Abaixo o Ritz, Beat Generation, Contracultura, Anti Moda
Abaixo o Ritz, Beat Generation, Contracultura, Anti Moda
Abaixo o Ritz, Beat Generation, Contracultura, Anti Moda
FLORIANÓPOLIS . SC
2009
UNIVERSIDADE DO ESTADO DE SANTA CATARINA - UDESC
CENTRO DE ARTES - CEART
DEPARTAMENTO DE MODA
FLORIANÓPOLIS- SC
2009
INGRID LAGEMANN ISOPPO
Trabalho de Conclusão de Curso aprovado como requisito parcial para obtenção do grau de
Bacharel em Estilismo, no curso de graduação em Moda, do Centro de Artes da Universidade
do Estado de Santa Catarina.
Banca Examinadora:
Orientador: _______________________________________________________
Professora Mestre Liliane Edira Ferreira Carvalho
Universidade do Estado de Santa Catarina/UDESC.
Membro: ________________________________________________________
Professora Doutora Mara Rúbia Sant’Anna
Universidade do Estado de Santa Catarina/UDESC.
Membro: ________________________________________________________
Professora Doutora Maria Isabel Orofino
Universidade do Estado de Santa Catarina/UDESC.
O caminho para chegar até aqui foi longo e árduo, e só foi possível de ser
concretizado, primeiramente graças a Deus que tem iluminado meu caminho e graças a muitas
pessoas que fizeram e fazem a diferença em minha vida. Eu serei eternamente grata a toda
minha família que me ajudou muito e sempre me motivou a seguir em frente e jamais desistir
dos meus sonhos. Obrigada mãe e pai pela dedicação, obrigada maninhos pelo carinho e
obrigada vó pela imensa ajuda. Agradeço também a Ricardo, o amor da minha vida, que
sempre se mostrou disposto a me ajudar e tornou esta caminhada mais leve e feliz, obrigada
meu amor pela companhia, parceria e compreensão ao longo desses anos de curso.
Aos meus queridos amigos, Ismael Farinon, Cristiane Lanzarin, Ângela Simon e
Tereza Rebello, Mara Rúbia Sant`Anna, Maria Izabel Costa, Maria Isabel Orofino, Balbinete
Silveira, Aparecida Maria Batisti de Abreu, Icléia Silveira e Silva, Lucas da Rosa e José
Alfredo Beirão Filho, todos esses professores foram de extrema importância durante estes
TIMOTHY LEARY
RESUMO
Depois da Beat Generation, o mundo ocidental nunca mais foi o mesmo. Repensar,
contestar, mudar, se tornaram palavras de ordem agregadas ao discurso de juventude e foram
atreladas ao “Novo” como ideal de consumo. A contracultura e a antimoda, em sua disposição
de crítica aos padrões estabelecidos pelo consumo capitalista, acabaram abarcadas pelo
sistema de moda que se apropriou de seus ideais de contestação, pautando-os como
diferenciais de juventude. Indo contra tudo que a princípio pregaram, a antimoda virou moda
e o Beat, hoje associado a seres pensantes, tornou-se cult.
After the Beat Generation, the occidental world has never been the same. Rethink,
contest, change have become words of order in parallel with the youth viewpoint and had
been connected to the “New Order” as a consumption ideal. The counterculture and the
antifashion, in its criticism position to the established standards of the capitalist consumption,
ended up embraced by the fashion system that have appropriated itself of their argumentation
ideals, embracing them as youth distinguishers. Going against everything they have once
preached, the antifashion turned fashion and the Beat, today associated to intelligent beings,
has achieved cult status.
INTRODUÇÃO ......................................................................................................................12
ANEXOS .................................................................................................................................83
12
INTRODUÇÃO
Falar em moda jovem hoje significa falar de um “Novo” que não só é mudança, mas
contestação. O espaço da moda se concretizou como espaço não só de individualidades, mas
de discurso social e político dentro da própria indústria, nas passarelas. Isso se estabeleceu ao
longo das últimas décadas, na medida em que o “Novo” tomou a quebra do próprio padrão
anteriormente estabelecido como medida para estabelecer como novo padrão. O olhar da
indústria então converge para os que estão fora daquilo que ela estipula. Neste sentido, o
presente estudo busca uma relação entre a contracultura e a moda, partindo de uma análise
sobre a Beat Generation, movimento que influenciou a transformação da moda jovem dos
anos 1960, marcando o início da antimoda moderna e a consequente absorção desta pela moda
corrente. Dessa forma, tem-se por objetivo principal neste trabalho estabelecer a influência
que a contracultura, a partir da Beat Generation, pode ter oferecido à mudança que aconteceu
na moda a partir da década de 1960, quando, pela primeira vez na história ela passa a dar
atenção aos jovens, restabelecendo no traje não somente seus comprimentos, formas e cores,
mas toda uma nova significação como forma de expressão.
Para estabelecer a relação pretendida entre o movimento beat e a moda jovem, faz-se
necessário, inicialmente, realizar um entendimento e aprofundamento sobre a Beat
Generation: quem foram os contraculturais beats? Sobre o que falavam? Quais seus principais
expoentes? Podem ser considerados pioneiros como movimento de contracultura e antimoda?
Desta forma, surgem algumas problematizações a serem verificadas, como o que foi a
contracultura? O que foi a Beat Generation? O que foi a antimoda surgida através dos jovens,
neste mesmo contexto? Qual a relação dos hippies com os beats? Esta última problemática
surge, a partir do momento em que se verifica uma semelhança nos dois movimentos, beats e
hippies, como se um fosse parte do outro, podendo o movimento hippie ser a real expressão
beat na moda, no sentido de aparência e adoção da antimoda. E por último, qual a influência
13
do movimento beatnik na transformação da moda jovem dos anos 1960 e qual a herança que
esta antimoda deixou para a moda jovem dos dias atuais?
Assim, para a obtenção de uma análise mais completa, definindo a moda não apenas
como vestimenta, mais como “espírito do tempo”, assim como determina Flüguel (apud
Caldas, 1999), também é apresentado o cenário musical da época, partindo do jazz e suas
vertentes e chegando ao Rock and roll, os quais tiveram uma forte ligação com os Beats e a
contracultura. A música também foi usada para protestar, alcançando corações e mentes.
Além deste universo underground norte-americano, são buscadas e apresentadas as
referências brasileiras em relação à contracultura, chegando ao movimento Tropicalista e todo
contexto político da repressão de 1964, uma vez que no Brasil tem-se a expressão dominante
contracultural através da música. O Brasil então marca, neste trabalho, a importância da
absorção em larga escala do discurso Beat, seja em novos conceitos e padrões de
comportamento na música ou na moda, ao longo das últimas décadas.
Acredita-se que esta pesquisa torna-se importante para uma melhor compreensão dos
motivos que levaram os jovens a irem contra as tradições sociais, iniciando, a partir da década
de 1960, a prática de manifestações de rebeldia e contracultura. O que não significa que outras
manifestações de contracultura não aconteceram antes dos beats, até mesmo em séculos
anteriores, como os muscadins, os dândis. Estes, no entanto, seguiram caminhos distintos e,
ao contrário da Beat generation, foram bem documentados. Logo, este trabalho também tem
relevância no sentido de trazer à pauta a relação entre a Beat Generation, a antimoda e a moda
jovem a partir dos anos 1960. Importante salientar que a antimoda é aqui pensada segundo
Bollon (1993) e Lipovetsky (1989), que apontam-na como quebra com os padrões estéticos
correntes ditados pelo sistema e aceitos socialmente.
Porque, para nós, “cultura” não é simplesmente um referente que marca uma
hierarquia de “civilização”, mas a maneira de viver total de um grupo, sociedade,
país ou pessoa. Cultura é, em Antropologia Social e Sociologia, um mapa, um
receituário, um código através do qual as pessoas de um dado grupo pensam,
classificam, estudam e modificam o mundo e a si mesmas. É justamente porque
compartilham de parcelas importantes deste código (a cultura) que um conjunto de
indivíduos com interesses e capacidades distintas e até mesmo opostas transformam-
se num grupo e podem viver juntos sentindo-se parte de uma mesma totalidade.
Podem, assim, desenvolver relações entre si porque a cultura lhes forneceu normas
17
que dizem respeito aos modos mais (ou menos) apropriados de comportamento
diante de certas situações. (DAMATTA, 1986, p.123)
Contudo, fazendo uma ressalva sobre a citação acima, é permitido considerar que esta
adaptação e recepção intracultural e intercultural não acontece de maneira tão amigável como
Damatta escreve, pois se fosse de tal forma, não existiram preconceitos, racismos,
desentendimentos e guerras. De fato, por mais que possa ser possível a comparação da cultura
como um receituário, um manual, este não é seguido a risca, quer dizer, ele acontece muito
mais facilmente na teoria do que na prática. Levando em consideração isso e já pensando na
contracultura, que brevemente será abordada mais profundamente, se a cultura funcionasse de
maneira aberta e receptiva, a contracultura deixaria de ser vista como uma ação radical oposta
a cultura dominante. Dessa forma, observa-se que a classificação de contracultura se dá
exatamente por ser uma exclusão da norma. Isso acontece porque a cultura, uma vez
considerada, resiste a modificações maiores e, por esse motivo, muitas vezes quando se pensa
em cultura a primeira impressão que vem é a de costumes muito antigos. A respeito disso, o
próprio Damatta descreve sobre a tendência de exclusão de um novo modo de pensar dentro
da cultura.
O homem vive uma vida verdadeiramente humana graças à cultura. A cultura é uma
forma específica do “existir” e do “ser” do homem. O homem vive sempre de acordo
com uma cultura que lhe é peculiar e que, por sua vez, cria entre homens um laço
que também lhes é peculiar, determinando o caráter inter-humano e social da
existência humana. Na unidade da cultura como forma peculiar da existência
humana, arraiga-se simultaneamente a multiplicidade das culturas em cujo âmago o
homem vive(...) É pela cultura que o homem, como homem, “é” mais, tem maior
acesso ao “ser”. (HELL, 1989, p.10)
(...) Com algumas poucas exceções (talvez incluindo nosso momento histórico
atual), as contraculturas foram episódios históricos inspirados, otimistas, talvez
mesmo míticos. Sempre que pessoas corajosas e apaixonadamente adotam
comportamentos desafiadores que buscam libertar os humanos de limitações
opressivas (ou limitações percebidas como sendo opressivas), certamente pode-se
esperar excitação, conflito e escândalo – e, portanto, histórias cativantes. (2003,
p.23)
1
A moda era um meio de reunir os seres em uma sociedade e de criar o presente social, essencialmente, uma
forma de relação entre os seres, uma veneração coletiva pela novidade, pelo processo de imitação entre os
homens. (Tarde, 1979. APUD SANT´ANNA , 2007:81).
19
Uma geração cresce e com ela nasce a vontade de ter um lugar que corresponda aos
seus anseios. No entanto, a sociedade em que se encontra está longe de ser este lugar
idealizado. Dessa forma, é preciso lutar contra velhos costumes, disseminar algumas novas
ideias, juntar alguns novos amigos e criar boas maneiras de se fazerem notáveis: formam-se
assim os movimentos de contracultura. Esses movimentos e “tribos”2 não são visíveis à todos,
é preciso captar o “espírito da época”, examiná-los e reconhecê-los. Esta não é uma tarefa tão
fácil quanto possa parecer, uma vez que estes grupos de manifestações contraculturais são
formados muito mais por exceções e nem sempre comportará fazer generalizações para
identificá-los e denominá-los. Entretanto, é necessário buscar exatamente as semelhanças uns
com os outros para que possamos traçar uma linha de raciocínio compreensível.
2
Unidade de organização social que consiste em um número de famílias, clãs, etc. que vivem numa determinada
área e partilham ancestrais, cultura e liderança comuns; comunidade. (SACCONI, 1996, p.655)
20
Falar de contracultura é, num certo sentido, falar dos Estados Unidos – pelo menos
num momento inicial. Afinal, foi lá onde primeiro se manifestou, de modo mais
marcante e evidente, esse novo espírito de contestação que os movimentos de
rebelião da juventude dos anos 60 viriam colocar na ordem do dia. Apesar da
importância do papel que a Europa seguradamente desempenhou na formação de
toda essa nova ideologia da juventude, certas condições especiais dos Estados
Unidos faziam deste país o berço por excelência da contracultura. (PEREIRA 1992,
pp.32-33)
Estes jovens estavam reivindicando seus direitos através de uma linha de pensamento
que iria contra os costumes tradicionais da sociedade, contra uma cultura estabelecida até
aquele momento. Para que se fizessem notáveis, eles se utilizavam de diversos meios de
comunicação e símbolos, tentando, de uma forma ou de outra, expressar suas angústias, seu
inconformismo, esperança ou a falta dela. Segundo Pereira: “Aos poucos, os meios de
comunicação de massa começavam a divulgar uma nova ideia: a contracultura”(1992, p.15).
Em um primeiro momento, o movimento é distinguido pela sociedade através de seus
sinais mais evidentes, como os cabelos compridos, tipo de vestimentas, misticismo, drogas,
etc. Um conjunto de características que, aos olhos das “pessoas normais” que compunham a
classe média, representavam o ridículo, o despropósito, o ser “anormal”. No entanto, fica cada
vez mais óbvio que aquele conjunto de manifestações contraculturais não era constituído
apenas dessas primeiras impressões superficiais. Por conseguinte, simbolizava uma nova
forma de pensamento, uma nova forma de ver o mundo e as pessoas, um novo conjunto de
valores que faziam suas próprias regras. Roszak (1972), também relaciona algumas
características principais que delimitam esses contraculturais, como por exemplo, o interesse
pela psicologia da alienação, pelo misticismo oriental, pelas drogas psicodélicas e pelas
experiências comunitárias.
Assim, começavam a se fortalecer as bases de um movimento de contracultura que
buscava a liberdade. Liberdade de expressão, de pensamento, de comportamento, de escolhas,
liberdade de poder ser diferente, mesmo que esse diferente significasse ser “louco”. Para
Pereira (1992), o termo “contracultura” foi inventando pela imprensa norte-americana, nos
anos 60, para designar um conjunto de manifestações culturais novas que floresciam, não só
nos estados Unidos, como em vários outros países, especialmente na Europa e, embora em
menor intensidade e repercussão, na América Latina. Na verdade, é um termo adequado,
porque uma das características básicas do fenômeno é o fato de se opor, de diferentes
maneiras, à cultura vigente e oficializada pelas principais instituições das sociedades do
Ocidente.
21
Roszak (1972) acreditava que era nestes jovens prontos para rebelaram-se a todo
instante que encontrava-se a capacidade e oportunidade para reestruturar, reorganizar a atual
iludida sociedade e, assim, construir aquele lugar idealizado, onde há harmonia de
socialização de experiências. Esta sociedade que eles pretendiam modificar era definida como
tecnocrata, ou seja, uma sociedade que desenvolvia técnicas para todas as ações, tendo em
vista sempre um melhor planejamento. De acordo com Roszak,
Quando falo em tecnocracia, refiro-me àquela forma social na qual uma sociedade
industrial atinge o ápice de sua integração organizacional. É o ideal que as pessoas
têm em mente quando falam de modernização, atualização, racionalização,
planejamento.(...) A tecnocracia age no sentido de eliminar as brechas e fissuras
anacrônicas da sociedade industrial. (1979, pp.19-20)
rádio, ou seja, eles desejavam usufruir de todos os excessos da produção em massa ao mesmo
tempo em que desconfiavam e negavam a civilização tecnológica.”
Esses jovens rebeldes e muitas vezes marginalizados que definiram a chamada
contracultura dos anos 1950/60 eram os filhos da tecnocracia. Inconformados com o caminho
que a sociedade estava tomando ou sendo induzida a tomar, resolveram procurar novas
direções e viver o que realmente achavam que valia a pena na vida, como por exemplo, viver
em comunidades, gastar nada ou quase nada de dinheiro e se apegar a alguma prática religiosa
que pudesse explicar melhor a essência da vida, negando fazer parte da sociedade
tecnocrática.
A respeito desse pensamento contra a tecnocracia, Goffman e Joy dizem que, “a
principal diferença que fez de Marcuse um sucesso na cultura jovem, normalmente
desinteressada dos sofridos discursos marxistas europeus, era que ele não era apenas contra o
capitalismo, ele era contra a tecnocracia. De acordo com Marcuse, o “progresso intenso
parece estar ligado a intensa falta de liberdade. Campos de concentração, extermínio em
massa, guerras mundiais e bombas atômicas não são uma recaída na barbárie, mas a
implementação incontida das conquistas da ciência e da tecnologia modernas e dominação. E
a subjugação e destruição mais eficaz do homem pelo homem acontece no auge da
civilização”. (2007, p. 304)
Esta redução do homem pela técnica como sua veia condutora, pode ser compreendida
como uma simplificação do ser humano, ou seja, conseguir minimizar uma das coisas mais
complexas que existe no mundo: a vida humana. Para a tecnocracia ganhar espaço e se
consolidar era preciso que todos se encaixassem em um “padrão de normalidade” pré-
estabelecido e tivessem uma vida previsível. Quem vivia e aceitava esta sociedade eram os
pais desses jovens inconformados. Dessa forma, Roszak (1972) conta que a geração dos pais
desses jovens agarravam-se a tecnocracia em busca da segurança que ela prometia cumprir e,
de fato, parecia fazer. Sendo assim, porque esses pais, que estavam temporariamente felizes,
iriam reclamar daquilo que lhes trazia apenas o bem, a riqueza, a prosperidade e uma visão
segura do futuro?
Os integrantes da nova cultura juvenil, que tinham a tecnocracia como inimiga,
acreditavam que existiam muitos fatores que norteavam a tecnocracia e muitas artimanhas
muito bem elaboradas para que a população em sua maioria não percebesse sua manipulação.
Colocavam-se como aqueles que enxergavam de forma diferente e procuravam contestar tais
ordens impostas. Por consequência de sua petulante audácia, foram considerados a escória da
sociedade, marginais, por não se encaixarem no “padrão de normalidade” desejado.
Mas por que seriam eles, os jovens da época, os principais contestadores da expansão
da tecnocracia? A resposta para essa pergunta não pode ser apenas uma, pois existem diversos
eventos que contribuíram à rebeldia juvenil. Um fator essencial foi a geração anterior a esses
jovens, a geração da Segunda Guerra Mundial, que sofreu um tipo de interrupção ou
estagnação diante dos acontecimentos socioeconômicos. Explicando este acontecimento,
Goffmann & Joy citam: “(...) os anos 50 foram um período de conformismo Papai Sabe Tudo.
Exaurida pela Depressão e pela guerra mundial – mas com uma economia em ascensão.”
(2007, p.255)
importante salientar que, apesar de toda essa publicidade de opiniões coletivas por parte dos
jovens, muito mais do que mudar o mundo eles esperavam viver da maneira que lhes
conviesse, sem serem condenados pela sociedade tecnocrata que estava a contramão de seus
anseios. O convívio de jovens de várias idades, como os calouros, os recém formados e alguns
professores aliados, propiciaram a experimentação, o debate de ideias e, com efeito, o
surgimento de grupos com semelhanças - de comportamento, atitude, política, economia, etc.
- a fim de, unidos, conquistarem seus sonhos.
(...) O campus universitário, que chega a congregar 30.000 estudantes, tem servido
para cristalizar a identidade grupal dos jovens. Além disso, o campus mistura
calouros de dezessete, dezoito, com estudantes formados, já em seus vinte e tantos.
(ROSZAK,1972, p.39)
No final das contas, entretanto, não se pode deixar de ser ambivalente em relação a
esse dinamismo compensatório dos jovens, pois pelo menos ele constitui um
sintoma de sua situação inteiramente normal. Não é ideal, e provavelmente nem
sequer é bom que aos jovens caiba tamanha responsabilidade em criar ou imaginar
soluções para toda uma sociedade. Esta tarefa é grande demais para que tenham
êxito. Na verdade, é trágico que numa crise que exige o tato e a sabedoria da
maturidade, tudo quanto existe de mais promissor em nossa cultura esteja sendo
construído a partir de tentativas canhestras, o que não pode deixar de acontecer
quando os construtores são de todo neófitos. (ROSZAK, 1972, p.37)
É claro que não foram todos os jovens participantes da contracultura que ficaram à
obscuridade da sociedade. Alguns se renderam ao poder da tecnocracia e deixaram de fato
toda essa história de revolta de lado, ajustando-se aos padrões estabelecidos da vida adulta.
Outros levaram adiante todos os seus ideais e continuaram a viver sua vida de maneira
26
Os chamados beatniks e hippies, sejam o que forem, nada têm a ver com aquilo em
os transformaram o Time, Esquire, Cheeta, a televisão, as comédias da Broadway e
Hollywood. A imprensa decidiu que a rebelião “vende” mais. (ROSZAK, 1972,
p.47)
realmente desejavam era viver com suas próprias pernas e seguir o coração e não apenas a
razão como mandava a tecnocracia.
Voltando a mídia, como dito anteriormente, acabou por deformar muito dos intuitos e
manifestos dos contraculturais, fazendo com que ao longo das décadas parte da veracidade da
história da contracultura fosse aquilo que a mídia disse ou deixou de dizer. É fato que nunca
poderá se contar com convicção absoluta a maneira como realmente aconteceram os fatos. É
certo que houve um aproveitamento dos meios de comunicação sobre estes grupos de
contracultura, não somente dos que nasceram nas décadas de 1950 e 1960, mas também de
várias décadas posteriores. Além disso, parece que, alguns grupos em meio a toda esta
deturpação, acabaram por ganhar, nas páginas dos livros, mais importância do que outros.
Contudo, a deformação não significa irrealidade: a mídia aumentou, modificou alguns
aspectos, mas não divulgou uma história fictícia, estes grupos realmente existiram e deixaram
sua marca na história.
Seguindo assim, Goffman e Joy (2007) dizem que o impacto final da contracultura na
história pode ser analisado pela absorção de seus símbolos, artefatos e práticas pela cultura
dominante, da maneira que os separa bruscamente de suas origens na experiência real. No
entanto, ainda assim as marcas históricas deixadas pelas contraculturas podem ser
identificadas ao se analisar a história com uma compreensão de essência da contracultura.
Essa forma de ler os registros culturais oferece uma interminável fonte de inspiração,
28
No início dos anos 50, a nação reconheceu pelas ruas um movimento social
chamado Beat Generation. (Jack Kerouac - O rei dos Beats, 1991. vídeo)
3
Ver ficha técnica completa e sinopse em anexo 1.
4
Esta entrevista foi concedida no início de sua carreira, em seguida do lançamento do livro de maior sucesso
entre os jovens On the Road. Em anexo 2, encontra-se transcrita uma entrevista real de Jack Kerouac à Buckley,
já no final de sua carreira.
29
No dicionário esta palavra significa: batida, golpe, pulsação, latejo, ritmo, compasso.
Já a palavra “beaten” encontra significado como: açoitado, espancado, malhado, forjado,
pisado, batido, muito usado, vencido, derrotado, exausto. (MICHAELIS, 2002:23) Nos
dicionários de inglês e português, também pode-se encontrar a palavra “beatitude” - outra
definição também adotada pelos beats - e a sua definição será: 1.Bem-aventurança gozada no
céu pelos escolhidos. 2. Felicidade serena, completa e eterna. 3. Tratamento honorífico que se
dá ao Papa, a par de Vossa Santidade: Vossa Beatitude. (SACCONI. 1996:97)
Já Goffman e Joy (2007), fazem questão de usar mais a expressão “hip” ou “hipsters”
no lugar de “beat” ou “beatnik”. A propósito, este último termo não consta em nenhum
dicionário, pelo fato de ter sido uma palavra inventada pelos próprios beats, trata-se da junção
da palavra beat, já explicada, com o sufixo “nik”, retirada do termo “sputinik”, o satélite russo
que, em 1957, foi enviado ao espaço. O termo “hip” também não encontra significado no
dicionário de inglês, pelo menos não um significado que tenha alguma relação com o
movimento, talvez isso aconteça porque o hip seja uma abreviatura de hippies, o que
caracteriza um problema, pois autores como Roszak e Goffman tratam dos hippies como
sendo um movimento posterior a Beat Generation, ao mesmo tempo que insistem em chamar
o beat de hip.
Contudo, o que pode-se dizer é que na prática ou na intenção do movimento, ambos os
termos significam, como descrito anteriormente, na definição de beaten, algo como batido,
vencido, muito usado e cansado. Unindo estes significados aos da palavra beat, como batida,
compasso e ritmo, no final têm-se, mais ou menos, o que Kerouac chamou de “algo
harmonioso”. E por fim, a expressão “hipster”, que também possui um significado incerto,
mas de acordo com Goffman e Joy (2007) seria o mesmo que beat. Aliás, ambas podem ter
sido expressões retiradas das gírias utilizadas no jazz, estilo musical muito ouvido na época.
Tendo visto as primeiras definições, agora busca-se definir as relações históricas deste
grupo de contracultura, iniciando por uma geração anterior que já apresentava pensamentos
parecidos: a chamada “Geração Perdida”5 talvez possa ter sido, em um primeiro momento,
responsável por ter deixado de herança aos beats o gene do anticonformismo. Goffman e Joy,
no livro Contracultura Através dos Tempos (2007), apresentam o conceito do “contato direto”
como um tipo de ligação que organiza a linha contínua da história das contraculturas. O
contato direto é, sem dúvida, aquele que possibilita o contato dos integrantes das
contraculturas com as outras culturas. Assim acontece uma interação desses universos,
fazendo com que haja comunicação e troca de ideias, permitindo a individualidade e
impulsionando a contracultura.
E o contato direto também teve papel importante durante o século XX. Personagens
fundamentais dos movimentos de vanguarda europeus se misturam com escritores
americanos nas livrarias, nos salões e nos ateliês de Paris, ajudando a catalisar o
movimento literário da Geração Perdida. Algumas décadas mais tarde, muitos dos
integrantes das contraculturas jovens dos anos 1960 foram inspirados e instituídos
por muitos dos beatniks, herdeiros literários da Geração Perdida. (GOFFMAN E
JOY, 2007, p.14.)
5
Entre seus membros mais notórios, incluiram-se Ernest Hemingway, F. Scott Fitzgerald, Ezra Pound,
Sherwood Anderson, Waldo Peirce, John Dos Passos, e T. S. Eliot.
31
Roszak (1972) fala do papel dessa juventude perante a esperança por uma mudança no
cenário, cenário este em que se encaixavam os beats. Fala também sobre o conflito de
gerações existente na época e que acabou por ser um fator contribuinte para a ação rebelde da
juventude, ou seja, segundo ele as discórdias entre pais e filhos influenciaram o surgimento da
contracultura, mais especificamente da Beat Generation.
Para o bem ou para o mal, a maior parte do que atualmente ocorre de novo,
desafiante e atraente, na política, na educação, nas artes e nas relações sociais (amor,
corte sentimental, família, comunidade) é criação dos jovens que se mostram
profundamente, até mesmo fanaticamente alienados da geração de seus pais, ou de
pessoas que se dirigem primordialmente aos jovens. É entre a juventude que a critica
social significativa busca hoje uma audiência receptiva, à medida que, cada vez
mais, cresce o consenso de que é aos jovens que compete agir, provocar
acontecimentos, correr os riscos e, de forma geral, proporcionar os estímulos.
(ROSZAK, 1972, p.15)
Os beats, jovens oriundos de famílias que passaram pela depressão nos anos 30 - ou
seja, uma geração após a “Geração Perdida” - cresceram apoiados na ideia do não
conformismo, como dito anteriormente, o que acabava por impedir que se estabelecessem. Foi
viajando pelo país de norte a sul, recitando poemas em galerias e procurando uma harmonia
maior entre vida e arte vivida, que eles fizeram história. Eram jovens que se conheceram
dentro e fora das universidades, interessados em escritores não ortodoxos como Rimbaud,
Blake, Melville, Withman, Kafka, Nietzsche - alguns dos quais vieram mais tarde a ser
adotados nas universidades, sendo inclusive os professores que os propagavam acusados de
transmitirem valores subversivos aos estudantes. Inquietos, marginais (quando não minorias),
pretendiam mostrar seu desgosto com o consumismo e a tecnocracia. Apesar das principais
contribuições desta geração terem se dado na literatura, não é difícil identificar traços seus em
outras páginas.
32
Os movimento beat era formado por escritores que, na sua maioria, se conheceram
dentro das universidades. A respeito disso, Roszak (1972) fala em seu livro da tendência de
grandes pensadores e líderes iniciarem suas “carreiras” justamente dentro do campus da
universidade, que chegava a congregar 30.000 estudantes e servia como um veículo formador
da identidade grupal destes jovens. Outro fato importante, é que no campus conviviam jovens
de diferentes idades, dos calouros de dezessete anos até os já formados beirando os vinte e
tanto anos, este últimos acabam tomando a liderança perante os mais novos, que
normalmente, nem sabiam exatamente as dimensões que suas “badernas” poderiam tomar.
Jack Kerouac e Allen Ginsberg, assim como outros tantos escritores beats, se
conheceram na universidade, foi ali que surgiram as primeiras ligações. Depois disso, eles
resolveram percorrer o país de norte a sul, leste a oeste, e todos os relatos dessas viagens estão
nos seus livros. O de Kerouac é considerado até hoje a bíblia dos beatniks, pois foi justamente
esta literatura beat, como On The Road, que incentivou milhares de jovens a deixarem as suas
famílias de classe média e saírem para explorar por si, seu próprio país.
“A geração beat foi uma visão que tivemos no final dos anos 1940, John Clellon e
eu, e Allen Ginsberg de maneira meio maluca, de uma geração de tipos espertos
iluminados e loucos que de repente iriam se levantar para percorrer a América, uma
geração séria, curiosa, vagabunda, pegando carona em todas as direções,
maltrapilha, pacífica, de uma feiúra bela na sua graça e na sua novidade.”
(KEROUAC apud GOFFMAN E JOY, 2007, p.177)
33
Além de Kerouac e Ginsberg, outro escritor beat completa o principal trio beatnik,
Burroughs6, considerado o irmão mais velho, o mestre, como coloca Goffman ( 2007: 258),
“sugeria uma espécie de chefão gângster extraterrestre. Burroughs não era apenas hip, ele era
sobrenaturalmente experiente, e ensinou aos jovens pupilos literários aplicações na vida real
da filosofia convencional e anticonvencional e a literatura das experiências com drogas”.
Logo depois, o trio ganhou mais um aliado: Gregory Corso7.
Estava formado o quarteto que iria irritar uma sociedade, instigar a mídia, incentivar
os jovens e abrir as portas para todas as próximas gerações em que a contracultura, de uma
forma mais amenizada e menos intelectualizada, no entanto mais natural, tornar-se-ia um
acontecimento praticamente comum, fazendo parte de uma fase de transição de muitos
adolescentes para a vida adulta. É claro que a mídia, quando não transformava os beats em
apenas viciados, contribuiu muito com a divulgação e amplificação das ideias libertárias da
Beat Generation. Contudo, também têm-se que admitir que a imagem deflagrada e
transfigurada foi dada próprios beats, uma vez não se pouparam frente as drogas químicas e
ao álcool. A exemplo de Kerouac, reservando para si próprio um fim trágico e lamentável, em
suas últimas aparições sempre embriagado, ele próprio fazendo repensar o valor das questões
defendidas pela Beat Generation.
Durante a década de 1950, os beats se tornaram muito famosos. Eles estavam em
toda a mídia. Apareciam artigos nos principais jornais e revistas. Eles faziam
conferências com o apoio de grandes nomes do jazz. A revista Life chamou os beats
de “a única rebelião à vista”.(...) Ginsberg e Kerouac apareciam na TV (uma façanha
numa época em que haviam apenas três redes), e chegou mesmo a ser feita uma
tentativa de produzir um programa de televisão baseado em On the Road. (Quando
Kerouac recusou o acordo, eles o deixaram de lado e criaram o programa Route 66,
uma pálida evocação dos temas de Kerouac.) (GOFFMAN E JOY, 2007, p.265)
Como já foi dito anteriormente, Kerouac foi uma das figuras mais importantes da Beat
Generation, por este motivo, buscou-se mais informações sobre esta curiosa personalidade
que, de certa forma invadiu as mentes, corações, casas, famílias e universidades dos jovens de
pelo menos, uma década inteira.
6
William S. Burroughs, um dos mais subversivos e criativos escritores americanos da literatura moderna.
(MAEK, 1991. vídeo).
7
Em 1958, Kerouac escreveu: Considero Gregory Corso e Allen Ginsberg os dois melhores poetas da
América.(...)Contraditório em tudo, Corso reúne um inacreditável refinamento verbal e um talento excepcional
ao encanto endiabrado de um moleque de rua. (Alma Beat, L&PM, 1984).
Bibliografia: The Vestal Lady of Brattle (1955), Gasoline (1958), Bomb (1958), The Happy Birthday of Death
(1960), American Express (1961), Long Live Man (1962), Elegiac Feelings América (1965), Earth Egg, The
Notebook.
34
“ Jack Kerouac viveu sua vida em constante agitação. Ele observou e relatou
detalhes de forma lúcida e poética, num fluxo de consciência. Suas viagens sem
suprimentos para buscar seu refúgio nos trouxe imagens densas. Nenhuma pessoa,
evento ou impressão, estava excluída das crônicas que Jack Kerouac deixou para
sempre. Sua cidade não era exceção. Uma pequena cidade na Inglaterra com seu ar
industrial, incendiou a visão das crônicas de Kerouac.
O “profeta” da geração beat rompeu, nos anos 40, com os valores da sociedade
norte-americana, adotando um estilo de vida pouco convencional. Com o amigo
Neal Cassady, viajou pelos Estados Unidos, vivendo as experiências que depois
relataria em seus romances autobiográficos. Kerouac escrevia de forma espontânea,
num processo denominado sketching. Seu primeiro livro, The Town and the
City(1950), foi bem recebido pela critica, porém um fracasso comercial.
(ANTONELLI, 1986)
Kerouac escreveu a obra considerada a mais ilustre dos beats, On the Road. Como
autor, Kerouac se insere na linhagem norte-americana de escritores viajantes, como Mark
8
Ele conheceu Jack Kerouac por meio de Hal Chase. Jack se impressionou com a energia de Neal, com seu
encanto sobre as mulheres e sua espontaneidade e vontade de viver. Cassady provou ser o catalisador do
Movimento Beat ao se tornar personagem de vários livros de Kerouac. (site oficial LP&M)
35
Twain, Jack London e Hemingway9, e que apresenta laços de parentesco com uma série de
menestréis que vai de Woodie Guthrie a Bob Dylan. Este livro, publicado nos Estados Unidos
no ano de 1955-57, foi escrito de uma maneira muito especial, em um rolo de folhas coladas
uma às outras, no ano de 1951, contando uma série de aventuras que tinham acontecido cerca
de cinco anos antes.
Jack Kerouac escreveu mais de 12 romances, ficando famoso de On The Road (Pé
na Estrada), de 1957. Nesse livro, deu forma e conteúdo ao modo de vida de sua
geração. Sua idealização romântica desse estilo de vida espontâneo e despreocupado
quanto ao futuro tornou-o uma figura cultuada pela geração beat, o que aconteceu
depois com autores como William S. Burroughs e Allen Ginsberg. Outras de suas
obras importantes são o livro de poemas México City Blues, de 1959, e Big Sur, de
1962. (ANTONELLI, 1986)
O estilo de Jack, a prosa espontânea, é uma leitura de fácil compreensão e mais parece
que você está numa roda de amigos ouvindo histórias com um vocabulário totalmente
informal, próprio para a ocasião. Através da leitura dessa obra é possível se aproximar dos
comportamentos e pensamentos de uma geração que se tornou imortal não somente nas
páginas, mas também devido as mudanças sociais que provocou. A seguir, um trecho do livro
On the Road, mostrando o contexto em que Kerouac estava inserido e revelando suas
ambições, senão angústias, em curto prazo:
Sim, eu queria conhecer Dean mais intimamente não apenas porque eu era um
escritor e precisava de novas experiências, ou porque minha vida de vagabundagem
pelo campus tinha completado seu ciclo e já não significava mais nada, mas porque,
de alguma forma, apesar de nossa profunda diferença de caráter, ele me fazia
lembrar um irmão há muito esquecido; (...) Suas roupas de trabalho imundas o
vestiam tão graciosamente que mesmo num alfaiate da moda seria impossível
conseguir traje melhor – era só tomá-lo emprestado ao Alfaiate Orgânico da
Felicidade Natural, como fazia Dean com seu realce. (KEROUAC, 1955. p.12)
Repare a dedicação de Kerouac ao descrever seu amigo, os cuidados em relatar a
aparência e a emoção que esta despertava, a espontaneidade com que ele escreve. É como se
ele estivesse ali, no momento em que você lê, lhe contando, explicando e gesticulando. Ao
que alguns fatores indicam, existia uma forte inclinação ao homossexualismo ou
bissexualismo entre os grupos undergrounds da época, isso significava uma busca pela
liberdade sexual, um tipo de manifesto contra os papéis do homem e da mulher na dita família
perfeita norte-americana, que será mais enfatizado pelos hippies que, de algum modo, deram
continuidade aos ideais beats.
9
Mark Twain, ( 1835-1910). Jack London (1876 – 1916). Erneste Hemingway (1899 – 1961).
36
Já o livro de Allen Ginsberg, em vez da prosa espontânea, nos traz os relatos dessas
viagens em forma de poesias. O livro A Queda da América traz poemas escritos durante as
aventuras de Ginsberg pelo “pesadelo refrigerado” como Henry Miller10 chama os Estados
Unidos. No entanto seu livro, com igual importância histórica para o movimento, foi o Howl.
Assim, dizem Goffman e Joy que “a memorável leitura de “Uivo”, por Ginsberg, é
frequentemente destacada como o momento em que uma cultura hipsters e beats já existente
finalmente desabrochou” (2007, p.252). Tantos nas obras de Ginsberg como de Kerouac é
notável a semelhança entre suas vidas, experiências e desejos, sejam eles políticos, sociais,
religiosos ou pessoais. A indignação com a tecnocracia, a vontade de conhecer pessoas e
lugares novos e “loucos”, a preferência pelo budismo e práticas orientais, o vocabulário
espontâneo e sem cuidados e, principalmente, o anti-autoritarismo, existente em ambos. Eles e
os outros beats buscavam, como comentam Goffman e Joy (2007, p.49), “a afirmação do
poder individual de criar sua própria vida, mais do que aceitar os ditames das autoridades
sociais e convenções circundantes, sejam elas dominantes ou subculturais”.
Logo, concluída esta abordagem geral sobre a contracultura e a Beat Generation,
torna-se possível traçar três características que seriam fundamentais para entender os
princípios definidores da contracultura: a primeira seria o fato desses jovens afirmarem a
individualidade acima de qualquer restrição governamental ou convenção social; a segunda
seria o fato de desafiarem o autoritarismo, não só de maneira radical, mas principalmente na
sua sutileza; e a terceira e última característica essencial é a defesa que fazem de qualquer
mudança individual e social.
Além disso, existem mais dois fatores importantes que Goffman e Joy (2007) atribuem
aos movimentos de contracultura, especialmente aos beats, numa tentativa de explicar o
sucesso da repercussão desse movimento. São eles: a comunicação aberta, quer dizer, existe
10
Henry Miller (26 de dezembro de 1891, Nova York – 7 de junho de 1980, Califórnia) foi um controverso
escritor norte-americano. Profeta da sensualidade, pornógrafo, gênio, maldito, lírico, egoísta, uma vida carregada
de polêmica e adjetivos; um homem que cultivou a controvérsia como o combustível de uma vida longa e
intensa. (site oficial LP&M)
37
uma fácil troca de pensamentos e ideias entre os contraculturais, e isso deve-se ao fator
intelectualidade e ao valor que eles atribuem à comunicação interpessoal. Depois têm-se a
comunicação emocional íntima, esta mais ligada a facilidade que eles possuem em falar da
alma, tanto quanto o desejo de procurar entendê-la e explicá-la.
Resumindo todos esses aspectos relacionados a contracultura e a beat generation, têm-
se um somatório de características como a individualidade, o antiautoritarismo, a mudança
constante e a comunicação intelectual e da alma. Unindo tudo isso têm-se uma receita perfeita
para gerar uma enorme mudança de comportamento e, consequentemente, uma mudança na
moda, enquanto sistema, código e estética. Essas características podem ser a chave para se
entender a relação estabelecida entre essa contracultura, a antimoda, que será tratada no
próximo capítulo, e a moda, numa relação que se estabelece como estilo nos dias atuais e que
será apresentada no último capítulo deste estudo.
E o rock surgiu como o grito de revolta de uma nova geração. (...) Esse
envolvimento social da música se reflete, mais do que qualquer outra época, na ação
política. Em 1969, uma ala radical da SDS americana (Student a Democratic
Society) forma a organização clandestina Weatherman, nome tirado de um verso da
canção Subterranean Homesick Blues de Bob Dylan. (...) E se o capitão do exercito
38
americano diz que “o rock and roll contribuiu para o uso de drogas, bem como para
a alta incidência de doenças venéreas entre os recrutas”, existe também o jovem
radical que afirma: “O rock não é apenas um hino de guerra, um fundo sonoro como
A Marselhesa foi para a Revolução Francesa. Para a nossa geração, o rock é a
revolução”. (MUGGIATI, 1983. p.p 14 -15)
Figura 3- Capa do Álbum Bob Dylan – 1962 Figura 4- Capa do Álbum The Freewheelin Bob Dylan
Fonte: http://www.bobdylan.com/#/music/bob- – 1963
dylan Fonte: http://www.bobdylan.com/#/music/the-
freewheelin-bob-dylan
Nas capas dos discos, nos shows, a imagem desses poetas das novas gerações
apontava, gradativamente, para a mudança de atitude frente o convencional. No entanto, o
rock and roll não é exatamente o que se possa chamar de música contracultural ou
explicitamente antiautoritário, como nos diz Goffman e Joy (2007), mas o importante é que
estabeleceu-se com uma identidade jovem e nasceu enraizado no blues e no boogie-woogie,
39
que aliás são os ritmos onde encontram-se os valores essenciais que fizerem os jovens a
adotarem estes estilos como aliados de suas batalhas de rebeldia.
Como contam Goffman e Joy (2007), uma característica constantemente apresentada
na música é a libertação sexual, porém o ritmo norte-americano por si só não seria capaz de
produzir uma cultura sensual. Já ao contrário, os tribais africanos não apresentavam este
aprisionamento do próprio corpo, e foram eles, ainda em tempo de escravidão que levaram
para a América a característica sensual da música, através das “rodas de batuques” que
chamavam atenção também dos brancos. Mais tarde, passando o período da escravidão, após
a Guerra Civil, os negros começaram a criar novas formas musicais e, por volta de 1860, as
bases do blues já eram ouvidas nos meios rurais. Somente dez anos mais tarde tiveram a
oportunidade de sentar em frente aos pianos dos ricos, levando o boogie-woogie, um ritmo
com letras ousadas e picantes. A respeito disso Goffman e Joy dizem:
“Além de exprimir melancolia e dor, o blues, originalmente era (...) uma expressão
de potência sexual e desejo. No final do século XX, o blues se espalhou, tornando-se
uma linguagem folclórica popular em todas as comunidades rurais negras e, no
início da década de 1910, se tornou conhecido pela sociedade como um todo. O
blues transmitia uma informação chocante para a cultura branca: o sexo estava de
alguma forma ligada ao ritmo!” (2007, p. 253).
E enquanto o blues expressava as dores de um povo, o jazz com batidas mais rápidas,
como que comemorando o ritmo da vida urbana na virada no século, produzia êxtases
espirituais. Já na década de 1930, um novo estilo rouba a cena, é o Swing, rápido como o
jazz. Logo cria-se mais um ritmo, o bebop , que seria o jazz improvisado. Assim, além do rock
existiram outros gêneros musicais que embalaram os jovens contraculturais e a Beat
generation: seriam o blues e o jazz bem como suas variações.
O folk, a música country, era um estilo que trazia em suas letras relatos da sociedade
da época e notícias do seu cotidiano. Foi no fim dos anos 1950 que os jovens optaram por
fazer música com as referências da música folclórica vinda do meio rural, numa tentativa de
manifesto de defesa pelos “brancos pobres” e, por conseguinte, tentando desbancar a
tecnocracia e a vida consumista da classe média.
Assim, através da música estabelecia-se mais uma forma de expressar socialmente a
total insatisfação. Mas, mais do que tentar estabelecer um ponto de comunicação com a
sociedade, buscava-se estabelecer uma sintonia entre eles próprios, falar com a própria alma:
relembrando que uma das principais características da contracultura seria exatamente esta
40
facilidade da comunicação emocional íntima, que nada mais é que falar da alma e dos
sentimentos mais profundos.
Alguns anos antes, um jovem teria se voltado para o jazz, mais intelectualizado, ou
para a força bruta do rock and roll. Mas no final da década de 1950, em meio à
prosperidade quase ilimitada da Era de Eisenhower, a escolha musical dos jovens
recai paradoxalmente sobre a canção folclórica dos “brancos pobres” dos Estados
Unidos – a música rural do estilo country. Como milhares de garotos de sua idade,
Bob Dylan assume a pobreza – ou a ideia de pobreza – como um desencanto, uma
reação à sociedade de consumo e ao American Way of Life. (MUGGIATI, 1983, p.
16)
Ainda a respeito da defesa da classe pobre, Bob Dylan, assim como Jack Kerouac,
escondeu sua verdadeira origem, trocando, inclusive, seu nome. Muggiati (1983) comenta
que, provavelmente Dylan, que na verdade chamava-se Robert Zimmerman, adotou tal nome
em homenagem ao poeta galês Dylan Thomas, que acabou por torna-se uma figura idealizada
pelos beatniks. Foi através de Dylan Thomas que a poesia renasceu nos Estados Unidos,
influenciando os principais intelectuais beats, como Allen Ginsberg, Gregory Corso e
Lawrence Ferlingetti. Eles recitavam poemas nos cafés acompanhados pelo som do sax em
encontros que ficaram conhecidos como os jazz/poetry. A expressão musical é tão importante
neste contexto, que Jack Kerouac escreve México City Blues (242 choruses), coletânia de
versus meio improvisados em que tenta imitar com palavras o som do sax-tenor bepop e da
guitarra rock and roll.
(...), com seu apogeu por volta dos anos 1956-1968, surge o rock-‘n-roll, sintetizado
na figura provocativa de Elvis Presley, aglutinando um público jovem que começava
a fazer este tipo de música a expressão de seu descontentamento e rebeldia, tornando
inseparáveis a música (ou a arte) e o comportamento. É a chamada juventude
transviada, com suas gangs, motocicletas e revoltas contra os professores nas salas
de aula. (PEREIRA,1992, p.9)
Como exemplo desses grandes festivais de música que Pereira fala, podem ser citados,
entre os de maior importância, o de Monterey (1967), com o surgimento de Jimy Hendrix e
Janis Joplin; o de Woodstock e o de Altamont, ambos em 1969.
Tropicália. Era poeta, letrista, crítico e foi parceiro de Gilberto Gil e Edu Lobo. Outros
destaques deste movimento foram Caetano Veloso, Gal Costa, o cantor-compositor Tom Zé, o
maestro Rogério Duprat, além da cantora Nara Leão entre outros grandes nomes.
O jornalista Nelson Motta diz que, “o Tropicalismo foi um movimento de ruptura que
sacudiu o ambiente da música popular e da cultura brasileira entre 1967 e 1968” (Última
Hora, 1968). Mas Motta, também lançou suspeita a respeito do verdadeiro objetivo da
Tropicália, “O Tropicalismo é, por enquanto, apenas uma série de ideias esparsas que anota
certas tendências e determinada visão da realidade brasileira”11 . Mas Neves (1968) coloca
que o movimento visava à valorização de tudo que era nacional, indo contra as influências
que o Brasil insistia em receber da Europa e dos Estados Unidos. Assim, Hélio Oiticica
declara, que “o mito da tropicalidade é muito mais que araras e bananeiras: é a consciência de
um não condicionamento às estruturas estabelecidas, portanto altamente revolucionário na sua
totalidade” 12.
Uma das músicas mais conhecidas nesta época foi “Alegria, alegria”13 de Caetano
Veloso e, segundo Augusto dos Campos (1967), essa música soava como um manifesto,
tomando o mesmo objetivo que os movimentos de massa e de juventude. Além disso, buscava
a liberdade para a experimentação, sendo a parte da música em que diz “Por que não?”, ao
mesmo tempo um desabafo e um desafio. Gilberto Gil em uma entrevista para o Jornal da
Tarde, chegou a dizer que as suas composições, bem como as de Caetano seria “música pop”.
E assim ele definiu: “Musica pop, é a música que se consegue comunicar de maneira tão
simples, como um cartaz de rua, um outdoor, um sinal de trânsito, uma história em
quadrinhos.” (1967).
11
NEVES, Arlette. Tropicalismo: movimento, mito, escola ou cafajestada sob encomenda? Matéria retirada
da revista O Cruzeiro, 20/04/1968. Disponível em
<http://tropicalia.uol.com.br/site/internas/report_tropicalismo.php>, acessado em 10 de maio de 2009.
12
Ibdem 11
13
Letra completa de Alegria, alegria em anexo 3.
43
Entendendo o que possa ter sido e o que é este Tropicalismo, Carlinhos Oliveira
defende numa crônica tropicalíssima, que ele é um sintoma da maturidade psicológica (...).
Que é o próprio brazilian way of life e que o Brasil estaria reencontrando a originalidade14 .
O movimento acabou devido à repressão sofrida pelo governo militar e pela prisão dos
grandes intérpretes da Tropicália, como Gilberto Gil e Caetano Veloso.
14
Ibdem 11
44
Hendrix tem de estar nessa” (1981, p.14). Ainda no mesmo livro aparece um trecho dito por
Caetano em 1970: “A expressão ‘fundir a cuca de alguém’ é válida. As pessoas gostam que
você funda a cuca delas. Eu quero formar uma banda grande e criar um novo tipo de música.
Agora nós vamos fundir a Cuca das pessoas mas, enquanto ela se funde, nós vamos construir
algo para preencher o vazio” (1981, p.16). A respeito dessas duas citações é interessante notar
a semelhança das ideias dos dois músicos que estavam envolvidos nessa nova cultura jovem,
mas chegaram a reconhecer que precisavam de algo mais concreto, precisavam fazer mais por
esses jovens, estavam cansados de serem reconhecidos apenas por liderarem um grupo de
bagunceiros e drogados, não que seja verdade absoluta, mas era assim que muitos os viam.
Após uma grave denúncia de Jânio estar “tramando para o Brasil um regime análogo
ao de Cuba” (Koshiba e Pereira, 1993, p.338), no ano de 1 961 o presidente renunciou e,
45
assim, começou o governo de João Goulart (1961-1964), conhecido popularmente por Jango,
e reconhecido como aliado político do comunismo.
Para fortalecer ainda mais essas opiniões, quando Jânio renunciou, Jango
encontrava-se em visita à China comunista, onde declarara, dirigindo-se ao líder do
PC Chinês, Mao Tse-tung: “Congratulo-me em Vossa Excelência pelos triunfos
obtidos pelo povo e o governo da República chinesa em sua luta heroica pelo
progresso e pela elevação do padrão de vida do povo.” (Koshiba e Pereira, 1993,
p.339)
massa falida”. Ao mesmo tempo, nas ruas acontecia as “Marchas da família com Deus pela
Liberdade” (Holanda e Gonçalves, 1990, p.12)
De acordo com Koshiba e Pereira (1993), o movimento militar de 1964 teria sido o
ápice da crise no Brasil, no entanto também o desfecho de toda instabilidade que já perdurara
durante anos. Complementando, Holanda e Gonçalves dizem que, “o golpe de 64 traz consigo
a reordenação e o estreitamento dos laços de dependência, a intensificação do processo de
modernização, a racionalização institucional e a regulação autoritária entre as classes e
grupos” (1990, p. 20). Ainda de acordo com os mesmos autores, os intelectuais, jovens em
sua maioria, neste contexto, desempenharam o papel de “foco de resistência” perante o
movimento militar. Também neste ano, surge o primeiro movimento musical, intitulado
Opinião, que entre seus participantes tinha Nara Leão15, e que funcionará como uma resposta
ao golpe.
A respeito do Opinião, Holanda e Gonçalves descrevem que, “reunindo um público
jovem, o show parecia interpretar o sentimento de toda um geração de intelectuais, artistas e
estudantes naqueles dias em que a realidade do poder militar afigurava-se como um fantasma
no imaginário da revolução brasileira. Para espantá-lo surgia um novo imperativo: falar,
cantar, manifestar” (1990, p.23).
E foi desse jeito, falando, cantando e manifestando, que o clima de revolução, de
busca por liberdade e mudança, espalhava-se em todas as direções. Todos os meios de
comunicação eram utilizados para este mesmo fim. Assim, a vestimenta também foi uma
grande aliada, as roupas comunicavam antes mesmos das palavras. E, da mesma forma, as
artes plásticas não poderiam ficar de fora: surgiram vários projetos e instalações comunicando
o que Oiticica chamava de “antiarte” 16.
Segundo Holanda e Gonçalves (1990), pode-se definir que dois movimentos tiveram
suma importância para o cenário de contestação neste momento, o primeiro seria o “Cinema
Novo”17 e o segundo, o “Tropicalismo”, que muito trazia do rock jovem dos ingleses e norte-
-americanos. Segundo Holanda e Gonçalves (1990), “a ideia de retomar e levar adiante o
ponto de encontro da musicalidade brasileira com a modernidade musical assumia naquele
momento um caráter provocativo e r enovador” (1990, p. 55). Os j á ídolos brasileiros não
15
Ex-musa da “alienada” Bossa Nova, agora musa do protesto, de punhos cerrados, atraía as atenções do
estudante, do intelectual, do jovem contestador de esquerda. (HOLANDA e GONÇALVES, 1990, p.24)
16
Hélio Oiticica sentenciava: “chegou a hora da antiarte. Com as apropriações descobri a inutilidade da chamada
elaboração de obra de arte.” (HOLANDA e GONÇALVES, 1990, p.27)
17
(...) assumindo um papel de frente no campo da reflexão política e estética, expressaria de forma radical as
ambiguidades que dilaceravam a prática política intelectual em nossa história recente. (HOLANDA e
GONÇALVES, 1990, p.30)
47
negavam a influência dos movimentos de outros países, e logo, de maneira cada vez mais
regular, festivais aconteciam e marcavam a história da música e da cultura jovem brasileira.
18
A expressão iê-iê-iê surgiu a partir dos Beatles, quando lançaram a Música She Loves You, logo a mídia os
chamou de “Reis do iê-iê-iê”.
48
Figura 09 - Gal, Nara, Rogério Duprat(costas), Caetano, Gil e os Mutantes. Lançamento do Disco
Manifesto, 1968.
Fonte: http://tropicalia.uol.com.br/site/internas/fotos.php
Este assunto poderia durar ainda muitas páginas, no entanto, pelo histórico
apresentado presume-se que já se torna possível reconhecer a importância do cenário
underground brasileiro, bem como a situação política que acabou favorecendo o
aparecimento destes manifestos através das artes plásticas, do cinema, da música e também da
moda. Todo este movimento jovem, tanto nacional como internacional, proporcionou à Moda
ir além de seu valor comercial e estável, tornando-se uma aliada essencial para expressar
insatisfação, falar, cantar, representar, gritar, junto com estes jovens “rebeldes”. Enfim, a
antimoda, em sua relação com a Moda, manifestou-se primeiramente na mesma dimensão em
que estes movimentos gritavam revolução.
49
Adianta-se aqui que, mesmo falando sobre, de certa forma, a moda dos anos 1960, -
sendo que em vários momentos não será possível desviar da moda dominante da época, ou
como Lipovestki (1989) coloca da “moda oficial” -, contudo não aprofundar-se-á este aspecto.
Apenas será apresentado um resumo das mudanças que a moda sofreu neste tempo, para que
se possa chegar ao que realmente se faz relevante para o referente estudo: a antimoda. Assim
como a contracultura revela-se como um nova cultura, porém marginal, a antimoda também
revela-se como uma moda marginal, igualmente, em primeira instância.
19
Relembrando as definições já apresentadas de beats ou beatniks sendo o mesmo que hipster, que por sua vez
emprestou o radical hip para os hippies.(ver Primeiro Capitulo).
50
Contudo, para ser compreensível esta ligação entre a contracultura e a antimoda, com
a moda vigente na época e a moda dos dias atuais, far-se-á necessário falar dessa nova
estrutura do sistema de moda que acabou por contribuir para uma mudança dos costumes de
toda uma sociedade, que Lipovestky (1989) chamou de moda aberta, apenas lembrando que
esta era a moda oficial e não a antimoda.
Tal como se organiza sob nossos olhos, a moda já não encontra seu modelo no
sistema encarnado pela moda de cem anos. Transformações organizacionais, sociais,
culturais, em curso desde os anos 1950 e 1960, alteraram a tal ponto o edifício
anterior que se tem o direito de considerar que uma nova fase da história da moda
fez sua aparição. (...) Novos focos e critérios de criação impuseram-se; a
configuração hierarquizada e unitária precedente rompeu-se; a significação social e
individual da moda mudou ao mesmo tempo que os gostos e comportamentos dos
sexos. (LIPOVESTKY,1989, p.107)
20
Expressão utilizada para denominar um estilo que faz referência à cultura popular.
51
-se por dois movimentos dividindo o sistema de moda, não exatamente um conflitando com o
outro, uma vez que os públicos e classes sociais de cada movimento eram muito bem
definidos, assim como distintos um do outro. Esses dois movimentos, ou melhor, processos,
seriam o mercado da Alta Costura, com todo seu luxo e ostentação de roupas feitas sob
medida respeitando um padrão extremamente rígido de qualidade e que já guiava a moda com
excelência há tempos; e o mercado da moda industrial, que crescia cada vez mais, produzindo
roupas em escala, com custo baixo e preço final bem mais acessível, obviamente.
Enfim, dessa forma fica instaurado um ciclo: cabe a Alta Costura o lançamento das
tendências e as novidades e, tanto as costureiras em seus pequenos ateliês como a moda
industrializada, cabe a reprodução dessas novidades, mas em um padrão de qualidade
diferente. No entanto, todo este processo seria quase que exclusividade à moda feminina. Já
na moda masculina acontecia de forma diferente, principalmente porque enquanto o ponto
inicial da moda feminina partia de Paris, a capital oficial da Alta Costura, a moda masculina
partia de Londres e depois cada vez mais dos Estados Unidos. Embora acompanhando esses
dois processos, de moda sob medida e industrial - igualmente como acontecia na moda
feminina - a moda masculina realmente caminhava de uma forma mais lenta. É que, como diz
Lipovestsky (1989:71), prolongando um fenômeno já manifesto no século XVIII, a moda
moderna é de essência feminina.
Dessa forma, o sistema de moda permaneceu durante muito tempo com a Alta Costura
e a moda industrial dividindo espaço, mas engana-se quem pensa que a indústria da confecção
tenha surgido depois da Alta Costura, ela surgiu cerca de um século antes, no final do Antigo
regime, de acordo com Lipovetsky (1989), mas aos poucos é que foi ganhando força e a
própria Alta Costura acabou por ajudar esta moda a instaurar-se definitivamente, uma vez que
as maisons de Alta Costura e seus criadores lançavam a moda e, de forma cada vez mais
regular e oficial, compradores de várias partes do mundo, principalmente dos Estados Unidos,
iam até essas maisons, compravam em primeira mão as novas peças e depois reproduziam em
série, simplificando o modelo e vendendo a um preço inferior. Este processo foi
impulsionando a moda industrial, então: “A Alta Costura disciplinou a moda no momento em
que ela engatava um processo de inovação e de fantasia criadora sem precedente. (...) A moda
moderna ainda que sob a autoridade da Alta Costura, aparece assim como a primeira
manifestação de consumo em massa, homogêneo, estandardizado, indiferente às fronteiras”
(Lipovetky, 1989, p.73-74).
52
Portanto, a moda foi cada vez mais se democratizando, e a moda em série ganhando
espaço, e diversos estilistas acompanhando e lançando sempre uma moda menos luxuosa e
mais prática, ainda mais depois da Primeira e Segunda Guerra Mundial. Nestes contextos,
houve o desmoronamento do universo “holista” e a moda, a partir do século XX, passa a ser
comandada pelo ideal da igualdade democrática. É importante acompanhar toda essa
significante mudança no sistema de moda, consequentemente nos códigos do vestir,
exatamente pelo fato de não ser a antimoda um momento tão exclusivo de luta libertária
através da vestimenta, uma vez que, nota-se que toda uma sociedade por completo também
acompanhava mudanças com enfoque igualmente parecido. Mas é claro, que o vestir feminino
não mudou apenas por caráter libertário isolado, até porque as mulheres não foram às ruas
com cartazes pedindo uma moda menos austera - como fizeram os jovens manifestando seus
direitos - outros acontecimentos tiveram importância para esta democratização da moda
oficial, como por exemplo, o crescimento do hábito da prática de esportes.
Assim como a moda oficial, que ganhava formas mais livres e menos rígidas a cada
nova coleção, a antimoda também engajava-se nesta busca por liberdade. Mas, é óbvio que
existia uma grande diferença na liberdade da moda dos estilistas e na liberdade radical da
antimoda: a diferença está no por que, como e para que conseguir tal liberdade. A antimoda,
assim como a contracultura, renunciava um sistema dominador, então os jovens participantes
da contracultura acabaram se utilizando da vestimenta também como um veículo de
manifesto. Como eles estavam contra um sistema dominante, por conseqüência, deveriam
rejeitar a moda oficial, criando assim a antimoda.
Nos anos 1950 e 1960 a moda oficial ficava cada vez mais espontânea, lançando, por
exemplo, formas futuristas através de Courréges, e mostrando que, embora através de uma
inspiração inusitada, o objetivo continuava o mesmo: a liberdade. A respeito disso o próprio
Courréges declarou: “Procurei uma moda dinâmica, com a constante preocupação da
liberdade do gesto... a mulher de hoje liberou-se. É preciso que o seja também fisicamente.
Não se pode vesti-la como estática, como sedentária” ( LIPOVETSKY, 1989, p.78).
Ao mesmo tempo em que toda essa nova significação aconteceu na moda também
houve um reconhecimento profissional e artístico a partir da metade do século XIX que
jamais tinha acontecido. Antes os profissionais eram considerados apenas costureiros e então
ganharam o título de criadores, quem conseguiu esse feito foi Charles Frederick Worth (1825-
1895), considerado até hoje o pai dos estilistas. Assim escreve Lipovetsky: “O costureiro,
após séculos de relegação subalterna, tornou-se um artista moderno, aquele cuja lei imperativa
54
é a inovação” (1989, p.79). Além disso, os estilistas vão expor na moda, através de suas
criações, uma íntima ligação com os artistas modernos e, por mais relativamente lenta que
venha a ser a evolução das criações para não ser rejeitada pelos consumidores conservadores,
aos poucos alguns criadores conseguem encaixar um pouco de criatividade livre em suas
obras realizando parcerias com os seus amigos das artes plásticas.
Não é um fenômeno anedótico que, desde a aurora do século XX, certos grandes
costureiros admiram e freqüentam os artistas modernos: Poiret é amigo de Picabia,
Vlaminck, Derain e Dufy; Chanel é ligada a P. Reverdy, Max Jacob, Juan Gris,
realiza os trajes de Antígone de Cocteau, sendo os cenários de Picasso e a música de
Honegger; as coleções de Schiaparelli são inspiradas pelo surrealismo.
(LIPOVETSKY, 1989, p.81)
Definitivamente, a moda tinha mudado, não tanto quanto ainda poderia, mas tinha
dado um passo grande à frente. Da moda a la garçonne dos anos 20, passando por vestidos
um tanto audaciosos com estampa de lagosta de Schiaparelli, a criação dos trajes para praia
nos anos 30, até a minissaia nos anos 60. Da mesma maneira que as modelagens mudavam,
por exemplo, com os vestidos curtos, os tecidos também se mostravam cada vez mais
criativos, roupas de materiais nobres não eram mais o foco, o sintético estava em alta, o jérsei
e até mesmo roupas feitas com panos de limpeza. Diz Lipovetsky (1989) que tudo isso
correspondia à arte modernista: simplificação ou depuração da moda paralela a certas
pesquisas dos cubistas, dos abstratos, dos construtivistas.
Feita esta breve abordagem sobre a moda de cem anos, caracterizando a primeira fase
da moda moderna e voltando ao foco dos anos 1960, agora torna-se mais fácil falar sobre a
moda aberta e o prêt-à-porter - logo a antimoda, uma moda partindo de jovens inconformados
- que irão constituir a segunda fase da moda moderna. Pelo fato da primeira fase desta moda
moderna ter sido de relevante importância para a re-estruturação de um novo sistema, o que
acontece a partir de agora é que, com as portas já abertas, basta continuar um trabalho e
firmar-se cada vez mais. Ou seja, os estilistas criadores foram reconhecidos, a moda sazonal
foi imposta, os desfiles foram se tornando um hábito a cada coleção nova, a produção em
55
série se expandia, e a Alta Costura continuava com todo seu mérito - é verdade que mais
simbólico do que exatamente lucrativo e muito menos vanguardista.
Foi assim que, nos anos 1960, chegou-se ao fenômeno chamado prêt-à-porter,
expressão lançada na França numa apropriação da expressão americana ready to wear, que
significa “pronto para usar”. Seria uma moda industrializada, parecida com a que já vinha
sendo feita, mas a diferença está na qualidade, tanto de execução como na criação, uma vez
que agora o prêt-à-porter não era apenas uma confecção reproduzindo cópias menos
complexas de peças compradas, ele passou a ganhar maior credibilidade, uma moda industrial
que podia virar griffe, apresentar novidades e criações próprias.
Nos anos 1960, este novo mercado industrial iria cada vez mais tornar-se independente
e a moda, que já vinha passando por um profundo processo de modernização, ganharia um
novo público alvo, os jovens. Assim surgem vários novos estilistas, revelando uma moda
audaciosa e inovadora. A respeito dessa moda jovem, Lipovetsky cita: “com suas botas de
salto baixo, seu branco puro, suas preferências a colegiais de meias soquetes, seu dinamismo
de geômetra, o estilo Courrèges registra na moda a ascensão irresistível dos valores
propriamente juvenis, teenagers” (1989, p.111). Os estilistas que faziam história na época
eram: Balenciaga, Yves Saint-Laurent, obviamente Courrèges, entre outros mais, e ainda
tinham aqueles estilistas fazendo sua estreia, como Cacharel, Mary Quant, Michèle Rosier,
Emmanuelle Kahn, e mais alguns.
por modelo o princípio das coleções sazonais de moda. Com o estilismo, o vestuário
industrial de massa muda de estatuto, torna-se integralmente um produto de moda.
As primeiras griffes do prêt-à-porter aparecerão nas publicidades. (LIPOVETSKY,
1989, p.110)
Logo, com o prêt-à-porter fixado e um estilo mais jovem também ganhando força,
Courréges declara: “Abaixo o Ritz, viva a rua.” (apud LIPOVETSKY, 1989, p.112). Mas
como que se explica, de repente, essa mudança no enfoque da moda? Claro que como se viu o
sistema de moda já vinha desde o século passado se modificando, conforme a sociedade
também readaptava-se, no entanto, a moda acabou passando por uma extraordinária
metamorfose. Para tentar entender, de alguma forma, como constituiu-se o caminho que levou
a moda a readaptar-se, basta dar atenção as palavras ditas por Courréges, em que ele evidencia
a rua. Nota-se que, realmente, houve uma inversão da pirâmide da moda. Ou seja, um fato
inédito aconteceu, parte da moda que se via nas ruas não era mais aquela ditada nem pela Alta
Costura, nem pelos estilistas consagrados ou pelos novos estilistas nas indústrias de prêt-à-
porter, mas tratava-se de uma invenção espontânea partindo dos próprios jovens e, então,
numa sacada de mercado e, provavelmente de sobrevivência, a mídia e os criadores
rapidamente apropriaram-se dessa moda e a levaram para a passarela.
Chegou-se então ao momento em que a moda passou a depositar total confiança nos
gostos juvenis, tornando aqui viável voltar a falar na antimoda, que até este momento não teve
a atenção merecida. Foi necessária a espera para que se chegasse a este momento da moda
57
jovem, pois existe uma relação, relativamente estreita, entre esta nova moda e a antimoda,
uma vez que foi justamente esta antimoda que proporcionou a inversão do sistema, pois não
acredita-se que todos os jovens de uma hora para outra, resolveram inventar sua própria
moda, provavelmente não. Todavia, foram os jovens integrantes dos movimentos marginais,
os adeptos da antimoda, que acabaram por lançar esta moda jovem. E aos poucos, um grande
grupo de jovens também começou a adotar esta antimoda, logo a mídia percebe e rapidamente
os criadores também. Passa assim a moda jovem a ser, de certa forma, uma criação dos jovens
contraculturais que utilizaram-se da antimoda como forma de expressão contra o próprio
sistema de moda. Construindo um universo da aparência em que negavam um sistema
econômico capitalista e dominante, acabaram consumidos e massificados pelo próprio
sistema.
Mas a antimoda, ou seja, estes jovens rebelando-se e usando da aparência como aliada
aos seus manifestos, não é algo tão novo assim. Exatamente por este motivo é que Lipovetsky
(1989) apresenta estes personagens da antimoda da década de 1960, como sendo os neo-
dândis. Estes jovens rebeldes, que pareciam para muitos rebeldes sem causa, tinham como
ideal de vida a marginalidade, não no seu sentido pejorativo, mas marginal, por negarem os
costumes tradicionais da sociedade, optando por uma conduta de vida considerada
underground. Eles estavam propondo a ruptura de valores, embasada em comportamento,
atitude e aparência distintos dos convencionais.
Bollon (1993) traz um resumo das “tribos” que surgiram ao longo da história da moda,
mas infelizmente não traz um capítulo falando propriamente dos beats. Mas, mesmo assim,
traz uma ideia geral sobre estes movimentos de antimoda surgidos sempre num contexto
parecido. A respeito disso:
Além do mais, o Dandismo não tem muito a ver com liberdade e nem com a total
democratização da vestimenta atingida nos dias de hoje e que teve seu inicio através da Beat
Generation, que mesmo sendo um movimento limitado, devido ao número de associados na
época, foi quem proporcionou a abertura das portas da contracultura e da antimoda para
milhares de jovens das décadas seguintes. Um exemplo de um movimento seguidor dos beats
são os Hippies, que como falado no inicio deste capítulo, torna-se mais fácil analisá-los como
um movimento de antimoda, devido ao grande número de adeptos, consideravelmente maior
que os próprios beats, que era um movimento restrito à escritores e intelectuais. É como se os
hippies fossem a massificação da Beat Generation.
60
Após a divulgação do movimento Beat na mídia – aliás foi a partir daí que surgiu o
termo Beatnik, criado pela colunista Herb Caen, do San Francisco Examiner – todos os
Estadunidenses ficaram conhecendo Kerouac, Ginsberg e companhia, como figuras grotescas.
Como Goffmann e Joy (2007, p.265) citam: “Nesse tipo de representação, o estilo substituía o
conteúdo. O beatnik da mídia tinha um visual típico: os homens usavam cavanhaque e não
colocavam a camisa dentro das calças. As mulheres se vestiam de preto, culminando com uma
boina francesa. Eles carregavam bongôs para toda parte. Era um consenso que eles não
gostavam de tomar banho.”
Por mais que fosse insultuosa, a redução da rebelião boêmia hipster a um estereótipo
engraçadinho pode ter subvertido os Estados Unidos convencionais mais do que
diminuído os beats. Afinal, ainda era a década do “burocrata”. Qualquer um que não
fosse alinhado – corretamente vestido e sem excesso de cabelo – e não submergisse
sua identidade na homogeneidade do mundo industrializado nove-às-cinco era visto
61
como fora dos limites, um completo paria, um personagem suspeito. Após quase
uma década com uma repressão como essa, qualquer imagem – por mais incompleta
ou diluída que fosse – de pessoas fora dos parâmetros seria muito atraente,
particularmente para os jovens. (GOFFMAN E JOY, 2007, p.265)
E depois dos beatniks, quase simultaneamente aparecem os Hippies, que muito têm a
ver com os beats, seja no comportamento, nas buscas libertárias ou quanto à aparência. No
entanto, Goffman e Joy (2007) dizem que o hippies seriam uma evolução em um sentido mais
alegre e quase absurdo das tendências contraculturais antiautoritárias deixadas da década de
50 pelos beatniks. Nesta mesma época, após a Beat Generation, surgem, no lugar dos
expressionistas abstratos, os artistas da Pop Art como Roy Lichtenstein e Jasper Johns. E
também a Op Art, na Inglaterra, através de Bridget Riley.
Falando em Inglaterra, Goffman e Joy (2007) contam que, por muito tempo o universo
do rock inglês vivia em segredo, e foi assim que ele teve tempo para aperfeiçoar não somente
a música, mas também a noção de moda. Os garotos do cenário do rock desenvolveram sua
marca através de um estilo de vestir totalmente próprio, como, por exemplo, os cabelos
longos, as botas com salto alto, calças pescando-siri, blusas escuras ou camisas com colarinho
alto: “(...) seu visual era uma mistura de dândi inglês e beat americano” (GOFFMAN E JOY,
2007, p.286). A partir deste momento, uma nova imagem jovem passou a ser idolatrada:
meninos exageradamente magros e ausentes de musculatura, uma aparência frágil e no
entanto, adorada pelas meninas que mostravam-se completamente apaixonadas. Assim, surge
em 1964, da Inglaterra conquistando os Estados Unidos, quatro jovens com o seu pop rock
quase frenético, os Beatles. A respeito disso, da febre que estes jovens provocaram em toda
uma geração de jovens, Goffman e Joy vão definir de beatlemania. “Era a beatlemania, e
enquanto as garotinhas se debulhavam e se molhavam, toda a população adulta dos Estados
Unidos momentaneamente parou de se preocupar com comunas e passou a se preocupar com
o cabelo”(GOFFMAN E JOY, 2007, p.286).
mais atrativo do que passar quatro anos em uma faculdade e posteriormente mais quarenta
anos de terno e gravata dentro de um escritório. E foi dessa forma, que todo o mundo passou a
falar dos Hippies, que na verdade não eram muito bem vistos, inicialmente, pelos beats, mas a
semelhança em aparência e ideais era inegável.
Foi dessa maneira que a rua conquistou uma população quase que inteiramente, o
hippie, o beat, a mistura de neo-dândis e mendigos, viraram um estilo de se vestir, mas isso
não é o mais importante, relevante é a mudança social que todos esses acontecimentos juvenis
provocaram. Uma sociedade por inteiro mudou sua forma de pensar e o sistema de moda teve
de mudar também, foi assim que a Alta Costura perdeu espaço e a moda democrática do prêt-
à-porter ganhou reconhecimento. Lipovetsky (1993) diz que a moda libertou-se do sistema
instituído pela Alta Costura devido aos novos valores das sociedades liberais do consumo de
massa, a menor preocupação com distinção de classes: a diversão proporcionou o crescimento
de uma cultura de massa hedonista e juvenil que está no coração do declínio final da moda
suntuária.
O impulso de uma cultura jovem no decorrer dos anos 1950 e 1960 acelerou a
difusão dos valores hedonistas, contribuiu para dar uma nova fisionomia à
reivindicação individualista. Instalou-se uma cultura que exibe o não-conformismo,
que exalta valores de expressão individual, de descontração, de humor e de
espontaneidade livre. (LIPOVETSKY, 1989, p.120)
63
E assim, o estilo jovem foi se firmando como o estilo a partir dos anos 1960, estilo de
viver e estilo de se vestir. A respeito disso, Lipovetsky(1989) diz que o estilo de Courrèges,
que traduzia também o estilo dos anos 1960 e de todos os criadores do prêt-à-porter
simbolizava exatamente esta dinâmica jovem e dos novos valores, através do rock, dos ídolos
e tudo que simbolizasse o universo juvenil. E além da mudança no sistema de moda, a moda
enquanto vestimenta também sofreu uma repaginação, formas mais agressivas, colagens e
sobreposições de peças e mistura de estilos descontraídos.
Acontece, dessa forma, uma abertura total do código do vestir, como se tudo fosse
permitido, não existindo mais regras porque a roupa j á não diz mais um discurso social de
64
poder, ela diz um discurso de individualidade e de liberdade. E como cada indivíduo pode, a
partir deste momento, falar o que bem entender através de suas vestimentas, novos estilos
nunca vistos vão surgir a cada dia, novos materiais vão ser usados, muitos vão imitar e muitos
vão inventar e claro que alguns pais vão preferir continuar com a mesma moda segura da
década passada. Lipovetsky (1989) escreve que no lugar do cuidado e da “classe”, entram o
bizarro e a ironia. É o momento em que a moda ri da moda, a elegância tira sarro da
elegância, acontece a total democratização da moda.
A moda ganhou uma conotação jovem, deve exprimir um estilo de vida emancipado,
liberto das coações, desenvolto em relação aos cânones oficiais. Foi essa galáxia
cultural de massa que minou o poder supereminente da Alta Costura; a significação
imaginária “jovem” acarretou uma desafeição pelo vestuário de luxo, assimilando ao
mesmo tempo ao mundo “velho”. (...) A integração modernista de todos os assuntos
e materiais no campo nobre da arte corresponde, agora, a dignificação democrática
dos jeans, délavés, dos pulls puídos, dos tênis gastos, dos trastes etro, dos
grafismos comics nas T-shirts, dos andrajos, do “look clochard”, das derivações high
tech. (LIPOVETSKY, 1989, p.121)
No entanto, mesmo tudo ou quase tudo estando permitido aos jovens quanto à moda,
estabelecem-se novas regras: agora os adultos teriam que, quase que como uma obrigação,
65
parecer jovens. O estilo jovem tomou conta do universo da aparência: este conceito, atrelado à
antimoda levou a que, nos dias atuais, se desencadeasse uma busca desenfreada por, além de
parecer jovem, parecer ser único.
O importante não é estar o mais próximo possível dos cânones da moda, menos
ainda exibir uma excelência social, mas valorizar a si mesmo, agradar, surpreender,
perturbar, parecer jovem. (...) Um novo princípio de imitação social se impôs, o do
modelo jovem. (...) Poucos se preocupam em exibir nas roupas seu “sucesso”, mas
quem não se empenha, de alguma maneira, em oferecer de si próprio uma imagem
jovem e liberada, em adotar não certamente a última moda júnior, mas o ar, a
gestald jovem? (LIPOVETSKY,1989, p.122)
Com efeito, conclui-se que fica instaurada esta nova moda que fundiu-se com algumas
características estéticas e sociais da antimoda que, por sua vez, foi tomada dos movimentos de
contracultura dos anos 1960. O maior mérito deve-se ao movimento intitulado Beat
Generation, o qual abriu as portas para outros movimentos antiautoritaristas, no sentido de
criar o hábito do não-conformismo jovem em sua transição para a fase adulta.
Assim, a moda oficial readaptou-se, sendo capaz de criar novos desejos, como o de
liberdade e de individualidade, e novos vícios, como o da eterna juventude. Como se verá no
capítulo seguinte, onde já não existem antimoda, moda, contracultura ou cultura em
expressões e significados desligados um do outro, a moda também ganha novos códigos,
tornando-se quase impossível a tentativa de descrever uma moda oficial nos dias de hoje, pois
esta já não comporta mais regras. No entanto, existe uma definição para este estilo herdado
dos pioneiros jovens contraculturais beatniks: é o estilo underground ou alternativo que, para
os jovens consumidores de moda do século XXI, parece ser o mais vanguardista,
simbolizando o estilo jovem “oficial”.
66
Estilo, moda, formas e cores. Hoje decifrar e descrever todos esses pontos já não é tão
fácil, é como se tudo estivesse vindo à tona: o passado, o presente e o futuro unidos numa
única moda, num único corpo. Hoje tudo é permitido: vista-se como quiser, combine quantas
cores conseguir, sobreponha o quanto lhe convir, é a moda mais democrática de todos os
tempos, o que não exclui o bom gosto na hora da escolha. O interessante é notar que a moda
considerada a “moda dos estilistas”, na maioria das vezes é totalmente carregada dos símbolos
da antimoda, da cultura underground. Isto pode significar que, hoje, vive-se a cultura da
contracultura e a moda como discurso tomou posse da antimoda.
Analisando o sistema de moda, pensadores como Veblen e Simmel (apud Caldas,
1999) identificam dois movimentos que regem o sistema: o primeiro seria a imitação, no
sentido de camuflagem, para pertencer à um grupo ou por status; o segundo seria a
diferenciação, adotado por aqueles que buscam uma individualidade através da aparência.
Esta é a atitude escolhida por aqueles que acabam servindo de espelho para a moda, mas não
necessariamente com a intenção de sê-lo. A rua lançando as tendências21 é uma fonte
essencial de pesquisa e inspiração para os estilistas. Criou-se até uma profissão denominada
Coolhunter22, que abarca estes pesquisadores e observadores dos comportamentos e
movimentos que acontecem nas ruas para transferi-los para o mercado. Assim, normalmente o
estilo adotado pelos que buscam a diferenciação, logo, mas nem sempre, torna-se o produto
massificado e passa a ser consumido por aqueles que utilizam-se da imitação. Dessa forma,
21
Movimento Trickle-up (ver capitulo 2).
22
É uma profissão nova no Brasil, mas na Europa e EUA já existem até cursos para quem deseja tornar-se um
coolhunter. Este profissional é um caçador de tendências, ele vai a bares, boates, universidades e deve se infiltrar
no lifestyle do público que deseja entender.
67
cria-se um ciclo, pois para alcançar novamente a diferenciação, este grupo precisa criar um
novo estilo, que por sua vez acabará tornando-se comum à massa novamente.
Pode-se dizer que a antimoda dos anos 1960 encaixa-se perfeitamente nesta
característica da diferenciação, porém não exatamente da maneira como funciona hoje, pois já
não se pode mais dizer que existe antimoda, uma vez que esta é o verdadeiro produto de moda
nos dias atuais. Além do mais, de acordo com estudo feito e como pode ser visto nos capítulos
anteriores, ficou estabelecido que esta característica da diferenciação é base da antimoda e
esta, portanto, deixa de ser antimoda no momento que é adotada pelo mercado.
A partir de agora, falar-se-á desta moda atual provinda da antimoda, desta “antimoda”
que já tornou-se parte do sistema, ficando conhecida como estilo underground ou estilo
alternativo, intimamente ligado a moda jovem ou estilo jovem e estilo de vanguarda, que
perdura desde os anos 1950 e 1960, como se viu anteriormente, quando deu-se início ao
movimento contracultural Beat Generation. Esta estética de vanguarda hoje é reconhecida por
todos, é vendida, é adotada por grupos, mas por seguir o princípio da inconstância que define
por si mesma a cultura jovem, ela nunca está estável, nunca se permite ser copiada e depois
estagnar-se por sua própria natureza, estará em constante renovação.
Esta moda, como Flüguel aponta, é o “espírito do tempo” do século XXI. Assim
descreve Caldas,
“Moda, hoje, não é só roupa, mas também os lugares que são frequentados, o que se
lê e se escuta, o modo como se vive... Ao mesmo tempo, todas essas esferas do
comportamento humano enviam mensagens sobre quem somos, frequentemente
sobre quem não somos, às vezes, sobre quem gostaríamos de ser... Deste ponto de
vista, a roupa – como qualquer outro ato de consumo – é um ato de comunicação.”
(1999, p.39)
Assim, a moda hoje traduz a sociedade urbana e veloz em que está inserida; traduz a
ansiedade e inquietação dos que a usam; traduz com louvor um momento onde a contracultura
é cultura e a antimoda pertence irremediavelmente à moda.
Para que essa relação seja mais compreensível, serão estabelecidas algumas relações
de marcas e estilistas que utilizam destes símbolos da antimoda, podendo assim serem
identificados como adeptos de um estilo mais underground. Mas já adianta-se que a pretensão
não é fazer nenhum estudo de caso e também não se pensa em focar a moda como puramente
vestimenta, mas sim como estilo, conceito e expressão. É importante salientar que, hoje, há
uma variedade imensa de estilos que, inclusive, são intercambiáveis entre si. Assim, no
68
mercado atual de moda, estilos se misturam formando novos estilos, caracterizando novas
possibilidades de identificação que serão consumidas pelos sujeitos-moda23.
Compreender a moda hoje, em seu discurso de contestação social, é compreender o
estilo jovem em sua relação com a herança da contracultura e da antimoda da Beat
Generation. Um exemplo para melhor explicar seria o caso da marca brasileira Ronaldo Fraga
que, desde 2001, apresenta suas coleções na São Paulo Fashion Week24. Fraga foi o único
estilista brasileiro a receber o reconhecimento da ordem cultural, através do ministro da
cultura e músico Gilberto Gil. Ronaldo “é aclamado como estilista cult da moda brasileira.”25
Seus temas sempre dotados de muita criatividade, vão desde homenagens à estilista brasileira
Zuzu Angel (2001/2002), passando pelo universo da obra de Carlos Drummond de Andrade e
homenageando o compositor e cantor Tom Zé (2005) e a cantora Nara Leão (2007/2008),
entre outras inspirações inusitadas. Apresentando sempre sobreposições de peças, estampas
criativas, trabalhos manuais como bordados, cores vibrantes misturadas com tons pastéis,
construindo um universo além de lúdico, ao mesmo tempo divertido e melancólico. Seu estilo
é atemporal: essencialmente jovem mesmo quando coloca modelos acima dos 60 anos para
desfilar, como foi o caso da última coleção para o inverno 2009.
Através do trabalho de Ronaldo Fraga é possível explicar que herança é esta que a
moda recebeu daqueles anos de rebeldia, de poder falar através da roupa, de conseguir
discursar através de formas, cores e poesia o pensar de uma geração. Uma moda jovem sim,
mas isto não se restringe a um público de faixa etária jovem. Vai-se mais além: jovem em
essência, jovem em alma, jovem no seu tempo. Isto é democracia exercitada através da moda
e foram estas portas que se abriram a partir do momento que a roupa foi usada para protestar.
Ela passou a ser não somente vestimenta, tecido com corte perfeito e silhuetas e
comprimentos pré-estabelecidos por grandes maisons. Passou a ser um perfeito veículo de
comunicação entre diferentes grupos participantes do diálogo da sociedade moderna.
A última coleção que o estilista apresentou, para o inverno 2009, foi inspirada no
espetáculo de Giz, de Álvaro Apocalipse, escrita para o teatro de bonecos Giramundo.
Ronaldo colocou senhores e senhoras, com provavelmente mais de 60 anos de idade, e
também crianças para desfilar. Ronaldo Fraga traz estas diferentes idades da vida para a
passarela, no momento em que apenas meninas lindíssimas e esguias e homens com corpos
23
SANT’ANNA, Mara Rúbia. Teoria de Moda: Sociedade, Imagem e Consumo. São Paulo: Estação das Letras,
2008.
24
SPFW, maior evento de moda da Brasil e da América Latina, produzido por Paulo Borges desde 1996.
25
Frase retirada do Curriculum Vitae do estilista, no site oficial de Ronaldo Fraga. Disponível em
http://ronaldofraga.com.br/port/index.html, acessado 1 de junho de 2009.
69
sarados e rostos perfeitos ou exóticos aparecem. Dessa forma, ele “cutuca” a sociedade e os
espectadores de seu desfile, ele provoca este sentimento do que é ser jovem e onde
colocamos, como sociedade, os que já envelheceram. Ele consegue, dessa forma, provar que a
moda é de fato para todos e que a juventude é um conceito “engolido” pelas pessoas como se
fosse a única fase da vida onde há vitalidade. A propósito, estes “velhinhos” estavam vestindo
peças de Fraga com o mesmo estilo que sempre o caracterizou, jovem e criativo.
A respeito dessa forma de comunicação que a moda possibilita, Bollon (1993) diz que
a moda é por excelência, como nos casos dos movimentos de estilo em que se enquadram
Zazous, Punks, e no caso específico deste trabalho os Beats, o canal privilegiado de expressão
de um discurso habitualmente escondido, tabu, impossível de dizer com palavras comuns,
lógicas.
Mais uma marca do cenário brasileiro que apresenta este estilo de crítica social é a
Cavalera, que desde 2001 desfila na SPFW e hoje conta com cerca de 10 estilistas
desenvolvendo suas coleções, com Marcelo Sommer como diretor criativo. A Cavalera tem
por excelência ser uma marca bem-humorada, jovem e urbana. Dessa forma cria estampas
criativas sempre tratando e debochando de assuntos atuais, como por exemplo, as camisetas
com dizeres como “Disney War” fazendo uma alusão à invasão do Iraque a “Disney World”.
Na coleção apresentada na São Paulo Fashion Week inverno 2009, a marca revelou-se
também cult e folk, trazendo de maneira mais uma vez bem-humorada o universo folclórico
brasileiro do Boi Bumbá26 e toda riqueza do povo caboclo. Na passarela se viu modelos
flutuando, máscaras de bichos permitindo um tom quase bizarro para a coleção, nas roupas o
corte moderno com silhuetas secas, listras, onças, paetês e franjas, que combinadas
proporcionaram um ambiente lúdico e divertido, ao mesmo tempo que, de maneira criativa
mostravam a cultura brasileira através da moda.
26
Festival folclórico que acontece na cidade de Parintins, no interior do Amazonas, desde 1964. Na festa
acontece uma disputa entre dois grupos Boi Garantido e Boi Caprichoso. Os dois bois encenam a mesma
história, a de pai Francisco e mãe Catrina, a qual, durante a gravidez, sente o desejo de comer língua de boi. (
Fonte: http://www.parintins.com.br/)
72
Além dessa coleção, uma das mais marcantes da história da Cavalera foi a do inverno
2008, apresentada em meio ao lixo acumulado as margens do rio Tietê em São Paulo.
Debaixo de garoa e junto ao mau-cheiro, ofereceu máscaras para os convidados, completando
o discurso com o som de uma sirene de emergência. A marca causou polêmica fazendo uma
importante reflexão sobre a poluição das águas e a reciclagem e utilizando tecidos
reaproveitados para criar algumas das peças da nova coleção.
Figura 22– Moda Jovem - Coleção Cavalera no rio Tietê– inverno 2008 SPFW
Fonte: http://moda.terra.com.br/spfw2008inverno/interna/0,,OI2254189-EI10822,00.html
73
jovens que andam por Tóquio hoje, e ao seu redor uma sociedade de tradições milenares, de
obediência e disciplina como ideais de conduta de vida.
então, como discursos de constante inovação, alimentando essa mesma indústria que
questionavam. No sistema de moda, contestar “virou moda” e o Beat se tornou produto de
consumo cult.
77
CONSIDERAÇÕES FINAIS
vida moderna, chegando ao século XXI totalmente democratizada, com mil formas, mil cores,
mil estampas, mil inspirações e, o mais importante, estabelecendo-se totalmente jovem, com a
alma jovem traduzindo o “espírito do tempo”. Portanto hoje, quando fala-se em moda, já não
se pode mais falar apenas em aparência, tratando-a como futilidade e superficialidade, a não
ser que esteja falando da profundidade que transparece à superfície através da aparência
(Bollon, 1993). E esta profundidade através da moda, vai tornar-se um portal de comunicação
entre indivíduos, estabelecendo novas formas de relacionamento e consequentemente novos
julgamentos, novos diálogos e novas atitudes.
Analisar a moda hoje é uma tarefa complexa, uma vez que todos seus códigos foram e
continuam multiplicando-se. Essa variedade de estilos vão das ruas às passarelas e retornam
às ruas em forma de modas, novas modas, a todo instante. Os símbolos da contracultura ainda
existem, porém deixaram de ser contraculturais justamente por que a democracia não os
condena; a cultura já não é uma só, ela respeita e abriga seres diferentes, indivíduos
diferentes, apesar de hipócrita muitas vezes. Ainda sim, hoje ela escuta os rebeldes, os novos
beats, e não os marginaliza como nos anos 1950 e 1960. Deles, sobrou que sua marginalidade,
sua antimoda, foi usurpada por esta moda que julga-se vanguardista. Esta, no entanto,
somente o é por estar tomada pelos efeitos, símbolos e coragem, pelo espírito de contestação,
da antimoda. É a moda da antimoda que, nos dias atuais, consegue simbolizar o “Novo” e
adequar-se a velocidade e complexidade da vida moderna.
79
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ANEXOS
Buckley: - Aqui conosco, o Sr. Jack Kerouac, se tornou famoso com a publicação de
seu livro On the Road. Ele parece pregar uma vida de descompromisso, vivendo uma vida de
perturbações. O fato é que, quando o livro foi publicado, em 1958, sete anos após ter sido
escrito, o sr. Kerouac se mostrou o mentor da Beat Generation, e para ser exato, de outros
autores. Ele tem sido um romancista que trabalha regularmente, está em seu décimo livro, The
Vanity of Dulouz, que é considerado por muitos o seu melhor. E o me diz sr. Kerouac, você
estava pensando em algo, divagando algo?
Buckley: - Quais são, na sua opinião, as diferenças entre os hippies, e no seu caso, um
movimento radical?
Kerouac: - Nada.
Kerouac: - Minha avó deve ter sido a mãe desses adamites. (Jack dá uma gargalhada)
Buckley: - Puro?
Buckley: - Sobre isso sr.Kerouac, diria que em termos de. Eu perdi totalmente o fio da
meada. O assunto que quero tratar é que nos últimos anos, pessoas deixaram de ver no
processo político um instrumento útil para se chegar a um mundo melhor para se viver. E isso,
talvez não tenha a ver com problemas de caráter, ou algo assim.
Buckley: - Ela é só desilusão, e isso teria a ver com o começo do movimento hippie.
Buckley: - Você não acha que seria mais caro mandar recrutas robôs?
Kerouac: - Cuidado com os falsos profetas. Que chegam a você vestindo roupas de
cordeiro, mas que por baixo, são lobos vorazes.
Kerouac: - Há pessoas que tem um método para criar o caos. Eles dizem que, uma vez
que o caos já está aí, elegem pessoas para que possam cuidar do caos.
Kerouac: - Eu não nada sobre ele, nunca estive lá. Estou querendo dizer que a idéia
dele de protestar, correr por aí, fazer barulho de qualquer jeito, ou seja, se você cria o caos,
você se torna um Comissário do Controle do Caos. Sabe como chamávamos o Humprey?
Kerouac: - O quê?
Kerouac: - Eu.
Buckley: - alguém poderia me dizer, daqui a 10 anos, a seguir esse negócio de, o que
poderia acontecer com os hippies?
Convidado 2: - Daqui para frente acho que os hippies vão ser os líderes de uma nova
geração. Todos fumarão maconha, os jovens legisladores vão introduzir a legalidade da
maconha. Os jovens profissionais irão se ligar quando souberem da grande contribuição que
Ginsberg e Kerouac deram para a civilização da América.
Kerouac: - Como assim? Não tenho nada a ver com Ginsberg, não ligue meu nome a
essa coisa.
Fonte: http://letras.terra.com.br/caetano-veloso/43867/