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Modernidade x Pós-modernidade

Dissertação sobre a visão do autor David Lyon entre modernidade e pós-modernidade. Abordar modernidade e pós-modernidade pode parecer, em um primeiro momento, uma mera definição conceitual. Mas na prática está muito longe de ser. Ao discorrer sobre esta mudança de fase na história da humanidade que envolve processos sociais, culturais, religiosos, tecnológicos, entre outros, David Lyon recorre a diversos pensadores críticos que abordaram o tema de passagem ou com análises mais aprofundadas.

1 UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO - USP ESCOLA DE COMUNICAÇÃO E ARTES – ECA GESTÃO INTEGRADA DA COMUNICAÇÃO DIGITAL NAS EMPRESAS, DIGICORP MODERNIDADE X PÓS-MODERNIDADE Tema: Dissertação sobre a visão do autor David Lyon entre modernidade e pós-modernidade Trabalho Professor Mauro Wilton Eduardo Gomes Vasques SÃO PAULO, 2014. 2 INTRODUÇÃO Abordar modernidade e pós-modernidade pode parecer, em um primeiro momento, uma mera definição conceitual. Mas na prática está muito longe de ser. Ao discorrer sobre esta mudança de fase na história da humanidade que envolve processos sociais, culturais, religiosos, tecnológicos, entre outros, David Lyon recorre a diversos pensadores críticos que abordaram o tema de passagem ou com análises mais aprofundadas. O autor, aliás, parece se eximir de definições claras e objetivas e tenta colocar o assunto utilizando o subterfúgio da avaliação, de estudos e publicações de uma série de pensadores sobre pontos cruciais na passagem moderna. O maior problema, entretanto, é que as visões podem ser complementares ou conflitantes. Isto porque é possível fazer avaliações criteriosas a partir de um grande número de vertentes e correntes de pensamento, seja pela política, pela economia, pelo mercado de trabalho, religião, entre outras diversas variáveis. E, mesmo com todas as referências, o próprio autor se limita a apontar: “A modernidade, então é um fenômeno de grande diversidade e riqueza, difícil, se não impossível, de sintetizar.” Por meio da visão de Max Weber, Karl Marx, Anthony Giddens, Émile Durkheim e outros, Lyon expressa características e movimentos que marcaram o período da modernidade. Do conhecimento das técnicas que permitiram o desenvolvimento do controle e geração de poder. Um exemplo latente aparece quando analisamos a migração das pessoas do campo para os grandes centros urbanos. Sem conhecimento das normas, dos padrões, dos modelos vigentes, tornaram-se subalternas. À medida que conseguiam evoluir um pouco mais, novas técnicas já haviam sido criadas, mantendo-as em uma espécie de limbo no mercado e na sociedade como um todo. Lyon avança não só na transição de período entre uma era e outra, mas coloca dúvidas em relação ao que seria a pós-modernidade, também fazendo o uso de muitos pensadores influentes e renomados como referência. 3 DESENVOLVIMENTO A alteração do modelo de produção manual para o industrial causou modificações essenciais na vida das pessoas, criando conflitos e novas formas de encarar o mundo. Na modernidade, a razão passa a ser o centro da visão de mundo, no processo de organização social. Uma contradição, afinal, boa parte do período atribuído à modernidade foi o momento histórico de grandes guerras, portanto, bastante irracional em muitas ocasiões. Há, inclusive, algumas correntes da psicologia que simplesmente ignoram ou discordam completamente da divisão entre racional e emocional. Ao longo dos anos na era moderna, algumas áreas acabaram, segundo referências do autor, ganhando mais visibilidade ou espaço entre as normas da época. A administração e toda a sua metodologia de controle, o estilo militar e a sua disciplina, por exemplo, foram responsáveis por grande modificação cultural nas sociedades. E entendemos aqui como cultura o conjunto social integralmente, que traz no seu bojo o comércio, a indústria, a produção, as relações pessoais, a religião. E há, ainda hoje, rastros característicos da modernidade explícitos em diversas áreas. Diversas empresas e executivos nos Estados Unidos, inclusive, ainda usam como metodologia de trabalho e sobrevivência no mercado, noções e princípios desenvolvidos pelo estilo militar das últimas décadas. Não podemos esquecer que a própria internet surgiu a partir de um projeto que tinha como premissa melhorar e ampliar a comunicação militar. E as novas características sociais estão impondo também uma revisão desses processos e dessa dinâmica, especialmente pela mudança cultural provocada pelas relações interpessoais e pelo avanço tecnológico a partir da transição entre as décadas de 80 e 90. Alguns pensadores classificam este momento como nova era ou terceira fase do capitalismo. O empreendedorismo (que faz com que as pessoas deixem de lado a subordinação e cresçam com a cabeça de que é preciso arrumar um emprego “digno” e passar a vida trabalhando para uma única corporação, de ser independente e “dona do próprio nariz”), o modelo de home office (trabalhar de casa 4 e de maneira remota hoje já bastante possível) e a relação de hierarquia – ou falta dela – da juventude que começa a ocupar o mercado de trabalho mostram a quebra de alguns desses modelos, mas também não proporcionam algo novo que seja tão nítido, que traga o consenso sobre o tema entre os indivíduos e que ainda não define a pós-modernidade. A avaliação da modernidade considera aspectos culturais e padrões de vivência desenvolvidos ao longo de muitos séculos. E mesmo com o progresso humano, muitos dos princípios ainda tentam sobreviver. Imagine por exemplo um senhor que hoje tenha por volta de 93 a 95 anos e esteja lúcido mentalmente. Por mais que ele se esforce para entender todas as mudanças sociais do século XX, há uma dificuldade tremenda em assimilar essas alterações de padrões de convívio, de relacionamento com pessoas e objetos. As referências de mundo, de capital, de indivíduo para ele são completamente diferentes das que temos atualmente. Em contrapartida, temos novos indivíduos crescendo neste novo ambiente, sofrendo estímulos diversos e o tempo todo de uma sociedade já modificada pelo feminismo, pela liberalidade, pela diversidade sexual e racial, pela ampliação geral do conhecimento. É um choque grande de gerações. Talvez o de maior embate e consequências. A partir disso, a evolução tornou-se um ciclo irrefreável, quase impossível de deixar pistas que permitam prever o mínimo que seja do futuro. A cultura interfere na evolução do indivíduo que, por sua vez, devolve mudanças significativas para a cultura e modifica a forma como a sociedade e os indivíduos encaram os acontecimentos. Talvez em nenhum momento da história a famosa frase de Marshall McLuhan faça tanto sentido quanto o significado que ela traz para os dias de hoje: “Os homens criam as ferramentas. As ferramentas recriam os homens.” As mudanças culturais ainda podem levar alguns séculos para acontecer, mas há um conflito claro nos últimos anos causado especialmente pelo desenvolvimento do mercado das tecnologias de informação e comunicação (computação e telecomunicações). A partir do modelo vigente do capitalismo que busca organizar processos que beneficiem alguns grupos ou ampliar o acúmulo de riquezas para o consumo é possível não só afirmar que o indivíduo foi transformado 5 em mercadoria (como defende o sociólogo polonês Zygmunt Bauman), mas também perceber de forma nítida um espaço de tempo muito curto entre uma evolução e outra. Basta olhar o quadro abaixo de evolução dos meios de comunicação e perceber a distância de tempo entre a criação de uma nova plataforma e outra. Apesar de todos os benefícios, essa aceleração está causando uma série de conflito no e para o indivíduo da sociedade pós-industrial. Figura 1. A evolução dos meios de comunicação. E mesmo em coisas mais simples, o tempo tem criado dicotomias interessantes e até difíceis de lidar. Até mesmo a relação entre o indivíduo e o tempo sofreu consequências drásticas. Até 20 anos atrás, para conquistar sua identidade pessoal (o chamado RG ou Registro Geral) no Brasil, uma pessoa deveria comparecer a uma delegacia de polícia, retirar um formulário, se dirigir a um despachante para o preenchimento e entregar novamente na delegacia. Depois de 90 dias era preciso retornar ao ambiente policial para a retirada da versão final do documento. Hoje, em São Paulo por exemplo, as pessoas podem usar o serviço do Poupatempo. Em cerca de três 6 horas você realiza todo o processo. E ainda assim o órgão é tido como “Perdetempo”, porque o período para a produção de três horas é muito lento. A pós-modernidade parece premente, mas não é possível definir com exatidão quando ela efetivamente começa. Temos ainda nos dias atuais muitas formas, normas e características que nos remetem diretamente à modernidade, uma mistura entre passado e presente. E que agora passa a receber novos estímulos de maneira acelerada. CONCLUSÃO A chamada sociedade da informação proporcionada pelo modelo pósmoderno e pelo avanço da ciência e tecnologia trazem perturbação das relações sociais em todos os seus âmbitos. A forma de geração de conhecimento, armazenamento e resgate de dados foi modificada sobremaneira. Convivemos o momento todo com ambiguidades. Ao passo que temos evoluções científicas e tecnológicas que alteram padrões sociais positivamente e que colaboram para evolução do homem, ainda carregamos o peso e o fardo de problemas sociais e conflitos seculares ainda sem nenhuma solução próxima, mesmo com todo o afrouxamento e relaxamento das normas. As promessas de uma vida mais agradável e de um indivíduo mais humano parecem cada vez mais distantes da realidade. Não conseguimos enxergar a qualidade de vida, o prazer na essência do significado da palavra. Principalmente quando olhamos no longo prazo. E isso traz ainda mais frustrações para o indivíduo. O sagrado religioso, historicamente forte nas relações para o homem e para o contexto social, perde espaço para a energia, fonte de quase todos os afazeres (tarefas do indivíduo na era industrial). Com a evolução das tecnologias, novas gerações passam a considerar a energia como algo inerente à vida. Ela deixa de ser considerada uma exceção para fazer parte naturalmente da vida do indivíduo. E o sagrado passa a ser não só a internet e suas possibilidades, mas o ter (consumismo) e o ser (público). Afinal, como exercer boa parte das funções da vida sem a rede, sem o Google, sem a integração e convergência entre plataformas e dispositivos que têm como apelo central a internet? Quais as desvantagens em ser 7 famoso, ser amado, ser consumido por pessoas quando se é uma personalidade reconhecida? O preço da fama para o indivíduo famoso, via de regra, dificilmente é mostrado ou exposto. E, ainda assim, muita gente deseja isso. Outro bom exemplo disso é observar a relação de gerações com essas plataformas e tecnologias. O acesso a diversos meios e a infinidade de novos estímulos provocados por eles nas pessoas vêm alterando o modo de vida das pessoas. E talvez por isso Lyon tenha passado pela frustração exposta na literatura de pensadores atuais em relação à sociedade da informação, chegando a afirmar que o progresso de certo modo parou no tempo e no espaço. O conflito causado pelo fato das pessoas buscarem soluções gerenciais para administrarem problemas e dilemas pessoais, contemporâneos, elimina e tenta racionalizar o que é emocional. Com raras exceções, há uma sensação de banalização no indivíduo como um ser pensante e no que ele produz atualmente, bem como uma manipulação explícita de seus gostos, de seu padrão de convivência em sociedade. Conforme o tempo vem passando, a indústria cria necessidades e não permite que o indivíduo consiga suprimi-las nunca. Quando ele acredita que vai ter prazer com algo, logo há um novo e mais interessante, mais moderno, com mais recursos. E novamente o homem se vê pronto para adquirir. Ao apontar que o gerenciamento da informação é o desenvolvimento mais recente nessa tendência, com bancos de dados poderosos, cruzamento de informações, padrões de consumo, gostos, características físicas, entre outros, o lado mais humano do indivíduo e sua complexidade física ficam alheios dos estudos. Em especial quando falamos do cérebro. O órgão é um desafio até mesmo para António R. Damásio, o dono da cadeira David Dornsife de neurociência, psicologia e neurologia da Universidade da Califórnia – Estados Unidos – e diretor do Instituto do Cérebro e da Criatividade. Ele deixa isso claro em O erro de Descartes – Emoção, razão e o cérebro humano. Mesmo para um estudioso, especialista em avaliar o cérebro do homem, há enormes desafios e questões não respondidas até os dias de hoje. 8 A informação e o conhecimento hoje para a tomada de decisão na vida e no contexto social (trabalho, religião, consumo, etc) resumem-se à mera interpretação de dados e sinais, um turbilhão deles. Tudo é imediato e todos somos imediatistas. No fundo a impressão que se tem é que, apesar da evolução rápida das plataformas, das tecnologias, dos meios de comunicação entre os indivíduos, o homem não tem conseguido acompanhar os acontecimentos na mesma velocidade. E, como bem observou Jean-François Lyotard, estamos nos tornando escravos de instrumentos que criamos para serem nossos súditos. A discussão é ampla, complexa, envolve diferentes disciplinas e, provavelmente, também conta com o ciclo vivo de retroalimentação, no qual o ambiente e os símbolos influenciam o comportamento social e este devolve para o universo seus aprendizados e experiências. A pontuação que explica melhor esta fase em que vivemos é a de Ithiel de Sola Pool, cientista político do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT) e considerado referência quando o tema é convergência das mídias: “Estamos numa era de transição midiática, marcada por decisões táticas e consequências inesperadas, sinais confusos e interesses conflitantes e, acima de tudo, direções imprecisas e resultados imprevisíveis.” (Pool, Ithiel de Sola – “Technologies of Freedom”, 1983). Vivemos um período de negociação diária com as pessoas. Gerenciamos conflitos com tudo, o tempo todo. A economia da experiência ganha força. Há uma aceleração da obsolescência dos itens materiais e as manifestações artísticas, culturais, transacionais, buscam criar novas necessidades no indivíduo, o que causa muito desconforto e a sensação de que o prazer ou é efêmero ou nunca será plenamente atingido. O prazer está se transformando em recompensa. 9 BIBLIOGRAFIA LYON, David. Pós-Modernidade. São Paulo: Editora Paulus, 1998. BAUMAN, Zygmunt. Vida para o Consumo. São Paulo: Editora Zahar, 2007. DAMÁSIO, António R.. O erro de Descartes – emoção, razão e o cérebro humano. São Paulo: Companhia das Letras, 1996. JENKINS, Henry. Cultura da convergência: a colisão entre os velhos e novos meios de comunicação – 2ª edição. São Paulo: Editora Aleph, 2009.