Arqueologia Pós-Colonial
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BASSI, L.F. Metodologia para análise tecnológica em cristais de quartzo. R. Museu Arq.
Etn., 25: 105-117, 2015.
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Fig. 4. Alguns possíveis hábitos do cristal de quartzo: A. normal ou prismático; B. trigonal; C. hexagonal; D. dauphine;
F. muzo; G. tessin; H. agulha; I. cúbico ou pseudocúbico. Fonte: http://www.quartzpage.de. Acesso em 19/04/2012
Cristais de quartzo: elementos para reconhecer A análise conjunta desses elementos permi-
métodos de lascamento te identificar a orientação do lascamento, tendo
como referência o eixo cristalográfico do quart-
Os ângulos identificados como recorrentes zo. Dessa forma, há a possibilidade de mapear
são: 120o (corpo-corpo), 142o (corpo-ápice), 134o escolhas e possíveis recorrências na maneira
(ápice-ápice), 115o entre facetas não consecutivas como essa matéria-prima foi gerida.
de corpo-ápice e 86o para facetas não conse-
cutivas de ápice (fig. 5). Esses ângulos foram
medidos com um goniômetro de contato1 exata-
mente perpendicular à aresta medida. Ou seja,
o cristal, ou o fragmento de cristal que se quer
medir deve seguir seu eixo cristalográfico.
Portanto, os ângulos descritos acima
foram usados como referência para determinar
a localização da lasca no cristal, permitindo
que se definisse a direção do golpe em relação
ao núcleo ou suporte. Dessa forma, é preciso
buscar a referência sempre na relação entre o
eixo tecnológico da lasca e o eixo do cristal. Isso
é possível pela relação entre talão e face inferior
(interna) da lasca, da identificação das arestas
naturais e/ou estrias de crescimento.
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as estrias e as arestas de corpo-ápice são perpen- de lascamento transversal frontal, com ponto
diculares ao eixo tecnológico da lasca; as arestas de impacto no corpo (2); a partir daí abrem-se
de corpo e ápice-ápice coincidem com o eixo outras possibilidades, como por exemplo, a
tecnológico da lasca. retirada transversal diagonal (3); formando um
e. Lascamento oblíquo: A transição entre o ângulo favorável para lascamento transversal
lascamento longitudinal e o transversal carac- lateral (4). Após esta sequência, o primeiro nega-
teriza-se por um ângulo próximo a 45o entre o tivo formado pela remoção do ápice serve como
plano de percussão e o eixo cristalográfico. plano de percussão para uma retirada longitu-
Como ilustrado na figura 8, considerando dinal (5). O cristal então é lascado (transversal
um cristal inteiro (1), é possível realizar uma frontal) (6), formando um plano de percussão
abertura inicial com a retirada de ápice através favorável para negativos oblíquos (7).
Fig. 8. Possibilidades para o lascamento do cristal de quartzo. (1): cristal inteiro; (2):
abertura inicial com retirada do ápice por lascamento transversal frontal; (3): retirada
transversal diagonal; (4) lascamento transversal lateral; (5) retirada longitudinal; (6)
lascamento transversal frontal; (7) retiradas por lascamento oblíquo.
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Percussão sobre bigorna (PSB ou bipolar) apenas se a morfologia do corpo do cristal fosse
achatada e houvesse um recuo maior no plano
O lascamento sobre bigorna também pode de percussão, formando um talão mais largo. Na
ser analisado pela metodologia proposta neste imagem de número 3 há uma retirada que extrai
artigo. A viabilidade depende da apresentação mais massa do núcleo/suporte e que prolonga-se
da coleção: se houver peças nucleiformes com ao até quase a aresta da parte inferior do hexágono.
menos uma faceta de cristal, é possível fazer uma Na figura 4 o ângulo de percussão se aproxima
análise diacrítica dos estigmas para identificar os muito do ângulo “ideal” de 90o, sendo que extrai
gestos de lascamento e pressupor a posição do boa parte do núcleo/suporte, formando uma
núcleo/suporte em relação ao golpe recebido. abertura quase plana no hexágono.
Assim, pode-se inferir se a peça foi lascada As retiradas de lascas transversais laterais
transversal, longitudinal ou obliquamente (para são perfeitamente possíveis, mas frequente-
este último caso, ver Prous, Souza e Lima 2014: mente devem ser acompanhadas por outras
287-326). Além disso, também se podem distin- retiradas que facilitam o lascamento, como por
guir as sequências de lascamento, as preferên- exemplo uma retirada transversal diagonal (ver
cias e as ausências. fig. 8 número 4). Um ângulo de lascamento
próximo a 120o, em cristais de quartzo, não é
Lascamento transversal lateral e lascamento completamente restritivo, uma vez que vários
oblíquo hábitos e formatos de corpo facilitam este tipo
de lascamento. Isso não significa que qualquer
Alguns consideram o lascamento transver- cristal pode ser lascado por técnica transversal
sal lateral impossível, mas ele já foi reproduzido lateral, pois todo tipo de abordagem depende
inúmeras vezes em experimentos no MHN- da apresentação do núcleo/suporte e aspectos
JB-UFMG. Lascas deste tipo apresentam um como homogeneidade e linhas de fratura são
ângulo de 120o entre o talão e a face superior, fundamentais para o sucesso da retirada de
isso é possível devido à fragilidade do quartzo lascas. Além disso, o prisma hexagonal pode
e também porque, na maioria das vezes, a lasca apresentar achatamento ou alargamento em
retira completamente a faceta (fig. 9, imagens 3 áreas do corpo, sendo a morfologia também um
e 4), o que permite “vencer” um ângulo impro- aspecto importante a ser considerado.
vável. Dessa forma, o ângulo de lascamento é Uma outra questão muito importante
inferior a 120o (Isnardis e Prous, comunicação sobre o lascamento oblíquo deve ser discutida:
pessoal). quando há percussão no ápice do cristal e a
A figura 9 apresenta algumas das possibilida- única faceta existente na lasca se encontra no
des de lascamento transversal lateral. Na imagem talão (talão com faceta de cristal), a identifica-
número 2 há uma retirada improvável devido ção espacial da peça pode ser feita a partir das
ao ângulo de lascamento permanecer próximo estrias de crescimento contidas neste talão. Mas
de 120o. Nesse caso, o lascamento seria possível quando o cristal inteiro é considerado, a transi-
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ção entre corpo e ápice resulta em uma quebra Duas jazidas de cristal de quartzo foram
de angulação de 38o em relação ao corpo, o que localizadas nas proximidades do sítio arqueo-
leva inevitavelmente à associação com o lasca- lógico Bibocas II, denominadas localmente
mento oblíquo. Por isso é muito difícil afirmar como Lavra das Bibocas e Lavrinha. Estas foram
que as lascas que possuem faceta de cristal descritas como:
somente no talão têm orientação longitudinal
ou oblíqua, e é preciso cuidado ao se definir “As rochas filíticas e quartzíticas das
a orientação do lascamento, principalmente Serras do Cabral e Espinhaço encontram-se
quando a única informação disponível sobre o recortadas por numerosos veios de quartzo
eixo cristalográfico são as estrias de crescimento de origem hidrotermal, como produto de
localizadas exclusivamente no talão da lasca. preenchimento de falhas e fraturas. Tam-
Outra dificuldade sobre a identificação do bém ocorrem, em menor escala, veios de
lascamento oblíquo diz respeito ao ângulo de quartzo atravessando sequências pelíticas da
lascamento, ou seja, aquele formado entre o Formação Paraopeba e Grupo Macaúbas.”
talão e a face inferior da lasca. Se ele se apresen- (Engecorps 2005: 219).
tar próximo a 135o o lascamento provavelmente
é oblíquo, e isto se explica pela posição do A Nota Explicativa da Folha Jequitaí
eixo tecnológico da lasca (sempre num plano (SE.23-X-C-II)1:100.000 caracteriza as jazidas de
tridimensional) em relação ao eixo cristalográ- cristal desta região como:
fico. Porém nem sempre uma retirada oblíqua
gera um ângulo de lascamento próximo a 135o, “Os depósitos de quartzo se associam
e esta medida deve ser utilizada apenas como a filões hidrotermais, com no máximo 5 m
mais um elemento para identificação. de espessura e provavelmente relacionados
à Orogenia Brasiliana, cortando rochas me-
tapelíticas dos supergrupos Espinhaço e São
Jazidas e o garimpo de cristal: aspectos para a Francisco.” (Chaves e Benitez 2007: 34).
contextualização dos sítios arqueológicos
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Os cristais de quartzo destas jazidas são quartzo amorfo para utilização em indústrias e
explorados comercialmente em Jequitaí e sua construção civil.
extração é feita de forma manual (marretas, pica- Outra característica importante nestas
retas, pás, alavancas e marrão). Geralmente são jazidas de “custelão” são as “ilhas” de cristal
abertos no sedimento buracos de até 4 metros lascado (acumulações detríticas), geralmente
de diâmetro, passando pela rocha até chegar ao localizadas em áreas de sombra. Nestes locais há
veio, ou, em outros casos, são feitos cortes no uma enorme quantidade de lascas e fragmentos
perfil que podem chegar a mais de 10m de altura de cristais de todos os tipos, cores e tamanhos.
(fig.10). Quando isto ocorre os garimpeiros se- É onde os garimpeiros “limpam” os cristais
guem a linha do filão e extraem o que chamam para agregar valor às peças, ou seja, retiram os
de “custelão”. Este tipo de extração gera pilhas cristais do “custelão” ou retiram partes de sílica
de sedimento e rejeito, este último composto ba- amorfa para vender o “custelão” inteiro. Nesta
sicamente por quartzo esbranquiçado e amorfo atividade, que pode ser exercida nestas “ilhas”
(localmente chamado de “quartzito”), e também de cristais lascados ou em qualquer outra área
por cristais com muitas intrusões e por pedaços (o sítio arqueológico Bibocas II foi um local
que não possuem valor agregado. utilizado pelos garimpeiros para lascar cristal)
Este “quartzito” é a fonte de sílica que são usados como percutores o “coqueirinho”
proporcionou a formação/crescimento de e/ou um pedaço de vergalhão de aproximada-
cristais em meio aquoso nas fendas, sendo o mente 30 cm de comprimento (fig. 11), dobrado
revestimento característico em que os cristais se em uma das pontas. Ambos são utilizados para
formam. É uma rocha silicosa amorfa e acinzen- retirar lascas com maior precisão. Este trabalho
tada e/ou esbranquiçada, com fissuras que não pode ser realizado por mulheres e crianças,
interessam ao mercado atual embora os garim- sendo que a extração do “custelão” é exercida,
peiros relatem que já houve comércio para este quase sempre, pelos homens.
Fig 11. Jazida de quartzo das Bibocas (em atividade). Os garimpeiros fizeram um corte
no barranco para seguir o filão hidrotermal. Formam-se pilhas de rejeito com sedimento
e quartzo sem valor agregado. Isso é chamado localmente de garimpo de “custelão”, em
referência ao quartzo amorfo com cristais entremeados.
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Os garimpeiros de “custelão” fazem uma se- Conhecer este tipo de garimpo é de grande
paração entre o que é quartzo e o que é cristal. importância, pois a extração e o lascamento de
O primeiro é o quartzo leitoso, o segundo é o quartzo permanecem até hoje como atividade
cristal hialino e pode variar em tipos mais ou importante para as pessoas que moram na re-
menos valiosos. O cristal de “cabelo” (rutilado) gião de Jequitaí. Além disso, o garimpo interage
é o mais caro chegando a ser vendido por até 50 diretamente na conservação de sítios pré-his-
reais o quilo. Outro muito procurado, porém tóricos, pois pode sobrepor e/ou misturar o
mais raro, é o cristal “mofado”, este apresenta material lítico, devido à grande possibilidade de
uma intrusão verde. Existem também os cristais compartilhamento dos mesmos espaços e jazidas
de hábito do tipo Muzo e Tessim (cuja deno- de quartzo.
minação local não foi registrada) que apresen- Dessa forma, o conhecimento das técnicas
tam estrias de crescimento muito marcadas e da localização dos garimpos atuais pode ajudar
e protuberantes, além do “lobisomem” (com a encontrar novos sítios arqueológicos pré-histó-
facetas escuras e ásperas, mas muito hialino por ricos e contribuir para o conhecimento das for-
dentro, ideal para lapidar). Todas essas intrusões mas de exploração e gestão desta matéria-prima.
minerais ou morfologias específicas são carac- Através deste estudo é possível levantar mais
terísticas que aumentam consideravelmente o dados e expandir as discussões sobre tecnologia
valor de venda das peças. lítica e gestão de matérias-primas, assim como
Todos estes tipos são mais caros, mas po- uso e ocupação da paisagem.
dem variar de preço dependendo do tamanho,
formato e a forma como estão arranjados no
“custelão”. O cristal hialino fragmentado, sem Comparação entre os sítios arqueológicos
qualquer característica que o torne especial, cus- Bibocas II e Santana do Riacho
ta em média 10 reais o quilo. Antigamente os
cristais eram vendidos para indústrias eletrônica As análises da escavação central do sítio
e siderúrgica, mas atualmente os principais com- arqueológico Bibocas II possibilitaram a identi-
pradores são os intermediários que adquirem o ficação de várias abordagens de lascamento do
quartzo por valores muito baixos na mão dos ga- quartzo, o que demonstra uma grande varieda-
rimpeiros e revendem para serem lapidados em de de escolhas. Portanto não há uma recorrên-
joalherias e/ou lojas de esoterismo e decoração. cia ou repetição no lascamento do cristal, mas
Durante as campanhas de campo em o que é típico desta indústria em específico é a
Jequitaí, foi coletado quartzo lascado das áreas diversidade de formas de lascamento. Esta carac-
de garimpo. Este material está sendo analisado terística diverge das publicações sobre o cristal
em trabalhos de monografia de estudantes de de quartzo do abrigo de Santana do Riacho
graduação do curso de Antropologia da UFMG (Prous 1991: 229-274), localizado no município
e também foi alvo de um artigo (Rodet et al homônimo, no estado de MG.
2014). A. Prous (1991) descreve as indústrias sobre
No sítio arqueológico Bibocas II são raras cristal de quartzo de Santana do Riacho como
as peças em quartzo leitoso, no entanto, este sendo majoritariamente lascadas por PSB (per-
material é o mais abundante nas jazidas de cussão sobre bigorna, também conhecida como
quartzo da região. É possível encontrar alguns lascamento bipolar), para o autor isso acarreta
cristais dispersos em superfície, mas em geral, é num melhor aproveitamento de cristais devido
necessário cavar buracos e quebrar rochas para ao tamanho e morfologia destes. Esta técnica
extração do cristal hialino. Isso indica uma clara tende a produzir os mesmos tipos de produtos
escolha dos grupos pré-históricos que ocupa- e na mesma proporção, enquanto na debita-
ram o abrigo (Bassi, 2012). Este conhecimento gem por percussão direta dura (PDD, também
da gestão do quartzo, seja ele sob a forma de conhecida como unipolar) a morfologia do
cristais ou não, é fundamental para se pensar o cristal limitaria as possibilidades de abordagem.
contexto arqueológico. Segundo Prous, a dificuldade de debitagem
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lateral leva a iniciar o lascamento pelo ápice ou Por fim, a escavação central do sítio arqueo-
raiz, criando lascas com gume de faceta sem a lógico Bibocas II apresenta uma ampla variação
necessidade de “descorticar” a peça. Outra ca- das cinco formas elementares do lascamento
racterística importante é a raridade dos cristais de cristal, no entanto, não há neste momento,
ou seixos maiores que 5cm no sítio. nenhuma indicação quantitativa ou qualitativa
São descritos quatro processos de lasca- que indique sistematização ou métodos de las-
mento baseados na análise de lascas e núcleos camento nesta matéria-prima. O que se sabe é
(nuclei) em Santana do Riacho: os nuclei semi que todas as possibilidades de lascamento estão
piramidais, resultado de quando o lascamen- presentes de forma aparentemente aleatória na
to se inicia pelo ápice ou pela raiz; os cristais estratigrafia. Isto não significa que não existam
grandes (raros), retira-se uma faceta lateral e métodos sistemáticos por trás da gestão tecno-
posteriormente são retiradas lascas (laterais) lógica dos cristais, mas que ainda não temos
transversais; o lascamento a partir de ambas as dados suficientes para afirmar tal proposição.
extremidades, com dois planos de percussão
opostos; e por fim os núcleos poliédricos, com
mais de dois ângulos de percussão, caracterizan- Considerações finais
do os blocos residuais de debitagem bipolar. Há,
também, as lascas com dorso cortical indicando A recorrência natural de ângulos entre
uma debitagem transversal (frontal e/ou diago- as facetas do cristal permite, em alguns casos,
nal) em gomos ou fatias, sendo raros os nuclei identificar imediatamente a posição da lasca no
correspondentes a esta abordagem. suporte original e mapear algumas das formas
As formas de lascamento do cristal identi- como o quartzo foi lascado e, quando possível,
ficadas em Santana do Riacho são mais asso- os métodos mais recorrentes. A análise desses
ciadas à PSB (bipolar), sendo a PDD menos ângulos constantes entre as facetas dos cristais
recorrente no sítio, dessa forma não há explo- pode ensejar novas interpretações sobre a gestão
ração recorrente das cinco formas elementares humana do quartzo em sítios arqueológicos.
do lascamento do cristal presente no abrigo Na prática, é difícil medir os ângulos,
Bibocas II. Em Jequitaí ocorre o contrário, a ainda mais numa coleção de pequenas lascas,
PDD é predominante, principalmente nos ní- o que dificulta a aplicação dos procedimentos
veis mais antigos (VI e V inferior), isso permite necessários para chegar a uma medida exata
uma ampla variação da utilização da morfologia proposta pela cristalografia. Nem sempre é
dos cristais, demonstrando que o que foi con- possível medir satisfatoriamente os ângulos,
siderado impraticável em Santana do Riacho pois algumas lascas apresentam facetas corres-
acontece com frequência em Jequitaí. Ou seja, pondentes muito pequenas, devido ao processo
há lascamento lateral com talões de faceta de de lascamento. Na coleção do sítio Bibocas II,
cristal e outras formas muito variáveis de apro- casos assim foram descritos, mas excluídos das
veitamento desta matéria-prima. Portanto, não sínteses qualitativas e separados para possíveis
acreditamos que a morfologia do cristal limita referências.
as possibilidades de abordagem, muito pelo Essa metodologia de análise pode ser
contrário, ela as amplia e permite conjugar com aplicada a qualquer coleção arqueológica que
muita eficiência as cinco formas elementares apresente cristais com facetas, de modo que é
do lascamento de cristal, podendo ser infinita- possível identificar as escolhas mais recorrentes
mente aproveitadas, criando planos e superfícies no lascamento do cristal e fazer um levantamen-
de percussão, transformando as morfologias e to estatístico das preferências.
ângulos dos núcleos ou suportes. Na arqueologia, os ângulos recorrentes
O que antes era considerado limitador, em cristais não devem ser interpretados como
agora deve ser visto como novas possibilidades, dados inequívocos, mas como instrumentos
que vão muito além de ângulos considerados auxiliares para descrever tendências ou mé-
“ruins” para lascar. todos de lascamento. Como os suportes do
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BASSI, L.F. Methodology for technological analysis in quartz crystals. R. Museu Arq.
Etn., 25: 105-117, 2015.
Abstract: This article covers a topic discussed in the master’s thesis (Basssi,
2012) on technological analysis of the quartz crystal, from the archaeological
site Bibocas II in Jequitaí MG. Through the analysis of the axes in the natural
crystal facets is possible to identify important elements on the knapping process.
Thus, the technologic analysis of the collection by the proposed approach allows
identification of the location of the core / blank, in addition to the description
of possible knapping methods.
Referências Bibliográficas
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