O Sufismo Como Dimensao Mistica Do Isla
O Sufismo Como Dimensao Mistica Do Isla
O Sufismo Como Dimensao Mistica Do Isla
RESUMO
Diante da realidade islâmica contemporânea e buscando
estar atento às diversas vozes presentes no “outro”, este
artigo tem em vista apresentar de forma sucinta o que é o
Sufismo, pensando-o como uma possibilidade – entre mui-
tas – de concretização das crenças islâmicas. Para tal, ini-
ciar-se-á procurando compreender como a notícia acerca
de sua existência chega ao Ocidente, ou seja, como os
ocidentais o “descobrem”. A seguir, centrar-se-á na bus-
ca de compreender o Sufismo a partir de sua relação com
o islamismo por meio de suas fontes primordiais: o Corão
e o Profeta Muhammad.
. Por fim, este artigo apresentará
brevemente alguns elementos que compõem e caracteri-
zam o repertório de crenças e práticas de várias escolas
Sufis tais como a busca da Unicidade Divina, a prática
meditativa da recitação dos Nomes Divinos e a submis-
são à orientação de um “šayh”.
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Palavras-chave: Sufismo; Mística islâmica; Orientalismo.
DEFINIÇÃO
E o papel de Muhammad
. no Sufismo chega a tal ponto que o
aniquilamento em Deus (“fan~' fi Allah”) tem como trajetória
quase que obrigatória o aniquilamento em Seu Profeta (“fan~' fi
rasul”), itinerário de realização do amor a Deus.
Um último aspecto que assevera a centralidade do Profeta junto
aos Sufis é a reverência que se tributa a sua descendência, tanto
entre os partidários do Shiismo quanto entre os do Sunismo,
uma vez que, com exceção da Ordem Naqšbandi, todas as de-
mais se remetem a pelo menos um “iman” shiita em sua genealo-
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gia (“silsila”). Acerca da tensão
entre místicos e anti
místicos, são ilustra-
tivos os seguintes
“hadits”: “A pobreza é
PRINCIPAIS ELEMENTOS CONSTITUINTES DE SUA PROPOSTA ESPIRITUAL %
o meu orgulho”. Da
mesma maneira, “Ó
meu Deus, faz-me vi-
Desde os primórdios do Islã, os seguidores do Profeta acredi- ver humildemente,
tavam que as observâncias externas só tinham valor se acompa- morrer humildemente
e ressuscitar dos
nhadas de um sentido interior, de um desejo de obedecer aos mortos humildemen-
mandamentos de Deus, de uma experiência do reconhecimento te”. Contra o ascetis-
mo também não falta-
da grandeza d’Ele e da pequenez do ser humano. Esta forma de vam “hadits”: “O me-
%
conceber o seguimento do Islã envolvia a totalidade da vida da lhor dos muçulmanos
não é o que vende a
pessoa, incluindo observâncias morais e espirituais. outra vida para gozar
O desejo de pureza de intenção, com o passar do tempo, deu esta vida. Também
não o é o que vende
origem a práticas ascéticas, talvez sob influência dos monges cris- esta vida para adqui-
tãos orientais (Cf. H OURANI, 1995, p. 165). Buscava-se uma rir a futura. O melhor
dos muçulmanos é o
forma de relação com Deus que passasse pelo amor e pela purifi- que apanha o seu
cação do coração. Embora o surgimento destas concepções ascé- bem numa e noutra”;
“O casamento é a
ticas tenha provocado reações antimísticas,12 elas darão origem, metade da fé”; “O
mais tarde, ao Sufismo. muçulmano que per-
manece celibatário
Este “caminho” (“salik”) de interioridade e purificação do co- pertence aos irmãos
ração que é o “Tasawwuf”, no entanto, é concebido como sendo de satanás. Se quiser
. brincar de monge
dividido em vários estágios e fases, que conduzem o Sufi através cristão, que se faça
da “šari'a”, para entrar na “tariqa” e atingir o “Haq§qa”. 13
A “šari'a” cristão. Se quiser
. . permanecer muçul-
representa a prática exotérica da busca de um crente muçulma- mano, que se case”.
no. É a prática dos princípios básicos da Lei Islâmica como pres- Neste contexto é que
surge o “hadit” anti-
suposto para adentrar-se no Caminho. A “tar§qa”, de acordo com %
. monaquismo: “Não
sua etimologia árabe, é o caminho, o meio para se chegar a algum há monaquismo no
Islã”. Para estas ci-
lugar e, portanto, o método que se segue neste percurso. Implica tações, cf. Caspar
em uma trajetória de busca esotérica e, como tal, se caracteriza (1991, p. 151-152).
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A “hirqa” é um cujo expoente é Junayd (m. 910), o grande mestre dos Sufis de
manto feito de reta-
lhos e que simboliza a Bagdad, enfatiza o estado de sobriedade (“sahw”), que prioriza
transmissão da “bara- as virtudes, em oposição ao estado de embriaguez ou intoxicação
ka” do “šayj”.
(“sukr”), que caracteriza-se pelos êxtases, locuções teopáticas,
iluminações e pela “aniquilação” (“fan~'”) em Deus. Desta se-
gunda tendência, chamada por Palácios de Sufismo H eterodoxo,
dois nomes são significativos: Bistami (m. 874) e H allaj (857-
922), que foi discípulo de Junayd e terminou sua vida preso e con-
denado à morte, incompreendido e visto como herege pela orto-
doxia muçulmana.
Quanto à questão da forma de aproximação do Sagrado, uma
outra distinção possível caracteriza o Sufismo em Metafísico –
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O que não quer cujo representante máximo foi Ibn 'Arab§22 (1165-1240) – e ou-
dizer que Ibn 'Arab§
se restringisse à tro que se concentra na experiência amorosa como meio para a
metafísica, pois um união mística, tendo como representantes Rabi'a al-Adawiyya (m.
contato maior com
sua obra revelará 801), Du l-Nun al-Misri (m. 859) ) e) Rãm§ (m. 1256).
outras facetas nela Quanto à questão da concepção acerca da finalidade do Su-
presentes.
fismo, ou seja, a união mística com Deus, também se pode dis-
tinguir, segundo Louis Gardet (1981, p. 126), duas tendências,
já observadas por Ibn H aldun: uma de irradiação da vida divina
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no coração do fiel, “tajalli”, segundo a qual o fiel deve ter seu co-
ração polido como um espelho para irradiar da melhor forma a
Divindade e seus Atributos; e outra, a “wahda”,. que apregoa a
unidade ou identidade de substância entre a Divindade e o fiel. A
primeira identifica-se com a união intencional de amor e de von-
tades; a segunda, com a união de substâncias, embora isto não
signifique, a priori, a afirmação de um monismo substancial. Na
primeira concepção se encontram os Sufis anteriores ao século
XIII (Rabi'a, H allaj, H asan Basri). A partir deste período, cres-
cem os adeptos da segunda concepção, “wahda”, . que enfatiza o
aniquilamento do eu (“fan~'”) frente à potência divina e, simulta-
neamente, a sua subsistência transformada em Deus (“baq~'”).
Encontram-se nesta tendência Ibn al-Farid e Ibn 'Arab§ (Cf. tam-
bém PAREJA, 1975, p. 291).
CONCLUSÃO
ABSTRACT
In the face of the contemporary Islamic reality and seek-
ing to be attentive to the diversity of voices that we can
find in the “other”, this article aims to show briefly what
Sufism is, thinking it as a possibility – amongst many – of
the realization of the Islamic faith. To articulate this, the
article will begin looking at understanding of how the news
about its existence arrives in the West, that is, how west-
erners “discover” it. Then, the article will focus on the
search to understand Sufism from its relationship with
Islam through its primordial origins: the Koran and the
Prophet Muhammad.
. Finally, this article will look briefly
at some elements that make up and characterize the rep-
ertory of beliefs and practices of several Sufi schools, such
as the search for the Divine Unicity, the meditative prac-
tice of the recitation of the Divine Names and the submis-
sion to a Šayh orientation.
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Key words: Sufism; Mystical Islamism; Orientalism.
Referências
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