O Corpo Fragmentado
O Corpo Fragmentado
O Corpo Fragmentado
JoelPeter Witkin.
Bruna Finelli Duarte 1
MORAES, Eliane R. O corpo impossível. São Paulo: Iluminuras, 2010.
Em
O Corpo impossível: A decomposição da figura humana de Lautréamont a Bataille,
parte da tese de doutorado de Eliane Robert Moraes, , podemos observar que as imagens
sempre relatam metaforicamente sobre fragmentos do corpo e não o corpo inteiro.
O livro é dividido em 11 capítulos divididos em 3 partes e descrevem sobre vários
momentos na história da arte em que aparecem obras relacionadas ao corpo e à sua
fragmentação. Porém , não apenas ao corpo, mas a algo inerente dele, na morte, e no que
é transformado por ela.
No capítulo I O peso da cabeça, a autora inicia o paragrafo descrevendo sobre momentos
da história em que o homem perde a cabeça.
Nesse sentido metafórico, a autora utiliza de uma história contida na bíblia que fala sobre o
momento em que João Batista é decapitado e sua cabeça entregue à Salomé (mulher que
desejou a cabeça de João Batista).
“Não é de todo estranho que o homem perca a cabeça no limiar da Segunda Guerra. Ainda sob certos
disfarces, sua decapitação já vinha sendo anunciada há algumas décadas. Mas precisamente desde o
final do século XIX quando na arte europeia e em particular, na França, um tema bíblico tornouse
recorrente, de forma quase obsessiva: a história de Salomé.” (p. 27)
A alegoria da morte foi muito representada na arte, assim como a naturezamorta.
Podese relacionar então alguns trabalhos dos artistas modernistas e sua ligação com a
fragmentação do corpo tão representada na época.
Trazendo para a contemporaneidade, JoelPeter Witkin que trabalha com a criação de
sentido em suas imagens (alegorias) por intermédio dos corpos grotescos em sua
fotografia, cria algumas de suas naturezas mortas a partir de cadáveres e elementos
1
stricto sensu
Mestranda do Programa de pós graduação em Estudos Culturais Contemporâneos da
Universidade FUMEC.
próximos aos encontrados durante todo o período de legitimação do conceito que a autora
O Corpo impossível
do livro , trata.
Segue abaixo duas relações entre o trabalho de Witkin e o tema que a autora cita no 1o
capítulo do livro:
JoelPeter Witkin
Still Life, Marseilles 1992 Keystonefrance 2
Nessas duas imagens, vemos a relação entre a ação e o corpo. A ação demonstrada na
gravura acima representa a decapitação e a consequência dessa ação é a cabeça que é
cortada.
Essa cabeça cortada, esse fragmento entre corpos e entre corpo e consciência aparece na
Still Life
obra do fotógrafo Joel Peter Witkin que ao representar uma imagem de
naturezamorta, insere uma cabeça “morta” na cena.
“ A arte moderna respondeu à trama do caos através de
formas fraturadas, estruturas parodísticas, justaposições inesperadas,
registros de fluxo de consciência e da atmosfera da ambiguidade e
ironia tágica que caracterizam tantas obras do período. (p. 57)
2
Disponível em: <http://allday.com/post/2177offwiththeirheadstheriseandfalloftheguillotine/ >
acesso em fev.2016.
3
Pablo Picasso,
Femme en chemise assise dans un fauteil 1913.
, Interrupted Reading 19994
Joel PeterWitkin
Vemos entre essas duas imagens uma semelhança estética a partir da análise de
fragmentação do corpo e do corpo feminino. Porém notase que a fragmentação acontece
principalmente na cabeça nas duas imagens, ou seja, o ser acéfalo torna o corpo
abandonado.
“A mulher se tornará espectral pela desarticulação e a deformação de sua anatomia”, afirmava Dalí no
artigo “As novas cores do sexappeal espectral”, de 1934.
As obras de Witkin muito se assemelham a questão da natureza do corpo, um dos estudos
de Bataille que a autora mostra em sua publicação. A fragmentação do corpo também a faz
fragmentação da consciência e a comprovação deste momento das artes plásticas se
evidencia no Renascimento, quando a descrição da morfologia humana se torna uma
obsessão. Portanto, a ideia de caos, a desintegração da ordem, da unidade, a ideia de
caos, a desintegração da ordem, da unidade, o desprendimento do todo, a integridade
perdida, marcaram o pensamento dos artistas nas primeiras décadas do século XX.
3
Disponível em:
<http://paintingandframe.com/prints/pablo_picasso_la_femme_en_chemise14387.html> acesso em jan.
2016.
4
Disponível em: < http://www.mocp.org/detail.php?type=related&kv=7876&t=people> acesso em jan.
2016.
“A vida dos simulacros”, a autora retoma o conto “O homem da areia” de Hoffmann,
publicado em 1817, mostrar marionetes e seus recurso em ser objetos autômatos. Para a
autora, a realidade é colocada a prova quando a máquina simula ser u ser vivo.
Para ilustrar esse trecho do livro, a autora segue com a obra Boneca nadadora (190) de um
autor anônimo.
JoelPeter Witkin, Um Santo escuro.1993 Anônimo, Boneca nadadora, 1905.6
5
Novamente aparecem elementos esteticamente semelhantes entre as obras que a autora
apresenta no livro e as obras de Witkin.
Nas imagens acima, ambas figuras são bonecas representam simulacros de uma realidade.
Máquinas que simulam seres vivos fazerem o trabalho e o esforço humano, aparecem com
frequência nesse capítulo. Para os surrealistas, os monstros não eram mais aberrações,
mas imagens poéticas. Por isso, toda forma monstruosa, sobretudo, a esfinge, “assume o
papel de depositária do sentido da vida” (p. 119).
O cerne da leitura de Eliane é a figura do acéfalo e as diversas formas que a concepção de
Bataille assume nesse período. Para a autora o “antropomorfismo dilacerado” e
entendemos este termo como a compreensão da realidade a partir das obras de arte
modernistas “de Bataille, confere uma dimensão ontológica ao projeto modernista de
5
Disponível em: <
http://www.mocp.org/detail.php?type=related&kv=7876&t=people
> acesso em jan.
2016.
6
MORAES, Eliane Robert. O Corpo Impossível. 2002. p94.
decomposição das formas, oferecendo uma resposta cruel às interrogações de seus
contemporâneos” (p. 22).
Dessa forma podemos concluir que seu livro foi pensado em uma estética de dilaceração do
corpo humano, incapaz de ser reconstituído, tendo na figura do Acéfalo seu ponto mais
profundo: “ao ostentar precisamente aquilo que lhe falta, tal qual um teatro vazio, o corpo
sem cabeça resta como um corpo impossível” (p. 227).
Segundo a autora, Bataille analisa a cabeça como sendo um lugar de duplas reações, e não
apenas de elevações de ideais e de consciência mas de escatologias também. Logo, pode
se pensar no trabalho de Witkin dessa maneira. A maneira do pensamento duplo entre
ideologias e escatologias para mostrar a mesma coisa: o corpo, esse, impossível sendo
possível através de suas obras.