Cabo Verde Economic Update 2 - Translated

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Cabo Verde

Atualização económica

Choques climáticos e
sustentabilidade orçamental:
potenciais impactos e opções
políticas

Maio 2023

1
© 2023 The World Bank
1818 H Street NW, Washington DC 20433
Telephone: 202-473-1000; Internet: www.worldbank.org

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expressos neste trabalho não refletem necessariamente as opiniões dos Diretores Executivos do Banco
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Atribuição - Por favor, cite o trabalho da seguinte forma: "Banco Mundial. 2023. Choques climáticos e
sustentabilidade fiscal: potenciais impactos e opções políticas. Actualização Económica de Cabo Verde.
© Banco Mundial."

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20433, EUA; fax: 202-522-2625; e-mail: pubrights@worldbank.org.

3
Agradecimentos
O Cabo Verde Economic Update é uma série de relatórios do Banco Mundial que avalia as tendências,
perspectivas e políticas económicas em Cabo Verde. Cada edição inclui uma seção sobre os recentes
desenvolvimentos e perspectivas económicas, seguida de uma seção temática que analisa questões de
particular importância. A seção temática da presente edição centra-se no teste de stress da
sustentabilidade da dívida de Cabo Verde em diferentes cenários de cheias, tendo em conta o aumento do
impacto de eventos naturais adversos.

A equipa foi liderada por José Daniel Reyes (Economista Sénior, EAWM1) e Rosa Brito Delgado
(Economista, EAWM1). A equipa incluiu Oscar Ishizawa (Especialista Sénior em Gestão do Risco de
Catástrofes, SAWU1), Rafael Van der Borght (Consultor Sénior, SAWU1), Victor Steenbergen
(Economista Sénior, ETIIC) e Eduardo Carbonel (Economista Sénior, EAWPV). Os revisores foram
Michel Matera (Especialista Principal em Gestão de Risco de Desastres, SAWU1) e Gabriela Schmidt
(Economista, EAEM2).

Micky O. Ananth (Analista de Operações, EAWM1), Theresa Adobea Bampoe (Assistente de Programa,
EAWM1), e Vania Jurena Gama Lopes (Consultora de Curto Prazo, AWMCV) ajudaram a equipa.

O relatório foi preparado sob a orientação e supervisão geral de Keiko Miwa (Directora Nacional,
AWCF1), Theo David Thomas (Gestor de Prática, EAWM1), Eneida Fernandes (Representante
Residente, AWMGW), Edouard Al-Dahdah (Economista Principal e Líder de Programa, EAWDR), e
Daniela Marotta (Economista Principal, EAWM1).

4
Conteúdo

1. Politica Monetária........................................................................................................................26
1. Pobreza........................................................................................................................................30
1. Os impactos económicos de eventos naturais adversos em Cabo Verde....................................35
1. Calibração dos efeitos macro-orçamentais das inundações em Cabo Verde...............................38
1. Análise da sustentabilidade da dívida em diferentes cenários de inundação..............................41
1. Cenário de Referência.................................................................................................................43
1. Cenário de elevada resiliência orçamental..................................................................................44
1. Conclusão e Politica de Opçōes...................................................................................................47

Lista de quadros, figuras e caixas

Figure 1: Services is the key sector driving GDP Growth.........................................................................11


Figure 2: Exports and private consumption drive economic growth on the demand side...........................12
Figure 3: Inflation hit a record high as international fuel and food prices surged.......................................14
Figure 4: Loan Guarantees to SOEs (millions of USD).............................................................................. 18
Figure 5: Public Debt (percent of GDP).................................................................................................... 19
Figure 6: Recent Economic Developments ............................................................................................... 24
Figure 7: External Sector Developments................................................................................................... 25
Figure 8: Fiscal Sector Developments ...................................................................................................... 26
Figure 9: Monetary Sector Developments................................................................................................. 27
Figure 10: Poverty reduction in 2022 was driven by job creation, especially in tourism...........................28
Figure 11: Share of Employment and Income for each sector by welfare decile.......................................29

5
Figure 12: Breakdown of Consumption and Median Effective Inflation Rates by Decile.........................30
Figure 13: Breakdown of Consumption and Median Effective Inflation Rates by Decile.........................31
Figure 14: The inflation experienced by the households differs significantly from the official CPI and the
GDP.......................................................................................................................................................... 32
Figure 15: The Economic Impacts of Adverse Natural Events in Cabo Verde.......................................... 34
Figure 16: Conceptual Framework: How Climate-related Shocks can Affect Debt................................... 40
Figure 17: Extreme floods could significantly shift the anticipated trajectory of debt ...............................45
Figure 18: Under a “High Fiscal Resilience” scenario debt ratio would fall faster below the indicative risk
threshold.................................................................................................................................................... 45

Table 1: Selected Fiscal Indicators............................................................................................................ 16


Table 2: Key Impact of Disaster and Climate-related Risk in Cabo Verde................................................ 36
Table 3: Flood Impact on Capital and GDP for Cabo Verde..................................................................... 38
Table 4: Policy Options............................................................................................................................. 47

Box 1: Recovery of the Tourism Sector...................................................................................................... 21


Box 2: The IMF-World Bank Debt Sustainability Framework (DSF) Explained.......................................41

Acrónimos e abreviaturas

AAL Perda média anual


CAD Défice da balança corrente
Cat DDO Opção de redução por catástrofe
CPI Índice de Preços no Consumidor
CVE Cape Verde escudo
DSA Avaliação da sustentabilidade da dívida

6
FDI Investimento direto estrangeiro
FNE Fundo Nacional de Emergência
FRS Declaração de risco fiscal
GDP Produto interno bruto
Mecanismo Mundial para a Redução e Recuperação de
GFDDR
Catástrofes
IMF Fundo Monetário Internacional
INE National Institute for Statistics
LDC País menos desenvolvido
MoF Ministério das Finanças
NPL Empréstimos não produtivos
NTL Luzes noturnas
PEDS Plano Estratégico para o Desenvolvimento Sustentável
PPP Paridade do poder de compra
SIDS Pequenos Estados Insulares em Desenvolvimento
SLR Aumento do nível do mar
SOE Empresa pública
SSA África Subsaariana
WDI Indicadores de Desenvolvimento Mundial (Banco Mundial)
WEO Perspectivas Económicas Mundiais (FMI)
y/y Ano a ano

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Sumário Executivo
Capítulo 1: O Estado da Economia

Evolução económica recente e perspectivas

O PIB real aumentou 17,7 por cento em 2022, com os rendimentos per capita a ultrapassarem os
níveis anteriores à pandemia. Do lado da oferta, o alojamento, os transportes e o comércio explicaram
60 por cento do crescimento. Do lado da procura, as exportações (principalmente o turismo) e o consumo
privado foram responsáveis pelo crescimento. A recuperação da atividade económica em 2022 foi
acompanhada por uma redução da pobreza (0,8 pontos percentuais), apesar do aumento da inflação. A
inflação global atingiu 7,9 por cento (y/y) em dezembro de 2022, depois de as pressões inflacionistas
terem surgido em 2021, alimentadas pelos elevados preços internacionais do petróleo e dos alimentos e
pelas perturbações na cadeia de abastecimento mundial devido à guerra na Ucrânia. Os preços mais
elevados dos alimentos e a baixa produção agrícola, impulsionados pela seca de cinco anos,
intensificaram a insegurança alimentar.
O forte crescimento económico em 2022 conduziu a uma redução da pobreza. A taxa de pobreza caiu
de 20,1 por cento em 2021 para 19,3 por cento em 2022 (utilizando 3,65 dólares por dia-2017 PPC),
atingindo os níveis de pobreza de 2015. O crescimento económico foi fundamental para a redução da
pobreza, liderado pela criação de novos empregos, especialmente no setor do turismo. No entanto, a
redução da pobreza foi atenuada pelo aumento da inflação em 2022, especialmente os preços mais
elevados dos géneros alimentícios. Estima-se que, sem o aumento dos preços dos alimentos, a pobreza
teria sido de 16,2% em 2022 (3,65 dólares por dia PPC 2017), quase 3 pontos percentuais mais baixa e
próxima do nível pré-pandémico (16,1%) em 2019.
O défice orçamental diminuiu para 4,1 por cento do PIB em 2022, apoiado pelo forte desempenho
económico e pelo aumento das receitas fiscais. A receita total aumentou 18,3 por cento, impulsionada
pelos impostos sobre o rendimento das pessoas singulares e o IVA, enquanto a despesa total aumentou
5,4 por cento, refletindo despesas correntes mais elevadas, com medidas tomadas para proteger os mais
vulneráveis do aumento da insegurança alimentar e para controlar os preços dos combustíveis e da
energia. O sistema de proteção social, através de transferências monetárias, apoiou os mais vulneráveis.
As necessidades de financiamento orçamental para 2022 diminuíram para 97 milhões de dólares. Foram
totalmente cobertas por créditos concessionais, subvenções e empréstimos internos.The SOE sector con-
tinued to require fiscal support while it gradually recovers from the crisis caused by COVID-19. Os riscos
orçamentais provenientes do setor aumentaram ainda mais em 2022 e continuam a ser necess ários
desafios a nível político e institucional. Estes riscos resultam principalmente do agravamento do
desempenho operacional da Cabo Verde Airlines (CVA), desencadeando um aumento do apoio do
Governo através de apoio orçamental direto e garantias de empréstimo em 2020 e 2021. Em 2022, as
garantias de empréstimo adicionais representaram 46,6 milhões de dólares, impulsionadas principalmente
pela ELECTRA, a empresa de eletricidade e água, (19,5 milhões de dólares). O stock total da dívida
garantida situou-se em 189 milhões de dólares em 2022, representando 8% do PIB. A capitalização para
as empresas públicas representou 18 milhões de dólares em 2022 (7,2 milhões de dólares em 2021), sendo
a CVA o maior beneficiário com 8,8 milhões de dólares. Estas vulnerabilidades orçamentais podem

8
comprometer os esforços de Cabo Verde para restaurar a sustentabilidade orçamental e manter a dívida
(em percentagem do PIB) numa trajetória descendente a médio prazo.
A dívida pública diminuiu para 120,9 por cento do PIB em 2022, impulsionada pelo crescimento do
PIB. A dívida pública, que se encontrava numa trajetória descendente desde 2017, aumentou
acentuadamente para 143,7 por cento do PIB em 2021, com a necessidade de recorrer a empréstimos
externos concessionais adicionais e à emissão de obrigações do Tesouro para cobrir as necessidades de
financiamento orçamental. A dívida pública continuou a aumentar em 2022, em cerca de 5,4 por cento em
termos nominais, mas foi compensada pela expansão do PIB. De acordo com a An álise Conjunta de
Sustentabilidade da Dívida do BM/FMI de junho de 2022, embora o risco de perturbação da dívida
externa tenha sido atualizado de elevado para moderado, o risco de perturbação global da dívida de Cabo
Verde permanece elevado, mas é avaliado como sustentável. Considerando estas tendências da dívida e a
elevada vulnerabilidade do país a choques externos, melhorar a gestão e o acompanhamento dos riscos
orçamentais, reduzir o apoio direto e as garantias de empréstimo às empresas públicas, continuar a
reforçar a gestão da dívida e reduzir o endividamento interno são ações fundamentais para reduzir as
vulnerabilidades da dívida.
A forte recuperação das exportações líquidas de serviços reduziu o défice da balança corrente
(DAC) de 11,8 por cento do PIB em 2021 para 3,4 por cento em 2022. As exportações de turismo, que
representam cerca de 65% das exportações de serviços, lideraram o aumento do total das exportações. As
receitas do turismo aumentaram mais de 200 por cento em 2022, representando 16,4 por cento do PIB
(6,3 por cento em 2021), impulsionadas pela forte recuperação das chegadas de turistas, que
ultrapassaram os níveis pré-pandémicos. O aumento robusto das remessas, que representam 12 por cento
do PIB, também apoiou a recuperação da CAD. A CAD foi financiada principalmente pelo IDE e por
empréstimos em condições favoráveis. O IDE representou 4,7% do PIB. Estima-se que as reservas
internacionais em 2022 cubram cerca de 6 meses de importações, muito acima dos 3,6 meses
recomendados pela Avaliação da Estabilidade Externa (AEE) do FMI de 2019. Como tal, as reservas
ajudaram a apoiar a política monetária acomodatícia em vigor desde 2020.
Prevê-se que o crescimento real do PIB atinja 4,4 por cento em 2023 e permaneça próximo do PIB
potencial a médio prazo. O crescimento será apoiado pelo consumo privado, pelo investimento no
turismo e pela economia azul e deverá atingir uma média de 4,5 por cento entre 2023 e 2025. À medida
que o Governo reestrutura o funcionamento de várias empresas públicas importantes através de parcerias
público-privadas (PPP), venda directa e acordos de concessão, e implementa reformas estruturais no
âmbito do plano estratégico para o desenvolvimento sustentável (PEDS II 22-26), serão mobilizados mais
investimentos privados para apoiar o crescimento. A estratégia visa alcançar um crescimento maior e
mais sustentado através do aumento da resiliência económica, do aumento da produtividade e da redução
da fragmentação do mercado. A aplicação bem sucedida da estratégia permitirá que os empresários locais
beneficiem das repercussões positivas do próspero setor do turismo, criando assim uma economia mais
diversificada e sustentável.
Prevê-se que a inflação diminua em 2023, à medida que o crescimento global se modera, os preços
dos produtos de base estabilizam e os estrangulamentos da oferta diminuem. Prevê-se que a inflação
global se situe em 5,2 por cento. A médio prazo, a âncora nominal (indexação ao euro) e o regresso à
consolidação orçamental deverão conter a inflação, convergindo para 2% no final de 2024. Prevê-se que a
pobreza (utilizando 3,65 dólares por dia - PPC de 2017) se mantenha acima dos 19% em 2023, devido ao
aumento dos preços, especialmente dos produtos alimentares. Prevê-se que a taxa de pobreza desça para
18,7 por cento em 2024 e continue a descer para 17,5 por cento em 2025, apoiada pelo crescimento
económico e pela estabilização da inflação.

9
As perspectivas estão sujeitas a riscos substanciais de deterioração decorrentes de incertezas
devidas à guerra na Ucrânia e a choques climáticos. Um aumento da dimensão ou da duração do
choque nos termos de troca decorrente da guerra na Ucrânia poderá conduzir a pressões inflacionistas
contínuas e à continuação do apoio político para atenuar o seu impacto, o que, por sua vez, poderá
deteriorar a sustentabilidade orçamental e da dívida. Pressões políticas contra a continuação da
consolidação orçamental. As pressões políticas contra a continuação da consolidação orçamental podem
também fazer descarrilar as reformas estruturais planeadas para gerir os riscos orçamentais. Uma fraca
procura externa nos principais mercados turísticos de Cabo Verde poderá enfraquecer o crescimento
económico do país. Além disso, o país continua significativamente exposto a catástrofes naturais,
incluindo as relacionadas com as alterações climáticas. Com o nível mais elevado de risco de catástrofe
climática na África Subsariana e um dos mais elevados a nível mundial, Cabo Verde já está a sentir os
efeitos de eventos geológicos e climáticos que estão a afetar os meios de subsistência e os principais
setores de crescimento. Prevê-se que estes fenómenos se agravem num futuro próximo, colocando riscos
significativos para a sustentabilidade do modelo de desenvolvimento.
Capítulo 2: Choques relacionados com o clima e sustentabilidade orçamental: impactos potenciais e
opções políticas
As catástrofes e os choques relacionados com o clima têm afetado de forma recorrente as finanças
públicas em duas frentes simultâneas. O crescimento económico tende a contrair-se quando ocorre uma
catástrofe, reduzindo assim a cobrança de receitas, enquanto as despesas de emergência após a
recuperação da catástrofe e os esforços de reconstrução aumentam a necessidade de finanças públicas.
Para financiar estas despesas imprevistas, o governo tem historicamente recorrido a realocações
orçamentais ad-hoc, interrompendo os programas de desenvolvimento em curso e excluindo outras
despesas que promovem o crescimento, com efeitos potencialmente duradouros na acumulação de capital
humano e na taxa de crescimento potencial da economia.
A segunda parte deste relatório centra-se no teste de stress da sustentabilidade da dívida do país em
diferentes cenários de cheias. O Capítulo 2 baseia-se na componente de cheias do Perfil de Risco de
Desastres desenvolvido para Cabo Verde, que determina os danos potenciais aos activos físicos que as
cheias de diferentes intensidades e frequências poderiam gerar em Cabo Verde. Este Perfil de Risco
fornece informações únicas sobre eventos extremos de inundação, ou seja, eventos de risco de cauda, que
se espera que se tornem mais frequentes à medida que o clima muda e precisam de ser cuidadosamente
analisados para garantir a sustentabilidade da dívida no futuro. Com base nas potenciais perdas de capital
que estas inundações poderiam produzir, é utilizada uma função de produção tradicional Cobb-Douglas
para derivar os potenciais impactos no crescimento e calibrar as trajectórias macro-orçamentais a médio
prazo em cada cenário de inundação. Estas estimativas são depois incorporadas na Análise de
Sustentabilidade da Dívida (ASD) do FMI-Banco Mundial para explorar a forma como um choque
exógeno no ano 2023 afecta a sustentabilidade da dívida a médio prazo até 2042. Para tal, consideramos
como diferentes inundações poderiam afectar a trajetória da dívida em relação ao PIB em relação a um
cenário "sem inundações". Eventualmente, é explorado um cenário de "elevada resiliência orçamental"
para avaliar de que forma a política orçamental pode ajudar a atenuar os impactos de inundações
extremas.
Os resultados mostram que, embora as pequenas inundações recorrentes representem uma ameaça
limitada, inundações raras mas mais prejudiciais poderiam ter um impacto significativo na
sustentabilidade da dívida de Cabo Verde. Uma inundação rara, mas catastrófica, poderia aumentar
significativamente as taxas de endividamento, o que faria com que a dívida pública de Cabo Verde
ultrapassasse os limiares indicativos da tua capacidade de carga da dívida (até 14 anos no cenário mais

10
extremo, de 2028 no cenário de base para 2042). A adopção de políticas destinadas a reforçar a resiliência
fiscal, nomeadamente através de um DDO de 10 milhões de dólares de Cabo Verde e de um mecanismo
eficiente baseado em regras para atribuir e executar o financiamento pós-catástrofe, poderá proporcionar
alguma protecção, permitindo uma recuperação mais rápida e reduzindo as perdas do PIB, conduzindo
assim a uma redução acelerada do rácio dívida/PIB. Isto ajudaria o país a descer mais rapidamente abaixo
dos limiares indicativos do risco de endividamento. No entanto, para as inundações mais graves, mesmo
neste cenário de resiliência orçamental reforçada, a trajectória do rácio dívida/PIB desviar-se-ia
significativamente do "cenário sem inundações", o que poderia fazer descarrilar os esforços de
consolidação orçamental em curso e sublinhar a necessidade urgente de investir na redução dos riscos e
na adaptação às alterações climáticas para limitar as perdas potenciais.
Para reduzir os riscos salientados no presente capítulo, as autoridades poderiam considerar um
pacote de opções políticas estruturado em torno de três grandes domínios de reformas. Em primeiro
lugar, as autoridades poderiam continuar a melhorar a incorporação dos riscos orçamentais relacionados
com as catástrofes e o clima na estratégia mais ampla de gestão dos riscos orçamentais, com vista a
informar eficazmente a elaboração da política orçamental. Em segundo lugar, o Governo poderia
considerar a possibilidade de desenvolver uma estratégia de financiamento mais abrangente, com base em
níveis de risco, para aumentar a tua capacidade de adoptar políticas anticíclicas na sequência de uma
catástrofe. É igualmente importante garantir a existência de mecanismos baseados em regras para
aumentar a eficiência e a transparência na alocação e execução dos recursos pós-catástrofe. Por último,
serão necessários investimentos específicos na redução dos riscos e na adaptação às alterações climáticas
para limitar os impactos futuros dos fenómenos naturais adversos e amortecer as perspectivas de
desenvolvimento num clima em mudança. As políticas públicas têm, por conseguinte, um papel
fundamental no reforço da resiliência económica. O quadro seguinte apresenta em pormenor as opções
políticas que podem ser consideradas para este efeito.

Policy Options

Recommendação Responsabilidade Cronologia

Ter em conta e incorporar os riscos orçamentais relacionados com as catástrofes e o clima na


estratégia mais vasta de gestão dos riscos orçamentais
Reforçar a inclusão dos riscos de catástrofe e climáticos MdF/Comité do Risco Curto prazo
na declaração de risco orçamental Orçamental
Integrar estes riscos nos documentos de política orça- MdF/Comité do Risco Medio prazo
mental a médio prazo, tais como os quadros orçamentais Orçamental
a médio prazo (QFP), a estratégia da dívida a médio
prazo (EDMP) e a análise da sustentabilidade da dívida.

Desenvolver uma estratégia integrada em função dos riscos para aumentar a capacidade orça-
mental de resposta rápida na sequência de uma catástrofe, preservando simultaneamente a
sustentabilidade das finanças públicas
Delinear os passivos contingentes explícitos e implícitos MdF/Comité do Risco Curto prazo
associados a catástrofes e choques relacionados com o Orçamental
clima

11
Reunir os instrumentos de financiamento de riscos exis- MdF/Comité do Risco Medio prazo
tentes no âmbito de uma visão estratégica e integrada e Orçamental
avaliar diversas opções de financiamento de riscos para
aumentar a cobertura contra catástrofes e choques rela-
cionados com o clima, tendo em conta as condições
macroeconómicas mais amplas
Promover mecanismos baseados em regras para aumen- MoF/FNE Medio prazo
tar a eficiência e a transparência na afectação e execução
dos recursos pós-catástrofe
Tornar as infra-estruturas públicas críticas resistentes às alterações climáticas e promover in-
vestimentos específicos na redução do risco de catástrofes e na adaptação às alterações
climáticas
Investimentos públicos resistentes ao clima através da in- MoF/DNP Curto prazo
corporação de considerações relativas ao clima e ao risco
de catástrofes na concepção, formulação e avaliação de
novos projectos de investimento
Aumentar a resiliência das redes rodoviárias através de MIOTH / Medio prazo
uma gestão dos ativos de transporte baseada nos riscos. Infraestruturas de
Cabo Verde/
Estrades de Cabo
Verde (ECV)
Reforçar o planeamento territorial e aumentar a resiliên- Ministério das Medio prazo
cia costeira através de uma combinação de infra-estru- Infra-estruturas,
turas verdes e cinzentas que potenciem as soluções Planeamento Territo-
baseadas na natureza. rial
e Habitação (MIOTH)
/ INGT/ Ministério do
Ambiente e
Agricultura / Min-
istério
do Mar

12
Parte I - O estado da economia
1. Sector real
O crescimento recuperou fortemente em 2022, apesar dos ventos contrários da economia mundial. O bom
desempenho do setor do turismo, combinado com o aumento do consumo privado, apoiou o crescimento. No
entanto, os elevados preços mundiais dos combustíveis e dos géneros alimentícios exacerbaram as pressões
inflacionistas.

1. O choque resultante da COVID-19 produziu a maior contração de que há registro (19,3%) em


2020 e expôs as vulnerabilidades económicas do país. Antes da crise, Cabo Verde registrou um
crescimento económico robusto, impulsionado por um setor turístico próspero e fortes reformas estru-
turais, principalmente em torno do setor das empresas públicas. Entre 2016 e 2019, o crescimento foi
em média de 5 por cento (3,2 por cento em termos per capita). O choque da COVID-19 teve um im-
pacto negativo no país através do sector do turismo, que representa 25 por cento do PIB e impulsiona
cerca de 40 por cento da atividade económica global, e através da redução do Investimento Directo
Estrangeiro (IDE), uma fonte crítica de finanças externas e um motor fundamental do crescimento. A
crise foi provocada pelo encerramento de nove meses do setor do turismo e pelas repercussões negati-
vas que lhe estão associadas nos setores a montante. As exportações líquidas foram um entrave ao
crescimento, com uma redução das exportações de bens e serviços de 58,9 por cento. Invertendo os
progressos realizados desde 2015, a taxa de pobreza nacional (utilizando a Paridade do Poder de
Compra de 3,65 dólares por dia - 2017) aumentou de 16,1 por cento em 2019 para 21,5 por cento em
2020.
2. Depois de ter crescido 7% em 2021, a recuperação económica de Cabo Verde da pandemia da
COVID-19 reforçou-se em 2022, com o crescimento a atingir 17,7%. Do lado da oferta, o cresci-
mento foi sustentado pelo valor acrescentado dos setores do alojamento, comércio e transportes, que
representaram 67% do crescimento do PIB, bem como pelos impostos líquidos de subsídios, que rep-
resentaram 23% do crescimento do PIB (Figura 1). A forte recuperação do setor do turismo, com as
chegadas de turistas a ultrapassarem os níveis de 2019, está a impulsionar a atividade económica no
país. O setor da construção teve um desempenho inferior em 2022, ressentindo-se dos elevados níveis
de inflação que criaram incerteza e levaram ao adiamento dos investimentos internos. Globalmente, o
setor dos serviços contribuiu com 17 p.p. para o crescimento do PIB, enquanto a indústria transfor-
madora, impulsionada pelas indústrias de transformação de peixe, contribuiu com 1,3 p.p. O sector da
agricultura e das pescas contribuiu negativamente com 0,7 p.p. para o crescimento, refletindo princi-
palmente a seca de 5 anos que continua a afetar o país.

Figura 1: Os serviços são o sector-chave que impulsiona o crescimento do PIB


(Pontos percentuais)

13
Public administration and social-1.1security
-0.4
Fishing and aquaculture
-0.3
Agriculture, livestock and forestry 2021 2022
Health and social work-0.3
-0.1
Education
Extractive industries 0.0
Other service activities 0.1
Information and communication activities 0.1
Manufacturing industries 0.2
Construction 0.2
Electricity and water 0.6
Real estate Activities 0.8
Financial and insurance activities 0.8
Business Services 0.9
Commerce and repair 3.3
Transport and storage 3.7
Taxes net of subsidies 4.1
Accommodation and restaurants 4.9

-2 0 2 4 6
Source: Author's calculations using authorities’ data and WBG estimations (February 2023)

3. As exportações e o consumo privado lideraram o crescimento económico do lado da


procura. As exportações, principalmente o turismo, e o consumo privado foram responsáveis
pelo crescimento económico, refletindo uma maior procura externa e a retoma completa da
mobilidade (Figura 2). O investimento total diminuiu em 2022, em 31,8 por cento, com a ele-
vada incerteza e os preços a afetarem as decisões de investimento interno. No entanto, o IDE
teve um bom desempenho em 2022, representando 4,9 por cento do PIB, um aumento de 0,5
pontos percentuais em comparação com 2021. Com o impulso da atividade económica, as
importações também aumentaram, sobretudo de bens de consumo e combustíveis, con-
tribuindo negativamente com 8,6 p.p. para o crescimento do PIB. O consumo público tam-
bém contribuiu negativamente para o crescimento, em 1,6 p.p., reflectindo os esforços para
evitar gastos desnecessários.

Figura 2: As exportações e o consumo privado impulsionam o crescimento económico do lado da


procura
(Pontos percentuais)

14
70
Growth
Imports
Exports
Government Consumption
40 Investment
Private Consumption

10

-20

-50
2019 2020 2021 2022

Source: Author's calculations using authorities’ data and WBG estimations (February 2023).

4. O impacto da guerra na Ucrânia exacerbou a inflação em 2022, afetando desproporcional-


mente as famílias mais pobres e vulneráveis, aumentando a insegurança alimentar e agra-
vando a desigualdade. Os principais canais de transmissão directa da guerra são os preços in-
ternacionais mais elevados do petróleo e dos alimentos. Uma vez que o país importa cerca de
80 por cento dos produtos de consumo, o aumento dos preços globais dos alimentos e da en-
ergia exerce uma pressão ascendente sobre o custo dos alimentos e dos combustíveis em
Cabo Verde, afectando desproporcionalmente os pobres. Os agregados familiares no decil in-
ferior da distribuição de rendimentos gastam, em média, 25 do seu rendimento disponível em
alimentos e bebidas. A taxa média de inflação global situou-se em 7,9 por cento em 2022,
em comparação com 1,9 por cento em 2021 (Figura 3). Este aumento nos preços foi impul-
sionado principalmente por um aumento de 15,7 por cento nos produtos alimentares e be-
bidas não alcoólicas, um aumento de 11,1 por cento nos transportes e um aumento de 4,1 por
cento nos preços da habitação e dos serviços públicos. Os preços médios da energia aumen-
taram 23% em 2022, o que exerceu uma pressão ascendente sobre os preços noutros setores.
A taxa de inflação, quando se excluem a energia e os produtos alimentares (incluindo be-
bidas) e o tabaco, situou-se em 3,9% ao ano, mostrando até que ponto os preços dos alimen-
tos e da energia afetam atualmente a taxa global.

5. As autoridades reagiram rapidamente em Abril de 2022 com um pacote de medidas


para proteger os mais vulneráveis através de medidas para prevenir a insegurança ali-
mentar e controlar os preços da eletricidade e dos combustíveis. As medidas para prote-
ger as famílias mais vulneráveis do aumento da insegurança alimentar incluem (i) programas
de trabalho público para 95 por cento da população em fase de crise ou pior (CH3 e acima);
(ii) controlo dos preços do milho, do trigo e do óleo alimentar; (iii) extensão da cobertura da
pensão social; (iv) extensão das refeições escolares durante todo o Verão; (v) transferências

15
monetárias; e (vi) assistência alimentar aos 5 por cento da população em fase de crise ou pior
(CH3 e acima). As medidas de apoio à produção alimentar incluem (i) subsídios à alimen-
tação animal e (ii) um aumento da capacidade de armazenamento de cereais. O custo destas
medidas é de 34 milhões de dólares ou 1,6% do PIB. As medidas destinadas a controlar o au -
mento dos preços da electricidade e dos combustíveis incluem (i) a redução do IVA sobre a
electricidade de 15 para 8 por cento; (ii) um aumento do subsídio da tarifa social de energia
para a água e a electricidade de 30 para 50 por cento; (iii) e uma suspensão temporária do
mecanismo de indexação automática dos preços dos combustíveis. Embora estas medidas se-
jam importantes para apoiar os meios de subsistência dos agricultores e pescadores rurais, o
teu âmbito de aplicação é mais vasto do que o das medidas destinadas a combater directa-
mente a insegurança alimentar, o que suscita preocupações quanto à tua eficácia e à natureza
regressiva de algumas intervenções. O pacote de medidas de resposta, com um custo orça-
mental estimado em 4,2% do PIB em 2022, ajudou a proteger o consumo privado e evitou
aumentos de preços mais acentuados.

Figure 3: Inflation hit a record high as international fuel and food prices surged

40 Percentage 35 Percentage
Real GDP Growth
Headline Inflation (RHS)
Food and Beverages Inflation (RHS)
20 Energy Inflation (RHS) 19

0 3

-20 -14

-40 -30
2019 2019 2019 2019 2020 2020 2020 2020 2021 2021 2021 2021 2022 2022 2022 2022
-Q1 -Q2 -Q3 -Q4 -Q1 -Q2 -Q3 -Q4 -Q1 -Q2 -Q3 -Q4 -Q1 -Q2 -Q3 -Q4

Source: Author's calculations using authorities’ data and WBG estimations

6. Prevê-se que o crescimento real do PIB atinja 4,4 por cento em 2023 e se mantenha
próximo do potencial a médio prazo. O crescimento será apoiado pelo consumo privado,
pelo investimento no turismo e pela economia azul, e deverá atingir uma média de 4,5 por
cento entre 2023 e 2025. À medida que o Governo reestrutura o funcionamento de várias em-
presas públicas importantes através de parcerias público-privadas (PPP), venda direta e acor-
dos de concessão, e implementa reformas estruturais no âmbito do plano estratégico para o
desenvolvimento sustentável (PEDS 22-26), será mobilizado mais investimento privado para
apoiar o crescimento. A estratégia visa alcançar um crescimento maior e mais sustentado

16
através do aumento da resiliência económica, do aumento da produtividade e da redução da
fragmentação do mercado. A implementação bem sucedida da estratégia permitirá que os
empresários locais beneficiem das repercussões positivas do próspero sector do turismo,
criando assim uma economia mais diversificada e sustentável.

7. Prevê-se que a inflação abrande em 2023, com a moderação do crescimento global, a es-
tabilização dos preços dos produtos de base e a redução dos estrangulamentos da oferta.
Prevê-se que a inflação global se situe em 5,2 por cento. O aumento das taxas de juro de
referência do banco central previsto para 2023, para reduzir o diferencial de taxas de juro em
relação à zona euro e proteger a ligação, ajudará a controlar a inflação. A médio prazo, a
forte âncora nominal proporcionada pela ligação ao euro e o regresso à consolidação orça-
mental manterão a inflação contida, convergindo para 2 por cento no final de 2024.

8. As perspetivas estão sujeitas a riscos substanciais de deterioração decorrentes das in-


certezas devidas à guerra na Ucrânia e a choques climáticos. Um aumento da dimensão
ou da duração do choque dos termos de troca decorrente da guerra na Ucrânia poderá con-
duzir a pressões inflacionistas contínuas e à continuação do apoio político para atenuar o teu
impacto, o que, por vez, poderá deteriorar a sustentabilidade orçamental e da dívida. As
pressões políticas contra a continuação da consolidação orçamental podem também fazer
descarrilar as reformas estruturais planeadas para gerir os riscos orçamentais. Uma fraca
procura externa nos principais mercados turísticos de Cabo Verde poderá enfraquecer o
crescimento económico do país. Além disso, o país continua significativamente exposto a
catástrofes naturais, incluindo as relacionadas com as alterações climáticas. Com o nível mais
elevado de risco de catástrofe climática na África Subsariana e um dos mais elevados a nível
mundial, Cabo Verde já está a sentir os efeitos de eventos geológicos e climáticos que estão a
afectar os meios de subsistência e os principais sectores de crescimento. Prevê-se que estes
eventos se agravem num futuro previsível, colocando riscos significativos à sustentabilidade
do modelo de desenvolvimento.

2. Dinâmica orçamental e da dívida

As medidas tomadas para proteger as pessoas mais vulneráveis do aumento da insegurança alimentar e
para controlar os preços dos combustíveis e da energia representaram um encargo adicional para o
orçamento público, mas o bom desempenho económico e o aumento das receitas fiscais compensaram
esse encargo e conduziram a uma redução do défice orçamental.

9. The overall fiscal deficit narrowed in 2022, supported by the strong economic perfor-
mance and increased fiscal revenues. The impact of the war in Ukraine and the inflationary
crisis continued to negatively affect the country's fiscal position, with total expenditures in-

17
creasing by 5.4 percent compared to 2021. Despite this, fiscal pressures were moderated by
strong revenue collection, under-execution of capital spending, and budget support (Table 1).
The overall fiscal deficit is estimated at 4.1 percent of GDP in 2022, compared to 7.4 percent
in 2021. Spending needs were driven by acquisition of goods and services, social transfers
and debt service, The government has provided direct support and subsidies to mitigate the
impact of rising global food and fuel prices on vulnerable households. However, overall ex-
penditure remained under control as capital spending was lower than budgeted. Revenue per-
formance remains strong due to improved income tax collection and VAT from imports as
the economy recovers and key imports become more expensive. Consequently, the primary
balance improved substantially compared to 2021, from -5.2 percent of GDP to -1.9 percent
of GDP in 2022. Further, budget support of US$53.2 million provided by the World Bank,
the African Development Bank (AfDB) and IMF helped address financing needs.
Table 1: Selected Fiscal Indicators

2019 2020 2021 2022e 2023p 2024p 2025p

Total Revenues 26.8 24.6 22.8 21.6 24.4 24.8 25.2

Tax revenues 19.6 18.1 17.2 18.1 17.8 19.0 19.4

Taxes on income and profit 5.9 5.5 4.7 4.2 4.6 4.7 4.8

Taxes on goods and services 9.7 8.6 8.1 9.5 8.8 9.3 9.6

Taxes on international trade 3.7 3.6 4.0 4.1 4.0 4.6 4.6

Other taxes 0.3 0.4 0.3 0.3 0.3 0.3 0.3

Non-tax revenues 4.3 3.2 3.6 2.6 4.7 4.6 4.7

Grants 2.9 3.2 2.0 0.9 1.9 1.2 1.2

Total Expenditures 28.5 33.6 30.2 25.7 29.0 28.1 27.4

Current expenditures 24.8 30.3 28.0 23.8 24.8 24.3 23.6

Compensation to employees 9.6 12.0 11.4 9.0 9.2 9.2 9.0

Goods and services 3.7 6.1 5.1 4.4 5.8 4.7 4.5

Interest payments 2.3 2.7 2.2 2.2 2.2 2.2 2.2

Subsidies 0.1 0.3 0.4 0.8 0.8 0.7 0.6

Current transfers 2.8 3.6 2.8 2.3 2.5 2.5 2.4

Social benefits 3.7 4.6 4.8 3.7 3.4 3.4 3.4

Other expenses 2.9 1.1 1.3 1.5 1.2 1.5 1.5

Net acquisition of nonfinancial assets 3.6 3.6 2.2 1.9 4.2 3.8 3.8

Primary balance 0.6 -6.4 -5.2 -1.9 -2.4 -1.0 0.0

18
Overall fiscal balance -1.7 -9.0 -7.4 -4.1 -4.6 -3.3 -2.2

Net other liabilities -3.0 -1.2 0.9 -0.1 0.7 -0.1 -0.2

On-lending -0.7 -0.9 -0.6 -0.4 -0.7 -0.2 -0.2

Capitalization 0.1 -0.4 -0.4 -1.1 -0.8 0.0 0.0

Financing needs -4.7 -10.2 -6.5 -4.2 -3.9 -3.4 -2.4

Total financing 4.7 9.6 6.5 4.2 3.9 3.4 2.4

Net domestic financing 1.3 3.0 1.6 2.3 1.6 2.2 0.3

Net external financing 3.4 6.5 4.9 1.9 2.3 1.2 2.1

Net errors and omissions 0.0 -0.6 0.0 0.0 0.0 0.0 0.0

Public debt 108.5 140.8 143.7 120.9 110.7 104.1 98.6

External debt 79.2 101.5 101.9 83.7 79.8 76.4 73.9

Domestic debt 29.3 39.3 41.8 37.1 30.9 27.7 24.7

Source: Ministry of Finance and IMF data, World Bank staff calculations

10. Driven by the strong rebound of the economy in 2022, fiscal revenues increased by 18.3
percent, reaching 22.1 percent of GDP. Tax revenues reached CVE 44 billion (USD 421
million) in 2022, an increase of around 30 percent compared to 2021. Income taxes, personal
and corporate, increased with the phasing out of the COVID-19 measures to protect compa-
nies, jobs, and income still in place in 2021(installment payments on taxes, suspension of co-
ercive collection of taxes, and lay-off scheme). Increased economic activity in 2021 also had
a positive impact on the annual profit tax paid by firms in 2022. Taxes on goods and services
and on international trade increased by 41.9 and 27 percent, respectively, compared to 2021,
reflecting the rebound in economic activity, increase in imports, and increase of import duties
on some products and of the excise tax on tobacco, alcoholic beverages, and vehicles. Non-
tax revenue decreased by 2.2 percent, representing 2.7 percent of GDP, mainly reflecting de-
clines in property income. Grants accounted for 0.9 percent of GDP in 2022, 1 percentage
points lower than in 2021, with the gradual decline of this modality for financing projects and
budget support.

11. Total expenditure increased by 5.4 percent in 2022, reaching 25.7 percent of GDP,
mostly driven by the measures taken to protect the most vulnerable from rising food in -
security and to control fuel and energy prices. The fiscal response package is estimated at
US$84.7 million, which contributed to a 6.6 percent in current spending. Subsidies increased
by about 140 percent, mostly due to the payment of financial compensation to oil companies
and electricity companies as part of policy measures taken to address the escalating interna-
tional prices. The increase in current expenditures also reflects an increase in spending on

19
the acquisition of goods and services under several resumed projects, and on debt interest
payments due to the end of the moratorium period on debt service granted by bilateral credi-
tors. On the contrary, social benefits decreased by 2.8 percent due to the reduction in social
inclusion income payments. Capital expenditure also decreased by 8 percent, with an execu-
tion rate of only 41.2 percent compared to the amended budget, due to the delay of several
public investment projects, mainly investments to improve housing conditions, strengthen in-
frastructure in education, health, and roads. By functional composition, social expenditure
accounted for 48.8 percent of total expenditures, public services for 36 percent, economic af-
fairs for 12 percent and environment for 1.7 percent.

12. The SOE sector continued to require fiscal support while it gradually recovers from the
crisis caused by COVID-19. Fiscal risks coming from the sector further increased in 2022
and challenges remain to be addressed at the policy and institutional level. These risks stem
mostly from the worsening of Cabo Verde Airlines (CVA) operational performance, trigger-
ing increased Government support through direct budget support and loan guarantees in
2020, 2021, and 2022. The authorities had extended loan guarantees amounting to US$35.6
million in 2021 to support financially distressed SOEs, with CVA accounting for almost half
of the loan guarantees (US$20 million). In 2022, additional loan guarantees accounted for
US$46.6 million, driven mostly by ELECTRA, the electricity and water utility, (US$19.5
million) (Figure 4). The stock of total guaranteed debt stood at US$189 million in 2022, rep-
resenting 8 percent of GDP. Capitalization to SOEs accounted for US$18 million in 2022
(US$7.2 million in 2021), with CVA being the largest recipient with US$8.8 million. These
fiscal vulnerabilities may undermine Cabo Verde’s efforts to restore fiscal sustainability and
maintain the debt (as a share of GDP) in a declining trajectory in the medium term.

13. The Government is strongly committed to implement a new SOE reform agenda for
2022-2026 to reduce debt vulnerabilities. This agenda includes various degrees of privati-
zation for 11 SOEs, ranging from full privatization to partial divestments, concessions, and
public private partnerships (PPPs). In July 2022, the Government successfully signed a con-
cession contract with an international private operator (Vinci, France) for the airport public
service to support civil aviation, previously under the Airports and Air Safety Company
(ASA). In addition, the privatization processes of a series of SOEs including ENAPOR (port
management), ELECTRA (electricity and water production and distribution), EMPROFAC
(import and distribution of pharmaceuticals), and INPHARMA (production of pharmaceuti-
cals) have resumed. Taking a realistic approach and focusing on selected SOEs to foster the
most critical structural reforms can be considered in implementing this agenda.

Figure 4: Loan Guarantees to SOEs (millions of USD)

20
Source: Cabo Verde’s Ministry of Finance.

14. A dívida pública diminuiu para 121,2 por cento do PIB em 2022, impulsionada pelo
crescimento do PIB. A dívida pública aumentou acentuadamente nos últimos anos, de 108,5
por cento em 2019 para 143,7 por cento do PIB em 2021 (Figura 5). Grande parte deste au -
mento foi impulsionado pelo colapso do PIB em 2020 (contração de 19,3%), elevados dé-
fices orçamentais para responder aos efeitos da COVID e da guerra na Ucrânia (média de
6,8% do PIB em 2020-22) e garantias diretas e re-empréstimos a algumas empresas públicas,
nomeadamente a Cabo Verde Airlines e a ELECTRA, a empresa de serviços públicos de
eletricidade e água. A dívida externa, que representa 84% do PIB em 2022, é maioritaria-
mente concessional, com prazos de vencimento longos e taxas de juro baixas. A dívida in-
terna aumentou acentuadamente após o choque da COVID-19 e representa actualmente quase
40% do PIB. Os indicadores de liquidez, embora não sejam terríveis, uma vez que a maior
parte da dívida multilateral é concessional, pioraram: o serviço da dívida absorveu 49,7 por
cento das receitas orçamentais em 2021 e estima-se que seja de quase 50,2 por cento em
2022. À luz destas tendências de agravamento da dívida e da elevada vulnerabilidade do país
a choques externos, reduzir o apoio direto e as garantias de empréstimo às empresas públicas
e continuar a reforçar a gestão da dívida e a reduzir o endividamento interno são ações funda-
mentais para reduzir as vulnerabilidades da dívida.

Figure 5: Public Debt (percent of GDP)

21
160.0
79.4 91.3 102.5115.9126.6128.4127.2114.6108.5140.8143.7120.9
72.2
120.0 63.1

80.0

40.0

0.0
2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016 2017 2018 2019 2020 2021 2022
External Domestic Series3 e

Source: Ministry of Finance, 2022.

15. A mais recente avaliação conjunta do Banco Mundial e do FMI sobre a sustentabilidade
da dívida (ASD), publicada em Junho de 2022, concluiu que a dívida pública é susten-
tável, mas o risco de perturbação global da dívida é elevado, enquanto o risco de per-
turbação da dívida externa é moderado. A cobertura da dívida da ASD inclui o governo
central, os fundos extraorçamentais, o banco central e as garantias, em conformidade com as
contas orçamentais. Em comparação com a anterior ASD conjunta do Banco Mundial e do
FMI, publicada em outubro de 2020, o risco de perturbação da dívida externa foi atualizado
de elevado para moderado. O principal fator desta melhoria é a reavaliação do PIB, que mel-
horou mecanicamente os indicadores da dívida. O rácio entre o valor atual (PV) da dívida
externa pública e com garantia pública (PPG) e o PIB só ultrapassa o seu limiar em 2022, na
projeção de referência, e de forma prolongada nos cenários de teste de esforço. A infracção
no cenário de referência tem uma duração mais curta do que na última ASD, devido à re-
dução do PIB. Prevê-se que o rácio VA da dívida pública total em relação ao PIB seja Ao
mesmo tempo, os indicadores de liquidez (rácios serviço da dívida/receitas e exportações)
permanecem firmemente abaixo dos respectivos limiares, refletindo a elevada natureza con-
cessional da dívida externa. As perspectivas da dívida externa e global são avaliadas como
sustentáveis e são apoiadas pela continuação da recuperação da atividade económica a médio
prazo e pelo regresso à trajetória de consolidação orçamental anterior à pandemia.
16. As autoridades estão empenhadas em regressar à consolidação orçamental a médio
prazo e em colocar o rácio da dívida em relação ao PIB numa tendência decisiva de de-
scida. O Orçamento do Estado para 2023 assume uma estratégia de redução gradual do dé-
fice para níveis sustentáveis até 2025 através de 5 áreas de intervenção: (i) aumento dos im-
postos cobrados através da melhoria da eficiência do sistema fiscal e alargamento da base
tributária em 16 por cento; (ii) racionalização e contenção de custos através da redução das
despesas com pessoal para níveis inferiores a 11 por cento do PIB, investimento no digital
para reduzir a procura de recursos e racionalização da frota de veículos; (iii) novas modali-
dades de financiamento dos investimentos em parceria com o setor privado e com garantias

22
do Tesouro; (iv) reestruturação do setor das empresas públicas através de PPP, privatizações
e concessões; e (v) novo modelo de gestão da dívida com conversão de parte da dívida ex-
terna em capital natural e climático.

17. O Governo pretende manter o forte nível de receitas totais a médio prazo, com um au-
mento progressivo das receitas fiscais em vez de subsídios. Prevê-se que a receita fiscal
aumente cerca de 20 por cento relativamente a 2022, representando 24,4 por cento do PIB.
Esta projeção decorre do aumento da cobrança de impostos, resultante (i) do dinamismo
económico (crescimento do PIB de 4. 4 por cento); (ii) da melhoria da eficiência da adminis-
tração fiscal no combate à fraude e evasão fiscal; (iii) da racionalização dos incentivos fis-
cais, com destaque para a eliminação progressiva da isenção total dos direitos de importação;
(iv) do reforço da tributação do tabaco e do álcool, (v) do aumento da taxa turística sobre a
estadia diária em hotel para 276 CVE (+56 CVE) (vi) do alargamento da base tributária,
nomeadamente no comércio electrónico; e (vii) da provisão para o encontro de contas no âm-
bito das dívidas fiscais. Prevê-se ainda o aumento da cobrança de receitas de institutos, fun-
dos e serviços autónomos, bem como de receitas patrimoniais decorrentes da conclusão de
processos de concessão e privatização. A adopção da Pauta Externa Comum da CEDEAO,
que foi adiada para 2023 devido ao impacto persistente da crise da COVID-19, deverá tam-
bém aumentar as receitas fiscais comerciais a médio prazo. Estas medidas conduzirão a um
aumento das receitas fiscais de 18,1 por cento do PIB em 2022 para 19,4 por cento em 2025.

18. A despesa total permanecerá elevada em 2023, em 29% do PIB, e diminuirá gradual-
mente com a eliminação progressiva das medidas excepcionais para conter o impacto da
guerra na Ucrânia e uma maior eficiência das despesas. Prevê-se que as despesas cor-
rentes aumentem de 23,8 por cento do PIB em 2022 para 24,8 por cento em 2023. Este
crescimento resulta (i) da atualização da pensão social e do aumento do salário mínimo para
14.000 escudos, com um impacto esperado de 0. 06 por cento do PIB; (ii) do desembolso de
empréstimos para financiamento de projectos, reprogramado para 2023; (iii) do aumento dos
subsídios externos e (iv) do aumento de algumas despesas obrigatórias decorrentes, principal-
mente: (a) das despesas com encargos da dívida; (b) dos restantes três meses das medidas de
mitigação adoptadas em 2022, em resposta ao aumento dos preços dos alimentos e da electri-
cidade; (c) do alargamento do número de beneficiários das pensões não contributivas e das
atualizações salariais dos funcionários públicos e pensionistas. A médio prazo, a diminuição
das despesas com bens e serviços reduzirá gradualmente as despesas correntes. Prevê-se que
as despesas de capital atinjam 4,2 por cento do PIB em 2023 e se aproximem dos 3,8 por
cento em 2025. O total das despesas representará cerca de 27,4 por cento do PIB em 2025.

19. O défice orçamental global permanecerá relativamente estável em 2022, com 4,6% do
PIB, diminuindo para 2,2% do PIB em 2025 devido ao aumento das receitas fiscais. O
governo planeia contratar 11 mil milhões de escudos para cobrir as necessidades de financia-

23
mento do orçamento (défice orçamental e amortização da dívida). Deste montante, prevê-se
que cerca de 40% sejam financiados com dívida externa e 60% com obrigações do tesouro
emitidas no mercado interno. O financiamento externo virá de credores multilaterais e bilat-
erais em condições concessionais. Os empréstimos internos serão efetuados através da emis-
são de obrigações do tesouro de curto, médio e longo prazo. Prevê-se uma redução do rácio
dívida/PIB para 110,7% em 2023, com o início de uma consolidação orçamental orientada
para as receitas, que reduzirá o défice orçamental e o aumento contínuo do PIB. Os riscos
orçamentais continuarão a ser elevados, uma vez que o défice orçamental está exposto a pas-
sivos contingentes em sectores particularmente vulneráveis a choques externos.

3. Setor Externo

A forte retoma das chegadas de turistas contribuiu para reduzir a CAD, apesar do aumento das
importações de mercadorias, impulsionado pela dinâmica económica e pela inflação. O IDE e os
empréstimos em condições favoráveis continuaram a ser as principais fontes de financiamento da CAD.

20. O défice da balança de transações correntes diminuiu devido à forte recuperação das
exportações líquidas de serviços, que compensou o aumento das importações líquidas de
bens. As exportações de turismo, que representam cerca de 65% das exportações de serviços,
lideraram o aumento do total das exportações. As receitas do turismo aumentaram mais de
200 por cento em 2022, representando 16,4 por cento do PIB (6,3 por cento em 2021), impul-
sionadas pela forte recuperação das chegadas de turistas, que ultrapassaram os níveis pré-
pandémicos (Caixa 1). As exportações de bens também tiveram um bom desempenho devido
ao aumento significativo das reexportações de combustíveis e géneros alimentícios nos por-
tos e aeroportos. O forte aumento das remessas, com a retoma económica nas economias
avançadas, também apoiou a recuperação da CAD. As remessas representaram 12% do PIB e
continuaram a ser uma importante fonte de divisas. Para atenuar a evolução positiva da CAD,
as importações de bens e serviços aumentaram cerca de 32%, refletindo a dinâmica crescente
das atividades económicas e o impacto da inflação.
Caixa 1: Recuperação do setor do turismo

Cabo Verde recebeu mais de 835.000 turistas em 2022, excedendo ligeiramente os níveis pré-pandémicos.
Isto corresponde a um aumento de quase 400 por cento em relação aos níveis de 2021 e excede o número de turis -
tas recebidos em 2019 em 16.637 (+2 por cento). O quarto trimestre de 2022, que é a época alta no país, registou o
maior número de turistas, quase 285.000. Mais de 80 por cento da procura turística continua concentrada nos dois
destinos de sol e praia bem estabelecidos das ilhas do Sal e da Boa Vista. O mercado de origem também está con -
centrado, sendo o Reino Unido a maior fonte de turistas, representando cerca de 30 por cento do total, enquanto a
Alemanha, os Países Baixos e Portugal, em conjunto, também representam 30 por cento do total de turistas. O se-
tor do turismo representa cerca de 25% do PIB e 40% da atividade económica global e é a principal fonte de em -
prego. Os impostos pagos pelos turistas atingiram 7 milhões de dólares em 2022 (0,3 por cento do PIB), 55 por
cento acima da estimativa do governo para o ano e cinco vezes mais do que em 2021. A contribuição turística foi
introduzida pelo governo em Maio de 2013, com todos os hotéis e unidades similares obrigados a cobrar dois eu -
ros por cada dormida até dez dias a cada turista com mais de 16 anos.

24
Figura B3.1: Receitas do Turismo Figura B3.2: Chegadas de turistas e taxa de
ocupação

So
urce: Cabo Verde Central Bank, 2022.
Source: Cabo Verde National Institute of Statistics, 2022.

As autoridades prosseguiram as reformas necessárias para relançar o setor do turismo após a pandemia de
COVID-19. As autoridades adoptaram medidas de resposta imediata para apoiar as MPME em toda a economia e
anunciaram um plano de recuperação do turismo para apoiar a revitalização da economia a curto prazo. O plano
baseava-se em quatro pilares. Em primeiro lugar, a segurança sanitária, que tinha como objetivo restaurar a confi-
ança dos turistas e estimular a procura através da implementação de programas de formação e de certificação san -
itária para os operadores turísticos. Em segundo lugar, a diversificação do turismo, que pretendia posicionar outras
atrações turísticas a nível nacional, continuando a promover os destinos de sol e praia bem estabelecidos das ilhas
do Sal e da Boa Vista. Em terceiro lugar, a cultura, que se centrou na reabilitação do património cultural. Por úl -
timo, o quarto pilar é o reforço dos mecanismos de apoio às empresas e aos trabalhadores do setor do turismo para
aumentar a resiliência à crise. A estratégia nacional de desenvolvimento económico para 2022-2026 (Plano Es-
tratégico de Desenvolvimento Sustentável - PEDS), em preparação, prevê dar prioridade a medidas destinadas a
acelerar o crescimento sustentável do turismo, diversificando-o em mais nichos e ilhas e estabelecendo uma mel -
hor ligação com o património natural e cultural do país.

21. A CAD foi financiada principalmente pelo IDE e por empréstimos concessionais em
2022. A conta financeira contraiu-se em cerca de 67%, refletindo a continuação da retoma
dos projetos de IDE planeados. O IDE aumentou cerca de 35 por cento em 2022, represen-
tando 4,7 por cento do PIB (4,4 por cento em 2021). Cerca de 84% do IDE foi direcionado
para o setor do turismo e do imobiliário turístico. As reservas internacionais brutas aumen-
taram 15 milhões de EUR, atingindo aproximadamente 626 milhões de EUR e cobrindo
cerca de 6 meses de importações, muito acima do nível de 3,6 meses recomendado pela
Avaliação da Estabilidade Externa (AEE) de 2019 do FMI. Como tal, as reservas ajudaram a
apoiar a política monetária acomodatícia em vigor desde a crise da COVID-19.

22. Embora as exportações de serviços continuem a expandir-se em 2023, prevê-se que a


CAD aumente para 4,6% do PIB, impulsionada pelo aumento das importações, em es-
pecial para o investimento privado. Prevê-se que a CAD diminua para 2,9 por cento do
PIB em 2025, apoiada pelo aumento das receitas do turismo e pela estabilização dos preços
das importações para consumo. O crescimento estável das remessas, que reflete a melhoria

25
das condições no mercado de trabalho europeu, também apoiará a descida da CAD. Prevê-se
que o aumento dos fluxos de amortização da dívida pública aumente as necessidades de fi-
nanciamento externo, que deverão ser satisfeitas principalmente através de empréstimos ofi-
ciais e do IDE. O crescimento robusto das exportações e o aumento das remessas, juntamente
com o aumento dos fluxos de IDE, deverão manter as reservas internacionais a um nível ele-
vado de cerca de 6 meses de importações previstas a médio prazo.

4. Politica Monetária

23. A política monetária continuou a equilibrar a necessidade de apoiar a recuperação


económica com a importância de proteger a indexação. O Banco Central manteve as me-
didas monetárias e financeiras acomodatícias em vigor desde 2020, que ajudaram a apoiar o
crédito e forneceram liquidez às famílias e às empresas. A redução das taxas de juro de refer-
ência do Banco Central para níveis muito baixos, o alívio temporário das regras de capital e
operacionais que os bancos são obrigados a seguir e uma linha especial sem precedentes de
grandes empréstimos a custos excepcionalmente baixos para apoiar os bancos são algumas
das medidas tomadas para ajudar o país a reagir aos efeitos da crise da COVID-19 no sector
bancário e financeiro. No entanto, o Banco Central acompanhou de perto a evolução das
reservas e da inflação e manteve-se pronto a ajustar as definições de política económica, se
necessário.

24. O sistema financeiro permaneceu resiliente em 2022, apoiado pelas medidas de política
monetária adotadas pelo Banco Central para manter a liquidez do mercado. Os indi-
cadores de solidez financeira do setor bancário evoluíram positivamente em 2022. A relação
entre o capital regulamentar e os ativos ponderados pelo risco aumentou de 21,4 % em 2021
para 22,3 % no final de dezembro de 2022, muito acima do mínimo regulamentar de 12 %. A
rendibilidade dos ativos situou-se em 1,7 por cento (1,4 por cento em 2021), enquanto a
rendibilidade dos capitais próprios foi de 17,4 por cento (15 por cento em 2021). O setor
bancário manteve-se líquido e o crédito à economia aumentou 5,3% (em termos homólogos)
no final de dezembro de 2022, apoiado por linhas de crédito e moratórias sobre os pagamen-
tos de empréstimos concedidos em resposta à crise da COVID-19 que foram prorrogadas até
setembro de 2022. A liquidez no setor financeiro torna-o mais bem preparado para resistir
aos efeitos de um possível aumento dos empréstimos não produtivos com o fim das
moratórias.

25. O setor financeiro continua a apresentar fragilidades estruturais e aversão ao risco dev-
ido aos elevados níveis de empréstimos não produtivos (NPL). Os elevados níveis de liq-
uidez refletem a aversão ao risco num ambiente de NPL persistentemente elevados (embora
tenha diminuído ligeiramente de 8,1 por cento em 2021 para 7,8 por cento em 2022), bem
como oportunidades de investimento limitadas que cumprem padrões de crédito aceitáveis. O

26
setor debate-se com uma baixa qualidade dos ativos e, apesar de um rácio de adequação dos
fundos próprios relativamente forte, os bancos em Cabo Verde são potencialmente vul-
neráveis a rácios elevados de NPL. Os elevados níveis de endividamento das empresas públi-
cas, das sociedades não financeiras e das famílias agravam o problema. O setor continua alta-
mente concentrado com dois (dos sete activos) bancos comerciais que detêm 64 por cento e
68 por cento das quotas de mercado de crédito e depósitos.

Figura 6: Evolução económica recente

Source: Author's calculations using authorities’ data

Figura 7: Evolução do setor externo

Source: Author's calculations using authorities’ data.

27
Figura 8: Evolução do setor fiscal

Source: Author's calculations using authorities’ data.

28
Figura 9: Evolução do setor monetário

Source: Author's calculations using authorities’ data.

5. Pobreza

A redução da pobreza em 2022 foi impulsionada pelo crescimento económico, conduzido pela criação de
emprego, especialmente no setor do turismo. Ao mesmo tempo, a redução da pobreza foi atenuada pelo
aumento da inflação em 2022, especialmente devido ao aumento dos preços dos alimentos
Figura 10: A redução da pobreza em 2022 foi impulsionada pela criação de emprego, especialmente
no setor do turismo

Fonte: Cálculo do autor com base no IDRF2015 (Inquérito às Despesas e Receitas Familiares, 2015). Pobreza estimada em
2015. Projeções de pobreza de 2016 a 2025.

Impacto do crescimento do PIB setorial nos rendimentos das famílias

26. Até à pandemia de Covid-19 em 2020, os esforços de redução da pobreza em Cabo


Verde colocavam o país entre os campeões da África Subsariana em termos de melho-
rias nas condições de vida. As projeções mostram que a taxa de pobreza diminuiu quase 3,2
pontos percentuais de 2015 a 2019, caindo de 19,3 para 16,1 por cento (usando os 3,65
dólares por dia-PPP em 2017). Além disso, entre 2001 e 2015, a desigualdade (medida pelo
Índice de Gini) caiu de 52,5 para 42,0. Ao mesmo tempo, o modelo de desenvolvimento de
Cabo Verde, baseado no turismo e no investimento direto estrangeiro (IDE), tem mostrado
sinais de cansaço desde a crise financeira global de 2008. O choque resultante da COVID-19
produziu a maior contração económica de que há registo (14,8 por cento) em 2020 e expôs as
vulnerabilidades económicas do país, perturbando os setores dos serviços e da hotelaria e
provocando um aumento da pobreza de 5,4 pontos percentuais (para atingir 21,5 por cento
em 2020).

27. A redução da pobreza em 2022 foi impulsionada pelo crescimento económico, apesar do
pico da inflação, que levou à criação de emprego, especialmente no turismo, devido à
normalização dos fluxos turísticos. Após o declínio relacionado com a Covid-19, o cresci-

29
mento económico recuperou em 2021, quando o PIB do país aumentou 7,1 por cento, e con-
tinuou a crescer em 2022, quando o crescimento atingiu 15 por cento, ultrapassando o nível
do PIB pré-pandemia de 2019. Prevê-se que a taxa de pobreza tenha caído de 20,1 por cento
em 2021 para 19,3 por cento em 2022 (utilizando 3,65 dólares por dia-2017 PPP), atingindo
os níveis de pobreza de 2015. O setor dos serviços cresceu 20,9 por cento em termos reais em
2022, seguido do setor da indústria transformadora com 5,3 por cento, enquanto a agricultura
contraiu mais de 10 por cento. É importante considerar as diferenças de crescimento secto-
rial, uma vez que a maioria da população pobre trabalha no sector dos serviços. Em Cabo
Verde, 62 por cento dos adultos ativos em agregados familiares pobres trabalham em
serviços, e os agregados familiares pobres obtêm 54 por cento do seu rendimento do setor
dos serviços. Além disso, os agregados familiares em melhor situação são mais propensos a
trabalhar em serviços (sugerindo que uma parte significativa dos rendimentos dos agregados
familiares em Cabo Verde está associada a actividades no sector do turismo), e um terço dos
agregados familiares mais pobres está no setor agrícola, mas obtém menos de um quarto do
seu rendimento de atividades agrícolas (Figura 11).
Figure 11: Share of Employment and Income for each sector by welfare decile

Fonte: Cálculo do autor com base no IDRF2015

Impacto da inflação elevada no consumo real das famílias

28. A redução da pobreza em Cabo Verde foi atenuada pelo aumento da inflação em 2022,
especialmente devido ao aumento dos preços dos alimentos. Uma característica notável da
evolução macroeconómica recente em Cabo Verde tem sido a inflação elevada, impulsionada
principalmente pela inflação dos preços dos alimentos. A inflação global atingiu 7,9 por
cento (y/y) em dezembro de 2022, após o surgimento de pressões inflacionistas em 2021, ali-
mentadas pelos elevados preços internacionais do petróleo e dos alimentos e pelas pertur-

30
bações na cadeia de abastecimento global devido à guerra na Ucrânia.

29. A inflação elevada dos preços dos alimentos afeta desproporcionalmente as famílias que
gastam mais em alimentos, especificamente as famílias mais pobres. Em Cabo Verde, as
famílias mais pobres gastam uma percentagem ligeiramente superior do seu rendimento em
alimentos. Em 2022, a inflação alimentar atingiu um pico de 15,7 por cento, enquanto a in-
flação da energia e dos transportes aumentou para 10,1 e 11,1 por cento, respectivamente. Es-
tima-se que, sem o aumento dos preços dos alimentos, a pobreza (3,65 dólares por dia PPC
2017) teria sido quase 3 pontos percentuais inferior em 2022, e próxima do nível pré-
pandémico (16,1%) a partir de 2019. Além disso, a inflação medida pelo IPC em 2022 foi
mais elevada do que o deflator do PIB (7,9 por cento em comparação com 5,1 por cento), o
que significa que o poder de compra das famílias ficou aquém do que seria sugerido pelo
crescimento do PIB real. A Figura 6 mostra a distribuição das taxas de inflação específicas
das famílias em comparação com o IPC oficial e o deflator do PIB para cada ano.

Figura 12: Repartição do consumo e das taxas de inflação efetivas medianas por decil

Source: IDRF2015. World Bank, Macroeconomics and Investment (MTI) Global Practice (2023). Projections start in 2023.

31
Figura 13: Repartição do consumo e das taxas de inflação efetivas medianas por decil

Fonte: Banco Mundial, Prática Global de Macroeconomia e Investimento (MTI) (2023). As projeções começam em 2023.
Nota: A figura mostra um gráfico de caixa de bigodes que apresenta o mínimo, o primeiro quartil, a mediana, o terceiro
quartil e o máximo dos valores da inflação enfrentados pelas diferentes famílias durante o período de 2019-2025. Além disso,
os dois pontos mostram o valor oficial do IPC (laranja), bem como o deflator do PIB (verde) para cada ano.F

O efeito combinado do crescimento e da inflação

30. Embora se preveja que a pobreza diminua no período 2024-2025, o crescimento não de-
verá ser particularmente favorável aos pobres. Prevê-se que a pobreza, com base na linha
de pobreza de rendimento médio-baixo de 3,65 dólares por dia PPC2017, permaneça acima
dos 19% em 2023 (aumentando 0,1 pontos percentuais a partir de 2022 para 19,4%) devido
aos preços mais elevados, especialmente dos produtos alimentares (a inflação dos alimentos
está projetada em 6%, enquanto a inflação total deverá ser de 4,5%). Posteriormente, prevê-
se que a taxa de pobreza desça para 18,7 por cento em 2024 e atinja 17,5 por cento em 2025,
apoiada pelo crescimento económico e pela estabilização da inflação. O impacto combinado
das estimativas a nível dos agregados familiares do crescimento nominal per capita (com
base na distribuição sectorial do rendimento) e da inflação (com base na percentagem de ali -
mentos no consumo) permite projeções do impacto no consumo real per capita em toda a dis-
tribuição. Os agregados familiares nos decis mais pobres registam taxas de crescimento
marginalmente positivas durante todo o período de 2023-2025, mas prevê-se que o cresci-
mento seja quase nulo em toda a distribuição. Além disso, as famílias imediatamente abaixo
do limiar de pobreza registam algumas das taxas de crescimento mais baixas em 2024 e
2025.

Figura 14: A inflação registada pelas famílias difere significativamente do IPC oficial e do PIB

Fonte: Projecções preparadas pela Poverty and Equity Global Practice com base no IDRF2015.

32
Parte II - Choques climáticos e sustentabilidade orçamental:
impactos potenciais e opções políticas

31. Cabo Verde é repetidamente afetado por choques geológicos e climáticos e as alterações
climáticas trarão ameaças sem precedentes ao arquipélago. Devido à sua localização e
geografia, o país está exposto a uma vasta gama de riscos naturais, incluindo erupções vul-
cânicas, secas, tempestades tropicais, deslizamentos de terras e inundações. O arquipélago é
também caracterizado por um conjunto de factores estruturais, como a rápida migração rural-
urbana e inter-ilhas, a contínua degradação dos solos, a pobreza persistente e o elevado endi-
vidamento, que, em conjunto, aumentam a tua vulnerabilidade a estes fenómenos naturais.
No futuro, à medida que as alterações climáticas se forem revelando, prevê-se que as temper-
aturas aumentem gradualmente e que os padrões de precipitação apresentem padrões mais er-
ráticos (ou seja, níveis agregados de precipitação mais baixos, mas fenómenos extremos de
precipitação mais frequentes). Estas alterações poderão intensificar as secas e provocar inun-
dações mais graves. A mais longo prazo, a subida do nível do mar e o aquecimento dos
oceanos poderão provocar a erosão do capital natural do arquipélago e afectar ainda mais os
sectores do turismo e da economia azul, que são os principais motores de crescimento.

32. Os riscos climáticos e de catástrofes podem comprometer as perspectivas de cresci-


mento futuro do país e ameaçar a sustentabilidade da dívida. As perdas médias anuais
decorrentes de vários riscos foram estimadas em quase 1% do PIB e as raras inundações
catastróficas podem ter graves efeitos negativos no crescimento. Do ponto de vista orçamen-
tal, o Governo tem tradicionalmente mostrado uma margem de manobra orçamental limitada
para mobilizar recursos na sequência de uma catástrofe, o que tem deixado a maior parte das
necessidades pós-catástrofe por satisfazer (ver CEM 2023 para uma análise pormenorizada).
Esta limitada resiliência orçamental implica uma utilização restrita de políticas orçamentais
anticíclicas para responder às catástrofes e dificulta a capacidade do Governo para promover
uma recuperação rápida e sólida, o que, em contrapartida, pode potencialmente amplificar os
impactos negativos do choque inicial.

33. Para entender melhor como os actuais esforços de consolidação fiscal podem ser afeta-
dos por eventos naturais adversos, este capítulo "testa o stress" da análise da sus-
tentabilidade da dívida com diferentes cenários de cheias. A nossa abordagem utiliza
primeiro a componente de cheias do Perfil de Risco de Desastres desenvolvido para Cabo
Verde, que determina os danos potenciais aos ativos físicos que as cheias de diferentes inten-
sidades e frequências poderiam gerar em Cabo Verde. Isso permite-nos fornecer informações
únicas sobre eventos extremos de inundação, que se espera que se tornem mais frequentes à
medida que o clima muda. Com base nessas potenciais perdas de capital, usamos então uma
função de produção tradicional Cobb-Douglas para derivar os potenciais impactos de cresci-

33
mento associados a cada cenário de inundação. Na segunda parte deste capítulo, estas estima-
tivas são incorporadas na Análise de Sustentabilidade da Dívida (ASD) do FMI-Banco
Mundial para explorar a forma como um choque exógeno no ano de 2023 afecta a sus-
tentabilidade fiscal e da dívida a médio prazo até 2042. Para tal, consideramos a forma como
os choques afectam a trajetória da dívida em relação ao PIB em relação aos "limiares de ca-
pacidade de absorção da dívida" indicativos. Por fim, é explorado um cenário de elevada re-
siliência orçamental para avaliar de que forma a política orçamental pode ajudar a atenuar os
impactos de inundações extremas.

1. Os impactos económicos de eventos naturais adversos em Cabo Verde

34. No período 2010-2020, as perdas registadas devido a catástrofes e choques relacionados


com o clima têm registado uma tendência ascendente, com uma média de 0,25 por cento
do PIB. Sob os efeitos combinados de uma expansão constante de cidades e vilas em áreas
propensas a inundações e eventos extremos de precipitação mais frequentes, foram registados
impactos crescentes de inundações: em São Nicolau (2009), Boavista (2012), São Miguel
(2013, com danos estimados em 2,6 milhões de dólares) e Santo Antão (2016, com danos es-
timados em 7 milhões de dólares). Em 2015, o furacão Fred, o primeiro furacão registado so -
bre Cabo Verde desde 1892, causou danos estimados em 2,5 milhões de dólares (Jenkins et
al., 2017). Da mesma forma, os baixos níveis de precipitação em 2017 levaram a um grande
evento de seca que afectou até 70.000 pessoas, de acordo com as estimativas do Governo.
Eventualmente, a erupção vulcânica em 2014-15 no Fogo desencadeou o maior nível de per-
das directas e indiretas, com um impacto global estimado em US$ 28 milhões (PDNA, 2015).

Figura 15: Impactos económicos de eventos naturais adversos em Cabo Verde

Durante o período de 2010-2020, as perdas re- ... em média, a sua ocorrência está associada a
sultantes de fenómenos naturais adversos foram, uma redução do crescimento no ano do impacto
em média, de 0,25 por cento do PIB por ano...

Fonte: Perdas compiladas a partir de várias fontes (CATDAT, EM-DAT, PDNA e Monteiro et al., 2013).

34
Nota: Na figura da direita, "Antes" (depois) refere-se à média de 3 anos antes (depois) do registo de uma catástrofe ou de
um choque relacionado com o clima. Esta figura é calculada para o período 1980-2020, com um total de 18 anos de
"choques".

35. Para além deste impacto direto, os fenómenos naturais adversos também provocaram
perdas indiretas e perturbações económicas, tendo sido associados a reduções das taxas
de crescimento do PIB. A análise de eventos para o período 1980-2020 aponta para um
efeito negativo no crescimento quando uma catástrofe atinge o país. Este impacto foi de 1
ponto percentual (p.p.), em média, no ano do choque. Curiosamente, as taxas de crescimento
tendem a regressar à tendência anterior à catástrofe nos três anos que se seguem ao choque,
mas nenhum "efeito de ricochete" parece materializar-se. A análise econométrica realizada
no âmbito do Memorando Económico de Cabo Verde também evidenciou que as secas têm
um impato negativo nas taxas de crescimento da produção agrícola, enquanto os eventos ex-
tremos de precipitação reduzem significativamente a produção não agrícola. Em conjunto,
estas conclusões revelam a elevada sensibilidade do modelo de crescimento cabo-verdiano às
condições climáticas, com impactos potencialmente agravados à medida que as alterações
climáticas se desenrolam.

36. Embora úteis, os dados históricos apresentados acima são insuficientes para informar
sobre a magnitude das perdas potenciais de eventos naturais adversos. À medida que
Cabo Verde cresce a sua economia e expande as suas cidades, o país acumula mais ativos
físicos e produtivos e o seu nível de vulnerabilidade a eventos naturais adversos varia. Se os
novos ativos estiverem localizados em áreas propensas a riscos, eles aumentam a exposição
do país, configurando um cenário de perdas potenciais que é diferente do padrão histórico.
Além disso, dada a disponibilidade restrita de dados, as perdas históricas não captam todo o
espectro de condições de risco e subestimam os impactos de grandes eventos catastróficos.
Para obter uma noção mais sólida dos danos que os fenómenos naturais adversos podem
gerar, a análise histórica deve ser complementada com uma avaliação probabilística dos
riscos. Os modelos de risco probabilísticos foram originalmente desenvolvidos pelo sector in-
ternacional dos (re)seguros e constituem a base para a elaboração de um perfil de risco. Os
modelos de risco baseiam-se em estudos científicos e de engenharia dos perigos naturais e
dos seus impactos em bens específicos, como edifícios e infra-estruturas. Integram dados de
alta resolução sobre a localização e a qualidade das propriedades para estimar as perdas po-
tenciais de capital físico para eventos com várias probabilidades (ver anexo 1 para uma de-
scrição pormenorizada).

37. As Perdas Médias Anuais (AAL) decorrentes de múltiplos perigos foram estimadas em
quase 1% do PIB (US$ 18,2 milhões). O Perfil de Risco de Catástrofes quantifica as poten-
ciais perdas diretas que as cheias, secas, erupções vulcânicas e terramotos podem causar aos
bens físicos. As perdas estimadas são principalmente causadas por riscos relacionados com
inundações, que representam quase 70 por cento do AAL agregado (ver tabela 1). É de
salientar que estas estimativas se baseiam nos padrões climáticos atuais e não têm em conta
os potenciais impactos decorrentes das alterações climáticas. É importante notar que as AAL
do perfil de risco são cerca de cinco vezes mais importantes do que as perdas médias anuais

35
históricas, salientando a urgência de reforçar a resiliência do crescimento para limitar as per-
das futuras.

Tabela 2: Principais impactos das catástrofes e dos riscos climáticos em Cabo Verde

Perda anual média (AAL)


Tipo de perigo
em milhões de USD Em percentagem do PIB
Cheia 13.4 M 0.68%
Sismo 1.0 M 0.05%
Erupção Vulcanica 1.2 M 0.06%
Seca 2.6 M 0.13%
Total 18.2 M 0.93%
Notas: (i) Os valores são em USD de 2018. (ii) A perda média anual (AAL) é a perda esperada por ano, calculada em mé-
dia ao longo de muitos anos. (iii) O risco é avaliado apenas para erupções vulcânicas no Fogo, com a AAL calculada como
os danos e perdas incorridos desde a erupção de 2015 - actualizada para 2018 - dividida pela frequência das erupções. (iv)
As estimativas de AAL para secas correspondem a perdas de rendimento agrícola devido a um episódio de seca em Cabo
Verde.
Fonte: Resultados do Perfil de Risco de Desastres de Cabo Verde revisto (2020) para inundações.

38. Dada a predominância das perdas relacionadas com as inundações e a intensificação


prevista dos fenómenos extremos de precipitação com as alterações climáticas, o resto
da presente avaliação centra-se nos testes de resistência da sustentabilidade da dívida
face ao risco de inundações. Os testes de esforço centram-se geralmente em perdas agudas a
curto prazo que poderiam desencadear um risco sistémico. Como tal, aproveitando o perfil de
risco de inundações desenvolvido para Cabo Verde, o teste de stress proposto inclui eventos
extremos de inundações, ou seja, eventos de risco de cauda. O perfil de risco indica, por ex -
emplo, que Santiago ou São Vicente enfrentam, cada um, uma probabilidade anual de 1 por
cento de perdas superiores a US$37 milhões (equivalente a 1,88 por cento do PIB). Estes
eventos extremos estão a tornar-se mais frequentes num clima em mudança e as suas conse-
quências económicas devem ser cuidadosamente analisadas para identificar opções políticas
relevantes que possam melhorar a preparação e a capacidade do país para lidar com estes
choques.

2. Calibração dos efeitos macro-orçamentais das inundações em Cabo Verde

39. O fato de um desastre se tornar uma ameaça significativa à sustentabilidade da dívida


não depende apenas da magnitude inicial das perdas para os ativos físicos, mas também
das características estruturais e das condições macro-fiscais mais amplas da economia
atingida. Para derivar trajetórias macro-fiscais de médio prazo dos danos potenciais aos

36
ativos físicos apresentados acima, calibramos três dimensões críticas para as características
da economia cabo-verdiana: (i) seguindo o quadro proposto por Hallegatte et al. (2022a e
2022b), estimamos primeiro a magnitude dos potenciais impactos no crescimento decorrentes
da destruição de capital; (ii) avaliamos então a carga fiscal e a parte dos passivos contin-
gentes que o Governo é capaz de financiar na sequência de uma inundação; e (iii) derivamos
a dimensão temporal e os efeitos dinâmicos do crescimento que podem ocorrer após uma in-
undação.

40. Para explicar plenamente os impactos macro-económicos das grandes inundações, é


essencial ir além dos danos aos ativos físicos e considerar os potenciais efeitos de ampli-
ficação. A literatura empírica e teórica tem destacado a forma como as catástrofes reduzem
tanto o stock de capital como a produtividade total dos fatores (PTF, ver Hallegatte e Vogt-
Schilb, 2019; Dieppe et al., 2020). Para traduzir os danos aos ativos físicos do perfil de risco
de inundação em efeitos de crescimento, utilizamos, portanto, uma função Cobb-Douglas
padrão e assumimos que os ativos destruídos tornam o capital restante menos produtivo. Por
outras palavras, as catástrofes não só reduzem o stock total de capital, mas também a sua pro-
dutividade. Este efeito é perfeitamente ilustrado pelo exemplo dos danos nas infra-estruturas
de transportes: se os aeroportos forem danificados e as pontes arrastadas pelas chuvas torren-
ciais, os impactos no crescimento serão mais graves do que o valor associado aos ativos per-
didos. As perturbações nas redes de transportes reduzirão a produtividade das empresas e dos
activos que dependem dessas infra-estruturas - pelo menos até que a conectividade seja resta-
belecida. Na avaliação proposta, este efeito é captado através de um choque na PTF calibrado
de forma a que o seu valor aumente à medida que aumentam as perdas de activos físicos (ver
Anexo 2 para mais pormenores).

41. Tendo em conta estes efeitos, os resultados indicam que as taxas potenciais de cresci-
mento do PIB podem ser significativamente afetadas por inundações raras mas de
grande escala. Como mostra a Tabela 3, inundações raras com períodos de retorno de 100
anos ou mais (ou seja, uma probabilidade anual de 1 por cento ou menos) poderiam reduzir o
PIB em 6,7 a 8,9 pontos percentuais. Mais precisamente, Cabo Verde enfrenta uma probabili-
dade anual de 1 por cento de sofrer perdas de ativos equivalentes a aproximadamente 5,8 por
cento do PIB, o que poderia implicar um desvio do PIB de um cenário "sem inundações" de
6,7. p.p. Este impacto é quase comparável ao impacto da crise financeira global de 2008 para
Cabo Verde; é também superior a um desvio padrão da taxa de crescimento anual do PIB du-
rante o período 2010-2020 (ou seja, 5,6), que poderia ser visto como um indicador de refer-
ência para testar a sustentabilidade da dívida. No caso das inundações de um ano em 500, o
impacto no PIB é cerca de metade do impacto observado durante a crise da COVID. O im-
pacto no crescimento é, no entanto, relativamente pequeno para as inundações que podem
ocorrer, em média, uma vez em cada 10 anos ou mais frequentemente. Curiosamente, os re-
sultados sugerem uma relação não linear entre as perdas de ativos e as perdas de produção,
em que os impactos no PIB são mais elevados do que as perdas de ativos para as inundações
com um período de retorno de 50 anos ou mais. Isto reflecte os efeitos de amplificação que
podem materializar-se no caso de grandes inundações catastróficas e é consistente com a ev-
idência empírica (Felbermayr e Gröschl, 2014).

37
Tabela 3: Impacto das inundações na capital e no PIB de Cabo Verde

SFonte: estimativas dos autores baseadas no Perfil de Risco de Desastres de Cabo Verde revisto para inundações
NB: As perdas do PIB devem ser interpretadas como um desvio do PIB em relação ao cenário "sem inundações”.

42. Uma segunda dimensão crucial para calibrar os efeitos das inundações na sustentabili-
dade global da dívida é a carga fiscal que o Governo suportará na sequência de uma in-
undação. Obviamente, nem todos os custos associados aos bens danificados ou destruídos
terão de ser suportados pelo Governo, uma vez que grande parte deles são bens privados. De
uma perspectiva fiscal, os riscos climáticos e de catástrofes constituem passivos contingentes
para as finanças públicas. Uma análise das catástrofes mais recentes em Cabo Verde mostra
que os custos impostos por eventos naturais adversos são, de fato, constituídos por passivos
contingentes explícitos (por exemplo, danos a infra-estruturas públicas, edifícios públicos) e
implícitos (por exemplo, apoio a famílias afectadas, habitações privadas). Os passivos contin-
gentes associados a catástrofes devem, portanto, ser vistos como uma parte das perdas totais
de activos apresentadas na coluna 3 do quadro 3. No entanto, a magnitude e a natureza destes
passivos dependem dos acontecimentos e são muito incertas. Em última análise, o custo orça-
mental das catástrofes depende essencialmente do montante dos passivos contingentes im-
plícitos que o Governo é capaz de financiar quando o choque ocorre. No resto da análise, as -
sume-se que as despesas públicas adicionais associadas às inundações representam 50% das
perdas totais de activos físicos (ou seja, 50% da coluna 3 do quadro 3). Isto representaria um
encargo fiscal significativo que varia entre 9 milhões de USD (período de retorno de 2 anos)
e 75 milhões (período de retorno de 500 anos).

43. Um aspecto final fundamental que irá alterar os efeitos das inundações na sustentabili-
dade da dívida são os efeitos dinâmicos do crescimento que podem ocorrer após um
choque. De acordo com a literatura recente e em consonância com a dinâmica observada
após as recentes catástrofes em Cabo Verde, os efeitos prejudiciais para o crescimento são
calibrados para serem gradualmente eliminados, embora persistam até que a reconstrução es-
teja totalmente concluída (ver anexo 2 para mais pormenores e os seguintes autores para uma

38
discussão abrangente: Hsiang e Jina 2014, Dell et al. 2014, Burke et al. 2015, Del Valle et al.,
2020, Krichene et al. 2021). Mais precisamente, o "efeito de crescimento máximo" é atingido
durante o ano do choque e é depois reduzido em função do tempo de reconstrução. O tempo
de reconstrução é estimado em função (i) da intensidade da inundação e (ii) do financiamento
pós-catástrofe disponível. Como mostra a equação 1, inundações mais extremas (ou seja, um
choque maior nas perdas de activos) levariam a mais anos de reconstrução - e, por con-
seguinte, a efeitos adversos mais longos no crescimento - enquanto um melhor acesso ao fi-
nanciamento pós-catástrofe (por exemplo, através de uma Cat DDO) leva a menos anos de
reconstrução, ceteris paribus. Neste contexto, o espaço orçamental molda a capacidade do
governo para financiar a recuperação e a reconstrução na sequência de catástrofes, o que, por
sua vez, afecta o tempo de reconstrução e a persistência do impacto negativo no crescimento.

(1)
P u b li c a s s e t l o s s e s y
R e c o n s t r u c t io nt im e=
Y e a r l y p o s t−d i s a s t e r f i n a n c i n g

44. No cenário de base, estimamos que o governo pode financiar a reconstrução em 2 por
cento da despesa pública anual. Uma vez que Cabo Verde tem pouco espaço fiscal e é prin-
cipalmente limitado em termos de crédito - não pode contrair empréstimos comerciais no es-
trangeiro e só pode contrair empréstimos em pequenas quantidades a nível interno devido a
um pequeno sector financeiro local - presume-se que o financiamento pós-catástrofe seja lim-
itado no cenário de base. Partindo deste pressuposto, o tempo necessário para a reconstrução
é de 1 a 6 anos, dependendo da gravidade da inundação (ver Anexo 2 para as trajectórias de
crescimento ilustrativas associadas a cada período de retorno). Esta calibração está alinhada
com o que foi observado no rescaldo de recentes catástrofes em Cabo Verde, onde a recuper -
ação e a reconstrução foram condicionadas por fraquezas institucionais e falta de espaço fis-
cal. Também é consistente com o quadro oficial de recuperação estabelecido pelo governo de
Cabo Verde, que distingue uma recuperação a médio prazo que se estende por 1 a 3 anos, en-
quanto a recuperação a longo prazo pode durar de 3 a 10 anos, dependendo da gravidade do
evento.

3. Análise da sustentabilidade da dívida em diferentes cenários de inundação

45. Para avaliar o impacto das inundações na sustentabilidade da dívida, incorporamos as


perdas relacionadas com as inundações como um choque exógeno de uma determinada
probabilidade que afeta os principais parâmetros macro-económicos e molda a tra-
jetória da dívida. A Figura 3 apresenta um quadro conceitual, adaptado do Quadro de Sus-
tentabilidade da Dívida (QSD) do FMI-Banco Mundial. Isto mostra que um choque rela-
cionado com o clima com uma determinada probabilidade (no nosso caso, inundações) con-
duz a perdas de ativos. Tal como referido na secção anterior, este choque gera efeitos adver-

39
sos no crescimento potencial e implica despesas públicas adicionais não planeadas. A capaci-
dade de satisfazer as necessidades de financiamento pós-catástrofe determinará a magnitude
e o impacto global do choque no crescimento do PIB. A magnitude global e a persistência
dos impactos adversos no crescimento afetarão, em contrapartida, o PIB nominal e reduzirão,
pelo menos temporariamente, as receitas do setor público. As pressões orçamentais resul-
tantes deste efeito de tesoura sobre as receitas e as despesas conduzirão a uma deterioração
do saldo orçamental primário, o que aumentará ainda mais as necessidades brutas de finan-
ciamento. Ao afetar as necessidades globais de financiamento, estes canais afetam assim o
volume global da dívida e o montante do serviço da dívida necessário.

Figura 16: Quadro Conceptual: Como os choques relacionados com o clima podem afetar a dívida

• A análise utiliza então o Quadro de Sustentabilidade da Dívida (QSD) do FMI-Banco


Mundial para modelar o impacto das cheias na sustentabilidade da dívida de Cabo
Verde. A Caixa 1 fornece mais pormenores sobre o QSD. A nossa análise explora como um
choque no ano de 2023 afeta a sustentabilidade fiscal e da dívida a médio prazo até 2042.
Começamos com a mais recente Análise de Sustentabilidade da Dívida do FMI-BM (ASD,
concluída em Junho de 2022) e ajustamos o cenário de referência para refletir novos valores de
crescimento mais elevados para o ano de 2022. Assumimos que as inundações ocorrem em
2023 e, em seguida, ajustamos três parâmetros-chave na ASD (de acordo com os mecanismos
descritos na seção anterior):
• Despesas públicas (que aumentam de acordo com os custos de reconstrução);
• Taxa de crescimento do PIB (que se desvia em função do impacto estimado do crescimento an-
ual); e
• Acumulação da dívida externa (no caso da Cat DDO).

40
Em seguida, consideramos a forma como estes choques afetam os parâmetros-chave da sus-
tentabilidade da dívida em relação aos seus limiares de capacidade de carga da dívida da
ASD (definidos pelo FMI-BM):
• Risco de sobreendividamento da dívida pública (VA da dívida pública total em percentagem
do PIB < 70%)
• Risco de sobre-endividamento externo (VP do rácio da dívida externa pública e publicamente
garantida (PPG) em relação ao PIB < 55%)

Caixa 2: O Quadro de Sustentabilidade da Dívida (QSD) do FMI e do Banco Mundial explicado

O Quadro de Sustentabilidade da Dívida (QSD) do FMI e do Banco Mundial utiliza limiares in-
dicativos, ligados à classificação dos países, para analisar o risco de sobreendividamento público e
externo. Estes limiares são limites a partir dos quais o risco de sobreendividamento é considerado ele-
vado. Os limiares dependem da capacidade de carga da dívida dos países. Para Cabo Verde, dois
parâmetros-chave (entre outros) moldam a sua sustentabilidade da dívida em relação aos teus limiares
de capacidade de carga da dívida (definidos pelo FMI-BM):
• Risco de sobreendividamento da dívida pública: medido com base no valor actual (PV) da dívida
pública total como percentagem do PIB, que deve ser inferior a 70 por cento.
• Risco de sobreendividamento externo: medido com base no valor atual (VP) do rácio da dívida ex-
terna total pública e garantida publicamente em relação ao PIB, que deve ser inferior a 55%.
O QSD qualifica então os países como estando sob um risco "baixo", "moderado" ou "elevado"
de sobreendividamento em relação a estes limiares de endividamento. O QSD efetua vários testes
de resistência para verificar a vulnerabilidade da situação da dívida de um país a choques externos. A
partir daí, estabelece três classificações:
• Baixo risco de sobreendividamento se nenhum dos indicadores do peso da dívida ultrapassar os re-
spetivos limiares no cenário de base ou no teste de esforço mais extremo.
• Risco moderado de sobreendividamento se nenhum dos indicadores do peso da dívida ultrapassar os
respectivos limiares na base de referência, mas pelo menos um indicador ultrapassar o seu limiar nos
testes de esforço.
• Risco elevado de sobreendividamento externo se qualquer um dos indicadores do peso da dívida ul-
trapassar o seu limiar no cenário de referência.
A mais recente Análise de Sustentabilidade da Dívida (ASD) do FMI e do Banco Mundial para
Cabo Verde mostra que o seu risco actual de sobreendividamento global permanece elevado, en-
quanto o risco de sobreendividamento externo é moderado. Tal como explicado anteriormente, é
classificado em conformidade porque se prevê que o rácio do VA da dívida pública total em relação ao
PIB ultrapasse o limiar durante 2022-28 no cenário de base e no teste de esforço (e está, portanto, em
risco "elevado"). Simultaneamente, a partir de 2023, o valor actual do rácio da dívida externa pública e
com garantia pública em relação ao PIB só ultrapassa o seu limiar nos cenários de teste de esforço (en-
contrando-se, portanto, em risco “moderado").
Fonte: Elaboração dos autores com base em IMF-World Bank (2018) e IMF-World Bank (2022).

4. Cenário de Referência

41
47. Os resultados indicam que pequenas inundações recorrentes têm um impacto relativa-
mente modesto na sustentabilidade da dívida de Cabo Verde, enquanto inundações ex-
tremamente raras e grandes poderiam aumentar os rácios da dívida pública e alterar
consideravelmente o risco da trajetória antecipada da dívida em relação ao PIB. A
Figura 4 (figura da esquerda) apresenta o valor actual (PV) da dívida pública como uma per-
centagem do PIB na ausência de cheias e em diferentes cenários de cheias. Estes cenários
variam entre um período de retorno de 5 anos (ou seja, inundações que geram perdas de
ativos com uma probabilidade anual de 20 por cento de serem excedidas) e um período de re -
torno de 500 anos (ou seja, perdas com uma probabilidade anual de 0,2 por cento de serem
excedidas). No "cenário sem inundações", o VA da dívida pública diminui rapidamente de
103% em 2021 para 70% em 2028. As inundações pequenas e recorrentes (com um período
de retorno que varia entre 2 e 25) fazem subir um pouco esta tendência, pelo que se prevê
que a dívida pública desça abaixo do limiar de 70% um ano ou dois anos mais tarde, em 2029
ou 2030. Em termos gerais, um único evento de inundação de baixa intensidade tem um im-
pacto relativamente modesto na dívida pública. No entanto, inundações mais raras, mas mais
prejudiciais (ou seja, inundações com um período de retorno de 50 a 500 anos) alteram signi -
ficativamente a trajectória do rácio da dívida pública e podem ameaçar a sustentabilidade da
dívida: para eventos de cauda (uma vez em 500 anos), a dívida pública atingiria o limiar de
risco 14 anos mais tarde do que no cenário "sem inundações".

48. Para a dívida externa, concluímos de forma semelhante que pequenas inundações
recorrentes têm um impacto relativamente modesto na sustentabilidade da dívida ex-
terna, enquanto eventos mais extremos poderiam atrasar significativamente o ano em
que Cabo Verde cai abaixo do limiar de risco indicativo. A Figura 45 (figura à direita) ap-
resenta o VA da dívida externa pública e garantida publicamente como uma percentagem do
PIB em diferentes cenários de cheias. No "cenário sem inundações", a dívida externa diminui
rapidamente de 59 por cento em 2021 para 55 por cento em 2022 (ou seja, o limiar de risco
indicativo). Qualquer inundação pequena e recorrente (com um período de retorno de 25 anos
ou menos) tem muito pouco impacto nesta tendência (em parte porque a maior parte dos cus-
tos de reconstrução do Estado é financiada internamente). No entanto, os eventos de cauda
podem aumentar significativamente os rácios da dívida externa. Para um nível de perdas rela-
cionadas com as inundações que tem uma probabilidade anual de 1% de ser excedido (ou
seja, RP 100), a trajectória da dívida externa em relação ao PIB apresenta um pico significa-
tivo e ultrapassa o limiar de risco até 2026.

5. Cenário de elevada resiliência orçamental

49. Para considerar as opções políticas para melhorar a sustentabilidade da dívida, com-
paramos os impactos das inundações acima descritos com estes impactos num cenário

42
de elevada resiliência orçamental. Este cenário de elevada resiliência fiscal implica dois el-
ementos principais: (i) instrumentos de financiamento de risco para mobilizar rapidamente
recursos adicionais pós-catástrofe em condições financeiras favoráveis; (ii) um forte mecan-
ismo baseado em regras que facilite uma alocação e execução eficientes dos recursos pós-
catástrofe para acelerar a recuperação no terreno. Existem provas sólidas de que, quando os
governos canalizam rapidamente os recursos pós-catástrofe através de mecanismos eficientes
e transparentes baseados em regras, a recuperação económica é consideravelmente acelerada
(Del Valle et al. 2020). A política orçamental acomodatícia conduzida no âmbito deste
cenário de elevada resiliência orçamental é, por conseguinte, calibrada assumindo que (i) está
disponível um DDO Cat de 10 milhões de dólares e que (ii) o Fundo Nacional de Emergência
(FNE) existente permite canalizar eficazmente estes recursos adicionais, impulsionando as-
sim a recuperação económica e diminuindo a duração dos efeitos adversos no crescimento.

50. Os resultados sugerem que o cenário de elevada resiliência orçamental poderia ajudar a
atenuar os impactos das inundações nas perspectivas de sustentabilidade da dívida,
especialmente no caso de acontecimentos extremos. medida que o choque se torna mais
grave, a capacidade de refinanciar rapidamente e implementar um plano de recuperação e
reconstrução marca uma diferença mais pronunciada entre as duas trajetórias da dívida em
relação ao PIB (ver anexo 2). Como resultado, o cenário de elevada resiliência fiscal também
ajudaria Cabo Verde a descer mais rapidamente abaixo dos limiares de risco indicativos.
Relativamente à dívida pública, para uma inundação com um período de retorno de 50 anos,
a diferença entre os dois cenários políticos é de um ano (2031 no cenário de base, vs. 2030 no
cenário de elevada resiliência fiscal) e sobe para quatro anos no cenário mais extremo 2042
no cenário de base com um período de retorno de 500 anos, versus 2038 no cenário de
elevada resiliência fiscal, ver Figura 18 - esquerda). No que respeita à dívida externa, o rácio
mantém-se abaixo do limiar de risco indicativo para todas as inundações com um período de
retorno de 50 anos ou menos. No caso de precipitações mais extremas (RP=250, RP=500), o
acesso rápido ao financiamento ajuda o país a descer abaixo do limiar de risco um ano antes
(em 2026 e 2028, respectivamente, ver Figura 18 - direita). É importante notar que, tanto
para a dívida pública como para a dívida externa, este cenário de elevada resiliência
orçamental limita apenas marginalmente a mudança das trajectórias dos rácios da dívida em
relação ao "cenário sem inundações" (ver anexo 2). Estes resultados sublinham, assim, a
necessidade de complementar as opções políticas detalhadas neste cenário de elevada
resiliência orçamental com medidas destinadas a reduzir o risco climático e de catástrofes em
setores-chave que favorecem o crescimento.

51. Os resultados obtidos neste capítulo devem ser interpretados com cautela. A avaliação
centra-se apenas nos danos causados pelas cheias e não inclui outros riscos naturais que tam-
bém podem ser amplificados pelas alterações climáticas, como a subida do nível do mar ou o
aquecimento dos oceanos. É importante notar que o exercício se centrou apenas nos canais de
transmissão a nível macroeconómico afetados por inundações extremas e não considerou os

43
impactos cumulativos de pequenas inundações mais frequentes nem os efeitos redistributivos
destes choques. Também não inclui um cenário de choques compostos, em que as inundações
ocorreriam concomitantemente com outros choques (por exemplo, Covid-19 ou crise finan-
ceira). No entanto, dada a natureza totalmente exógena dos eventos naturais adversos, Cabo
Verde poderia potencialmente ser atingido por um cenário de "choques compostos" e estes
cenários poderiam ser incluídos como parte de futuros testes de stress. Além disso, os resulta-
dos devem ser interpretados com cautela, dado o elevado nível de incerteza em todas as ca-
madas da análise, incluindo: (i) incertezas relacionadas com a frequência de eventos naturais
adversos e o nível de danos que poderiam produzir aos activos físicos em Cabo Verde; (ii) in-
certezas sobre os efeitos quantitativos dos choques no ambiente e nos sistemas socioe-
conómicos e a sua implicação para o processo de produção global; e (iii) incertezas sobre
outras variáveis macroeconómicas que poderiam moldar as estratégias de refinanciamento da
dívida (por exemplo, política monetária mais restritiva nas principais economias globais). Por
fim, esta avaliação aponta para a necessidade de mais trabalho analítico e de novas formas de
recolha de dados para garantir que os riscos de catástrofes e de clima possam ser incorpora-
dos de forma mais completa e sólida na análise da ASD.

44
Figure 17: Extreme floods could significantly shift the anticipated trajectory of debt

PV OF PUBLIC DEBT-TO-GDP RATIO PV OF PPG EXTERNAL DEBT-TO-GDP RATIO

Figura 18: Num cenário de "elevada resistência orçamental", o rácio da dívida desceria mais rapi-
damente abaixo do limiar de risco indicativo

NO EM QUE O VA DA DÍVIDA PÚBLICA EM PERCENTAGEM DO PIB DESCE


ANO EM QUE O RÁCIO DÍVIDA EXTERNA/PIB DO PV DO PPG DESCE ABAIXO DE
70 ABAIXO DE PERCENTAGEM INFERIOR A 55 POR CENTO

FONTE: CÁLCULOS DOS AUTORES BASEADOS NA ASD DO FMI-BM.

NOTA: RP= PERÍODO DE RETORNO ASSOCIADO A CADA CENÁRIO DE INUNDAÇÃO; PV= VALOR ACTUAL

6. Conclusão e Politica de Opçōes

52. Este relatório utiliza os resultados do Perfil de Risco de Catástrofes de Cabo Verde re-
visto para testar a sustentabilidade da dívida face a eventos de cheias extremas. A
análise fornece resultados pormenorizados em diferentes períodos de retorno de inundações
(ou seja, perdas relacionadas com inundações de uma determinada probabilidade), incluindo
eventos de cauda, que permitem apresentar mais detalhes das implicações macro-fiscais de
inundações extremas. Estes eventos extremos estão a tornar-se mais frequentes à medida que
o clima muda e precisam de ser cuidadosamente analisados para garantir a sustentabilidade
da dívida no futuro, em particular no contexto de Cabo Verde.

53. Os resultados mostram que, embora as pequenas inundações recorrentes representem


uma ameaça limitada, inundações raras mas mais prejudiciais poderiam ter um im-
pacto significativo na sustentabilidade da dívida de Cabo Verde. Uma inundação rara,
mas catastrófica, poderia aumentar significativamente as taxas de endividamento, o que faria
com que a dívida pública de Cabo Verde ultrapassasse os limiares indicativos da sua capaci-
dade de carga da dívida (até 14 anos no cenário mais extremo, de 2028 no cenário de referên -
cia para 2042). A adoção de políticas destinadas a reforçar a resiliência fiscal, nomeadamente
através de um DDO de 10 milhões de dólares de Cabo Verde e de um mecanismo eficiente

45
baseado em regras para atribuir e executar o financiamento pós-catástrofe, poderá propor-
cionar alguma protecção, permitindo uma recuperação mais rápida e reduzindo as perdas do
PIB, conduzindo assim a uma redução acelerada do rácio dívida/PIB. Isto ajudaria o país a
descer mais rapidamente abaixo dos limiares indicativos do risco de endividamento. No en-
tanto, no caso das inundações mais graves, mesmo neste cenário de resiliência orçamental re-
forçada, a trajectória do rácio dívida/PIB desviar-se-ia significativamente do "cenário sem in-
undações", podendo fazer descarrilar os esforços de consolidação orçamental em curso e
salientando a necessidade urgente de investir na redução dos riscos e na adaptação às alter-
ações climáticas para limitar as perdas potenciais.

54. Para reduzir os riscos salientados neste capítulo, as autoridades poderiam considerar
opções políticas em três grandes domínios de reforma. Em primeiro lugar, o risco de
catástrofes e o risco climático poderiam ser incorporados de forma mais sistemática na es-
tratégia mais alargada de risco orçamental. As autoridades poderiam, por exemplo, continuar
a refletir os fatores de risco e a delinear medidas de mitigação e de provisionamento na
declaração de risco orçamental publicada com o orçamento anual. Tal garantiria que as avali-
ações dos riscos climáticos e de catástrofes fossem utilizadas para fundamentar a elaboração
da política orçamental. Em segundo lugar, com base no DPP recentemente assinado com um
DDO Cat com o Banco Mundial, o Governo poderia desenvolver uma estratégia de financia-
mento mais abrangente em função dos riscos, a fim de aumentar a sua capacidade de con-
duzir políticas anti-cíclicas na sequência de uma catástrofe. Esta estratégia poderia procurar
combinar instrumentos de retenção e de transferência de riscos para aumentar a cobertura, re-
conhecendo que nenhum instrumento financeiro único pode cobrir todos os riscos. É igual-
mente importante garantir a existência de mecanismos baseados em regras para aumentar a
eficiência e a transparência na alocação e execução dos recursos pós-catástrofe. Por último,
serão necessários investimentos específicos na redução dos riscos e na adaptação às alter-
ações climáticas para limitar os impactos futuros de fenómenos naturais adversos e amortecer
as perspectivas de desenvolvimento num clima em mudança. A impermeabilização das infra-
estruturas críticas contra as alterações climáticas permitirá realizar importantes economias
face a fenómenos naturais adversos mais frequentes e intensos. A existência de infra-estru-
turas resilientes contribui igualmente para promover uma recuperação económica rápida e
sólida, o que, por sua vez, limita as potenciais repercussões negativas e minimiza os impactos
no crescimento associados ao choque inicial. As políticas públicas têm, portanto, um papel
crítico na construção da resiliência económica às alterações climáticas e na garantia da sus-
tentabilidade da dívida e do desenvolvimento futuro em Cabo Verde. A Tabela 4 detalha as
opções políticas que poderiam ser consideradas para este fim.
Table 4: Opções Politicas

Recomendação Responsabilidade Linha do tempo

Ter em conta e incorporar os riscos orçamentais relacionados com as catástrofes e o clima na estratégia

46
mais vasta de gestão dos riscos orçamentais

Reforçar a inclusão dos riscos de catástrofe e climáticos na MdF/Comité do Risco Curto Prazo
declaração de risco orçamental Orçamental

Integrar estes riscos nos documentos de política orçamental a MdF/Comité do Risco Medio Prazo
médio prazo, tais como os quadros orçamentais a médio prazo Orçamental
(QFP), a estratégia da dívida a médio prazo (EDMP) e a
análise da sustentabilidade da dívida.

Desenvolver uma estratégia integrada em função dos riscos para aumentar a capacidade orçamental de
resposta rápida na sequência de uma catástrofe, preservando simultaneamente a sustentabilidade das
finanças públicas

Delinear os passivos contingentes explícitos e implícitos asso- MdF/Comité do Risco Curto Prazo
ciados a catástrofes e choques relacionados com o clima Orçamental

Reunir os instrumentos de financiamento de riscos existentes MdF/Comité do Risco Medio Prazo


no âmbito de uma visão estratégica e integrada e avaliar diver- Orçamental
sas opções de financiamento de riscos para aumentar a cober-
tura contra catástrofes e choques relacionados com o clima,
tendo em conta as condições macroeconómicas mais amplas

Promover mecanismos baseados em regras para aumentar a MoF/FNE Medio Prazo


eficiência e a transparência na alocação e execução dos recur-
sos pós-catástrofe

Tornar as infra-estruturas públicas críticas resistentes às alterações climáticas e promover investimen-


tos específicos na redução do risco de catástrofes e na adaptação às alterações climáticas

Investimentos públicos resistentes ao clima através da incorpo- MoF/DNP Curto Prazo


ração de considerações relativas ao clima e ao risco de
catástrofes na concepção, formulação e avaliação de novos
projectos de investimento

Aumentar a resiliência das redes rodoviárias através de uma MIOTH / Infrastructure Medio Prazo
gestão dos ativos de transporte baseada nos riscos. of Cape Verde/
Estrades de Cabo Verde
Verde (ECV)

Reforçar o planeamento territorial e aumentar a resiliência Ministério das Medio Prazo


costeira através de uma combinação de infra-estruturas verdes Infra-estruturas,
e cinzentas que potenciem as soluções baseadas na natureza. Planeamento Territorial
e Habitação (MIOTH)
/ INGT/ Ministério do
Ambiente e
Agricultura / Ministério
do Mar

Referências
Burke, M., S. Hsiang e E. Miguel. 2015. Efeito global não linear da temperatura na
produção económica, Letter Nature, 527, Outubro, pp. 235-239.

47
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https://doi.org/10.1016/j.jdeveco.2010.12.002

48
Anexo 1. Perfil de Risco de Desastres de Cabo Verde

Para resolver a escassez associada aos dados históricos e fornecer uma visão mais
abrangente do risco, foi desenvolvido um Perfil de Risco de Catástrofe, posteriormente
revisto e melhorado para Cabo Verde, centrado nas inundações, secas, erupções
vulcânicas e terramotos. O Perfil de Risco de Catástrofe fornece uma visão das perdas
potenciais que as catástrofes e os eventos relacionados com o clima podem gerar para os
activos físicos numa determinada região e tem sido utilizado por um número crescente de
países como base para informar a tomada de decisões sobre a resiliência às catástrofes e
ao clima.

As técnicas de modelização utilizadas para desenvolver um Perfil de Risco foram


originalmente desenvolvidas pela indústria internacional de (re)seguros para avaliar o
risco de diferentes catástrofes naturais em carteiras de activos físicos subscritos (por
exemplo, edifícios) e são cada vez mais utilizadas pelos governos para analisar a sua
exposição a fenómenos naturais adversos. Estas técnicas baseiam-se em estudos
científicos e de engenharia dos riscos naturais e dos seus impactos em activos físicos
específicos, como edifícios e infra-estruturas. Normalmente, estes modelos incluem os
seguintes módulos:

• Módulo de exposição: Uma base de dados geo-referenciada de activos em risco, que


capta atributos importantes como a localização geográfica, o tipo de ocupação (por
exemplo, residencial, comercial, industrial, agrícola) e o tipo de construção (por
exemplo, madeira, aço, alvenaria), a idade e o número de pisos.
• Módulo de Perigos: Um catálogo de milhares de potenciais eventos de catástrofes
naturais que podem ocorrer numa região, cada um definido por uma frequência e
gravidade de ocorrência específicas. São efectuadas análises sobre a ocorrência
histórica de eventos catastróficos para captar a extensão de possíveis eventos, com base
em opiniões de peritos.
• Módulo de vulnerabilidade: Uma série de relações que relacionam os danos causados a
um bem com o nível de intensidade de um perigo (por exemplo, abalo do solo para
terramotos, velocidade do vento para ciclones tropicais). As relações variam consoante
o perigo e as características de cada bem; por exemplo, uma pequena casa de madeira e
um edifício alto de betão responderão de formas diferentes a um terramoto e, como tal,
sofrerão danos de formas diferentes e em extensões diferentes. Numa escala maior, por
exemplo, ao analisar um bairro ou uma cidade inteira, podem ser utilizados indicadores
para captar a vulnerabilidade geral de uma área.

49
Módulo de perdas: Uma combinação da informação contida nos outros três componentes
para calcular as perdas globais esperadas para os riscos selecionados que afetam uma
carteira de ativos de interesse. Normalmente, são produzidos dois tipos de métricas de
risco: perdas médias anuais (AALs) e perdas máximas prováveis (PMLs). A AAL é a
perda esperada, em média, todos os anos para os riscos que estão a ser analisados;
enquanto as PMLs descrevem as maiores perdas que se pode esperar que ocorram para
um determinado período de retorno (dentro de um determinado período), como uma
perda de 1 em 50 anos ou uma perda de 1 em 250 anos..,
As métricas de risco produzidas por este tipo de modelos são particularmente úteis para os decisores
políticos na avaliação de diferentes dimensões do risco, incluindo a probabilidade de perdas e a perda
máxima que pode ser gerada por grandes eventos (por exemplo, inundações maciças ou ciclones que
afectam grande parte de um país).
Em Cabo Verde, as perdas médias anuais decorrentes de múltiplos riscos naturais foram estimadas
em quase 1% do PIB (US$ 18,2 milhões). Estas são principalmente causadas por riscos relacionados
com inundações, que representam quase 70 por cento das AALs estimadas. Além disso, as perdas estão
espacialmente concentradas nas ilhas de Santiago, São Vicente e, em menor escala, Boa Vista, onde se
encontra a maioria dos bens e da população. Ao considerar eventos de cheias mais extremos, as ilhas de
Santiago e São Vicente enfrentam uma probabilidade anual de 1 por cento de perdas superiores a US$ 37
milhões. Embora reconheçamos que as curvas de Probabilidade de Excedência (EP) baseadas nas ilhas
são sub-aditivas, as perdas totais de ativos a nível nacional são aproximadas através da soma das PMLs de
cada ilha individual. Partindo deste pressuposto de uma forte correlação das perdas entre as ilhas, o pa ís
enfrenta uma probabilidade anual de 1% de exceder as perdas resultantes de inundações na ordem de
grandeza de 5,9% do PIB (figura A.1). É de notar que estas estimativas se baseiam nos padrões climáticos
actuais e não têm em conta os potenciais impactos de futuras alterações climáticas.

FIGURE A.1. ASSET LOSSES FROM FLOODS APPROXIMATED AT THE NATIONAL LEVEL (IN PERCENTAGE OF GDP)

8 7.5

6.5
National Asset Losses (in % of GDP)

5.9
6

4 3.6

2.2
1.9
2

0
0 125 250 375 500
Source: Authors based on revised Cabo Verde Disaster Risk Profile (2020) for floods.

50
Anexo 2. Derivação dos impactos no crescimento das perdas de activos em Cabo Verde.

Para traduzir os danos aos ativos físicos em impactos no crescimento, utilizamos uma função Cobb-
Douglas padrão, como se segue:
α 1−α
Y t =Z t k t−1 l t (1)

Onde é a produção no período , e são os fatores de produção capital e trabalho, respectivamente, e é a


Produtividade Total dos Fatores (PTF). Para aproximar a taxa de crescimento do produto no caso de um
dado choque no capital, derivamos a equação (1) transformada em logaritmo e assumimos que a mão-de-
obra se mantém constante. Formalmente, isto corresponde a:

L n Y t=L n Z y, t + α Ln k t−1❑
❑ + ( 1−α ) L n l t

∆Y ∆ Z ∆ K t −1 ∆L
= +α +(1−α )
Y Z K L
∆Y ∆ Z ∆K
= +α
Y Z K
∆ Y =∆ Z y ,t + α ( A s s e t lo s s e s y )t
Tal como referido no texto principal, as inundações têm impacto na função de produção através de dois
canais:
- Perdas de ativos: os danos físicos imediatos ao capital e aos ativos baseiam-se nos resultados do perfil
de risco de inundação descrito no anexo 1. As perdas de ativos são calculadas para diferentes períodos de
retorno, de 2 a 500, para cada ilha e expressas como uma percentagem do capital total estimado nessa
ilha. As perdas de ativos são então agregadas a nível nacional para informar sobre a variação de para um
determinado período de retorno (ou seja, o termo "" acima). É utilizado um coeficiente normalizado de
0,3 para o valor da elasticidade da produção.
- Diminuição da produtividade total dos factores: o choque é calibrado de forma a que o seu valor
aumente à medida que aumentam as perdas de activos físicos. Mais precisamente, para as perdas de
activos no período de retorno de 2 anos, o choque na PTF é nulo e depois aumenta com uma magnitude
igual à diferença entre as perdas de activos no período de retorno considerado e as perdas de activos no
cenário do período de retorno de 2 anos. A título de exemplo, se as perdas de activos aumentarem de 0,9
para 5,9 - ou seja, 5 pontos percentuais - a PTF será reduzida de 1 para 0,95. Implicitamente, esta
calibração implica que os activos afectados incluem as principais infra-estruturas que aumentam a PTF
(ou seja, aeroportos, estradas).
Os impactos estimados de acordo com esta metodologia devem ser interpretados como um desvio de um
cenário "sem inundações", dada a probabilidade de sofrer o nível de perdas de bens indicado pelo período
de retorno. Isto implica que Cabo Verde enfrenta uma probabilidade anual de 1 por cento de sofrer perdas
físicas na ordem de 5,8 por cento do PIB, o que poderia implicar um desvio do PIB de um cen ário "sem
inundações" de aproximadamente 6,7 p.p.
Um último aspecto fundamental que deve ser considerado são os efeitos dinâmicos do crescimento que
podem ocorrer após um choque. De acordo com a teoria neoclássica do crescimento, a destruição de
capital gerada por catástrofes estimula subsequentemente o investimento para repor o stock de capital e, a

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médio prazo, coloca o produto de volta ao seu nível estável. A taxa de crescimento da atividade
económica deverá, portanto, ser inferior à tendência aquando do impacto e, com as instituições
adequadas, os esforços de recuperação e reconstrução poderão gerar um efeito de ricochete que se
traduzirá numa taxa de crescimento superior à tendência a partir de então. Na prática, este "efeito de
ricochete" tem sido raramente observado e depende em grande medida de factores como (i) a qualidade e
a criticidade do stock de capital danificado ou destruído, (ii) a capacidade do governo para elaborar e
aplicar políticas fiscais anticíclicas eficientes e (iii) a diversificação e a dimensão global da economia (ver
Felbermayr e Gröschl, 2014, para uma discussão empiricamente fundamentada destas dinâmicas). De
facto, para os Pequenos Estados Insulares em Desenvolvimento (PEID) como Cabo Verde, as
investigações empíricas indicam que os eventos naturais adversos geram impactos negativos substanciais
no crescimento e os efeitos de recuperação não se materializam (Strobl 2012, Hsiang e Jina 2014, FMI
2019). As restrições do lado da oferta e o espaço fiscal limitado resultam frequentemente num atraso na
recuperação e reconstrução, com uma reconstrução que pode durar cinco a dez anos, ampliando os
impactos iniciais do choque no crescimento em vez de provocar um efeito de recuperação.
FIGURA A.2. ESQUEMA DA DIMENSÃO TEMPORAL DOS EFEITOS DE CRESCIMENTO DAS INUNDAÇÕES

Source: authors adapted from Burke et al. (2015)

Segundo esta literatura crescente, partimos do princípio de que os efeitos prejudiciais para o crescimento persistirão até que a
reconstrução esteja concluída. No cenário de referência, o "efeito de pico do crescimento" é, portanto, atingido durante o ano
do choque e os efeitos do crescimento são gradualmente eliminados em função dos esforços de recuperação e reconstrução. Isto
implica que os impactos adversos no crescimento não são eliminados por um "efeito de ricochete" em períodos subsequentes
nem produzem efeitos a longo prazo que reduzam permanentemente a capacidade de crescimento do país. De um ponto de vista
esquemático, após as inundações, a taxa de crescimento do PIB de Cabo Verde seguirá uma trajectória como a linha azul na
figura A.2. Usando esta abordagem, para as inundações mais graves (ou seja, RP de 500 anos), estima-se que os efeitos
adversos do crescimento durem 5,3 anos. A figura A.3 ilustra estes efeitos dinâmicos do crescimento para diferentes períodos de
retorno, enquanto a figura A.4 recapitula o quadro conceptual e os principais pressupostos utilizados para esta análise.

FIGURA A.3. EFEITOS DINÂMICOS DO CRESCIMENTO ASSOCIADOS A DIFERENTES CENÁRIOS DE


INUNDAÇÃO

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FIGURA A. 4. QUADRO CONCEPTUAL E PRINCIPAIS PRESSUPOSTOS UTILIZADOS PARA CALCULAR OS IMPACTOS DAS
INUNDAÇÕES NO CRESCIMENTO DINÂMICO

53
FIGURA A. 5. EFEITOS POTENCIAIS DAS INUNDAÇÕES EXTREMAS NA TRAJECTÓRIA DA DÍVIDA PÚBLICA NO CENÁRIO DE
REFERÊNCIA E NO CENÁRIO DE ELEVADA RESILIÊNCIA FISCAL (FR ELEVADA) (VA DA DÍVIDA PÚBLICA EM PERCENTAGEM DO
PIB)

Source: Authors’ calculations and IMF-WB DSA.

FIGURA A.6. EFEITOS POTENCIAIS DAS INUNDAÇÕES EXTREMAS NA DÍVIDA EXTERNA NO CENÁRIO DE REFERÊNCIA E NO
CENÁRIO DE ELEVADA RESILIÊNCIA FISCAL (FR ELEVADA) (VP DO RÁCIO DÍVIDA EXTERNA/PIB DO PPG)

Source: Authors’ calculations and IMF-WB DSA.

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