Ranieri, r. a. - o Sexo Além Da Morte
Ranieri, r. a. - o Sexo Além Da Morte
Ranieri, r. a. - o Sexo Além Da Morte
"A mais poderosa força que existe no organismo espiritual depois da força da mente é o sexo.
Nele, Deus concentrou montanhas de energias. Liberadas indiscriminadamente, conduzem o
ser à desilusão, ao desgaste e até à morte espiritual. É certo que toda a energia da natureza
pode ser recomposta com facilidade. Na crosta terrestre, o homem ainda não tem idéia exata
do que representa a sexualidade. Nem se deve condenar a sexualidade nem se deve exaltar
demasiado as suas alegrias. Sexo como tudo que Deus fez deve se enquadrar na Lei do
Equilíbrio. Não há crime algum em coisa alguma que Deus fez."
Estas palavras extraídas do presente livro, servem para dar ao leitor uma idéia do seu alto
teor de espiritualidade.
Não se espantem os leitores com o título dado a esta obra, pois ela mais do que nenhuma,
encara corajosamente o problema do Sexo dos Espíritos.
A atualidade do assunto levou o nosso querido R. A. Ranieri a derramar luzes sobre a
situação dos Espíritos ainda encarnados e dos que já partiram, quanto ao problema sexual.
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DAG GRÁFICA E EDITORIAL LTDA. / Av. N. Senhora da Ó, 1782, tel. 857-6044 / COM FILMES
FORNECIDOS PELO EDITOR / Imprimiu / 10ª Edição -Do 44º ao 46º milheiros / agosto – 1991
Nota: A Diretoria desta Editora não possui remuneração e objetiva a divulgação da Doutrina Espírita
e do movimento da Fraternidade. / Capa: William J. Tardelli / Produção Editorial: Edifrater
Desenrolar-me das faixas do organismo físico tornara-se assunto resolvido embora não seja fácil no
campo da consciência pura. Inconscientemente, milhares deixam o corpo todas as noites e perambulando
pelo mundo dos Espíritos, mas conscientemente, com pleno conhecimento, são poucos. Muitos, após
identificarem essa situação, comprazem-se em esperar o cair da noite para mergulhar no outro lado da
vida. Vagueiam a esmo ou buscam deliberadamente determinados locais onde satisfazem as suas
necessidades ou paixões.
Naquela noite, estávamos aprazados para uma visita especial.
Eleutério fora designado para acompanhar-me. Preocupava-me ultimamente o desenlace final ou a volta
ao mundo espiritual e, percebendo-me talvez a inquietação íntima, amigos de planos superiores
atendiam-me o justo anseio de aprendizado.
Percebi que Eleutério envergava roupagem de tonalidade verde escuro ao invés da túnica luminosa dos
Espíritos superiores. Era na realidade, como eu, uma criatura normal. Nada dizia nele que vinha de
esfera diferente.
-Vamos, disse-me o mensageiro. Como sabe, recebi ordens de acompanhá-lo e orientá-lo no lado de cá.
Quero cumprir fielmente a minha missão!
Disse isso e sorriu significativamente.
-Hoje visitaremos alguns amigos que sofrem as dores das paixões sem remédio...
Olhei Eleutério surpreendido.
-Como, aqui também, há paixões sem remédio?
-Sim, aqui é que as paixões são sem remédio, disse ele. Aqueles que se amam desesperadamente buscam
se encontrar a qualquer preço e geralmente se encontram quando vibram na mesmafaixa vibratória. É
mais fácil vencer as convenções sociais...
-Então, vamos! -retruquei alegremente. Há muito desejo conhecer aqueles que vivem uma vida
diferente .
Alçamos vôo silencioso ao simples desejo de partir. Na realidade deslizamos no espaço. As coisas
ficaram atrás sem que o percebessemos detalhadamente. Parecia-nos um filme que se desenrolava em
nossa mente.
Em breve penetrávamos em movimentada avenida da Capital Bandeirante, suntuoso edifício, palacete de
ricos, e buscávamos a alcova de respeitável casal. No leito, duas criaturas repousavam e a sua respiração
ofegante mostrava que algo especial estaria ocorrendo com elas.
-Sentiram-nos a presença -explicou Eleutério -e por isso, se afligem à nossa aproximação. Casal
relativamente moço. Ela com uns 35 e ele com 45 anos.
-Busquemos o marido primeiro -esclareceu o Guia.
Observei que dizendo isso, Eleutério pegava nas mãos com muito cuidado um fio escuro que partia da
cabeça ligado a outro que saia do umbigo do homem. Examinou-os e disse:
-Sigamos nesta direção. Acompanhei-o intrigado.
Em breve, alcançamos estranho bordel, escuro, repleto de fumaça e bebidas onde criaturas de caídas
mergulhavam no desvario das paixões mais infelizes.
A uma mesa, sentado com uma mulher horrível, o homem entregava-se às mais baixas e tor-pes atitudes.
Assustei-me ao verificar o seu fácies desfigurado e decadente. Os olhos empapuçados, flácidas as carnes
do rosto, enfim, completa e suprema decadência moral. A mulher era uma dessas infelizes que aparecem
nas ruas de Paris mendigando um pouco de amor.
-Est
á vendo? -perguntou Eleut
ério. Esse coitado passa a vida desse jeito. Durante o dia
é fi
gura decente e respeit
ável da sociedade paulista, mas
à noite busca os lugares como este para dar vaz
ão ao seu anseio de desregramento.
Aproximamo-nos dos dois para ouvir o que falavam.
-Como você sabe, -dizia o homem -minha vida com ela é muito infeliz. É uma criatura boa mas não me
ama nem me compreende. Durante toda a minha juventude, após o casamento, e isso já fazem mais de
dez anos, negou-me carinho, afeição, amor. Nos primeiros tempos, reagi muito e me esforcei por manter
uma atitude compatível com minha posição social. No entanto, a fome de sexo conduziu-me pouco a
pouco a estes lugares, onde de alguma forma encontro o prazer e a alegria que ela me nega. O que fazer?
Traí-la publicamente não posso. Falta-me coragem para desafiar a sociedade. Ainda respeito lá os
homens. Fujo, pois, para esta região onde as mulheres como você me satisfazem os anseios de
animalidade.
Vi que o homem chorava. Talvez tocado pelas vibrações de nossa presença. A mulher, mentalmente
muito inferior, não compreendia bem o drama do homem e respondeu:
-Não faz mal, deixa pra lá! Eu estou aqui para consolá-lo e lhe darei aquilo de que você precisa!
Parece que o intimo do homem se revoltou com a naturalidade da mulher porque afastou-a com um gesto
brusco e saiu dali cambaleando pela porta à fora.
-Voltemos -falou Eleutério. Ele agora buscará a casa e retornará às faixas do corpo físico.
Não demorou e retornamos ao interior do palacete onde a senhora dormia em paz, silenciosamente. O
homem retomou o corpo com violência e acordou assustado como quem pressente alguém no quarto mas
não teve coragem de acordar a esposa. Olhou-a e tornou a dormir, agora menos agitado.
II -Ela
Em breve atingíamos zona mais descampada. No alto de pequeno outeiro erguia-se majestoso edifício,
antigo colégio de freiras Carmelitas, que passaram a vida encarceradas em silenciosos cubículos
esquecidas do mundo.
Estranhei o lugar. Eleutério, porém, alertou-me:
-Aqui ainda permanecem muitos Espíritos de freiras que continuam praticando o jejum, o cilício e os
sacrifícios inúteis, aliados a uma renunciação, agora incompreensível para todos. Agarram-se às formas
de pensamentos estereotipadas pela sua vontade de atingir o Cristo pela renunciação mal orientada e com
isso ao invés de subir espiritualmente, estacionam no tempo como prisioneiras comuns que se
prendessem a si mesmas. Jamais nesse caminho conquistarão o paraíso que sonharam.
Entramos. A nossa passagem, muitas delas espantavam-se surpreendidas com nossa presença, que lhes
parecia absolutamente incompreensível. Outras nada percebiam, tão embebidas estavam em suas
orações. Faces encovadas, pele sem cor, amarelada talvez pelo tempo. Algumas trabalhavam, andando de
um lado para outro, conduzindo objetos caseiros. No salão principal de refeições, naturalmente, animado
outrora por aquelas que eram as servidoras das encarceradas, encontramos bela figura de mulher
debruçada sobre pequeno móvel que simbolizava mesa, vestida de branco, com singela roupa de irmã de
caridade, mantinha o pensamento distante, talvez em longa oração.
-Não, não está orando, disse o Benfeitor. Está meditando, preocupada com o marido.
Evidentemente, a manifestação de espanto expressa em meu rosto, lembrou a Eleutério que eu precisava
de melhores esclarecimentos.
-Meu caro, este Esp
írito
é apenas a esposa daquele homem que visitamos. Nas horas mais si
lenciosas da noite, deixa o corpo e busca este recinto, onde outrora praticou como irm
ã Carmelita a mais terr
ível renuncia
ção. Agora, casada, n
ão consegue aceitar o marido sexualmente e este que lhe tem, na realidade, profundo amor, mas que no
entanto, ainda sente a fome sexual pr
ópria daqueles que estacionam em certas faixas vibrat
órias, busca espiritualmente os lupapanares e mergulha na lama escura dos desvios mais terr
íveis.
Contemplei Eleutério imensamente surpreendido.
-Mas, e ela? Não tem responsabilidade espiritual?
-Sim, tem responsabilidade espiritual muito grande. No Ministério da Evolução os assentamentos
relativos a ela são muito extensos. Espírito antiqüíssimo, vem ela da Grécia de Orfeu e dos Mistérios das
mais puras sibilas. Em Roma envergou a túnica das vestais. Possui de fato um passado de pureza sexual
e moral de enorme respeitabilidade, contudo, assumiu o compromisso de ajudar a elevar espiritualmente
o companheiro e defender-lhe a honra. E isso ela só poderá fazê-lo evitando que ele venha a cair em
tentação na carne e se perder. Por sua vez, Espírito de prodigiosa força de caráter, forjado nos circos de
Roma, e nas lutas dos Exércitos Romanos, mantém ele no mundo a aparência do homem correto e
honesto. A noite, porém, liberto dos laços que o prendem à carne, busca as satisfações mais fáceis ao
lado de companheiros desprezíveis.
-E o retorno à carne? -Interroguei. Não guarda ele lembranças?
-Guarda vivas lembranças. Ao acordar recorda às vezes muitas passagens de suas orgias noturnas, mas
leva à conta de sonhos ou pesadelos. É lógico que na vida comum de relação, os problemas sexuais
vêem-lhe permanentemente ao pensamento e a presença feminina sempre o perturba um pouco.
-Somos criaturas como você, querida amiga, e não vemos motivo para permitir tal coisa.
Humildemente pareceu aceitar a situação.
-A que devo a honra da visita, então? -quis saber.
-Estamos em passeio de estudo, afirmou Eleutério. Somos aprendizes das coisas de Deus e viemos visitar
este colégio onde tantas irmãs praticam a renunciação.
Agradeceu com um olhar.
-Parece-nos, contudo, aventurou Eleutério, que algumas freiras levam muito longe a renunciação...
-Você está muito enganada, reafirmou o Guia. Sua responsabilidade nesse caso é das maiores. Você já se
esqueceu dos compromissos que assumiu para com ele? Um desses compromissos é justamente o de
defende-lo das forças inferiores que tentarem atraí-lo para o seu raio de atividade pecaminosa desviando-
o dos sagrados compromissos com Jesus.
Ela calou-se ao ouvir o nome de Jesus.
-Está bem. Vou pensar. Todavia, continuo acreditando firmemente que sexo é imundície!
Despedimo-nos e Eleutério, batendo levemente nos meus ombros ensinou:
-Nem sempre a Lei que nos governa é a Lei de Deus. Ela foge de uma Lei mas cairá no domí nio de
outra mais rigorosa. Aqueles que fogem dos compromissos da Divina Lei precipitam-se ver-
tiginosamente nos braços da dor que é Lei de Ferro.
III -Sexo
Evidentemente, eu fora despertado para o estudo do problema sexual em face da espiritualização. Como
seria considerado no plano superior e mesmo no plano simplesmente espiritual, a sexo?
Meus pensamentos dominavam-me intensamente a casa mental. Na realidade, o problema daqueles dois
talvez fosse apenas o problema de todos...
Eleutério, Espírito de certa envergadura, provavelmente lia-me os pensamentos, porque, repentinamente,
falou-me:
-O problema sexual não se restringe somente à esfera da carne ou à crosta terrestre. Ele vai mais além do
comum entendimento humano. Sexo, nas esferas espirituais, não significa apenas macho e fêmea, órgãos
masculinos e femininos, relações sexuais. Em nossas esferas, sexo significa um conjunto de qualidades
ou características femininas ou masculinas, positivas ou negativas e neutras,
se assim se pode dizer e o ato sexual pode se processar num outro campo de vibra
ções, resultado detransfer
ências que o homem comum ainda n
ão conhece, no campo do amor.
É natural que na esfera de carne entenda o homem que sexo
é apenas a rela
ção macho e f
êmea de modo a que tudo termine em rela
ções sexuais. No entanto, em nosso Plano, sexo significa mais. Buscamos a identifica
ção das almas e a uni
ão dos cora
ções. Pode haver, no mundo, sexo sem amor enquanto que aqui geralmente nas mentes mais evolu
ídas existe amor sem sexo, considerando-se sexo
órg
ãos sexuais. Isso n
ão quer dizer que as almas n
ão apresentem os
órg
ãos sexuais. Por muitos mil
ênios ainda ostentar
ão o emblema de Ad
ão.
Sorri à apreciação de Eleutério: emblema de Adão! Só mesmo Espíritos daquele quilate se lembrariam de
dar tal nome aos órgãos masculinos!
IV -Avante
As palavras de Eleutério ainda repercutiam em meus ouvidos e o meu anseio de saber mais tornou-se
insuportável. O Espírito porém, acrescentou:
-Meu filho, a verdade deve ser dosada... Fora disso, nos arriscaremos a estabelecer a desordem na Casa
do Pai.
Conformei-me com o ensinamento. O que poderia fazer?
-Não devemos dar mais do que a mente humana pode conter -esclareceu o Grande Amigo. Não só você
ou eu, mas milhares de criaturas, no mundo, anseiam por mais verdade, no entanto, a inda, infelizmente,
não têem condições mentais para saber mais... Somos obrigados a aguardar o futuro. O campo sexual, do
ponto de vista espiritual, é terra virgem, contudo, deveremos ir devagar...
Prosseguimos. Eleutério convidou-me a visitar desagradável colônia de mulheres perdidas.
-Mas, existe isso? -surpreendi-me.
-Existe muito mais do que você pensa. O mundo da morte é apenas o mundo da vida, não é mesmo? E aí
como aqui os sentimentos são os mesmos. Ninguém atinge a santidade pelo simples fato de ter morrido.
A morte somente despe o homem da roupa de carne. A santificação é obra de cada um. Oremos, meu
filho, a oração é senha para caminhos melhores. E peçamos a Deus não nos deixe cair em tentação.
Eleutério pronunciando essas palavras emitia estranha luminosidade exteriorizada em pleno peito como
estrela da manhã.
Compreendi a elevação do seu pensamento e admirei-me que em pleno século humano da astronáutica
viessem os Espíritos superiores nos instruir sobre sexo.
A marcha agora se fazia por região escura e as vibrações que chegavam até nos eram de inquietação. Eu
já sentira coisa semelhante e até pior noutra oportunidade. Entretanto, a natureza destas novas vibrações
me inquietavam. A minha mente começavam a chegar imagens de mulheres seminuas, como se minha
mente fosse uma tela de televisão... Assustei-me e procurei armar-me com as defesas mentais
constituídas pelo acervo de sentimentos cristãos que me animavam. Só o Cristo se-ria capaz de me
salvar, pois em verdade eu me sentia ligado prodigiosamente ao campo sexual como se ali houvesse meu
Espírito sofrido através dos tempos as mais duras provas.
-Eu tenho um espinho na carne que me foi dado por satanás para me esbofetear...
Eleutério pronunciou essas palavras do Apóstolo Paulo com a intenção de me instruir. Recebias com
imensa humildade e consolação.
Se Paulo sentia na carne violentamente o espinho do sexo, ele que fora Apóstolo do Senhor e se o sentia
depois de ter conhecido Jesus, o que poderia esperar eu, velho romano das lutas mais terríveis do
Império e grego dedicado à sensualidade da Arte Helênica? É lógico que o meu pensamento ainda em
luta com o sexo se armasse da melhor boa vontade para resistir ao assédio das sombras.
V -O vale
Caminh
ávamos
à margem de extenso vale limitado por uma cerca aparentemente igual aos a
lambrados que cercam os campos de esporte, com todas as apar
ências de uma fronteira comum, na
tural.
Ante a nossa expressão de assombro, Eleutério esclareceu:
-O parque está cercado à feição das cercas habituais da terra, conquanto o material usado sejaoutro. É
necessário isso, para que as mulheres que aqui habitam temam sair. O terror à transgressão das normas
da Instituição acarretam-lhes extensos sofrimentos. Aqui, como no mundo, dificilmente podem criaturas
desse nível espiritual compreender o amor. Por isso, são disciplinadas ainda pelo terror. Na antigüidade
se dizia que "O temor de Deus é o princípio de toda a sabedoria", muito em-bora estejamos nós hoje,
lutando para que "o amor de Deus seja o principio de toda a sabedoria". De um a outro a distância é
muito grande. Só o tempo conseguirá fazer com que a mente humana aceite a regra de Jesus. Os
Espíritos endividados lutam sempre contra a aplicação ou a vivência da Lei de Deus. Nas faixas dos
submundos espirituais, viver a Lei ainda é problema complicado.
Eleutério calou-se e nós compreendemos que chegara a hora de atravessar os portões da Instituição. Lá
dentro esperavam-nos os Espíritos das mulheres perdidas, recolhidas ali por amor de al-guns.
Ainda não esboçara bem esse pensamento quando vi uma mulher desgrenhada que correra pa ra nós.
Longos cabelos desgrenhados sobre os ombros, vestido sujo, descalça... Agarrou-se à cerca e olhou com
olhares de fogo, cheios de sensualidade, tão poderosa, que sentimos que suas vibrações nos atingiam
vertiginosamente. Acompanhou-nos, à proporção que andávamos, agarrada à cerca, se estorcendo em
manifestações sexuais indescritíveis, e, de repente, antes que pudessemos prever ou supor, fez-nos um
gesto grosseiro e violento pondo a mão em seus órgãos sexuais, numa exibição de tremenda repercussão.
Enrubescemos de vergonha. Ela, porém, sorriu-nos como um animal desesperado que se oferece. A fúria
do sexo brilhava em seu olhar e o desejo mais intenso expressava-se em suas mãos crispadas.
Uma estranha coragem nos dominou o Espírito. Aproximamo-nos delas e conversamos com aquela
mulher que nos devorara antes com o olhar:
-Minha filha, falamos-lhe carinhosamente. Você é tão bela e tão pura. E dizendo isso, alisamos-lhe os
cabelos desgrenhados. Tomada talvez por aquela vibração que vinha de Eleutério, através de nós,
acalmou-se, mas me respondeu:
-Você não me reconhece? Não, não me reconhece mesmo?
Olhei-a confuso e ela esclareceu:
-Eu sou Zaira, a judia que se perdeu em Roma, no Reinado de César Augusto, e que você re cebia, muitas
vezes, no Palácio Imperial! Desde aquela época você me resiste! Já desejava ser santo!
Antes que eu pudesse prever, completamente louca, deu uma terr
ível gargalhada e escapou de minhas m
ãos:
-Santo? Quem é você para ser santo? Até hoje anda atrás desse Jesus! Que o César Nero per seguiu até os
confins do mundo! Deixe disso, você não chegará a santo! E eu não quero vê-lo mais! Estou enojada! Há
milênios recusa-me o corpo e a alma!
Grito tão lancinante e expressões tão violentas deixaram-nos profundamente abalado por dentro, na
profundeza de nosso coração! O que fazer? Não nos recordávamos absolutamente do que ela dizia nem
os acontecimentos referidos despertavam em nós qualquer lembrança...
-E ela? perguntei ao Guia. Como pode se lembrar enquanto que eu não me lembro?
-Essas criaturas -respondeu-me o amigo espiritual -trazem de maneira aguda os acontecimentos que mais
lhes preocupam o cérebro. Vivem dia e noite ruminando o passado. Sofrem desesperadamente e
entregam-se à fúria sexual como talvez a única porta aberta capaz de contê-las para que não se
precipitem em abismos mais escuros. Tanto aqui quanto no mundo o sexo funciona, além de suas
funções normais, como freio de outras paixões e violências piores. As almas incapazes de conter a força
das desgraças que as rodeiam, muitas vezes, agarram-se na satisfação sexual com verdadeiro delírio e
com isso crimes piores são evitados.
Eleutério sorriu.
-O Sexo nessas criaturas funciona como a válvula na panela de pressão... Se não houvesse a válvula, a
panela explodiria!
Olhamos o Espírito com admiração. Nunca pensáramos que a sabedoria de Deus controlasse as forças
descontroladas dos Espíritos inferiores em parte através do sexo que muita gente considerava
"patrimônio imundo"
VI -Além do vale
As mulheres continuavam a seguir-nos, agora, de mais longe.
O parque estendia-se por entre as árvores amigas e gramado verde. Elas, porém, não nos perdiam de
vista. De repente, notei um fato estranho: além da cerca, do lado de fora, magotes de ho-mens, alguns
vestidos, a maioria seminus, agarravam-se à cerca em desespero.
-O que é aquilo? -perguntei surpreendido.
-São Espíritos encarnados, meu filho, disse Eleutério, que à noitinha, deixam o corpo, no mundo, e vêem
desesperados até aqui na ânsia incontida de se encontrarem com essas mulheres...
!!!...
Diante de minha admiração, Eleutério completou:
-Aqui, dificilmente conseguem um encontro para a troca sexual das energias, mas além do Vale onde não
há nenhum controle, eles conseguem o seu objetivo. Lá, onde a vigilância da Espiritualidade Superior
não pode ainda existir, vivem eles em manifestações realmente de baixo teor vibratório, quer ir além do
Vale?
Recebi a pergunta surpreso e interessado.
-Não vim aqui para aprender? -respondi.
-Evidentemente, todo aprendizado hoje é patrimônio para o amanhã. E todo conhecimento hoje é tesouro
para o futuro. Espero, apenas, que você possa se equilibrar em face dos desequilíbrios alheios. O perigo
de ir além do Vale é o risco de cairmos, também nós, em tentação... Raros são os Espíritos que
renascendo na Terra, por mais elevados que sejam, não se sintam tentados aqui ou ali. O Mundo é mundo
de provas e tentações...
Olhei Eleutério com amor. Eu também possuía ainda um corpo de carne que permanecia no mundo como
receptor e emissor de minhas pobres energias.
Prosseguiu Eleutério:
-O corpo funciona
às vezes como amplificador ou caixa de nossos sentimentos. Outras vezes, serve-nos de fortaleza
defensiva. Nele, por
ém, os sentimentos de ordem terrestre vibram sempre com grande intensidade. N
ão h
á nenhuma imund
ície no sexo, patrim
ônio sagrado dos Esp
íritos e da humanidade, o que as vezes existe
é somente desequil
íbrio. E o desequil
íbrio deve ser por n
ós dis
ciplinado afim de que um dia alcancemos a serenidade do reequilibro. O Esp
írito retorna sempre ao reequilibro da Lei, muito embora possa ele percorrer rotas desconhecidas e
desconcertantes. Viver a Lei n
ão
éf
ácil, aquela lei que n
ós chamamos por uma quest
ão de entendimento de Lei de Deus e o ser estar
á sempre vivendo no dom
ínio de uma lei porque o Universo se rege por leis inexor
áveis. Quando sa
ímos de uma ca
ímos no dom
ínio de outra. O que existem s
ão leis de equil
íbrio e leis de desequil
íbrio. Leis de ascens
ão e leis de descens
ão. Leis que indicam que o Esp
írito sobe ou leis que indicam que o Esp
írito desce. Leis que mostram que o Esp
írito apenas marcha durante s
éculos numa mesma faixa ou leis que nos esclarecem que o Esp
írito apenas estaciona no tempo. Leis de integra
ção e leis de desintegra
ção. O Universo de Deus
é um Universo de Leis, ou seja de fatos e fen
ôme
nos que marcham numa ou noutra dire
ção. Uma esp
écie de grade de for
ças vivas que orientam a marcha viva de tudo o que existe. Tudo no Universo, meu filho,
é lei. Acostumamo-nos a conhecer por Lei de Deus a Lei do Amor. Na realidade tudo
é lei de Deus. As for
ças universais estabelecem ritmos t
ão exatos, precisos, inexor
áveis, que passou-se a chamar esse acontecimento de Lei.
Eleutério calou-se e eu vi que o seu cérebro naquela hora estava profundamente iluminado.
Estranha admiração tomou-me a alma.
-Quem seria Eleutério? A sua simplicidade não ensejava acreditar à primeira vista que era o sábio que
demonstrava ser...
Percebendo-me as indagações mais íntimas retrucou:
-Meu caro, tão grandes são ainda as minhas imperfeições que permaneço chumbado à terra junto com
todos os pecadores!
Compreendi a tirada de humildade do Amigo e para não perturbá-lo nos seus mais vivos sentimentos de
humildade, falei:
-Iremos Além do Vale?
-Iremos, respondeu ele. Espero que nós dois possamos resistir ao espetáculo!
VII -A porta
O caminho que seguíamos conduzia a pequena porta que à distância nos parecia situada na cerca. Descia
agora pequena elevação e ouvíamos cantar e murmurar as águas de um riacho que cor-ria entre a
folhagem.
-Essas mulheres recebem aqui tratamento? -procurei informar-me.
-O tratamento delas por ora consiste em viver em plena natureza afastadas um pouco domundo sexual. É
um processo de resfriamento... -ensinou Eleutério. Depois, em Instituição mais elevada recebem
tratamento psicoterápico mais adequado. Fique bem claro, meu amigo, que nós procuramos apenas
retificar e reajustar o ser a uma atividade sexual sã. A Espiritualidade Superior não busca eliminar ou
destruir o sexo. A sexualidade é estágio necessário da alma humana em determinadas faixas do universo.
Lei da Vida, porta aberta a reencarnação ou caminho da "fábrica de for-mas", entendeu?
-São doentes, esclareceu Eleutério. Tão fixados permaneceram através dos séculos nos assun tos sexuais
que criaram essas vibrações que atraem ou criam os microorganismos do sexo.
Fiquei assombrado.
Jamais ouvira dizer tal coisa. Não sabia que o sexo pela fixação mental da criatura criasse ou atraísse
formações de miasmas ou microorganismos!
-E qual a função desses seres microscópicos? -Informei-me.
Exaltam a sexualidade doentia do ser. Para se libertar deles, o ser precisa retificar-se mental e
espiritualmente durante milênios, procurando viver o bem, a verdade e o amor. Isto meu filho, são
aberrações do sexo mal orientado...
Olhei os homens que agora se constituíam de milhares, todos de pé, olhos esfogueados, como uma tribo
de índios esquisitos.
-O tempo que levaram para cair será a medida do tempo que levarão para subir ou se recuperar, disse o
Espírito, e o remédio é sempre o mesmo: obedecer as determinações das leis morais, buscando o amor
verdadeiro, a harmonia interna, a verdade a todo o custo, a renunciação e o entendimento. Só essas
regras permitirão ao ser equilibrar-se no panorama cósmico. Fora disso, só o mal nos arrastará. O Sexo
não é um mal, o mal está na orientação ou condução má dos instintos sexuais.
Acordei. Era Eleutério que me chamava à realidade. Tornei a ver aquelas caras sensuais que me olhavam
com profunda ironia. Um deles gritou:
-O de trás não é anjo, não! É como nós! Vamos arrebatá-lo! Vamos arrebatá-lo!
A esse grito, milhares de gritos ensurdecedores ecoaram pelo Vale e a turba avançou contra nós com as
mãos crispadas. Senti-lhes as garras ferozes nas pernas e nos braços. Eleutério, porém, estendeu a destra
e despediu fulgurantes raios de safirina luz que os deteve estarrecidos, como se a força poderosa
daquelas vibrações os imobilizasse a todos.
Respirei profundamente. Ainda ouvi vozes que murmuravam baixinho:
-Aquele não é anjo! Aquele não é anjo! É um como nós!
Compreendi a minha inferioridade moral e envergonhei-me de mim mesmo. Na verdade, o que eu
merecia era estar entre eles, no inferno da sexualidade atormentada!
Eleutério, no entanto, lendo-me os pensamentos, abraçou-me e disse:
-Não é verdade, você não é um deles. Você está buscando conduzir-se através do sexo disciplinado e
orientado no casamento e no lar. Já luta consigo mesmo para não voltar às faixas inferiores...
Este Vale, todavia, meu filho, é uma das regiões onde impera o pensamento sexual e são poucos os que
podem atravessá-lo sem sentir desmaios, atrações e delírios... Não pense que estamos estudando apenas
o sexo em sua forma equilibrada. Esta nossa viagem é apenas uma visão panorâmica da sexualidade no
mundo espiritual, notícia que até hoje os homens nunca tiveram. É a primeira vez que o mundo terrestre
receberá informações desse teor e nós estamos nos limitando a apresentar apenas alguns flashes...
A folhagem verde e a paisagem bucólica contrastavam com a saúde e a alegria que se irradiava de todos
eles.
Fixara meu pensamento e minha meditação nesse ponto, quando um gesto de Eleutério me deteve:
-Como, mas aqui não estamos além do Vale, onde não há nenhum controle? -surpreendi-me perguntando
a Diana.
-Sim, Eleutério tem razão esclareceu Diana. Não há possibilidade de controle porque estas criaturas são
absolutamente livres por não se submeterem a nenhuma disciplina nem aceitam nenhum governo,
mesmo o Governo de Deus, mas isso não impede que haja aqui vigilantes que acompanhem os
movimentos... No Vale propriamente, recebem tratamento e de alguma forma sesubmetem a certa
disciplina. Aqui, não. Fazem o que querem e o que sentem. É lógico que sem que saibam são governados
por leis inexoráveis do destino...
Procurei compreender o pensamento de Diana, mas senti que uma confusão se estabelecia em minha
mente.
-Não se preocupe, disse ela, a liberdade que Deus concede aos seres é de certa maneira tratamento
espiritual. As criaturas também um dia se saturam de liberdade e voltam a desejar a discipli na da Lei; o
que aqui também poderíamos classificar de ponto de saturação, em similar com os preceitos da ciência
da terra. Meu pensamento galopou pelos sertões da minha alma. “Saturar-se de liberdade”. Poderia a
liberdade saturar o ser?
-Lembre-se que liberdade é quase apenas um conceito, -falou Diana. O ser está no universo limitado em
todos os departamentos da vida. A liberdade como o homem a entende na realidade não existe, pois a
criatura é prisioneira de tudo...
Fixei a bel
íssima jovem que me falava e tive a impress
ão que a sabedoria que brotava de seus l
ábios como p
érolas vinha do fundo dos mil
ênios... Liberdade limitada? Pode-se limitar a liberdade?
-Pode-se -confirmou ela. Na terra não existe o que se convencionou chamar de "liberdade vigiada”? Em
toda parte do Universo a liberdade é limitada. Milhões de leis menores limitam o campo que muitas
vezes nos concedem as grandes leis de Deus. Em verdade, pensando-se em termos do mundo, os
preconceitos, os tabus, a disciplina, são limitações da liberdade. A liberdade libertada ainda não pode ser
concedida a seres que vivem em determinadas faixas vibratórias, tais como a da terra e destas regiões
onde estamos.
-Mas, no universo inteiro não existem condições de completa liberdade?
-Existe. Existe sim , mas só os “Grandes Seres”, aqueles que atingiram os píncaros da evolução espiritual
conquistaram o direito da liberdade sem limitações, pois que o sentimento de liberdade verdadeira, é
antes de tudo, condição interior do Espírito Eterno. Quando o Espírito atinge os mais altos cumes da
Espiritualidade Superior, conquista a liberdade ampla de pensar, de agir, de viver, de criar e de amar...
Diana sorria maravilhosamente e de seus olhos pendiam raios de sublime beleza e irradiações de
profundas virtudes.
Vi que me encontrava diante de Espírito velhíssimo que atingira o clima interior da sabedoria e do amor.
-Meu filho, não pense assim, disse ela, ainda tenho minhas limitações... Você verá em breve.
Enrubesci verificando que ela percebera-me o pensamento oculto no âmago de minha casa mental como
quem olha por uma janela aberta.
Procurei Eleutério. Estava perto de mim e acalmou-me.
XI -Os homens
Um fato diferente impressionou-me de maneira viva o Espírito.
Comecei a encontrar velhos companheiros da carne que ali estacionavam, no Circulo da Perdição, assim
era chamada a zona além do Vale. Muitos daqueles que eu encontrava todos os dias nas ruas de minha
cidade terrestre, corriam entre os faunos e as ninfas e com eles mergulhavam nas ondas do amor. Alguns
se esconderam de mim atrás das árvores ou da vegetação mais baixa, outros, porém, sorriam alegremente
e me acenavam com as mãos convidando-me a ir com eles ao encontro do amor.
Exibiam todos eles o cordão fluídico umbilical que caracteriza os Espíritos encarnados. Nem sempre o
cordão era escuro, às vezes de cor clara e nesses casos verifiquei que não se entregavam ao amor com o
desespero dos outros, havia menos animalidade.
Eleutério conduzia-me cada vez mais bosque a dentro e era comum ver grupos nus deitados pela grama,
rindo na alegria dos amantes. Lembrei-me de Paolo e Francesca da Rimini e da viagem de Dante. Nunca
compreendi tão bem o drama daqueles que morrem de amor...
Anibal estava à margem do caminho. Velho amigo de infância sorriu para mim.
-Você aqui? -Disse ele. Vejo que vem vestido com a túnica dos bons...
Disse e sorriu.
Senti-me enrubescer. Pareceu-me que zombava.
-Você sabe que sou pecador.
Eleutério havia parado um instante para permitir-me conversar com ele.
Milhares de Espíritos iguais a Aníbal aproximavam-se de nós ansiosos por escutar a conversa.
-Sei que é pecador mas hoje está com a túnica dos anjos, acompanhando um anjo!
-Meu caro Aníbal, falei-lhe, sempre fomos amigos e não compreendo porque agora me hostiliza!
Pareceu compreender-me porque se desculpou e disse:
-Bobagem minha, quando somos encontrados em culpa procuramos sempre atacar os que são bons. Sei
que você é Espírito ainda imperfeito mas vem lutando por se espiritualizar. Sei que estou errado, mas não
tenho outra solução para a minha vida. Quando meu corpo dorme venho espiritualmente para aqui, eu, e
como você vê, milhares como eu. Aqui encontramos a satisfação sexual que nos é negada na terra...
Mas você, Aníbal, sabe que nós Espíritos estamos em evolução. Porque não busca o caminho do
progresso espiritual?
-Não tenho condições. Sou muito atrasado..
Atrasado como? Todos nós estamos avançando.
Ouvindo-nos, Eleutério interferiu:
-O sexo não é empecilho a evolução. Pelo contrário, é porta aberta para a evolução. Não é através da
reencarnação que os Espíritos vão alcançando maior progresso? O sexo é porta sagrada. A extravagância
sexual é que enfraquece o corpo físico e o perispírito do homem. As forças eletromagnéticas dos veículos
corpo e perispírito tendem a enfraquecer-se ou a gastar-se com o exercícioindiscriminado da sexualidade,
apenas isso... É como se uma bateria se descarregasse pelo uso excessivo. O celebro material sem a carga
eletromagnética necessária, enfraquecido, não tem condições de alçar vôos para o pensamento mais alto.
Daí terem os religiosos do passado caído na situação oposta e absurda de tentar a castidade absoluta.
Para manter-se uma absoluta castidade, também é necessário que o ser tenha progresso e evolução
espiritual. A castidade para o homem comum ou mesmo para aquele que progrediu muito espiritualmente
mas ainda não alcançou a beatitude é medida prejudicial porque a criatura encarnada tem a
responsabilidade da criação das formas... Olhei Eleutério e vi que ele penetrava agora no campo secreto
dos conhecimentos sexuais do Espírito e fiquei amedrontado.
-Tudo no universo pode espiritualizar ou materializar, depende apenas da fixidez de nossa mente. Onde
fixamos a mente colocamos ali o coração e o perispírito passa a adquirir menos velocidade vibratória e
com isso tende a se imobilizar ou a enrijecer-se.
Aníbal contemplou-nos espantado.
-Meu caro Aníbal, falou-lhe Eleutério, pousando-lhe as mãos nos ombros, sei que você é grande
estudioso dos problemas psíquicos e tem fome espiritual de Jesus Cristo, sua alma anseia por progredir e
crescer no Espírito, somente verifico que está preso demasiadamente à ânsia sexual nas lutas consigo
mesmo num conflito estabelecido pelos preconceitos sociais e pela falsa moral religiosa de nosso tempo.
Sexo, meu filho, não é imundície nem imoralidade. É oportunidade de entendimento entre as criaturas e
chance de transfusão de fluidos. Quando duas criaturas se amam verdadeiramente, através do sexo e do
ato sexual elas se transfundem as vibrações psico-físico-espirituais de que são portadoras e dão e
recebem energias extraordinárias para a marcha da vida. Há euforia e grandeza moral e espiritual.
Quando, porém, a fixação sexual é demasiada ou exagerada, pode a criatura cair no esgotamento nervoso
ou no desgaste e embrutecimento perispiritual, mas apesar disso, perante Deus, não há pecado. Deus que
criou o sexo não o fez nem moral nem imoral, fê-lo natural e simples para alegria do homem e da mulher
e para progresso dos Espíritos. Sexo é obra divina e o Criador se compraz em verificar que através dele
os seres avançam universo a dentro ao encontro de maiores possibilidades e alcançam cada dia maior
ascensão espiritual. O sexo sublimar-se-á através dos tempos e por ele, os seres que gravitam nas
sombras encontrarão o entendimento maior e se aproximarão do Reino de Deus. Você não se lembra de
Paulo, o apóstolo? "Não vos defraudeis uns aos outros" porque é melhor casar do que abrasar"?
Esse problema é problema velho, mal compreendido pelos homens e mal divulgado por certos padres da
Igreja Católica que não puderam entender a orientação dos iniciados e a deturparam. A lém disso, você
não sabia que Pedro tinha sogra. Quem tem sogra tem ou teve esposa...
Rimos todos ante as expressões de alegria de Eleutério.
An
íbal fitava-o surpreendido e percebi que seus olhos irradiavam uma nova luz.
-Mas, Senhor, e a minha presença noturna aqui neste Vale de Perdição constantemente?
O Guia respondeu:
-Aníbal, perdoe-me, Senhor só, Jesus Cristo. Quanto à sua presença no Vale é resultado de suas
necessidades de satisfação sexual. Não encontrando em casa, a compreensão da companheira, é natural
que você a procure em algum lugar. Aqui se reúnem companheiros seus de outras vidas e almas afins que
o amam verdadeiramente, assim o encontro é fatal. Nós vivemos submetidos a leis inexoráveis e as leis
do pensamento ainda são as mais poderosas. Evidentemente, o controle e a disciplina das energias
sexuais, no campo psico-físico dão ao ser novas dimensões além da animalidade, mas a natureza não dá
salto e a paciência do homem há de levá-lo, no futuro, a zonas mais elevadas de espiritualização. Uma
coisa posso lhe dizer, meu caro, sexualidade não é crime...
Dizendo isso, Eleutério bateu, amigavelmente, nas costas de Aníbal e esclareceu:
-Agora temos que andar mais um pouco, contudo lhe prometo que voltaremos a conversar em breve.
-Nada, -respondeu Diana -que provavelmente via o meu pensamento. Nada, meu amigo. Nesse estágio
de evolução em que se encontra Aníbal, muito pouco se fará por ele. A luta sexual que o domina é muito
grande. As energias que se lhe esvaem do ser são energias poderosas que se renovam na satisfação do
próprio sexo. Há duas intensas e poderosas fontes de energia no homem: a fonte mental e a fonte sexual.
Ambas se equilibram permanentemente. Uma é a força renovadora do mundo e do universo que cerca o
homem e que se manifesta através da inteligência nas atividades de cada dia, e a outra é a energia
criadora das formas físicas que buscam realizar a obra da criação divina para evolução dos seres. A
primeira é força de atividade e realização; a segunda é energia de manutenção e permanência do homem
na Terra. Sem o sexo não haveria homem no mundo e não haveria oportunidade de evolução, para os
Espíritos que vibram na faixa dos mundos semelhantes à terra. São mundos de reencarnação que exigem
formas físicas. Naturalmente, Deus, em sua Sabedoria determinou que o potencial do sexo se constituísse
de extraordinária e poderosa força, de modo a que o homem não se desinteressasse de sua criação e
ficasse interrompida a possibilidade de evolução espiritual. Por outro lado, vemos que esse fato existe
em toda a Natureza, desde às plantas e os animais até às próprias aves e os insetos. Sexo é Lei da Vida.
Você, já
Diana não ouviu
sorriu. isso? longo e maravilhoso. A nossa volta os faunos dançavam a dança do amor e os
Um sorriso
Espíritos dos homens cantavam estranhas canções sexuais.
Tomáramos o caminho íngreme que ia dar numa clareira onde as crianças de quinze, dezoito e vinte anos
brincavam entre as flores.
Pareciam-me pássaros de alvíssima beleza. Estranhei a mudança repentina de cenário e Diana explicou:
-Aqui se reúnem aqueles que caíram na terra, na expressão do mundo e que buscam de algu ma forma a
satisfação sexual.
Vi que todas elas mantinham o cordão fluídico que as ligava à terra.
Rodeavam-nos alegremente e buscavam-me com os olhares e com as mãos, pois que muitas delas vieram
abraçar-me e até desejavam beijar-me ansiosamente. Por que permitiriam Diana e E leutério que isso
acontecesse?
A princípio atemorizei-me. Depois senti prazer e sorri para elas.
Bateram palmas e riram. Senti ondas de amor invadir-me o organismo espiritual e compreendi que me
embriagava de amor. O que fazer! Nossos guias pareciam ignorar o que se passava comigo.
A algazarra das meninas cresceu assustadoramente e vi que estava agora envolvido por centenas de
las que me arrastavam felizes para um pequeno bosque. Suas m
ãos leves e quentes alisavam-me o corpo e senti o h
álito perfumado de suas bocas juvenis. Uma vertigem jamais sentida dominou-me por completo e minha
alma estava a ponto de se perder. Ao mesmo tempo eu mesmo me entregava ao amor. Nada fizera al
ém das car
ícias, mas s
ó aquilo deixou-me exausto e perturbado. Ap
ós, corre
ram em gritaria e deixaram-me ali ca
ído e sozinho. Um grande sil
êncio envolveu o bosque. N
ão vi mais Diana nem Eleut
ério. Ao meu lado apareceu uma criatura pequenina e feia que ria para mim sarcasticamente, um
verdadeiro an
ão e me convidou:
-Você não quer conhecer o Vale? Não veio aqui para isso?
Surpreendi-me dizendo-lhe que sim e estendi-lhe os braços para que me levantasse.
Riu e levantou-me com extrema facilidade como se eu fosse uma pluma e levou-me bosque a dentro.
Não poderia dizer o que se passava comigo. Apenas sabia que meu ser se comprazia naquelas ondas de
amor físico que vinham de todos os lados.
-Quem é você? -perguntei.
-Kunter -falou ele. Trabalhei com Wagner na ópera alemã. Conheço todo o Vale e espero a-tender o
pedido de Diana.
-Pedido de Diana? -espantei-me.
-Sim. Diana preferiu que você conhecesse o Vale por meu intermédio. Também presto serviço secreto
neste Vale.
Admirei-me da facilidade de exposição de Kunter.
-Serviço secreto?
-Sim. Serviço secreto. Muitos Espíritos como eu veêm aqui como se viessem se divertir igual aos outros
mas, na realidade são elementos de informação de departamentos mais adiantados. Quando notamos
alguma melhoria mental em algum Espírito, assim como no caso de Aníbal, comunicamos o fato, e logo
vem o auxilio para retirá-lo e interná-lo em hospital ou educandário especializado. A maioria dos
Espíritos, porém, que vêem aqui é de Espíritos dominados pelo pensamento sexual e que não encontram
satisfação na terra.
Vi que ali também havia uma criatura certamente bem esclarecida e talvez mais sábia do que eu julgava.
Caminhei com ele. O bosque aumentava de tamanho à proporção que andávamos. Não sei porque mas
senti-me encorajado, apesar de não ver mais Eleutério e Diana. Sabia que eles não me abandonariam e
que no momento oportuno estariam comigo. Por outro lado, Kunter me inspirava imediata confiança.
Percebi que dele se irradiava estranha força de decisão e firmeza. Vi também a imensa facilidade com
que se movimentava no Vale e percorria o bosque como se estivesse em ca sa. Tailan estava deitado
quando Kunter foi falar com ele. Ela, ao lado do anão um verdadeiro gigante.
-Tailan, falou Kunter, trago um amigo que quer conhecer os seus domínios. A figura que eu encontrava
agora não era assustadora mas possuía o olhar de um felino e o corpo atlético de um es portista das
olimpíadas. Fitou-me demoradamente, e, depois disse:
-Onde foi você arranjar esse espécime, Kunter?
-Vem da Crosta e quer estudar a sexualidade no campo do Espírito.
-E tem ordem? -quis saber, desconfiado.
-Tem sim, Tailan, informou Kunter.
-Pergunto porque você sabe, vir aqui todo mundo pode vir, porém para estudar é preciso ordem. Além
disso, esse daí é protegido do Cordeiro e eu não quero encrencas nem com o Cordeiro nem com os
Dragões...
Meu negócio é outro, não tenho partidarismo.
Kunter respondeu:
-Compreendi; voc
ên
ão quer complica
ções
···
-Você sabe, retornou ele, não entro nessa briga de anjos com demônios. Cuido de sexo, desenvolvo o
meu negócio, e não busco nem Deus nem o Diabo!
Eu estava admirado com a conversa. Então havia aquilo? Poderia alguém ficar afastado de to-dos, das
leis de Deus ou da força dos demônios?
Ele mesmo sem saber talvez me respondeu às indagações.
-Aqui onde vivo sou neutro. Respeito o Cordeiro e respeito os Dragões. Aceito as leis de Deus e obedeço
ordens dos Dragões. Mas sempre que posso fico livre dos dois! Sabendo isso, vocês podem andar por aí.
Cooperarei. Aqui todos são livres e o sexo é o que há de mais importante entre nós. Só cuidamos disso.
Queremos viver! Queremos viver!
Kunter concordou com um gesto humilde de cabeça e falou:
-Vai nos acompanhar?
-Mais tarde. Podem andar à vontade e ver o que quiserem. Tudo é nosso e todos amam. Aqui neste
bosque não há outra coisa senão o amor livre e não há ódio de espécie alguma. Todos amam, todos
amam!
Tailan abriu os braços e cantou uma canção profundamente sensual na qual as palavras diziam do corpo,
dos órgãos sexuais e da satisfação de amar.
A voz de Tailan era belíssima e extraordinariamente atrativa. Lembrei-me da lenda das sereias.
-Não se deixe envolver, sussurrou Kunter. A melodiosa voz de Tailan e a sua sensualidade são forças
perturbadoras neste Vale.
De fato, logo começaram a aparecer homens e mulheres de beleza excepcional. Não eram mais meninas,
e sim criaturas adultas, bem formadas, e algumas vinham vestidas com longos e transparentes vestidos
coloridos que, mais que a nudez, me impressionavam a sensibilidade sexual. Braços roliços e seios que
me feriam a acústica da alma. Senti outra vez as ondas do amor que evolavam delas.
Lembrei-me de nossos amigos Diana e Eleutério, contudo, não me atrevi a chamar por eles. Kunter
apertou-me o braço e disse:
-Passemos! Passemos!
A energia com que disse, deu-me um ânimo desconhecido e atravessamos em meio àquelas criaturas que
me alisavam os cabelos e passavam as mãos em minhas espáduas.
-Vem! Vem! meu amor! -clamavam elas.
-O que fazer! uma cruel angústia tomou-me a alma. Voltei meu pensamento para o Cristo e O vi
Crucificado no alto do Calvário! Pendido sobre o peito parecia-me enviar a sua mensagem de renúncia e
dor.
Essa imagem pareceu-me um bálsamo e as mulheres, instantaneamente se afastaram e murmuraram
entre si:
-Ele é filho do Cordeiro! -e se afastaram mais ainda.
Agruparam-se numa pequena elevação e me contemplaram como quem contempla alguém muito
respeitável ou então um enfermo tomado de lepra.
-Vamos! -insistiu o anão. Ore e passe!
Orei e passei. Atrás de nós ficou um perfume inesquecível de amor carnal e físico. Jesus, porém, vibrava
na minha alma como a única e última esperança.
-Cuidado, meu amigo, com o pensamento nestas regiões. Estas mulheres impregnam o ambiente de
tantas vibrações de sexualidade que dificilmente um Espírito menos prevenido consegue resistir. O amor
físico é como o mel, doce da doçura suave das coisas que nos arrastam. Não mergulhemos em
meditações em torno delas porque correremos o perigo de nos perdermos!
O sexo é obra divina e como obra divina tem os atrativos das coisas de Deus. O prazer de a-mar ainda é
um dos irresistíveis prazeres que dominam a humanidade. Se você não reagir imediatamente, jamais
sairá daqui! Ficará imantado a elas como a limalha de ferro ao imã. Poderá ir mas voltará sempre!
Em face dessas palavras que me atingiram fortemente o coração, fiz violenta reação e me reajustei ao
pensamento superior. Uma brisa suave banhava agora a nossa testa e pude esboçar um sorriso leve de
compaixão para comigo mesmo. Ainda era muito frágil e, terrível, o caminho que conduz ao prazer da
carne!
Logo após, encontrei de novo Diana e Eleutério. Estranhei encontrá-los na frente mas não perguntei
nada. O caminho agora era mais escuro, as folhagens sombrias e Kunter pediu licença para se retirar
dizendo que ia avançar para preparar a nossa chegada... Pensei comigo: -onde iremos chegar? Calei-me,
porém. Não me competia indagar. Apenas senti que qualquer coisa no ar sufocava-me levemente a
garganta, que o ambiente estava se tornando menos respirável e que a impressão se tornava diferente da
inicial.
-O amor e o sexo não estão na carne nem no perispírito -disse Eleutério tomando um ar professoral. O
sexo especialmente está no Espírito, na alma. Muita gente alega que a carne é fraca. Não existe fraqueza
da carne, o que existe é evolução maior ou menor do Espírito. Tudo, no ser, está na mente. A sexualidade
e o amor também estão na mente e não na carne. A carne e o perispírito são redes eletromagnéticas de
alto potencial, acrescidas, no caso do corpo físico, do material de que se compõe o mundo no qual está
vivendo o ser. Apenas isso. Ela é normal e é obra de Deus. O instinto ou necessidade de procriar, força
extraordinária da natureza, é que lança o macho e a fêmea na lutasexual. Não há nisso pecado nem
crime. É a natureza que se expressa através das formas de maneira a preservar as próprias formas,
renovando-as e recriando-as.
Sexo é potencial divino. O uso exagerado, como já dissemos, poderá levar o homem ao embrutecimento
e a animalidade mais violenta, mas o uso controlado poderá mantê-lo perfeitamente no seio da criação
equilibradamente. O que pode haver em todos os departamentos do universo é so-mente equilíbrio e
desequilíbrio. Quem se desequilibra sofre para readquirir o equilíbrio. Essa luta para a conquista do
reequilibro é que é sofrimento ou dor. Não há pecado nem Deus pune ninguém.
Suas leis funcionam como o mais exato rel
ógio e todos est
ão sujeitos a essas leis, frias, duras, ine
xor
áveis, mas perfeitas.
Eleutério parou de falar e bateu-me nos ombros amigavelmente. Sorri para ele agradecido. Os
apontamentos eram de molde a nos fazer meditar profundamente.
Senti que no silêncio que se estabelecera à nossa volta pairava a Sabedoria Infinita de Deus.
1
Lembrei-me de Atafon instintivamente. Evidentemente a região onde nós estávamos não era a zona dos
abismos e sim apenas o espaço que sobrepaira a crosta terrestre. Estávamos somente no espaço aéreo,
não nas profundezas da terra. No entanto, Diana, Espírito Infinitamente inferior a Ata fon, parecia-me
ainda assim, um anjo.
Aquelas lembranças me vinham à mente, provavelmente, pelo fato de estarmos penetrando em zona
escura e fétida, esquisita, diferente do bosque que percorrêramos onde o amor livre se misturava às
figuras de helênica beleza. Senti, por instinto, que agora descíamos a região semelhante às regiões do
2
Abismo .
Eleutério enchera-se de seriedade e Diana caminhava lépida, mas com aspecto grave.
Súbito, apareceu-nos Kunter.
-Senhor, disse ele, a Eleutério, tudo está preparado. Falei com Deucalion.
-Aqui, meu filho, esclareceu Eleutério, não é propriamente zona livre e sim região mais ou menos
controlada. Os Espíritos que aqui vêem estão em tratamento espiritual.
De fato, à proporção que avançávamos, divisei ao longe um edifício de torres pontiagudas que se perdia
no céu, lembrando os palácios antigos. Jardins imensos e numerosas entradas assinalavamlhe a
construção. Alguns animais pareciam pastar também em enormes campos verdes que surgiam de inopino
à nossa Visão.
Entre nós e a edificação, porém, havia grande distância que se interpunha àquela zona escura de cheiro
nauseabundo.
-Lá fica o Sanatorium, falou Diana apontando com a mão, contudo, teremos que atravessar o Vale da
Morte, extensa faixa onde estacionam os Espíritos que iniciaram o desgaste da forma perispiritual pelo
exagero do exercício sexual. É lógico, meu caro, disse dirigindo-se a mim, que nessa primeira incursão e
nestas primeiras notícias que enviaremos à terra sobre sexo, no plano espiritual,não mostraremos nem
contaremos tudo. É de boa técnica pedagógica do Mundo Espiritual que toda a verdade transmitida à
terra seja dosada de conformidade com a possibilidade de percepção e assimilação daqueles que vão
recebê-la. Não podemos dizer mais nem ensinar mais do que aquilo que a média geral da humanidade
pode receber. Alguns discípulos ou iniciados recebem em particular muita informação mais adiantada,
todavia, ficam obrigados a não revelar. Pelo seu próprio adiantamento sabem eles que não devem fazê-
lo. Se dermos mais que a humanidade pode assimilar estabeleceremos a desordem na Casa do Pai e a
perturbação
Diana falou nas mentes
e sorriu humanas.
para nós. Compreendi perfeitamente o esclarecimento. Por diversas vezes já fora
alertado desse fato. Realmente, no plano espiritual há recomendações severas com referência ao envio de
revelações a planos ou criaturas que não atingiram ainda o clima interior necessário para entendê-las. As
vezes preferem as Forças Espirituais que a notícia venha aparentemente incompleta. Afirmam que será
melhor. Paulatina e gradativamente serão transmitidas novas noticias que virão esclarecer os pontos
aparentemente incompreensíveis. Ensino mais demorado, porém seguro.
Meditávamos nas anotações daquela hora quando verificamos que atravessávamos terreno estranho e
mais sombrio ainda. Gemidos partiam, lamentos, daqui ou dali. Vi que entre a folhagem havia criaturas
abandonadas pelo chão. Pareciam animais e sofriam. Eleutério fez-nos um gesto e
1 2
Atafon -Espírito que apareceu no "O ABISMO". Livro
editado pela Eco -"O ABISMO" do mesmo autor.
acompanhamo-lo. Diana esperou no trilho enquanto faz
íamos a incurs
ão. Pegamos um atalho. Kun
ter
à frente sob orienta
ção de Eleut
ério.
Em determinado ponto paramos e o Guia nos apontou diversas criaturas que se amontoavam umas sobre
as outras. Notei que não tinham braços e as pernas excessivamente finas estavam na realidade mutiladas.
Fisionomias intensamente pálidas como se houvessem perdido todo sangue, palidez do mármore. As
bocas eram apertadas como bocas de criaturas que chupassem bico de mamadeira. Contraídas,
esquisitas. Na realidade, lembravam crianças recém-nascidas, embora os corpos fossem de adultos.
-Esses viveram do amor carnal de natureza mais inferior até começarem o desgaste do perispírito.
-Como você já pode perceber, esses se escondem aqui nestes lugares porque se sentem envergonhados
de terem perdido os órgãos sexuais.
Eleutério disse e ordenou a um deles que se aproximasse. O corpo era de um jovem, a fisio nomia, no
entanto, era de um homem velho, encanecido no mundo.
-Aldrovando, falou o Espírito, há quanto tempo você está ai?
-Há dois mil anos, Senhor, respondeu ele.
-Onde é que você perdeu os órgãos sexuais?
-Nas civilizações antigas, meu Senhor. Entreguei-me demasiado a alegria do amor...
-E agora, Aldrovando, o que vai fazer?
-Aguardo a misericórdia de Deus e a oportunidade de servir, contudo, neste estado não tenho coragem de
sair daqui! Nem eu e nem os meus companheiros! Estou esperando chamada do Sanatorium. Alguns
enfermeiros e médicos já estiveram aqui nos estudando.
-E que acharam?
-Acharam que a recuperação vai bem. Deram-nos instruções. Disseram que deveríamos por alguns anos
esquecer o problema sexual. Infelizmente, Senhor, não é fácil...
-Porque não é fácil?
-N
ão
éf
ácil porque a nossa mente est
á imantada a muitas criaturas que insistentemente nos procuram e v
êem at
é aqui, Senhor, nos amar! Nada nos resta, mas essas companheiras se compra
zem em abra
çar-nos e beijar. Como sofremos na escurid
ão, dif
ícil
é recusar esse amor!
Compreendi a força da afirmativa e fiquei pensando naqueles que se destroem por amor. O silêncio
envolveu-nos de novo. Eleutério convidou-nos a prosseguir e Aldrovando permaneceu onde estava com
os olhos fitos em nós como alguém que contemplasse uma de suas grandes esperanças.
XV -Ainda no vale
Eu já aprendera, na viagem ao Abismo, que o perispírito pode se mutilar e que a criatura espi ritual tende
a imobilizar-se perispiritualmente embora não retroceda no campo da evolução. Subimos ou descemos
de acordo com a direção que damos ao nosso pensamento.
Todavia, para mim, era imensamente chocante verificar que o amor descontrolado conduzia ao mesmo
resultado. Como conciliar o ensinamento que nos orientava no sentido de que sexo e a-mor eram Lei da
Vida e a decadência daqueles seres?
Diana que se juntara de novo ao nosso grupo, ouviu-me as indagações mentais e passou a orientar-me:
-Meu caro, disse ela com suavidade, não há nenhuma contradição nisso. Tudo está certo. Por exemplo,
uma criatura se alimenta para viver e tudo vai bem. Se, no entanto, comer demais poderá sofrer
perturbação estomacal. Quem passa noites sem dormir, poderá estar sujeito a esgotamento nervoso. A
máquina tem um limite de uso, o abuso é que está errado...
Compreendeu agora? Esses Espíritos, quando na terra e mesmo neste plano, levaram muito longe a
liberdade sexual ... Perderam-se a si mesmos e agora têem que se recuperar.
Vi que Diana era senhora absoluta do assunto, e aquilo dito pelos seus lábios me parecia mais doce e
mais suave. Reconfortei-me com a sua palavra e agradeci-lhe a bondade. Entrementes, prosseguimos a
marcha. Percebi que por um motivo qualquer que escapava à minha argúcia os instrutores espirituais me
levavam a ver as criaturas mutiladas por amor. Eles mesmos que nos anunciaram que o amor era Lei da
Vida. Talvez quem sabe porque há grande dúvida entre os homens com referência ao uso do sexo?
Seguíamos. A folhagem verde escuro, agora clareara um pouco. O Sanatorium parecia mais perto. Suas
torres de uma beleza invulgar apontavam para o infinito onde a lua e as estrelas brilhavam clareando-nos
de alguma forma o caminho.
A luz lunar nas faixas espirituais funciona de modo diferente e as partículas atmosféricas brilham com
mais intensidade, de maneira que a claridade dos planos espirituais é maior.
Uma tristeza tomou-me a alma. Afinal, a forma humana daquelas criaturas nos identificava com elas.
-O corpo espiritual adquire maior vitalidade e as suas células espirituais conquistam maior velocidade à
proporção que colocamos a mente em Deus e nas coisas espirituais. Por outro lado, as células
perispirituais tendem a diminuir a sua velocidade e a imobilizar-se à medida que fixamos a mente nas
coisas materiais. Neste caso particular do sexo, muitos fenômenos diferentes ocorrem, explicou Diana.
A sexualidade sadia e pura canaliza energias superiores e transfunde fluidos de renovação, expressando o
amor verdadeiro, de modo a que as criaturas se sentem fortalecidas. A sexualidade perturbada no entanto,
arrasta o ser para as zonas inferiores da vida. Contudo, não há crime. Cada um assume a
responsabilidade do seu ato. Aqueles que praticam relações sexuais com este ou com aquele elemento
indiscriminadamente não comete nenhum ato que atente contra a Misericórdia de Deus, mas sujeita-se a
ligar-se às companhias espirituais que o outro possuí e caminhará na estrada materializante das forças
menos elevadas. Como já dissemos, há um desgaste das forças sexuais. Assim como se gasta, na terra, o
patrimônio material, também se gasta o patrimônio das energiassexuais. Aquele que esbanja o que
possuí, fatalmente, alcançara a pobreza. É lógico que isso se reflete no organismo físico. Porém, a
sexualidade de teor mais elevado mantém o ser em boas condições perante os esforços da vida. Tudo no
mundo esta sujeito a transformações O Bem e o Mal transformam-se a cada passo, ou para melhor ou
para pior. Compete ao ser dar a direção que o conduzirá à luz ou que o atirará nas trevas.
Devemos em tudo, buscar a lei de Deus. E ela representar
á sempre: harmonia, beleza, verda
de, perfei
ção, amor.
Fiquei olhando Diana em sua forma angélica e pura. Beleza inconcebível pela humanidade.
O caminho agora se juncara de flores e águas claras e puras murmuravam por entre folhagens a sua
canção. Um ar leve passara a brincar no espaço e percebi que a zona era mais saneada. O odor
pestilencial afastara-se. Nossos pés pisavam gramado verde claro e em tudo havia um perfume diferente.
-São os cheiros dos remédios que se exalam da Sanatorium, disse Eleutério. De lá vem um ar diferente.
Os médicos que colaboram no Sanatorium têem procurado sanear o ambiente à volta no anseio de
melhorar as condições. Como você vê, meu amigo, a zona livre ou o Vale Livre é muito grande.
De fato, eu já observara isso. A extensão do Vale era imensa. Perdia-se na distância infinita.
-O que vimos, continuou Eleutério, é apenas uma nesga onde se situam alguns tipos voltados para a
sexualidade. Mas a multidão não tem fim. São criaturas de todos os tipos e de todas as raças. Há
atualmente na espiritualidade menor um anseio muito grande de extravasar os sentimentos sexuais na
terra. Os Espíritos Superiores estão procurando controlar de certa forma essas manifestações embora
haja discordâncias aqui mesmo quanto à permissão. Reconhece-se que o mundo não pode mais continuar
prisioneiro do sexo. Por outro lado, não podemos apoiar a liberdade sexual no mundo desde que
associada à prostituição, ao crime, aos entorpecentes, à desordem, à vagabundagem desenfreados dos
Espíritos menos felizes que já quase perderam o uso da razão e que se reencarnam por força da lei mas
que dependendo de nós, serão governados ainda que à distância. Compreendemos a mocidade atual e
acreditamos que é legitimo o seu anseio de reforma, mas não podemos aceitar o crime.
A sexualidade em si é Lei da Vida, e deve ser exercitada, desde que não busque destruir o próprio
homem que é obra de Deus.
Eleutério calou-se. O Sanatorium aproximava-se e vimos algumas pessoas que passeavam em seus
vastos jardins.
Uma claridade suave semelhante à luz de luar brilhava na folhagem.
XVI -Sanatorium
Aproximamo-nos. As grandes portas do Sanatorium abriram-se de par em par e uma escadaria de
material semelhante ao mármore subia para o segundo andar. Enfermeiras e médicos transitavam pelos
corredores e um cheiro forte de estranho perfume inundava todas as coisas.
Que perfume é esse? -interroguei.
-Esse perfume vem de grandes câmaras situadas no alto do prédio -informou Eleutério -e é captado por
aparelhagem especial que o retira das flores elétricas que você vê nesses imensos jar-dins. A finalidade
dele é de, misturado com camadas de ions, esterilizar completamente o ambiente. Na realidade, o jardim
já se encontra brandamente esterilizado. Os corredores e salas do prédio qua-se completamente
esterilizados e as salas de tratamento e cirurgia completamente esterilizados por serem já recintos
fechados.
-Sim, meu filho, o perispírito, às vezes sofre modificações e incisões necessárias. No campo sexual isto é
comum nestas zonas. Espíritos que se preparam para a reencarnação e que dilaceraram os órgãos sexuais
vêem para aqui e sofrem ligeiras modificações, não só nos órgãos sexuais conhecidos dos homens, mas
principalmente noutros que a humanidade ainda não identificou. No cérebro espiritual, por exemplo,
onde existem glândulas invisíveis ainda para os cientistas terrestres mas visíveis para nós, costumam os
nossos médicos ou cientistas fazer intervenções de maneira a colaborar para que o indivíduo que vá
renascer inconscientemente aplique suas forças sexuais noutro campo até que no futuro possa ele exercer
a função sexual sem grandes aberrações. Se não agíssemos assim, evidentemente, colaboraríamos para
que se multiplicassem os monstros existentes no mundo. Há criaturas que chegam nestas esferas, meu
caro, em completa alienação mental originadas do mau uso do sexo. As forças sexuais são como as águas
de uma grande cachoeira que podem ser orientadas e conduzidas para movimentar grandes turbinas em
favor da energia elétrica de iluminação do
mundo, e de movimenta
ção das m
áquinas que dar
ão oportunidade de trabalho a milhares de oper
á
rios, ou podem ser aplicadas t
ão desastradamente que venham a destruir a pr
ópria usina, ou quem sabe poder
ão invadir as terras plantadas onde reside muita gente e arrasar tudo.
Sexo, como a mediunidade, é força é disposição do homem. Se lhe dermos direção adequada abriremos
as portas do futuro. Se não lhe dermos uma direção segura para o bem, colocaremos em risco as próprias
construções existentes. Você não acha que essa energia deva ser aproveitada pelo homem no campo do
bem e da felicidade?
Fitei Eleutério com admiração e respondi:
-Eleutério, já aprendi, que sexo e sexualidade são Lei da Vida e devem ser exercidos com amor, mas
aprendi também que são forças de arrasamento na construção divina quando não compreendendo o seu
valor real, nos entregamos ao descontrole total.
Eleutério sorriu:
-Vejo que o aprendiz vai bem. De fato, sua definição está quase perfeita, no entanto, não se afobe porque
ainda falta mais...
----------* ---------
Albino recebeu-nos na porta, após termos dado os primeiros passos dentro do corredor. Diana
apresentou-nos: -Este é o Dr. Albino, nosso companheiro e mestre da ciência médica espiritual.
Era um homem maduro, cabelos branquejando, aparentando uns quarenta e nove anos de ida
XVII -Enfermaria
A enfermaria semelhante às enfermarias terrestres, com pequenas diferenças, especialmente nas camas
que eram um simples tampo de material leve como plástico.
-Não vejo muita diferença dos Sanatórios da terra -, falei timidamente.
-A mente humana transferida para o plano espiritual sofreria espantoso impacto se encontrasse tudo
diferente -disse Albino. As Forças Superiores recomendam que se mantenham os ambientes das
primeiras faixas espirituais parecidas com as construções e mobiliários terrestres. Se houvesse uma
mudança brusca a maioria dos Espíritos se precipitaria na loucura. Imaginemos alguém desencarnando e
encontrando um ambiente desconhecido completamente diferente, com criaturas vestidas de modo
estranho? Pensaria que estivesse num outro mundo ou não entenderia nada. A gradação de faixa para
faixa é um modo de ir adaptando a mente aos novos mundos espirituais. Evidentemente, as faixas
vibratórias realmente superiores apresentam um panorama diferente do plano em que estamos. De fato
irreconhecível. Mas para o Espírito chegar lá, deverá ir lentamente se adaptando aos diversos planos de
vida. Lenta e dolorosa é a transformação gradual através das Idades.
O Espírito que gravita para Deus atravessa milhões de faixas vibratórias antes de alcançar as regiões
mais perfeitas e o seu veículo vai também se transformando e se adaptando ao meio ambiente. Há uma
relação inexorável entre o que somos e o meio em que vivemos. Nossas vibrações ou as vibrações de
nosso carro espiritual guardam rigorosa relação com as faixas espirituais onde habitamos. Nossa vida
decorre dessa correlação. Recebemos e emitimos vibrações e assim como a aranha vive em sua teia nós
também vivemos na teia vibratória do Universo. Na tela maravilhosa do infinito construímos a nossa
perfeição ao encontro de Deus. Há uma subida que decorre sempre de uma transformação para melhor.
Ou há uma descida que decorre de uma imobilização para pior. Espiritualidade traz dilatação do veículo
espiritual. Materialidade arroja-nos na construção das células do corpo espiritual que nos conduz à
solidificação ou petrificação, se assim se pode dizer, de nosso veículo perispiritual. A mente, como um
sol permanece no cosmo interno à semelhança do caroço de
jambo dentro do fruto, mas tamb
ém sente a decad
ência da forma e est
á sujeita aos embates da petri
fica
ção ou constru
ção.
Verifiquei que a linguagem de Diana, Eleutério e Albino se identificavam mas vi também que Diana era
Espírito imensamente superior aos dois. Em Diana, junto com o sorriso angélico brilhava a
espiritualidade de esferas muito adiantadas. Em Eleutério eu via o conhecimento do mundo espiritual.
Em Albino vislumbrei a ciência e a medicina espirituais. Runter lembrava-me a humanidade e
o anseio de compreender. Eu ali representava apenas o aprendiz bisonho sequioso de conhecimento,
embora profundamente ignorante. Deslumbravam-me os ensinamentos novos como se bebesse água pura
de castália.
O problema sexual que eu encontrava tão chocantemente exposto pela primeira vez não me convencera
ainda da grandeza ou da miséria do sexo, contudo, eu já sentia a sua repercussão em toda a humanidade
dos dois mundos: o visível e o invisível. A extensão era enorme. Todo aquele vale que percorremos,
embora numa extensão mínima, revelava-me o vasto panorama da responsabilidade humana e situava
para mim o sexo no centro do Jardim do Paraíso Universal. Adão, segundo a Bíblia, caíra pelo sexo.
Como ignorar tamanho patrimônio espiritual?
Abeiramo-nos de um dos primeiros leitos e ali jazia uma mulher de beleza gasta e feições perdidas.
-Esta, explicou o Dr. Albino, indicando com a mão, geme como criança enferma.
Olhei por cima dos ombros de Eleutério e vi uma mulher encolhida no leito sem lençóis, faces
macilentas. sorriso triste, pernas e braços finíssimos. Seu olhar agora sem lágrimas exprimia a mais
completa infantilidade.
-Perdida nas chamas sexuais há milênios deixou-se flutuar no mar das grandes ilusões... Arrebatada pelo
amor físico, vagou de continente em continente nos braços de todos os homens. O futuro dela era,
pensava, o amor da carne. Com isso desgastou pouco a pouca as células cerebrais do perispírito e
caminhou rápida e seguramente para a imbecilidade.
Albino falou e a mulher incompreensivelmente, como uma criança idiota sorriu-lhe ingenuamente. É
certo que não compreendeu nenhuma de suas palavras.
-Querem ver? -perguntou o médico.
Dizendo isso, colocou-lhe a mão na cabeça e ouvimos imediatamente o som do zumbido de uma abelha.
Percebemos que Albino era sacudido por intensa vibração perispiritual e que de sua mão direita uma
força prodigiosa se exteriorizava. O cérebro da mulher iluminou-se e tornou-se transparente como o
vidro. Vimos-lhe internamente os meandros cerebrais e os Lóbulos desenhados. Albino, porém, imprimiu
maior velocidade à sua vibração e compreendemos que ampliado o material interno tornara-se diáfano e
pudemos perceber um grande espaço entre as células e milhares de células que pareciam barcos
abandonados numa praia distante, sem vida e sem vitalidade. Um grande silêncio no cosmo celular. A
inatividade celular dominava algumas zonas, inteiramente.
A mulher por sua vez sorria.
-Mas sexo não é Lei da Vida? -falei insopitavelmente.
-É, concordou Albino, e Deus fê-lo como porta sagrada da reencarnação e da evolução e também como
alegria do homem e da mulher. No entretanto, dentro de um clima sadio de compreensão e entendimento
capaz de concorrer para a felicidade dos cônjuges ou daqueles que se amam. Nunca, porém, para que a
criatura se despenhe no exagero de malgastar o patrimônio do corpo físico e até do corpo espiritual.
Como você sabe, meu filho, o corpo perispiritual é construção carregada de eletromagnetismo em alta
escala e até se assim se pode exprimir, alguém de alta voltagem. Outras forças, para as quais no
momento, ainda não ternos nomenclatura compreensível para a humanidade, percorre esses organismos.
São forças que estão além da invisibilidade ou da percepção mesmo do Espírito relativamente adiantado.
A incursão indiscriminada no campo sexual, na prática sexual, arrasta o Espírito ao des perdício dessas
forças que só se aglutinarão de novo mediante laborioso processo de recuperação através dos séculos.
O Espírito pode se encaminhar no sentido da inconsciência pelo desgaste das forças mais ín timas. Não
sei se me fiz entender? Fiz?
Contemplei o grupo ali reunido e n
ão soube dizer nada. Meu pensamento ainda n
ão poderia alcan
çar a explica
ção de Albino. Via a mulher idiotizada e n
ão compreendia como atrav
és da pr
ática de algo que Deus criara pudesse ela arriscar quase a pr
ópria imortalidade!
Passamos a outro leito.
Um homem agora desafiava nossa argúcia e nosso entendimento. A mulher voltara à sombra do próprio
cérebro já que o médico se retirara. Apagou-se-lhe o cérebro e ela continuou a nos sorrir idiotamente de
longe...
----------* ----------
Outros casos foram surgindo, aqui, ali, em todos aqueles leitos. Muitas enfermeiras circulavam por entre
as camas, e diversos médicos examinavam os enfermos. Albino, todavia, centralizava nossas atenções.
Lembrava velha figura do mundo médico terrestre. Infelizmente, não conseguia me lembrar quem e
parece que Eleutério não desejava revelar-lhe a personalidade.
Admirava-me a quantidade de doentes na enfermaria. Enorme a quantidade. Cada um apresentando
enfermidade diferente, mas segundo Albino, todos de natureza sexual. Havia paralíticos da espinha,
ulcerosos, cegos, loucos, gente de todo o tipo exibindo as mais assombrosas deformidades. Albino
reafirmava sempre que se tratavam de doenças de origem sexual
-Na terra, esclareceu ele, os homens não fazem idéia exata da origem de suas enfermidades. O sexo está
intimamente ligado ao sistema neuro-espinal, com repercussão direta no cerebelo e nos órgãos da
digestão, sem se falar na influência direta nos campos dos órgãos perispirituais de comunicação, como
no caso da pituitária. A imaginação funciona nos assuntos sexuais com intensidade extraordinária. A
inteligência, que é força interna de alta propulsão, adquire ritmo inusitado quando se trata de
sexualidade, de maneira que sob a influência dos pensamentos sexuais todo organismo fí sico e
perispiritual da criatura passa a vibrar sob poderosa movimentação do motor da mente. Em determinado
ritmo o aparelho do corpo que é a representação física da rede perispiritual vibra em relativa
normalidade, contudo, se a mente é acelerada mais intensamente, foge da normalidade da Lei e o
aparelho passa a vibrar descontroladamente, pondo em risco todo o arcabouço humano. Devemos
procurar compreender que entre o tecido da leis que Deus ofereceu para o crescimento e o progresso do
homem, existe a Lei Maior que é a Lei do Equilíbrio e que preside os nossos destinos na marcha para os
mundos superiores.
XVIII -Outros enfermos
A palavra de Albino vibrava no ambiente como a luz do principio.
Meu coração palpitava em ritmo crescente e a minha inteligência lutava consigo mesma para seguir-lhe
os raciocínios lógicos.
Os enfermos olhavam-nos com curiosidade. A maioria. Os outros, em pequeno número, limitavam-se a
dormir ou então ficavam com o olhar vítreo perdido na distância.
Percebi que grande parte dos doentes apresentava um fácies idiotizado.
-Eleutério, aventurei-me, tenho notado que a maioria destes doentes se apresenta imbecilizado. Será isso
da doença?
-Sim, o desgaste sexual conduz comumente o homem e o Espírito à infelicidade. É atividade que atinge
principal e diretamente o cérebro e fere profundamente o perispírito. São descargas eletromagnéticas de
alto teor vibratório que sacodem todo o arganismo. Nos dois mundos: no mundo físico e no mundo
psíquico as repercussões são da ordem mais profunda. Interessa ao cérebro, à espinha, a todas as
ramificações de natureza nervosa e só posteriormente, aos órgãos sexuais.
Eleutério sorriu bondosamente para mim e acrescentou:
-Meu caro, estamos lidando aqui com o "corpo elétrico do homem" com repercussões nos di-versos
corpos que servem de veículo à alma através da evolução. Esses doentes renascerão na terra
em p
éssimas condi
ções f
ísicas. L
á, ingenuamente, a medicina atribuir
á o fato ao
álcool, ao entorpe
cente,
às taras nervosas e
às diversas heran
ças dos diversos ramos da fam
ília. Na realidade os mono
sexuais geralmente s
ão tamb
ém grandes consumidores de
álcool e de outras subst
âncias nocivas de acordo com o uso exagerado que lhes possam dar.
Como sabemos, os Espíritos, de um modo geral, reencarnam em grupos. São grupos espirituais que vêem
fazendo a sua evolução conjunta há milênios. Assim, são Espíritos mais ou menos do mesmo tipo. De
vez em quando um Espírito de ordem mais elevada se reencarna entre eles, vindo de grupos mais
elevados para impulsioná-los ao progresso. No entanto, sejam elevados ou inferiores, a regra é a dos
Espíritos reencarnarem em grupos, por diversos motivos. A mais comum é o fato de se terem tornado
inimigos em outras vidas, quando a reencarnação é prova. Quando são Espíritos mais elevados a
reencarnação pode ser só de missão ou combinando missão e prova. Missão e pro va, Espíritos mais
elevados. Tarefa e prova, Espíritos menos elevados, quase que o comum da humanidade. Porque na
economia de Deus, todos trabalham e todos evoluem. Vaso sagrado da vida, no caso da mulher.
Atividade sublime da criação, no homem. Alegria de ambos, é, todavia, o sexo instrumento delicado que
pode por em risco toda a construção humana e espiritual, se o seu uso não se adaptar às leis de equilíbrio
da
Nanatureza.
luta do lar, o sexo desempenha papel preponderante. Desprezá-lo será colocar em prova dura os
Espíritos que alí reencarnem para um progresso maior. Colabora o sexo para a harmonia doméstica e
para a paz de todos. Compete a cada um separar o joio do trigo. Nem a mulher deve desprezar o homem,
nem o homem pode desprezar a mulher. Deus os fez macho e fêmea e como tal devem se unir na glória
universal. Portas abertas para o infinito, o sexo deve honrar o homem como obra divina. Através dele, as
gerações se sucederão, e os Espíritos que partem retornam um dia para prosseguir no campo das
experiências milenares e purificadoras. Grandes Espíritos aguardam muitas vezes, a oportunidade para
renascer entre os homens. Assim veio ao mundo, há pouco tempo, o velho Demócrito na figura de
Einstein e retornou também há pouco para uma grande missão o maravilhoso Claude Bernard, que
deixou as esferas dos Espíritos sob uma chuva de bênçãos e flores, porque ia levar grandes esperanças à
humanidade, em nome dos Grandes Gênios do nosso Sistema Solar.
Como, pois, colocar barreiras ao exercício do sexo? Não pode o homem enfrentar Deus tentando
destruir-lhe a sua obra, pela omissão nem deve, por outro lado, colocá-la em risco através do
desregramento. No equilíbrio encontrara a humanidade o prazer perfeito e, o perfeito cumprimento da
Lei.
Eleutério falou e meus olhos se encheram de lágrimas. De seu cérebro centelhas de safirina luz saltavam
e atingiam-nos o coração.
Volvi os olhos para aqueles infelizes e vi que o amor humano se é porta aberta para a espiritualidade é
também possibilidade de imensas quedas. Mas acima de nós brilha Deus como a Luz do Principio.
Entramos num vasto anfiteatro. Sobre uma mesa espaçosa, limpa, de material semelhante ao vidro ou ao
plástico um homem dormia. Evidentemente Espírito de forma de homem. Algumas enfermeiras
observavam-no e tomavam notas.
Albino aproximou-se, cumprimentou, e convidou-nos ao exame.
Por intervenção de alguém a mesa emitiu luminosidade suave e iluminou todo o organismo do paciente.
Sua transparência ficou igual à do vidro puro de cristal e nós vimo-lhe todos os órgãos internamente. Lá
estavam o coração e os pulmões, o fígado e o estômago, o pâncreas, e a traquéia brilhava
maravilhosamente. O cérebro, no entanto, era o palácio iluminado que nos chamava a atenção. Como um
motor o cérebro vibrava e correntes coloridas percorriam-lhe os lóbulos e os meandros incessantemente.
As correntes vibratórias percorriam o paciente da cabeça aos pés. Subiam pela espinha, iam ao cérebro,
do cérebro se espalhavam pelo organismo inteiro e tornavam a ir ao fundo da espinha.
-Os impulsos sexuais, embora partam do cérebro como todos os impulsos eletromagnéticos,comumente
se aninham na região inferior da espinha -falou o instrutor. É uma forma elementar daquilo que os
Hindus chamam de Kundalini. Só que na Kundalini, o iniciado desperta forças de maior intensidade e
mesmo periculosidade. Depende de um controle muito maior.
Esta criatura não é caso dos piores. Como vêem as correntes aí estão se movimentando mais ou menos
normalmente, mas se prestarem bem atenção verão que muitas correntes estão interrom pidas. Olhem
bem.
Autorizados, aproximamo-nos e fixamos o olhar percuciente. Vi, de imediato, que em determinados
pontos a corrente estava interrompida, havia uma mancha negra de pequeno tamanho. Naquele local
faíscas ou centelhas saltavam e a corrente prosseguia no outro lado, semelhante à corrente elétrica. No
entanto, havia locais, parecendo fim de linha onde a interrupção era total e a mancha negra bem maior.
Verificamos esse fato nos órgãos sexuais. Uma grande mancha cobria todos os
órg
ãos e ali a paralisa
ção vibrat
ória era total. N
ão havia vida. Notamos que o tecido perispiritual estava dilacerado.
Albino percebeu-nos a surpresa porque ponderou:
-Essa ruptura só poderá ser reparada noutras existências carnais com melhoria do modo de pensar do
paciente e com a contenção sexual. Geralmente, aconselhamos essas criaturas a se reen carnarem em
determinadas circunstâncias de modo que venham a ser religiosos reclusos, ou seja, padres de diversas
seitas que adotam uma espécie de afastamento do mundo. Evidentemente não serão bons religiosos nas
primeiras reencarnações, todavia, depois melhoram.
Vi também que o coração do rapaz apresentava-se parcialmente manchado e que as correntes vibratórias
que ali deveriam exibir um colorido novo, bonito, pelo contrário, na parte que estava boa, também era de
cor apagada, dando a impressão que o resto do coração marchava para a paralisação completa.
-Dificilmente, explicou Albino, o coração se salva nos excessos sexuais. De modo geral, todo devasso,
prejudica também o próprio coração. Renascerá com essa deficiência. No entanto, recuperar o tecido
perispiritual do coração não é tão fácil quanto recuperar o tecido perispiritual de outros órgãos. Só o
amor verdadeiro e a dedicação desinteressada às outras criaturas no mundo fará com que através dos
milênios o Espírito recupere o órgão do sentimento. As repercussões produzidas pela sexualidade, no
coração atingem proporções inimagináveis. Sexualidade é Lei Divina, porém, dentro do equilíbrio,
tornou a repetir Albino.
Diana e Eleutério, silenciosos, acompanhavam as explicações do médico.
Mantinham-se respeitosamente e ouviam com o mesmo interesse que nós ouvíamos.
Albino afastou-se do local e nós deixamos aquela figura iluminada sobre a mesa.
-O que está ele fazendo ali? -arriscamos timidamente a pergunta.
-Está preparado para ser examinado e submetido a impulsos mecânicos que possam melhorar um pouco,
as suas condições vibratórias -considerou o médico. É processo habitual nosso. Aqui, são eles orientados
a renascer de acordo com as instruções superiores e nós os convencemos a retor nar à Terra porque a
maioria não quer retornar. Prefere este mundo. Mas a Lei é a dos renascimentos.
Usamos diversos sistemas, desde o convencimento amigável pela palavra até a reencarnação
compulsória.
Evidentemente, aqui não é o Ministério da Reencarnação, nós contudo, cooperamos humildemente para
que em breve estejam eles em condições de aceitar de uma forma ou de outra as determinações do
Ministério.
Temos diversos aparelhos que aplicamos de maneira diversa.
De fato, pendurado do teto em sala à parte divisamos enorme bujão de vidro onde uma criatura
enroscada em si mesma na posição do feto no útero dormia tranqüilamente. Era um homem.
-Esse dai entrou numa espécie de hibernação -disse Albino. Nada sabe do que o rodeia. Fomos obrigados
a isso porque embora demonstrasse lá no Vale grandes melhoras, chegando aqui deu demonstrações de
loucura sexual. Para não perturbar os outros doentes nós o internamos nesse recipiente que o guardará
por algumas semanas. Recebeu choques que conduzem à inconsciência completa. Choques
eletromagnéticos que não produzem nenhuma dor e também alguns medicamentos. Voltará mais calmo.
Como vêem o nosso processo em muitos casos é semelhante aos da Terra.
Albino sorriu e nós também sorrimos, e olhamos aquele homem pendurado do teto como uma criança
que ainda não nascera. O que fizera? Interroguei-me. Não tive, contudo, a coragem de inter rogar o
médico.
Eleutério, porém, como que respondendo à minha pergunta esclareceu:
-Esse cidadão, desde a Antigüidade Grega e romana até os tempos mais modernos manteve casas
suspeitas e bordéis de luxo. Na realidade, sempre reencarnou sem as funções sexuais, era o que no
Evangelho se chamava eunuco. Mas não era eunuco pelo Reino de Deus e sim pelo Reino da Terra.
Mantinha a perversão sexual dos outros para ganhar dinheiro e serviu a reis e a príncipes mas serviu
também à escória mais baixa de Paris e do mundo. Na verdade, meu filho, ele sempre foi louco.
XX -Interrogand
o
Eleutério falou e nós caminhamos para espaçoso templo que se situava ao lado do laboratório. O assunto
interessara-nos profundamente.
-Pois é, continuou o instrutor, o homem mantinha em seus negócios as forças assalariadas do mal.
Organizava encontros clandestinos entre mulheres da sociedade e homens mal intencionados. Procurava
convencer aquelas que nunca se arriscaram fora do casamento e usava todos os recursos a fim de que
alguém se perdesse. Durante séculos reencarnou nessas condições mas foi caindo, até atingir o campo
incontrolável da loucura e da inconsciência. Perdido no Vale, há algum tempo demonstrou os primeiros
sinais de recuperação ou seja, os primeiros sintomas de que desejava de novo subir. Nós o amparamos,
no entanto, tão precária é a sua condição interior que fomos obrigados a mantê-lo nesse recipiente.
Serve, por outro lado, de exemplo para os outros...
Sexo, meu filho, é perigoso instrumento que Deus colocou em nossas mãos. Embora sendo uma das mais
altas expressões da vida é também delicado aparelho, como, de resto, você já está informado.
Meu olhar contemplava estático o homenzinho prisioneiro na campânula. Parecia realmente um feto
enorme.
Como a vida era misteriosa e fantástica! -pensei mergulhado num abismo de interrogações sem fim.
Deus na sua onisciência encerrara em seu universo as mais variadas e inimagináveis expressões de sua
sabedoria. Aquele homem parecia também um pinto dentro do ovo. No silêncio de seu sono aparente o
que estaria ocorrendo?
-Nada, disse Eleutério, ele apenas dorme e sonha. É a hibernação espiritual. Da mesma forma que na
Terra o homem é introduzido numa geladeira ou é submetido a qualquer processo de hibernação seja por
medicamento ou seja que for, aqui também nós hibernamos o Espírito, não é verdade Albino?
O que seria do mundo sem as plantas e sem as flores? Jesus em sua sabedoria dissera: "Em verdade vos
digo que nem Salomão em toda a sua Glória se veste como um deles"
Isso falou dos lírios do campo que nem trabalham nem ceifam,..
Agora vinha a revelação de que há tesouros de medicamentos nas flores e nas plantas ornamentais.
XXII -Estudando
Prosseguimos. O Sanatório de vastas proporções abrigava milhares de enfermos e a cada pas-so
defrontávamos os mais intrincados problemas sexuais no campo do Espírito.
-O Sexo, em última análise, explicou Albino, sedia-se na alma. Sexualidade é uma condição intrínseca
do Espírito assim como a masculinidade e feminilidade. O Anjo, evidentemente, não possui sexo como
nós na Terra o entendemos. A angelitude é o trecho da estrada do Espírito que já atingiu altíssima
possibilidade de entendimento com Deus.
Eleutério que ouvia sério, observou:
-Nessas condições, chega a um ponto que a criatura espiritual não pode mais ser classificada como
homem ou mulher. Entra o Espírito numa faixa onde os seres não são nem homem nem mulher. Campo
neutro do Espírito. Acalmadas as paixões, dominados o ódio e a revolta, estabelecido o amor, perde o ser
a característica que a animalidade expressa de macho e fêmea. Na realidade, o ser está em ascensão. As
forças que governam o Espírito são imensamente poderosas. A contenção sexual é apenas medida
disciplinar de defesa do organismo animal e mesmo perispiritual. É lógico, que se reflete de maneira
ponderável no desenvolvimento espiritual da criatura. Deus não condena ninguém pelo uso imoderado
das forças sexuais, o próprio ser é que se desgasta a si mesmo com o uso imoderado de suas forças. Isso
dá como resultado a internação, às vezes, em hospitais como este ou então a permanência em lugares
como o Vale Livre.
O uso inadequado ou imoderado dessas forças também pode conduzir o Espírito à loucura ou à
inconsciência. O desgaste atinge sempre diretamente o cérebro através da corrente perispiritual que na
terra estrutura o sangue.
Eleutério calou-se e Albino agradeceu-lhe a preciosa colaboração.
N
ós, contudo, contemplamos Eleut
ério com imenso respeito.
É certo, que est
ávamos ali diante de entidade espiritual de elevado conhecimento e profunda viv
ência espiritual.
Eleutério sorriu com humildade e disse: lendo-me o pensamento que exprimia tanta admiração:
-Meu caro, os que como eu caíram em outras épocas têem o dever de retornar para ajudar. O mistério da
Vida no Universo é o mistério de Deus. Tão variadas são as formas pelas quais Deus manifesta a sua
Vontade que basta às criaturas fitar o céu estrelado para compreender que a Ordem que governa o Cosmo
é a Suprema Inteligência e a Suprema Bondade do Universo. Meu filho, é simples compreender Deus.
Basta à criatura ter ouvidos de ouvir e de entender.
Vi que Eleutério se iluminara gradativamente e que de seu coração um jorro de safirina luz se irradiava.
Todos estavam contritos e tive a impressão que um Anjo estava entre nós.
XXIII -A volta
Deixamos o Sanatório. Nosso Grupo se encaminhara para outro salão do hospital, e Albino após servir-
nos uma bebida que parecia chá, despediu-se de nós. Imaginamos que houvesse ali ainda outros locais de
tratamento, mas não tivemos coragem de pedir permissão para ver.
-Realmente, esclareceu Eleutério, há aqui doentes internados em estado gravíssimo. Não falaremos,
contudo, por ora, a respeito deles. A sua viagem, meu caro, desta vez, tem a finalidade apenas de
primeira noticia, não é mesmo?
Concordei com Eleutério. De fato, havia sido avisado de que me seria concedida a oportunidade de ver
algumas coisas e de noticiar sem maior profundidade. Os homens precisavam de saber que após a morte
do corpo ou mesmo pelo simples desprendimento do corpo físico, o Espírito percorria aqueles sítios
dominados pelo pensamento sexual e que nos planos além da vida física a fome de sexo dominava-lhes a
mente com intensidade. Doenças e desequilíbrios esperavam-nos do lado de lá embora o sexo fosse
instrumento sagrado da Vida Imortal.
Compreendi a gravidade do assunto e a responsabilidade que se me colocava sobre os ombros frágeis.
Seria compreendido? Por certo, não. A humanidade não aceita bem aquilo que fala de seus erros e falhas
e também entendi que o fato era natural.
Eleutério tocou-me o ombro e Diana sorriu para mim.
-Voltemos, disse ela. Daqui, desta vez, você não pode passar. Temos que cumprir o regulamento.
Assim, retornamos pelo Vale onde os Espíritos que vinham da Terra encontravam-se com os Espíritos
que já fora definitivamente da carne acorriam dominados pela ânsia sexual. Os motivos eram os mais
variados. A tese, porém, de que estavam imantados pelo pensamento nós iríamos comprovar em breve.
Uma brisa fresca acariciava-nos a testa e um perfume sensual bailava no ar. Meu pensamento começava
de novo a ser dominado pelo amor e mulheres nuas dançavam na retina de meus olhos.
Eleutério, contudo, abraçou-me e Diana fez um gesto no espaço como o fariam os hierofantes e percebi
que de novo voltava à realidade. O sonho, ali, envolve depressa os seres menos prevenidos e o amor
sexual é assim como capitoso vinho que nos embriaga insensivelmente.
De fato, amar ainda é uma das belas coisas da natureza .
-No amor físico, falou Diana lendo-me o pensamento, não há propriamente pecado ou crime. O que pode
haver é o mergulho na materialização demorada dos sentimentos e a permanência na carne por muito
tempo. A carne dá, que é órgão de natureza puramente espiritual, outras possibilidades de manifestação
no campo físico. Já repetimos que sexo não quer dizer apenas procedimento dos órgãos físicos. Sexo é
um conjunto de qualidades masculinas ou femininas, negativas ou positivas. O que caracteriza o Espírito
sexualmente é seu modo de ser e não o fato de possuir órgãos de determinado tipo.
XXIV -A Terra
Eleutério conduziu-me de novo às faixas mais próximas de nosso pensamento na Crosta. Os outros todos
haviam desaparecido. E nós dois caminhávamos agora por entre os edifícios de uma grande cidade. A
névoa da madrugada cobria tudo em seu lençol branco e frio e poucas pessoas andavam na rua àquela
hora. Um ou outro encostado aos prédios denunciavam a presença da vida humana. Sabíamos, no
entanto, que dentro das casas e nos lares, criaturas cheias de problemas vibravam intensamente.
De repente, vimos um homem que caminhava com lentidão, rodeado de Espíritos e de numerosas
mulheres, criaturas levianas, de grandes olheiras pintadas e cabelos fosforescentes. Riam e gargalhavam
abraçando-o e beijando-o desvairadas. Ele sentia-lhes a presença e até o aperto que lhe davam. Não as
via, mas a sensação que possuía era normal. Para ele, eram mulheres verdadeiras. Entrou numa casa
modesta e o acompanhamos. Tirou a roupa e deitou-se na cama e elas deitaram com ele. Uma abraçou-o
e passou a manter relações sexuais com o homem. Contemplamos estarrecidos aquela estranha simbiose
de homem e Espírito como se fossem um casal normal no ato mais sagrado da vida. Mas não era. Ali
estavam um homem que se deixou envolver demasiado pelo pensamento sexual e mulheres perdidas que
vivendo no outro lado da vida sentiam a mesma necessidade sexual daqueles que estavam na carne. Ele,
por sua vez, comprazia-se no ato. Estranho prazer dominava-o e retinha-o ali na cama, horas acordado
sob o domínio das mulheres que se revezavam. Uma após outra, tomavam-no e mantinham com ele
relações de homem e mulher com a mesma intensidade que os outros fazem na terra. Beijavam-no,
abraçavam-no e unidas a ele exauriam-lhe as forças. No entanto, coisa extraordinária! Percebi que entre
o intervalo de uma a outra, ele parecia recuperar as energias perdidas.
Eleutério compreendeu-me as indagações íntimas porque falou-me em voz baixa:
-Esse homem mergulhou nas correntes vibratórias do amor sem esperança.
Retira forças de si mesmo e das outras pessoas.
-Dos Espíritos que o rodeiam? -exclamei.
-Não, respondeu o Amiga, retira forças de pessoas que o rodeiam, familiares, amigos, etc. e até de
criaturas afins que estejam mais distantes, quilômetros de distância...
-E isso pode acontecer?
-Pode. Criaturas que possuem determinado teor mediúnico-vibratório podem haurir forças em outras
criaturas. Os grandes médiuns o fazem, especialmente os de psicografia, que são alimentados pela
vibração presente ou remota de amigos. Para o Espírito não há distância, tudo é perto e tudo está aí
presente.
Olhei Eleutério com surpresa. Tínhamos novamente um ensinamento desconhecido da humanidade.
-Sim, meu amigo, as criaturas se alimentam vibratoriamente umas das outras e os médiuns de certa
elevação e força retiram até inconscientemente energias de seus amigos, daqueles que se afi nem com
eles. Se assim não fosse, não teriam o combustível necessário para a produção das suas obras. Por isso, a
aproximação dos bons e dos grandes médiuns não poderá nunca ser permanente. Se fosse, um deles
ficaria destruído.
Evidentemente, a maior aproximação poderá se dar entre os grandes médiuns e pessoas queembora tendo
a energia para dispor e fornecer, não precisam dela no campo da mediunidade. É o alimentador humano
das obras espirituais. Dai, certa incompreensão em torno das amizades de determinados médiuns.
Dificilmente, e só de maneira excepcional, dois grandes médiuns poderão se
manter juntos, se isso acontecer se devorar
ão mutuamente. Temos o poder de devorar energias. A mente humana absorve e expele for
ças que ser
ão ou n
ão aproveitadas. Isso funciona tanto no campo superior quanto no campo inferior. A regra
é a mesma. O caso deste rapaz
é singular mas n
ão
éo
único na hist
ória espiritual do mundo. Agrada-lhe o funcionamento da mediunidade. Acanhado, t
í
mido, a principio, n
ão tendo coragem de buscar as mulheres do mundo, passou a mentalizar as mo
ças bonitas que conhecia. Essas espiritualmente vinham-lhes ao encontro atra
ídas pelo seu poder mental, pois esse mo
ço noutras
épocas foi poderoso hipnotizador. Contudo, como n
ão gostavam de
le, fugiam-lhes de novo
à atra
ção. Esp
íritos, por
ém, como esses, ligados aos bordeis, onde por fim ele foi algumas vezes, vieram procur
á-lo. E ent
ão, ele passou a v
ê-las atrav
és da casa mental. Evita
va pensar nelas no principio e voltava o seu pensamento para as virgens e as puras ou as meninas que ele
julgava puras e inocentes. Percebendo que estas n
ão vinham mais, entregou-se ao prazer de conviver espiritual e sexualmente com essas pobres criaturas
que o amam a seu jeito.
Eleutério calou-se e eu fiquei surpreendido com a avalanche de novos ensinamentos que lhe brotavam
dos lábios.
O moço, porém, no calor de amar não nos percebia a presença nem as indagações. Lábios co lados nos
lábios das mulheres, peito nos peitos, braços e pernas enrodilhados, era um verdadeiro fauno na loucura
do amor.
Eleutério tomou-me o braço e conduziu-me para fora. O dia, pouco a pouco clareava no horizonte e o
sol prenunciava a ressurreição da vida no mundo.
Eleutério esclareceu-me.
É hora de retornar ao seu veículo físico. Descansaremos um pouco no bosque e depois você voltará.
Senti-me entristecer. A volta ao organismo físico era para mim sempre uma grande dificuldade. As vezes
retornava com horror, outras vezes com alegria. Ali, porém, dominava-me a satisfação da presença de
Eleutério. Bateu-me amigavelmente nas costas.
-Ninguém pode fugir à Lei. Logo mais nos reencontraremos.
Ouvi suas últimas palavras porque perdi a consciência. O corpo chamava com seu imenso poder.
XXVI -Irradiações
Reencontrei Eleutério à noite no mesmo sítio. As árvores amigas derramavam-se sobre a grama e o
Espírito descansava sob o flamboyant gigante.
Era uma bela figura de traços maravilhosos. Abraçou-me.
Meu pensamento continuava preso ao rapaz que estudávamos. Tomou-me Eleutério pelo braço e falou:
-Você sabe que todos os seres têem irradiações que procedem ou não impulsionadas pela mente, no caso
do ser humano ou do ser espiritual que já atingiu o estágio de humanidade nessa fa-se, expedimos ou
irradiamos raios, vibrações e ondas. Tudo pode ser chamado de vibrações ou radiações. Cada ser emite
aquilo que possui. Se dominado pelas coisas espirituais irradia vibrações mais leves, espirituais. Se
dominado pelas coisas materiais, irradia vibrações mais pesadas, materializadas. E existem entre dezenas
de tipos diferentes de radiações ou vibrações, as radiações sexuais. Poderosas, intensas, violentas. Ondas
ou raios emitidos por uns atingem outros seres que com eles se afinam. A afinidade é Lei e vige em todos
os campos da existência humana.
Em face disso, um homem recebe às vezes violento impacto sexual de uma mulher que com ele tem
afinidade embora possa estar ela no meio de uma multidão de mulheres belas. As outras centenas de
mulheres não impressionam aquele homem e nem outros homens impressionam aquela mulher, mas as
ondas sexuais de um se confundem com as ondas sexuais do outro e eles se fundem num mesmo ser.
Podem ser criaturas que estiveram ligadas em outras vidas e podem ser apenas Espíritos que se vêem
pela primeira vez. Apesar de ser este último caso muito difícil de ocorrer. Estabelecida a faixa vibratória
que os une é fácil o entendimento espiritual através do espaço. Mesmo que não se encontrem
materialmente, poderão se encontrar espiritualmente. Durante o sono ou mesmo durante o dia,
acordados, através do pensamento se encontrarão. Basta um encontro ou reencontro, um olhar, um gesto
ou uma carta para estabelecer poderosos laços de ligação. Com essa ligação, o Espírito busca o outro
através do tempo e do espaço e passam a conviver mantidos por intensa vibração. Sentem-se, percebem-
se, amam-se, muito embora às vezes tenham se visto uma única vez, de longe, à distância. E podem até
se buscarem sexualmente...
Olhos fixos em Eleutério, ia de surpresa em surpresa, acompanhando a sua exposição.
Minha cabe
ça recebia os ensinamentos novos como um rochedo no mar batido pelas tempes
tades e pelos ventos. O que dizia era simplesmente impressionante. Na realidade, eu mesmo j
á senti
ra os impactos do amor. Percebera as ondas que me envolveram no Vale Livre e havia passado por
acontecimentos interessantes. Mas saber agora que os Esp
íritos podem se ligar vibratoriamente e podem at
é manter rela
ções sexuais e viver uma vida dentro da vida, era de estarrecer.
Eleutério abraçou-me com carinho.
-Meu filho, há coisas piores.
Haveria coisas piores?
Eleutério aconselhou-me:
-Aguarde um pouco. Elmiro sairá logo e nós o acompanharemos.
Quem seria Elmiro? Indaguei-me.
O bom amigo, porém, esclareceu:
-Elmiro é o rapaz que vimos hoje e que se imantou àquelas mulheres.
Compreendi e aguardei. Não tardou e o moço saiu de casa. Notamos que estava sozinho. Ninguém com
ele. E as mulheres?
-As mulheres se foram mas você verá que ele não tardará a chamá-las.
-Como, é ele que as chama?
-Geralmente, é pelo pensamento envia-lhes apelos dramáticos e elas vêm. No entanto, se alguém falar
com ele dizendo essa verdade, ele reagirá e negará o fato. Afirmará que o seu maior anseio é libertar-se
desses Espíritos que o amam. Você verá, contudo, que ele sorri de gosto quando fala nelas e se compraz
nesse estranho amor.
Eu estava surpreendido.
-Sim, meu filho, ele considera o seu caso uma doença e quer se libertar, mas o seu inconsciente prende
os Espíritos ao veículo de Elmiro e ele ao mesmo tempo que se alegra também sofre porque tem no
coração um grande desejo de se espiritualizar e progredir. Evidentemente, os Espíritos das mulheres
também se comprazem nessa paixão. Simbiose perfeita amam-se desvairadamente. E sempre o fazem em
grupo.
Elmiro estava se distanciando e nós procuramos alcançá-lo. Ia com passo firme e insinuou-se agora por
viela escura e fétida onde quase o perdemos de vista. Em breve, mergulhava em estranho tugúrio onde
uma mulher ainda moça o esperava. Uma dessas infelizes que vivem do amor dos ho-mens. Recebeu-o
ela com cortesia e entregou-se-lhe corajosamente.
Elmiro acalmou por um momento a sua ânsia sexual e depois saiu. Nós o acompanhamos e vimos que
ainda não dera breves passos e já rajadas de pensamentos emitidos por seu cérebro cortavam o espaço
em todas as direções. Pareciam gritos de angústia. Buscavam as mulheres amigas que
o abraçavam e amavam sempre. -Bem, perguntei respeitoso, mas já não se satisfez? -Não, respondeu
Eleutério, infelizmente a sua fome sexual é sem limites. As vibrações dessas criaturas o acompanham.
Veja! -Prestei atenção à ordem de Eleutério e vi que alguns Espíritos de mulheres aproximavam-se
Eleutério, compadecido, deu-lhe um passe. Pareceu acalmar-se. Isso durou umas duas horas. Olhos
abertos perdidos no espaço, emitia seguidamente imagens femininas que se projetavam à nos-sa vista, no
espaço logo acima de sua cabeça. Víamos as figuras dançarem diante dele. Às vezes sor ria. Outras
entrava em profunda tristeza.
Súbito apareceu no recinto uma mocinha de rara beleza física e de grande beleza espiritual. Elmiro
chamara-a pelo pensamento. Vimos de imediato que era Espírito encarnado, que deixara por momentos
talvez o envolucro carnal atendendo ao poderoso apelo de Elmiro.
-Não se esqueça que ele foi hipnotizador em outras vidas, disse Eleutério. Sua força mental, nesse
campo, é grande e eficiente.
A moça reagia violentamente ao apelo de Elmiro. Via-se que o Espírito não se submetia à in sistência do
rapaz.
-Não, não! dizia ela. Não sirvo para isso! Compreendo-o espiritualmente.
Elmiro segurou-a de modo espiritual pelos braços, pois seu corpo deitado entrara em semitranse e o seu
pensamento o arrastava para nosso plano. Por outro lado, as mulheres que amavam Elmiro e que ainda
estavam ali entraram em enorme gritaria acusando-o:
-Mau, perverso, traidor!
-Eu amo você! -clamava ele. Vem, Adélia, não me abandone!
A moça ergueu a cabeça e disse:
-Não me arraste para esse caminho! Não posso, não devo!
Disse e foi embora.
Elmiro ficou ali aflito, adormecido e de novo retomou completamente o veículo físico. As mulheres
correram de novo para abraçá-lo. Ele não fez mais nenhum gesto para repeli-las. Entregou-se-lhes
indiferente.
-Gostaria de conhecer melhor o seu drama, falei.
Eleutério sorriu e explicou:
Dramas como esse existem aos milhares. Esse é apenas um exemplo mais escabroso. Vamos agora.
Depois lhe mostrarei o resto e lhe direi das causas mais profundas que o afligem.
Saímos. Lá fora, a lua derramava seus raios de prata sobre a terra, testemunha silenciosa dos sofrimentos
da humanidade.
Olhei-a e compreendi a marcha inexorável dos séculos que nos arrastam através dos milênios e das
Idades.
XXVII -O sono de Elmir
o
O sono de Elmiro era um sono agitado e nas noites subsequentes nós tornamos a vê-lo. A sua volta
sempre havia os Espíritos sequiosos de sexualidade. Acompanhamos-lhe os problemas mais íntimos e
compreendemos que sua luta era grande. Os apelos que lhe nasciam na casa mental atraíam as mais
surpreendentes figuras espirituais. Na rua, no serviço, em toda a parte fixava ele alguma mulher que lhe
agradava e à noite, mentalizando-as, via que chegavam arrastadas por seu poderoso magnetismo. Muitas
revoltadas. Vinham espiritualmente e a todas tentava ele submeter à sua atração amorosa no campo do
Espírito.
Ensinara-me Eleutério muitas coisas. Penetrava eu no reino fantástico de conhecimentos ignorados pela
atual humanidade. Saber que Espíritos encarnados estendem raios e redes de forças que prendem outras
criaturas arrastando-as à práticas de atos sexuais, era, na realidade abrir portas nunca abertas.
Elmiro irradiava forças sexuais e o impacto dessas forças atingindo certas mulheres, algumas
respeitabilíssimas, criava-lhes terrível drama interno, pois ao retornar ao organismo físico, desper tando
no mundo da matéria densa, traziam vagamente a impressão dos passos que haviam dado.
Noite após noite, estudamos-lhe o caso e não tínhamos, na verdade, nenhuma solução para e-le.
-Elmiro, disse Eleutério, é caso insolucionável por ora. Deverá permanecer assim até que um dia
libertado dessas mulheres e vivendo noutra faixa vibratória alcançará um clima diferente onde a sua
religiosidade crescerá. Por enquanto, deixemo-lo entregue a si mesmo. Contemplei Elmiro. Deitado na
cama, sonhava o sonho da visão das mulheres nuas que vinham deitar-se com ele como se fossem
criaturas de carne e sangue. Claro que meu entendimento ainda lutava por entender melhor esses
problemas. No entanto, sentia que no Universo, forças desconhecidas e poderosas governam os Espíritos
e compreendi também que o Espírito, encarnado ou não, é centro de profunda atração, capaz de atrair à
distância os outros seres de tal modo a manter com eles, quando a Lei de Afinidade preside os seus
destinos, atos e relações sexuais no plano além da matéria densa. Como, pensava eu, haveriam os
homens de receber as primeiras notícias sobre esse assunto? O que fazer?
Eleutério bateu-me no ombro com carinho e disse:
-Meu filho, Deus que fez os céus e as terras do Universo sabe porque essas coisas acontecem. Na rota
infinita das estrelas muitos segredos guardam os mundos desconhecidos para a nossa humanidade, no
Grande Futuro.
Agradeci as palavras de Eleutério e partimos.
O caso de Elmiro, entrevisto apenas agora guardaria por certo mais profundas revelações. Infelizmente,
não me seria permitido revelar.
Lá fora a lua brilhava silenciosa e amiga e as estrelas pareciam acenar-nos num campo de trigo.
-Mas então, interroguei, não há amor sem a presença indesejável dessas criaturas?
-Há, quando os corações pulsam com pureza e a mente vibra com harmonia e respeito a Deus. Só a
formação moral impede o avassalamento dos Espíritos. A moral cristã principalmente e a piedade cristã
são barreiras quase que intransponíveis para os aproveitadores do sexo. Ama-se verdadeiramente dentro
do respeito sagrado que o sexo merece, sem companhias indesejáveis, quando colocamos a alma e o
coração. A mente fortificada nos pensamentos superiores será sempre uma barreira. Acontece, porém,
que nem sempre os dois parceiros estão nas mesmas condições. O amor dentro do lar, como já lhe
afirmamos goza de proteção quando reina na casa os sentimentos da alta moralidade ou ainda da moral
cristã.
Fora disso, a praça está aberta à invasão. Olhei Eleutério e ele completou:
-Vamos embora, se não, em pouco receberemos as rajadas sexuais que vêm dessa gente.
Tomou-me o braço e partimos.
XXIX -Carla
Os vapores do álcool, as radiações do fumo, e as ondas de sexualidade que emanavam das criaturas
encarnadas e mesmo desencarnadas que os espiavam, haviam me perturbado um pouco e o ar fresco da
noite fez-me bem. Eleutério conduziu-me para fora da cidade, no campo, e em breve vimos uma casa
iluminada onde gargalhadas alegres cortavam o ar.
-Ali, é o tugúrio de Carla, esclareceu o Bom Amigo. Algumas mulheres de alta classe, reunidas por Carla
recebem homens de categoria e passam a exercer o comércio carnal. O preço é alto, mas quase todos são
homens ricos, capitães de indústria ou elementos do alto comércio. Ninguém se
envolve com eles, nem a pol
ícia. E Carla, meu amigo, legisla com impon
ência e classe, respeitada equerida por essa gente.
É certo, que o povo da cidade considera-a uma prostituta, mas n
ão chega a classific
á-la de "vulgar". Falam de suas orgias, etc. etc. Os rapazes da sociedade e os estudantes apa
recem l
á de vez em quando e ela tem a gentileza de trat
á-los bem, abrindo m
ão quase sempre de qualquer pagamento.
Ouvi surpreso as palavras de Eleutério.
Todavia, silenciei.
Logo, estávamos à porta da casa, realmente bonita e bem montada, ao gosto rústico, onde a madeira
envernizada tinha o seu lugar de honra.
Notei logo à entrada, uma mocinha linda, de pouco mais de dezoito anos, de olhos sonhadores, cabelos
negros caídos sobre os ombros, tez morena. Parecia na realidade moça de família.
-Parece e é, acrescentou Eleutério. Carla recruta essas moças na Capital e aprisiona-as neste recanto. Não
podem sair sem sua ordem e obedecem rigorosamente as suas instruções. O dinheiro que ganham lhe é
entregue religiosamente nas mãos e ela da de volta apenas uma pequena parte. Cerca-as porém do
máximo conforto.
De surpresa em surpresa, entrei acompanhado do instrutor e defrontei a seguir belíssima japonesa, de
short e pernas maravilhosamente torneadas. Os olhos apertados e os lábios sensuais davamlhe uma nota
diferente. Compreendi logo porque os homens a amavam. Seu nome era Ieda. Fiquei comovido e
penalizado. Alguma coisa falava dentro de mim de um antigo amor, não sei onde nem quando. Ela
pareceu sentir-me a presença porque suspirou fundo e procurou-me com o olhar. Entrava uma loura
espalhafatosa e Ieda lhe disse:
-Maria, não sei o que me deu agora. Pareceu-me ver ali um homem louro que me fitava triste. Depois
desapareceu. Tive a impressão de que já o conhecia, mas não sei quem é. Esquisito, senti imensa ternura
por ele.
-Não é à toa que às vezes penso que você está ficando louca, quando diz que quer deixar esta vida,
gargalhou Maria.
A japonesa ficou pensativa. Seus traços leves e absolutamente femininos davam-lhe uma expressão de
maravilhosa pureza. Olhei-a com carinho e passei. Onde a encontrara eu?
-As vidas sucessivas explicam perfeitamente esse fato, falou Eleutério. A impressão de reconhecermos
alguém, de imediato, quando na carne, as simpatias espontâneas e as antipatias que brotam de improviso
denotam que defrontamos velho amigo ou antigo inimigo. No caso presente, meu caro, você se encontra
diante de velha conhecida de Paris e do Oriente.
Se você procurá-la na carne verificará que dela nascerá por você um amor espontâneo e rápido.
Provavelmente dirá:
-Parece que eu já o conheço há muito tempo! De onde?
-E você, naturalmente, não saberá responder ou dirá: foi em outra vida!
Realmente, meu coração palpitou mais intensamente diante da japonesa.
Passei e vi que os quartos estavam bem decorados, com cortinas de rendas longas e na realidade todos os
quartos perfumados, semelhavam quartos de mocinhas educadas, de boas famílias. Não faltavam é
lógico, os Espíritos ligados ao sexo que por ali andavam unindo-se a uns e outros.
Que era bordel era, embora bordel de alta classe, mas os Espíritos que ali estavam denotavam
o mesmo teor vibratório mental daqueles que vivem no sexo e para o sexo, insaciáveis e tristes. Fa ces
transfiguradas, membros sexuais de enormes proporções, olhares fusilantes e as mãos semelhantes a
garras. Era o amor livre e o Espírito, evidentemente entrega-se totalmente às sensações que o dominam.
Voltava-me à mente as indagações permanentes: como podia o sexo que era sagrado e o prazer do sexo
que era criação de Deus degenerar daquela forma? Seria degenerescência ou tudo aquilo na Ordem
Universal da Natureza seria absolutamente normal? Só Eleutério poderia me responder mas o Espírito
havia se afastado em busca de Carla e eu fiquei com meus pensamentos. A japonesa parecia ver-me
porque sorria.
Procurei Eleutério. Encontrei-o após. Carla estava deitada, descansando. Nossa entrada na casa parece
que mudara, pela vibração do grande Espírito, a vibração do ambiente. Embora na sala al-guns casais se
divertissem no jogo sexual, algumas mulheres passaram a manter-se pensativas. Pas
sando pelos corredores, vi nos quartos casais que se amavam, que se beijavam ou que se entregavam ao
desvario do amor. O pensamento de Carla agora flutuava como bal
ão que subisse lentamente. Lembran
ças esquisitas dominavam-lhe a mente. Lembrava-se da inf
ância de menina pobre, dos pais, agora velhos e que naquele tempo nada podiam lhe dar, no mo
ço bonito que a desvirginou, naqueles anos todos de sofrimento perambulando pelos caminhos da
prostitui
ção e enfim a casa que montou com esfor
ço e que agora se tornara naquele local de concentra
ção de gente rica, que lhe trazia o di
nheiro nas m
ãos. Ela que se acostumou a ser dura, teve pensamentos de amor pelas meninas e fez prop
ósitos de ajud
á-las materialmente. Libert
á-las, por
ém, nunca!
Está vendo, falou Eleutério. É sensível à nossa aproximação, no entanto, não abre mão do di reito de
escravizar. As infelizes permanecerão aqui ainda por muito tempo porque ela não permitirá nunca que
conquistem uma vida melhor.
Entidades perversas que dominavam Carla afastaram-se dela assim que nos aproximamos. Embora não
nos vissem, murmuraram entre si:
-Vocês não acham que há qualquer coisa esquisita no ambiente? dizia uma.
-De fato, falou outro. Nota-se algo estranho e indefinido. Parece que Carla mudou e está pensando em
se regenerar. Temos que estar vigilantes porque não iremos permitir isso!
-Não, não! -afirmou um terceiro. Abandonar esta vida ela não abandonará! Depois, é preciso que se saiba
que isto também é nosso! Não fomos nós que ajudamos, encontrando os fregueses paraela? Se não
fôssemos nós ela jamais teria tido êxito! É verdade que em troca nós nos divertimos e vivemos a vida,
unidos a esses casais. Mas a realidade é que sem nós, Carla não seria ninguém!
Ouvimos e ficamos admirados.
É assim mesmo, meu filho, ensinou mansamente Eleutério. Ela escraviza as moças e os vampiros a
escravizam. Ela comercializa a carne das meninas e eles respiram sensações sexuais deste lado. Por sua
vez, não tem coragem de sair daqui e passarão anos nessa situação por sua vez, também escravizados, na
própria armadilha que criaram.
-Bem, arrisquei um pensamento, mas um dia Carla e as moças morrerão, não é verdade? E eles para
onde irão?
-Para outro bordel, até que a Lei os atinja. Aí então descerão ou entrarão em crise terrível. Poderão ficar
loucos e buscarão o Vale. Ou começarão a perceber a decadência da forma perispiritual. De qualquer
jeito terão que defrontar a inexorabilidade da Lei que sempre funciona. Não fugirão à regra. Um dia
despertarão para o sentimento do infinito e virão de alma esfarrapada rezar no Altar de Deus.
XXX -A japonesa
Lá fora, vi com surpresa que a pequena e bela japonesa contemplava o jardim em volta da ca sa com ar
pensativo.
Imensa ternura dominou-me o coração.
-Ela está pensando em fugir, disse o Espírito, e mais do que isso, pensa em fugir a esta vida sexual, agora
sem sentido para ela.
-O que há entre nós, Eleutério? Perguntei envergonhado. Profunda atração me arrasta para es-sa menina
e enorme piedade penetra minha alma ao vê-la. Eleutério sorriu compreensivamente.
-Coisas de um passado distante, meu filho. Você já viveu no oriente, foi também mongol, de cabelos
hirsutos e bigodes longos de chinês caídos sobre a boca. Comandante de legiões de hunos, assolava a
terra em seu corcel de morte e por onde passava conduzia a devastação. As moças que encontrava com
seus homens eram repartidas. Escolhia para si a melhor. Essa é uma daquelas que durante muito tempo,
arrebatada dos pais pela sua violência, acompanhou-o nas lutas e nas guerras. Depois, reencarnou muitas
vezes e o perdeu de vista. Ela contudo ainda ama o cavaleiro audaz que no fundo de sua memória
integral galopa os corcéis da morte.
Quer ver?
Dizendo isso, Eleut
ério aproximou-se da menina e colocou-lhe a destra na fronte.
Imediatamente tudo clareou e passei a ver como num filme, vastos campos onde cavaleiros em disparada
devoravam o espaço. Pequena aldeia aproximava-se e à frente da brigada selvagem, enorme huno ou
mongol cavalgava belíssimo corcel. Em seus olhos brilhava a paixão da guerra e a voracidade sexual.
Entraram na aldeia e passaram os seus habitantes a fio de cimitarra. As mulheres, porém, agarradas na
fúria da invasão eram colocadas na garupa dos animais que partiam como relâmpagos. O Chefe huno,
entrou na casa do chefe da aldeia, arrancou-lhe a filha de dezoito anos dos braços e levou-a como um
demônio. Não matou os velhos, apenas lhes disse:
-Nada temam. Sou o Chefe e vou fazê-la nossa rainha.
Outras cenas se sucediam mas nós estávamos chocados. Aquele homem selvagem éramos nós, no
entanto, quando?
Eleutério bateu-me nas costas e confortou-me:
-Não se preocupe, meu filho, todos nós viemos da inconsciência para a consciência e iremos da
inconsciência para a razão humana e da razão humana para a razão divina através da angelitude.
Agradeci a bondade do Amigo. Meus olhos estavam cheios de lágrimas e não pude furtar-me a
imprevisto gesto de ajoelhar-me perante a mulher e beijar-lhe as mãos delicadas. Pareceu perceber
porque retirou a mão depressa e recuou assustada. Olhou por todos os lados e depois disse para si
mesma:
-Não é nada, pensei que alguém me beijava as mãos e me pedia perdão.
Será que estou ficando louca?
Disse e correu para dentro.
Fiquei, todavia, ali, ajoelhado. Soluços pungentes cortaram-me o peito.
Era eu o causador de tanta infelicidade! O que fazer para recuperá-la?
-Não se desespere, compadeceu-se Eleutério. Ela já está numa atitude mental favorável. Iremos
requisitar o Grupo de Salvação dos Samaritanos para acabar de libertá-la e em breve você a reencontrará
em um de nossos hospitais.
Meus soluços cessaram às palavras do Espírito e compreendi porque Eleutério me levara até ali onde o
passado distante se me tornara um presente terrível. Na realidade, eu sentia que me en contrara a mim
mesmo com todas as misérias guardadas no tempo.
XXXI -Visitantes
Estranhas entidades penetravam no lar de Carla. Grupos de Espíritos debochados chegavam juntos com
os homens que ali vinham buscar o prazer e talvez o esquecimento.
Recebidos na sala, sentavam-se à volta de pequenas mesas onde se divertiam saboreando o whisky caro
de Carla abraçados às meninas que passavam a rodeá-los. O dinheiro jorrava e o riso enchia o recinto.
Com eles, os Espíritos riam, divertiam-se e amavam-se na mesma base que os encarnados. Não se
diferenciavam deles. Envolviam os homens, abraçavam-se com as mulheres e seguiam para a cama na
loucura do amor.
Assistíamos a tudo como os médicos olham os doentes.
-Eleutério, perguntei, há crime nisso?
-Não, esclareceu o Espírito, crime não há. O que há é desperdício de uma energia preciosa que faltará ao
cérebro e enriquecerá o perispírito. O exagero e a permanência demorada no campo sexual é que
prejudicam a criatura. Mas é um prejuízo todo pessoal, que absolutamente não afeta a Deus. Deus é pai e
amigo e têm as suas leis que governam o Universo independentes Dele. Depois de criadas dirigem o
desenvolvimento do ser através dos milênios. Não há crime e não há pecado. Há apenas endurecimento
do perispírito, diminuição das percepções espirituais, estacionamento no tempo e no espaço. Poderíamos
dizer que o Espírito se atrasa espiritualmente, nunca porém crime ou pecado. Além disso, como já
tivemos oportunidade de dizer, adquirem amizades inconvenientes,
associam-se a Esp
íritos inferiores e podem cair nas pervers
ões sexuais, que
é cap
ítulo
à parte no es
tudo da sexualidade.
-Você não acha Eleutério, indaguei a medo, que o comércio sexual na terra ainda é uma necessidade?
-Você diz o comércio normal dos casais ou o entendimento com as mulheres perdidas?
-Com as mulheres perdidas.
-Bem, nós somos de opinião que constitui ainda necessidade inadiável. Em face do estágio de evolução
dos homens, constitui, de certa forma, garantia para a sociedade. Evidente que o homem não poderia
manter de forma alguma a abstinência total. Só os mortos se mantêm nessa posição.
Refrear de uma vez o exercício sexual na fase atual da evolução humana, de atraso, seria im pedir a
expansão natural dos sentimentos sexuais e o homem seria conduzido à pratica de crimes horrendos,
como sejam o assassinato, o latrocínio e outros piores. O represamento violento das energias sexuais
levam o homem superior à realização de obras intelectuais, artísticas ou santificantes de grande
importância para a humanidade, mas a contenção dessas mesmas energias no seu interior, arrastá-lo-á à
violência e ao crime. Cada um dá o que tem. O homem bom pensará em usar a energia atômica para
visitar outros mundos, e o homem mau pensará de imediato em usar a mesma energia atômica para
destruir países e cidades.
A surpresa estampava-se, é lógico, no meu rosto. Eleutério percebeu e riu.
-Meu filho, pode parecer que estou criando uma nova moral, mas a verdade é essa. Há casos particulares
intrincados que só serão resolvidos com o tempo e que envolvem a harmonia das famí lias, no entanto,
esses lares só se mantêm unidos porque o homem que não se entende com a esposa encontra alguma
satisfação no comércio carnal com essas mulheres. Homens de enorme responsabilidade na sociedade e
no mundo social, no amor destas infelizes acalma as suas paixões. É uma fuga necessária.
A proporção porém que o Espírito progride e evolui vai ele se libertando dessas situações. Não se
esqueça que Jesus sempre tratou com carinho as prostitutas mas não pode redimir a todas. O mundo
depois d'Ele continuou cheio delas. O assunto, na verdade é de difícil entendimento e sei que você lutará
com estas novas idéias. Não faço absolutamente apologia da sexualidade atormentada, apenas identifico
um fenômeno que existe e que se não é solução definitiva é, contudo, um mal necessário. O bom senso
indica isso.
Eleutério calara. Meu olhar perdia-se agora no infinito. Era muito difícil compreender tudo! Como
haveremos de fazer para atingir a Suprema Compreensão?
Eleutério bateu-me, como lhe era habitual, nas costas:
-Nem eu compreendo. No mundo Espiritual, Grandes Entidades continuam estudando o assunto.
Evidentemente, em breve, recolheremos melhores e maiores esclarecimentos. Não se esqueçaque estou
lhe oferecendo somente conclusões minhas, de caráter pessoal. É o meu modo de entender. Aqui, no
Plano do Espírito, cada um diz o que sabe, embora também haja códigos e estudos da Esfera mais Alta,
que definem o pensamento geral da Comunidade que os espíritas de determinada faixa vibratória
habitem. A proporção que subimos e passamos a viver em faixas vibratórias superiores, dispondo de
novos conhecimentos, compreendemos mais e a moral é outra, apesar de que em suas linhas gerais
permaneça sempre o pensamento do Cristo. E neste caso ainda vale a afirmativa do Mestre:
-Aquele que estiver sem pecado que atire a primeira pedra...
Tive a impressão que meus olhos se abriram mais compreensivos e surpresos agora e que meu coração
recebia uma rajada maior de entendimento e de amor.
XXXII -O drama
Como tantas outras criaturas, Carla vinha de encanação em encarnação mantendo lares de a-mor como
aquele. Através das civilizações desde as épocas mais remotas. Espírito endividado.
Calou-me fundo a sua situação. Observamo-la, por isso, com interesse.
Eleut
ério, sempre pronto a iluminar-me o Esp
írito com conhecimentos novos, n
ão se furtava a responder aos nossos apelos mentais. Sentia e compreendia-me perfeitamente as inquieta
ções como quem l
ê num livro aberto.
-Carla, meu amigo, sentiu nossas vibrações e nossa presença. Hoje, é criatura temente a Deus.
-Como, essa criatura que mantêm tanta gente escravizada, é temente a Deus, respeita Deus?
-Sim, respeita e acata Deus. Sabe que Ele existe e faz as suas orações habituais com muito fervor, no
entanto, ainda não conseguiu se libertar. Há um drama na sua alma. Além disso, cria uma menina
paralítica à qual dedicou todo o seu amor. Quer ver?
Dizendo isso, Eleutério levou-me para os fundos do jardim da casa onde uma casinha recoberta de flores
rodeada de gramado verde dava outro colorido.
Entramos. Uma criada desenvolvia ali suas atividades em volta de uma criança de treze a quatorze anos
que jazia paralítica numa cadeira de rodas.
O amigo murmurou baixinho:
-Essa é Liana, filha adotiva de Carla. Todo o dinheiro que Carla recebe é canalizado para a cura dessa
menina.
Ainda falava Eleutério quando entrou a japonesa e abraçou-a com carinho.
-Liana, meu amor, como tem passado?
Fiquei perplexo. A moça beijou e abraçou a criança com carinho imenso.
-Veja o que eu trouxe para você, disse, e retirou das dobras do vestido pequena caixa de bombons, que
lhe entregou. A menina sorriu de prazer.
-Que bom, exclamou feliz, eu já estava com saudades suas. Você não vinha mais me ver. E o tio Paulo?
Sumiu?
-Ah! O tio Paulo não tem vindo mais! com certeza está viajando, respondeu a outra.
Compreendemos que falava de algum dos rapazes que as visitavam e que deveria ser cliente da moça.
Observei as pernas da menina e vi que eram magérrimas, assim como seus braços e incapazes de sustê-la
em pé. O rosto, todavia, era belo, maravilhoso! O olhar possuía profundo e sincero magnetismo.
-Está vendo, concluiu Eleutério, Carla se dedica de corpo e alma a essa criança e as outras mulheres
adoram a menina. Nem sempre, pois, se pode julgar as criaturas. Jesus ensinou: Não jul gueis para não
serdes julgados. Carla como você vê está melhorando. Através dos séculos vem encontrando o seu
caminho. Algum dia se libertará. Não advogamos em absoluto a sua permanência no mundo da
sexualidade, mas entendemos perfeitamente que a casa, de certa forma, colabora para que o mundo seja
menos infeliz até que os homens atinjam maior grau de evolução. Se não existissem esses antros, não
haveria virgens na Terra. A violência carnal e avassaladora do homem faria da Terra inteira um imenso
bordel. A natureza não dá saltos e ninguém alcança a evolução de um dia para outro. O Espírito
endurecido na terra luta desesperado consigo mesmo para vencer as barreiras terríveis da sua própria
limitação. Lembra o pintassilgo dentro do ovo: romper a casca para ele é enorme sacrifício e ele só
poderá fazer na hora certa e nos limites de ferro do ciclo de gestação. A mente humana está no mesmo
caso. Amadurece devagar e compreende devagar. Os gênios são o resultado da evolução de milênios.
Não se alcança a perfeição a toque de caixa. Realmente, a criatura pode acelerar a sua evolução voltando
o seu pensamento diuturnamente para as coisas espirituais, e, em nosso planeta, fixando-o no Cristo.
Fora disso, reencarnará tempo a fora no desespero de despertar em esferas mais altas.
Ouvi Eleutério, o Grande Espírito, e contemplei a menina paralítica. Que estranho caminho conduzira
aquela mulher a dar o coração àquela alma pura e organizar ao mesmo tempo um templo de amor aos
desconsolados e aos loucos?
-São os mistérios do Caminho de Deus, meu filho, respondeu o instrutor. A alma atravessa as Idades
como um pássaro que atravessasse o oceano, a primeira ilha que encontra pousa para descansar, depois
levanta vôo de novo. O seu objetivo, porém, é o outro continente. Pousará em quantas terras encontre até
que um dia pousará em porto seguro. E o nosso porto seguro é Deus.
Fomos saindo da casinha. Tudo era belo em torno, os insetos cantavam a sua can
ção e os va
ga-lumes acendiam as suas lanternas.
Abracei Eleutério fraternalmente e disse-lhe:
-Eleutério, Deus lhe pague por tudo, você é um grande amigo.
Ele sorriu como quem sabe que eu estivera muito perto do meu destino.
Lancei um último olhar à japonesa debruçada sobre a menina paralítica. Meus olhos encheram-se de
lágrimas de amor.
-Isso é o que podemos denominar de sexo neutro ou o terceiro sexo, esclareceu Eleutério. Formam uma
população minoritária à margem da população normal. Vivem uma vida diferente e mantêm-se num
clima mental totalmente estranho para o mundo. Não são homens nem são mulheres, sexualmente
falando. Estudaremos evidentemente o que são. Mergulharemos em suas almas, se nos for permitido.
Paráramos ali para aproveitar a vibração ambiente e rever velho amigo. Eleutério dissera-me que
deveríamos reabastecer a fim de termos energia para o futuro.
Penetramos, após haurir energias nos raios da lua e na claridade lunar que nos vinham nas mãos da noite,
em casa modesta, onde o companheiro nos esperava.
-Este é um santo afirmou Eleutério. Deu a sua vida e o seu amor à humanidade inteira.
Olhei o amigo que nos recebeu com um grande abraço. De sua cabeça e de seu tórax, intensa luz se
irradiava. A beleza de seu olhar e de seu rosto era como a beleza dos anjos. Recebi-lhe as vibrações
como poderosos raios que me penetrassem o organismo todo. Senti-me reanimar. Ofereceunos em
seguida um cálice de fluidos. É lógico que ali estava o seu Espírito no Plano Espiritual. Visitávamos,
pois, um Espírito. Eleutério manteve com ele ligeira conversa e o Grande Amigo, sorrindo, esclareceu:
-Agora compreendo a razão desta visita. É interessante o estudo que estão fazendo em torno de sexo.
Numerosas são as consultas que em meu trabalho de mediunidade terrestre tenho recebido. Todos estão
angustiados, aflitos, querendo uma solução. Creio que o auxílio de vocês nesse campo será inestimável.
Como primeira idéia, acho maravilhosa! Vocês não imaginam o desespero dessa gente! Na realidade, o
sexo tem matado ou tornado infeliz mais gente do que o amor e o ódio e talvez mais do que as próprias
guerras...
De maneira que toda contribuição superior no campo espiritual é inestimável tesouro. Agradeço-lhes
pois o que estão fazendo pelos homens. Tenho certeza que diminuirá o número dos consulentes que,
agora, encontrarão no trabalho de vocês resposta a muitas indagações.
Contemplei o companheiro que apresentava ali nova contextura perispiritual. Notei que maior poder se
irradiava ainda de sua mente.
Seus olhos tornaram-se mais brilhantes e ele prosseguiu:
-O meu caso por exemplo, é uma necessidade imposta pelo Plano Superior. Quando fui cha mado a
reencarnar, os engenheiros e técnicos de reencarnação excluíram de meu mapa qualquer possibilidade de
casamento. Todas as minhas energias, disseram eles, deverão ser dedicadas ou canalizadas para a
recepção de livros espirituais e em menor escala para a caridade cristã. Os livros seriam na realidade os
meus filhos. O meu maior sonho seria casar e ter muitos filhos, dedicar-me ao lar e dar todo o meu amor
à companheira e a eles. Seria o que de maior poderia me suceder na Terra, contudo, não tenho esse
direito. Deverei abraçar e amar a todos com o mesmo carinho e com o mesmo amor. É um imperativo da
Vida Maior. Resta-me nesta vida, tão somente o trabalho cristão, Fora disso, deverei zelar a fim de não
me perder.
-Mas...
Uma pergunta ia ser esboçada por nós. Não tivemos coragem de fazê-la.
Ele porém que já lera o nosso pensamento, esclareceu:
-Meu caro, toda sexualidade que poderia se expressar, em nosso caso, através dos órgãos já desapareceu.
Já não temos há muito tempo, qualquer vibração nesse sentido. Foi-nos tirada essa possibilidade.
Realmente, isto facilitou-nos a tarefa. Nos primeiros tempos de nossa encarnação ainda sentíamos
algumas vibrações sexuais, depois tudo desapareceu como uma grande névoa. Ficou-nos a alegria de
amar espiritualmente só.
Na fisionomia dele, vimos uma longínqua tristeza.
-Não repare, meu amigo, disse ele. Meu anseio por ter filhos é tão grande que não posso sopitar os meus
sentimentos. Mas na próxima encarnação voltarei e terei muitos filhos.
Saímos de novo para fora, como quem vai se despedindo e ele acompanhou-nos a porta. Os fluidos
ingeridos davam-nos novas energias e sentiamo-nos recuperados.
De repente, dirigiu-se ele a Eleutério:
-Sabe que recebi a not
ícia de que Tamerl
ão ir
á receber amanha
à noite, pela madrugada, o comando das legi
ões das trevas antes comandadas por Greg
ório?
-Sei, respondeu o instrutor. Tenho ordens extraordinárias para comparecer e assistir tudo a fim de fazer
as devidas comunicações às esferas superiores.
-Eu também espero estar lá, acrescentou ele. Emmanuel prometeu-me essa oportunidade. Provavelmente
não nos veremos, não é mesmo? Porque estaremos em situação diferente de vibração.
Amor tipicamente de almas absolutamente afins. Há, na verdade, amor, porém não há sexo como
entendemos na Terra. O amor que fluí das almas nem sempre se expressa através dos órgãos sexuais.
Você já sabe disso. Onde estiverem as almas gêmeas, se elas se encontrarem se reconhecerão e grande
será a luta para impedir que se unam. Imensa atração magnética exerce terrível ação sobre elas. Quando
essas almas gêmeas estão em estágio superior de evolução, o caso é simples e fácil. Sabem o que fazem e
compreendem que devem respeitar as leis de Deus. Quando ainda estagiam em situação inferior, há
dramas sem precedentes.
Exemplo simbólico: Romeu e Julieta. Não conseguem viver um sem a presença do outro e enfrentam
todos os riscos.
Ele falava e o meu pensamento e a minha mente queriam mais. Preocupavam-me as origens, o
nascimento das almas gêmeas.
-Meu irmão, acrescentou o amigo, para explicar-lhe isso eu teria que esclarecer-lhe a origem da
formação das almas, o que na verdade eu ainda também não sei. Vê como é fascinante o problema?
-Teremos, antes de nos despedirmos, que comparecer a uma reunião muito séria que foi programada
pelas Trevas. Recebi ordens para estar presente com você.
-Reunião das Trevas? Murmurei.
-Infelizmente, os Espíritos inferiores que assolam a Terra buscando desviar os homens do Caminho do
Bem, pretendem se reunir numa grande assembléia, quando Tamerlão assumirá o posto deixado por
Gregório. Diz a notícia que recebi que ele pretende traçar o seu programa de guerra aos espiritualistas.
Iremos como observadores. Eu, para o Mundo Espiritual, e você, para o Mundo Terrestre.
Gregório havia sido capturado pelos inimigos e a legião estava sem chefe.
No horário marcado, um sussurro percorreu a multidão. Nós havíamos entrado ali vibrando em altíssima
vibração de modo que ninguém poderia nos ver ou perceber. Uma mesa de pedra rústi
ca servia de tribuna para o General, pois Tamerlão significava um general para a sua Legião.
Eleutério dissera-me em voz baixa:
-Guarde o maior silêncio porque estamos no Reino de Tamerlão e aqui manda ele.
Um grande acontecimento estava para se realizar.
Pela primeira vez notei preocupação no olhar de Eleutério.
-Meu filho, esse Tamerlão, Gênio do Mal, deverá traçar diretrizes perigosas de combate às
forças do Bem. Precisamos de estar vigilantes.
Gregório já buscava a Espiritualidade, mesmo inconscientemente. Este não, este ainda vibra nas faixas
mais inferiores, embora seja potentíssima inteligência. Cérebro dinâmico voltado para a destruição de
tudo o que é bom e divino. Quer solapar-nos o movimento de libertação. Eleutério si lenciou e eu vi em
seus olhos uma certa tristeza.
Tamerlão entrou. Grande estatura, forte, musculoso, passo firme e decisivo, figura extraordinária de
mongol. Cabelos pretos, bigodes enormes caídos à margem da boca, à feição chinesa. Olhar que
desprendia chama. Entrou e mal cumprimentou a multidão, como se fosse um novo Napoleão.
A frente da mesa parou e dirigiu-se aos seus camaradas:
-Senhores, espíritas do submundo, assumo agora as legiões e o poder das trevas!
Ninguém disse nada. Reinou o silêncio mais profundo.
Percorreu com os olhos toda a multidão e falou:
-Ninguém tente me desrespeitar porque será punido! A vingança de Tamerlão é cruel e sem
fim. Quem não quiser me seguir que diga agora e se manifeste. Terá liberdade para se retirar! Fora disso
será punido se vier a cometer falta no futuro. Nós não perdoaremos ninguém!
Com essa afirmativa retirou do bolso da túnica um mapa, colocou sobre a mesa e com uma espécie de
lápis vermelho na mão, declarou:
-Não seguiremos o caminho de Gregório que fracassou. Seguiremos nova rota.
Afirmando isso, riscou o estranho mapa de alto a baixo e gritou:
-Iremos combater os Espíritos e os espíritas aqui:
E com traço rápido escreveu SEXO.
O silêncio tornou a envolver a todos.
-Companheiros, falou de novo, só há um caminho para destruir os fanáticos da Espiritualidade Superior:
atacá-los sem tréguas no Castelo do Sexo. Poucos são os que resistem à fúria sexual! Nem os heróis e
nem os santos! Atacaremos primeiro os líderes do Espiritismo e aqueles que se tornaram paladinos da
Espiritualidade no mundo. Nosso campo de batalha será o campo sexual onde o
homem
é mais fraco! Tenho certeza que poucos restar
ão de p
é! Destru
ídos os ign
óbeis Filhos do Cordeiro ser
áf
ácil destruir a massa!
Falou e uma onda de aplausos partiu de todos os lados. Era em verdade uma idéia genial. Tamerlão
sorriu.
-Ordeno aos nossos amigos que chefiam, organizarem grupos para o ataque.
Não perdoem nem homens nem mulheres. Desprestigio, desgaste, desmoralização através do Sexo e
sairemos vitoriosos!
Novos aplausos. Tamerlão com um gesto rápido de despedida saiu.
Nós também nos retiramos. A lua brilhava no firmamento.
Eleutério comentou:
-Realmente, agora estou preocupado. Nem Adão resistiu à força do Sexo.
Espírito genial e mau, Tamerlão vai fazer muito mal em nossas hostes.
Precisamos preparar a defesa. Você, meu filho, entendeu o que ele disse?
Com um gesto de cabeça disse que sim.
-Pois é, atacará os espíritas na sua fragilidade, que é o sexo, procurará aproximar os lideres de mulheres
que com eles tiveram ligações de outras vidas, que foram noutra época suas esposas ou suas amantes, e
através desse velho amor buscará desmoralizá-los no mundo e inutilizar a obra evangélica que estejam
realizando pelo escândalo. Precisamos andar depressa, antes que a sua devastação seja muito grande!