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REPÚBLICA DE ANGOLA Docente: Maurício Lucassa Manuel Lucas
UNIVERSIDADE LUEJI A’ NKONDE Email: mauriciomayerslucas@gmail.com
FACULDADE DE DIREITO DO DUNDO Tel: (+244) 944 483 409; 934 182 761
SUMÁRIOS RESUMIDOS DE DIREITO ECONÓMICO
Aula n.º 03 e 04 | Data: 11/10/23
Tema I – Introdução ao Estudo do
Direito Económico; Sumário: 1.6. Relação entre o Direito e a Economia; 1.7. Evolução histórica do D.E. na Ordem Internacional; 1.7.1. Estado Absolutista; 1.7.2. Estado Liberal; 1.7.3. Estado Intervencionista; 1.7.1.1. Estado Intervencionista Social; 1.7.1.2. Estado Intervencionista Socialista; 1.7.4. Estado Democrático e de Direito.
1.6. Relação entre o Direito e a Economia
As relações entre economia e direito sempre existiram, seja em
qualquer doutrina que se preze a esclarecer fenómenos jurídico-económicos.
Economia e direito sempre se interifluenciaram, ou seja,
ambas são dimensões específicas da mesma totalidade: a sociedade, as relações sociais, ordenadas na dimensão económica e jurídicas, dimensões objectivamente indissolúveis na totalidade integrante.
Lições elaboradas tendo em atenção os manuais de Domingos Francisco João e Francisco
Queirós in Lições de Direito Económico de Angola e nos Apontamentos de Direito Económico em uso na FDULAN. Apesar disso as relações entre economia e direito não são uniformes e têm variado ao longo do tempo. Para o pensamento liberal, a actividade económica é um dado natural, prolongamento das liberdades individuais e geradora de riqueza, regendo-se por regras e lógicas próprias, totalmente racional e desenvolve-se num meio institucional próprio: o mercado.
A princípio pensava-se que o direito subordinava-se a
economia, até mais tarde se inverter os conceitos e ideias a respeito, tudo porque hoje por hoje, é o direito que regula a economia, através de seus instrumentos normativos, pelos quais se socorre o Estado para estabelecer a ordem na sociedade.
1.7. Evolução histórica do D.E. na Ordem Internacional
1.7.1. Estado Absolutista
A evolução histórica do pensamento económico tem como
ponto de partida o declínio do Estado Absolutista, que enfeixava todos os poderes na mão do rei, cuja concentração de força impedia o desenvolvimento de qualquer teoria que objetivasse reconhecer aos súditos direitos em oposição às ordens do monarca.
Vigorava a máxima romana quod principi placuit legis habet
vigorem, que se traduzia na egocêntrica visão de Luís XIV, L’état c’est moi (O Estado sou eu). Resultou do declínio do mosaico de Estado feudal, que se caracterizava pela descentralização dos centros de decisão política.
Lições elaboradas tendo em atenção os manuais de Domingos Francisco João e Francisco
Queirós in Lições de Direito Económico de Angola e nos Apontamentos de Direito Económico em uso na FDULAN. Observe-se que, durante o auge do Estado Absolutista, diversas leis interferiam indevidamente na esfera de domínio privado do indivíduo. Por exemplo, os nubentes só podiam consumar o casamento após autorização do rei, que tinha o direito de copular com a noiva antes do noivo.
Quando quisessem ter um filho deveriam solicitar uma
permissão ao monarca, que lhes entregava uma placa que deveria ser pendurada nas suas portas. A placa dizia: F.U.C.K. (Fornication Under Consent of the King) ou “Fornicação Sob o Consentimento do Rei”. Somado a isso, a tributação cobrada pelo monarca se dava por meio do confisco da produção e da propriedade do indivíduo, não raro sob pena do cerceamento do direito de liberdade.
Fim do Absolutismo
Podemos destacar, portanto, que o declínio ideológico do
Absolutismo se deu através dos seguintes factos:
1. A necessidade da sociedade em estabelecer direitos e
garantias individuais que protegessem os súditos dos abusos perpetrados pelo Soberano. 2. A Constituição do Rei João Sem-Terra, na Inglaterra, em 1215, que trouxe a lume o princípio da legalidade, concebido como forma de limitação da atuação do Estado no campo tributário. 3. Teoria da separação dos poderes desenvolvida pelo Barão de Montesquieu, a partir das ideias de formas puras de governo pensadas por Aristóteles, cuja obra L’esprit des lois (1748) é o marco filosófico de tal movimento,
Lições elaboradas tendo em atenção os manuais de Domingos Francisco João e Francisco
Queirós in Lições de Direito Económico de Angola e nos Apontamentos de Direito Económico em uso na FDULAN. culminando na Revolução Francesa (1789), tendo como expressão máxima. 4. Declaração Universal dos Direitos do Homem e do Cidadão, que foi uma das principais obras que marcou a origem dos direitos de 1ª geração – direitos individuais. O Estado Absolutista deu lugar ao Estado Liberal, que se caracterizava na plena garantia das liberdades individuais (... laissez-faire, laissez-passer...).
1.7.2. Estado Liberal
Nota: O Estado deixava a condução dos negócios jurídicos ao
livre-arbítrio das partes interessadas, que exerciam seus direitos individuais de forma irrestrita, focando seus esforços, tão somente, na garantia da segurança pública interna, bem como na manutenção da ordem externa.
O surgimento do Estado Liberal sustentou-se no aquecimento
das relações comerciais e no aparecimento de novos fatores de produção (capital), oriundos do mercantilismo e da ascensão da classe burguesa, dando origem à ciência económica e sua teoria clássica de microeconomia.
As imperfeições do regime liberal clássico não tardaram a
aparecer. Isto porque o funcionamento desse pressupunha:
1. Certa igualdade e um ambiente concorrencialmente
perfeito, para que, através da competição equilibrada entre os agentes, se alcançasse os interesses coletivos. 2. Como tais pressupostos nunca foram efetivados, houve a crise do liberalismo, caracterizada por sucessivas depressões econômicas, desequilíbrios internacionais, Lições elaboradas tendo em atenção os manuais de Domingos Francisco João e Francisco Queirós in Lições de Direito Económico de Angola e nos Apontamentos de Direito Económico em uso na FDULAN. acirramento das desigualdades sociais, bem como por conflitos bélicos em escala mundial. 3. O exercício indiscriminado dos direitos e liberdades individuais sem um aparato jurídico que lhe impusesse limites preestabelecidos, teve consequências nefastas para a sociedade, uma vez que, no campo interno, concentrou demasiadamente os fatores de produção e riquezas nas mãos de poucos, gerando as lutas de classes e injustiças sociais, bem como, no campo externo, acirrou as disputas por mercados económicos, que culminou na 1a Guerra Mundial, desdobrando-se na 2a Grande Guerra. 4. Com o agravamento da questão social interna, isto é, a marginalização das classes menos favorecidas, bem como o aparecimento dos párias sociais, dentre outros fatos ocorridos, presenciamos o nascimento dos direitos de 2ª geração, isto é, os direitos de cunho social, tais como o direito do trabalhador e o direito à seguridade social (previdência, assistência e saúde). 5. Igualmente, a concentração de riquezas e dos fatores de produção nas mãos de poucos se mostrou perniciosa ao mercado económico, uma vez que gerou práticas abusivas prejudicando e eliminando a livre-concorrência necessária à manutenção saudável dos mercados respectivos. 6. Destaca-se na América do Norte, no fim do século XIX, o nascimento das primeiras leis de intervenção no mercado (antitruste).
Lições elaboradas tendo em atenção os manuais de Domingos Francisco João e Francisco
Queirós in Lições de Direito Económico de Angola e nos Apontamentos de Direito Económico em uso na FDULAN. 7.1.3. Estado Intervencionista
Assim, após os conflitos sociais do século XIX, bem como dos
grandes conflitos mundiais, presenciou-se o aparecimento do Estado Intervencionista e o nascimento das primeiras normas de caráter jurídico-Económico, no qual a autonomia de vontade das partes na atividade económica é mitigada pelo direcionismo estatal, sobrepondo-se os interesses coletivos e transindividuais aos interesses individuais. Como decorrência dos fatos acima delineados, presenciamos o aparecimento dos primeiros blocos económicos internacionais e o nascimento dos direitos de 3ª geração, que são os direitos cuja titularidade pertence a toda a sociedade, tendo caráter nitidamente coletivo e transindividual (meio ambiente, defesa do consumidor, defesa da concorrência etc.).
Surge o intervencionismo estatal, caracterizado por forte
interferência do Poder Público na sua Ordem Econômica, sob duas vertentes dominantes:
1. O Estado Socialista: O modelo socialista caracterizou-se
pela absorção total da atividade económica por parte do Estado. 2. Estado do Bem-Estar Social: a intervenção na atividade económica apresenta-se mais moderada, objetivando garantir que sejam efetivadas políticas de caráter assistencialista na sociedade, para prover os notadamente hipossuficientes em suas necessidades básicas.
Lições elaboradas tendo em atenção os manuais de Domingos Francisco João e Francisco
Queirós in Lições de Direito Económico de Angola e nos Apontamentos de Direito Económico em uso na FDULAN. Nota: O Estado intervencionista, em virtude do superdimensionamento da máquina estatal, gerando déficit no orçamento público, uma vez que as despesas a serem realizadas pelo Poder Público ultrapassaram o volume de receitas arrecadadas, cedeu lugar ao Estado Neoliberal, ou, como preferem diversos autores, ao Estado Regulador.
Porquanto se demonstrou ineficiente, paternalista e
incompetente, não se revelando capaz de atender com presteza e eficiência à demanda dos cidadãos, sendo, ainda, responsável por vultosos endividamentos e déficits nas contas públicas. A experiência histórica revelou que se tratava de um modelo de Estado esbanjador, superestimado, incapaz de investir nas demandas sociais mais urgentes, tais como transporte, habitação, saúde, educação e segurança pública, dentre outras.
Estado Neoliberal: Fortemente inspirado no ideário político da
social democracia. O pêndulo retorna à iniciativa privada, de modo a assegurar-lhe o papel de protagonista na sociedade, dando-se um retorno comedido ao ideário liberal, permeado, agora, pela presença do Estado, na qualidade de agente normatizador e regulador de sua Ordem Econômica.
O novo posicionamento estatal regulador passou a concentrar
esforços em áreas que considera como típicas de Estado, abandonando-se o direcionismo estatal nas atividades econômicas, ficando este apenas como agente regulador da atividade económica.
Lições elaboradas tendo em atenção os manuais de Domingos Francisco João e Francisco
Queirós in Lições de Direito Económico de Angola e nos Apontamentos de Direito Económico em uso na FDULAN. Destarte, busca-se com este modelo um retorno comedido aos ideais do liberalismo, sem, contudo, abandonar a necessidade de sociabilidade dos bens essenciais, a fim de se garantir a dignidade da pessoa humana bem como os ditames de justiça social, permeados e aliados, agora, à livre-iniciativa e à defesa do mercado.
Caracteriza-se numa nova concepção para a presença do
Estado na economia, como ente garantidor e regulador da atividade económica, que volta a se basear na livre iniciativa e na liberdade de mercado, bem como na desestatização das atividades econômicas e redução sistemática dos encargos sociais.
Obs: O Direito Econômico é fruto direto de todas as mudanças
socioeconômicas presenciadas ao longo do século XX, sendo, assim, um ramo jurídico concebido para disciplinar as diversas formas de interferência estatal no processo de geração de rendas e riquezas da Nação.
1.7.4. Estado Democrático e de Direito
Noção: Podemos conceituar o Estado Democrático de Direito
como a Nação juridicamente organizada em torno de constituição e leis, cuja legitimação da autoridade política se dá por meio da crisma de aprovação popular e a atuação dos agentes públicos é previamente delimitada em normas jurídicas.
Obs: Com a queda do modelo absolutista, a sociedade passou
a eleger os valores a seguir, como meio de se atingir o novo modelo por ela pensado, garantindo-se, assim, o atendimento de suas reais necessidades e interesses. Lições elaboradas tendo em atenção os manuais de Domingos Francisco João e Francisco Queirós in Lições de Direito Económico de Angola e nos Apontamentos de Direito Económico em uso na FDULAN. Tais valores, a seguir apontados, consubstanciaram o Estado Democrático de Direito, e são eles:
1. Constituição de uma autoridade política – Esta teve como
pensador inicial Nicolo Machiavelli que, em sua obra O príncipe (1532), apontou para a necessidade de se constituir a organização política da sociedade, por meio de um ente politicamente autônomo no campo interno e soberano no campo externo (autodeterminismo), ao qual denominou Estado.
No campo jurídico, a organização administrativa do Estado,
segundo Machiavelli, somente seria bem-sucedida, por meio da obtenção legítima de poder, que se daria pela crisma de aprovação popular. Defende a centralização do poder político, como forma de se garantir a segurança jurídica e a estabilidade política, e não propriamente o absolutismo.
Merece destaque, a posteriori, a teoria de separação das
funções estatais em três vertentes típicas (edição de leis, aplicação e cumprimento destas, e solução de conflitos) idealizada por Charles-Louis de Secondatt, ou simplesmente Charles de Montesquieu, O espírito das leis (1748).
2. Contenção da autoridade política - Aliada à necessidade
de se dar proteção jurídica aos valores sociais, bem como de se constituir a autoridade política do Estado, a sociedade, recém-saída do modelo autoritário absolutista, sentiu necessidade de se limitar a atuação do Poder Público em face do indivíduo, separando o campo
Lições elaboradas tendo em atenção os manuais de Domingos Francisco João e Francisco
Queirós in Lições de Direito Económico de Angola e nos Apontamentos de Direito Económico em uso na FDULAN. de atuação do Poder Público, do campo de exercício dos Direitos Privados.
Merece destaque o pensamento de Thomas Hobbes que, em
sua obra Leviatã (1651), apontou para a necessidade de se conter o poder da autoridade política, iniciando o processo de consagração da proteção do domínio privado e de liberdades individuais.
No campo jurídico, a proteção ao domínio privado e às
liberdades individuais da pessoa foi efetivada mediante a normatização dos direitos privados, de cunho nitidamente cível e individualista, resultando na separação dialética do direito do Estado do direito civil, isto é, na segregação jurídica de direito público e de direito privado.
3. Representação dos interesses da sociedade - No processo
de reconfiguração da engenharia política do Estado dos séculos XVII e XVIII, mister se fez garantir à sociedade legitimação para escolher a forma pela qual iria exercer sua participação no processo decisório da Nação.
Merece destaque o pensamento de Jean-Jacques Rousseau,
cuja obra O contrato social (1762), aliada ao pensamento de Benjamin Constant, Princípios políticos constitucionais (1806), foram determinantes para legitimar o processo de participação popular na vida da Nação.
Segundo Rousseau, a vontade da maioria sempre se traduz no
atendimento do interesse público, devendo haver participação popular na condução da vida política do Estado. No campo jurídico, a representação dos diversos segmentos sociais Lições elaboradas tendo em atenção os manuais de Domingos Francisco João e Francisco Queirós in Lições de Direito Económico de Angola e nos Apontamentos de Direito Económico em uso na FDULAN. consagrou-se com a positivação dos direitos políticos e com o nascimento dos partidos de representação popular.
4. Pluralismo social e justiça distributive: mister se fez
garantir proteção aos segmentos sociais marginalizados, minoritários e, consequentemente, excluídos do processo de produção e repartição de riquezas.
No campo jurídico, o processo de proteção social e distribuição
de riquezas foi efetivado mediante a normatização dos direitos sociais (trabalho, previdência, assistência social, saúde, educação, lazer etc.). Todavia, a fim de se efetivar as políticas públicas de cunho social, mister se fez ao Estado intervir em sua ordem económica, com o fito de direcioná-la para a consecução de seus objetivos, atendendo ao interesse coletivo e promovendo o bem-estar social.
Da junção de todos estes valores sociopolíticos, foi concebido
o Estado Democrático de Direito, que pode ser conceituado como a Nação juridicamente organizada em torno da Constituição e leis cujos representantes gozam do crisma da aprovação popular, tendo atuação disciplinada e limitada pelo ordenamento jurídico.
Observe-se que tal modelo estatal encontra-se presente em,
praticamente, todos os textos constitucionais editados após a 2.ª Guerra Mundial.
PRÓXIMA AULA: SISTEMAS ECONÓMICOS
Lições elaboradas tendo em atenção os manuais de Domingos Francisco João e Francisco
Queirós in Lições de Direito Económico de Angola e nos Apontamentos de Direito Económico em uso na FDULAN.
Democracia, Direitos Fundamentais, Paradigmas: Justiça, Segurança e Liberdade : Democracia – história do constitucionalismo e formação do Estado – Estado de Direito Democrático – Estado Social – Direitos Fundamentais
Democracia e Jurisdição Constitucional: a Constituição enquanto fundamento democrático e os limites da Jurisdição Constitucional como mecanismo legitimador de sua atuação