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Interações em e-learning em ensino superior

2020, Pedagogias Digitais no Ensino Superior

Neste texto apresento alguns aspectos relevantes vinculados aos processos de interação existentes em cursos online. Destaco três tipos de interações, distintas e interdependentes: a que ocorre entre os recursos (digitais ou não), indispensáveis para o desenvolvimento das situações de ensino; as interações didáticas, entre conteúdos e atividades; e as interações humanas. Ressalto a importância das interações humanas, sobretudo em cursos online regulares de ensino superior, para a melhor aprendizagem dos participantes. A interação humana aqui compreendida é caracterizada em diversas categorias, desde as relações humano-computador até os estágios de envolvimento pessoal e grupal dos estudantes visando o aprendizado colaborativo e cidadão. Palavras-chave: ensino superior-e-learning-interações 1. Importância das interações no ensino e na aprendizagem A construção do conhecimento e a interação humana estão na base das relações de ensino e aprendizagem em todos os tipos de formações e níveis educacionais, presenciais ou em e-learning. Na cultura educacional formal, desenvolvida em escolas e universidades, o termo "interação" tornou-se expressão comum para dizer das necessidades básicas para viabilização de boas aprendizagens, sem definição clara sobre a que se refere e dos seus múltiplos sentidos. O termo é amplo e não há consenso em relação à uma única e abrangente definição para "interação". A expressão-interação-é empregada nos mais diferenciados campos do conhecimento com significados específicos, vinculados às respectivas áreas de

Interações em e-learning no ensino superior Profa. Dra. Vani Moreira Kenski(USP) Resumo: Neste texto apresento alguns aspectos relevantes vinculados aos processos de interação existentes em cursos online. Destaco três tipos de interações, distintas e interdependentes: a que ocorre entre os recursos (digitais ou não), indispensáveis para o desenvolvimento das situações de ensino; as interações didáticas, entre conteúdos e atividades; e as interações humanas. Ressalto a importância das interações humanas, sobretudo em cursos online regulares de ensino superior, para a melhor aprendizagem dos participantes. A interação humana aqui compreendida é caracterizada em diversas categorias, desde as relações humano-computador até os estágios de envolvimento pessoal e grupal dos estudantes visando o aprendizado colaborativo e cidadão. Palavras-chave: ensino superior - e-learning - interações 1. Importância das interações no ensino e na aprendizagem A construção do conhecimento e a interação humana estão na base das relações de ensino e aprendizagem em todos os tipos de formações e níveis educacionais, presenciais ou em e-learning. Na cultura educacional formal, desenvolvida em escolas e universidades, o termo “interação” tornou-se expressão comum para dizer das necessidades básicas para viabilização de boas aprendizagens, sem definição clara sobre a que se refere e dos seus múltiplos sentidos. O termo é amplo e não há consenso em relação à uma única e abrangente definição para “interação”. A expressão – interação - é empregada nos mais diferenciados campos do conhecimento com significados específicos, vinculados às respectivas áreas de estudo. Em geral, o conceito de interação relaciona-se à uma ação, ou processo, que ocorre entre entes e que gera reações em todos os envolvidos. Para Piccinnini et al. (2001), a tendência entre os autores é a de relacionar interação com a questão da ação recíproca, da co-construção e da bidirecionalidade. Neste sentido, o ensinar e o aprender são, por si só, ações que exigem esta reciprocidade. O processo de ensino-aprendizagem é um complexo sistema de interações. Esta complexidade mobiliza pesquisadores para definir as melhores condições de interação que viabilizem aprendizagens em diferenciados contextos. Costa e Barros (2016) se apoiam em Yves Lenoir (2014) para afirmarem que a mediação didática do professor e as interações entre os alunos pode levar o aluno a alcançar níveis cognitivos superiores, a compreender as funções sociais do conhecimento e a desenvolver valores humanos necessários à convivência social e ainda a renovar regularmente o desejo de aprender. (p. 284/285) Na educação formal, a maior incidência de estudos sobre interação se orienta para as ações realizadas entre os agentes humanos envolvidos no processo: professores e alunos. Realmente, as ações realizadas pelos dois protagonistas do processo de ensino são centrais, mas não são as únicas formas de interação vigentes e que contribuem para boas aprendizagens. Outros entes estão presentes e condicionam todo o processo. O uso de inovações tecnodigitais na educação – que garantem a personalização do ensino e sua adaptação ao ritmo e estilo de cada estudante - ampliou a necessidade de se compreender os diversos formatos das interações que ocorrem em situações didáticas mediadas. Como diz Newman(2017): “As faculdades e universidades estão criando espaços de aprendizado mais informais, porque entendem a importância de criar e colaborar 24 horas por dia, 7 dias por semana, e não apenas quando a aula está em andamento 1. 1 Colleges and universities are creating more informal campus learning spaces because they understand the importance of creating and collaborating 24/7, not just when class is in session. Na atualidade, os nossos desafios na relação interação e aprendizagem vão muito além do espaço fechado das salas de aula – presenciais ou virtuais – e das trocas comunicativas entre professores e alunos. Os avanços tecnológicos digitais operam ações revolucionárias na educação e ampliam a importância da interação como elemento essencial na construção do conhecimento. Os ambientes interativos de última geração, dialogam com os usuários e buscam atender suas necessidades de aprendizagem de forma personalizada. O grande desafio é que à medida que as expectativas desses alunos aumentam, a capacidade de resposta pedagógica a essas necessidades também precisa aumentar. É neste sentido que Cristou (2010), ao falar da importância dos ambientes de realidade virtual para a educação, aponta que A interação entre os sentidos, os benefícios da integração sensorial e uma visão construtivista da aprendizagem, apoiam o uso de paradigmas de aprendizagem nos quais o aprendiz pode formar conhecimento através do contexto e da experiência. VR é ideal para isso. O uso da VR proporciona um ambiente multissensorial e interativo que é envolvente e permite que os alunos construam um significado a partir da experiência 2(p. 7). O assunto é amplo e demanda várias reflexões. Neste texto o meu foco para pensar em algumas dessas interações que ocorrem na esfera educacional está orientado para as características específicas do ensino superior online, a distância. Novas e diferenciadas interações - técnicas, didáticas e humanas – precisam ser consideradas no momento de desenvolvimento dos processos formativos na modalidade. Sigo, assim, o caminho apresentado por Costa e Barros (2016), quando se referem aos estudos de Hrastinski (2008), para dizer que as interações no e-learning envolvem dimensões mais complexas, influenciadas pelas interfaces digitais, os aplicativos e recursos em uso nos ambientes virtuais, os formatos de apresentação, o desenvolvimento dos conteúdos, os papeis e solicitações de atuação dos estudantes, as diversas 2 the interaction between senses, the benefits of sensory integration and a constructivist view of learning, support the use of learning paradigms in which the learner is allowed to form knowledge through context and experience. VR is ideally suited for this. The use of VR provides a multi-sensory, interactive environment that is engaging and that allows learners to construct meaning from experience. avaliações e o acompanhamento e comunicabilidade entre todos os participantes. As interações ocorridas nos espaços formativos requerem estudos aprofundados, sobretudo em relação às novas formas de relação humanocomputador, presentes nos ambientes virtuais personalizados de ensino. O protagonismo do aluno em relação ao seu aprendizado digitalmente mediado e as interlocuções possíveis nas plataformas inteligentes geram novos tipos de interações que redefinem os caminhos do aprendizado de acordo com as necessidades de cada usuário. Nesta amplitude, destaco no texto apenas três tipos diversos de interações em e-learning: as relacionadas com os ambientes e recursos virtuais; a interação didática e a vivenciada entre os participantes do processo educativo. 2. Tipos de interações em e-learning A. O “ambiente virtual” como “interface interativa” A primeira e mais frequente interação de um estudante que ingressa em um curso online é com o ambiente virtual. Ele está motivado para acessar o ambiente virtual e adentrar em um novo espaço de aprendizado. Suas expectativas o levam a considerar suas interações com professores, outros estudantes e técnicos, quando for necessário. Raramente, no entanto, ele identifica o seu encontro com as interfaces e a navegação em tela. E elas assumem importância crucial em seu processo de aprendizagem. O estudante de ensino superior em e-learning precisa entrar no ambiente constantemente, para acessar conteúdos em diferenciados formatos e realizar as atividades. Mesmo quando realiza trocas comunicativas com professores e colegas do curso, suas ações são mediadas pelos recursos do ambiente. Mais do que uma sala de aula, o ambiente virtual em que se situam os processos de ensino-aprendizagem é um meio que dialoga e interage de forma constante com os estudantes. Muitas vezes as dificuldades de aprendizagem não se vinculam aos conteúdos e atividades previstas, mas às condições de usabilidade dos ambientes e recursos digitais em que o curso é disponibilizado. A preocupação didática, ao realizar os planejamentos dos cursos, não atinge o design dos ambientes virtuais e suas funcionalidades, para adequá-los às necessidades de aprendizagem dos usuários. Estes são trabalhados por especialistas em tecnologias que têm como maior preocupação o funcionamento dos recursos. As inúmeras questões ligadas à usabilidade de equipamentos e recursos digitais, de acordo com os usuários, tem sido trabalhadas por uma nova e cada dia mais ampla área, o Design de Interação. Segundo Arnold(2011), “a preocupação central do Design de Interação é projetar produtos interativos que sejam de fácil aprendizagem, eficazes no uso e capazes de proporcionar ao usuário uma experiência gratificante”. Ao procurar garantir, de forma interdisciplinar – com o apoio de diversas áreas do conhecimento como: a informática, o design, a psicologia e a educação – o desenvolvimento de projetos com melhor qualidade de aprendizagem para pessoas, com os mais diferenciados estilos de aprendizagem e fluência tecnológica, o Design de Interação se apresenta como processo. Um processo que engloba fases, testes e vários tipos de avaliações. Quando orientado para as ações em e-learning, sua maior preocupação é a de identificar as características dos usuários e os seus objetivos para acesso e realização das múltiplas ações no curso online. Sua meta é a de garantir a perfeita interação entre o estudante e as interfaces que viabilizam o acesso e uso dos dispositivos virtuais de aprendizagem. Um bom Design de Interação objetiva desenvolver a melhor relação humano-tecnologia. Um bom Design é invisível, passa despercebido pelo usuário que, por meio dele, acessa o espaço amigável do ambiente virtual do curso, realiza navegação intuitiva pelos recursos didáticos disponíveis e desenvolve experiências significativas para sua aprendizagem. Há mais de uma década as relações entre emoção e design digital são também estudadas em um novo campo do conhecimento, paralelo e, em alguns aspectos, muito próximo do Design de Interação, que é o Design Emocional. Na perspectiva deste último, o envolvimento emocional do estudante com as interfaces do ambiente são essenciais para a viabilização do processo educacional. Esse equilíbrio entre funcionalidade e emoção, amplifica a ambos e resulta positivamente. Neste mesmo caminho, em 2004, Don Norman lançou o livro “Emotional Design” em que introduziu a ideia de que o design do produto- no nosso caso o ambiente virtual - deveria abordar três níveis diferentes de processamento cognitivo e emocional: visceral, comportamental e reflexivo. Norman explica que no nível visceral, o usuário reage aos aspectos visuais e sensoriais de um produto antes mesmo que a interação significativa ocorra. Por exemplo, ao acessarmos qualquer ambiente virtual, rede ou portal, o processamento visceral nos alerta se o que vemos na tela nos agrada ou é seguro. O nível comportamental nos ajuda a realizar processamentos cognitivos para administrar comportamentos simples e cotidianos, hábitos e trajetos que, segundo Norman, constituem a maioria das ações humanas. Este nível se relaciona diretamente com as condições de interação e as condições de usabilidade oferecidas pelo ambiente. Já o nível reflexivo envolve consideração consciente e reflexão sobre experiências passadas, memórias e a integração com conhecimentos mais amplos, adquiridos em outras situações de vida e que, no caso dos ambientes virtuais, pode nos tornar mais próximos ou não, das interfaces do ambiente. Segundo Arnold (2011), existem três características que constituem parte fundamental do processo de design preocupado com a interação: foco no usuário, critérios de usabilidade específicos e iteração. Para a autora, o foco no usuário é a base central do processo de interação. Os critérios de usabilidade relacionam-se com todas as ações dos designers baseadas em maior conhecimento dos usuários para criar espaços digitais facilitadores e atraentes. Já a iteração, para Arnold (2011), permite refinar o design com base em feedbacks, que são obtidos na medida em que usuários e designers se envolvem com o projeto e passam a discutir requisitos, necessidades, desejos e aspirações, fundamentados em ideias diversificadas a respeito do que é realmente necessário e do que é viável (p. 9). Alguns dos focos de atenção para o desenvolvimento de ambientes de cursos online com um ótimo grau de interação estrutural e emocional referem-se à sua adequação aos objetivos educacionais propostos e às condições de usabilidades dos estudantes. Neste sentido, merecem destaque os aspectos ligados ao: • Design visual e navegação • Mecanismos de pesquisa • Acessibilidade • Percepção Visual: layout, cor, fontes, imagens, formulários... • Adequação a dispositivos móveis... • Adequação das estruturas às propostas de atividades, textos, vídeos e estratégias didáticas • Interação com recursos e dispositivos inovadores, como IA, deep learning... A navegação amigável, adequada ao nível de fluência tecnológica dos estudantes, garante a estes o domínio do ambiente, o despertar das características emocionais positivas em relação ao processo, o desenvolvimento de iniciativas de personalização dos caminhos e a criação de experiências significativas. Boas condições de navegabilidade e uso dos recursos disponíveis nos ambientes virtuais de aprendizagem predispõem emocionalmente os estudantes para o acesso, a participação e as demais formas de interação em e-learning. B. Interação didática Para identificar com maior precisão os processos de interação didática em elearning integro-os nos cuidados para o planejamento e produção de cursos que favoreçam o aprendizado e as trocas comunicativas, de acordo com os objetivos propostos. A interação didática diz respeito à comunicabilidade necessária entre o ambiente virtual, os conteúdos e as atividades. Refere-se também à interação da proposta do curso com o modelo pedagógico estabelecido pela instituição; com a estrutura do processo formativo; as avaliações; os procedimentos e as normas que orientam a atuação dos professores e estudantes na instituição. A preocupação didática vai muito além da seleção dos materiais, dos recursos e atividades que serão disponibilizados no ambiente virtual para serem desenvolvidos em cada aula. Na produção do curso há necessidade de ir além da formatação da aula como “uma lista de conteúdos publicados na rede” (Beurlen, Coelho e Kenski, 2006). Em relação aos conteúdos, é preciso que, por exemplo, textos, imagens, vídeos e as atividades dialoguem entre si. Que o estudante, ao ter contato com todos os recursos disponíveis em uma aula, sinta que são complementares, que se articulam para lhe oferecer as melhores condições para o seu aprendizado. Não são raros os exemplos de cursos em que textos e vídeos não abordam os mesmos assuntos ou não convergem para o mesmo foco e nem se relacionam com os exercícios propostos. Posicionamentos desencontrados sobre o mesmo tema e atividades abertas e mal orientadas causam incertezas nos alunos sobre o que é mais relevante, o que é preciso realizar. Prejudicam o aprendizado e afetam o próprio interesse dos estudantes. A interação didática entre conteúdos e atividades, sobretudo entre os que são realizados em e-learning, constrói diálogos entre formatos diversos para trabalhar e aprender o mesmo assunto, favorecendo o respeito aos estilos de aprendizagem dos alunos. A interação engloba também as propostas de comunicação didática nos temas debatidos nos fóruns e chats. Neste sentido, é preciso que os fóruns sejam orientados primordialmente para trocas comunicativas sobre o que está sendo trabalhado. Que todos tenham conhecimento das principais regras de convivência virtual e dos mecanismos para manter a conversação, sem sair do foco dos temas propostos para o debate. Espaço central da intercomunicação em um curso, os fóruns viabilizam o compartilhamento de conhecimentos por meio de trocas de experiências e informações. Possibilitam o desenvolvimento do raciocínio crítico e a melhor compreensão dos conceitos trabalhados em aula. A interação didática é também preocupação presente nos espaços de feedback em que professores buscam auxiliar os alunos em suas dúvidas e necessidades de orientação. Oferecer feedback personalizado que vá ao encontro das urgências do estudante favorece a compreensão e o aprendizado. A falta de resposta ou o envio de mensagem genérica e despersonalizada diminuem as possibilidades de interação entre os participantes e aumentam o desinteresse e as dificuldades do aprendiz. Estes cuidados precisam ser “ensinados” às plataformas personalizadas de elearning. Elas interagem com o estudante e coletam informações, na medida em que ele participa das ações previstas no ambiente virtual. Essas informações são processadas e utilizadas, posteriormente, para fornecer feedback instantâneo ao aluno e ajustar de forma personalizada a sua experiência de aprendizado. Nas interações com o estudante o ambiente altera automaticamente o que vem a seguir em uma sequência, seja um conteúdo ou uma ordem diferente nas atividades, em resposta a como o aluno está se saindo. Nem sempre, no entanto, esta interlocução vai ao encontro das questões e dúvidas que o aluno tem, não por falta de conteúdo, mas pela fala, a forma como a interlocução homemmáquina acontece. Um exemplo, está no uso de termos regionais, que são mal compreendidos em outros lugares, que usam a mesma expressão para se referir a situações bem diferentes. À diversidade de recursos presentes em uma aula online somam-se as ações realizadas nos momentos presenciais. Estágios, trabalhos de campo, práticas de laboratório complementam o aprendido nos momentos virtuais e devem estar em total consonância com o que foi aprendido a distância. A interação didática preocupa-se portanto com a integração e harmonia entre todos os meios e processos pedagógicos desencadeados em cada tema de um curso de forma que o aluno possa ter condições de aprender com qualidade, articulando os saberes. C. Interação Humana e entre Humanos - Interação entre equipes para produção em e-learning Diversos são os tipos de interação humana existentes em todas as fases de planejamento, produção e oferecimento de formações em e-learning. Diversas equipes multidisciplinares - formadas por professores, técnicos, designers, equipes de vídeo e outros profissionais – atuam no processo, o que leva Newman (2017), dizer que “à medida que as instituições de ensino continuam a seguir em frente e adotar essas tendências de transformação digital, devemos considerar o atual paradigma de instrução tecnológica e avançar para uma abordagem baseada em equipe”. A partir dos mesmos objetivos de aprendizagem, cada equipe tem responsabilidades diferentes que convergem para a viabilização de cada aula, cada momento do curso. O ideal é que esses profissionais atuem em colaboração, com o máximo de interação em cada etapa da produção. Este processo de interação entre equipes envolve disciplina, cumprimento de prazos, comunicação e troca de informações entre os participantes nas diversas etapas produção do material didático que, ao final, precisa constituir um único material com sentido e com elementos que estimulem o aprendizado do aluno (MARTINS, 2011). A interação entre equipes para a elaboração do mesmo material didático requer momentos de cocriação que, como apresenta Gabarrone (2017), diz respeito ao processo de produção coletiva, essencial para o preparo de textos, atividades e recursos didáticos com imagens, animações e vídeos integrados, que possam convergir para o mesmo sentido. - Interação cognitiva com os conteúdos A interação pessoal do estudante com os conteúdos engloba sua relação cognitiva com o que é apresentado para o seu aprendizado e, também, seus valores, habilidades e hábitos de estudo para vivenciar o processo formativo em pauta. A memória educativa do aluno em relação ao tema a ser estudado também entra em cena e viabiliza ou não seu interesse e predisposição ao aprendizado. Importante é se considerar que a interação cognitiva não designa, apenas a ação solitária e isolada do aluno, mas a maneira como este se relaciona com o conhecimento e os seus estilos personalizados de aprendizagem. Envolve também sua participação no ambiente para tirar dúvidas, para discutir ou para buscar mais informações sobre o assunto. O estudante online precisa ser estimulado a continuar e ser bem sucedido em seus movimentos para aprender por meio de feedbacks, trocas interativas com seus colegas e professores, interlocuções positivas com o próprio meio digital. Em termos ideais, o ensino atraente deve despertar no estudante um estado mental, caracterizado como flow, por Csikszentmihalyi (2008), que diz que “As atividades mais agradáveis não são naturais; eles exigem um esforço que inicialmente é relutante em fazer. Mas uma vez que a interação começa a fornecer feedback para as habilidades da pessoa, ela geralmente começa a ser intrinsecamente gratificante.” 3 (p.68) 3 “Most enjoyable activities are not natural; they demand an effort that initially one is reluctant to make. But once the interaction starts to provide feedback to the person's skills, it usually begins to be intrinsically rewarding”. O encontro entre estudante e os conteúdos que precisam ser aprendidos é desafiador. No início, este esforço, como bem diz Csikszentmihalyi, não é fácil e provoca reações emocionais que podem gerar desânimo, desinteresse e abandono. Para alterar este quadro é fundamental que ocorram feedbacks. Retornos interativos e compensadores que valorizem os esforços entre as prévias “habilidades da pessoa”, o conhecimento e as suas aprendizagens. Cursos online que ofereçam diversas situações de aprendizagem ligadas ao mesmo conteúdo geram maiores oportunidades para atender às condições especiais de cada estudante. Ao contrário, cursos rígidos, baseados em um só tipo de comunicação – síncrona ou assíncrona – geram desinteresse e dificultam o aprendizado. A preocupação é a de gerar esta gratificação intrínseca, o prazer pessoal de se abrir para novas aprendizagens, novas habilidades. Neste sentido, Costa e Barros (2016, p. 288), alertam para as discussões menos elaboradas, realizadas nos encontros síncronos (presenciais e virtuais) em função do tempo hábil e que podem, facilmente, sair do foco do conteúdo e passar para um momento de convivência, sem aprofundamento do objetivo cognitivo do tema em discussão. Dizem estes autores: “a participação do professor deve suscitar a participação cognitiva do aluno” (p. 303). Segundo ainda estes autores, é muito difícil o desenvolvimento de ações formativas abertas, livres, não orientadas por planejamentos didáticos e ação docente, para o aprendizado de um conteúdo. Não é que elas não ocorram, mas exigem alto grau de motivação para aprender, disciplina e foco do aprendiz. Em cursos regulares, “a interação livre, normalmente, suscita pouco trabalho cognitivo e, sem objetivo de ensinoaprendizagem, perde o foco, levando ao desinteresse dos alunos pelas atividades” (p. 299). Em termos pessoais, a interação com o conteúdo requer não apenas condições cognitivas desenvolvidas em aprendizagens prévias para a compreensão do que precisa ser aprendido, mas também amadurecimento emocional para lidar com os compromissos de estudo online. Questões como comprometimento com sua própria aprendizagem, disciplina, organização em relação ao cumprimento de prazos e capacidade de comunicação oral e escrita, são essenciais para um bom aprendizado. - Interação com/entre os participantes A principal preocupação dos processos formativos em todos os níveis em relação à interação diz respeito às relações entre os participantes de um mesmo curso. As características do e-learning, no ensino superior, exigem processos humanos interativos bem planejados, que vão além das perguntas e respostas em fóruns e chats e a prontidão em retornos pontuais às dúvidas dos estudantes. Como diz Aires (2016, cit. por Moura, 2017), “o e-learning proporciona diversas oportunidades de interação e de decisão, baseadas no primado da flexibilidade, no fácil acesso ao conhecimento e na aprendizagem como um processo social e colaborativo”. Em princípio, é importante pensar que na turma recém formada existe um amontoado de pessoas. O primeiro desafio, portanto, é o de reunir esses seres em um grupo, para alcançar o desejável processo social, com trocas e colaborações entre todos os participantes, respeitando seus conhecimentos prévios e suas diferenças. Assim, inicia-se o curso com um grupo aleatório de seres isolados e que, ao longo do período letivo, se encontram virtualmente, formam grupos, passam a agir colaborativamente. Criam comunidades. Esta transformação ocorrida em rede não se dá ao acaso. Além do foco nas temáticas do curso é preciso que o ambiente seja planejado e proporcione condições para a criação de comunidades virtuais de aprendizagem, ou seja, cadeias virtuais de relações em que todos possam participar, colaborar e compartilhar informações e experiências, para aprenderem, juntos. D. Interação e comunidades gamificadas em e-learning A reunião inicial de participantes de um curso online, independente de quantos sejam, é, em princípio, uma “multidão”, no sentido proposto por Bauman quando diz que, na Internet, “estamos todos numa multidão e numa solidão ao mesmo tempo”. (Zygmunt Bauman, 2001). Um dos grandes problemas apontados pelos estudantes que começam a acessar os ambientes virtuais é exatamente esta solidão, em meio à multidão de participantes e recursos. O desafio está em integrá-los, estabelecer identidades além do acesso ao mesmo espaço digital. Reuni-los de forma que possam se sentir pertencentes a um mesmo grupo, com interesses comuns de aprendizado, independente dos tempos e espaços em que vivem. Diferentes níveis de interação humana se apresentam em uma turma, como processo paralelo ao processo de ensino e de aprendizagem. Ele envolvem não apenas os interesses comuns sobre um determinado conteúdo, as condições de usabilidade dos recursos e, também, o caráter emocional do processo, mas também a integração em rede de forma que possam se auxiliar mutuamente, na superação de desafios para aprender. O processo de interação humana em redes de e-learning no ensino superior requer ações didáticas motivadoras e bem planejadas. Não é o único caminho metodológico mas, o desenvolvimento de processos de Gamificação em disciplinas no ensino superior desperta a motivação dos alunos para a criação de sentimentos de identidade grupal, espírito de equipe e pertencimento. Como processos, eles se desenvolvem, na convivência didaticamente orientada entre os participantes. Desdobram-se em várias ações paralelas ao desenvolvimento das atividades disciplinares e se complementam. Minha preocupação com este movimento didático paralelo levou-me à criação de estratégias em cursos superiores de e-learning, que passo a relatar. São processos bem sucedidos, planejados e desenvolvidos em vários cursos, em turmas semipresenciais ou totalmente a distância. Turmas que oscilaram entre 20 e 50 participantes, em cursos de graduação e pós-graduação, com as quais interagi diretamente com todos os participantes, durante o período da disciplina. A gamificação aqui entendida se apresenta como processo didático em que os conteúdos e atividades são construídos, apresentados e desenvolvidos como etapas, permeadas de fases, com desafios individuais, grupais e intergrupais que precisam ser superados individualmente e coletivamente. Segue o relato. Início. O primeiro desafio está em fazer desabrochar o espírito de equipe, logo no início da disciplina em e-learning. Requer o desenvolvimento de ações que integrem não apenas os estudantes, mas cada participante com os professores, o ambiente, as atividades e o estímulo para superar os obstáculos do processo formativo, de acordo com os propósitos desta formação. Ele se inicia com o acolhimento e estimulo a todos para inclusão e participação, mas também com o esforço para garantir a visibilidade de cada participante. Que todos se conheçam e que estejam dispostos a participar, colaborar e ajudar para o alcance de resultados comuns. Que as regras estejam claras e acordadas entre todos os participantes e que não sintam que estão em um jogo, mas em um processo de aprendizagem desafiador. Primeiros movimentos. O envolvimento no desafio a ser superado coletivamente em cada tema desloca o interesse do estudante para a formação da identidade grupal e o sentimento de pertencimento ao grupo. Neste processo, cada participante identifica suas capacidades, seus limites e como pode auxiliar os demais e ao grupo para avançarem unidos na superação dos primeiros desafios propostos e o alcance do conhecimento. Abre-se também para o recebimento de apoios e orientações, trocas com os companheiros de jornada na desafiadora ação de aprender e também superar os seus desafios individuais. Para o melhor desempenho no game é preciso presença e estímulo à participação. Comunicação, feedbacks constantes e colaboração estão na base das propostas pedagógicas desenvolvidas nos games. Na superação dos desafios, cada participante irá desenvolver processos de estimulo e persuasão com os parceiros da equipe e a vivência de jornadas emocionais, plenas de engajamento e flow, de forma colaborativa, em equipe. Movimentos Intermediários. Os desafios presentes no desenvolvimento de cada tema na proposta didática de cada curso estimula os alunos à comunicação. O acompanhamento próximo do professor, os feedbacks frequentes, a orientação mais personalizada para as questões que surgem os estimulam. A participação intensiva e a necessidade de cumprir ou superar prazos e metas os une. Já não mais estranhos. São colegas que compartilham os mesmos interesses de aprendizagem, o mesmo momento de ensino e o mesmo ambiente virtual. Formam-se redes de relações entre os pares que se expandem e atingem outros aplicativos, além do ambiente do curso. Alunos interagem entre si para trocas sobre os conteúdos e a realização das atividades propostas. Dividem tarefas. Desde o primeiro momento da estruturação das equipes, líderes são escolhidos pelos demais. Lideranças rotativas. Em cada tema um estudante assume esta função. Neste momento intermediário, os líderes mais experientes – que lideraram as equipes nos momentos iniciais do curso - colaboram, criam estratégias e auxiliam a equipe a superar os desafios propostos. As comunidades de aprendizagem crescem, se ampliam, prosperam. Em meio às trocas comunicativas e a ação em conjunto, um novo processo interativo aflora e que se relaciona com a forma como cada participante considera os demais. Empatia. A capacidade de compreender o ponto de vista e o contexto em que os outros participam do mesmo processo. Novas emoções vem à tona e despertam a preocupação com os demais, a motivação para ajudálos a melhorar seus desempenhos, mobilizá-los para a ação e para alcançar resultados coletivos de realização. Movimentos finais. Chega-se, assim, a um novo nível interativo: contágio. A dinâmica da ação de superar desafios em comunidades de aprendizagem é tão intensa emocionalmente que não fica restrita ao ambiente virtual ou às pessoas que participam do processo formativo. Ela se amplia. Criações grupais são compartilhadas pelas redes digitais e alcançam novos públicos, interagem com novos grupos. Multiplicam. Cada participante cria o seu próprio acervo de conhecimentos e compartilha além do grupo, com seus próximos, na família, no trabalho, no virtual. Faz-se Educação em movimento. Interações. Enfim, o processo de desenvolvimento educativo para a interação em e-learning é contínuo. Não é simples e nem rápido. Trata-se de uma nova cultura que “precisa crescer naturalmente”, como tão bem diz Lèvy (1999). Necessita ser planejada junto com todo o desenvolvimento dos conteúdos e integrada à formação cognitiva prevista. Mais do que uma ação isolada, a proposta interativa é uma formação que objetiva a transformação de todos os participantes que nela se envolvem, objetivo da Educação, em relação aos seus conhecimentos, sentimentos e comportamentos como pessoa e profissional, em todos os espaços e ambientes, de aprendizagem, sempre. Referências Arnold, T. (2011) Além da interação homem computador: O Design de Interação, seus processos e metas, em busca da satisfação do usuário final. 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Foi professora da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e da Universidade de Brasília (UnB). Coordenadora e pesquisadora de pesquisa coletiva sobre "Grupos que pesquisam EaD no Brasil" (ABED, 2017). Organizadora e autora do livro "Design Instrucional para cursos on-line) da Ed. Senac/SP. Autora dos livros: “Tecnologias e Ensino Presencial e a Distância”; Educação e Tecnologias o novo ritmo da informação e Tecnologias e Tempo Docente, todos publicados pela Editora Papirus, além de muitas outras publicações em que trata de suas pesquisas e experiências profissionais na área de Educação Online e Tecnologias Digitais. e-mail: vmkenski@usp.br