Biblioteca Advb Arquivo 33
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ESCOLA DE MSICA
Dissertao de Mestrado
Belo Horizonte,2007
Belo Horizonte
2007
ii
FICHA CATALOGRFICA
N972r
iii
FOLHA DE APROVAO
iv
DEDICATRIA
AGRADECIMENTOS
Agradeo em especial:
vi
RESUMO
Estudo sobre a abordagem popular realizada pelo violonista Raphael Rabello (19621995) sobre a pea Odeon (1910) do compositor e pianista Ernesto Nazareth (18631934), a partir da comparao entre (1) edio original para piano, (2) gravaes
(comerciais e no-comerciais) em udio e vdeo de Raphael Rabello e (3) a
transcrio para violo nos moldes da tradio erudita de Antnio Sinpoli. Utilizouse o conceito de Instncia de Representao do Original de ARAGO (2001) sobre
os processos de arranjo e improvisao e os referenciais de ALMEIDA (1999) e
SANTOS (2001) sobre aspectos estilsticos; de CHEDIAK (1986) e FREITAS (1995)
sobre aspectos tericos da improvisao; e de ZANON (2004) acerca dos aspectos
tcnicos do violo. Inclui, nos anexos, transcries dos arranjos e improvisao das
gravaes.
vii
ABSTRACT
viii
SUMRIO
1-INTRODUO.........................................................................................................1
2-DADOS BIOGRFICOS DOS COMPOSITOR E ARRANJADORES.......................3
2.1-Ernesto Nazareth e o choro Odeon..............................................................3
2.2 Raphael Rabello ..........................................................................................6
2.3 Antnio Sinpoli ........................................................................................... 8
3- ASPECTOS DO ARRANJO E IMPROVISAO DE RAPAHAEL RABELLO EM
ODEON ........................................................................................................................ 8
3.1 Aspectos formais.......................................................................................... 8
3.2 Aspectos harmnicos................................................................................. 10
3.3 Aspectos Rtmicos...................................................................................... 27
3.4 Aspectos meldicos....................................................................................33
3.5 Seo Introdutria e Seo Final...............................................................40
4- CONCLUSO.........................................................................................................42
5-REFERNCIAS...................................................................................................... .44
6- ANEXOS................................................................................................................47
6.1-Anexo1-(N)-Partitura Original de Odeon, para piano, composta por
Ernesto Nazareth................................................................................................... 47
6.2-Anexo 2-(S)-Transcrio de Odeon, para violo, de Antnio Sinpoli.................50
6.3- Anexo 3-(RA)- Arranjo de Odeon, para violo, de Raphael Rabello...................53
6.4-Anexo 4-(RI)- Improvisao sobre Odeon, feita ao violo, por Raphael
Rabello........................................................................................................................ 62
1
1 Introduo
Este trabalho investiga a concepo musical do violonista Raphael Rabello (1962 1995), atravs da comparao de seu arranjo para a msica Odeon (1910), de Ernesto
Nazareth (1863-1934), com a verso original para piano solo (NAZARETH, 1968) e com
outro arranjo para violo solo, elaborado por Antnio Sinpoli (1878 -), este ltimo a
partir de uma concepo ligada msica erudita (SINPOLI, s/d). O arranjo de Rabello
foi registrado entre o final de 1990 e o incio de 1991 no lbum Raphael Rabello & Dino
7 Cordas. Contrapusemos a este material uma improvisao gravada de maneira
informal, construda sobre a mesma composio. Este registro em vdeo amador foi
realizado durante uma visita de Rabello a Belo Horizonte em 15 de Maro de 1991, e
gravado por Jos Pascoal Guimares em sua casa. Nosso objetivo demonstrar como
Rabello organiza, no mbito do arranjo e da improvisao, aspectos formais,
harmnicos, rtmicos, e meldicos. Buscamos, no contraste de procedimentos entre
Rabello e Sinpoli ao abordar o choro de Nazareth, dar relevo ao pensamento ligado
viso do msico popular. Nos anexos, alm do original para piano e da verso de
Sinpoli, inclumos transcries de nossa autoria do arranjo e da improvisao de
Rabello.
2
verso original de uma pea musical vista com um certo grau de flexibilidade na
esfera do popular, mesmo quando as instrues de execuo vm registradas sobre a
forma de uma partitura (o exemplo usado por Arago para ilustrar este caso
justamente uma partitura para piano de Nazareth). Concluindo, Arago chega
proposio de que haja uma instncia de representao do material original, que,
enquanto na prtica da msica erudita ela possui um carter integral, na msica popular
sua natureza passa a ser virtual.
3
A fim de evitar repeties desnecessrias de referncias s fontes primrias,
resolvemos apresenta-las ao longo do trabalho da seguinte forma:
(N) Partitura Original de Odeon, para piano, composta por Ernesto Nazareth;
(S) Transcrio de Odeon, para violo, de Antnio Sinpoli;
(RA) Arranjo de Odeon, para violo, de Raphael Rabello;
(RI) Improvisao sobre Odeon, feita ao violo, por Raphael Rabello.
Passou grande parte de sua vida tocando nas salas de espera dos cinemas, para
aqueles que aguardavam o incio das sees. A composio Odeon foi, inclusive,
dedicada aos donos do cinema de mesmo nome, que ficava na Cinelndia, onde o
compositor trabalhava. Empregou-se tambm na Casa Carlos Gomes como
experimentador de partituras, ou seja, possua a funo de executar para os clientes
o contedo das partituras a venda, pois a tecnologia de gravao e reproduo de
udio ainda estava ento em fase de desenvolvimento, e a msica s podia ser
apreciada em execues ao vivo.
Sua produo costuma ser dividida em polcas, valsas, e tangos brasileiros, sendo este
ltimo termo um nome forjado para acobertar o que na verdade so maxixes, dana
condenada pelos costumes da poca. Contudo, justamente a poro da obra
dedicada a este gnero que se destaca no trabalho de Nazareth, tanto qualitativa (pela
originalidade das invenes rtmicas, e diversidade formal), quanto quantitativamente,
visto que o nmero das valsas compostas, por exemplo, de 43, enquanto so mais de
noventa os tangos dentro dos quais se encontra, ao lado de Brejeiro, Batuque,
Escovado, e Fon-fon, a composio que objeto deste estudo: Odeon.
Odeon foi composto em 1910, dedicado empresa Zambelli & Cia., dona do cinema
homenageado no ttulo, localizado na Avenida Rio Branco n 137, onde o autor tocou na
sala de espera. Em 1968, a pedido de Nara Leo, Vincius de Morais fez uma letra para
Odeon (SEVERIANO e MELLO, 1997, p. 207).
Ernesto Nazareth levou para o piano os sons que vinham da rua, tocados por nossos
msicos populares, dando-lhes roupagem requintada, situando assim, sua obra na
fronteira do popular com o erudito, transitando vontade pelas duas reas.
1
So chamados de chores os msicos, instrumentistas e compositores que executam o gnero musical choro
popularmente conhecido como chorinho.
5
O esprito do choro est sempre presente nas suas composies, sejam elas
interpretadas por um msico erudito ou popular, em nada se destoa se interpretada por
Artur Moreira Lima ou um choro como Jac do Bandolim.
Odeon sintetiza esse esprito da msica de choro, pertencendo a uma srie de quase
cem tangos brasileiros, sendo uma obra prima no Gnero e uma das inmeras peas
de Nazareth em que melodia harmonia e ritmo se entrosam de maneira quase
espontnea, com refinamento de expresso, como opina o pianista-musiclogo Aloysio
de Alencar Pinto.
As influncias que deram origem ao Tango Argentino foram as mesmas que deram
origem ao tango brasileiro. As principais influncias europias foram a mazurca e a
polca, e a influncia latino-americana foi a milonga. Outro estilo de msica que teve
grande influncia na gnese do tango foi a habanera executada em havana.
Mais recentemente tivemos compositores de tangos brasileiros, tais como; Lina Pesce,
David Nasser, Jos Fernandes, Nelson Gonalves e vrios outros. Sem falar da regio
6
sul do Pas, mais precisamente do Rio Grande do Sul, onde as influncias rio-platenses
e gachas se fazem notar nas diversas composies de milongas e tangos brasileiros .
Segundo Jos Ramos Tinhoro, o nome tango brasileiro teria sido criado por Henrique
Alves de Mesquita (1830-1906) em 1871 ao lanar a composio de sua autoria
intitulada Olhos matadores acompanhada da indicao "tango brasileiro".
Tambm fazia parte desse panorama a msica erudita, que soava na casa, por conta
do piano de uma de suas irms. Atravs de uma aprendizagem informal, o menino
prodgio comeou a tocar violo aos sete anos e por volta dos 10 anos j reproduzia
7
solos de Horondino Silva, o Dino Sete Cordas que tirava de ouvido. Segundo Rick
Ventura, Rabello se apaixonou perdidamente pelo disco Vibraes, do poca de Ouro de Jacob do Bandolim. Encantava-lhe especialmente o violo do Dino, a tal ponto que
muitas vezes ele vinha casa de Ventura, s para ficar ouvindo o disco, e em mais
algumas semanas j estava fazendo suas prprias variaes.
Aos doze anos comeou a estudar violo teve aulas com Jaime Florence, o Meira. Ao
longo da vida, conviveu com grandes referncias da msica popular brasileira. Outros
professores foram o prprio Dino Sete Cordas e Radams Gnattali, que alm de
mestres se tornaram parceiros do violonista em gravaes e apresentaes.
Rabello gravou, entre as dcadas de 80 e 90, 16 discos, dos quais achamos por bem
destacar: Raphael Rabello interpreta Radams Gnattali, gravado solo, Dois Irmos, com
Paulo Moura, e o trabalho feito junto a Ney Matogrosso, Pescador de Prolas. Em 1992
lanou tributo a Tom Jobim, Todos os Tons, com participaes de Paco de Lucia e
Jacques Morelembaum, entre outros.
intitulado Relendo Dilermando Reis, que venceu do prmio Sharp de 1994. Outras
realizaes incluem duos com Elizete Cardoso, Do Rian, Armandinho Macedo e
Romero Lubambo.
Criou com Henrique Filho (vulgo Reco do Bandolim), Ruy Fabiano e Carlos Henrique o
projeto da Fundao Escola de Choro, hoje rebatizada 'Fundao Escola de Choro
8
Raphael Rabello. Comps 18 canes que foram lanadas no incio de 2002 no projeto
Todas as Canes de sua irm Amlia Rabello.
As verses (S), (RA), e (RI) foram todas concebidas uma tera menor acima do tom
original, ou seja, tm o tom de Mi menor como principal, e modulam para Sol maior.
Acreditamos que essa mudana de tom tenha sido feita em razo da troca de
instrumento, e que o conjunto das caractersticas idiomticas sejam um critrio de peso
9
que orientou o esforo de adaptao da msica, sobretudo no trabalho de Rabello.
Detalhes para subsidiar esta hiptese sero dados ao falarmos dos aspectos
harmnicos e meldicos.
Quanto ao esquema formal, (RA) e (RI) apresentam diferenas relevantes. (RA) possui
uma introduo de onze compassos. As trs primeiras notas em anacruse ocupam,
neste arranjo, os dois ltimos compassos desta seo introdutria. A ltima repetio
da seo A tambm muito diferente: seus oito primeiros compassos foram
substitudos por uma outra semi-seo de trinta e um compassos. (RI) tem incio na
seo B, porm este primeiro B incompleto, pois possui apenas oito compassos. O
primeiro compasso no faz parte do B original, e um compasso acrescentado, onde
Rabello executa um acorde do primeiro grau apenas como ponto de partida. Portanto, a
forma desta metade de uma seo B deve ser contada a partir do segundo compasso.
Ao invs de suceder uma seo A a este B incompleto, Rabello improvisa sobre a
seo C, na seqncia. Segue-se um A formalmente regular, outro B, tambm regular
desta vez, outro A, e uma seo C de trinta e dois compassos tamanho relativo
execuo desta seo e sua repetio , e tudo se encerra no ltimo A, que contm
meio compasso a mais (na verdade, Rabello incluiu uma escala enquanto improvisava,
e, por estar tocando muito livremente, acabou suspendendo a contagem de tempo
naquele trecho).
Em resumo, os esquemas formais destas duas verses podem ser escritos da seguinte
forma:
10
3.2 Aspectos Harmnicos
Admitimos como hiptese que o acorde que ocupa os dois ltimos tempos deste
compasso seja um L menor acrescentado da sexta, podendo ser entendido como um
emprstimo modal bem distante (Subdominante menor do tom homnimo ao relativo
maior). Outra opo pensar nele como um agrupamento harmnico resultante da
conduo de notas meldicas que fazem a passagem do quarto grau de D sustenido
menor para sua dominante. Tendo isto em mente, podemos considerar que o baixo
uma nota de passagem (a stima do acorde do quarto grau), o F e o L so notas do
acorde, e o d bequadro, uma antecipao do Si sustenido que a tera do quinto
grau. No compasso seguinte (c.13), apesar de estar em uma oitava diferente, as notas
F e L continuam a fazer parte do bloco, sendo que o L funciona como um retardo
11
que resolve na fundamental da dominante. Sinpoli tentou se manter fiel ao texto
musical de Nazareth, mantendo um D menor com quinta no baixo. Parece que o
critrio de uso do acorde em (S) foi funcional, ou seja, tentando manter o emprego do
emprstimo modal mesmo que distante. Chegamos a essa concluso porque no h
como sustentar a qualidade de antecipao referente nota Mi bemol, sendo que, no
compasso seguinte, o R sustenido qual ela corresponde aparece na oitava de
baixo(Ex. 2):
Ex. 2 Acorde de D menor (c.12-14) Transcrio de Sinpoli.
J Rabello, no se preocupa tanto com a fidelidade ao original neste nvel. Ele manteve
a conduo do baixo nos compassos que correspondem ao c.12 de (N) em (RA), e
mantm a funo de subdominante da tonalidade nos dois tempos do compasso (Ex. 3,
4):
12
Ex. 3 Acorde de L menor com stima no baixo no 2 tempo do (c.23) Arranjo de Rabello.
Ex. 4 Acorde de L menor com stima no baixo no 2 tempo do (c.141) Arranjo de Rabello.
Em (RI), toda vez que passa por esse ponto, Rabello mantm a funo de
subdominante no compasso inteiro (Ex. 5, 6, 7):
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Ex. 6 Improvisao de Rabello (c.72) usando desenhos meldicos na escala de L menor.
Ex. 7 Improvisao de Rabello (c.151) com fragmentos de baixaria arpejada sobre o acorde de L
menor.
No compasso 72 de (RA), Rabello executa uma baixaria, cuja construo pode ser vista
como uma ornamentao sobre a conduo meldica do baixo, a qual foi valorizada em
detrimento de todo o resto do contedo temtico deste trecho (Ex. 8):
Ex. 8 Conduo meldica do baixo com funo de ornamentao (c.72) Arranjo de Rabello.
14
Mais uma vez, h uma passagem que recebe tratamento desigual quando reelaborada,
envolvendo a conduo a partir do quarto grau no ltimo tempo do c.15. O caso deste
trecho, porm, mais fcil de entender. Nazareth executou no baixo um desenho
meldico muito comum na passagem do quarto grau em posio fundamental para o
primeiro com quinta no baixo. O problema que este desenho geralmente usado em
progresses no campo harmnico maior, sendo que a terceira e a quarta colcheia do
segundo tempo ficam preenchidas por um acorde diminuto de passagem:
[IV - #IV| I/5]
Como o contraste entre um acorde menor, e um diminuto muito mais ameno que entre
este ltimo e um maior, Nazareth empregou outra conduo harmnica para dar mais
nitidez alternncia dos blocos sonoros nesta passagem. Mantendo o desenho no
baixo, ele montou um acorde de sexta alem com baixo em stima, que possui, neste
caso, uma segunda sexta acrescentada, a ser resolvida como retardo no compasso
seguinte. Este acorde uma preparao para o quinto grau, que no acontece
imediatamente, j que conduz a um primeiro grau com quinta no baixo (mas que
equivale ao quinto esperado, montado de forma suspensa).
15
Em (S), esta conduo no acontece, e o espao todo ocupado por um acorde de L
menor, a subdominante (Ex. 10):
Ex. 10 Excluso da nota de passagem no baixo no 2 tempo (c.15) por Sinpoli.
16
fluxo do ritmo harmnico, que no seria to regular sem a simplificao da conduo
(Ex. 12):
Ex. 12 Trecho onde o acorde de sexta alem omitido (c.146) Arranjo de Rabello.
Ex. 13 Improviso de Rabello omitindo a passagem do acorde de sexta alem, substituindo-o pelo L
menor com nona (c.39).
17
Ex. 14 Trecho do improviso de Rabello substituindo a passagem do acorde de sexta alem por um
acorde de L menor com dcima primeira (c.155).
No compasso 70, uma linha meldica em grau conjunto descendente d margem a ser
interpretada como pertencente escala de l menor natural, pois est precedida de
outro trecho meldico construdo claramente sobre a escala menor harmnica de l,
que, como prescreve a tradio do choro, usada sobre a dominante, por causa da
presena da sensvel, como nos lembra ALMEIDA (1999, p. 111) (Ex. 15):
Ex. 15 Trecho do improviso de Rabello usando fragmento escalar (c.68-70).
Na parte B h um outro ponto onde o uso meldico do baixo deu margem a uma
ambigidade na interpretao harmnico-funcional. No compasso 23, a terceira e a
quarta colcheia so marcadas por um cromatismo no baixo (Ex. 16):
18
Ex. 16 Trecho contendo cromatismo no baixo (c.22) partitura original de Nazareth.
Em (S), no h dobra da voz do baixo nas oitavas superiores, o que d outro peso ao
deslocamento cromtico do baixo. No segundo tempo do compasso 23, a assinatura
funcional a de uma acorde subdominante menor (EX. 17):
19
Ex. 17 Acorde de subdominante menor (c.23) Transcrio Sinpoli.
20
Ex. 19 Si bemol diminuto substituindo o Mi bemol diminuto(c.47). Improviso Rabello.
Essa resoluo tem o mesmo princpio funcional da resoluo do diminuto auxiliar, que
consiste em movimentar todas as vozes do acorde, exceto a que corresponde
fundamental do acorde seguinte (conduo por nota comum). Outra conduo
empregada em (RI), igual da que se observa em (N), consistiu na passagem do acorde
do quarto grau para o quarto grau menor (emprstimo modal), chegando novamente no
primeiro grau (Ex. 20):
Ex. 20 Substituio do diminuto pelo quarto grau menor (emprstimo modal) (c.55). Improviso Rabello.
21
movimento, no plano harmnico, quando um trecho permanece estacionrio sobre um
mesmo grau. At aqui, nenhuma novidade para a prtica da msica tonal, seja ela
popular ou erudita. Mesmo assim, expomos no diagrama abaixo as ocorrncias de
dominantes, observando a intensidade com que participam da conduo do discurso
musical (Ex. 21):
Ex. 21 Trecho com resumo de movimentao harmnica
Quase toda a pea foi composta tendo em vista este tipo de movimentao harmnica,
mas nos trechos que separamos, o processo de preparao no possui um carter
estrutural to profundo. Este recurso tem a ver muito mais com uma opo de colorido e
um tratamento rtmico da conduo harmnica, de forma que podemos entend-lo
como uma opo esttica de Nazareth.
22
Um outro tpico que cabe, dentro do estudo dos aspectos harmnicos, o do uso de
acrscimos de tenso. Alm do colorido j visto, pela utilizao de notas meldicas na
conduo harmnica, na prpria construo temtica de Odeon h sees com
abundncia de seqncias de resoluo de dcimas, dcima terceiras e nonas (Ex. 22,
23, 24, 25):
Ex. 22 Trecho com resumo das tenses(c.13-15). Partitura original Nazareth.
23
Ex. 24 Trecho com resumo das tenses (c.145-147) Arranjo de Rabello.
Nazareth tambm faz uso dos acordes diminutos com funo dominante, onde o quinto
grau, por exemplo, tem a fundamental substituda pela nona menor, funcionando como
um stimo grau. Rabello faz uso desta substituio sobre o original na parte A do seu
arranjo (Ex.26):
Ex. 26 Trecho com acordes diminutos na funo dominante (c.12-14). Arranjo Rabello.
24
Ex. 28 Trecho com substituio acorde dominante com quinta no baixo por acorde suspenso (c.80).
Improviso Rabello.
25
Ex. 29 Trecho com substituio acorde dominante com quinta no baixo por acorde suspenso (c.96).
Improviso Rabello.
Ex. 30 Trecho com substituio acorde dominante com quinta no baixo por acorde suspenso (c.124).
Improviso Rabello.
IIm7 cadencial um acorde menor com stima, construdo a partir da supertnica da tonalidade.
Sempre que se tem um acorde menor no tempo forte do compasso e separado da dominante por
intervalo de quarta justa ascendente ou quinta justa descendente, dizemos que este acorde um IIm7
cadencial. (DENYER, 1982, p.269)
26
Ex. 31 Trecho onde acorde de D7/A substitudo por Am7(c.49) Improviso Rabello.
Ex. 32 Trecho onde Raphael empregou o acorde menor com sexta na primeira inverso com funo de
IIm7 cadencial.(c.83) Improviso Rabello.
Ex. 33 Trecho com acrscimo da 7 maior no acorde de Sol maior e utilizao do acorde dominante na
1 inverso (c.98) Improviso Rabello.
Ex. 34 Trecho usando acorde F menor com sexta e Mi com 7 menor na 1 inverso (c.115) Improviso
Rabello.
27
3.3 Aspectos Rtmicos:
Ex. 36 Seo C: Acordes com hastes para baixo. (c.30-33) Transcrio de Sinpoli.
28
Nas sees correspondentes em (RA), Rabello escolhe de manter apenas a figura
rtmica da mo direita, e marca, na maior parte das vezes, os tempos fortes do
compasso com o baixo. O resultado que a seo B fica parecendo uma re-elaborao
dos ltimos quatro compassos de A (Ex. 37, 38):
Ex. 37 Final da seo A marcada por tempos fortes no baixo (c.24-26) Arranjo Rabello.
Ex. 38 Incio da seo B marcado por tempo forte com baixo em semnimas (c.44-47) Arranjo Rabello.
29
Ex. 40 Trecho correspondente de Lamentos do Morro. (c.83-84) Arranjo Rabello.
Sinpoli, na sua verso (S), acaba por dificultar a execuo com a sua determinao de
manter as figuras da mo esquerda do original, podendo comprometer, para a maioria
dos violonistas, a fluncia deste trecho. Mesmo assim, no parece ser apenas uma
questo de ordem tcnica, visto que Rabello, mesmo sendo dotado de condies, optou
por no reproduzir este ritmo. Podemos verificar no incio da seo B, que Rabello
mantm o baixo em pedal nos trs primeiros compassos (Ex. 41):
Ex. 41 Trecho com o baixo em pedal nos trs primeiros compassos (c.44-46) Arranjo Rabello.
Caso ele julgasse que aquela figura rtmica fosse imprescindvel, mesmo que
momentaneamente, poderia ter optado por inseri-la no baixo.
30
principalmente no acompanhamento, do samba e do choro, padro que Mrio de
Andrade chamou de 3sncope caracterstica e (SANDRONI, 2001, p. 29) (Ex. 22, 37):
Ex. 42 Trecho com padro rtmico (c.1-3). Partitura original Nazareth.
Ex. 43 Trecho com padro rtmico igual ao original. (c.12-14) Arranjo Rabello.
Nos compassos 20, 21, 22, e 23, Rabello variou a execuo distribuindo as vozes dos
acordes em semicolcheias, ocupando todos os tempos dos compassos binrios (Ex.
44):
3
[...] A figura semicolcheia-colcheia-senicolcheia chamada por Mrio de Andrade e outros de sncope
caracterstica (SANDRONI, 2001, p. 56)
31
Ex. 44 Trecho com distribuio de vozes dos acordes em semicolcheias (c.20-22) Arranjo Rabello.
32
Ex. 48 Trecho com grupo de tercinas e escala em fusas (c.10) Improviso Rabello.
33
3.4 Aspectos Meldicos
Ex. 52 Melodia executada na regio grave da maneira do exemplo 48. (c.1-4). Transcrio Sinpoli.
34
Ex. 53 Melodia executada tambm na regio grave. (c.12-15). Arranjo Rabello.
Ex. 54 Acordes do acompanhamento com abertura em outra posio meldica. (c.26-29). Improviso
Rabello.
35
Ex. 55 Trecho de improvisao com cifrar e destaques de notas de passagem, bordaduras e
apojaturas. (c.99-107). Arranjo Rabello.
36
H alguns momentos onde o arpejo executado feito sobre a posio fixa de um
acorde sobre o brao do violo (Ex. 57, 58, 59, 60):
Ex. 57 Trecho de improvisao onde o arpejo executado feito sobre a posio fixa (c.15-19).
Improviso Rabello.
37
Ex. 60 Cifra e desenho da posio no brao do violo (c.115-118) Improviso Rabello.
Quando isso acontece, o baixo ganha em alguns momentos um maior destaque, pois
Rabello constri linhas meldicas tpicas da baixaria, ou, como ALMEIDA chama,
baixo meldico (1999, p. 116)(Ex. 61, 62, 63):
Ex. 61 Improvisao com linhas meldicas tpicas da baixaria (c.1-4) Improviso Rabello.
38
Ex. 63 Improvisao usando baixaria variada ou florida (c.63-66). Improviso Rabello.
Improvisao usando motivo original de odeon (Ex. 65, 66, 67, 68, 69):
Ex. 65 Improvisao usando o motivo original (c.26-28) Improviso Rabello.
39
Ex. 66 Improvisao usando o motivo original (c.2) Improviso Rabello.
40
3.5 Seo Introdutria e Seo Final de Odeon
41
Astrias, de Isaac Albeniz. LIMA JUNIOR (2003, p. 136137) ressalta neste trecho
ainda uma peculiaridade. (Ex. 73):
[...] a nota Si ora tocada na segunda corda solta ora tocada na quarta corda presa na nona
casa, produzindo assim um efeito sonoro que pode ser denominado como uma melodia de
timbres decorrentes do uso das diferentes cordas para uma mesma nota, so os sons
equssonos explorados a maneira de campanella, gerando uma heterofonia pela permanncia de
sons que formam um Halo sonoro e uma melodia de timbres entre as cordas segunda e quarta.
42
Ex. 74 Trecho de Odeon executado em trmolo (c.124-129) Arranjo Rabello.
A harmonia desses compassos a mesma dos trs primeiros, apenas dilatada, ou seja,
o que durava meio compasso, passa a durar um compasso inteiro. Essa dilatao,
porm, no regular, sendo que alguns acordes duram mais, proporcionalmente.
Porm, a sucesso das funes na progresso de 124 a 141 a mesma que de 12 a
20.
4 Concluso.
43
Rabello valoriza a forma individualizada de sua performance, como ele mesmo depe
no vdeo: [...] Acho que nego pode at no gostar de mim no, pelo menos quando eu
toco a pessoa sabe que sou eu que t tocando. (RABELLO, 1991). Contudo, a
liberdade e individualidade que separam a sua performance de qualquer outra no se
d de forma absoluta e intransigente. Pelo contrrio, o vocabulrio que foi empregado,
tanto no arranjo quanto no processo de construo da improvisao, tem sua origem
facilmente identificvel (seja pelo histrico biogrfico ou pelas caractersticas de estilo).
44
5-Referncias:
ALBIN, Cravo. Dicionrio Cravo Albin da Msica popular Brasileira. Rio De Janeiro,
2005.
ALMEIDA, Alexandre Zamith. Verde e amarelo em preto e branco: as impresses do
choro no piano brasileiro. Dissertao de mestrado-Universidade Estadual de
Campinas, instituto de Artes. Campinas, SP: 1999.
ARAGO, Paulo. Pixinguinha e a gnese do arranjo musical brasileiro (1929 a 1935).
2001. Dissertao (Mestrado em Msica) Programa de Ps Graduao em Msica,
Centro de Letras e Artes, UNIRIO.
BELLINATI, Paulo. The Guitar works of Garoto. San Francisco: Guitar solo publication
vol I, p.18-21.1991
BOYD, Malcolm. Arrangement. In: SADIE, Stanley. The New Grove Dictionary of Music
and Musicians. Second Edition. New York: Groves Dictionaries Inc., 2000, vol. 2, pp.6570.
CHEDIAK, Almir. Harmonia e Improvisao. Vols. 1 e 2. Rio de Janeiro: Lumiar, 1986.
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6- Anexos
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