Noção de Direito - Sebastião Cruz em Direito Romano (Portugal)

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Direito Romano, Sebastião Cruz.

Título I – Conceito de Direito Romano (pág. 7)

- Qualquer Direito dum povo (Direito atual ou Direito passado), é um conjunto de normas ou
regras de caráter social.
Veremos que é um conjunto de normas (sociais) jurídicas; que, além de
normas jurídicas, há outras normas sociais, e que as normas jurídicas se distinguem de
todas as outras por certas bem determinadas características.
- O Direito de um povo é um conjunto de normas. E todos os povos possuíram e possuem as
suas normas.
Mas então... o Homem terá necessidade de normas? Não serão elas, até, uma afronta à sua
liberdade? Sobretudo as chamadas normas jurídicas, visto imporem-se-nos coercitivamente?

Título I – Conceito de Direito Romano


Capítulo 1º - Certos Prolegómenos ao Conceito de Direito Romano (pág. 8 a 15)

 NECESSIDADE DA EXISTÊNCIA DE NORMAS SOCIAIS. RAZÕES: LIBERDADE E SOCIABILIDADE


DO HOMEM.
- o homem é, simultaneamente, um Ser livre e um Ser sociável. Livre, pela sua própria
natureza; sociável por uma inata necessidade de conviver.
- Para que a existência de seres livres em sociedade resulte uma convivência pacifica, uma
vivencia ordenada, é preciso que haja regras que, por um lado a cada individuo proíbam os
abusos da liberdade, e alem disso, limitem ou até suspendam (temporariamente)
determinado uso; por outro lado a todos indiquem e garantam certos usos fundamentais da
liberdade. Daí a necessidade da existência de normas sociais, quer dizer, das regras de
qualquer moto atinentes ao comportamento ordenado dos homens vivendo em societas.
- Por isso todos os povos, por mais rudimentar que se manifeste os seus costumes ou
por mais primitivos que se nos apresentem os seus costumes (hábitos, praxes,
tradições), sempre tiveram e têm algumas normas reguladoras da concicencia entre as
pessoas.
- A necessidade da existência de normas sociais fundamentam-se em duas razões: liberdade
e sociabilidade do homem.

 VÁRIAS ESPÉCIES DE NORMAS SOCIAIS. UMA DESSAS ESPÉCIES SÃO AS NORMAS JURÍDICAS
– O DIREITO; SUA ESPECIAL NECESSIDADE
- As normas sociais podem ser de várias ordens: religiosas, morais, éticas, de educação, de
diplomacia, de etiqueta etc. e também jurídicas.
- As normas jurídicas são aquelas que eficazmente determinam e protegem o que
pertence a cada um, contribuindo dum modo especial para a coexistência pacífica
entre as pessoas.
Norma = “esquadro”
Regra = regula = “régua”
- São medidas para valorar as coisas.
- A Ciência do Direito não é uma ciência do ser, mas a ciência que se preocupa com os valores, ou mais
rigorosamente, com a medição dos valores.
- As normas jurídicas determinam, eficazmente, em virtude do seu poder coativo. Ao desobedecer uma
norma jurídica, existem meios coativos próprios (normalmente do Estado) para forçar a pessoa ao
cumprimento dessa norma, e com todas as consequências por não se ter verificado o cumprimento
voluntário.
- As normas jurídicas determinam e protegem o que pertence a cada um, pois
as normas jurídicas são ditadas pela Justiça, que é a virtude de atribuir a cada
um o que é seu (Iustitia est constans et perpetua voluntas ius suum quique
tribuendi, Ulpinianus, D. 1, 1, 10, pr.)
O conceito de iustitia é mais próprio dos filósofos do que dos juristas. Tadavia,
Ulpinianus conhecia e dominava perfeitamente a filosofia gregam sibretudo Platão,
Aristóteles e Putarco.
- A ideia de “atribuir a cada um o que é seu” encontra-se (talvez
inspirado por Pitágoras) já em Platão, e constitui um tópico do
pensamento antigo.

- As normas jurídicas contribuem de um modo especial para a convivência


pacífica, pois, determinando eficazmente o que é de cada um, nem permitem
abusos de direito nem prejuízos para ninguém. Cada coisa (já apropriada)
pertence ao seu dono; está no seu lugar. Há ordem. Há tranquilidade. Ora, a
paz é precisamente a tranquilidade na ordem. Daí que a paz tem de ser
fundamentalmente uma obra da justiça.
- Não poderá haver paz, baseada em injustiça; haverá, quando muito, uma
ordem imposta pela força. Mas, a força pode vencer, mas só a razão (a justiça)
convence. E só o convencimento das pessoas produz tranquilidade, e esta,
como ficou dito, é um elemento integrante da paz.

- Coexistência pacífica entre as pessoas: ou físicas (indivíduos) ou


jurídicas (entidades, diferentes das pessoas físicas, capazes de direitos
e obrigações. Associações – formadas por pessoas físicas; Fundações –
constituídas por um conjunto de bens, especialmente afetados à realização de
certas finalidades).

- Ao conjunto das normas jurídicas chama-se Direito.

- Especial necessidade da existência de normas jurídicas


- É da essência do homem “estar no mundo”, o que implica estar com pessoas.
- O homem realiza-se pela convivência com as pessoas e pelo domínio e uso
das coisas.
- As normas que determinam o domínio e o uso das coisas, no
horizonte da intersubjetividade, são as normas jurídicas.
- Portanto, as normas jurídicas são imprescindíveis ao Homem
em sociedade, quer dizer, pertencem à essência social do
homem.
- Daí o famoso brocardo “ubi societas, ibi ius” – onde existir
uma sociedade, aí necessariamente tem de haver normas
jurídicas, o Direito.

 CARACTERÍSTICAS DAS NORMAS JURÍDICAS:


 EXTERNA, A SUA COERCIBILIDADE
- As normas jurídicas se distinguem de todas outras normas sociais, externamente,
sobretudo pelo seu caráter coercitivo, pela sua força imperativa. Impõem-se-nos
coativamente.
- O Direito (ius) é, fundamentalmente, uma vis (força). Durante muito tempo vis e
ius se escreviam e se pronunciavam da mesma forma. O Direito é uma força,
autoritariamente ditada (imposta ou declarada) e socialmente aceite.
 INTERNA, PRECEITOS (ENUMERAÇÃO, SIGNIFICADO, ALCANCE, VALOR E
HIERARQUIZAÇÃO).
- As normas jurídicas distinguem-se das outras normas sociais principalmente
pela sua característica interna, isto é, pelo seu conteúdo íntimo, pois é da
própria essência de qualquer norma jurídica, sempre, em tudo, a todos,
preceituar – “honeste vivere, alterum non leadere, suum cuique tribuere”.
- Não abusar dos seus poderes, isto é, exercer retamente as suas
faculdades ou direitos (honeste vivere)
- Não prejudicar ninguém (alterum non laedere)
- atribuir (ou dar ou só entregar ou dar e entregar) a cada um o que é
seu (suum cuique tribuere).
- Dar e entregar, juridicamente, são coisas diferentes.
Dar (dare) = transferir para outrem a propriedade
duma coisa.
Entregar (tradere) = transferir a posse.
- Tribuere (atribuir) tem um caráter genérico em relacao a dar
e a entregar, tanto pode ser só um, só o outro, ou os dois em
simultâneo.

A norma jurídica, ao conjunto das normas jurídicas e aos preceitos jurídicos (quer
fundamentais, quer gerais), chama-se “direito” (ius).

Título I – Conceito de Direito Romano


Capítulo 2º - Analise da primeira parte da expressão “Direito Romano” – IUS
ROMANUM (pág. 15 a ..)

a) Noção etimológica
- Significado “natural”, “espontâneo”, quer dizer, noção etimológica da palavra que
designa esse conceito jurídico.
- As palavras em Direito, sobretudo em Direito Romano, estão carregadas de
sentido, refletem luminosamente o pensamento jurídico.

- Ainda hoje não se sabe concretamente a origem da palavra ius. Os autores, quer
filólogos quer juristas, não estão de acordo quanto à sua etimologia. Alguns
consideram ius uma palavra primitiva, outros uma palavra derivada, e dentro deste
segundo grupo, há ainda muitas divergências.
- Segundo investigações mais recentes, a palavra ius, etimologicamente, deve ser
primitiva; mas tem uma relação ôntica, proximamente com iustitia, remotamente com
iupiter (iovis). Daí que o Direito (primeiro youes; depois ius) tem uma relação de
procedência com a divindade ou com as divindades.

b) Noção Real – Quid Ius? [O que é (o) Direito?]


- A respeito da definição de ius, observa Max E. Mayer: “até agora não houve um jurista nem
um filósofo do Direito que tenha acertado a formular uma definição do Direito unanimemente
aceite.” “Isto é esquisito, mas explicável. Em nossa opinião, o motivo principal consiste em que
é impossível compreender e explicar satisfatoriamente as diversas formas manifestativas do
Direito numa única fórmula.”
- É extremamente difícil definir o Direito, visto tratar de duma realidade altamente
complexa.
- Mas deve transcrever-se, para temos uma noção genérica (embora muito vaga), a
partir da qual iremos para as noções específicas (direito normativo, direito subjetivo
etc.), que já se podem definir, visto tratar-se de ralidades delimitadas, pouco ou nada
complexas.
- No entender de Sebastião Cruz, esta definição seria: Ius (direito) é tudo que
tem espécies atinências com o iustum (o justo, o exato, o devido).
- Pode ser tomado em vários sentidos, há autores que falam em 26 acepções.
Normalmente, apenas se referem duas: em sentido objetivo e em sentido
subjetivo. Sebastião Cruz entende, porém, que devem nomear-se, pelo menos,
6 acepções de ius (direito).

1º) Em sentido normativo, direito é a norma jurídica ou o conjunto de normas


jurídicas ou o ordenamento jurídico (tomado nalgumas das duas partes ou no
seu conjunto), que determina o modo de ser ou de funcionar duma
comunidade social, ou ainda os princípios jurídicos (fundamentais ou gerais).
- É neste sentido que se fala de Direito Natural, Positivo, Internacional,
Português (Espanhol, Francês etc.), Matrimonial, Penal, das Obrigações
(das Servidões, das Sucessões, da Empresa etc.).
- Vulgarmente chama-se ao direito em sentido normativo “direito (em
sentido) objetivo”. Sebastião Cruz considera isto como um erro, visto
que o objectum do ius nunca pode ser uma norma do ius, mas o
conteúdo do ius. A palavra objetivo da expressão “Direito Objetivo”
devia predicar-se de ciência jurídica e não de direito.

2º) Em sentido subjetivo, direito é a situação jurídica, o poder ou faculdade


moral que alguém (individuo ou entidade) tem de exigir, fazer, possuir, ou
simplesmente reter uma coisa. Neste sentido que se diz que o vendedor dum
objeto tem direito ao preço e o comprador tem direito à coisa vendida.

3º) Em sentido objetivo, ius significa o iustum, o devido; a própria coisa justa; a
realidade justa. É, pois, o objeto, o conteúdo ou âmbito do direito normativo
mas sobretudo do direito subjetivo. Era aquilo que os juristas romanos
geralmente designaram por natura rerum (natureza das coisas). Esse conceito
foi para os romanos o primeiro e o primário ou fundamental de Direito, de tal
modo que “quae rerum natura phohibentur nulla lege confirmata sunt”, ou
seja, aquilo que é proibido pela natureza das coisas, não pode ser confirmado
por nenhuma lei (D. 50, 17, 188, 1.)

4º) Numa quarta acepção (o local), ius tem significado de lugar onde se
administra a justiça; grosso modo, o tribunal. É com este alcance que se diz em
linguagem vulgar: quem não cumpre, deve ser chamado ao direito (ou seja, ao
tribunal).

5º) Numa quinta acepção, ius significa o “saber jurídico”. Tem esta acepção,
quando se diz: Antônio estuda Direito (ou seja, estuda o saber jurídico,
geralmente ciência jurídica).

6º) Numa sexta acepção, ius significa patrimônio (quer ativo quer passivo)
duma pessoa.

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