Jennifer Estep - Elemental Assassin 15 - Unraveled

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O que poderia dar errado quando se está tentando desvendar

uma conspiração de décadas?

Como a atual rainha do submundo de Ashland, você pensaria que


eu, Gin Blanco, saberia tudo sobre uma sociedade secreta controlando
as coisas por trás dos bastidores. Eu posso ser a Aranha, a assassina
mais temível da cidade, mas as minhas magias elementais de Gelo e de
Pedra não me ajudaram muito a aprender mais sobre “o Círculo”. Apesar
das minhas investigações contínuas, as pistas ficaram tão frias como
o inverno que se aproxima.
Então, quando Finnegan Lane, meu irmão adotivo, recebe a
notícia de uma herança inesperada, nós pensamos por que não sair da
cidade para ir a algum lugar menos perigoso por alguns dias? O
lugar: Bullet Pointe, um complexo hoteleiro sofisticado com um
parque temático do Velho Oeste que Finn agora possuía.
No início, todos os cowboys e as garotas atrevidas do saloon
são apenas divertidas. Mas, acrescente algumas coincidências
sombrias e assassinos do Círculo à espreita, e as férias tornam-se
mais selvagens - e mortíferas - do que qualquer um de nós esperava.
Ainda bem que esta assassina trouxe muitas facas para o
tiroteio...
Capítulo 1
Era a noite perfeita para matar alguém.
Nuvens espessas e pesadas obscureciam a lua e estrelas,
aprofundando as sombras da noite fria de dezembro, e uma garoa gelada
respingava do céu, cobrindo tudo lentamente com um brilho liso e traiçoeiro.
Pingentes de gelo já haviam se formado em muitas das árvores que se
alinhavam na rua, parecendo dedos retorcidos e brilhantes que se arrastavam
por todos os galhos nus e esqueléticos. Nenhum animal se movia ou agitava-
se, nem uma coruja andava em uma das copas das árvores procurando abrigo.
No quarteirão as luzes vermelhas, verdes e brancas piscavam nas
portas e janelas de uma das amplas mansões afastadas da rua, e o leve trinado
de canções natalinas enchia o ar. Um rápido fluxo de pessoas passava pela
porta da frente enfeitada de visco, descia a entrada de carros forrada com
bonecos de neve e indo para os carros, entrando nos veículos e ligando os
motores. A festa de jantar de alguém estava terminando rapidamente, embora
fossem apenas nove horas. Todos queriam ficar em casa e em segurança,
quentes e aconchegados em suas próprias camas, sonhando com os anjos,
antes que o tempo piorasse. Em dez minutos, todos teriam ido embora, e a
rua ficaria quieta e deserta novamente.
Sim, era a noite perfeita para matar alguém.
Pena que minha missão era apenas de reconhecimento.
Eu me abaixei no meu assento, ficando o máximo possível longe da
vista dos faróis que passavam. Mas nenhum dos motoristas deu uma segunda
olhada na minha velha van branca, e eu duvidava que qualquer um deles
ficasse olhando para as letras azuis na lateral que dizia Cloudburst Falls
Catering. Buffet, floristas, músicos. Tais veículos de serviço eram muito
comuns em Northtown, a parte de Ashland onde a elite rica, social e mágica
vivia. Se não fosse pelo péssimo clima, toda essa rua provavelmente estaria
iluminada pelo clima de festa enquanto as pessoas realizavam várias festas,
cada uma tentando superar seus vizinhos com exibições de luzes
espalhafatosas.
Uma vez que o último carro passou e o último par de faróis
desapareceu, eu me endireitei no meu assento, peguei o binóculo do meu colo
e espiei através deles outra mansão próxima.
Um muro de pedra cercava essa mansão da rua, com um grande portão
de ferro que estava fechado e trancado. Diferentemente de seu vizinho,
nenhuma luz de Natal decorava essa casa, e apenas um único cômodo na
frente estava iluminado – um escritório com portas de vidro que davam para
um pátio de pedra. Cortinas finas e brancas cobriam as portas e, a intervalos
de poucos segundos, a forma escura de um homem aparecia, movendo-se para
frente e para trás, como se ele estivesse continuamente andando de um lado
para o outro do escritório.
Eu aposto que ele estava andando de um lado para o outro. De todos
os relatórios que eu ouvi, ele tinha ficado escondido em sua mansão por
meses, preparando-se para o seu julgamento por assassinato, que deveria
começar depois do primeiro dia do ano. Isso seria o suficiente para fazer
qualquer um enlouquecer.
Ao meu lado, um rangido suave ecoou, seguido por um suspiro longo
e alto. Dois sons que eu ouvi várias vezes na última hora em que eu estive
estacionada aqui.
O homem na mansão não era o único enlouquecendo.
— Diga-me novamente. Como eu fiquei preso com você esta noite? —
Uma voz baixa murmurou.
Eu abaixei meu binóculo e olhei para Phillip Kincaid, que tinha os
braços cruzados sobre o peito musculoso e uma expressão teimosa em seu
rosto bonito. Um longo casaco preto cobria seu corpo, enquanto uma toca
preta estava puxada sobre sua testa, escondendo seus cabelos dourados de
vista, exceto pelo rabo de cavalo baixo que estava na parte de trás. Eu estava
vestida toda de preto também, das minhas botas ao meu jeans, minha blusa
de gola alta, colete silverstone e casaco de lã. Uma toca preta também estava
na minha cabeça, embora eu tivesse colocado todo meu cabelo castanho
escuro embaixo do gorro de tricô.
— O que há de errado, Philly? — Eu disse. — Não gosta de ser minha
babá hoje à noite?
Ele deu de ombros, nem mesmo se importando em negar. — Você é
Gin Blanco, a famosa assassina que virou rainha do submundo. Você não
precisa de babá. — Ele se mexeu em seu assento, fazendo-o ranger
novamente, e balançou a cabeça. — Mas Owen insistiu nisso... as coisas que
faço por esse homem.
Phillip estava certo. Como a Aranha, eu poderia dar conta sozinha de
praticamente qualquer situação. Eu certamente não precisava dele aqui, mas
Owen Grayson, o melhor amigo de Phillip e meu namorado, queria que fosse
assim. Mas eu não protestei muito quando Phillip apareceu no Pork Pit e me
disse que queria ir junto hoje à noite.
Com os misteriosos membros do Círculo lá fora, um pequeno reforço
poderia ser útil. Mesmo que o backup fosse mais resmungão do que se poderia
esperar.
— Por que Lane não podia ficar aqui com você? — Perguntou Phillip.
— Ou Jo-Jo ou até mesmo Sophia nesse caso? Por que eu fui eleito para
congelar minhas bolas hoje à noite?
Finnegan Lane, meu irmão adotivo, foi muitas vezes meu parceiro no
crime em todas as coisas relacionadas à Aranha, enquanto Jo-Jo e Sophia
Deveraux, respectivamente, me curava, e se livrava do sangue e dos corpos
que eu deixava no meu caminho.
— Porque Finn ainda está lidando com a bagunça que Deirdre Shaw
deixou no First Trust Bank, e Jo-Jo e Sophia tinham ingressos para O Quebra-
Nozes — eu disse. Marcando nossos amigos nos meus dedos. — E claro, você
sabe que Owen prometeu a Eva que ele ajudaria com aquela arrecadação de
brinquedos de Natal que ela está liderando na faculdade comunitária.
— Eu teria ficado feliz em ajudar Eva com sua arrecadação de
brinquedos — Phillip resmungou. — Emocionado. Em êxtase, até.
Apesar da diferença de idade de dez anos, Phillip era louco por Eva
Grayson, a irmã mais nova de Owen, embora ele estivesse esperando que ela
terminasse a faculdade e ficasse um pouco mais velha antes de buscar uma
relação real com ela.
— Qualquer coisa teria sido melhor – mais quente – do que isso. — Ele
levantou a gola do casaco para cobrir mais de seu pescoço, depois se abaixou
ainda mais em seu assento.
— Ah, pobre bebê. Preso aqui no frio e no escuro comigo esta noite. —
Eu estalei minha língua com simpatia. — E pensar que eu estava prestes a
oferecer-lhe um pouco de chocolate quente.
Seus olhos azuis se estreitaram com interesse. — Você tem chocolate
quente? Chocolate quente caseiro?
Abaixei a mão e tirei uma garrafa térmica grande de metal da mochila
preta que estava entre nossos assentos no chão da van. — Claro que eu tenho.
Você não pode fazer uma vigilância em uma noite fria de inverno sem isso.
Peguei duas canecas de plástico da sacola e as entreguei a Phillip, que
as manteve firme enquanto eu servia. O aroma rico e inebriante da bebida
deliciosa encheu a van, cortando o frio gelado que se infiltrara no interior do
veículo. Eu respirei a fumaça enquanto tampava a garrafa térmica e a
guardava. Phillip passou a minha xícara e eu respirei mais profundamente,
antes de tomar um gole. A bebida escura cobriu minha língua com seu sabor
agridoce, suavizado pelo extrato de baunilha e framboesa que eu adicionara à
mistura.
Phillip embalou sua xícara como um vagabundo encolhido sobre uma
lata de lixo. Ele tomou um longo gole e suspirou de novo, desta vez com
felicidade. — Agora isto é melhor.
Nós dois nos acomodamos em nossos lugares, observando a mansão e
tomando nosso chocolate quente.
As pessoas que tinham organizado o jantar devem ter decidido ir para
a cama, já que as canções gravadas foram abruptamente cortadas, e as luzes
de Natal se apagaram de uma porta, uma janela e um boneco de neve de
plástico, escurecendo ainda mais a paisagem. A garoa gelada também
aumentou, transformando-se mais em uma chuva mais constante, cada gota
caindo contra o para-brisa da van. Não era realmente uma noite que se
ajustava para homem ou de animal, mas esses eram os meus tipos favoritos
de ambientes como uma assassina. O frio, a chuva e as trevas sempre
facilitaram a aproximação com o alvo e fugir depois que você acaba com ele.
Se eu quisesse alguém morto, eu teria esperado por uma noite como esta para
atacar.
E eu estava disposta a apostar que alguém poderia ter a mesma ideia
sobre o homem na mansão.
Phillip inclinou a xícara para a sombra que ainda andava de um lado
para o outro atrás das portas do pátio. — Você realmente acha que ele sabe
alguma coisa sobre o Círculo?
Eu dei de ombros. — Ele é o melhor que eu tenho agora... e a única
pessoa ainda viva que pode saber qualquer coisa sobre eles.
Duas semanas atrás, eu tinha sido sequestrada e mantida como refém
por Hugh Tucker, um vampiro que alegou ser parte de um grupo secreto, que
supostamente puxava as cordas do submundo e tudo mais em Ashland. Isso
certamente foi novidade para mim, já que eu era supostamente a chefe do
submundo atualmente. Mas Tucker alegara que o Círculo era uma
organização de criminosos tão ricos e poderosos que ninguém podia tocá-los,
especialmente uma assassina humilde como eu. O vampiro também dissera
que o Círculo monitorava tudo por trás dos bastidores – e que eles podiam
matar a mim e meus amigos sempre que quisessem.
Mas a coisa mais chocante que ele revelou foi que minha mãe, Eira
Snow, supostamente tinha sido um deles.
Minha mãe foi assassinada quando eu tinha treze anos, uma perda
profunda que eu ainda sentia até hoje. Mas eu a via como qualquer outra
criança. Ela era minha mãe – nada mais, nada menos. Eu realmente nunca
pensei em quem ela era, muito menos que tipo de pessoa. As coisas boas que
ela fez, as ruins, como ela se sentiu em relação a todas elas. Eu não sabia
nada disso. Mas Tucker virou meu mundo de cabeça para baixo com suas
acusações, e eu queria saber se elas eram verdadeiras: eu tinha que saber se
minha mãe tinha sido a boa pessoa que eu sempre supus que ela era, ou tão
perversa, sem coração e depravada quanto o resto deste Círculo sombrio.
— Você sabe, nós poderíamos bater na porta dele e perguntar a ele
sobre tudo isso — disse Phillip.
Eu bufei. — Ele não me diria nada. Nada em que eu pudesse confiar
de qualquer maneira. Ele me odeia demais.
Phillip se mexeu em seu assento novamente. — Bem, pelo menos
poderíamos acabar com isso e ir para casa. Isso certamente impediria que
minhas bolas se transformassem em cubos de gelo...
Um par de faróis apareceu no espelho retrovisor do furgão. Fiz um
gesto para Phillip, e nós nos deitamos em nossos lugares.
Um SUV preto cruzou a rua, passando pela nossa van. O veículo parou
no final do quarteirão e virou à direita, desaparecendo de vista. Phillip
começou a se sentar, mas eu estendi minha mão, parando-o.
— Espere — eu disse. — Vamos ver se eles voltam.
Ele revirou os olhos, mas ele ficou parado. — Por que eles voltariam?
Provavelmente é só alguém que vive na vizinhança...
Faróis apareceram no espelho retrovisor do furgão novamente, e aquele
mesmo SUV passou por nossa posição. Desta vez, o veículo virou à esquerda
no final do quarteirão.
— Talvez eles estejam perdidos — disse ele. — Todas essas ruas e
mansões de Northtown são bem parecidas, especialmente no escuro.
Eu balancei a cabeça. — Eles não estão perdidos. Eles estão vendo o
quão quieta e deserta a área está para o que eles têm em mente. Eles estarão
de volta. Você vai ver.
Nós nos sentamos na van, observando nossos espelhos. Como estava
esperando, um minuto depois, aquele mesmo SUV passou por nós novamente.
Só que desta vez, o veículo não estava com os faróis acesos nem com as luzes
de estacionamento. Ele fez uma curva no meio da rua, estacionou no meio-fio
e parou – bem na frente da mansão que estávamos observando.
— Olá — eu murmurei. — O que temos aqui?
As portas se abriram, e duas pessoas saíram da frente do SUV, ambas
vestindo longos casacos pretos parecidos com os de Phillip. Eles eram
gigantes, cada um com cerca de dois metros de altura, ombros grossos e peitos
largos; muito provavelmente eles eram os músculos e guarda-costas de quem
estava na parte de trás do veículo.
Seguramente, um dos gigantes abriu uma porta traseira, e uma figura
mais baixa, mais magra emergiu, também ostentando um casaco preto, junto
com um fedora preto e um cachecol combinando enrolado em torno do
pescoço. Eu olhei através do meu binóculo, mas a pessoa estava de costas
para mim, então eu não conseguia ver o rosto dele, embora pelo tamanho e
andar, eu tive a impressão de que era uma mulher.
— Alguns visitantes de fim de noite para um encontro secreto com o
nosso velho amigo? — Phillip pensou.
— Talvez.
Um dos gigantes se agachou. No início, eu me perguntei o que ele
estava fazendo, mas então a mulher com o fedora e o cachecol correu para o
gigante, que a ergueu no ar. A Sra. Fedora agarrou a parte superior do portão
de ferro e passou as pernas por cima com toda a graça de um atleta olímpico.
Pousando habilmente de pé na calçada do outro lado, ela se endireitou e
começou a andar em direção à mansão com um propósito mortal.
Eu amaldiçoei, percebendo que estava prestes a perder minha única
pista sobre o Círculo. Eu considerei a possibilidade de que alguém viesse aqui
para silenciá-lo, mas parte de mim não tinha pensado que isso aconteceria, já
que todo caminho que eu tentei rastrear até os membros do Círculo tinha sido
um beco sem saída.
— Não é uma reunião — Eu rosnei. — Eles estão aqui para matá-lo.
Como a Fedora já tinha passado do portão, eu não tinha tempo de sair
da van, esgueirar-me pelas sombras e esfaquear os gigantes nas costas como
normalmente faria. Então eu larguei meu binóculo, abri minha porta, saí do
veículo e corri rua abaixo em direção ao SUV.
— Gin! Espere! — Phillip gritou, lutando para sair e me seguir.
Mas eu precisava chegar ao homem na mansão antes da Fedora, então
eu o ignorei. Os gigantes giraram ao ouvir o som da voz de Phillip e me viram
correndo em direção a eles. Eles amaldiçoaram, puxaram as armas de dentro
de seus casacos e atiraram.
Pfft! Pfft! Pfft!
Eu ziguezagueei e a primeira rodada de balas errou. Mas quando os
gigantes pararam para mirar, eu peguei minha magia de Pedra e endureci
minha pele em uma concha impenetrável.
Pfft! Pfft! Pfft!
A segunda rodada de balas também errou. Os gigantes estavam
preparados e os silenciadores, no final de suas armas, abafavam os sons dos
tiros. Nenhuma luz se acendeu no interior das mansões vizinhas. Eles
queriam manter isso quieto? Bem, eu também.
Pfft! Pfft! Pfft!
Dois dos tiros erraram novamente, mas o terceiro acertou o meu ombro
direito, girando-me. Ainda assim, graças à minha magia, não explodiu através
de mim do jeito que deveria. Eu derrapei no revestimento de gelo da rua, mas
consegui recuperar o equilíbrio e avançar novamente.
Em vez de ir em direção aos gigantes, corri direto para o SUV. Quando
eu estava no alcance, eu pulei o para-choque, depois para o capô, depois subi
para o teto. Antes que os gigantes percebessem o que eu estava fazendo, corri
para frente e pulei do teto do veículo, impulsionando e tentando chegar o mais
alto possível no ar. Para minha sorte, eles estacionaram perto do meio-fio e da
calçada estreita. Um segundo depois, minhas mãos atingiram o topo do muro
que dava para a mansão, e eu cavei minhas botas nas pedras lisas de modo
que eu pudesse me puxar para a borda. A Fedora não era a única que podia
ser ginasta.
Eu rolei para o topo do muro e desci os três metros para o outro lado,
aterrissando agachada. Espalmei uma das facas de silverstone enfiadas em
minhas mangas, levantei-me e corri pelo gramado. A grama coberta de gelo
rangia como ossos quebradiços sob as minhas botas.
A luz que saía do escritório iluminava perfeitamente Fedora, que estava
quinze metros à minha frente e se movia rapidamente, sua respiração fluindo
atrás dela em um rastro de vapor gelado. Ela deve ter ouvido o tumulto na rua
porque acelerou o ritmo, puxou uma arma de seu casaco, e atirou através da
fechadura das portas do pátio com um movimento suave. Um segundo depois,
ela estava dentro da mansão.
— Ei! — Gritou uma voz de homem de dentro do escritório. — Quem é
você? O que você pensa que está fazendo?
Eu não ouvi a resposta dela, se é que houve uma.
Pfft! Pfft! Pfft!
Pfft! Pfft! Pfft!
Mais e mais tiros soaram nas ruas atrás de mim, mas os gigantes não
estavam mais mirando em mim. Phillip deve ter entrado na luta. Ele podia
cuidar de si mesmo, então concentrei toda a minha energia em correr pelo
gramado, tentando chegar à mansão, mesmo que já fosse tarde demais.
Pfft! Pfft! Pfft!
Então, disparos de armas de fogo brilharam dentro do escritório, tão
brilhantes quanto as luzes de Natal estavam antes. Alguém tinha acabado de
ser baleado.
Um segundo depois, Fedora atravessou as portas e saiu para o pátio
de pedra. Eu apertei os olhos, mas as luzes do escritório estavam atrás dela,
e tudo que eu podia ver na escuridão era o brilho pálido de seus olhos acima
do lenço preto enrolado em volta do seu rosto. Ela me deu uma saudação
zombeteira com sua arma antes de voltar para dentro na mansão. Agora que
sua missão foi cumprida, sem dúvida ela sairia por uma das portas traseiras
e desapareceria na floresta. Tudo sem eu nem ao menos dar uma boa olhada
no rosto dela.
Eu amaldiçoei. Mesmo que eu quisesse correr para dentro da mansão,
eu me forcei a desacelerar e me aproximar das portas do pátio com cautela,
caso ela estivesse à espreita para tentar me matar também. Eu também peguei
mais do meu poder de Pedra, endurecendo a minha pele o máximo possível,
na hipótese de ela ter decidido me explodir com balas e magia elemental. Como
precaução final, alcancei meu poder, ouvindo todas as vibrações emocionais
que afundaram nas paredes de pedra da mansão.
Resmungos duros e chocados ecoaram de volta para mim dos tiros que
a mulher acabara de disparar. Ao mesmo tempo, havia um alto e choroso coro
de preocupação, medo e paranoia. Mas não havia sussurros dissimulados ou
murmúrios sombrios de intenção maligna que teriam sinalizado que ela estava
se escondendo no escritório, pronta para colocar uma bala na minha cabeça
no segundo em que eu entrasse. Quem quer que fosse a mulher, ela estava
muito longe.
Ainda assim, fui cuidadosa ao entrar no escritório, minha faca ainda
na mão, minha outra mão para cima e levemente iluminada com minha magia
de Gelo, pronta para explodir quem quer que pudesse me atacar.
Mas apenas uma pessoa estava no escritório: o homem que eu estava
observando.
Jonah McAllister, meu velho inimigo, jazia esparramado no chão.
Capítulo 2
Eu olhei para Jonah, que permaneceu absolutamente imóvel, com os
braços estendidos para os lados, as pernas torcidas desajeitadamente debaixo
de seu corpo. A frustração me preencheu porque a Fedora tinha chegado até
ele, que ela tinha se infiltrado na casa dele tão rápido e facilmente quanto eu,
também, podia.
Meu plano tinha sido vigiar a mansão de McAllister e capturar
qualquer um que o Círculo pudesse mandar para matá-lo, já que ele era a
mais óbvia – e até agora a única – ponta solta que poderia me conduzir até
eles. Então, eu teria levado meu tempo doce e sangrento questionando aquela
pessoa sobre seus chefes. Mas a Fedora tinha sido mais rápida e muito mais
inteligente do que eu esperava, e mais uma vez fiquei sem nada. Apenas outra
na minha crescente série de falhas quando se tratava do grupo sombrio.
Eu estava cansada de perder para aqueles bastardos, quem quer que
eles realmente fossem.
Eu comecei a passar por McAllister e sair do escritório para procurar
no resto da mansão por Fedora, mesmo sabendo que ela já tinha ido embora.
Mas então percebi que não havia sangue em seu corpo. Na verdade, eu não vi
sangue em lugar algum – nem escorrendo pelo chão, nem esparramado sobre
as cadeiras, nem mesmo borrifado em cima dos papéis que haviam
escorregado de sua mesa e caído ao redor dele como flocos de neve grandes.
Então, eu parei e dei uma olhada mais de perto nele.
Jonah McAllister estava muito mais magro do que na última vez que
eu o tinha visto e confrontado neste escritório. Círculos negros rodeavam seus
olhos, e suas maçãs do rosto pareciam como se flechas tentaram perfurar seu
rosto, como se tivesse perdido treze quilos durante a noite. Até mesmo a sua
pele, da qual ele se orgulhava tanto e mantinha jovem, firme e suave como a
de um bebê, com um regime rigoroso de caros tratamentos faciais elementais
de Ar, parecia velha, solta e enrugada, como papel molhado que mal se
agarrava ao resto de seu crânio.
Sua cabeleira prateada estava tão gloriosa como sempre, no entanto,
artisticamente estilizada e tão brilhante e polida como um enfeite de Natal,
mesmo quando o resto dele estava espalhado no chão como um brinquedo
quebrado. Eu me perguntei quanto produto ele tinha usado para manter seu
cabelo tão firme, perfeitamente ancorado no lugar, mesmo quando ele tinha
sido baleado. Até mesmo Finn ficaria impressionado com isso.
Mas o que chamou minha atenção foi o suéter de Natal que cobria seu
peito – verde brilhante com uma rena marrom sorridente que se estendia pela
frente, completa com um nariz de lantejoulas vermelhas. Não era o estilo
habitual e elegante do McAllister. Na verdade, o suéter parecia feito à mão,
embora eu não conseguisse imaginar quem gastaria tempo e trabalho para
tricotar um suéter para Jonah – qualquer suéter, muito menos um tão feio.
Dada a forma como o resto dele estava esquelético, o suéter parecia
suspeitamente grosso e volumoso, e percebi exatamente o que estava por baixo
disso. Claro. McAllister poderia ser uma doninha, mas ele era uma doninha
esperta. Ele sabia exatamente o quanto as pessoas ainda estavam furiosas
com ele por causa do roubo ao Briartop, e ele teria tomado precauções contra
ser assassinado em sua própria mansão.
Então, eu me agachei, puxei minha mão para trás e lhe dei um tapa
no rosto. McAllister estremeceu com a pancada forte, mas não abriu os olhos.
Então, eu bati nele de novo, desta vez com mais força.
McAllister soltou um gemido de dor, mas ele ainda não abriu os olhos,
determinado a jogar de morto o maior tempo possível.
— Acorda, acorda, Jonah — eu disse lentamente. — Você pode abrir
seus olhos, ou eu posso continuar batendo em você. Estou bem com isso. Eu
ainda preciso fazer o meu “cardio”1 de hoje.

1 Exercícios cardiovasculares (aeróbicos).


Os olhos castanhos de McAllister se abriram com a minha ameaça, em
seguida, estreitaram-se em fendas quando ele me reconheceu. — Blanco? —
Disse ele. — O que você está fazendo aqui?
— Bem, eu estava esperando capturar sua pretensa assassina, mas ela
conseguiu escapar. Eu não consigo decidir se estou feliz ou desapontada por
você ainda estar vivo. — Eu balancei a cabeça para o suéter feio de Natal dele.
— Eu não achava que Rudolph vinha equipado com um colete de silverstone
à prova de balas nos dias de hoje.
— Parecia uma sábia precaução. — Ele molhou os lábios e olhou ao
redor do escritório, como se estivesse preocupado que Fedora fosse voltar e
terminaria o que ela tinha começado.
Quase desejei que ela o fizesse. Mesmo agora, apesar de quão útil
McAllister poderia ser, parte de mim queria levantar a minha faca e apenas
acabar com ele por todas as vezes que ele tentou me matar. Isso teria sido a
jogada inteligente. Mas eu não fui nada inteligente nas últimas semanas. Por
que começar agora?
— Gin! Gin! — Phillip gritou, sua voz ficando cada vez mais alta. —
Você está bem?
— Estou bem! — Eu gritei de volta. — Estou aqui! No escritório!
Eu me levantei e fui até as portas do pátio. Phillip correu até mim, com
uma arma na mão. Sua respiração fumegava no ar, e suas bochechas estavam
vermelhas como um tomate por causa do frio. Eu olhei o portão atrás dele,
que estava bem aberto agora, mas o SUV preto que tinha estado estacionado
do lado de fora da mansão de McAllister tinha sumido.
— Os gigantes atiraram um pouco na minha direção, depois entraram
no carro e partiram antes que eu conseguisse me aproximar deles. Eu tentei
atirar em seus pneus, mas... — Phillip encolheu os ombros.
Eu assenti, desapontada, mas não surpresa. Dada a maneira como ela
se infiltrou facilmente na mansão, Fedora tinha provado que ela era
inteligente. É claro que ela teria dito aos seus homens para fugirem ao
primeiro sinal de problemas, especialmente se esse problema fosse eu. Ela não
queria arriscar que os gigantes fossem capturados e questionados sobre ela e
o Círculo. Mas a frustração surgiu em mim mesmo assim. Mais uma vez, tudo
o que consegui foi um grande monte de nada, mas obriguei-me a concentrar-
me no que era importante agora.
— Não se preocupe com isso — disse eu. — Você está bem?
Phillip assentiu. — Sim. Apenas um pouco sem fôlego por tentar te
alcançar. — Seu olhar foi para McAllister, que estava lentamente se
levantando. — Eu vejo que ele conseguiu sobreviver, afinal.
— Parece que nosso bom amigo Jonah gosta de usar seus suéteres de
Natal com um colete de silverstone debaixo deles.
— Que prático — disse Phillip, — considerando quantas pessoas
querem matá-lo.
— De fato.
McAllister olhou para baixo e puxou o suéter para longe de seu peito.
O olho esquerdo da rena, bem ao lado do coração de McAllister, tinha sido
destruído, e eu pude ver o brilho das três balas presas no colete preto embaixo.
A Fedora não estava brincando. Todos esses tiros foram para matar, e a
precisão deles era especialmente impressionante. Então, ela podia atirar
também, além de suas acrobacias. Ela definitivamente o queria morto, o que
só me deixou mais curiosa sobre o que ele poderia saber sobre o Círculo.
Jonah McAllister tinha sido o advogado pessoal de Mab Monroe, a
Elemental de Fogo que dirigiu o submundo de Ashland por anos antes de eu
matá-la. Mab também tinha sido a vadia que matou minha mãe, Eira, e minha
irmã mais velha, Annabella.
Durante anos, eu pensei que Mab tinha matado minha família por
causa de uma longa disputa entre as famílias Snow e Monroe, assim como
suas preocupações sobre as minhas magias de Gelo e Pedra potencialmente
ultrapassarem seu poder de Fogo algum dia. Mas Hugh Tucker alegara que
Eira estivera causando problemas ao Círculo, de modo que ele e os outros
membros haviam dado a Mab autorização para assassiná-la. Algo mais que
tinha vindo como uma revelação impressionante e horripilante, e algo mais
que me fez ainda mais determinado a obter respostas sobre a minha mãe, o
Círculo, tudo.
Começando agora.
McAllister fez uma careta e deixou seu suéter cair de volta no lugar,
embora a rena de um olho só parecia tudo menos animada agora. Ele olhou
para trás e para frente entre mim e Phillip, sua boca franzindo em
pensamento. Eu quase podia ver as rodas girando em seu cérebro enquanto
ele se perguntava o que estávamos fazendo aqui – e como ele poderia melhor
distorcer a situação a seu favor.
Eu ainda estava segurando minha faca, então eu apontei-a para o sofá
ao longo da parede. — Sente-se.
McAllister engoliu em seco, mas ele se moveu e sentou no sofá. Peguei
uma cadeira ao lado da mesa e a movi para o espaço aberto em frente ao sofá.
Depois virei-a, sentei-me e apoiei os cotovelos nas costas dela. Phillip ficou ao
lado das portas do pátio, olhando para fora e vigiando, para o caso de Fedora
e seus gigantes decidirem retornar e fazer outra tentativa.
Eu olhei para McAllister, e ele me encarou, molhando seus lábios
repetidamente, bem como repetidamente retorcendo as mãos. Se ele soubesse
quão desesperada eu estava por informações – qualquer informação – sobre o
Círculo, ele não me diria nada, assim como eu disse a Phillip mais cedo na
van. Então fiquei olhando para McAllister, meu rosto calmo e em branco,
esperando que ele rachasse e começasse a falar para preencher o silêncio
tenso.
Não demorou muito.
— O que você quer, Blanco? — McAllister retrucou.
— Bem — eu disse, ainda mantendo meu tom fácil e postura casual,
— no caso de você não ter ouvido, trancado em sua torre de marfim, eu sou
oficialmente a abelha rainha do submundo hoje em dia.
Ele franziu o cenho, mas não disse nada.
— Chegou ao meu conhecimento que há algumas pessoas que querem
você morto, Jonah. Bem, ainda mais do que o habitual, de qualquer maneira.
Dada a minha nova posição, você pensaria que essas pessoas iriam vir e obter
minha permissão para o ataque, especialmente quando é tão conhecido o
quanto eu quero que você seja julgado por seus crimes no museu de arte
Briartop durante o verão. Mas essas pessoas não tiveram minha permissão,
então eu decidi vir e estragar sua pequena festa de assassinato.
Era uma besteira completa. A única razão pela qual eu queria que
McAllister continuasse respirando era para que eu pudesse conseguir
informações, mas ele não precisava saber disso.
— Agora, eu admito que essas pessoas realmente me surpreenderam,
na verdade, levaram a melhor sobre mim. Eu não achei que eles seriam tão
espertos, rápidos e determinados. Mas isso só me deixa mais curiosa sobre
quem decidiu agitar as coisas na minha caixa de areia.
— Sua caixa de areia? — McAllister zombou. — Não é sua caixa de
areia e nunca será. Não do jeito que era a de Mab. Os outros chefes do
submundo estavam com muito medo dela para causar muitos problemas. Pelo
menos, não de maneira aberta. Você, minha querida, é uma história
completamente diferente. Rainha ou não, você matou muitos dos amigos deles
e todos querem você morta.
Eu bufei. — Por favor. Minha contagem de corpos não é tão
impressionante quanto a de Mab. Ela fritou as pessoas apenas por olharem
para ela do jeito errado.
— Certamente, — McAllister concordou. — Mas Mab nunca fingiu ser
outra coisa senão a cadela fria e impiedosa que ela realmente era. Todos estão
fartos do seu pequeno código moral e pedantismo irritante. Mais cedo ou mais
tarde, um dos outros chefes conseguirá matá-la. Eu só espero que eu ainda
esteja vivo para ver quando esse dia chegar.
— Indo dançar no meu túmulo, Jonah? Isso é um pouco clichê.
Ele fez uma careta para mim, a raiva manchando suas bochechas e
fazendo-as quase tão vermelhas quanto o nariz de rena em seu suéter
berrante.
Eu encolhi os ombros. — Você provavelmente está certo. Eu nunca
quis o emprego, mas agora que é meu, eu vou aproveitar o melhor de uma
situação ruim e de todas as pessoas más e ruins que vêm junto com isso. —
Eu me inclinei para frente. — Agora, me diga o que você sabe sobre o Círculo.
Ele franziu a testa. Pela primeira vez, a testa dele realmente se enrugou
como a de uma pessoa normal, apesar de todos os anos de tratamentos faciais
elementais de Ar. — O Círculo? Que Círculo?
McAllister era um bom advogado e mais do que capaz de todos os tipos
de teatralidade, incluindo mentir no meu rosto. Eu o estudei, mas pela
primeira vez ele parecia genuinamente confuso.
— O Círculo — eu repeti, tentando manter minha voz suave e uniforme
e não deixá-lo saber quão importante isso era para mim. — Eles são os que
enviaram aquela assassina atrás de você esta noite.
Ele balançou a cabeça. — Nunca ouvi falar deles.
Eu olhei para Phillip, que deu de ombros para mim. Ele também
pensava que McAllister estava dizendo a verdade.
— O Círculo — eu disse pela terceira vez, um pouco de aborrecimento
rastejando em meu tom. — Algum grupo secreto no qual Mab estava envolvida.
Quero saber tudo o que você sabe sobre eles.
McAllister sacudiu a cabeça novamente. — Desculpe, mas eu nunca
ouvi falar de nenhum Círculo. Que tipo de apelido idiota é esse? Soa como um
grupo de ioga.
Eu tive que ranger os dentes para não pular da cadeira, empurrar a
faca contra o seu pescoço e gritar para ele me dar algumas respostas. Levei
um momento para relaxar a minha mandíbula.
— Ok, digamos que eu realmente acredito que você nunca ouviu falar
do Círculo. E quanto a Hugh Tucker? — perguntei, tentando um caminho
diferente. — Vampiro, cabelo preto, cavanhaque, muito rápido. Tende a passar
despercebido a maior parte do tempo.
McAllister mordeu o lábio inferior. — Hugh Tucker, Hugh Tucker. Por
que eu conheço esse nome...? — Ele estalou os dedos. — Tucker. Eu lembro
dele. Mab costumava sair com ele de vez em quando. Babaca idiota e
presunçoso. Eu nunca entendi o que ela viu nele.
Esse era Tucker, tudo bem. Meus olhos se estreitaram. — O que você
quer dizer com sair com ele? Os dois estavam... envolvidos?
Ele encolheu os ombros. — Tão envolvidos como Mab já esteve com
qualquer um dos seus encontros de uma noite. Tucker foi o único que ela já
teve de volta para um segundo e terceiro, no entanto. Ela me disse uma vez
que os dois eram velhos amigos, que ela o conhecia desde criança, e que eles
cresceram juntos. Essa foi uma das razões pelas quais ele se destacou para
mim.
— E por que isso?
McAllister me deu uma olhada como se a resposta deveria ter sido
óbvia. — Porque a maioria das pessoas que Mab conhecia por qualquer
período de tempo acabava morta, geralmente pela mão dela.
Bem, isso era certamente verdade. Mab nunca teve vergonha de assar
as pessoas com sua magia de Fogo pela menor infração. Ainda assim, eu fiquei
quieta, esperando que ele continuasse, mas o advogado olhou para mim com
uma expressão perplexa, obviamente, não entendendo o meu súbito interesse
em um dos velhos amantes de Mab.
— É só isso? — Phillip perguntou. — Isso é tudo o que você sabe sobre
o Círculo?
— Eu já te disse. Eu não sei nada sobre qualquer Círculo estúpido —
McAllister parou e inclinou a cabeça para o lado, me estudando com novo
interesse. — Isso é realmente importante para você, não é, Blanco? Este
Círculo... eles realmente te irritaram.
— Você pode dizer que sim.
Eu mantive meu rosto em branco, mas McAllister sentiu o cheiro de
sangue na água, e como qualquer tubarão ele foi direto para ele.
Ele sorriu, a expressão sinistra criando linhas profundas nos cantos
de seus olhos. Pela primeira vez desde, bem, sempre, ele parecia
genuinamente feliz por estar em minha presença. — Agora que eu penso sobre
isso, talvez eu saiba mais sobre Hugh Tucker, bem como sobre este Círculo
que ele pertence.
— Mas?
— Mas, como você sabe, eu tenho estado sob muito estresse nestes
últimos meses, preparando-me para o julgamento por homicídio. Minha
memória não é o que costumava ser.
Mentiroso. A memória dele provavelmente era melhor do que a minha,
mas eu reconheci a tática de negociação pelo que era.
Suspirei. — O que você quer, Jonah?
— Eu quero sair.
— Sair de quê?
— Sair de Ashland, do meu julgamento, desta maldita prisão que você
me colocou — ele rosnou. — Eu quero começar de novo em algum lugar que
ninguém me conheça. Eu nem me importo onde neste momento. Eu só quero
sair daqui. — Seu olhar percorreu o escritório, e sua boca se contorceu de
desgosto antes de se concentrar em mim novamente. — Você faz isso
acontecer, e eu vou te contar tudo o que sei sobre Hugh Tucker e o Círculo.
Ele se recostou no sofá e cruzou os braços sobre o peito, me dando um
sorriso presunçoso e cheio de dentes, absolutamente certo de que eu cederia
às suas demandas.
Por um momento, fiquei tentada – tão malditamente tentada. Porque o
Círculo já conhecia tudo sobre mim e eu estava lutando para alcançar o
atraso. Eu nem sabia quem eram, além de Tucker, e meus amigos e eu não
conseguíamos encontrar vestígios do vampiro desde a noite em que Deirdre
Shaw havia morrido. Se pelo menos eu pudesse identificar os membros do
Círculo, então eu poderia estudá-los - matá-los - antes que eles me atacassem
de novo ou, pior, meus amigos.
E eu finalmente conseguiria as respostas para todas as minhas
perguntas sobre a minha mãe.
Abri a boca, pronta para ceder às exigências ridículas de McAllister,
mas depois olhei para Phillip, que ainda estava de pé junto às portas do pátio,
com a arma na mão, vigiando. E me lembrei de como ele parecia pálido,
deitado no chão de mármore do museu Briartop, lentamente sangrando depois
de ser baleado por um dos gigantes que McAllister havia contratado para
roubar o museu e o testamento de Mab do cofre. Eu me lembrei de quanta dor
Phillip tinha sofrido. Eu me lembrei de como Eva tinha chorado por ele e como
Owen estava preocupado com seu melhor amigo.
E assim, eu fechei minha boca. Ninguém fodia com meus amigos e
conseguiu um passe livre, nem mesmo para satisfazer minha ardente
curiosidade sobre a minha mãe e o Círculo. Eu poderia ser uma assassina,
mas havia algumas linhas que eu não cruzaria.
Além disso, Jonah McAllister não era nem um pouco confiável. Por
mais que eu o tivesse ferrado ao revelar o seu envolvimento no assalto ao
Briartop para toda Ashland, eu não tinha dúvida de que ele estaria mais do
que feliz em me alimentar com um monte de mentiras e sair correndo da
cidade, secretamente rindo de mim o tempo todo. Mesmo que eu o ameaçasse,
mesmo se eu o torturasse, mesmo se eu o cortasse com minhas facas, ele era
teimoso o suficiente e me odiava o suficiente para aguentar e não me dizer
nada.
Não, eu não poderia arriscar que ele mentisse, inventando alguma
história, e me mandando em alguma busca inútil. Eu não poderia arriscar. E
eu especialmente não insultaria Phillip e seu sofrimento dessa maneira.
— Bem, Blanco? — McAllister cantou, ainda tão confiante de que eu ia
ceder às suas demandas. — O que você diz?
Eu balancei minha cabeça. — Nunca vai acontecer, Jonah. Nunca vai
acontecer. — Eu me levantei e fui em direção às portas do pátio. — Vamos lá,
Phillip. Vamos embora. Nós perdemos tempo suficiente aqui.
Phillip me seguiu, embora não tivéssemos dado três passos para o
gramado antes que McAllister se apressasse atrás de nós.
— Espere! Espere! — ele gritou, lutando para nos alcançar.
Eu me virei e ergui minha faca, e McAllister teve que parar rapidamente
para evitar bater a ponta da rena na lâmina.
— Não, Jonah — eu falei. — Eu não tenho tempo para esperar, e eu
particularmente não tenho tempo, paciência ou energia para aguentar você
tentando suas artimanhas em mim. Você pode saber alguns detalhes sujos
sobre Tucker por vê-lo com Mab, mas você pareceu completamente confuso
quando mencionei pela primeira vez o Círculo, o que significa que você não
sabe nada sobre eles.
Ele abriu a boca para protestar, mas eu o interrompi antes que ele
pudesse começar.
— Eu admito que te torturar por um pouco de informação que você
possa ter seria divertido, uma boa diversão depois das duas semanas de
merda que eu tive, mas eu não poderia confiar em nada que você gritasse. E,
francamente, tenho coisas melhores a fazer do que tirar seu sangue das
minhas roupas hoje à noite.
Ele molhou os lábios novamente, seus olhos se movendo para a
esquerda e para a direita, como se esperasse que mais assassinos
aparecessem de repente da garoa gelada.
— E quanto a mim? O que eu faço agora?
— Por tudo que eu me importo, você pode ficar bem aqui em sua
mansão, cozinhando em seus próprios sucos assim como você tem feito por
meses agora. Embora não demore muito para que a Fedora perceba que você
não está tão morto quanto ela quer que você esteja. — Eu o encarei. — O que
você acha que vai acontecer então?
Eu cortei minha faca pelo ar bem na frente de sua garganta, apenas
no caso de ele não entender.
Ele engasgou e cambaleou para trás. — Ela vai voltar.
Eu assenti. — Ela vai, e eu imagino que da próxima vez, ela vai se
certificar de que você está bem morto antes dela ir embora.
Seu rosto empalideceu, fazendo-o parecer ainda mais esquelético do
que antes, quando esse fato horrível lentamente afundou. Homem morto
andando em mais de um sentido.
— Aproveite a sua vida, Jonah — eu falei. — O pouco que resta dela,
de qualquer maneira.
Dei-lhe uma saudação fingida com a faca, em seguida, virei e fui para
a noite.

***

Mais uma vez, Phillip me seguiu, embora não tivéssemos dado cinco
passos antes de McAllister começar a me chamar.
— Blanco! — Disse ele, sua voz afiada se dissolvendo em um lamento
amargo. — Você não pode fazer isso! Você não pode me deixar aqui! De novo
não! Eu não aguento! Não de novo!
Continuei andando. Phillip olhou por cima do ombro. — Você deveria
estar feliz — ele murmurou. — McAllister está inclinado contra o batente da
porta e segurando o peito como se estivesse prestes a ter um ataque cardíaco.
Eu bufei. — Ele teria que ter um coração em primeiro lugar.
Phillip sorriu, mas ele continuou olhando para mim com o canto do
olho. — Eu sei por que você disse não a ele — disse ele. — Mas não faça isso
por mim. Não foi McAllister quem atirou em mim.
— Não, mas ele montou todo o roubo do museu, e você se machucou
como resultado de seu plano. Sem mencionar as pessoas inocentes que
morreram só porque ele queria esconder o fato de que ele estava desviando
dinheiro de Mab e não queria que Madeline descobrisse sobre isso. Isso o torna
responsável pela coisa toda. E agora ele quer um cartão livre para fora de
Ashland apesar de tudo isso? Em troca de algumas informações tênues sobre
Tucker que provavelmente não vão me dizer nada que eu já não saiba sobre o
vampiro? Não, de jeito nenhum.
Phillip não disse mais nada enquanto atravessávamos o gramado, e o
único som era o triturar de grama coberta de gelo sob nossas botas. Depois
do calor e da luz do escritório de McAllister, a noite parecia mais fria e mais
escura do que antes. A garoa voltou a cair, transformando-se em uma chuva
mais constante e gelada, e nossas respirações pairavam em torno de nós em
nuvens geladas. Ou talvez fosse apenas o meu próprio senso de fracasso que
fez tudo parecer escuro, sombrio e desolado.
Phillip tinha aberto a fechadura do portão de ferro e abriu-o caminho
para mansão, então paramos na entrada e olhamos para cima e para baixo na
rua. Mas não havia sinal da Fedora, dos gigantes ou da SUV, e todas as casas
vizinhas ainda estavam escuras. Ninguém ouvira os tiros ou nos viu nos
esgueirando. Bom. Menos uma dor de cabeça para lidar nesta noite.
Phillip e eu nos apressamos pela rua e entramos na minha van. Eu
liguei o motor, deixando o aquecimento o mais quente possível, mas o ar
quente fez pouco para dissipar o desespero gélido e o cansaço que enchiam
meu corpo.
— Então, e agora? — Perguntou Phillip. — Você não vai deixar
McAllister aqui sozinho, não é?
Olhei para Phillip.
Ele ergueu as mãos enluvadas. — Não me interprete mal. Ser
assassinado em sua própria casa não poderia acontecer com um cara melhor.
Francamente, eu gostaria de estrangulá-lo até a morte com minhas próprias
mãos pelo que ele fez com a Eva, Owen e todos os outros naquela noite no
Briartop.
— Mas?
— Mas eu sei o quão importante descobrir sobre este Círculo é para
você, e, especialmente, descobrir a verdade sobre o que a sua mãe estava
envolvida. Eu me sentiria da mesma maneira, se fosse eu. — Phillip deu um
suspiro e lentamente deixou sair. — Eu sempre senti o mesmo sobre meus
pais. Procurei por eles por anos, mas nunca cheguei a lugar nenhum. Levei
muito tempo para aceitar o fato de que eles provavelmente estavam mortos.
Ou simplesmente não se importavam o suficiente para tentarem me encontrar.
Ele resmungou as últimas palavras, mas eu ainda podia ouvir a dor
em sua voz. Seus ombros caíram e seu corpo pareceu se esvaziar, como o ar
saindo lentamente de um balão. Ele olhou para o lado de fora do para-brisa,
em vez de olhar para mim, mas um músculo em sua mandíbula saltou, como
se ele estivesse rangendo os dentes para não mostrar mais emoção. Algo com
o qual eu tinha mais do que uma pequena experiência, especialmente
naquelas últimas semanas.
Phillip tinha sido abandonado quando criança e tinha crescido em
algumas casas de acolhimento ruins antes de fugir e viver nas ruas. Foi lá que
ele conheceu Owen e Eva, e os três formaram sua própria família, juntamente
com Cooper Stills, o ferreiro mentor de Owen. Phillip não sabia nada sobre
seus pais, embora pensasse que um deles devia ser um gigante e o outro um
anão, dada sua enorme força.
Estendi a mão e apertei a sua enluvada, dizendo-lhe que entendia sua
dor, raiva e frustração. Ele olhou para mim com o canto do olho, apertou
minha mão uma vez e deslizou seus dedos para fora dos meus.
— Chega disso — ele disse, sua voz um pouco mais clara do que antes.
— Não quero que Owen fique com ciúmes.
— Alguém tem uma opinião bastante alta de si mesmo.
— Sempre. — Phillip sorriu com a minha provocação, então inclinou a
cabeça para a mansão novamente. — Mas o que você vai fazer com o
McAllister? Se Tucker e o resto do Círculo o querem morto, então ele tem que
saber algo sobre eles, certo? Talvez ele simplesmente não perceba o que é.
O pensamento do que o advogado viscoso poderia ou não saber enviava
pequenos pontos de dor disparando através das minhas têmporas. Eu
esfreguei minha cabeça dolorida. — Eu não sei. Eu não sei mais nada. Talvez
McAllister saiba de algo, talvez ele não saiba. Talvez Tucker só queira que
McAllister morra para provar alguma coisa. Para provar que ele pode me matar
e a qualquer outra pessoa que ele queira a qualquer hora que ele quiser.
— Mas? Desta vez, Phillip fez a pergunta.
— Mas você está certo. Eu tenho que fazer algo sobre ele, por mais que
me doa.
Suspirei, puxei meu celular do bolso do casaco e apertei um número
na discagem rápida. Ele respondeu no primeiro toque, como se estivesse
sentado ao lado do seu próprio telefone, esperando a minha ligação. Ele
provavelmente estava. Ele era irritantemente eficiente dessa maneira.
— Sim, Gin? — A voz suave de Silvio Sanchez, meu assistente pessoal,
encheu meu ouvido. — Deduzo que algo aconteceu com Jonah McAllister.
Eu olhei para a mansão. McAllister tinha voltado para dentro, fechado
as portas do pátio atrás dele e apagado todas as luzes, como se isso pudesse
mantê-lo a salvo.
— Pode-se dizer que sim. Alguém tentou matá-lo.
Através do telefone, pude ouvir Silvio batendo em seu teclado. Mesmo
que fosse tarde da noite, ele ainda estava ocupado trabalhando, embora eu
não tivesse ideia do que ou por que ele estava digitando agora. A maioria das
pessoas sãs teria ficado esparramada no sofá, assistindo à TV ou lendo um
bom livro, mas o vampiro estava sempre disponível e sempre em seu
computador, não importava quão tarde eu ligasse.
— Hmm — Silvio murmurou. — Bem, isso não é um desenvolvimento
totalmente inesperado. Você pensou que o Círculo poderia vir atrás dele para
mantê-lo quieto.
— Eu não acho que ele realmente saiba alguma coisa sobre eles — eu
disse. — Esse é o problema real.
Eu contei ao vampiro tudo que tinha acontecido, incluindo a tentativa
de assassinato do advogado pela Fedora. Quando terminei, Silvio continuou
digitando por mais alguns segundos antes de finalmente parar. — Eu fiz uma
nota para verificar se Bria e Xavier podem me obter as imagens da câmara de
trânsito da área na parte da manhã. Talvez possamos, pelo menos, obter uma
placa da SUV que estavam dirigindo.
— Eu aplaudo seus esforços, mas eu não estou prendendo a minha
respiração.
A detetive Bria Coolidge, minha irmãzinha e Xavier, seu parceiro na
força policial, estavam ajudando em minha busca pelo Círculo, especialmente
Bria, que queria respostas sobre nossa mãe tanto quanto eu. Nas últimas
semanas, Bria e Xavier vasculharam todos os tipos de bancos de dados da
polícia, tentando encontrar informações sobre Tucker e qualquer pessoa com
quem ele pudesse estar associado. Mas, até agora, os dois policiais não tinham
descoberto nada, assim como eu, Silvio, e o resto dos nossos amigos.
— Então o que você quer fazer com McAllister, Gin? — perguntou
Silvio. — Existem várias opções disponíveis para você.
Ele estava certo. Desde que eu era a chefe do submundo, eu poderia
fazer qualquer coisa que eu quisesse com Jonah McAllister, desde voltar para
dentro de sua mansão e matá-lo pessoalmente, ter um número enorme de
lacaios do submundo fazendo isso por mim, ou simplesmente deixar o
advogado ferver em seu próprio medo, paranoia e miséria, como eu havia feito
nos últimos meses.
Esse era o verdadeiro retrocesso, a brutal e amarga ironia de toda essa
situação. Todos achavam que eu era a grande chefe, que eu era a líder, que
eu era a pessoa no comando, mas eu conhecia a obscura e suja verdade. Que
eu era apenas a testa de ferro, apenas um fantoche, apenas um acessório
conveniente para o Círculo se esconder atrás, enquanto eles alegremente
continuavam com suas próprias maquinações nos bastidores. Eu disse a
Tucker que eu nunca iria trabalhar para o grupo da maneira que Mab tinha,
mas o Círculo ainda estava me usando do mesmo jeito. O pensamento azedou
ainda mais meu humor.
— Gin? — Silvio perguntou novamente. — O que você quer fazer sobre
McAllister?
Olhei de volta para a mansão, que estava tão escura e silenciosa como
todas as outras na rua agora. Sem dúvida Jonah ainda estava bem acordado,
no entanto, se escondendo em um armário em algum lugar e segurando uma
arma. O advogado provavelmente ainda estava usando seu suéter de Natal
berrante e colete de silverstone, esperando desesperadamente que a Fedora
não voltasse e acabasse com ele.
Eu duvidava que ela voltasse hoje à noite desde que ela pensou que já
o tinha matado, mas ela voltaria, e eu tinha que me preparar para isso. Se
McAllister soubesse alguma coisa sobre o Círculo, algo que ele talvez nem
percebesse que sabia, então eu queria outra chance para arrancar isso dele.
Oh, eu não achava que poderia impedir Fedora de matar McAllister se
ela estivesse realmente determinada a fazê-lo. Eu não poderia vigiá-lo ou
protegê-lo 24 horas por dia, nem mesmo se eu o arrastasse aos pontapés e
gritando para um esconderijo em algum lugar. Mas mesmo que a Fedora
conseguisse matar o advogado, talvez eu pudesse pelo menos descobrir mais
sobre ela, o que poderia me levar até Tucker e ao resto do Círculo. Neste
momento, eu aceitaria todas as migalhas de pão que eu conseguisse.
— Gin? — Silvio perguntou pela terceira vez.
— Chame Jade Jamison e pergunte se ela pode pedir a algumas
pessoas que trabalham neste bairro para manter um olho em McAllister. Ela
provavelmente já tem pessoas cozinhando, limpando e fazendo outras coisas
por aqui, especialmente nesta época do ano.
Jade Jamison era uma figura do submundo que administrava uma
variedade de empresas de limpeza e outros serviços em toda Ashland. Nessa
vizinhança, cozinheiros, empregadas domésticas, jardineiros e até guardas de
segurança seriam tão invisíveis quanto os bonecos de neve do feriado, e
ninguém lhes dava uma segunda olhada. Nem McAllister e espero que nem
Fedora, quando ou se ela voltasse para tentar matá-lo novamente.
— Mas diga a Jade que eu só quero que seus funcionários observem
McAllister, — acrescentei. — Eu não quero que nenhum deles tente salvá-lo
se ele for atacado novamente pela Fedora ou por outra pessoa. Ele não vale a
vida deles, e nem qualquer informação que ele possa ou não ter.
— Entendido. — Silvio começou a digitar novamente. — Mais alguma
coisa?
— Não. Embora isso tudo possa esperar até a manhã. Você deveria ir
para a cama. Descanse um pouco.
— Mmm-hmm. — O vampiro começou a digitar ainda mais rápido do
que antes, ignorando completamente a minha sugestão.
Eu suspirei, sabendo que eu não poderia impedi-lo de ligar para Jade
no segundo em que desligarmos. Silvio não gostava de procrastinar nada, nem
mesmo por algumas horas. Era uma das coisas que fez dele um grande
assistente, mesmo que às vezes me incomodasse.
— Vejo você no restaurante pela manhã — eu disse, cedendo ao
inevitável.
— Claro. E terei uma atualização para você logo de manhã. Vejo você
então.
Nós dois desligamos e olhei para Phillip.
Ele franziu a testa para mim. — Apenas olhos em Jonah? Esse não é
o seu estilo habitual. Estou surpreso que você não esteja voltando lá agora e
fazendo-lhe algumas perguntas mais pontuais com sua faca na garganta dele.
Talvez fosse isso o que eu deveria ter feito, mas eu simplesmente não
tinha energia para ser intimidante esta noite. Não quando o Círculo havia me
superado novamente. Além disso, eu não confiaria em nenhuma palavra que
McAllister dissesse agora, e não havia como ter certeza de quanto ele tentaria
me enganar apenas para continuar respirando.
— O que eu posso dizer? — Eu falei lentamente — É um milagre de
Natal.
Phillip riu, enquanto eu colocava a van em marcha e conduzia na noite
fria e gelada.
Capítulo 3
Eu deixei Phillip no cais para o Delta Queen, seu barco cassino e casa,
depois dirigi ao longo do rio até chegar a um lote pavimentado que dava para
um pequeno parque e uma área arborizada. Entrei e parei, espiando pelas
janelas.
Eu estava a apenas alguns quilômetros do Delta Queen, mas poderia
muito bem ter ido para a lua, dadas as diferenças surpreendentes. Em vez de
um reluzente barco branco, lojas sofisticadas e restaurantes de luxo, prédios
abandonados, calçadas rachadas e postes de luz quebrados pontilhavam a
paisagem. Eu estava em Southtown agora, a parte de Ashland que era o lar
de gangues, traficantes e outras pessoas violentas e perigosas.
Normalmente, eu esperaria ver um par de sem-teto encolhido sobre as
latas de lixo no final do estacionamento, queimando o lixo dentro para se
aquecer. Mas estava muito úmido e frio naquela noite, então a área estava
completamente deserta. Bom. Eu não queria que ninguém me visse ou,
especialmente, percebesse para onde eu estava indo.
Silvio poderia – e fez – rastrear meu telefone, então o desliguei e o deixei
no meu carro, que o vampiro também poderia rastrear, graças ao localizador
GPS que ele tinha instalado no chassi. Ele poderia estar em casa trabalhando,
mas eu não tinha dúvida de que Silvio estava checando seu telefone de vez em
quando, só para ver onde eu estava. Eu admirava a eficiência e dedicação do
vampiro, mas saber que ele poderia ficar de olho em mim tão facilmente me
assustava um pouco. Além disso, uma menina tinha que manter alguns
segredos para si mesma.
Especialmente quando se tratava do Círculo.
Saí do meu carro. Tinha finalmente parado de chover, mas as
acumulações de gelo deixaram o ar ainda mais frio, então puxei o colarinho
do meu casaco, abaixei a minha toca e coloquei as mãos enluvadas nos bolsos
do casaco, tentando selar todo o calor do meu corpo. Isso funcionou por cerca
de cinco segundos, então a primeira rajada de vento me atingiu no rosto e
cortou todas as minhas muitas camadas de roupas. Estremeci, abaixei a
cabeça e comecei a andar.
Deixei o estacionamento para trás e segui por um caminho sinuoso
que corria ao longo do rio. Durante os meses mais quentes, a área arborizada
era popular entre os pedestres, corredores e ciclistas, mas ninguém em sã
consciência estaria aqui esta noite, devido ao clima. Mas, eu raramente estava
no meu perfeito juízo, de acordo com Phillip, Silvio e o resto dos meus amigos.
O caminho estava coberto de gelo, por isso caminhei pela grama para
o lado, julgando que seria mais seguro. Fiquei de olho, mas todos tinham
buscado o abrigo que puderam encontrar para passar a noite, e eu era a única
pessoa correndo no escuro.
Demorei cerca de trinta minutos para chegar ao fim do caminho, que
se inseria em outro pequeno parque arborizado. Fiquei nas sombras de um
salgueiro-chorão, examinando essa área, mas também estava deserta. Então,
eu caminhei através das pilhas de folhas úmidas e escorregadias até a cerca
de três metros que cercava o parque da área industrial ao lado.
Apesar do gelo que incrustava o metal, eu facilmente escalei a cerca,
passando minhas pernas por cima do topo, e caindo para o outro lado. Eu me
agachei nas sombras, apenas no caso de alguém estar neste lado da cerca,
mas eu estava tão sozinha quanto antes, então me endireitei e corri para
frente.
Eu corri através de trinta metros de espaço aberto até alcançar um
grande contêiner de metal, o primeiro de muitos alojados neste amplo
estaleiro. Eu me agachei contra o lado do contêiner, olhando em todas as
direções, mas ninguém apareceu, e nenhum grito quebrou o silêncio frio.
Ninguém tinha visto minha invasão inicial, então me senti segura o suficiente
para continuar.
Eu contornei a extremidade daquele contêiner apenas para ser
saudada por mais centenas de contêineres todos empilhados em cima um dos
outros em fileiras organizadas. Durante o dia, as caixas de metal mostravam
suas verdadeiras cores de vermelhos, amarelos e laranjas enferrujados, mas
eram todos cinzentos na penumbra. Havia luzes acesas em todo o estaleiro
para impedir invasores como eu, mas lançavam mais sombras do que as
baniam, e eu era capaz de passar facilmente de uma piscina de escuridão para
outra. À distância, eu podia ouvir o fluxo contínuo do rio Aneirin, mas esse
era o único som que ecoava pela noite.
Eu me movi pela área até chegar ao fim do labirinto de contêineres,
então parei. Mais espaços abertos se estenderam na minha frente, levando a
um grande armazém no centro do estaleiro. As luzes brilhavam no armazém e
eu vi um guarda gigante sentado em uma pequena cabana de madeira ao lado
de uma das portas da doca de carga. Ele estava tão agasalhado quanto eu e
parecia estar assistindo algo em seu telefone, embora ele olhasse em volta a
cada minuto, verificando as coisas.
Olhei em volta, mas não vi mais guardas, então voltei para o labirinto
de contêineres, movendo-me pelas fileiras até chegar a um contêiner solitário
debaixo de uma grande arvore. Esse contêiner estava danificado e amassado
em vários lugares, como se tivesse sido derrubado mais de uma vez, e parecia
estar abandonado, um pedaço de lixo descartado que os trabalhadores não
tinham conseguido levar para o ferro-velho.
Eu me aproximei do contêiner, agachei-me e alcancei minha magia de
Pedra, examinando e ouvindo todas as pedras que eu tinha colocado
estrategicamente ao redor do contêiner As pedras estavam nos mesmos
lugares de antes, e só sussurraram de volta para mim sobre o frio, junto com
burburinhos fracos e constantes de todos os guindastes, empilhadeiras e
outras máquinas pesadas que se moviam pela área diariamente. Nenhum
murmúrio sombrio de malícia ou assassinato se agitou de volta para mim, o
que significava que ninguém esteve perto do contêiner desde a última vez que
estive aqui há alguns dias. Bom. Eu fiquei de pé, tirei uma chave do bolso do
casaco, abri o cadeado e entrei no contêiner, fechando a porta atrás de mim.
O interior do contêiner estava escuro como breu, mas me movi ao longo
da parede até chegar para uma pequena mesa. Eu tirei minhas luvas, estendi
a mão e liguei o interruptor da lanterna a bateria que eu tinha trazido aqui
alguns dias atrás, junto com alguns outros suprimentos.
A luz inundou o interior do contêiner, e eu pisquei várias vezes,
tentando fazer meus olhos se ajustarem ao brilho súbito e forte. Em vez de ser
estéril, o interior do contêiner tinha algumas mesas, várias cadeiras e uma
estante de metal com uma garrafa de gim e alguns copos de plástico
empoleirados nas prateleiras. Tudo junto, parecia que algum sem-teto tinha
vagado por aqui e transformara este lugar em sua nova casa.
De certo modo, era exatamente isso que eu tinha feito.
De acordo com Hugh Tucker, o Círculo sabia tudo sobre mim, o que
significava que eles conheciam o Pork Pit, a casa de Fletcher e onde o resto
dos meus amigos moravam e trabalhavam. Eles poderiam até saber sobre as
várias casas seguras que eu usava em torno de Ashland de tempos em tempos.
Então, eu queria um lugar que eles não poderiam conhecer, algum lugar novo,
algum lugar seguro, algum lugar onde eu pudesse pensar e compilar todas as
informações que eu tinha sobre eles. Eu encontrei esse contêiner alguns dias
atrás. Desde que eu matei Dimitri Barkov, o antigo proprietário do estaleiro,
esse parecia um local perfeito para fazer meu quartel-general supersecreto do
Círculo.
Não estava mais quente aqui do que lá fora, e minha respiração
congelava no ar, mas pelo menos as paredes de metal bloqueavam o vento. Eu
poderia ter ligado o pequeno aquecedor que estava ao lado de uma das mesas,
mas decidi não fazer isso. Talvez estar com frio e desconfortável me motivaria
a descobrir as respostas para todas as minhas perguntas. Valia a pena tentar,
de qualquer maneira.
Liguei mais algumas lanternas, depois voltei minha atenção para o
grande quadro branco que estava encostado a uma das paredes. Eu peguei a
ideia de Bria, que tinha algo parecido em sua casa quando regressou para
Ashland e estava tentando me encontrar, assim como prender Mab Monroe.
Ela tinha fotos, papéis e muito mais pregados em seu quadro, uma exibição
visual de todas as pistas que ela estava investigando.
Mas meu quadro estava deprimentemente vazio.
Ah, tinha uma foto de Hugh Tucker, e embaixo eu escrevi os poucos
fatos que eu sabia sobre o vampiro. Mas essa era toda a informação concreta
que eu tinha. O resto do quadro estava coberto de perguntas.
Oh, as perguntas.
Quem pertence ao Círculo? Número de membros? Eles estão apenas em
Ashland? Quem é o líder? Qual é a estrutura de poder? Em quais atividades
ilegais eles estão envolvidos?
As perguntas continuaram, todas rabiscadas com a minha caligrafia
horrível. De acordo com Tucker, o Círculo tinha deixado Mab ser a chefe do
submundo, para que os outros criminosos se concentrassem unicamente
nela. Então, eu estava supondo que todo o tributo – todo o dinheiro – das
atividades dos chefes tinha fluído através de Mab para o Círculo às
escondidas. Eu me perguntei o quanto a ausência desse fluxo de renda estava
prejudicando o grupo. Provavelmente não muito, se fossem tão ricos e
poderosos quanto Tucker afirmava, mas eu não tinha como saber com certeza.
Só uma coisa era certa – Mab tinha sido apenas uma cabeça nessa
monstruosa hidra, e eu teria que cortar todas as outras para finalmente matar
o Círculo para sempre.
Eu andei de um lado para o outro na frente do quadro, olhando para
todas as perguntas, por sua vez, e massageando as cicatrizes doloridas nas
minhas palmas – cada uma delas um círculo cercado por oito raios finos. A
runa da Aranha, o símbolo da paciência – algo que me faltava nos dias de hoje.
Meus dedos se aproximaram do anel da minha mão direita, que
também estava gravado com a minha runa de Aranha, e eu o girei algumas
vezes antes de pegar o pingente de runa de Aranha em volta do meu pescoço
e deslizá-lo para trás e para frente em sua corrente. O anel e o pingente de
silverstone pulsavam com as minhas magias de Gelo e de Pedra armazenadas
no metal, mas todo o meu poder elemental não me ajudou a resolver o enigma
do Círculo.
Quanto mais eu olhava para as perguntas, mais deprimida eu ficava.
Mas a inquietação certamente não ajudava em nada, então soltei meu colar,
dei um passo à frente e peguei um marcador que estava na prateleira abaixo
do quadro.
Eu fiz uma nova caixa no quadro e desenhei um chapéu imperfeito
dentro dela. Fedora, escrevi embaixo da caixa. Assassina. Acrobática. Boa com
armas.
E... e... e isso era tudo o que eu sabia sobre ela. Aqueles eram o total
dos fatos que eu tinha sobre a mulher. Mais uma vez, eu me amaldiçoei por
não ser mais rápida, mais forte, mais inteligente. Por não ser capaz de, pelo
menos, capturá-la e interrogá-la.
Como uma assassina, a informação era fundamental. Quem era seu
alvo, onde ele morava, o número de guarda-costas que ele tinha, sua família,
amigos, animais de estimação, hábitos e até mesmo os seus hobbies. Tudo
isso era importante e útil para planejar um ataque a alguém. Mas eu não tinha
nada disso quando se tratava do Círculo.
Eu não tinha nada.
Eu olhei para o chapéu idiota que eu tinha desenhado, mais enojada
do que nunca. Parte de mim queria passar o marcador sobre ele e no resto do
quadro até eu apagar a Fedora, o Tucker e todas as minhas malditas
perguntas. Mas isso teria sido infantil, e eu teria que apagar tudo e começar
de novo.
Eu ainda desenhei chifres de diabo em cima da cabeça de Tucker. Só
porque eu podia. Eu os coloquei em cima do chapéu também.
Na verdade, me fez sentir um pouco melhor, e eu olhei para o quadro,
me perguntando como poderia marcar anda mais a foto de Tucker...
Creak.
Eu me virei para a porta do contêiner. Aquilo soou como se alguém
tivesse segurado a alavanca e tentado abrir a porta, mas não conseguiu, dada
a espessura e o peso do metal.
Creak.
Claro que aquela pessoa tentou novamente, e, desta vez, a porta
começou a se abrir. Alguém estava do lado de fora – e eles estavam entrando.

***
Eu soltei o marcador, espalmei uma faca e corri para a porta,
recostando-me contra a parede do metal ao lado dela.
Um segundo depois, uma mulher vestindo roupas escuras e uma toca
entrou no contêiner, com a cabeça movendo de um lado para o outro enquanto
olhava em volta.
— O que diabos ela está fazendo agora...
Eu não dei tempo à mulher para terminar sua frase murmurada. Em
um instante, eu agarrei seu ombro, girei-a, empurrei-a contra a parede e
levantei minha faca até sua garganta.
Lorelei Parker olhou para mim, seus pálidos olhos azuis fixos nos
meus. — É assim que você cumprimenta os seus convidados, Gin? — Ela
disse.
Eu respirei fundo. — Desculpa. Eu pensei que você fosse outra pessoa.
— Não se desculpe. Eu vim preparada.
Algo espetou meu lado. Eu olhei para baixo. Lorelei tinha uma de suas
pistolas de Gelo elemental pressionada contra o meu estômago. Mesmo que a
arma só estivesse carregada com uma única bala, ela ainda causaria muitos
danos, especialmente naquele lugar.
— Touché — eu murmurei.
Eu afastei minha faca de sua garganta e dei um passo para trás. Lorelei
colocou a pistola de Gelo de volta no coldre do cinto.
— Como você sabia que eu estava aqui?
— Eu estava fazendo uma verificação final do estaleiro antes de ir
embora, e notei que o cadeado do contêiner estava aberto. Então eu imaginei
que você provavelmente estivesse aqui. — Ela inclinou a cabeça para a porta,
que estava escancarada agora. — Você pode querer fechar isso. E trancá-la
por dentro da próxima vez, se você não quer que as pessoas se aproximem de
você.
Eu dei-lhe um olhar azedo, mas Lorelei apenas arqueou as
sobrancelhas em uma resposta repreensiva. Então, fechei a porta e deslizei a
barra de metal para baixo, trancando-nos no contêiner.
Lorelei Parker era a melhor contrabandista do submundo de Ashland,
pronta, disposta e capaz de conseguir qualquer coisa para qualquer um a
qualquer momento. Armas, dinheiro, barras de ouro, arte, roupas de grife,
animais exóticos, comidas sofisticadas e vinhos. Se havia um mercado negro
para isso, Lorelei sabia onde obtê-lo e como trazê-lo para Ashland às
escondidas. Ela também era uma das poucas aliadas que eu tinha no
submundo, apesar da arma que ela acabara de apontar para mim.
Lorelei olhou ao redor, observando as mesas e cadeiras que
pontilhavam o interior do contêiner. — Você esteve ocupada desde a última
vez que eu estive aqui.
— Bem, eu só tinha que decorar minhas novas instalações — eu grunhi
de volta.
— Assassina chique. Eu gosto disso. — Ela sorriu. — Você deveria vir
decorar meu escritório no armazém enquanto está nisso.
Diante de seus interesses de contrabando, Lorelei cobiçava o estaleiro
há muito, muito tempo. Com Ditritri Barkov morto, ela rapidamente e
silenciosamente assumiu o controle, pagando o que restou da equipe dele para
desocupar o local e trouxe seu próprio pessoal. Como eu era a chefe do
submundo, esse movimento precisava da minha aprovação, e eu estava feliz
em dá-la. Tudo o que eu pedi em troca foi um contêiner para chamar de meu.
Lorelei era a única que sabia sobre o meu contêiner. Não porque eu
não confiava em meus outros amigos, mas porque Tucker e o Círculo poderiam
estar espionando todos nós, e eu não tinha me estabelecido aqui só para eles
perceberem o que eu estava fazendo. Mais do que isso, eu realmente queria
ter algo concreto para mostrar aos meus amigos antes de trazer qualquer um
deles aqui. Especialmente Bria e Finn, que queriam – precisavam – de
respostas tanto quanto eu. Às vezes, eu pensava que éramos como os três
ratos cegos, desesperadamente correndo em busca de respostas sobre nossas
mães mortas, e todos nós provavelmente seríamos cortados em pedaços por
Tucker e o resto do Círculo.
Lorelei foi até o quadro, encarando todos os meus rabiscos e brincando
com o fim da sua trança preta, que saia por baixo da sua toca azul royal.
Ela bufou e apontou para os chifres de diabo na foto de Tucker. — Eu
não sabia que você era uma artista tão talentosa.
— Eu só queria poder colocar minhas mãos nele pessoalmente — eu
murmurei. — Eu pintaria seu rosto com tons de sangue interessantes, então.
Melhor do que Picasso.
Lorelei me olhou, ouvindo a raiva e a frustração na minha voz. — Você
encontrará Tucker eventualmente, e o resto do Círculo também. Eu tenho fé
em você.
— E por que isso?
Ela encolheu os ombros. — Porque você, Gin Blanco, é a pessoa mais
teimosa e determinada que eu conheço.
Meus olhos se estreitaram. — Isso soou suspeitosamente como um
elogio. Por que você está sendo tão gentil comigo de repente?
— Porque somos amigas, mais ou menos, e é isso que os amigos fazem,
certo? — Sua voz era casual, mas ela não olhou para mim quando disse as
palavras, e a boca dela estava em uma linha tensa, quase como se estivesse
com medo de que eu rejeitasse seu sentimento suave de imediato.
— Somos amigas, mais ou menos — eu disse em uma voz forte. — E
você sabe o que mais amigos fazem?
— O quê?
Eu andei e peguei o marcador que eu tinha deixado cair no chão. Eu
entreguei a ela, então peguei outro para mim, junto com uma garrafa de gim
e um par de copos de plástico da prateleira de metal.
— Eles tomam uma bebida e desenham caricaturas muito ruins de
todos os seus inimigos — eu disse. — O que você diz, amiga?
Lorelei olhou para o gim, o marcador na mão e depois para mim. Suas
lindas feições se transformaram em um sorriso. — Eu digo que parece um
grande momento, amiga.
Capítulo 4
Lorelei e eu passamos a próxima hora rabiscando no quadro branco
antes de ela finalmente guardar o marcador, dizendo que precisava ir para
casa e ver como estava Mallory, sua avó. Nos despedimos, e eu desliguei as
lanternas, tranquei o contêiner, e fui para casa também.
Tomei um banho e fui para a cama, embora eu passei uma boa parte
da noite olhando para o teto do meu quarto, ainda me xingando por deixar a
Fedora escapar. Mais uma vez, o Círculo tinha estado três passos à minha
frente o tempo todo, e eu ainda não tinha novas informações sobre eles.
Eventualmente, adormeci, me levantei na manhã seguinte e fui ao Pork
Pit, meu restaurante de churrasco no centro da cidade de Ashland. Estacionei
seis quarteirões de distância do restaurante e subi na calçada, entrando na
multidão de transeuntes correndo para trabalhar naquela fria manhã de
dezembro. O sol estava brilhando para variar, mas os raios fracos não emitiam
um calor verdadeiro, e todos mantinham o queixo em seus casacos, suas
respirações ondulando ao redor deles em grossas nuvens de gelo.
Eu andei junto com os outros, embora eu continuasse olhando em
volta e olhando para os reflexos em todas as vitrines, tentando ver se alguém
estava me seguindo. Eu não vi ninguém, mas isso não significava nada. Não
com uma profissional habilidosa como a Fedora trabalhando para o Círculo.
Eu não veria alguém como ela chegando até que ela colocasse três balas na
parte de trás da minha cabeça. Ainda assim, mantive uma vigilância o melhor
que pude. Apenas no caso.
Fiz o meu caminho até o Pork Pit e minha verificação habitual da porta
da frente e das janelas, no caso de alguém ter deixado uma armadilha de
runas, bombas ou outro presente de Natal desagradável para mim. Mas a
porta e as janelas não tinham sido violadas, então entrei e repeti o processo.
As cabines de vinil azul e rosa também estavam limpas, assim como as mesas
e cadeiras, e ninguém entrou desde que eu tranquei a porta na noite passada.
Então, eu coloquei um avental de trabalho azul por cima das minhas roupas
e comecei as minhas tarefas matinais, incluindo fazer um molho de churrasco
secreto do meu mentor Fletcher Lane.
Entrar na minha rotina habitual e respirar todo o cominho, pimenta
preta e outros temperos doces e picantes do molho fervente me fizeram sentir
melhor. Assim como fazer aqueles desenhos bobos com Lorelei na noite
passada. Claro, a Fedora poderia ter fugido, mas Phillip e eu estávamos bem,
e isso era o mais importante. Além disso, mais cedo ou mais tarde, o Círculo
cometeria um erro. Eu só tinha que estar pronta para tirar proveito disso
quando eles o fizessem.
Às dez horas, uma batida suave soou na porta da frente, e eu deixei
Silvio Sanchez entrar no restaurante.
— Você não tem que bater, sabe. Eu te dei sua própria chave semanas
atrás. Você pode entrar na hora que quiser.
— Bater é a coisa educada a se fazer, — o vampiro murmurou de volta
para mim. — E neste caso, é a coisa prudente também. Especialmente quando
sua chefe é uma assassina que não aceita muito gentilmente as pessoas se
aproximarem dela sorrateiramente.
— Bom ponto.
Silvio tirou o longo casaco cinza, revelando seu terno, camisa e gravata
cinzas. Ele pendurou o casaco no cabide ao lado da porta, depois tirou o
chapéu fedora cinza e o colocou ali também.
Meu olhar se fixou no chapéu fedora e, desse jeito, meu humor suave
desapareceu. Silvio percebeu o que eu estava olhando.
— É apenas um chapéu, Gin — disse ele em uma voz divertida. — Não
um recipiente para o mal supremo.
Eu grunhi e fui para trás do balcão que ficava ao longo da parede dos
fundos do restaurante. Puxei uma faca afiada e serrilhada de um bloco de
açougueiro e comecei a cortar tomates, alface e cebolas para os sanduíches
do dia. Cortar as coisas sempre me fazia sentir melhor.
Silvio se sentou em seu banquinho habitual no balcão e ligou o telefone
e o tablet para a reunião matutina, como ele gostava de chamá-la. O vampiro
descobriu tudo o que podia sobre a Fedora durante a noite, o que basicamente
era nada. Ele tinha estado em contato com Bria e Xavier e tinha conseguido o
número da placa da SUV a partir de uma câmera de segurança do bairro.
Silvio havia rastreado o veículo até seu legítimo dono, que o tinha registrado
como roubado algumas horas antes do ataque na mansão de McAllister. Sem
dúvida, a Fedora já tinha abandonado o veículo nesta altura. Outro beco sem
saída.
Então, Silvio mudou para outros assuntos do submundo, incluindo
alguns chefões que precisavam de mim para mediar mais uma disputa
mesquinha. Suspirei. Na maioria das vezes, eu senti como se ser a chefe do
submundo de Ashland fosse como servir como o CEO da empresa mais
perigosa de todos os tempos. Só não que eu não recebia um salário condigno,
um escritório no canto, um jatinho particular ou quaisquer outras vantagens
corporativas. Apenas mais e mais pessoas planejando, conspirando e
aguardando até que decidissem que estavam finalmente prontos para me
matar.
Mas eu me forcei a ouvir Silvio e seguir junto. Todo mundo ainda
pensava que eu era a grande chefe, então eu tinha que agir assim. Pelo menos
até eu descobrir mais sobre o Círculo, como eles se encaixam no submundo
de Ashland, e cujas cordas eles estavam puxando, além da minha. Além disso,
se os outros chefes descobrissem sobre o Círculo e percebessem que eu não
era o poder supremo em Ashland, isso só os tornaria muito mais determinados
a me matar para que pudessem subir na cadeia alimentar do submundo.
Silvio sugeriu que marcássemos algumas reuniões com alguns dos
criminosos mais importantes, e concordei relutantemente.
Então eu mudei para o outro tema premente do dia. — E quanto a
Jonah McAllister? Ele ainda está em sua mansão?
Silvio assentiu. — A dez minutos atrás, de acordo com uma das
pessoas de Jade. Ela mandou que eles me mandassem mensagens de texto
com atualizações , mas até agora, tudo está quieto.
— Fedora não voltaria até hoje à noite de qualquer maneira. Isso é o
que eu faria. Como Jade aceitou meu pedido?
— Jade estava mais do que feliz em oferecer sua ajuda — disse Silvio.
— Ela já tinha várias pessoas trabalhando na área, incluindo um guarda de
segurança que patrulha aquele bairro em particular. Ela nem vai cobrar por
isso, embora ela gostaria de pedir um pequeno favor em troca. No entanto,
esse favor não seja especificado neste momento.
— Claro que sim.
Jade Jamison era uma mulher de negócios experiente, e sabia que, se
eu lhe devesse, valeria mais a longo prazo do que qualquer dinheiro que eu
pudesse pagar por seus serviços de vigilância. Sílvio mencionou algumas
outras coisas que precisavam da minha atenção antes que mais duas batidas
soassem na porta da frente, e o resto dos funcionários começou a aparecer,
incluindo Catalina Vasquez, a sobrinha de Silvio, e Sophia Deveraux, que
usava um comprido sobretudo preto com uma caveira de lantejoulas
prateadas usando um gorro de Papai Noel bordado nas costas. Combinava
com o resto de suas roupas góticas, incluindo o suéter listrado de preto e
prata, com listras de bengalas doces2. Sophia sempre mostrava seu espírito
natalino de uma maneira única.
Todos começamos a trabalhar e, às onze horas, várias pessoas
aguardavam na porta, batendo os pés para se manterem aquecidas, mais do
que prontas para entrar e pegar o seu churrasco. Hoje devia estar muito frio
para travessuras criminosas, porque a maioria dos meus clientes era apenas
pessoas normais, ansiosas para comerem um prato quente de churrasco,
juntamente com feijões cozidos, batatas fritas, anéis de cebola, salada de
repolho e um pouco de macarrão com queijo, que eu fiz o especialmente por
causa do tempo frio.

2
Eu tive um prato grande de macarrão com queijo para meu próprio
almoço. Macarrão al dente, cheddar branco forte derretido em um molho
cremoso e viscoso, biscoitos de manteiga assados polvilhados por cima para
um pouco de crocância. Era a comida de conforto perfeita, quente e saborosa,
e eu poderia usar todo o conforto que conseguisse agora.
A hora do almoço chegou e foi sem problemas, e o restaurante
lentamente se esvaziou depois disso, com apenas um par de pessoas para
atender. A maioria das pessoas permaneceu em casa hoje, não querendo se
aventurar no frio mais do que absolutamente necessário. Eu conhecia o
sentimento. Desde que eu descobri sobre o Círculo, eu só queria ficar
escondida na casa de Fletcher, enrolada na cama, com travesseiros e
cobertores em volta de mim, como se isso de alguma forma mudasse tudo que
Hugh Tucker tinha me dito – e a ameaça que ele e seu misterioso grupo
representavam para todos com quem eu me importava.
Eu tinha acabado de terminar o meu macarrão com queijo quando o
meu telefone apitou com uma nova mensagem de texto.
Você pode vir ao banco? Finalmente pronto para deixar o gênio fora da
caixa. F.
Meu coração se levantou e uma nova e fresca esperança surgiu através
mim com a mensagem de Finn. Já não era sem tempo. Eu estava esperando
por isso há dias, e ele também.
Eu mandei uma mensagem de volta. Estarei lá em 30 min. G.
Eu empurrei minha tigela vazia, me levantei e coloquei meu celular no
bolso da calça jeans. Em seguida, virei e peguei uma grande caixa de papelão
do balcão, junto com vários recipientes para viagem.
— O que foi aquilo? — Perguntou Silvio, me observando colocar
macarrão com queijo em uma tigela.
— Oh, só Finn. Aparentemente, ele está preso em outra reunião de
gerenciamento de crise no banco e quer que eu leve comida para ele.
— Mmm-hmm. Você sabe, isso seria quase uma mentira crível, exceto
pelo quão feliz você soa.
Eu olhei para o vampiro. — Eu não posso parecer feliz quando estou
falando sobre meus amigos?
Silvio cruzou os braços sobre o peito e me deu um olhar conhecedor.
— Não tão feliz.
Eu terminei de servir o macarrão com queijo e passei para uma panela
de feijões cozidos, colocando-os em um recipiente separado. — Sabe, Silvio,
você está se tornando tão paranoico quanto Finn sempre diz que eu sou.
Ele suspirou. — Eu sei. E é tudo sua culpa. Você me levou a isso.
— E como eu fiz isso?
— Não me dizendo onde você está e o que você está fazendo. Desligando
seu telefone para que eu não possa rastreá-la. Estacionando seu carro em
locais estranhos em várias horas do dia e da noite. — Ele assinalou os pontos
em seus dedos. — O que exatamente você estava fazendo em Southtown à
meia-noite da noite passada?
— Talvez eu tivesse saído para um passeio ao luar, — eu brinquei.
— Na neve e no frio? Acho que não. Você estava aprontando alguma
coisa, assim como você está sempre tramando algo. — Ele balançou a cabeça.
— Ser seu assistente é como tentar cuidar de um menino de três anos
indisciplinado.
Arqueei as sobrancelhas e avancei para a tigela com salada de repolho.
— Uau, eu cresci rapidamente. Você disse mais ou menos a mesma coisa na
semana passada, só que eu era uma menina teimosa de dois anos na época.
Ele bufou, nada divertido com a minha piada, então decidi contar a
verdade. Pelo menos, parte dela.
— Bem, se isso faz você se sentir melhor, eu estou indo para o banco,
e eu estou levando a Finn um pouco de comida. — eu levantei o recipiente
com repolho como prova.
— Entre outras coisas — Silvio disse, não acreditando nem por um
segundo.
— Entre outras coisas — eu concordei.
Eu terminei de embalar a comida de Finn na caixa de papelão, então
fui até um expositor de bolo de vidro, peguei um biscoito com lascas de
chocolate recém assado e coloquei em um guardanapo.
— Aqui. — Eu o ofereci para Silvio como uma oferta de paz. — Biscoitos
tornam tudo melhor, até mesmo assistentes vampiros amuados.
— Mmm-hmm.
Os olhos cinzentos de Silvio se estreitaram, mas eu sorri diante do
olhar dele. Finalmente, ele cedeu, pegou o biscoito e quebrou um pedaço. Ele
colocou-o na boca e suspirou de novo, desta vez com prazer.
— Biscoitos tornam tudo melhor — ele murmurou, concordando
relutantemente comigo. — Até mesmo chefes assassinos paranoicos e
obscuros.
Eu ri e entreguei a ele outro biscoito.
Capítulo 5
Eu pedi a Sophia e Catalina para vigiar o restaurante, peguei a comida
para Finn e fui até o First Trust of Ashland.
O First Trust era o banco mais exclusivo e sofisticado da cidade,
atendendo aos extremamente ricos, poderosos e perigosos. O prédio de sete
andares ocupava seu próprio quarteirão no coração do centro da cidade, e o
mármore cinza brilhava no fraco sol de inverno. Deixei meu carro em uma
garagem próxima, peguei a caixa de comida e segui para a entrada principal.
Algumas semanas atrás, um único guarda gigante estaria postado do
lado de fora, observando casualmente as pessoas se apressarem na calçada.
Mas, graças à recente e quase bem-sucedida tentativa de roubo de Deirdre
Shaw, a segurança tinha sido dramaticamente aumentada, e quatro guardas
agora ladeavam as portas duplas, todos mantendo a vigilância atenta, e todos
com as mãos próximas do coldre.
Eu trouxe o almoço para Finn várias vezes nas últimas semanas para
que os guardas soubessem quem eu era, mas ainda me olharam com
desconfiança quando me aproximei, e continuaram observando quando abri
uma das portas e entrei. Mesmo assim, um deles olhou através do vidro,
acompanhando os meus movimentos.
As portas se abriram em um lobby enorme e elegante que tinha uma
sensação leve, clara e arejada. Veias brancas percorriam o chão de mármore
cinza antes de serpentear pelas paredes e se estenderem sobre o teto, onde se
enrolavam em torno de vários lustres de cristal impressionantes. Mesas
escuras e pesadas estavam agrupadas por todo o saguão, para que as pessoas
pudessem ter um pouco de privacidade enquanto falavam sobre suas
finanças.
Dado que era um dia de semana, várias pessoas passavam pela área.
Pessoas entrando para fazer depósitos, outras saindo depois de terem
entregue o seu dinheiro, banqueiros carregando papéis de uma mesa para
outra. Caixas digitando em seus teclados, e o murmúrio de meia dúzia de
conversas enchia o ar, junto com um ocasional bip agudo de um celular.
Mais uma vez, meu olhar foi atraído para os guardas gigantes, todos
os oito, posicionados em pares nos quatro cantos do saguão, todos em alerta
máximo, com as mãos nas armas, exatamente como os quatro guardas do lado
de fora. Normalmente, eu teria ido até a recepcionista – outra guarda gigante
recém-instalada – sentada em uma mesa perto da entrada e dito a ela quem
eu estava aqui para ver, mas um homem de pé ao lado do balcão dos caixas
acenou para mim.
— Gin! — ele gritou. — Por aqui!
Sua voz não era tão alta assim, mas comparada com os outros
murmúrios abafados, ecoou como um trovão pelo espaço aberto, e todos
pararam o que estavam fazendo para olhar para ele, depois para mim. Eu fiz
uma careta e aumentei meu aperto na caixa de comida. Ainda ciente dos
olhares dos guardas em mim, caminhei até o balcão, que corria ao longo da
parede dos fundos.
Finnegan Lane, meu irmão adotivo, se endireitou com a minha
aproximação. Para um observador casual, ele parecia o mesmo de sempre –
um banqueiro de investimento bonitão usando um elegante terno Fiona Fine.
Mas o cabelo castanho-amarronzado estava mais despenteado do que
estilizado, a sua camisa branca estava amarrotada e o seu terno azul-marinho
pendia frouxamente nos ombros, em vez de estar perfeitamente ajustado. Ele
perdeu peso nas últimas semanas, apesar de todas as minhas tentativas de
convencê-lo a comer.
Finn olhou para a caixa de papelão em minhas mãos e suspirou. —
Mais comida? Eu ainda tenho sobras do frango assado que você trouxe para
o almoço há alguns dias.
Passei a caixa para ele. — Bem, agora você tem mais.
Ele assentiu com gratidão, mas seu olhar verde passou por mim e
passou pelo saguão antes de se concentrar em um ponto ao longo da parede
esquerda – o mesmo local onde ele descobriu pela primeira vez que Deirdre
Shaw era sua mãe. Os ombros de Finn caíram, fazendo o paletó cair ainda
mais, e eu poderia dizer que ele estava revivendo a traição dela.
Deirdre alegou que Fletcher a tinha ameaçado, forçando-a a deixar
Finn para trás, e a manteve afastada de seu próprio filho por quase toda a
vida de Finn. Ela havia voltado para Ashland há algumas semanas, dizendo
que, com Fletcher morto, ela poderia voltar para casa, conhecer seu filho e,
finalmente, fazer parte da vida de Finn.
Malditas mentiras sujas, tudo isso.
Na realidade, todos aqueles anos atrás, Deirdre havia ameaçado
congelar um Finn recém-nascido com sua magia de Gelo, se Fletcher não a
deixasse sair da cidade. Ela não se importava com Finn, até que ela precisou
dele para ajudá-la a roubar o First Trust em um último esforço desesperado
para pagar os milhões que ela devia a Tucker e ao resto do Círculo.
Finn olhou para o local ao longo da parede um segundo a mais antes
de se virar e colocar um sorriso no rosto, como se tudo estivesse normal, e ele
ainda era o cara despreocupado e feliz que tinha sido antes de Deirdre ter
invadido a cidade. Antes que ela rasgasse seu coração em pedaços e o traísse
da pior maneira possível. Antes que ela o torturasse com sua magia de Gelo.
Antes de ele ter matado a própria mãe para me salvar.
— Tudo bem. Vamos andar com isto — Finn disse.
Ele se afastou do balcão dos caixas e foi até uma porta de metal no
canto esquerdo do lobby. Os dois gigantes posicionados lá me olhavam, mas
Finn mostrou-lhes o cartão de acesso e eles abriram a porta. Segui Finn por
um longo lance de escadas que levava ao porão, onde ficavam os escritórios
dos funcionários sênior do banco. Finn me deixou em pé no corredor enquanto
ele ia ao seu escritório e colocava a caixa de comida em sua mesa. Então,
juntos, nós dois fomos até o Big Bertha.
O Big Bertha era o maior e mais seguro cofre do banco, com centenas
de caixas de cofres de segurança que eram um verdadeiro tesouro de dinheiro,
joias preciosas, ações, títulos e outros objetos de valor. Como este era um dia
normal de trabalho, a grossa porta metálica externa do cofre estava aberta,
embora a porta interna ainda estivesse fechada e trancada. Aquela porta
interna era na verdade uma placa reforçada de silverstone, um metal
extremamente resistente e durável que podia absorver e armazenar magia. A
placa tinha três camadas distintas agora, cada uma separada a poucos
centímetros da próxima, em vez da única camada que Deirdre tinha tão
facilmente explodido com sua magia de Gelo durante a tentativa de roubo.
Para minha surpresa, um anão com cabelos prateados e ondulados,
olhos castanhos afiados e feições ásperas e enrugadas estava em frente ao
cofre, esperando por nós. Stuart Mosley, o presidente do First Trust, e o chefe
de Finn.
Eu olhei para Finn, que deu de ombros para mim. — Ninguém entra
no cofre agora sem a aprovação de Mosley. Eu tive que dizer a ele o que eu
queria lá.
Eu não gostava que ninguém soubesse o que estávamos fazendo,
especialmente Mosley, já que eu não tinha ideia se poderíamos confiar nele.
Mas não havia como evitar o anão, então nos aproximamos dele.
— Srta. Blanco — disse Mosley com uma voz forte e grave. — É tão
bom vê-la de novo.
— Sr. Mosley.
Nós apertamos as mãos, como se isso fosse apenas uma transação
comercial inocente, então Mosley olhou para Finn. — Você tem a chave?
Finn assentiu, colocou a mão no bolso da calça, e tirou uma chave de
cofre, que ele segurou para a inspeção de seu chefe. Mosley olhou para o
número – 1300 – que estava gravado no metal. Por um momento, uma
sugestão de sorriso apareceu no rosto do anão, aprofundando as linhas nos
cantos dos olhos e da boca, mas foi embora tão rapidamente que me perguntei
se só imaginara a emoção divertida. Eu olhei para Mosley, mas seu rosto
estava frio como pedra novamente, e eu não consegui ler o que ele estava
pensando.
Mosley se virou e digitou um código em um teclado que estava ligado
à primeira porta de silverstone. A luz no teclado piscou verde antes de piscar
de novo para vermelho. Ele digitou mais dois códigos; a luz brilhou verde duas
vezes mais antes de permanecer nessa cor, e todas as três portas de prata
lentamente deslizaram uma atrás da outra.
— Bem, você sabe onde fica essa caixa, Finn, — Mosley retumbou. —
Eu vou deixá-lo à vontade. Certifique-se de bloquear o cofre novamente
quando terminar.
O anão acenou para nós, então se virou e caminhou pelo corredor e
virou a esquina, presumivelmente voltando para o seu escritório.
— Eu sou a única que achou isso estranho? — Eu perguntei. — Quase
parecia que ele estava prestes a abrir um sorriso genuíno ali por um segundo.
Finn balançou a cabeça. — Honestamente, não consigo dizer mais
nada por aqui. Para cima é para baixo e para baixo é para os lados, com todas
as novas medidas e mudanças de segurança. De qualquer forma, vamos ver o
que papai nos deixou.
Entramos no cofre. A última vez que eu estive aqui, o espaço estava
em ruínas, desde que eu usei as minhas magias de Gelo e de Pedra para
derrubar o teto em cima de Deirdre e de Rodrigo Santos, o ladrão profissional
que a estava ajudando. Mas as pilhas de escombros de mármore já tinham
desaparecido, assim como toda a poeira cinzenta, os pedaços quebrados de
vergalhões de silverstone e outros destroços. A área parecia imaculada, e as
fileiras de caixas de cofres de segurança brilhavam como se tivessem sido
todas polidas à mão. Talvez elas tivessem sido, dada a atenção de Mosley aos
detalhes.
— Por aqui — disse Finn.
Ele me levou para o canto esquerdo da parte de trás do cofre. Todas as
caixas estavam marcadas com pequenos números pretos, e a caixa de Fletcher
– 1300 – era a caixa central em uma fileira de três para o lado e três para
baixo. Nove caixas no total, separadas de todas as outras.
Finn estendeu a chave para mim. — Você a achou, então você faz as
honras.
Depois que Tucker tinha me insultado com o conhecimento de que
minha mãe tinha feito parte do Círculo, eu tinha ido ao Cemitério Blue Ridge
para desenterrar seu túmulo para ver se Fletcher poderia ter deixado uma
pista para mim lá, como ele tinha feito no caixão vazio de Deirdre. Eu encontrei
a chave do caixa do cofre de segurança enterrada na terra no túmulo da minha
mãe e fiquei pensando sobre isso desde então.
Mas agora que nós finalmente íamos abrir a caixa, a dúvida me
encheu, juntamente com mais do que um pouco de preocupação sobre o que
nós encontraríamos lá dentro. Que horríveis segredos Fletcher descobriu
sobre minha mãe? Que duras verdades ela escondeu durante todos aqueles
anos? E quanto elas me machucariam agora?
— Gin? — Finn ainda estava segurando a chave para mim. — Você
está bem?
Eu soltei um suspiro. — Sim. Vamos fazer isso.
Antes que eu pudesse pensar sobre isso por mais tempo, eu peguei a
chave dele, deslizei na fenda da caixa, e virei-a. A fechadura se abriu e eu
puxei a maçaneta e tirei o cofre da parede. Eu carreguei o compartimento
longo e retangular até uma mesa na altura da cintura e coloquei-o ali. Finn
acenou para mim e eu lentamente levantei a tampa da caixa para revelar...
Uma única folha de papel.
Eu franzi a testa. Não é o que eu estava esperando. De modo nenhum.
Com todas as fotos e lembranças quebradas que Fletcher havia colocado na
caixa no caixão de Deirdre, eu supus que essa caixa também seria preenchida
com informações. Mas talvez o velho não tivesse tido tempo de descobrir tudo
sobre minha mãe e o Círculo. Talvez ele tivesse apenas deixado para trás uma
lista dos nomes dos membros. Isso seria mais do que suficiente para que eu
começasse a rastrear Tucker e todos os outros, por mais que houvesse tantos.
Com o coração acelerado, eu peguei o papel. Meus dedos estavam
tremendo tanto que me levou três tentativas antes que eu fosse finalmente
capaz de agarrá-lo e tirá-lo da caixa. Finn moveu-se para ficar ao meu lado, e
eu segurei o papel onde poderíamos vê-lo para encontrar...
Um retângulo desenhado na folha.
Era isso. Isso era tudo. Apenas um retângulo grande e simples
desenhado em uma folha branca de papel.
Eu o virei, esperando que algo estivesse escrito na parte de trás. Uma
nota, um número de telefone, um endereço. Mas nada estava lá. Eu segurei
contra a luz, pensando que talvez houvesse uma runa, marca d'água ou algum
outro símbolo fraco que eu ainda não tinha percebido. Nada ainda.
Desesperada, olhei de novo para a frente, mas era a mesma de antes.
Nada – não havia nada aqui. Fletcher não me deixou nenhuma pista
sobre minha mãe, Tucker ou o Círculo. Nenhuma.
Uma vez mais, eu tinha nada. Absolutamente nada. Zero. Nada. Um
monte muito grande de nada. Mais nada do que nunca.
— É isso? — Eu rosnei. — Isso é tudo que existe? Você deve estar
brincando comigo!
Irritada, joguei o papel na mesa. A folha solta atravessou a superfície
metálica lisa, flutuou no ar e pousou bem na frente das fileiras de caixas de
cofres de segurança. O lote inteiro parecia uma rosquinha agora que a caixa
de Fletcher estava faltando no centro. Eu olhei para o papel, me perguntando
se o velho estava de alguma forma zombando de mim do grande além. Isso
certamente era como se sentia.
Finn se aproximou e pegou o papel rebelde do chão, colocando-o de
volta na mesa. Ele limpou a garganta, quebrando o silêncio tenso e raivoso. —
Eu sei que você está desapontada. Eu também. Eu esperava que houvesse
mais na caixa.
— Mas?
Ele deu de ombros. — Mas talvez o pai simplesmente não tenha tido
tempo para colocar qualquer informação na caixa. Você sabe quantos
esconderijos ele tinha em seu escritório e em toda a cidade. Difícil de rastrear
todos eles, muito menos o que ele colocou dentro de cada um. Ou talvez ele
simplesmente não tivesse nenhuma informação sobre sua mãe e o Círculo
para compartilhar. Ele se foi agora, então nunca teremos certeza.
Decepção queimou meu coração, queimando toda a minha esperança
anterior em cinzas negras frágeis. — Não, eu acho que nunca vamos.
Eu olhei para o papel de novo, igualmente irritada e frustrada. Parte
de mim queria pegar a folha, rasgá-la em pedaços e jogar toda a bagunça na
lata de lixo mais próxima. Em vez disso, estendi a mão, cuidadosamente
dobrei-a e coloquei-a dentro do bolso do meu casaco. Talvez fosse bobagem,
mas eu ia manter a folha, apenas pela simples razão de que Fletcher havia
rabiscado nela.
Finn pigarreou novamente. — Eu sei que você está decepcionada.
— Mas?
— Mas aqui está outra coisa que eu preciso falar com você.
Ele hesitou, em seguida, colocou a mão no paletó e tirou um espesso
punhado de papéis, que ele colocou na mesa entre nós.
— O que é tudo isso?
— Chegou pelo correio há alguns dias. — Ele deslizou os documentos
sobre a mesa para mim. — Veja por si mesma.
Peguei os papéis, desdobrei-os e olhei a primeira página. Eu fiz uma
careta. — Isto... parece algum tipo de... escritura feito para você.
Finn atirou o polegar e o indicador para mim. — Vencedora, vencedora.
É a escritura do complexo de resorts Bullet Pointe, que agora possuo
fechadura, estoque e barril3.
Eu pisquei ao ouvir o nome. — Bullet Pointe? Aquele esquisito parque
temático do Velho Oeste na Geórgia? Aquele com todos os caubóis, o tempo
todo?
Bullet Pointe era moderadamente famoso em Ashland e arredores,
como o pobre e distante primo sulista de um dos parques temáticos da Disney.
Os passeios, os personagens fantasiados e as exibições de shows tornaram o
local especialmente popular entre as famílias e as escolas. Se você vivesse a
uma curta distância de carro, era provável que você tivesse ido ao parque
temático em pelo menos uma viagem de férias em família ou passeio da escola.
Finn assentiu, com um pouco de excitação brilhando em seus olhos.
— Sim, é isso. Papai nos levou lá uma vez nas férias. Você se lembra, Gin?
Eu bufei. — Oh, eu lembro bem. Você e Fletcher passaram o fim de
semana inteiro brincando de cowboys, enquanto eu os segui como uma
terceira roda.
— Você também ficou doente. Eu me lembro de você comendo pizza
demais e então vomitando suas entranhas no segundo que nós saímos de um
dos passeios de balanço. — Finn sorriu. — Bons tempos.

3 No original “lock, stock, and barrel”. Trata-se de uma expressão que significa “incluindo
tudo”, “completamente”, “na totalidade”.
Revirei os olhos, então fiz a pergunta óbvia. — E como exatamente você
acabou com a escritura desta armadilha turística?
Ele se mexeu. — Deirdre deixou para mim em seu testamento.
Minhas sobrancelhas subiram em minha testa. — A sua mãe vadia e
mentirosa rainha do gelo realmente deixou algo para você?
Finn estremeceu, o sorriso provocante caindo de seu rosto e a excitação
apagando de seus olhos. Tarde demais, percebi o quão duro meu tom tinha
sido e quanto ele ainda estava sofrendo por tudo que Deirdre havia feito. Mas
eu não podia colocar as palavras de volta na minha boca, então eu continuei
em frente.
— Eu pensei que Deirdre estava falida, — eu disse em uma voz mais
neutra. — Que a razão pela qual roubou o Briartop e tentou fazer a mesma
coisa aqui no banco foi para pagar todos os milhões que ela devia ao Tucker e
ao resto do Círculo.
Finn encolheu os ombros. — Parece que ela foi pelo menos capaz de
manter o resort. Talvez Tucker não tenha percebido que ela era a dona. Talvez
ela tenha escondido isso dele. Mas mesmo que ele soubesse sobre o resort e a
pressionasse para vendê-lo, não é o tipo de coisa que você pode simplesmente
levar até a casa de penhores de esquina e trocar por dinheiro vivo.
Bem, esconder bens certamente soava como algo que Deirdre teria
feito. Mesmo quando Tucker a amarrava em uma cadeira e a torturava, ela
ainda estava planejando como poderia transformar a situação em seu
benefício. Mamãe Dee sempre planejava algo, então não era surpresa que ela
tivesse guardado alguns ativos para um dia chuvoso. Mas um parque temático
do Velho Oeste? Eu nunca esperaria isso dela. Ele simplesmente não se
encaixava com a personalidade de diva de Deirdre e o vício para as coisas mais
refinadas da vida.
— Ela chegou a falar comigo sobre o resort algumas vezes — continuou
Finn. — Antes... de tudo o que aconteceu.
Eu esperei, mas ele não elaborou, e eu percebi que eu teria que
arrancar isso dele. — E o que ela disse?
Finn mordeu o lábio e mudou de posição. Ele olhou para além de mim,
olhando para a entrada do cofre e para o corredor, concentrando-se no local
onde Deirdre o havia torturado com sua magia. Seus olhos verdes se
escureceram e seus ombros ficaram tensos, lembrando-se das horríveis e
dolorosas queimaduras de Gelo que ela havia infligido a ele. Suas mãos se
fecharam em punhos, e um leve tremor, quase imperceptível, percorreu seu
corpo antes que ele fosse capaz de pará-lo.
— Finn? — Eu perguntei de novo em uma voz mais suave, tentando
afastá-lo de suas memórias dolorosas. — O que Deirdre disse sobre o parque
temático?
Ele piscou, voltando para o aqui e agora, embora ele abaixou a cabeça
e começou a desenhar uma linha no chão com a ponta do sapato, em vez de
olhar para mim. — Deirdre achava que o tema do Velho Oeste era bastante
pitoresco. Ela me contou que comprou o parque por um capricho décadas
atrás, que foi um dos seus primeiros investimentos. O parque em si é todo
sobre caubóis, o tempo todo, assim como você disse, mas há também um hotel
no local, também chamado Bullet Pointe. Deirdre disse que ela concentrou
todos os seus esforços no hotel. Ele ainda tem a mesma atmosfera do Velho
Oeste, como todas as outras coisas, mas ela alegou que o transformou
lentamente em um resort de luxo. Ela se gabou de que as pessoas vinham de
todo o país para ficar lá e aproveitar o spa, os campos de golfe e o lago que o
circula e ao parque temático. Aqui. Veja por si mesma.
Finn pegou o maço de papéis de mim e tirou um folheto liso e lustroso,
que ele entregou para mim. Abri-o e examinei as páginas. Ele estava certo. O
hotel Bullet Pointe parecia um lugar chique, com o tipo de luxo insanamente
caro e exagerado em que Deirdre se dedicava. Ainda assim, fiquei imaginando
por que ela o deixara para Finn e, em especial, por que a escritura tinha
aparecido agora.
Normalmente, a documentação de propriedades e heranças eram
muito mais lentas, especialmente em Ashland. Na maioria das vezes, quando
alguém morria, parentes há muito perdidos e primos de segundo grau
distantes começavam a surgir, cada um exigindo um pedaço da torta do
dinheiro do falecido, independentemente de ser grande ou pequeno. Mas aqui
estava Finn, apenas duas semanas após a morte de Deirdre, com a escritura
deste brilhante novo e significativo imóvel. Era tudo um pouco conveniente,
muito rápido e fácil para o meu gosto. Algo estava acontecendo aqui.
— Então, o que você pretende fazer com o seu novo dinheiro
inesperado? — Eu perguntei.
— Bem, isso depende de você.
— Por que eu?
— Porque eu sei o que você está pensando – que tudo isso aconteceu
muito rápido e muito facilmente. E eu concordo totalmente com você. É
definitivamente suspeito. Eu nem sequer pensei que fosse real, no começo.
— Mas?
— Mas no segundo em que eu recebi a escritura, comecei a fazer
ligações, certificando-me de que era legítima. O advogado que fez o testamento
de Deirdre me garantiu que era e me colocou em contato com o gerente do
resort.
— E?
Finn hesitou. — E duvidoso ou não, pensei que poderíamos ir até lá
neste fim de semana e verificar por nós mesmos. O gerente do resort quer me
conhecer, o novo dono, e ter certeza de que estou feliz com a forma como as
coisas estão sendo executadas.
— Você quer dizer que o gerente quer sugar e beijar sua bunda para
que ele possa manter seu trabalho confortável.
— Na verdade, é uma “ela”, mas é algo assim. — Finn me lançou um
leve sorriso, uma ocorrência rara nos dias de hoje. — Mas, ei, eu não sou de
recusar um beijo na bunda livre e entusiasmado.
— Essas palavras parecem tão erradas saindo da sua boca.
— Qual é o problema, Gin? Não gosta de duplo sentido?
Eu bufei. — Isso não é duplo sentido, e você certamente não é um
James Bond.
Finn endireitou a gravata. — Claro que não. Eu sou muito mais bonito
do que aquele cara inglês4.
— Você certamente tem um ego muito maior.

4No original “limey bloke”. É uma gíria usada (Estados Unidos e Canadá) fazendo referência
aos britânicos.
Ele piscou para mim. — Isso não é a única coisa que é maior em mim.
Eu gemi e balancei a cabeça. — Sempre me surpreende como o ego de
Finnegan Lane não pode ser contido por uma mera mortal como eu. Apenas
exala em todos os lugares, infectando tudo o que toca.
— Infectando isso com grandiosidade — ele atirou de volta para mim.
Meus olhos se estreitaram, mas Finn sorriu ainda mais, cruzou os
braços sobre o peito e se inclinou contra a mesa, sabendo que ele ganhou
nossa partida de disputa verbal. Naquele momento, ele parecia mais com o
seu antigo eu do que em semanas, depois de tudo que aconteceu com Deirdre.
Eu não tinha coragem de explodir sua bolha com mais suspeitas e
preocupações agora, então eu olhei para o folheto do hotel novamente.
— Você realmente quer ir até lá neste fim de semana? — Eu perguntei.
— Você não precisa ficar aqui e ajudar Mosley? Eu pensei que vocês ainda
tinham mais alguns cofres para classificar e garantir que o conteúdo fosse
devolvido aos seus legítimos donos.
— Nós terminamos com a última das caixas algumas noites atrás. —
Finn fez uma pausa. — Mosley passou por todas e checou tudo.
Aparentemente, ele tem uma lista mestra de todos os itens em cada caixa, até
o último diamante sem cortes e moeda de ouro.
— E como ele conseguiu isso? Eu pensei que as caixas de depósito e
seu conteúdo deveriam ser completamente confidenciais.
Finn encolheu os ombros. — Eu não perguntei, e francamente, eu não
quero saber. Estou feliz que tudo esteja de volta ao seu devido lugar. Tudo o
que Mosley está fazendo agora é contratar e investigar novos guardas e
estudar os novos procedimentos e protocolos de segurança. Acredite em mim,
ele me informou sobre isso completamente.
Finn murmurou as últimas palavras, e sua expressão alegre
desapareceu. Desta vez, eu estremeci por ele. Qualquer um teria caído no
encanto enganoso de Deirdre e ficado enredado em seu plano elaborado para
roubar o First Trust. Mas gostando ou não, Finn foi quem deu a Deirdre,
Rodrigo Santos, e a sua equipe de ladrões acesso ao banco, mesmo que tivesse
sido sob a mira de uma arma, e vários dos guardas do banco morreram como
resultado.
Naturalmente, Stuart Mosley tinha sido duro com Finn. Oh, o anão
não gritou, esbravejou ou ameaçou. Mosley nem disse uma única palavra
sobre demiti-lo. Ele apenas se certificou de que Finn estivesse envolvido em
todos os aspectos para colocar o banco de volta em funcionamento, desde
revisar os novos procedimentos de segurança, garantir aos clientes que seus
objetos de valor ainda estavam seguros, até assistir aos funerais de todos os
guardas que haviam morrido.
Finn teria feito todas essas coisas de qualquer maneira, mas a última
delas tinha sido particularmente difícil, já que ele trabalhou no banco por anos
e tinha sido amigável com todas as pessoas que tinham sido mortas. Ele não
disse nada para mim, mas ele foi para o Pork Pit depois de alguns dos funerais,
seus olhos sombrios, o rosto cinzento de tristeza, todo o seu ser irradiando
uma miséria doentia. Eu sabia que isso o rasgou, saber que seus colegas de
trabalho estavam mortos e que suas famílias estavam sofrendo suas perdas
devastadoras. Finn se culpou por tudo isso, e a culpa era como um peso de
chumbo ligado aos seus ombros. Eu sabia que ele não estava comendo como
deveria, e Bria tinha me dito que ele mal dormia também.
Finn realmente amava seu trabalho, então o roubo e tudo o que Deirdre
tinha feito a ele tinha sido punição suficiente, mas Mosley o fez sofrer um
pouco mais, só porque podia. Outra coisa que contribuiu para a infelicidade
de Finn nas últimas semanas, embora ele não tenha reclamado das táticas de
seu chefe. Nenhuma vez. Finn achava que ele merecia ser punido, e nada que
eu, Bria ou qualquer outra pessoa dissesse convenceu-o do contrário.
— Além disso, — Finn continuou, — eu acho que todos nós precisamos
de uma pausa depois de tudo que aconteceu nas últimas semanas, e onde é
melhor para recuperar o seu humor do que em um hotel chique? Uma
massagem de algas fará maravilhas para a pele e, francamente, minha
querida, você poderia usar algumas fatias de pepino em seus olhos. Livre-se
das olheiras e linhas de preocupação, e vire sua perpétua carranca de cabeça
para baixo.
— Franzir a testa me deixa mais intimidante, e os únicos pepinos em
que estou interessada são os das saladas do Pork Pit.
Ele revirou os olhos. — Você está tão errada sobre tantas coisas na
vida, eu nem sei por onde começar.
Eu sorri para ele, e ele suspirou, sabendo que eu ganhei a segunda
rodada. Mas Finnegan Lane nunca ficava para baixo por muito tempo.
— Vamos lá, Gin — ele disse. — Você, eu, Bria, Owen. Faremos uma
viagem até lá, passaremos o final de semana brincando de cowboys e sendo
mimados, e voltamos a tempo de abrir o restaurante na manhã de segunda-
feira. Vai ser divertido. Férias de todos e de tudo em Ashland.
— Férias? — eu zombei e cruzei os braços sobre o peito. — Você se
lembra do que aconteceu na última vez em que saímos de férias?
Ele estremeceu, pensando no nosso tempo em Blue Marsh.
— Um vampiro psicopata quase sugou toda a minha magia, junto com
o meu sangue, e eu acabei tropeçando em um pântano no meio da noite — eu
disse. — Então, me perdoe se eu não estou ansiosa para tirar outras férias.
Para mim, férias significa apenas perigo extremo em um lugar diferente.
Finn acenou afastando as minhas preocupações. — Isso foi um golpe
de azar e você sabe disso. Nada como isso vai acontecer de novo.
Arqueei minhas sobrancelhas para ele.
— Bem, provavelmente não — ele disse. — Embora eu saiba, de fato,
que você não vai tropeçar em nenhum pântano.
— E por que isso?
— Porque eles não existem lá.
Ele sorriu, satisfeito com a sua lógica, mas eu continuei encarando-o.
O sorriso escorregou de seu rosto e seus ombros caíram novamente.
— Por favor, Gin — ele disse com uma voz muito mais baixa. —
Significaria muito para mim.
— Por quê?
Seus lábios pressionaram em uma linha apertada, e levou um
momento para ele responder. — Deirdre disse que passou muito tempo no
hotel. Eu gostaria de ver o quarto dela e as coisas dela, o que quer que ela
tenha deixado para trás.
De repente, tudo fazia sentido. Mesmo agora, depois do quão
horrivelmente ela o traiu e torturou, Finn ainda queria saber mais sobre
Deirdre, da mesma forma que eu queria saber mais sobre a minha mãe, e se
ela realmente tinha sido uma pessoa terrível como Tucker alegou. Finn
precisava saber se havia algo mais em Deirdre do que sua ganância insaciável
e seu coração frio e gelado. Eu não podia culpar meu irmão por sua
curiosidade, já que as mesmas perguntas queimavam em meu coração sobre
Eira.
— Além disso, — Finn continuou, sentindo que eu estava vacilando, —
talvez haja alguma pista em suas coisas sobre o Círculo. Ela gerenciava o
dinheiro deles, afinal. Pelo menos de um deles. Certamente, ela manteve
registros de seus interesses comerciais e finanças.
Ele tinha razão. Não encontramos nada nos pertences pessoais de
Deirdre em sua cobertura alugada em Ashland, mas talvez ela tivesse deixado
algo para trás no hotel. Algo que o Círculo ainda não tinha tido acesso. Algo
que pudesse me ajudar a identificar os outros membros – ou pelo menos
descobrir como minha mãe esteve envolvida com eles.
Talvez Finn estivesse certo. Talvez uma mudança de cenário faria bem
a todos. Limpar as nossas cabeças e corações, e vamos voltar para Ashland
com novos olhos e determinação renovada. Neste momento, eu estava apenas
dando voltas quando se tratava do Círculo, e eu fiquei sem pessoas para
questionar e lugares para procurar.
Eu suspirei, e Finn sorriu, percebendo que ele tinha ganhado essa
terceira e última rodada e assim o jogo todo.
— Bem, Gin? — Excitação estava rastejando em sua voz novamente.
— O que você diz?
Eu balancei a cabeça e joguei o folheto sobre a mesa. — A única coisa
que posso dizer. Vamos lá, Cowboy. Vamos fazer uma viagem.
Capítulo 6
— Atire em mim, — Owen Grayson murmurou em voz baixa que só eu
podia ouvir. — Apenas vá em frente e atire em mim agora. Por favor. Alguém,
qualquer um, me tire da minha miséria.
Eu olhei para o meu namorado, que estava esparramado pelo banco
de trás do Range Rover. Saímos de Ashland na manhã de sexta-feira e, três
horas depois, estávamos finalmente nos aproximando do parque temático
Bullet Pointe, que ficava nos arredores de Chattanooga, embora na realidade
estivesse na Geórgia, ao invés do Tennessee.
Finn estava dirigindo e cantando mais uma música com tema de
cowboy, assim como fez desde que saímos de casa. Sua cantoria era animada,
mas extremamente desafinada. Eu não sabia que existiam tantas músicas do
Velho Oeste, muito menos que Finn sabia as letras de muitas delas, mas ele
fez uma playlist especial apenas para a nossa viagem.
Owen suspirou e passou os dedos pelos cabelos pretos como se
estivesse pensando em arrancá-los, assim como já fizera uma dúzia de vezes
na última hora. A luz do sol que penetrava através das janelas destacava os
traços robustos e bonitos de seu rosto, inclusive seu nariz ligeiramente torto
e a cicatriz que lhe cortava o queixo. Owen girou o pescoço de um lado para
outro, tentando liberar um pouco da tensão que se acumulava ali e em seus
ombros largos e musculosos.
Estendi a mão e peguei sua mão, entrelaçando meus dedos nos dele.
— Relaxe — eu sussurrei. — Estamos quase lá.
— Você está tão me devendo por isso — ele murmurou de volta.
— E como você gostaria de receber?
Seus olhos violeta brilharam com um calor súbito e intenso, e um
sorriso lento e sexy surgiu nos seus lábios. — Oh, eu posso pensar em
algumas maneiras.
— Bem, então. — Eu sorri de volta para ele. — Eu ficarei mais do que
feliz em pagar.
A detetive Bria Coolidge estava sentada no banco do passageiro da
frente, e ela deve ter ouvido nossos sussurros, porque se virou e olhou para
mim, seu cabelo loiro voando sobre os ombros.
— Acabei de ver outra placa! — ela disse, sua voz mais maníaca do que
genuinamente entusiasmada. — Devemos chegar ao hotel a qualquer
momento!
Seus olhos azuis se contorceram. Os dedos dela também, e ela olhou
para Finn, então para o controle de volume no rádio, como se debatesse qual
deles ela queria calar mais. Owen não era o único que estava cansado do
karaokê de três horas do meu irmão adotivo.
Mas Finn continuou cantando junto com a música, cantando sobre
cavalos, cerveja e outras coisas de cowboys. Eu era a única que parecia notar
o quanto seus sorrisos estavam tensos e quão forçada e falsa era sua
exagerada alegria. Finn parecia determinado a se divertir e esquecer todos os
seus problemas em Ashland, pelo menos durante este fim de semana.
Eu admirava sua determinação, não sendo o caso da sua cantoria.
Felizmente, Bria estava certa, e Finn saiu da estrada principal e entrou
em uma longa e pavimentada estrada que subia a colina coberta de árvores.
De acordo com o folheto que eu li, o hotel Bullet Pointe estava localizado no
topo da colina, com o parque temático do Velho Oeste espalhado no vale
abaixo.
— E aqui estamos — disse Finn, saindo das árvores e entrando em
uma ampla área circular em frente ao hotel.
Ele parou perto da entrada e estacionou, e nós quatro saímos do carro.
O hotel resort Bullet Pointe estava à nossa frente. A estrutura de sete
andares era feita de enormes rochas cinzentas encaixadas com grossas e
resistentes vigas de madeira envelhecidas e cinzentas. As janelas pequenas,
reluzentes, brilhavam como diamantes retangulares à luz do sol, enquanto o
telhado de ardósia preta elevava-se até um ponto acentuado. A frente do hotel
era ladeada por um pórtico de pedra que exibia fileiras de cadeiras de balanço
e barris antiquados com tabuleiros de damas e outros jogos empoleirados no
topo.
O Natal definitivamente chegara cedo aqui. Grandes aglomerados de
flores de Natal5 em vasos estavam espalhados a cada poucos metros ao longo
da varanda, enquanto o visco e outras plantas verdes se enrolavam ao redor
das colunas de pedra, junto com luzes brancas. Ainda mais luzes brancas
decoravam todas as janelas e beirais, guirlandas verdes com arcos de veludo
vermelho suspensos pendiam dos lados da estrutura. O hotel me lembrava
um alojamento de caça rústico do oeste que tinha sido enfeitado para o Natal
e caído no meio das Montanhas Apalaches.
— Não é legal? — Finn disse, seu rosto iluminando-se com emoção. —
Esse vai ser um ótimo final de semana. Vamos pegar nossa bagagem e entrar.
Embora fosse pouco depois das dez horas da manhã, um fluxo
constante de pessoas entrava e saía do hotel, fazendo check-in, despachando
malas, refrigeradores e mais aqui e ali. Um manobrista vestido como um
cowboy pegou as chaves do carro de Finn, enquanto dois porteiros, também
vestidos como cowboys, se apressaram e carregaram nossa bagagem em um
carrinho de latão. Nós quatro nos dirigimos para a entrada principal, um arco
de pedra que era cercado por chifres de cervos e alces com luzes brancas em
volta deles.
Finn estava ocupado falando e apontando coisas para Bria e Owen,
mas eu olhei ao redor, examinando tudo e todos à minha volta. Os
manobristas e porteiros estavam apressados fazendo o seu trabalho, enquanto
os outros hóspedes estavam ocupados com seus filhos e a sua bagagem. Eu
também alcancei minha magia de Pedra, mas as rochas que compunham o
hotel apenas murmuravam com toda a correria e agitação de milhares de

5 No original “poinsettia”. A ponsettia, também conhecida como flor de Natal, estrela de Natal
ou bico-de-papagaio é uma planta originária do México e caracteriza-se pelas suas folhas
largas que podem ter diversas cores, sendo a mais popular a vermelha por causa do Natal.
pessoas que ficavam aqui todos os anos, e eu não detectei nenhuma nota alta
e óbvia de malícia, caos ou assassinato.
Ainda assim, não pude evitar sentir como se alguém estivesse me
observando.
Um pavor sinistro e familiar encheu a boca do meu estômago, e as
cicatrizes de runas de Aranha embutidas em minhas palmas das mãos
começaram a coçar e queimar, quase em aviso. Eu poderia jurar que alguém
estava olhando para mim. Olhei em volta novamente, mas a cena
movimentada era a mesma de antes, com hóspedes, manobristas e porteiros
interessados em sua própria bagagem, gorjetas e tarefas. Então, meu olhar
vagou para cima em direção aos níveis mais altos do hotel...
Uma cortina branca se moveu em uma janela no terceiro andar.
Minha cabeça se levantou e meus olhos se estreitaram enquanto eu
olhava para aquela janela, mas a cortina já havia voltado para o lugar. Eu não
conseguia ver quem – se alguém – estava atrás dela. Ainda assim, eu
permaneci onde estava, esperando que a cortina se movesse novamente,
revelando exatamente quem estava do outro lado...
— Vamos lá, Gin! — Finn gritou. — Estamos perdendo tempo!
Ele acenou para mim antes de passar pela entrada em arco. Bria e
Owen o seguiram, mas eu fiquei onde estava e olhei para a janela novamente.
A cortina branca permaneceu perfeitamente imóvel, embora minha
sensação desconfortável de ser observada não tenha desapareceu. Se alguma
coisa, intensificou-se quanto mais eu olhava para a cortina, como se estivesse
trancada em um concurso de encarar com alguém que eu nem conseguia ver...
— Gin! — Finn gritou de novo, pendurado na lateral do arco. — Vamos,
lá!
Com seu segundo grito, mais alto, hóspedes e trabalhadores se
voltaram para olhar para mim, aumentando meu desconforto, e eu não tive
escolha a não ser abaixar a cabeça e me apressar. Ainda assim, quando entrei
no hotel, um pensamento continuou correndo pela minha mente.
Nós tínhamos acabado de chegar aqui, e eu já sentia como se
tivéssemos cometido um erro perigoso.
***

Eu atravessei o arco e alcancei Bria e Owen, que estavam olhando ao


redor do saguão, enquanto Finn falava com um dos cowboys na recepção.
O hotel Bullet Pointe parecia rústico do lado de fora, mas Deirdre Shaw
certamente não tinha poupado nenhuma despesa remodelando o interior, que
era todo sofisticado, luxuoso e confortável. Uma enorme lareira de pedra
cinzenta, com pelo menos quinze metros de largura, ocupava uma parede
inteira do saguão, com cadeiras de balanço acolchoadas e sofás estofados
espalhados em frente a ela. Dado o frio do lado de fora, várias pessoas
relaxavam diante das chamas crepitantes e sorviam canecas altas de
chocolate quente e sidra de maçã temperada, enquanto outros hóspedes
estavam empoleirados em banquinhos em um bar perto da lareira, tomando
bebidas mais pesadas.
Garçons vestidos como cowboys e garçonetes em trajes de saloon girl6
saíram do bar, atravessaram a multidão em frente à lareira e voltaram,
servindo e repondo as bebidas. Ainda havia mais funcionários fantasiados
circulando pelo saguão, deixando pratos de aperitivos e pequenos lanches,
antes de voltarem a um corredor para uma cozinha próxima.
Mais cadeiras e sofás estavam reunidos em grupos por todo o saguão,
para aqueles que preferiam relaxar longe do calor da lareira, juntamente com
mesas que apresentavam lâmpadas altas feitas chifres de veados, alces e
cervos. Esses mesmos tipos de chifres também envolviam os amplos
candelabros de rodas de carroça que desciam do teto.
Mas a decoração rústica não podia competir com todas as árvores de
Natal. Mais de uma dúzia delas se espalhava pelo saguão, variando em
tamanho, desde bonitas árvores de mesa até o espetacular abeto de nove
metros no centro do saguão. Aqui não havia falsificações. Estas árvores eram
definitivamente genuínas, dando o cheiro forte e perene que perfumava o ar.

6
Cada árvore tinha um tema e decorações diferentes para combinar.
Uma árvore era sua própria caixa de brinquedos, com bonecas de pano, trens
em miniatura e soldadinhos de chumbo pendurados em seus galhos, junto
com cordas de pipocas e cranberry. Outra tinha um tema de cowboy,
naturalmente, com botas em miniatura, laços e esporas de prata cobrindo de
cima a baixo. Uma delas era o seu próprio País das Maravilhas no inverno,
enfeitado com flocos de neve de cristal, bonecos de neve e enfeites prateados.
E assim por diante, cada árvore ostentava mais luzes e ornamentos do que a
anterior.
Eu gostava de enfeites natalinos, e enfeitar a árvore era uma das
minhas coisas favoritas no Natal, mas me deixava um pouco melancólica e eu
sempre sentia falta de Fletcher um pouco mais nesta época do ano. O velho
sempre abraçou o espírito natalício, decorando o Pork Pit com as luzes,
enfeites e visco, conduzindo brinquedos e comida, e comprando pequenos
presentes bobos para mim, Finn, e para as irmãs Deveraux. Este ano, eu me
senti ainda mais melancólica do que o normal, com a perda de Fletcher
agravada por todas essas perguntas não respondidas sobre minha mãe.
— Ei, pessoal — chamou Owen. — Venham ver isso.
Afastei-me das árvores de Natal e fui até Owen, que estava olhando
para uma grande vitrine de madeira. Bria aproximou-se também de nós.
Para minha surpresa, várias peças de joias antiquadas estavam dentro
da vitrine, empoleiradas em suportes de veludo preto. Um pingente quadrado,
uma gargantilha larga, vários anéis, brincos e pulseiras, até mesmo um par
de pentes antiquados. Todas as peças eram feitas de silverstone, e em todas
estavam faltando as coisas mais importantes – as pedras preciosas que
ficavam no centro.
— O Tesouro Escondido da Bullet Pointe, — Owen falou, lendo a placa
de informações dentro da vitrine. — Esta joia pertenceu a Sweet Sally Sue,
uma rica baronesa do carvão que construiu o Bullet Pointe hotel e o parque
temático durante a Grande Depressão.
Várias fotos também foram colocadas na vitrine, mostrando Sweet
Sally Sue, uma mulher alta e magra com olhos azuis e longos cabelos ruivos
enrolados em cachos grossos. Ela deve ter amado o parque temático e as joias
porque em cada foto ela estava vestida como uma saloon girl à moda antiga e
adornada com todas as suas joias.
Eu me inclinei para mais perto, olhando as fotos. Uma grande safira
quadrada ia no pingente vazio, enquanto a gargantilha tinha três fileiras de
diamantes. Mais safiras e diamantes adornavam o resto das joias, junto com
generosas porções de rubis, esmeraldas e outras pedras preciosas. A Sweet
Sally Sue não tinha usado bugigangas. Mesmo naquela época, as pedras
preciosas valeriam uma fortuna.
— A Sweet Sally Sue adorava quebra-cabeças — Owen continuou
lendo. — Para comemorar o que teria sido o aniversário de 105 anos de Sweet
Sally Sue, as pedras preciosas foram removidas de suas armações, colocadas
em uma sacola de veludo preto e escondidas no parque temático Bullet Pointe,
onde permanecem até hoje. Quem encontrar a bolsa de pedras preciosas
poderá ficar com elas, bem como suas armações originais. Eles também
receberão um passe vitalício gratuito para o parque temático e hotel.
Owen parou e piscou, como se a frase final no cartaz o surpreendesse.
Ele limpou a garganta e terminou de ler. — O concurso foi uma criação da
atual proprietária do resort, Deirdre Shaw.
Eu olhei para as armações vazias das joias. Elas me lembravam de um
anel de noivado que Fletcher havia dado a Deirdre – um que ela arrancara o
diamante e vendera às escondidas.
— Tesouro escondido? Para quem possa encontrá-lo no parque
temático? — Bria bufou. — Parece um golpe de publicidade. Uma maneira de
fazer com que mais pessoas venham ao parque e gastem seu dinheiro
procurando algo que nem está lá.
— Provavelmente, conhecendo Deirdre — falei. — Isso, ou ela vendeu
as pedras para pagar por seus próprios confortos e reformas do hotel e não
queria que ninguém percebesse o que ela tinha feito.
— Bem, não diga ao Finn, — advertiu Bria, — ou ele nos fará vasculhar
todos os bancos do parque e lixeiras por essas pedras.
— Na verdade, — Finn disse, chegando por trás dela, — isso está na
minha lista de tarefas.
Bria estremeceu e encarou-o. Ele arqueou as sobrancelhas, mas ela
encolheu os ombros, percebendo que era muito tarde para recuperar suas
palavras sarcásticas.
— De qualquer forma, — Finn disse, — eu fiz nosso check-in, e os
porteiros estão levando nossa bagagem até os nossos quartos. A gerente está
me esperando no escritório dela. Vamos ver o que ela tem a dizer em sua
defesa.
Ele estendeu o braço para Bria. — Vamos, minha senhora?
Ela assentiu e colocou o braço entre os dele, e os dois se dirigiram para
os elevadores no canto dos fundos do saguão.
Eu fiquei perto da vitrine, ainda olhando para as armações vazias das
joias. Elas eram apenas cascas de metal agora, despojadas das pedras que as
tinham tornado tão adoráveis, mas quanto mais eu olhava para elas, mais
pesada era a preocupação se abatia sobre meu estômago. Mesmo que Sweet
Sally Sue estivesse morta, e Deirdre também, eu quase podia sentir seus
fantasmas pairando no ar ao meu redor, sussurrando insultos que eu não
conseguia entender.
— Gin? — Owen perguntou. — Você está pronta para ir?
— Sim — eu disse, mais uma vez tentando banir a sensação incômoda
de que algo estava seriamente errado. — Tão pronta quanto eu estarei.
Capítulo 7
Finn segurou o elevador para Owen e eu, e nós quatro subimos até o
terceiro andar, onde ficava o escritório da gerente do resort.
O elevador se abriu em um longo corredor com salas e escritórios de
ambos os lados. Ao contrário do saguão luxuoso, este andar era muito mais
espartano e profissional, sem chifres, rodas de carroça ou outra decoração do
Velho Oeste em qualquer lugar à vista. As únicas decorações eram as fotos
que cobriam as paredes, mostrando vistas panorâmicas do hotel, do parque
temático e do lago que circundava os dois, juntamente com várias fotos
glamourosas autografadas por pessoas ricas e famosas que tinham ficado aqui
ao longo dos anos.
Eu não me importava com as celebridades, mas eu gostaria de ter
ficado e estudado as outras fotos, mas Finn estava com pressa, e ele caminhou
direto para o escritório no canto no final do corredor. Ele bateu na porta
fechada, depois girou a maçaneta e abriu uma fresta.
— Sra. Wyatt? — Ele falou. — Sou Finnegan Lane. Eu acredito que
você está me esperando.
— Claro, claro, — uma voz alegre e animada respondeu. — Podem
entrar.
Finn abriu completamente a porta, e nós entramos no escritório.
Bem, agora eu sabia por que o resto do corredor não tinha nenhuma
decoração do Velho Oeste. Porque estavam todas aqui.
Cada coisa no escritório tinha algum tipo de vibração do Velho Oeste,
de um par de candeeiros em forma de esporas de prata, a uma cadeira que
tinha rifles falsos que serviam de braços, a uma escultura de cowboy feita de
laços que tinham sido, bem, laçados juntos. Tachas prateadas enfeitavam
todos os sofás e cadeiras de couro verde escuro, enquanto pedaços de
turquesa brilhavam no topo de uma mesa de centro de vidro. Pinturas de gado
e cowboys cobriam as paredes, e o que parecia ser um genuíno tapete de pele
de urso estava esticado no chão em frente à lareira em um canto.
O urso não era o único animal morto aqui. Uma grande cabeça de
búfalo estava suspensa na parede acima da lareira, com várias cabeças
menores de veados, alces e cervos flanqueando-a. Uma raposa vermelha
empalhada estava na larga cornija sobre a lareira, enquanto um lince a
encarava do chão. Presa a cada animal havia uma pequena etiqueta branca
que mostrava um local, junto com uma data. Alguém gostava de caçar – e
mostrar seus troféus.
Uma escrivaninha ficava no canto oposto do escritório, em frente ao
santuário de animais mortos que se agrupava em volta da lareira. Um telefone,
um monitor, um laptop, canetas, blocos de anotações, papéis. A escrivaninha
era a única coisa normal à vista.
Porque a mulher sentada atrás dela era tudo menos normal.
Ela levantou-se e deu um passo à frente, sorrindo para nós. Em vez de
usar um terno típico, a mulher estava vestida como uma cowgirl7, desde sua
camisa xadrez rosa cravejada de botões de pérola até o jeans branco apertado
e as botas brancas com ponteiras de prata. Uma fivela de prata do tamanho
de um pires cravejada de uma série deslumbrante de strass rosa e branco
grudava-se em seu cinto de couro branco, junto com dois coldres brancos,
ambos contendo um revólver à moda antiga, com cabo de pérola. Seu longo
cabelo loiro estava preso em tranças que desciam pelo peito, e seus olhos eram
verdes claros e bonitos. A única coisa que estava faltando nela era um Stetson8
branco na cabeça. Oh espere. Lá estava ele, preso a um chifre de outra cabeça
de alce perto da escrivaninha.

Vaqueira
8 Stetson é uma marca de chapéu fabricada pela John B. Stetson Company. O Stetson se
tornou um dos maiores estilos de chapéu do mundo e foi popularizado por peças e filmes
Western, se tornando um dos maiores símbolos do Velho Oeste americano.
— Roxanne Wyatt, ao seu serviço, mas você pode me chamar de Roxy
— ela disse, sua voz gotejando com um charme carismático. — Todo mundo
aqui o faz.
Finn se adiantou e apertou a mão dela. — Roxy, prazer em conhecê-la.
Estes são meus amigos Bria Coolidge, Owen Grayson e Gin Blanco.
Roxy deu a volta na mesa e andou na nossa fila, balançando a cabeça
e apertando as nossas mãos. Eu fui a última, e ela sorriu e pegou minha mão.
Senti sua magia de Fogo no segundo em que seus dedos tocaram os
meus.
Sua mão estava agradavelmente quente, mas eu podia sentir a magia
elemental mais quente que jazia logo abaixo da superfície da sua pele. Roxy
começou a soltar minha mão, mas eu envolvi minha mão livre em torno das
nossas e dei a ela outro longo e vigoroso aperto, tentando determinar
exatamente quanto poder ela tinha.
Eu não senti uma queimadura explosiva e mortal, uma que pudesse
incinerá-lo no local, não como eu senti com Mab Monroe e Harley Grimes,
duas outras elementais do Fogo que eu tinha lutado. Oh, Roxy ainda poderia
queimar alguém e matar com sua magia, mas levaria um tempo. Seu poder de
Fogo era moderado, na melhor das hipóteses.
Roxy me deu um olhar estranho, e eu sorri para ela e finalmente soltei
a sua mão.
Ela me encarou por um segundo mais e então apontou para um grande
armário de madeira adornado com maçanetas de osso. — Posso oferecer uma
bebida para vocês? Devem estar com sede depois de ter vindo de carro de
Ashland. Água, chá, café, algo mais forte?
Todos nós pedimos água, e Roxy passou as garrafas antes de nos dizer
para nos sentirmos confortáveis nos sofás de couro.
Roxy se sentou na cadeira de novo, abriu a própria água e tomou um
longo gole antes de deixá-lo de lado e olhar para Finn. — Eu fiquei muito triste
em saber sobre a morte da sua mãe. Por favor, aceite minhas sinceras
condolências pela sua perda trágica.
Eu bufei. Roxy me deu um olhar de lado, mas Finn se inclinou para
frente no sofá, bloqueando sua visão de mim, e aumentou a potência do seu
sorriso. — Obrigado — disse ele. — Quão bem você conhecia Deirdre?
Roxy se recostou na cadeira e entrelaçou os dedos sobre sua fivela de
cinto brilhante. — Bem, a Sra. Shaw me contratou como nova gerente do
resort há cerca de dois meses. Eu só a vi pessoalmente algumas vezes, embora
eu tenha falado com ela frequentemente sobre assuntos do resort.
Finn assentiu. — Minha mãe me disse que possuía o hotel e o parque
temático, mas devo dizer que fiquei surpreso ao receber a escritura pelo
correio. E tão rapidamente.
— Sim, bem, a Sra. Shaw me ligou cerca de uma semana antes dela,
hum, falecer e me disse que ela estava mudando o seu testamento e deixando
tudo para você. — Roxy estendeu as mãos amplamente. — Eu quero honrar
seus desejos ao máximo, especialmente na morte.
— Eu aprecio isso — Finn murmurou.
Roxy gesticulou para várias pilhas de papéis em sua mesa. — Eu
preparei algumas informações sobre o hotel e o parque temático para você, se
quiser revisá-las agora. Ou talvez um tour rápido no hotel primeiro? Eu tenho
que me preparar para o show do meio-dia em breve, mas eu poderia te mostrar
por alguns minutos agora.
— Na verdade, eu gostaria de ver o quarto da minha mãe, — Finn disse
em uma voz suave. — Deirdre me disse que havia uma suíte reservada para o
seu uso pessoal. Eu gostaria de vê-la e ver os seus objetos pessoais. E, é claro,
eu vou arrumá-los e levá-los comigo quando partirmos.
Finn vendeu isso bem, e soou como um pedido perfeitamente inocente
de um filho enlutado, em vez do plano que havíamos elaborado para obter
acesso à suíte de Deirdre sem atrair atenção indesejada. Finn podia ser dono
do resort, mas este ainda era um território novo e inexplorado, e precisávamos
pisar levemente até sabermos exatamente com quem estávamos lidando.
Roxy piscou, como se não esperasse que Finn pedisse isso logo de cara,
e por uma fração de segundo, algo quase como satisfação brilhou em seu olhar
verde. Meus olhos se estreitaram. Por que ela estaria tão interessada em olhar
a suíte de Deirdre?
Mas a emoção desapareceu, e ela sorriu de novo, seus dentes brancos
brilhando quase tanto quanto o strass na fivela do seu cinto extravagante. —
Com certeza. Apenas deixe-me mandar uma mensagem para Ira. Ele tem as
chaves para todas as áreas privadas do hotel, incluindo a suíte de Deirdre. Ele
deve ter tempo para te mostrar onde fica antes do show do meio-dia.
Ela puxou o celular do bolso do jeans e mandou uma mensagem.
— Quem é Ira? — Bria perguntou.
Roxy hesitou e molhou os lábios, como se o que ela estava prestes a
dizer a deixasse desconfortável. — Ira Morris era o administrador do resort
antes de mim.
— Antes de você? — perguntou Owen. — E ele ainda trabalha aqui?
— Você pode dizer que Ira é bastante... apegado ao local. Ele está aqui
há anos e é uma personagem e tanto. Ora, eu imagino que um dia o velho
excêntrico cairá morto no meio do parque temático com as suas botas. — Ela
soltou uma risada, mas uma corrente subjacente áspera e zombeteira ondulou
através do som.
— Mas se esse cara, Ira, se preocupa tanto com o resort, então por que
Deirdre contratou você como a nova gerente? — Bria perguntou.
Roxy encolheu os ombros. — Com a economia do jeito que tem estado
nos últimos anos, o hotel e o parque temático não estão indo tão bem. As
pessoas estão cortando gastos, e as férias costumam ser as primeiras coisas
que as pessoas estão tentando economizar. Uma das razões pelas quais a Sra.
Shaw decidiu remodelar o hotel e transformá-lo em um resort de luxo foi atrair
pessoas com renda mais alta, pessoas que ainda podem se dar ao luxo de
gastar dinheiro em viagens, serviços de spa, comida gourmet e coisas do
gênero.
— Eu suponho que faz sentido — disse Finn.
Roxy assentiu. — Além disso, o pobre Ira é um pouco... da velha escola,
digamos, quando se trata de coisas como marketing e publicidade e conseguir
que as pessoas venham a Bullet Pointe. Ele acha que apenas colocar cartazes
nas estradas interestaduais é publicidade suficiente, mas isso não funciona
nos dias de hoje. — Ela balançou a cabeça. — Ira fez o melhor que pôde,
abençoe seu coração. Mas a Sra. Shaw pensou que era hora de algumas ideias
novas, nova liderança, então é por isso que ela me trouxe.
Abençoe seu coração? Bem, isso era clássico o insulto e depreciação do
Sul. A voz de Roxy praticamente vibrou com simpatia, mas eu consegui ouvir
o que ela não estava dizendo. Ira não estava ganhando dinheiro suficiente para
o gosto de Deirdre, então ela o rebaixou.
— De qualquer forma — continuou Roxy, — se vocês me seguirem, eu
vou levá-los ao saguão e mostrarei onde está o escritório de Ira.
Nós nos levantamos. Roxy pegou o seu Stetson branco e colocou-o em
sua cabeça, completando sua roupa de cowgirl. Ela nos deu outro sorriso
resplandecente e saiu para o corredor. Os outros a seguiram, mas eu fiquei
para trás, olhando ao redor do seu escritório novamente. Percebi uma coisa –
a janela ao lado da escrivaninha dava para a entrada principal do hotel.
Fui até lá, puxei a cortina branca e olhei para baixo. Com certeza, era
a mesma janela e cortina que eu tinha notado de baixo. Hmm. Talvez eu não
tenha imaginado meu observador depois de tudo. Fazia sentido que Roxy
estivesse aqui de olho em Finn, já que ele era seu novo chefe e ela
provavelmente queria manter seu emprego. Ainda assim, a explicação simples
não me fazia sentir melhor, e aquele medo inquieto mais uma vez borbulhava
no meu estômago.
— Gin! — Finn gritou do corredor. — Vamos!
Eu não podia fazer nada no momento para aliviar a minha
preocupação, então deixei a cortina cair de volta no lugar e saí do escritório.

***

Meus amigos e eu entramos no elevador com Roxy e descemos até o


saguão. Roxy tagarelava o tempo todo sobre o hotel, o parque temático e o lago
ao redor, jorrando tantos dados e fatos que meus olhos rapidamente ficaram
vidrados. Finn prestou muita atenção, absorvendo cada palavra que ela disse,
mas eu não estava tão encantada com a nossa anfitriã. Quando as portas dos
elevadores se abriram menos de um minuto depois, eu estava pensando
seriamente em arrancar aquele Stetson branco da cabeça dela e enfiar o
chapéu na sua boca só para fazê-la ficar quieta.
Owen notou minha expressão irritada, sorriu e me cutucou com o
cotovelo. Eu revirei meus olhos e encolhi os ombros para ele.
— É claro que todos já viram o saguão — disse Roxy, saindo do
elevador. — Temos aqui um bar totalmente abastecido, bem como muitos
lugares onde as pessoas podem sentar e apreciar a decoração, juntamente
com a vista.
Ela apontou para as janelas do chão ao teto que se alinhavam na
parede do saguão. Através do vidro, avistei vários caminhos pavimentados que
se curvavam do hotel descendo a colina até o parque temático abaixo. Luzes
de neon brilhavam em uma variedade de atrações, incluindo vários carrosséis,
um par de pequenas montanhas-russas, e o temido passeio de balanço que
me fez vomitar as minhas entranhas no passado, como Finn me lembrou tão
alegremente. Mas a peça central do parque era uma rua larga, com vitrines e
calçadas de madeira, feita para parecer como algo do Velho Oeste, embora eu
não conseguisse ver todos os detalhes dessa altura.
À distância, na direção do extremo o oeste distante do parque, a
superfície do lago Bullet Pointe brilhava e ondulava sob a brisa constante.
Uma grande doca de madeira se estendia como um dedo dentro do lago,
apontando para a densa floresta na margem oposta. Barcos elegantes e
modernos se alinhavam em ambos os lados do cais, além de algumas canoas
e caiaques. Todos os barcos balançavam para cima e para baixo nas ondas
agitadas, mas ninguém estava perto do lago, dado o frio que fazia.
— E, claro, o nosso spa de alto nível também está localizado neste
andar — Roxy falou novamente, apontando para um corredor que se
ramificava do lado esquerdo do saguão. Ela olhou para Bria e para mim. —
Senhoras, sintam-se à vontade para aproveitar os serviços e pacotes que vocês
quiserem. Eu fiz reservas para vocês, então tudo o que precisam fazer é ligar
e avisar ao pessoal do spa que estão indo.
— Oh, Gin definitivamente precisa de uma massagem de algas e
algumas fatias de pepino — disse Finn. — No mínimo. Talvez isso faça com
que ela relaxe e se divirta neste fim de semana.
Bria e Owen riram, enquanto Roxy estampava um sorriso neutro em
seu rosto, não entendendo a piada dele. Eu olhei para Finn, mas ele já tinha
colocando as mãos nos bolsos da calça e estava assoviando enquanto se
afastava.
Roxy contou mais alguns fatos sobre as comodidades do hotel, e
eventualmente nós fomos para o centro do saguão, perto da vitrine de madeira
que falava sobre a Sweet Sally Sue e suas joias lendárias.
— A caça ao tesouro parece ser uma ótima ferramenta promocional —
Finn disse, olhando para o casal que estava olhando a vitrine e usando seus
telefones para tirar fotos das armações de joias vazias.
Roxy assentiu. — Oh sim. A frequência no parque e no hotel subiu 10%
desde que a caça ao tesouro começou há dois meses. Foi uma ideia brilhante
da parte da Sra. Shaw.
— Alguém realmente não achou as gemas ainda? — Bria perguntou.
— Na verdade, sobre a caça ao tesouro... — O rosto de Roxy se enrugou,
e ela olhou ao redor, como se ela não quisesse ser ouvida, antes de se
concentrar em Finn novamente. — O concurso foi ideia da Sra. Shaw, e ela
cuidou de tudo, inclusive de esconder as joias. Por acaso ela não lhe disse
exatamente onde no parque ela poderia ter escondido, não é?
Finn franziu a testa. — Não. Por quê?
Roxy lançou outro olhar furtivo ao redor. — Bem, ninguém mais parece
saber onde elas estão. E acredite em mim, nós procuramos por elas. Todos
nós procuramos por elas. — Sua voz caiu para um murmúrio baixo.
Nós? Quem era nós? E o jeito que ela disse isso me fez pensar que Roxy
tinha muito mais do que apenas um interesse casual nas pedras escondidas.
Eu a estudei de novo, ainda mais atentamente do que tinha feito em
seu escritório, mas vi exatamente a mesma coisa – alguém que parecia abraçar
entusiasticamente o tema cowboy de Bullet Pointe e estava desesperadamente
tentando agradar seu novo chefe.
Ainda assim, algo sobre ela me pareceu inerentemente falso, como
todos aqueles brilhantes strass em seu cinto. Como se meus amigos e eu
fossemos apenas mais um grupo de turistas e ela estava usando seu traje de
cowgirl e personagem e fazendo um show só para nosso benefício. Eu tinha
sido enganada por Hugh Tucker, pensando que ele não era nada além do
humilde assistente pessoal de Deirdre. Eu não ia ser enganada de novo. Eu
definitivamente estaria de olho em Roxy Wyatt.
— Bem, sinto muito, mas Deirdre não me disse nada sobre a caça ao
tesouro ou onde ela poderia ter escondido as joias. — Finn piscou para Roxy.
— Se ela tivesse, eu já estaria no parque, conseguindo-as para mim.
Ele soltou uma gargalhada, que Roxy retornou com uma risadinha,
uma que estava um pouco alta demais e foi muito longa para ser genuína. Oh
sim. Ela definitivamente era alguém para vigiar.
Roxy olhou para o relógio. — Ah, droga. Eu adoraria mostrar a vocês
mais um pouco, mas eu realmente tenho que ir ao parque para o show do
meio-dia. Vocês deveriam descer e conferir. É o destaque do dia para os
hóspedes e todos os que trabalham no parque temático.
— Claro — disse Finn. — Eu estava planejando isso. Estaremos lá.
Parece divertido.
Ela deu outro sorriso para ele. — Ótimo. Há mais alguma coisa que eu
possa fazer por você enquanto isso?
— Eu ainda preciso da chave da suíte de Deirdre — ele lembrou a ela.
— Claro. Se vocês forem por aquele corredor até o final, verão o
escritório de Ira no canto de trás. — Roxy apontou para um corredor que
contornava o lado direito do saguão. — Vejo vocês no show. Tomem cuidado
agora, ouviram?
Ela inclinou o seu Stetson branco para nós, colocou os polegares nos
bolsos do jeans e então se virou e se afastou. Sério, ela saiu passeando,
andando lenta e facilmente, como se fosse uma verdadeira cowgirl em um
passeio casual.
— Aquela mulher está definitivamente tramando algo — eu disse.
Meus amigos me encararam.
— Por que você diz isso? — Owen perguntou.
— Porque ninguém é naturalmente tão alegre.
— Ela provavelmente só quer manter seu emprego — disse Bria. — Eu
seria legal com o novo chefe também, se eu estivesse em seus sapatos, er,
botas.
Eu olhei para Finn, esperando que ele concordasse com os outros, mas
seus lábios estavam enrugados em pensamento.
— Tenho que concordar com Gin nisso — disse ele. — Roxy foi legal,
mas ela não estava ansiosa, e ela não bajulou o suficiente se estava realmente
preocupada em manter o seu trabalho. Foxy Roxy não é tudo o que parece.
Bria cruzou os braços sobre o peito. — Foxy Roxy? Realmente?
— Bem, sim. Você não viu aquela roupa de cowgirl que ela usava? E
ela estava usando muito bem.
Bria olhou para ele, mas Finn continuou em frente do jeito que ele
sempre fazia.
— Sabe, enquanto estamos aqui, devemos comprar para você uma
roupa como essa — disse ele em um tom suave.
Ela sorriu docemente para ele. — Eu não sou uma cowgirl, eu sou a
xerife nesta cidade aqui. E por que não conseguimos uma roupa para você?
Ora, você poderia se vestir como uma saloon girl. Eu acho que seria o visual
perfeito para você.
Finn sorriu. — Só se você concordar em me bater com o longo braço
da lei, xerife.
— Você deseja.
— Pode apostar que sim. — Seu sorriso aumentou, e ele piscou os
olhos para ela. — E eu me vestiria completamente como uma saloon girl.
Qualquer coisa para você, xerife.
Bria bufou e acertou seu cotovelo na lateral dele, mas Finn colocou seu
braço ao redor do ombro dela, inclinou-se, e sussurrou algo em seu ouvido
que a fez corar. Owen empalideceu e balançou a cabeça, como se tentasse
banir o pensamento dos dois brincando de se fantasiar. Sim, eu também.
Finn e Bria se dirigiram até o corredor para encontrar Ira Morris, com
Owen seguindo-os. Eu comecei a ir nessa direção também, mas um grupo de
pessoas escolheu aquele momento exato para atravessar o saguão, separando-
me de meus amigos.
Hugh Tucker era um deles.
Capítulo 8
Eu olhei duas vezes.
Cabelo preto, olhos pretos, cavanhaque preto, alto, magro, terno caro.
Era o vampiro certo, parecendo exatamente o mesmo que da última vez que
eu o vi no estaleiro na noite em que ele me sequestrou. Tucker passou por
mim em um instante, no meio da multidão, mas eu tinha certeza de que era
ele.
Tanta certeza que eu espalmei uma faca, avancei... e corri direto para
um carrinho de bagagem.
Clang.
Eu bati com força nos trilhos de latão e caí, aterrissando na minha
bunda. Malas caíram do carrinho e voaram em várias direções, deslizando pelo
chão de pedra como discos grandes de shuffleboard9. Eu comecei a me mexer,
mas o carregador gigante que estava empurrando o carrinho tropeçou em uma
das malas largas e caiu em cima de mim, me levando de volta ao chão.
— Oof!

9É uma modalidade esportiva que coloca em disputa dois competidores que lançam discos,
com o auxílio de um taco, para dentro de uma zona triangular. Ganha quem alcançar a
posição de melhores pontuações.
Todo o ar saiu dos meus pulmões com o impacto duro e contundente,
e o carregador acidentalmente empurrou seu grande cotovelo direito em
minhas costelas, adicionando agravando as lesões. Mas eu ignorei as dores,
empurrei o carregador de cima de mim e fiquei de pé, com a faca ainda na
mão. Minha cabeça virou para a esquerda e para a direita, examinando o
saguão. Onde estava Tucker? Tudo o que eu precisava era de um local escuro
e silencioso e de cinco minutos com ele...
Eu tinha dado apenas três passos para frente quando percebi que
todos no saguão estavam olhando para mim. Os hóspedes relaxando junto à
lareira, as pessoas examinando as árvores de Natal, as pessoas que olhavam
para a vitrine da caça ao tesouro, todos os recepcionistas fantasiados, os
carregadores e os garçons. Toda a conversa havia cessado abruptamente, e o
único som era o canto natalino tocando ao fundo. Fa-la-la-la-la...
Eu parei e rapidamente deslizei minha faca na minha manga antes que
alguém percebesse. Então, eu me forcei a sorrir e encolher os ombros
timidamente, pedindo desculpas por interromper a diversão de todos.
Lentamente, todas as pessoas no saguão voltaram para as suas bebidas,
conversas e tarefas.
Eu me virei, me inclinei e ajudei o carregador caído a ficar de pé. — Me
desculpe por isso. Eu não vi você ali parado.
O mensageiro olhou para mim como se eu fosse louca, já que era
muito, muito difícil não ver um gigante de dois metros vestido como um
cowboy e empurrando um carrinho de bagagem. Ele se esquivou de mim e
começou a pegar as malas que eu tinha espalhado pelo saguão.
Owen correu para mim, junto com Finn e Bria.
— Gin! — disse Owen. — Você está bem?
— Estou bem — eu murmurei, esfregando minhas costelas
machucadas e olhando ao redor do saguão novamente.
Aquele grupo de homens de negócios e mulheres estava junto aos
elevadores, mas Tucker não estava com eles. Eu examinei as cadeiras de
balanço em frente a lareira, as que cercam as árvores de Natal e até as
banquetas do bar, mas eu não vi o vampiro em nenhum lugar. Era como se
Tucker tivesse passado por mim e depois desaparecido no ar. O bastardo era
rápido, mas será que ele era assim tão rápido?
— O que foi aquilo? — Finn perguntou.
— Eu pensei... — Eu comecei a dizer a ele que eu tinha visto Tucker,
mas mudei de ideia.
Ninguém tinha visto o vamp além de mim, e ele não estava no saguão
agora. Ah, meus amigos acreditariam em mim se eu contasse sobre Tucker,
mas agora eu estava começando a duvidar de mim mesma. Dada a minha
natureza reconhecidamente desconfiada e paranoica, sem mencionar minha
obsessão com o Círculo, não seria assim tão impossível pensar que eu tinha
acabado de ver alguém que se parecia com Tucker, ao invés do próprio
homem.
— Gin — Owen perguntou de novo, o rosto franzido de preocupação.
— Desculpe. Fui desajeitada, sem olhar para onde eu estava indo.
Eu soltei uma risada frágil, e os olhos de Finn se estreitaram. Ele
percebeu que eu não estava dizendo a verdade. O mesmo aconteceu com Owen
e Bria. Os três me encararam, esperando que eu confessasse, mas fiquei em
silêncio.
— Bem, vamos encontrar essa Ira — Finn finalmente disse.
— Claro — eu disse. — Lidere o caminho.
Ele me deu mais um olhar desconfiado, em seguida, colocou o braço
em volta dos ombros de Bria novamente e dirigiu em direção ao corredor.
Owen ergueu as sobrancelhas para mim, mas eu balancei a cabeça, dizendo-
lhe que não queria falar sobre isso.
Ele estendeu o braço. Coloquei o meu através do dele e, juntos, saímos
do saguão. Ainda assim, antes de entrarmos no corredor, eu não pude deixar
de olhar para trás por cima do meu ombro, imaginando onde estava Hugh
Tucker.
Ou se ele estive aqui para começar.

***
O corredor envolvia todo o perímetro do hotel, com lojas cheias de
produtos de grife e restaurantes gourmet que se ramificando dos dois lados
do amplo corredor de pedra. Embora não fosse ainda nem meio dia, dezenas
de pessoas entravam e saíam das lojas e restaurantes, então levamos quinze
minutos para percorrer a multidão e chegar ao escritório no canto mais
distante.
Ninguém estava naquela parte remota do hotel, nem mesmo um
zelador cuidando de suas tarefas diárias, e tudo estava quieto e calmo. Aqui
atrás, você nem ouvia as canções natalinas do sistema de som do saguão. Um
pedaço de papel com Ira Morris, gerente do resort Bullet Pointe rabiscado em
tinta preta grossa, estava colado à porta, junto com uma única fileira de luzes
brancas que continuavam a piscar como se fossem queimar a qualquer
momento. Um triste testemunho de quão longe Ira Morris tinha caído.
— Uau, Deirdre realmente baniu esse cara, não é? — Bria disse. — Eu
não acho que você poderia ficar mais longe do saguão e ainda estar no mesmo
prédio.
— Oh, eu tenho certeza de que se houvesse um porão, Deirdre o teria
chutado até lá embaixo — eu disse.
Finn nos deu um olhar de advertência e bateu na porta.
— Entre — gritou uma voz baixa e grave.
Finn abriu a porta e nós quatro entramos. Ao contrário do luxuoso
escritório de Roxy, aquele era um espaço pequeno e apertado, grande o
suficiente para a frágil mesa de metal e duas cadeiras incompatíveis na frente.
Armários de metal cinza cobriam duas das paredes, as gavetas de cada lado
estavam parcialmente abertas, já que não podiam conter todas as resmas de
papel que haviam sido colocadas aleatoriamente dentro delas. Ainda havia
mais folhas empilhadas em cima de todos os armários, curvando-se para cima
como escadarias em espiral. O ar cheirava a papel velho, seco e levemente
mofado, mas não era um aroma desagradável. Isso me lembrou do escritório
de Fletcher antes de eu começar a limpá-lo.
Onde a mobília e a bagunça de papel terminavam, as fotos começavam.
Fotos coloridas, retratos em preto e branco, até mesmo alguns de estanho
antigos, cobriam todo o espaço disponível nas paredes, as molduras se
amontoavam umas ao lado das outras como as peças de um quebra-cabeça.
Todas as fotos mostravam algum aspecto do Bullet Pointe. O sol se pondo
atrás do telhado do hotel. As luzes dos carrosséis e outros brinquedos do
parque brilhando à noite. Pessoas comendo bolos de funil e jogando jogos de
parque de diversões.
As fotos eram muito mais sinceras e interessantes do que as fotos de
glamour de celebridades que haviam sido penduradas nas paredes do lado de
fora do escritório da Roxy. Eu estava apostando que todas tinham sido tiradas
por Ira Morris, dadas as velhas câmeras, lentes e outros equipamentos de
fotografia que se empoleiravam aqui e ali, como pássaros de metal
empoleirados em uma árvore de papel.
— Só um segundo — disse um homem.
Ele parecia estar sentado atrás da escrivaninha, embora eu não
conseguisse vê-lo de fato, dados os montes de papéis ali, cada pilha imponente
balançando na brisa fraca que criamos apenas abrindo a porta e entrando no
escritório.
Owen notou as torres de papéis inclinando e gentilmente fechou a
porta atrás de nós, cortando a brisa ameaçadora.
Um par de mãos ásperas e desgastadas surgiu, pegando uma pilha de
papeis, depois outra, e a movendo para lados opostos da mesa, revelando o
homem no meio da bagunça. Não era de admirar que eu não tenha conseguido
vê-lo antes. Ele era um anão, pouco mais de um metro e meio, com um corpo
forte e amplo. Seus cabelos negros tinham sido cortados perto de seu crânio
e salpicados com uma generosa quantidade de prata, fazendo com que os fios
curtos e espetados parecessem agulhas saindo de seu couro cabeludo. Sua
pele de ébano era um pouco mais clara que seu cabelo, enquanto seus olhos
eram de um avelã escuro. Dadas as linhas profundas que sulcavam seus olhos
e boca, ele provavelmente tinha mais de cem anos, embora sempre fosse difícil
dizer a verdadeira idade de um anão.
Assim como Roxy, ele não se parecia com seu típico gerente de resort,
especialmente porque ele estava usando um suéter de Natal, verde brilhante
com uma gigante flor de Natal vermelha no centro. Enquanto eu observava,
pequenas luzes vermelhas piscavam uma por uma, tocando seu peito e
iluminando as pontas da flor de Natal antes de brilharem em uníssono. Eu
não achei que fosse possível, mas o suéter do anão era ainda mais
extravagante do que o de Jonah McAllister. Pelo menos a vestimenta do
advogado não tinha luzes piscando.
— Só um segundo — ele repetiu, sua voz mais aguda, o sotaque do
oeste mais suave, do que o arrastado sulista.
O anão arrastou mais algumas pilhas de um lado de sua mesa para o
outro, franzindo a testa em concentração, enquanto ele olhava para todas elas,
como se fossem da maior importância. Eu não vi como elas eram diferentes
de qualquer um dos outros papeis lotando o escritório, mas este não era o
meu espaço de trabalho para julgar. Finalmente, ele colocou as últimas folhas
de lado, adicionando-as à pilha oscilante e olhou para nós.
— O que vocês querem? — Ele rosnou.
Não era exatamente uma recepção calorosa, mas Finn não se
intimidou. Ele colocou um sorriso no rosto, deu um passo à frente e estendeu
a mão. — Eu sou Finnegan Lane, o novo proprietário do resort.
— Ira Morris — o outro homem estalou. — Então você é a desova da
Deirdre.
Finn estremeceu um pouco, mas ele manteve seu sorriso fixo em seu
rosto. — Sim.
— Hmm.
O som simples tinha um monte de julgamento nele. Tive a impressão
de que Ira não tinha uma boa opinião sobre a Deirdre.
Ira ignorou a mão estendida de Finn, cruzou os braços sobre o peito e
recostou-se na cadeira, que soltou um rangido sinistro, como se estivesse
prestes a desmoronar. — E quem são seus amigos?
Finn nos apresentou. Ira olhou para Owen e para mim, nos
dispensando abertamente, mas ele parou e fez um exame quando finalmente
olhou para Bria.
O anão a estudou por vários segundos. — Seu sobrenome é Coolidge?
— Sim — respondeu Bria com cautela. — Por quê?
Ira olhou para ela por mais alguns segundos, em seguida, seu olhar
percorreu o escritório, como se ele estivesse procurando por algo. Seu olhar
se moveu ao longo da parede à sua direita, embora eu não pudesse dizer qual
pilha de papéis ou foto ele poderia estar procurando.
Ele finalmente encolheu os ombros. — Nenhuma razão. — Ele se
inclinou para frente em sua cadeira, fazendo-a ranger novamente. — Eu vou
perguntar novamente. O que você quer?
Seu tom de voz foi tão brusco quanto antes. Finn franziu a testa e
lentamente baixou a mão, parecendo um pouco desanimado. Nenhum puxa-
saco aqui. Eu escondi um sorriso.
Finn limpou a garganta. — Roxy disse que você tinha a chave para a
suíte da minha mãe e poderia mostrar onde fica. Eu gostaria de ir até lá depois
do show do meio-dia e examinar as coisas dela, se eu puder.
Ira bufou. — Eu acho que você pode fazer o que quiser, já que é o seu
resort agora.
O anão se afastou de sua mesa, e sua cadeira bateu contra mais pilhas
de papel, sacudindo-as e as fotos na parede acima. Ira abriu uma gaveta no
meio da escrivaninha e colocou a mão dentro. Após quase um minuto, ele
tirou uma chave de ferro à moda antiga, que ele jogou em cima de sua
escrivaninha.
— Essa é a chave para a suíte chique da Deirdre. Último andar. Você
parece um cara inteligente o bastante. Tenho certeza de que você pode
encontrá-la sozinho.
Finn piscou. Ele esperava que o anão exalasse carisma, charme e
alegria de cowboy, assim como Roxy. Mas eu meio que gostei do mau humor
de Ira. Pelo menos ele foi honesto sobre odiar-nos. Depois de todas as
maquinações de Tucker e do Círculo, eu apreciava mais honestidade do que
nunca.
— Mas Roxy disse... — Finn começou.
Ira olhou para ele. — Eu não dou a mínima para o que Roxy disse. Eu
tenho um show para narrar. Não tenho tempo para levar Sua Alteza Real por
aí.
Finn abriu e fechou a boca, mas nenhuma palavra saiu.
Ira bufou de novo, depois se levantou e virou de lado, habilmente
manobrando através dos corredores estreitos criados por todas as torres de
papel que eram quase tão altas quanto ele. Finn, Bria, e Owen saíram do seu
caminho, mas eu mantive minha posição, forçando-o a parar e olhar para
mim.
Ele começou a passar direto por mim, mas eu cruzei meus braços sobre
o peito e ampliei minha postura. Ele percebeu que eu não iria me mover até
que eu desejasse, e parou e me encarou um pouco mais de perto, seus olhos
castanhos se estreitando em pensamentos, e fazendo com que mais linhas
dobrassem seu rosto áspero e envelhecido.
— Blanco, certo? — ele falou.
— Sim.
— Hmm.
Houve aquele som severo e crítico novamente. Normalmente, levava
pelo menos alguns minutos para eu irritar as pessoas. Por outro lado, eu
estava disposta a apostar que praticamente tudo irritava Ira Morris desde o
seu rebaixamento.
— Então? — ele retrucou. — Você vai se mover, ou vai ficar aí o dia
todo?
Eu olhei para ele por um momento, deixando-o saber que eu não estava
com medo dele, antes de finalmente me mover. O anão bufou, passou por
mim, abriu a porta e saiu correndo. Seus rápidos movimentos provocaram
uma violenta rajada de vento através do pequeno escritório, fazendo as folhas
de papel rodopiarem no ar como se fossem flocos de neve, antes de lentamente
se acomodarem novamente em cima de suas respectivas pilhas.
Eu espiei por fora da porta e observei o anão desaparecer no corredor
curvilíneo. Então, eu olhei por cima do meu ombro para Finn.
— Uau — eu disse devagar, — eu nunca vi esse tipo entusiasmado de
puxa-saquismo em toda a minha vida. Ele simplesmente amou você.
Bria e Owen riram baixinho.
— Cale-se, Gin — Finn rosnou, em seguida, pegou a chave da mesa e
saiu correndo do escritório assim como Ira Morris tinha feito.
Capítulo 9
Agora que tínhamos a chave para a suíte de Deirdre, eu queria ir até
lá imediatamente e começar a procurar nas coisas dela, mas Finn tinha outras
ideias. Ele insistiu para que nós passássemos pelo parque temático e
tivéssemos um bom lugar para o show do meio-dia. Assim, nós voltamos para
o saguão, e depois vagamos ao longo de um dos caminhos pavimentados que
se estendiam desde o hotel descendo a colina até o parque de temático no vale
abaixo.
Bullet Pointe ostentava todas suas atrações habituais. Carrosséis,
montanhas-russas e outros brinquedos. Carrinhos de comida servindo
cachorro quente, nachos e, meu favorito, bolos de funil. Lojas vendendo
camisetas, botas, copos comemorativos e outras mercadorias e lembranças,
todas gravadas com o tema do parque – um chapéu de cowboy com dois
revólveres à moda antiga cruzados sobre ele.
Tudo tinha algum tipo de tema Velho Oeste, e placas em forma de
cowboys sorridentes, cavalos empinados e cactos espinhosos adornavam
praticamente tudo, inclusive os postes de ferro à moda antiga que ladeavam
as passarelas.
Ao contrário do hotel, Deirdre não deve ter se incomodado em reformar
ou modernizar nada no parque, já que todas as barracas, brinquedos e placas
tinham a mesma aparência desgastada e antiquada que me lembrava daquela
viagem de longa data com Finn e Fletcher.
Mas a peça central do parque temático era a Main Street. Uma torre de
água de madeira de nove metros de altura, com as palavras Bullet Pointe Main
Street pintadas de vermelho desbotado e enferrujado, marcava a entrada.
Todas as calçadas do parque davam para a longa e larga rua de terra batida,
que se assemelhava à rua principal de uma velha cidade do Velho Oeste,
completa com calçadas de madeira e vitrines de lojas em ambos os lados. Cada
pedacinho das letras nas lojas era feito em uma fonte antiga, aumentando a
ilusão de que você havia voltado para o Velho Oeste.
As vielas corriam entre os blocos de lojas, levando a outras áreas com
mais carrinhos de comida e lojas de souvenirs, com mais calçadas que
levavam aos brinquedos e outras atrações do parque, formando um círculo
gigante. Na extremidade oposta, a Main Street abria-se em uma grande praça,
com vários conjuntos de arquibancadas de madeira cinzenta e de aspecto
fraco bloqueando a área.
As lojas e restaurantes da Main Street eram muito maiores e mais
bonitos do que os do resto do parque temático e, naturalmente, apresentavam
preços muito mais elevados. Todos eles seguiam com o tema Velho Oeste,
desde o Feeding Trough (um restaurante de churrasco) até o Gumdrop (uma
loja de doces), o Silver Spur (uma loja de roupas, chapéus e botas) até a Gold
Mine (um lugar onde você podia comprar ouro e pedras preciosas e, em
seguida, projetar suas próprias armações para eles, bem como comprar anéis,
colares e afins).
Mas a maior loja pertencia ao Good Tyme Saloon, um saloon à moda
antiga onde se podia comprar salsaparrilhas, juntamente com refrigerantes
mais comuns, cervejas e coquetéis para molhar o bico, de acordo com a placa
de latão na janela. O saloon também era um dos vários estabelecimentos que
davam shows de hora em hora. Os sons de plinka-plinka de um piano, que
necessitava desesperadamente de afinação, se deslocavam para o lado de fora,
e através da vitrine da loja eu podia ver várias mulheres vestidas como saloon
girls com suas saias coloridas e dançando pelo chão. Ainda mais pessoas
fantasiadas – de cowboys a apostadores e garimpeiros – passeavam pelas
calçadas, tirando seus chapéus para as pessoas, posando para fotos e
soltando frases típicas para acompanhar seus personagens.
— Traga-me alguns biscoitos para ir com todo este queijo — Bria
murmurou, observando um cowboy gigante passear em uma postura
deliberada de pernas arqueadas.
— Bem, eu acho que é divertido — disse Owen. — Brega, certamente,
mas divertido também.
Eu olhei para ele. — Eu não sabia que você era um fã de cowboys.
Ele sorriu. — Você está de brincadeira? Que criança não quer ser um
cowboy? Montar seu fiel cavalo, cantar canções ao redor da fogueira, dormir
do lado de fora sob as estrelas, a coisa toda. — Ele olhou para a multidão
subindo e descendo as calçadas. — Na verdade, meus pais trouxeram Eva e
eu aqui de férias uma vez. Ela era apenas um bebê, então ela não se lembra,
mas eu me lembro. Foi uma das melhores viagens que já fizemos. Minha mãe
até me comprou um verdadeiro Stetson. Eu o guardei até ela e meu pai
morrerem...
A voz de Owen sumiu e o sorriso escorregou de seu rosto. Devido às
dívidas de jogo de seu pai, seus pais haviam morrido em um incêndio causado
por Mab Monroe quando ele era adolescente, deixando ele e Eva desabrigados.
Eu estendi a mão e apertei a sua, e ele me deu um sorriso grato por
tirá-lo daquelas velhas memórias dolorosas.
— Divertido? Não é apenas divertido — disse Finn, seus olhos verdes
brilhando de excitação. — É fantástico! Estou tão feliz por ter vindo aqui neste
fim de semana. São as melhores férias de Natal de todos os tempos!
Como se todas as coisas de cowboy não fossem extravagantes o
suficiente, a Main Street também estava enfeitada para as festas de fim de
ano. Fios cintilantes de enfeites vermelhos, verdes e prateados envolviam
todos os postes de luz da rua, fazendo com que eles parecessem gigantescas
bengalas doces. Ainda mais enfeites adornavam os bancos de ferro que
revestiam as calçadas. A maioria das vitrines tinha sido decorada com pinhas,
viscos e flocos de neve gigantes que pulsavam com luz branca brilhante. Até
mesmo os cowboys e outros personagens fantasiados tinham pequenos
adereços para as festas de fim de ano, como bandanas vermelhas, com
padrões de Papai Noel, renas e bonecos de neve, amarrados ao pescoço. Era
uma mistura estranha de cowboy e Natal, mas eu achei estranhamente
encantadora.
— Vamos lá — disse Finn, enxotando-nos para a frente com as mãos.
— Eu quero arranjar um bom lugar para o show.
Nós entramos com o fluxo de pessoas indo em direção às
arquibancadas no final da Main Street. Aquecedores de ambientes foram
instalados ao longo das calçadas, com vários outros agrupados ao redor das
arquibancadas, embora eles fizessem pouco para diminuir o frio do inverno
rigoroso. Ainda assim, apesar do frio, havia uma casa cheia para o show. Eu
queria ir para a última fileira das arquibancadas, de modo que eu tivesse uma
visão panorâmica de tudo, mas Finn insistiu que nos sentássemos na fila da
frente e por isso ele tirou algumas pessoas do caminho para que isso
acontecesse. Então, foi aí que ficamos.
A multidão tagarelava e várias pessoas levantaram seus telefones,
tirando fotos de todos os cowboys e outros personagens fantasiados que
estavam cercando a rua para o próximo show. Peguei meu telefone e tirei
algumas fotos também. Não porque eu quisesse alguma lembrança, mas
apenas no caso de Hugh Tucker estar à espreita em algum lugar. Eu não tinha
visto o vampiro sorrateiro durante o nosso passeio pelo parque temático, mas
talvez eu tivesse sorte, o encontrasse em uma multidão, e me tranquilizasse
de que eu não estava louca e que minha paranoia desenfreada não estava
finalmente conseguindo o melhor de mim.
— Isso não é ótimo? — Finn perguntou, saltando para cima e para
baixo na arquibancada como uma criança cheia de açúcar.
— Sim — disse Bria. — Ótimo.
Ela suspirou e enfiou o queixo na gola do casaco azul marinho,
tentando ficar aquecida e obviamente desejando que o show já tivesse
acabado. Os lábios de Owen se contorceram, como se ele estivesse se
segurando uma risada contra a óbvia miséria de Bria. Ela deu-lhe um olhar
irritado, o que só fez seus lábios tremerem novamente.
Finn fez sinal para um cara que vendia petiscos e comprou um saco de
pipoca de caramelo para Bria e ele. Owen também comprou pipoca, mas eu
balancei a cabeça negando quando ele me ofereceu um pouco. Pipoca não era
minha coisa favorita. Além disso, eu ainda estava ocupada demais
examinando a multidão para pensar em comida.
Eu não localizei Tucker em lugar algum, e ninguém parecia estar
prestando atenção em mim e nos meus amigos. Então, eu sentei e tentei
relaxar, mesmo que eu não pudesse afastar a sensação de que o vampiro
estava em algum lugar, nos observando.
O guincho ensurdecedor de um sistema de som sendo ligado encheu o
ar, fazendo todo mundo estremecer, e Ira Morris entrou em cena,
posicionando-se num pequeno palanque ao lado das arquibancadas. O anão
ainda usava seu suéter de Natal berrante, que ele tinha coberto com um paletó
vermelho e suspensórios que se prendiam ao seu jeans preto. Botas de cowboy
pretas cobriam seus pés, enquanto um chapéu-coco preto com uma fita
vermelha em volta da aba se empoleirava em sua cabeça. Parecia que ele
pertencia a um quarteto de barbearia antiquado, mas a estranha roupa
combinava com ele.
Ira fez um grande show de passar os dedos pelos suspensórios
vermelhos, depois os soltou, de modo que voltaram ao lugar. Ele deu à
multidão um sorriso largo, parecendo muito mais alegre do que esteve em seu
escritório, e pegou um microfone de uma saloon girl ao seu lado. Um silêncio
caiu sobre a multidão, e Ira continuou sorrindo até que todos se acalmassem.
— Ora, olá, senhoras e senhores — o anão ronronou em sua voz baixa
e grave que estaria perfeitamente à vontade em cem filmes do Velho Oeste. —
Bem-vindos ao nosso cantinho do mundo, Bullet Pointe. Ou casa, como
gostamos de chamá-lo.
Ele soltou uma risada sincera. Bria olhou para mim e revirou os olhos,
como se dissesse: Realmente? Há mais disso? A teatralidade brega também
não era minha coisa favorita, mas Owen parecia estar gostando, e Finn estava
completamente arrebatado, seu olhar fixo em Ira, nem mesmo olhando para a
pipoca que ele estava colocando em sua boca. Se Finn estava focado no show,
então ele não estava pensando em Deirdre e todas as suas traições, então eu
supus que isso fosse algum progresso. Eu pegaria o que conseguisse, mesmo
que tivesse que sofrer com uma apresentação brega.
— Agora, como vocês são novos aqui, podem não estar cientes, mas
nós temos alguns fora-da-lei por aqui — continuou Ira. — Algumas das
pessoas mais malvadas e violentas que vocês jamais encontraram. A infame
gangue Dalton.
Assim que ele terminou de dizer a palavra gangue, gritos altos, berros
e gargalhadas soaram, e uma dúzia de homens a cavalo saiu de um dos becos,
cavalgando diretamente para o meio da Main Street, disparando suas armas
no ar. A multidão engasgou e se abaixou, mesmo sabendo que tudo era apenas
parte do show.
A gangue Dalton continuava circulando com seus cavalos, disparando
suas armas. Cada um deles estava vestido como um típico cowboy com botas,
calças de couro e chapéus, mas um cara era maior e mais largo do que todo o
resto, um gigante que tinha mais de dois metros de altura. Ele era um homem
bonito, com cabelos castanhos ondulados e uma pesada barba de cinco horas
já em seu queixo. Ele estava vestido todo de preto, desde as botas, jeans e
camisa até a bandana estampada em preto e branco em volta de seu pescoço
e o Stetson preto na cabeça. Ele também estava um pouco mais entusiasmado
em disparar sua arma para o ar do que os outros membros da gangue. Ah, o
vilão da peça.
Finalmente, os membros da gangue abaixaram suas armas e levaram
seus cavalos até um longo trilho de madeira do lado de fora da churrascaria
Feeding Trough. Eles desmontaram, amarraram os animais ao trilho, e
voltaram para o espaço aberto em frente às arquibancadas.
— Agora, há rumores de que Brody Dalton, o líder da gangue, tem a
intenção de assaltar o banco quando a próxima remessa de ouro chegar à
cidade — prosseguiu Ira.
O gigante musculoso de preto girou seu revólver prateado ao redor do
seu dedo, enquanto andava de um lado para o outro na frente das
arquibancadas.
— Estou cansado de viver no campo com nada além de bolachas duras
e rançosas para comer — disse Brody Dalton em um barítono profundo. — Eu
pretendo conseguir o que eu quero, e o que eu quero é ouro – e muito disto.
Ele não olhou para a multidão, apesar de todos saberem que ele estava
falando conosco.
Ele apontou seu revólver na direção da joalheria Gold Mine, que
aparentemente funcionava como o banco da cidade nesse cenário. Os outros
membros da gangue se reuniram, todos ansiosos para seguir sua liderança.
— Mas, Brody — um dos outros gigantes falou, — e a xerife Roxy?
Com a deixa, as portas duplas do saloon se abriram, e Roxy Wyatt saiu.
Ela ainda estava usando o mesmo traje de cowgirl de antes, com uma adição
notável – uma estrela de xerife prateada brilhante estava presa ao peito dela.
A xerife Roxy tirou o chapéu branco e acenou para frente e para trás na frente
do rosto, como se estivesse quente, apesar de estar no máximo três graus do
lado de fora. Mas eu supus que neste pequeno drama, sempre era um dia
quente e ensolarado no Velho Oeste.
— Eu não estou preocupado com a xerife Roxy — Brody zombou. —
Porque eu tenho cascavéis de estimação maiores do que ela. Não é verdade,
rapazes?
Os membros da gangue riram. A xerife Roxy, magicamente, pareceu
notar Brody e sua equipe, e seguiu em sua direção, suas mãos caindo para os
cabos de pérola dos dois revólveres amarrados à sua cintura.
Ira limpou a garganta, sua voz muito menos entusiasmada do que
antes. — A xerife Roxy tinha ouvido os rumores também, e ela decidiu dar a
Brody uma última advertência sobre o que aconteceria se ele tentasse roubar
o banco.
— Brody! — Roxy gritou. — Este é seu último aviso. Não vá causar
problemas agora. Ou eu vou ter que derrubá-lo mais rápido do que uma
salsaparrilha gelada em um dia quente de verão.
O gigante riu e cruzou os braços sobre o peito. — Você fala muito, mas
você não poderia acertar o lado de um celeiro com essas armas extravagantes
que você tem.
Roxy olhou por cima do ombro. Eu não tinha notado até agora, mas
alguns caras estavam ocupados arrumando garrafas de vidro em cima de um
dos telhados da loja. Assim que eles terminaram, os homens se afastaram,
deixando as garrafas para trás, a uns bons trinta metros de onde Roxy estava.
Roxy voltou-se para Brody e sorriu. — É aí que você está
completamente errado, Brody. Eu sou a melhor atiradora deste condado, e eu
vou provar para vocês, bem aqui, agora mesmo.
Mesmo que eu soubesse exatamente o que estava por vir, eu ainda
pulei com o resto da multidão, quando Roxy puxou os revólveres de seus
coldres, girou-os e começou a atirar.
Crack!
Crack! Crack!
Crack! Crack! Crack!
Uma por uma, as garrafas de vidro se quebraram. Não só isso, mas
elas realmente explodiram, com flashes de Fogo elemental disparando para o
céu. Mesmo ao longe, eu podia sentir as explosões quentes de magia
atravessando o ar. Roxy poderia ter apenas um poder moderado, mas ela
encontrou uma maneira de fazê-lo contar.
— Ei — eu sussurrei, — ela está usando balas verdadeiras. Revestidas
de magia elemental real.
Finn e Owen mandaram eu me calar, totalmente interessados no show.
Bria murmurou alguma coisa sobre estar com frio e se abaixou um pouco
mais. Mas eu olhei para Roxy, muito mais interessada nela do que antes.
Claro, ela provavelmente executou esse ato e fez essas mesmas manobras
dezenas de vezes, mas ainda assim foi impressionante. Ela era uma atiradora
de elite em todos os sentidos da palavra. E eu nunca vi ninguém usar balas
de silverstone revestidas com magia elemental antes. Não apenas truques,
mas também os mais mortais.
Roxy mostrou mais de suas habilidades de tiro ao alvo, atingindo mais
garrafas de vidro, sinais de estanho e até mesmo cortando vários laços em
dois. Ela não apenas mirou as coisas de frente e as atingiu como um atirador
normal. Ela colocou suas armas nas costas ou sobre os ombros ou até mesmo
nos joelhos, contorcendo-se em posições mais elaboradas e impossíveis, com
os alvos ficando cada vez menor. Ela até mesmo atirou em um charuto na
boca de um jogador usando um espelho.
A multidão ficou apropriadamente impressionada, e Brody e sua
gangue ficaram de queixo caído, até Roxy colocar as armas vazias e dizer a
eles para saírem da cidade – ou então.
Em retorno, Brody avançou e fez ruídos ameaçadores dizendo que Roxy
não tinha visto o último dele e blá, blá-blá, blá-blá. A cena terminou com
Brody e os outros membros da gangue tirando seus cavalos do trilho e
levando-os para longe sob o olhar vigilante da xerife Roxy.
Ira levou o microfone de volta aos lábios. — A xerife Roxy não era boba,
e ela sabia que Brody estaria de volta, assim que um novo carregamento em
ouro chegasse ao banco — ele fez uma pausa. — E agora, pessoal, vamos fazer
uma pequena pausa, então sintam-se à vontade para pegarem mais alguns
petiscos, enquanto organizamos o palco para o ato final do nosso pequeno
drama.
Ira desapareceu, e as pessoas vendendo petiscos reapareceram,
oferecendo outra rodada de pipoca, amendoim cozido, chocolate quente e
afins. Desta vez, Finn comprou uma maçã- do-amor, enquanto Bria cedeu e
pegou um algodão-doce de cereja. Owen bebeu uma salsaparrilha servida em
uma garrafa de vidro à moda antiga, mas eu levantei meu telefone e tirei mais
algumas fotos da multidão, ainda procurando por Hugh Tucker, embora eu
não o tivesse visto em nenhum lugar...
De repente, um grito alto e berros soaram, juntamente com o crack-
crack-crack de tiros. Poucos segundos depois, uma diligência irrompeu de um
dos becos e se dirigindo para o meio da Main Street, com os membros da
gangue Dalton em seu encalço a cavalo.
A gangue rapidamente alcançou a diligência e forçou-a a parar, bem
na frente das arquibancadas. Suspiros ecoaram da plateia, especialmente
quando os membros da gangue jogaram o condutor para fora da diligência.
Mas o sujeito fez uma bela queda no que parecia ser um pedaço suspeito de
terra macia e coberta de feno. Provavelmente o mesmo local em que ele havia
caído centenas de vezes antes.
A gangue abriu a porta da diligência, e dois dos membros entraram e
colocaram uma caixa forte no chão, que Brody abriu dramaticamente com o
cabo da arma. O gigante estendeu a mão e tirou um punhado de moedas falsas
de ouro, que ele deixou deslizar por entre os dedos e cair de volta para dentro
da caixa.
— Whoo-eee, rapazes! Estamos bem de vida! — Brody gritou para os
entusiásticos aplausos do grupo.
A multidão estava completamente envolvida na história, e
praticamente todo mundo – até mesmo Bria – estava no limite de seus
assentos, imaginando o que iria acontecer a seguir.
Enquanto Brody e sua gangue estavam tentando descobrir como
carregar o cofre de ouro em um de seus cavalos, a xerife Roxy saiu correndo
do saloon, junto com vários cowboys bonzinhos. Ela correu pela calçada,
saltou em cima de um daqueles longos trilhos de madeira, e voou pelo ar,
aterrissando perfeitamente em cima de seu cavalo à espera.
Choque sacudiu através de mim. Eu reconheci aquele estilo acrobático
suave e gracioso. Aqueles eram mais ou menos os mesmos movimentos que
Fedora tinha usado quando pulou a cerca do lado de fora da mansão de Jonah
McAllister há alguns dias. Eu pensei que Roxy poderia estar tramando alguma
coisa, mas eu nunca esperei que ela fosse uma assassina do Círculo.
— Filha da puta! — Eu murmurei.
Várias pessoas pediram para eu me calar, e Ira Morris me deu um
olhar particularmente irritado por ousar interromper o grand finale do show,
especialmente com uma linguagem tão ruim. Finn, Owen e Bria olharam para
mim, mas eu balancei minha cabeça, e todos se voltaram para o show. Eu
também, com meu olhar agora firmemente fixo na xerife Roxy.
Roxy galopou rua abaixo, pulou de seu cavalo, e sacou seus revólveres
confiáveis. — Renda-se, Brody! — Ela gritou, apontando suas armas para o
fora-da-lei gigante. — Não me faça atirar em você!
— Você nunca me levará vivo, xerife! — Brody gritou de volta, puxando
suas próprias armas.
Depois disso, foi como um filme épico de tiroteio do Velho Oeste,
quando todos sacaram suas armas e começaram a atirar nos outros. Todos
eles usavam balas falsas, desta vez, é claro. Personagens fantasiados saíram
do salão, da joalheria e de todas as outras lojas para participar do grande
confronto, com Brody Dalton e sua gangue enfrentando a xerife Roxy e os
bonzinhos de Bullet Pointe.
Vou dar aos artistas seus adereços. Eles se esmeraram para vender o
show, com expressões faciais exageradas, gritos de gelar o sangue, e vários
impressionantes mergulhos das varandas do segundo andar e até mesmo dos
telhados da loja em fardos de feno estrategicamente colocados e outras
superfícies macias abaixo. Um casal de anões até caiu em um par de
bebedouros convenientemente colocados e se levantaram cuspindo água. Eu
estremeci. Apesar de ter sido um ato, a água tinha que estar gelada hoje, não
importando quantos aquecedores estivessem dentro e ao redor da Main Street.
Os membros da gangue foram rapidamente dominados pelos
habitantes da cidade, que os atacavam com espingardas, rifles e forcados.
Brody foi o único fora-da-lei a ficar de pé.
— Desista, Brody! — Roxy falou, avançando lentamente para o gigante,
seus revólveres ainda apontavam para ele. — Você não tem para onde ir!
— Nunca! — Brody assobiou.
A cabeça do gigante chicoteava para a esquerda e para a direita,
procurando uma rota de fuga. Então, ele fez algo completamente inesperado –
ele correu diretamente para as arquibancadas. A multidão ofegou, mas Brody
ignorou sua surpresa e disparou mais alguns tiros falsos em Roxy, que
graciosamente rolou para trás de um cocho de água para se proteger.
— Você nunca me levará vivo, xerife! — repetiu Brody, ainda correndo
em direção à multidão.
Ele derrapou até parar bem na frente das arquibancadas, como se
tivesse acabado de perceber que as pessoas estavam sentadas ali. Seu olhar
castanho escuro trancado com o meu, e um sorriso se espalhou por seu rosto.
Antes que eu soubesse o que estava acontecendo, Brody Dalton
agarrou meu braço, levantou-me, e pressionou sua arma contra a minha
têmpora.
Capítulo 10
— Você está vindo comigo! — Brody gritou no meu ouvido.
— Eu não penso assim, docinho.
Eu nem sequer pensei sobre o que eu era fazendo. Eu apenas reagi da
maneira que normalmente fazia em qualquer momento quando alguém
colocava uma arma contra a minha cabeça e tentava me fazer refém.
Violentamente.
Eu bati meu cotovelo no estômago do gigante três vezes em rápida
sucessão. Brody soltou um oof! alto de dor e surpresa e perdeu o controle
sobre mim. Antes que ele pudesse se recuperar, eu virei, tirei a arma da mão
dele e a bati em seu rosto.
Crunch.
O gigante poderia estar atirando balas de festim durante a cena da
batalha, mas seu revólver era real e pesado o suficiente para quebrar o nariz
dele, especialmente com a força que eu coloquei nisso. Brody soltou um
grunhido e cambaleou para trás, segurando as mãos no nariz repentinamente
machucado e inchado. Sangue jorrou pelo rosto e encharcou a bandana
estampada de preto e branco amarrada em seu pescoço. O sangue do gigante
também se espalhou por todo o revólver, que eu ainda estava segurando no
alto, pronta para bater em seu rosto novamente.
Por um momento, houve um silêncio atordoante.
Brody olhou para mim com os olhos arregalados e chocados, assim
como o resto dos artistas e o público. Até os cavalos me olhavam de lado. Eu
tinha me esquecido de todo o resto quando estava derrubando Brody, mas
agora dezenas de pessoas e animais estavam me olhando, a mulher louca que
arruinou esse grande espetáculo do Velho Oeste sendo, bem, eu.
Ira correu e arrancou o revólver da minha mão antes que eu pudesse
causar mais danos com ele. — Vamos dar uma salva de palmas para esta
pequena dama que, hum, salvou o dia em Bullet Pointe!
Aplausos polidos e dispersos explodiram, mas todos na plateia
continuaram me olhando de forma cautelosa, e o elenco parecia
particularmente azedo. Brody olhou para mim com olhos cheios de ódio,
mesmo quando ele arrancou sua bandana para limpar o sangue do seu rosto
e do seu nariz ainda inchado.
— Por que você não dá um bom aceno para a multidão, pequena dama
— disse Ira em voz alta e aguda, batendo o cotovelo na minha lateral da mesma
maneira que eu fiz com Brody.
Apesar dos seus mais de cem anos, o anão ainda era forte, e o golpe
cavou em minhas costelas. Eu comecei a retaliar, mas Ira me deu um forte
olhar de aviso. Então, eu cerrei meus dentes, levantei minha mão e dei um
aceno curto e irregular. No entanto, não soaram mais aplausos, e voltei
depressa para as arquibancadas, e sentei-me ao lado de Owen, curvando os
ombros e tentando me tornar mais pequena e invisível possível.
Owen olhou para mim, um sorriso se espalhando por seu rosto. — Sabe
— ele disse, — acho que pode haver um novo xerife nesta cidade.
— Acho que você está absolutamente certo — Bria entrou na conversa,
apreciando a minha miséria tanto quanto ele.
— Calem-se, vocês dois, — eu reclamei, cruzando os braços sobre o
peito.
Finn se inclinou para frente, olhando para mim. — Você só tinha que
arruinar o show, não é mesmo, Gin?
— Eu não fiz isso de propósito — eu reclamei novamente. — Ele tinha
uma arma.
— Que estava carregada com balas de festim. — Finn bufou. — Ele
tinha um brinquedo.
Ainda assim, ele sorriu e jogou seus últimos pedaços de pipoca em
mim, deixando-me saber que tudo estava perdoado. Bem, pelo menos meus
amigos acharam que a minha vergonha era hilariante, porque os artistas do
Bullet Pointe certamente não o faziam. Todos me deram outra rodada de
olhares irritados antes de percorrerem a rua e voltarem para dentro das lojas
para retomarem suas posições anteriores. Naturalmente, Brody era o mais
raivoso de todos, dando-me um olhar de caia-morta-vadia antes de sair em
disparada em direção a um dos becos.
Ira me encarou, com os braços cruzados sobre o peito, a boca franzida
em pensamentos. Então ele balançou a cabeça, como se estivesse me
dispensando como apenas uma mulher louca, e começou a mexer com o
sistema de som perto do palanque, afastando seu microfone e desligando tudo
até o próximo show.
Xerife Roxy era a única que não estava chateada com as minhas
palhaçadas. Mesmo que eu tenha arruinado o seu grande e triunfante
momento para interpretar o papel heroína, ela parecia genuinamente divertida
com a coisa toda, e até chegou ao ponto de sorrir e me dar um aceno com seu
Stetson branco. O movimento foi assustadoramente parecido com o jeito que
ela me saudou com a arma na mansão de McAllister, convencendo-me ainda
mais de que ela era a aspirante a assassina do advogado.
Mas em vez de atacá-la, dei-lhe um sorriso tímido e dei de ombros
fingindo que ainda não tinha a menor ideia de sua verdadeira identidade – e
como ela era perigosa.
Roxy assentiu para mim, depois se virou e caminhou pela rua, indo
atrás de Brody. Eu queria saber o que os dois poderiam dizer sobre mim, então
decidi ser uma mosca na parede.
— Sabe — eu disse, — eu realmente deveria pedir desculpas a Brody
por exagerar assim.
Finn assentiu. — Isso seria um gesto legal. — Ele balançou as
sobrancelhas para mim. — E você deveria pedir a Brody seu autógrafo. Você
sabe, acalmar seu ego ferido e seu nariz quebrado um pouco.
Ele riu, e Bria e Owen riram junto com ele.
Revirei os olhos. — Tudo bem, tudo bem. Eu vou fazer as pazes com o
gigante. Vocês vão conferir as lojas na Main Street, e eu vou encontrar vocês
em alguns minutos. Ok?
Todos nós nos levantamos, e Finn, Bria e Owen caíram no fluxo de
pessoas deixando as arquibancadas e vagando de volta em direção as vitrines
das lojas. Comecei a ir em direção ao beco onde Brody e Roxy haviam
desaparecido, mas Ira contornou a plataforma e bloqueou o meu caminho.
O anão cruzou os braços sobre o peito e abriu bem as pernas, como se
estivesse se preparando para um confronto. — Quem é você? — Ele
demandou. — E o que você e seus amigos estão realmente fazendo aqui?
— Eu te disse antes. Meu nome é Gin Blanco.
Eu esperei, imaginando se Ira poderia estar na folha de pagamento do
Círculo, assim como Roxy, mas ele não demonstrou reconhecer o meu nome.
Ele era um bom ator ou nunca tinha ouvido falar de mim antes.
— E Finn disse a você por que estamos aqui — eu continuei. — Ele é
o filho de Deirdre, e é o dono do resort agora.
Ira bufou. — O nome desse vigarista da cidade pode estar na escritura,
mas Bullet Pointe pertence a mim. — ele apontou o dedo para o seu peito,
exatamente onde seu coração estava. — A doce Sally Sue me acolheu e me
deu um emprego quando eu era apenas um adolescente, e estou aqui desde
então. Eu sou aquele que manteve este lugar funcionando por todos esses
anos, apesar dos melhores esforços de Deirdre Shaw em contrário.
Meus olhos se estreitaram. — O que você quer dizer? O que você sabe
sobre Deirdre?
Ele bufou novamente. — Que ela era uma pirralha mimada e egoísta
que não dava a mínima para nada além de si mesma. Ela certamente não se
importava com o parque temático e com as pessoas que o adoram, que
dependem disso para colocar comida em suas mesas e roupas em seus filhos.
Tudo o que ela fez foi viver a boa vida em sua suíte chique e espremer o
máximo de dinheiro possível do hotel e do parque. E então, quando ela decidiu
que eu não estava ganhando dinheiro suficiente, ela me substituiu por essa,
essa imitação barata.
Bem, eu não podia argumentar contra sua avaliação sobre Roxy. Ela
era uma farsa, até aqueles strass brilhantes e coloridos na fivela do seu cinto
enorme.
— E agora você e seus amigos vêm aqui — Ira continuou seu discurso,
— e a primeira coisa que você faz é arruinar o show do meio-dia. Arruinou-o
completamente. Eu vi seu rosto durante o show. Você pensou que era bobo,
até idiota. Mas os artistas treinam muito para isso, e gostam de mostrar suas
habilidades, de conseguir aplausos e de posar para fotos. Sem mencionar o
quanto o público gosta, especialmente as crianças. Mas nada disso aconteceu
hoje, graças a você, Srta. Gin Blanco.
Eu nunca pensei sobre o show dessa maneira, o quanto os artistas
trabalharam duro para fazê-lo todos os dias, e quanto prazer eles e o público
tinham com isso. Eu me mexi, a culpa pesando no meu estômago. — Eu
realmente sinto muito sobre isso. Eu não queria estragar o show.
Ira bateu as mãos nos quadris. — Sente muito? Você sente muito? Não,
eu sinto muito. Lamento por ter esperanças de que seu amigo Sr. Lane poderia
realmente ser diferente de sua mãe. Que ele poderia realmente dar a mínima
para esse lugar e fazer o que é melhor para ele e para todas as pessoas que
trabalham aqui.
Eu abri minha boca para dizer que Finn era diferente de Deirdre, mas
Ira ergueu sua mão, me cortando.
— Esqueça isso, — ele rosnou. — Tenho trabalho a fazer. Eu não tenho
tempo para pessoas como você, você... ameaça.
Ira me lançou outro olhar zangado, depois se virou e foi embora,
desaparecendo na multidão.
Eu fiquei ao lado das arquibancadas vazias, digerindo suas palavras,
o que ironicamente foi semelhante ao que eu dissera a Jonah McAllister
alguns dias atrás. E assim como as minhas tinham sido naquela época, as
palavras de Ira eram todas demasiado verdadeiras agora.
Eu não me importava com Bullet Pointe e o que aconteceria com ele, e
Finn também não. Nós viemos aqui para obter respostas sobre Deirdre e o
Círculo. Nada mais nada menos. Isto era apenas uma diversão para nós,
apenas umas férias, apenas alguns de dias de descanso das nossas próprias
vidas, problemas e preocupações em Ashland.
Mas para Ira Morris, este resort com todos os seus personagens
fantasiados, decorações bregas e shows era a sua casa, e ele estava
determinado a lutar por isso. Mesmo que ele ainda estivesse secretamente
trabalhando para Tucker e o Círculo, eu admirava a convicção do anão. Foi
da mesma maneira que eu me senti sobre o Pork Pit e toda Ashland. Quando
o fim de semana acabasse, e eu e meus amigos tivéssemos nossas respostas,
eu conversaria com Finn sobre seus planos para o Bullet Pointe, para ter
certeza de que o resort continuasse.
Mas por agora, Roxy estava aqui, e ela era a única pista que eu tinha
sobre Hugh Tucker e o Círculo. Por isso, eu endireitei meus ombros, deixei as
arquibancadas para trás e parti pela Main Street, mais do que pronta para
encontrar algumas respostas sobre o que realmente estava acontecendo por
aqui.

***

Eu fui para o beco em que Brody e Roxy tinham entrado, que era um
dos vários que corriam entre os prédios de lojas que compunham os dois lados
da Main Street. Alguns dos artistas estavam saindo do beco e voltando para a
rua, e todos me deram o olhar irritado quando passaram por mim. Isso me fez
sentir como se eu ainda estivesse em Ashland, ainda no Pork Pit, sendo
encarada pelos chefes do submundo enquanto eu servia churrasco. Sempre
popular, sim, essa era eu. Fazendo inimigos onde quer que eu fosse.
Eu abaixei a cabeça e segui em frente. Pouco antes de chegar ao fim
do beco, olhei para trás, mas ninguém mais estava no corredor, então me
esgueirei e olhei pela esquina, olhando para o espaço além.
Uma grande praça havia sido convertida em uma área de descanso
para os artistas dos shows. Uma série de pavilhões de madeira espalhados ao
ar livre espalhados pela praça, cada um com uma estação diferente.
Prateleiras com roupas de cowboys, saloon girls, jogadores e outros figurinos
estavam alinhados em um pavilhão, junto com várias mesas com espelhos
iluminadas para que todos pudessem colocar suas marcas de beleza,
cicatrizes e outras maquiagens para entrarem plenamente no personagem.
Armários de metal para as pessoas guardarem seus pertences pessoais e
roupas ocupavam a maior parte de outro pavilhão. Havia ainda mais
suprimentos nas outras áreas, desde botas e saltos altos até caixas-fortes
cheias de armas e munição falsas, picaretas, serras e outras ferramentas, até
laços grossos que estavam enrolados como cascavéis em barris de plástico.
A diligência que foi usada no show do meio-dia também estava
estacionada ali, cheia de pilhas de bagagens que haviam sido amarradas até
o topo. Um caminho de terra levava para a direita e para um celeiro vermelho
enferrujado onde os cavalos eram mantidos, e o ar cheirava a esterco, poeira
e feno. Uma cerca de três metros de altura, coberta com arame farpado cercava
a parte de trás da praça, e, através das árvores, eu podia ver a superfície azul
escura do lago cintilando à distância.
Desde que o show acabou, todos os artistas estavam de volta às suas
estações habituais na Main Street, e a praça estava vazia, exceto por Brody,
que estava sentado em frente a um dos espelhos da penteadeira, olhando para
o nariz quebrado. Roxy se inclinava contra o lado do espelho, os braços
cruzados sobre o peito. Seus lábios se curvaram em um sorriso, enquanto
observava o gigante tentar empurrar seu nariz de volta para onde deveria
estar. Tirei meu celular do bolso da minha calça jeans, coloquei-o no modo de
vídeo, e apontei para eles.
— Aquela vadia, — Brody rosnou. — Eu não posso acreditar que ela
quebrou o meu nariz.
— Bem, essa é Gin Blanco para você — disse Roxy. — Pelo que Tucker
me disse, ela apenas marreta o seu caminho pela vida. Pior do que um touro
na proverbial loja de porcelana. Neste caso, você acabou por ser a porcelana.
Roxy riu da sua própria piada de mau gosto. Brody deu a ela um olhar
azedo, que ela ignorou.
Ele se inclinou para frente e sorriu para si mesmo no espelho. — Bem,
pelo menos ela não quebrou nenhum dos meus dentes. Eu acabei de ter esses
bebês clareados.
Então Roxy estava trabalhando para Tucker, assim como eu pensei, e
aparentemente Brody também estava. Fiquei feliz por ter arrebentado o nariz
do gigante. Meu único arrependimento foi não ter batido nele com mais força
e tê-lo feito comer seus preciosos dentes como se fossem balas de hortelã.
Eu pensei em pegar uma faca e confrontar os dois, mas estávamos a
apenas algumas dezenas de metros da rua principal. Seus gritos certamente
atrairiam atenção indesejada. Além disso, eu queria obter o máximo de
informação que pudesse primeiro. Porque eu ainda não sabia qual era o
sentido disso tudo.
Era óbvio agora que Tucker tinha planejado que Finn recebesse a
escritura de Bullet Pointe, mas por que o vampiro nos atraiu até o resort? Será
que ele planejou conseguir de alguma forma que Finn transferisse a
propriedade para ele? Ou ele queria outra coisa de nós? Uma vez que eu
soubesse a resposta para isso, eu poderia planejar meu próximo passo e matar
Roxy e Brody para a alegria do meu coração. Então, eu fiquei quieta e esperei
nas sombras no canto do beco, gravando-os com o meu telefone.
— Por quanto tempo nós temos que bancar os bonzinhos com essas
pessoas? — Brody rosnou.
— Até que Tucker diga o contrário — disse Roxy. — Você sabe disso.
O gigante jogou sua bandana arruinada e ensanguentada na
penteadeira. — Tudo o que sei é que estamos presos nos últimos dois meses
neste parque temático idiota, vestidos como cowboys estúpidos e fazendo
shows estúpidos. E o que temos ganhado com isso? Nada.
Bem, pelo menos eu não era a única que estava frustrada pela falta de
progresso.
— Ah, vamos lá — disse Roxy. — Ficar por aqui tem sido divertido.
— Você está apenas dizendo isso por causa do seu fetiche de cowboy.
— Brody balançou a cabeça. — Você realmente gosta de todas essas coisas
bregas do Velho Oeste. A fantasia de cowgirl, a atitude de foda-se, o papel de
xerife, toda a performance. Você ainda teve todas as suas assustadoras
cabeças de animais despachados de Blue Marsh para que você pudesse
decorar seu escritório com elas.
Roxy encolheu os ombros. — Eu gosto das lembranças de minhas
caçadas. Eu tenho um cara trabalhando naquele urso negro que eu matei no
final de semana na Cypress Mountain. Ele ficará no canto, bem ao lado do
meu lince.
Então ela era uma caçadora, assim como eu pensei quando eu vi todos
aqueles pobres animais empalhados em seu escritório mais cedo. Mais que
isso, ela gostava de manter troféus de sua destreza mortal.
Brody bufou. — Não, você só gosta de matar coisas. E agora você acha
que Gin Blanco será o seu grande prêmio.
Roxy sorriu. — Absolutamente. Essa cadela já está morta. Ela só não
sabe ainda. E eu vou ser a pessoa que finalmente a matará de vez. Eu teria
feito isso do lado de fora da mansão de McAllister, mas Tucker a queria aqui.
Meus olhos se estreitaram. Minha cabeça recheada e montada em uma
parede? Isso nunca irá acontecer, docinho.
— Sim, McAllister, o cara que você não conseguiu matar — Brody
cortou. — Eu não posso acreditar que ele te enganou com um colete de
silverstone.
— Quem achou que ele seria tão inteligente? — Roxy murmurou, seu
temperamento alegre escorregando um pouco. — Além disso, Tucker só queria
que ele morresse para provar um ponto para Blanco. McAllister não sabe de
nada importante. Ainda assim, vou voltar e acabar com ele depois que
terminarmos com Blanco e seus amigos. Apenas por não ter morrido quando
eu quis que ele morresse.
Brody cruzou os braços sobre o peito. — E, claro, conseguir exibir seus
pequenos truques com seus revólveres é apenas a cereja no topo do bolo —
ele grunhiu, continuando seu discurso. — Esse trabalho todo tem sido como
um sonho se tornando realidade para você.
— Bem, certamente foi melhor do que ficar naquela cobertura em
Bigtime, esperando para matar aquele cara com um rifle sniper. — Roxy
bufou. — Não há diversão nisso. Não há emoção da perseguição, não ofuscar
seu oponente, não caçá-los e ver o medo em seus olhos antes de puxar o
gatilho.
Parecia que os dois eram algum tipo de esquadrão de ataque de Tucker,
viajando pelo país e fazendo qualquer trabalho sujo que ele pagasse para eles.
Eu me perguntava quantas pessoas trabalhavam para Tucker. Talvez ele
estivesse mais alto no Círculo do que eu percebi. Talvez ele fosse realmente
um dos líderes, em vez de ser apenas o mentor de Deirdre e um garoto de
recados como eu pensava.
— Além disso — Roxy disse, — trabalhar no resort era a única maneira
de entrarmos e procurarmos as joias sem alertar a todos sobre o que estamos
realmente fazendo aqui.
Demorou um momento para as palavras dela se infiltrarem, mas, uma
vez que o fizeram, a compreensão passou por mim como um raio.
As joias. É claro.
Então, Deirdre havia roubado as pedras preciosas de Sweet Sally Sue,
mas aparentemente não as trocou por dinheiro, ou as usou para pagar pelas
reformas do hotel. Ela deve tê-las escondido aqui no Bullet Pointe como seu
pé-de-meia, no caso de as coisas correrem mal com Finn em Ashland. Só que
Finn tinha matado Deirdre em vez disso, e ela nunca teve a chance de voltar
para o resort e recuperar os diamantes, safiras e rubis.
— Tucker sabe que Deirdre escondeu essas pedras em algum lugar por
aqui — disse Roxy. — E ele deixou bem claro que não vamos sair até encontrá-
las.
— E eu digo que elas não estão aqui — Brody rosnou. — Procuramos
em todos os lugares por essas coisas. Eu não vejo por que Tucker as quer
tanto. Ele tem muito dinheiro.
Roxy encolheu os ombros. — Claro, Tucker tem muito, mas Deirdre
Shaw devia milhões a ele e seus amigos, e ele planeja conseguir recuperar pelo
menos parte desse dinheiro por qualquer meio necessário. É o princípio das
coisas. Além disso, os amigos de Tucker não são o tipo de pessoa que você
quer decepcionar. Ele precisa suavizar as coisas com eles, mesmo que seja
apenas diminuindo um pouco a enorme dívida de Deirdre.
O gigante enfiou o lábio inferior em um petulante beicinho. — Bem, eu
ainda não vejo porque nós simplesmente não podemos matar Blanco, Lane, e
os outros dois e acabar já com esse trabalho.
— Porque Tucker acha que Blanco pode ser capaz de encontrar as
pedras com sua magia de Pedra, — Roxy falou com uma voz paciente, como
se estivesse explicando algo para uma criança de três anos de idade. — Ou
que Deirdre contou a Finnegan Lane onde ela as escondeu.
— Mas você perguntou a Lane se ele sabia sobre as joias, e ele disse
que não.
Roxy encolheu os ombros novamente. — Talvez ele saiba de algo, talvez
ele não saiba. Talvez Deirdre tenha lhe dado uma pista que ele nem sequer
percebe que é uma pista. De qualquer maneira, eu vou tirar isso dele. — Ela
fez uma pausa. — Ou Tucker vai.
Ambos empalideceram um pouco com isso. Aparentemente, eles
estavam bem familiarizados com a forma como Hugh Tucker tirava respostas
das pessoas. A imagem de Deirdre algemada a uma cadeira, com cortes,
hematomas, queimaduras e profundas marcas de mordida em todo o corpo
passou pela minha mente. Deirdre tinha trabalhado para o vampiro, e ele não
teve nenhum escrúpulo em fazê-la sofrer, só porque ela o desapontou. Eu
poderia imaginar o quanto mais entusiasmado ele estaria em me torturar,
Finn, Bria e Owen para conseguir o que ele queria.
— E Blanco? — Brody disse, ficando de pé. — O que você quer fazer
com ela?
— Bem, você deveria agarrá-la para que pudéssemos tirá-la do
caminho antes de irmos atrás de Lane. — Roxy bateu em seu próprio nariz
perfeito e reto. — Não deixe que ela esmague seu rosto como se fosse uma
piñata.
O gigante rosnou, mas Roxy acenou com a mão, descartando sua raiva.
— Nós cuidaremos de Blanco mais tarde. E se ela não puder encontrar as
pedras preciosas, ou se Lane não souber nada sobre elas, e as pedras
realmente estiverem perdidas para sempre, bem, pelo menos teremos um
pouco de diversão com eles antes de partirmos.
Ela sorriu, tirou um revólver do coldre do cinto e começou a girá-lo ao
redor, fazendo o cano prateado brilhar ao sol da tarde. Fúria fria surgiu
através de mim pela maneira tão casual com que ela falou sobre torturar e
assassinar a mim e aos meus amigos – e como ela iria gostar disso.
Essa vadia era a única que já estava morta. Ela só não sabia ainda. E
a Aranha seria a única a acabar com ela para sempre.
Capítulo 11
Eu tinha ouvido o suficiente, então desliguei meu telefone e coloquei
de volta no bolso do meu jeans. Olhei por cima do ombro, mas o beco ainda
estava deserto, embora as pessoas se movessem para frente e para trás na
Main Street, indo de um bloco de lojas para o seguinte. Uma vez que eu estava
satisfeita que ninguém estava prestando atenção em mim, eu espalmei uma
faca e olhei para Roxy e Brody novamente, traçando a melhor maneira que eu
poderia me aproximar para matar os dois em silêncio.
Meu olhar se moveu de um lado para o outro na área de descanso. Se
eu pudesse chegar àquele barril cheio de laços sem ser vista, eu poderia me
agachar atrás dele, então correr para aquele monte de trajes de saloon girl.
Uma vez que eu estivesse em posição, eu poderia sair de trás das roupas e
atacar Roxy e Brody com um spray de adagas de Gelo. Se eu usasse uma
grande quantidade de magia, provavelmente poderia matá-los antes que
percebessem o que estava acontecendo. Mesmo se eles sobrevivessem ao meu
ataque inicial, eu sempre poderia usar as minhas facas. Eles poderiam soltar
alguns gritos, mas eu estava disposta a arriscar, agora que eu sabia da tortura
que eles tinham em mente para mim e meus amigos.
Eu apertei minha faca, sentindo a runa da Aranha estampada no
punho pressionando contra a cicatriz maior correspondente na palma da
minha mão. A sensação me estabilizou, do jeito que sempre fazia. Eu respirei
fundo, peguei minha magia de Gelo, e saí do beco...
Algo fez bip-beep, e Roxy virou na minha direção. Eu engoli uma
maldição e deslizei de volta para as sombras antes que ela me visse. Ela
guardou o revólver no coldre, deu um passo à frente e pegou o telefone na
penteadeira, olhando para a mensagem na tela.
— Jim diz que Lane, Coolidge e Grayson estão no Silver Spur,
experimentando chapéus. Nenhum sinal de Blanco, no entanto.
Brody balançou a cabeça. — Esqueça sobre Tucker querendo ela viva.
Eu estou dizendo a você, Roxy, você precisa matar essa cadela agora. Não
jogue este jogo de perseguição estúpido com ela. Ela não é um animal idiota
que eu posso tirar do pântano para que você possa matá-la em seus próprios
termos.
— Mas é um jogo tão divertido, — Roxy ronronou. — Especialmente
desde que a ilustre Aranha nem percebeu que ela é meu alvo ainda. Ela nunca
vai saber o que a atingiu.
Ela sorriu, tirou um de seus revólveres e começou a girar em torno de
sua mão. O gigante revirou os olhos. Sim, eu também.
Esqueça sobre ficar quieta. Se a xerife Roxy queria um pedaço de mim,
então eu estava mais do que feliz em mostrar como um bandido parecia – e
quão morta eu poderia deixá-la. Eu alcancei ainda mais a minha magia de
Gelo e avancei...
Risos soaram na extremidade do beco. Eu me virei e percebi que dois
cowboys gigantes estavam andando na minha direção. Suas cabeças estavam
baixas, ambos olhando e rindo de alguma coisa em um de seus telefones,
então eles não tinham me visto ainda, mas era apenas uma questão de
segundos antes de fazerem.
Eu engoli outra maldição. Testemunhas e danos colaterais eram coisas
que eu tentava evitar a todo custo, então eu fiz a única coisa que pude –
coloquei minha faca na manga, saí do beco e fui para a área onde meus
inimigos estavam.
— Oh, aí está você! — Chamei em voz alta, acenando com a mão. —
Eu tenho procurado em todos os lugares por vocês dois!
Surpresos, Roxy e Brody se viraram na minha direção. As mãos de
Brody se fecharam, enquanto Roxy parou de girar seu revólver, a arma
apontada para o chão.
Por enquanto.
Eles se entreolharam, obviamente se perguntando se eu tinha ouvido
a conversa deles, mas eu coloquei um sorriso benigno no rosto e fui direto até
eles. Eles não eram os únicos que poderiam fazer um show.
Eu parei na frente do gigante e olhei para o nariz inchado e torto, que
parecia um tomate podre que tinha sido amassado em seu rosto. Eu estremeci
e assobiei uma respiração entre meus dentes em falsa simpatia. — Eu só
queria te dizer o quanto sinto muito por ter te acertado. Eu não sei o que
aconteceu comigo. Devem ser todas essas aulas de autodefesa que venho
fazendo ultimamente.
Soltei uma risada, tentando interpretar a coisa toda como uma piada,
mas o gigante estava tudo menos divertido. Os dedos de Brody cerraram-se
ainda mais, os nós dos dedos estalando sob a pressão lenta e constante, e os
lábios dele se contorceram de raiva. Naquele momento, o gigante não queria
nada mais do que avançar, enrolar as mãos em volta da minha garganta e me
estrangular até a morte por quebrar o seu nariz.
Roxy colocou uma mão de advertência em seu ombro e me deu um
sorriso inocente em troca. — Oh, Brody sabe que você não fez por mal, Gin.
— Claro que não — eu falei para ela. — Foi tudo parte do show, certo?
— Certo.
Nós nos encaramos, nós duas sorrindo largamente como se tudo
estivesse bem, e esta era uma conversa normal. Mas Roxy manteve sua arma
para fora, seu dedo no gatilho, pronta para levantar a arma e me encher de
balas cobertas de Fogo, e eu tinha meu próprio poder elemental acumulando
em minhas palmas, pronta para levantar minhas mãos e explodir sua cara
com a minha magia de Gelo.
Mas os dois cowboys que eu tinha visto antes entraram na praça, ainda
rindo sobre qualquer vídeo bobo que eles estavam assistindo, e o momento –
e nosso confronto em potencial – passou.
Por agora.
Os cowboys acenaram para Roxy e Brody Então, foram até uma
prateleira para pendurarem os seus chapéus por hoje e trocarem para roupas
normais.
— Bem, então, vou deixar você se limpar — eu disse, quebrando o
silêncio tenso que havia se acumulado em torno de mim, do gigante e da
elemental de Fogo. — Mais uma vez, sinto muito mesmo. Se você precisar de
um elemental do Ar para colocar o nariz de volta no lugar, por favor, sinta-se
à vontade para me mandar a conta.
Brody me olhou com raiva, suas bochechas vermelhas como o nariz.
Roxy, no entanto, me deu outro sorriso inocente. — Oh, nós temos um
curador na equipe, então isso não será necessário. Eu estava prestes a ligar e
chamá-lo.
Eu assenti como se as informações me agradassem.
— Na verdade, Gin, eu estou feliz que você esteja aqui — disse Roxy.
— Eu sei que você provavelmente vai querer explorar o parque e o hotel pelo
resto do dia, mas eu estava pensando se você e seus amigos gostariam de se
juntar a Brody e eu para um almoço amanhã cedo antes do show do meio-dia.
Seria uma chance para eu falar com Finn sobre o resort e para todos nós nos
conhecermos melhor.
Eu preferiria esculpir seu coração com uma faca de manteiga do que
partir o pão com ela, mas eu joguei junto. — Claro. Parece divertido.
— Ótimo! — Roxy disse. — Apareçam às onze horas da manhã de
amanhã no restaurante Feeding Trough na Main Street. Eu preparo tudo.
Eu assenti para ela, depois para Brody. — Mais uma vez, sinto muito,
e espero que você se sinta melhor logo. Agora se cuidem, ok.
Eu sorri para eles novamente, me virei e saí da praça em um ritmo
normal. Meus ombros tensos, e eu alcancei minha magia de Pedra, pronta
para mandá-la correndo pelo meu corpo inteiro. Eu não iria deixar Roxy atirar
nas minhas costas, especialmente se ela pensasse que eu tinha ouvido
qualquer conversa dela com Brody. Ela poderia querer encontrar as joias, mas
também me queria morta para poder colocar outro troféu em sua parede.
Mas eu não ouvi o clique característico dela engatilhando seu revólver,
e eu virei a esquina e entrei de novo no beco, fora da vista da área de descanso.
Não fora da linha de fogo, no entanto. Nem mesmo perto.

***
Deixei o beco para trás e voltei para a rua principal com suas lojas,
multidões e personagens fantasiados. Mais do que nunca, senti como se as
pessoas estivessem me observando e analisando todos os meus movimentos.
Toda vez que um dos cowboys, garimpeiros, jogadores ou saloon girls
passavam ou sorriam para mim, eu olhava de relance para eles, imaginando
se eles iriam enviar uma mensagem de texto para Roxy com minha localização
atual no momento em que eu virava minhas costas. Provavelmente. Meus
ombros ficaram tensos novamente, ainda esperando que uma bala explodisse
em minhas costas em um segundo, mas eu me forcei a entrar na multidão.
Eu encontrei meus amigos no Silver Spur, bem onde Roxy tinha dito
que eles estavam. Parte do Silver Spur era uma antiga loja mercantil, com
sabonetes, elixires e outros produtos, enquanto a outra metade apresentava
roupas de designers, incluindo os chapéus que Finn e Owen estavam
experimentando. Bria se apoiou contra uma arara de coletes de couro com
franjas, parecendo entediada.
— Por que você demorou tanto? — Ela reclamou. — Eu já vi o máximo
de chapéus de cowboy que posso aguentar.
Ela inclinou a cabeça para Finn, que estava olhando para si mesmo
em um espelho de corpo inteiro, admirando o Stetson branco em sua cabeça
e tentando convencer Owen a comprar o mesmo chapéu em cinza. Antes que
eu pudesse responder, Finn se aproximou de nós. Ele também estava usando
uma bandana estampada verde e branca em volta do pescoço e calças de couro
branco enfeitadas com strass de um verde pálido sobre o jeans. Ele parecia
um cantor de música country prestes a subir ao palco. Tudo o que ele
precisava era de um violão brilhante.
— Ei, Gin! — Ele falou, virando-se em um círculo e fazendo os strass
brilharem sob as luzes. — O que você acha? Sou eu ou o quê?
Obriguei-me a sorrir para ele. — É totalmente você.
Ele sorriu e sinalizou para que um dos balconistas guardasse tudo
para ele.
Owen se aproximou e apontou seu Stetson cinza para mim. — Senhora
— ele perguntou, — você gosta?
Eu estendi a mão e inclinei o chapéu para trás em sua testa. — Use
isso para mim hoje à noite, e você verá o quanto eu gosto, cowboy.
Ele riu e foi entrar na fila com Finn para pagar.
O Silver Spur estava lotado, e levou vinte minutos para o funcionário
embrulhar as novas aquisições de Finn, junto com o chapéu de Owen, e para
nós finalmente deixarmos a loja. Olhei para cima e para baixo nas calçadas,
mas não vi ninguém obviamente nos observando. Eu sabia que eles estavam
lá, no entanto. Eu podia sentir seus olhares nos meus amigos. Precisávamos
sair do parque temático e voltar para o hotel, em nossas suítes, onde eu
poderia contar aos outros o que estava acontecendo, e poderíamos planejar
nosso próximo passo.
Mas, mais uma vez, Finn tinha outras ideias. — Vamos. Vamos pegar
um pouco de chocolate quente.
Ele saiu pela calçada, e Bria, Owen e eu não tivemos escolha a não ser
segui-lo. Finn caminhou até um carrinho de comida parado na entrada de um
dos becos, onde ele comprou chocolates quentes para todos nós, antes de nos
levar até dois bancos de ferro que foram colocados juntos, um de frente para
o outro. Finn e Bria pegaram um banco, com Owen e eu sentados em frente a
eles no outro.
Finn tomou um gole de seu chocolate quente, depois olhou em volta e
se inclinou para frente, olhando para mim com os olhos afiados e
conhecedores. — O que está acontecendo, Gin?
— Por que você acha que alguma coisa está acontecendo?
— Porque normalmente você teria me ridicularizado impiedosamente
por ter comprado calças de couro branco coberto de strass. Assim como você
deveria ter feito. Mas você disse que elas pareciam ótimas. Essa não é a
sarcástica e atrevida Gin Blanco que eu conheço e amo. — Ele parou para
tomar outro gole de seu chocolate quente. — Além disso, há um cowboy que
vem nos seguindo de loja em loja, enviando mensagens de texto em seu
telefone o tempo todo. Ele está atrás de mim agora, encostado em um poste e
tentando parecer casual.
Meu olhar passou por Finn, e com certeza, aquele cowboy estava
exatamente onde ele disse. Eu deveria ter percebido que Finn teria notado
alguém o observando. Ele pode não ser um assassino tão bom quanto eu, mas
Fletcher tinha treinado seu filho tão bem quanto ele me treinou.
— Além disso, você esteve fora por muito tempo — acrescentou Finn.
— Normalmente, eu teria dito que você teve que parar, matar alguém e
esconder seu corpo, mas não há sangue em suas roupas. — Ele me deu outro
olhar severo. — Então desembucha, Gin. Em que tipo de problema você se
meteu?
Suspirei, percebendo que era hora de confessar. — Bem, você está
certo. Eu realmente não matei ninguém, embora eu certamente quisesse...
Enquanto bebíamos nossos chocolates quentes, eu disse aos meus
amigos tudo o que Roxy e Brody tinham dito sobre trabalhar para Tucker e o
vampiro querendo que encontrássemos as joias escondidas para ele.
Quando terminei, Owen olhou para mim. — Então é isso que estava
acontecendo no saguão antes, quando você atropelou aquele carrinho de
bagagem. Você pensou ter visto Tucker e ia atrás dele.
Eu assenti. — Culpada da acusação, mas ele desapareceu antes que
eu pudesse chegar até ele. Mas ele está por aqui em algum lugar. Ele tem que
estar.
Nós quatro ficamos em silêncio, segurando nossas canecas vazias.
Para o observador casual, parecia que estávamos apenas fazendo uma pausa
das festividades, sentados nos bancos, tomando um lanche quente e
observando as pessoas. Oh, nós estávamos observando às pessoas, tudo bem.
— O cowboy se foi, mas há um mineiro gigante em seu lugar, olhando
para nós a cada minuto, mais ou menos — disse Owen.
— A saloon girl que trabalha com o carrinho de pipoca está nos
vigiando também — Finn acrescentou.
— E eu vejo um jogador em uma das varandas do segundo andar,
olhando diretamente para nós e mandando mensagens de texto, — Bria disse.
Eu assenti. — Eu não sei quantas pessoas trabalham para Roxy e
Brody diretamente, mas temos que assumir que qualquer um dos funcionários
do resort pode estar em sua folha de pagamento e ser uma possível ameaça.
Sem mencionar Tucker à espreita, e qualquer homem que ele possa ter
escondido nas sombras com ele. — Eu olhei para meus amigos. — Do jeito
que eu vejo, nós temos duas opções. Podemos sair daqui, voltar para Ashland
e nos reagrupar.
— Ou? — perguntou Finn, embora soubesse tão bem quanto eu qual
era a segunda escolha.
— Ou podemos ficar e procurar as joias. De acordo com Roxy, Tucker
acha que Deirdre deu a você alguma pista sobre onde ela as escondeu, ou que
eu posso, de alguma forma, encontrá-las com minha magia de Pedra. Talvez
ele esteja certo sobre isso.
Eu mantive minha voz neutra, apesar de querer ficar aqui. Eu não me
importava com as pedras e como elas eram valiosas. Nem um pouco. Para
mim, isso era tudo sobre Hugh Tucker. O vampiro esteve três passos à minha
frente há semanas e eu queria virar a mesa e vencê-lo em seu próprio jogo. Eu
queria tirar-lhe algo com o que ele se importasse, para variar. Mas, acima de
tudo, queria tê-lo a minha mercê – ou a falta dela – para finalmente esculpir
algumas respostas dele sobre a minha mãe e o Círculo.
Mas ficar no resort seria perigoso – talvez até mortal. Nada que não
tivéssemos enfrentado antes, é claro, mas nós viemos aqui para relaxar e tirar
uma folga do constante perigo em Ashland. Não nos envolver com mais
problemas.
Oh, eu ficaria feliz em enfrentar Roxy, Brody e todas as outras pessoas
aqui se isso significasse ficar mais perto de descobrir os membros do Círculo,
mas isso não era uma escolha minha. Não realmente. Porque Tucker tinha
atraído Finn para cá, enviado a escritura do resort, e aumentara as suas
esperanças de saber mais sobre Deirdre. Então ele deveria ser o único a
decidir.
Eu olhei para Finn. — Então, o que você quer fazer? Este é seu fim de
semana e seu resort, então é sua escolha. Certo, pessoal?
Bria e Owen assentiram, e nós três olhamos para ele.
Meu irmão adotivo bateu com o dedo contra o lado de seu copo,
olhando para os restos de seu chocolate quente como se fossem folhas de chá
que de alguma forma revelariam o futuro. Depois de alguns segundos, seu
dedo parou, e ele levantou a cabeça, olhando para Bria e Owen, e então
finalmente para mim.
Muitas emoções brilhavam nos olhos de Finn. Preocupação com o
perigo em que estávamos, raiva que Tucker o havia manipulado novamente,
decepção por ele não ter descoberto nada de novo sobre Deirdre ainda. Mas
tudo isso se dissipou, endurecendo em uma determinação teimosa que eu
conhecia muito bem – a mesma determinação que Fletcher tinha incutido em
mim, assim em seu filho. Naquele momento, Finn parecia com o seu antigo eu
do que ele tinha parecido em semanas.
— Foda-se — Finn disse, um sorriso se espalhando em seu rosto. —
Vamos encontrar essas pedras e empurrá-las na garganta de Tucker.
Eu sorri de volta para ele. — Eu estava esperando que você dissesse
isso.
Capítulo 12
Deixamos a Main Street para trás, voltamos para o hotel e subimos de
elevador até o sétimo andar onde estavam nossas suítes, como se tudo
estivesse normal.
Por outro lado, meus amigos e eu estarmos em perigo mortal, com
inimigos ao redor era perfeitamente normal. Férias. Heh.
O tempo todo, ficamos de olho, mas o parque temático e os
funcionários do hotel apenas nos observavam. Roxy e Brody devem ter dito
aos seus lacaios para nos deixarem em paz por enquanto. Pelo menos, até
encontrarmos as joias para eles.
O elevador se abriu, revelando um longo corredor com apenas algumas
portas nas paredes. Nós avançamos. As portas do elevador se fecharam atrás
de nós com um sussurro, e o único som era os nossos passos suaves no
carpete grosso e cinza.
— Neste andar estão todas as suítes da cobertura — disse Finn. —
Nossos quartos estão lá. — Ele apontou a mão para a esquerda, indicando um
par de portas do outro lado do corredor.
— E de acordo com o número na chave que Ira Morris me deu, a suíte
de Deirdre está lá. — Desta vez, ele apontou para a direita, onde uma única
porta foi colocada na parede.
É claro que havia apenas uma porta e uma suíte daquele lado. Deirdre
não queria compartilhar uma única polegada de espaço com ninguém.
Finn olhou para aquela porta fechada por um momento, depois se
virou, tirou um cartão-chave de plástico do bolso da calça e abriu a porta da
sua suíte. Todos nós entramos, e Finn e Owen colocaram seus pacotes em
uma mesa perto da porta.
Na verdade, eram duas suítes em uma, com cada área com sua própria
sala espaçosa, quarto e banheiro, com portas duplas conectadas no meio.
Nossa bagagem estava no foyer da suíte de Finn e Bria, embora as duas salas
tivessem uma mesa com uma enorme cesta de frutas, além de travessas de
morangos com cobertura de chocolate e outras delícias gourmet.
— Por sua estadia e nossa grande nova parceria, Roxy — Bria disse,
lendo a nota na cesta de frutas na sua suíte e de Finn.
Ela jogou o bilhete de volta na mesa e abriu a boca, mas eu levantei
meu dedo até meus lábios em alerta, e Bria reprimiu o resto de suas palavras
sarcásticas.
— Bem, então, — eu disse, — vamos nos instalar e ver se Roxy nos
deixou qualquer outra... surpresa.
Os outros assentiram, percebendo o verdadeiro significado das minhas
palavras, e nós fomos trabalhar, verificando discretamente nossas respectivas
malas e suítes em busca de câmeras escondidas, aparelhos de escuta e
armadilhas de runas. Apenas no caso de Roxy ter revestido algo com sua
magia de Fogo para tentar nos matar em nossos quartos.
— Alguma coisa? — Owen perguntou cerca de dez minutos depois.
Eu olhei pela última vez para o respiradouro que estava baixo na
parede e me levantei. — Não. Está tudo limpo.
Passamos pelas portas de conexão abertas, e voltamos para a suíte de
Finn e Bria. Os dois estavam sentados em um dos sofás da sala de estar,
digitando em seus laptops na mesa de café na frente deles.
— Alguma coisa suspeita aqui? — Perguntei.
Finn balançou a cabeça. — Nenhuma câmera ou dispositivo de escuta.
O quarto está limpo.
— Assim como o nosso — eu disse. — Roxy sabe que as joias não estão
aqui, então ela não se incomodou em grampear nossos quartos. Ela deve ter
apenas dito ao seu pessoal para nos observar enquanto estivermos no hotel e
no parque temático.
Bria digitou mais algumas teclas em seu laptop. — Você sabia que o
resort tem sua própria página dedicada à caça ao tesouro? Existe até um lugar
onde as pessoas podem postar sobre todos os lugares que olharam no parque
temático. Há centenas de comentários aqui e muitas fotos.
Finn balançou a cabeça novamente. — Esqueça o parque temático.
Deirdre não seria pega nem morta em um lugar assim. Mais importante, ela
não teria escondido aquelas joias em qualquer lugar que ela não pudesse por
suas mãos em questão de minutos.
Owen cruzou os braços sobre o peito. — Você acha que elas estão aqui
no hotel em algum lugar?
Finn assentiu, nunca tirando os olhos da tela do laptop. — Elas têm
que estar.
— Bem, se esse é o caso, Deirdre não as teria mantido em sua própria
suíte? — Owen disse.
— E sem dúvida esse foi o primeiro lugar que Roxy e Brody procuraram
e não acharam — eu disse. — Mas nós ainda não olhamos lá. Talvez
encontremos algo que eles deixaram escapar.
— É por isso que estou procurando as plantas do hotel agora — disse
Finn. — Eu quero ter certeza de que Deirdre não teve paredes falsas
adicionadas a sua suíte ou em qualquer outro lugar do hotel.
Esta suíte tinha sua própria impressora, e Finn pediu a Owen para
ajudá-lo a conectar seu laptop a ela. Bria continuou pesquisando, rabiscando
todos os lugares que as pessoas já haviam procurado pelas joias,
concentrando-se no hotel.
Enquanto os outros trabalhavam, tirei meu telefone do bolso e liguei
para Silvio. Ele respondeu no segundo toque. No fundo, eu podia ouvi-lo
digitando tão rápido e furiosamente como sempre, mesmo que eu não tivesse
ideia no que ele poderia estar trabalhando desde que eu nem estava em
Ashland agora.
— Eu pensei que você teria um final de semana agradável e relaxante
enquanto eu estivesse fora.
— E eu pensei que você faria o mesmo. Já está em apuros? — Silvio
respondeu com uma voz seca e conhecedora.
— É assim que você fala com sua chefe?
— É certamente quando essa chefe é você. O que está acontecendo?
Eu bufei com o tom dele, mas lhe contei tudo o que tinha acontecido,
incluindo a nossa busca pelas joias da Sweet Sally Sue.
— Então deixe-me ver se entendi, — Silvio disse quando eu terminei.
— Você só está no resort há, o quê, três horas agora? E você já tem pessoas
tentando sequestrar e matar você? Eu acho que esse é um novo recorde até
mesmo para você, Gin.
— Roxy e Brody querem nos torturar e nos matar depois que
encontrarmos as joias, — eu corrigi. — Não faz qualquer sentido para eles nos
matar antes disso.
Por um momento, Silvio parou de digitar, e houve um completo
silêncio. — Seu otimismo nunca deixa de me surpreende.
Eu não achava que era otimismo, mas fatalismo, mas eu não discuti
com ele. No fundo, os ruídos de digitação recomeçaram, com cada batida de
tecla rápida soando como uma pequena arma disparando no meu ouvido.
— Hmm — Silvio murmurou. — Eu abri o site do hotel. Parece que
vocês quatro têm muito terreno para cobrir. Você precisa que eu vá até aí?
Pode não doer você ter algum backup.
Ele estava certo. Meus amigos e eu estávamos em desvantagem
numérica, e certamente não machucaria ter Silvio esperando nos bastidores.
Ainda assim, hesitei. Eu não queria colocar em risco outro amigo. E eu
realmente queria que o vampiro tivesse um fim de semana agradável e
relaxante, livre de todo o sangue, corpos, destruição e drama que me seguiam.
— Eu pensei que você tinha planos — eu disse, tentando convencê-lo
a não vir. — Você sabe, finalmente tomar café com aquele fofo cavalheiro mais
jovem com quem você esteve flertando nas últimas semanas no Pork Pit?
Silvio bufou. — Estou velho demais para flertar com alguém. Aquele
simpático cavalheiro mais jovem e eu acabamos por compartilhar alguns dos
mesmos interesses.
— Uh-huh.
— Além disso, ele pode esperar. Eu posso estar aí em poucas horas.
Apenas me dê a palavra, e eu carrego meus eletrônicos no carro.
Eu carregaria o carro com facas, armas e outras armas variadas, mas,
novamente, eu supus que os eletrônicos eram as armas escolhidas por Silvio.
Então eu decidi deixá-lo fazer algum dano com eles. — Na verdade, eu preciso
que você fique no momento. Eu quero tudo o que você pode desenterrar sobre
Roxy Wyatt e Brody Dalton. Histórias criminais, relatórios de crédito, onde
eles foram para o ensino fundamental. Eu quero saber cada pequeno detalhe
sobre eles. Eles trabalham para Tucker, mas eu estou supondo que eles não
foram tão cuidadosos quanto o vampiro.
— Você acha que eles deixaram um rastro que você pode seguir até
Tucker e o Círculo, — Silvio disse, pegando a minha linha de pensamento.
— Talvez. No mínimo, parecia que eles tinham derrubado vários corpos
para Tucker. Eu quero saber quem esteve na lista de alvos do vampiro. Pode
me dar alguma pista sobre ele ou sobre os outros membros do Círculo ou, pelo
menos, quais são seus interesses comerciais.
— Feito. Eu terei uma atualização para você hoje à noite, ou na
primeira hora de amanhã no mais tardar. E eu vou em frente e carregarei o
carro de qualquer maneira. Apenas no caso.
— Você não precisa fazer isso. Eu posso cuidar de mim mesma, sabe.
Eu sou uma assassina depois de tudo. As pessoas realmente me temem e
coisas assim. — Eu suspirei. — Pessoas normais e sãs, de qualquer maneira.
— Uh-huh. Falarei com você em breve, Gin.
Silvio desligou. Pensei em chamá-lo de volta e ordenar que ele ficasse
em Ashland, mas eu sabia que ele não responderia. Não quando ele estava
focado na trilha de Roxy e Brody. Mesmo se ele atendesse, eu poderia falar até
ficar com o rosto azul e ele simplesmente ignoraria meus protestos.
Às vezes eu pensava que Silvio Sanchez era mais o meu chefe do que
o contrário.

***

Finn terminou de examinar as plantas do hotel, mas ele não encontrou


esconderijos óbvios onde Deirdre pudesse ter escondido as joias. Então
decidimos verificar a suíte dela por nós mesmos.
Nós quatro andamos pelo corredor até a porta de Deirdre. Finn ergueu
lentamente a chave na mão, como se fosse tão pesada quanto um tijolo. Depois
de um momento, ele enrolou os dedos ao redor, deslizou a chave na fechadura
e girou.
— Aqui vamos nós — disse ele, abrindo a porta e atravessando para o
outro lado.
A suíte era enorme, maior do que a cobertura de Deirdre no prédio de
apartamentos Peach Blossom em Ashland. Passamos pelo vestíbulo e
entramos em uma sala de estar rebaixada, com sofás e cadeiras de couro
branco, mesas de vidro e cromo e tapetes persas em preto e branco. Nenhuma
decoração de cowboy ou do Velho Oeste estava à vista, embora houvesse uma
árvore de Natal branca de três metros de altura no canto, com um par de
caixas plásticas cheias de enfeites espalhadas ao redor. As janelas do chão ao
teto se alinhavam na parede dos fundos da suíte, exibindo uma vista
encantadora das árvores ao redor e dos rochedos e do lago Bullet Pointe à
distância.
Uma grande cozinha ficava ao lado do espaço principal, embora estava
imaculada, e todas as bancadas de mármore branco e aparelhos cromados
brilhavam, como se ninguém jamais tivesse cozinhado alguma coisa ali.
Deirdre certamente não tinha. Quando eu a espiava em Ashland, ela pedia
serviço de quarto para cada refeição. Eu não a tinha visto fazer nem mesmo
um sanduíche em todo o tempo em que eu a observei.
— Eu nunca pensei que eu iria admirar o estilo de decoração de
Deirdre, mas eu tenho que dizer que eu estou feliz por não ter botas ou laços
aqui — Bria disse.
— Parece exatamente como seu outro apartamento. — Finn andou de
um lado da sala para o outro e de volta novamente, olhando por cima de tudo.
— Não há nada aqui. Nada. Eu nem vejo uma revista.
Bria olhou para mim e eu encolhi os ombros para ela. Minha irmã
entrou na frente de Finn, cortando seu ritmo rápido. — Você não sabe disso
ainda. Vamos dar uma olhada. Talvez você encontre alguma coisa ou veja algo
que Tucker e os outros perderam. Ok?
— Tudo bem, — Finn murmurou.
Então nós quatro verificamos a suíte, abrindo e fechando as gavetas
da mesa de café, olhando sob as almofadas do sofá, e até revirando as panelas
e frigideiras vazias nos armários da cozinha. Também procurei por câmeras
escondidas, aparelhos de escuta e armadilhas rúnicas, mas não havia nada
nos dois cômodos da frente, então andamos pelo corredor até o quarto
principal e o banheiro nos fundos, onde as coisas finalmente ficaram um
pouco mais interessantes.
Aparentemente, Deirdre passara muito mais tempo aqui do que levara
Finn a acreditar, porque o quarto estava lotado de coisas dela. Terninhos,
vestidos de coquetel e vestidos de baile ocupavam um dos lados do enorme
closet, todos cuidadosamente pendurados em racks e organizados de acordo
com a cor, desde o mais claro ao mais escuro. O outro lado do armário
continha prateleiras cheias de chapéus, bolsas e sapatos stilettos – mais
sapatos de salto agulha, botas e calçados do que qualquer mulher poderia
usar em toda a vida.
Mas eu estava mais interessada na parede do fundo do armário, já que
todas as prateleiras foram forradas com tecido branco de veludo, tornando a
área sua própria caixa de joias independente. Deirdre tinha muitas joias.
Colares, pulseiras, anéis, brincos, relógios, grampos de cabelo, tiaras – dúzias
e dúzias de cada uma delas empoleiradas lindamente nas prateleiras de
veludo branco, mais uma vez organizadas de acordo com a cor, das pedras
claras às escuras. Sacos e caixas pretas de veludo também estavam alinhados
nas prateleiras, para que ela pudesse transportar suas bugigangas de lugar.
Parecia que Deirdre tinha uma peça diferente para todos os dias do ano – e
depois mais alguns.
Eu me movia de um lado para o outro da parede e de volta, examinando
cuidadosamente cada prateleira e todas as joias nela por vez, imaginando se
talvez Deirdre tivesse escondido as joias de Sweet Sally Sue aqui com as suas.
Eu também estendi minha magia de Pedra, ouvindo todas as gemas. Quer
fosse um diamante, safira ou rubi, quanto mais cara fosse uma pedra
preciosa, mais alto ela cantaria sobre sua beleza cintilante.
Mas não havia pedras soltas por aí, e as gemas apenas murmuravam
suavemente – se murmuravam. Algumas das peças estavam completamente
silenciosas, dizendo-me que eram feitas de vidro em vez de pedras preciosas.
Eu bufei. É claro que as joias de Deirdre seriam tão falsas quanto ela. Ela fez
todo mundo em Ashland pensar que ela estava rolando em dinheiro, mesmo
que ela estivesse completamente falida. Essa era mais uma de suas muitas
cortinas de fumaça.
Ainda assim, mesmo com as poucas peças de joalheria genuínas que
eu vi, as pedras preciosas não cantavam alto. Ah, elas eram boas o suficiente,
mas não no mesmo nível das joias de Sweet Sally Sue. Nem de perto. Todas
essas prateleiras cheias de anéis e colares, e você teria sorte de ganhar dez
mil se vendesse tudo.
Então eu fui para o banheiro, que continha uma variedade de
sabonetes caros, xampus, loções, cremes faciais, maquiagem e perfumes,
juntamente com um rack inteiro de garrafas de champanhe. Deirdre deve tê-
las usado para misturar seus banhos de espuma extravagantes, assim como
ela tinha feito em Ashland.
Olhar todas as coisas dela no armário e no banheiro era interessante,
mas ainda era apenas coisas. Não havia computadores, telefones, tablets ou
pen drives que nos diria algo mais sobre Deirdre Shaw do que o que já
sabíamos.
— Nada — Finn rosnou, jogando para baixo outra embalagem vazia. —
Não há nada aqui. Nenhuma coisa sobre ela, o Círculo, ou qualquer outra
coisa.
Ele olhou em volta para a bagunça que fizemos ao tirar as roupas,
sapatos, chapéus e bolsas de Deirdre do seu armário e jogando-os no meio do
chão do quarto. O nojo encheu seu rosto, e ele chicoteou em seu calcanhar e
voltou para a sala de estar.
— Eu vou atrás dele — disse Bria.
Ela saiu do quarto, deixando Owen e eu em pé em um mar de vestidos
de lantejoulas brilhantes e sapatos stiletto. Owen olhou por cima das pilhas
de roupas para verificar se tínhamos deixado alguma coisa intocada, enquanto
eu voltava para o armário, batendo suavemente nas paredes, no chão e até no
teto, para o caso de termos perdido um painel escondido.
Mas não havia nada, assim como Finn havia dito. Sem painéis soltos,
sem cubículos escondidos, sem cofres secretos, nada além de roupas, sapatos
e joias falsas. A frustração surgiu através de mim, junto com a tristeza e a
decepção por Finn. Ele veio aqui esperando por respostas, e não parecia que
ele iria conseguir nenhuma.
E nem eu.
— Roxy e Brody realmente limparam este lugar, não é? — Perguntou
Owen.
Voltei para o quarto e chutei um stiletto preto do meu caminho. — O
que você quer dizer?
Ele estendeu as mãos. — Olhe para todas essas coisas. Há milhares e
milhares de dólares em roupas de grife aqui. Sem mencionar aqueles sapatos
e bolsas ridiculamente caros e todo aquele champanhe caríssimo no banheiro.
— Então?
— Então parece que esta era a base de Deirdre. Há certamente muito
mais coisas dela aqui do que naquela cobertura em Ashland.
— Mas...
Owen balançou a cabeça. — Mas não há um único pedaço de papel em
qualquer lugar da suíte. Eu tenho documentos por toda a minha casa, mesmo
que seja apenas um recibo de onde eu comprei combustível no meu caminho
para casa. Mas Deirdre? Ela nem sequer tem uma nota de serviço de quarto
aqui. Roxy e Brody devem ter pegado tudo, tudo mesmo.
Eu estava tão focada nas roupas e nas joias de Deirdre que eu não
pensei em algo tão simples como recibos, mas Owen estava certo. Todo mundo
tinha papel. Algumas pessoas, como Ira Morris, tinham muito mais, mas
Deirdre parecia não ter nenhum.
— De qualquer forma — ele disse, — vou verificar como estão Finn e
Bria. Você vem?
— Em um minuto.
Owen assentiu e caminhou pelo corredor, desaparecendo de vista.
Eu olhei para o quarto novamente com um olhar muito mais crítico.
Não era apenas o papel que estava faltando. Não havia bibelôs, nem
lembranças, nem bugigangas de qualquer tipo – nada pessoal. Nem mesmo
um papel amassado na lata de lixo que me diria que tipo de chiclete Deirdre
tinha gostado de mastigar.
Oh, eu não tinha pensado que Deirdre teria uma coleção de bonecas
de cerâmica ou um amor secreto por macramé, mas ela tinha fotos de Fletcher,
Finn e de si mesma. Ela tinha que ter mantido aquilo em algum lugar antes
dela vir para Ashland. E você pensaria que haveria mais fotos aqui, mesmo
que fossem apenas de si mesma.
Mas Owen estava certo, e Roxy e Brody tinham pegado tudo,
provavelmente sob as ordens de Tucker, procurando pistas sobre as gemas.
Eu tinha que admirar quão eficientemente e completamente eles higienizaram
sua suíte de qualquer coisa importante. Roxy e Brody tinham desnudado este
lugar melhor do que um par de gafanhotos.
Ainda assim, quanto mais eu olhava para os montes de roupas e
sapatos de Deirdre, mais irritada eu ficava. Isso não passara de uma
gigantesca perda de tempo. Tucker provavelmente tinha dito a Roxy e Brody
exatamente o que deixar para trás na suíte, apenas para aumentar nossas
esperanças, só para pensarmos que finalmente estaríamos chegando a algum
lugar. O vampiro continuava balançando cenouras de informação na minha
frente, e como uma idiota estúpida, eu tentava pegá-las, mesmo que ele as
arrancasse de mim todas as vezes.
Mais uma vez, Hugh Tucker estava jogando comigo – e eu estava
perdendo e muito
Capítulo 13
Aborrecida, voltei para a parte principal da suíte, onde os outros
estavam.
Finn estava de pé perto das janelas, com os braços cruzados sobre o
peito, olhando para a vista e pensativo. Bria e Owen estavam examinando
todas as gavetas e armários novamente, procurando fundos falsos e painéis
secretos, no caso de termos perdido alguma coisa. Olhei para minha irmã, que
balançou a cabeça, me dizendo que Finn ainda estava chateado e para dar-
lhe algum espaço. Bem, ele não era o único que estava com raiva, mas eu
decidi canalizar minha frustração em algo produtivo. Então, eu me juntei a
Bria e Owen em sua busca renovada, e nós três deixamos Finn com seus
próprios pensamentos.
Eu acabei na árvore de Natal branca no canto. Era uma daquelas
árvores artificiais pré-fabricadas, então liguei, só para ver se de fato
funcionava. As luzes se acenderam imediatamente, indo do branco para o
rosa, para o verde, para o azul e vice-versa, e lançando belos padrões nas
janelas de vidro. Nenhum enfeite estava pendurado na árvore, no entanto. Eu
suponho que Deirdre não teve tempo de decorá-la – ou mandar alguém no
resort fazer isso por ela – antes de ir para Ashland. Então, me sentei no chão
e comecei a examinar as caixas de ornamentos, curiosa para saber que tipo
de decorações ela teria.
Assim como com o resto das coisas de Deirdre, elas eram criativas –
redemoinhos elaborados, laços e torres de prata, ouro, cristal e vitrais, em
formatos de flocos de neve, guirlandas, pingentes de gelo e bonecos de
gengibre. Todos eram adoráveis, se bem que totalmente impessoais. Nenhum
“O Primeiro Natal do Bebê”, nenhum boneco de neve feito à mão, nenhuma
lembrança de lugares que Deirdre havia visitado. Todas as decorações
estavam misturadas, dizendo-me que Roxy e Brody já haviam passado por
elas do jeito que tinham feito com todo o resto na suíte. Ainda assim, passar
pelos ornamentos era um passatempo agradável o suficiente, então eu
continuei tirando-os, examinando cada um, e então colocando-os de lado.
Na parte de baixo de uma das caixas, encontrei um chumaço de papel
amassado, que empurrei ao lado para revelar um grande globo de neve.
Diferente de tudo o mais, o globo tinha obviamente vindo do parque temático,
já que exibia uma cena em miniatura da Main Street, com uma pequena placa
com pedras brilhantes que soletravam Bullet Pointe. Sacudi-o e observei a
minúscula bota de prata e o glitter espalhado se agitar, antes de voltar a
pousar lentamente.
Mais dois globos de neve também estavam aninhados no fundo da
caixa. Um apresentava uma cena de verão do Lago Bull Pointe, feito de seixos
azul-escuros com glitter de peixes e veleiro, enquanto o outro continha uma
cena de inverno do hotel, coberto de neve, decorações de Natal vermelhas e
verdes brilhantes e glitter em forma de coroa e árvore.
Bria se agachou ao meu lado. Ela olhou para o globo de neve da Main
Street que eu ainda estava segurando antes de olhar para os outros dois que
eu tinha colocado no chão com todas as outras decorações. Todos pareciam
presentes desembrulhados empoleirados sob a árvore.
— Eu vi alguns desses globos no Silver Spur hoje cedo. Bonitinhos,
mas um pouco bregas — disse ela — Eles me lembram de todos aqueles globos
de neve que mamãe tinha. Lembra como você, eu e Annabella colocamos tudo
na nossa árvore de Natal naquele último ano?
— Sim — eu disse asperamente. — Eu me lembro.
Tinha sido em uma tarde tão normal, e algo que eu tinha esquecido até
agora. Não, isso não era verdade. Desde que eu descobri que minha mãe fazia
parte do Círculo, eu tenho olhado para o passado, tentando me lembrar de
cada coisa que eu podia sobre ela, especialmente se ela alguma vez mostrou
alguma dica ou sinal de que ela estava envolvida com pessoas tão perigosas.
Ou se ela era perigosa.
Mas eu não tinha conseguido me lembrar de muito coisa. Apenas
imagens nebulosas da minha mãe sorrindo para mim ou escovando meu
cabelo ou rindo enquanto nós duas assistíamos Bria pular pela mansão,
brincando, cantando e falando coisas sem sentido para suas bonecas. Parecia
que quanto mais eu tentava colocar essas imagens em foco, mais escuras e
mais distante elas se tornavam até que elas desapareciam completamente. A
dor que elas trouxeram junto com elas permaneceu, no entanto, tão nítida e
clara quanto uma das minhas facas na minha mão. Porque minha mãe ainda
estava morta – estaria sempre morta – e eu não tinha nenhuma pista sobre no
que ela estava envolvida que matou ela e Annabella.
Estar aqui neste hotel só me fez pensar ainda mais sobre minha mãe,
o Círculo e tudo mais. Eu me perguntei com que frequência Deirdre tinha
vindo aqui. Eu me perguntei se ela já havia convidado Tucker ou algum de
seus outros amigos do Círculo para vir ao seu resort. Fiquei imaginando se
minha mãe já estivera aqui antes de morrer.
Eu me perguntei... Eu me perguntei muitas malditas coisas que eu não
tinha como conseguir as respostas. Quanto mais eu tentava descobrir o
passado, mais eu me sentia como se uma teia de aranha fosse lentamente
desfiada, desintegrando uma vertente de cada vez em nada.
Aborrecida de novo, eu bati o globo de neve no carpete com força
suficiente para fazer a bota e o glitter bater contra o vidro. Algumas das pedras
que adornavam o sinal Bullet Pointe também saíam de suas bordas e
penetravam no interior do vidro antes de cair na pequena rua. Baratas e
bregas, exatamente como Bria havia dito.
Eu olhei para o globo, meus dedos coçando para pegá-lo e jogá-lo
contra a parede mais próxima, junto com os outros dois, em seguida pisar
neles por precaução, até que todos estivessem vazios e quebrados como meu
coração.
— Vamos — eu falei, ficando de pé. — Finn está certo. Isso não tem
sentido. Não há nada aqui. Vamos embora
Inclinei-me e tirei o fio da tomada, desligando as luzes da árvore de
Natal. Não esperei que meus amigos me seguissem enquanto eu me virava,
saía pela porta e deixava a suíte de Deirdre Shaw para trás.

***

Passamos a maior parte da tarde na suíte de Deirdre, mas depois de


sairmos de mãos vazias, nenhum de nós sentiu vontade de procurar no resto
do hotel pelas joias. Pelo menos não hoje à noite. Então nós quatro comemos
um bom e caro jantar italiano em um dos restaurantes do hotel, e depois
tomamos uma bebida de sidra de maçã temperada no saguão junto à lareira.
Mais uma vez, eu estava ciente da equipe do hotel nos observando, mas foi só
isso o que eles fizeram. Como eu disse a Silvio antes, Roxy e Brody
provavelmente não iriam fazer nada até que encontrássemos as gemas – ou
eles decidissem que as pedras estavam perdidas para sempre.
Depois da nossa bebida, voltamos para nossas respectivas suítes –
Finn e Bria em uma, e Owen e eu na outra. Tomamos precauções para nos
certificarmos de que estaríamos em segurança durante a noite, incluindo
barricar as portas com várias mesas e cadeiras pesadas e garantir que
tivéssemos nossas armas à mão. Ninguém entraria aqui esta noite sem fazer
muito barulho e receber um monte de balas em retorno.
Uma vez feito isso, Finn e Bria desapareceram em seu próprio quarto.
Owen e eu tomamos banho, colocamos nossos pijamas e fomos para a cama.
Owen adormeceu quase imediatamente, seu suave ronco ressoando como um
coro constante ao meu lado. Mas fiquei deitada na cama por um longo tempo,
olhando para o teto, revirando várias coisas em minha mente, pensando em
minha mãe, Tucker, Deirdre e, especialmente, onde ela poderia ter escondido
seu tesouro.
Mas as respostas não vieram magicamente até mim, então parei de
olhar para o teto, rolei para o meu lado e me aconcheguei ainda mais embaixo
das cobertas. Eventualmente eu caí no sono, na terra dos sonhos e
memórias...
— Você está fazendo errado — uma voz irritada falou.
Eu olhei para cima do globo de neve que eu estava amarrando na árvore
de Natal. — O quê?
Annabella, minha irmã mais velha, fez uma careta e apontou o dedo
para a direita.. — Não você... ela.
Ela olhou para Bria, que estava sentada no chão, sacudindo um globo
após outro, às vezes dois ao mesmo tempo, cantarolando para si mesma,
perdida em seu próprio mundinho.
Annabella olhou para Bria novamente. — Ela deveria estar nos
ajudando a colocar essas coisas estúpidas na árvore. Não apenas ficar sentada
lá. Afinal de contas, isto foi ideia dela.
Estávamos enfeitando nossa árvore de Natal na sala da família do
andar de cima, algo que eu absolutamente amava fazer. No jantar de ontem à
noite, mamãe nos perguntou como queríamos decorá-la este ano, e Bria sugeriu
que amarrássemos todos os globos de neve da mamãe na árvore. Eu pensei que
era uma ideia legal, mas é claro que Annabella tinha decidido que era
totalmente idiota, assim como ela fazia com tudo que não era ideia dela ou não
envolvia sair com as amigas dela. Ainda assim, mamãe insistiu que Annabella
nos ajudasse, especialmente porque mamãe tinha uma reunião e não poderia
vir aqui até que ela terminasse.
Então, durante a última hora, Annabella, Bria e eu cuidadosamente
aninhamos globos de neve na árvore e os amarramos nos galhos com fio verde,
certificando-nos de que eles não escorregariam e quebrassem no chão. Bem, na
verdade, Annabella e eu estávamos fazendo todo o trabalho. Bria estava
sentada junto à árvore, brincando com os globos do jeito que sempre fazia.
Annabella bufou. — Se Bria não vai ajudar, eu não vou montar a
estúpida árvore sozinha.
— Mas... — Eu comecei a protestar que eu estava ajudando, mas já era
tarde demais.
— Esqueça isso — Annabella estalou, cortando-me. — Eu vou ligar para
os meus amigos.
Ela se virou, seu longo rabo de cavalo loiro voando atrás dela, e pisou
no corredor. Vários segundos depois, ouvi o estrondo da porta do seu quarto
batendo. Dizer que Annabella era uma adolescente mal-humorada era um
eufemismo total. Só porque ela estava no ensino médio, ela achava que já era
adulta, e ela nunca mais queria fazer nada divertido, especialmente quando se
tratava de brincar comigo e com Bria. Isso era coisa de criança, e ela não era
mais uma criança, como ela gostava tanto de lembrar qualquer um que pudesse
ouvir.
Eu olhei para Bria, esperando que ela estivesse em lágrimas porque
Annabella tinha fugido, mas ela ainda estava brincando com os globos e nem
notou que Annabella tinha ido embora. Eu soltei um suspiro aliviado. Bom. A
birra de uma irmã era tudo o que eu poderia lidar hoje.
— Fique aqui, Bria — eu disse. — Vou ver se mamãe terminou sua
reunião e pode vir nos ajudar.
— Okeydokey, smokey, — Bria respondeu em uma voz distraída e
cantada.
Ela provavelmente ficaria ali sentada por outra hora antes de perceber
que eu fui embora, então coloquei meu globo no chão, e escapei enquanto podia.
Desci as escadas, abraçando as paredes para que eu não estivesse no
caminho. Mamãe estava fazendo sua festa anual de Natal hoje à noite, e todos
os tipos de pessoas estavam se movendo de um cômodo da nossa mansão para
o outro. Garçons segurando caixas de champanhe, floristas carregando
grinaldas verdes, até mesmo um par de músicos arrastando harpas,
preparando-se para colocar seus instrumentos na sala principal.
A cozinha estava a caminho do escritório de mamãe, e eu parei e espiei
dentro. Os fornecedores foram os primeiros a chegar esta tarde e já cozinhavam
há horas. Perus assados no mel e frutas secas repousavam sobre tábuas de
madeira, esperando para serem esculpidos, enquanto os chefs trabalhavam
com molho de cranberry, purê de batatas, molho de carne e outros
acompanhamentos clássicos de Natal. Tudo cheirava incrivelmente, e meu
estômago se agitou em antecipação.
— Parece que alguém está com fome — uma voz divertida e masculina
falou.
Eu olhei para a direita para encontrar um homem de meia-idade olhando
para mim. Ele usava um avental de trabalho azul por cima de suas roupas, e
seus cabelos castanho-avermelhados espiavam por baixo do seu chapéu alto
de chef branco. Seus olhos eram claros, alegres, verdes de Natal, e suas
bochechas estavam vermelhas pelo calor dos fogões.
— Faltam horas até o jantar — eu disse, meu estômago roncando
novamente.
O homem olhou para a esquerda e para a direita, mas os outros chefs
estavam ocupados. Então ele estendeu a mão e pegou uma casca de chocolate
em forma de flor de Natal de uma bandeja. A mousse de chocolate, uma das
minhas sobremesas favoritas, estava empilhada na casca, coberta com
framboesas frescas, fazendo com que parecesse uma flor de Natal.
Ele piscou e passou a sobremesa para mim. — Eu não vou dizer se você
não fizer, Genevieve.
Eu fiz uma careta, imaginando como ele sabia o meu nome, mas eu
estava com muita fome para me importar. — Obrigada — eu disse, e dei uma
grande mordida.
Era tão fantástico quanto parecia. A mousse de chocolate era leve e fofa,
e as framboesas adicionaram um sabor frutado e doce. A concha de chocolate
amargo era crocante entre meus dentes, derretendo em minha boca,
adicionando um sabor ainda mais rico e delicioso à sobremesa.
— Bom, huh? — O homem disse em um tom de brincadeira.
— Mmm-hmm. — Eu rapidamente terminei o resto da sobremesa.
Ele piscou para mim de novo, depois voltou ao trabalho, colocando mais
mousse de chocolate de um saco de confeitaria nos moldes de flor de Natal.
Saí da cozinha e segui para a parte de trás da casa, onde ficava o
escritório da minha mãe, com vista para os jardins. Os trabalhadores também
estavam lá fora, amarrando luzes de natal brancas, galhos grossos de visco
verde e laços de veludo vermelho. Uma das minhas coisas favoritas sobre o
Natal eram todas as cores brilhantes e ousadas, juntamente com os brilhos das
luzes e os brilhos de prata e ouro...
— Eu não posso mais fazer isso — disse uma voz.
— Bem, isso é muito ruim, Eira — outra voz respondeu. — Você faz parte
do grupo, então está no meio das coisas, junto com o resto de nós, quer você
goste ou não.
Eu fiz uma careta. Ele estava conversando com minha mãe. Mas o que
ela não podia fazer mais?
Eu fui na ponta dos pés até o final do corredor. A porta do escritório
estava aberta, deixando-me ver minha mãe sentada em sua mesa. Ela era tão
bonita com seus longos cabelos loiros e olhos azuis. Não pela primeira vez,
desejei parecer com ela como Bria e Annabella. Mas, em vez disso, eu herdei os
cabelos castanhos escuros e os olhos cinzentos de meu pai, embora eu mal me
lembrasse dele, já que ele morreu logo depois que Bria nasceu.
Eu fiquei de lado, olhando para as outras pessoas no escritório.
Uma delas era uma mulher bonita, com cabelos loiros curtos, que tinham
sido modelados em ondas soltas e elegantes. Ela usava um vestido de coquetel
vermelho e um grande pingente em forma de coração brilhava ao redor de seu
pescoço. Ela deve ter ficado entediada com a reunião porque estava parada na
frente de algumas prateleiras, pegando os globos de neve da minha mãe,
sacudindo-os e vendo o glitter voar dentro, assim como Bria tinha feito antes.
Um homem estava sentado na cadeira ao lado da mesa da minha mãe.
Um paletó preto estava pendurado sobre os ombros. Combinava com o cabelo e
os olhos, bem como o cavanhaque preto aparado que se agarrava ao queixo. Ele
sorriu para minha mãe, revelando um conjunto de presas em sua boca, mas sua
expressão não parecia ser tão amigável.
O vampiro apoiou os cotovelos nos braços da cadeira e juntou os dedos.
— Deixe-me fazer isso simples, Eira. Você pode continuar a desempenhar seu
papel dentro do grupo ou encontraremos alguém para ocupar o seu lugar.
Ela ergueu o queixo. — Vá em frente, Hugh. Encontre outra pessoa. Isso
me agradaria muito.
O vampiro soltou uma risada baixa e feia. — Você sabe tão bem quanto
eu que há apenas uma maneira de alguém deixar o Círculo.
Minha mãe cruzou os braços sobre o peito. — Isso é uma ameaça?
Porque eu não gosto de ameaças.
A mulher pegou outro globo de neve e sacudiu-o. — Realmente, Eira.
Você sempre tem que ser tão encrenqueira? Por que você não pode ser apenas
uma boa menina e concordar com as coisas?
— Porque, Deirdre, — minha mãe retrucou, — ao contrário do resto de
vocês, por acaso tenho um pouco da minha consciência sobrando.
Deirdre revirou os olhos, mas ela colocou o globo para baixo, virou-se e
olhou para o vampiro. — Passar todos esses anos longe de Ashland me fez
esquecer quão hipócrita ela sempre foi. Como você consegue lidar com ela,
Hugh?
Ele deu de ombros.
Os lábios da minha mãe se apertaram em uma linha apertada. — Eu
nunca quis nada disso.
— Mas você é parte do Círculo, assim como seus pais eram antes de
você. — Hugh fez uma pausa. — E assim como suas filhas maravilhosas serão
depois de você.
Raiva acendeu nos olhos da minha mãe, junto com um vislumbre de sua
magia de Gelo. — Deixe minhas garotas fora disso. Elas não têm nada a ver
com você e eu e o resto deste negócio podre.
Ele arqueou as sobrancelhas. — Engraçado, mas Tristan pensou a
mesma coisa. E olhe o que aconteceu com ele.
Eu fiz uma careta. Meu pai morreu em um acidente de carro. O que isso
tinha a ver comigo, com minhas irmãs ou com qualquer outra coisa? Os dois
estavam conversando em enigmas que eu não entendia. Mas era assim que as
coisas aconteceram aqui ultimamente. Na maioria das vezes, mamãe ficava
escondida em seu escritório por horas a fio, falando ao telefone ou encontrando
todo tipo de gente estranha. Normalmente, antes da festa anual de Natal, ela
teria nos ajudado a decorar a nossa árvore, já que essa era a nossa tradição
familiar. Mas em vez disso, ela esteve aqui a tarde toda, encontrando uma
pessoa atrás da outra.
Eu levantei a mão para bater na porta, mas pensei melhor. Mamãe não
gostaria de ser interrompida. Além disso, eu não gostei da aparência da mulher
ou especialmente do vampiro. Claro, ele parecia apenas outro homem de
negócios, um entre dúzias com que minha mãe lidava, mas seus olhos negros
estavam frios e mortos, como luzes de Natal que tinham queimado. Olhos
assim... Eles me fizeram tremer.
Havia muita gente com esse tipo de olhos por aqui ultimamente. Isto me
deixava... inquieta. Ah, não que eu estivesse realmente preocupada com
qualquer coisa. Não realmente. Minha mãe era uma das mais fortes elementais
do Gelo por aqui, e ela poderia facilmente cuidar de si mesma, assim como de
mim e das minhas irmãs. Mas todas essas reuniões e todas essas pessoas
estranhas... simplesmente não parecia com ela.
Nem a preocupação que apertava o rosto dela – preocupação da qual ela
simplesmente não conseguia se livrar, não importando quanto ela tentasse.
Mesmo quando ela estava saindo com Annabella, Bria e eu, mamãe sempre
parecia distraída e distante, como se o peso do mundo estivesse em seus
ombros.
— Pense sobre a minha proposta — disse Hugh, levantando-se e
abotoando o paletó preto. — Talvez isso lhe dê a ilusão de que você realmente
tem uma escolha em tudo isso.
Deirdre riu, divertindo-se com suas palavras enigmáticas.
Mais raiva explodiu nos olhos da minha mãe, mas ela se levantou e deu-
lhe um breve aceno de cabeça. Os dois olharam um para o outro por cima da
mesa, cada um dando ao outro um olhar fixo. Finalmente, Hugh sorriu e inclinou
a cabeça para a minha mãe, como se estivessem tendo uma conversa agradável
em vez de uma tão tensa... o que quer que fosse isso. Deirdre aproximou-se dele
e, juntos, de braços dados, eles se dirigiram para a porta.
Voltei para o corredor, sem querer que soubessem que eu estivera
escutando. Mas Deirdre e Hugh eram rápidos demais para mim, e o vampiro
abriu a porta antes que eu pudesse desaparecer ao virar da esquina.
Então avancei novamente, fingindo que tinha acabado de chegar aqui,
embora o olhar que ele me deu me disse que ele percebeu que eu estivera
ouvindo-os o tempo todo.
— Olá, pequena Genevieve — ele murmurou. — Tão adorável ver você
novamente.
Novamente? Eu nunca o tinha visto antes, mas pela segunda vez esta
noite, um homem estranho sabia meu nome.
Deirdre estendeu a mão na frente dela, estudando suas longas unhas
vermelhas, como se estivesse debatendo se precisava de uma manicure. Ela me
ignorou completamente, mas Tucker continuou olhando para mim. Eu me mexi,
tentando não tremer sob seu intenso olhar negro.
— Você está muito bem hoje. E muito parecida com seu pai. Mais e mais
o tempo todo.
Minha mãe apareceu na porta do escritório. — Adeus, Hugh — disse ela
num tom alto e agudo.
Hugh piscou para mim, depois caminhou pelo corredor, com Deirdre
ainda em seu braço. Eles desapareceram na esquiva, mas eu podia ouvir o eco
de seus passos enquanto eles se moviam pela casa, cada um batendo no chão
aparentemente tão alto quanto um tambor.
Minha mãe os ouviu irem, seus lábios apertados em uma linha fina, e
preocupada novamente. — Ele vai voltar — ela sussurrou, quase para si
mesma. — E então as coisas serão piores.
Pior? Pior o quê? O que o vampiro tinha feito para ela? E o que ela acha
que ele faria a ela no futuro? Eu olhei para a minha mãe, mas ela ainda estava
olhando para o corredor, perdida em seus problemas, preocupações e medos...
Meus olhos se abriram e eu respirei fundo. Por um momento, eu não
me lembrei onde eu estava, mas depois um corpo quente se moveu ao meu
lado, e Owen virou de lado, de modo que ele estava de frente para mim.
— Gin? — Sua voz estava rouca de sono. — Está tudo bem? Você estava
murmurando em seu sono.
— Tudo bem, — eu sussurrei, tentando acalmar meu coração
acelerado. — Está tudo bem.
Mas Owen ouviu a tensão na minha voz, e ele piscou, ficando um pouco
mais desperto. — O que é isso? Você teve outro pesadelo?
Owen e eu muitas vezes passamos a noite juntos, então ele estava bem
familiarizado com meus pesadelos, todas as memórias do passado que
enchiam minha mente quando eu dormia. Mais de uma vez, eu o acordei no
meio da noite enquanto eu me debatia e gritava idiotices sobre alguma batalha
de longa data.
Mas eu quase nunca sonhava com a minha mãe, exceto pelo
assassinato dela. Aquele pesadelo me assombrou por anos até que eu me
vinguei de Mab Monroe – vingança que parecia falsa, vazia e inútil desde que
Tucker me contou que o Círculo tinha dado a Mab permissão para matar
minha mãe. Perceber que ele e Deirdre estiveram em seu escritório, em nossa
mansão, ameaçando-a e minhas irmãs... foi apenas mais um show de horror
para adicionar à minha coleção sempre crescente. Eu esfreguei a mão em
minha testa. Eu me perguntei que outras coisas terríveis eu lembraria antes
que tudo isso tivesse terminado.
— O que você sonhou desta vez? — Owen perguntou.
Eu virei de lado para ficar de frente para ele. — Era Natal. O último
Natal em que minha mãe e Annabella estavam vivas. Estávamos decorando a
nossa árvore e eu fui ao escritório da minha mãe para ver se ela queria nos
ajudar. Tucker estava lá. Assim como Deirdre.
Owen franziu a testa. — Você tem certeza?
— Sim. Infelizmente. — Eu disse a ele todos os detalhes sujos, e ele
ficou lá, digerindo minhas palavras. — Mas você não sabe sobre por que eles
estavam se encontrando?
Eu balancei minha cabeça. — Não. Mas eu sei que há mais no sonho
do que isso. Sempre existe. Chegará a mim mais cedo ou mais tarde. Dado no
que ela estava envolvida, eu poderia desejar que fosse mais tarde, no entanto.
— Os pais de ninguém são perfeitos — observou Owen. — Os meus
certamente não eram, especialmente o meu pai com seus problemas de jogo.
— Eu sei. — Eu suspirei. — Mas eu sempre achei que minha mãe era
uma boa pessoa, essa grande mulher. Ela sempre parecia tão gentil, carinhosa
e forte. Muito melhor do que eu. Eu sei que não tenho nenhum direito de julgá-
la, não depois de todas as coisas terríveis que fiz. Mas agora, ao perceber que
ela estava envolvida com o Círculo, ela provavelmente fez muitas coisas ruins,
seja por ordem deles ou por vontade própria... Eu não sei o que pensar sobre
isso. Eu não sei o que sentir sobre isso.
Owen me puxou para seus braços, de modo que minha cabeça estava
descansando em seu ombro, e deu um beijo na minha têmpora. — Eu sei —
ele sussurrou. — Eu sei.
Ele me segurou assim por um longo tempo, ambos perdidos em nossos
próprios pensamentos perturbados sobre nossos pais.
Mas, eventualmente, eu fiquei cansada de pensar e me preocupar com
minha mãe, Tucker e o Círculo. Não queria mais fazer isso. Não, pelo resto da
noite, eu queria me concentrar na única coisa que sabia que era verdade –
meu amor por Owen e o dele por mim.
Eu me apoiei em um cotovelo, olhando para ele. O luar entrava pela
fresta nas cortinas brancas, lançando o rosto de Owen na sombra, exceto pelo
brilho de seus olhos violeta. Eu estendi a mão e tracei meus dedos sobre os
planos afiados de seu rosto, mergulhando em todas as sombras que a noite
criava. Ele agarrou minha mão e deu um beijo na minha palma, bem no centro
da minha cicatriz de runa de Aranha.
Owen estava vestindo apenas um boxer preto, e ele se recostou nos
travesseiros enquanto eu continuava minhas lentas e lânguidas explorações,
arrastando meus dedos para baixo em seu peito nu, apreciando a sensação
de seus músculos quentes e sólidos. Um ponto bem ao longo de suas costelas
era particularmente sensível, se agrupando e flexionando sob cada movimento
dos meus dedos.
— Bem, Sr. Grayson— eu murmurei, — eu acredito que você esteja um
pouco sensível hoje à noite.
— Eu? Sensível? Nunca.
Ele limpou a garganta e apertou os lábios, como se segurasse uma
risada. O que só fez eu me concentrar naquele ponto, correndo levemente
meus dedos sobre ele de novo e de novo, encarando-o o tempo todo.
Finalmente, Owen cedeu e começou a rir, seu peito inteiro tremendo
com suas risadas suaves. Eu ri com ele, fazendo cócegas nele por mais um
minuto, antes de deslizar minha mão para baixo, mergulhando abaixo da
cintura de sua cueca, e envolvendo meus dedos em seu comprimento espesso
e duro.
Sua risada desapareceu, substituída por suspiros afiados e ásperos
quando comecei a acariciá-lo.
— Aqui tem cócegas também? — Eu brinquei.
Ele deslizou a mão por baixo da camiseta macia que eu estava usando
e segurou meu peito, rolando o meu mamilo nos dedos. — Tantas cócegas
como isto.
O desejo suave e quente que estava fervendo em minhas veias ficou
mais quente, e eu me levantei e tirei minha camiseta e calcinha enquanto ele
se livrava de sua cueca. Owen avançou, sacudindo sua língua sobre o meu
mamilo antes de beliscá-lo com os dentes. Eu gemi e ele me puxou para cima
dele, os seus lábios encontrando os meus. Ele me beijou, sua língua
mergulhando na minha boca uma e outra vez. Passei os dedos pelos cabelos
dele e puxei para mais perto.
Owen rolou-me de costas, chupando um dos meus mamilos, depois o
outro, enquanto a mão dele mergulhava entre as minhas pernas. Seu dedo
deslizou dentro de mim e, desta vez, eu ofeguei.
— Cócegas, de fato — ele murmurou em voz baixa e satisfeita. —
Cócegas, de fato.
Eu enterrei minhas unhas em suas costas, querendo que ele
continuasse, mas Owen se moveu ainda mais baixo na cama, separou minhas
coxas e colocou sua boca em mim, sua língua entrando e saindo. Seus
movimentos eram lentos no início, enquanto ele me provocava do jeito que eu
tinha feito, mas depois seus golpes se tornaram mais rápidos, mais afiados,
mais duros. Eu arqueei as costas na cama, meus dedos torcendo nos lençóis,
sentindo a pressão e prazer se acumularem em partes iguais, o calor rugindo
por todo o meu corpo.
— Vamos lá, querida — ele sussurrou. — Venha para mim.
E eu fiz.
O clímax explodiu, e eu caí de volta contra os travesseiros, apreciando
o calor lânguido que inundou minhas veias, fazendo com que cada parte de
mim se sentisse quente, relaxada e satisfeita. Owen beijou seu caminho de
volta pelo meu corpo e começou a me pegar em seus braços novamente.
Eu estendi minha mão, parando-o. — Oh, não. — Eu dei-lhe um
sorriso perverso. — Nós não terminamos ainda.
Eu o empurrei de costas, então peguei uma camisinha de sua carteira
na mesa de cabeceira. Eu tomava anticoncepcionais, mas sempre usamos
proteção extra. Essa não foi a única coisa que eu peguei na mesa de cabeceira.
O Stetson cinza que Owen tinha comprado mais cedo estava lá, então eu
coloquei na cabeça dele.
— Eu disse a você que eu queria que você usasse isso para mim.
— Isso está bom para mim, senhora, — ele falou com lentidão. — Eu
sempre pretendo agradar.
— Eu também.
Owen riu e inclinou o chapéu para mim antes de empurrá-lo para trás
da testa para que ele pudesse me ver melhor. Eu dei-lhe um sorriso diabólico,
então fui para o trabalho, beijando, lambendo, acariciando e chupando-o
apenas como ele fez comigo.
— Oh, sim — ele murmurou, seu corpo inteiro se contorcendo
enquanto ele lutava para ficar parado e fazer o prazer durar o maior tempo
possível.
Mas eu não o fiz esperar muito. Quando ele estava pronto para mim,
eu desenrolei o preservativo sobre ele, então me levantei de joelhos e o montei,
afundando em seu comprimento longo e duro em um movimento suave. Desta
vez, nós gememos juntos.
Eu o montei forte e rápido, e Owen colocou as mãos nos meus quadris,
me incentivando. A pressão e o prazer começaram a crescer de novo, cada
golpe mais áspero, mais rápido e mais satisfatório do que o anterior. Desta
vez, nós dois gememos e passamos juntos pela borda.
E eu me perdi nele pelo resto da noite.
Capítulo 14
Eu teria gostado de dormir até tarde na manhã seguinte, mas meu
telefone tocou exatamente às sete horas. Eu sabia quem estava ligando tão
cedo e por quê. Fiquei surpresa por ele ter esperado tanto tempo para me
atualizar.
Owen grunhiu, rolou para o outro lado da cama e puxou as cobertas
sobre a cabeça enquanto eu procurava o meu telefone na mesa de cabeceira.
— Você nunca dorme? — Eu resmunguei quando finalmente levei o
aparelho ao ouvido.
— Um bom assistente nunca dorme quando há trabalho a ser feito.
Silvio parecia irritantemente alerta e cheio de emoção. — Ou quando há
informações para compartilhar. Pense nisso como a nossa reunião matinal,
Gin. Levada até você através da magia da tecnologia.
Consegui engolir minha resposta sarcástica, apesar de ter caído de
costas nos travesseiros, não segurando muito o telefone, mas sim colocando-
o entre a minha orelha e o meu ombro. — Suponho que você cavou sobre Roxy
e Brody?
— Claro que sim. Você estava certa. Nenhum deles foi muito reservado
sobre seus movimentos, então foi fácil rastreá-los. Nem mesmo um desafio. —
Silvio pareceu desapontado com isso. — Tanto Roxy Wyatt quanto Brody
Dalton cresceram em Blue Marsh. Parece que seus pais eram amigos que
faziam fretamento nos pântanos, ajudando os turistas a caçarem veados,
ursos, jacarés e coisas do gênero. Pelo que eu apurei, Roxy, em particular,
assumiu o negócio da família como um pato na água, liderando os fretamentos
depois que o seu pai morreu. Ela também é excepcionalmente boa com armas.
Ela ganhou várias competições de tiro ao alvo em todo o país, e até faz suas
próprias balas.
Pensei na facilidade com que ela atirou naquelas garrafas no telhado
durante o show de ontem e como todas elas explodiram com sua magia de
Fogo. — Claro que ela faz suas próprias balas. Porque ela não é quase mortal
suficiente sozinha.
Silvio ignorou o meu sarcasmo. — Eu não sei exatamente como ela
acabou trabalhando na Bullet Pointe, se foi Deirdre quem a contratou ou se
Tucker coagiu Deirdre para trazê-la a bordo, mas na verdade a Roxy tem
experiência no ramo de resorts. Ela trabalhou em vários parques de diversões
ao longo dos anos, fazendo de tudo, desde administrar os quiosques, ser a
atiradora de elite residente, até gerenciar alguns dos negócios. — Ele limpou
a garganta. — Mas em todas as cidades onde ela trabalhou, houve mais de
um assassinato e caso de pessoa desaparecida foi relatado logo após a sua
chegada, embora nada tenha sido apontado para ela.
— Surpresa, surpresa — Eu disse.
Roxy deve ter trabalhado em todos aqueles lugares como cobertura
enquanto esperava Tucker ligar e dizer a ela quem matar em seguida por ele.
— Brody? Qual é a história dele?
— O típico músculo gigante. Ele seguiu Roxy por todo o país,
trabalhando nos mesmos lugares que ela. Eles parecem ser amigos, mas nada
mais.
— Então ele é seu companheiro de caça — eu pensei. — Assim como
seus pais eram antes deles.
— Algo assim — Silvio concordou. — Eu ainda estou cavando os
assassinatos nas áreas onde eles trabalharam. Ligarei para você novamente
hoje mesmo com uma atualização. Tente não se meter em muitos problemas
nesse tempo, ok?
— Eu? — Eu zombei. — Entrar em problema? Nunca.
Silêncio, embora eu pudesse imaginar o vampiro revirando os olhos.
Silvio disse que tinha mais pessoas para contatar, e nós dois nos despedimos
e desligamos.
Não consegui voltar a dormir, e Owen também não, então nós dois nos
levantamos e tomamos um longo e agradável banho juntos antes de nos
vestirmos e irmos para a suíte de Finn e Bria. Meu irmão adotivo e minha irmã
estavam sentados em um dos sofás, tomando café e olhando as impressões
das plantas do hotel novamente.
— Finalmente — disse Finn. — Eu estava me perguntando se vocês
dois só iriam vadiar em seu quarto o dia todo.
Eu arqueei minhas sobrancelhas. — E o que vocês dois estavam
fazendo na sua suíte ontem à noite e hoje de manhã?
Finn sorriu, enquanto Bria corava e se concentrava em tomar seu café.
— Eu retiro meu caso. — Eu inclinei a cabeça para os papéis cobrindo
a mesa. — Você vê algo novo ou diferente nesta manhã?
Finn suspirou e balançou a cabeça. — Infelizmente não. Nada óbvio.
Mas essas pedras têm que estar aqui em algum lugar. E alguém vai encontrá-
los mais cedo ou mais tarde, então poderia muito bem ser nós, certo?
Ele tentou injetar alguma alegria e otimismo em sua voz, mas suas
palavras saíram como um grunhido baixo, e eu poderia dizer que ele ainda
estava tão chateado, enojado e desanimado como ele tinha estado depois de
termos revirado a suíte de Deirdre ontem. Sim, eu também.
Mas Finn estava certo. Alguém tinha que encontrar as joias mais cedo
ou mais tarde, e eu queria que fosse nós, em vez de Tucker e seus lacaios.
Eu precisava que fôssemos nós – eu precisava ganhar agora, assim
como Finn.

***

Estudamos as plantas do hotel por mais alguns minutos, depois


seguimos para o saguão, já que esse era o lugar mais lógico para Deirdre
esconder as joias além da suíte. Ela não teria arriscado colocá-los em um
quarto de hóspedes onde um visitante ou funcionário poderia acidentalmente
encontrar.
Então, pegamos o elevador até o primeiro andar e nos separamos, cada
um de nós indo para a seção designada para começar a procurar. Finn foi até
a área do bar, enquanto Bria verificava a enorme lareira e cadeiras ao redor.
Owen desapareceu no corredor esquerdo para conferir as lojas e restaurantes.
Eu fui em outra direção e tomei o corredor oposto para fazer o mesmo nas
lojas e restaurantes do outro lado do hotel.
Separar-nos era um risco, mas um grupo como o nosso andando por
aí pareceria estranho e provavelmente daria uma dica para Roxy e Brody
quanto ao que estávamos realmente fazendo. Além disso, dessa forma, eles
tinham quatro pessoas para seguir, o que tornaria o rastreamento de todos
nós ao mesmo tempo um pouco mais difícil. Talvez pudéssemos pelo menos
identificar quantas pessoas Roxy e Brody tinham nos observando, então
saberíamos exatamente quem eram todos os nossos inimigos. Eu pegaria
todas as pequenas vantagens que pudesse conseguir.
Não eram nem nove horas, mas o saguão do hotel já estava cheio de
pessoas, com cada vez mais hóspedes chegando para tomar os lugares
daqueles que estavam fazendo o check-out nesta manhã de sábado. Ainda
mais pessoas entravam e saíam das lojas e restaurantes, enquanto os garçons
fantasiados se apressavam para levar comida e bebidas para todos os
hóspedes. Canções instrumentais soavam no fundo, e as luzes em todas as
árvores de Natal queimavam brilhantes e firmes. Era uma cena linda. Pena
que tanta escuridão espreitava sob a alegria do feriado.
Subi e desci pelo corredor, entrando em todas as lojas e restaurantes,
e olhando para tudo. Alguns funcionários fantasiados se interessaram por
mim, puxando seus telefones e mandando mensagens de texto enquanto eu
passeava pelas lojas, mas ninguém realmente me seguia, então me senti
segura o suficiente para continuar.
Conforme eu mudava de uma área para outra, eu me coloquei no lugar
de Deirdre, tentando descobrir onde ela esconderia um saco cheio de pedras
preciosas. Mas quanto mais eu pensava, mais frustrada ficava. Muitas
pessoas e tantos membros da equipe estavam constantemente se
movimentando pelo saguão, corredores e lojas. Mesmo nas primeiras horas da
manhã, algumas pessoas ainda estavam lá fora, limpando, arrumando e se
preparando para o próximo dia de trabalho. Eu não podia imaginar Deirdre
escondendo as joias sem que alguém percebesse o que ela estava fazendo,
muito menos permanecerem escondidas por tanto tempo sem que ninguém as
encontrasse, especialmente dada a caça ao tesouro altamente divulgada e
quanto as pessoas estavam procurando, incluindo Roxy e Brody.
Ou talvez Deirdre Shaw fosse muito mais inteligente do que eu, e eu
nunca encontraria as pedras.
De qualquer maneira, minha frustração se transformou em uma
mistura de raiva, desgosto e depressão no momento em que cheguei ao final
do corredor onde ficava o escritório de Ira Morris. Eu espiei pela porta de vidro,
mas o escritório estava escuro. Ninguém estava em casa. Eu duvidava
seriamente que Deirdre tivesse escondido alguma coisa lá, dado que Ira a
odiava por rebaixá-lo para este buraco na parede, mas valia a pena um tiro.
Além disso, era o único lugar em minha seção que eu ainda não tinha olhado.
O corredor estava deserto, então eu peguei minha magia, deixando que
ela se encaixasse na palma da minha mão. Um segundo depois, eu estava
segurando duas picaretas finas de Gelo, que inseri na fechadura. Ela se abriu
menos de um minuto depois, e eu escorreguei para o outro lado, certificando-
me de fechar e trancar a porta atrás de mim.
Não havia janelas, então eu fui forçada a acender as luzes. Além disso,
no clima que eu estava, eu não me importaria se alguém percebesse que eu
tinha invadido. Eu pisquei contra o brilho repentino, olhando para a bagunça.
Pilhas de papéis por toda parte, fotos emolduradas nas paredes, câmeras,
lentes e outros equipamentos fotográficos espalhados aqui e ali. Como o anão
poderia encontrar alguma coisa aqui? Mas não havia nada que eu pudesse
fazer além de entrar nas trincheiras.
Então olhei para a primeira pilha imensa de papéis que eu vi, depois a
seguinte, então a próxima. Para minha surpresa, todos eles tinham a ver com
o negócio de resort. Faturas, avisos de remessa, recibos de pagamento. Eu
encontrei um par de livros grossos onde os hóspedes tinham rabiscado seus
nomes ao fazerem check-in no hotel há trinta anos. Parecia que Ira Morris era
um rato de carga que nunca jogava nada fora, assim como Fletcher. Pensar
no velho trouxe um sorriso ao meu rosto e aliviou um pouco da minha raiva.
Ainda assim, depois de uns quinze minutos de busca, desisti. Se
Deirdre tivesse escondido as joias aqui, elas estavam enterradas sob tantos
papéis que eu precisaria de um trator para desenterrá-las. Eu me virei para
deixar o escritório, tendo que me esquivar de todas as pilhas de papéis que eu
examinei. Eu me movi para a esquerda, o que me colocou perto de uma das
paredes. Um brilho de vidro chamou minha atenção, e eu olhei para a foto
mais próxima de mim.
Deirdre Shaw olhava para mim.
Eu ofeguei e parei tão de repente que quase derrubei uma torre de
papel que era mais alta do que eu. Mesmo assim, eu tive que me atirar para
frente, agarrá-la e estabilizá-la. Quando eu tinha certeza de que os papeis não
iriam cair, eu soltei e olhei para a foto.
Deve ter sido tirada no dia em que Deirdre comprou o resort porque
ela parecia estar com vinte e poucos anos. Ela estava segurando uma tesoura
gigante e cortando uma grande faixa de fita vermelha, enquanto sorria e
olhava diretamente para a câmera. Seus pálidos olhos azuis pareciam estar
diretamente focados nos meus, e eu tremi, um pouco assustada por esse
fantasma em particular.
Mas então um pensamento me ocorreu – se Ira tinha essa foto de
Deirdre, então talvez ele tivesse outras. Nós não encontramos nenhuma foto
em sua suíte, mas talvez algumas delas estivessem aqui e eu pudesse pegar e
dar a Finn. Ah, as fotos não respondiam a nenhuma de suas perguntas sobre
sua mãe, mas pelo menos a nossa vinda até aqui não teria sido um completo
fracasso.
Meu coração acelerou, olhei para as fotos ao redor, mas eram apenas
fotos do hotel, do parque e de todas as pessoas que os visitaram ao longo dos
anos. Todas as fotos eram lindas, especialmente as fotos cênicas, mas eu não
vi Deirdre em nenhuma delas...
Clique.
Eu congelei, reconhecendo o som característico de uma chave girando
em uma fechadura e sabendo exatamente o que aconteceria a seguir.
Com certeza, um segundo depois, Ira Morris abriu a porta e entrou em
seu escritório.
O anão usava mais ou menos a mesma coisa que tinha vestido ontem
– botas de caubói pretas, jeans pretos e um suéter de Natal, este vermelho
brilhante e estampado com flocos de neve prateados com luzes brancas
piscando. Até mesmo os flocos de neve em seus suspensórios vermelhos
tinham minúsculas luzes neles. O que era isso com as pessoas e todas essas
suéteres de Natal?
Ira piscou, surpreso por me encontrar aqui, mas aquela emoção
rapidamente se transformou em raiva que fez seus olhos castanhos brilharem
quase tão brilhantes como as luzes em seu suéter e suspensórios. Claro que
sim. Porque é assim que essas coisas sempre aconteciam na minha vida.
— O que você está fazendo no meu escritório? — Ele perguntou.
Eu poderia ter mentido. Eu provavelmente deveria ter mentido. Afinal,
eu ainda não sabia se Ira estava trabalhando para o Tucker também. Mas
depois de perceber que Tucker nos atraiu para cá para participar de sua caça
ao tesouro retorcida, e de perder todo esse tempo vasculhando a suíte de
Deirdre ontem, eu estava um pouco zangada.
Então, ao invés de girar uma teia fraca de mentiras que o anão veria
direito através de qualquer maneira, eu encolhi os ombros. — Procurando
pelas joias da Sweet Sally Sue. O que mais?
— E você acha que elas estão aqui? — Ira soltou uma risada dura e
amarga. — Confie em mim. Se essas pedras estivessem aqui, eu as
encontraria, ficado com ela e deixaria esse lugar miserável há muito, muito
tempo.
Eu olhei ao redor para as fotos do resort nas paredes e todas as pilhas
de papéis que registram sua história, um recibo, um recibo de pagamento e
assinatura de um hóspede do passado. — Não, eu não acho que você teria.
Passei pelos papéis, pronta para sair, mas Ira ainda estava bloqueando
a porta, obrigando-me a parar em frente a ele. O anão olhou para mim por
vários segundos antes de finalmente se afastar para o lado.
— Obrigada — eu disse. — Tenho que voltar para o saguão e ver se
meus amigos tiveram mais sorte do que eu.
Ele bufou e balançou a cabeça. — Você nunca vai encontrar essas
joias, porque elas não estão aqui. Deirdre Shaw fugiu com elas há alguns
meses.
— Talvez. Ou talvez eu surpreenda você e todos os outros e realmente
as encontre.
Ele soltou outra risada dura. — Eu pensei que você estava fora da sua
mente quando atacou Brody durante o show de ontem. Mas agora eu sei que
você é louca.
Eu sorri. — Infelizmente, essa é a coisa mais legal que alguém disse
sobre mim durante todo o fim de semana.
Ira piscou, então me deu um olhar desconfiado, aparentemente
pensando que eu era realmente louca. Ele não foi a primeira, e ele certamente
não seria a última pessoa a acreditar nisso. Mas eu passei por ele, saí pelo
corredor e deixei-o com sua bagunça para trás.
Muito ruim eu não conseguir me livrar da confusão de emoções em
minha cabeça e coração tão facilmente.
Capítulo 15
Voltei para o saguão e me dirigi para a árvore de Natal do País das
Maravilhas no inverno, onde eu combinei de encontrar os outros assim que
terminássemos as buscas. Um dos garçons estava me observando, e ele pegou
o telefone e mandou uma mensagem para alguém, provavelmente Roxy. Mas
ele não se aproximou de mim, então eu o ignorei e estudei os enfeites e
decorações de Natal. Meus amigos apareceram alguns minutos depois, e nos
encaminhamos para um local mais isolado atrás da árvore do País das
Maravilhas no inverno.
— Alguma coisa? — Perguntei.
Finn, Bria e Owen balançaram a cabeça.
— Eu só não vejo onde Deirdre poderia ter escondido as joias, — Owen
falou. — Todo lugar que eu olhei é muito público com muitas pessoas
constantemente indo e vindo.
— Sim — disse Bria. — Eu comecei a pensar que, se essas pedras
preciosas estivessem aqui, alguém já as teria encontrado.
— Eu concordo. — Finn hesitou. — Ou há outra possibilidade.
— Qual? — Eu perguntei.
Ele olhou para mim. — Talvez Roxy tenha percebido que você estava a
seguindo ontem, e foi por isso que ela falou sobre as joias. Talvez ela já as
tenha encontrado. Talvez ela esteja apenas puxando nossas correntes,
observando enquanto corremos por aí, e rindo de nós o tempo todo.
Eu balancei minha cabeça. — Acho que não. Ela e Brody pareciam
genuínos quando falavam sobre por quanto tempo estavam procurando. Mas
quem sabe, com Tucker envolvido. Eu não descartaria nenhuma hipótese.
Já que tínhamos falhado em nossa busca, não tínhamos nada a fazer
senão voltar para nossas suítes e nos prepararmos para o almoço com Roxy e
Brody. Eu não achei que os dois tentariam nos matar em um restaurante,
especialmente porque ainda não encontramos as joias, mas sempre poderia
ser uma armadilha, então fui para o quarto e abri minha mala. Owen entrou
no quarto, sentou-se na cama e observou eu tirar todas as minhas roupas e
depois tirar um fundo falso da mala.
No meio da espuma negra havia quatro facas, três armas carregadas,
dois clipes extras de munição e várias latas pequenas de pomada de cura da
Jo-Jo. Pensei em colocar uma arma nas minhas costas, mas já estava usando
meu arsenal habitual de facas, então uma arma provavelmente seria um
exagero, literalmente. Em vez disso, peguei duas latas do unguento
cicatrizante, colocando-as nos bolsos do meu casaco de lã preta.
— Um fundo falso? — perguntou Owen. — Isso é um pouco James
Bond, não é?
Eu sorri. — Esta mala pertencia ao Fletcher. Ele amava todos aqueles
filmes antigos de espionagem. Ele costumava fazer maratonas deles nos fins
de semana, especialmente nesta época do ano. Finn os odiava, mas eu adorava
assistir aos filmes com Fletcher. Era a nossa pequena tradição de Natal.
Owen assentiu, depois se levantou, remexeu na própria mala e tirou
uma arma e alguns cartuchos de munição que escondera em uma boxer azul.
— Uma arma enfiada em sua cueca? — eu disse. — Eu vejo que eu não
sou a única que veio preparada.
Ele sorriu de volta para mim. — Bem, eu não poderia exatamente
encaixar meu martelo de ferreiro dentro da mala. Além disso, depois do que
aconteceu da última vez que saímos de férias em Blue Marsh, eu pensei que
seria sensato ter um backup extra na mão.
— E é por isso que eu te amo.
Seu sorriso aumentou. — Eu sei.
Eu fui até ele e o beijei, depois fomos para a suíte de Finn e Bria.
Juntos, nós quatro pegamos o elevador até o saguão e saímos do hotel
descendo a colina até o parque temático.
Apesar de estar mais frio hoje do que ontem, o parque temático estava
absolutamente lotado. Mais pessoas estavam fora, já que era sábado,
juntamente com o dobro do número de personagens fantasiados. Finn, Bria e
Owen perambulavam pelo parque, olhando vitrines e observando todas as
atrações. Segui atrás deles, fingindo fazer o mesmo, embora estivesse
realmente fazendo reconhecimento, como faria qualquer bom assassino.
Olhando para os brinquedos, quiosques e barracas. Memorizando os
layouts de todos os caminhos, passagens e becos. Percorrendo a cerca de
arame que separava o parque temático dos estacionamentos para ver onde
ficavam as saídas e quantos guardas de segurança estavam posicionados em
volta delas.
Conhecer o local me fez sentir melhor. Ah, eu não conhecia o parque
temático tão bem como eu conhecia as ruas de Ashland, mas agora, se algo
acontecesse, eu não estaria vagando por aqui desorientada.
E algo ia acontecer – eu tinha certeza disso.
Eu não vi Hugh Tucker em nenhum lugar da multidão, mas eu ainda
sentia sua presença tão claramente como se ele estivesse bem na minha
frente. O vampiro havia planejado tudo isso e eu sabia que ele estava
espreitando nas sombras. Mais trabalhadores estavam nos observando e nos
seguindo hoje também, todos eles irradiando tensão da mesma forma que o
ar quente soprava dos aquecedores que estavam espalhados pelo parque. Algo
tinha que acontecer mais cedo ou mais tarde – e eu estava apostando em mais
cedo.
Quando meus amigos e eu fizemos um circuito completo no parque,
era hora de encontrar Roxy e Brody para almoçar no Feeding Trough. Yee-
haw.
Os dois estavam do lado de fora do restaurante de churrasco,
esperando por nós, e ambos estavam vestidos com seus trajes. O cabelo loiro
de Roxy foi mais uma vez trançado em duas longas tranças, e ela estava
exibindo um Stetson vermelho, junto com uma camisa xadrez vermelha e
jeans e botas brancas. A estrela prateada de xerife estava presa ao peito de
novo, e a fivela de cinto prateado estava gravada com um coração gigante feito
de brilhantes pedrinhas vermelhas e brancas. Brody estava todo vestido de
preto, ainda fazendo o papel do fora da lei, assim como ele tinha feito durante
o show de ontem.
Eu me concentrei na estrela prateada piscando na camisa de Roxy,
bem onde estava seu coração podre. Ela poderia também estar usando uma
placa: Por favor, Gin, me apunhale aqui. Eu ficaria feliz em fazer isso – muito
em breve.
Roxy nos deu um aceno alegre, mas Brody parecia muito menos
entusiasmado, cruzando os braços sobre o peito e olhando para mim. Ele deve
ter visto aquele curandeiro de Ar afinal, porque seu nariz estava reto uma vez
mais, e nenhuma marca do meu ataque com a arma permaneceu em seu belo
rosto. Que pena.
— Ei, vocês! — Roxy falou com uma voz alegre. — Vocês estão prontos
para um churrasco?
Mesmo que eu quisesse arrancar uma das minhas facas e cortar sua
garganta, eu sorri de volta para ela, ainda brincando com a parte do turista
sem noção. — Eu estou sempre pronta para um churrasco.
Roxy riu, em seguida, abriu a porta e entrou. Eu a segui, com meus
amigos entrando atrás de mim. Brody ficou na retaguarda.
Surpresa, surpresa, o interior do Feeding Trough tinha um tema de
Velho Oeste, assim como o resto das lojas. Cabines de madeira desgastadas
cobriam duas das paredes, com mesas e cadeiras correspondentes
preenchendo o espaço entre elas. Um longo balcão de madeira com banquetas
acolchoadas ladeava a parede dos fundos, com um par de portas vai e vem
atrás dela que levavam até a cozinha. Letreiros enferrujados e antiquados
decorados com vaqueiros, cactos e gado cobriam as paredes, e vários grandes
fardos de feno estavam amontoados nos cantos, junto com alguns cochos de
alimentação reais.
Nós nos sentamos em uma mesa de canto, grande o suficiente para
nós seis. Uma garçonete, vestida como uma saloon girl, empurrou os
cardápios sobre a mesa e tomou nossos pedidos de bebida. Desde que era
pouco depois das onze, o horário do almoço estava aumentando, e mais e mais
pessoas entravam no restaurante, prontas para comerem seu churrasco antes
do show do meio-dia.
Quando estávamos todos sentados, Roxy se virou para mim. — Ouvi
dizer que você administra seu próprio restaurante de churrasco em Ashland,
Gin. Que divertido! Você vai ter que me dizer como o nosso pequeno
restaurante se compara ao seu.
— Claro.
Eu respirei. O cheiro de carne defumada e assada permeava o
restaurante, mas isso era tudo que eu sentia. Nenhuma especiaria ou tempero
rico perfumava o ar, o que significava que não havia profundidade real no
sabor. Esse churrasco ia ser sem graça, na melhor das hipóteses.
Roxy continuou falando. — Bem, eu acho que nós temos o melhor
churrasco por quilômetros ao redor. Todo mundo diz isso.
— Sim, eu vi todos as placas sobre ele e o resto do parque temático na
interestadual no caminho até aqui, — Bria murmurou. — Você não podia
perder este lugar mesmo se quisesse.
Roxy se iluminou, escolhendo ignorar o tom sarcástico da minha irmã.
— Essa é a ideia. Ora, temos pessoas que vêm aqui todos os anos para as suas
férias de verão e festas de final de ano...
E ela começou a falar. Roxy falava sem parar sobre o número de
visitantes que o parque tinha a cada ano, os outros restaurantes, a quantidade
de trabalho que dava os espetáculos diários do meio-dia e todos os outros
pequenos detalhes sobre o resort. Apesar de trabalhar aqui para Tucker, Roxy
parecia gostar genuinamente de falar sobre Bullet Pointe. Isso, ou ela só
queria nos entediar até a morte. Meus olhos vidraram, assim como os de todos
os outros na mesa, com exceção de Brody, que apenas ignorou Roxy e
começou a folhear as telas em seu telefone.
Finn, Bria e Owen comentaram quando apropriado, mas eu não me
preocupei em fazer conversa. Em vez disso, examinei o restaurante,
observando todos dentro. Os turistas, em sua maioria, juntamente com vários
trabalhadores pegavam uma refeição rápida antes do show do meio-dia. Pela
primeira vez, nenhum dos trabalhadores estava nos vigiando, já que Roxy e
Brody estavam aqui para fazer isso pessoalmente, mas o desconforto frio ainda
escorria pela minha mente. Meus amigos e eu tínhamos percebido que este
almoço poderia ser uma armadilha, mas todos nós concordamos que seria
muito improvável que Roxy e Brody fizessem qualquer coisa para nós em um
lugar público com tantas pessoas por perto. Ainda assim, agora que
estávamos aqui, não pude deixar de sentir que havíamos cometido um erro
grave. E desejando ter trazido mais armas comigo.
Mas nada de suspeito aconteceu, e Roxy falou por dez minutos antes
da garçonete finalmente voltar com nossas bebidas, colocando-as na mesa
com força suficiente para fazer um pouco de líquido espalhar por cima,
escorrer pelas laterais dos copos e escorrer sobre a mesa de madeira.
— Patty — disse Roxy em um tom cortante. — Traga-nos alguns
guardanapos. Agora mesmo.
Patty estremeceu com o desagrado frio na voz de Roxy, e ela
rapidamente saiu correndo, voltou com alguns guardanapos e limpou as poças
de líquido. Ela finalmente anotou nossos pedidos e saiu correndo.
— Serviço desleixado — eu disse em voz baixa que só Finn podia ouvir.
— Não me faz esperar muito pela qualidade da comida.
Finn revirou os olhos. — Todo mundo é um crítico.
Eu bufei.
Ele bebeu seu chá doce gelado em três goles e sinalizou a garçonete
por outro, mas levou mais alguns minutos antes que ela voltasse com um copo
fresco para ele. Bria e Owen sorviam seus drinques também, mas eu só tomei
alguns goles do meu. Quem quer que tenha feito o chá não se incomodou em
dissolver todo o açúcar, por isso tinha gosto de terra morna mais do que
qualquer outra coisa. Eu bufei novamente. Eu nunca serviria um chá doce tão
inferior aos meus clientes.
Afastei meu chá e me concentrei em Roxy, que estava tomando uma
salsaparrilha. Brody estava bebendo a mesma coisa, jogando canecas inteiras
de líquido para trás como se elas não fossem maiores que copos de shot.
— Então, Roxy — eu disse em uma voz neutra, — onde você aprendeu
a atirar assim? Seu show ontem foi muito impressionante. Todos aqueles
truques foram simplesmente incríveis.
Ela me olhou por cima da borda da caneca, imaginando se eu estava
sendo genuína, mas ela decidiu jogar junto e deixou a bebida de lado. — Meu
pai era um grande caçador e eu queria ser igual a ele quando era criança. Ele
foi quem me ensinou a atirar. Ele colocou garrafas de vidro e latas no nosso
quintal, depois me deixou atirar nelas. Acho que eu só tinha um talento
natural para isso, porque eu tenho feito isso desde então.
— Caça ou tiro? — perguntei.
Roxy sorriu para mim. — Ambos.
Ela puxou um de seus revólveres e começou a girar ao redor e ao redor,
fazendo o cabo de pérola e o barril de prata brilharem sob as luzes. A arma
era como uma extensão da mão dela, e ela nem precisava saber exatamente o
que estava fazendo com ela. Em vez disso, Roxy sorriu e olhou para mim o
tempo todo, a arma se movendo para cima, para baixo e de volta em sua mão.
De repente, ela parou, com a arma apontando diretamente para o meu
coração e seu dedo no gatilho. — Kapow — disse, sorrindo ainda mais do que
antes.
Finn, Bria e Owen ficaram tensos, imaginando se ela realmente iria
puxar o gatilho e atirar em mim no meio do restaurante. O mesmo aconteceu
com Brody. Mas eu ignorei o desejo de alcançar minha magia de Pedra e me
forcei a sorrir de volta para Roxy, como se isso fosse apenas uma conversa
casual.
Eu levantei minhas mãos em falsa rendição. — Você me pegou, xerife
Roxy.
— Eu tenho certeza, Gin — ela demorou. — Eu sempre capturo meu
homem. Ou mulher, neste caso.
Mesmo que eu tenha me coçado para espalmar uma faca, atravessar a
mesa e apunhalá-la no coração, eu lentamente abaixei minhas mãos para o
tampo da mesa, como se nosso jogo simulado tivesse acabado.
Mas Roxy não queria que acabasse, porque ela manteve a arma
apontada para mim, esfregando o dedo para trás e para frente no gatilho, como
se estivesse a um segundo de atirar em mim, afinal de contas...
— Aqui está! — falou uma voz.
A garçonete escolheu aquele momento exato para retornar com nossos
pedidos e começou a colocar os pratos na mesa.
O olhar verde de Roxy se fixou no meu cinza, então nos encaramos.
Depois de um segundo, ela ergueu seu Stetson vermelho para mim e guardou
a arma no coldre. Mais uma vez, nosso possível confronto foi interrompido
antes que realmente começasse.
Mas nos encararíamos de verdade em breve.
Todos nos concentramos em nossa comida, que exatamente o que eu
esperava de um restaurante de parque temático – caro e de preço exorbitante,
com porções lamentavelmente pequenas.
Finn entusiasticamente comeu sua refeição. Bria e Owen também, mas
eu só peguei um pouco da minha sopa de batata e salada de frango grelhado.
Eu simplesmente não tinha apetite. Não quando eu esperava que Roxy sacasse
a arma novamente e atirasse em mim a qualquer momento. Mas ela e Brody
se concentraram em sua comida também, com o gigante colocando batatas
fritas na sua boca entre os goles de salsaparrilha.
Nós pedimos a mesma coisa para a sobremesa – um pedaço
surpreendentemente delicioso de bolo de maçã, coberto com uma calda quente
de caramelo e sorvete derretido de baunilha. Era a única parte boa da refeição.
Mas, por outro lado, era difícil estragar a sobremesa.
Finalmente, a conta chegou, e Roxy insistiu em pagar. Bem, pelo
menos minha aspirante a assassina era legal o suficiente para pagar pelo
almoço.
Nós seis nos afastamos da mesa e saímos do restaurante. Eu olhei ao
redor, ainda esperando algo acontecer, mas eu não vi nenhum dos nossos
observadores habituais vadiando nas calçadas.
Roxy olhou para seu relógio prateado, que tinha quase tantos strass
como a fivela do cinto. — Bem, eu odeio terminar assim, mas Brody e eu
precisamos nos preparar para o show do meio-dia. Não é, Brody?
— Sim — disse o gigante.
— Finn, talvez você e eu possamos nos encontrar mais tarde para
finalmente analisar as finanças do resort? — Roxy perguntou.
— É claro — disse Finn.
— É um encontro então. Ela nos deu um sorriso brilhante. —
Aproveitem o resto do dia.
Ela inclinou seu Stetson vermelho para nós, virou-se e caminhou pela
calçada. Brody revirou os olhos e seguiu-a.
E eles apenas se afastaram. Bem desse jeito. Sem nem mesmo um
olhar para trás, para nós. Mais desconforto frio desceu pela minha espinha.
Algo estava muito, muito errado aqui.
— Isso foi quase agradável — disse Owen.
— Sim — eu murmurei. — Exceto pelo fato de que Roxy puxou sua
arma para mim, e ela e Brody nos querem mortos. Vamos. Vamos voltar para
o hotel.
Nós quatro seguimos naquela direção, e Finn cambaleou, segurando
um poste de madeira para se apoiar.
Eu olhei para ele. — Você está bem?
— Sim. Eu acho que acabei comendo demais.
Bria bufou. — Você acha? Você comeu todo o seu sanduíche de frango
grelhado e metade do meu também. Para não mencionar todos os
acompanhamentos que você comeu.
Finn gemeu e apertou seu estômago. — Eu sei, e vou pagar por isso
agora. Andem devagar, pessoal. Como, andando bem devagar.
Nós quatro entramos no fluxo de pessoas na calçada, voltando para o
hotel. De novo, olhei em volta, esperando ver nossos observadores habituais,
mas nenhum deles estava à vista, e ninguém parecia nos seguir. Eu fiz uma
careta. O que Roxy estava planejando?
Chegamos ao final da Main Street, e percebi que Finn havia ficado
vários passos atrás. — Finn? Você está bem?
Em vez de me responder, ele balançou a cabeça e cambaleou para o
beco mais próximo, ainda segurando o estômago, como se fosse vomitar. Seria
bom para ele por ser um comilão no almoço.
Finn tropeçou vários passos adiante, depois se virou e olhou para mim,
seus olhos verdes brilhantes e vítreos...
— Eu... não... sinto... tão bem... — Ele murmurou.
Seus olhos rolaram para a parte de trás de sua cabeça, e ele caiu no
chão.
Capítulo 16
— Finn! — Eu gritei. — Finn!
Corri até ele, com Bria e Owen se movendo muito mais devagar atrás
de mim. A essa altura, estávamos a meio caminho pelo beco, debaixo de uma
grande árvore de bordo com galhos nus e esqueléticos, bem longe da multidão
da Main Street.
Comecei a me agachar ao lado de Finn, que estava inconsciente, mas
Bria tropeçou em mim, quase me derrubando.
— Eu não me sinto... muito bem... ou... — ela murmurou, seus olhos
azuis tão vítreos quanto os de Finn.
Ela também desmaiou, espalhando-se pelo asfalto aos meus pés,
inconsciente como Finn. A preocupação apertou meu estômago. O que estava
acontecendo aqui?
— Gin, — Owen disse com voz baixa.
Minha cabeça virou em sua direção. Ele também estava cambaleando,
mas apontou para a entrada do beco.
Roxy estava parada ali, segurando um de seus revólveres, girando a
arma ao redor da mão, exatamente como fizera no restaurante. Brody estava
bem ao lado dela, junto com alguns dos bandidos gigantes de sua gangue.
Mas me concentrei no homem de terno escuro em pé no meio deles. Cabelos
negros, olhos negros, cavanhaque negro, sorriso presunçoso e frio.
Hugh Tucker finalmente havia se mostrado.
O vampiro me lançou um olhar entediado e acenou com a mão. — Leve-
os — ele falou. — Vivos.
Pensei naquele grão açucarado no chá doce gelado – chá que meus
amigos tinham bebido, enquanto Roxy e Brody beberam salsaparrilha. Não
era açúcar, afinal de contas, mas algum tipo de sedativo, destinado a nos
nocautear, para que Tucker pudesse fazer o que quisesse conosco.
Owen caiu de joelhos, ainda olhando para mim. — Corra, Gin — ele
sussurrou. — Corra!
Então ele também desabou no chão inconsciente.
Eu espalmei uma faca para lutar contra Tucker, Roxy, Brody e todo o
resto deles. Mas minha barriga ficou tensa, e por um momento minha visão
ficou desfocada, fazendo-me ver dois de tudo. Eu também bebi o chá doce,
apenas não tanto quanto os meus amigos.
Finn, Bria e Owen estavam caídos, e eu tinha um monte de bandidos
avançando sobre mim. Eu não seria capaz de matar todos eles antes de perder
a consciência também. Eu teria sorte se conseguisse derrubar um deles. Então
eu fiz a única coisa que podia.
Eu virei e corri para longe como o proverbial covarde de barriga
amarela.

***

Eu corri em direção ao final do beco o mais rápido que pude, sabendo


que eu tinha que colocar alguma distância entre eu e meus inimigos antes que
o sedativo – ou o que quer que eles tivessem nos dado – fazer efeito e me deixar
inconsciente também.
Mesmo agora, eu podia sentir a droga trabalhando em mim. Minhas
pernas tremeram, minha respiração ficou curta e áspera, e o suor escorria
pelo meu rosto, apesar da temperatura gelada. Meu estômago gorgolejava, um
estrondo sinistro soando como um trem de carga batendo em alta velocidade.
— Pegue ela! — Tucker assobiou em algum lugar atrás de mim. — Não
a deixem fugir, seus idiotas!
— Claro, chefe — gritou Roxy.
Eu estava tão concentrada em chegar ao final do beco que as palavras
dela não foram registradas por alguns segundos. Quando finalmente
afundaram no meu cérebro, percebi o que ela estava fazendo. Eu amaldiçoei
e alcancei minha magia de Pedra, tentando endurecer minha pele a tempo...
Crack!
Um pouco tarde demais. Uma bala atingiu a parte superior do meu
braço esquerdo, fazendo-me gritar, cambalear e bater na parede do prédio
mais próximo. Meu sangue espalhou-se por toda a madeira escura,
congelando e grudando ali como flocos de neve de formato estranho. Foi um
tiro bonito e hábil, projetado para me atrasar sem me matar.
Doeu como um filho da puta.
Levar o tiro já era ruim o suficiente, mas a bala que perfurou o meu
braço tinha o bônus adicional de ser revestida com a magia Fogo de Roxy. Ela
poderia ter apenas uma quantidade moderada de poder, mas deve ter passado
horas, se não dias, cobrindo a bala de silverstone e todas as outras em suas
armas com a magia Fogo. O resultado foi como se eu tivesse sido atingido por
um elemental poderoso, alguém como Mab Monroe ou Harley Grimes.
Enquanto a bala atravessava meu braço, Fogo explodiu na ferida, e o
fedor da minha própria carne queimando encheu o ar. Eu gemi de novo e bati
meu corpo contra o prédio, tentando sufocar e apagando as chamas, mas isso
era Fogo elemental, e ele continuou queimando e queimando.
Mais gritos saíram dos meus lábios, e eu apertei minha mão livre sobre
a ferida e explodi com a minha magia de Gelo. Isso me fez gritar também, mas
a força fria do meu poder finalmente extinguiu o Fogo.
Ainda doía como um filho da puta, embora.
O Fogo tinha cauterizado o buraco no meu braço, de modo que eu não
estava sangrando, mas eu podia sentir as queimaduras feias e empoladas que
havia deixado para trás – aquelas que pulsavam e latejavam de dor
incandescente a cada respiração que eu dava. Mesmo o efeito de resfriamento
do meu poder de Gelo não foi suficiente para impedir que a magia do Fogo
passasse por toda a ferida e pelas camadas da pele ao redor. Eu sabia
continuaria a doer até conseguir curar os dois buracos, assim como fazer algo
sobre a pele carbonizada por dentro e ao redor da ferida.
Mas primeiro, eu tinha que sair daqui. Então eu engoli o resto dos
meus gritos e me afastei da parede.
Crack!
Desta vez, a bala de Roxy atingiu a parede, bem onde minha coxa
esquerda esteve meio segundo atrás. Mais Fogo explodiu, lambendo minhas
roupas e fazendo-me jogar minha mão para afastar as chamas, mas continuei,
cambaleando ao redor da lateral do prédio e fora de sua linha de fogo, por
assim dizer.
Um alívio momentâneo.
Esse beco se abria para uma passarela cheia de gente, junto com
carrinhos de comida e de souvenir. Eu entrei no coração da multidão, evitando
aglomerados de turistas, mas a droga no meu sistema dificultou as coisas, e
acabei tropeçando em pessoas mais frequentemente do que não.
Tudo isso tornou mais fácil para Roxy e Brody me detectarem.
—Lá está ela! — A voz de Brody ecoou atrás de mim. — Pegue ela!
Pegue aquela ladra!
Roxy podia ser uma atiradora de elite, mas nem ela arriscaria atirar
em mim com todos esses turistas. Então o gigante e o resto de sua gangue dos
bandidos começaram a gritar e a gritar, como se me perseguissem fosse
apenas outro ato para a multidão. As pessoas se caíram nessa, dando um
passo atrás para abrir espaço para Brody e seus amigos irem atrás de mim.
Alguns dos turistas até começaram a gritar e aplaudir, aproveitando o
espetáculo.
Bem, se a multidão quisesse um show, eu lhes daria um bom.
Comecei deliberadamente a acertar pessoas, derrubando-as e tentando
criar tantos obstáculos atrás de mim como pude. Eu também derrubei barris,
quiosques e outras exibições, incluindo uma coleção de roupas do Velho Oeste
que fez o cara cuidando gritar maldições para mim. Chapéus de cowboy
navegavam no ar, flutuando no vento do inverno, enquanto as fivelas de cinto
prateadas tilintavam contra o pavimento.
Cheguei a outro beco no final dessa passagem, cambaleei até ele, e
voltei em direção a Main Street, onde a maioria da multidão ainda estava. Eu
não podia deixar Roxy, Brody e os gigantes me pegarem. Se isso acontecesse,
Finn, Bria e Owen estariam mortos e eu junto com eles. Torturados primeiro,
por qualquer informação que Tucker pensasse que tínhamos sobre as joias, e
depois assassinados, para que não fôssemos mais ameaças para ele e para o
Círculo. Tucker provavelmente deixaria Roxy usar todos nós na prática de tiro
ao alvo com suas balas cobertas de fogo, então ter Brody e o resto dos gigantes
despejam nossos corpos no lago.
Então eu continuei avançando, sabendo que eu não podia parar, nem
por um segundo. Mas eu estava ficando sem força – rápido. Meu coração
estava acelerado por causa de toda a corrida, de desviar e empurrar a
multidão, fazendo a droga circular pelo meu corpo muito mais rapidamente
do que o normal. Apesar de estar correndo, minhas pernas ainda pareciam
pesadas, dormentes e lentas, como se eu estivesse correndo debaixo d'água.
A visão dupla estava ficando cada vez pior, e minha cabeça parecia
desconectada do resto do meu corpo, como um balão que estava prestes a
estourar do meu pescoço e ir para o nada além do céu azul selvagem.
Pior ainda, Roxy, Brody e os gigantes estavam se aproximando de mim.
Eu podia ouvir o bater firme de suas botas no asfalto, junto com o coro
em resposta de suas esporas de prata. Em minutos eles me alcançariam, ou
a droga acabaria me derrubando, ou os dois. Então, quando cheguei ao fim
do beco e entrei na Main Street, corri para o primeiro prédio que eu vi,
esperando poder despistá-los dessa maneira.
Naturalmente, era o Good Tyme Saloon.
Eu tropecei pelas portas duplas e corri direto para uma fila de saloon
girls, que estavam balançando suas saias e levantando os calcanhares para
alguma música de piano alta e animada. As meninas não estavam felizes com
o fato de eu bater nelas e interromper seu grande final. Então, novamente,
arruinar shows estava se tornando meu hábito.
— Ei!
— Cuidado!
— O que você pensa que está fazendo!
Gritos irritados se levantaram ao meu redor, mas os turistas sentados
nas mesas em frente a pista de dança pensavam que tudo era apenas parte
do show, e eles aplaudiram, assobiaram e bateram os pés ainda mais alto do
que antes.
Uma saloon girl me empurrou para fora do seu caminho, direto para
outra, que me empurrou de volta para a primeira garota. Em um instante, eu
fui empurrada por toda a linha delas, saltando uma após a outra.
Eventualmente, eu cambaleei para frente, aterrissando bem no colo de um
cara velho com dentes amarelados que olhou para mim.
— Está aqui para me dar uma dança no colo, querida? — Ele
gargalhou.
— Aqui está sua dança no colo — eu rosnei de volta.
Estendi a mão, peguei a caneca de vidro de salsaparrilha que ele estava
bebendo e esmaguei-a sobre sua cabeça, fazendo o líquido castanho-escuro
espumar e espalhar-se pelo rosto dele.
O sujeito uivou de dor e empurrou-me para longe, mas não antes de
eu agarrar outra caneca cheia de sua mesa. Parei cambaleante no meio da
pista de dança, salsaparrilha caindo pela borda do vidro, ensopando minhas
roupas e respingando contra as tábuas do assoalho de madeira.
Nesse ponto, a música do piano parou abruptamente, as saloon girls
saíram pista de dança, e os turistas finalmente perceberam que talvez eu não
fizesse parte do show, afinal. Mas antes que eu pudesse pensar em me mover,
Brody atravessou as portas de vaivém.
— Lá está ela! — Ele gritou.
O gigante veio em minha direção, seus braços esticados. Abaixei-me
para fora do caminho do seu abraço de urso, virei e esmaguei a caneca de
salsaparrilha na parte de trás de sua cabeça. O vidro quebrou, fazendo Brody
gritar, perder seu chapéu de cowboy, cambalear para frente e cair diretamente
em uma mesa cheia de homens, derrubando suas cestas plásticas de asas e
nachos no chão e fazendo-os derramar suas cervejas neles mesmos.
Esse último pecado capital foi o que oficialmente começou a briga de
saloon.
Os caras ficaram realmente chateados por agora terem cerveja em suas
roupas ao invés de bebê-la, e eles se levantaram. Dois avançaram em direção
a Brody, enquanto os outros dois vieram até mim.
Eu estava cambaleando tanto que mal conseguia ficar de pé, e muito
menos revidar, então peguei a saloon girl mais próxima, girei-a como se
estivéssemos fazendo um do-si-do e empurrei-a para os dois caras que
estavam na minha direção. Ela gritou, e os três caíram no chão em um monte
de braços, pernas, renda preta e crinolina.
Click.
Sobre o caos, ouvi o martelo bater de volta em um revólver, e olhei para
cima para ver Roxy de pé dentro das portas do saloon, sua arma apontada
para mim, a intenção maligna brilhando em seus olhos verdes pálidos. Ela
deu um passo à frente para melhorar sua pontaria e se certificar de que não
atiraria em um turista por engano, mas mais e mais pessoas começaram a
empurrar, gritar e brigar um com o outro, bloqueando sua mira. Eu me virei
rapidamente e corri direto para o bar, empurrei outro conjunto de portas
duplas de vaivém e terminei na parte de trás do saloon.
Isso me lembrou da parte de trás do Pork Pit, com guardanapos,
canudos, canecas e outros suprimentos empilhados em prateleiras de metal,
junto com várias geladeiras e alguns freezers zumbindo contra as paredes. Por
um louco momento louco, eu considerei entrar em um freezer para me
esconder, mas eu ficaria sem ar antes que Roxy e Brody parassem de procurar
por mim.
Então, eu tropecei para a porta dos fundos, abrindo-a e cambaleando
para fora. Eu estava esperando outro beco, mas eu estava na área de descanso
com seu amplo pavilhão de madeira abrigando todas as roupas de cowboy,
chapéus, botas e muito mais.
Um cavalo branco amarrado a um poste próximo relinchou e se
esquivou enquanto eu mancava, obviamente percebendo que algo estava
seriamente errado comigo e não querendo fazer parte disso.
— Quieto, Silver — eu assobiei. — Você vai me entregar.
Então percebi que estava tentando calar um cavalo e dei uma risadinha
boba. Eu nunca, nunca dei uma risadinha, mas agora, tudo que eu queria
fazer era me deitar no chão e rir, rir e rir. Oh sim. Eu estava perto de desmaiar
por causa de qualquer droga que tivesse sido colocada naquele chá doce.
Eu não conseguiria fugir de Roxy e Brody, mas talvez eu pudesse ser
mais esperta do que eles. Tudo o que eu tinha que fazer era encontrar um
lugar para me esconder até que a droga estivesse fora do meu sistema. Então,
quando minhas risadinhas se fossem, eu poderia voltar e matar cada um
desses bastardos, começando com Hugh Tucker. Não era o melhor plano que
eu já tinha feito, mas meu cérebro estava muito lento e confuso para pensar
em qualquer coisa neste momento.
Mas onde se esconder?
O cavalo não queria nada comigo, e eu não era nenhuma cowgirl, então
eu não podia montar no animal e cavalgar para longe. Dado que o pavilhão
estavam todos abertos, Roxy e Brody facilmente poderiam me ver escondida
atrás dos barris, fardos de feno e prateleiras de roupas. Eu não tinha a energia
para tentar subir as escadas até o segundo andar do saloon, muito menos
subir até o telhado, e as únicas outras coisas ali eram cactos falsos, bolas
quebradiças de erva daninha e a diligência que era usada no show do meio-
dia...
A diligência.
Isso poderia funcionar.
Caminhei até a diligência, que estava estacionada sob o seu próprio
pavilhão bem no fundo da área de descanso. De longe, a diligência parecia
nova e brilhante, mas de perto, eu podia ver o quão abatida, amassada e
desgastada realmente estava, assim como tudo no parque temático. Pedaços
de metal cintilavam como minério de prata por todos os lados, onde a tinta
vermelha brilhante tinha sido lascada, e todas as quatro rodas pareciam estar
penduradas nos eixos. A porta da diligência estava aberta, como se estivesse
quebrada e não fechasse direito, e eu pude ver uma grande caixa forte – a
mesma que estava cheia de ouro falso durante o show de ontem.
A caixa forte parecia grande o suficiente para eu me esconder, mas
hesitei. Era um esconderijo tão óbvio, e sem dúvida Roxy e Brody olhariam na
diligência quando finalmente abrissem caminho através da briga de saloon e
corressem até aqui. Enquanto eu amaldiçoava e começava a me virar para
encontrar um esconderijo melhor, avistei uma escada na parte de trás da
diligência que levava ao teto. Vários baús tinham sido amarrados no teto para
representar a bagagem falsa, mas parecia haver espaço suficiente para eu me
colocar entre eles. Ainda assim, hesitei novamente. Porque meus inimigos sem
dúvida verificariam o teto da diligência também...
— Você a vê? — A voz de Brody ecoou pela porta que eu deixei aberta,
na parte de trás do saloon. — Onde ela foi?
Eu estava sem tempo e opções, então eu peguei a escada. Meus
músculos pareciam tão fortes quanto espaguete molhado, mas consegui me
içar para o teto. O esforço me deixou ainda mais tonta, e tudo se misturou
como se eu estivesse em um carrossel. Cambaleei para o lado e quase caí da
diligência antes que minha visão clareasse, e me endireitei lentamente.
Duas fileiras de baús rodeavam a parte superior da carruagem, com
uma estreita faixa de espaço entre elas. Eu encolhi meu estômago, puxei meus
ombros para trás, e abaixei, me contorcendo no meu caminho para o espaço
como um peixe tentando escapar de um anzol. Era um ajuste apertado, mas
eu consegui, mesmo que o meu corpo estivesse tão rígido e reto como uma
tábua descansando entre as duas fileiras de bagagem.
Uma pequena fenda corria entre dois dos baús onde eles não tinham
sido colocados um contra o outro, então eu me contorci um pouco mais alto
até que eu podia olhar através da abertura e ver a área de descanso. O esforço
fez minha cabeça girar, e levou vários segundos antes que eu pudesse me
concentrar novamente.
Eu podia ouvir Roxy e Brody gritando para os gigantes moverem suas
bundas, e alguns segundos depois, todos eles entraram correndo pela parte
de trás do saloon. Eles pararam, olhando de um pavilhão para o próximo, e
seus rostos se contorceram de fúria quando não me viram.
— Espalhem-se! — Roxy latiu. — Encontrem Blanco! Agora!
— Vocês a ouviram! — Brody falou. — Procurem em toda parte!
Os gigantes correram para seguir os comandos de seus chefes,
entrando nos becos que levavam de volta à Main Street, enquanto Roxy e
Brody ficavam para trás na área de descanso. Os dois se espalharam, armas
em punho, procurando atrás de cada barril, fardo de feno e roupas, como eu
esperava. Brody até pegou um forcado comprido e afiado e enfiou-o em todos
os bebedouros, para o caso de eu ter desenvolvido brânquias e poder respirar
embaixo d'água como um peixe. O pensamento sarcástico me fez querer dar
uma risadinha de novo, mas engoli o riso louco.
— Ela tem que estar por aqui em algum lugar — disse Brody. — Por
que você não deu a ela uma dose maior de sedativo?
— Eu não podia fazê-la beber o chá — Roxy retrucou. — Não é culpa
minha que o cozinheiro não tenha dissolvido todo o pó nele como eu disse
para fazer, e Blanco não gostou do sabor. Além disso, ela ainda bebeu quase
meio copo. Isso deveria ser mais que suficiente para derrubá-la. Os outros três
estão desmaiados. Eu tenho alguns dos seus meninos levando-os até o hotel
para que Tucker possa questioná-los quando acordarem.
— Eu ainda não vejo porque ele os quer vivos, — Brody disse. —
Deirdre provavelmente vendeu essas joias muito tempo atrás. Se elas
estivessem aqui, nós já as teríamos encontrado. Ele deveria apenas cortar
suas perdas e matá-los em vez de nos fazer manter essa charada estúpida.
— E eu não te pago para pensar, Sr. Dalton — uma voz suave
murmurou.
Roxy e Brody estremeceram e lentamente viraram-se. Hugh Tucker
estava de pé na porta dos fundos do saloon. O vampiro deve ter seguido a
comoção da minha corrida louca pelo parque.
Ele andou até Brody, e o gigante tirou seu chapéu preto em sinal de
respeito e deferência. Roxy também removeu seu Stetson vermelho e se
afastou alguns passos para longe de seu parceiro. Ela não queria ser o centro
da atenção de Tucker. Inteligente.
E nem Brody, a julgar pela forma como o gigante se mexeu, fazendo as
suas botas de couro rangerem e as esporas anexas guincharem.
— Ouvi dizer que Blanco lhe bateu com a sua própria arma durante o
show de ontem. Isso é verdade? — A voz de Tucker era firme, sem um traço
de malícia, mas seus olhos eram como dois buracos negros em seu rosto,
completamente desprovidos de emoção.
Brody engoliu em seco e assentiu. — Sim, senhor, eu temo que seja...
Antes que ele pudesse terminar, Tucker pegou o revólver de Brody de
sua mão, e bateu a arma no rosto do gigante.
Crack.
O som audível do nariz do gigante quebrando soou como um tiro na
área de descanso.
Brody gritou e cambaleou para trás, o sangue saindo do nariz inchado.
Por um segundo, seu rosto ficou vermelho e roxo de surpresa e raiva, e sua
mão pairou sobre o segundo revólver preso à cintura, como se estivesse
pensando em atirar em Tucker.
Mas Tucker arqueou as sobrancelhas negras num desafio silencioso, e
Brody pensou melhor nas coisas e tirou a mão de sua arma. Tucker jogou o
primeiro revólver de volta para o gigante, que lutou para pegá-lo.
Eu pisquei, imaginando se estava alucinando com a rapidez com que
Tucker fez isso, mas, pela primeira vez, minha visão permaneceu clara. Beber
sangue de outras pessoas dava à maioria dos vampiros força e sentidos
aprimorados, mas pareceu tornar Tucker excepcionalmente veloz. Ou talvez
ele tivesse algum tipo de habilidade vampírica natural que o ajudasse nisso.
De qualquer forma, ele quebrou o nariz de Brody em um piscar de olhos. Eu
teria que encontrar uma maneira de descobrir como enfrentar a velocidade de
Tucker antes de matá-lo.
— Eu não te pago para pensar — repetiu Tucker. — Eu te pago para
seguir as ordens e obter os resultados que eu quero. E, agora, quero que Gin
Blanco seja encontrada e amarrada como um presunto de Natal. Então saia,
faça seu maldito trabalho e encontre-a. Ou da próxima vez, vou quebrar muito
mais do que apenas o seu nariz. — Seus olhos negros se concentraram em
Roxy. — De ambos.
— Sim, senhor! — Roxy e Brody falaram as palavras em uníssono, mas
Tucker já havia voltado para o saloon, desaparecendo de vista.
Eles esperaram alguns segundos para se certificar de que ele não
estava voltando, então lentamente relaxaram. Brody tirou a bandana
estampada de preto e branco e apertou-a contra o nariz, tentando impedir que
a corrente de sangue escorresse pelo rosto. Roxy esfregou o polegar sobre o
cabo de pérola de seu revólver, um tique nervoso.
— Você ouviu o que ele disse — ela rosnou. — Agora vamos encontrar
essa cadela antes que ele volte e cumpra sua promessa.
Brody deu a ela um olhar sombrio, mas ele limpou o resto do sangue
de seu rosto e ajudou-a a procurar na área de descanso. Não demorou muito,
e finalmente os dois se viraram para encarar a diligência, já que era o único
lugar que ainda não tinham olhado.
— Ela não está aqui — disse Brody. — Eu estou dizendo a você que
Blanco está muito longe.
— Bem, verifique a diligência de qualquer maneira, — Roxy retrucou.
— Mandei gigantes para todos os lados do parque e do hotel antes de nos
encontrarmos com Blanco e os outros no restaurante. Todos eles enviaram
uma mensagem de texto dizendo que ela não passou por eles. Então ela tem
que estar em algum lugar no parque temático.
Brody soltou um suspiro longo, alto e sofrido, mas ele seguiu Roxy até
a diligência. Ela espreitou na carruagem abaixo de mim, e um leve rangido
soou quando ela abriu a tampa da caixa forte, apenas certificando-se que eu
não tinha me amontoado lá.
— Olhe em cima no teto — ela ordenou a Brody.
Mais rangidos soaram, desta vez das molas, e todo o vagão inclinou
sob o peso do gigante quando ele segurou a escada na parte de trás.
Eu silenciosamente amaldiçoei, mas não havia nada que eu pudesse
fazer. A droga tinha tomado completamente o meu corpo, fazendo eu me sentir
flácida, lânguida e ligeiramente desconectada de tudo o que estava
acontecendo. Além do mais, eu estava tão imprensada entre as duas filas de
baús que eu não conseguia nem segurar uma faca para pegar o gigante de
surpresa quando ele finalmente me visse.
E ele iria me ver.
Tudo o que Brody tinha que fazer era olhar por cima da primeira fileira
de baús, e ele me veria deitada aqui. Então ele ou me jogava no esquecimento
ou me pegaria, me jogaria para fora da diligência, e deixaria Roxy colocar
algumas balas em mim. De qualquer forma, eu seria pega...
— O que vocês dois estão fazendo? — Uma voz baixa rosnou. — E por
que todo mundo está correndo como galinhas com a cabeça cortada?
Brody parou de subir, embora eu pudesse ver o topo do chapéu preto
do gigante na parte traseira da diligência. Virei a cabeça e olhei para trás
através da fenda nos baús.
Ira Morris estava na área de descanso, os braços cruzados sobre o peito
e um olhar zangado no rosto enrugado. Eu nunca fiquei tão feliz em ver o anão
mal-humorado.
— Bem — ele retrucou. — O que está acontecendo? Vocês dois
deveriam estar se preparando para o show do meio-dia, e não ficar
conversando por aqui. E o que há de errado com o nariz de Brody?
Roxy deu um sorriso a Ira. — Na verdade, vamos ter que adiar o show
até o final desta tarde.
Os olhos de Ira se estreitaram. — E por que isso?
— Brody e os gigantes estavam correndo atrás de um batedor de
carteiras que fugiu com a bolsa de uma mulher — disse Roxy com uma voz
suave. — O batedor de carteira quebrou o nariz de Brody na briga e
esperávamos encontrá-lo antes que ele saísse do parque. Não é verdade,
Brody?
— Sim, — o gigante disse. — Está certa.
Ira bufou, depois estendeu as mãos para longe. — Bem, esse batedor
de carteiras obviamente não está por aqui. Então, por que você não desce daí
antes de quebrar essa escada? É muito frágil para aguentar um cara grande
como você, e eu não preciso de mais nada para consertar por aqui.
Brody deu ao outro homem um olhar teimoso, mas desceu da escada,
fazendo a carruagem inteira balançar de um lado para o outro com a perda
repentina de seu peso. — Tanto faz — ele murmurou.
Ira olhou para ele por um momento antes de se virar para Roxy. —
Agora, por que vocês dois não vão procurar em outro lugar e me deixem fazer
o meu trabalho? Eu preciso dar uma olhada nas rodas da diligência e ter
certeza de que tudo está pronto para o próximo show. Sempre que vocês dois
estiverem prontos e finalmente decidirem fazê-lo.
Roxy olhou para Brody, que balançou a cabeça, dizendo a ela que eu
não estava me escondendo em cima da diligência. Pela primeira vez, tive sorte
e Ira distraiu o gigante antes que ele pudesse realmente olhar para o teto. Um
pequeno favor, mas eu aceitaria o que eu conseguisse agora.
— Bem? — Ira estalou. — Vocês vão sair do meu caminho e me deixar
fazer o meu trabalho? Ou vocês ficarão parados aí o dia todo?
Raiva acendeu nos olhos de Roxy, mas ela queria me encontrar mais
do que ela queria lidar com ele agora. — Claro, Ira — disse ela. — Vamos,
Brody. Vamos ver se os outros tiveram mais sorte em achar aquele batedor de
carteiras.
Ela sorriu para o anão uma última vez, então ela e Brody deixaram a
diligência para trás, atravessaram os pavilhões, entraram na parte de trás do
saloon e fecharam a porta atrás deles.
— Já vai tarde, — Ira murmurou.
Eu soltei um suspiro suave de alívio. Roxy e Brody se foram, e tudo o
que eu tinha que fazer era esperar que Ira examinasse a diligência e saísse.
Então eu poderia descer do teto e encontrar algum lugar melhor para me
esconder até que meu corpo eliminasse o sedativo do meu sistema.
Eu realmente deveria saber melhor do que pensar que estava livre.
Ira olhou por cima do ombro, certificando-se de que Roxy e Brody se
foram, depois subiu na escada da diligência, inclinou o chapéu-coco preto na
cabeça e olhou para mim.
— Como você chegou aí? — Ele disse. — Coisinha determinada, não é?
Tudo que eu podia fazer era olhar para ele, meu corpo sentindo frio,
pesado e entorpecido, e minha mente ficando cada vez mais nebulosa,
enquanto o sedativo passava por mim.
Ele balançou a cabeça. — Agora eu vou ter que cortar todas as cordas
e mover todos os baús para tirá-la daí...
O anão ficou resmungando para si mesmo sobre quantos problemas
eu estava causando a ele, mas eu não podia fazer nada para detê-lo, então eu
o ignorei.
Meus dedos pareciam tão frios, pesados e entorpecidos quanto o resto
do meu corpo, e eu me atrapalhei com o bolso da minha jaqueta, tentando
tirar meu celular. Levei três tentativas, mas finalmente consegui.
Olhei para a tela, tentando ver meus contatos. Pela primeira vez, fiquei
feliz que Silvio tivesse programado meu telefone com uma runa de aranha
especial ao lado de seu nome. Como o Sinal do Batman, mas ao contrário,
como se você quisesse invocar Alfred em vez de Bruce Wayne.
Ira estava em pé em cima da diligência, e colocou a mão no bolso da
calça jeans, tirou um canivete e abriu-o.
Eu toquei na tela, determinada a fazer minha ligação antes que o anão
cortasse as cordas e usasse aquela faca para me cortar. Um segundo depois,
o telefonema conectou. Como esperado, a pessoa do outro respondeu quase
que imediatamente.
— O que foi, Gin? — A voz de Silvio encheu meu ouvido. — Você precisa
de algo?
— Eu... — Essa única palavra saiu como um grasnar distorcido.
— Gin? — A voz de Silvio imediatamente se aguçou. — O que está
acontecendo? O que está errado?
— Eu... — eu tentei de novo, mas o som estava tão truncado quanto
antes.
O balão da minha mente parecia estar cada vez mais longe do resto de
mim, cada vez mais alto e cada vez mais rápido ao mesmo tempo. Eu precisava
dizer a Silvio o que havia acontecido. Sobre Finn, Bria e Owen sendo
capturados. Sobre eu estar drogada. Sobre o homem se aproximando de mim
com uma faca.
Mas apenas um pensamento encheu minha mente, junto com aquelas
risadinhas estranhas e loucas. — Não coma o churrasco — eu sussurrei,
risadinhas pontuando cada palavra. — Não coma o churrasco...
— Gin? Você está bêbada? Você está machucada? Onde você está? O
que está acontecendo? — A voz de Silvio se afiou com cada palavra, e eu pude
ouvir seus dedos voando sobre um teclado.
Eu me perguntei se o vampiro já estava tentando rastrear meu telefone.
Provavelmente. Ele era extremamente eficiente dessa maneira. O pensamento
me fez dar risadinhas de novo.
Ira se inclinou e tirou o telefone dos meus dedos. — Eu não acho que
você deveria fazer ligações agora.
— Gin? Gin! Quem é que está falando? Você ainda está aí? Gin! — A
voz de Silvio continuou a soar pelo telefone.
Ira revirou os olhos para os gritos frenéticos de Silvio, encerrou a
ligação e colocou meu celular no bolso da sua calça jeans, como se fosse dele.
Eu realmente estava louca porque, em vez de me preocupar, concentrei meu
olhar nas luzes brancas que piscavam no suéter de Natal do anão. Luzes tão
bonitas, bonitas...
Ira franziu o cenho e se inclinou novamente, o canivete brilhando como
prata líquida em sua mão.
Misericordiosamente, a droga finalmente me puxou para baixo antes
que eu visse ou o sentisse ele me apunhalar com a lâmina.
Capítulo 17
A festa anual de Natal da minha mãe estava em pleno andamento.
Eu espiei através do corrimão que se alinhava na varanda do segundo
andar, olhando para todas as pessoas elegantemente vestidas enchendo nossa
grande sala de estar abaixo. Homens de smoking preto clássico, abotoaduras
de diamante piscando em suas mangas. Mulheres em vestidos de baile
coloridos, safiras, rubis e esmeraldas penduradas em suas orelhas, pescoços e
pulsos. Mesmo aqui em cima, acima das canções suaves e vibrantes dos
harpistas, eu podia ouvir os sussurros de todas aquelas pedras preciosas, cada
uma cantando em vão sua própria beleza cintilante.
Garçons vestidos de smoking vermelho e verde atravessavam a
multidão, entregando aperitivos deliciosos e taças de champanhe dourado e
borbulhante, e todos falavam, comiam, riam, bebiam e se divertiam. Visco,
lantejoulas e luzes brancas suaves estavam penduradas ao longo da lareira,
com flores de Natal em vasos flanqueando a lareira com suas chamas alegres
e crepitantes. Ainda havia mais vegetação, luzes e flores de Natal nos cantos
da sala, e o ar cheirava a seiva de pinheiro misturado com uma pitada de
fumaça de madeira. A cena bonita me lembrou de um dos globos de neve da
minha mãe. Tudo o que precisava era de alguns flocos e glitter rodopiando no
ar para completá-la.
Embora fosse quase meia-noite, a festa ainda estava forte, e minha mãe
estava bem no meio das coisas, passando de um grupo de convidados para o
próximo, sorrindo, rindo e apertando a mão de todos. Depois daquela tensa
reunião em seu escritório, mamãe veio até a sala da família para ajudar Bria e
eu a decorar a nossa árvore de Natal, embora ela tenha descartado todas as
minhas perguntas sobre Hugh e Deirdre e o que eles queriam que ela fizesse.
Em vez disso, mamãe fingira que estava tudo bem, exatamente como estava
fazendo agora, misturando-se com todos os seus convidados.
Eu deveria estar na cama, mas não conseguia dormir, então eu saí para
ver a ação. Mas isso fora vinte minutos atrás e eu estava ficando entediada.
Então me afastei da varanda e fui até a árvore de Natal no canto da sala da
família, aquela que minhas irmãs e eu havíamos decorado hoje cedo. Bem, a
maior parte estava decorada. Vários globos de neve e outros ornamentos ainda
estavam espalhados pelo chão, esperando para serem pendurados. Mas a
árvore estava decorada o suficiente para mim.
Deitei-me debaixo da árvore de Natal e deslizei para o canto mais
distante, deitada de costas e examinando os galhos com todos os ornamentos,
luzes e enfeites acima. Esta era uma das minhas coisas favoritas para fazer
todos os anos. Normalmente, eu faria na manhã de Natal, quando estávamos
todos reunidos ao redor da árvore e acabávamos de abrir nossos presentes,
mas Annabella havia zombado de mim no ano passado, dizendo que apenas
uma criancinha se arrastaria atrás da árvore. Então, eu apenas iria em frente
e faria isso agora, quando ela não estava por perto para me provocar.
Não sei quanto tempo fiquei lá, olhando para as luzes e os suaves
reflexos de vidro, mas eu devo ter cochilado porque quando eu deu por mim a
mansão estava em silêncio. A conversa, o riso, as canções. Todo o barulho da
festa havia desaparecido. Todos devem ter ido para casa, enquanto eu estava
dormindo.
Eu esfreguei a areia dos meus olhos e me sentei. Pelo menos eu comecei,
mas depois lembrei onde estava e baixei-me no último segundo. Eu consegui
evitar derrubar a árvore de Natal e tudo mais. Isso teria sido um desastre,
especialmente com todos os globos de neve da minha mãe sobre ela. Sem
dúvida que eu teria quebrado cada um deles.
Quando eu comecei a me arrastar para fora da árvore, o rangido das
escadas me fez parar. Isso provavelmente era a mamãe, vindo para desligar as
luzes de Natal. Então eu fiquei onde estava, esperando que ela simplesmente
andasse pelo corredor e não abrisse nossas portas e olhasse para dentro para
ter certeza de que estávamos na cama.
Eu me agachei e espreitei através dos galhos, esperando ver seus saltos
pretos. Mas, em vez disso, um par de botas pretas apareceu no topo da escada.
Eu fiz uma careta. Por que mamãe usaria botas?
Ela não faria. Por um segundo, achei que devia ser Annabella, voltando
para casa tarde da noite após encontrar seus amigos, mas depois percebi que
as botas eram grandes demais para pertencerem a ela. Eu congelei, então
lentamente olhei através dos galhos, minha mente finalmente juntando os
pedaços.
Alguém estava em nossa casa.
As botas se adiantaram, e um homem alto emergiu das sombras. Ele
estava todo vestido de preto, com luvas pretas e uma máscara de esqui preta
cobrindo a cabeça e o rosto.
Um intruso estava em nossa casa.
Esse pensamento horrível continuava sacudindo dentro do meu cérebro,
com perguntas surgindo ao lado dele, como luzes de Natal brilhando à vida uma
após a outra. O que esse homem estava fazendo aqui? Isso era um... roubo?
Várias casas no bairro tinham sido roubadas nas últimas semanas,
pessoas voltando para casa de festas e outras noites de folga para descobrirem
que alguém havia invadido o local, enquanto estiveram fora, e roubado todos os
presentes debaixo de suas árvores, assim como o Grinch.
Eu prendi a respiração, imaginando o que o homem poderia roubar, já
que não tínhamos colocado nenhum dos nossos presentes embaixo da árvore
ainda. Ou talvez ele estivesse aqui pelas joias da minha mãe, algumas das
bugigangas antigas da casa ou até mesmo pilhas de dinheiro no cofre do
escritório. Ele deu um passo à frente e baixou a mão para o lado.
Foi quando eu vi a arma.
Meus olhos se arregalaram e minha respiração ficou presa na minha
garganta. Não estava aqui para roubar – estava aqui para matar.
Ao meu redor, as pedras da nossa mansão sussurravam, mas os
trinados fúteis e felizes das pedras preciosas dos convidados tinham sido
substituídas por murmúrios sombrios e ásperos. Quem quer que fosse o
atirador, ele era perigoso, e suas más intenções eram suficientemente brutais
para já terem deixado vibrações emocionais na pedra.
O homem foi até a árvore e parou, como se estivesse admirando as
decorações. Eu coloquei minhas mãos sobre a minha boca para conter o grito
subindo em minha garganta e me encolhi contra a parede, desesperadamente
desejando que eu pudesse me derreter nela e escapar pelo outro lado.
Mas tudo que eu podia fazer era ficar quieta e silenciosa como um rato,
esperando que ele não olhasse para o chão e me visse através dos galhos
grossos, enfeites prateados e luzes cintilantes. O cheiro de seiva de pinheiro,
que antes era tão agradável, agora parecia um veneno deslizando pela minha
garganta, sufocando-me de dentro para fora.
Finalmente, o homem se afastou da árvore e deixou a área da família
para trás. Ele parou no meio do corredor, como se não tivesse certeza para onde
ir. Então ele começou a avançar novamente, e eu percebi que ele estava
andando em direção aos quartos de Annabella e Bria.
O pensamento do atirador machucando minhas irmãs cortou um pouco
do meu pânico, e a raiva acendeu no lugar do meu medo. Ele não ia machucá-
las. Não se eu pudesse evitar. Eu mordi meu lábio. Mas o que eu poderia fazer
contra um cara com uma arma? Eu não sabia, mas tinha que fazer alguma
coisa, mesmo que fosse apenas fugir, encontrar minha mãe e avisá-la sobre o
que estava acontecendo. Mas ela também poderia estar dormindo, e eu podia
ser a única que percebeu que o intruso estava na casa.
Assim, era minha obrigação detê-lo.
Esperei até que o atirador se movesse mais para dentro do corredor,
então lentamente saí de trás da árvore. Eu me agachei ao lado da árvore e me
inclinei para frente, olhando para o corredor mais adiante. O homem
desacelerou, como se contasse as portas que cobriam as paredes e tentasse
decidir em qual delas ele queria entrar.
Olhei para as escadas, esperando que minha mãe aparecesse de
repente, viesse correndo até aqui, e esmagasse-o com sua magia de Gelo, mas
ela não fez. Na verdade, eu não ouvi nenhum movimento em qualquer lugar da
casa.
Minha mente se agitou e se agitou, tentando formular um plano que me
deixaria salvar a todos. Eu poderia usar minha magia de Pedra para endurecer
minha pele do jeito que minha mãe estava me ensinando. Isso me manteria a
salvo das balas do atirador, mas Annabella e Bria não tinham herdado a magia
de Pedra do nosso pai para que elas pudessem se proteger como eu podia.
Mas minha magia não me ajudaria a realmente machucar o homem em
troca, então eu olhei em torno de novo, procurando por algum tipo de arma que
eu poderia usar contra ele. Talvez se eu pudesse me esgueirar e bater nele por
trás, eu poderia detê-lo por tempo suficiente para gritar, sair correndo e soar o
alarme. Depois disso, tudo que eu tinha que fazer era esperar minha mãe, e
tudo ficaria bem.
Eu tinha certeza disso.
Mas as únicas coisas ao meu redor eram os enfeites de vidro, enfeites
prateados e globos de neve que não tínhamos conseguido colocar na árvore. Não
exatamente ótimas armas. Ainda assim, peguei o maior e mais pesado globo e
avancei alguns passos, pronta para saltar, alcançar minha magia, começar a
gritar e invadir o corredor atrás do intruso.
Mas ele não abriu nenhuma das portas, e ele passou pelos quartos onde
Annabella e Bria dormiam. Em vez disso, ele virou a esquina no final do corredor
e desapareceu. Mais degraus rangeram e percebi que ele estava indo para o
andar térreo.
Eu fiz uma careta. Por que ele iria lá? A única coisa daquele lado da
casa era o escritório da minha mãe...
Eu respirei fundo. Ele estava aqui para matar minha mãe. Eu sabia
disso, no fundo dos meus ossos, assim como eu sabia que tinha que pará-lo.
Eu fiquei de pé e corri para o final do corredor. Eu olhei ao redor da
esquina lá, procurando pelo homem armado. Com certeza, ele já estava lá
embaixo, movendo-se mais rápido agora, e entrando no corredor que o levaria
ao escritório da minha mãe. Eu corri escada abaixo atrás dele, meus pés
descalços mal fazendo barulho no chão.
O intruso estava agora do lado de fora do escritório da minha mãe,
parado no mesmo lugar onde eu estive poucas horas atrás, vendo mamãe falar
com aquele vampiro Hugh, junto com aquela mulher Deirdre. Eu estremeci,
lembrando dos olhos negros mortos do vampiro. Eu me perguntei se Tucker era
o atirador mascarado. Ele certamente parecia o tipo que se esgueirava para
dentro de uma casa e matava alguém no meio da noite.
O homem enfiou a mão no bolso da calça, tirou um silenciador e colocou-
o na ponta da arma. Enquanto ele estava distraído, eu na ponta dos pés dei
mais alguns passos e me agachei atrás de uma mesa encostada na parede.
Quando ele terminou com o silenciador, o homem estendeu a mão livre
e gentilmente tentou abrir a porta do escritório. A maçaneta girou facilmente, e
ele abriu a porta um pouco e parou, esperando para ver se minha mãe tinha
notado alguma coisa. Mas ela não tinha, e eu podia ouvir o estalido, contínuo
clack-clack de sua digitação enquanto ela trabalhava em seu computador.
O homem respirou fundo como se para se controlar, em seguida, abriu a
porta e invadiu o escritório. Pânico e medo surgiram na minha garganta,
sufocando-me, mas afastei os sentimentos, fiquei de pé e corri, sabendo que
tinha que chegar até ele antes de ele puxasse o gatilho.
— O que... o que você está fazendo...? — Mamãe perguntou em uma voz
chocada.
— Saudações do Círculo — o homem falou, embora eu mal registrasse
suas palavras, muito menos tinha tempo para pensar sobre o que elas queriam
dizer.
Eu parei na porta. Na minha frente, o homem ergueu sua arma para
disparar. Mamãe recuou da mesa e ficou de pé, mandando a cadeira rolando
pelo chão, mas ela ia ser muito lenta para sair do caminho das balas, muito
menos reunir sua magia de Gelo para criar um escudo para se proteger.
Essa raiva me encheu novamente, mais forte do que antes, e eu soltei
um grito alto e avancei.
O homem ficou tão surpreso que virou para um lado, sua arma
vacilando, mas não diminuí a velocidade. levantei minha mão e esmaguei o
globo de neve no lado da cabeça dele o mais forte que pude.
O globo se estilhaçou no impacto, espalhando neve falsa, glitter e água
por toda parte, e um pedaço de vidro afiado, recortado e curvo cortou minha
mão direita, deixando um corte profundo e feio no centro da minha palma. Gritei
de dor e o homem deu um passo à frente e bateu a pistola no meu rosto. Dor
explodiu na minha bochecha e eu voei pela sala, bati na parede e deslizei para
o chão.
— Garota estúpida — ele rosnou, apontando a arma para mim. — Você
deveria ter ficado em seu quarto.
Atordoada, eu olhei para o cano negro de sua arma, sabendo o que viria
a seguir e que não havia nada que eu pudesse fazer para pará-lo...
— Eu te disse, senhor — uma voz baixa rosnou. — Você precisa parar
de ligar para este telefone. Ela não está mais acordada do que a última vez
que ligou exatamente um minuto atrás.
Meus olhos se abriram. Eu conhecia aquela voz trêmula e com sotaque
do oeste . Esse era Ira Morris, e a menos que eu ainda estivesse sonhando, o
anão não tinha me matado depois de tudo.
Então, o que ele queria comigo?

***

Levei alguns segundos para limpar o resto das teias de aranha


sonhadoras da minha mente. Sentei-me devagar e percebi que estava deitada
em uma cama confortável e macia no que parecia uma cabana rústica.
Paredes de madeira escuras, coloridos tapetes trançados no chão, lareira de
pedra cinza ladeada por um conjunto de cadeiras de balanço acolchoadas. O
espaço tornava-se ainda mais acolhedor por todas as fotos. Elas cobriam cada
polegada disponível das paredes e mostravam o hotel Bullet Pointe, o parque
temático e o lago ao redor. Essa era definitivamente a casa de Ira.
Lembro-me vagamente de que Finn dizendo-me dizer que o gerente do
resort morava em uma cabana na propriedade. Parecia que Ira tinha pelo
menos ficado com sua casa quando Deirdre o rebaixara, se não seu escritório
no hotel, que Roxy havia assumido. Bom para ele.
Eu balancei minhas pernas para o lado da cama, estremecendo com
as batidas na minha cabeça, assim como as dores maçantes que ondulavam
através do meu peito, costas e pernas. Em termos de cavalo, eu senti como se
tivesse sido montada com força e deixada molhada. Esquisito. Eu não tinha
pensado que Roxy tinha me machucado tanto assim, mas quase todas as
partes de mim sentiam-se machucadas, espancadas e maltratadas.
Mas eu empurrei a dor e avaliei a minha situação. Minhas botas
estavam apoiadas em um tapete ao lado da cama, mas eu ainda estava usando
meu jeans preto. Minha jaqueta de lã preta fora removida e cobria uma das
cadeiras de balanço, e a manga esquerda do meu suéter vermelho também
tinha sido cortada.
Afastei as abas do tecido. Uma bandagem branca estava em volta do
meu braço esquerdo, amarrada com um pequeno nó. Eu flexionei meu punho
e movi meu braço e ombro. Um pouco de rigidez e dor, mas nada que eu não
pudesse suportar. Olhei em volta e vi duas latas vazias da pomada de cura da
Jo-Jo em cima da cômoda ao longo da parede. Ira deve tê-las encontrado nos
bolsos da minha jaqueta, percebido o que elas eram, e usado nas queimaduras
de Fogo e buracos de balas que Roxy tinha colocado no meu braço.
Ainda mais importante, as minhas cinco facas de silverstone foram
colocadas em uma fileira na cômoda. Ira deve tê-las removido, junto com
minhas botas e jaqueta, para me deixar mais confortável. Mas eu me sentia
nua sem minhas facas, então me levantei e as coloquei de volta em suas
fendas habituais – uma contra a parte de trás das minhas costas, duas nas
minhas mangas e duas enfiadas em minhas botas.
Abri a porta do quarto e saí para a parte principal da cabana, que era
uma sala de estar, sala de jantar e cozinha, tudo em um só. Uma lareira
grande ocupava a maior parte de uma parede, flanqueada por um sofá verde
com cobertores coloridos dobrados nas costas. Duas mesinhas nas duas
extremidades do sofá exibiam lâmpadas em forma de botas de caubói e outras
bugigangas com temática do Velho Oeste apareciam no restante do espaço.
Mas o efeito era encantador, em vez de extravagante, como no escritório da
Roxy, e o melhor de tudo, nenhum animal morto estava à vista.
Ainda mais fotos adornavam as paredes nessa parte da cabana,
enquanto câmeras, lentes, cartões de memória e outros equipamentos de
fotografia cobriam a mesa da sala de jantar, junto com várias pilhas de papéis.
Mas a bagunça estava limitada àquela mesa, em vez de encher toda a cabana.
Ira Morris era um pouco mais organizado em seu espaço pessoal do que em
seu escritório apertado no hotel.
O anão andava de um lado para o outro da porta da frente da cabana,
atravessava a sala de estar e ia até a cozinha nos fundos. Meu celular estava
grudado em seu ouvido, e seu rosto estava com uma expressão irritada.
— Ouça, senhor — Ira rosnou de novo, — eu disse a você que sua
amiga está bem. Não é culpa minha que ela levou um tiro, foi drogada e não
pode falar com você agora.
Do telefone, eu podia ouvir o tom agudo e exigente de Silvio, se não
suas palavras exatas.
Ira parou. — Você vai vir aqui e arrancar as minhas tripas pelo meu
nariz? Realmente? — Ele riu. — Você e que exército, espertalhão?
— Oh, eu não faria disso um desafio — eu disse. — Silvio é muito
perigoso quando você o irrita.
Ira girou em sua bota para me encarar. Surpresa brilhou em seus olhos
castanhos escuros, como se ele não estivesse esperando me ver de pé ainda.
Então, ele fez uma careta, deu um passo à frente e colocou o celular na minha
mão.
— Aqui — ele disse. — Você lida com esse cabeçudo. Ele ligou
cinquenta vezes na última hora, apesar de eu ter dito que você estava
inconsciente.
Eu sorri. — Ele é muito persistente dessa maneira.
Ira bufou, se afastou e se sentou em uma das cadeiras de balanço junto
à lareira.
Levantei o telefone ao ouvido. — Olá, Silvio.
— Gin! — Meu assistente gritou. — Onde você está? Eu fiquei doente
de preocupação! Aquele imbecil não me deixou falar para você, e Finn, Bria e
Owen não atendem seus telefones.
— Shh, — eu disse, esfregando minha testa. — Voz baixa, por favor.
Eu tenho uma dor de cabeça latejante.
Qualquer que fosse o sedativo que Roxy e Brody haviam colocado em
meu chá doce, tinha sido uma coisa forte. Finn, Bria e Owen, sem dúvida,
acordariam com enxaquecas, uma vez que beberam muito mais do que eu.
Se acordassem.
Preocupação revirou meu estômago, mas me forcei a afastar a emoção.
Tucker pensava que Finn poderia saber onde Deirdre havia escondido as joias.
Ele não mataria meus amigos até que tivesse certeza absoluta de que eles não
sabiam de nada. Torturá-los, sim. Matá-los, não.
Ainda não, pelo menos.
— Por que você está com dor de cabeça? — Silvio perguntou com uma
voz muito mais baixa e mais calma. — O que está acontecendo?
— Vamos apenas dizer que nossas férias no Velho Oeste ficaram um
pouco mais selvagens do que qualquer um de nós esperava.
Eu contei Silvio tudo o que tinha acontecido. Quando terminei, o
vampiro ficou em silêncio, e eu não o ouvi digitar no teclado como de costume.
— Você tem alguma ideia de onde as joias estão escondidas? —
Perguntou Silvio. — Eu odeio apontar isso, mas essas pedras são a única
vantagem que você tem agora.
— Oh, eu sei exatamente onde elas estão.
A cabeça de Ira se virou, e surpresa encheu seus olhos novamente. Eu
encolhi os ombros para ele. Eu sabia onde elas estavam escondidas. Eu
deveria saber o tempo todo, no primeiro segundo em que eu pus os olhos
nelas, mas eu estava muito presa nas minhas memórias, melancolia e mágoa
sobre minha mãe para percebê-las.
— Então, qual é o plano? — Perguntou Silvio. — O que você quer que
eu faça?
— Carregue alguns suprimentos. Meu tipo de suprimentos... armas,
facas, munição, pomadas de cura, tudo, e dirija até aqui. Eu sei que Jo-Jo e
Sophia estão ocupadas exibindo o salão naquele tour turístico de casas hoje,
mas veja se você pode encontrar alguém para vir com você e cuidar das suas
costas.
— Entendido. Mais alguma coisa?
Olhei para Ira. — Com exceção do Sr. Morris, temos que assumir que
todas as pessoas que trabalham no hotel e no parque temático estão
envolvidas nisso de alguma forma, e que elas sabem tudo sobre nós, incluindo
quem você é e como se parece. Eles podem não trabalhar para Tucker, Roxy e
Brody diretamente, mas eles provavelmente têm muito medo deles para não
te denunciar no segundo em que te virem. Então você precisa de algum tipo
de disfarce. Veja se Roslyn Phillips pode te emprestar algo.
— Entendido, — Silvio disse. — Vou ver se posso pegar emprestado o
carro de outra pessoa também. Apenas no caso de Tucker e o resto do Círculo
terem marcado nossos veículos habituais também.
— Boa ideia.
— O que você quer que eu faça quando estiver aí?
Pensei nisso por alguns segundos. — Encontre-me no Feeding Trough.
É a churrascaria que faz parte do parque temático.
— Mas não é o lugar onde você foi drogada? — Eu podia ouvir a
carranca na voz de Silvio.
— Sim. E, também é o último lugar para onde eles esperam que eu
volte.
— Eu estarei aí o mais rápido que puder — prometeu Silvio. — O que
você vai fazer nesse meio tempo?
Olhei para Ira novamente. — Pegar essas joias perdidas e finalmente
conseguir algumas respostas diretas sobre o que realmente está acontecendo
por aqui.
Capítulo 18
Eu desliguei com Silvio, em seguida, olhei para um relógio em forma
de búfalo na parede. Era pouco depois da uma hora, o que significava que eu
estive inconsciente por cerca de uma hora. Mais uma vez, a preocupação
encheu meu coração por Finn, Bria e Owen, mas eu forcei isso de lado. Eles
provavelmente ainda estavam inconscientes, e Tucker não poderia questioná-
los – tortura-los –antes de acordarem, o que significava que eu ainda tinha
tempo para salvar meus amigos.
Mas primeiro, eu queria saber mais sobre o homem que me salvou,
então me aproximei e me sentei na cadeira de balanço ao lado de Ira. — Então,
você me tirou da diligência e me trouxe até aqui para a sua casa.
Ele assentiu. — Eu também tive trabalho para fazer isso. Você se
espremeu entre aqueles baús, algo bom. Então, é claro, eu tive que realmente
te colocar em um dos baús e trazê-lo até aqui através do parque temático. Mas
eu movo coisas assim o tempo todo, então ninguém prestou atenção em mim.
— Então é por isso que meu corpo parece ter sido enrolado como um
pretzel. — Eu brinquei.
Ele assentiu novamente e continuou balançando.
— E por que você faria isso? Por que você me salvaria? Você poderia
ter me entregue a Roxy e Brody. Eles provavelmente teriam lhe dado uma
recompensa por isso.
Ele bufou. — Aqueles dois? Eles não me dariam uma recompensa por
salvá-los de um prédio em chamas, muito menos por entregar você.
— Ainda assim, era um grande risco a tomar.
O anão encolheu os ombros e olhou para as chamas que estavam
crepitando na lareira. Depois de alguns segundos, ele limpou a garganta. —
Eu vi aquele vampiro, Hugh Tucker, espreitando pelo saguão do hotel esta
manhã, e eu sabia que algo estava acontecendo. Algo ruim. É sempre ruim
quando ele está por perto.
Eu fiz uma careta. — Tucker já esteve aqui antes?
— Várias vezes. Pelo menos uma vez por ano, ele e alguns de seus
amigos vinham aqui para um retiro, e Deirdre estendia o tapete vermelho para
eles.
Minha respiração ficou presa na garganta, e meu coração se levantou
com um pouco de esperança. Ele tinha que estar falando sobre os outros
membros do Círculo. Então eles estiveram aqui, afinal. Eu queria apimentá-
lo com perguntas, mas eu segurei minha língua, deixando-o terminar sua
história.
— Embora Tucker e Deirdre não estivessem se dando bem ultimamente
— Ira continuou. — No ano passado, eles brigavam sempre que ele vinha para
cá. Um par de meses atrás, Tucker a fez contratar Roxy e Brody. Falou algo
sobre como o resort não estava ganhando dinheiro porque Deirdre continuava
gastando tudo em roupas e joias. — Ira bufou. — Eu poderia ter dito isso a
ele.
— E foi aí que Deirdre criou aquela falsa caça ao tesouro.
Ira franziu o cenho. — Fui eu quem colocou as joias de Sweet Sally Sue
em exibição anos atrás como uma homenagem a ela. Eu gostava de andar pelo
saguão todos os dias e ver suas coisas, junto com suas fotos. Isso me lembrava
de todos os bons anos que tivemos aqui juntos.
— Até que Deirdre roubou as joias.
Raiva torceu o rosto dele. — Deirdre sabia que eu nunca a deixaria tê-
las, então ela esperou até que eu estivesse ocupado com o show do meio-dia
e então as roubou. Quando percebi o que ela tinha feito, Deirdre já havia saído
do resort. Eu tentei rastreá-la, mas ela manteve movendo-se de um dos
apartamentos extravagantes para o seguinte. E é claro que ela não respondia
nenhum dos meus telefonemas. A próxima coisa que eu soube, era que ela
está anunciando a caça ao tesouro, e Roxy e Brody estavam aqui, me chutando
para fora do meu escritório e assumindo o controle de tudo.
O corpo de Ira se acalmou, e seu olhar castanho escuro subiu para
uma foto emoldurada na lareira que mostrava Sweet Sally Sue usando um
vestido de saloon girl, toda enfeitada com suas joias. Eu reconheci como a
mesma foto que estava na vitrine no saguão do hotel.
— Eu não podia acreditar que Deirdre iria desrespeitar a memória de
Sweet Sally Sue assim, mas eu deveria saber melhor — disse ele em uma voz
amarga. — Eu deveria ter protegido melhor o legado dela.
— Você a amava, não é? É por isso que você ficou aqui todos esses
anos, mesmo depois que Roxy e Brody entraram e assumiram o controle.
Ira assentiu e começou a se balançar na cadeira novamente. — Doce
Sally Sue cuidou de mim quando eu não tinha nada. Ela era como a mãe que
eu nunca tive, e essa era a minha casa. Sempre será minha casa.
Entendia muito bem seus sentimentos, pois sentia exatamente o
mesmo em relação a Fletcher e ao Pork Pit. Apesar de todas as coisas más que
aconteceram no restaurante, incluindo o assassinato de Fletcher, ele era
minha casa, e sempre seria. Mais do que isso, era o legado que o velho me
deixara, e eu o defenderia até meu último suspiro, da mesma forma que Ira
tentara manter Bullet Pointe funcionando por todos esses anos, apesar dos
melhores esforços de Deirdre estragar tudo.
Ira parou de balançar e olhou para mim. — Eu tenho acompanhado
Tucker o dia todo, imaginando o que ele estava fazendo. Eu o ouvi conversando
com Roxy sobre você e seus amigos e todos os problemas que você causou a
ele em Ashland. É verdade? Que você é algum tipo de assassina que ele quer
morta?
— Absolutamente.
Eu disse a Ira uma versão condensada da minha história com Tucker,
incluindo todas as coisas que ele disse sobre a minha mãe fazer parte do
Círculo. — Você já ouviu falar deles? Deirdre alguma vez disse alguma coisa
para você sobre um grupo chamado Círculo?
Ira sacudiu a cabeça. — Desculpe, mas eu nunca ouvi falar de nenhum
Círculo. E Tucker nem sempre vinha com as mesmas pessoas.
— E quanto a Eira Snow? Você já ouviu falar dela? — Eu prendi a
respiração, esperando, esperando, esperando...
Ele balançou a cabeça novamente. — Desculpe, mas esse nome não
soa familiar. — Ele acenou com a mão para todas as fotos nas paredes. —
Muitas pessoas vêm aqui todos os anos. Eu não posso manter o controle de
todas elas.
Tinha sido um tiro no escuro, que minha mãe tinha estado aqui uma
vez e que Ira se lembraria dela entre todos os milhares de visitantes, mas a
decepção tomou conta de mim mesmo assim. Outro beco sem saída.
Ainda assim, não era culpa dele, então me forcei a sorrir para ele e
gesticulei para as paredes da cabana. — Eu fiquei pensando nas suas fotos.
Eu as notei em seu escritório. Elas são impressionantes, especialmente as
fotos do hotel, do parque e do lago.
Pela primeira vez desde que eu o conheci, um sorriso genuíno iluminou
o rosto do anão, suavizando sua perpétua carranca. — Sweet Sally Sue me
deu uma câmera no primeiro Natal que eu estive aqui. Eu tenho tirado fotos
desde então. — Ele olhou em volta para as fotos, seu olhar se movendo de
uma moldura para a outra. — Bullet Pointe pode ser um negócio, mas eu gosto
de ver as pessoas tão felizes no parque e no hotel. Eu gosto de tirar fotos de
suas memórias. Fico feliz em vê-las se divertindo. Significa mais para mim do
que o dinheiro.
Eu assenti. Eu me sentia da mesma forma sobre a comida que servia
no Pork Pit. Ver o prazer que outras pessoas tinham da minha cozinha sempre
colocava um sorriso no meu rosto. Eu gostava de alegrar o dia de alguém,
mesmo que fosse apenas com a maneira de preparar uma refeição boa e
saudável. Ira e eu éramos mais parecidos do que eu teria pensado ser possível.
— Obrigada por me salvar. Por arriscar o seu pescoço por mim. Muitas
pessoas não teriam feito isso.
Ira acenou com a mão, dispensando meus agradecimentos. — O que
eu deveria fazer? Deixar você lá fora e congelar lentamente até a morte?
Eu sorri. — Bem, eu ainda aprecio mesmo assim.
Por mais que eu estivesse gostando de ficar sentada aqui perto das
chamas quentes e conversando com o anão, parei de balançar a cadeira e
fiquei de pé. Porque o tempo estava passando, e eu precisava pegar as joias e
descobrir como salvar meus amigos antes que Tucker os torturasse e os
matasse.
— O que você vai fazer agora? — Perguntou Ira.
— Voltar para o hotel. É lá onde estão as joias.
Ele balançou a cabeça. — Você nunca vai conseguir. Roxy e Brody têm
todo mundo procurando por você. E você também não pode entrar no parque
ou no hotel. Eles têm todas as saídas bloqueadas. — Ele acenou com a mão.
— E não demorará muito para que eles tenham a brilhante ideia de vir aqui e
procurar por você.
— Não se preocupe. Estou indo embora. Eu não vou colocar você em
mais perigo. Você já fez o suficiente por mim.
Seu rosto envelhecido se enrugou em outro sorriso raro. — Querida,
eu não me importo com o perigo. Ajudar você bem debaixo do nariz de Roxy e
Brody foi a coisa mais divertida que eu fiz em meses. Mas eu não estou prestes
a te enviar lá para levar um tiro de novo.
— O que você quer dizer?
— Você precisa de um disfarce, exatamente como você disse ao seu
amigo no telefone.
Ira ficou de pé e desapareceu em seu quarto. Alguns tinir e estrondos
soaram, como se ele estivesse mexendo em seu armário. Ele saiu um minuto
depois, segurando um cabide de arame que continha um antigo vestido de
saloon girl envolto em plástico transparente. Ao contrário das fantasias
baratas que os artistas usavam, eu podia dizer que esse era o negócio real,
feito de seda, renda e crinolina.
— Isso pertencia à Sweet Sally Sue. — Ira sorriu para o vestido e as
lembranças que trouxe de volta. — Ela era uma garota forte, assim como você,
e eu acho que ela gostaria que você o usasse. Especialmente se te ajudar a
expulsar Tucker, Roxy e Brody daqui para sempre.
Hesitei. Eu não queria usar o vestido por medo de arruiná-lo, e as
memórias de Ira junto com ele, mas ele estava certo. Eu não poderia sair como
Gin Blanco, a fora da lei que todo mundo estava procurando. Eu precisava de
um disfarce, e eu não estava prestes a olhar os dentes desse cavalo.
— Estou honrada. — Eu peguei o vestido dele.
Eu segurei a roupa, e um sorriso se espalhou pelo meu rosto quando
eu percebi de que cor era.
Vermelho sangue. Sempre a minha cor.

***

A cabana de Ira podia estar relativamente arrumada, mas ele tinha um


pequeno galpão que era tão bagunçado quanto o escritório do hotel. Mas em
vez de pilhas de papéis, o galpão estava cheio até a borda com todos os tipos
de fantasias, incluindo sapatos, maquiagem e até algumas perucas que os
artistas haviam descartado. Peguei algumas coisas para o meu disfarce,
depois voltei para o quarto dele para me arrumar.
A primeira coisa que tive que fazer foi colocar um espartilho.
Sério, um verdadeiro espartilho antiquado completo com ossos de
baleia para dar a ele – e a mim – essa forma de ampulheta. A coisa com
babados estava coberta com toneladas de renda preta, e eu levei muito tempo
e muito esforço para entrar nela. A única graça salvadora era que as fitas
pretas se prendiam na frente, em vez das costas, mas eu ainda amaldiçoava
quem quer que tenha inventado uma coisa tão desagradável e desconfortável.
A seguir, o vestido de Sweet Sally Sue. A armação rígida em crinolina
preta fez as camadas superiores de seda vermelha se espalharem em minhas
pernas, me fazendo sentir como um sino humano. Pelo lado positivo, o vestido
tinha mangas compridas que escondiam a bandagem branca na parte
superior do meu braço esquerdo, bem como dois bolsos profundos para eu
carregar minhas facas. Eu coloquei minhas outras três facas na cinta-liga e
meias que acompanhavam o vestido.
Sapatos pretos com saltos quadrados e grossas tiras no tornozelo
foram os próximos, junto com um par de luvas de renda preta sem dedos que
fez as cicatrizes de aranha em minhas palmas coçarem. Eu também coloquei
meu colar de runa da aranha no corpete e amarrei uma fita de veludo preto
com um camafeu vermelho ao redor da garganta.
Depois que minhas roupas estavam no lugar, eu coloquei uma peruca
loira com o cabelo comprido enrolado em cachos grossos, empoei o rosto, e
pintei meus lábios com o mesmo tom de vermelho do vestido. Para o toque
final, eu coloquei uma pequena pinta negra na minha bochecha esquerda,
perto dos meus lábios para desviar a atenção dos meus olhos, cuja cor cinza
eu não podia mudar.
Eu parecia e me sentia ridícula, e não vi como os artistas suportavam
estes trajes dia após dia durante seus turnos de oito horas. Eu só tinha usado
o vestido por dez minutos e eu já queria sair, começando com o espartilho.
Era uma pena Finn não estar aqui. Ele teria gargalhado com a minha miséria.
O pensamento dele, Bria e Owen fez meu estômago apertar de
preocupação novamente. Hora de continuar com as coisas. Então eu saí do
quarto e voltei para a parte principal da cabana, onde Ira estava relaxando em
sua cadeira de balanço junto à lareira.
Eu dei uma volta para sua inspeção. — Bem? O que você acha?
Ira olhou para mim e deu uma segunda olhada. Ele piscou e piscou,
então franziu a testa, me estudando cuidadosamente.
— O quê? Tenho batom nos dentes ou algo assim?
Ira balançou a cabeça. — Nada como isso. Você apenas... parece uma
dama que eu me lembro de fotografar muito tempo atrás.
— Eu pensei que você não pudesse lembrar os nomes de todos que
você fotografou.
Ele deu de ombros. — Não os seus nomes, mas eu nunca esqueço um
rosto.
Ele se levantou da cadeira de balanço e vagou pela cabana, olhando
para todas as fotos nas paredes, procurando o que ele queria. Ele parou e
balançou a cabeça um minuto depois. — Eu não tenho certeza onde esta foto
está. Pode estar no meu escritório no hotel.
— Bem, talvez eu vá lá e tente encontrá-la — eu brinquei. — Se eu não
for morta antes disso.
Uma possibilidade grande, já que era apenas eu contra Tucker, Roxy,
Brody e todos os seus homens.
— Você vai até o hotel e pega essas pedras — disse Ira. — Vou andar
pelo parque e ver as informações que posso captar sobre Tucker e seus planos.
Então, quando chegar a hora, eu vou até a entrada principal e fico de olho no
cara irritante, o Silvio.
Eu assenti. Eu disse a Ira que essa era a minha luta, não a dele, mas
o anão tinha insistido que esta era a sua casa, e se ele pudesse ajudar a
expulsar Roxy e Brody de vez, então ele faria o que pudesse para ajudar.
Então, esse era o plano que elaboramos. Eu não queria Ira por perto se Tucker
e os outros colocassem suas garras em mim, e ter o anão atento para Silvio,
esperançosamente, ajudaria meu assistente e quem mais ele conseguisse
reunir em Ashland, entrar no parque sem ser notado.
— Tudo bem, então. — Eu fui para a porta da frente. — Deseje-me
sorte.
Ira me deu um olhar conhecedor. — Oh, eu acho que você é do tipo
que faz sua própria sorte.
— Não. — Eu sorri. — Apenas faço as pessoas morrerem.
Capítulo 19
A cabana de Ira estava isolada em um trecho de floresta que dava para
o lago. Ele me seguiu para fora da cabana, trancando-a atrás dele e seguimos
nossos caminhos separados. Ele se dirigiu para a entrada principal do parque
temático para ver o que podia descobrir sobre os outros trabalhadores,
enquanto eu peguei uma trilha que levava de volta à área de descanso, ficando
escondida atrás de uma fila de árvores.
Deve ter sido hora de algum show da tarde, porque a área de descanso
estava cheia de pessoas trocando trajes de cowboys e jogadores, colocando
perucas e maquiagem, e certificando-se de que suas armas falsas estavam
cheias festins. Olhei em volta, mas não vi Roxy ou Brody em nenhum lugar,
embora eu visse vários dos seus gigantes fora da lei, se preparando junto com
todos os outros. Mas os artistas levavam isso como uma ciência, e a área de
descanso esvaziou-se cerca de cinco minutos depois, quando todos correram
para tomar seus lugares para o show.
Quando eu tinha certeza de que a área estava deserta, saí de trás de
uma árvore e corri pelos pavilhões de madeira, querendo voltar para a relativa
segurança das multidões da Main Street o mais rápido possível. Eu tinha
acabado de passar pela porta dos fundos do Good Tyme Saloon quando algo
inesperado em um quadro de avisos chamou a minha atenção.
Um cartaz de Procurada com minha foto.
Parei e fui olhar mais de perto, imaginando se meus olhos estavam
pregando peças em mim. Mas eles não estavam. Uma foto em preto-e-branco
granulado de mim que parecia ter sido tirada de uma câmera de segurança
dentro do hotel ocupava a maior parte do pôster, enquanto a palavra
Procurada se arqueava na parte superior com aquela antiga fonte do Velho
Oeste que estava em tudo por aqui. Gin Blanco também estava escrito no
mesmo tipo de fonte, curvando-se sob o meu rosto, junto com a promessa de
uma recompensa de mil dólares por quaisquer avistamentos de mim no hotel
ou no parque temático. Bem, isso foi um pouco insultuoso. Você pensaria que
eu valeria pelo menos cinco mil – morta ou viva.
Meu próprio cartaz. Eu sorri abertamente. Apenas o que eu sempre
quis.
Eu não consegui me conter. Tirei cuidadosamente o cartaz do quadro
de avisos, enrolei-o e coloquei-o num dos bolsos do meu vestido.

***

Deixei a área de descanso para trás e atravessei o beco e saí de volta


na Main Street. No outro lado da rua, em frente às arquibancadas dos
visitantes, cowboys, jogadores, saloon girls e outros personagens fantasiados
dançavam com uma música country antiga e animada e exibiam o que parecia
uma elaborada quadrilha. Eu não vi Roxy ou Brody entre os artistas, no
entanto. Eles provavelmente ainda estavam procurando no parque por mim
ou talvez até estivessem posicionados no hotel, esperando que eu tentasse
resgatar meus amigos.
A música subiu para um rugido crescente para o grande final, com
todos os artistas gritando, pulando e jogando seus chapéus no ar. A multidão
levantou-se, aplaudindo e assobiando, e todos os artistas fizeram uma
reverência. A multidão desceu pelas arquibancadas, e todos os personagens
fantasiados se aproximaram para encontrá-los, dar autógrafos e posar para
fotos. Bem, esse show certamente tinha sido muito mais suave do que os
outros dois que eu tinha participado neste fim de semana.
Era agora ou nunca, então eu respirei fundo e saí para a calçada de
madeira. Sorri para as pessoas por quem passei, apenas mais uma
funcionária fazendo o seu papel, mesmo quando cada passo me levava cada
vez mais perto do hotel e das joias...
— Ei! Você aí! — Uma voz alta chamou atrás de mim. — Você no vestido
vermelho!
Eu fiquei tensa. Bem, Essa era definitivamente eu. Droga. Eu esperava,
pelo menos, sair do saloon e aproximar-me do hotel antes que alguém me
parasse e me interrogasse. Mas pareceria mais suspeita se corresse, então eu
lentamente me virei e coloquei um sorriso no rosto.
— Sim?
Brody Dalton correu até mim. Eu deslizei minha mão no bolso do meu
vestido, meus dedos enrolando em torno da faca de silverstone no interior,
pronta para arrancar a lâmina, enfiar na garganta do gigante, pegar minhas
saias e correr, correr, correr.
Brody parou, suas bochechas coradas do frio. Ele não devia ter tido
tempo de visitar aquele curandeiro do Ar de novo, porque seu nariz ainda era
um nó vermelho, quebrado e inchado por causa da surra de Tucker. Bom.
— O que você acha que está fazendo, me fazendo andar até aqui? —
Ele retrucou. — Você deveria ter vindo até mim no segundo que eu gritei com
você. Você não sabe quem eu sou?
Mesmo que eu quisesse socar seu rosto, eu abaixei minha cabeça em
desculpas. — Eu sinto muito, senhor. Eu não ouvi você no começo, acima de
todo o barulho da plateia.
Brody me deu um olhar desconfiado, como se ele não acreditasse em
mim, mas aparentemente ele tinha outras coisas para se preocupar. Ele
levantou a mão e percebi que ele estava segurando uma pilha grossa de
papéis. Ele tirou uma folha do topo e colocou na minha mão livre. Era uma
cópia do meu pôster de Procurada.
— Aqui. Carregue isso com você o tempo todo — ele retrucou de novo.
— E se você avistar esta mulher, mande mensagem para Roxy ou para mim
imediatamente com sua localização. Entendeu?
— Sim, senhor. — Abaixei a cabeça novamente, como se estivesse
estudando a minha própria foto.
— O que ela fez?
— Ela é uma ladra e uma batedora de carteira, entre outras coisas —
o gigante rosnou. — Agora saia e se misture como você deveria, e mantenha
um olhar atento por esta aqui.
Eu balancei a cabeça para ele. — Sim senhor. Eu vou ficar.
Brody me deu outro olhar suspeito, provavelmente por causa do meu
tom doce, mas ele bufou, deu a volta e saiu. Eu o observei por alguns
segundos, mas tudo o que ele fez foi parar todos os trabalhadores que ele
passou, empurrar um dos meus pôsteres de Procurada para eles e exigir que
eles estivessem à minha procura.
O gigante não tinha percebido que ele me teve ao alcance do braço. Ele
ia pagar por isso mais tarde. Eu me certificaria disso.
Mas, agora, eu tinha dois trabalhos – pegar as joias e descobrir onde
Finn, Bria e Owen estavam sendo mantidos. Assim, eu enrolei meu segundo
pôster de Procurada e coloquei dentro do meu bolso ao lado do primeiro.
Então, eu aumentei a potência em meu sorriso, me virei e entrei na multidão
de turistas.

***

Demorei trinta minutos para ir da Main Street até o hotel,


principalmente porque as pessoas ficavam me parando e me pedindo para
posar para fotos. Eu odiava cada segundo disso, mas era meu trabalho como
uma saloon girl não oficial do Bullet Pointe, e eu não queria que nenhum dos
turistas reclamasse e chamasse atenção indesejada para mim. Então eu bati
meus cílios, balancei minhas saias e sorri para todas as fotos. Quando cheguei
ao hotel, minhas bochechas doíam por tanto tempo que eu permaneci na falsa
e animada expressão.
Eu entrei no saguão e parei, imaginando se eu me destacaria mais aqui
do que no parque, mas meu vestido de saloon girl estava perto o suficiente dos
que as garçonetes do hotel usavam. Uma bandeja vazia estava na esquina do
bar, e eu caminhei casualmente e a peguei quando o barman estava de costas.
As pessoas com bandejas vazias sempre pareciam que tinham lugares para
estar, e ninguém me deu uma segunda olhada enquanto eu passeava pelo
saguão, apesar do clique alto dos meus saltos no chão de pedra.
Eu segui uma garçonete até a cozinha, não só porque eu queria me
misturar com o resto da equipe, mas também porque queria espionar os
trabalhadores. Um deles tinha que saber onde Tucker estava mantendo Finn,
Bria e Owen. Então, eu empurrei as portas duplas, entrei na cozinha, e
imediatamente me arrependi da minha decisão.
Roxy estava aqui.
Ela estava usando a mesma fantasia de cowgirl de antes, completa com
seu chapéu vermelho e fivela de cinto de metal brilhante. Suas mãos estavam
cruzadas atrás das costas e ela andava de um lado para o outro na frente de
uma fila de cozinheiros, garçons cowboys e garçonetes de saloon. A garçonete
na minha frente se apressou para entrar na fila com todos os outros, e eu não
tive escolha a não ser segui-la.
Roxy finalmente parou de andar e levantou a mão, segurando outra
pilha dos meus pôsteres de Procurada. Quantas dessas coisas eles
imprimiram nas últimas duas horas? Eu escondi um sorriso. Eu estava
começando a gostar de toda essa coisa fora da lei.
— Esta mulher está em algum lugar no resort, e nós vamos encontrá-
la — Roxy falou como um sargento. — A partir deste momento, vocês
examinarão cada hóspede que vocês servirem e irão compará-los com esta
mulher. Se vocês a encontrarem, então me mandem uma mensagem
imediatamente com a localização dela. Vocês me entenderam?
Ninguém disse nada, então ela aumentou o volume de seu berro. —
Vocês me entenderam?
— Sim, senhora! — Todos nós gritamos em uníssono.
Ela passou por nós, empurrando um cartaz de Procurada nas mãos de
cada pessoa. Não apenas isso, mas ela olhava cada um dos trabalhadores por
vez, olhando de tudo, desde os chapéus até suas fantasias e suas botas. Eu
comecei a suar, e não por causa do calor dos fogões.
Se ela me reconhecesse, eu estava morta.
Eu não poderia lutar contra todas as pessoas neste espaço apertado e
lotado, muito menos passar por Roxy antes que ela me enchesse de balas
revestidas de Fogo. Os trabalhadores se amontoariam em cima de mim, me
arrastariam até o chão, e me segurariam lá até que Roxy pudesse convocar
Tucker para lidar comigo. Depois eu seria amarrada e torturada ao lado de
meus amigos ou seria morta imediatamente.
Mas, eu não podia fugir. Não agora quando ela estava empurrando um
cartaz em minhas mãos. Roxy começou a se afastar, depois parou e olhou
para mim com olhos penetrantes e críticos. Minha mão livre deslizou em meu
bolso, alcançando a minha faca novamente. Eu só tinha uma chance de
derrubá-la, e eu tinha que fazer valer a pena...
Roxy deu um passo à frente, pegou meu vestido e, na verdade, puxou
para baixo, mostrando mais do meu decote. Meu colar de runa de Aranha se
deslocou dentro do espartilho, nadando em direção ao topo, e imediatamente
parei de respirar, não querendo que o colar saísse e me entregasse.
— Você pode se dar ao luxo de mostrar um pouco mais de pele — Roxy
retrucou. — Isso é o que faz com que você – e eu – tenha melhores gorjetas.
Você entendeu?
— Sim, senhora, — eu falei em voz alta, ainda tentando não respirar.
Ela me olhou como se pensasse que eu estava zombando dela, mas eu
abaixei minha cabeça, como se eu estivesse com muito medo para não ceder
às suas exigências. Depois de vários segundos, ela finalmente assentiu e se
afastou de mim, gritando mais ordens para a equipe.
Eu respirei fundo e discretamente coloquei meu colar de volta para
onde ele estava antes.
Roxy continuou gritando ordens, e todos os garçons se alinharam
novamente, para encher nossas bandejas com copos de champanhe, e circulá-
los através do saguão para os hóspedes. Eu estava muito feliz de entrar na
fila, colocar os copos na minha bandeja e sair da cozinha.
Carregando minha bandeja de bebidas, saí da cozinha o mais rápido
que pude sem realmente correr. Pensei em colocar a bandeja na primeira mesa
por onde passasse e apenas ir embora, mas olhei de relance por cima do
ombro. Claro que Roxy estava agora de pé junto ao bar, os braços cruzados
sobre o peito, observando a equipe, incluindo eu, apenas para ter certeza de
que estávamos à altura de seus padrões.
Então, eu sorri e ri para um grupo de rapazes sentados nas cadeiras
de balanço em frente à lareira. Eu até inclinei-me, dando-lhes uma boa e longa
visão do meu decote, mais uma vez esperando que o meu colar de runa de
Aranha não caísse em um dos seus colos. Todos os homens sorriram, seus
olhares presos no meu peito, enquanto eles alcançaram as taças de
champanhe. Com o canto do olho, vi Roxy acenar com a cabeça em sinal de
aprovação, pensando que eu estava suficientemente intimidada e voltou sua
atenção para outra garçonete.
Entreguei todas as bebidas na minha bandeja, voltei para a cozinha e
consegui outra rodada. Quando voltei para o saguão, Roxy tinha decidido que
a equipe estava pronta e estava parada ao lado de algumas das árvores de
Natal decoradas.
Olhei ao redor, mas não vi Brody nem nenhum dos outros gigantes. Se
não fosse por todos os turistas, esse seria o momento perfeito para tirar minha
faca do bolso do meu vestido, me aproximar de Roxy e esfaqueá-la pelas
costas. Apesar das possíveis testemunhas e danos colaterais, eu ainda
considerei isso seriamente, querendo eliminar pelo menos um inimigo
perigoso, e cheguei a ponto de dar um passo na sua direção...
Um homem entrou na minha frente, fazendo-me parar rapidamente.
para evitar derramar todas as bebidas na minha bandeja. Mesmo assim, os
copos balançaram perigosamente, fazendo o champanhe derramar-se e
espalhar espuma.
Abri a boca para brigar com o cara para tomar cuidado para onde ele
estava indo, mas ele olhou para mim e eu percebi que era Hugh Tucker. Então,
eu rapidamente virei para o meu lado, inclinando o rosto para longe dele,
embora eu ainda estivesse tentando controlar minha bandeja de bebidas
balançando.
Com o canto do meu olho, eu pude ver Tucker me encarando, mas meu
disfarce funcionou e o vampiro me dispensou como sem importância. porque
ele continuou até onde Roxy estava de pé. Eu esperei alguns segundos, então
me movi na direção deles, entregando bebidas para todos os hóspedes que eu
passava, até que eu estava perto o suficiente para escutar a conversa deles...
— ...nenhum vestígio de Blanco ainda — disse Roxy. — Mas eu dobrei
o número de gigantes postados em todas as saídas do hotel e do parque
temático. Nós a pegaremos logo. Ela não pode escapar, e nós a encontraremos
mais cedo ou mais tarde.
Tucker cruzou os braços sobre o peito, encarando sua lacaia. — E eu
não posso acreditar que você foi descuidada o suficiente para deixá-la
escorregar por entre os seus dedos em primeiro lugar. Você me disse que o
sedativo que você deu a Blanco e seus amigos era infalível. Parece que acabou
sendo óleo de cobra10, já que Blanco ainda está lá fora.
— Sinto muito, senhor. — Roxy tirou o chapéu e abaixou a cabeça em
desculpas. — Não se preocupe. Nós vamos encontrar Blanco. Eu prometo isso.
— E é melhor você conseguir isso — ele respondeu com uma voz suave
e sedosa. — Eu não gosto de fracasso. Deirdre Shaw lhe contaria isso, se ainda
estivesse viva.
— Sim, senhor. Claro que não, senhor.
Tucker olhou para Roxy por mais um momento, certificando-se de que
a ameaça silenciosa em suas palavras tinha afundado completamente, depois
olhou para o relógio. — Por quanto tempo mais Lane e os outros estarão
inconscientes?
Minha respiração ficou presa na minha garganta, e minhas mãos
tremeram, agitando os copos restantes na minha bandeja, mas os dois não
me notaram ou a minha surpresa.
— Eles ainda estão desmaiados no quarto de Lane, mas não deve
demorar muito mais antes de começarem a acordar — disse Roxy.
Então Finn, Bria e Owen estavam na suíte de Finn no último andar,
sem dúvida sob uma guarda pesada de Tucker para mantê-los tão perto e tão
isolados, especialmente quando eu ainda estava livre e poderia causar muitos
problemas.
— Avise-me assim que eles acordarem — disse Tucker. — Eu quero
começar a questioná-los imediatamente sobre as joias. E envie as minhas
ferramentas habituais para a suíte para os interrogatórios.

10É um eufemismo para um remédio que promete curar as mais diversas doenças, mas é
apenas um golpe de marketing.
Meu estômago revirou e a bile subiu em minha garganta. Assim como
eu temia, ele iria torturar meus amigos pelas respostas – respostas que
nenhum deles tinha.
— Mas e Blanco? — Perguntou Roxy. — Você não quer que ela seja
encontrada primeiro?
Tucker encolheu os ombros. — Ela não importa no quadro geral. Não
realmente. Encontrar essas gemas é a coisa mais importante. E se nós não
pudermos encontrá-las, bem, eu vou me contentar com a execução de Lane e
os outros.
Eu não pude deixar de dar um suspiro por causa da maneira casual
que Tucker falou sobre assassinar meus amigos. A raiva inundou meu corpo,
e eu ansiava para pegar uma das minhas facas, atacar o vampiro, e cortar a
porra da sua garganta. Eu seriamente, seriamente considerei isso, assim como
eu fiz com Roxy alguns momentos antes.
Mas eu empurrei minha raiva de lado e mantive a minha posição. Dada
a velocidade de Tucker, era cinquenta por cento de chance que eu pudesse
matá-lo antes que ele me matasse. Adicione Roxy e seus confiáveis revólveres
à mistura, e as chances não estavam a meu favor. Sem mencionar todos os
espectadores inocentes que poderiam levar um tiro – ou pior – no fogo cruzado
em potencial. Não, por mais que eu quisesse acabar com Tucker e Roxy, não
poderia enfrentá-los. Aqui não. Não agora.
Mas logo – muito, muito em breve.
Tucker e Roxy continuaram conversando, mas um cara sentado em
uma cadeira de balanço me chamou, ansioso por um copo de champanhe
grátis e um olhar para o meu decote, então eu coloquei um sorriso e caminhei
em sua direção, ainda pensando no meu próximo passo.
Silvio estava certo. As joias eram a única vantagem potencial que eu
tinha e a única coisa que manteria meus amigos vivos.
Eu sabia onde estavam as joias. Agora tudo o que eu tinha que fazer
era chegar até elas.
Como todo o resto da minha vida, era mais fácil falar do que fazer.
Capítulo 20
Eu dei ao cara na cadeira de balanço o pequeno show que ele queria e
me afastei antes que ele começasse a babar em mim. Eu ainda tinha dois
copos de champanhe na minha bandeja, mas em vez de entregá-los, atravessei
o saguão e entrei em um dos elevadores. Enquanto o elevador subia, trabalhei
nos detalhes do meu plano.
Havia apenas um – não morrer.
O elevador parou em vários andares para deixar as pessoas entrarem
e saírem, até que eu era a última pessoa no elevador. Observei os números se
iluminarem lentamente e subi até o último andar, onde a suíte de Finn ficava.
As portas do elevador se abriram e eu respirei fundo, coloquei um
sorriso no rosto e me dirigi para o corredor. Como eu esperava, três gigantes
vestidos como bandidos estavam de guarda na frente da porta que dava para
a suíte de Finn, e eu estava disposta a apostar que ainda mais guardas
estavam posicionados lá dentro, bem como na minha suíte ao lado. Muitos
guardas para eu lutar sem me machucar, especialmente porque Finn, Bria e
Owen ainda estavam inconscientes e não podiam me ajudar. Mesmo que eu
conseguisse matar todos os guardas, eu não conseguiria tirar os três da suíte
em segurança. Então, embora eu odiasse deixar meus amigos à mercê de
Tucker – ou a falta dela – essa era a minha única opção agora.
Os três guardas do lado de fora ficaram atentos ao me verem indo na
direção deles, suas mãos caindo para as armas nas cinturas. Eu me perguntei
se Roxy tinha equipado todos eles com suas balas revestidas de Fogo. Eu teria,
mas eu estava apostando que ela as mantinha para si mesma. Ela não ia
querer deixar ninguém usar suas balas especiais, muito menos ter a diversão
de atirar em mim com elas.
Mas, em vez de pegar uma faca e atacar os gigantes, eu me aproximei,
acenando educadamente para eles. Os três olharam para o meu decote, mas
eu continuei pelo corredor até chegar à porta do lado oposto.
A que levava à suíte de Deirdre.
Parei em frente à porta e peguei minha magia de Gelo e Pedra, usando
para fazer minha mão ficar tão fria, dura e forte quanto possível. Então eu bati
educadamente na porta. — Serviço de quarto — eu chamei com uma voz
alegre.
Bater na porta de Deirdre era um risco, mas eu estava disposta a
apostar que Roxy tinha dito aos gigantes para proteger apenas a porta de Finn
e não a suíte em frente a dele. Eu também estava apostando que os gigantes
não perceberam que a suíte estava vazia.
Eu olhei para os guardas com o canto do olho, mas eles continuaram
olhando maliciosos, e nenhum deles se separou de seus amigos para se
aproximar de mim.
Então, bati uma segunda vez. — Serviço de quarto — eu gritei em voz
mais alta.
Eu me virei para o lado, de modo que meu vestido armado estava
bloqueando a visão dos gigantes da porta, envolvi minha mão em torno da
maçaneta, e explodi com a minha magia de Gelo, dirigindo os fragmentos frios
do meu poder através do buraco da fechadura e na tranca. Uma vez que eu
tinha certeza de que estava congelada, mandei outra explosão de magia de
Gelo, quebrando todos esses pedaços, mesmo quando usei minha mão
endurecida pela Pedra para puxar a maçaneta. Foi preciso algum esforço, mas
a fechadura se quebrou e a porta se abriu com um guincho audível.
Coloquei um sorriso no rosto e olhei para a frente, como se estivesse
cumprimentando o hóspede lá dentro.
— Olá, senhora — eu gritei para o benefício dos guardas. — Eu tenho
aquele champanhe que você pediu. Gostaria que eu servisse?
Entrei na suíte, fechei a porta atrás de mim e coloquei a bandeja e os
copos em uma mesa próxima. Eu olhei ao redor, mas tudo era o mesmo de
antes. Não parecia que Tucker, Roxy ou Brody tinham entrado aqui e
procurado na suíte de Deirdre novamente. Mas havia apenas uma maneira de
saber com certeza, então corri para a árvore de Natal branca no canto, minha
respiração na garganta, meu coração batendo, minhas palmas coçando com
antecipação.
A árvore parecia exatamente como eu me lembrava, até os três globos
de neve de Bullet Pointe que eu tinha alinhado no chão em frente a ela – globos
de neve que não combinavam com o resto dos ornamentos extravagantes de
Deirdre.
Eu caí de joelhos na frente da árvore, agarrei o globo que apresentava
a cena da Main Street, e segurei-o contra a luz que entrava pelas janelas do
chão ao teto. Sacudi o globo, e mais algumas pedras claras saíram das letras
no letreiro Bullet Pointe, brilhando enquanto navegavam pela água.
— Olá, diamantes — eu sussurrei.
Eu peguei os outros dois globos, olhando para eles por sua vez. Safiras
compunham a cena do lago e, enquanto rubis e esmeraldas brilhavam como
as decorações de Natal no hotel coberto de neve no outro. E ainda mais gemas
brilhavam aqui e ali em todos os três globos. Eu não sabia se todas as joias
da Sweet Sally Sue estavam aqui, mas parecia que Deirdre tinha colocado a
maioria delas nos três globos. Então ela escondeu os globos com o resto de
suas decorações de Natal, como se fossem apenas pedaços de vidro e glitter,
escondendo as joias à vista durante todo o tempo, um dos mais antigos e
melhores truques que existem.
— Inteligente — eu sussurrei novamente. — Muito, muito inteligente,
Mamãe Dee.
Eu pensei na memória que eu tive de Deirdre no escritório da minha
mãe, sacudindo todos aqueles globos de neve, enquanto Tucker ameaçava
Eira. Eu me perguntei se foi aí que Deirdre teve a ideia do esconderijo. Eu me
perguntei que outros truques ela poderia ter aprendido com minha mãe,
embora eu provavelmente jamais saberia. Mas, por agora, era o suficiente que
eu tivesse encontrado as joias.
Eu trouxe o globo da Main Street até o meu ouvido e estendi a mão
com a minha magia de Pedra. O vidro grosso e a água silenciavam os sons,
mas eu ainda conseguia distinguir os orgulhosos trinados das pedras
preciosas sobre sua própria beleza. Eu deveria ter notado os murmúrios antes,
no segundo em que eu peguei os globos quando nós entramos aqui pela
primeira vez ontem, mas eu estava muito perdida nas memórias de minha
mãe para prestar atenção nelas.
Bem, eu estava aqui agora. e esses bebês estavam vindo comigo.
Eu peguei as duas facas dos bolsos do meu vestido de saloon girl e
deslizei-as em minhas ligas com minhas outras três armas. Então coloquei
todos os três globos de neve nos bolsos do meu vestido, já que não tinha tempo
de abri-los e arrancar as pedras agora. Pela primeira vez, eu estava grata que
minhas saias de seda e crinolina eram tão armadas, que elas ajudavam a
esconder as protuberâncias arredondadas de vidro.
Nesse ponto, eu estava na suíte há quase cinco minutos, o que era
exagerado quando se tratava de serviço de quarto. Então, eu voltei e peguei a
minha bandeja de prata. Eu comecei a andar em direção à porta, então parei
e xinguei, percebendo que eu tinha que me livrar dos dois copos antes de sair
para o corredor, já que entregar o champanhe era ostensivamente minha razão
para estar aqui. Então eu coloquei os copos na mesa.
Eu me dirigi para a porta novamente, mas outro pensamento me
ocorreu, uma maneira que eu poderia ser tão esperta quanto Deirdre tinha
sido quando se tratava das joias.
Então, eu coloquei a minha bandeja na mesa, ergui minhas saias e
corri para o quarto de Deirdre. Corri por entre as pilhas de roupas, sapatos e
bolsas que eu e meus amigos havíamos feito quando tínhamos procurado aqui
ontem e corri para o closet, indo direto para a parede de joias bem no fundo.
Meu olhar vagou por todos os anéis, colares e pulseiras que repousavam nas
prateleiras, antes de me concentrar nas caixas e outros itens que Deirdre
usara para guardar e transportar suas joias desta luxuosa suíte para todas
as outras em que permaneceu por todo o país.
Lá, isso serviria muito bem.
Peguei uma bolsa de veludo preto de uma das prateleiras e apertei-a
para ter certeza de que estava vazia. Apenas o que eu queria.
Peguei outra bolsa vazia e vários outros itens na parede. Então enfiei
tudo nos bolsos do meu vestido, deixei o armário e corri de volta para a parte
principal da suíte. Eu estava aqui há quase dez minutos. Hora de partir antes
que os gigantes do lado de fora ficassem mais desconfiados do que
provavelmente já estavam.
Estendi a mão para a maçaneta novamente, parei e xinguei,
percebendo que dessa vez eu havia esquecido a bandeja. Então eu peguei a
bandeja vazia, tomei fôlego e lentamente saí, tentando controlar meu coração
acelerado, e coloquei um sorriso falso no meu rosto. Eu puxei a maçaneta,
que ainda estava congelada por causa da minha magia de Gelo, e recuei para
o corredor, como se eu ainda estivesse falando com alguém dentro da suíte.
— Não, senhora, obrigada por uma gorjeta tão generosa e uma
conversa tão adorável — eu falei para o benefício dos guardas. — Por favor,
deixe-me saber se você precisar de mais alguma coisa. Terei prazer em ajudá-
la de qualquer maneira que eu puder.
Eu estava exagerando? Oh sim. Mas eu queria que os gigantes se
concentrassem em minhas palavras, não em meus movimentos. Fechei a porta
e virei para o lado, mais uma vez usando minhas saias armadas para bloquear
a visão dos gigantes. Eu segurei a maçaneta, alcancei minha magia de Gelo
novamente, e forcei mais cacos frios no buraco da fechadura e no batente da
porta ao redor da maçaneta, esperando que eles fossem o suficiente para
ancorar a porta por tempo suficiente para eu sair daqui. Só havia uma
maneira de descobrir.
Eu soltei a maçaneta e dei um passo para trás, minha respiração na
garganta, mas a porta não se abriu e deu a entender que eu forcei meu
caminho para a suíte. Mas eu não sabia quanto tempo isso duraria. Hora de
sair enquanto era tempo.
Então eu caminhei pelo corredor até onde os gigantes estavam
posicionados do lado de fora da porta da suíte de Finn. Mais uma vez, todos
ficaram atentos ao me verem e meu peito cheio por causa do espartilho. Eu
segurei minha bandeja ao meu lado, dando-lhes uma melhor visão do meu
peito, enquanto eu agarrava-a com força, pronta para levantá-la e batê-la nos
rostos dos guardas se eles tentassem me parar.
Os gigantes olharam para mim novamente, mas eles não entraram na
minha frente, eu assenti e sorri educadamente quando passei por eles. Por
mais que eu quisesse pegar minhas saias e fazer uma corrida louca até os
elevadores, eu me forcei a andar em um ritmo normal, mesmo que eu pudesse
ouvir dois globos de neve chacoalhando nos bolsos dos meus vestidos. Eu
estremeci e continuei, esperando que os gigantes não notassem os sons. Meu
olhar se fixou nos elevadores à frente, e comecei a contar a distância em minha
cabeça.
Três metros de distância para a segurança... dois metros... um metro
e meio... um metro e vinte... noventa centímetros... sessenta... trinta...
— Ei — um dos gigantes falou. — Deixe-me perguntar uma coisa.
Meu dedo pairou sobre o botão de chamada do elevador. Eu
discretamente dei um soco, então me virei para encarar os gigantes,
levantando as sobrancelhas. — Sim?
— Eles te deram uma boa gorjeta? — O mesmo gigante falou. — Porque
eu certamente teria dado com você nesse vestido.
Ele olhou para mim novamente e soltou um assobio baixo. Seus dois
amigos juntaram-se com suas risadas.
Eu coloquei a mão no meu quadril e fiz uma pose, dando-lhe outro
pequeno aceno. Um largo e genuíno sorriso cruzou meu rosto ao pensar nos
milhões de dólares em joias escondidas nos meus bolsos.
— Ah — eu disse, — foi uma ótima gorjeta. Uma das melhores que eu
já consegui.
Capítulo 21
O elevador chegou, felizmente pondo um fim ao meu flerte forçado com
o guarda, e eu entrei e voltei para o saguão. Olhei em volta, mas não vi Tucker,
Roxy ou Brody em qualquer lugar, embora vários gigantes estivessem
posicionados ao longo das paredes, estudando todos que entravam e saiam e
comparando-os com meus pôsteres de Procurada em suas mãos.
Ainda carregando minha bandeja vazia, deixei o saguão para trás,
voltei para a cozinha e coloquei a bandeja na primeira mesa que eu vi. Um dos
cozinheiros me deu um olhar estranho, mas eu caminhei por ele e empurrei
meu polegar sobre o ombro.
— Fazendo o meu intervalo agora.
Ele assentiu e voltou a cortar os tomates para o prato de massa que
ele estava fazendo.
Saí pela porta dos fundos da cozinha, que dava para um pequeno pátio
de pedra. Algumas garçonetes estavam do lado de fora, amontoadas contra o
frio e fumando cigarros, apesar do grande letreiro vermelho de Proibido Fumar
pendurado na parede. Seus olhos se estreitaram em suspeita, se perguntando
quem eu era e se eu iria denunciá-las para Roxy, mas eu simplesmente assenti
para elas, entrei em um caminho e me afastei do hotel, descendo a colina até
o parque temático.
Como era sábado à tarde, o parque estava mais lotado do que nunca,
com multidões de turistas percorrendo os caminhos, pegando comida dos
carrinhos e ficando em fila para os brinquedos. Eu também passei por vários
personagens fantasiados, os quais pareciam estar segurando uma cópia do
meu pôster de Procurada e examinando a multidão a procura de mim.
Acrescente isso às pedras que pesavam nos bolsos e senti que cada olho estava
firmemente fixo em mim. Minha cicatriz de runa de Aranha coçava e
queimava, e eu tive que me forçar a andar em um ritmo normal, apesar de
tudo que eu queria fazer era correr, correr e fugir de todas as pessoas à minha
procura.
Na verdade, eu não poderia ter fugido de qualquer pessoa neste
momento, por causa de como os saltos altos antiquados estavam apertando
meus dedos dos pés. Mais dispositivos de tortura, junto com o espartilho
estúpido. Eu coloquei um sorriso agradável no rosto e atravessei o parque.
As pessoas me pararam e me pediram para posar para fotos, assim
como quando fiz no meu caminho até o hotel, e eu as tirei porque muitos
outros trabalhadores estavam por perto para que eu não fizesse. Eu não
queria fazer nada suspeito para atrair a atenção de ninguém, muito menos
que um dos artistas enviasse uma mensagem para Roxy ou Brody e
reclamasse da saloon girl que estava ignorando os hóspedes.
Finalmente, saí da Main Street e voltei para a área de descanso atrás
do saloon. Algumas pessoas estavam andando pelos pavilhões, conversando,
rindo e mandando mensagens de texto, mas todos eram apenas trabalhadores
regulares, em vez de fazer parte da gangue de gigante de Brody, e eu não vi
ninguém segurando uma cópia do meu pôster de Procurada. Mais uma vez,
sorri e acenei para todos que passei. Todos eles me deram cumprimentos e
acenos em retorno, depois voltaram para as conversas, embora os cowboys
fantasiados tivessem dado um passo a mais ao inclinarem a ponta dos
chapéus para mim. Que cavalheirismo.
Eu vaguei pelos pavilhões, olhando para todas as fantasias, armas
falsas, ferramentas, barris cheios de laços e outros suprimentos. Enquanto eu
vagava por aí, fiz um inventário mental das coisas que poderiam ser úteis para
mim mais tarde naquela noite, e, também, peguei o único item que eu
precisava agora – uma pinça de aparência robusta. Não exatamente a
ferramenta de precisão que eu queria, mas teria que servir.
Quando terminei meu exame, saí da área de descanso e voltei para a
Main Street. Andei pelas calçadas de madeira, olhando para as fachadas, e
procurando por uma loja que estava cheia o suficiente para que os
trabalhadores fiquem focados nos clientes, mas não tão ocupados que eu não
poderia vagar livremente lá dentro. O Silver Spur, a loja de roupas, parecia
servir, e eu entrei.
Mais uma vez, eu sorri e acenei para todos que eu passei, mas os
turistas aqui estavam muito ocupados fazendo compras para pedir que eu
posasse para fotos. Para minha sorte, os banheiros ficavam bem no fundo da
loja, bem em frente aos vestiários, onde ficava a maior parte do tráfego de
pedestres. Fui para o banheiro feminino, que estava vazio, entrei em uma das
baias e tranquei a porta atrás de mim. Fechei a tampa do vaso sanitário,
sentei-me e respirei fundo.
Então, finalmente, finalmente consegui tirar os globos de neve dos
bolsos do vestido e examiná-los.
De perto, eles eram coisas baratas e frágeis, não as caras e pesadas
como os que a minha mãe tinha todos aqueles anos atrás. E Deirdre não tinha
feito um bom trabalho em proteger as pedras dentro, pois mais e mais delas
começaram a se soltar quando virei o globo da Main Street de cabeça para
baixo nas mãos.
O globo era como um frasco de vidro, com a base de madeira rosqueada
para dentro do vidro. Eu rapidamente tirei a base, coloquei de lado e me
ajoelhei no chão do banheiro. Um ralo estava embutido em um ladrilho entre
a minha cabine e a seguinte, então eu segurei minha palma como uma
peneira, cuidadosamente inclinei o globo, e derramei toda a água do vidro,
deixando-a escorrer da minha mão e cair no ralo abaixo.
Eu fui devagar, apenas derramando um pouco da água de cada vez, e
certificando-me de não perder nenhuma das pedras preciosas. Depois que
toda a água se foi, e as gemas estavam secando em um pedaço de papel
higiênico, e peguei a base de madeira, que tinha a cena da Main Street
aparafusada nela, e usei a pinça para gentilmente tirar o resto das joias da
placa do Bullet Pointe e outros lugares onde Deirdre as colou.
Cinco minutos depois, eu tinha uma pilha impressionante de
diamantes, junto com várias outras pedras. Coloquei tudo em um dos meus
sacos de veludo preto, depois repeti o processo nos outros dois globos.
Quando terminei, levantei o saco de veludo em minhas mãos. Sem o
vidro e a água em volta delas, eu podia ouvir claramente os murmúrios das
pedras preciosas, que eram altos, vaidosos e orgulhosos o suficiente para
permitir que eu estimasse seu valor. Pelo menos dez milhões de dólares, se
não mais. Agradável. Enquanto isso era apenas uma gota no balde comparado
às dezenas de milhões que Deirdre devia ao Círculo, cada pedacinho ajudava.
Ainda mais importante, agora eu tinha algo que Tucker queria, e ele ia
me devolver meus amigos.
Oh, eu não era estúpida o suficiente para pensar que o vampiro
honraria qualquer acordo para troca que pudéssemos fazer. Eu esperava que
ele me traísse no mínimo e me matasse na pior das hipóteses. Mas eu estaria
pronta para Tucker, Roxy, Brody e todos os outros. Eu poderia estar presa em
seu parque temático, mas esta Aranha poderia criar suas próprias armadilhas
e teias.
Eu tinha mais trabalho a fazer, então eu coloquei o saco de pedras
preciosas de lado, peguei algumas das outras coisas que eu tinha tirado da
parede de joias de Deirdre, e fui trabalhar novamente com as pinças. Assim
que terminei o segundo projeto, me levantei, abri a porta do box e joguei os
globos de neve vazios no lixo. Então eu fui até uma das pias para lavar todo o
glitter das minhas mãos.
Eu acabava de secar as minhas mãos quando meu telefone tocou.
Tirei-o do bolso do meu vestido e chequei a mensagem. Era de Silvio,
naturalmente. Ele tinha feito um bom tempo dirigindo até aqui, já que ainda
não eram cinco horas.
No restaurante. Vestindo um chapéu cinza.
Bem, isso era interessante. Parecia que o meu assistente tinha
aceitado a minha sugestão para disfarçar-se. Mandei-lhe uma mensagem em
resposta.
Estou a caminho.
Peguei o saco de veludo preto na pia, certificando-me de que as cordas
na parte de cima estavam bem fechadas, para que não perdesse nenhuma das
joias por dentro, depois enfiei tudo no meu espartilho, bem perto do meu colar
de runa de Aranha.
Era um ajuste apertado, e certamente não tornava o espartilho mais
confortável, mas era o lugar mais seguro que eu tinha agora. Uma vez eu tinha
certeza de que tudo ia ficar no lugar, eu abri a porta e saí do banheiro.

***

A loja de roupas Silver Spur não era tão longe da churrascaria do


Feeding Trough, mas ainda assim demorei vinte minutos para chegar lá,
principalmente porque eu tinha que parar, sorrir e tirar mais fotos idiotas. Eu
era a única saloon girl em todo o parque temático com quem as pessoas
queriam posar junto? Talvez fosse o vestido vermelho-sangue, me fazendo
sobressair em um mar de rosas, verdes e azuis pálidos. Eu estava cansada de
sorrir para a câmera, então eu entrei no restaurante antes que alguém
pudesse me parar.
Como era final da tarde, a multidão do jantar ainda não tinha
aumentado, e apenas algumas pessoas estavam lá dentro. Melhor ainda, a
maioria deles estava fantasiada, com os vaqueiros, jogadores e garimpeiros de
ouro comendo sanduíches de churrasco, cheeseburgers, rodelas de cebola e
batatas fritas antes de voltarem para suas atividades.
Os únicos fantasiados fora do lugar eram os três caminhoneiros.
Todos usavam botas de trabalho marrom, jeans escuros e coletes
vermelhos sobre camisas xadrez vermelhas. Chapéus cinza de caminhoneiros
com as palavras Cypress Mountain Shipping costuradas no topo em vermelho
foram puxadas para baixo na testa, e os três tinham seus narizes enterrados
em seus cardápios. Apesar de seus disfarces, eu ainda os reconheci.
Eu andei até a mesa deles. — Vocês se importam se uma pobre,
simples e esforçada saloon girl se juntar a vocês? — Eu falei no mesmo
sotaque doce e suave que eu usara em Brody antes.
— Vá embora, garota, — um dos caminhoneiros resmungou. —
Estamos esperando alguém.
— Bem, Silvio, — eu o repreendi, — essa é a maneira de falar com sua
chefe?
O caminhoneiro que falou olhou para cima. Meu assistente ficou bem
em seu disfarce. Além de sua roupa de caminhoneiro, ele também usava uma
peruca cinza desgrenhada, e um bigode cinza igualmente desgrenhado cobria
o lábio superior. Parecia que um verme lanoso tinha se arrastado até lá e
morrido.
Sílvio apertou os olhos. — É você...
Uma garçonete estava caminhando em direção a outra mesa, então eu
puxei uma cadeira e me sentei ao lado de Silvio. — Com certeza, querido.
Sassy11 Scarlet ao seu serviço.
Eu bati meus cílios para ele, então me virei e olhei para as outras duas
pessoas sentadas à mesa – Lorelei Parker, também com um chapéu de
caminhoneiro, e Phillip Kincaid, com um chapéu e um bigode falso loiro.
O olhar azul de Phillip varreu minha peruca loira, a pinta negra e a
roupa de saloon girl. Ele pegou o telefone, ergueu-o e apontou para mim. —
Diga queijo, Scarlet.
Teria parecido suspeito se eu não fizesse isso, então eu me inclinei ao
lado de Silvio, coloquei meu braço em torno dos ombros dele e sorri. — Você
sabe, eu ia graciosamente agradecer a todos por terem vindo, por quererem
ajudar, por arriscarem suas vidas por nossos amigos. O pacote completo. Eu
tinha um discurso preparado e tudo. Era lindo.
— E agora? — Phillip murmurou, virando o seu telefone para um
ângulo melhor.
— E agora, eu quero esfaqueá-lo com o meu garfo — eu disse com os
dentes cerrados.
Ele riu e tirou mais duas fotos.
— Mande-me essas — disse Lorelei.
Phillip assentiu e apertou alguns botões do telefone. — Feito.
Eu olhei para Lorelei também, mas ela me deu um sorriso doce em
retorno.
— E apenas pense, aquelas fotos estão na nuvem agora, Gin, — Phillip
disse em um tom alegre. — Onde elas ficarão e serão vistas para sempre.

11 Atrevida
Revirei os olhos, em seguida, olhei ao redor do restaurante. — Onde
está Ira? — Perguntei em voz baixa.
— Sr. Morris estava esperando por nós na entrada principal do parque
— disse Silvio. — Ele cuidou de colocar os nossos suprimentos no parque e
disse a todos os guardas que éramos amigos dele. Eles olharam muito para
Lorelei, pensando que ela poderia ser você, mas finalmente nos deixaram
entrar. O Sr. Morris estava vindo para cá com a gente, mas ele recebeu um
texto da Roxy, dizendo que ela estava em sua cabana, procurando por você.
Então ele foi lidar com ela, enquanto nós viemos aqui como planejado.
Eu assenti. Ira havia dito que Roxy iria a verificar sua cabana mais
cedo ou mais tarde. Fiquei feliz que isso foi mais tarde, e eu não estava lá para
causar-lhe mais problemas.
— Então, quais são as últimas notícias? — Silvio perguntou.
Comecei a responder, mas uma garçonete escolheu aquele momento
para vir e anotar o nosso pedido. Os outros pediram chás doces gelados,
juntamente com cheeseburgers com bacon e com todos os acompanhamentos,
enquanto eu optei por limonada de morango, sanduíche de frango grelhado,
salada de repolho, feijões cozidos, batatas fritas e anéis de cebola.
— Com fome? — Phillip perguntou depois que a garçonete tinha
anotado meu pedido e foi embora.
Eu encolhi os ombros. — Apenas construindo minha força para esta
noite. Além disso, não é que eu tenha tido um almoço satisfatório.
Enquanto esperávamos pela nossa comida, eu disse a Silvio, Phillip e
Lorelei tudo o que tinha acontecido enquanto eu estava me esgueirando por
aí.
— Então Hugh Tucker armou tudo isso e atraiu vocês até aqui para
fazer o trabalho sujo por ele, — Phillip meditou. — Ele se deu muito trabalho
por algumas pedras bonitas.
Mesmo que elas estivessem enfiadas no meu espartilho, eu ainda podia
ouvir as pedras preciosas cantando orgulhosamente sobre sua própria beleza.
— Não apenas algumas pedras bonitas — eu disse. — Milhões de quilates
cintilantes.
A garçonete voltou com a nossa comida, e todos nós avançamos. A
comida estava muito melhor do que tinha sido na última vez que eu comi aqui
algumas horas atrás. As batatas fritas e os anéis de cebola estavam dourados
e crocantes, enquanto a salada tinha uma pitada de vinagre. O sanduíche de
frango grelhado e os feijões cozidos, entretanto, foram decepcionantes, já que
o molho em ambos não tinha o cominho picante e a pimenta preta que tinha
no molho secreto de Fletcher no Pork Pit. E o melhor de tudo era que minha
limonada não tinha um sedativo.
Enquanto comíamos, eu ficava de olho nas janelas, observando o fluxo
e refluxo de pessoas nas calçadas. A cada poucos minutos, um par de gigantes
passeava, segurando meus pôsteres de Procurada em suas mãos e
examinando a multidão a minha procura. Eles até pararam e olharam através
das janelas várias vezes, espreitando dentro do restaurante de churrasco. Mas
eu era apenas outra saloon girl, comendo meu jantar antes de voltar ao
trabalho. Sim, esconder-se à vista de todos era um dos melhores truques.
Obrigada pela lembrança, Mamãe Dee.
Meus amigos também notaram os gigantes, e agiram casualmente e se
concentraram em sua comida, como eu fiz, até que os guardas se afastaram
da janela do restaurante.
Sílvio me olhou por um momento, depois suspirou, amassou o
guardanapo e empurrou o prato para longe. — Uh-oh. Eu conheço esse olhar.
— Que olhar?
Ele apontou o dedo para mim. — Esse olhar. Aquele que diz que você
já pensou em algum plano para salvar Finn, Bria e Owen, com perigo
considerável para si mesma.
Eu fiz uma careta. — Existe algum outro tipo de plano? Eu certamente
não vou colocar vocês em perigo. — E fiz uma pausa. — Bem, não em mais
perigo do que o absolutamente necessário.
Silvio suspirou novamente. — E é exatamente isso que esse olhar
significa.
— O que você tem em mente? — perguntou Lorelei.
Esperei até que a garçonete tivesse resposto nossas bebidas pela
última vez, deixado a conta e saído para a próxima mesa. — É simples, na
verdade. Eu vou dar a Hugh Tucker exatamente o que ele quer.
Phillip inclinou a cabeça. — E o que seria isso?
Eu sorri. — Um grande momento no Velho Oeste, no estilo da Aranha.
Capítulo 22
Não queria entrar nos detalhes do meu plano aqui, então Silvio pagou
a conta, e nós quatro saímos do restaurante.
— Eu quero verificar Ira, — eu disse aos outros. — Pegar nossos
suprimentos e ter certeza de que ele está bem e que o Roxy não causou
nenhum problema a ele. Sua cabana é por aqui.
Silvio, Phillip e Lorelei andaram pelas calçadas de madeira, fingindo
olhar as vitrines como todos os outros turistas, enquanto eu passeava atrás
deles, mantendo-os à vista, enquanto sorria e posava para ainda mais fotos
estúpidas. Lentamente, nós quatro saímos da Main Street, descemos uma
viela e fomos para o caminho curvo e arborizado que levava à cabana de Ira.
Depois que deixamos a multidão para trás, nos movemos muito mais
rápido, embora eu tenha feito meus amigos saírem do caminho e rastejarem
pelas árvores quando nos aproximamos da cabana. Eu me esgueirei até um
grande bordo e espiei o tronco grosso.
Na clareira mais adiante, Ira estava sentado em uma cadeira de
balanço na varanda da frente de sua cabana, as luzes do suéter de floco de
neve piscando e fazendo brilhar a espingarda apoiada no seu colo. Eu
cuidadosamente examinei a área ao redor da cabana e a floresta além, mas
não vi Roxy, Brody ou qualquer gigante à espreita. Eles devem ter ido embora,
quando perceberam que eu não estava aqui. Dei um suspiro de alívio. Eu
estava preocupada com Ira.
Ainda assim, fiz um gesto para meus amigos ficarem para trás
enquanto eu saía das árvores e lentamente me aproximava do anão, ainda
procurando por qualquer sinal de que ele não estivesse sozinho. Ira parou de
balançar e levantou-se com minha aproximação, a espingarda balançando na
mão.
— Não se preocupe — disse ele, batendo no cano de sua arma. — Eles
foram embora. E eles não voltarão. Eu disse a Roxy e Brody que se eu os visse
em minha terra novamente, eu colocaria uma carga de chumbo no traseiro
deles.
Eu ri. — Você deveria fazer isso de qualquer maneira.
Ele pensou nisso por um segundo, então sorriu de volta para mim. —
Você está certa. Eu deveria.
Acenei para meus amigos e entramos na cabana. Ira trancou a porta
atrás de nós, enquanto Phillip se moveu para uma das janelas, vigiando no
caso de que Roxy e Brody decidissem voltar depois de tudo.
Ira apontou o polegar para um grande baú preto que estava na frente
à lareira. — Não foi fácil, mas consegui trazer os suprimentos que seus amigos
trouxeram com eles. Muitas armas para apenas vocês quatro.
— Acredite em mim, — eu disse, — nós precisaremos delas.
Ira abriu o baú, e Silvio começou a examinar todos os itens dentro,
reclamando que o anão tinha apenas jogado tudo no baú e arruinado a
organização cuidadosa de Silvio. Ira apoiou as mãos em seus quadris, pronto
para brigar com o vampiro, e Lorelei foi mediar entre eles.
Isso me deixou para começar a rolar a bola com Tucker, então eu
peguei meu telefone e disquei o número principal do hotel.
— Olá, este é o hotel resort Bullet Pointe. Como posso ajudá-lo? —
Uma voz animada e feminina falou em meu ouvido.
— Aqui é Gin Blanco. Diga a Roxy Wyatt que quero falar com Hugh
Tucker. Não se preocupe, eu vou esperar.
— Hum, tudo bem. Só um segundo. Deixe-me ver se eu posso
encontrá-la.
— Oh, eu tenho certeza de que ela virá correndo assim que perceber
que eu estou na linha.
— Hum, tudo bem, — a funcionária disse novamente, obviamente não
tendo ideia quem eu era ou o que estava acontecendo.
Ela me colocou em espera, e eu me encostei na lareira, ouvindo o
mesmo tipo de música de piano que eles tocavam incessantemente no Good
Tyme Saloon.
Cinco minutos e tons intermináveis depois, meu celular clicou. Eu
coloquei no viva-voz e acenei para meus amigos, para que todos ficassem em
silêncio. Alguns segundos depois, alguém atendeu do outro lado da linha. No
entanto, ele não disse nada, então decidi começar a conversa.
— Bem, olá, Tuck — eu disse. — Aposto que você não pode adivinhar
quem é.
— Blanco — a voz do vampiro encheu meu ouvido. — Que
decepcionante. Eu estava segurando uma fraca esperança de que você tivesse
se arrastado até um buraco em algum lugar e morrido.
— Nós dois sabemos que você nunca poderia ter essa sorte.
— Não, eu suponho que não. —Sua voz era calma e sem emoção. — O
que você quer?
— Eu quero meus amigos de volta. E eu vou pegá-los de volta. Quanto
ao derramamento de sangue, entretanto, depende de você.
Tucker soltou uma risada baixa e sinistra. — Como se eu me
importasse com derramamento de sangue. Além disso, por que eu daria seus
amigos de volta quando eu tive tantos problemas para trazê-los até aqui em
primeiro lugar?
— Oh, eu não sei. Talvez alguns milhões de dólares em pedras
preciosas? Com certeza, isso vale uma vida ou três, mesmo para um filho da
puta de coração frio como você.
Silêncio, embora eu quase pudesse ouvir as engrenagens na mente de
Tucker enquanto ele debatia se eu estava dizendo a verdade.
— Você está blefando. Meu pessoal tem procurado por semanas e não
viu nenhum traço das joias. Não há como você as ter encontrado em uma
única tarde.
— Oh, docinho. Eu nunca blefo.
Ele bufou.
— Além disso, a razão pela qual você atraiu a mim e meus amigos até
aqui foi para que pudéssemos encontrar essas pedras preciosas para você. E
agora você está dizendo que eu não as encontrei? — Eu estalei minha língua.
— Você não pode ter as duas coisas, Tuck.
— Eu ainda não acredito em você.
— Bem, eu poderia tirar uma foto e enviar isso para você, mas você
provavelmente não iria acreditar nisso também. Você apenas alegaria que eu
tinha um punhado de falsificações. Então, por que você não vai perguntar aos
gigantes que você tem guardando meus amigos sobre a deslumbrante saloon
girl no vestido vermelho-sangue que entrou na suíte de Deirdre pouco tempo
atrás?
— O que...
— Não se preocupe — eu disse, interrompendo-o. — Estou com de bom
humor, então vou lhe dar um tempo para confirmar tudo. Vou ligar novamente
para a linha principal do hotel em dez minutos. Se eu fosse você, eu diria à
balconista para me transferir direto. Melhor se mexer agora, está ouvindo?
— Espere...
Eu desliguei.
— Você gostou disso — disse Lorelei.
Eu sorri. — São as pequenas coisas que fazem a vida realmente valer
a pena.
A essa altura, ela e Silvio já tinham tirado os papéis e os equipamentos
fotográficos da mesa de jantar de Ira, retiraram todos os suprimentos do baú
e colocaram tudo na superfície. Armas, munição, facas, latas de pomada
curativa da Jo-Jo. Todos os suspeitos de costume.
Silvio também conseguiu um mapa do parque temático, que ele abriu
em cima das armas, e entrou no modo de assistente completo, comparando o
mapa em papel a algumas fotos aéreas que ele acessou em seu tablet.
— Este lugar é como um labirinto — disse ele. — Olhe para todos esses
caminhos circulando ao redor e indo a lugar nenhum.
Eu assenti. — Eu sei. E é isso que vai me dar a vantagem.
Silvio me olhou com o canto do olho, claramente imaginando que tipo
de vantagem eu estava falando.
Os dez minutos se passaram rapidamente, embora eu esperei mais
cinco, só para fazer Tucker suar um pouquinho. Ele se deu ao trabalho de
arrumar tudo aquilo, e eu sabia que ele faria o que fosse necessário para
recuperar aquelas pedras, até mesmo esperar por minha ligação. Eu me
perguntei quanta pressão os outros membros de seu precioso Círculo tinham
colocado sobre ele para recuperar pelo menos parte do dinheiro que Deirdre
tinha desperdiçado. Deve ter sido uma quantia considerável, já que parecia
que ele estava mais com medo deles do que de mim.
Tucker era um idiota dessa maneira.
Finalmente, eu disquei o número principal do hotel novamente. Assim
que eu disse à balconista meu nome, ela rapidamente me colocou em espera.
Tucker atendeu menos de trinta segundos depois.
— O que você quer? — Ele rosnou.
— Então você acredita em mim agora. Excelente, — eu ronronei. — E
eu quero o que sempre desejei – o regresso em segurança dos meus amigos.
Eles pelas joias. Uma troca simples. Até você pode fazer matemática básica,
Tuck. Claro, eu quero falar com eles primeiro. Certificar-me de que eles ainda
estão vivos. Então, por que você não faz essa chamada ser transferida para a
suíte do Finn? Não se preocupe. Eu vou esperar.
— Você não dá as ordens por aqui, Blanco...
Eu o interrompi. — Ou posso seguir até o lago, entrar em um barco e
largar esse lindo saco de pedras cintilantes no meio da água. Sua escolha,
Tuck.
— Tudo bem, — o vampiro rosnou novamente. — Espere.
Phillip ainda estava de pé perto das janelas, vigiando, mas ele olhou
para mim, o respeito brilhando em seus olhos. — Fazendo-o correr e cumprir
sua ordem? Isso deve estar deixando Tucker maluco.
Sorri novamente. — Esse é o ponto.
Enquanto esperávamos que Tucker voltasse para a linha, Silvio tirou
um marcador vermelho do bolso de sua camisa xadrez vermelha e começou a
marcar todas as entradas do parque.
— Eu não gosto disso — disse ele, balançando a cabeça. — Eu não
gosto nada disso.
— Eu também não gosto — respondi. — Mas é o que é. Temos que fazer
o melhor possível – pelo bem de Finn, Bria e Owen.
Silvio assentiu, mas seu rosto apertou-se com preocupação.
Finalmente, meu celular tocou e um leve zumbido soou, me dizendo
que alguém estava na linha. Eu esperei, meus dedos enrolando apertados ao
redor do telefone, e minha respiração ficou presa na garganta.
— Gin? — A voz de Finn finalmente soou.
Meu corpo inteiro cedeu, e eu segurei o telefone longe do meu rosto
para que ninguém do outro lado pudesse ouvir meu suspiro de alívio. Então
eu trouxe o dispositivo de volta aos meus lábios novamente. — Como você
está?
— Um pouco grogue. — Suas palavras arrastaram um pouco. — Você
achou as joias?
— Eu as encontrei, e vou tirar vocês daqui. Apenas espere. Ok?
— Ok. — Finn fez uma pausa. — E cuidado com os besouros. Eles
estão em toda parte nesta época do ano. Eu posso vê-los agora, voando por
aqui...
Sua voz se afastou, e ele soltou uma pequena risada, como se ainda
estivesse sob a influência daquele sedativo. Mas besouros era um código que
Fletcher inventara para nós há muito tempo, e eu reconheci as palavras como
o aviso que elas eram. Finn estava me dizendo que qualquer encontro com
Tucker seria uma armadilha e que o vampiro tinha muitos homens com ele.
Eu já sabia de tudo isso, mas meu coração ainda se levantou com o fato de
que Finn estava bem o suficiente para tentar me ajudar.
— Você está satisfeita agora? — Tucker retrucou, voltando na linha. —
Todos os seus amiguinhos preciosos ainda estão vivos. Mas eles não vão ficar
assim por muito tempo a menos que você me dê essas joias.
— E se você machucar qualquer um deles, você nunca conseguirá as
pedras. Então, eu diria que temos um impasse aqui.
Silêncio. Tucker limpou a garganta. — Bem, então, se você
simplesmente trouxer as joias para o hotel, podemos resolver toda essa
situação confusa...
Eu ri, cortando-o novamente. — Então você pode ter Roxy, Brody e
todos aqueles gigantes me cercando e me matando? Esqueça. Você vai me
encontrar no parque temático, do lado de fora do saloon, bem no meio do Main
Street. À meia noite. Só você e meus amigos. Ninguém mais.
— Ou?
— Ou eu vou esquecer o lago e jogar cada uma dessas pedras no
primeiro banheiro que eu ver. Acredite em mim quando digo que há um por
perto.
— Você não faria isso. Não enquanto eu ainda tenho seus amigos.
Eu ri novamente. — Oh, sim, eu faria. Apenas por despeito.
Especialmente se você os ferir de alguma forma. Mas vamos ser honesto. Não
é um risco que você vai correr.
— Tudo bem — disse Tucker. — Eu te encontrarei no meio da Main
Street com seus amigos a reboque. E Blanco... nem pense que você pode me
enganar e escapar. Eu tenho esse lugar cercado. Ninguém entra ou sai –
incluindo seus amigos – até que eu tenha essas joias.
— Isso é...
Eu ia lançar outro insulto para ele, mas o bastardo me ultrapassou e
desligou o telefone.

***

Após uma troca de roupa, meus amigos e eu começamos a nos


preparar para esta noite.
A primeira coisa que fiz foi ir para o quarto e me livrar do meu disfarce
torturante. Eu tirei o vestido de saloon girl sem nenhum problema, embora eu
tivesse que chamar Lorelei para me ajudar a desamarrar o espartilho. Ela riu
o tempo todo. Eu também tirei os saltos antiquados, a peruca loira e a pinta
que eu tinha colocado no meu rosto.
Felizmente, Silvio me trouxe algumas roupas extras, então eu pude
colocar meu traje habitual de assassina – botas pretas, meias, jeans, gola alta
e um colete forrado de silverstone, o que impediria a entrada de qualquer
projétil em minha direção. Passei os dedos pela borda do colete e pensei na
facilidade com que Roxy atirou no meu braço hoje mais cedo e o quanto suas
balas revestidas de Fogo tinham machucado. Eu teria que investir em uma
jaqueta de silverstone quando voltasse para Ashland.
Se eu voltasse para Ashland.
Eu ainda tinha todas as minhas cinco facas, que eu coloquei em seus
lugares de costume. Eu também coloquei uma faca extra nos bolsos do meu
colete, junto com algumas latas de pomada de cura da Jo-Jo. Como toque
final, peguei emprestado um cinto de couro preto de Ira e coloquei duas
pistolas equipadas com silenciadores nos canos. Armas ficavam sem munição
muito rapidamente para o meu gosto, mas eu precisaria de todo o poder de
fogo que eu pudesse conseguir esta noite.
Eu coloquei uma última coisa no bolso do meu colete – um saco de
veludo preto cheio de joias. Não podia me esquecer disso.
Uma vez que eu estava pronta, alisei as rugas do vestido de Sweet Sally
Sue o melhor que pude e pendurei-o no cabide. Eu olhei para o vestido por
um momento, pensando, então peguei um item de suprimentos misturados
na cama e coloquei em um dos bolsos do vestido. Satisfeita, eu sorri, peguei o
cabide e levei o vestido de volta para a sala principal, onde os outros estavam.
— Aqui está. — Eu entreguei o vestido para Ira. — Eu não sujei o
vestido de sangue, o que, deixe-me dizer, é algo milagroso para mim. Mas você
ainda deve verificar isso mais tarde. Certifique-se de que não haja nenhuma
mancha ou especialmente buracos nos bolsos.
Ele me deu um olhar estranho, imaginando por que eu me importaria
tanto com o vestido, mas ele assentiu e pendurou a peça em uma maçaneta
na parede para ajudar a tiras as rugas.
Depois disso, Ira foi até a mesa da sala de jantar, onde Silvio, Phillip e
Lorelei ainda olhavam para o mapa do parque, memorizando a localização de
tudo, desde os quiosques e carrinhos de comida até as fontes de água e
banheiros. Eu me juntei a eles, estudando o mapa também, assim como eu
tinha estudado o parque quando eu estava explorando com Finn, Bria e Owen
hoje cedo. Você nunca sabia o que poderia ser importante quando estava
lutando por sua vida, e esta noite eu precisaria de todas as vantagens que
pudesse obter.
— Então, você finalmente vai nos informar sobre o seu plano? —
Perguntou Phillip.
Eu apontei para o mapa do parque temático. — Esse... Esse é o meu
plano.
Lorelei franziu a testa. — O que você quer dizer?
Silvio percebeu o que eu estava tramando, e ele começou a sacudir a
cabeça. — Eu sabia — disse ele. — Eu sabia que você ia fazer algo assim.
— Algo assim como o quê? — Ira perguntou.
Eu bati meu dedo no mapa. — Tucker acha que me prenderá no parque
temático. Não importa o que ele me disse no telefone, ele não vai vir e me
enfrentar, e ele certamente não vai esperar até a meia-noite para colocar as
mãos sobre essas pedras preciosas. Assim que o parque seja fechado esta a
noite, e todos os trabalhadores e turistas se forem embora, ele enviará Roxy,
Brody e seus gigantes, esperando que eles possam me encontrar, me matar e
pegar as joias.
Isso é o que eu faria em sua situação, e eu sabia que Roxy estaria
ansiosa para me confrontar. Afinal, ela era uma caçadora, e Gin Blanco era
um grande jogo, baby.
— Tucker quer essas pedras mais do que qualquer outra coisa — eu
continuei. — Então, ele provavelmente enviará a maioria de seus gigantes para
o parque temático atrás de mim. Espero que ele só deixe alguns homens para
trás para guardar Finn, Bria e Owen no hotel. De qualquer maneira, duvido
que Tucker tenha percebido que eu pedi ajuda. Então, enquanto eu estiver
correndo pelo parque temático sendo a distração, vocês três podem ficar de
olho no hotel. Tucker terá que tirar Finn, Bria e Owen para fora da suíte e
descer até o saguão em algum momento, nem que seja para levá-los até a Main
Street para o nosso encontro. Não importa o que aconteça comigo, eu quero
que vocês peguem os três no segundo que tiverem a chance.
Silvio suspirou, ainda não gostando do meu plano, mas ele percebeu
que não havia como me dissuadir disso, e assentiu. O mesmo aconteceu com
Phillip e Lorelei.
Ira limpou a garganta. — Quatro. Seremos quatro. — Ele cruzou os
braços sobre o peito, desafiando-me a argumentar.
Eu sabia quando era derrotada e lhe dei um sorriso agradecido. —
Quatro de você então.
Ele acenou de volta para mim.
Nós discutimos mais algumas coisas, mas depois disso, não havia
nada a fazer além de esperar pelo fechamento do parque. Eu acabei me
sentando no sofá, minha cabeça repousando contra um travesseiro grande e
fofo, e meus pés esticados em um pequeno pufe. Talvez tenha sido o calor
agradável do fogo ou os últimos resíduos do sedativo no meu sistema, mas
meus olhos se fecharam lentamente e comecei a sonhar...
O atirador pairou sobre de mim, seu dedo enrolando de volta no gatilho,
e eu sabia que ia morrer, bem aqui na minha própria casa.
Eu sempre me senti tão segura, tão segura aqui. Eu sempre pensei que
nada de ruim poderia acontecer, enquanto eu estivesse dentro dessas paredes,
onde as pedras cantavam suavemente para eu dormir todas as noites.
Me deixou mal do estômago ao perceber o quão errada eu estava.
O homem deu um passo à frente. e ajustou sua pontaria. Eu coloquei
minhas mãos no chão, mas eu caí em um tapete persa grosso, em vez do chão
de pedra escorregadio, e eu não ia ser capaz de sair do caminho antes dele
disparar em mim à queima roupa na cabeça...
Uma bola branca azulada de magia explodiu no ar, batendo direto na
arma do cara. Ele gritou e cambaleou para trás, tentando soltar a arma. Só que
ele não podia, já que sua mão inteira agora estava envolta em um grosso bloco
de gelo elemental, junto com sua arma.
O homem gritou de novo, esticou o braço com a mão livre e tirou outra
arma da parte de baixo de suas costas, mas seus movimentos eram lentos e
desajeitados, e eu sabia o que ia acontecer a seguir.
A magia encheu o escritório, fria o suficiente para fazer minha respiração
congelar no ar. Só que desta vez, a luz se separou em um borrifo mortal de
adagas de Gelo, todas perfuraram o peito do homem com a arma. Sangue
espirrou em todas as direções das feridas pontiagudas, gotas quentes caindo
no meu rosto como abelhas. Sua segunda arma caiu da sua mão, e ele gritou e
agarrou seu peito, como se fosse tirar todos aqueles longos e cintilantes pedaços
de Gelo.
Mas era tarde demais para isso.
O homem cambaleou para trás, batendo na parede à minha frente e
suas pernas deslizaram debaixo dele. Um segundo depois, ele estava no chão,
de frente para mim. Meu olhar se trancou com o dele. Mesmo que a máscara de
esqui ainda cobrisse seu rosto, eu poderia dizer que ele parecia surpreso, como
se ele nunca tivesse pensado que ele poderia acabar como os aperitivos na festa
de Natal mais cedo.
Ele abriu a boca para dizer alguma coisa, mas só um fino fio de sangue
saiu de lá, embora cada vez mais escorresse pelo seu peito, encharcando suas
roupas pretas. Seu olhar escuro trancou-se novamente com o meu, mas seu
corpo ficou frouxo, e eu poderia dizer que ele não estava me vendo. Não mais.
Ainda olhando para o homem morto, eu estremeci e passei meus braços
em volta de mim...
Uma sombra caiu sobre mim, e eu lentamente olhei para cima. Minha
mãe se elevou acima de mim, as chamas brancas azuladas da sua magia ainda
estalavam em sua mão. Ela olhou para o homem, certificando-se de que ele
estava morto, depois caiu de joelhos na minha frente. Ela ainda estava
segurando sua magia, e o arrepio frio afundou em meu corpo, exatamente como
os punhais de Gelo tinham feito no peito do intruso. Eu me afastei dela, tentando
me pressionar contra a parede, através da parede, e do outro lado para algum
lugar muito longe. Onde não havia homens armados rastejando ao redor. Onde
era seguro. Onde eu estava segura.
Em qualquer lugar, menos aqui, onde eu acabei de ver minha mãe matar
um homem.
— Genevieve! Você está bem? — A voz de mamãe era tão alta quanto
um trovão no silêncio absoluto de seu escritório.
Tudo o que eu podia fazer era apenas olhar para ela. Eu sentia frio e
dormência, por dentro e por fora, como se ela tivesse me congelado com a sua
magia do Gelo, em vez do atirador.
Mamãe soltou sua magia de Gelo e se inclinou para frente, como se fosse
passar as mãos pelo meu corpo e certificar-se de que eu estava bem, mas me
afastei dela novamente. Por um segundo, a confusão encheu os olhos azuis,
junto com mais do que um pouco de mágoa. Mas essa mágoa rapidamente se
transformou em uma compreensão sombria.
Ela lentamente baixou as mãos para os lados e se balançou para trás,
colocando uma pequena distância entre nós. Ela ficou assim por mais de um
minuto, apenas me deixando olhar para ela, enquanto minha mente se agitava
e se agitava, tentando entender tudo o que tinha acabado de acontecer.
— Você está sangrando — mamãe finalmente disse, apontando para a
ferida feia na palma da minha mão. — Se importa se eu der uma olhada nisso?
Eu olhei para baixo e percebi que estava segurando minha mão
machucada contra o meu peito, espalhando sangue por todo o meu pijama de
floco de neve azul. Eu tinha esquecido tudo sobre o vidro do globo de neve que
cortara minha palma, mas agora que eu estava olhando para ele, eu podia
sentir a ferida profunda e latejante.
— Genevieve? — A voz de mamãe era quase um sussurro. — Posso olhar
para a sua mão? Por favor?
Aquele suave por favor finalmente penetrou meu choque, horror e
descrença. Porque minha mãe sempre dizia por favor e obrigado, e ela perfurava
essas palavras em mim e minhas irmãs também. Isso fez com que ela
parecesse, bem, mamãe novamente, e não a poderosa elemental do Gelo que
acabara de matar um homem.
Eu assenti e estendi minha mão para ela.
Mamãe se inclinou para frente novamente, seus dedos frios contra a
minha pele enquanto eles gentilmente sondavam a ferida. Eu tentei não pensar
sobre a magia do Gelo espreitando logo abaixo da superfície de sua própria
pele. Eu sempre soube que ela era uma forte elemental, mas realmente assisti-
la soltar aquele poder contra outra pessoa... realmente sentir sua força fria...
realmente ver o quão facilmente ela matou o atirador com sua magia...
Eu não sabia o que pensar sobre isso – ou dela – agora mesmo.
— Não parece muito profundo — disse minha mãe, tentando injetar
alguma falsa leveza em sua voz. — Vamos limpar você. Vou colocar um pouco
de pomada de cura elemental do Ar nela, e você estará tão boa quanto nova no
dia seguinte.
— E como você vai limpar isso? — Eu sussurrei, apontando um dedo
tremendo para o homem morto.
Ela não olhou para ele, mas sua boca se apertou em uma linha fina e
apertada. — Não se preocupe com ele, Genevieve. Ele invadiu nossa casa e
ameaçou você. Ele conseguiu exatamente o que merecia.
O veneno frio em sua voz me chocou, e eu olhei para essa pessoa
estranha que eu nunca tinha visto antes. — Mas você sempre diz que não
devemos usar nossos poderes para machucar outras pessoas. Que não é para
isso que nossa magia elemental serve.
Mamãe se inclinou para frente novamente e gentilmente segurou meu
rosto em sua mão. Talvez fosse minha imaginação, mas os dedos pareciam mais
frios do que antes, e quase pensei que podia ver a magia de Gelo correndo
através da veia azulada em sua têmpora. Eu pressionei meus lábios e contive
um arrepio.
— Isso é verdade. Não devemos usar nossa magia para prejudicar os
outros, a menos que seja absolutamente necessário defender a nós mesmos e
às pessoas que amamos. Assim como foi para mim esta noite. Você entendeu?
Eu assenti, fingindo entender e tentando ignorar quão assustada e
horrorizada eu ainda estava lá no fundo. Agora, tudo em que eu conseguia
pensar era no cano negro daquela arma, alinhando-se com a minha testa, e o
quanto eu não queria morrer. Eu segurei outro estremecimento.
— Você pode me dizer o que aconteceu? — Os olhos azuis da minha mãe
ainda estavam nos meus olhos cinzentos. — Como você sabia que aquele
homem estava em casa?
Meu olhar passou por ela para o homem morto e todo o sangue ainda
escorrendo de seu peito, mas eu me forcei a focar nela novamente. — Adormeci
debaixo da árvore de Natal durante a festa. Eu tinha acabado de acordar
quando ouvi alguém subindo as escadas. Eu pensei que era você vindo nos
checar, mas depois eu vi as botas dele. Então fiquei quieta até que ele passou
por mim. Eu pensei que ele poderia entrar em um dos quartos e ferir Bria ou
Annabella, mas ele veio aqui em vez disso. Então, eu saí de trás da árvore e o
segui.
O rosto da mãe endureceu em uma máscara vazia e remota. — O homem
veio direto para o meu escritório? Em vez de procurar pela casa?
Eu assenti.
Ela olhou por cima do ombro para ele. — Então Tucker enviou-o como
um aviso — ela murmurou, falando mais para si do que para mim. —
Provavelmente só para me assustar. Talvez me ferir um pouco. Eu aposto que
Tucker não achava que eu realmente o mataria.
Cada palavra que ela disse fez mais e mais bolas preocupação surgirem
na boca do meu estômago. — Um aviso? — Eu sussurrei. — Um aviso sobre o
quê?
— Sobre o que vai acontecer com você e suas irmãs se eu não fizer algo
para ele e seus amigos — ela respondeu, ainda distraída em seus pensamentos.
— O quê? O que você tem que fazer?
Em vez de me responder, mamãe ficou olhando para o atirador, sua
expressão ficando mais e mais irritada a cada segundo, até que seus olhos
estavam brilhando um azul ártico com sua magia de Gelo. Ela levantou a mão,
e outra explosão de energia saiu dela e disparou através da sala. Eu estremeci
e desviei o olhar do brilho da magia. Depois de alguns segundos, ela abaixou a
mão e soltou seu poder, embora o ar estivesse ainda muito frio. Eu olhei para o
atirador e engasguei.
Ela o congelou.
O homem agora estava envolto em gelo elemental da cabeça aos pés,
parecendo mais um picolé do que uma pessoa de verdade. E minha mãe ainda
olhava para ele, como se quisesse explodi-lo repetidamente com seu poder,
mesmo que ele já estivesse morto. Eu nunca a tinha visto tão brava antes, nem
mesmo alguns meses atrás, quando ela pegou Annabella entrando em casa
depois do toque de recolher dela às dez horas.
— Não se preocupe, Genevieve. — Mamãe se virou para mim. — Tudo
está bem agora.
Eu abri minha boca para argumentar, para gritar e berrar e vociferar que
tudo certamente não estava bem. Que havia um homem morto em seu escritório
que quase tinha matado nós duas.
Ela me deu um olhar severo. — Você não dirá nada sobre isso a
Annabella ou especialmente a Bria. Nenhuma palavra. Você me entendeu?
— Mas...
— Você me entendeu? — Ela falou, me cortando.
Raiva jorrou através de mim, que ela estava me dando ordens assim.
Que ela estava me dizendo para ficar quieta. Que ela estava mentindo na minha
cara e dizendo que tudo estava bem quando obviamente não estava. Mas então
eu olhei para ela novamente, e notei seus lábios apertados, dedos trêmulos, e o
tênue arrepio que abalou seu corpo inteiro antes que ela pudesse escondê-lo.
E eu percebi que ela estava com medo.
Eu pensei no homem em seu escritório mais cedo. Hugh, o vampiro. E de
alguma forma, eu sabia que ele estava por trás de tudo o que tinha acontecido
esta noite.
— Você me entendeu? — A voz da mãe saiu mais suave desta vez, mais
um apelo desesperado do que uma ordem direta.
— Eu entendi — eu sussurrei, apesar de não entender.
Mas eu teria feito qualquer coisa naquele momento para tirar o medo
dela.
Ela sorriu para mim, mas era uma expressão vacilante. — Bom. Isso é
bom. Não se preocupe, Genevieve. Eu vou cuidar disso. Tudo será o mesmo que
sempre foi. Você verá. Ninguém nunca mais virá aqui e te machucará
novamente, não enquanto eu tiver fôlego e magia no meu corpo.
Eu apenas assenti, não tendo certeza do que ela esperava que eu
dissesse. Não tendo certeza do que eu poderia dizer que não seria uma mentira
completa.
Mamãe olhou para mim, em seguida, seus ombros tremeram novamente,
e um soluço sufocado escapou de seus lábios antes que ela pudesse engoli-lo.
Ela estendeu a mão e me puxou para o seu colo, seus braços apertados em volta
de mim, abraçando-me e me embalando para frente e para trás, para frente e
para trás. Tentando me consolar – e a si mesma.
— Tudo vai ficar bem — ela sussurrou. — Você vai ver.
Mamãe repetiu essas duas frases várias vezes, como se estivesse
tentando se convencer, até mais do que a mim...
— Gin? — Uma voz suave perguntou. — Gin, você está acordada?
Por um momento, eu ainda podia sentir os braços da minha mãe em
volta de mim, ainda sentir seu hálito quente no meu cabelo, ainda sentir sua
magia de Gelo enrolada em seu corpo, pronta para atacar quem ousou me
machucar. Mas rapidamente, os sentimentos desapareceram, e ela se foi,
perdida nos cantos escuros da minha mente. Embora a dor, a perda e a
saudade continuassem esfaqueando meu coração.
— Gin? — A mesma voz perguntou novamente.
Eu abri meus olhos para encontrar Silvio de pé ao meu lado. — Sim —
eu disse, minha voz grossa com mágoa, sono e lembranças. — O que se passa?
— Ira diz que o parque fechará em trinta minutos. Está na hora.
Capítulo 23
Todos nós checamos e nos certificamos de que tínhamos nossas armas
e outros suprimentos prontos. Então nos reunimos em frente à lareira, eu com
minhas roupas pretas, meus amigos ainda vestidos de caminhoneiros, e Ira
usando seu suéter de Natal, embora ele tivesse apagado as luzes.
— Não importa o que aconteça comigo, levem Finn, Bria e Owen para
um lugar seguro, — eu disse.
Sílvio, Phillip e Lorelei acenaram de volta para mim. Ira acariciou sua
espingarda.
— Tenha cuidado — disse Silvio, preocupação enchendo seus olhos
cinzentos.
Eu dei ao vampiro um sorriso confiante e pisquei para ele. — Sempre.
Abri a porta e saí da cabana. Meus amigos fizeram o mesmo, apesar de
terem entrado no caminho que levava até o hotel, enquanto eu peguei o que
passava pelo lago e voltava para o parque temático.
De acordo com Ira, Bullet Pointe fechava às oito em ponto, e já passava
das sete e meia. A escuridão já havia encoberto a paisagem, mais escura do
que o carvão em alguns lugares, mas como era a estação de férias, fios de
pequenas luzes brancas haviam sido enrolados em volta de muitas árvores,
iluminando meu caminho. Ainda assim, mantive-me nas sombras o máximo
possível, andando apenas dentro da linha das árvores, em vez de seguir pelo
caminho em si.
Cheguei à área de descanso e deslizei para trás da diligência,
agachando-me e olhando por trás de uma das rodas traseiras. A área estava
deserta, mas eu sabia que logo mudaria.
— Atenção, todos — uma voz ecoou pelo sistema de alto-falantes do
parque. — O parque temático fechará em quinze minutos. Atenção, o parque
fechará em quinze minutos. Por favor, recolham os seus pertences e dirijam-
se à saída mais próxima ou ao hotel. Obrigado.
Durante os quinze minutos seguintes, mais de duzentas pessoas
correram para a área de descanso, todos, desde os personagens fantasiados
até as pessoas que cuidavam dos carrinhos de comida até os vendedores de
ingressos nos portões da frente. Os funcionários atravessavam os pavilhões,
abrindo os baús e trocando suas botas de cowboy, capas e chapéus por velhos
tênis comuns, jeans e casacos para afastar o frio invernal. Todos pareciam
serpentes trocando de peles por algo muito mais confortável.
Eu olhava para a multidão, mas não vi Roxy, Brody ou qualquer um
de seus gigantes. Eles estariam aqui em breve, entretanto.
E eu estaria pronta para eles.
Eu mantive minha posição atrás da diligência e esperei os
trabalhadores saírem. Não demorou muito. Dez minutos depois, todo mundo
estava empacotado, seus telefones em uma mão e as chaves do carro na outra,
prontos para irem para casa e para suas famílias depois de um longo dia
lidando com todos os turistas. Deixaram os pavilhões, desceram os becos,
saíram pela Main Street e desapareceram. Cinco minutos depois, eu estava
sozinha, e nem ouvia mais os murmúrios das conversas deles.
Bom.
Eu fiquei de pé, saí de trás da diligência e atravessei o pavilhão,
recolhendo os suprimentos que precisaria e coloquei-os na sacola preta vazia
que eu levara para esse fim. Eu não deveria encontrar Tucker até a meia-noite,
mas o vampiro mandaria Roxy, Brody e seus gigantes para o parque atrás de
mim, assim que o último dos turistas e trabalhadores saísse. Eu tinha talvez
meia hora, no máximo, para me preparar para eles.
Então, pendurei minha mochila de suprimentos por cima do ombro,
desci o beco e saí para a Main Street. Como no resto do parque, as luzes
brancas estavam envolvidas em praticamente tudo, desde os bancos de ferro
até os postes de luzes e as placas no alto. Em uma noite normal, eu supunha
que as luzes teriam sido desligadas agora, mas Tucker não queria que seus
homens tropeçassem no escuro atrás de mim. Mas eu não me importava com
as luzes porque elas davam aos meus inimigos uma falsa confiança – e ainda
havia muitas sombras para se esconder.
Olhei para cima e para baixo na rua, examinando todas as lojas e
restaurantes, pensando nos itens que cada um vendia e como eu poderia
potencialmente usá-los para minha vantagem. Algumas das lojas não tinham
absolutamente nada que me ajudasse, como o Silver Spur, com suas roupas
de grife extravagantes e fivelas de cinto prateadas gigantes, ou a Gold Mine,
com suas vitrines cheias de joias. Meu olhar passou por essas duas lojas,
descendo o resto da rua para o restaurante de churrasco, a loja de doces, o
saloon...
O saloon.
Eu me concentrei no Good Tyme Saloon, um sorriso se espalhando
pelo meu rosto. Agora isso poderia ser interessante. Então eu fui até lá. As
portas de vaivém estavam fechadas e duas portas normais estavam fechadas
e trancadas atrás delas. Mas eu peguei a picareta de um mineiro dos pavilhões
mais cedo, e alguns balanços foram mais do que suficientes para quebrar as
fechaduras das portas.
Eu empurrei as portas quebradas e entrei no saloon. Mais luzes
brancas brilhavam aqui, lançando muita iluminação. Coloquei minha picareta
de volta na minha mochila e deixei cair tudo no chão antes de dar a volta atrás
do balcão e olhar para as garrafas antiquadas de bebidas nas prateleiras de
vidro espelhado. Eu escolhi um par, tirei as rolhas e cheirei os conteúdos lá
dentro. De uma vez, o cheiro cáustico de álcool flutuava para mim. Não apenas
para exibição, então. Excelente.
Espalhei várias garrafas ao redor do saloon, batendo-as nas mesas nos
cantos como se fossem peças centrais. Eu também alinhei quatro garrafas no
bar, em seguida, coloquei a mão na minha mochila e tirei uma camisa de
cowboy branca que eu peguei em uma das prateleiras de roupas. Um par de
cortes com a minha faca reduziu a camisa em tiras longas, que eu coloquei no
topo das garrafas. Eu também tirei um isqueiro roubado da bolsa e coloquei
no balcão ao lado delas.
Uma vez feito isso, peguei minha mochila e saí do saloon. Minha
próxima parada foi a torre de água na entrada da Main Street. Olhei para a
torre, que também estava decorada com luzes de Natal. A estrutura robusta
estava instalada em quatro troncos de madeira espessa e sólida – pelo menos
até que dei às duas pernas de frente um par de cortes com uma serra elétrica
alimentada por bateria de meus suprimentos. Eu não cortei a madeira até o
fim, e a torre permaneceu de pé, mas eu enfraqueci esses dois suportes o
suficiente para meus propósitos. Eu também peguei uma mangueira de água
nas proximidades e abri o bocal, deixando a água cair em cascata sobre a
passarela em frente à torre.
Eu chequei meu telefone. Vinte minutos se passaram desde o
fechamento do parque. Eu provavelmente tinha mais dez minutos antes da
abertura da temporada de caça a Gin Blanco, então fui para o beco em frente
à torre de água. Desta vez, tirei vários laços compridos da mochila e os
desenrolei um a um. Eu não era um cowboy, mas eu poderia amarrar um nó
decente o suficiente, e eu fiz muitas armadilhas ao longo dos anos. Uma vez
que os laços estavam prontos, era hora de eu entrar em posição.
Escondi minha mochila atrás de um dos bebedouros, depois corri pelo
caminho que me levaria até a entrada principal do parque temático, já que
esse era o lugar mais lógico para meus inimigos se reunirem. Logo depois que
cheguei à entrada, saí do caminho e entrei na mata, deslizando de uma poça
de sombras para a outra até chegar a uma distância do portão principal.
Estava trancado para a noite, exatamente como eu esperava, mas não me
importei.
Eu não queria sair.
Eu queria que as pessoas entrassem.
Eu me movi pela floresta até encontrar uma árvore alta – uma que não
estava envolta em luzes brancas nem perto de quaisquer outras que
estivessem iluminadas. Eu subi seis metros até encontrar um galho robusto
que eu pudesse me sentar sem ser vista facilmente de baixo. Eu não queria
estar no chão quando Roxy, Brody e os gigantes entrassem no parque, e meu
poleiro me deixava vê-los chegar. Além disso, eles presumiam que eu estava
me escondendo em algum lugar mais profundo do parque, não aqui perto da
entrada.
Meu poleiro também me deixou olhar além do portão, que se abriu em
uma área de quiosques, com uma série de estacionamentos vazios além disso.
Todos os trabalhadores tinham ido para casa, e os turistas tinham feito o
mesmo ou subiram a colina até o hotel, se era lá que estavam hospedados.
Mesmo os gigantes que protegiam a entrada para me impedir de fugir
desapareceram, agora que Tucker sabia que eu não estava partindo sem meus
amigos. Então, eu estava completamente sozinha.
Mas não ficou assim por muito tempo.
Eu só estava em posição por cerca de cinco minutos quando vários
gigantes dobraram a esquina da área dos quiosques e se aproximaram do
portão principal. Aquela área estava iluminada com luzes de Natal, assim
como o resto do parque, então eu podia ver Brody liderando o grupo. Ele estava
vestido com seu traje de cowboy habitual, todo de preto, assim como eu.
Não havia sinal de Roxy, no entanto. Ela deve ter ficado com Tucker
para tomar conta dos meus amigos. Ou talvez ela estivesse esperando que
Brody me capturasse, como ele tinha feito em suas caçadas anteriores. De
qualquer forma, ela não estava aqui, por isso ela não era importante agora.
Brody não perdeu tempo indo até o portão principal e retirando uma
chave, que ele deslizou para dentro do cadeado.
A gangue Dalton tinha vindo atrás de mim.

***

Brody abriu o cadeado com bastante facilidade, mas as correntes ao


redor do portão deslizaram através das barras de metal e se chocaram contra
o chão, criando uma série de altos clank-clank-clank. O gigante estremeceu e
soltou uma maldição murmurada por causa do barulho. Se ele quisesse entrar
no parque em silêncio, ele estava fazendo um trabalho ruim. Eu teria ouvido
essas correntes por todo o caminho até o saloon da Main Street. Mas eu
segurei minha posição e observei Brody se abaixar e arrastar as correntes para
fora do caminho. Eu chequei meu telefone. Pouco depois da oito e meia. Bem
no horário. Tucker não perdeu tempo em mandar seus homens para o parque.
Eu mandei uma mensagem para Silvio. Hora da festa aqui no portão
principal.
Ele respondeu alguns segundos depois. No saguão com os outros.
Nenhum sinal ainda de nossos amigos ou Tucker.
Eu esperava isso, mas a decepção ainda me encheu. Eu queria –
precisava – saber que Finn, Bria e Owen estavam seguros. Nada mais
importava.
Nem mesmo se eu vivia ou morria aqui esta noite.
Brody tirou as últimas correntes do caminho e abriu o portão para que
seus homens pudessem entrar. Todos eram gigantes, e ainda estavam vestidos
com seus trajes de cowboy completos com botas, calças jeans e até mesmo
chapéus. Vários deles, incluindo Brody, também usavam grandes fivelas de
cinto prateadas, e alguns tinham esporas nas botas. Eu balancei a cabeça.
Idiotas. Eles deveriam estar vestidos de preto como eu. Todo aquele metal
reluzente apenas os tornava muito mais fáceis de se ver nos brilhos das luzes
de Natal.
Fácil de ver, fácil de matar.
Brody esperou até que todos os homens estivessem lá dentro antes de
fechar e trancar o portão atrás deles. Eu fiz uma boa contagem de cabeças.
Treze gigantes ao todo, incluindo Brody, uma dúzia de padeiros12. Enquanto
eu observava, os gigantes sacaram suas armas, verificando se estavam
prontas para o rock'n'roll. Nada de armas falsas esta noite. Mais uma vez,
imaginei se algum deles tinha as balas revestidas de Fogo de Roxy carregadas
em suas armas, mas não havia como saber até que começassem a atirar em
mim. Mas eu tinha armas e truques próprios e estava pronta para usá-los.
Brody virou-se para seus homens. — Lembrem-se, esta cadela Blanco
é sorrateira. Então, eu quero que fiquem juntos de três em três e estejam
sempre em contato constante pelos fones de ouvido. Se vocês encontrarem

12A frase “dúzia de padeiros” significa mais de uma dúzia ou um grupo de treze. A frase teve
origem na prática dos padeiros ingleses de adicionarem um pão extra quando vendiam doze
pães.
Blanco, você pode feri-la, mas não matá-la. Tucker ainda precisa questioná-
la primeiro. Entendido?
Brody não mencionou as joias. Provavelmente porque ele percebeu que
seus homens me matariam, tirariam as joias do meu corpo, e fugiriam em vez
de entregá-las a ele como deveriam.
Todos os gigantes murmuraram sua concordância, então começaram
a se certificar de que seus fones de ouvido estavam funcionando. bem como
se dividirem em quatro equipes de três, exceto pela equipe de Brody, que o
tinha como um homem extra. Quatro equipes de gigantes só para me matar.
Tucker não estava brincando. Eu estava lisonjeada.
Enviei a Silvio outra mensagem de texto, avisando-o exatamente
quantos homens Brody trouxe para o parque. Ele me mandou uma mensagem
de volta alguns segundos depois, dizendo que ele, Phillip, Lorelei e Ira ainda
estavam no saguão, segurando suas posições até que avistassem Tucker ou
nossos amigos.
Eu coloquei meu celular de volta no bolso do jeans e me concentrei
novamente nos homens abaixo, estudando-os com mais cuidado do que antes.
Eu não senti nenhuma magia elemental emanando de nenhum deles, mas eles
não precisavam disso. Não com todas essas armas, para não mencionar sua
própria força e resistência inerentes. Eu teria que ficar quieta enquanto os
matava, pelo menos no começo, até que eu diminuísse o rebanho um pouco.
Caso contrário, eles se agrupariam e me derrubariam. Então a festa
terminaria antes mesmo de começar.
— Espalhem-se — disse Brody, checando suas armas. — E cuidados
com as suas costas. Essa não é uma pessoa comum com quem estamos
lidando. Essa cadela é uma assassina e uma das melhores. Entenderam?
Bem, pelo menos ele estava me dando meus créditos. E ele estava
certo. Eu era uma das melhores.
E eu ia matar todos os filhos da puta aqui esta noite.
Os homens assentiram para Brody, e as quatro equipes se espalharam,
indo devagar pela passarela que levava do portão principal para o parque. Eu
estudei os homens novamente, concentrando-me em como eles se moviam, e
quem parecia ser a maior ameaça. Isso era obviamente Brody, e os três caras
com ele pareciam tão duros e fortes quanto ele. Mas havia três gigantes que
se juntaram na parte de trás da equipe, que eram um pouco mais baixos e
mais magros do que os outros, então decidi ir atrás deles primeiro.
Esperei até que todos os homens tivessem descido pela passarela, bem
longe da minha posição, então desci da árvore e os seguiu, ainda
permanecendo na floresta e fora do caminho.
As quatro equipes de gigantes alcançaram a primeira grande
bifurcação no parque temático e se dividiram, com cada equipe seguindo em
uma direção diferente. Eu espalmei uma faca e corri atrás dos três homens
que eu escolhi para matar primeiro.
Os gigantes desceram a passarela, obedientemente procurando por
trás de cada carrinho de comida, barril e fardo de feno. Mas eles estavam tão
ocupados olhando para o que estava na frente deles que nem sequer ocorreu
a eles que eu poderia estar seguindo seu rastro. Ah, de vez em quando, eles
olhavam por cima dos ombros, mas na maioria das vezes se concentravam no
que estava à frente, e não na Aranha que silenciosamente se arrastava atrás
deles.
Os três gigantes chegaram ao final dessa passagem e pararam para se
reagrupar. Eu agachei-me nas sombras atrás de um par de ervas daninhas e
assisti-os.
— Talvez ela não esteja aqui — sugeriu um deles. — Talvez ela tenha
saído do parque com os turistas mais cedo.
Um segundo gigante sacudiu a cabeça. — De jeito nenhum.
Analisamos todas as imagens de segurança e verificamos cada pessoa que
saiu a tarde inteira. Blanco não era um deles. Ela está aqui em algum lugar.
Nós apenas precisamos encontrá-la. Vamos continuar olhando.
O último homem assentiu, e os três começaram a avançar novamente,
seguindo por um novo caminho. Com minha faca ainda na mão, eu fiquei de
pé e os segui.
Com muito chão para cobrir, mesmo ao longo desta passarela, os
gigantes fizeram a coisa inevitável que os mataria – eles se separaram.
Dois dos gigantes foram verificar atrás de alguns carrinhos de comida
que estavam agrupados, enquanto o outro entrava em um pequeno beco,
olhando atrás de cada barril e cocho de água que cobria as paredes. Esperei
até que o homem sozinho estivesse no fundo do beco, depois corri para a
entrada e parei, me escondendo atrás de um cartaz grande de papelão de um
vaqueiro tocando um banjo.
Depois esperei – apenas esperei que ele voltasse por aqui.
Era um beco sem saída, e não demorou muito tempo para o gigante
voltar. Um minuto depois, ele voltou para a minha posição. Os outros dois
homens ainda estavam checando os carrinhos de comida e ignorando
completamente o amigo.
Minha faca na minha mão, eu me preparei, respirando lentamente
para dentro e para fora, puxando ar para dentro de meus pulmões para a
rápida explosão de energia que eu precisaria para derrubar os três gigantes.
O gigante solitário passou pelo cartaz em que eu estava me escondendo
atrás, sem se incomodar em procurar atrás dele. Seu segundo e último erro.
Em uma caçada como esta, você sempre tinha que verificar os lugares indo e
vindo, porque você nunca sabia quem poderia estar se esgueirando em você.
O gigante parou no final do beco e levou a mão ao ouvido. Eu mantive
minha posição e esperei, sabendo que ele ia checar com Brody.
— Beco da Cascavel está limpo — disse o gigante. — Indo ajudar Ellis
e Clyde a verificar alguns carrinhos de comida.
Ele esperou um segundo pela resposta de Brody, que eu não consegui
ouvir, então assentiu. — Entendido. Vamos continuar procurando.
Eu sai detrás do cartaz. Apesar de todas as luzes de Natal, o gigante
nunca notou a sombra se arrastando ao lado dele, e eu fui capaz de chegar
logo atrás dele. Ele parou para olhar em volta, e foi quando eu ataquei. Estendi
a mão, enfiei meus dedos em seus cabelos, puxei sua cabeça para trás e cortei
sua garganta.
Ele estava morto antes de cair no chão.
Mas eu já estava me movendo, pulando por cima do corpo dele e
correndo pelo caminho em direção aos carrinhos de comida, me colocando
contra o lado de um, assim que os outros dois gigantes chegaram ao final.
Aqueles homens ainda estavam procurando por mim, então levaram alguns
segundos para ver o corpo de seu amigo deitado na entrada do beco.
— O que... — um deles falou.
Eu contornei o carrinho e joguei minha faca nele. A lâmina atravessou
o ar e afundou em sua garganta, cortando o resto de suas palavras. Ele
cambaleou para trás contra um dos carrinhos, sua perna saindo debaixo dele,
já mais perto de morto do que vivo.
O terceiro e último gigante virou em minha direção, levantando sua
arma, mas eu corri para frente, ergui minha mão, e enviei um spray de adagas
de Gelo direto em seu rosto e garganta. A arma do homem escorregou de sua
mão e caiu no chão enquanto ele tossia e tossia, tentando desalojar os pedaços
afiados e irregulares de Gelo de sua garganta. Fechei a distância entre nós,
espalmei outra faca, e passei a lâmina em seu estômago, logo acima da sua
horrível fivela de cinto.
Ele não podia nem gritar quando ele caiu no chão, tentando empurrar
suas entranhas de volta para onde elas deveriam estar. Eu terminei suas lutas
acertando minha faca em seu coração, em seguida, retirando-a.
Eu virei e olhei para cada gigante, mas eles estavam mortos, então eu
olhei por eles nas calçadas além. Mas tudo estava quieto, e ninguém tinha me
ouvido eliminar essa primeira equipe de homens.
Então eu fui, arranquei minha faca fora da garganta do gigante, limpei-
a em sua camisa xadrez e a coloquei de volta na minha manga. Ainda
segurando a outra faca em minha mão, eu passei por cima de seus corpos e
me entrei mais profundamente no parque temático.
Três já foram, faltam dez.
Capítulo 24
Não demorou muito para encontrar a segunda equipe de gigantes.
Estavam apenas duas passarelas adiante, checando as sombras em torno de
uma série de carrinhos de comida, exatamente como a primeira equipe de
homens havia feito. Mas eles eram muito mais cautelosos do que os outros,
permanecendo juntos, com um homem constantemente olhando para trás,
vigiando suas costas. Eu não conseguiria pegá-los de surpresa como fiz com
a primeira equipe.
Então, olhei em volta, pensando sobre onde estávamos no parque em
relação às armadilhas que eu havia montado. Os laços eram os mais próximos.
Aqueles funcionariam. Eu deslizei minha faca na minha manga e peguei uma
das armas do coldre no meu cinto. Eu me assegurei de que a arma estava
pronta para disparar, então me levantei e corri das sombras, atravessei a
passarela e passei por um dos becos, à vista do gigante servindo a retaguarda.
— Ei! — Ele gritou. — Lá está ela! Indo para aquele beco! Venham!
Os três homens abandonaram a busca e correram atrás de mim. Eu
arrisquei um olhar por cima do meu ombro, imaginando se algum deles
poderia passar por seus amigos na ânsia de me pegar, mas eles ficaram juntos
em sua formação apertada. Eu sorri abertamente. Perfeito.
Eu virei para o beco. Na metade do corredor, parei de correr e me
agachei atrás de um barril que havia sido empurrado contra a parede. A arma
estava na minha mão direita, e eu me abaixei com a esquerda e peguei três
laços longos, grossos e pesados que eu prendi a um gancho na parede oposta
e serpenteei pelo chão até este lado do beco. Eu usei minha magia de Pedra
para proteger minha palma das cordas ásperas, me apoiei no canto e olhei
para o lado, esperando que o inimigo se aproximasse o suficiente.
Um segundo depois, os três correram para o beco, correndo tão rápido
como podiam.
— Depressa! — gritou um dos gigantes. — Não a percam...
Zip!
Eu puxei os laços com força, e os três saltaram do chão do beco,
criando uma armadilha bem na altura do tornozelo.
Os três gigantes tropeçaram sobre os laços, aterrissando em uma pilha
no meio do beco. O peso deles arrancou as cordas da minha mão e me
desequilibrou, mas eu me recuperei antes deles. Mesmo enquanto eles
gritavam e se mexiam, tentando se levantar, eu fiquei de pé e esvaziei minha
arma neles.
Pfft!
Pfft! Pfft!
Pfft! Pfft! Pfft!
Quando aquela primeira arma clicou vazia, tirei a segunda do coldre
no meu cinto e a peguei também.
Pfft!
Pfft! Pfft!
Pfft! Pfft! Pfft!
Os gritos dos gigantes se dissolveram em chiados e gorgolejos. Então,
até aqueles ruídos pararam.
Seis já foram, faltam sete . Ainda não está na metade do caminho.
Como minhas armas estavam equipadas com silenciadores, os
disparos foram bem silenciosos, mas, é claro, os gritos de pânico dos gigantes
soaram, ecoando pelo parque temático como trovões, e eu sabia que não
levaria muito tempo antes das outras duas equipes virem correndo. Então eu
joguei minhas duas armas vazias, corri para frente e peguei duas novas armas
dos gigantes mortos. Todo o tempo, eu continuei olhando ao redor, percebendo
quão exposta eu estava. Mas talvez a minha sorte durasse, e eu poderia voltar
para as sombras antes que as outras duas equipes de gigantes convergissem
para minha posição...
Crack! Crack! Crack!
Balas bateram na parede ao meu lado, fazendo lascas de madeira
voarem em todas as direções. Eu realmente precisava parar de me dar azar
desse jeito.
Eu virei minha cabeça para ver mais três gigantes correndo pelo beco
em minha direção.
— Lá está ela! — Um dos gigantes gritou. — Peguem ela!
Crack! Crack! Crack!
Mais e mais balas zuniram no ar em minha direção, mas nenhuma
delas explodiu com o Fogo elemental de Roxy. Parecia que ela mantinha todos
aqueles bebês em chamas para si mesma. Mas balas ainda eram balas, então
eu peguei minha magia de Pedra, usando-a para endurecer minha pele,
enquanto erguia minhas próprias armas roubadas e começava a disparar de
volta.
Crack! Crack! Crack!
Meus tiros fizeram os gigantes se agacharem atrás de um par de
bebedouros para se protegerem, mas eu não era tão boa atiradora quanto
Finn, e eu estava muito longe para derrubá-los do jeito que ele faria. Ainda
assim, eu continuei atirando enquanto me afastava dos gigantes, apenas
tentando ganhar alguns segundos de vantagem. Mas, rapidamente, minhas
armas ficaram sem balas, então joguei-as fora como as outras.
Os gigantes espiaram ao redor dos bebedouros e se levantaram,
percebendo que eu estava sem munição, mas eu já havia me virado e
começado a fugir.
Bem, eu não estava fugindo dos gigantes tanto como estava correndo
em direção a algo – a torre de água.
Crack!
Crack! Crack!
Crack!
Balas me perseguiram pelo beco, fazendo buracos através de barris,
acertando placas de metal, e explodindo em bolas de capim. Os gigantes se
recuperaram mais rápido e estavam se movendo mais rápido do que eu
esperava. Ainda bem que eu já tinha feito meu trabalho de preparação.
Eu virei na esquina e parei, já que era onde eu deixei a mangueira de
água em funcionamento. O jorro de água já cobria essa parte da passagem,
fazendo-a brilhar como um chão polido sob os suaves reflexos brancos das
luzes de Natal. Eu me agachei, bati minha mão contra o asfalto úmido, e
explodi com a minha magia, transformando toda aquela água em uma camada
sólida de Gelo elemental. No segundo que foi feito, corri para a torre de água,
aquela com dois troncos vacilantes.
Eu envolvi minhas duas mãos em torno do primeiro poste e soltei outra
explosão da minha magia de Gelo, dirigindo os fragmentos do meu poder no
fundo do corte que eu já tinha feito. A madeira rangeu e gemeu com a súbita
explosão de frio, mas não quebrou. E não faria, não até que eu quisesse.
Uma vez que terminei com o primeiro poste, eu fui e repeti o processo
no segundo. Então eu recuei o suficiente para que eu pudesse ver os dois
postes ao mesmo tempo e esperei que os gigantes ficassem ao alcance.
Com certeza, os três homens que estiveram atirando em mim correram
pela esquina, sem nem mesmo pensar que eu poderia armar uma armadilha
para eles. Botas de cowboy podem parecer legais, mas elas não têm muita
tração. No segundo em que os gigantes pisaram no asfalto congelado, as botas
escorregaram, impulsionando-os para a frente, e todos gritaram e jogaram as
mãos para o alto no ar, como três patinadores andando em uma pista de gelo
pela primeira vez. Um após o outro, todos caíram sobre suas bundas no meio
da passarela, bem na sombra da torre de água. Perfeito.
Sintonizei seus gritos surpresos e alcancei minha magia de Gelo
novamente, reunindo mais e mais do meu poder até que eu tinha duas bolas
prateadas de magia pulsando nas palmas das minhas mãos. Então eu estendi
as duas mãos para frente ao mesmo tempo, mirando nos dois postes que eu
já tinha cortado e congelado.
Minha magia de Gelo bateu nos dois postes, e a madeira já
enfraquecida estalou como um par de palitos de fósforo.
Crack! Crack!
Sem esses dois postes como suporte, a torre não podia ficar de pé. Com
um rangido alto e agourento, o recipiente de madeira inclinou-se para a frente
e caiu no chão, estilhaçando-se em mil pedaços e espalhando água sobre tudo
em seu caminho – inclusive nos três gigantes que ainda estavam caídos no
meio da passarela por causa da minha camada de Gelo elemental.
Os gigantes gritaram e tentaram se levantar, mas já era tarde demais.
A água jorrou do recipiente quebrado, abafando seus gritos de pânico. Mesmo
quando a água caía em cascata sobre eles, dei um passo à frente, levantei as
mãos e soltei a explosão de magia do Gelo, direto para o centro de todo aquele
líquido impetuoso. A água já estava fria por ficar parada no tanque em
dezembro, o que tornou mais fácil para mim congelá-la – e os gigantes junto
com ela.
A água bateu no chão, então explodiu em folhas de Gelo elemental,
congeladas por minha magia. Pensei que os gigantes gritavam por ajuda ou
talvez até gritassem maldições para mim, mas eu estava muito ocupada
enviando onda após onda de magia para me importar. Minha mãe estava certa.
Esses homens haviam entrado no parque para me matar, então eles estavam
conseguindo exatamente o que mereciam.
Um minuto depois, toda a água se foi, e um campo de Gelo elemental
tomou seu lugar, as ondas e cumes estranhos lembrando-me das ervas
daninhas que estavam espalhadas pelo parque.
E os gigantes estavam congelados, bem no meio de tudo isso.
Eles ainda estavam sentados, embora suas mãos estivessem
levantadas sobre suas cabeças, como se instintivamente tivessem tentado
impedir que a água caísse sobre eles. Pareciam três estátuas de cowboys que
haviam sido erguidas no centro da passarela.
Estudei os gigantes, mas todos estavam envoltos em camadas sólidas
de Gelo elemental. Se eles já não estivessem mortos por estarem congelados,
eles sufocariam em breve. Não havia maneira de entrar ar através de todas
aquelas camadas frias e espessas.
Nove já foram, faltam quatro...
Crack! Crack! Crack!
Mais uma vez, balas espalharam-se ao meu redor, quebrando minhas
esculturas de Gelo elemental e espalhando estilhaços afiados por toda parte.
Eu me abaixei atrás de um bebedouro e olhei para o lado. Os três gigantes
remanescentes estavam no final da rua, além do meu campo de Gelo, com
Brody em pé na frente deles.
— Atirem nela! Atirem nela, seus idiotas! — ele gritou, acenando com
a arma para mim.
Os gigantes ergueram suas armas para disparar contra mim
novamente, mas eu me virei e corri pela passarela, indo ainda mais fundo no
parque temático.
Capítulo 25
Os sons de tiros continuaram atrás de mim, mas eles rapidamente
pararam quando os gigantes perceberam que eu estava fora de alcance. Eu
continuei correndo, porém, determinada a aproveitar ao máximo a minha
vantagem. Eu tinha uma reta livre para onde eu estava indo, e os gigantes
teriam que abrir caminho pelo campo de Gelo ou perder um tempo precioso
dando a volta.
Mas eles não viriam mais me atacar cegamente. Eles seriam muito
mais cautelosos desta vez e ficariam juntos em um grupo. Eu precisaria de
todas as minhas habilidades para acabar com eles. Ainda bem que eu tinha
mais uma carta na manga.
Então fui para a peça central da Main Street – o Good Tyme Saloon.
Empurrei as portas quebradas e corri para o bar, onde alinhei aquelas
quatro garrafas de bebida, com panos brancos espreitando do topo delas.
Peguei as garrafas junto com o isqueiro e corri escada acima até o segundo
andar.
Brody e os gigantes esperavam que eu ficasse atrás do balcão, já que
era feito de madeira grossa e pesada que oferecia a maior cobertura e proteção
contra suas balas. Mas Fletcher tinha insistido que a chave para sobreviver
era fazer algo inteiramente inesperado, e esse era o meu plano agora. Então
eu alinhei três das garrafas no corrimão do segundo andar, perto da viga de
suporte que ficava atrás. A quarta garrafa estava em uma das minhas mãos,
e eu tinha o isqueiro na outra.
Uma vez que eu estava em posição, comecei a contar os segundos em
minha cabeça.
Cinco... dez... quinze... trinta... sessenta...
Cinco minutos se passaram antes que eu ouvisse um rangido revelador
na calçada de madeira em frente ao saloon. Os gigantes devem ter visto as
portas quebradas e percebido que eu entrara aqui. Bom.
— Desista, Blanco! — Brody gritou. — Eu tenho esse lugar cercado!
Você não pode escapar! Não dessa vez!
Eu sorri. Cercado? Por favor. Ele tinha três homens restantes. Isso não
era suficiente para cercar um tatu. Além disso, eu não queria fugir. Não até
que eu tivesse matado cada um deles.
— Blanco! — Brody gritou novamente. — Esta é sua última chance!
Eu ainda não respondi, embora eu pudesse ouvir os outros três
gigantes resmungando um com o outro na rua.
— Você realmente acha que ela está lá?
— Talvez seja outra armadilha.
— Talvez ela já tenha ido embora há muito tempo.
— Ela não vai embora sem seus amigos, — Brody disse, interrompendo
o coro da dúvida. — Confie em mim sobre isso. E as portas estão abertas. Ela
está lá dentro, então. Agora, vamos entrar nessa porcaria, ou vamos ficar aqui
e discutir sobre isso a noite toda? Porque eu não quero que alguém volte para
Tucker e diga a ele que nós quatro não conseguimos capturar uma mulher, e
vocês?
Os outros três gigantes murmuraram seu acordo, aparentemente com
mais medo de Tucker do que de mim. Eu balancei a cabeça. Tolos. Vocês
devem sempre ter mais medo da pessoa que poderia matá-los imediatamente.
Neste caso, eu.
Os gigantes continuavam debatendo e discutindo entre si. Revirei os
olhos, querendo que eles entrassem logo e parassem de perder meu tempo.
Porque uma vez que eles estivessem mortos, eu poderia checar com Silvio e
ver se ele tinha posto os olhos em Finn, Bria e Owen.
Finalmente, Brody e os outros três gigantes perceberam que eu não ia
sair, e eles decidiram vir atrás de mim. Eu mantive a minha posição atrás da
viga de apoio, a garrafa e o isqueiro ainda em minhas mãos, com as outras
três garrafas todas em uma fila bem arrumada na grade à minha frente.
As portas quebradas se abriram e um chapéu preto solitário apareceu.
Eu fiquei tensa, mas depois percebi que era apenas um chapéu em uma vara
que alguém, provavelmente Brody, estava acenando por aí.
Alguém por aqui tinha assistido a muitos filmes de Velho Oeste.
Ainda assim, eu daria aos gigantes crédito por tentarem que eu desse
o primeiro passo e me entregasse. Mas eu fazia isso há muito, muito tempo, e
um chapéu em uma vara não ia me enganar, então eu mantive minha posição
e esperei que eles entrassem.
Um minuto se passou, depois dois, depois três, e ainda os gigantes
ficaram do lado de fora. Finalmente, no entanto, um deles soltou um grunhido
frustrado, jogou o chapéu e ficou no meio do saloon. A vara caiu no chão,
enquanto o chapéu girava ao redor e ao redor antes de finalmente se
acomodar.
Eu permaneci no lugar, tal como antes. Eu tinha visto mais do que
alguns filmes do Velho Oeste, graças a Sophia, que os amava, e havia uma
razão pela qual as pessoas sempre diziam não atirar até que você visse os
brancos dos olhos de seus inimigos.
Isso significava que eles estavam finalmente perto o suficiente para
você os matar.
Lentamente, as portas se abriram, e os quatro gigantes se arrastaram
para dentro, armados e prontos para atirar. Pensava que Brody poderia estar
liderando-os, mas ele foi o último a entrar no salão. Inteligente. Muito esperto.
Eu me perguntei se seus homens perceberam que ele os tinha colocado para
entrarem na minha armadilha e morrerem primeiro. Provavelmente não.
Os quatro gigantes entraram na ponta dos pés e olharam para a direita
e para a esquerda, examinando o saloon. Mas eles só viram cadeiras vazias, e
não prestaram atenção nas garrafas de bebidas que eu posicionei como peças
centrais em algumas das mesas quando entrei aqui. Eu poderia ter aberto
algumas das garrafas e ensopado tudo em álcool, mas os gigantes poderiam
ter sentido o cheiro, e eu não queria que eles percebessem exatamente no que
eles estavam andando até que fosse tarde demais.
Brody deu um passo à frente e apontou o dedo para o bar, pensando
que eu estava me escondendo lá atrás. Ele levantou sua arma e acenou para
os outros homens em um sinal claro. Todos assentiram, depois ergueram as
próprias armas, miraram no bar e começaram a atirar.
Crack!
Crack! Crack!
Crack! Crack! Crack!
Brody e seus homens atiraram no bar, colocando buraco após buraco
na madeira espessa e pesada. Lascas voavam, e as prateleiras espelhadas e
garrafas de bebidas alcoólicas atrás do balcão estilhaçaram-se para todos os
lugares. Alguém não conseguiu atingir o lado mais largo do bar.
Um por um, os gigantes esvaziaram suas armas, embora todos as
tenham rapidamente recarregado. Por um momento, tudo estava
estranhamente quieto. O fedor de pólvora encheu o ar, junto com o cheiro
áspero e cáustico de toda a bebida derramada.
Finalmente, Brody apontou a arma para o bar novamente. — Cheque!
— Ele sussurrou para o gigante mais próximo.
O outro homem engoliu, estendeu a mão e ajustou o chapéu,
inclinando-o um pouco para trás na testa. Ele também checou sua arma,
certificando-se de que estava totalmente carregada novamente, e levantou a
arma para uma posição ofensiva. Então ele respirou fundo e se adiantou,
surpreendentemente silencioso para um homem tão grande. Ele se moveu
para mais perto do bar... e mais perto... e mais perto ainda...
Atrás dele, os outros dois gigantes se espalharam, com Brody
ocupando uma posição mais próxima das portas duplas. Os três homens
apontaram suas armas para o bar, esperando que eu aparecesse por trás da
longa laje de madeira a qualquer momento. Mas eu não fiz isso, e cada
segundo que passava só aumentava a tensão. As luzes podiam estar acesas,
mas o aquecimento não estava, e o frio de dezembro já havia afundado no
prédio, fazendo a respiração dos gigantes pairar no ar.
O gigante chegou ao bar de um ângulo, e ele finalmente chegou perto
o suficiente para ficar na ponta dos pés e olhar para o lado. Ele franziu as
sobrancelhas, e piscou algumas vezes, como se o espaço vazio atrás do bar o
tivesse confundido. Depois de alguns segundos, ele avançou, colocou uma
mão na madeira e se inclinou sobre ela, sua cabeça estalando para a esquerda
e para a direita enquanto ele procurava por mim.
Ele se virou para Brody. — Ela não está lá atrás!
Brody franziu a testa. — O que você quer dizer com ela não está lá
atrás?
O gigante jogou a mão para fora. — Quero dizer, ela não está se
escondendo atrás do bar...
Ele nunca teve a chance de terminar sua frase.
Eu cliquei no isqueiro, acendi o pano branco no fim da garrafa de gim
que eu estava segurando e joguei-a bem no meio do salão.
Whoosh!
Meu coquetel Molotov improvisado explodiu com um rugido e uma bola
brilhante de chamas laranja-avermelhadas.
Os gigantes gritaram e saíram do caminho, mas eu já estava
acendendo a próxima garrafa de gim e derrubando-a em cima deles. Desta vez,
minha mira foi melhor, e eu acertei no gigante perto do bar no peito. A garrafa
se espatifou no impacto, espalhando gim por todo lado, e o álcool se acendeu
instantaneamente. O gigante gritou e gritou, batendo nas chamas que
dançavam por todo o seu corpo, queimando a pele, mas não adiantava. Ele
bateu em uma mesa, que se estilhaçou sob seu peso e mergulhou no chão. Ao
redor dele, os pedaços de madeira começaram a fumegar, enquanto também
começaram a pegar fogo.
Brody e os outros dois gigantes finalmente perceberam que eu estava
na sacada e ergueram suas armas para tirar em mim. Acendi meu terceiro e
quarto coquetel Molotov e joguei-os em rápida sucessão, dessa vez em duas
mesas separadas, cada uma com uma garrafa de bebida no centro dela.
No alvo.
Ambas as garrafas aterrissavam exatamente onde eu queria, e toda
aquela área explodiu em chamas, pegando outro dos gigantes de surpresa.
Mais uma vez, a bebida espirrou por toda parte e ele também se acendeu como
uma árvore de Natal. Este gigante fez a coisa inteligente e parou, caiu e rolou
no chão, assim como deveria. Mas o que ele não percebeu foi que ele estava
rolando no fogo crescente que estava se espalhando ao redor do primeiro
gigante que eu atingi. Então, em vez de apagar as chamas, tudo o que o
segundo homem fez foi espalhá-las pelo resto do saloon. Faíscas
incandescentes e brasas voavam por toda parte, e pequenos incêndios
surgiram em meio a toda a velha madeira desgastada.
Por entre a fumaça e as chamas, Brody e o quarto gigante ergueram
novamente as armas e finalmente dispararam em mim, mas eu peguei o
corrimão, balancei minhas pernas sobre ele, e pulei da varanda. Na descida,
agarrei minha magia de Pedra, transformando meu corpo em uma casca dura,
impenetrável – e pesada.
Crash!
Eu fiz o mergulho perfeito em cima de ambos, fazendo com que nós
três caíssemos no chão. Brody amaldiçoou e rapidamente se levantou e saiu
do meu alcance, mas o outro homem se chocou contra o chão, atordoado, e
eu aproveitei, segurando uma faca e cortando sua garganta. Ele morreu com
um sangrento gorgolejo.
— Sua puta! — Brody rosnou.
Ele levantou a arma e começou a atirar em mim novamente, enquanto
ele recuou em direção às portas. Eu mantive o controle da minha magia de
Pedra, e as balas inofensivamente pingaram do meu corpo e atingiram nas
paredes, destruindo ainda mais o saloon. Eu aumentei meu aperto na faca,
fiquei de pé e comecei a avançar, mas Brody decidiu não ficar por perto para
encontrar o mesmo destino que seus amigos. Ele disparou mais alguns tiros,
depois correu para fora das portas duplas.
Dessa vez, eu o persegui.
Pelo menos, tentei.
Dirigi-me para as portas do saloon, mas uma rajada de fogo me fez
parar de repente. O saloon era mais uma caixa de fósforos do que eu pensava,
e as chamas dos meus coquetéis molotov já haviam se espalhado pelo primeiro
andar. Fumaça negra e grossa fervia no ar, dificultando a respiração, e o calor
lambia minha pele, ansioso para queimar toda a minha magia de Pedra. Eu
tinha que sair daqui, ou a fumaça e chamas rapidamente me superariam.
Tossindo o tempo todo, eu fui para as portas do salão novamente, mas
outra explosão ocorreu naquela área, e as chamas começaram a queimar lá
ainda mais brilhantes e quentes do que antes. Já que eu não podia sair pelas
portas duplas agora, e as chamas já haviam bloqueado a parte de trás, eu fui
para a única outra saída. Eu usei minha magia de Pedra para fazer minha
pele ainda mais dura e mergulhei de cabeça pela janela de vidro que se
alinhava na frente do salão.
Crash!
Eu voei através do vidro, que explodiu com um rugido, e bati na
calçada de madeira do lado de fora. Meu impulso me jogou para a frente, e eu
rolei pela calçada, acertei um dos bebedouros, saltei e acabei esparramada em
um ângulo estranho na rua de terra. Para adicionar insulto à injúria, eu bati
forte o suficiente para balançar a água dentro, fazendo com que uma onda
transbordasse por cima e caísse em cascata em cima de mim, me encharcando
até os ossos. Em um instante, eu estava com muito frio, apesar do calor
crescente do fogo do saloon. O arrepio chocante também me fez perder o
controle da minha magia de Pedra. Engasgando, eu cambaleei para os meus
pés, minha faca ainda na minha mão, afastando os fios molhados e soltos de
cabelo do meu rosto. Brody ainda estava aqui fora, e eu não descartaria ele
voltar e me atacar se ele pensasse que finalmente tinha a vantagem...
O punho do gigante estalou na lateral do meu rosto.
O golpe me fez tropeçar para trás, e eu acabei caindo sentada no
bebedouro, como todos os cowboys tão comicamente fizeram durante o show
ao meio-dia de ontem no parque.
— Foda-se, sobre levar você viva. — Brody grunhiu, levantando sua
arma.
Antes que ele pudesse puxar o gatilho, eu levantei minha mão e enviei
um spray de adagas de Gelo na direção dele. O gigante rosnou e virou-se para
o lado, desviando a maior parte da explosão. Para um cara tão grande, ele era
rápido, muito mais rápido do que eu, especialmente quando eu estava tão
encharcada.
Eu tentei sair do bebedouro para que eu pudesse esfaqueá-lo com
minha faca, mas Brody finalmente se levantou e desistiu de tentar atirar em
mim. Ele largou a arma e avançou, envolvendo as mãos em torno da minha
garganta. Dada a sua estrutura maior e mais pesada, ele facilmente me
empurrou de volta para dentro do bebedouro, bem debaixo da água. Meu
pulso bateu contra o lado da madeira, e minha faca escorregou dos meus
dedos e desapareceu na água. Sem uma arma na mão, tudo o que ele tinha
que fazer era me segurar por tempo suficiente para que eu desmaiasse. Então
ele poderia me amarrar e me levar para Tucker ou me afogar como ele
realmente queria.
Eu estava apostando nessa segunda opção.
Eu chutei e resisti e me debati e me engasguei, mas eu não era páreo
para a força superior de Brody, e eu estava muito longe na água para revidar.
A única parte dele que eu poderia alcançar eram suas mãos e braços, e eu não
poderia causar dano suficiente a qualquer um deles para matá-lo antes que
ele me sufocasse.
Então eu parei de me debater, já que tudo o que estava fazendo era
desperdiçar ar e energia preciosos, e pensar sobre como eu poderia escapar
do gigante. Ou pelo menos sair da água tempo suficiente para respirar.
Minha magia de Pedra poderia me salvar de balas, mas não me serviria
de nada nessa situação, então eu foquei no meu poder de Gelo. Eu usei a
maior parte dele congelando os gigantes na rua mais cedo, mas eu ainda tinha
as reservas armazenadas no meu anel de runa de Aranha e no colar
correspondente. Mas apenas congelar a água não me faria bem, já que eu
ainda sufocaria sem ar, então me concentrei na única coisa que eu poderia
fazer com a minha magia de Gelo.
Quebrar a madeira ao meu redor.
Nenhuma madeira significava nenhum bebedouro, e nenhum
recipiente para conter toda a água gelada. Por isso, eu tirei minhas mãos de
Brody, não tentando mais arrancar seus dedos do meu pescoço. Em vez disso,
eu segurei minhas mãos para fora, de modo que eu estava tocando os dois
lados do bebedouro de uma só vez, minhas cicatrizes de runas de Aranha
esmagadas contra a madeira fria e viscosa. Depois eu soltei com a minha
magia de Gelo.
Mesmo com a magia armazenada no meu anel e pingente, ainda era
difícil, especialmente porque manchas cada vez mais brancas, cinzentas e
pretas começaram a nadar na frente dos meus olhos. Mas me concentrei em
explodir a madeira de ambos os lados. No segundo em que achei que estavam
suficientemente congelados, mandei outra explosão de magia de Gelo,
quebrando todos os cristais frios.
Vamos, eu pensei. Quebre, maldita seja, quebre!
Mas a madeira era velha, dura e desgastada, e não queria se curvar,
muito menos se quebrar completamente. Mas eu continuava explodindo com
minha magia de Gelo repetidas vezes, e finalmente forcei umas poucas
rachaduras nas tábuas. Pelo menos, achei que sim. Eu não podia ver o que
eu estava fazendo desde que Brody ainda estava me segurando debaixo
d'água, sufocando a vida fora de mim. Mas eu alcancei e arranhei e raspei
toda a magia do Gelo guardada no meu anel e no pingente de runa de Aranha,
explodindo para fora através de minhas mãos, forçando-a na madeira
repetidamente...
Whoosh!
A madeira finalmente se partiu, o bebedouro se quebrou em pedaços,
e a água jorrou por toda parte. Eu mal consegui respirar antes que Brody
escorregasse e caísse em cima de mim, tirando o ar dos meus pulmões
novamente com seu peso.
Ele amaldiçoou, mas não soltou seu aperto na minha garganta, nem
mesmo por um instante. — Sua vadia! — Ele gritou. — Por que você
simplesmente não morre?!
Eu não me preocupei em desperdiçar meu precioso ar para responder
a ele.
Minha magia de Gelo se foi, e eu não conseguia pegar minhas facas,
dada a maneira que o corpo dele estava me prendendo no lugar. Mas eu
poderia alcançar uma outra arma – a arma sobressalente guardada no cinto
de Brody.
Então coloquei minha mão entre nós, tentando chegar à arma, mas
Brody estava usando uma daquelas fivelas de cinto enormes que Roxy gostava
tanto, e isso ficava no caminho dos meus dedos frios e entorpecidos.
— O que você está fazendo agora? — ele zombou. — Tentando me
apalpar?
Eu ignorei sua provocação, passei a mão pela fivela do cinto, enrolei
meus dedos ao redor da arma, e a agarrei o mais forte que pude.
Brody franziu a testa, percebendo que eu não estava, de fato, tentando
apalpá-lo. — Mas o que...
A arma se soltou do coldre. Eu segurei a arma, pressionei contra o lado
de sua cabeça, e puxei o gatilho.
CRACK!
O som parecia tão alto quanto uma dinamite explodindo no meu
ouvido, e sangue espirrou por todo o meu rosto, picando minha pele com seu
calor chocante. Por um momento, os olhos de Brody se arregalaram, então
tudo dentro dele apenas – parou. Sem um som, suas mãos se afastaram da
minha garganta e ele se lançou para a frente em cima de mim. Eu esperei
vários segundos, mas ele não se mexeu, e eu senti mais e mais do sangue dele
escorrendo pelo meu rosto e pescoço. O gigante estava morto.
Eu soltei um grunhido e finalmente consegui empurrá-lo de cima de
mim antes de me levantar lentamente. Atirei a arma na lama, abaixei-me e
coloquei as mãos nos joelhos, tentando recuperar o fôlego. Brody estava
deitado de lado, os dedos estendidos em minha direção, seus olhos cegos fixos
em mim em uma acusação silenciosa que eu conhecia muito bem.
Eu levantei minha mão, como se estivesse inclinando a aba de um
chapéu de cowboy imaginário para ele. — A fora-da-lei Gin Blanco vence
novamente.
Capítulo 26
Algo explodiu dentro do salão, fazendo com que mais chamas
disparassem pela janela quebrada da loja e me afastando do corpo de Brody.
O incêndio também me lembrou que eu ainda tinha trabalho a fazer esta noite.
Agora que Brody e os gigantes estavam mortos, eu precisava chegar ao hotel
para ajudar Silvio e os outros a salvarem o resto de nossos amigos.
Eu levantei minha mão, apertando os olhos contra o brilho, e olhei
para a confusão lamacenta ao redor do bebedouro, procurando a faca que eu
perdi na minha briga com Brody. Lá estava ela, caída em uma poça, o cabo
apenas visível através da lama espessa e desleixada. Eu comecei a me curvar
e estender a mão...
Crack!
Um tiro soou, e eu silvei quando uma bala passou pelo meu braço
esquerdo, perto de onde eu já tinha sido baleada hoje cedo. Mais uma vez, o
Fogo elemental entrou em erupção e em torno da ferida, queimando mais
quente do que as chamas ainda disparando para fora do saloon. Roxy não
tinha entrado no parque com Brody e os gigantes, mas ela estava aqui agora,
e a cadela atirou em mim novamente com uma de suas balas revestidas de
Fogo.
Eu me joguei para a frente, bem no meio da grande poça com lama
espirrando em cima de mim. Mas a lama pegajosa na verdade apagou o Fogo,
embora a magia continuasse a queimar e queimar a ferida. Maldições e
rosnados saíram dos meus lábios e eu lutei para controlar a dor. Mesmo
enquanto eu me levantava, eu continuei esperando que outra bala rasgasse
meu corpo a qualquer segundo...
— Bem, — uma voz familiar e maliciosa falou, — isso foi certamente
dramático.
Eu levantei minha cabeça para encontrar Roxy e Hugh Tucker em pé
no meio da Main Street.
E eles não estavam sozinhos.
Finn, Bria e Owen estavam atrás deles, parados do outro lado da rua.
Suas mãos estavam bem amarradas na frente deles com grossos laços,
enquanto bandanas negras tinham sido colocadas em suas bocas para mantê-
los quietos. Todos os meus amigos pareciam tensos e zangados, mas nenhum
corte visível ou hematomas pontilhavam seus rostos. Não parecia que eles
tinham sido torturados, e todos acenaram para mim, dizendo silenciosamente
que eles estavam mais ou menos bem. Alívio me inundou. Bom. Isso era bom.
O que não era bom era a meia dúzia de guardas gigantes que
flanqueavam meus amigos. Tucker poderia ter mandado Brody e sua gangue
de proscritos para o parque temático atrás de mim, mas o vampiro tinha
percebido que ele precisaria de mais homens, e ele planejou de acordo. Ainda
assim, eu colocaria uma diferença maior em seus números do que eu
esperava, e as chances eram muito maiores agora do que antes.
Especialmente desde que o resto da gangue Blanco estava espreitando
por aqui em algum lugar.
Eu não olhei ao redor, mas sabia que Silvio, Phillip, Lorelei e Ira tinham
que estar por perto. Eles teriam visto Tucker deixando o hotel com nossos
amigos, e eles o seguiriam até aqui.
A menos que os quatro já estivessem mortos – mortos tentando
resgatar nossos amigos no hotel...
Medo me encheu, lavando meu alívio, mas eu empurrei a emoção de
lado. Eu não iria me deixar pensar assim. Eu não podia. Não se eu quisesse
resgatar Finn, Bria e Owen. Silvio e os outros estavam esperando o momento
certo para atacar, assim como eu pedi. Eu tinha que acreditar nisso, assim
como eu tinha que acreditar que todos nós íamos sair vivos desse maldito
parque temático – e que eu não ia morrer no próximo minuto ou dois.
Roxy deu um passo à frente, seu revólver apontado para a minha
cabeça. O olhar dela foi para o corpo de Brody, e seus olhos verdes pálidos se
encheram de raiva. — Levante-se — ela rosnou, focando em mim novamente.
— Lentamente. Qualquer movimento repentino, e eu vou colocar outra bala
em você.
Eu lentamente levantei minhas mãos da lama e cambaleei para os
meus pés. Eu arrisquei um olhar para baixo e percebi que minha faca ainda
estava espetada na poça. Eu pisei na frente dela para que eles não a vissem
caída no chão.
Tucker olhou para mim, então para Brody caído morto na rua, e
finalmente para o saloon ainda em chamas. — Bem, você certamente fez uma
bagunça por aqui.
Eu sorri. — O que posso dizer? Eu simplesmente não consigo me
conter.
— Ela matou Brody, — Roxy estalou. — Então, corte a conversa fofa e
me deixe atirar na cadela novamente.
Tucker deu-lhe um olhar frio. — Não até eu conseguir o que eu vim
buscar.
O vampiro estalou os dedos, e os homens guardando Finn, Bria e Owen
levantaram suas armas, empurrando suas armas contra os lados dos meus
amigos.
— Dê-me as joias ou meus homens vão matar seus preciosos
amiguinhos bem na sua frente, — Tucker falou.
Eu sabia que ele estava falando sério, então eu não hesitei. — Está
bem, está bem. Apenas relaxe. Eu vou te dar o que você quer. Eles estão em
um dos bolsos do meu colete. Então diga a Annie Oakley para evitar de atirar.
Roxy rosnou, mas dei um sorriso doce em troca. Tucker sacudiu a
cabeça para Roxy, que abaixou a arma para o lado, embora ela mantivesse o
dedo enrolado no gatilho, pronta para levantar a arma e atirar em mim no
segundo em que eu fizer alguma coisa suspeita.
Eu estendi as minhas mãos para os lados, então lentamente trouxe-as
para o meu peito. Então, com a mesma lentidão, abri um dos bolsos no meu
colete de silverstone molhado, enlameado e ensanguentado, peguei uma bolsa
de veludo preto e levantei-a onde Tucker e Roxy podiam vê-la.
— Aqui estão suas pequenas pedras preciosas. Cada uma delas.
— Vá buscá-las — disse Tucker para Roxy.
Ela apertou os lábios, claramente irritada por receber ordens como
uma simples criada, mas seguiu pela rua na minha direção, com a arma ainda
na mão, claramente ansiosa para atirar em mim novamente. Eu fiquei tensa,
pensando em alcançar minha magia de Pedra para endurecer minha pele, mas
eu tinha esgotado quase todas as reservas no meu anel e colar de runa de
Aranha. Eu só seria capaz de me proteger mais uma vez de todas as balas, e
eu não queria desperdiçar os poucos restos de magia que eu tinha. Ainda não.
Então eu fiquei ali parada e esperei, imaginando se Roxy seria estúpida
o suficiente para ficar à distância de um braço de mim.
Mas ela era esperta demais para isso, e parou a cerca de três metros
de distância. — Jogue a bolsa aqui. Sem truques, ou seus amigos morrem.
— Sem truques da minha parte.
Eu gentilmente joguei a bolsa cerca de um metro e meio na minha
frente, para que ela caísse entre nós no meio da rua. Roxy manteve seu olhar
em mim e sua arma pronta quando ela se inclinou para frente, abaixou-se e
puxou a bolsa, mas eu não fiz um movimento. Eu não arriscaria a vida de
meus amigos assim.
Enquanto Roxy se endireitava, olhei para trás dela. Finn e Bria, ambos
tinham olhares tensos e preocupados em seus rostos, e eles não paravam de
olhar para os homens que os guardavam, esperando por uma oportunidade
para tentar derrubá-los.
Finalmente, eu olhei para Owen. Ele olhou de volta para mim, seus
olhos violetas firmes em meus cinzentos, nenhum um pouquinho de medo,
completamente confiante de que eu conseguiria tirar ele e os outros disso.
Quando teve certeza de que ninguém, a não ser eu, estava olhando para ele,
piscou o olho, depois girou as mãos amarradas, de modo que seus dedos
estavam apontando para a esquerda. Eu não olhei naquela direção, mas sabia
o que ele estava tentando me dizer – que Silvio, Phillip, Lorelei e Ira estavam
em posição e prontos para ajudar. Owen deve tê-los visto no hotel.
Meu coração se acelerou. Nós ainda tínhamos a chance de sair disso.
Por mais que eu quisesse piscar de volta para ele, deixei meu rosto em branco,
não querendo dar a Tucker, Roxy ou os guardas qualquer suspeita sobre o
que estava acontecendo.
Roxy recuou e jogou a bolsa de veludo preto para Tucker, que
facilmente a pegou. O vampiro levantou a bolsa na mão, abriu os cordões e
colocou o conteúdo na palma da mão. Diamantes, safiras e rubis brilhavam
sob as luzes e as chamas do saloon, e eu podia ouvir as pedras cantando
suavemente sobre sua beleza.
Satisfeito, Tucker assentiu, colocou as joias de volta na sacola e
fechou-a bem apertado antes de colocá-la no bolso do paletó preto. — Bem,
Gin, você me surpreendeu. Você realmente me deu o que eu queria. Assim
sem mais nem menos.
Dei de ombros. — Você não me deu muita escolha.
— Não, eu não dei — murmurou Tucker. — E eu acredito que isso
conclui nosso negócio por esta noite. — Ele sorriu, e eu sabia o que viria a
seguir. — Na verdade, isso conclui nosso negócio para sempre. Mate-a.
Ele gesticulou com a mão. Ele ainda não tinha terminado o movimento
antes que Roxy sorrisse, chicoteasse e atirasse em mim.

***

Eu percebi que esse pequeno cenário só terminava de um jeito – com


Roxy atirando em mim – e eu podia usar minha magia de Pedra para me
proteger. Mas eu escolhi não fazê-lo. Porque Roxy estava chateada que eu
tinha matado Brody, e eu estava apostando que ela iria querer me fazer sofrer
antes dela finalmente acabar comigo.
E eu estava certa.
Esta bala passou raspando pelo meu braço direito, mas eu ainda gritei,
especialmente quando o Fogo elemental explodiu de novo, queimando a minha
pele com sua intensidade forte. Eu cambaleei para trás e bati no meu braço,
usando meus dedos cobertos de lama para apagar o Fogo o melhor que pude.
Meus amigos avançaram, tentando gritar com as bandanas enfiadas na boca,
mas os guardas os mantiveram no lugar. Tucker cruzou os braços sobre o
peito, divertindo-se com todo o espetáculo.
— Eu poderia usá-la para praticar tiro ao alvo — disse Roxy, girando
seu revólver ao redor de sua mão. — Mas isso não seria muito esportivo da
minha parte. Estamos no Velho Oeste, então vamos resolver as coisas à moda
antiga. Que tal um duelo, Gin? Só você e eu e nossas armas no meio do Main
Street. A vencedora leva tudo.
Ela não esperou que eu respondesse. Em vez disso, ela apontou para
a arma de Brody, que ainda estava no meio da lama onde a deixei cair antes.
— Pegue-a.
Eu hesitei, me perguntando como eu poderia transformar isso em meu
favor...
Crack!
Desta vez, a bala roçou a parte externa da minha coxa esquerda. Mais
Fogo elemental queimou a minha pele, e o cheiro da minha carne queimada
encheu meu nariz, fazendo meu estômago revirar. Eu cerrei os dentes, bati no
Fogo o melhor que pude, e afastei a dor, apertando com força. Eu poderia lidar
com um pouco de dor, um pouco de Fogo, um pouco de pele queimada.
Contanto que eu conseguisse distribuir uma grande quantidade de mortes em
troca.
— Eu disse, pegue-a — rosnou Roxy. — Pegue agora porra.
— Ok, ok — eu disse. — Você quer seu confronto no meio-dia, xerife
Roxy? Por mim tudo bem.
Mantendo um olho em Roxy, eu caminhei até onde a arma estava e
lentamente me abaixei, tentando pegá-la sem cair no chão. Eu estendi meus
dedos em direção à arma...
Crack!
Uma bala atingiu a coronha da arma, fazendo-a sair do meu alcance e
Fogo elemental explodir sob meus dedos. Eu rosnei e bati minha mão contra
a minha coxa, mais uma vez apagando as chamas, embora não a queimação
contínua que elas deixaram para trás.
A risada soou quase tão alta quanto os tiros, como Roxy, Tucker e os
guardas riram às minhas custas. Eu olhei para cima. Roxy sorriu, uma luz
cruel piscando em seus olhos, e gesticulou para que eu tentasse novamente.
Então eu suspirei e caminhei para frente, percebendo que não tinha
escolha a não ser jogar seu jogo doentio. A única coisa boa sobre isso era que
todo mundo estava focado em mim agora, incluindo os gigantes guardando
Finn, Bria e Owen, que baixaram suas armas dos lados dos meus amigos. Eu
esperava que meu sofrimento desse a Sílvio e aos outros a chance de
finalmente fazer seu movimento.
Mas agora, eu tinha outra rodada de torturas para suportar, então
cerrei os dentes e estiquei minha mão na direção da arma de Brody
novamente, sabendo o que viria a seguir...
Crack!
Mais Fogo, mais queimaduras na minha pele, mais risos de Roxy,
Tucker e todos os guardas.
Eu sufoquei a última rodada de Fogo, lentamente me endireitei e olhei
para ela. — Não admira que você tenha todas aquelas cabeças de animais
empalhados em seu escritório. Você é uma cadela sádica.
Roxy arqueou uma sobrancelha para mim. — Bem, Gin, se você não
quer jogar junto, eu acho que vou ter que te usar para treinar tiro ao alvo
afinal de contas.
Antes que eu pudesse retorquir, a cadela levantou sua arma e atirou
em mim novamente.
Crack!
Essa bala atingiu a parte carnuda da minha coxa esquerda. Mais
daquele maldito Fogo elemental explodiu e queimou minha pele, aumentando
a agonia da ferida. Roxy não tinha me esfolado desta vez, mas ela também não
tinha acabado de brincar comigo, já que a bala não tinha atingido nada vital.
Uma ferida dolorosa, mas não debilitante.
Ainda assim, gritei mais alto do que antes, cambaleei para a frente e
caí no meio da lama, como se estivesse acabada. Eu achei que foi bem
convincente, no que diz respeito a quedas.
— Mmm! Mmm! — Os gritos abafados de meus amigos encheram o ar,
mas eles não podiam fazer nada para me ajudar.
Roxy sorriu e se aproximou de mim, girando sua arma ao redor de sua
mão, fazendo o punho de pérola e o cano de prata brilharem, e fazendo todos
os tipos de truques extravagantes com a arma. Eu fiz o meu próprio truque,
cavando a minha mão na lama, e enrolando meus dedos ao redor do punho
da minha faca que ainda estava enterrada lá. Eu também alcancei os últimos
fragmentos remanescentes da minha magia de Pedra, me preparando para
derramar o poder para endurecer minha pele uma última vez. Eu só teria uma
chance, e eu tinha que fazer valer a pena.
Desta vez, Roxy continuou chegando até que ela estivesse ao alcance
do braço, pairando sobre mim. — Sabe, não tenho uma cabeça humana no
meu escritório, mas acho que vou fazer uma exceção para você, Gin. — Seus
olhos brilharam com satisfação maliciosa.
— Nunca vai acontecer, docinho...
Antes que eu pudesse terminar ela levantou a arma e atirou no meu
rosto.
Capítulo 27
Pelo menos, Roxy tentou atirar no meu rosto.
No último segundo, me lancei para fora do caminho, deslizando para a
frente através da lama. Mas a bala do tiro à queima-roupa ainda perfurou meu
ombro esquerdo. Eu grunhi com o impacto duro e contundente e flash de
Fogo, mas a minha magia de Pedra impediu a bala de realmente rasgar o meu
corpo. Roxy rosnou e começou a puxar o gatilho novamente, mas eu não dei
a ela a chance.
Eu cerrei meus dentes, levantei minha faca para fora da lama, e
apunhalei o pé dela. Desta vez, foi Roxy quem gritou.
Um som doce, tão doce.
Ela tentou atirar em mim novamente, mas eu tirei minha faca do seu
pé e passei em seu pulso, fazendo-a soltar seu fiel revólver. Ela cambaleou
para trás, tentando se afastar de mim e desesperadamente procurando o
segundo revólver em seu cinto, mas eu me joguei para a frente, acertei-a em
torno dos joelhos e derrubei-a de bunda na lama. Ela tentou me chutar para
longe, mas eu agarrei sua fivela de cinto de strass e usei-a para me puxar para
cima dela.
Então eu levantei a minha faca novamente e acertei-a em seu peito,
bem ao lado da estrela prateada e brilhante de xerife presa sobre o seu
coração.
E eu não parei.
Eu a esfaqueei uma vez, duas vezes, três vezes, cada ferida tão
profunda, brutal e mortal quanto eu consegui. Seu sangue respingou no meu
rosto e mão, mas eu não me importei com sensação de calor. De modo
nenhum.
Roxy gritou e gritou, procurando agarrar a sua arma durante todo o
tempo. Ela conseguiu colocar as pontas dos dedos no cabo de pérola, então
eu levantei minha a faca uma última vez e a abaixei, conduzindo-a por toda a
sua mão e na lama mole abaixo.
— Nunca traga uma arma para uma luta com faca — eu sibilei.
Roxy gargalhou uma vez, como se concordando comigo, então seu
corpo ficou frouxo e ainda sob o meu.
Tanto quanto eu teria gostado de afundar na lama ao lado dela, Tucker
e os guardas ainda estavam aqui, ainda vivos, então puxei minha faca da mão
dela, rolei de cima do seu corpo e cambaleei para os meus pés.
Tucker já estava apontando o dedo para mim. — Mate-a, agora porra...
Crack!
Crack! Crack!
Crack!
Mais tiros soaram, mas desta vez, a gangue Blanco foi quem disparou.
Com toda a atenção dos guardas em mim, Silvio, Phillip, Lorelei e Ira
finalmente decidiram atacar. De alguma forma, Silvio e Ira conseguiram se
esgueirar até a varanda do segundo andar de uma das fachadas e estavam
atirando contra os gigantes, enquanto Phillip e Lorelei estavam fazendo a
mesma coisa de sua posição atrás de um carrinho de comida no nível da rua.
Finn, Bria e Owen imediatamente jogaram-se no chão, fora da linha de
fogo.
Crack!
Crack! Crack!
Crack!
Um gigante caiu, depois outro. Bria se agachou e puxou a arma da
mão de um gigante morto. Ela jogou-a para Finn, então se atrapalhou em tirar
a segunda arma do gigante do coldre no cinto. Owen também estava pegando
a arma do gigante morto mais próximo a ele.
Meus amigos lutando contra os gigantes significavam que restava
apenas um homem. Eu procurei na rua por Tucker.
Mas o bastardo não estava aqui.
Minha cabeça estalou para a esquerda e para a direita, procurando por
ele. Eu não tinha passado por tudo isso só para deixá-lo fugir agora. Então,
onde ele estava? Onde estava aquele maldito rato furtivo...
Vi um flash de movimento pelo canto do olho e virei a cabeça bem a
tempo de ver Tucker sair da rua e correr para um beco. Eu comecei a ir
naquela direção, mas parei e olhei para os meus amigos.
Finn também tinha visto o vampiro, e ele arrancou o lenço da boca e
acenou para mim com as mãos atadas. — Estamos bem! — Ele gritou. — Vai!
Pegue o Tucker!
Eu sorri para ele agradecida e fiz o que ele ordenou, correndo pela rua
atrás do meu inimigo.

***

Eu estava prejudicada por causa de todos os buracos e queimaduras


no meu corpo, especialmente os da minha coxa, mas ignorei a dor de minhas
muitas lesões e manquei o mais rápido que pude. Mas Tucker era
excepcionalmente rápido, e ele facilmente colocou alguma distância entre nós.
Ele estava do outro lado da área de descanso antes mesmo de eu sair do beco.
Mas, em vez de tomar o caminho que levava de volta ao hotel, ele partiu para
outro lado. Eu fiz uma careta, imaginando onde ele estava indo, mas então
percebi exatamente onde aquele caminho levava – o ancoradouro no lago.
Não havia dúvida de que Tucker tinha sua rota de fuga já mapeada.
Pegue um barco para o outro lado do lago, onde ele provavelmente teria um
carro esperando, depois desapareceria durante a noite, junto com as joias.
Eu não estava disposta a deixá-lo escapar tão facilmente.
Então cerrei os dentes e me forcei a me mover mais rápido. Eu era bom
em estragar as coisas, então foi exatamente o que eu fiz, derrubando barris,
fardos de feno, arbustos e tudo mais que estava no meu caminho. A coisa boa
sobre correr era que isso se livrou do frio que tinha afundado em meus ossos
por ser mergulhada no bebedouro. O ruim foi que fez todo o meu corpo gritar
com a dor das minhas queimaduras e ferimentos de bala. Mas ignorei a agonia
o melhor que pude e continuei correndo.
Saí da área de descanso e entrei no caminho que levava ao lago. Sem
obstáculos, eu aumentei o meu ritmo.
Mas eu ainda estava muito atrasada.
À distância, ouvi um motor de barco roncar para a vida. Eu soltei uma
maldição e continuei.
Deixei o bosque para trás e corri colina abaixo, em linha reta em
direção ao cais de madeira que se estendia como uma flecha na água. Luzes
decorativas também estavam ao redor da doca, deixando-me ver claramente
Tucker de pé em um barco no outro extremo, soltando uma corda e acionando
o motor. Eu coloquei uma explosão de velocidade, fazendo o meu melhor para
alcançá-lo.
Mas não adiantou.
Quando cheguei ao final da doca, Tucker já estava a dez metros na
água, com o motor ligado. Sem armas e sem magia, o bastardo sabia que eu
não poderia matá-lo agora, e ele olhou para trás só para me provocar.
Tucker balançou a cabeça. — Você não sabe quando desistir, não é,
Gin?
— Somente os perdedores desistem. Você? Você só vai morrer.
Ele sorriu, seus dentes brilhando como opalas em seu rosto. — Não
esta noite.
— Não — eu murmurei. — Não esta noite.
— Diga-me uma coisa, — ele gritou.
— O quê?
Ele colocou a mão no bolso da jaqueta e tirou a bolsa de veludo preto,
deixando-a balançar de sua mão como um pêndulo do relógio, zombando de
mim. — Onde Deirdre escondeu as joias? Meus homens e eu procuramos em
todos lugares por elas.
— Elas estavam em sua suíte. Escondidas em alguns globos de neve,
como se fossem apenas pedras sem valor.
Tucker sacudiu a cabeça novamente. — Aquela cadela. Deirdre era
esperta, mas nunca imaginei que ela fosse tão esperta.
— Oh, imagino que ela teve a ideia no dia em que vocês dois visitaram
minha mãe em seu escritório, pouco antes de sua festa anual de Natal.
Tucker congelou, o sorriso presunçoso caindo de seu rosto. — Você se
lembra disso?
— Sim, eu me lembro disso. Eu me lembro especialmente do homem
que você enviou para machucar minha mãe naquela noite.
Ele me olhou por um momento, depois deu de ombros. — Foram
apenas negócios. Certamente, você de todas as pessoas pode entender isso.
— Oh, eu entendo isso. E eu vou fazer disso o meu negócio para acabar
com você e o resto do Círculo.
O vampiro sorriu, seus olhos negros brilhando em seu rosto. —
Cuidado com o que você deseja, pequena Genevieve. Essa é uma lata de
vermes que você pode não querer abrir.
— Eu...
Tucker me fez uma saudação fingida e ligou o motor, me abafando. O
vampiro balançou a sacola de veludo preto para mim novamente, zombando
de mim pela última vez, antes de guiar o barco, pressionando o acelerador e
deslizando pelo lago.
Tucker estava certo. Ele não ia morrer esta noite.
Mas em breve... muito em breve.
Eu me certificaria disso.
Capítulo 28
— Gin! Onde você está? Gin! — As vozes dos meus amigos passaram
pelo ar até mim em um alto e preocupado coro.
— Aqui! — Eu gritei. — Aqui embaixo no ancoradouro!
Um minuto depois, Finn, Bria e Owen apareceram, correndo para o
cais. Eu manquei de volta em sua direção, a dor dos meus ferimentos
inundando meu corpo a cada passo. Meus amigos derraparam até pararem,
com armas nas mãos, olhando para a esquerda e para a direita.
— Onde está Tucker? — Finn rosnou. — Onde ele está?
Eu apontei meu polegar por cima do meu ombro. — Ele se foi. Entrou
em um barco, afastou-se e fiquei aqui como uma idiota. Aquele filho da puta
deve ser parte gato, tantas vidas quanto ele parece ter.
Bria me deu um olhar simpático. — Eu sinto muito, Gin.
Eu dei de ombros. — Está tudo bem. Vocês estão seguros e isso é o
mais importante. Além disso, Tucker vai voltar a aparecer mais cedo ou mais
tarde. E eu vou pegá-lo quando ele o fizer.
Owen se adiantou e segurou meu rosto em sua mão, seu olhar firme
no meu. — Nós vamos pegá-lo quando ele o fizer.
Eu sorri de volta para ele. — Você pode ter certeza que sim.

***

Owen insistiu em me pegar em seus braços e me levar para a casa de


Ira para que eu pudesse me limpar, assim como usar um pouco da pomada
de cura da Jo-Jo para curar todas as queimaduras e feridas de bala que Roxy
tinha infligido em mim. A pomada não me curou completamente, mas parou
a dor constante e lancinante das queimaduras do Fogo e tirou a pior das
minhas feridas. Eu ficaria bem até voltar para casa em Ashland amanhã e Jo-
Jo poderia me curar.
Finn e Bria voltaram para o parque temático para ajudar Silvio, Phillip,
Lorelei e Ira a lidar com todo o sangue, corpos e outras destruições que nós
deixamos para trás. Bem, que eu havia deixado para trás.
Ira acabou ligando para o corpo de bombeiros para apagar o fogo do
saloon, e eles o apagaram antes de danificar mais a Main Street. Quanto a
todos os corpos dentro e ao redor do saloon, Ira afirmou que as imagens de
segurança mostravam os gigantes invadindo o parque temático, e ele disse às
autoridades que deviam estar procurando as joias escondidas. Naturalmente,
os gigantes se voltaram uns contra os outros, começaram o fogo e atiraram
uns nos outros quando não encontraram as pedras preciosas. Eu não sei se
alguém realmente comprou a história inventada por Ira, mas Roxy, Brody e os
gigantes estavam todos mortos, eles não podiam dizer nada diferente, e meus
amigos e eu certamente não iríamos dizer nada. Além disso, o parque era a
propriedade privada de Finn, então não havia muito que os policiais pudessem
fazer uma vez que Ira lhes dissesse que o proprietário não iria se prosseguir
com o assunto, já que todos os criminosos estavam mortos. Não parecia que
qualquer coisa voltaria para nós.
Todos nós ficamos na cabana do anão, apenas no caso de Tucker
decidir voltar e nos atacar outra vez, mas o resto da noite passou em silêncio,
e nós dormimos até tarde.
Pouco antes do meio dia do dia seguinte, eu estava de pé na cozinha
de Ira, preparando panquecas de manteiga em uma chapa e fritando um
monte de bacon, ovos e batatas em uma frigideira de ferro fundido.
— O café da manhã está servido — eu gritei, então olhei para Ira, que
estava sentado à mesa da sala de jantar. — Por favor, me diga que há um
triângulo por aqui em algum lugar que eu possa tocar.
Ele riu. — Receio que não.
— Ah, bem.
Era um ajuste apertado, mas todos se espremeram em volta da mesa
enquanto eu servia a comida. Panquecas douradas leves como o ar, bacon
crocante, ovos mexidos fofinhos e batatas fritas crocantes. Era o café da
manhã perfeito, e todos nós cavamos nosso banquete.
Finalmente, depois de ter três pratos de comida, Ira se afastou da
mesa, suspirou com contentamento e olhou para mim. — Eu deveria contratá-
la para trabalhar no Feeding Trough. Nenhum dos meus funcionários pode
cozinhar assim.
Eu ri. — Desculpe, mas eu já tenho um restaurante de churrasco para
administrar.
Ele sorriu de volta para mim.
Finn bufou. — Bem, eu não sei como vocês dois podem estar tão
alegres esta manhã, considerando o fato de que o saloon no meu parque
temático acabou de incendiar.
Ira arqueou as sobrancelhas. — Seu parque temático?
Meu irmão encolheu os ombros. — Meu nome é o que está na escritura.
— Bom — disse Ira, sem perder o ritmo. — Então você pode pagar por
todos os reparos.
Finn piscou, então percebendo que ele tinha sido pego, deu ao anão
um olhar azedo. Ira riu, e todos nós nos juntamos a ele. Finn suspirou e tomou
um pouco mais de café, o que o animou de novo.
— Por mais que eu odeie admitir, Finn está parcialmente certo — Silvio
entrou na conversa. — Afinal, Tucker escapou.
Bria assentiu. — E ele fugiu com as joias também.
— Alguns caras têm toda a sorte — Finn murmurou.
Ira, Owen, Phillip e Lorelei concordaram, mas eu ri novamente,
fazendo-os olhar para mim com surpresa.
Os olhos de Lorelei se estreitaram. — O que você fez, Gin?
Eu me levantei, atravessei a cabana e peguei o vestido da Sweet Sally
Sue de onde ele estava pendurado na parede. Eu trouxe o vestido para a mesa
da sala de jantar e estendi para Ira. — Por que você não faz as honras?
Ele franziu a testa, se perguntando o que eu estava aprontando, mas
então seu rosto clareou, e eu sabia que ele se lembrou do que eu lhe tinha dito
ontem. O anão tirou o vestido de mim, colocou-o no colo e enfiou a mão no
primeiro bolso, depois no outro. Ele encontrou no segundo. Ira piscou
surpreso e lentamente tirou uma bolsa de veludo negro.
Todos arfaram, se levantaram e se reuniram em torno de sua cadeira.
Com as mãos trêmulas, o anão lentamente abriu os cordões da bolsa
e cuidadosamente inclinou os conteúdos na mesa.
As joias de Sweet Sally Sue brilharam sob as luzes.
Por um momento, houve um silêncio atordoado.
Então Finn começou a falar, como sempre fazia. — Essa... essas são
as verdadeiras joias, certo?
Eu assenti. — Sim, essas são as que eu encontrei escondidas naqueles
globos de neve na suíte de Deirdre. Todas que ela escondeu neles.
Silvio franziu a testa. — Então, o que estava naquela bolsa que você
deu a Tucker? Porque ele abriu na Main Street ontem à noite, e eu o vi
derramar as pedras na mão dele.
— Oh, aquelas eram pedras preciosas também, só que na sua maioria
falsas.
Desta vez, Owen franziu a testa. — Mas onde você conseguiu joias
falsas em tão pouco tempo?
Eu sorri. — Diretamente da própria Mamãe Dee.
Nós nos sentamos em nossas cadeiras, e eu disse aos meus amigos
como eu peguei um monte de anéis, colares e pulseiras, junto com uma bolsa
extra de veludo preto, daquela parede de joias no closet de Deirdre.
— A maioria era apenas bijuterias — eu disse. — Bijuterias muito
bonitas, mas ainda falsas. Havia algumas pedras preciosas verdadeiras na
mistura, mas eram pedras pequenas e de baixa qualidade. Então eu as tirei
de seus suportes e as coloquei em uma bolsa de veludo preto como se fossem
reais. Foi bom o suficiente para enganar Tucker.
O vampiro pode ser inteligente, mas ele não era um elemental de Pedra
como eu, então ele não tinha sido capaz de ouvir os murmúrios suaves e fracos
das pedras na noite passada, e ele não percebeu que eu estava dando a ele
um monte de falsificações. Era com isso que eu estava contando, e funcionou
como um encanto proverbial. Tucker pode ter escapado, mas pelo menos eu o
impedi de colocar as mãos nas joias. Era uma pequena vitória, mas eu
aceiraria o que pudesse conseguir.
— Eu só queria poder estar lá para ver o olhar no rosto de Tucker
quando ele perceber que você o enganou e que tudo o que ele tem é uma pilha
de vidros bonitos — Phillip disse.
— Eu também. — Eu sorri. — Eu também.
Todo mundo ficou em silêncio, tomando seu café e suco de laranja. Ira
ainda estava olhando para todas as pedras brilhantes e coloridas espalhadas
sobre a mesa. Depois de alguns segundos, ele pegou tudo, colocou de volta na
sacola e segurou a coisa toda sobre a mesa para Finn.
— Aqui — disse Ira em uma voz áspera. — Estes pertencem a você
agora. Afinal de contas, seu nome está na escritura, exatamente como você
disse.
Finn sorriu e começou a alcançar a mesa em busca das joias, mas eu
limpei minha garganta e levantei minhas sobrancelhas. Ele olhou para mim,
seu rosto se contorcendo em uma careta suplicante. Mas eu continuei olhando
para ele, e ele finalmente revirou os olhos.
— Você sabe o quanto eu odeio ser nobre — ele choramingou. — Isso
me faz sentir coceira.
— Finn... — Eu avisei.
— Tudo bem, tudo bem — disse ele, abaixando a mão e sentando-se
em sua cadeira. — Na verdade, Ira, eu acho que você deve manter as joias.
Afinal de contas, você é quem amava Sweet Sally Sue.
Outro pensamento ocorreu a Finn, e ele se iluminou. — Além disso,
esta é a sua casa. Aposto que alguns desses diamantes ajudariam bastante
para consertar o saloon e fazer o parque temático voltar a funcionar.
Lorelei bufou. — E poupar você de realmente ter que pagar por
qualquer coisa. Boa lógica, Lane.
Finn sorriu e apontou o polegar e o indicador para ela. — Bingo.
Todos nós gememos.
Ira colocou a bolsa na mesa e limpou a garganta. — Na verdade, eu
tenho algo para vocês também, Gin e Bria.
Ele se levantou e desapareceu em seu quarto. Olhei para minha irmã,
que encolheu os ombros para mim. Ela não sabia o que ele estava fazendo
mais do que eu. Ira apareceu alguns segundos depois, carregando duas fotos
emolduradas. Ele entregou a primeiro para Bria, e todos nos inclinamos sobre
a mesa para olhá-la.
Era uma foto da nossa mãe.
A foto tinha sido tirada no saguão do hotel durante as festas de final
de ano, e Eira estava em pé diante de uma árvore de Natal, examinando um
dos globos de neve aninhados nos galhos. Ela parecia jovem na fotografia,
provavelmente com vinte e poucos anos, e sorria com deleite infantil, com o
rosto todo iluminado ainda mais do que as luzes da árvore. A bela foto dela
era muito melhor do que as fotos que eu encontrei dela com Deirdre Shaw e
Mab Monroe. Meu peito se apertou.
Ira acenou para Bria. — Quando vi você pela primeira vez, achei que
você se parecia com alguém que eu tinha visto no resort, mas não conseguia
identificar exatamente quem era ou onde estava sua imagem. Então, quando
vi Gin usando aquela peruca loira, percebi que ela também se parecia com a
mesma mulher.
Choque passou por mim. Bria era a imagem de nossa mãe, mas nunca
pensei que eu fosse parecida com ela. Mas Ira pensou que eu era. Isso me
agradou. Que eu ainda carregava parte dela comigo, mesmo que eu não tivesse
percebido até agora.
— Você nunca esquece um rosto — eu murmurei, minha voz grossa de
emoção.
— Não, eu não esqueço. — Ira assentiu para mim. — Você tem o nariz
e as maçãs do rosto dela. Coloque essa peruca loira de volta, e tanto você
quanto Bria poderiam ser suas gêmeas.
— Obrigada. — Eu murmurei novamente.
Ira assentiu e me entregou a segunda foto. — E eu pensei que você
poderia querer ver esta também.
Mais uma vez, todos se inclinaram sobre a mesa para ver a foto – de
Hugh Tucker.
O vampiro estava sentado no saguão do hotel, também durante os
feriados, dado o visco amarrado em cima na cornija da lareira atrás dele.
Tucker estava inclinado para a frente, com os cotovelos nos joelhos,
conversando com alguém sentado em uma cadeira de encosto alto que eu não
conseguia ver. Eu trouxe a foto para perto do meu rosto, examinando cada
detalhe, mas não havia mais nada ali. Tucker também parecia jovem na foto,
na casa dos vinte e poucos anos, embora ele tivesse um daqueles rostos sem
idade que tornavam difícil identificar a idade que ele tinha naquela época.
— Fiz uma rápida varredura em todas as minhas fotos aqui, e temo
que essa é a única foto que tenho de Tucker — disse Ira. — Eu sinto muito,
Gin.
— O vampiro não é importante. Não hoje, de qualquer maneira. — Eu
coloquei a foto de lado e olhei para os meus amigos, antigos e novo. — Agora,
estou feliz por estar aqui com todos vocês. — Fiz uma pausa. — E que todos
nós sobrevivemos a outras férias.
Finn ergueu a caneca de café. — Eu vou beber a isso. Saúde, a todos!
Todos nós levantamos nossas canecas de volta para ele.
— Saúde!
Capítulo 29
Depois de terminarmos o café da manhã, fomos ao hotel, pegamos
nossas coisas e nos encontramos de novo no saguão, onde Ira tinha outra
surpresa, dessa vez para Finn – aquela foto do corte de fita de Deirdre que eu
tinha visto no escritório do anão ontem.
— Obrigado por isso, mas eu realmente não preciso mais — disse Finn.
— Para melhor ou pior, eu estou em paz com Deirdre. Ela não se importava
comigo, então não vou me preocupar em pensar mais sobre ela. Pelo menos,
vou tentar não pensar muito nela.
— Aceite — disse Ira com uma voz rouca. — Ela ainda era sua mãe.
Você pode querer isso... mais tarde.
Finn hesitou, mas finalmente assentiu e colocou a foto em sua mala.
Nós nos despedimos de Ira, que prometeu manter contato e nos deixar
saber como estavam ocorrendo as reformas no parque temático, e saímos do
complexo de resorts Bullet Pointe. Finn, Bria, Owen e eu fomos no Range
Rover de Finn na viagem de volta para casa, com Silvio, Phillip e Lorelei
seguindo atrás em outro carro.
— Então — Finn disse com uma voz animada enquanto nós colocamos
nossos cintos de segurança, — quem quer cantar algumas músicas de cowboy
a caminho de casa?
Bria apontou o dedo para ele. — Se eu ouvir ao menos um único
yippee-ki-yay, eu vou atirar em você. Sem mais músicas de cowboy. Nunca
mais.
Finn amuou por um minuto, então se animou e começou a mexer no
console central.
— Uh-oh — Owen murmurou.
— Bem, então — disse Finn, erguendo uma caixa de CD verde que ele
balançou para nós três, — é uma coisa boa que eu trouxe a minha playlist de
Natal como backup.
Bria beliscou a ponte do nariz, Owen suspirou e recostou-se contra o
seu assento.
Eu apenas ri.
— Cobrindo as bases — eu disse. — Cobrindo as bases.

***

Três horas e várias dezenas de canções natalinas fora de moda mais


tarde, chegamos em Ashland. Nosso primeiro passo foi ir ao salão de Jo-Jo,
para que a anã pudesse curar completamente as queimaduras e os buracos
de bala que ainda decoravam meu corpo. Ela cuidou dos meus ferimentos,
depois ficou me paparicando por uma hora, inclusive me fazendo uma caneca
de chocolate quente. Muito melhor do que fatias de pepino e ser mimada em
um spa chique.
Depois disso, meus amigos e eu seguimos nossos caminhos separados,
cada um de nós voltando ao ritmo de nossas vidas regulares.
Na manhã seguinte, levantei-me, tomei um banho, e fui para o Pork
Pit uma hora mais cedo. Sophia e Catalina tinham feito um ótimo trabalho na
minha ausência, e tudo estava pronto para o rock'n'roll, mas eu ainda fiz um
pote de molho secreto de churrasco do Fletcher, aproveitando a maneira como
ele temperava o ar. O cheiro quente e reconfortante sempre fazia o restaurante
se sentir como casa.
Na hora em que Silvio entrou e se sentou em seu banquinho habitual
no balcão, eu mudei para um dos meus projetos do dia. O vampiro me
observou usar um martelo e um prego para pregar cuidadosamente uma folha
de papel na parede perto da caixa registradora, bem ao lado de uma foto de
Fletcher e seu velho amigo Warren T. Fox que já estava lá, junto com uma
cópia emoldurada e ensanguentada de Where the Red Fern Grows.
Eu dei um passo para trás, admirando o meu trabalho manual. —
Bem, o que você acha?
Silvio bufou. — Só você ficaria orgulhosa de um pôster de Procurada.
Minha imagem granulada me encarou da parede, junto com o meu
nome e as informações que Roxy e Brody tinham oferecido por mim. Silvio
estava certo. Talvez fosse egoísta, mas eu amava ser a estrela do meu próprio
pôster de Procurada.
Sorri. — Eu enchi minha mala com cartazes antes de sairmos do Bullet
Pointe. Eu tenho o suficiente deles para colocar por todo o restaurante, se eu
quiser.
Ele revirou os olhos. — Isso soa como algo que Finn faria. Junto com
a obtenção de cartazes de Procurados, com todas as nossas fotos neles para
presentes de Natal.
— Bem, Silvio, — eu falei, — eu acho que é uma excelente ideia. Eu ia
te dar uma gravata. Ou talvez um suéter de Natal muito ruim. Mas cartazes
de Procurados personalizados? Isso é genial.
Seus lábios se curvaram em desgosto, e ele realmente estremeceu.
Eu estalei meus dedos. — Espere um segundo. Já sei. Por que não
combinar os dois? Vou conseguir para você um suéter que parece com um
pôster de Procurado completo com sua foto nele. O que poderia ser mais
reconfortante do que isso?
Ele apenas gemeu.

***

O resto do dia passou sem incidentes, e eu fechei o restaurante e fui


para casa, feliz por estar de volta à minha rotina familiar.
Naquela noite, eu estava na casa de Fletcher, relaxando no sofá da
sala, com os pés envoltos em meias na mesa de centro à minha frente e um
velho filme de James Bond na TV. Embora fosse quase meia-noite, eu tinha
acabado de tirar alguns biscoitos de chocolate e damasco do forno, e a casa
cheirava deliciosamente. E os biscoitos em si? Uma mistura divina de
chocolate quente e derretido, e doce sabor frutado dos cranberries secos e
damascos. O deleite perfeito para o último trabalho que eu tinha de fazer nesta
noite fria de inverno.
Porque ainda tinha mais um quebra-cabeças para resolver – o papel
da caixa de segurança de Fletcher.
Eu terminei meu segundo biscoito, tirei os pés da mesa de café, e
inclinei-me para a frente. Eu tinha deixado o papel na mesa quando o
encontrei pela primeira vez, mas parecia o mesmo que naquele dia no banco
quando Finn e eu o encontramos. Um grande retângulo desenhado em uma
única folha de papel branco.
Eu ainda não tinha uma pista do que significava.
Não, isso não era bem verdade. Eu sabia que era uma mensagem de
Fletcher, uma maneira enigmática de me dizer algo importante. O velho não
teria deixado o papel na caixa de outra forma. E a ironia da situação também
não me escapou. Fletcher propositadamente montou esta pequena caça ao
tesouro, uma que era estranhamente semelhante à minha busca pelas joias
de Sweet Sally Sue.
As informações no caixão de Deirdre me levaram a desenterrar o
túmulo da minha própria mãe, que levara a chave àquela caixa de depósito no
banco First Trust. Que havia resultado em um pedaço de papel que me
levaria... em outro lugar? Mas onde? E para quê?
Mais do que isso, eu me perguntava por que Fletcher tinha organizado
coisas assim. Por que me fazer saltar tantos arcos por um simples pedaço de
papel? Tinha que haver algo mais para tudo isso. Ou talvez Fletcher não queria
que eu encontrasse qualquer informação sobre o Círculo. Talvez ele nunca
quisesse que eu soubesse sobre a conexão da minha mãe com o grupo
maligno.
Ou talvez ele estivesse tentando me proteger de uma verdade ainda
mais horrível, o que quer que fosse.
Eu não sabia. Eu simplesmente não sabia. Ainda pior, eu tinha essa
sensação incômoda de que estava faltando algo óbvio, que isso era um
exemplo de Fletcher escondendo algo à vista de todos, assim como Deirdre
colocara as pedras naqueles globos de neve como se fossem pedras comuns.
Mas por mais que tentasse, eu não via a floresta para as árvores. Ou as árvores
para a floresta. Ou, o que quer que fosse essa metáfora estúpida.
Peguei a chave do cofre da mesa e examinei-a de todos os ângulos, mas
também era a mesma de antes – apenas uma chave com um número nela.
Nenhuma runa, nenhuma marca, nenhum símbolo de qualquer tipo que
enfeitasse o metal. Gin Blanco ataca novamente.
Essa frustração familiar surgiu através de mim, mas eu não podia ficar
muito melancólica. Não com biscoitos recém assados espalhando seu perfume
de chocolate por toda a casa. Mesmo que eu não conseguisse descobrir a
charada de Fletcher esta noite, então eu poderia pelo menos ter mais um
biscoito – ou três – antes de ir para a cama.
Joguei a chave na mesa, mas ela virou de ponta cabeça e deslizou pela
madeira, aterrissando no centro do retângulo na folha de papel. Eu comecei a
ficar de pé para pegar mais biscoitos, mas algo sobre onde a chave estava me
fez parar, me inclinar para frente e olhar para ela novamente.
Me lembrou... alguma coisa ... algo que eu vi recentemente. Alguma...
forma. Mas o quê?
Eu fiquei sentada lá e pensei sobre isso por alguns minutos, mas a
resposta não veio para mim, então eu me levantei, fui para a cozinha e voltei
com mais três biscoitos em um guardanapo de papel. Eu coloquei os biscoitos
na mesa ao lado da folha de papel e arrumei-os em uma fileira bem
arrumada...
Foi quando me lembrei da forma exata que a chave no centro do
retângulo representava e, mais importante, onde eu a tinha visto antes. Olhei
para a chave, o retângulo em volta e os biscoitos alinhados na mesa. Meu
coração começou a bater com entusiasmo. Eu tinha razão. Eu tinha certeza
disso. Mas ainda mais do que isso, eu senti um crescente sentimento de
antecipação, sabendo que Fletcher tinha algo para eu encontrar afinal de
contas.
— Fletcher — eu disse, sorrindo, — seu filho da puta.
Capítulo 30
— Esta é uma má ideia — resmungou Finn. — Uma ideia muito ruim.
Você sabe como o gelo está fino para mim por aqui nos dias de hoje.
Estávamos de volta ao banco First Trust, no nível do subsolo, em frente
a um escritório fechado. Eu liguei para Finn logo de manhã e contei o que
percebi sobre a pista que Fletcher havia deixado para trás. Finn tinha ficado
um pouco cético, mas ele concordou em me ajudar a checar isso.
— Não se preocupe — eu disse. — Vai ficar tudo bem. Você verá. Agora
bata na porta do homem.
Ele me lançou um olhar incrédulo. Finn olhou para a placa de metal e
estremeceu, obviamente não querendo fazer isso, mas ele levantou a mão e
bateu na porta do escritório de qualquer maneira.
— Entre! — Uma voz gritou.
Finn suspirou e girou a maçaneta, e nós entramos no escritório de
Stuart Mosley. Embora esse fosse o banco mais exclusivo e influente de
Ashland, o escritório de Mosley era mobiliado com simplicidade, com uma
escrivaninha grande, duas cadeiras à frente e vários arquivos de metal
alinhados nas paredes. Alguns tapetes grandes estavam espalhados pelo chão
de mármore, e a única pintura na parede mostrava uma linda cena de uma
nevasca na Bone Mountain. Meus olhos se estreitaram. Eu estive na mesma
cachoeira com Fletcher muitas vezes. Mais uma vez, imaginei o quão bem
Fletcher conhecia Mosley, mas não era para isso que eu estava aqui hoje.
Mosley estava sentado atrás de sua mesa, examinando uma pilha de
papéis, e nem sequer olhou para cima quando entramos. — Sim?
Finn mudou de um pé para outro. Eu lhe dei uma cotovelada no lado,
encorajando-o a continuar com as coisas, e ele avançou e pigarreou. — Sr.
Mosley, tenho certeza de que você se lembra da minha irmã, Gin Blanco. Ela
queria falar com você sobre algo.
O anão ainda não olhou para cima. — E o que seria isso?
— Um cofre de segurança — eu disse. — Nove deles, na verdade.
Isso finalmente chamou a sua atenção. Mosley parou por um
momento, depois deixou de lado os papéis que estava olhando e lentamente
levantou a cabeça. Seus óculos de leitura pretos faziam seus olhos castanhos
parecerem maiores do que realmente eram, e notei o súbito e agudo interesse
em seu olhar. — E que caixa seria essa?
Eu levantei a chave do cofre onde Mosley podia vê-la.
Ele arqueou as sobrancelhas espessas. — Sim? Eu acredito que você
já olhou naquela caixa há vários dias, Srta. Blanco.
— Sim. Eu olhei naquela caixa. No começo, fiquei muito desapontada
com o conteúdo, já que a única coisa dentro dela era essa única folha de papel,
como eu tenho certeza de que você já sabe.
Peguei o papel do bolso da minha jaqueta e desdobrei-o antes de
colocá-lo na frente de Mosley e colocar a chave no centro do retângulo como
fiz na minha mesa de café ontem à noite. No começo, eu achava que o papel
era um beco sem saída, mas era tudo menos isso. Em vez disso, havia sido
uma mensagem sobre onde estava a informação real – nas caixas de
segurança ao redor da primeira, formando um retângulo em volta da caixa
original de Fletcher. Ou um círculo, dependendo do seu ponto de vista e
apreciação por ironia.
Eu desenhei meu dedo ao redor do retângulo, traçando a forma em
toda a volta. — E agora eu quero abrir o resto das caixas de Fletcher. Todas
as que formam um anel em torno dessa primeira caixa central. Nove caixas
no total, contando com a que eu já abri.
Mosley tirou os óculos e colocou-os de lado, em seguida, recostou-se
na cadeira e juntou a mão, estudando-me. Eu olhei de volta para ele. Ao meu
lado, Finn continuou trocando o peso dos pés, ainda desconfortável por eu
confrontar seu chefe.
— E por que você acha que Fletcher tinha outra caixa aqui? — Mosley
finalmente perguntou. — Especialmente tantas delas?
— Que interessante você chamá-lo de Fletcher, em vez do Sr. Lane.
Você está assim tão familiarizado com seus clientes?
Mosley deu de ombros, sem realmente responder à minha pergunta.
— Eu sei que Fletcher tinha mais caixas aqui porque ele desenhou este
mapa do tesouro para elas. Ele simplesmente não disse que X marca o local.
Ele era esperto demais para isso, e ele confiou em mim para descobrir por
conta própria. Na verdade, acho que ele colocou as coisas exatamente assim
porque percebeu que eu era a única que teria a teimosia e a determinação
para descobrir o que sua pista realmente significava.
Concordância brilhou nos olhos de Mosley, junto com o que parecia
ser respeito.
Eu bati meu dedo no papel. — Quando Finn me levou para o cofre
alguns dias atrás, notei que a caixa de Fletcher estava no meio desse banco
de nove caixas que foram colocadas sozinhas na parte de trás do cofre. Admito
que demorei um pouco para descobrir o que esse retângulo significava, que o
velho estava me dizendo que eu havia aberto apenas a primeira caixa e que
todas as outras em torno dela também pertenciam a ele. Mas Fletcher era
paranoico, e ele queria ter certeza de que ninguém mais descobrisse sobre
essas caixas, exceto Finn e eu. Isso me deixa muito curiosa para saber o que
está nelas. Mas você já sabe, não é, Sr. Mosley?
Ele me estudou por cima dos dedos. — E o que faz você pensar que eu
sei o que pode estar nessas caixas?
— Porque você é o guardião dos segredos por aqui. Você sabe a quem
todas as caixas do seu cofre pertencem e o que está em cada uma delas. Então
você sabe que todas aquelas caixas pertencem ao Fletcher.
Mosley continuou olhando para mim, e eu olhei de volta para ele. Finn
continuava a se mexer, olhando para nós dois, e o único som era o leve ruído
de seus sapatos no chão.
Finalmente, Mosley soltou uma gargalhada. — Fletcher sempre me
disse que você era inteligente. Eu não pensei que você iria descobrir sozinha.
Eu dei a ele um sorriso fino. — Ainda bem que Fletcher não
compartilhou suas dúvidas. Embora eu me perguntasse por que ele confiaria
em você com as caixas dele.
— Isso é entre Fletcher e eu. O sorriso de Mosley era tão afiado e fino
como o meu. — Vamos dizer que nós dois fizemos um ao outro certos... favores
de tempos em tempos.
Eu abri minha boca para perguntar exatamente o que aqueles favores
tinham sido, mas Finn tocou meu braço em advertência e me deu um olhar
severo e aguçado. Ele conhecia Mosley melhor do que eu e estava me dizendo
que eu havia empurrado seu chefe o suficiente por hoje. Então eu mantive
minha boca fechada. Além disso, Finn e eu ainda precisávamos acessar
aqueles cofres, e eu estava apostando que Mosley era o único que poderia abri-
los. Seria assim que Fletcher teria montado isso, e parecia que ele e Mosley
tinham sido próximos o suficiente – pelo menos fizeram favores um ao outro
o suficiente – para Mosley honrar os desejos do velho.
Finn limpou a garganta. — Gin e eu realmente apreciaríamos se
pudéssemos olhar as caixas agora.
O anão olhou de volta para Finn, e seus olhos e rosto suavizaram, só
um pouquinho. Por um momento, o olhar de Mosley pareceu distante, como
se ele estivesse pensando em outra coisa, ou em outra pessoa – Fletcher. Eu
via tanto do velho em Finn, e parecia que Mosley também o fazia.
O anão se afastou de sua mesa e me deu outro olhar frio. — Bem,
então, agora que a Sra. Blanco decidiu ser civilizada sobre as coisas, eu ficarei
feliz em deixá-la entrar nas caixas do Fletcher.

***

Mosley fez Finn e eu sairmos do escritório dele, então fechou e trancou


a porta, não querendo que víssemos o que ele estava fazendo. Eu inclinei
minha cabeça para o lado e pressionei minha orelha contra a porta, mas eu
não ouvi um sussurro de som da outra sala.
— Não se incomode — disse Finn. — O escritório dele é à prova de som.
— O que você acha que ele está fazendo ali dentro?
Finn encolheu os ombros. — Provavelmente pegando as chaves das
caixas. Há rumores de que Mosley tem um esconderijo secreto em algum lugar
em seu escritório. Parece exatamente o tipo de lugar que papai deixaria
aquelas chaves.
Com certeza, um minuto depois, a porta do escritório se abriu e Mosley
apareceu, carregando um pequeno chaveiro prateado na mão. Finn e eu o
seguimos pelo corredor até Big Bertha.
Mosley assentiu para os dois guardas gigantes que estavam ali. Outra
nova medida de segurança. — Jimmy, Tommy, façam uma pausa.
Com a ordem severa, os dois homens assentiram e saíram sem uma
palavra. Mosley digitou os códigos no teclado e as três portas de malha de
silverstone deslizaram uma atrás da outra. Eu pensei que Mosley poderia
entrar no cofre conosco, mas ele folheou o chaveiro antes de selecionar uma e
segurá-la onde Finn e eu pudemos ver.
— As instruções de Fletcher, ele queria que você abrisse esta caixa
primeiro — disse Mosley.
Eu peguei a chave dele e olhei para o número estampado no metal –
1301. Partindo do começo, em mais de uma maneira. — Obrigada.
— Espero que você encontre o que procura, Srta. Blanco. Você
também, Finn. Traga-me as chaves de volta quando você terminar. — Mosley
acenou para nós dois e saiu, voltando para o escritório.
Esperei até que ele estivesse fora de vista e o eco de seus passos
desapareceu antes de me virar para Finn. — Você está pronto para isso?
Ele soltou um suspiro. — Eu acho que tenho que estar.
Entramos no cofre e fomos para o canto de trás, onde estavam os cofres
de Fletcher. Eles eram exatamente os mesmos de antes, três caixas de cada
lado e três abaixo, nove caixas no total. Eu não tinha percebido antes, mas as
caixas estavam um pouco fora de ordem, com 1300 no centro e 1301 no canto
superior esquerdo. Outra pequena pista que eu inicialmente ignorei.
Então, coloquei a chave na fechadura, virei-a e puxei a caixa para fora
de sua fenda na parede. Antecipação surgiu através de mim, e eu me apressei
e coloquei a caixa na mesa para este fim no cofre forte. Por uma vez, eu não
tive paciência para esperar, e eu abri o topo da caixa para encontrar...
Fotos – dezenas de fotos empilhadas dentro da caixa.
Eram todas do resort Bullet Pointe. Eu olhei para as fotos, estupefata.
Finn gemeu. — Você está brincando comigo? Eu nunca mais quero ver
aquele lugar.
Mas eu afastei minha surpresa e comecei a examinar as fotos, olhando
e entregando a Finn uma a uma.
A maioria das fotos eram do mesmo tipo que Ira havia tirado – fotos
bonitas do hotel, parque temático e lago. Meu coração começou a afundar.
Talvez eu estivesse errada. Talvez não houvesse qualquer informação sobre o
Círculo aqui em tudo. Talvez Fletcher não soubesse nada sobre o misterioso
grupo. Afinal, o velho mantivera o controle sobre Deirdre para ter certeza de
que ela não voltaria para Ashland para ameaçar Finn. Talvez seja isso que ele
estava fazendo no Bullet Pointe. Seguindo-a e vendo o que ela estava fazendo.
Finalmente, cheguei à última foto, uma grande impressão retangular
que estava presa no fundo da caixa, como se não tivesse importância
nenhuma. Eu olhei para ela, esperando ver outra foto do saguão do hotel. Isso
é exatamente o que era, mas eu reconheci alguém nesta foto.
Minha mãe.
Eu respirei fundo. Finn percebeu que eu finalmente encontrei alguma
coisa, e ele abaixou a foto que ele estava olhando para olhar a da minha mão.
— Filho da puta — disse ele. — Essa é a sua mãe.
— Não apenas ela — eu sussurrei. — Não apenas ela.
A foto mostrava um grupo de pessoas sentadas em uma mesa no meio
do saguão do hotel, durante as férias, dado o visco, os laços e outras
decorações ao fundo. E minha mãe não era a única pessoa que eu reconheci.
Deirdre Shaw também estava na foto, junto com Mab Monroe. Várias outras
pessoas também estavam reunidas em volta da mesa, seus rostos claramente
visíveis, embora eu não conhecesse nenhuma delas.
O grupo parecia estar comemorando alguma coisa, dadas as taças de
champanhe na mesa e os sorrisos satisfeitos no rosto de todos – com exceção
da minha mãe. Sua boca estava apertada em seu rosto, e sua mão estava
envolvida em torno de sua taça de champanhe, o braço ligeiramente puxado
para trás, como se ela estivesse pensando em atirar o copo nas duas pessoas
sentadas do outro lado da mesa.
Finn bateu o dedo em uma dessas pessoas. — Aqui está Tucker.
Eu assenti. — E eu estou disposta a apostar que este é o resto do
Círculo.
— Deirdre, Tucker, Mab, sua mãe. Você pode estar certa. Mas quem
são as outras pessoas?
Eu estudei os rostos um pouco mais de perto, mas ainda não reconheci
ninguém. — Não faço ideia. — Eu apontei para a foto novamente. — Mas esse
cara... ele é o líder.
O homem estava sentado ao lado de Tucker e parecia ser a pessoa que
minha mãe estava olhando. Ele era a única pessoa cujo rosto você não
conseguia ver, já que ele estava de costas para a câmera. Tudo o que eu sabia
sobre ele era que ele tinha cabelo escuro e parecia ser um cara grande, alto e
forte.
Finn franziu a testa e se inclinou para frente, encarando a foto
novamente. — Por que você acha que ele é o líder?
— Porque Tucker está sentado ao lado dele, e olha a postura do
vampiro. Ele está se inclinando e abaixando a cabeça. Você conhece Tucker.
Ele não mostraria esse tipo de deferência para ninguém...
— Exceto seu chefe.
— Exatamente. Além disso, minha mãe está sentada o mais longe
possível desse homem do que ela poderia ficar, do lado oposto da mesa. Ele é
o líder. Eu sei disso.
Eu sabia disso – no fundo dos meus ossos.
— Mas por que meu pai não tem uma foto do rosto desse cara? — Finn
perguntou. — Ele tem uma visão clara de todos os outros. Certamente não
teria sido tão difícil se mover discretamente pela mesa e tirar uma foto do líder.
Então, por que ele não fez?
Eu balancei minha cabeça. — Eu não sei. Talvez Fletcher só pudesse
ter uma chance de fotografar o grupo inteiro. Essas pessoas são paranoicas
quanto ao seu sigilo. Eles não iriam querer que alguém tirasse fotos deles.
Finn assentiu, aceitando minha explicação, mas minha mente
continuava agitada e agitada. Ele estava certo. Fletcher deveria ter incluído
uma foto do rosto do líder, mas ele não tinha feito isso, e eu não pude deixar
de pensar que era uma omissão deliberada. Mas, por quê? O que era tão
interessante, horrível ou chocante sobre esse homem que Fletcher o tinha
excluído?
E como isso afetaria a mim, a Finn e a todos os outros?
Finn apontou para a foto. — Ei, olhe para isso. O que isso parece com
você?
Eu olhei para a foto. Eu não tinha prestado atenção a isso antes, mas
a mesa ostentava uma peça central elaborada, o tipo de coisa que você poderia
colocar velas, embora esta peça não tivesse nenhuma. — Isso parece... um
grupo de espadas, todas unidas e apontando para fora.
— Não apenas um grupo de espadas, mas um grupo de espadas em
um círculo. — Finn olhou para mim, com a excitação em seus olhos. —
Senhoras e senhores, acho que acabamos de encontrar a runa oficial do
Círculo. — Ele fez uma pausa. — Bem, a runa oficial, provavelmente
ultrassecreta, e ninguém-sabe-sobre-ela-além-deles. Mas ainda assim.
— Acho que você está certo.
Olhamos um para o outro, ambos sorrindo como tolos, percebendo que
estávamos finalmente – finalmente – prontos para obter as respostas que
queríamos.
Capítulo 31
Passamos pelo resto das caixas de segurança, abrindo-as uma a uma,
e examinando todos os itens dentro delas.
Todas estavam repletas de fotos, assim como a primeira, e todas as
fotos eram das pessoas que haviam se reunido em volta da mesa. Eu esperava
que pudesse haver mais. Talvez algumas publicações ou registros de quem
eram as pessoas e todos os seus movimentos, mas nada disso estava nas
caixas. Talvez Fletcher não tivesse conseguido tantas informações sobre os
membros do Círculo. Eu provavelmente nunca teria certeza, mas a incerteza
não me incomodava como antes. O velho me dera um lugar para começar. Isso
era tudo que eu precisava.
A única pessoa que Fletcher não parecia ter fotografado era o homem
de costas para a câmera naquela primeira foto, o líder do Círculo. Eu ainda
me perguntava por que Fletcher não o identificara também, mas eu não estava
muito preocupada com isso. Eu encontraria seus amigos em primeiro lugar, e
eles acabariam me levando até ele.
As fotos na última caixa trouxeram lágrimas aos meus olhos. Elas
eram todas fotos da minha mãe. E não apenas dela, mas de mim, Bria e
Annabella também. Eu não sabia por quanto tempo Fletcher esteve nos
observando, mas ele tinha tirado dezenas de fotos de nós ao redor de nossa
mansão, brincando no quintal, vendo vitrines e andando pelas ruas de
Ashland. Havia até mesmo uma foto de nós quatro sentadas em uma cabine
no Pork Pit, olhando nossos cardápios.
Em vez de ficar com raiva por Fletcher nunca ter mostrado isso para
mim, me senti reconfortada em vez disso. O velho não deixou isso aqui como
um lembrete de que minha mãe tinha sido membro no Círculo, mas porque
ele sabia que eu iria querer as fotos como lembranças dela e de Annabella. Da
minha família. De tempos mais felizes.
Tempos mais simples.
Eu olhei para uma foto da minha mãe me segurando perto do seu lado
e sorrindo para mim. Eu pensei muito sobre o que tinha acontecido antes da
festa e depois naquela noite no escritório. Eu ainda não sabia exatamente
como ela estava envolvida com o Círculo, ou as coisas horríveis que ela poderia
ter feito por eles, mas as perguntas não respondidas não me corroíam como
antes. Porque minha mãe não tinha trabalhado para Tucker por vontade
própria, e ela tentou proteger sua família o melhor que pôde. Essas eram as
coisas que importavam, e essas eram as coisas que diziam o tipo de pessoa
que ela tinha sido – uma mãe que amava suas filhas.
Eu passei meus dedos pelo seu rosto sorridente, em seguida, coloquei
a foto de lado e olhei através das outras. Quando terminamos com a última
caixa, Finn olhou para a mesa onde todas as caixas estavam alinhadas, com
os topos abertos, revelando as fotos lá dentro.
— O que você quer fazer com tudo isso? — Sua voz era áspera com
emoção. — Levá-las para a casa do meu pai?
Eu balancei a cabeça. — Não. Há um risco muito grande de Tucker
invadir, ver e perceber que finalmente conhecemos o resto do Círculo. Vamos
deixar tudo aqui. Esteve seguro no cofre todos esses anos, e eu quero que
continue assim. Nós vamos fazer cópias e deixar os originais aqui.
— Mas você não está preocupada com Tucker encontrar as cópias
também?
Eu sorri. — Oh, eu sei exatamente onde esconder essas.

***

Eu disse a Finn onde eu planejava armazenar a informação. Ele soltou


uma risada, e nós dois começamos a trabalhar, pegando nossos telefones e
tirando fotos de tudo. Assim que terminamos, colocamos as fotos originais nos
recipientes apropriados, colocamos as caixas de volta em suas fendas na
parede e as fechamos novamente. Depois disso, fomos ao escritório de Finn,
onde ele imprimiu cópias de todas as fotos, já que ele tinha uma impressora
colorida, entre outras coisas.
Duas horas depois, eu saí do banco carregando aquela caixa de
papelão que eu usara para levar comida para Finn no outro dia. Caixas vazias
estavam empilhadas lá agora, e uma pasta grossa de fotos estava aninhada
no fundo. Eu mantive aquela pasta escondida dentro da caixa enquanto eu
trabalhava no meu turno habitual no Pork Pit, fechei o restaurante e fui para
casa de Fletcher. Então, tarde da noite, depois que eu troquei de roupa para
a minha roupa preta habitual de assassina, peguei a pasta da caixa, saí da
casa de Fletcher e me dirigi para minha nova casa longe de casa.
Meu contêiner de transporte.
Eu dirigi pela cidade e cruzei em torno das ruas do centro por quase
uma hora, só para ter certeza de que não estava sendo seguida. Então,
estacionei meu carro a cinco quilômetros de distância do estaleiro, apenas por
um pouco mais de segurança. Agora que finalmente tinha algumas
informações sobre o Círculo, não seria tola o suficiente para deixar Tucker se
deparar com isso e perceber o quão perto eu estava de identificar seus amigos.
Eu tinha a vantagem agora, e estava determinada a mantê-la.
Eu me aproximei do pátio de embarque com cautela e silêncio, fazendo
um circuito completo ao redor do perímetro, mas, exceto por um único guarda
gigante, a área estava deserta e até mesmo Lorelei não estava aqui essa noite.
Ainda assim, continuei examinando a paisagem e tomei mais cuidado
enquanto me aproximava do meu contêiner. Assim como na última vez em que
estive aqui, me abaixei e escutei as pedras que coloquei estrategicamente ao
redor do contêiner de metal, mas elas estavam nas mesmas posições de antes,
e ninguém esteve perto delas há dias. Bom.
Eu abri o cadeado, entrei, fechei e tranquei a porta atrás de mim. Então
eu liguei as lanternas e fui até o quadro branco que eu tinha colocado ao longo
de uma das paredes. Todas essas caixas em branco e pontos de interrogação
não me assombravam tanto quanto antes. Não agora.
Limpei tudo do quadro, deixando apenas alguns dos rabiscos que
Lorelei e eu tínhamos desenhado nos cantos. Em seguida, abri minha pasta
de informações e peguei a foto do grupo de pessoas que estavam no saguão do
hotel Bullet Pointe. Eu coloquei isso no centro superior do quadro, já que era
o meu ponto de partida, a primeira vertente que eu usaria para construir
minha teia de morte. Passei os dedos pelo rosto zangado de minha mãe, em
seguida, passei por todas as cópias das fotos que estavam nas caixas de
segurança de Fletcher, combinando fotos de pessoas sozinhas com as do
grupo.
Demorei algumas horas, mas quando terminei, tinha várias seções de
fotos coladas no quadro branco. Eu ainda não sabia seus nomes, mas achei
que agora tinha uma boa ideia de quem eram os membros do Círculo.
Movimentadores e agitadores de grande porte em Ashland e além, exatamente
como Tucker alegara.
Somente uma grande peça ainda estava faltando – o homem no meio
de tudo isso. O chefe de Tucker e o líder do Círculo. O único ângulo que eu
tinha dele era de suas costas, então eu ainda não tinha pistas reais sobre sua
identidade. Mas eu o encontraria eventualmente. E uma vez que eu o fizesse,
perguntaria a ele exatamente por que ele tinha dado a Mab Monroe a luz verde
para assassinar minha mãe, que problemas Eira estava causando que
resultaram em sua morte.
Então eu iria matá-lo por levar ela e Annabella para longe de mim e de
Bria.
Era tarde e eu deveria ter ido para casa dormir um pouco. Eu ainda
tinha que abrir o Pork Pit pela manhã. Mas pela primeira vez desde que essa
coisa toda começou, pela primeira vez desde que eu descobri sobre minha
mãe, o Círculo e tudo mais, eu não estava cansada. Não estava cansada ou
com o coração partido ou apenas com meu estômago revirado.
Agora... agora eu estava determinada a encontrar o homem no meio e
rasgar o Círculo. Uma pessoa e um corpo de cada vez até não sobrar nada.
Eu tinha rostos agora. Os nomes não seriam muito difíceis de
conseguir. E uma vez que eu colocasse os dois juntos, eu poderia finalmente
agir. Eu encontraria o elo fraco no Círculo e usaria essa pessoa para desvendar
o resto de sua teia escura e venenosa.
Então, eu servi de um copo de gim, puxei uma cadeira para a frente do
quadro branco e comecei a olhar para as fotos de novo.
A Aranha tinha novos alvos.

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