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O PATRIMÔNIO CULTURAL E SUAS MÚLTIPLAS CAMADAS

2023, Anais do 5° Simpósio Científico ICOMOS Brasil e 2° Simpósio Cientifico ICOMOS/LAC

TEMA GERAL 5 - EDUCAÇÃO E PATRIMÔNIO - SUBTEMAS: EDUCAÇÃO PATRIMONIAL, INTERPRETAÇÃO E APRESENTAÇÃO DO PATRIMÔNIO CULTURAL, HERANÇA PARA NOSSAS GERAÇÕES O PATRIMÔNIO CULTURAL E SUAS MÚLTIPLAS CAMADAS MÜHLBAUER, Clarice F. Universidade Federal do Rio de Janeiro. Programa de Pós Graduação em Arquitetura Av. Pedro Calmon, 550, sl. 433 | Edifício Jorge Machado Moreira | Ilha do Fundão Rio de Janeiro | RJ | CEP:21941-590 clarice.muhlbauer@fau.ufrj.br RESUMO Ultrapassamos a marca dos 30 anos da chamada “Constituição Cidadã”. Pautada na construção de uma sociedade livre, justa e solidária; na promoção do bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação; e na redução das desigualdades sociais e garantia do desenvolvimento nacional, a Carta Magna brasileira parece apontar (novamente) o caminho necessário para uma reestrutura política e um novo desenho de sociedade. No campo do patrimônio cultural não é diferente, em seu artigo 216 a Constituição Federal de 1988 apresenta os bens que constituem o patrimônio cultural brasileiro: “os bens de natureza material e imaterial, tomados individualmente ou em conjunto, portadores de referência à identidade, à ação, à memória dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira” (Brasil, 1988) e indica que caberá não só ao Poder Público, mas também a comunidade, a promoção e proteção do patrimônio cultural brasileiro. O tema da participação social também é basilar para os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável, pactuados pelos Estados-membros da ONU na Agenda 2030. Assunto que ecoa nas recomendações da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura. Em seu manual de referência para gestão do patrimônio mundial cultural, a UNESCO (2016) apresenta o crescimento da abordagem “baseada em valores” (na qual os integrantes da sociedade participam da atribuição de valor), em detrimento da abordagem “convencional” (onde apenas os especialistas atribuem valor) nos processos de reconhecimento e gestão da conservação do patrimônio cultural, recomendando a utilização da ferramenta “plano de conservação”. Nesse cenário consideramos como premissa: a atribuição de significados diversos ao patrimônio cultural pelos diferentes integrantes da sociedade e que essa compreensão apoia processos decisórios mais inclusivos e com maiores chances de ressonância com a sociedade na qual um bem está inserido. Na pesquisa em andamento, busca-se a compreensão das formas de identificação e apresentação das diversas camadas de significados que compõe um bem/lugar considerado como patrimônio cultural e que melhor se adequem ao ciclo de um “plano de conservação”, ferramenta proposta pela Política do Patrimônio Cultural Material (PPCM) do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional - IPHAN, como instrumento de conservação (Brasil, 2018). O uso da ferramenta conforme proposta por James Kerr (2013) determina o pensar de forma estruturada e proporciona às pessoas envolvidas com o sítio a oportunidade de avaliar como e por que ele é significativo, identificar as vulnerabilidades desse significado cultural e definir o que deve ser feito para conservá-lo no caso de qualquer uso futuro, alteração ou reparo. Palavras-chave: Democracia; patrimônio cultural; plano de conservação; declaração de significância; valores 5° Simpósio Científico ICOMOS Brasil e 2° Simpósio Cientifico ICOMOS/LAC Belo Horizonte/MG - Brasil, 05 a 07 de dezembro de 2022 – Lima-Peru, 08 e 09 de dezembro de 2022 Cenário Ultrapassamos a marca dos 30 anos da chamada “Constituição Cidadã”. A Carta Magna brasileira traz como objetivos da República Federativa do Brasil a formação de uma sociedade livre, justa e solidária; a garantia do desenvolvimento nacional; a erradicação da pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; a promoção do bem de todos sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação. Aponta o caminho necessário para uma reestrutura política e um novo desenho de sociedade. No texto de seu 216º artigo apresenta um novo paradigma para a promoção e proteção do patrimônio cultural brasileiro. “Art. 216. Constituem patrimônio cultural brasileiro os bens de natureza material e imaterial, tomados individualmente ou em conjunto, portadores de referência à identidade, à ação, à memória dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira, [...] § 1º O Poder Público, com a colaboração da comunidade, promoverá e protegerá o patrimônio cultural brasileiro, por meio de inventários, registros, vigilância, tombamento e desapropriação, e de outras formas de acautelamento e preservação” (BRASIL, 1988) Ao colocar em pauta a colaboração entre o Poder Público e a comunidade, lança então o desafio com o qual seguimos nos deparando no campo das políticas públicas de patrimônio, e de outros campos da democracia no Brasil. Ulpiano Bezerra de Meneses (2012) vai chamar essa novidade de deslocamento de matriz do valor cultural. Meneses sinaliza que o significado de um bem cultural não está na materialidade da coisa em si, mas nas práticas sociais que a envolvem. Irei diretamente para a questão nuclear: a matriz do valor. Se o valor é sempre uma atribuição, quem o atribui? Quem cria valor? (MENESES, 2012, p.33) Sônia Florêncio, repete algumas perguntas do professor e avança com seus questionamentos: Por que as pessoas valoram o patrimônio? Se o valor é atribuído, quem o atribui? Quem o cria? Como as relações subjetivas e, portanto, afetivas com os bens culturais podem ser acessadas? Como o Estado e as políticas públicas de patrimônio incorporam em suas ações institucionais instrumentos, técnicas, metodologias que permitam o acesso a essa valoração do patrimônio? Como abarcar os diferentes saberes e formas de conhecer dos sujeitos envolvidos com os bens culturais? Como o Estado e os órgãos de preservação podem proceder para implementar políticas públicas de patrimônio que levem em consideração as diferentes dimensões valorativas do Patrimônio? Essas são algumas das questões que precisam ser enfrentadas para que ocorra a ampliação da inclusão dos grupos sociais nos processos de patrimonialização. (FLORÊNCIO, 2022, p.449). 5° Simpósio Científico ICOMOS Brasil e 2° Simpósio Cientifico ICOMOS/LAC Belo Horizonte/MG - Brasil, 05 a 07 de dezembro de 2022 – Lima-Peru, 08 e 09 de dezembro de 2022 Dentro do rol de questionamentos apresentados pela pesquisadora e técnica do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – IPHAN, a questão do acesso às relações subjetivas com os bens culturais nos interessa especialmente. Catherine Gallois (2017), também servidora do IPHAN, já apontava que seria essa uma fronteira de pesquisa pouco explorada no campo do patrimônio. Direcionando o olhar para a complexidade de se pensar formas para processos efetivos de participação em tomadas de decisão que afetem a conservação e gestão dos bens patrimonializados. Para Gallois, ações como seleção, valoração, uso, conservação, restauração e demolição não deveriam ser apenas técnicas. Contribuindo para esse debate, Carla Coelho, pesquisadora e servidora da Casa de Oswaldo Cruz | Fundação Oswaldo Cruz, aborda em sua tese as dificuldades no estabelecimento desses processos participativos. O processo de atribuição de valor aos sítios históricos, ao incorporar os diferentes atores que participam da sua dinâmica, pode contribuir para o reconhecimento e fortalecimento de suas singularidades, fornecendo subsídios para a definição de estratégias que se oponham à tendência de homogeneização identificada em grandes projetos de revitalização. As dificuldades em relação à participação efetiva da comunidade nas ações relacionadas à preservação, incluindo a valoração, devem ser entendidas no contexto mais amplo da realidade brasileira, que ainda apresenta imensos desafios e entraves para que a população possa exercer de forma plena sua cidadania. Apesar dessas dificuldades – ou exatamente por causa delas – os profissionais do campo do patrimônio cultural devem buscar novas estratégias para viabilizar a participação da sociedade e reduzir a imensa distância percebida entre a instância técnica, a instância política e os usuários dos sítios históricos. (COELHO,2018, p.272 e 273) Silvia Zanirato reforça que um dos caminhos para a efetividade da associação patrimônio/ identidade é a manutenção da ação institucional e abertura para a sociedade através da transparência do que chama de “políticas de ativação patrimonial”, trazendo para os processos de patrimonialização e salvaguarda de bens culturais a identificação de seus sujeitos atuantes, as dimensões sociais e intangíveis dos elementos e seus múltiplos valores. Alerta ainda para os efeitos sociais consubstanciais ao processo de patrimonialização e/ou de desaparecimento de tais bens; a articulação das políticas de ativação do patrimônio com as demais políticas públicas (ambiental, econômica, social) para viabilizar a conservação. Nessa perspectiva está também a ampliação de usos do patrimônio, uma condição para a identificação e a participação social na proteção do bem. (ZANIRATO, 2018, p.29) Retornamos então a Sônia Florêncio (2022), que entende que os 5° Simpósio Científico ICOMOS Brasil e 2° Simpósio Cientifico ICOMOS/LAC Belo Horizonte/MG - Brasil, 05 a 07 de dezembro de 2022 – Lima-Peru, 08 e 09 de dezembro de 2022 processos de patrimonialização estão inseridos em um contexto de relações sociais e representações da vida dos diferentes grupos sociais e que, consequentemente, precisam ser conhecidas para se conhecer, também, as valorações atribuídas aos bens culturais. Para acessar o universo de valores cotidianos atribuídos pelos grupos sociais ao patrimônio cultural, é preciso compreender o universo das representações e das relações sociais que pautam suas vidas nos territórios, o que é raro no universo das práticas dos processos de patrimonialização, tradicionalmente focados em interpretações do patrimônio realizadas por especialistas. (FLORÊNCIO, 2022, p.447) Eliana Soares explora a discussão sobre inflação patrimonial e relevância demasiada do especialista. Mas há quem contraponha esse discurso, ao promover um debate que, para além da necessidade de diversificação do patrimônio, há que se reconhecer uma multiplicação de compreensões e a diversidade de porta-vozes, que não aquelas que são controladas ou monopolizadas pelo Estado. Portanto, essa inflação, ou proliferação, poderia ser vista como um sinal de democracia, tendo em vista a ampliação da noção de patrimônio em todo mundo, a partir dos anos de 1980. Novas demandas surgem, e a sociedade civil desponta através das associações, tanto no Brasil, quanto na França, por exemplo. (SOARES, 2020, p.469) Importante apontar, como indica Flavio Carsalade, que reconheçamos a função identitária da cultura e a importação de sua preservação, mas não esqueçamos as mudanças pelas quais a sociedade passa e o que significa dizer que a cultura não é fixa. Estamos submetidos a processos de transformação de crença e valores tanto como indivíduos, quanto como grupos e uma análise, ainda que breve, sobre as transformações culturais mostraria como um mesmo povo em diferentes épocas valoriza ou vê de forma diferente o mesmo bem cultural. (CARSALADE, 2017, p.205 e 206) Também fala sobre as mudanças pelas quais passam os valores que são atribuídos aos chamados bens patrimoniais, Mario Pragmácio Telles (2018), que em umas das notas de rodapé de sua tese usa como exemplo a roda de capoeira, uma prática considerada crime, prevista pelo no Código penal de 1890, que passa a categoria de patrimônio cultural brasileiro em 2008. Vimos que nessa breve amostragem de ideias de pesquisadores e profissionais brasileiros, que atuam no campo da conservação de bens patrimonializados, há uma consonância com o que veremos a seguir em relação ao cenário mais amplo das Nações Unidas e outros órgãos de preservação e pesquisa no campo da patrimônio cultural. 5° Simpósio Científico ICOMOS Brasil e 2° Simpósio Cientifico ICOMOS/LAC Belo Horizonte/MG - Brasil, 05 a 07 de dezembro de 2022 – Lima-Peru, 08 e 09 de dezembro de 2022 O tema da participação social é basilar para os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável, pactuados pelos Estados-membros da ONU na Agenda 2030, deles destacamos os seguintes objetivos: Objetivo 12. Consumo e produção responsáveis 12.b. Desenvolver e implementar ferramentas para monitorar os impactos do desenvolvimento sustentável para o turismo sustentável, que gera empregos, promove a cultura e os produtos locais [...] Objetivo 16. Paz, justiça e instituições eficazes 16.7. Garantir a tomada de decisão responsiva, inclusiva, participativa e representativa em todos os níveis Vamos ver o assunto ecoando também nas recomendações da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura, que apresenta em seu Manual de Referência para Gestão do Patrimônio Mundial Cultural (UNESCO, 2016), o crescimento da abordagem “baseada em valores” (na qual os integrantes da sociedade participam da atribuição de valor), em detrimento da abordagem “convencional” (onde apenas os especialistas atribuem valor) nos processos de reconhecimento e gestão da conservação do patrimônio cultural. Figura 1 – Montagem da autora a partir de imagens do Manual de referência Gestão do Patrimônio Mundial Cultural 5° Simpósio Científico ICOMOS Brasil e 2° Simpósio Cientifico ICOMOS/LAC Belo Horizonte/MG - Brasil, 05 a 07 de dezembro de 2022 – Lima-Peru, 08 e 09 de dezembro de 2022 Gerir um ambiente histórico, portanto, é gerir mudanças. É assim com bens do Patrimônio Mundial ou com qualquer outra forma de patrimônio. O objetivo do gestor deve ser a continuidade do uso sustentável da paisagem, seja urbana, seja rural, mantendo e, se possível, reutilizando o que for importante do passado e, ao mesmo tempo, protegendo o VUE do bem. Em consequência, a gestão deve mudar também para acomodar os pontos de vista de outros e os interesses daqueles que moram e trabalham na região. (UNESCO, 2016, p.32, grifo nosso) Outros documentos, produzidos por órgãos internacionais de preservação do patrimônio cultural, seguem apontando nessa mesma direção, como a Declaração de Delhi, sobre Patrimônio e Democracia, onde o ICOMOS convida a todos a: “promover processos democráticos inclusivos de engajamento comunitário: de todas as pessoas, por todas as pessoas, para todas as pessoas” (ICOMOS, 2017, tradução nossa). A abordagem baseada em valores é, em muitos sentidos, uma resposta a complexidade cada vez maior do campo do patrimônio. Evoluiu em diversos países, como o Canada e os Estados Unidos, e se tornou mais conhecida por meio da Carta de Burra, elaborada pelo ICOMOS, na Australia, em 1979 e posteriormente atualizada. Nessa carta, promoveu-se a avaliação do significado de um lugar, com base nos valores atribuídos por todos os interessados (não apenas pelos especialistas) e o uso de uma declaração de significado como base para desenvolver estratégias de conservação e gestão. Tal conceito foi aprofundado nos trabalhos de James Kerr sobre planos de conservação (1982). Ele promoveu uma abordagem sistemática do desenvolvimento de planos de conservação e gestão baseados em valores e, o que é mais importante, do significado cultural de um lugar de patrimônio para a sociedade. Nessa abordagem, ele adotou a premissa de que os integrantes de uma sociedade atribuem valores diversos ao patrimônio (UNESCO, 2016, p.29) Erica Avrami, Randall Mason e Marta de la Torre, em seu relatório de pesquisa para The Getty Conservation Institute (2000), trataram das transformações na sociedade e como isso afetou como vimos e criamos o patrimônio cultural, saindo de um foco estreito, dado pelos especialistas, direcionado para cânones, os chamados monumentos históricos, obras primas, etc, ampliando significativamente o espectro e passando a incluir exemplares e conjuntos de arquitetura vernacular, paisagens naturais e culturais e outros elementos que seriam significativos para grupos específicos da sociedade. Sobre plano de conservação No texto organizado por James Kerr em 1983, ele apresenta a ferramenta que compartilha com a Carta de Burra (1980) os princípios de que os valores atribuídos ao bem cultural estruturam as políticas/diretrizes para sua conservação. Kate Clark (2000) exemplifica que essa abordagem pode ser utilizada para jardins históricos, paisagens, edificações, sítios arqueológicos, coleções de artefatos e até um navio. O uso 5° Simpósio Científico ICOMOS Brasil e 2° Simpósio Cientifico ICOMOS/LAC Belo Horizonte/MG - Brasil, 05 a 07 de dezembro de 2022 – Lima-Peru, 08 e 09 de dezembro de 2022 dessa ferramenta mostra-se particularmente relevante em lugares com características mistas. Clark (1998) ressalta aspectos a serem observados para aplicação do instrumento, focando no diálogo e na produção coletiva como estratégias importantes para a identificação dos valores e posteriormente proposição das diretrizes. A ferramenta está proposta na Política do Patrimônio Cultural Material (PPCM) do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional - IPHAN, como instrumento de conservação (Brasil, 2018). Seu uso determina o pensar de forma estruturada e proporciona às pessoas envolvidas com o sítio a oportunidade de avaliar como e por que ele é significativo, identificar as vulnerabilidades desse significado cultural e definir o que deve ser feito para conservá-lo no caso de qualquer uso futuro, alteração ou reparo. Consolidada pelo Iphan, a Política de Patrimônio Cultural Material (PPCM) foi instituída pela Portaria Nº 375, de 19 de setembro de 2018. Esta normativa servirá de guia para ações e processos de identificação, reconhecimento, proteção, normatização, autorização, licenciamento, fiscalização, monitoramento, conservação, interpretação, promoção, difusão e educação patrimonial relacionados à dimensão material do Patrimônio Cultural Brasileiro. (...) A Política de Patrimônio Cultural Material traz inovações importantes para os procedimentos que envolvem a preservação e valorização do patrimônio cultural. Mas, permeando todas elas, está o objetivo de promover a construção coletiva dos instrumentos de preservação, garantindo assim a legitimidade das ações do Iphan junto às comunidades e também entre os agentes públicos. Esse objetivo decorre de diversos princípios, sobretudo da indissociabilidade entre os bens culturais e as comunidades, da participação ativa na elaboração de estratégias e da colaboração entre as esferas do Poder Público e a comunidade. (IPHAN, 2018) Pesquisa em andamento Nesse cenário, a pesquisa em andamento tem como premissa: que os integrantes da sociedade atribuem significados diversos ao patrimônio cultural e que essa compreensão apoia processos decisórios mais inclusivos e com maiores chances de ressonância com a sociedade na qual um bem está inserido. Como objetivo geral busca-se a compreensão das formas de identificação e apresentação das diversas camadas de significados que compõe um bem/lugar considerado como patrimônio cultural e que melhor se adequem ao ciclo de um “plano de conservação”. Entende-se que a ferramenta possibilita um olhar integrado sobre o bem, como: de que maneira ele representa e concretiza valores intangíveis associados? Como ele pode comunicar de maneira coesa todas as suas “partes” – arquitetura, paisagem, bens móveis e integrados, sítios e bens 5° Simpósio Científico ICOMOS Brasil e 2° Simpósio Cientifico ICOMOS/LAC Belo Horizonte/MG - Brasil, 05 a 07 de dezembro de 2022 – Lima-Peru, 08 e 09 de dezembro de 2022 arqueológicos? Ou como dar “voz” a todas as camadas e percursos históricos pelo qual o bem passou ou representa? (CORRÊA; MÜHLBAUER, 2020) Objetivos específicos: 1. Mapear atores/ stakeholders (instituições, associações, organizações não governamentais...); 2. Levantar, analisar e experimentar procedimentos do método qualitativo de pesquisa para identificação das camadas de significado que compõe um bem/ lugar considerado patrimônio cultural; 3. Construir a Declaração de Significância para um bem reconhecido como patrimônio cultural sintetizando o que é o lugar? o porquê é importante? E como esta importância se manifesta hoje? Essa proposta se entrelaça com o campo de investigação do Laboratório de Pesquisa em Arquitetura, Subjetividade e Cultura do Programa de Pós Graduação em Arquitetura LASC | PROARQ, que estão focados na relação pessoa-espaço construído, analisando fatores de ordem subjetiva e cultural que participam da construção do Lugar, da memória e da identidade espacial dos grupos socioculturais. Considerar o espaço construído como artefato cultural significa dizer que ele pode ser compreendido como linguagem, como portador de significados e, principalmente, como materialização da visão de mundo dos grupos que a produzem. (DUARTE, 2010, p.2) Aprender a olhar, a ler e a escutar os ambientes juntamente com seus usuários significa, para o arquiteto-pesquisador, a possibilidade de um diálogo cultural dos mais enriquecedores, no qual se verificam não apenas as relações entre os pesquisados e seus ambientes, mas também o relacionamento do pesquisador com seu próprio sentimento espacial. (Ibid., p.4) A integração possibilitada pela compreensão e análise de atributos de ambiências de lugares urbanos e arquitetônicos é a abordagem desejável para complementar o olhar especializado em patrimônio cultural. Através da aplicação de metodologias específicas que ressaltem a dimensão sensível das ambiências, pretende-se uma aproximação que possa somar e relacionar os diversos olhares sobre determinado lugar. Conceitos como “Empatia Espacial” (DUARTE, 2015, p. 72) no contexto do patrimônio cultural, podem trazer ricas contribuições para complementar o enfoque a partir das análises da morfologia/ tipologia, da materialidade e do processo histórico de determinado lugar. 5° Simpósio Científico ICOMOS Brasil e 2° Simpósio Cientifico ICOMOS/LAC Belo Horizonte/MG - Brasil, 05 a 07 de dezembro de 2022 – Lima-Peru, 08 e 09 de dezembro de 2022 Estudo de caso Como objeto para estudo de caso é proposto o Conjunto da Fortaleza de Santa Cruz da Barra, em Jurujuba, Niterói/RJ, componente do conjunto de dezenove fortificações brasileiras em processo de candidatura a patrimônio mundial. Figura 2 – Montagem fotográfica a partir de imagens disponíveis na internet referentes À fortificação. Para esse lugar já estão identificadas camadas “oficiais” de significados, enquanto bem tombado nacional nos livros Histórico e Belas Artes, como parte integrante da poligonal do Sítio da Paisagem Cultural do Rio de Janeiro – Patrimônio Mundial e como unidade operacional do Exército Brasileiro, resta apresentar um novo conjunto de valores; significados que possam se somar aos já identificados, ampliando a abordagem. Mirando Clark (2019) aponta que tradicionalmente os especialistas em patrimônio tem usado sua expertise para definir os significados de lugares de patrimônio, mas provoca ao dizer que, cada vez mais devemos nos comportar menos como ditadores e mais como facilitadores, ouvindo as pessoas, nos engajando junto às comunidades e ajudados os grupos a explorarem o que importa ao invés de dizer a eles. O profissional à frente do desenvolvimento de um plano de conservação precisa ser capaz de uma abordagem transdisciplinar. É importante que tenha conhecimento de arquitetura e 5° Simpósio Científico ICOMOS Brasil e 2° Simpósio Cientifico ICOMOS/LAC Belo Horizonte/MG - Brasil, 05 a 07 de dezembro de 2022 – Lima-Peru, 08 e 09 de dezembro de 2022 patrimônio cultural e é fundamental que consiga contextualizar, problematizar e relacionar as informações, promovendo reorganizações que permitam a superação de barreiras e possibilitem a apreciação de uma nova perspectiva. James Kerr aponta que, a manutenção da distinção entre as disciplinas contidas em um plano de conservação, pode significar a destruição ou enfraquecimento da interdependência essencial entre os tipos de evidência e a forma de narrativa que melhor apresentam o processo de desenvolvimento de um lugar. A busca pela ampliação de conhecimento, através de pesquisa aplicada, em resposta ao desafio posto de estudar cada aspecto, cada parte do bem/lugar e seu entorno, as práticas sociais que ali ocorrem, os aspectos simbólicos que o permeiam, relacionando todas as disciplinas, apresentando os critérios e as razões pelos quais este lugar é significativo – Declaração de Significância, pode trazer respostas que contribuirão para processos mais eficientes, eficazes e efetivos dentro da esfera dos órgãos públicos de preservação do patrimônio cultural. AGRADECIMENTOS: O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - Brasil (CAPES). Processo n. 88887.686202/2022-00 do PROEX (Programa de Excelência Acadêmica). REFERÊNCIAS (na ordem em que aparecem no texto) BRASIL. [Constituição (1988)]. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília, DF: Presidência da República, [2020]. 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