SANDRA FLÁVIA CORREIA BATISTA ambiente
SANDRA FLÁVIA CORREIA BATISTA ambiente
SANDRA FLÁVIA CORREIA BATISTA ambiente
ISBN 972-8069-21-9
JÚRIS ET
DE JURE
Coordenação
Ac. n.° 160/92, de 5 de Maio, publicado no D.R., II.' Série, de 19 de Agosto de 1992
Ac. n." 176/92, de 7 de Maio, publicado no D.R., I I . ' Série, de 18 de Setembro de 1992
(Direito à informação);
Ac. n." 177/92, de 7 de Maio, publicado no 22." Vol. dos Acórdãos do Tribunal Cons-
titucional (Direito à informação);
Ac. n.° 594/93, de 16 de Junho, publicado no D.R. I.* Se'rie, de 29 de Setembro çje
1993 (Direito à informação);
Ac. n.° 226/94, de 8 de Março, publicado no D.R., I I . ' Série, de 13 de Julho de 1994
(Recorribilidade de actos confirmativos); ,
Ac. n.° 249/94, de 22 de Março, publicado no D.R., I I . ' Série, de 27 de Agosto de
(Duplo grau de jurisdição na suspensão de eficácia de acto administrativo);
Ac. n.° 303/94, de 24 de Março, publicado no D.R., II." Se'rie, de 27 de Agosto de 1994
(Suspensão de eficácia de actos negativos);
Ac. n." 9/95, de 11 de Janeiro, publicado no D.R., II.* Série, de J4 de Março de 199S
(Direito à informação).
S A N D R A FLÁVIA C O R R E I A BATISTA *
1. Introdução
JUEIS ET DSJttZ
Mn 1 0 i t m it Fatuidade 4c Direito d l UCF - Porto
Parto. 1 M 8
824 Sandra Flávia Correio Batista
1
« 0 porco que tem o pé córneo e até o casco bifurcado, mas que não rumina,
será impuro para vós. Não comereis carne de nenhum deles nem tocareis nas seus
cadáveres: são impuros para vós.» [...] «Se morrer um dos animais que vos é lícito
comer, quem tocar no seu cadáver ficará impura até à tarde. Aquele que comer essa
carne morta, lavará as suas roupas e ficará Impuro até à tarde; e aquele que a trans-
portar lavará as suas roupas e ficará impuro até à. tarde.» [ . . . 1 «Esta é a doutorina
relativa aos quadrúpedes, às aves, a todos os seres vivos que se movem nas águas e a
todos aqueles que rastejam sobre a terra, a fim de que destlnga o que é impuro do
que é puro, o animal que se pode comer daquele que se não deve comer.» In BÍBLIA
SAGRADA, Livro do Levítico U , 7-8, 39-40 e 46-47.
1
«Reservarás u m sítio fora do acampamento, para as tuas necessidades; terás
também, no teu acampamento, u m a pá, e, quando para ali fores, cavarás a terra com
esse instrumento, cobrindo as tuas dejecções.» in BÍBLIA SAGRADA, Livro do
Deuteronómio 23, 13-14.
826 Sandra Flávia Correio Batista
3. A l g u n s t ó p i c o s d a h i s t ó r i a d a q u e s t ã o a m b i e n t a l em
Portugal
4. A I m p o r t â n c i a do e n q u a d r a m e n t o j u r í d i c o do a m b i e n t e
a) Instituições internacionais
3
Quanto ao tabor das agências especializadas das Nações Unidas em torno do
ambiente h á que reaçar o papel da OMS pela ligação que tradicionalmente se esta-
belece entre o ambiente, a promoção da saúde e a prevenção da doença, ligação que
só recentemente se tem vindo a esbater por u m a certa autonomização e promoção
funcional da temática ambiental.
O Ambiente: Uma Questão Jurídica ou Uma Preocupação da Humanidade 12
5. Conclusão
De tudo o que foi dito e do muito que ficou por dizer, conclui-se
que preocupações ambientais sempre existiram e que o desafio hoje
enfrentado pela humanidade se não é inovador tem, no entanto, que
enfrentar ameaças que são próprias da nossa época. A resposta a este
desafio tem que confiar na normatividade e coercibilidade jurídicas mas
tem que contar, anjtes de tudo, com a adesão íntima de todos nós à pre-
servação do meio que nos é imprescindível à vida. E esta adesão íntima
não cabe ao direito assegurar mas, antes de tudo, às virtualidades da
educação. E tanto o direito como os esforços da educação têm que se
conjugar não apenas em prol do bem estar actual da humanidade, antes
pelo contrário, têm que se projectar n u m a acção de longo alcance que
inclua as gerações vindouras. O ambiente é u m bem que pertence à
humanidade como ente intemporal que permanece para lá das vidas
c o n c r e t a s d o s seus c o m p o n e n t e s e as g e r a ç õ e s v i n d o u r a s t ê m tanto
direito (a herdar) a uma vida saudável, como aquela que hoje nos cabe
construir para nós e, simultameamente, legar para o futuro.
É imperioso criar mecanismos legais que reforcem as preocupações
ambientais e ponham em prática o ideal pró-ambiental, na consagra-
BIBLIOGRAFIA
GALE, Boutros, «Agenda para a Paz», 2.* Edição, Centro de Informações das Nações
Unidas, 1995.
KONING, H. W., «Setting Environmentai Standards - Guidelines for Decision-making»,
Organização Mundial de Saúde, Genebra, 1987.
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«FACTURAS FALSAS»:
CRIME DE FRAUDE FISCAL OU DE BURLA?
A M É R I C O A. TAIPA D E CARVALHO *
CONSULTA
I. Os factos:
JDMlí ST DBJUttE
Noa M u u da Fualdade de Direito d* UCf - Parto
ferp, 1W8
850 Américo A. Taipa de Carvalho / José M. Damião da Cu riba
H. As qualificações jurídico-penais:
I. O facto d a adesão:
C) As questões:
P A R E C E R
A NOSSA POSIÇÃO
apesar de ter rejeitado o recurso penal n.° 235/96, interposto para fixa-
ção de jurisprudência (rejeição fundamentada no facto de não se
verificarem, segundo o mesmo STJ, os pressupostos quer da iden-
tidade dos factos objecto do acórdão recorrido e do acórdão fun-
damento, quer da identidade das disposições legais aplicáveis), não
quis deixar de tomar posição sobre esta matéria da distinção entre fraude
fiscal e burla, considerando que existe entre estas duas figuras uma rela-
ção de especialidade e, como tal, a lei penal fiscal afasta a lei penal
comum. Com efeito, pondera o referido Acórdão: «Desde 1 de Janeiro
de 1994, mediante a inclusão expressa dos «reembolsos * na fraude
fiscal, (mesmo) quando ocorram todos os elementos constitutivos
do crime de burla, passou a existir, incontestavelmente, entre a
fraude fiscal e o crime de burla, um concurso aparente, predo-
862 Américo A. Taipa de Carvalho / José M. Damião da Cu riba
minando a lei fiscal como lei especial sobre o Código Penal, Lei
geral ou comum,».
4. A verificação d o r e s u l t a d o / d a n o p r e j u í z o p a t r i m o n i a l
d o Estado-fisco em n a d a altera, c o m o j á o vimos, a n a t u r e z a
e qualificação jurídico-penal da conduta de fraude contra os
interesses t r i b u t á r i o s c o m o c r i m e d e f r a u d e fiscal. Assim,
mesmo que haja o reembolso, total ou parcial, das importâncias visa-
das com a utilização das «facturas falsas» {correspondentes a negócios
simulados), a qualificação jurídico-penal do comportamento do agente
não pode deixar de continuar a ser a de crhne de fraude fiscal.
A verificação do efectivo prejuízo patrimonial fiscal do Estado
apenas levará a que a pena concreta a aplicar fossa ser mais grave do
que se tal dano não se tivesse verificado. Mas esta agravação ter-se-á
de conter dentro do limite máximo da pena legal prevista no art. 23°
do RJIFNA.
Conclusão
11
2. C o n t r a esta a f i r m a ç ã o d o d e s p a c h o , h á q u e c o n t r a p o r
o seguinte:
independentemente de não se poder nunca deixar de atender às cir-
cunstâncias qualificativas vigentes ao tempo da prática do crime fun-
damental, mesmo face às circunstâncias previstas como qualificativas
da fraude fiscal pela alteração legislativa operada pelo Dec.-Lei n* 394/93,
a a c t u a ç ã o d o arguido, que consistiu em utilizar as facturas falsas,
isto é, facturas que não correspondiam a negócios realizados, mas sim
simulados (RJIFNA, art. 23 ", n.° 2, al. c), d e f o r m a a l g u m a p o d e
dizer-se q u e preencheu u m a sequer q u e seja das circunstân-
cias r e f e r i d a s nas ais. e) ef) do art. 23.°.
Quanto à circunstância referida na al. e) («o agente falsificar
ou viciar, ocultar, destruir, inutilizar ou recusar entregar, exibir
ou apresentar livros e quaiquer outros documentos ou elementos
probatórios exigidos pela lei fiscal»), parece imediatamente evidente
que todas as acções aí referidas - falsificar, viciai; ocultar, etc. - têm
por objecto «livros e quaisquer outros documentos ou elementos pro-
batórios exigidos pela lei fiscal». Ora, não parece que as «factu-
ras falsas» façam parte dos livros ou documentos exigidos pela lei
fiscal... Nem parece que se possa falar de falsificação.
Relativamente à circunstância referida na al. f) («o agente usar
os livros ou quaisquer outros elementos referidos no número (deve
querer referir-se à alínea) anterior sabendo-os falsificados ou vida-
dos por terceiros»), por maioria e tripla razão, ela não se verificou na
actuação do arguido: é que nem as «facturas falsas» são, como dis-
semos, documentos exigidas pela lei fiscal..., nem foram preen-
chidas por terceiros, nem tem sentido falar-se, relativamente a estas
facturas, em falsificação.
864 Américo A. Taipa de Carvalho / José M. Damião da Cu riba
Conclusão
III
IV
SUSPENSÃO D O FBOCJBDIMBNTO CRIMINAL (Lei n.° 51-A/96, de 9-12, art. 2.", n.° 2)
VI
CONCLUSÕES FINAIS
Março de 1998.
DO DESCONTO DAS MEDIDAS
PROCESSUAIS PRIVATIVAS DA LIBERDADE
- ANÁLISE DE ALGUMAS QUESTÕES
1. Introdução
Jtiws st Oijtrjri
Nu 30 »aot á» hualAufeJe Mrtito 4* UC? • rort»
Perto, 1998
PT. 875-SW
874 Maria (ta Conceição Ferreira da Cunha
1
Qualquer artigo que venha a ser referido sem Indicação da proveniência será
do Código Penal português; por outro lado, sempre que nos referirmos expressamente
a este Código, utilizaremos a sigla CP, assim como CPP para Código de Processo Penai
português.
1
Cf. neste sentido, Figueiredo Oias, Direito Penai Português, As Consequên-
cias Jurídicas do Crime, Áequltas, Ed. Notícias, 1993, p. 297 e, do mesmo autor, tam-
bém neste sentido; Taipa de Carvalho, Sucessão de Leis Penais, 2,' ed., Coimbra ed.,
1997, p. 313 ess.
' Há que sublinhar que as medidas processuais não são «penas antecipadas-
- neste sentido, salientando a situação de «presunção de inocência» em que o agente
se encontra, Figueiredo Dias. Direito Penal..., cii„ p. 297; também neste sentido Taipa
de Carvalho, Sucessão.cit., p. 313 e ss„ escolhendo, para uma das partes da sua
obra, o impressivo e esclarecedor (além de crítico) título «Do desvirtuamento da fun-
ção processual da prisão preventiva à neutralização do princípio constitucional da
presunção de inocência do arguido e, consequentemente, à violação «ope legis» ou
«ope ludicfe» do direito da Uberdade individual* (p. 313).
Do Descontodai-Medidas Processuais Privativas da liberdade 875
Devemos confessar que esta reflexão nos foi sugerida pela leccio-
nação desta matéria na cadeira de Direito Penal para a qual nos servi-
mos, essencialmente, dos ensinamentos de Figueiredo Dias4, assim como
pela ulterior leitura de um artigo alemão', onde se comenta a proble-
mática suscitada pelos casos em que, tendo um agente cumprido pri-
são preventiva por tempo igual (ou até superior) à pena concreta em
que vem a ser condenado, o juiz entenderia ser aplicável a pena de sus-
pensão <fe execução da prisão; p, ex., tendo o agente cumprido 1 ano
de prisão preventiva, e «endo condenado em 1 ano de pena de prisão a
ser substituída porsuspensão de execução da pena, como resolver o pro-
blema do desconto?6 A resposta a esta questão estará dependente, antes
de mais, dos critérios de desconto aplicáveis, assim como da própria
«ratio» tias penas de substituição. Dever-se-á entender que na pena con-
creta a substituir h á que descontar o tempo de prisão preventiva sofrido
pelo agente? Sendo assim, não subsistiria qualquer pena de prisão, Ora,
face a esta solução, poder-se-á ainda questionar se faria algum sentido
aplicar uma pena de substituição 7 . A resposta, como veremos, não é
pacífica8, e tem ainda implicações importantes quanto a eventuais pro-
cessos futuros por que venha a responder este mesmo agente - poderá
este agente vir mais tarde a ser considerado reincidente ou delinquente
habitual tomando-se em consideração este caso? É evidente que o pro-
" Assim, o que se deverá ler em conta, para efeitos de «desconto», é a unidade
processual, não a unidade substantiva; Figueiredo Dias dá-nos o seguinte exemplo:
se um agente for preso preventivamente por ter sido acusado pelos factos X,V e Z, o
desconto deverá sei feito mesmo que esse agente venha a ser condenado apenas pelo
facto Y (cf. Direito Penal .cit., p, 299, § 437). Note-se que também na Comissão
Revisora do ProfPG — Actas, PG I 165 - se defendeu esta (dela de unidade pri>ces-
sual; também neste sentido, Mala Gonçalves, 11.' ed., 1997, art. 80.anotaçSo 2. Já
no CP Italiano Impõe-se o desconto de toda a prisão preventiva sofrida antes da sen-
tença; assim, Romano (art. 137° n," m. 5 « ss.), entende ser aplicável o desconto a
prisões preventivas sofridas em virtude de um outro processo, (apud Figueiredo Dias,
Direito Pena!..., cit., p. 299, nota' 122).
13
Note-se que, na versão originária do CP, o art. 80." referia-se apenas à pri-
são preventiva; porém, Já então Figueiredo Dias entendia que «à prisão preventiva
devem equiparar-se, apesar do silêncio da lei, outras privações da liberdade de carácter
processual, como ê o caso da detenção e da obrigação de permanência na habita-
ção; a Justificação é, nestes casos, exactamente a mesma da prisão preventiva c a solu-
ção ( favorável ao agente, não havendo por isso obstáculos à integração da lacuna
por esta via», cf. Figueiredo Dias, Direito Penal..., cit., p. 299, § 437.
" Quanto aos critérios do desconto cf. infra ponto 3.
" Ta) como na versão original do CP, o art. 80." reícre-se a penas de prisão ou
de multa, não às penas de substituição; diferentemente, porém, o art. 81," (casos de
desconto de uma pena anterior) deixou de referi r-se à prisão e à multa, especifica-
mente,referindo-stàs penas em geral. No entanto, já face à anterior redacção do CP,
Figueiredo Dias entendia que, quer em relação ao art. 80.° quer em relação ao 8.1.'
(ou seja, quer para os casos de desconto de medidas processuais, quer para os casos
de desconto de uma pena anterior), se deveriam tomar em consideração não só as
penas principais como as de substituição, desde que se encontrasse um critério ade-
878 Maria (ia Conceição ferreira da Curtia
quado para tal desconto (cf. Direito Penal.,., til, p. 300, § 439). Quanto aos crité-
rios do desconto, mormente no caso de aplicação de u m a pena de substituição,
cf. Infra ponlo 3-3. b).
15
Note-se que o instituto do desconto é aplicável, quer o agente tenha sofrido
medida processual ou pena em Portugal, quer no estrangeiro (cf. art 82."); o que
importa 4 tjue a tenha sofrido «pelo mesmo ou pelos mesmos factos* (art. 8 2 / ) .
Do Desconto dai- Medidas Processuais Privativas da liberdade 879
Tal prejuízo será ainda maior, como é evidente, no caso do agente ter
sido sujeito a privação da liberdade igual - ou até superior - ao tempo
de prisão em que vem a ser condenado, situação em que o agente não
terá que cumprir qualquer pena, não ficando sujeito, nem sequer por
u m tempo limitado, ao referido acompanhamento. O mesmo poderá
acontecer, com efeitos porventura mais nefastos sob o ponto de vista da
prevenção especial, e, até, da prevenção geral, no caso do Tribunal enten-
der que a pena mais adequada à situação seria uma pena não detentiva
- p. ex., uma pena de multa ou uma pena de sustituição16 (a qual
poderá ser de multa - art. 44.® — ou de outra natureza - suspensão de
execução da pena de prisão — cf arts. 50.® e ss. prestação de traba-
lho a favor da comunidade - cf. arts. 58." e ss.). É que, tendo o juiz
optado por medidas não detentivas por considerar que ratas realizam,
face ao caso concreto, de forma adequada, as finalidades da punição
(prevenção geral e especial), respeitando, assim, o critério de escolha
da pena (cf. art. 71.*), tal objectivo poderá ficar comprometido com o
funcionamento do desconto. Assim, um agente que tenha estado preso
preventivamente durante, p. ex., 12 meses, e venha a ser punido com
uma pena de multa de, p. ex., 100 dias-multa, não terá qualquer pena
a cumprir (cf, art. 80.°-2); ora, ao não sofrer qualquer sacrifício
pecuniário, o qual se considerou ser o mais ajustado à recuperação do
delinquente e ã própria prevenção geral daquele tipo de crimes,
compromentem-se, ao menos parcialmente, estas finalidades. Mais
impressivos ainda poderão ser os casos em que, tendo o agente estado
preso preventivamente, vem a ser condenado numa pena de substitui-
ção; p. ex., esteve preso preventivamente durante 1 ano e vem a ser con-
denado em 1 ano de pena de prisão a ser substituída por suspensão de
execução da pena de prisão ou por prestação de trabalho a favor da
14
Note-se que, se a pena de substituição for detentiva - prisão por dias livres
ou regime de semi-detenção (cf. arts. 45." e 46.") - os problemas subsistem, pois estas
penas, apesar de tanbém privarem o agente da sua liberdade, fa?.ern-no por forma
multo diversa da da pena de prisão tradicional e, também, de forma muito diversa
da p ris I o preventiva, u m a vez que evitam a «quebra» dos laços familiares, sociais e
profissionais do agtnie (cf. sobre estas penas de substituição. Figueiredo Dias, Direi/o
Penal..., cit., p. 355 e 336).
880 Maria (ta Conceição Ferreira da Cunha
17
Cf. quanto a esta questão infra 3-3 b), £ evidente que o problema se coloca
nos mesmos termos, embora de forma mitigada, no caso do agente ler estado preso
preventivamente por tempo inferior ao da pena concreta a substituir, assim, quanto
menor for a diferença entre o tempo da pena concreta de prisão e o tempo de prisão
preventiva, mais aguda se torna a questão.
11
Neste sentido cf. supra notas 2 e 3.
" Assim, o § 51 t do CP Alemão e o art. 69.° do Suíço, os quais permitem que,
em certos casos, o juiz negue total ou parcialmente o desconto; no entanto, a aber-
tura destas excepções é .feita em função do comportamento do agente depois do facto,
solução que não parece de sufragar (cf. Figueiredo Dias, Direito Penal..., cit., p. 298,
§ 435).
M
tf. arts. 80.", 61.° e 82," do CP; também optando pela consagração deste ins-
tituto sem abrir excepções, o CP Austríaco ou o art, 52." do Projecto Schultz.
Do Descontodai-Medidas Processuais Privativas da liberdade 881
No te-se que o Projecto de 1963, no seu art. 9 3 ' , consagrava como critério
fundamental o do desconto «equitativo», consideraudo-se, por isso, que instituía um
sistema que abria a possibilidade de nem sempre haver desconto (pelo menos des-
conto «total») - Cf. Figueiredo Dias, ibidem.
" Parece, no entanto, que mesmo face a critérios equitativos deste tipo, algo
dás finalidades preventivas sairá inevitavelmente prejudicado - de todo o modo, o
agente não vai cumprir a totalidade da pena determinada com o seu acompanha-
mento e finalidades específicos; por outro lado, porém, a justiça material também
nunca ficará plenamente realizada ainda que se siga o critério mais «compensató-
rio» possível; tal será assim, u m a vez que, para o agente, o cumprimento de uma
medida processual privativa da liberdade (mais ainda se se prolongar no tempo) é
sempre u m sacrifício que tem algo de «indevido», tendo em conta a «presunção de
inocência», e é, com certeza, ura sacrifício ainda superior ao do cumprimento de uma
pena, dada a incerteza da situação £ a possível convicção acerca da sua injustiça;
porém, encontrar u m critério baseado, exclusivamente, na compensação de sacrifí-
cios, e que concretize plenamente os ideais de justiça, também oito parece praticá-
vel, dada a inevitável subjectividade dos sacrifícios sofridos e a sofrer...
-s Cf. infra 3.3. b) e ainda Taipa de Carvalho, «Condicionaiidade Sóclo-
Culturai do Direito P e n a l . . . » , Análise Histórica. Sentido e Limite», Coimbra, 1985,
p. 100 e ss.
882 Maria (ia Conceição ferreira da Curtia
24
Cf. supra ponto 2.
25
Qf. supra ponto 2, nota 22.
" Cf. Taipa de Carvalho pata quem, de facto, a privação da liberdade enquanto
medida processual será mais dolorosa do que a própria pena de prisão; no entanto,
este autor assinais este aspecto a propósito da dedução dessa privação da liberdade
na pena de mulia que venha a ser cominada, não. relativamente ao problema de que
ora tratamos (cf. Sucessão efe Leis Penais. ..,!.* ed„ p 13).
17 É verdade qut, quando é cominada u m a pena de multa, o legislador enten-
deu poder o juiz deduzir mais de um dia-multa por cada dia de privação da liber-
63
Do Descontodai-Medidas Processuais Privativas da liberdade
dade sofrido (cf. infrg ponto 3.2); no entanto, no caso da dedução da privação da
liberdade n a pena de multa, tal será mais defensável, em rjome de u m a ideia de Jus-
tiça material, já que estão em causa dois tipos de sacrifícios muito distintos, enten-
dendo-se que, normalmente, a privação da liberdade é mais custosa ík> que o sacrifício
pecuniário; de resto, a ieí, (á a outros propósitos (pena prisão subsidiária — cf. art.
49."-J) partiu desse entendimento, estabelecendo um critério de «equivalência» que
poderá ser orientador da dedução nos casos de aplicação de pena de multa (sobre
estes aspectos cf. infra ponto 3.2.).
M
Esta era já a solução do art. 80.°-1 na sua versão original.
21
Cf. art. ÍO.°-2 do CP na sua versão original.
884 Maria (ia Conceição ferreira da Curtia
M
«Equivaler» n ã o é aqui empregue n u m sentido jurídico, u m a vez que nunca
poderá haver perfeita equivalência jurídica entre u m a medida processual e u m a pena
(cf. supra neta 3).
51
Cf. supra ponto 2. É verdade que tal Ideia sempre ficaria prejudicada, com
qualquer tipo de desconto, mas esta imposição não vem em nada minimizar esse
efeito.
" É evidente que o juiz se pode servir do art. 49. como critério orientador,
mas poderá entender que a «proporção» a fazer deverá ser diferente, desde que n ã o
inverta a solução - ou seja, desde que 1 dia de privação da liberdade nunca seja dedu-
zido à razão de menos de 1 dia de multa.
Do Descontodai-Medidas Processuais Privativas da liberdade 885
41
Assim, parece que se apostou em depositar maior confiança no julgador.
w
Cf. notas 2 e 3 « bibliografia aí citada.
88 8 Maria da Cvnceição Ferreira da Cunba
43
Direito Pena!..., cif,, p, 500, § 439, referi ndo-se, nâo apenas ao art. 80.",
de que ora curamos, mas também ao art. 81.?, ambos nas suas versões originárias.
Note-se que, quanto ao art. 80.*, a revisão não irou se, em relação a este aspecto, qual-
quer alteração.
* Note-se <]ue o internamento não pode exceder o limite máximo da pena cor-
respondente ao tipo de crime cometido pelo inimputável {cf. art. 92 °-2}.
45
0 agente em, j». ex., prisão preventiva, também não teve o acompanhamento
necessário à sua ressoeialtzaçâo (cf. supra ponto 2).
Do Descontodai-Medidas Processuais Privativas da liberdade 889
se nos afigura mais grave; para o agente inimputável parece que se tor-
nará de todo indispensável um acompanhamento específico, com um
tratamento adequado ao seu caso41*. Mas, não haver qualquer dedução
também contraria aquele limiar mínimo de justiça, assim como o prin-
cípio de que, mesmo as medidas de segurança, estão sujeitas a limites.
Se tivermos em conta <jue o juiz irá ponderar o que ainda será neces-
sário para o tratamento do agente, apenas com o limite da moldura
abstracta do crime cometido (cf. art. 92.°-2)<r e se tivermos ainda em
conta, não só os limites mais elevados, como é evidente, dos crimes màis
graves,:c<?mo as regras estabelecidas na lei para esses casos (cf, art.
9.1 e 92°-3), o critério apontado não será de todo desajustado.''8
medida concreta50 - , parece que fará sentido pensar-se que será na pena
concreta «a substituir» que deverá ser feito o desconto. Ora, esta pena
concreta « a substituir» terá de ser uma pena de prisão ou uma pena
de multa (no caso do art. 60." ou no do art. 48."), estando, quanto a
estas, definido na lei o critério do desconto a fazer51. Esta opinião poderá
não ser pacífica. Poder-se-ia entender que, depòis de determinada a pena
díe substituição (a sua espécie assim como o seu «quantum») é que se
deveria fazer o desconto; havendo, assim, de facto, uffiá lacúnâ na lei.
Tomemos o seguinte exemplo: determinado agente passa l ano preso
preventivamente e vero a ser condenado em 2 anos de pèna de prisão a
ser substituída por suspensãode execuçM da prisIto 5 ^ u m a solução pos-
sível (a qtfe começámos por defender) seria i dedescontar 1 ano de pri-
são preventiva nos 2 anos de pena de prisão; assim, o juiz teria de
determinar o tempo (e modo) de suspensão adequado à substituição de
1 ano de pena de prisão, determinando, p, ex., 2 anos de suspendo.
Outra solução, com resultados práticos porventura bastante distintos,
seria a de determinar o tempo de suspensão adequado à substituição
dos 2 wos de pena de prisão por hipótese, 3 anos de suspensão e,
depois, nesta pena, teríamos de deduzir 1 ano de prisão preventiva; ora,
face a esta solução, a lei não nos indica, de facto, qualquer critério,
tendo o juiz que colmatar a lacuna, adoptando um critério que lhe
pareça «equitativo» - tendo em conta que o agente esteve privado da
sua liberdade durante 1 ano, quanto tempo se deverá descontar nos 3
anos de suspensão de execução da prisão? Aqui, o critério poderia variar
w
Nottí-se quê tal n i o era assim na ver$&> original dó CP, pois o «regime de
prova* (hoje sem cxistSncià autónoma - o que existe é suspensSo de execução da
pena de prisio com regime de prova - cf. art. 53-®) nâo pressuponha a determina-
ção da pena concreta a substituir.
51
Cf. supra ponto 3 1. «3-2.
52
O que nos parece indiscutível é que, cora base na pena concreta - e n í o com
base nesta pena depois de feito o desconto — é que o juiz deverá decidir se é de apli-
car ou não determinada pena de substituição; caso contrário, haveria violação dos
pressupostos (desde logo dos pressupostos formais) da aplicação das penas de substi-
tuição, é que, p. ex., n o caso da pena de suspensão de execução da prisão, a pena
concreta de prisão não poderá ser superior a $ anos <cf. art. 50.*') - é desta pena de
prisão que se trata, é este o pressuposto do instituto, não desta pena deduzida da pri-
vação de liberdade como medida processual...
Do Descontodai-Medidas Processuais Privativas da liberdade 891
55
Note-se que, embora por vezes tenhamos contraposto critério aritmético a
critério equitativo [simplificando as questões), a verdade é que um critério aritmé-
tico poderá ser equitativo; ou melhor, para se estabelecer um critério aritmético o legis-
lador o u o Juiz taseia-se, em princípio (assim deverá ser), n u m a ideia de
«equitatividade». Tiivez fosse melhor, então, contrapor critério pré-determínado (uni-
forme) a critério que deixa u m a margem para decidir face a cada caso concreto.
" Mas também tudo depende das proporções usadas.
55
Embora seja difícil comparar sacrifícios tão distintos quanto a privação da
liberdade relativamente a um tempo <am que pesa u m a ameaça sobre o agente acom-
panhada da imposição de deveres e/ou regras de conduta e, eventualmente, de u m
plano de readaptação do delinquente (cf. arts. 51° e ss.)... É verdade que quando
se desconta a privação da liberdade n u m a pena de multa, também se comparam sacri-
fícios distintos; porém, face a tal situação, a lei dá-nos alguma orientação (cí. supra
ponto 3.2.). Assim, se partirmos do princípio de que a privação da liberdade é mais
dolorosa do que a suspensão da prisão (o que parece quase indiscutível, embora tal
também varie com os deveres e regras restabelecidas n a suspensão), o critério da com-
pensação de sacrifícios parece aproximar-se mais da primeira solução.,.
56
Neste sentido, Figueiredo Dias, Velbos e Novos. ., cit., p 68; também neste
sentido se inclina J Jurisprudência alemã; em sentido não totalmente coincidente,
cf. certa doutrina alemã referida supra nota 7 e infra ponto 4.
892 Maria (ia Conceição ferreira da Curtia
ss
Ou u m a maior uniformidade já que, tniíando-se da substituição de uma pena
de muita, o critério legal permite alguma «discricionariedade», havendo, no entanto,
u m a orientação legal (cf. supra ponto 3.2.)
M
Ê a s o l u t o que, como vimos, permite u m a leitura da lei que cubra as várias
situações, sem necessidade de se recorrer à integração de lacunas (a não ser, é claro,
para o caso da dedução das medidas processuais privativas da liberdade nas medidas
de segurança — cf. ponto 3.3. a ) ) .
41
in Velhas e Novas..., cit., p. 68,
61
Este aspecto torna-se importante para futuro (cf. infra ponto 4).
894 Maria (ia Conceição ferreira da Curtia
4. Implicações d o f u n c i o n a m e n t o do i n s t i t u t o do desconto
em processos futuros
«quantum» n ã o terão de coincidir, até porque a razão de ser de cada um dos insti-
tutos é distinta, com os critérios que a lei estabelece para o desconto (cf., no caso de
aplicação de u m a multa como pena de substituição, o art. 44.* versus art. 80.°-2).
17
Cf. supra poma 3 3 í>).
" Esta exigência tornou-se expressa com a revisão do CP (cf. actuais arts. 75-°,
8 3 . 8 4 . " e 86.°). J i antes da revisão era esse o entendimento da doutrina (cf. Figuei-
redo Dias, Direito ?mal. . ., cit., p. 264 e 265, relativamente & reincidência; relati-
vamente aos arts. 83/ B 84.°, cf. p. 565; quanto ao art. 86.", defendia este autor que,
de jure candendo, a solução também fosse essa - cf. p. 577, § 912; de facto, tal solu-
ção passou a ser a estipulada na lei depois da revisão). Com a revisão também se
tomou-se clara a impossibilidade de estarem em causa penas de substituição de natu-
reza detentlva (prisão por dias livres ou regime de semi-detenção), uma vez que se
passou a exigir que as penas de prisão, pressuposto da reincidência, sejam superiu-
res a 6 meses; ora, «tas penas de substituição só são aplicáveis a penas de prisão até
3 meses (cf. art. 75." e arts, 4 5 * e 46." e cf. Figueiredo Dias, Direito Penal.., cii.,
p. 565, § 889).
896 Maria (ia Conceição ferreira da Curtia
não podemos dizer que o agente tenha cumprido prisão efectiva. De todo
modo, actualmente, o que é relevante, para aplicação destes institutos,
é que não tenha havido condenação em prisão efectiva, não o seu cum-
primento, 69 e esta não existiu. Isto vale, como é evidente, para qual-
quer pena de substituição, incluindo as de natureza detentiva.70/71 A este
propósito caberá referir o que nos diz Figueiredo Dias: quanto à reinci-
dência, entende este autor que o desejo presente na lei foi o «de que a
condenação anterior assuma uma gravidade tal que implique a apli-
cação (directa) de u m a pena de p r i s ã o . . . » " . Também em relação à
w
Esta foi também uma alteração introduzida pela revisão de 1995 (cf. actuais
arts. 75°, 83°, 84.° e 86.°). Note-se que a solução anterior, no sentido de se exigir o
cumprimento, ao menos parcial, da pena, para efeitos de reincidência, era criticada
pela doutrina - se o fundamento da reincidência se relaciona com o desrespeito pela
solene advertência do Tribunal, então nada tem a ver com o cumprimento efectivo
da pena; tal já não seria assim se o fundamento se relacionasse também com o sofri-
mento da pena de prisão (cf. Figueiredo Dias, Direito Penai,.., cit., p. 267, § 376).
70
Cf. supra nota 66. Por outro lado, caso a pena determinada seja uma. pena
de prisão, haverá que ter em conta que, para efeitos futuros (eventual consideração
do agente como reincidente ou como delinquente por tendência), o que se deve ter
em conta é, mais uma vez, a pena cominada, não a pena cumprida (ou a cumprir),
resultante do desconto. Este aspecto poderá ser relevante para verificação — ou não
- dos pressupôs tos formais destes institutos, pois, quer no art. 75.°, quer no art, 83.°,
há a exigência, não só da condenação em prisão efectiva, como de um determinado
«quantum» de prisão - no art. 75.°, pena de prisão superior a 6 meses, no art. 83 °,
pena de prisão superior a 2 anos.
71
Já relativamente aos casos de conhecimento superveniente do concurso
(cf. a ri. 78.°), estando em causa, na sentença transitada em Julgado, uma pena de
substituição, ler-se-á, no entanto, de partir da pena substituída (pena principal
- embora depois de feito o eventual desconto) para se formar o concurso. Só em rela-
ção à pena do concurso fará sentido ver se deverá haver substituição (cf. neste sen-
tido Figueiredo Dias, Direito Penal..., cit., p. 295, § 430). Esta parece ser a solução
mais consentânea com a ideia da pena do concurso ser uma pena conjunta; o juiz
só poderá avaliar da adequação e suficiência da aplicação de uma pena de substitui-
ção considerando a totalidade dos factos e a personalidade do agente (cf. idem,
p. 291, § 420).
" Direito Penal..cit., p. 265, § 372; embora estas considerações sejam teci-
das a propósito da pena de multa com prisão alternativa - 46.°-1 na sua versão
original —, têm perfeito cabimento no presente contexto.
Do Descontodai-Medidas Processuais Privativas da liberdade 897
73
Cf. idem, p, 565, § 889.
" Cf. supra em nolas 7 e 8, a aJusão a alguma disconcordância enlre, por um
lado, Figueiredo Dias e a jurisprudência alemã e, por outro, certa doutrina alemã.
n
Esta seria, assim, u m posição algo intermédia entre as duas soluções
equacionadas supra ponto 3.3. Li), ou, talvez, mais aproximada da segunda solução
apontada, embora de forma algo mitigada.
76
Cf. ponto 33- b) nota 56.
" Cf. Velhas t Novas.cit., p. 68.