Durkheim e A Globalizacao

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AS DIMENSES DA GLOBALIZAO GIOVANNI ALVES Durkheim e a Globalizao omo !

o"#e $e Soli$arie$a$e So ial

urkheim nos apresentou em sua obra A diviso

do trabalho social, de 1893, a diviso do trabalho como fonte de solidariedade social. Ele caracterizou, por outro lado, a anomia, como sendo algo decorrente de um per odo de r!pidas transforma"#es da economia e da sociedade, em virtude do pr$prio desenvolvimento da diviso do trabalho social. Em virtude disso, indicou a necessidade de regulamentaes mais complexas, salientando o papel do Estadona"o e do governo. %as, para Durkheim, com o tempo tenderia a se formar tais regulamenta"#es sociais, capazes de instaurar e realizar a natureza da pr$pria diviso do trabalho mais desenvolvida& a solidariedade orgnica. Deste modo, para ele, a anomia seria tempor!ria e um fen'meno e(cepcional nas sociedades mais comple(as. )a sua perspectiva, est! impl cito um otimismo com o desenvolvimento das sociedades modernas. *e Durkheim criticou o otimismo dos utilitaristas e dos economistas diante da mo invisvel do mercado, de certo modo, ele pr$prio acreditava +ue o desenvolvimento da diviso do trabalho social tenderia a incrementar a solidariedade social. ,ara isso, depositou seu otimismo nas inst-ncias da regulamentao juridico-moral da sociedade, como uma mera manifesta"o da natureza da pr$pria diviso do trabalho mais desenvolvida. . /nfase de Durkheim no consenso social caracteriza um ponto de vista corporativo +ue, de certo modo, iria predominar nas sociedades capitalistas desenvolvidas europ0ias, no p$s1guerra, com as e(peri/ncias de Estado social e +ue ho2e, encontram1se em crise diante da globaliza"o.

Globalizao Como Fonte de Solidariedade ?


)a $tica de Durkheim, a globaliza"o poderia ser considerada e(presso de um desenvolvimento ampliado do capitalismo moderno, +ue tenderia a impulsionar a diviso do trabalho social compreendida como sendo a especializao ligada produtividade do trabalho. Ela, a diviso do trabalho en+uanto especializa"o, 0, na linguagem dos economistas, o resultado de um esfor"o inteligente do homem para tirar o maior produto e o maior proveito dos fatores de produo, incluindo seu pr$prio trabalho. *ob a globaliza"o, assistimos a e(acerba"o da l$gica da especializa"o numa escala planet!ria&
Em uma economia global, nem o capital, nem o trabalho, nem as mat0rias1primas constituem, em si, o fator econ'mico determinante. 3 importante 0 a melhor rela"o entre esses tr/s

fatores. ,ara estabelec/1la, a 4firma global5 no leva em considera"o as fronteiras nem as regulamenta"#es, mas somente a e(plora"o inteligente +ue pode fazer da informa"o, organiza"o do trabalho e revolu"o da gesto 67omanet, 19988

Entretanto, Durkheim reconheceu +ue a busca pelos produtores da mais alta produtividade atrav0s da especializa"o mais inteligente no basta para assegurar uma diviso do trabalho vi!vel. . diviso do trabalho e a concorr/ncia criam problemas 9 medida +ue os resolvem. . diviso do trabalho sup#e uma aloca"o pr0via dos recursos e uma diviso ulterior do produto, das +uais no so e no podem ser de antemo calculados e dese2ados todos os aspectos e conse+:/ncias. Diz ele&
*e, normalmente, a diviso do trabalho produz a solidariedade social, pode acontecer contudo +ue ela tenha resultados completamente diferentes, ou mesmo opostos 6Durkheim, 198;&1<;8

Deste modo, num primeiro momento, Durkheim critica o vi0s otimista +ue os evolucionistas e os utilitaristas atribu ram a mo invisvel do mercado 6*mith e *pencer8. .pesar disso, como iremos ver, ele no dei(a de incorporar um certo otimismo diante da direo natural da diviso do trabalho. ,ara Durkheim, a =dire"o natural> da diviso do trabalho 0 a solidariedade social, mas algo a faz desviar1se da sua dire"o natural. Esse algo 0 a anomia, o desregramento. ,ara ele, a diviso do trabalho, mesmo acompanhada de uma especializa"o das tarefas, no n vel da aloca"o dos recursos e de uma eleva"o da produtividade no +ue concerne ao produto, 0 tamb0m e antes de tudo, um fato de organizao, ou se2a, utilizando a acep"o de Durkheim, um fen'meno de solidariedade. Ela no 0 um fen'meno natural, mas propriamente social? al0m disso, esse fen'meno no 0 espont-neo, mas, por assim dizer, sistematicamente organizado e coordenado. Durkheim enfatiza a coordena"o das tarefas, principalmente sob a solidariedade orgnica, correspondente a nossa 0poca, onde a diferencia"o das atividades produtivas ocorre de acordo com crit0rios de efic!cia e de compet/ncia. 3corre, segundo ele, uma mudan"a marcante e incessante na hierar+uia do status, +ue e(ige um enorme desenvolvimento das fun"#es de coordena"o, +ue se tornam cada vez mais met$dicas e conscientes. ,or e(emplo, Durkheim salienta a preponder-ncia do direito cooperativo sobre o direito repressivo como uma manifesta"o da solidariedade orgnica +ue caracteriza as sociedades comple(as. @omo as diferen"as resultantes da especializa"o provocam o aumento da fre+:/ncia e da intensidade das trocas entre os produtores, com os riscos de conflitos inerentes a esses contatos e a essas trocas, a diviso do trabalho deve ser colocada sob a vigil-ncia de autoridades dotadas de uma viso mais abrangente do processo de produ"o do +ue cada um dos produtores. ara !ur"heim essa funo de coordenao e de reflexo # tanto mais importante $uanto mais diferenciadas forem as tarefas produtivas. . s0rie de cita"#es abai(o demonstram a import-ncia dos meios de coordenao para o desenvolvimento da solidariedade social em sociedades mais comple(as&
A medida +ue as diferen"as se tornam mais numerosas, a coeso torna1se mais inst!vel e tem necessidade de ser

consolidada por outros meios 6Durkheim, 198;b&1;B8 ..essa falta de regulamentao no permite a harmonia regular das fun"#es 6Durkheim, 198;b&1CD8 *e a diviso do trabalho no produz solidariedade, 0 por+ue as rela"#es dos $rgos no so regulamentadas, 0 por+ue esto num estado de anomia 6Durkheim, 198;b&1CE8

. diviso do trabalho 0 para Durkheim no somente especializa"o das aptid#es e das compet/ncias? 0 tamb0m coordena"o das tarefas. 3 +ue sup#e como necessidade da reprodu"o social de uma maior organiza"o e maior coordenao das trocas. .lguns diriam& uma nova =regula"o>, termo utilizado por uma escola de economistas franceses. 3ra, o +ue 0 a globaliza"o seno o desenvolvimento ampliado do capitalismo moderno, com a agudizaro da diviso do trabalho social numa escala planet!ria, cu2os resultados perversos, na perspectiva de Durkheim, seriam decorrentes de uma anomia universal 6Durkheim no utiliza tal e(presso8 F )a $tica durkheiminiana, a especializa"o, o aumento da fre+:/ncia e da intensidade das trocas no 0 acompanhado, na mesma medida, de uma maior organiza"o e coordena"o por parte das autoridades do processo produtivo. ,or isso, ela tende a gerar uma s0rie de fen'menos anormais ou patol%gicos. . fal/ncia do Estado social1democrata 6&elfare 'tate8. +ue conseguiu nas Gltimas d0cadas do s0culo HH, constituir uma coeso social relativa, instaurando a solidariedade orgnica a partir de uma s0rie de regulamenta"#es sociais e 2ur dicas, tendeu a conduzir o mundo capitalista a um novo per odo social e hist$rico caracterizado pela desregulamenta"o, pelo predominio da l$gica privatista em detrimento do espa"o pGblico, onde a crise dos valores agudiza, cada vez mais, a capacidade do sistema social recompor1se e, +uem sabe, de reproduzir1se 6utilizando uma analogia organicista8. 3 m0rito de Durkheim foi salientar a import-ncia das normas e valores para a reprodu"o de organismos sociais comple(os, como so as sociedades capitalistas modernas, principalmente na era da globaliza"o, onde 0 maior a integra"o e intensidade das trocas e da produ"o. )a medida em +ue processos sociais vinculados a diviso do trabalho social em escala planet!ria conduzem o mundo capitalista a uma s0rie de transforma"#es muito r!pidas, criando uma situa"o de anomia, a ine(ist/ncia de um (stado mundial, de um governo global como impulsionador da coeso social, recept!culo de valores da solidariedade orgnica, tenderia a complicar, ainda mais, a capacidade de resolver a situa"o de anomia, intrinseca a pr$pria natureza das transforma"#es r!pidas proporcionadas pelo desenvolvimento da diviso do trabalho social. 3 +ue percebemos, ho2e, 0 +ue, o +ue era considerado por Durkheim como e(cepcional, tende a torna1se cr'nico. . sa da, com certeza, na perspectiva durkheiminiana, seria uma nova regulamentao mundial, atrav0s da constitui"o de organismos de coordena"o global, rudimentos ainda pouco eficazes de um governo e de autoridades mundiais, capazes de e(ercer uma vigil-ncia mais abrangente do processo do =globalismo> 6utilizando a e(presso de Ianni8. Deste modo, para Durkheim, seria a natureza da diviso do trabalho social, cada vez mais comple(a, +ue poderia e(plicar,

por e(emplo, o surgimento de $rgos de coordena"o multilaterais, tais como o J18 ou ainda, a 3%@, o K%I e o Lanco %undial.

@om certeza, Durkheim seria um cr tico da globaliza"o tal como ocorre em nossos dias, na medida em +ue ela se desenvolve sem uma coordena"o global, propiciando, portanto, uma situa"o de anomia. %as ele no seria um cr tico da globaliza"o em si, na medida +ue iria reconhecer nela uma positividade& o desenvolvimento de novas formas de solidariedade, inevit!vel no atual est!gio da diviso do trabalho.

Globalizao e a Anomia Universal


. anomia 0 uma entidade observ!vel apenas atrav0s de manifesta"#es diversas. M um fen'menos de desregramento +ue possui significa"#es mGltiplas. Ela se vincula aos malogros do sistema de diviso do trabalho +ue caracterizam as sociedades industriais. ,ara Durkheim, a anomia seria um conceito +ue poderia e(plicar, por si s$, a s0rie de resultados perversos da globaliza"o, no podendo, ser identificada meramente com o conceito de alienao, utilizado pelos mar(istas, tendo em vista +ue a aliena"o decorreria de algo +ue iria al0m dela mesma& a propriedade privada8. ,ara Durkheim, os seguintes fen'menos sociais so manifesta"#es da anomia. M claro +ue podem haver outras formas de anomia, =mas a+uelas +ue vamos falar N disse ele 1 so as mais gerais e as mais graves> 6Durkheim, 198;8& 1. .s =rupturas parciais da solidariedade org-nica> so as propiciadas pelas crises industriais e comerciais, tais como as fal/ncias, +ue testemunham +ue certas fun"#es no esto a2ustadas umas 9s outras. ,or e(emplo, elas poderiam ser vinculadas 9s crises capitalistas, 9 pr$pria instabilidade sist/mica da economia moderna sob a dire"o hegem'nica do capital financeiro. )a $tica de Durkheim poderiamos apreender +ue tende a ocorrer ho2e, uma s0rie de =disfuncionalidades> entre a economia nacional e a economia global. 3 surgimento de um mercado mundial cada vez mais integrado pelo livre com0rcio, tenderia a incrementar, ainda mais, o +ue Durkheim denominou de =rupturas parciais> da solidariedade org-nica. E. 3 =antagonismo entre o trabalho e o capital> ocorre principalmente na medida em +ue a especializa"o se desenvolve no mundo do trabalho, constituindo a grande indGstria 6cabe salientar +ue para Durkheim a alienao) no sentido mar(ista, seria apenas uma manifesta"o e uma conse+:/ncia da anomia8. ,ara ele, a pe+uena indGstria 1 e vamos pensar ho2e nas oficinas =p$s1fordistas>1 0 mais suscet vel de cultivar uma solidariedade org-nica, com a unidade e a concerta"o proliferando entre capital e trabalho, sendo a grande indGstria propicia a desenvolver o antagonismo entre trabalho e capital. )a medida em +ue prolifera a grande indGstria e seu espa"o de atua"o, indo al0m dos mercados locais e nacionais, tende a tornar mais agudo o antagonismo entre capital e trabalho. Diz ele& =0 apenas na grande indGstria +ue estes conflitos se encontram em estado

agudo.>6Durkheim, 198;&1<98. .o salientar a agudeza do antagonismo entre capital e trabalho na grande industria , Durkheim prenunciara uma das principais causas da crise do fordismo, salientadas pelos =regulacionistas> franceses, a organiza"o taOlorista1fordista do trabalho, baseada na especializa"o radical do trabalho 6Pipietz, 198;? LoOer, 198;8. 3. . especializa"o sempre crescente da pes+uisa cient fica acarreta um efeito de atomiza"o, decorrente do pr$prio processo de especializa"o das ci/ncias. @ontra a atomiza"o das especialidades da ci/ncia, Durkheim sugere +ue 0 necess!rio =encarregar uma ci/ncia nova de a reconstituir>. Diz ele,=a+uilo +ue o governo 0, face 9 sociedade no seu todo, a filosofia deve s/1lo face 9s ci/ncias.> . situa"o de anomia, salientadas por Durkheim, no decorre de uma natureza da diviso do trabalho mais comple(a, +ue, para ele, 0 fato de solidariedade social. 3 +ue poderia nos levar a perceber +ue, para ele, a globaliza"o, compreendida como uma etapa superior da diviso do trabalho social, tenderia a no conduzir, por sua pr$pria natureza, a tais resultados sociais perversos. . perversidade da globaliza"o no campo social, na $tica de Durkheim, poderiam ser situa"#es e(cepcionais. Qais perversidade sociais +ue ela produziria seriam decorrentes da falta de regulamenta"o, isto 0, da anomia 6para Durkheim, a aus/ncia de normas e(plica a anormalidade8&
. diviso do trabalho no produz estas conse+:/ncias em virtude de uma necessidade da sua natureza, mas apenas em circunst-ncias e(cepcionais e anormais 6Durkheim,198;&1CC8

. imagem da sociedade-organismo 0 +ue incontestavelmente transparece na no"o durkheiminiana de solidariedade org-nica. ,or isso, ele considera os fenom/nos de perversidade social, decorrentes do desenvolvimento do capitalismo moderno, como anormais e e(cepcionais e no como a verdadeira situa"o normal das sociedades modernas. Disse ele& =...como todos os fatos biol$gicos, ela apresenta formas patol$gicas, +ue 0 necess!rio analisar> 6Durkeim, 198;&1<;8 )a obra * suicidio, de 189B, a no"o de anomia 0 imersa num con2unto de dicotomias conceituais +ue esclarecem novos aspectos do conceito, aplic!vel a 0poca em +ue vivemos. ,or e(emplo& ele contrap#e egosmo ( altrusmo e ainda anomia e fatalismo. )a obra de 1893, ele 2! criticava a especializa"o =ego sta>, +ue cria a anomia&
...+ue o indiv duo no se feche a estreitamente, mas se mantenha em rela"o constante com as fun"#es vizinhas..6Durkheim, 198;b&1CB8

3u ainda&
...o indiv duo curvado sobre a sua tarefa, isola1se na sua atividade particular? dei(a de sentir os colaboradores +ue trabalham ao seu lado na mesma obra +ue ele, dei(a absolutamente de ter id0ia desta obra comum 6Durkheim, 198;b&1;D8.

Qais desdobramentos conceituais da anomia, principalmente no campo da rela"o do indiv duo com a sociedade e seu grupo social, poderiam apreender uma s0rie de aspectos do =desregramento> no postos na obra pret0rita A diviso do trabalho social. M importante a percep"o anal tica de Durkheim 6ainda baseada na imagem de uma sociedade-organismo+ de +ue a comple(ifica"o dos sistemas sociais ocasiona uma individualiza"o crescente dos membros

da sociedade, o +ue propicia efeitos crescentes de =desregramento>, considerado por ele como situa"#es e(cepcionais&
. diversidade das fun"#es 0 Gtil e necess!ria? mas, tal como a unidade, +ue no 0 menos indispens!vel, no surge delas espontaneamente, o cuidado de a realizar e de a manter dever! constituir, no organismo social, uma fun"o espec fica, representada por um $rgo independente. Este $rgo 0 o Estado ou o Joverno 6Durkheim, 198;&1;18

Entretanto, Durkheim no defende um governo forte, +ue imponha de cima para bai(o a regulamenta"o +ue propicie a unidade e o consenso entre as partes da sociedade. Diz ele +ue,
3 +ue faz a unidade das sociedades organizadas, como de todo o organismo, 0 o consensus espont-neo das partes, 0 essa solidariedade interna, +ue no 0 s$ to indispens!vel como a a"o reguladora dos centros superiores, mas +ue 0 tamb0m sua condi"o necess!ria, por+ue eles apenas a traduzem num outra linguagem e, por assim dizer, a consagram R...S As partes devem ser j, solid,rias uma das outras para $ue o todo tome consci-ncia de si e reaja como tal.> 6o grifo 0 nosso8 6Durkheim, 198;&1;38

. comple(ifica"o social 0 +ue produz a solidariedade org-nica. )a viso dos utilitaristas, como 0 o caso de *pencer, a solidariedade orgnica seria e(clusivamente contratual, seria livre de toda a regulamenta"o. Entretanto, para Durkheim, tal solidariedade seria inst!vel& =3 +ue manifesta a e(tenso da a"o social 0 a e(tenso do aparelho 2ur dico>. M necess!rio, portanto, uma regulamenta"o comple(a, um aparelho jurdico. Durkheim ansiava por uma sociedade em +ue os indiv duos fossem guiados por um sistema de valores e normas, isto 0, por uma moral, +ue os encora2asse e os convidasse a se satisfazerem com sua posi"o no sistema de diviso do trabalho. Ele assimila sociedade e organizao, sociedade e organismo& =3 papel da solidariedade no 0 suprimir a concorr/ncia, mas modera1la.>. E mais adiante salienta +ue
...estas perturba"#es so naturalmente tanto mais fre+:entes +uanto mais especializadas forem as fun"#es? por+ue +uanto mais comple(a 0 uma organiza"o mais se faz sentir a necessidade de uma regulamenta"o comple(a 6Durkheim, 198;b&1C18

Durkheim acreditava +ue o estado de anomia seria tempor!rio. Decorre de uma fase do desenvolvimento social caracterizado por r!pidas mudan"as. ,or e(emplo, ele pergunta& de onde prov0m o estado de anomia F Durkheim responde&
Tma vez +ue um corpo de normas 0 a forma definida +ue tomam com o tempo as rela"#es +ue se estabelecem espontaneamente entre as fun"#es sociais, pode1se dizer a priori +ue o estado de anomia 0 imposs vel em toda a parte em +ue os $rgos solid!rios esto em contacto suficiente e suficientemente prolongado 6Durkheim, 198;8

,or isso, na medida em +ue as partes contguas perceberem, em cada circunst-ncia, a necessidade +ue t/m uma das outras, e viverem, atrav0s da troca, um sentimento vivo e cont nuo de sua mGtua depend/ncia, elas iro consolidar, com o tempo, a solidariedade, prevendo e fi(ando as condi"#es do e+uil brio do organismo. )a perspectiva de Durkheim, portanto, com o tempo, os conflitos tendem a se e+uilibrar. . situa"o de anomia 0 bastante percept vel na 0poca hist$rica

de Durkheim. Pembremos +ue ele viveu a 0poca de passagem do capitalismo concorrencial para o capitalismo monopolista, uma etapa do desenvolvimento capitalismo moderno caracterizada pelo =imperialismo> 6a virada para o s0culo HH8. Ele pertence a uma 0poca de transforma"#es r!pidas na vida social e na economia internacional, nas empresas e na pr$pria ci/ncia. )a $tica de Duirkheim poder amos dizer +ue a diviso do trabalho, e por +ue no dizer, a globalizao +ue ocorre ho2e trazendo em seu bo2o uma s0rie de resultados sociais perversos, deve seus resultados a rapidez das transforma"#es capitalistas, sendo +ue, com o tempo, ela ira tender a alcan"ar uma condi"o de e+uil brio +ue desvendaria seu verdadeiro sentido e finalidade& ser uma fonte de solidariedade e no apenas, como os economistas muitas vezes salientam, um meio de aumentar o rendimento das for"as sociais. . seguinte longa transcri"o de Durkheim 0 importante para mostrar como as transforma"#es do mercado, segundo ele, atingem a empresa e a rela"o capital e trabalho e possuem implica"#es na pr$pria ci/ncia social e moral. *o implica"#es na economia, no mundo do trabalho e na pr$pria atividade cient fica&
...9 medida +ue o tipo organizado se desenvolve, a fuso dos diversos segmentos uns nos outros implica a dos mercados num mercado Gnico, +ue abra"a apro(imadamente toda a sociedade. Este estende1se mesmo para al0m dela e tende a torna1se universal, por+ue as fronteiras +ue separam os povos esbatem1se ao mesmo tempo +ue as +ue separam os segmentos de cada um deles. Da resulta +ue cada indGstria produz para consumidores +ue esto dispersos sobre toda a superf cie do ,a s, ou mesmo do mundo inteiro. 3 contato no 0 portanto 2! suficiente. 3 produtor no pode abarcar o mercado com olhar, nem mesmo com o pensamento? no pode 2! representar1lhe os limites, uma vez +ue ele 0, por assim dizer, ilimitado. ,or conse+:/ncia, a produ"o carece de freio e de regra? ela apenas pode tatear ao acaso e, no decurso destas tentativas, 0 inevit!vel +ue a medida se2a ultrapassada +uer num sentido +uer no outro. Da essas crises +ue perturbam periodicamente as fun"#es econ'micas. 3 aumento dessas crises locais e restritas, +ue so as fal/ncias, 0 verdadeiramente um efeito desta mesma causa. A medida +ue o mercado se estende, a grande indGstria surge. 3ra, ela tem por efeito transformar as rela"#es dos patr#es e dos oper!rios. Tma maior fadiga do sistema nervoso, 2unta 9 influ/ncia contagiosa das grandes aglomera"#es aumenta as necessidades destes Gltimos. 3 trabalho mec-nico substitui o do homem? o trabalho na manufatura, o da pe+uena oficina. 3 oper!rio est! arregimentado fora da fam lia todo o dia? vive cada vez mais afastado da+uele +ue o emprega, etc. Estas condi"#es novas da vida industrial reclamam naturalmente uma organiza"o nova? mas, como estas transformaes se realizam com uma extrema rapidez) os interesses em conflito no tiveram ainda tempo para se e$uilibrar. Kinalmente, o +ue e(plica +ue as ci/ncias morais e sociais este2am no estado +ue dissemos 0 +ue foram as /ltimas a entrar no c rculo das ci/ncias positivas. @om efeito, h! pouco mais de um s0culo +ue este novo campo de fen'menos se abriu 9 investiga"o cientifica. 3s cientistas instalaram1se, num ou noutro lado, segundo os seus gostos naturais. Dispersos sobre esta vasta superf cie, permaneceram at0 o

presente demasiado afastados uns dos outros para sentir todos os la"os +ue os unem. %as, por+ue levaro as suas pes+uisas sempre mais longe dos seus pontos de partida, acabaro necessariamente por atingir1se e, por conseguinte, por tomar consci/ncia da sua solidariedade. . unidade da ci/ncia formar-se-, assim por si mesma? no pela unidade abstrata duma f$rmula, de resto demasiado e( gua pela infinidade de coisas +ue ela deve abarcar, mas pela unidade viva de um todo org-nico. ,ara +ue a ci/ncia se2a una, no 0 necess!rio +ue ela caiba inteira no horizonte de uma e mesma consci/ncia N o +ue de resto, 0 imposs vel N mas basta +ue todos a$ueles $ue a cultivam sintam $ue colaboram numa mesma obra. 6o grifo 0 nosso86Durkheim, 198;b&C311C;8

.s partes grifadas por n$s salientam portanto dois aspectos importantes do pensamento durkheiminiano& 1. . anomia 0 decorr/ncia de r!pidas transforma"#es sociais e portanto, possuem um car!ter de e(cepcionalidade, o +ue leva a crer +ue, com o tempo, os interesses em conflito tendero a se e+uilibrar. E. 3 e$uilbrio social, salientado por Durkheim, tende a ocorrer, na medida em +ue surgirem, no decorrer do pr$prio desenvolvimento social, regulamenta"#es mais comple(as, por parte do Estado1na"o e dos governos +ue apenas manifestariam um consenso espontneo das partes, +ue no poderia ser imposto pelos centros superiores. 3 +ue +uer dizer +ue, Durkheim cultiva um vi0s otimista sobre os desdobramentos da diviso do trabalho social e, por conseguinte, do +ue poder amos considerar, ho2e, a globaliza"o. *urge uma +uesto crucial& no haveria em Durkheim uma valoriza"o e(acerbada e idealizada do aparelho 2ur dico, do Direito, como cimento ideol$gico e regulador da coeso social, contra o movimento do capital F E mais do +ue isso& uma cren"a inabal!vel na capacidade reguladora do Estado1na"o sobre o desenvolvimento irremedi!vel da moderniza"o capitalista 6o Estado1na"o posto como o referencial heur stico da sociologia cl!ssica8 F @om certeza, Durkheim teve a importante percep"o de um aspecto da sociabilidade na etapa moderna do capitalismo& o !ireito como sendo a e(presso1mor da ideologia +ue coordena e regula a reprodu"o social, principalmente numa 0poca onde o movimento do capital,sob a etapa da mundializa"o financeira, possui duas dimens#es parado(ais& por um lado, o capital financeiro tem um medo p-nico das regulamenta"#es pGblicas +ue poderiam se opor a esse livre movimento de financeiriza"o 6por e(emplo, uma =ta(a Qobin>8 e, por outro lado, os investidores institucionais 1 e os governos 1 t/m um temor visceral das instabilidades sociais provocadas pelo movimento e(acerbado do capital financeiro. .lgo a ser destacado 0 +ue Durkheim salientava +ue a nova regulamenta"o social capaz de superar as anomias da modernidade deveria nascer do =consenso espont-neo entre as partes>, ao inv0s de serem impostos por um Estado onisciente, verdadeiro 0eviat, tal como surge ho2e, no receitu!rio neoliberal. )a verdade, Durkheim 0 um dos precursores ideol%gicos dos pactos tripartites de cariz neocorporativo tal como proposto pela social-democracia moderna.

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