Sobre este e-book
Júlia Lopes de Almeida
Julia Lopes de Almeida (1862- 1934) nasceu no Rio de Janeiro e morou em Campinas (SP) da infância até a juventude, onde, com o incentivo da família, publicou suas primeiras crônicas na Gazeta de Campinas. Sua produção literária é ampla, composta de crônicas, contos, peças teatrais, novelas e romances. Colaborou em grandes jornais da época, como O Paiz, Jornal do Commercio e Tribuna Liberal. Em 1886 a família mudou-se para Portugal, onde Julia publicou o primeiro livro, Contos infantis, em parceria com a irmã, Adelina A. Lopes Vieira. No ano seguinte, casou-se com o poeta português Filinto de Almeida. De volta ao Riode Janeiro, publicou, como folhetim, Memórias de Martha, que se tornariadepois seu primeiro romance. Julia era defensora da educação feminina, do divórcio e da abolição do regime escravocrata, temas presentes em suas obras. Foi uma das idealizadoras da Academia Brasileira de Letras, mas não foi aceita pois o regimento, na época, só permitia homens.
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Pássaro tonto - Júlia Lopes de Almeida
Apresentação
Pássaro Tonto estava em no prelo quando Julia Lopes de Almeida faleceu, em 1934. O livro, contudo, ainda que postumamente publicado, foi bem recebido pelo público que ansiava pelo último romance escrito pela renomada autora.
Já consagrada entre os escritores de sua época, Julia usou sua arte para levantar questionamentos, registrar mudanças sociais e instigar os leitores.
É no conturbado Brasil da década de 1920 que se passam as primeiras cenas de Pássaro Tonto. A personagem principal da trama é Lalita, filha do banqueiro Jaime Negrão, que sentindo-se ameaçado pela situação política do país, decide passar uma temporada com a família na Europa. A jovem, fútil e sem ideais, embarca, a contragosto, para Paris.
Diferente das personagens femininas de outros romances, Julia Lopes de Almeida, evidencia e critica, através das ações de Lalita, as modificações sociais do pós-guerra e os novos costumes, com destaque para o culto ao corpo ‘perfeito’, a influência do estrangeirismo e a modernidade que era ditada pela Europa.
Para os críticos da época, este último romance de Julia fica aquém de sua qualidade literária quando comparado a outros de seus livros. Mas é inquestionável o talento da autora ao abordar e registrar temas que influenciaram a sociedade de seu tempo.
Como temos feito na publicação de livros clássicos, atualizamos o texto conforme o Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa de 1990, mas mantivemos a ortografia dos nomes próprios como no original. Procuramos incluir, em notas no rodapé, a tradução dos textos em língua estrangeira e a definição de palavras ou expressões fora de uso, visando tornar a leitura mais fluida para que o leitor faça, de maneira simples, uma imersão na época em que a obra foi escrita.
As Editoras
Sumário
I
II
III
IV
V
VI
VII
VIII
IX
X
XI
XII
XIII
XIV
XV
XVI
XVII
XVIII
XIX
I
Março de 1925. Jaime Negrão, do alto comércio bancário do Rio de Janeiro, sentia-se constrangido por uma atmosfera política contrária às suas opiniões e aos seus interesses. Por isso, mal-acabado o serviço obrigatório do banco, fugia para casa, isolando-se de convivências que, mais ou menos, lhe proporcionavam amarguras. Uma tarde em que voltava do trabalho menos esmagado pela eletricidade de certas forças secretas viu, ao atravessar o seu vestíbulo, a mulher e a cunhada conversando baixinho a um canto do salão. Estavam mutuamente tão absorvidas, que ele não as quis interromper e subiu logo para os seus aposentos. Naturalmente a cunhada ficaria para o jantar. Conversariam depois.
Conversar? Sobrar-lhe-ia ânimo para isso? Expansivo por índole, preferia agora estar só. Tinha chegado ao ponto de não se interessar nem mesmo pelas coisas que ainda havia pouco o distraíam. Só no isolamento deixava cair a máscara de chumbo que era obrigado a manter no rosto durante as melhores horas do seu dia social. Por vezes sentia de tal modo nítida essa impressão de caraça[1], que chegava a passar os dedos pelo queixo forte e bem escanhoado e a pensar: Estarei maluco?...
Haveria já uns bons 20 anos que ele consumia todo o vigor dos seus nervos no alucinante esforço de ganhar dinheiro. Não pela obediência natural às leis da conservação, mas pelo desejo de que o seu pão de cada dia trouxesse no miolo matérias muito mais suculentas do que a simples massa de trigo. Tinha adquirido essa tendência por contágio, na convivência de um financeiro insaciável, com quem se relacionara já perto dos 40 anos. Até essa data fora um homem tranquilo, de gostos regulados por um emprego público. Desde que o diabo, porém, lhe assoprou no peito a chama da ambição, percebeu logo que a sua pele revestia já um outro homem e compreendeu para o que tinha vindo ao mundo. Todas as suas faculdades de batalhador, até então adormecidas, entraram em liça[2]. Enriqueceu em pouco tempo. Muita gente dizia, em alto e bom som, que desonestamente. Era mentira. Diziam-no por inveja. A inveja no Brasil tem a assuada[3] fácil e os dedos sempre prontos para apontar difamadoramente os que, por qualquer qualidade excepcional, se elevam acima do nível comum. A verdade é que ele tinha enriquecido por impulso de um raro tino financeiro e por ter sido favorecido por dias de crédito lisonjeiro. Infelizmente as ondas que haviam trazido prosperidade rápida retraíam-se agora num refluxo ainda mais violento. Era isso sobretudo o que mais o exasperava. No lar uma mulher suave e dois filhos, um rapaz, Armando, estudante de medicina, e uma menina, Eulália, a quem davam em casa o nome de Lalita. Desde a infância destes, vivia em sua companhia uma senhora, que tinha começado a exercer na família as funções de mestra de primeiras letras e acabava agora como governanta: D. Márcia. Era tudo.
Nessa tarde, à hora do jantar, Negrão não reparou que a mulher estava ainda mais pálida do que de costume e que tinha os olhos vermelhos. A cunhada fora-se embora, deixando-lhe lembranças, vagamente transmitidas. Sentia agora pena de não lhe ter falado; gostava dela, do seu bom humor perene e da graça dos seus conceitos, picados por uma pontinha de inconsciente ironia.
Ao desdobrar os guardanapos, D. Márcia participou que o Armando não viria jantar, e era com o filho que ele gostava de conversar sobre certos assuntos que supunha não interessarem às senhoras.
— Ele disse para onde ia?
D. Márcia não soube explicar a ausência do rapaz. A comunicação pelo telefone tinha sido sucinta: Janto fora.
Nada mais.
Mas, se faltava o Armando para ouvir, ali estava a Lalita para falar. Risonha e tagarela, animava o ambiente misturando na correnteza do palavreado coisas fúteis com outras de que nem suspeitava a gravidade. Tinha saído com as duas primas, filhas exatamente da tia Olímpia, que ali tinha estado uma hora antes. Contava cenas da rua. Vira as Bastos, com uns vestidos curtos, acima dos joelhos e tão transparentes que todos se voltavam para as ver... Quando tomavam chá na confeitaria, fora cumprimentá-las o Balmaceda da fábrica de tecidos, todo de branco, de brim lustroso, para reclame do seu negócio, está bem-visto... As primas obrigaram-no a sentar-se a seu lado e com jeitinho, numa lábia habilidosa, perguntaram-lhe quais as suas opiniões sobre a situação política da atualidade.
— Se vissem a cara que ele fez... Era da gente arrebentar de riso. As meninas sossegaram-no imediatamente: Se fomos indiscretas, desculpe; é que nós, mulheres, não entendemos nada dessas coisas…
Como eu permanecesse calada, perguntaram-me: Não é verdade, Lalita? Pronuncie-se também, ande. Repita, ao menos, as opiniões da família... Ou, antes, não diga nada, porque na sua, como na nossa casa, somos todos revoltosos... Não tenho medo de o confessar. E o senhor?
O Balmaceda titubeou: "Não deixo de ter, porque se a mordaça é incomoda, a enxovia[4] da Ilha das Cobras[5] é horrível... Também eu tenho as mesmas ideias, mas sou mais prudente e aconselho-as a que o sejam também..." Coitado... Eu gosto de gente assim como as meninas, que não têm medo de nada...
Negrão franziu os sobrolhos e ia dizer qualquer coisa quando a mulher se ergueu muito pálida, queixando-se de uma dor aguda num pulmão. Era uma das suas crises. D. Márcia correu a buscar o vidrinho de Moschus[6] e o jantar ficou por alguns minutos interrompido.
Durante a noite Negrão percebeu que Maria Antonia não dormia, disfarçando uma agitação inacostumada, a que ela não era sujeita, porque dormia bem. Era evidente que guardava consigo um segredo que a sufocava e que esse segredo lhe fora certamente transmitido pela irmã. Não querendo mostrar-se curioso, Negrão esperou com impaciência pela hora do desabafo. Mas a revelação tardava e ele por fim adormeceu. Foi só depois do café matinal, à hora em que fazia a sua toalete, que, voltando-se para a mulher, ele lhe perguntou de supetão:
— Que te dizia ontem a Olímpia quando eu entrei da rua?
Maria Antonia estremeceu, como se tivesse sido sacudida por um choque elétrico... Hesitou por um momento até que respondeu num tênue fio de voz:
— Nada...
— Ora essa!
Por que quereria ela esconder a verdade? Com a sua grande curiosidade de homem, aguçada por aquele retraimento, tão raro na mulher, que era sempre comunicativa e sincera, ele insistiu, já nervoso:
— Em outra qualquer ocasião o que vocês pudessem ter conversado ser-me-ia indiferente. Mas agora, não!
Ela balbuciou timidamente:
— Por quê?
— Porque conheço as ideias do Bento e não posso deixar de ficar apreensivo.
A mulher continuava calada, de cabeça baixa, num evidente esforço mental, como se estudasse as palavras em que teria de emitir o seu pensamento.
Desesperado, Negrão explodiu:
— Que diabo! É justo que, ao menos em minha casa, eu viva desanuviado e certo da sinceridade dos outros! Já me basta a hipocrisia e o silêncio que sou obrigado a manter lá fora.
— Nunca ocultei coisa alguma... Nem de você, nem de ninguém.
— Mas, agora...
― Sim ― agora ela confessou ter alguma coisa a dizer, mas temia fazê-lo por medo de o irritar. — Quando você grita fico desorientada...
— Ora, quando grito! Parece-me que não sou nenhum tirano! — e, depois, mais baixo — O caso é assim tão grave?
— É.
— Fale sem susto.
Maria Antonia relanceou a vista pelas paredes e as portas fechadas, como a temer que os espreitassem e rompeu a falar baixinho, angustiosamente, como se as palavras tivessem espinhos que lhe estraçalhassem a língua. A irmã tinha vindo na véspera pedir-lhe para fazer com que nem o marido nem o filho aludissem jamais diante da sua gente, à política do momento...
Negrão atalhou, muito espantado, com um outro: Ora essa!... Por quê?!
— Porque a maninha morreria de desespero se algum de vocês fosse preso por denúncia...
— De quem?
Maria Antonia engoliu em seco, com esforço.
O marido insistiu:
— De quem? Do Bento?
— Sim... ou das filhas...
— Das filhas?!... — interrompeu Jaime, boquiaberto, como se não tivesse entendido.
— Sim... — corroborou ela, ainda engasgada, toda a tremer.
Calaram-se ambos, olhando-se de face numa expressão de assombro interrogativo, até que numa