Treino de Força Criancas
Treino de Força Criancas
Treino de Força Criancas
em crianas e jovens
Rev Medicina Desp in forma, 1 (6), pp.21-24, 2010
Prof. Doutor Mrio A. Cardoso Marques | Departamento de Cincias do Desporto da Universidade da Beira
interior | Centro de Investigao em Desporto, Sade e Desenvolvimento Humano (CIDESD)
4
tema
abstract
O presente artigo pretendeu abordar algumas das principais variveis de interesse directa-
mente ligadas ao desenvolvimento da fora em crianas e em jovens. Uma vez que ainda
hoje constitui um tema controverso, optamos por focar os pontos onde existe maior discor-
dncia: volume, intensidade e tipo de exerccios.
The aim of the present study was to examine specific variables related with resistance train-
ing in youth. Unfortunately, to date it remains a controversial subject. Thus, we present some
of the most controversial points associated with resistance development in youth: volume,
intensity and type of exercises.
mos autores, no faz nenhum sentido iniciar o trabalho de fora por tinham o mesmo suporte muscular que os adultos, e que a au-
tema
volta dos 17/18 anos de idade, j que a literatura refere a eficcia dos sncia de andrognios, principalmente da testosterona, limitaria o
programas de fora em idades compreendidas entre os 6 e os 13 anos trabalho de fora. Para alm da importncia da coordenao neu-
de idade, como se pode comprovar no Quadro 1. ro-muscular, hormonas, como a de crescimento e a insulina, so
importantes para o desenvolvimento da fora em crianas.
Estudos Idades
Metodologia Durao Freq. Resultados mais Nas crianas pr-pberes mais velhas (10-12 anos de idade), o
de treino (semanas) semanal significativos
treino de fora deve complementar o trabalho realizado na fase
F. mx. isomtrica:
Nielson Aceleraes,
extensa de anterior (dos 7 aos 9 anos de idade), reforando assim toda a mus-
et al. 7-9 extenso de pernas 5 3
pernas) Impulsio
1980 e saltos verticais
vertical culatura e o sistema osteo-articular. Dado que existe uma forte
Sewall e Pesos livres: 3 sries correlao entre a fora e as habilidades tcnicas e motoras,
Fora nos flexo-
Micheli 10 -11 de 10rep. com 50% 9 3
res do ombro fundamental estabelecer um equilbrio harmonioso entre todos
1986 1RM
Resistncia hidru- F. isocintica: os grupos musculares. Ainda que se deva manter um elevado vo-
Weltman
lica (TC: 30 cada principais grupos
et al. 6-11
GM apenas os
14 3
musculares lume de exerccios de carcter geral, h que incluir um nmero
1986
mais importantes) Salto vertical
ptimo de exerccios especficos de fora, dado que a maior parte
Sailors
Pesos livres: 65-75% F. mxima: 5RM: das modalidades desportivas requer uma elevada componente de
de 5RM (agacha- agachamento,
e Berg 12 8 3
1987
mento, supino e press de peito e coordenao relacionada com a tcnica (Gonzlez-Badillo e Go-
flexes de braos) flexo de braos
rostiaga, 1995). Esta sub-etapa (10-12 anos) costuma ser decisiva
Pesos livres:
60-75% de 1RM
F. mx. dinmica: para a consolidao dos aspectos ligados coordenao neuro-
Blimkie supino e flexes
(agachamento,
et al. 9-11
supino e flexes de
10 3 de braos muscular e, principalmente, no que diz respeito consolidao da
1989 F. mx. isomtri-
braos; 3-5 sries tcnica de base iniciada no perodo anterior (7-10 anos de idade).
ca do cotovelo
de 12 rep).
Salto vertical
nal decididamente uma etapa abonatria, isto , o aumento
Diallo et Pliometria simples
10-13 10 3 com e sem con-
al. 2001 variada da produo de testosterona joga um papel importante para o
tramovimento
impulso e desenvolvimento da fora (Beunen e Thomis, 2000).
Pesos livres A
Marque
(10/11anos): 6 a Apesar disso, h que prestar especial ateno ao seu treino, na
8rep. 5-20kg (AG)
M. e Salto vertical
Gonz- 10-13
e 2-10 kg para o
8 2 com e sem con-
medida que se observa, com muita frequncia, e de forma erra-
AG; Pesos livres B
lez-Badi- tramovimento da, a utilizao de formas de treino inadequadas e semelhantes
(12/13): 6 a 8 rep.:
llo 2003
5 a 30kg (AG) e 5 a
20kg para o AG. s do adulto, o que muitas vezes provoca graves leses osteo-
QUADRO 1 Resumo de alguns estudos cientficos efectuados em crianas (depois de articulares. Em termos globais, deve-se aumentar a diversidade
Marques, 2004). do trabalho com pesos e mquinas, incluindo exerccios muito
simples que solicitem os grupos musculares mais importan-
O trabalho de fora em pr pberes tes de cada modalidade. S assim possvel desenvolver-se a
Durante a infncia quase todos os ndices fsicos esto em cres- musculatura dos braos, do tronco e dos membros inferiores,
cimento e, do ponto de vista motor, o jovem desportista atinge mas sempre com a preocupao de criar a harmonia entre os
uma capacidade fsica e de trabalho ptimas. Todavia, a nossa diversos msculos.
4
com o potencial do sistema nervoso, prin- duzida, para alm da obrigatoriedade dos
tema
cipalmente nas seis primeiras semanas Exerccios de fora em crianas exerccios especficos, h que dar relevo
de treino (Fleck, 1999). A este respeito, a e jovens importante utilizao de exerccios de
literatura identifica vrios programas de Do ponto de vista terico, torna-se prati- carcter geral. Mais, o volume (sries x
treino da fora que foram eficazes durante camente impossvel fixarem-se normas de repeties) de treino deve ser privilegia-
perodos de tempo de 6/8 semanas ou um cargabilidade geral, quer em crianas, quer do face intensidade. Gonzlez-Badillo
pouco mais longos, como por exemplo, de em adolescentes, sem antes se ter efectua- e Serna (2000) entendem que nunca se
8 a 10/12 semanas (Sewall e Micheli, 1986; do uma anlise da preparao precedente. deve realizar o treino de fora em dois dias
Weltman et al., 1986; Sailors e Berg, 1987; Para Marques (2004), quer os exerccios que seguidos e mais de trs vezes por semana,
Blimkie et al., 1989; Ramsay et al., 1990; envolvem grupos musculares isolados (ex: bem como evitarem-se esforos mximos,
Falk e Mor 1996; Diallo et al., 2001; Mar- extenso de pernas), quer os exerccios mais isto , nem grandes percentagens, nem um
ques M. e Gonzlez-Badillo, 2003) ou at complexos, isto , onde participam mais uni- nmero mximo de repeties por srie.
mesmo 14/20 semanas (Weltman et al., dades articulares (ex. agachamento), devem
1986; Ramsay et al., 1990). Nielsen et al. fazer parte de qualquer programa de treino Manipulao do volume e
(1980) foram ainda capazes de constatar onde participem crianas ou jovens. Enquan- intensidade
que o de trabalho de fora durante cinco to os primeiros so relativamente fceis de A planificao do trabalho de fora deve
semanas pode ser igualmente efectivo na se executar, exerccios como o agachamento ter como base de desenho metodolgico
melhoria da fora. Uma das formas mais requerem maior coordenao (Faigenbaum, a manipulao do volume e da intensi-
usuais e prticas para se determinar a per- 2000). Relativamente ao desenvolvimento dade dos exerccios, tornando-se funda-
centagem da carga externa a utilizar feita das diferentes manifestaes de fora, por mental e determinante o uso de distin-
atravs do teste de fora dinmica mxi- exemplo, para a fora mxima ser melhora- tos mtodos como forma eficaz de no
ma (1RM: uma repetio mxima) (Fleck, da, podem-se utilizar desde cargas muito le- s aumentar os nveis de fora mxima,
1999). Embora a literatura reporte vrios ves at cargas mais pesadas, devendo ser evi- como de potncia (Baker e Nance, 1999).
estudos que usaram este processo como tados os exerccios tipicamente excntricos, Contudo, o trabalho especfico de fora
forma de estimar a carga em crianas ou uma vez que a fase excntrica trabalhada mxima, especialmente quando se utili-
em jovens pr-pberes (Sewall e Micheli em quase todos os movimentos. Por outro zam grandes magnitudes da carga (car-
1986; Blimkie et al., 1989; Ramsay et al., lado, dado que a fora explosiva representa gas pesadas), pode ser bastante exigen-
1990), e sem menosprezar este tipo de a manifestao de fora mais importante te para qualquer atleta, mesmo para os
metodologia, opinamos que os testes de para a globalidade dos desportos, esta pode mais experientes (Bloomer e Ives, 2000).
1RM so algo discutveis e quase sempre ser desenvolvida com a utilizao de cargas Como tal, devem-se combinar esforos
desnecessrios nestas idades. Esta opinio livres e mquinas isoinerciais (resistncia mximos com solicitaes musculares
igualmente corroborada por Gonzlez- constante), ou atravs da realizao de exer- menos exigentes (Marques, 2004).
Badillo et al. (2000), ao defenderem que ccios pliomtricos (Faigenbaum, 2000). A respeito de intensidade, pensa-se que
se deve evitar os testes de 1RM, e que a esta componente do treino mais dif -
intensidade da carga de treino deve ser Programas de treino da fora cil de controlar do que o volume, j que
igualmente prescrita pela capacidade de em crianas e jovens a intensidade de trabalho mal calculada
trabalho individual. Por exemplo, a maio- Nos jovens, tal como nos adultos, os pro- pode ser muito mais prejudicial para o
ria das modalidades desportivas no exige gramas destinados ao desenvolvimento da rendimento do atleta do que o volume
um elevado grau de fora mxima, poden- fora devem-se coadunar s necessida- de treino. Apesar da eficcia dos vrios
do tomar-se como medida de referncia des especficas de cada atleta e prpria programas de treino de fora referidos
3 a 5 RM. Esta percentagem no s ser especificidade da modalidade em causa. na literatura especializada, a maioria das
Ciclos de treino 12-15 vs. 8-10 semanas 8-12 semanas 6-8 semanas
N. de vezes/semana 2-3 1-2 1-2 1-2
Quadro 3 Sugestes para o trabalho de fora em pberes crianas (depois de Marques, 2004).
Bibliografia
1. Baker, D.; Nance, S. (1999). The Relation Between Running Speed Phys. Fitness. 41: 342-348. 15. Marques, M. Gonzlez-Badillo (2003). Efeito do treino de fora so-
and Measures of Strength and Power in Professional Rugby League 7. Faigenbaum, A. (2000). Strength Training For Children and Adoles- bre o salto vertical em jovens jogadores de basquetebol de 10-13 anos de
Players. The Journal of Strength and Conditioning Research. 13(3): cents. Clinics in Sports Medicine. 19(4): 593-618. idade. Trabalho de investigao apresentado no II Simpsio de Treino e
230-235. 8. Faigenbaum, A.; Westcott, W. (2000). Strength and Power for Young Avaliao de Fora e Potncia Muscular. Ismai, Castelo da Maia.
2. Benedict, T. (1999). Manipulating Resistance Training program Athletes. Champaign, Illinois: Human Kinetics. 16. Marques, M.C. O Trabalho de Fora no Alto Rendimento Despor-
Variables to Optimize Maximum Strength in Men: A Review. The 9. Falk, B.; Mor, G. (1996). The Effects of Resistance and Martial Arts tivo. Da Teoria Prtica. Livros Horizonte, Lisboa. 2004.
Journal of Strength and Conditioning Research. 13(3): 289-304. Training in 6-8 Year Old Boys. Pediatric Exercise Science. 8: 48-56. 17. Nielsen, B.; Nielsen, K.; Hansen, M.B.; Asmussen, E. (1980). Train-
3. Beunen, G; Thomis, M. (2000). Muscular Strength development in 10. Fleck SJ (1999). Periodized Strength Training: A Critical Review. ing of functional muscular strength in girls 7-9 years old. In Berg K.,
Children and Adolescents. Pediatric Exercise Science, 12: 174-197. The Journal of Strength and Conditioning Research. 13 (1): 82-89 Eriksson. Children and Exercise IX Champaign, Illinois: Human
4. Blimkie, C.J; Ramsay, J.A.; Sale, D.G.; MacDougall, J.D.; Smith, K. 11. Fleck, S.J.; Kraemer, W.J. (1987). Designing Resistance Training Pro- Kinetics, 68-78.
(1989). Effects of 10 weeks of resistance training on strength develop- grams. Human Kinetics Books, Champaign, Illinois. 18. Psuke, M.; Eriline, J.; Gapeyeva, H. (2001). Knee Extensor Mus-
ment in prepubertal boys. In Oseid, S.; Carlesen, K.H. (Eds.). Children 12. Gonzalz-Badillo, J.J.; Gorostiaga, E. (1995). Fundamentos del cle Strength and Vertical Jumping Performance Characteristics in
and Exercise XIII. Champaign, Illinois: Human Kinetics, 182-191. entrenamiento de la fuerza. Barcelona. Inde. Pre-and Postpubertal Boys. Strength Training effects in prepubes-
5. Bloomer, R.; Ives, J. (2000). Varying Neural and Hypertrophic In- 13. Gonzlez-Badillo, J.J.; Serna, J.R. (2002). Programacin del entre- cent boys. Pediatric Exercise Science. 13: 60-69.
fluences in Strength Program. Strength and Conditioning. Journal. namiento de la fuerza. Barcelona. Inde. 19. Pez, L.C.; Luque, G.T. (2002). El entrenamiento de fuerza en
22(2): 30-35. 14. Marques, A.T.; Oliveira, J. (2001). O treino dos jovens desportistas. nios. Apunts. Educacin Fsica y Deportes. 61: 64-71.
6. Diallo, O.; Dore, E.; Duche, P.; Van Praagh, A. (2001). Effects of Actualizao de alguns temas que fazem a agenda do debate sobre a 20. Ramsay, J.A.; Blimkie, C.J; Smith, K.; Garner, S.; MacDougall, J.D.;
plyometric training followed by a reduced training programme on preparao dos mais jovens. Revista Portuguesa de Cincia do De- Sale, D.G. (1990). Strength training effects in prepubescent boys.
physical performance in prepubescent soccer players. J. Sports Med. sporto. 1 (1): 130-137. Med. and Sci. in Sports Exerc. 22: 605-614.