Introdução à
Psicologia Cognitiva
1
E X P L O R A N D O A P S I C O L O G I A C O G N I T I VA
1. O que é psicologia cognitiva?
2. De que forma a psicologia desenvolveu-se como ciência?
3. Como a psicologia cognitiva desenvolveu-se a partir da psicologia?
4. Como outras disciplinas contribuíram
para o desenvolvimento da teoria e da
pesquisa em psicologia cognitiva?
DEFINIÇÃO DE PSICOLOGIA
COGNITIVA
O que será estudado em um livro-texto sobre psicologia cognitiva?
1. Cognição: As pessoas pensam.
2. Psicologia cognitiva: Os cientistas pensam
sobre como as pessoas pensam.
3. Estudantes de psicologia cognitiva: As
pessoas pensam sobre o que cientistas
pensam em relação a como as pessoas
pensam.
5. Quais métodos os psicólogos cognitivos usam para estudar o modo como as
pessoas pensam?
6. Quais são as questões atuais e os vários
campos de estudo da psicologia cognitiva?
bem várias formas, por que elas se lembram
de alguns fatos, mas se esquecem de outros, ou
como aprendem a linguagem. Consideremos alguns exemplos:
• Por que, em dias com névoa, os objetos
parecem estar mais distantes do que
realmente estão? Essa discrepância pode
ser perigosa, inclusive enganando motoristas e envolvendo-os em acidentes.
4. Professores que lecionam para estudantes de
psicologia cognitiva: Basta rever os itens
anteriores.
• Por que muitas pessoas lembram-se
de uma determinada experiência (por
exemplo, um momento muito feliz ou
um constrangimento na infância), mas
esquecem os nomes de pessoas a quem
elas conhecem há muitos anos?
Para sermos mais específicos, a psicologia
cognitiva é o estudo de como as pessoas percebem, aprendem, lembram-se de algo e pensam
sobre as informações. Um psicólogo cognitivo
pode estudar o modo como as pessoas perce-
• Por que muitas pessoas têm mais medo
de viajar de avião do que de carro? Afinal de contas, as chances de lesão ou
morte são muito mais altas em um carro
do que em um avião.
20
ROBERT J. STERNBERG
Estas são algumas perguntas que podemos
responder por meio do estudo da psicologia
cognitiva.
Este capítulo introduz o campo da psicologia cognitiva, descrevendo um pouco do
histórico intelectual do estudo do pensamento
humano. Enfatizam-se especialmente algumas
das questões e das preocupações que surgem
quando pensamos sobre como as pessoas pensam. A seguir, teremos um breve panorama dos
principais métodos, das questões e das áreas
de conteúdo da psicologia cognitiva. As idéias
apresentadas neste capítulo proporcionarão um
alicerce sobre o qual construir uma visão dos tópicos da psicologia cognitiva.
Por que estudar a história deste campo ou
mesmo de qualquer outro? Para início de conversa, se soubermos de onde viemos, poderemos ter
uma compreensão melhor de para onde estamos
indo. Além disso, pode-se aprender com erros
do passado. Dessa forma, quando cometermos
erros, eles serão erros novos, e não os mesmos
de antes. Nossas formas de tratar questões fundamentais mudaram, mas algumas dessas questões permanecem praticamente as mesmas. Em
última análise, pode-se aprender algo sobre o
modo como as pessoas pensam estudando como
as pessoas já pensaram sobre o pensar.
O avanço das idéias, muitas vezes, envolve uma dialética. Uma dialética é um processo
de desenvolvimento em que as idéias evoluem
com o passar do tempo por meio de um padrão
de transformações. Qual é esse padrão? Em
uma dialética:
• Propõe-se uma tese. Uma tese é um
enunciado de opinião. Por exemplo, algumas pessoas são da opinião de que
a natureza humana governa muitos aspectos do comportamento humano (por
exemplo, a inteligência ou a personalidade; Sternberg, 1999). Contudo, depois
de algum tempo, alguns indivíduos observam alguns problemas na tese.
• Mais cedo ou mais tarde ou talvez logo
em seguida, surge uma antítese. Uma antítese é um enunciado que se contrapõe
à opinião enunciada anteriormente. Por
exemplo, uma visão alternativa é que o
que adquirimos em nossa criação (o contexto ambiental em que somos criados)
determina quase que por completo muitos aspectos do comportamento humano.
• Mais cedo ou mais tarde, o debate entre a
tese e a antítese leva a uma síntese. Uma
síntese integra os aspectos mais críveis de
cada uma de duas (ou mais) visões. Por
exemplo, no debate sobre a relação entre
inato e adquirido, a integração entre nossa
natureza inata e o que adquirimos no ambiente pode governar a natureza humana.
Na verdade, a visão mais aceita atualmente é que tanto a visão sobre “inato”
quanto a que se baseia no “adquirido” são
incompletas. Ambos os fatores trabalham
juntos em nosso desenvolvimento.
Se uma síntese parece fazer avançar nosso
conhecimento acerca de um assunto, ela servirá
como uma nova tese. Posteriormente, uma nova
antítese se seguirá, depois uma nova síntese, e
assim por diante. Georg Hegel (1770-1831) observou essa progressão dialética de idéias. Ele
foi um filósofo alemão que chegou a suas idéias
por meio de sua própria dialética, sintetizando algumas das visões de seus predecessores e
contemporâneos intelectuais.
ANTECEDENTES FILOSÓFICOS DA
PSICOLOGIA: RACIONALISMO VERSUS
EMPIRISMO
Onde e quando começou o estudo da psicologia cognitiva? Os historiadores da psicologia, de modo geral, identificam suas primeiras
raízes em duas abordagens à compreensão da
mente humana:
A filosofia procura entender a natureza geral
de muitos aspectos do mundo, basicamente por meio da introspecção – o exame
das idéias e das experiências internas (introspecção: “olhar para dentro”).
A fisiologia busca um estudo científico de
funções vitais na matéria viva, fundamentalmente por meio de métodos empíricos (baseados em observação).
Dois filósofos gregos, Platão (428-348 a.C.) e
seu aluno Aristóteles (384-322 a.C.), influenciaram profundamente o pensamento moderno na
PSICOLOGIA COGNITIVA
psicologia e em muitos outros campos. Platão
e Aristóteles discordavam com relação à forma
de investigar idéias. O primeiro era um racionalista, ou seja, acreditava que o caminho para
o conhecimento se dá pela análise lógica. Por
sua vez, Aristóteles (que era naturalista e biólogo, além de filósofo) era um empirista, alguém
que acredita que adquirimos conhecimento por
meio das evidências empíricas – ou seja, obtemos evidências por meio da experiência e da
observação (Figura 1.1).
Portanto a visão de Aristóteles leva diretamente a investigações empíricas da psicologia.
Em contrapartida, a visão de Platão prenuncia
os vários usos do raciocínio no desenvolvimento da teoria. As teorias racionalistas sem qualquer conexão com observações podem não ser
válidas, mas grandes quantidades de dados decorrentes de observação sem uma estrutura teórica que as organize podem não ter relevância.
Podemos considerar a visão de mundo racionalista de Platão como uma tese e a visão empírica
de Aristóteles, como uma antítese. A maioria
dos psicólogos de hoje busca uma síntese de
ambas. Eles baseiam as observações empíricas
na teoria e usam-nas para revisar suas teorias.
Durante a Idade Média, grande parte da
psicologia cognitiva conforme existia na época
era uma tentativa de fazer formulações a par-
(a)
FIGURA 1.1
21
tir das idéias de Aristóteles (Kemp, 1996, 2000).
Também foram feitas tentativas iniciais de localizar os processos cognitivos no cérebro. No século XVII, as idéias conflitantes do racionalismo
e do empirismo ressurgiram com o racionalista
francês René Descartes (1596-1650) e com o empirista inglês John Locke (1632-1704). Descartes
concordava com Platão, considerando o método
introspectivo e reflexivo superior aos métodos
empíricos de encontrar a verdade. Locke, por
sua vez, compartilhava o entusiasmo de Aristóteles em relação à observação empírica (Leahey,
2000; Manent, 1998; Smith, 1997).
Locke acreditava que os seres humanos
nascem sem conhecimento e, por tal razão, devem buscá-lo por meio da observação empírica.
Seu termo para isso era tabula rasa (que significa
“tábua vazia” em latim). A idéia é que a vida
e a experiência “escrevem” o conhecimento
em nós. Sendo assim, para Locke o estudo da
aprendizagem era fundamental para entender a
mente humana. Ele acreditava que não existem
idéias inatas. No século XVIII, o filósofo alemão
Immanuel Kant (1724-1804) sintetizou dialeticamente a visão de Descartes e Locke, ao afirmar
que tanto o racionalismo quanto o empirismo
têm seu lugar, devendo trabalhar juntos na busca da verdade. Atualmente a maioria dos psicólogos aceita a síntese de Kant.
(b)
(a) Segundo o racionalista, o único caminho para a verdade é a reflexão contemplativa; (b)
Segundo o empirista, o único caminho para a verdade é a observação meticulosa. A psicologia cognitiva, assim
como outras ciências, depende do trabalho de racionalistas e empiristas.
22
ROBERT J. STERNBERG
As primeiras dialéticas na psicologia
da cognição
O estruturalismo
Uma das primeiras dialéticas na história
da psicologia ocorre entre o estruturalismo e o
funcionalismo (Leahey, 1997; Morawski, 2000).
O estruturalismo foi a primeira grande escola
de pensamento na psicologia, a qual buscava
entender a estrutura (a configuração de elementos) da mente e suas percepções, analisando-as em seus componentes constitutivos.
Consideremos, por exemplo, a percepção de
uma flor. Os estruturalistas analisariam essa
percepção em termos de cores, formas geométricas, relações de tamanho que a constituem, e
assim por diante.
Um filósofo alemão cujas idéias mais tarde
contribuiriam para o desenvolvimento do estruturalismo foi Wilhelm Wundt (1832-1920). Wundt defendia o estudo das experiências sensoriais
por meio da introspecção. A introspecção é um
olhar interior para informações que passam
pela consciência (Lyons, 2003). Um exemplo
disso são as sensações experimentadas quando
se olha para uma flor. Com efeito, analisamos
nossas próprias percepções.
Wundt teve muitos seguidores, e um deles
foi o estudante americano Edward Titchener
(1867-1927). Titchener (1910) ajudou a trazer o
estruturalismo para os Estados Unidos. Outros
entre os primeiros psicólogos criticaram tanto o
método (introspecção) quanto o foco (estruturas
elementares de sensação) do estruturalismo.
Funcionalismo: uma alternativa ao
estruturalismo
Uma alternativa ao estruturalismo sugeri a que os psicólogos deveriam concentrarse nos processos de pensamento em lugar de
concentrar-se em seus conteúdos. O funcionalismo busca entender o que as pessoas fazem e
por que o fazem. Essa pergunta principal estava em contraste com a do estruturalismo, que
havia perguntado quais eram os conteúdos (as
estruturas) elementares da mente humana. Os
funcionalistas sustentavam que a chave para
o entendimento da mente humana e dos com-
Arquivos de The History of American Psychology, University of Akron
ANTECEDENTES PSICOLÓGICOS DA
PSICOLOGIA COGNITIVA
Wilhelm Wundt não foi muito bem-sucedido na escola,
sendo reprovado muitas vezes e ridicularizado pelos
outros. Entretanto, Wundt mostrou posteriormente
que o desempenho escolar nem sempre indica futuro
sucesso profissional, pois ele é considerado um dos
mais influentes psicólogos de todos os tempos.
portamentos era estudar os processos de como
e por que a mente funciona da maneira que funciona, em lugar de estudar seus conteúdos e os
elementos estruturais.
Os funcionalistas estavam unificados pelos
tipos de perguntas que faziam, mas não necessariamente pelas respostas que encontravam ou
pelos métodos que usavam para encontrá-las.
Como os funcionalistas acreditavam no uso de
quaisquer métodos que melhor respondessem
às perguntas de um dado pesquisador, parece
natural que o funcionalismo tenha levado ao
pragmatismo. Os pragmatistas acreditam que
o conhecimento é validado por sua utilidade: o
que se pode fazer com isso? Estão interessados
não apenas em saber o que as pessoas fazem,
como também querem saber o que podemos
fazer com nosso conhecimento sobre o que as
pessoas fazem. Por exemplo, eles acreditam na
importância da psicologia da aprendizagem e
da memória. Por quê? Porque pode nos ajudar a
melhorar o desempenho das crianças na escola.
Um líder na condução do funcionalismo
em direção ao pragmatismo foi William James
(1842-1910). Sua principal contribuição funcio-
PSICOLOGIA COGNITIVA
23
Archives of The History of American Psychology, Universidade de Akron
râneo na psicologia cognitiva. Dewey é lembrado basicamente por sua abordagem pragmática
do pensamento e da escola.
Muitos psicólogos cognitivos consideram William James, médico, filósofo, psicólogo e irmão do autor Henry
James, como um dos maiores psicólogos que jamais
houve, embora ele próprio pareça ter rejeitado a psicologia mais tarde.
nal ao campo da psicologia foi um único livro:
Princípios de Psicologia (1890/1970). Ainda hoje,
os psicólogos cognitivos apontam, muitas vezes,
os escritos de James em discussões de tópicos
fundamentais no campo, como atenção, consciência e percepção. John Dewey (1859-1952) foi
mais um dos primeiros pragmaticistas que influenciaram bastante o pensamento contempo-
APLICAÇÕES
PRÁTICAS DA
PSICOLOGIA
COGNITIVA
Associacionismo: uma síntese integradora
O associacionismo, assim como o funcionalismo, foi menos uma escola rígida de psicologia e mais uma forma influente de pensar.
O associacionismo examina a forma como os
eventos e as idéias podem tornar-se associados
uns com os outros na mente, a fim de resultar
em uma forma de aprendizagem. Por exemplo,
as associações podem resultar da contigüidade
(associar informações que tendem a ocorrer juntas mais ou menos ao mesmo tempo), da semelhança (associar informações com características
ou propriedades semelhantes) ou do contraste
(associar informações que parecem apresentar
polaridades, como quente/frio, claro/escuro,
dia/noite).
No final do século XIX, o associacionista
Hermann Ebbinghaus (1850-1909) foi o primeiro pesquisador a aplicar os princípios associacionistas de forma sistemática. Especificamente,
Ebbinghaus estudou e observou seus próprios
processos mentais. Contou seus erros e registrou
seus tempos de resposta. Por meio de auto-observações, estudou como as pessoas aprendem
e lembram-se de conteúdos por meio da repetição consciente do conteúdo a ser aprendido.
Entre outras conclusões, ele fez uma descoberta
experimental revolucionária: a de que a repetição freqüente pode fixar associações mentais de
Agora, imagine-se colocando a idéia do pragmatismo em uso. Pense sobre
as formas de tornar as informações que está aprendendo nesta disciplina
mais úteis para você. Parte do trabalho já foi feito – observe que o capítulo começa com perguntas que tornam as informações mais coerentes e
úteis, e o resumo retorna a essas perguntas. O texto responde de maneira
satisfatória às perguntas apresentadas no início do capítulo? Formule suas
próprias perguntas e organize suas anotações na forma de respostas. Além
disso, estabelecça uma relação desse material com outras disciplinas e atividades das quais você participa. Por exemplo, você pode ser chamado a
explicar a um amigo como funciona um programa de computador. Uma
boa maneira de começar seria perguntar a essa pessoa se ela tem alguma
pergunta. Assim, as informações que você oferece serão mais úteis a seu
amigo, em lugar de forçá-lo a buscar a informação de que necessita em
uma exposição longa e unilateral.
24
ROBERT J. STERNBERG
forma mais consistente na memória, ajudando a
aprendizagem (ver Capítulo 6).
Outro associacionista influente, Edward Lee
Thorndike (1874-1949), sustentava que o papel
da “satisfação” é a chave para a formação de associações. Thorndike chamou esse princípio de
lei do efeito (1905): um estímulo tenderá a produzir uma determinada resposta se um organismo
for recompensado por essa resposta. Thorndike
acreditava que um organismo aprendia a responder de uma determinada maneira (o efeito)
em uma dada situação se fosse recompensado
repetidas vezes por isso (a satisfação, que serve
como estímulo para futuras ações). Assim, uma
criança que recebe agrados por resolver corretamente problemas de aritmética aprende a fazêlo porque estabelece associações entre soluções
válidas e agrados.
Do associacionismo ao behaviorismo
Outros pesquisadores que foram contemporâneos de Thorndike usaram experimentos
animais para investigar relações de estímulo e
resposta de formas diferentes das de Thorndike
e seus colegas associacionistas. Os pesquisadores percorreram a linha entre o associacionismo
e o campo emergente do behaviorismo. O behaviorismo é uma perspectiva teórica segundo a
qual a psicologia deveria concentrar-se apenas
na relação entre comportamento observável,
por um lado, e eventos ou estímulos ambientais,
por outro. A idéia era tornar físico o que quer
que outros tivessem chamado de “mental” (Lycan, 2003). Alguns desses pesquisadores, como
Thorndike e outros associacionistas, estudaram
respostas voluntárias (embora, talvez, carecessem de qualquer pensamento consciente, como
no trabalho de Thorndike). Outros estudaram
respostas que foram desencadeadas involuntariamente, em reação ao que parece ser eventos
externos não-relacionados.
Na Rússia, o fisiologista ganhador do Prêmio Nobel, Ivan Pavlov (1849-1936), estudou
esse tipo de comportamento de aprendizagem
involuntário, começando com a observação de
que os cachorros salivavam em resposta à visão
do técnico de laboratório que os alimentava.
Essa resposta ocorria antes que os cachorros
vissem se o técnico trazia comida. Para Pavlov,
essa resposta indicava uma forma de aprendi-
zagem – aprendizagem classicamente condicionada – sobre a qual os cachorros não tinham
qualquer controle consciente. Na mente deles,
algum tipo de aprendizagem involuntária ligava o técnico à comida (Pavlov, 1955). O trabalho
fundamental de Pavlov abriu caminho para o
desenvolvimento do behaviorismo. O condicionamento clássico envolve mais do que uma
associação baseada na contigüidade temporal
(por exemplo, a comida e o estímulo condicionado ocorriam mais ou menos ao mesmo tempo; Rescorla, 1967). O condicionamento eficaz
exige contingência (por exemplo, a apresentação de comida sendo contingente com a apresentação do estímulo condicionado; Rescorla e
Wagner, 1972; Wagner e Rescorla, 1972).
O behaviorismo pode ser considerado uma
versão extrema do associacionismo, que se
concentra completamente na associação entre
o ambiente e um comportamento observável.
Segundo behavioristas rígidos e extremos (“radicais”), quaisquer hipóteses sobre pensamentos e formas de pensar internos não passam de
especulação.
Os proponentes do behaviorismo
O “pai” do behaviorismo radical é John
Watson (1878-1958). Watson não via utilidade
em conteúdos ou mecanismos mentais internos
e acreditava que os psicólogos deveriam concentrar-se apenas no estudo do comportamento observável (Doyle, 2000). Ele considerava o
pensamento apenas como fala subvocalizada.
O behaviorismo também diferia de movimentos anteriores à psicologia por redirecionar a
ênfase da pesquisa experimental, de participantes humanos a animais. Historicamente, grande
parte do trabalho behaviorista foi conduzida (e
ainda o é) com animais de laboratório, como os
ratos, porque possibilitam muito mais controle
comportamental de relações entre o ambiente e
o comportamento em relação a ele. Todavia, um
problema do uso de animais é determinar se a
pesquisa pode ser generalizada para seres humanos (ou seja, aplicada de forma mais geral a
seres humanos em lugar de apenas aos tipos de
animais que foram estudados).
B. F. Skinner (1904-1990), um behaviorista
radical, acreditava que quase todas as formas
de comportamento humano, e não apenas a
aprendizagem, podiam ser explicadas por com-
PSICOLOGIA COGNITIVA
portamentos em resposta ao ambiente. Skinner
desenvolveu pesquisas basicamente com animais não-humanos. Ele rejeitava os mecanismos
mentais, acreditando que o condicionamento
operante – envolvendo fortalecimento ou enfraquecimento do comportamento, contingente à
presença ou ausência de reforço (recompensas)
ou punição – podia explicar todas as formas
de comportamento humano. Skinner aplicou
sua análise experimental de comportamento a
muitos fenômenos psicológicos, como a aprendizagem, a aquisição da linguagem e a solução
de problemas. Em grande parte, em função da
presença muito intensa de Skinner, o behaviorismo dominou a disciplina da psicologia por
muitas décadas.
Os behavioristas ousando espiar dentro da
caixa preta
Alguns psicólogos rejeitaram o behaviorismo radical. Eles tinham curiosidade com
relação aos conteúdos da caixa misteriosa. Por
exemplo, Edward Tolman (1886-1959) achava
que, para entender o comportamento, era necessário levar em conta seu propósito e seu plano. Tolman (1932) acreditava que todo o comportamento era dirigido a algum objetivo. Por
exemplo, o objetivo de um rato em um labirinto
de laboratório pode ser encontrar a comida que
está ali. Tolman é considerado, por vezes, um
precursor da psicologia cognitiva moderna.
Outra crítica ao behaviorismo (Bandura,
1977b) é que a aprendizagem pode ser conseqüência não apenas de recompensas diretas
para o comportamento, como também pode
ser social, resultando de observações das recompensas ou das punições dadas a outros.
Essa visão enfatiza a forma como observamos e
modelamos nosso comportamento com relação
ao de outros. Aprendemos pelo exemplo. Essa
análise da aprendizagem social abre caminho
para examinar o que está acontecendo na mente do indivíduo.
Psicologia da Gestalt
Entre os muitos críticos do behaviorismo,
os psicólogos da Gestalt talvez tenham estado
entre os mais ávidos. A psicologia da Gestalt
diz que entendemos melhor os fenômenos psicológicos quando os vimos como todos organi-
25
zados e estruturados. Segundo essa visão, não
se pode entender totalmente o comportamento
quando desmembramos os fenômenos em partes menores.
A máxima “o todo é diferente da soma das
partes” resume bem a perspectiva da Gestalt.
Para entender a percepção de uma flor, por
exemplo, teríamos que levar em conta o todo da
experiência. Não se poderia entender essa percepção em termos de uma descrição de formas,
cores, tamanhos, e assim por diante. Do mesmo modo, não se poderia entender a solução
de problemas simplesmente examinando elementos isolados do comportamento observável
(Köhler, 1927, 1940; Wertheimer, 1945, 1959).
O SURGIMENTO DA PSICOLOGIA
COGNITIVA
Um enfoque mais recente é o do cognitivismo, a idéia de que grande parte do comportamento humano pode ser entendida em termos
de como as pessoas pensam.
O iniciar da psicobiologia
Ironicamente, um dos ex-alunos de Watson,
Karl Spencer Lashley (1890-1958), questionou de
modo contundente a visão behaviorista de que o
cérebro humano é um órgão passivo, o qual apenas responde às contingências ambientais fora
do indivíduo (Gardner, 1985). Em lugar disso,
considerava que o cérebro era um organizador
ativo e dinâmico do comportamento. Lashley
procurou entender de que maneira a macroorganização do cérebro humano tornava possíveis as atividades complexas e planejadas, como
apresentações musicais, jogos e uso da linguagem. Nenhuma delas era, em sua visão, explicável em termos de simples condicionamento.
Na mesma linha, mas em um nível de análise diferente, Donald Hebb (1949) propôs o conceito de conjuntos de células como base para a
aprendizagem no cérebro. Esses conjuntos são
estruturas neurais coordenadas que se desenvolvem por meio de estimulação freqüente.
Elas se desenvolvem com o passar do tempo, à
medida que aumenta a capacidade de um neurônio (célula nervosa) de estimular um neurô-
ROBERT J. STERNBERG
nio conectado a disparar. Os behavioristas não
aproveitaram a oportunidade rara de concordar
com Lashley e Hebb. Na verdade, o behaviorista B. F. Skinner (1957) escreveu um livro inteiro
descrevendo de que forma a aquisição e o uso
da linguagem poderiam ser explicados unicamente em termos de contingências ambientais.
Esse trabalho levou a estrutura teórica de Skinner longe demais, deixando-a susceptível a ataques. E um ataque estava por vir. O lingüista
Noam Chomsky (1959) fez uma análise rigorosa
das idéias de Skinner. Em seu artigo, Chomsky
enfatizava tanto a base biológica quanto o potencial criativo da linguagem, apontando a infinita quantidade de sentenças que podemos produzir com facilidade. Sendo assim, questionava
as noções behavioristas de que aprendemos
línguas por meio de reforço. Mesmo as crianças
pequenas estão permanentemente produzindo
novas sentenças para as quais não podem ter
sido reforçadas no passado. Chomsky afirmou
que nosso entendimento da língua não é condicionado tanto pelo que ouvimos, mas sim por
um dispositivo de aquisição da linguagem (language acquisition device – LAD) inato, o qual todos os seres humanos possuem. Esse dispositivo possibilita ao bebê utilizar o que escuta para
inferir a gramática de seu ambiente lingüístico.
Em termos objetivos, o LAD limita ativamente
o número de construções gramaticais possíveis.
Dessa forma, é a estrutura da mente, e não a estrutura das contingências ambientais, que guia
nossa aquisição da linguagem.
Relações com a tecnologia:
engenharia e computação
No final da década de 1950, alguns psicólogos estavam intrigados pela noção incômoda
de que as máquinas poderiam ser programadas
para demonstrar o processamento inteligente
da informação (Rychlak e Struckman, 2000).
Turing (1950) sugeriu que em pouco tempo
seria difícil distinguir a comunicação das máquinas da dos seres humanos. Ele sugeriu um
teste, atualmente chamado de “Teste de Turing”, pelo qual um programa de computador
seria considerado bem-sucedido na medida em
que seu resultado fosse indistinguível, por seres humanos, do resultado de testes com seres
humanos (Cummins e Cummins, 2000). Em
Cortesia de Ulric Neisser
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Ulric Neisser é professor de psicologia na Cornell
University. Seu livro, Psicologia Cognitiva, foi importante no lançamento da revolução cognitiva da psicologia. Neisser também foi um dos grandes defensores
de uma abordagem ecológica da cognição e demonstrou
a importância de estudar o processamento cognitivo em
contextos ecológicos válidos.
outras palavras, suponha que você se comunicasse com um computador e não soubesse que
era um computador: ele teria passado no Teste
de Turing (Schonbein e Bechtel, 2003). Em 1956,
uma nova expressão havia entrado em nosso
vocabulário. A inteligência artificial (IA) é uma
tentativa dos seres humanos de construir sistemas que demonstrem inteligência e em particular o processamento inteligente de informação.
(Merriam-Webster’s Collegiate Dictionary, 1993).
Programas que jogam xadrez e que conseguem
ganhar da maioria dos seres humanos são exemplos de inteligência artificial hoje.
No início da década de 1960, os avanços na
psicologia, na lingüística, na antropologia e na
inteligência artificial, bem como as reações ao
behaviorismo por parte de importantes psicólogos, convergiram a fim de criar uma atmosfera madura para a revolução. Os primeiros
cognitivistas afirmavam (como Miller, Galanter
e Pribram, 1960; Newell, Shaw e Simon, 1957b)
que as visões behavioristas tradicionais do comportamento eram inadequadas precisamente
porque nada diziam sobre como as pessoas
pensam. O livro de Ulric Neisser, Psicologia Cognitiva (Neisser, 1967), foi bastante importante
por destacar o cognitivismo, ao informar estudantes de graduação, de pós-graduação e acadêmicos sobre o campo que estava em desenvolvimento. Neisser definiu a psicologia cognitiva
como o estudo de como as pessoas aprendem,
PSICOLOGIA COGNITIVA
MÉTODOS DE PESQUISA EM
PSICOLOGIA COGNITIVA
Objetivos de pesquisa
Para melhor entender os métodos específicos usados por psicólogos cognitivos, deve-se,
em primeiro lugar, compreender os objetivos da
pesquisa em psicologia cognitiva, alguns dos
quais destacamos aqui. De modo sucinto, esses
objetivos são a coleta de dados, o desenvolvimento de teoria, a formulação de hipóteses, a
testagem de hipóteses e, talvez, a aplicação a
ambientes fora da pesquisa. Os pesquisadores,
muitas vezes, buscam apenas coletar a maior
quantidade possível de informações sobre um
determinado fenômeno, podendo ter ou não
noções preconcebidas com relação ao que podem encontrar ao coletar os dados. Sua pesquisa concentra-se na descrição de fenômenos
determinados; por exemplo, a forma como as
pessoas reconhecem rostos e como elas desenvolvem a especialização.
A coleta de dados reflete um aspecto empírico do empreendimento científico. Uma vez que
haja dados suficientes sobre o fenômeno cognitivo de interesse, os psicólogos cognitivos usam
vários métodos para fazer inferências a partir
deles. Em termos ideais, usam diversos tipos de
evidências convergentes para dar sustentação a
suas hipóteses. Às vezes, uma rápida observação dos dados leva a inferências intuitivas com
relação dos padrões que surgem a partir deles.
Contudo, é mais usual os pesquisadores usarem
vários meios estatísticos para analisar os dados.
A coleta de dados e a análise estatística auxiliam os pesquisadores na descrição de fenômenos cognitivos. Nenhum empreendimento
científico iria muito longe sem essas descrições.
Entretanto, a maioria dos psicólogos cognitivos
quer entender mais do que o que da cognição,
sendo que a maior parte deles também busca
entender o como e o porquê do pensamento. Ou
seja, os pesquisadores buscam formas de explicar a cognição, bem como de descrevê-la. Para
ir além das descrições, os psicólogos cognitivos
devem dar um salto, passando daquilo que se
observa diretamente ao que pode ser inferido
com relação às observações.
Suponhamos que se queira estudar um determinado aspecto da cognição. Um exemplo
seria a forma como as pessoas compreendem
informações em livros-texto. Em geral, começamos com uma teoria. Uma teoria é um corpo organizado de princípios explicativos gerais com
relação a um fenômeno. Ela gera hipóteses,
propostas experimentais acerca de conseqüências empíricas esperadas da teoria, tais como os
resultados de pesquisa. A seguir, tenta-se testar
a teoria e, assim, ver se ela tem o poder de predizer certos aspectos do fenômeno em questão.
Em outras palavras, nosso processo de pensamento é: “se nossa teoria estiver correta, sempre
que x ocorrer, o resultado deverá ser y”.
A seguir, testamos nossas hipóteses por
meio da experimentação. Mesmo se certas
conclusões parecerem confirmar uma dada
hipótese, elas devem ser submetidas à análise
estatística a fim de determinar sua significância
Cortesia de Herbert A. Simon
estruturam, armazenam e usam o conhecimento. Tempos depois, Allen Newell e Herbert Simon (1972) propuseram modelos detalhados de
pensamento humano e solução de problemas,
dos níveis mais básicos aos mais complexos.
Na década de 1970, a psicologia cognitiva já era
amplamente reconhecida como um importante
campo de estudos psicológicos, com um conjunto específico de métodos de pesquisa.
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Herbert A. Simon foi professor de ciência da computação e psicologia na Carnegie-Mellon University. É
conhecido por seu trabalho pioneiro com Allen Newell
e outros na construção e na testagem de modelos de
computador que simulavam o pensamento humano e
por seus testes experimentais desses modelos. Também
foi um importante defensor dos protocolos “de pensar
em voz alta” para o estudo do processamento cognitivo.
Simon faleceu em 2001.
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ROBERT J. STERNBERG
NO LABORATÓRIO DE LUDY T. BENJAMIN, JR.
Cortesia de Ludy T. Benjamin Jr.
Psicologia Pop – está por
toda parte! O público adora; os psicólogos detestam.
É o material da televisão,
dos filmes, dos livros, das
peças de teatro e das revistas. Penetrou fundo na
vida dos Estados Unidos,
e assim tem sido desde o
século XIX, quando os frenologistas mediam as
saliências nas cabeças das pessoas para orientálas com relação a suas escolhas profissionais,
os fisionomistas analisavam as características
faciais (por exemplo, formato do queixo ou do
nariz) para ajudar os executivos de empresas
a decidir quem deveria ser contratado ou promovido, ou os grafólogos estudavam amostras
de escrita à mão para ajudar os indivíduos a
encontrar parceiros compatíveis para o casamento. Quando a psicologia científica chegou
às universidades norte-americanas no final do
século XIX, esses novos psicólogos procuraram
desalojar a velha psicologia, tentando convencer o público da validade de sua abordagem e
do caráter absurdo do que rotulavam de pseudopsicologia.
Em nosso programa de pesquisa, estamos
examinando as diferenças entre essas duas psicologias, em uma tentativa de entender por que
o público continuou a aceitar as afirmações da
psicologia não-científica. Nosso programa é histórico, parte de uma atividade acadêmica crescente em história social e história da ciência, a
qual inclui a história da psicologia. Como pesquisa histórica, nosso trabalho é empírico, mas
não experimental. Já estudamos a psicologia popular de várias maneiras, incluindo a análise de
artigos de enciclopédia do século XIX e do início
estatística. A significância estatística indica a
probabilidade de que um determinado conjunto de resultados venha a ser obtido se houver
apenas fatores aleatórios em operação.
Uma vez que nossas predições hipotéticas
tenham sido testadas experimentalmente e analisadas estatisticamente, as conclusões desses
experimentos podem levar a outros trabalhos.
Por exemplo, o psicólogo pode realizar mais
do século XX (Benjamin et al., 1997) e o exame
de muitos levantamentos sobre a imagem que o
público tem da psicologia (Wood, Jones e Benjamin, 1986). Hoje em dia, estamos nos dedicando
às revistas norte-americanas de psicologia popular (mais de 50 títulos diferentes) que foram
publicadas entre 1900 e 1960. Essas revistas promoveram a crença de que seus conteúdos ajudariam os leitores a adquirir saúde, felicidade e
sucesso (Benjamin e Bryant, 1997).
Até o momento, examinamos mais de mil
dessas revistas, estudando seus artigos e suas
propagandas. Estamos tentando identificar temas, como casamento, criação de filhos, sexo
e satisfação no emprego, que sejam constantes
entre as publicações do mesmo período, mas
que possam mudar com o passar do tempo, e
estamos comparando esses temas com o que
estava sendo publicado ao mesmo tempo na
psicologia científica e com o que eram os temas
que permeavam a cultura dos Estados Unidos
naquela época. Por exemplo, a década de 1920
marcou uma virada na história norte-americana
com relação às oportunidades para as mulheres. Descobrimos que as revistas de psicologia
popular falavam aos interesses dessas mulheres; poucos psicólogos ou poucas publicações
de psicologia demonstravam qualquer interesse desse tipo. Essas diferenças, com certeza,
poderiam ser parcialmente responsáveis pelo
fato de o público aceitar as afirmações da psicologia popular e rejeitar as contraposições da
psicologia científica. O tópico é interessante por
si só, mas descobrir as razões para o apelo da
psicologia popular tem mais importância. Esse
entendimento é fundamental para que a ciência
e a prática modernas da psicologia cheguem
com eficácia ao público.
coleta de dados, análise de dados, desenvolvimento de teoria, formulação e testagem de hipóteses. Além disso, muitos psicólogos cognitivos têm esperanças de usar os conhecimentos
obtidos a partir da pesquisa para ajudar as pessoas a usar a cognição em situações reais. Algumas pesquisas em psicologia cognitiva são
aplicadas desde o seu início, buscando ajudar
as pessoas a melhorar suas vidas e as condições
PSICOLOGIA COGNITIVA
sob as quais vivem. Sendo assim, a pesquisa
básica pode levar a aplicações cotidianas. Para
cada um desses propósitos, diferentes métodos
de pesquisa oferecem vantagens e desvantagens diferenciadas.
Diversos métodos de pesquisa
Os psicólogos cognitivos usam vários métodos para explorar como os seres humanos
pensam. Entre eles, estão (a) experimentos de
laboratório e outros experimentos controlados,
(b) pesquisa psicológica, (c) auto-avaliações, (d)
estudos de caso, (e) observação naturalista e (f)
simulações por computador e inteligência artificial (ver Tabela 1.1 para descrições e exemplos
de cada método). Como mostra a Tabela 1.1,
cada método oferece vantagens e desvantagens
que o diferenciam dos outros.
Experimentos com o comportamento humano
Nos desenhos experimentais controlados,
o pesquisador realiza pesquisa geralmente em
um ambiente de laboratório. Ele controla o
maior número possível de aspectos da situação
experimental. A seguir, manipula as variáveis
independentes. Controla os efeitos das variáveis irrelevantes e observa os efeitos das variáveis dependentes (resultados).
Ao implementar o método experimental, o
pesquisador deve usar uma amostra representativa da população de interesse, exercer controle rigoroso sobre as condições experimentais
e, além disso, atribuir aleatoriamente participantes às condições de tratamento e controle.
Se esses requisitos para o método experimental
forem cumpridos, o pesquisador pode ser capaz
de inferir causalidade provável. Essa inferência
se dá com relação aos efeitos da variável ou variáveis independentes (o tratamento) sobre a
variável dependente (o resultado).
Suponhamos que os resultados na condição
de tratamento mostrem uma diferença estatisticamente significativa em relação aos resultados
na condição de controle. O pesquisador pode,
então, inferir a probabilidade de um vínculo
causal entre a(s) variável(is) independente(s) e a
variável dependente. Como o pesquisador pode
estabelecer um vínculo causal provável entre as
variáveis independentes dadas e as variáveis
dependentes, os experimentos de laboratório
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controlados oferecem um meio excelente de testar hipóteses.
Por exemplo, suponhamos que quiséssemos
verificar se ruídos altos e distrativos influenciam a capacidade de desempenhar bem uma
determinada tarefa cognitiva (por exemplo, ler
uma passagem de um livro-texto e responder a
questões de compreensão). Em termos ideais, a
princípio, selecionaríamos uma amostra aleatória de participantes entre o total de nossa população de interesse. A seguir, atribuiríamos aleatoriamente cada participante a uma condição
de tratamento ou a uma condição de controle.
Apresentaríamos algum ruído distrativo aos
participantes de nossa condição de tratamento,
e os participantes de nossa condição de controle não receberiam esse tratamento. Apresentaríamos a tarefa cognitiva aos participantes das
duas condições. A seguir, mediríamos seu desempenho de algumas maneiras (por exemplo,
velocidade e precisão de respostas a questões
de compreensão). Por fim, analisaríamos nossos
resultados estatisticamente. Logo após, examinaríamos se a diferença entre os dois grupos
alcança significância estatística. Suponhamos
que os participantes da condição de tratamento
demonstrassem desempenho mais baixo do que
os da condição de controle em um nível estatisticamente significativo. Nesse caso, poderíamos inferir que ruídos altos distrativos de fato
influenciaram a capacidade de ter bom desempenho nessa tarefa cognitiva específica.
Na pesquisa em psicologia cognitiva, as
variáveis dependentes podem ser muito diversificadas, mas envolvem, com freqüência,
várias medidas de resultados em termos de
precisão (como a freqüência de erros), de tempo
de resposta ou de ambos. Entre as muitas possibilidades de variáveis independentes estão
as características da situação, da tarefa ou dos
participantes. Por exemplo, as características
da situação podem envolver a presença versus
a ausência de determinados estímulos ou de
certas pistas durante uma tarefa de solução de
problemas. As características da tarefa podem
envolver leitura versus escuta de uma série de
palavras e depois a resposta a perguntas de
compreensão. As características dos participantes podem incluir diferenças etárias, diferenças
na situação educacional ou diferenças baseadas
em escores em testes.
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ROBERT J. STERNBERG
TABELA 1.1
Métodos de pesquisa
Os psicólogos cognitivos usam experimentos controlados, pesquisa psicobiológica, autoavaliações, observação naturalista e simulações por computador e inteligência artificial para
estudar fenômenos cognitivos.
MÉTODO
Descrição do método
EXPERIMENTOS DE
LABORATÓRIO
CONTROLADOS
Obter amostras de desempenho
em tempo e lugar determinados
PESQUISA
PSICOBIOLÓGICA
AUTO-AVALIAÇÕES, COMO
PROTOCOLOS VERBAIS,
AUTOCLASSIFICAÇÕES, DIÁRIOS
Estudar os cérebros
humanos e animais,
usando estudos post-mortem e várias
medidas
psicobiológicas ou
técnicas de imagem
(ver Capítulo 2)
Obter relatórios dos participantes
sobre sua própria cognição em andamento ou como lembrança
Validade de inferências
Geralmente
causais: atribuição aleatória de sujeitos
Geralmente não
Não se aplica
Validade de inferências
causais: controle experimental de variáveis
independentes
Varia muito, dependendo da técnica
específica
Provavelmente não
Geralmente
Amostras: tamanho
Podem ser de qualquer tamanho
Muitas vezes, são pequenas
Provavelmente pequenas
Amostras: representatividade
Podem ser representativas
Muitas vezes, não são representativas
Podem ser representativas
Validade ecológica
Não é improvável; depende da
tarefa e do contexto a que está
sendo aplicada
Improvável sob certas circunstâncias
Talvez; ver pontos fortes e fracos
Informação sobre diferen- Geralmente pouco enfatizadas
ças individuais
Sim
Sim
Pontos fortes
Proporciona evidências “brutas” das
funções cognitivas ao relacioná-las
à atividade fisiológica; oferece uma
visão alternativa do processo que
não está disponível por outros meios;
pode levar a possibilidades para o
tratamento de pessoas com déficits
cognitivos sérios
Acesso aos insights introspectivos a
partir do ponto de vista dos participantes, não podendo ser acessada por
outros meios
Facilidade de administração, de
contagem e de análise estatística
torna relativamente fácil aplicar
a amostras representativas de
uma população; probabilidade
relativamente alta de fazer inferências causais válidas
Pontos fracos
Exemplos
Incapacidade de relatar sobre processo que ocorrem fora da consciência
Protocolos verbais e autoclassificações:
A coleta de dados pode influenciar os
processos cognitivos sendo relatados.
Lembranças:
Possíveis discrepâncias entre cognição real e processos e produtos cognitivos lembrados
David Meyer e Roger Schvaneveldt (1971) desenvolveram uma
tarefa de laboratório na qual
apresentavam muito brevemente
duas seqüências de letras (palavras ou pseudopalavras) aos
sujeitos e pediam-lhes que tomassem uma decisão sobre cada
seqüência de letras, tal como
decidir se as letras formavam
uma palavra legítima ou se uma
palavra pertencia a uma categoria indicada
Elizabeth Warrington e Tim Shallice
(1972; Shallice e Warrington, 1970)
observaram que as lesões no lobo
parietal esquerdo do cérebro são associadas a déficits sérios em memória de curto prazo (breve, ativa), mas
a nenhum prejuízo da memória de
longo prazo. No entanto, as pessoas
com lesões nas regiões temporais
(mediais) do cérebro apresentam memória de curto prazo relativamente
normal, mas graves déficits na memória de longo prazo (Shallice, 1979;
Warrington, 1982)
PSICOLOGIA COGNITIVA
ESTUDOS
DE
OBSERVAÇÕES
NATURALISTAS
CASO
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SIMULAÇÕES POR
COMPUTADOR E
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL (IA)
Desenvolver estudos intensivos de indivíduos, tirando conclusões gerais sobre comportamento
Observar situações reais, como em Simulações: tentativas de fazer com que compusalas de aula, ambientes de traba- tadores simulem o desempenho cognitivo humano em diversas tarefas
lho ou casas
IA: tentativa de fazer com que computadores
demonstrem desempenho cognitivo inteligente,
independentemente de o processo se assemelhar
ao processamento cognitivo humano.
Altamente improvável
Não se aplica
Não se aplica
Altamente improvável
Não
Controle total de variáveis de interesse
Quase certamente pequeno
Provavelmente pequeno
Não se aplica
Não é provável que seja representativo
Pode ser representativo
Não se aplica
Sim
Alta validade ecológica para casos individuais; capacidade de generalização mais baixa
a outros
Não se aplica
Sim; informações ricamente detalhadas com
relação a indivíduos
Não se aplica
É possível, mas a ênfase está nas
distinções ambientais e não nas
diferenças individuais
Acesso a informações ricamente detalhadas
Acesso a ricas informações contexcom relação a indivíduos, incluindo infortuais, que podem não estar dispomações sobre contextos históricos e atuais,
níveis por outros meios.
que podem não estar disponíveis por outros
meios; pode levar a aplicações especializadas
para grupos de indivíduos excepcionais (como
prodígios, pessoas com lesões cerebrais)
Possibilita explorar uma ampla gama de possibilidades para modelar processos cognitivos; possibilita testar claramente se as hipóteses predizem
com precisão os resultados; pode levar a uma
ampla gama de aplicações práticas (por exemplo,
robóticas, para realizar tarefas perigosas ou em
ambientes de risco)
Aplicabilidade a outras pessoas; o tamanho
pequeno e a não-representatividade da amostra geralmente limita a capacidade de generalização à população
Falta de controle experimental;
possível influência no comportamento naturalista devido à presença do observador
Limitações impostas pelos limites do hardware
(por exemplo, hardware do computador) e do
software (os programas escritos pelos pesquisadores); distinções entre inteligência humana e
inteligência de máquinas – mesmo em simulações
envolvendo técnicas sofisticadas de modelagem,
as simulações podem modelar com imperfeição a
forma como o cérebro humano pensa
Howard Gruber (1974/1981) conduziu um estudo de caso sobre Charles Darwin, explorando em profundidade o contexto psicológico da
criatividade intelectual
Michael Cole (Cole, Gay, Glik &
Sharp, 1971) investigaram membros da tribo Kpelle na África,
comparando suas definições de
inteligência com as ocidentais,
examinando o modo como as
definições culturais de inteligência
influenciam o comportamento
inteligente
Simulações: Por meio de computações detalhadas, David Marr (1982) tentou simular a
perecepção visual humana e propôs uma teoria
da percepção visual baseada em seus modelos de
computadores.
IA: Vários programas de IA fora criados que
podem demonstrar perícia (por exemplo, jogar
xadrez), mas esses programas provavelmente resolvem problemas utilizando-se de processos distintos daqueles empregados por peritos humanos
32
ROBERT J. STERNBERG
Por um lado, as características da situação
ou tarefa podem ser manipuladas por meio de
atribuição aleatória dos participantes ao grupo
de tratamento ou de controle; por outro, essas
características não são facilmente manipuladas
de forma experimental. Por exemplo, suponha
que o investigador queira estudar os efeitos do
envelhecimento sobre a velocidade e sobre a
precisão da solução de problemas. O pesquisador não pode atribuir aleatoriamente os participantes a vários grupos porque as idades das
pessoas não podem ser manipuladas (embora
participantes de vários grupos etários possam
ser atribuídos de maneira aleatória a várias
condições experimentais). Nessas situações, os
pesquisadores, muitas vezes, usam outros tipos
de estudos, como os que envolvem correlação
(uma relação estatística entre dois ou mais atributos, como características dos participantes ou
da situação). As correlações são expressas como
números em uma escala que começa em –1,00
(uma correlação negativa), passa por 0 (sem
correlação) e chega a 1,00 (correlação positiva).
Por exemplo, pode-se esperar uma correlação
negativa entre fadiga e vigilância. Provavelmente não haveria qualquer correlação entre
inteligência e comprimento do lobo da orelha,
e seria provável uma correlação entre tamanho
do vocabulário e compreensão de leitura.
As conclusões das relações estatísticas são
altamente informativas. Seu valor não deveria
ser subestimado. Além disso, como os estudos
correlacionais não exigem a atribuição aleatória de participantes a condições de tratamento
e controle, esses métodos podem ser aplicados
com flexibilidade. Entretanto, tais estudos geralmente não permitem inferências inequívocas com relação à causalidade. Como resultado, muitos psicólogos cognitivos preferem
fortemente os dados experimentais aos dados
correlacionais.
Pesquisa psicobiológica
Por meio da pesquisa psicobiológica, os investigadores estudam a relação entre desempenho
cognitivo e eventos e estruturas cerebrais. O
Capítulo 2 descreve várias técnicas específicas
usadas na pesquisa psicobiológica, as quais geralmente caem em três categorias. A primeira
delas é a das técnicas para estudar o cérebro de
um indivíduo post-mortem (depois de sua mor-
te), estabelecendo relações entre seu funcionamento cognitivo antes da morte e características
observáveis no cérebro. A segunda categoria é
a das técnicas para estudar imagens mostrando estruturas ou atividades no cérebro de um
indivíduo que se sabe ter um determinado déficit cognitivo. A terceira é a das técnicas para
se obter informações sobre processos cerebrais
durante o desempenho normal de uma atividade cognitiva.
Os estudos post-mortem ofereceram algumas das primeiras visões acerca de como lesões
específicas (em determinadas localizações cerebrais) podem ser associadas com déficits cognitivos específicos. Esses estudos continuam
fornecendo visões úteis de como o cérebro influencia o funcionamento cognitivo. Avanços
tecnológicos recentes também têm possibilitado
cada vez mais que os pesquisadores estudem
indivíduos com déficits cognitivos conhecidos
in vivo (enquanto o indivíduo ainda está vivo).
O estudo de indivíduos com funções cognitivas
anormais vinculadas a lesões cerebrais, muitas
vezes, melhora nosso entendimento das funções cognitivas normais.
Além disso, os pesquisadores da psicologia
estudam alguns aspectos do funcionamento
cognitivo normal estudando a atividade cerebral em participantes animais. Os pesquisadores, em geral, usam animais para experimentos
envolvendo procedimentos neurocirúrgicos que
não podem ser realizados em seres humanos,
pois seriam difíceis, antiéticos ou impraticáveis.
Por exemplo, estudos que mapeiem a atividade
neural no córtex foram realizados em gatos ou
macacos (como a pesquisa psicobiológica sobre
como o cérebro responde a estímulos visuais;
ver Capítulo 4).
O funcionamento cognitivo e cerebral de
animais e de seres humanos anormais pode
ser generalizado e aplicado ao funcionamento
cognitivo de seres humanos normais? Os psicólogos responderam a essas perguntas de várias
formas. A maioria delas ultrapassa os limites
deste capítulo (ver Capítulo 2). Apenas como
exemplo, para alguns tipos de atividade cognitiva, a tecnologia disponível permite que os
pesquisadores estudem a atividade cerebral dinâmica de participantes humanos normais durante o processamento cognitivo (ver Técnicas
de Imagem Cerebral descritas no Capítulo 2).
PSICOLOGIA COGNITIVA
Auto-avaliações, estudos de caso e
observação naturalista
Experimentos individuais e estudos psicobiológicos, na maior parte das vezes, se concentram na especificação precisa de determinados
aspectos da cognição nos indivíduos. Para se
obter informações ricamente detalhadas sobre como determinados indivíduos pensam
em uma ampla gama de contextos, os pesquisadores podem usar outros métodos, os quais
incluem auto-avaliações ou auto-relatos(a descrição de processos cognitivos pelo próprio indivíduo), estudos de caso (estudos em profundidade de indivíduos) e observação naturalista
(estudos detalhados do desempenho cognitivo
em situações cotidianas e contextos fora de laboratório). Por um lado, a pesquisa experimental é mais útil para testar hipóteses. Por outro,
a pesquisa baseada em auto-avaliações, estudos
de caso e observação naturalista costuma ser
bastante útil para formular hipóteses.
A confiabilidade de dados baseados em vários tipos de auto-avaliações depende da sinceridade dos participantes que fornecem essas
avaliações. Eles podem ser completamente verdadeiros, mas as avaliações que envolvem informações da memória (como diários, descrições
em retrospectiva, questionários e levantamentos)
são, na verdade, menos confiáveis do que as fornecidas durante o processamento cognitivo sob
investigação. A razão é que os participantes, às
vezes, se esquecem do que fizeram. Ao estudar
processos cognitivos complexos, como solução
de problemas ou tomada de decisões, os pesquisadores muitas vezes usam um protocolo verbal.
INVESTIGANDO
A PSICOLOGIA
COGNITIVA
33
Em um protocolo verbal, os participantes descrevem em voz alta todos os seus pensamentos e as
suas idéias durante a realização de uma determinada tarefa cognitiva (por exemplo, “gosto mais
do apartamento com a piscina, mas não posso
pagar, então tenho que escolher...”).
Uma alternativa a um protocolo verbal é
os participantes relatarem informações específicas com relação a um determinado aspecto
de seu processamento cognitivo. Consideremos, por exemplo, um estudo de solução de
problemas por meio de insight (ver Capítulo
11). Pediu-se que os participantes relatassem,
em intervalos de 15 segundos, classificações
numéricas indicando o quanto pensavam estar
próximos de chegar a uma solução para um
dado problema. Infelizmente, até mesmo esses
métodos de auto-avaliação têm suas limitações. Como exemplo, os processos cognitivos
podem ser alterados pelo ato de apresentar o
relatório (como processos envolvendo formas
breves de memória; ver Capítulo 5). Outro
exemplo: os processos cognitivos podem ocorrer fora da consciência (como os que não exigem atenção consciente ou que acontecem de
forma tão rápida, que não conseguimos notálos; ver Capítulo 3). Para entender algumas
das dificuldades das auto-avaliações, faça as
seguintes tarefas propostas na seção “Investigando a Psicologia Cognitiva”. Reflita sobre
suas experiências com auto-avaliações.
Individualmente, faça uma das seguintes
séries de perguntas à metade de seus amigos,
e à outra metade, a outra série. Peça-lhes que
respondam o mais rápido que puderem:
1. Sem olhar para seus sapatos, tente relatar em voz alta os vários passos envolvidos no ato de amarrá-los.
2. Recorde em voz alta o que você fez em seu último aniversário.
3. Agora, amarre seus sapatos de verdade (ou outra coisa, como um
barbante em torno da perna de uma mesa), relatando em voz alta os
passos que realiza. Você observa alguma diferença entre a Tarefa 1 e
a Tarefa 3?
4. Relate em voz alta como você trouxe para a consciência os passos
envolvidos em amarrar seus sapatos ou as memórias que tem de seu
último aniversário. Você pode relatar com exatidão como trouxe as
informações para a consciência? Consegue relatar qual parte de seu
cérebro estava mais ativa durante cada uma dessas tarefas?
34
ROBERT J. STERNBERG
Conjunto 1:
1. O que o bicho-da-seda tece?
2. Qual é um material conhecido para fazer
roupas que vem do bicho-da-seda?
3. O que as vacas bebem?
Conjunto 2:
1. O que as abelhas fazem?
2. O que cresce nos campos que é posteriormente transformado em material
para roupas?
3. O que as vacas bebem?
Muitos de seus amigos, quando chegarem à
pergunta 3, no Conjunto 1, dirão “leite”, quando todos sabemos que as vacas bebem água. A
maioria dos seus amigos que responderem ao
Conjunto 2 dirá “água”, e não leite. Você acaba de realizar um experimento. O método do
experimento divide as pessoas em dois grupos
iguais, muda um aspecto entre os dois grupos
(em seu caso, você fez uma série de perguntas antes de fazer uma pergunta importante) e
mede a diferença entre os dois grupos. O número de erros é o que você está medindo, e é
provável que seus amigos do grupo 1 cometam
mais erros do que os do grupo 2.
Os estudos de caso (por exemplo, o estudo
de indivíduos excepcionalmente dotados) e as
observações naturalistas (como a observação
de indivíduos operando em usinas nucleares)
podem ser usados para complementar conclusões de experimentos de laboratório. Os
primeiros dois métodos de pesquisa cognitiva
oferecem alta validade ecológica – o grau no
qual conclusões específicas em um contexto
ambiental podem ser consideradas relevantes
fora daquele contexto. Como você talvez saiba,
a ecologia é o estudo do relacionamento interativo entre um organismo (ou organismos) e
seu ambiente. Muitos psicólogos cognitivos
buscam entender o relacionamento interativo
entre processos de pensamento humano e os
ambientes nos quais os seres humanos estão
pensando. Às vezes, os processos cognitivos
que são comumente observados em um ambiente (por exemplo, em um laboratório) não
são idênticos àqueles observados em outro
(como em uma torre de controle de tráfego aéreo ou em uma sala de aula).
Simulações por computador e
inteligência artificial
Os computadores digitais cumpriram um
papel fundamental no surgimento do estudo
da psicologia cognitiva. Um tipo de influência
é a direta – por meio de modelos de cognição
humana baseados na forma como os computadores processam a informação. Outro tipo é direto – por meio de simulações por computador
e inteligência artificial.
Nas simulações, os pesquisadores programam os computadores para imitar uma determinada função ou um processo humano. Entre
os exemplos, estão o desempenho em tarefas
cognitivas específicas (como a manipulação de
objetos no espaço tridimensional) e o desempenho de determinados processos cognitivos
(como o reconhecimento de padrões). Alguns
pesquisadores até já tentaram criar modelos de
computador de toda a arquitetura cognitiva da
mente humana. Seus modelos estimularam discussões acaloradas sobre como pode ser o funcionamento da mente como um todo (ver Capítulo 8). Por vezes, a distinção entre simulação e
inteligência artificial não é clara. Um exemplo
seria o de certos programas projetados para simular o desempenho humano e maximizar o
funcionamento ao mesmo tempo.
Juntando tudo
Os psicólogos cognitivos, muitas vezes,
ampliam e aprofundam seu entendimento da
cognição por meio da pesquisa na ciência cognitiva. A ciência cognitiva é um campo transdisciplinar que usa idéias e métodos da psicologia
cognitiva, psicobiologia, inteligência artificial,
filosofia, lingüística e antropologia (Nickerson,
2003; Von Eckardt, 2003). Os cientistas da cognição usam essas idéias e esses métodos a fim
de tratar do estudo de como os seres humanos
adquirem e usam o conhecimento. Os psicólogos cognitivos também fazem uso do trabalho
conjunto com outros tipos de psicólogos. Entre
os exemplos estão os psicólogos sociais (como
no campo transdisciplinar da cognição social),
os psicólogos que estudam a motivação e a emoção, e os profissionais da chamada psicologia da
engenharia (engineering psychologists, ou seja, os
psicólogos que estudam a interação entre seres
humanos e máquinas).
PSICOLOGIA COGNITIVA
QUESTÕES FUNDAMENTAIS E CAMPOS
DA PSICOLOGIA COGNITIVA
No decorrer deste capítulo, fizemos alusões
a alguns dos temas fundamentais que surgem
no estudo da psicologia cognitiva. Como esses
sistemas aparecem repetidas vezes nos vários
capítulos deste livro, segue-se um sumário. Algumas dessas questões vão ao próprio âmago
da natureza da mente humana.
Temas subjacentes ao estudo da
psicologia cognitiva
Se revisarmos as principais idéias deste capítulo, descobriremos alguns dos temas centrais
que são subjacentes a toda a psicologia cognitiva. Eis sete deles:
1. Inato versus adquirido: Qual é mais influente na cognição humana: aquilo que
nos é inato ou o que adquirimos? Se acreditarmos que as características inatas da
cognição humana são mais importantes,
poderemos concentrar nossa pesquisa no
estudo dessas características. Se acreditarmos que o ambiente cumpre um papel importante na cognição, poderemos realizar
uma pesquisa explorando de que forma
as características distintivas do ambiente
parecem influenciar a cognição. Hoje em
dia, a maioria dos estudiosos acredita que
os fatores inatos e os adquiridos interagem em quase tudo o que fazemos.
2. Racionalismo versus empirismo: Como podemos descobrir a verdade sobre nós mesmos e sobre o mundo em que vivemos?
Devemos fazê-lo tentando raciocinar logicamente, com base no que já sabemos? Ou
devemos fazê-lo observando e testando
nossas observações sobre o que percebemos por meio de nossos sentidos?
3. Estruturas versus processos: devemos estudar as estruturas (conteúdos, atributos
e produtos) da mente humana? Ou devemos nos concentrar nos processos de
pensamento humano?
4. Generalidade de domínio versus especificidade de domínio: Os processos que observamos são limitados a domínios únicos
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ou são gerais para uma série de domínios? As observações em um domínio se
aplicam a todos ou apenas aos domínios
específicos observados?
5. Validade das inferências causais versus validade ecológica: Devemos estudar a cognição usando experimentos altamente
controlados que aumentam a probabilidade de inferências válidas com relação
à causalidade? Ou devemos usar técnicas mais naturalistas, que aumentam a
probabilidade de se chegar a conclusões
ecologicamente válidas, mas possivelmente à custa de controle experimental?
6. Pesquisa aplicada versus pesquisa básica:
Devemos realizar pesquisa sobre processos cognitivos fundamentais? Ou devemos estudar formas de ajudar as pessoas a usar a cognição de modo eficaz
em situações práticas? Os dois tipos de
pesquisa podem ser combinados dialeticamente, de forma que a pesquisa básica
leve à pesquisa aplicada, que leva a mais
pesquisa básica, e assim por diante?
7. Métodos biológicos versus métodos comportamentais: devemos estudar o cérebro e seu
funcionamento diretamente, talvez, até
mesmo, fazendo escaneamentos no cérebro enquanto as pessoas realizam tarefas
cognitivas? Ou devemos estudar o comportamento das pessoas em tarefas cognitivas, observando medidas como porcentagem de acertos e tempo de reação?
Embora muitas dessas perguntas sejam apresentadas na forma excludente “ou...ou”, lembrese de que, muitas vezes, uma síntese de visões
ou métodos se mostra mais útil do que uma ou
outra posição extrema. Por exemplo, nossas características inatas podem proporcionar uma
estrutura herdada para nossas características e
para nossos padrões distintivos de pensamento e
ação, mas o que adquirimos pode moldar as maneiras específicas nas quais nós desenvolvemos
essa estrutura. Podemos usar métodos empíricos
para coletar dados e testar hipóteses, mas podemos usar métodos racionalistas para interpretar
os dados, construir teorias e formular hipóteses
baseadas em teorias. Nosso entendimento da
cognição se aprofunda quando consideramos
a pesquisa básica sobre os processos cognitivos
36
ROBERT J. STERNBERG
fundamentais e a pesquisa aplicada com relação
aos usos efetivos da cognição em ambientes da
vida real. As sínteses estão evoluindo de modo
permanente. Aquilo que hoje pode ser visto
como síntese, amanhã pode ser considerado
como uma posição extrema, e vice-versa.
IDÉIAS FUNDAMENTAIS NA
PSICOLOGIA COGNITIVA
Algumas idéias fundamentais parecem surgir com freqüência na psicologia cognitiva, independentemente dos fenômenos específicos estudados. A seguir, são apresentadas o que se pode
considerar como cinco idéias fundamentais.
1. Os dados na psicologia cognitiva só podem
ser entendidos completamente no contexto
de uma teoria explicativa, mas as teorias são
vazias sem dados empíricos.
A ciência não é apenas um conjunto
de fatos coletados de forma empírica. Em
lugar disso, comporta fatos que são explicados e organizados por teorias científicas. As teorias dão sentido aos dados.
Por exemplo, suponhamos que se saiba
que a capacidade das pessoas de reconhecer informações que já tenham visto
é melhor que sua capacidade de recordar
essas informações. Como exemplo, elas
são melhores em reconhecer se ouviram
uma palavra dita em uma lista do que
em se lembrar da palavra sem que ela
seja apresentada. Essa é uma generalização empírica interessante; no entanto, a
ciência exige que sejamos capazes não só
de fazer a generalização, como também
de entender por que a memória funciona
assim. Um objetivo importante da ciência é a explicação. Na ausência de uma
teoria, uma generalização empírica não
oferece uma explicação. Outro aspecto
importante é que a teoria nos ajuda a entender as limitações das generalizações
empíricas, além de quando e por que
elas ocorrem. Por exemplo, uma teoria
proposta por Tulving e Thomson (1973)
sugeria que, na verdade, o reconhecimento nem sempre deveria ser melhor
do que a recordação. Um objetivo im-
portante da ciência também é a predição.
A teoria de Tulving e Thomson levou-os
a predizer as circunstâncias sob as quais
a recordação deveria ser melhor do que
o reconhecimento. Uma coleta de dados
posterior provou que eles estavam certos. Em determinadas circunstâncias, a
recordação é até melhor do que o reconhecimento. A teoria, assim, sugeriu em
que circunstâncias, entre as muitas que
se examinam, deve haver limitações à
generalização. Sendo assim, a teoria nos
ajuda na explicação e na predição.
Ao mesmo tempo, a teoria sem dados
é vazia. Praticamente qualquer um pode
sentar-se em uma poltrona e propor uma
teoria – até mesmo uma que pareça plausível – mas a ciência requer a testagem
empírica dessas teorias. Sem essa testagem, as teorias permanecem meramente
especulativas, de forma que teorias e dados dependem entre si. As teorias geram
coleta de dados, os quais ajudam a corrigir as teorias, o que, então, leva a mais
coletas de dados, e assim por diante. É
por meio dessa interação entre teoria e
dados que aumentamos o conhecimento
científico.
2. A cognição geralmente é adaptativa, mas não
em todas as circunstâncias específicas.
Ao pensarmos em todas as formas
nas quais se podem cometer erros, é impressionante o quanto nossos sistemas
cognitivos operam bem. A evolução nos
serviu muito bem na moldagem do desenvolvimento de um aparato cognitivo
que é capaz de decodificar com precisão
os estímulos ambientais, além de entender os estímulos internos que compõem
a maior parte das informações disponíveis a nós. Podemos perceber, aprender,
lembrar, raciocinar e resolver problemas
com grande precisão. E o fazemos ainda
que isso nos seja dificultado constantemente por uma grande quantidade de
estímulos. Qualquer estímulo poderia
com facilidade nos distrair do processamento adequado das informações, mas
os mesmos processos que nos levam a
perceber, lembrar e raciocinar com precisão, na maioria das situações, também
PSICOLOGIA COGNITIVA
podem nos desviar. Nossas memórias
e nossos processos de raciocínio, por
exemplo, são suscetíveis a certos erros
sistemáticos, bem identificados. Por
exemplo, tendemos a supervalorizar a
informação que está disponível a nós, e
o fazemos mesmo quando essa informação não é totalmente relevante ao problema que temos em mãos. Em geral, todos
os sistemas – naturais ou artificiais – são
baseados em compensações. As mesmas
características que os tornam bastante
eficientes em uma ampla variedade de
circunstâncias podem torná-los ineficientes em circunstâncias específicas.
Um sistema que seria extremamente eficiente em cada circunstância específica
seria ineficiente em uma ampla variedade de circunstâncias, apenas porque se
tornaria complicado e complexo demais.
Portanto, os seres humanos representam
uma adaptação eficiente, mas imperfeita, dos ambientes que enfrentam.
3. Os processos cognitivos interagem uns com
os outros e com processos não-cognitivos.
Embora tentem estudar e, muitas vezes, isolar o funcionamento de processos cognitivos específicos, os psicólogos
cognitivos sabem como esses processos
podem trabalhar juntos. Por exemplo,
os processos de memória dependem de
processos de percepção. O que lembramos depende em parte do que percebemos. Da mesma forma, os processos de
pensamento dependem em parte dos
processos de memória: não se pode refletir sobre aquilo que não é lembrado.
Entretanto os processos não-cognitivos
também interagem com os cognitivos.
Por exemplo, aprendemos melhor quando estamos motivados para aprender.
Em contrapartida, nossa aprendizagem
talvez seja reduzida se estivermos chateados com alguma coisa e não conseguirmos nos concentrar na tarefa de
aprendizagem em questão. Sendo assim,
psicólogos cognitivos procuram estudar
os processos cognitivos não apenas de
forma isolada, como também em suas
interações uns com os outros e com os
processos não-cognitivos.
37
Uma das áreas mais interessantes da
psicologia cognitiva hoje em dia é a interface entre os níveis cognitivo e biológico
de análise. Nos últimos anos, por exemplo, tornou-se possível localizar a atividade no cérebro associada a vários tipos
de processos cognitivos; porém, é preciso ter cuidado com a conclusão de que a
atividade biológica é causal em relação à
atividade cognitiva. A pesquisa demonstra que a aprendizagem que causa mudanças no cérebro – em outras palavras,
os processos cognitivos – pode afetar as
estruturas biológicas da mesma maneira
que elas podem afetar os processos cognitivos. Dessa forma, as interações entre
cognição e outros processos podem acontecer em muitos níveis. O sistema cognitivo não opera de maneira isolada; ele funciona em interação com outros sistemas.
4. A cognição deve ser estudada por meio de
uma série de métodos científicos.
Não há uma forma certa de estudar
a cognição. Pesquisadores ingênuos, às
vezes, buscam o “melhor” método com
o qual fazer esse estudo. Sua busca inevitavelmente será em vão, pois todos os
processos cognitivos precisam ser estudados por meio de diversas operações
convergentes, ou seja, de métodos variados de estudo que buscam um entendimento comum. Quanto mais diferentes
tipos de técnicas levarem à mesma conclusão, maior a confiança que se pode ter
nessa conclusão. Por exemplo, suponhamos que estudos de tempos de reação,
taxas de erro e padrões de diferenças
individuais levem, todos, à mesma conclusão. Assim, pode-se ter muito mais
confiança na conclusão do que se apenas
um método levasse a essa conclusão.
Os psicólogos cognitivos precisam
aprender uma série de diferentes tipos
de técnicas para fazer bem seu trabalho.
Contudo, todos esses métodos devem
ser científicos. Os métodos científicos diferem de outros no sentido de que oferecem a base para a natureza autocorretiva
da ciência. Com o passar do tempo, corrigimos nossos erros. A razão para isso
é que os métodos científicos nos permi-
38
ROBERT J. STERNBERG
tem refutar nossas expectativas quando elas estão equivocadas. Os métodos
não-científicos não apresentam essa característica. Por exemplo, os métodos de
investigação que dependem apenas da
fé ou da autoridade para determinar a
verdade podem ter valor em nossas vidas, mas não são científicos e por isso
não são autocorretivos. Na verdade,
as palavras de uma autoridade podem
ser substituídas pelas de outra amanhã,
sem que se saiba qualquer coisa nova
sobre o fenômeno a que as palavras se
aplicam. Como o mundo aprendeu há
muito tempo, o fato de que importantes
dignitários digam que a Terra está no
centro do universo não faz com que isso
seja verdade.
5. Toda a pesquisa básica em psicologia cognitiva pode levar a aplicações e toda a pesquisa
aplicada pode levar a conhecimentos básicos.
Os políticos e, às vezes, até mesmo
os cientistas, gostam de fazer distinções
claras entre a pesquisa básica e a aplicada, mas a verdade é que a distinção, em
geral, não é nem um pouco clara. Pesquisas que pareciam ser básicas acabam
levando a aplicações imediatas. Da mesma forma, pesquisas que parecem que
serão aplicadas, por vezes, levam rapidamente a conhecimentos básicos, haja ou
não aplicações imediatas. Por exemplo,
uma conclusão básica da pesquisa sobre
aprendizagem e memória é que a aprendizagem é melhor quando distribuída no
tempo do que quando é amontoada em
um intervalo curto. Essa conclusão básica tem uma aplicação imediata a estratégias de estudo. Ao mesmo tempo, as pesquisas sobre testemunhos oculares, que
parecem, à primeira vista, ser bastante
aplicadas, melhoraram nosso entendimento dos sistemas de memória e de até
onde os seres humanos constroem suas
próprias memórias. Ela não reproduz
apenas o que acontece no ambiente.
Antes de encerrar este capítulo, pense
sobre alguns dos campos da psicologia
cognitiva, descritos nos capítulos restantes, aos quais esses temas e essas questões
fundamentais possam ser aplicados.
Panorama dos capítulos
Os psicólogos cognitivos têm se envolvido
no estudo de uma ampla gama de fenômenos
psicológicos, o qual inclui não apenas a percepção, a aprendizagem, a memória e o pensamento, como também fenômenos que aparentemente são de orientação menos cognitiva,
como emoção e motivação. Na verdade, quase
qualquer tópico de interesse psicológico pode
ser estudado de uma perspectiva cognitiva.
Não obstante, há algumas áreas principais de
interesse dos psicólogos cognitivos. Neste livro,
tentamos descrever algumas das respostas preliminares para as perguntas feitas pelos pesquisadores nas principais áreas de interesse.
Capítulo 2 Neurociência cognitiva – Quais são
as estruturas e os processos do cérebro
humano que estão por trás das estruturas
e dos processos da cognição humana?
Capítulo 3 Atenção e consciência – Quais são
os processos mentais básicos que regem
a forma como a informação entra em
nossa mente, em nossa consciência e em
nossos processos de alto nível para tratar
a informação?
Capítulo 4 Percepção – Como a mente humana percebe o que os sentidos recebem?
Como a mente humana adquire distintivamente a percepção de formas e padrões?
Capítulo 5 Memória: modelos e métodos de pesquisa – De que forma tipos diferentes de
informação (por exemplo, nossas experiências relacionadas a um evento traumático, os nomes dos presidentes dos
Estados Unidos ou o procedimento para
se andar de bicicleta) são representados
na memória?
Capítulo 6 Processos de memória – Como levamos a informação para a memória,
como a mantemos lá e como a recuperamos da memória quando é necessário?
Capítulo 7 Representação do conhecimento na
memória: imagens e proposições – Como representamos mentalmente as informações
em nossas mentes? Fazemos isso com palavras, imagens ou com alguma outra forma para representar sentido? Ou temos
múltiplas formas de representação?
PSICOLOGIA COGNITIVA
Capítulo 8 Representação e organização de
conhecimento na memória: conceitos, categorias, redes e esquemas – Como organizamos mentalmente o que sabemos? Como
manipulamos e operamos com relação ao
conhecimento – fazemos isso por processo em série, por meio de processamento
paralelo ou por meio de alguma combinação de processos?
Capítulo 9 Linguagem: natureza e aquisição –
Como deduzimos e produzimos sentido
por meio da linguagem? De que forma
adquirimos a linguagem, tanto nossa
primeira língua como outras?
Capítulo 10 Língua em contexto – De que
forma o uso da linguagem interage com
nossas formas de pensamento? Como
nosso mundo social interage com nosso
uso da linguagem?
Capítulo 11 Solução de problemas e criatividade
– Como solucionamos problemas? Quais
processos nos ajudam e quais nos impedem de atingir soluções para problemas?
Por que alguns de nós são mais criativos
do que outros? Como nos tornamos e
permanecemos criativos?
Capítulo 12 Tomada de decisões e raciocínio
– De que forma chegamos a decisões
39
importantes? Como tiramos conclusões
razoáveis das informações que nos estão
disponíveis? Por que e como, com tanta
freqüência, tomamos decisões inadequadas e chegamos a conclusões incorretas?
Capítulo 13 Inteligência artificial e humana –
Por que consideramos algumas pessoas
mais inteligentes do que outras? Por que
algumas pessoas parecem mais capazes
de atingir o que querem nos campos que
escolhem?
Neste livro, procuro enfatizar as idéias
comuns e os temas organizadores de vários
aspectos da psicologia cognitiva, em lugar de
simplesmente apresentar os fatos. Segui esse
caminho para ajudar o leitor a perceber padrões consideraveis e significativos no domínio da psicologia cognitiva. Também tentei lhe
oferecer alguma idéia de como os psicólogos
cognitivos pensam e como estruturam seu campo em seu trabalho cotidiano. Espero que essa
abordagem venha a lhe ajudar a examinar os
problemas da psicologia cognitiva em um nível
mais profundo do que seria possível sem ela.
No final, o objetivo dos psicólogos cognitivos
é entender não apenas como as pessoas podem
pensar em seus laboratórios, mas, também
como elas pensam em suas vidas cotidianas.
RESUMO
1. O que é psicologia cognitiva? A psicologia
cognitiva é o estudo de como as pessoas
percebem, aprendem, lembram e pensam a
informação.
2. De que forma a psicologia desenvolveuse como ciência? Começando com Platão
e Aristóteles, as pessoas refletiram sobre
como adquirir conhecimento da verdade.
Platão sustentava que o racionalismo oferece um caminho claro à verdade, ao passo
que Aristóteles defendia o empirismo como
caminho ao conhecimento. Séculos mais
tarde, Descartes ampliou o racionalismo
de Platão, enquanto Locke elaborava sua
teoria a partir do empirismo de Aristóteles.
Kant ofereceu uma síntese desses opostos
aparentes. Décadas depois de Kant propor
sua síntese, Hegel observou como a histó-
ria das idéias parecia avançar por meio de
um processo dialético.
3. Como a psicologia cognitiva desenvolveuse a partir da psicologia? No século XX, a
psicologia havia surgido como um campo
distinto de estudos. Wundt concentrouse nas estruturas da mente (levando ao
estruturalismo), enquanto James e Dewey
trataram dos processos da mente (funcionalismo). A partir dessa dialética, surgiu o associacionismo, defendido por Ebbinghaus
e Thorndike, que abriu o caminho para o
behaviorismo ao sublinhar a importância
das associações mentais. Outro passo rumo
ao behaviorismo foi a descoberta de Pavlov
dos princípios do condicionamento clássico. Watson e, mais tarde, Skinner foram
os principais proponentes do behaviorismo,
40
ROBERT J. STERNBERG
que se concentrava totalmente nas ligações
observáveis entre o comportamento de um
organismo e as contingências ambientais
particulares que fortaleciam ou enfraqueciam a probabilidade de que determinados
comportamentos se repetissem. A maioria
dos behavioristas descartava por completo a noção de que há mérito na tentativa dos psicólogos de entender o que está
acontecendo na mente do indivíduo que
desenvolve o comportamento. Entretanto,
Tolman e pesquisadores behavioristas posteriores observaram a influência dos processos cognitivos sobre o comportamento.
Uma convergência de avanços em muitos
campos levou ao surgimento da psicologia
cognitiva como uma disciplina específica,
sendo Neisser um dos notáveis expoentes.
4. Como outras disciplinas contribuíram
para o desenvolvimento da teoria e da
pesquisa em psicologia cognitiva? A psicologia cognitiva tem raízes na filosofia e
na fisiologia, que se fundiram para formar
o núcleo da psicologia.
Como campo distinto de estudo psicológico, a psicologia cognitiva também se
serviu das investigações transdisciplinares. Entre os campos relevantes estão a lingüística (por exemplo, como a linguagem
e o pensamento interagem?), a psicologia
biológica (quais são as bases fisiológicas
da cognição), a antropologia (por exemplo,
qual é a importância do contexto cultural
para a cognição) e os avanços tecnológicos,
como a inteligência artificial (como os computadores processam a informação?).
5. Quais métodos os psicólogos cognitivos
usam para estudar o modo como as pessoas pensam? Os psicólogos cognitivos
usam uma ampla gama de métodos, incluindo experimentos, técnicas psicobiológicas, auto-avaliações, estudos de caso,
observação naturalista, além de simulações
por computador e inteligência artificial.
6. Quais são as questões atuais e os vários
campos de estudo da psicologia cognitiva?
Algumas das principais questões no campo
concentraram-se em como buscar o conhecimento. O trabalho psicológico pode ser feito:
• usando o racionalismo (que é a base para o
desenvolvimento de teorias) e o empirismo (que é a base para a coleta de dados);
destacando a importância das estruturas
cognitivas e dos processos cognitivos;
• enfatizando o estudo do processamento
que é geral ou específico em relação ao
domínio;
• esforçando-se na busca de um alto grau
de controle experimental (que favorece
as inferências causais) e de um alto grau
de validade ecológica (que permite melhor generalização de conclusões para
ambientes fora do laboratório);
• realizando pesquisa básica a fim de obter conhecimentos fundamentais sobre
cognição e pesquisa aplicada em busca
de usos eficazes para a cognição em ambientes reais.
Embora as posições sobre essas questões
possam parecer diametralmente opostas,
muitas vezes, visões que parecem antitéticas podem ser sintetizadas de forma que
ofereça o melhor de cada um dos pontos de
vista opostos.
Os psicólogos cognitivos estudam as
bases biológicas da cognição, bem como a
atenção, a consciência, a percepção, a memória, o imaginário, a linguagem, a solução de problemas, a criatividade, a tomada
de decisões, o raciocínio, as mudanças na
cognição em termos de desenvolvimento
que ocorrem durante a vida, a inteligência
humana, a inteligência artificial e vários
outros aspectos do pensamento humano.
Pensando sobre o pensamento: questões factuais, analíticas,
criativas e práticas
1. Descreva as principais escolas históricas
de pensamento psicológico que levaram
ao desenvolvimento da psicologia cognitiva.
2. Descreva algumas das formas com que a
psicologia, a lingüística e a inteligência artificial contribuíram para o desenvolvimento
da psicologia cognitiva.
PSICOLOGIA COGNITIVA
3. Compare as influências de Platão e Aristóteles sobre a psicologia.
4. Analise como vários métodos de pesquisa
na psicologia cognitiva refletem das abordagens empirista e racionalista à aquisição
de conhecimento.
5. Faça um primeiro esboço de uma investigação cognitivo-psicológica envolvendo um
dos métodos de pesquisa descritos neste
capítulo. Aponte as vantagens e as desvantagens de usar esse método específico para
sua investigação.
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6. Este capítulo descreve a situação atual do
campo da psicologia cognitiva. Como se
pode especular que ele mudará nos próximos 50 anos?
7. Como um conhecimento obtido a partir da
pesquisa básica pode levar a usos práticos
em um ambiente cotidiano?
8. Como um conhecimento obtido a partir da
pesquisa aplicada pode levar a um entendimento aprofundado das características
fundamentais da cognição?
Termos fundamentais
associacionismo
funcionalismo
psicologia da Gestalt
behaviorismo
hipóteses
racionalismo
ciência cognitiva
Inteligência artificial (IA)
significância estatística
cognitivismo
introspecção
teoria
empirismo
pragmatismo
validade ecológica
estruturalismo
psicologia cognitiva
Sugestões de leitura comentadas
Nadel, L. (Ed.) (2003). Encyclopedia of cognitive
science (4 vols.). London, England: Nature
Publishing Group. Uma análise detalhada
de tópicos em toda a gama das ciências cognitivas. Os verbetes são classificados por
dificuldade.
Wilson, R. A., e Keil, F. C. (Eds.) (1999). The MIT
encyclopedia of cognitive sciences. Cambridge,
MA: MIT Press. Verbetes sobre toda a gama
de tópicos que constituem o estudo da ciência cognitiva.