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Contra a Pré-História (Eduardo Neves)

Os países são construções históricas. Em alguns casos, são construções


frágeis, agregados de povos que falam línguas distintas e professam credos
diferentes, às vezes até inimigos. Em outros casos, as fronteiras entre eles são linhas
retas traçadas em salões situados a milhares de quilômetros de distância. Há países
que se formam e se desfazem, que se devoram e se destroem. Que se expandem e
desaparecem, que mudam de nome. Curiosamente ou não, com exceção das
Guianas, nenhum país com território amazônico tem sua capital na Amazônia: Brasília,
La Paz, Lima, Quito, Bogotá e Caracas estão localizadas junto ao mar, no alto da
cordilheira dos Andes ou em outros biomas. Mais que uma coincidência geográfica,
essas configurações demonstram algo que os países amazônicos têm em comum: em
todos eles, a relação que estabelecem com a floresta e seus povos é de colonialismo
interno.

Nessa lógica, as Amazônias existem para produzir algo para fora, e assim tem
sido desde antes do início da colonização europeia: na época dos incas, eram as
plumas e a coca; depois, as "drogas do sertão", cacau, borracha, ouro, madeira,
petróleo e energia elétrica, para citar alguns exemplos. Parte dessa visão colonialista
resulta da ideia equivocada de que a Amazônia é uma região inóspita, que, por causa
de limitações ambientais, nunca foi densamente povoada. Nos últimos anos, a
arqueologia destruiu essa hipótese ao demonstrar que a região tem sido habitada há
mais de treze mil anos e foi cenário de importantes inovações tecnológicas no contexto
de todo o continente americano, como o início do cultivo de plantas e a produção inicial
e independente de cerâmica.

No início do século XVI, calcula-se que a população indígena da Grande


Amazônia — região que inclui a bacia amazônica propriamente dita, as Guianas, a
bacia do alto Orinoco na Venezuela e na Colômbia, e a bacia de rios que desembocam
diretamente no mar, como o Gurupi, na fronteira entre Pará e Maranhão — tenha
atingido entre oito e dez milhões de pessoas. Esses povos foram dizimados no início
do período colonial devido à guerra, escravidão e propagação de doenças contra as
quais não possuíam imunidade.

Evidências indicam que a Amazônia já era ocupada pelos ancestrais dos povos
indígenas há cerca de treze mil anos, com descobertas em Monte Alegre, no Pará, e
na bacia do rio Guaviare, na Colômbia, onde também foi documentada arte rupestre,
uma das mais antigas do continente. Trabalhos realizados na bacia do alto rio Madeira,
em Rondônia, e também em Monte Alegre, assim como no departamento de Beni, na
Bolívia, mostram que há nove mil anos plantas como mandioca, castanha-do-pará e
araçá-goiaba já eram consumidas e talvez cultivadas pelos povos locais.

Esses achados confirmam hipóteses anteriormente baseadas em dados


genéticos que sugeriam que a Amazônia foi um centro antigo e independente de
domesticação de plantas — ou de "neolitização", como seria chamado no Velho
Mundo — e de produção de agrobiodiversidade no planeta. De fato, a quantidade de
plantas cultivadas inicialmente na Amazônia e hoje disseminadas pelo mundo é
impressionante: mandioca, cacau, abacaxi, maracujá, mamão, amendoim, tabaco,
açaí, castanha-do-pará, guaraná, ingá, cupuaçu, pimenta murupi, goiaba e pupunha,
entre outras. A maioria dessas plantas consiste em tubérculos, árvores e arbustos,
com poucos cereais, destacando-se o milho, que, apesar de sua origem
mesoamericana no sul do México, já estava presente na Amazônia há cerca de seis
mil anos, tendo passado por um processo local de seleção genética independente.

Muitas dessas plantas se encontravam em um estado que Claude Lévi-Strauss


chamou de "intermediário" entre a condição selvagem e o cultivo pleno. Em diferentes
partes do mundo, a partir do final do Pleistoceno — ou da última era glacial, há cerca
de doze mil anos —, algumas populações humanas, de modo independente,
estabeleceram relações com plantas e animais selvagens, levando à criação de novas
espécies. Esse processo, conhecido como "domesticação", foi descrito pelo
arqueólogo marxista australiano Vere Gordon Childe, nos anos 1930, como parte da
"revolução neolítica".

No entanto, o caso amazônico apresenta particularidades. Embora a região


tenha sido um importante centro de cultivo de plantas, muitas espécies, como o açaí
e a castanha-do-pará, nunca foram completamente domesticadas. Outras
permanecem nesse "estágio intermediário" mencionado por Lévi-Strauss. Exemplos
são os guaiabeiros que crescem de forma quase selvagem nas fissuras das grandes
metrópoles brasileiras.

Durante muito tempo, a condição transitória dessas plantas levou a


comunidade arqueológica a uma "depressão teórica", fazendo-os acreditar que os
ancestrais indígenas seriam agricultores incipientes, a caminho de um neolítico nunca
plenamente alcançado. No entanto, essa visão reflete mais um problema de ideias
importadas de outras realidades históricas do que uma suposta incapacidade dos
povos indígenas locais. Não há razão para que os processos históricos tenham
ocorrido de forma universal e homogênea.

Na Amazônia, o neolítico foi "selvagem", baseado em ontologias que não


separavam claramente os domínios da natureza dos domínios da cultura, como
frequentemente ressaltam os povos indígenas e seus intelectuais. O antropólogo
Carlos Fausto e Eduardo Neves preferem chamar esse fenômeno de "processo de
familiarização", em vez de domesticação. Esse processo é marcado pela valorização
e produção de uma diversidade notável de variedades de plantas cultivadas.

Pesquisadoras como Laure Emperaire, Janet Chernela e Manuela Carneiro da


Cunha destacaram a enorme quantidade de variedades cultivadas nas roças
indígenas da Amazônia. Jerá Guarani mostrou o mesmo entre os povos guaranis da
Mata Atlântica e demonstrou que essas roças — verdadeiros refúgios de
agrobiodiversidade — também são espaços de resistência, onde práticas e
conhecimentos circulam e sobrevivem às tentativas de homogeneização cultural e
destruição de modos de vida distintos.

Talvez o melhor exemplo desse fenômeno esteja na notável diversidade


linguística observada entre os povos indígenas da América do Sul tropical. No norte
da América do Sul — incluindo a Amazônia, a Orinoquia e as Guianas — são faladas
cerca de trezentas línguas. Essas línguas se distribuem em cinquenta unidades,
podendo ser famílias linguísticas, ou seja, grupos de línguas com origem comum, ou
línguas isoladas. A quantidade de línguas isoladas na Amazônia, especialmente em
sua porção ocidental, próxima ao sopé dos Andes, é impressionante. A diversidade
linguística amazônica está entre as maiores do planeta e se torna ainda mais notável
por ter surgido em um contexto sem barreiras geográficas aparentes, como desertos,
cordilheiras ou arquipélagos, que normalmente isolam populações e favorecem o
surgimento de novas línguas.

Na ausência desses fatores geográficos e de um aparato estatal, essa imensa


diversidade linguística parece ter emergido como um processo ativo de valorização
das diferenças através das línguas. Há cerca de dois mil e quinhentos anos, verificou-
se um notável processo de aumento populacional em diferentes partes do território
que hoje corresponde ao Brasil. Na Amazônia, esse crescimento populacional deixou
registros em enclaves arqueológicos, distribuídos por áreas de dezenas de hectares
e compostos por espessos depósitos de cerâmica associados aos chamados solos de
"terra preta" — solos escuros, altamente férteis e estáveis.

Embora as terras pretas mais antigas datem de mais de cinco mil anos, foi
nesse período de aumento populacional que elas se disseminaram por vastas áreas
da Amazônia. Esses solos são considerados extraordinários porque mantêm sua
fertilidade por séculos, mesmo em condições ambientais extremas, como as da região
amazônica. Até a década de 1990, havia debates sobre a origem dessas terras pretas
— se seriam naturais ou resultantes da ação humana. Hoje, há consenso de que foram
formadas por práticas indígenas, embora ainda existam minorias acadêmicas que
discordem.

Apesar de as terras pretas terem sido formadas deliberadamente, seria um


equívoco supor que elas foram produzidas exclusivamente como zonas agrícolas
destinadas a resolver problemas de escassez ambiental. Nas escavações e
mapeamentos que Eduardo Neves realizou em dezenas de enclaves da Amazônia
Central durante a década de 2000, os depósitos mais espessos de terra preta estavam
sempre associados a áreas de atividades domésticas. Assim, essas terras eram
essencialmente compostos orgânicos — resíduos misturados a carvão queimado em
baixa temperatura e, em alguns casos, fragmentos de cerâmica.

Essas práticas sofisticadas de enriquecimento do solo ainda não são totalmente


compreendidas pela agronomia contemporânea. Durante muito tempo, acreditou-se
que a pobreza dos solos amazônicos, naturalmente pouco férteis, limitava o
crescimento demográfico na região, por supostamente dificultar a agricultura
permanente. No entanto, estudos realizados nos últimos trinta anos em várias partes
da Amazônia demonstram a presença onipresente de solos escuros e férteis,
associados a grandes quantidades de cerâmica decorada.

Esses solos, conhecidos como terras pretas, eram mencionados pela ciência
desde o século XIX, mas apenas na década de 1990 foi comprovada a autoria
indígena em sua formação. Dados arqueológicos indicam que as terras pretas mais
antigas, com cerca de 5.500 anos, se formaram na bacia do rio Madeira, em Rondônia,
e que, há cerca de 2.500 anos, o processo de produção desses solos se espalhou por
várias partes da Grande Amazônia, possivelmente cobrindo até 2% de sua área total.

O estudo das terras pretas exemplifica como visões externas influenciaram a


interpretação da Amazônia. Inicialmente, argumentava-se que tais solos eram
demasiado férteis para serem obra dos povos indígenas. Mais tarde, ao se aceitar sua
origem indígena, passaram a ser considerados como grandes façanhas agronômicas
destinadas a superar uma suposta limitação de nutrientes na região. Ambas as
interpretações refletem uma perspectiva que sugere que sempre falta algo à Amazônia
ou aos trópicos em geral, e que a solução deve vir de fora.

Na verdade, as terras pretas se formaram ao redor das habitações, como


resultado da deposição de resíduos orgânicos — cascas de mandioca, sementes de
palmeiras, ossos de animais, folhas e galhos queimados a baixa temperatura. Esses
materiais, junto com fragmentos das panelas de cerâmica utilizadas para preparar
alimentos e bebidas fermentadas, enriqueceram o solo ao redor das moradias, que
periodicamente eram abandonadas, queimadas e reconstruídas em novos locais
próximos. Esse processo contínuo levou, ao longo do tempo, à formação de vastas
áreas de terra preta. Mesmo depois de abandonados, esses espaços continuavam
férteis, com árvores e plantas típicas dos solos de terra preta prosperando por
décadas ou séculos. Esse padrão de uso e reuso de áreas de cultivo persiste até hoje
em várias comunidades da região.

Esse exemplo ilustra como a arqueologia na Amazônia, cada vez mais, não se
limita ao estudo de belos artefatos de cerâmica e pedra produzidos por povos
indígenas no passado, mas também se interessa pelas maneiras como esses povos
transformaram a natureza e moldaram paisagens. Mais importante ainda, interessa-
se por como essas paisagens preservam um registro valioso dos modos de vida
antigos. Trata-se de um esforço interdisciplinar, que envolve o estudo de amostras de
solo, macro e microvestígios de plantas, ossos de animais e humanos, além do uso
crescente de tecnologias de detecção remota.

Junto com as terras pretas, outras evidências desse crescimento populacional


ocorrido no primeiro milênio da era comum são visíveis nos enclaves arqueológicos
da região: aterros artificiais associados a cerâmicas sofisticadas no leste da Ilha de
Marajó, urbanismo de baixa densidade no Alto Xingu — formado por grandes aldeias
interligadas por caminhos lineares —, centenas de estruturas de terra em formatos
geométricos (quadrados ou círculos), conhecidas como geoglifos, conectadas por
caminhos no leste do Acre, sul do Amazonas e oeste de Rondônia, e estruturas de
pedra semelhantes a menires, associadas a câmaras funerárias na costa do Amapá.

Em 2008, o arqueólogo Michael Heckenberger, junto com um grupo de


colaboradores brasileiros e estrangeiros, incluindo o cacique Afukaká Kuikuro, do Alto
Xingu, publicou um artigo na revista Science sugerindo que, há cerca de mil anos, os
ancestrais dos Kuikuro viviam em grandes assentamentos interligados por caminhos
lineares que formavam redes regionais, caracterizadas como urbanas. Quinze anos
depois, em outubro de 2023, outro artigo publicado na mesma revista, com a
participação de dezenas de cientistas, propôs que mais de dez mil estruturas de terra
— aterros, valas, caminhos, diques, etc. — podem estar ocultas sob a densa
vegetação das áreas da Amazônia que ainda não foram desmatadas.

Curiosamente, a maioria dos autores desse último estudo são cientistas


naturais, um grupo que tradicionalmente aceitou com relutância a hipótese
arqueológica de que a Amazônia foi densamente habitada por povos indígenas no
passado e que a paisagem que conhecemos hoje é, em parte, resultado das ações
desses povos ao longo de milênios.

Nos séculos anteriores à colonização europeia, a diversidade de formas de vida


indígena na Amazônia era enorme. Estima-se que entre oito e dez milhões de pessoas
viviam na Grande Amazônia em 1492. No século XVIII, essa população foi
drasticamente reduzida devido à propagação de doenças, à escravidão e à guerra.
Quando os primeiros cientistas europeus começaram a explorar e descrever a região,
encontraram vastas áreas aparentemente desabitadas. A ausência de materiais
duráveis como pedra para construção reforçou a imagem de um território vazio e
atrasado, percepção que, infelizmente, ainda persiste.

Os povos indígenas da América do Sul não deixaram registros escritos sobre si


mesmos, portanto, suas histórias só podem ser conhecidas através do estudo dos
vestígios materiais de seus modos de vida. Em regiões áridas, como a costa do
oceano Pacífico no Peru, a ausência de chuva permite a preservação de restos
orgânicos, como ossos, peles e tecidos, além de construções de pedra e adobe. Nos
Andes, em regiões de grande altitude, há abundantes evidências de arquitetura em
pedra, amplamente utilizada como material construtivo.

Na Amazônia, com algumas exceções, os materiais de construção eram


diferentes: madeira, palha, cipós, canas e barro. Com exceção do barro, todos os
demais materiais são perecíveis e tendem a desaparecer rapidamente, alimentando o
ciclo natural de nutrientes que mantém viva a floresta. A ausência de construções de
pedra contribuiu para a criação da hipótese de que a Amazônia teria sido pouco
povoada no passado. Da mesma forma, as estruturas de terra que hoje são
amplamente documentadas — montículos, aterros, caminhos e valas em diferentes
formatos, como círculos e quadrados — eram, durante muito tempo, interpretadas
como formações naturais.

O estudo interdisciplinar de enclaves arqueológicos e das paisagens ao redor


tem modificado profundamente a arqueologia amazônica, ajudando a construir uma
imagem mais rica e complexa da antiguidade da região. Esse enfoque interdisciplinar
caracteriza a arqueologia contemporânea e é uma das razões pelas quais essa
ciência nunca foi tão fascinante como hoje.

Para alterar essa perspectiva equivocada, seria importante abandonar o termo


"pré-história" e adotar "antiguidade" para o campo de estudos sobre a história do Brasil
antigo. Embora pareça uma mudança simples, essa substituição garantiria aos povos
indígenas o direito à História, direito que lhes foi negado pela violência. Com tamanha
população e uma história tão antiga, é razoável esperar que os povos indígenas que
habitaram a Amazônia por milênios tenham desempenhado um papel fundamental na
transformação das florestas e de outros habitats onde viveram e onde ainda vivem.

Um corolário da ideia de que a Amazônia nunca foi densamente povoada é a


hipótese de que os ambientes amazônicos seriam prístinos, exemplos de áreas
intocadas pela ação humana. Contudo, essa hipótese também não se sustenta diante
das evidências arqueológicas. Graças a políticas afirmativas e outras iniciativas
públicas, hoje há diferentes cursos de graduação em arqueologia na Amazônia
brasileira — em Porto Velho, Santarém, São Gabriel da Cachoeira e Belém — que
ampliaram o acesso de estudantes, incluindo indígenas, ribeirinhos e quilombolas.
Esses novos cursos também passaram a absorver jovens formados em programas de
pós-graduação que se consolidaram no Brasil nas últimas décadas. Felizmente, essa
nova estrutura se mostrou robusta o suficiente para resistir aos ataques que a ciência
brasileira sofreu nos últimos anos.

Outra transformação significativa pela qual passou a arqueologia é a ampliação


do conceito de tempo passado. O foco na materialidade e nas paisagens permite que
a arqueologia estude fenômenos históricos mais recentes, ligados a populações
silenciadas e que não tiveram a oportunidade de registrar sua própria história, além
de grupos que talvez não queiram que suas histórias sejam conhecidas. Exemplos
incluem comunidades quilombolas do período colonial e imperial e vítimas da violência
de Estado enterradas em cemitérios clandestinos. Também se destacam os grupos
indígenas isolados, que vivem em diferentes partes da Amazônia.

A abordagem arqueológica pode ser uma ferramenta essencial na proteção


desses povos isolados. É comum pensar que os grupos isolados são "descobertos"
pela sociedade nacional e que cabe ao Estado estabelecer formas seguras de contato,
visando sua integração ao mundo moderno. Nos últimos anos, apesar das inúmeras
dificuldades enfrentadas, indigenistas da FUNAI desenvolveram o princípio, baseado
na prática, de que muitos dos povos "isolados" no Brasil — possivelmente mais de
sessenta — estão nessa condição porque assim escolheram, optando por não
estabelecer contato com as sociedades ao redor.

Se os países amazônicos têm responsabilidades históricas, uma das principais


é garantir as condições necessárias para que esses povos continuem vivendo de
acordo com seus modos de vida, já que não há outro lugar no mundo com um número
tão significativo de comunidades humanas que desejam permanecer isoladas. É difícil
imaginar uma responsabilidade maior do que essa.

O trabalho com povos isolados é uma missão verdadeiramente heroica, pois


representa uma luta para preservar a diversidade da humanidade. Essa afirmação
pode parecer exagerada, já que o número total de indivíduos vivendo em isolamento
na Amazônia não passa de alguns milhares, uma fração ínfima diante dos cerca de
oito bilhões de habitantes do planeta. No entanto, o objetivo desses esforços não é
promover o contato, mas assegurar que esses grupos possam continuar vivendo sem
ameaças em seus territórios. Trata-se de um diálogo silencioso e demorado, que exige
paciência e observação, realizado durante semanas por meio de formas de
comunicação baseadas em vestígios materiais: antigas fogueiras, cabanas
abandonadas, rastros, trilhas, árvores cortadas com machados de pedra ou metal,
galhos quebrados e árvores frutíferas.

O heroísmo desse trabalho reside na ideia de que a história desses povos não
precisa ser um destino inevitável rumo ao contato e à assimilação. Não existe
nenhuma lei natural ou social que determine que as coisas devam ocorrer dessa
maneira. Os caminhos do futuro, embora condicionados pelas circunstâncias do
presente, devem estar abertos à imaginação de mundos melhores, mais justos e mais
diversos. Os povos isolados não são vestígios fósseis de um passado remoto,
aguardando seu destino inevitável de integração. Pelo contrário, sua longa história de
resistência demonstra que outros futuros possíveis podem surgir das ruínas do
presente.

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