Aula de Inglês. Luciano Amaral Oliveira.

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formação de professores de inglês é um processo complexo.
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indivíduo for brasileiro, as coisas ficam ainda mais complicadas
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"em um trabalho eficiente na formação de professores.'

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com o objetivo de ajudar a preencher êssa lacuna ~a formaçã~. dos li-
-nciados em inglês e também de suprir a falta de materiais qu~abor-
'111teoria e prática e auxiliem o professor a cumprir com o objetivo de
ixinnr com qualidade seus alunos que vem a lume este Aula de inglês:
) planejamento à avaliação. Porque formar-se professor exige domínio
IS arcas abordadas em cada um dos capítulos deste livro e domínio da
IgU<l inglesa. Mais importante: exige do professor a humildade de reco-
u-ccr que não sabe tudo e a disposição para estar sempre aprendendo.
do planejamento à avaliação
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LUCIANO AMARAL OLIVE1RA

EDITOR:
Marcos Marcionilo

CONSELHO EDITORIAL:
Ana Stahl Zilles [Unisinos]
Angela Paiva Dionisio [UFPE]
Carlos Alberto Faraco [UFPR]
Egon de Oliveira Rangel [PUC-SP]
Gilvan Müller de Oliveira [UFSC, Ipol]
Henrique Monteagudo [Universidade de Santiago de Compostela]
Kanavillil Rajagopalan [UNICAMP]
Marcos Bagno [UnB]
Maria Marta Pereira Scherre rUFES] o planejamentoà avaliação
Rachei Gazolla de Andrade [PUC-SP]
Roberto Mulinacci [Universidade de Bolonha]
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Roxane Rojo [UNICAMP]
Salma Tannus Muchail [PUC-SP]
Slrio Possenti [UNICAMP]
Stella Maris Bortoni-Ricardo [UnB]
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'rAbO
Direção: ANDR~IA
CUSTÓDIO
Capa e diagramação: TElMACUSTÓDIO
Revisão: KARINA
MOTA
Imagem da capa: 123RF.COM

CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO NA FONTE


SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ

051A

Oliveira, Luciano Amaral


Aula de inglês: do planejamento à avaliação / Luciano Amaral Oliveira. - 1.
ed. - São Paulo: Parábola Editorial, 2015.
23 cm. (Aula de ... ; 2)

Inclui bibliografia e Indice


ISBN 978-85-7934-106-9

1. Lingua inglesa - Estudo e ensino. 2. Linguagem e línguas. 3. Linguagem


e Ilnguas - Estudo e ensino. I. Titulo. 11. Série.

15-24065 (DO: 372.6521


(OU: 373.3.016=111

Para

Direitos reservados à
PARABOLA EDITORIAL
Rua Dr. Mário Vicente, 394 -Ipiranga Ivone
04270-000 São Paulo, SP
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zida ou transmitida por qualquer forma e/ou quaisquer meios (eletrônico ou Luciana
mecânico, 'incluindo fotocópia e gravação) ou arquivada em qualquer sistema
ou banco de dados sem permissão por escrito da Parábola Editorial lida.

ISBN: 978-85-7934-106-9

e do texto: Luciano Amaral Oliveira, 2015


e da edição: Parábola Editorial, São Paulo, agosto de 2015
Sumário
Introdução 9

1 A logística da aula 17
1.1 O planejamento da aula .19
1.2 O gerenciamento da sala de aula 30

2 Sobre o ensino das quatro habilidades 45


2.1 Pequena confusão conceitual:
estratégias ou habilidades? .48
2.2 Conhecimentos necessários para o
desenvolvimento das quatro habilidades 55
2.3 Esquemas mentais e os processos de
decodifieação da informação 61
2.4 A integração das habilidades 68

3 O ensino da compreensão oral 75


3.1 O papel das atividades de
pré-compreensão oral 77
3.2 Micro-habilidades de compreensão oral 83
3.3 Recursos tecnológícos e o ensino da
compreensão oral 93

4 O ensino da leitura 97
4.1 A coerência textual 100
4.2 O papel das atividades de pré-leitura 105
4.3 Miero-habilidades de leitura 110

Sumário 7
4.4 'I'r0s controvérsias:a leitura em voz alta, o uso de textos
autênticos e o uso de textos literários 122

5 O ensino da fala 131


5.1 Três questões importantes: barreiras psicológicas,
leitura em voz alta e fluência vs. precisão 132
5.2 O papel das atividades de pré-fala
5.3 Micro-habilidades de fala
137
139 Introdução
6 O ensino da escrita 149
6.1 Os elementos de textualidade 155
6.2 O papel das atividades de pré-escrita 166
6.3 Micro-habilidades de escrita 169 nsinar inglês para brasileiros é uma tarefa
6.4 Escrita colaborativa e correção dos textos escritos: complexa. Requer conhecimentos linguísticos,
questões polêmicas 184 pedagógicos e didáticos. Mas, acima de tudo,
requer conhecimentos específicos sobre o ensino de
7 O ensino do vocabulário 191
línguas estrangeiras. Às vezes, o professor de inglês
7.1 Formas de ensino do significado lexical... 193
procura algo para ler sobre gerenciamento da sala de
7.2 O que é necessário para conhecer uma palavra? 196
aula ou sobre o ensino da gramática ou sobre qualquer
7.3 Fenômenos semânticos e organização do vocabulário 200
outro tema relacionado ao ensino de inglês e acaba
8 O ensino da gramática 205 esbarrando na falta de acesso a livros por conta dos
8.1 The pie chart: a concepção tridimensional da gramática 209 seus altos preços (em quase sua totalidade, os livros
8.2 O problema do conhecimento inerte e a interlíngua na sobre ensino e aprendizagem de inglês são importa-
discussão sobre os erros dos aprendizes 222 dos da Europa ou da América do Norte). Além disso,
8.3 Duas questões importantes: o uso de português eles enfrentam dificuldades para terem acesso a pe-
e o domínio da metalinguagem 229 riódicos como ET ProfessionaL, ELTJournal e TESOL
QuarterLy, que também não são baratos.
9 Avaliação do aprendizado e do ensino 235 Para facilitar o acesso de professores de inglês,
9.1 Princípios gerais para a elaboração de testes 238 formados e em formação, a questões práticas e teó-
9.2 Os tipos de testes 245 ricas relacionadas ao ensino da língua inglesa, decidi
9.3 Duas questões importantes: a mistura de habilidades escrever este Aula de inglês: do planejamento à ava-
e o efeito washback 250 liação. Meu desejo é compartilhar com leitoras e leito-
9.4 A avaliação do ensino: a observação de aulas 255 res informações que angariei e reflexões que realizei
ao longo de 25 anos de ensino de inglês. Desejo con-
Conclusão 261
tribuir para a formação de professores de inglês que,
Referências bibliográficas 265 como eu, tiveram sentimentos misturados e intensos,
expectativas grandes, frustrações não menores.

Aula de inglês: do planejamento à avaliação


Intro!iuçno 9
1\primciru aula de inglês que nós damos nunca sai de nossa ca- .llIll'Sde entrar em sala. Afinal, no momento de planejá-Ia, ele precisa
Iwça. Tensão, ansiedade, nervosismo e insegurança costumam mar- pensar sobre elementos como a faixa ctária e o nível de proficiência de
cur essa experiência. São sensações normais do início de uma car- seus alunos, os materiais didáticos e os recursos que tem à disposição
rei ra que se repetem menos intensamente a cada início de semestre, (' o espaço físico em que a aula será realizada. Obviamente, eu não po-
a cada nova turma, a cada nova instituição na qual o professor inicie deria deixar de comentar sobre os elementos que compõem o plano
um novo trabalho. Mas essas sensações podem ser minimizadas se o de aula, que não se confunde com o planejamento da aula. O segundo
professor tiver acesso a leituras que apontem caminhos, que sugiram aspecto é o gerenciamento da sala de aula, essencial para o controle
ursos de ação. Isso ajuda a diminuir as tensões e os riscos de que do professor sobre o ambiente físico e afetivo em que a aula se rea-
algo dê errado na aula. Iiza. Discuto os principais elementos que compõem o gerenciamento
Mesmo após o início da carreira, o professor de inglês pode con- da sala de aula: o espaço físico, o agrupamento dos alunos, o estabe-
tinuar a ter muitas dúvidas por conta de uma formação inadequada. E lecimento de regras de comportamento, a fala do professor, o uso de
isso é uma prova cabal de que apenas a experiência de sala de aula da português durante a aula, as instruções que o professor fornece aos
graduação ou dos cursos de treinamento de professores de institutos alunos e o monitoramento das atividades.
de idiomas não é suficiente para sanar nossas dúvidas e nos levar a O segundo capítulo, "Sobre o ensino das quatro habilidades",
soluções para os problemas com que nos deparamos na labuta pedagó- discute duas questões importantes sobre a natureza da compreen-
gica. Precisamos de interlocutores, e eu tive muitos ao longo de minha são oral, da leitura, da fala e da escrita. A primeira questão diz res-
arreira de professor de inglês: alunos, colegas, palestrantes, livros e peito à suposta existência de habilidades passivas e ativas. A segun-
artigos. São vozes que atravessam e constituem a minha voz, que colo- da questão, estreitamente relacionada com a primeira, é a equipara-
co nestas páginas em diálogo com você. ção que algumas pessoas fazem entre os modificadores receptiva e
Foi pensando na necessidade dessa interlocução que decidi escre- passiva quando tratam da compreensão oral e da leitura. Inevitavel-
ver este livro para quem já leciona inglês, para quem pretende começar mente, os conceitos de habilidade e de estratégia são contrastados
a lecionar inglês e para quem ministra cursos de formação de profes- para adotarmos uma definição operacional de habilidade, pois os
sores. Dividido em 9 capítulos, ele contém informações e aponta cami- termos skill, ability e strategy podem confundir a cabeça do profes-
nhos que podem ser úteis para a prática docente. A linguagem que uso sor. Abordo ainda a tipologia dos conhecimentos necessários para o
aqui é simples e amigável. Há conceitos que uso, como, por exemplo, desenvolvimento da fala, da escrita, da compreensão oral e da lei-
ompetência comunicativa, i +1, realia, input, abismo de informações e tura. Mostro que os conhecimentos linguísticos não são suficientes
behaviorismo, mas que não defino, por já ter feito isso no livro Métodos para o desenvolvimento das quatro habilidades: os aprendizes pre-
de ensino de inglês: teorias, práticas, ideologias, publicado pela Pará- cisam também de dois outros tipos de conhecimentos. É claro que
bola Editorial, cuja leitura recomendo, caso você sinta necessidade de os esquemas mentais e os processos de decodificação da informa-
revisitar ou de se familiarizar com esses e outros conceitos essenciais ção não poderiam ficar de fora deste capítulo, que trata também da
para a discussão sobre o ensino e a aprendizagem de inglês e com os questão da integração das habilidades.
métodos de ensino. A compreensão oral é a habilidade que mais desafios apresenta
O capítulo que abre este livro é "Alogística da aula", que trata de para os aprendizes brasileiros. Por isso, o capítulo 3, "O ensino da
dois aspectos importantes para o ensino de inglês. O primeiro, o pla- compreensão oral", apresenta informações e provocações que objcti
ncjarnento da aula, mostra ao professor que seu trabalho começa bem vam ajudar o professor no planejamento das suas aulas voltadas para

10 1\1110de Inglês: do planejamento à avaliação IlllrOlhJl;nll II


o dcsenvolvímento dessa habilidade. Discuto o papel que as atividades essa p('rgul\la con ctamcntc é essencial para o ensino ela cscrltu. 1':111
de pré-compreensão oral desempenham na realização das atividades s('guida, mostro a importância de o professor orientar seus alunos a
de compreensão oral. Apresento e comento quatro micro-habilidades levarem em consideração os elementos de textualidade na produção
de compreensão oral: a busca por informações específicas, o reco- de seus textos. Tradicionalmente, os professores costumam falar so-
nhecimento de palavras, a busca por ideias gerais e a inferenciação. bre a coerência textual e a coesão textual, mas é importante também
Finalizo o capítulo abordando uma questão premente nos tempos de onsiderarem os elementos pragmáticos de textualidade, i.e. a inten-
hoje: o uso dos recursos tecnológicos no ensino da compreensão oral. ionalidade, a aceitabilidade, a situacionalidade, a informatividade e a
Se a compreensão oral é a habilidade que mais desafios apresenta intertextualidade. Depois disso, discuto o papel das atividades de pré-
aos aprendizes brasileiros, a leitura é a que menos desafios apresen- -escrita e oito micro-habilidades de escrita: o uso correto das conven-
ta. Mas isso não significa dizer que tornar-se um leitor eficiente seja ções ortográficas e da pontuação, a ordenação correta das palavras,
uma tarefa fácil para os aprendizes. E é para tratar dessa habilidade o uso correto das regras sintáticas, a adequação do texto ao contexto
que escrevi o quarto capítulo, "O ensino da leitura", que se inicia pro- de produção e de recepção, o uso adequado dos elementos coesivos, a
blematizando a questão da coerência textual a fim de desconstruir a estruturação interna dos parágrafos, a ordenação lógica de parágrafos
concepção imanentista segundo a qual a coerência de um texto nele se e a revisão textual.
encontra. Discuto o papel das atividades de pré-leitura tendo em men- Um elemento importante para o desenvolvimento da competên-
te a questão da coerência textual. Em seguida, apresento as principais cia comunicativa dos aprendizes é o vocabulário. Quanto mais pa-
micro-habilidades de leitura: o reconhecimento dos padrões ortográ- lavras eles conhecem, mais tendem a compreender textos falados e
ficos, a busca por informações específicas, a busca por ideias gerais escritos e menos dificuldades tendem a encontrar para falar e escre-
e a inferenciação. Inevitavelmente, trago à tona três controvérsias a ver. Por isso, no sétimo capítulo, "O ensino do vocabulário", apresento
respeito das quais o professor precisa se situar, e que giram em torno formas de ensinar o significado lexical e discuto o que é necessário
dos seguintes temas: a leitura em voz alta, o uso de textos autênticos e para conhecer uma palavra. Abordo também alguns fenômenos se-
o uso de textos literários. mânticos importantes para o ensino de vocabulário e comento a im-
Outra habilidade que apresenta muitos desafios para os aprendi- portância de o professor orientar seus alunos quanto à organização
es brasileiros é a fala. Muitos deles comentam sua dificuldade de se do vocabulário a que são expostos.
tornarem fluentes. Mas, por que isso acontece? Existem barreiras psi- Inicio o oitavo capítulo, "O ensino da gramática", discutindo a na-
cológicas que interferem nesse desenvolvimento? Ler textos em voz tureza tridimensional da gramática a partir de uma proposta teórica
alta significa a mesma coisa que falar? E o que é mais importante: falar de Marianne Ce1ce-Murcia e Diane Larsen-Freeman: the pie chart. E
com fluência ou com precisão gramatical? Essas questões são tratadas como muitos professores ficam angustiados com alunos que não con-
no quinto capítulo, "O ensino da fala", no qual discuto o papel das ati- seguem, por exemplo, colocar o S nas formas verbais na 3a pessoa
vidades de pré-fala e apresento cinco micro-habilidades: a produção singular do simpLe present depois de muitas horas e até semestres de
inteligível dos sons, o uso apropriado dos elementos gramaticais e do aulas, trago à baila o problema do conhecimento inerte e articulo o
vocabulário, o uso apropriado dos registros, a realização das funções conceito de interlíngua com a discussão sobre os erros dos aprendizes.
comunicativas e o uso de estratégias de comunicação. Finalizo o capítulo discutindo duas questões sobre as quais o professor
"O ensino da escrita" é o sexto capítulo, que inicio discutindo a precisa refletir: o uso do português no ensino da gramática e a neccs
natureza da escrita: ela é um produto ou um processo? Responder a sidade de os alunos dominarem a metalinguagem.

Alllo cio ,"gIOs' do planojamento à avaliação Inlrodllçnu 1 :1


segundo esclarecimento diz respeito ao perfil deste livro: pe
o último capftulo se intitula "Avaliação do aprendizado e do en-
dagógico. Isso implica o [ato de cu não me ater a detalhes técnicos
sino". Apresento os princípios gerais de elaboração de testes e os ti-
sobre, por exemplo, a gramática da língua inglesa ou a elaboração de
pos de testes mais comumente utilizados no universo do ensino e da
testes de proficiência. Afinal, a ideia aqui não é discutir a gramática,
aprendizagem de inglês. Discuto a questão da mistura de habilidades e
mas, sim, discutir o ensino da gramática. A ideia aqui não é discutir os
o efeito washback que os testes exercem sobre a prática docente. Ob-
detalhes envolvidos na elaboração de testes, mas, sim, apresentar in-
viamcnte, eu não poderia deixar de tratar de uma questão fundamen-
formações relevantes sobre os testes que possam levar você a refletir
tal para a formação do professor: a observação das suas aulas.
sobre a maneira como avalia seus alunos. Enfim, a ideia de cada capí-
ostaria de fazer dois esclarecimentos aqui. O primeiro diz
tulo é discutir determinados assuntos do ponto de vista da formação
respeito à palavra formação. Já ouvi duas professoras universitárias
do professor, e não do ponto de vista técnico das diferentes áreas de
crit icarem esse termo, alegando que formar significa dar forma a
"Igo, moldar. Ou seja, a palavra formação teria um ranço behavioris- estudo da linguística.
Espero que este Aula de inglês: do planejamento à avaliação seja
Ia. Contudo, no meu entendimento, o ranço behaviorista se encon-
rrn nessa maneira de pensar, na crença de que alguém pode formar útil para você.
LUCIANO AMARAL OLIVEIRA
o professor. Não compartilho dessa crença. É o próprio professor Salvador, agosto de 2015.
quem se forma a partir dos cursos dos quais participa, das leituras
que faz, das conversas que tem com outros professores, das pales-
tras que ouve. Em inglês, usa-se o termo teacher training para falar
do início do processo de formação e o termo teacher deueíopment
pa ra se referir à continuação da formação do professor. Acho que
"treinamento de professores" e "desenvolvimento do professor" soam
.squísito, assim como soa estranho "educação do professor". Talvez
"desenvolvimento profissional do professor" seja uma tradução mais
adequada, mas seu uso não está consagrado na área de ensino de
inglês. Por isso, defendo o uso da palavra formação tendo em mente
que a formação do professor é um processo que o próprio professor
.ngendra, geralmente auxiliado por leituras, cursos e outros profes-
sores, que podem tranquilamente ser chamados de "formadores" a
partir da perspectiva que adoto aqui. Mas esse auxílio não passa dis-
so: um auxílio. Os méritos que um professor tem por sua formação
são dele. Um grupo de professores pode participar de um mesmo
'urso de formação, mas nem todos eles tomam a iniciativa de lerem
livros e artigos, de participarem em eventos, de refletirem sobre o
processo de ensino e de aprendizagem. Resultado: nem todos eles
se Lornam professores tão bem preparados quanto os que tomam as
récícas do processo da sua formação.

lntrcduçãn 1~)
14 fluiu clu II1gl0s: do planejamento à avaliação
A logística da aula
nício
do semestre letivo: novas turmas, novos alu-

I nos, talvez até uma escola nova. E aí está você com


a incumbência de dar uma aula de inglês, uma de
muitas aulas que virão. Você está ansioso, talvez até
inseguro, por uma ou mais das seguintes razões:
(1) nunca lecionou antes;
(2) nunca lecionou para o nível que irá lecionar
agora;
(3) será a primeira vez que usará o livro didático
agora adotado;
(4) já está cansado de fazer as mesmas coisas no
nível que lecionará novamente e deseja fazer
coisas diferentes nas aulas.
O que fazer? Por onde começar?
É pela logística que devemos começar o ato de
ensinar, o que significa que nossa aula começa a to-
mar contornos antes mesmo de entrarmos em sala de
aula. Isso parece óbvio, não é? Infelizmente algo só é
óbvio para quem afirma que algo é óbvio. E a conse-
quência disso é que ainda há professores que, por ra-
zões diferentes, não dão à logística da aula de inglês a
devida importância.
Ah, definamos logística: conjunto de "arran-
jos necessários para organizar algo com sucesso,
especialmente algo que envolva muitas pessoas ou

CAPiTULO 1 I A loglstica do oulu


cquipamcntos'", g verdade que nem sempre há muitos alunos na sala 1.1 O planejamento da aula
ele aula ou muitos equipamentos com os quais o professor tenha de
lidar (embora, no fim das contas, o sentido de muitos seja bastante re- Você já assistiu a uma aula em que teve a sensação de que o pro-
lativo), mas a ideia da logística se aplica perfeitamente no caso da aula fessor não tinha uma ideia clara do que estava fazendo? Uma aula em
de inglês. E por que se aplica? É necessário fazer arranjos para que a que ele parecia estar (ou claramente estava!) improvisando? Se já assis-
aula dê certo? Sim. É muito necessário! tiu, bem-vindo ao clube! Se não assistiu, observe estes dois casos para
Contrariamente ao que os behavioristas de plantão defendem, que você possa ter uma ideia do que é uma aula não planejada.
o aprendizado não é linear. Não se aprende uma coisa de cada vez, Primeiro caso: um professor de geografia de um curso de gradua-
sequencialmente: o aprendizado é um fenômeno caótico no sentido ção em turismo entra na sala e diz: "Boa tarde, pessoal. O que temos
de não seguir uma linha reta. O professor não simplesmente ensina para hoje? Vamos discutir que texto?" Uma aluna, embora desconfiada,
e os alunos aprendem ou não aprendem (e deixam o professor in- achando que é uma pegadinha, reage: "Como assim, professor? Hoje é
dignado por não terem aprendido). Isso simplesmente não funciona prova". O professor fica meio surpreso: "Prova?" Ele também acha que
assim. O binômio ensino-aprendizagem é mais complexo do que as é uma pegadinha da aluna, mas não é. Então, ele diz aos alunos para
mentes behavioristas vislumbram. No que diz respeito à aprendi- retirarem uma folha do caderno e copiarem as perguntas que irá es-
agem de inglês, vale observarmos o seguinte comentário de Rod crever no quadro. Aquela seria a prova.
Ellis (1991: 4), o qual resume essa não linearidade do aprendizado de Segundo caso: uma professora de literatura de um programa de
forma bem simples: "A aquisição de L2 não é um fenômeno uniforme pós-graduação diz a seus alunos para pegarem o texto que havia de-
e previsfvel'". signado como material de leitura: irá discuti-lo com eles. Ela, então,
Entretanto, o fato de o aprendizado ser um fenômeno caótico e, começa a ler o texto em voz alta e a comentar os trechos lidos. De
por isso, imprevisível não implica que o ensino seja um ato caótico. Pelo repente, ela lê um trecho e diz: "Essa parte a gente pula porque está
contrário, o ensino deve ser sistematizado, deve ser pensado: o profes- complexa". Uma aluna argumenta que, exatamente por ser complexa
sor precisa ter um objetivo claro em sua cabeça no que diz respeito ao aquela passagem, eles deveriam discuti-Ia. A professora não se abala,
aprendizado caótico dos seus alunos e escolher a maneira mais eficaz e diz que não é para discutir aquela parte e continua a discussão do tex-
os recursos mais adequados para atingir esse objetivo; precisa de uma to pulando outras passagens que considera complexas.
logística. Em suma, o professor deve planejar suas aulas e gerenciar a O que esta professora e aquele professor mostram ter em comum
sala de aula de acordo com o planejado, pois as decisões e os atos que nessas duas situações específicas (além da tremenda cara de pau)? A
constituem o ensino não são caóticos nem imprevisíveis. falta de PLANEJAMENTO. Ele não se lembrava de ter marcado uma
O planejamento da aula e o gerenciamento da sala de aula prova, não a preparou e acabou improvisando uma na hora da aula. Ela
constituem-se em conjuntos de ações essenciais para o ensino. nitidamente não fez a leitura do texto com a antecedência necessária,
Debrucemo-nos, portanto, sobre esses dois elementos da logística uma antecedência mínima que lhe permitisse se preparar para escla-
da aula para entender sua importância e nos familiarizar com seus recer os trechos complexos do texto, e acabou recusando-se a discutir
elementos constitutivos. determinados trechos que poderiam ter sido muito importantes para
as reflexões dos alunos.
Retirei essa definição do www.onelook.com, um site muito legal que oferece vários O planejamento é essencial para o ensino que se deseje bem-su-
dicionários online. Considero esse site uma mão na roda e o recomendo para você. cedido, independentemente de se tratar de ensino de línguas ou de
2 Assim como Rod Ellis, não faço distinção entre aprendizagem e aquisição. Esclareço
minha posição a esse respeito no quarto capítulo de Métodos de ensino de inglês: teorias, outras áreas de conhecimento. Ninguém, em sã consciência, tentará
práticas, ideologias (Oliveira, 2014). rebater essa afirmação. Por mais relapso que um professor seja, el

18 Aula de inglês: do planejamento à avaliação CAPiTULO 1 I A logística da aula 19


sabe disso. Basta observarmos determinados professores de inglês, 15 lidar com essas características, principalmente no que diz respeito à
minutos antes da aula, desesperadamente lendo a unidade do livro di- motivação dos alunos que vão às aulas porque são obrigados ou que já
dático que será o foco naquele dia para, pelo menos, terem uma ideia chegam às aulas cansados por virem diretamente do trabalho.
mínima do que vão fazer ao entrar em sala. Nesse caso, o que tais pro- Considerar a faixa etária dos alunos é importante para a toma-
fessores geralmente fazem é seguir o livro didático à risca, atividade da de decisão sobre que tipos de materiais levar ou não para a sala,
após atividade. É a aula que chamamos de bookish. sobre que temas abordar ou não em aula, sobre quais atividades do
Nossa capacidade de planejar aulas está diretamente relaciona- livro didático realizar ou não e em que sequência. Daí a necessidade de
da à nossa experiência. Quanto mais experiente somos, menos tempo o professor estar, sempre que possível, garimpando revistas, jornais,
levamos para planejá-Ias. Tessa Woodward (2001: 3) comenta a dificul- sites e livros de atividades em busca de materiais que possam comple-
dade que tinha para planejar aulas no início da carreira: "Eu me lembro mentar (ou até substituir) o que o livro didático oferece. O resultado
de quando comecei no meu primeiro emprego de professora. Eu cos- dessa garimpagem pode ser a criação de bancos de imagens, músicas
tumava gastar a noite inteira planejando as aulas para o dia seguinte". e reaLia para o professor ter à sua disposição na hora do planejamen-
Hoje Woodward leva muito menos tempo planejando aulas exatamente to e na hora da aula. Se você puder, crie seus próprios bancos desses
por já ter planejado muitas. Ela entende por planejamento os atos de: elementos, pois isso ampliará muito as possibilidades de planejamento
de suas aulas.
[...] levar em consideração os alunos; pensar no conteúdo, nos materiais e
Neste ponto, preciso fazer um alerta sobre um mito que circunda
nas atividades que podem fazer parte do curso ou da lição e colocar isso
o uso de materiais extras. Há professores que são o que podemos cha-
no papel; refletir com calma; recortar coisas de revistas; e fazer qualquer
mar de materiaL-oriented teachers, que acreditam numa suposta má-
outra coisa que você sinta que o ajudará a ensinar bem e seus alunos a
xima segundo a qual quanto mais materiais extras levarem para a sala,
aprenderem muito, i.e., assegurar que nossas aulas e cursos sejam bons.
melhores serão suas aulas. São professores que ficam muito atentos
Eu não entendo planejamento como a redação de páginas de anotações
com cabeçalhos do tipo 'Objetivos' e 'Problemas antecipados' a serem da-
a quaisquer atividades que seus colegas utilizem e que, muitas vezes,
das a um coordenador ou a uma coordenadora antes de ele ou ela obser- lhes pedem cópias dessas atividades para usarem em suas aulas mes-
var a sua aula (Woodward, 2001: 1, grifo da autora). mo sem saberem se serão adequadas para as especificidades de suas
turmas. Para eles, o importante é usar o máximo de atividades possível.
Analisemos as palavras de Woodward acerca do planejamento, Ora, a ideia segundo a qual "quanto mais atividades, melhor" é
pois elas apontam para elementos que não devem ser negligenciados um mito, porque não há uma relação direta entre quantidade de ma-
pelo professor na hora de planejar suas aulas. teriais e qualidade da aprendizagem. Simplesmente, não existe nenhu-
O professor precisa pensar em quem são seus alunos. São crianças, ma pesquisa sobre isso. Mas há uma consequência negativa bem óbvia
adolescentes ou adultos? Encontram-se em que níveis de proficiência? desse comportamento: professores orientados por materiais inevita-
Em institutos de idiomas, há adolescentes que estão no curso obriga- velmente ficam atrasados em termos dos conteúdos que devem ser
dos por suas mães ou por seus pais (ou por ambos); há adultos que vão trabalhados ao longo do semestre (como os professores de inglês cos-
do trabalho direto para a aula e que já chegam lá cansados; há crianças tumam dizer, they faL[ behind schedule) e acabam, consequentemen-
extremante agitadas e outras extremamente caladas ... Em escolas de te, cortando as atividades do livro didático para diminuírem o atraso.
ensino fundamental e de ensino médio, geralmente há uma mistura de Assim, muitos deles chegam ao extremo de quase não utilizarem o li-
níveis de proficiência na mesma sala de aula e os atos de indiscipli- vro didático, o que leva alguns alunos a reclamarem por terem pagado
na são mais frequentes do que nos institutos de idiomas. Com base caro por um livro que o professor mal utiliza. Os alunos estão corre-
nisso, o professor precisa pensar nas maneiras mais adequadas para tos em sua reclamação. Afinal, se um livro didático é adotado e se os

20 Aula de inglês: do planejamento à avaliação CAPíTULO 1 I A logística da aula


alunos gastam dinheiro para o adquirirem, ele deve ser usado (e livros Não podemos nos esquecer de que a aula deve estar voltada
didáticos de línguas estrangeiras são invariavelmente caros). Isso me para os alunos. Michael Lewis (1986:15) deixa isso bem claro:
parece óbvio, mas, como afirmei anteriormente, algo só é óbvio para É importante lembrar que o ensino de línguas é um meio para um fim.
quem afirma esse algo. O principal objetivo é mudar o comportamento dos alunos, não o dos
Ter materiais extras na manga é importante para os casos em que, professores. O aprendizado da língua é mais importante do que o ensino
por alguma razão, conseguimos fazer tudo o que havíamos planejado da língua.
para a aula e ainda haja tempo sobrando ou nos casos em que os alunos Retornemos às palavras de Woodward e notemos que ela enfatiza
reagem mal a determinada atividade chegando até a se recusarem a que planejamento não é a mesma coisa que uma folha de papel com
realizá-Ia: em vez de improvisar, lançamos mão de atividades que pro- anotações do tipo 'Objetivos' e 'Procedimentos'. Em outras palavras, ela
positadamente reservamos para situações como essas. Substituir uma não considera planejamento o mesmo que PLANO DE AULA. E está
u outra atividade do livro didático por uma atividade extra se justifica certa! O plano de aula é a materialização do planejamento.
no caso de as atividades propostas no livro não serem adequadas por Há professores experientes que planejam a aula, que não colocam
alguma razão. O que não se justifica é o professor lançar mão de uma o planejamento no papel e que, mesmo assim, são capazes de seguir
atividade extra sem um objetivo pedagógico estabelecido e com uma esse planejamento direitinho. E por que são capazes de fazer isso?
frequência tão alta que acabe deixando o livro didático de lado. Porque não apenas já planejaram tantas aulas que criam uma espécie
Certa feita, uma colega me ofereceu uma cópia da letra da músi- de plano mental de aula, mas também já lecionaram aquele nível com
ca The sign, da banda Ace of Base, e me disse para usá-Ia em minhas aquele livro didático tantas vezes que já conhecem o livro de cor e sal-
turmas. Perguntei-lhe qual o objetivo pedagógico daquela música e ela teado. Mas confiar na memória é correr o desnecessário risco de se
me respondeu: "Fun", Optei por não apresentar a música, apesar da boa esquecer de alguma coisa, o que pode atrapalhar o andamento da aula
vontade da colega em compartilhá-Ia comigo, pois seria potencialmen- e até colocar o professor em uma situação constrangedora.
te perturbadora para o gerenciamento da minha aula por duas razões: Felizmente para os alunos, a maioria dos professores prefere, sa-
em primeiro lugar, há palavras na música que os alunos das turmas que biamente, seguir o caminho seguro e colocar o planejamento no papel.
eu lecionava na época não conheciam e sobre as quais eles inevitavel- Alguns organizam seus planos em cadernos; outros, em folhas avulsas
mente me perguntariam, o que me faria gastar um bom tempo com em um classificador. Atualmente, com o avanço dos recursos tecnoló-
explicações ou traduções; em segundo lugar, essa música não tinha ne- gícos, imagino que existam professores que armazenem seus planos
nhuma conexão com o que se encontrava na unidade do livro didático de aula em smartphones, tablets ou em notebooks. No frigir dos ovos, a
que estávamos estudando. Portanto, é essencial ser coerente no uso do maneira como o professor armazena o plano de aula é o menos rele-
livro didático adotado e na quantidade, qualidade, adequação e objeti- vante: o importante mesmo é que ele tenha um plano de aula.
vos dos materiais extras que levamos para a sala de aula. E por que isso é importante? Por, pelo menos, cinco razões.
Uma questão importante que o professor precisa levar em consi- A primeira é o risco que o professor corre de se esquecer de algu-
deração no planejamento da aula é a seguinte: "O que meus alunos pre- ma coisa do que planejara e ter de improvisar desnecessariamente se
cisam estudar hoje?". Ou, dito de outra forma: "Aque meus alunos pre- não colocar o planejamento no papel. O plano de aula é uma forma de
cisam ser expostos hoje?" ou "O que meus alunos precisam aprender?". evitar o esquecimento e o improviso desnecessário.
Note que a primeira pergunta que deve vir à mente do professor não é A segunda razão é a possibilidade de o professor poder revisitar
"O que eu vou ensinar hoje?". Essa pergunta vem após aquelas três ou- o plano após a aula e ver o que funcionou e o que não funcionou para
tras perguntas. Afinal, a razão de ser da aula é a aprendizagem dos alu- decidir se mantém o planejamento ou se o altera nas próximas vezes
nos, à qual está atrelado o ato de ensinar: este existe em função daquela. que lecionar naquele nível para outras turmas.

Aula de inglês: do planejamento à avaliação CAPiTULO 1 I A loglstica da aula 23


A terceira razão é de ordem prática: se o professor elabora e ar- NíVEL diz respeito exatamente ao nível do curso em que a turma
quiva um plano de aula, ele não precisa gastar a mesma quantidade de se encontra, Ele pode ser expresso em termos de séries, no caso do cn
tempo no planejamento das próximas aulas para o mesmo nível, pois só sino fundamental e do ensino médio; em termos de nível de proficiên
precisará fazer ajustes se for o caso. cia, como, por exemplo, iniciante, intermediário ou avançado; ou em
A quarta razão para planejar as aulas e escrever um plano de aula termos do número do livro didático, como, por exemplo, Book 1, Book
é que o professor não correrá o risco de se esquecer dos materiais que 2 ou Book 6, no caso dos institutos de idioma; ou em termos de com-
precisam ser preparados ou separados para a aula. Não há como ele ponentes curriculares, como, por exemplo, Língua Inglesa I ou Língua
não ficar estressado ao perceber, na hora da aula, que se esqueceu de Inglesa 11, no caso dos cursos de Letras.
levar o co ou o ovo ou as cópias de uma atividade. Você poderia me perguntar: "Vem cá, fio. Mas que professor é tão
A quinta e última razão é a possibilidade de o professor faltar a tonto assim a ponto de não se lembrar de qual nível está lecionando?
uma aula e, assim, precisar de um substituto: ele precisa fornecer ao Não é desnecessário colocar o nível como um dos elementos do pla-
substituto o plano de aula com a devida antecedência. Infelizmente, há no de aula?" Pergunta procedente. Apresento, então, duas justificativas
professores irresponsáveis que solicitam uma substituição e não forne- para a presença deste elemento no plano de aula. Em primeiro lugar, o
cem o plano de aula, deixando o substituto numa situação complicada professor pode precisar de substituição, e essa informação é essencial
e exposto a queimar o filme se der uma aula ruim. Por isso, o professor para seu substituto, que não terá de ficar tentando adivinhar o nível
sério pode justificadamente se recusar a substituir um colega que não daquela turma, especialmente em uma aula em que não se utilize o
fornece o plano de aula. Obviamente, há casos justificáveis em que o livro didático. O professor pode estar tão familiarizado com a informa-
professor falta à aula e não tem tempo hábil para fornecer o plano de ção acerca dos níveis que leciona que pode se esquecer de colocar essa
aula ao substituto, como, por exemplo, a morte de pessoas próximas, informação no plano de aula a que seu substituto terá acesso. Assim,
um ataque cardíaco ou uma diarreia súbita e intensa, mas esses casos se a aula não for baseada no livro didático, cuja indicação do nível já
são pouco frequentes (ainda bem, né?). está presente, o substituto perderá tempo procurando por essa infor-
Bem, concentremo-nos agora nos elementos que compõem o pla- mação. Em segundo lugar, o professor de um instituto de idiomas pode
no de aula. A seguir, apresento uma lista desses elementos e, na se- ter muitas turmas em sequência de diferentes níveis, o que torna pos-
quência, comento cada um deles. Vale observar que há modelos dife- sível que ele, em um dia de estresse e cansaço incomuns, se esqueça
rentes. Logo, um ou mais de um dos elementos que apresento a seguir do nível de determinada turma em determinado horário. Por exemplo,
podem não estar presentes em alguns modelos (/e plano de aula. em 1993, eu tinha sete turmas num instituto de idiomas, totalizando 35
horas em sala de aula, lecionando quatro níveis diferentes. Eu precisava
ELEMENTOS DO PLANO DE AULA ter a informação sobre o nível no plano de aula de cada turma para evi-
(1) nível tar problemas, principalmente no início do semestre, quando eu ainda
(2) duração não havia memorizado para que níveis eu lecionaria e em que horários.
(3) número de alunos DURAÇÃO é um elemento que deve ser entendido de duas ma-
(4) estágio da aula neiras. A primeira diz respeito a quantos minutos a aula dura. No caso
(5) objetivo(s) dos institutos de idiomas, por exemplo, as aulas geralmente dura f1l
(6) procedimentos
50 minutos e costumam ser geminadas. Prestar atenção à duração da
(7) materiais
aula é importante para que não se desperdice tempo com atividades
(8) problemas antecipados
não essenciais como, por exemplo, músicas que nada têm a ver COIl1
(9) possíveis soluções para os prolJ/()lIlo1~ 011111'( ,pDdos
os assuntos da aula. Pode-se também interpretar 'duração' do pont ()

24 Aula de inglês: do planejamento à avaliação CAPíTULO 1 I A logfstlclt 111111111


"
de vista dos estágios da aula. Nesse caso, a duração diz respeito a de determinada função comunicativa e de formas Iinguísticas que pos
quantos minutos dura cada estágio. A duração de cada estágio deve sarn ser usadas para realizar essa função ou pode ser a produção de
ser estimada para que a aula tenha um equilíbrio em termos do tem- determinado gênero textual. Isso é importante para que o professor,
po alocado. após a aula, revisitando o plano, possa avaliar se atingiu ou não os
NÚMERO DE ALUNOS é autoexplicativo e é uma informação ne- objetivos estabelecidos e tomar decisões acerca da aula seguinte. Do
essária para que o professor não apenas leve o número suficiente de ponto de vista do professor, uma aula pode ter objetivos relacionados
cópias dos materiais extras, mas também evite problemas de gerencia- à sua prática docente (e.g., reduzir seu tempo de fala ou melhorar a
mento causados por um número ímpar de alunos no momento de uma maneira como dá instruções) ou a questões afetivas (e.g., melhorar o
atividade em duplas. Se houver um número ímpar, o professor já deve controle da disciplina na sala de aula ou controlar sua irritabilidade
ter uma solução planejada para a realização de trabalhos em duplas, para com alunos adolescentes).
pois um dilema se instaura: ele deve formar dupla com um aluno (e, as- O elemento PROCEDIMENTOS diz respeito às maneiras como o
sim, não monitorar o trabalho das outras duplas) ou deve formar uma professor implementa cada estágio na aula. Por exemplo, se os alunos
"dupla" com três alunos e, assim, ficar disponível para monitorar o tra- precisam estudar determinado ponto gramatical, o professor deve de-
balho deles? Sugiro que ele não forme dupla com nenhum aluno para cidir quantas informações sobre esse ponto fornecerá aos alunos; e se
poder monitorar o trabalho realizado pelas duplas. Afinal, no limite das vai apresentar itens lexicais novos, precisa decidir se deve apresentá-
possibilidades, pode ocorrer uma situação inusitada: sua turma ter um -los por meio de definições e exemplificações ou de realia ou de lin-
número ímpar de alunos que nunca faltam. Nesse caso, se ele sempre guagem não verbal. Mais um exemplo de procedimentos é o conjunto
optar por formar dupla com um deles, nunca monitorará o trabalho de instruções a serem dadas aos alunos para realizarem as atividades
dos outros alunos. previstas nos estágios da aula, pois o professor precisa decidir como
Além disso, o número de alunos ajuda o professor a decidir se leva irá proceder. Ele dará as instruções em inglês ou em português? Além
ou não determinada atividade para a sala de aula. Por exemplo, se o disso, deve ter o cuidado de dar instruções da maneira mais efica
professor tiver quinze alunos numa sala tão pequena que impeça a cir- possível ou desperdiçará muito tempo na aula ou, pior, os alunos não
culação deles de forma confortável, atividades do tipo cocktaiL party conseguirão realizar as atividades de maneira adequada.
(e.g., Class survey; Find someone who ...), em que eles se levantam e cir- Há ainda outro ponto importante sobre os procedimentos: o pro-
culam pela sala, não são viáveis. fessor precisa decidir quais atividades extraclasse (o popular home-
ESTÁGIO DA AULA diz respeito às etapas em que o professor work) ele deve designar para os alunos como extensão do que foi tra-
divide a aula. Uma etapa, por exemplo, que não pode deixar de estar balhado em sala de aula e, quando as designar, analisar se é necessário
presente no plano é o warm-up, cujo objetivo é integrar os alunos na explicar as instruções que constam no livro de exercícios. Vale lembrar
atmosfera de uso de inglês já que eles vêm de uma atmosfera de uso do que isso é essencial no nível iniciante, não apenas por causa da baixa
português. Dessa forma, o warm-up ajuda os alunos a ativarem esque- proficiência linguística dos alunos, mas também por causa da não fa-
mas mentais vinculados à língua inglesa. As outras etapas dão conta miliaridade deles com os tipos de exercícios propostos.
dos conteúdos e das habilidades linguísticas a serem trabalhados pelos Antes de passar para o próximo elemento do plano de aula, com-
alunos e, por isso, devem ser pensadas com cuidado para que haja uma partilho perguntas que o professor deve ter em mente no momento em
sequência lógica entre elas. que planeja os procedimentos das suas aulas. Elas são propostas por 11.
O elemento OBJETIVO(S) deve ser entendido a partir de dois ân- Douglas Brown (2007: 168). Vou resumi-Ias:
gulos. Do ponto de vista do aluno, o objetivo de cada estágio da aula (a) Há variedade suficiente nas técnicas para manter a lição dill"
deve ser explicitado. Por exemplo, o objetivo pode ser a apresentação mica e interessante?

Aula de inglês: do planejamento à avaliação CAPiTULO 1 I A 101llsIII:II (111 1111111 I


(b) As técnicas ou atividades que você utiliza na aula estão orga- não há rede na sua sala. E aí? Ele faz o quê? Qual é o seu plano B? (S
nizadas em sequência lógica? ele não tiver um plano B, as coisas ficarão piores.)
(c) A aula, como um todo, tem um ritmo adequado? (Neste caso, o O professor precisa antecipar problemas e pensar em POSSíVEIS
professor deve considerar, por exemplo, se as atividades não são SOLUÇÕES para eles. Às vezes, quando pensamos em possíveis proble-
nem muito longas nem muito curtas e se há transição entre elas.) mas, percebemos que é melhor desistir de determinada atividade que
(d) A duração da aula está apropriadamente cronometrada consi- havíamos planejado e substituí-Ia por outra. Afinal, como diz o ditado,
derando-se o número de minutos da hora-aula? antes prevenir do que remediar.
O elemento MATERIAIS engloba desde o livro didático até os ma- A seguir, apresento um modelo de plano de aula. Ele é muito dife-
teriais extras, como músicas, textos e jogos, e materiais de apoio, como rente do modelo que você usa?
realia e slídes. Esse elemento tem de constar no plano de aula, senão
Date: Class time period: Number of students:
o professor corre o risco de se esquecer de levar algum material para
a sala. Já vivenciei situações em que colegas interromperam educa- Levei: Classroom number:

damente minha aula para pedirem emprestados CDS e marcadores de ANTICIPATED POSSIBLE
TIME STAGE OBJECTIVES PROCEDURES MATERIAL
quadro branco. Eles provavelmente não prestaram atenção a esse ele- PROBLEMS SOLUTIONS

mento nos seus planos de aula. Eu também já passei pela experiência


de me esquecer de levar materiais para a aula, o que foi estressante e
acabou prejudicando o andamento da aula porque tive de sair da sala
para providenciar o material.
Além disso, o professor deve prestar atenção à adequação cultural
dos materiais utilizados em suas aulas. É importante lembrar de que, Alice Omaggio Hadley (1993: 488-490) oferece um conjunto de seis
geralmente, o principal elemento de 'materiais' é o livro didático e que a diretrizes para o planejamento de aulas que é bem instrutivo. Apresen-
maioria dos livros didáticos utilizados no Brasil é produzida por edito- to um resumo dessas diretrizes para finalizar esta seção:
ras britânicas ou estadunidenses. E por que isso é importante? Porque (a) Leve em consideração o conteúdo a ser ensinado em determinada
o fato de o livro didático ser elaborado em outros países inevitavelmen- aula: pense cuidadosamente nos temas, contextos culturais, ati-
te traz questões culturais que precisam ser consideradas pelo professor vidades e elementos linguísticos, como vocabulário e gramática.
não apenas no que diz respeito aos temas abordados, que podem ou não (b) Planeje as atividades que ajudarão seus alunos a atingirem ob-
interessar a seus alunos, mas também em termos dos valores ideológi- jetivos funcionais: considere as atividades que envolvam todos
cos veiculados, os quais precisam ser problematizados em sala de aula. os alunos ativamente durante o curso da aula.
PROBLEMAS ANTECIPADOS é um elemento que se refere a pro- (c) Prepare um rascunho daquilo que você pretende fazer durante
blemas que o professor vislumbra serem passíveis de ocorrer durante a auLa: anote o tempo estimado para cada atividade para que
sua aula. Por exemplo, ele pode preparar uma atividade e os alunos sua aula flua num ritmo razoável.
reagirem mal a ela. E aí? O que ele deve fazer? Forçá-los a realizarem (d) Verifique a sequência Lógica e a integração das atividades: plane-
a tal atividade ou fazer outra coisa no lugar dela? E se a atividade que je transições que tornem uma atividade uma continuação lógica
preparou exigir um vocabulário que alguns alunos demonstram não da outra ou que deixem claro que haverá uma mudança de foco.
dominar? O que fazer? Abandoná-Ia e substituir por outra ou gastar (e) Varie as tarefas na sala de aula: evite a repetição do mesmo
tempo de aula lecionando esse vocabulário aos alunos? Ele planejou tipo de atividades durante a aula para que os alunos não fiquem
usar um vídeo ou um áudio disponível na internet e, na hora da aula, entediados.

Aula de inglês: do planejamento à avaliação CAPíTULO 1 I A logfstico cio aula 9


(f) Avalie seu plano de aula após a aula: decida se você faria as LAYOUT FLEXlvEL LAYOUT RIGIDO

mesmas coisas ou se necessitaria alterar alguma coisa se des-


se aquela aula novamente.
Tendo feito o planejamento, chega o momento de você entrar em
sala de aula e colocar em prática aquilo que está no seu plano. E aí é
essencial que você realize um conjunto de ações para gerenciar o que
ocorre na sala de aula da maneira mais eficaz possível. É disso que tra- L -------,
C)
,---,

ta a próxima seção.
TEACHER'S
DESK

1.2 O gerenciamento da sala de aula

Você planejou sua aula, elaborou seu plano e agora está na sala, se o professor adota o Community Language Learrunq", ele fica atrás
que precisa estar sob seu total controle para que você consiga mate- dos alunos durante a realização das atividades porque essa posição é
rializar o que planejou. Para isso, você tem de considerar os elementos supostamente menos intimidatória para eles.
que fazem parte do GERENCIAMENTO DA SALA DE AULA. Vinculada às possibilidades que o layout flexível oferece, encon-
O primeiro elemento a considerar é o AMBIENTE FÍSICO em que tra-se a questão do AGRUPAMENTO dos alunos. Às vezes, eles tra-
a aula será realizada. A parte principal desse ambiente é o layout da balham individualmente; muitas outras vezes, trabalham com mais al-
sala. A disposição das carteiras dos alunos e da mesa do professor é guém. O professor precisa ficar atento ao agrupamento que faz para
importante para as diversas tarefas a serem realizadas: o professor a realização das atividades, a fim de evitar que os alunos pratiquem
pode querer formar duplas, trios ou quartetos. Assim, o semicírculo sempre com os mesmos colegas. O caso extremo dessa situação são os
é o layout mais prático e o que dá mais possibilidade de movimenta- casais de namorados que estudam na mesma turma: eles não querem
ção ao professor. E as escolas públicas e a maioria dos institutos de se desgrudar por nada deste mundo. Mas o grude apaixonado não deve
idiomas oferecem essa possibilidade aos professores. Há institutos de falar mais alto do que as necessidades de agrupamento, pois variar
idiomas, no entanto, que não dão opção aos professores no que diz as duplas, os trios e os quartetos é salutar porque oferece aos alunos
respeito à manipulação do posicionamento das cadeiras: eles possuem oportunidades de lidarem com a diversidade.
uma grande mesa em torno da qual se acomodam alunos e professor. Há formas diferentes de fazer o agrupamento: o professor decide
As imagens a seguir ilustram os dois layouts. Note que o layout flexível quem vai trabalhar com quem; ele faz um sorteio; ele estabelece um
apresentado está no formato canônico, mas ele pode ser desfeito para critério específico para o agrupamento (por exemplo, as duplas podem
atividades em grupo. ser formadas por pessoas que têm o mesmo signo ou que torcem pelo
Usualmente, no momento de dar instruções e de fazer apresen- mesmo time, o que leva os alunos a fazerem perguntas entre si); os
tações e explicações, o professor posíciona-se em frente ao quadro alunos escolhem com quem desejam trabalhar. O importante é que o
branco, atrás ou em frente da sua mesa, para ter uma visão global da professor decida previamente, no seu planejamento, qual será a forma
turma e, assim, nunca perder o contato visual com seus alunos. No de agrupamento para cada atividade, a fim de não desperdiçar tempo
momento da realização das atividades em duplas, ele circula, para, da aula tentando gerenciar o agrupamento.
acocora-se, curva-se, enfim, procura a melhor posição para monitorar
o trabalho dos alunos. Entretanto, a depender do método de ensino
Para obter maiores informações sobre o Community Language Learning, veja o capl
adotado, a posição pode ser previamente determinada. Por exemplo, tulo 3 do livro Métodos de ensino de inglês: teorias, práticas, ideologias (Oliveira, 2014).

30 Aula de inglês: do planejamento à avaliação CAPiTULO 1 I A loqlstica do autn


Uma situação que pode surgir no momento do agrupamento de ! instruçocs, que atrapalha nao apenas o aprendizado do retardatário
O
duplas é a existência de alunos com diferentes níveis de proficiência. como também o andamento da aula, pois ele geralmente solicita explica-
Para ser mais claro, usando as palavras de alguns professores: pode ções ao professor. Nesse caso, o professor precisa decidir se deve atender
haver alunos "fracos" e alunos "bons" numa sala de aula. Existem pro- à solicitação do retardatário naquele momento ou se deve deixar para
fessores que acreditam que devem emparelhar um aluno bom com um fazer isso após a atividade em andamento ou no final da aula.
aluno fraco para que o bom ajude o fraco. O problema dessa decisão é Mais uma vez: o professor precisa dar um bom exemplo e ser
a insatisfação que alguns alunos considerados bons podem sentir: eles pontual. Imaginemos um professor em um instituto de idiomas que,
podem simplesmente não estarem a fim de desempenhar o papel de no horário de iniciar uma aula, sempre se dirige calma e lentamente à
professor de colegas fracos. Outros professores preferem emparelhar mesa de café para preparar um cafezinho enquanto seus colegas se di-
alunos bons com alunos bons e alunos fracos com alunos fracos. O rigem para suas respectivas salas de aula: obviamente, ele sempre che-
problema dessa decisão é que as duplas de alunos bons inevitavelmen- ga atrasado. Quando se comporta assim, o professor envia a seguinte
te finalizam a atividade antes das duplas de alunos fracos. Para tomar mensagem aos alunos: "Olha, é melhor vocês não chegarem no horário
uma decisão, o professor terá de considerar cuidadosamente quem são para não terem que ficar me esperando chegar à sala". Ora, 5 minu-
seus alunos em termos de personalidade e comportamento para pre- tos de atraso por dia de aula, dois dias por semana, todas as semanas,
ver como reagirão às suas decisões. significa uma perda de 160 minutos de aula no semestre. E isso é ruim
Elemento vital para o funcionamento das aulas é o ESTABELECI- para os alunos porque eles deixam de ter 2 horas e 40 minutos (ou um
MENTO DE REGRAS DE COMPORTAMENTO. O ideal é que o professor pouco mais de 3 aulas de 50 minutos) de exposição à língua inglesa, já
faça isso logo no primeiro dia de aula para que os alunos, de imediato, restrita pelo fato de eles morarem no Brasil.
tomem conhecimento das regras que vão reger seus comportamentos Outro comportamento interessante a ser instigado nos alunos é
na sala de aula. Isso evita diversos problemas. evitar falar português em sala de aula. Uma forma de ajudá-los a se
Uma dessas regras diz respeito ao uso do telefone celular ou do comportarem assim é municiá-los com expressões para a comunica-
smartphone. Infelizmente, há pessoas muito mal-educadas, que não ção básica em sala de aula. Isso precisa ser feito logo no primeiro dia
respeitam locais em que seu uso é impróprio como o cinema, o teatro ... de aula do primeiro nível de iniciantes, pois, dessa forma, as chances
e a sala de aula. Converse com seus alunos sobre isso e peça-lhes para de os alunos evitarem falar português desnecessariamente aumentam
desligarem o aparelho ou ativarem o modo silencioso. É extremamente muito, não apenas nesse nível, mas também nos outros. Assim, o com-
irritante e desrespeitoso um aparelho tocar durante a aula. Pior ainda portamento de evitar o uso de português acaba tendo grandes chan-
é o aluno atender uma ligação no meio da aula. É claro que o professor ces de se consolidar. Eis algumas expressões que os alunos precisam
precisa dar um bom exemplo e não deixar o seu celular ou smartpho- aprender logo no primeiro dia de aula:
ne atrapalhar a aula. Além disso, ele deve negociar com os alunos que
realmente precisam deixar o aparelho ligado porque aguardam uma o How do you say in English?
informação sobre um parente hospitalizado ou algo parecido - a ideia o How do you spell ?
é deixar o aparelho na função vibra cal[ e deixar o professor previa- o How do you pronounce this?
mente avisado de que eles estão aguardando uma ligação importante, o Could you repeat that, please?
que atenderão da maneira mais discreta possível... fora da sala. o Could you speak slowly?
Outra regra de comportamento diz respeito à pontualidade. O aluno o I don't understand.
deve ser alertado da necessidade de ser pontual. Chegar atrasado implica
o Do you have an extra pencil/pen?
perder, no mínimo, o warm-up, o que já atrapalha a inserção no ambien-
o Could you lend me your eraser?
te da aula. Chegar muito atrasado implica perder atividades, explicações

32 Aula de inglês: do planejamento à avaliação CAPiTULO 1 I A loglstico da aula 33


Obviamente, o professor vai tratar essas expressões como expres- atividade com uma música para seus alunos adolescentes, lembre Sl'
sões congeladas. Ou seja, ele não vai explicar aos alunos os pronomes de que músicas interessantes para você podem ser chatas para eles
interrogativos ou os verbos modais ou os tempos verbais que compõem trata-se aí de uma questão cultural de diferenças de gerações. Tente
essas expressões. Nesse momento, os alunos precisam apenas apren- conhecer bem seus alunos, pois isso ajuda bastante no planejamento
der o significado global dessas expressões e a função comunicativa que das aulas. A terceira sugestão é, sempre que possível, elogiar algo po
cada uma delas realiza no contexto da sala de aula. sitivo que os alunos mais indisciplinados realizem. Você pode ganhar
Essas regras de comportamento, se legítima e consensualmente terreno com eles assim. Se nada disso der certo, resta apenas rezar,
instauradas, podem contribuir para reduzir um tipo de problema que orar, fazer pedidos aos orixás e a todos os deuses e a todas as deusas
atormenta professores em todo o mundo: indisciplina. Imagino que para que as criaturas indisciplinadas das suas turmas se iluminem
você que já experimentou os efeitos irritantes da indisciplina nutra fiquem bem comportadas.
uma esperança oculta de encontrar, nestas próximas linhas, uma so- Um comportamento importante que se aproxima muito da ques-
lução. Bem, I'm sorry! Não encontrará. A questão da indisciplina é tão tão da indisciplina é o não fazer as atividades extraclasse. Fazê-Ias
onipresente, séria e angustiante que vários professores e pedagogos importante para os alunos internalizarem informações linguísticas.
equiparam o gerenciamento da sala de aula a gerenciamento da indis- Até os exercícios nos quais o aluno deve copiar sentenças e palavras,
ciplina (experimente jogar as palavras dassroom management no Goo- que parecem tão bobos por não exigirem muito esforço cognitivo, são
gle para verificar isso). importantes para a fixação da ortografia. Por isso, o professor preci
Contudo, posso oferecer algumas sugestões que potencializam sa conversar com os alunos adultos e explicar-lhes a importância de
uma redução da indisciplina. A primeira é a criação de um ambiente eles fazerem o dever de casa e de assumirem as consequências negati-
positivo em sala de aula. Isso parece óbvio, né? Porém, há professo- vas no caso de negligenciarem suas tarefas (consequências como, por
res tão arrogantes, autoritários e impacientes que acabam levando os exemplo, demorarem um longo tempo para assimilar os padrões orto
alunos a adotarem comportamentos de resistência, tornando a sala de gráficos e a estrutura discursiva da língua inglesa). Se os alunos são
aula um espaço de embates inúteis que servem apenas para criar um crianças, inevitavelmente o professor deverá convocar a coordenação
ambiente negativo. O ideal é o professor criar uma proximidade dis- da escola para que ela converse com os pais a respeito disso. Afinal,
tante com o aluno: apesar de se mostrar próximo, o professor marca criança é criança e não se governa. Ponto. Mas no caso dos adolescen-
claramente que há uma linha divisória entre ele e seus alunos. Isso tes, é necessário ir com mais cautela. Sugiro que se converse com o
é evidenciado, por exemplo, na maneira contraditória, em termos de aluno primeiro, que lhe sejam dadas uma ou duas chances de modificar
registro de formalidade, com a qual alguns alunos se dirigem a mim: seu comportamento em relação ao dever de casa. Se isso não adiantar,
"Professor Lu" ou "Lu, o senhor ...",A segunda sugestão é levar aos alu- o professor tem a obrigação de chamar a coordenação para que ela
nos atividades interessantes. E é importante ficar claro: elas devem converse com os pais dos alunos. A cautela a que me refiro se deve ao
ser interessantes para os alunos, mesmo que não sejam interessantes fato de haver adolescentes que passam a considerar o professor seu
para o professor. Com isso não quero dizer que ele deva levar ativida- inimigo número um se ele os "dedurar" para seus pais. Enfim, é uma
des sem objetivo pedagógico nenhum, que sirvam apenas para entre- questão delicada que deve ser analisada caso a caso.
tenimento ou diversão. Quero dizer com isso que as atividades peda- Bem, o ambiente físico está controlado e as regras de comporta-
gógicas precisam ser adequadas para a idade dos alunos. Geralmente, mento, estabelecidas. Agora o professor precisa atentar para um el
os adultos e as crianças são mais maleáveis e topam fazer a maio- mento importante do gerenciamento da sala de aula: seu corpo. Vo A

ria das atividades propostas pelo professor. Os adolescentes é que deve estar-se perguntando: "Como assim? O corpo do professor?". Pois
tendem a se opor mais. Se você decidir, por exemplo, elaborar uma é. Não estou fazendo referência aqui a seu peso ou a seu modo de se

34 Aula de inglês: do planejamento à avaliação CAPíTULO 1 I A loglstica da 0111/1 3!1


vestir, mas, isto sim, à sua LINGUAGEM CORPORAL, mais especifica- professor deve ser reduzido o máximo possível. É o caso dos adeptos
mente ao contato visual que estabelece (ou não) com seus alunos, à sua do Siíent Way, criado por Caleb Gategno, para quem o professor dcv
voz e aos gestos que utiliza durante a aula. ficar em silêncio a maior parte do tempo. De outro lado, há aqueles qu
Manter contato visual com todos os alunos é essencial para o es- defendem a ideia de que a fala do professor é um input valioso para o
tabelecimento de uma relação de confiança mútua. Há professores que processo de aprendizagem dos alunos e que, por essa razão, deve ocu-
têm uma tendência curiosa de evitar olhar para alunos que consideram par boa parte do tempo da aula. É o caso dos adeptos da suggestopedia,
fracos e para alunos de quem, por alguma razão, não gostam. Entretan- um método criado por Georgi Lozanov'.
to, o professor precisa ser profissional e tratar os alunos igualmente, De que lado o professor de inglês deve se posicionar? Dos que
por mais difícil que isso possa ser em determinados casos. Além disso, defendem o máximo de fala do professor ou dos que defendem o mí-
o contato visual serve não apenas como uma forma de inibir conver- nimo de fala do professor? Simples: do lado de Aristóteles, para quem
sas paralelas e outros comportamentos negativos para o andamento da a virtude está no meio. Ou seja, o equilíbrio está no meio: o tempo de
aula, mas como um instrumento de feedback imediato sobre as reações fala do professor e o tempo de fala do aluno devem ser tratados com
dos alunos às atividades que realizam. racionalidade. Afinal, no nível inicial, os alunos ainda não podem falar
Avoz é importante para o ritmo da aula e para a concentração dos muitas coisas e é normal que o tempo de fala do professor tenda a ser
alunos. Um professor que fala lentamente e em voz baixa deixa os alu- maior do que o tempo de fala dos alunos. Essa proporcionalidade deve
nos com sono. Um professor que fala rapidamente e com voz estriden- se inverter nos níveis mais avançados de proficiência.
te deixa os alunos doidos. Então, o professor precisa buscar um equi- Alguns professores possuem um hábito que aumenta seu tempo
líbrio em termos de altura e de tom da voz, e em termos da velocidade de fala desnecessariamente: eles repetem o que os alunos dizem. Esse
da sua fala. Elevar o volume da voz quando percebe que dois alunos tipo de repetição é chamada de ECO. Vejamos um diálogo que exem-
estão em conversa paralela fora de hora geralmente ajuda o professor plifica isso:
a controlar a conversa. Por isso, ele deve usar sua voz da maneira mais TEACHER: How was your weekend?
eficaz possível.
STUDENT: Great.
Os gestos constituem parte importante da comunicação do pro-
fessor com seus alunos e contribuem para diminuir o chamado tempo TEACHER: Great? Good. What did you do?

de fala do professor. Por isso, vale a pena ele lhes ensinar os gestos que STUDENT: I went to the movies.
utilizará em sala. Há gestos que já estão tradicionalizados nas aulas TEACHER: Vou went to the movies. What film did you see?
de inglês. Por exemplo, para indicar pretérito, o professor aponta para
STUDENT: The Fabu/ous Oestiny of Ame/ie Pou/ain.
trás com o polegar; para indicar que o verbo na 3a pessoa do singular
TEACHER: The Fabu/ous Oestiny of Ame/ie Pou/ain? Did you like it?
tem um S na forma afirmativa, o professor mostra três dedos. Indepen-
dentemente de quais gestos o professor use, o importante é que seus STUDENT: Iloved it.
alunos os entendam e se acostumem com eles. TEACHER: Vou loved it. Great!
Aliás, vale lembrar: a FALA DO PROFESSOR é outro elemento fun- Esse professor fica ecoando as respostas do aluno sem nenhu-
damental para o gerenciamento da sala de aula. Ela funciona não ape- ma necessidade. E isso deve ser evitado. Repetir algo que um alu-
nas como um meio de organização da aula, mas também como input no diz pode ser uma forma de correção: a repetição pode levar o
para os alunos.
Embora muito útil, a fala do professor é fonte de muitas discus-
Para conhecer mais sobre o Silent Way e sobre a suggestopedia, veja o capítulo 3 de
sões. De um lado, há quem defenda a ideia de que o tempo de fala do Métodos de ensino de inglês: teorias, práticas, ideologias (Oliveira, 2014).

36 Aula de inglês: do planejamento à avaliação CAPíTULO 1 I A loglstico do 1111111 :1/


aluno a prestar atenção ao que ouve para descobrir o erro presente materna dos alunos, tornando (l lima espécie de persou« non wutu
ali. Mas, insisto, ficar ecoando o que os alunos dizem não é reco- na sala de aula" (Oliveira, 2014: 86). Ressalte-se que os supostos be
mendável simplesmente porque nós não fazemos isso nas interações nefícios de proibir o uso da língua nativa dos alunos na sala de aula
verbais que estabelecemos. A não ser quando se tem a intenção de não estão lastreados em nenhuma pesquisa. Como esclarece EIsa
pirraçar uma pessoa rernedando-a, algo que crianças fazem de vez Auerbach, o uso exclusivo de inglês durante as aulas se tornou uma
em quando. prática naturalizada, de senso comum, a qual, "enraizada em deter-
Há professores que se recusam terminantemente a usar portu- minada perspectiva ideológica, assenta-se em pressupostos não exa-
guês na aula e, quando é necessário explicar para um aluno o signi- minados e serve para reforçar as desigualdades em uma ordem social
ficado de uma palavra que faz parte de uma atividade extra, eles o mais ampla" (Auerbach, 1993: 9).
fazem em inglês, mesmo que a turma seja de iniciantes e mesmo que Não por acaso, Sheelagh Deller e Mario Rinvolucri (2002: 10)
a palavra seja de difícil explicação. Nesse caso, há um aumento desne- comparam o comportamento dos professores que se recusam a usar
cessário do tempo de fala do professor, algo que poderia ser evitado e a permitir que seus alunos usem a língua nativa na aula de inglês
com uma rápida tradução da palavra se esses professores não fossem ao comportamento daquele rei nu usando roupas invisíveis em um
desnecessariamente radicais na proibição do uso de português na dos contos de Hans Andersen e perguntam ironicamente: "Os alunos
sala de aula. não possuem uma língua materna?". É como se eles perguntassem:
Esse exemplo nos remete a outro elemento importante para o ge- "Como assim? Será que o rei não vê que está nu?". Com metáforas
renciamento da sala de aula: o USO DE PORTUGUÊS. Citei a ideia de argutas, eles provocam os professores que se comportam ortodo-
equilíbrio de Aristóteles anteriormente e a reforço aqui: o equilíbrio xamente quanto ao uso da língua nativa dos alunos nas aulas de lín-
está no meio. Ou, como se diz na minha terra, nem oito nem oitenta. guas estrangeiras:
O professor precisa ponderar acerca do uso de português na aula de o pensamento ortodoxo nos últimos cinquenta anos nos Estados Unidos,
inglês levando em consideração dois pontos. O primeiro é o fato de no Reino Unido e na Europa tem sido o de que o uso da língua materna
os alunos precisarem aprender inglês. Logo, quanto menos português deveria ser excluído da sala de aula de línguas estrangeiras.
for usado na sala de aula, melhor. Creio que isso seja óbvio. O segundo Nosso argumento é, ao contrário, o de que a língua materna (LM)é, sim,
ponto é o cuidado que o professor precisa ter para não ampliar des- a mãe da segunda língua, da terceira língua e da quarta língua. É desse
necessariamente o seu tempo de fala. Assim, se um aluno do nível ini- útero que novas línguas nascem na cabeça do aluno; portanto, excluir a
ciante faz uma pergunta acerca do significado de uma palavra que, por LM da sala de aula de inglês é como tentar desmamar um bebê no pri-
meiro dia da sua vida (Deller; RinvoJucri, 2002: 10, grifo dos autores).
acaso, faz parte de uma atividade e se essa palavra não for o foco da
atividade, é muito mais racional e lógico traduzir a palavra do que gas- Deller e Rinvolucri estão corretos, definem a língua materna d
tar preciosos minutos tentando fazê-lo entender uma explicação em maneira muito interessante e lembram que ela deve ser usada em
inglês sem a garantia de que a entenderá. circunstâncias claramente definidas. Uma dessas circunstâncias, por
Se os alunos têm uma língua nativa, nesse caso o português, por exemplo, é o momento no qual o professor apresenta o present per·
que fazer de conta que eles não possuem uma? Por que não colo- fect tens e com e sem sintagmas preposicionais formados por for e
car a língua portuguesa para funcionar a favor da prática docente e since. A tradução para o português de sentenças como as que aprc
a favor do aprendizado quando necessário for? Proibir o uso da lín- sento a seguir, além de reduzir o tempo de fala do professor, ajuda
gua materna é uma postura ideologicamente marcada. Como afirmei os aprendizes brasileiros a entenderem os sentidos do tempo verbal
alhures, "essa proibição acaba caracterizando negativamente a língua em questão.

38 Aula de inglês: do planejamento à avaliação CAPíTULO 1 I A loglsllcn tlll 1111111 ItI


1. Sheldon has sung in a choir for three years. de se concentrarem nas instruções e, inevitavelmente, pedirem qw'
você as repita.
2. /'ve been to Innsbruck.
Seja o mais simples e conciso possível. Instruções longas e COIl\
3. Oale has visited Germany. plexas são ineficazes e confundem os alunos. Jaimie Scanlon (2014)fOI
nece um exemplo interessante de como instruções desnecessariarncn
Portanto, recomendo que você não se feche em posições radicais
te longas podem ser simplificadas. Observe esta instrução:
no que diz respeito ao ensino de inglês. Além de ser útil para explica-
ções sobre determinados elementos gramaticais e lexicais, o uso do Ok, everybody, listen to me. I want to tell you what we're going
português pode até ser útil para outro elemento do gerenciamento da to do next. What we're going to do is... I want everybody to
aula: as INSTRUÇÕES. get together with the partners you were working on the peer-
Conforme mencionei na seção anterior, dar instruções é um ato -editing with last week.
que precisa ser realizado com cuidadosa preparação, pois elas estão a
Agora observe essa mesma instrução reformulada para ficar mais
um passo do aumento desnecessário do tempo de fala do professor e
simples e concisa (bem melhor, não?):
da não realização ou da realização equivocada da atividade por parte
dos alunos. Por isso, faço, a seguir, algumas sugestões que podem con- Pleasefind last week's writing partner.
tribuir para que suas instruções sejam dadas de forma adequada.
Finalmente, certifique-se de verificar se os alunos entenderam
Em primeiro lugar, repito, planeje cuidadosamente a maneira
suas instruções. Ah, um lembrete importante: não seja ingênuo a pont ()
como dará as instruções. Decida se dará as instruções em inglês ou em de perguntar "Do you understand?" e acreditar nas respostas afirmut i .
português, com ou sem demonstrações. Talvez haja algum ortodoxo de vasoAfinal, você não terá a menor ideia de como os alunos entendera 1\\
plantão que esteja torcendo o nariz e pensando o seguinte: "Peraíl Eu as instruções se não verificar o entendimento deles. Peça que alguém
li isso direito? É 'em português' mesmo?!". Sim! Eu acabei de escrever explique o que entendeu (mesmo que a explicação seja em portugucs
"em português" mesmo. Não há o menor problema em dar as instru- nos níveis mais baixos de proficiência). Só assim você terá certeza de
ções em português, principalmente se a turma for do nível iniciante e que seu ato de dar instruções foi bem-sucedido.
se os alunos não estiverem familiarizados com o tipo de atividade em Bem, você deu as instruções e os alunos estão realizando a ativida
questão. O professor precisa se lembrar de que o foco é a realização de. O que você faz agora? Relaxa um pouco? Vaitomar um cafezinho en
das atividades, não o entendimento das instruções. Obviamente, o uso quanto eles trabalham? Sorry, but no. Chegou o momento de acionar ou
de português para dar as instruções não deve ser algo frequente na tro elemento do gerenciamento da sala de aula: o MONITORAMENTO.
sala de aula: à medida que os alunos se familiarizam com os tipos de Você circula na sala, para, fica em pé, fica de cócoras, enfim, você esco
atividades, mais raramente o professor precisará usar português para lhe a posição mais adequada para observar o desempenho dos alunos,
dar instruções. responder a perguntas que eles possam ter, anotar erros para comentá
Depois de decidir qual a melhor forma de dar as instruções, você -los posteriormente, corrigir alguns erros na hora que acontecem.
precisa se certificar de que todos os alunos estão prestando atenção O monitoramento gera discussões sobre o tratamento que o pr
no momento em que as der. Do contrário, você terá de repeti-Ias para fessor deve dar aos erros dos alunos: ele deve ignorar os erros, anotá
quem não prestou atenção. Nesse sentido, vale ficar alerta para algo -los para comentá-los depois (o chamado deLayed feedback) ou corrigi
importante: se você for distribuir algum material, dê as instruções -los de imediato (o chamado on-the-spot feedback)? Depende do tipo
.<.!.ntg~
de distribuí-Io, pois o impacto visual é mais forte que o sonoro, de atividade sendo realizada. Se ela for voltada para o desenvolvimento
o que faz os alunos começarem a prestar atenção ao material em vez da fluência, então o professor deve anotar os erros para comentá-los

() fi 111111111IlIqlfts. do planejamento à avaliação CAPiTULO 1 I A logística da aul


depois c só corrigt-los dc imediato se se tratar de produções linguísti- realização da atividade. Obviamente, elas podem ser dirimidas com a
cas tão equivocadas que atrapalhem a continuidade da atividade mes- ajuda do professor, que deve, sim, permanecer na sala de aula. Portan-
mo com a negociação de sentidos entre os alunos. Se a atividade for to, a tarefa de monitoramento deve ser realizada em todas as ativida-
voltada para o desenvolvimento da precisão, então o professor deve des feitas na sala de aula.
corrigir os erros de imediato e, se necessário, explicar o elemento lin-
***
guístico em questão. Espero ter conseguido demonstrar a importância de planejar as
O monitoramento diz respeito também ao tempo dado aos alunos aulas e de gerenciar a sala de aula. Vamos agora nos debruçar sobre
para realizarem a atividade. Isso parece algo mais simples, né? Contu- questões relacionadas ao ensino das quatro habilidades.
do, nada é simples na vida do professor de inglês. Imagine esta situa-
ção: o professor prepara uma atividade para ser realizada em duplas,
dá as instruções e os alunos se engajam na sua realização. Após 7 mi-
nutos, todas as duplas já terminaram a atividade, à exceção de uma
dupla. O que o professor deve fazer? Dizer a esses dois alunos para
interromperem a atividade ali ou esperar que ela termine? O risco de
esperar é que, se a dupla levar uns 4 minutos para terminar, o que não
parece muito tempo se transforma numa eternidade para as outras du-
plas, que podem se engajar em conversas paralelas em português. O
risco de interromper o trabalho é provocar nos dois alunos um sen-
timento de fracasso por não terem conseguido terminar a atividade.
Em casos como esse, o professor tem de usar o bom senso e tomar a
decisão de acordo com o perfil dos alunos. Além disso, ele pode levar
alguma atividade extra para os alunos que terminarem antes dos ou-
tros. Mas aí surge outro problema em potencial: a última dupla finaliza
a primeira atividade e agora tem de aguardar as outras duplas finaliza-
rem a segunda atividade. Por isso, repito, o bom senso do professor é
essencial para uma tomada de decisão em casos de ritmos diferentes
de realização das atividades.
O monitoramento das atividades de escrita merece um comen-
tário à parte. As perguntas feitas três parágrafos acima (i. e., "Relaxa
um pouco? Vai tomar um cafezinho?") não estão ali por acaso. Há pro-
fessores que acreditam não haver problema em saírem da sala de aula
enquanto seus alunos realizam uma atividade de escrita. A ideia sub-
jacente a esse comportamento é a de que as atividades voltadas para o
desenvolvimento da escrita não precisam ser monitoradas porque elas
serão corrigidas posteriormente. Tal ideia é um grande equívoco, pois
s alunos podem ter dúvidas quanto à ortografia, ao vocabulário ou à
nstrução sintática, e essas dúvidas podem inquietá-Ios e dificultar a

42 Aula de inglês: do planejamento à avaliação


CAPíTULO 1 I A logística dn 1111111 ~:\
Sobre o ensino
das quatro habilidades
uando um professor de inglês dá início à sua
) formação, ele costuma ouvir e ler a respeito
das quatro habilidades linguísticas: a com-
~
preensão oral, a leitura, a fala e a escrita. Há alguns
autores que preferem usar o termo macro-habilidades
pelo fato de cada uma das quatro habilidades ser, na
verdade, composta de habilidades menores, as micro-
-habilidades, Essa preferência procede, mas, pelo fato
de o termo habilidade já estar consagrado entre os
professores de inglês, eu o utilizarei aqui, mas sem
perder de vista a natureza composicional, multidi-
mensional das habilidades.
Enfatizo que, se estou admitindo a existência
das micro-habilidades, estou olhando para cada ha-
bilidade linguística a partir de uma perspectiva de
multidimensionalidade e, consequentemente, vislum-
brando a possiblidade de elas serem decompostas,
pelo menos do ponto de vista teórico. Entretanto, de
acordo com Feng Liu (2010),há teóricos que afirmam
não haver evidência disso, defendendo a ideia da uni-
dimensionalidade das habilidades linguísticas, posi-
ção rebatida por outros teóricos que acreditam que
elas sejam passíveis de serem decompostas. Como
não há evidência irrefutável para uma posição nem
para a outra, continuarei aqui seguindo a tradicional

CAPíTULO 2 I Sobre o ensino das quatro habilidaclos 45


tendência de pensar as habilidades linguíslieas a partir de uma pers- pos estruturalistas acerca da suposta incxistência do significado íuc
pectiva multidimensional, Além do mais, vale lembrar: a análise, a de- ral e da suposta superioridade dos direitos do leitor (c, por extensão,
omposição teórica de objetos de estudo, é importante para se atingir do ouvinte) sobre os direitos do texto. Portanto, que isto fique bem
um maior entendimento acerca desses objetos. Por exemplo, não po- claro: receptiva e passiva não são sinônimos.
demos conceber o coração separado dos rins, mas um cardiologista Vale lembrar que há uma importante área de estudos que incor-
e um nefrologista fazem essa separação para melhor compreenderem pora em seu nome a palavra recepção e cujo foco está exatamente
cada um desses órgãos. Não podemos conceber a separação dos sons, na produção de sentidos. Refiro-me à estética da recepção, também
dos sinais gráficos e dos significados das palavras, mas um foneticista, chamada de teoria da recepção, na qual se destacam teóricos como
um morfologísta e um semanticista realizam tal separação para melhor Wolfgang Iser, Jonathan Culler, Umberto Eco e Stanley Fish (este, um
compreenderem determinados fenômenos linguísticos. Analogamente, ex-pós-estruturalista radical no que diz respeito à defesa dos direi-
faz sentido pensar na análise da fala, da escrita, da compreensão oral e tos do leitor e à crítica veemente ao estatuto teórico do significado
da leitura para melhor compreender seu desenvolvimento e vislumbrar literal'). Não é interessante? A estética da recepção dá foco à produção
as formas mais eficazes de tratá-Ias na sala de aula. de sentidos. Portanto, ao me referir a uma habilidade com o adjetivo
Há algumas décadas, teóricos e professores de línguas estran- receptiva, não estou significando com isso que ela seja passiva. Muito
geiras costumavam dividir as quatro habilidades linguísticas em pelo contrário: claramente, as quatro habilidades exigem mobilizações
dois grupos: as passivas, i.e., a compreensão oral e a leitura, e a as cognitivas e isso implica que falar, escrever, ler e compreender um tex-
ativas, i.e., a fala e a escrita. Hoje, com os avanços das pesquisas em to falado requer o engajamento ativo do sujeito usuário da língua. O
psicolinguística e em linguística aplicada, a maior parte dos teóri- adjetivo receptiva simplesmente nos remete à ideia de que o usuário da
língua encontra-se na posição de quem recebe e interpreta um texto
cos e professores se conscientizou de que não existe passividade
em nenhuma dessas habilidades. Pelo contrário, nós realizamos um escrito ou falado produzido por outro sujeito.
Ah, um comentário importante antes de seguir adiante: neste li-
esforço cognitivo grande para desenvolvermos as quatro habilidades
vro, considero as habilidades linguísticas sob uma perspectiva ortodo-
independentemente de estarmos falando da língua materna ou de
xa, ou seja, considero apenas as quatro habilidades tradicionalmente
uma língua estrangeira. Basta observar uma criança brasileira ad-
abordadas nos livros sobre ensino e aprendizagem de inglês. Esse co-
quirindo português, labutando com fonemas, conjugações e concor-
mentário se deve ao fato de Larsen-Freernan (2003) propor uma quinta
dâncias para ter ideia do esforço por ela empreendido. Compreender
habilidade, que ela chama de grammaring e que diz respeito ao uso
o que ouvimos, expressar oralmente o que pretendemos, entender o
fluente e preciso da gramática. Apesar dos argumentos interessantes
que lemos e expressar por escrito o que pretendemos são atos cog-
que ela apresenta, considero a gramática como um elemento constitu-
nitivamente complexos, que exigem a mobilização de tipos distintos
tivo da língua e não como uma habilidade linguística.
de conhecimentos.
Bem, para tratar de cada uma das quatro habilidades nos próxi-
Contudo, podemos dividir as habilidades em dois grupos: as re-
mos capítulos, preciso fazer algumas considerações sobre uma confu-
ceptivas, i.e., a compreensão oral e a leitura, e as produtivas, i.e., a fala
são que toma conta da cabeça de muitos professores por causa de dois
e a escrita. Talvez alguém torça o nariz e, indignado, me faça estas
termos: estratégia e habilidade. Aliás, esses termos confundem não
três perguntas, assim em sequência, sem sequer respirar: "Receptivas?'
só a cabeça de professores, mas também a de vários autores, que os
Como assim receptivas?! Isso não dá no mesmo que falar passivas?!".
Certa vez, um estudante de letras me fez essas perguntas, indignado,
Caso você queira ler mais sobre a questão do estatuto teórico do significado literal
eom a revolta teórico-conceitual estampada em seus olhos. Ele prova- e do papel do leitor na produção de sentidos textuais, sugiro a leitura do sétimo capüulo
velmente estava influenciado por tudo o que ouvira e lera de teóricos de Manual de semântica (Oliveira, 2008).

46 Aula de inglês: do planejamento à avaliação CAPíTULO 2 I Sobre o ensino das quatro habilldntlu 4/
utilizam como sinônimos, o que demonstra a dificuldade de se diferen- se instaura entre o ensino búsico da língua e o treinamento no uso
ciarem estratégias de habilidades. Sobre esses dois conceitos, tecerei, de estratégias: se decidir realizar o treinamento sistemático dos seus
a seguir, algumas considerações para que possamos tratar dos conhe- alunos no uso de estratégias, o professor acabará tendo menos tem-
cimentos necessários para o desenvolvimento das quatro habilidades po para o ensino de inglês propriamente dito. Renandya cita Michacl
linguísticas. Na sequência, abordarei o conceito de esquemas mentais Swan para corroborar esse ponto:
e os processos de decodificação da informação. Finalizarei este capí-
Ao mesmo tempo em que o treinamento no uso de estratégias pode ser
tulo tratando da integração dessas habilidades.
útil e contribuir para a independência do aprendiz, ele pode ser levado
a extremos não construtivos; e tal treinamento não substitui o ensino
2.1 Pequena confusão conceitual: básico da língua (Swan, 2008 apud Renandya, 2012: 4).
estratégias ou habilidades?
Embora Renandya esteja falando especificamente do treinamento
o início dos anos1990 presenciou um modismo que tomou conta no uso de estratégias de compreensão oral, suas considerações são ex
de vários cursos de inglês no Brasil: o treinamento dos aprendizes no tensíveis ao treinamento dos aprendizes no uso das outras estratégias.
uso de estratégias. Havia a crença de que tal treinamento os levaria E essas duas razões explicam o declínio do interesse pelo treinamento
a níveis mais avançados de proficiência na língua inglesa. E a crença no uso de estratégias. Afinal, não apenas continuam inexistindo evi
continuou como crença, pois, até hoje, não há um estudo longitudinal, dências oriundas de pesquisas que comprovem a relação causal entre
não impressionista, que tenha sido feito para estabelecer uma relação esse treinamento e o desenvolvimento da proficiência, mas também
causal entre o desenvolvimento da proficiência e o treinamento no uso persiste a questão da alocação do tempo de aula.
de estratégias. Não por acaso, o interesse pelo treinamento no uso de Assim como Renandya, diversos outros teóricos contribuíram
estratégias arrefeceu, embora o termo estratégia tenha se mantido ra- com essa profusão de artigos e livros sobre estratégias. Que professor
zoavelmente popular entre professores de inglês, cristalizando-se em de inglês nunca ouviu falar de estratégias? O termo estratégia já foi ou
suas mentes. vido ou lido por quase todos, senão por todos os professores, mesmo
Em 2012, Willy Renandya publicou um artigo cujo título é bastan- que não saibam exatamente o que ele significa.
te instigante no que diz respeito à suposta utilidade do treinamento Curiosamente, muitos professores falam de estratégias, mas, na
de aprendizes com um baixo grau de proficiência no uso de estraté- maioria das discussões em torno do treinamento dos aprendizes no
gias de compreensão oral: "Five Reasons why Listening Strategy Ins- uso de estratégias, uma questão muito importante escorrega para o
truction Might not Work with Lower Proficiency Learners", A vagui- segundo plano e por lá fica, inerte e silenciosa: a definição de estra-
dade da frase lou: proficiency não pode ser ignorada aí, mas podemos tégia. É esse escorrego a causa da tal confusão na cabeça de profes-
intuitivamente considerar baixa proficiência aquela dos aprendizes sores que menciono no início deste capítulo. Por exemplo, a busca por
que se encontram nos níveis iniciantes e intermediários. Dentre as informações específicas em um texto e a inferência a partir de uma
cinco razões apresentadas, destaco duas. A primeira é a falta de evi- conversa são estratégias ou micro-habilidades? Depende. Há alguns
dência empírica de que o treinamento no uso de estratégias funcione. professores e teóricos que as consideram estratégias, enquanto ou-
De acordo com Renandya, há estudos que demonstram uma correla- tros as consideram micro-habilidades. Assim fica difícil, né?
ção entre o uso de estratégias e o nível de proficiência. Entretanto, O termo estratégia costuma ser usado com tanta inconsistên
"como correlação não é causação, não se pode dizer, com alto grau cia que encontramos definições como esta no site do National Capital
de certeza, que o uso de estratégias leve a uma proficiência elevada" Language Resource Center: "Estratégias de compreensão oral são téc
(Renandya, 2012: 3). A segunda razão é a competição por tempo que nicas ou atividades que contribuem diretamente para a comprecnsao

48 Aula de inglês: do planejamento à avaliação CAPíTULO 2 I Sobre o ensino das quatro hablliclfl(lI 4
recordação do input oral'". Conceber estratégias como técnicas ou que vocc já percebeu o problema aí, né? Em inglês, há duas palavras
atividades é difícil de aceitar. A mesma inconsistência marca o uso do que podemos traduzir como 'habilidade': skiLL e ability. O MacmiL/cttt
termo habiLidade. Eis uma definição, formulada por Debra Peterson I)ictionary define skiLL como sendo "the ability to do something weU,
(2014), que evidencia isso: "Uma habilidade de compreensão é uma ati- usuaLLy as a result of experience and training"3 e define ability como
vidade que os alunos realizam com o propósito de aprender aspectos sendo "the fact of being able to do somethínq'". Talvez isso aponte um
do texto como a ideia principal ou causa e efeito". Conceber habilida- aminho para traduzirmos a definição oferecida por Liu, se traduzir'
des como atividades é complicado e difícil de aceitar. Além do mais, mos skill como 'habilidade' e abiLity como 'capacidade': "Habilidade é a
se o propósito em questão é aprender algo, então estamos falando de apacidade que foi automatizada e que opera amplamente de maneira
estratégias e não de habilidades. inconsciente, enquanto estratégia é um procedimento realizado com o
Peter Afflerbach, Paul David Pearson e Scott Paris (2008: 364) di- objetivo de resolver um problema".
vulgaram os resultados de uma pesquisa sobre estratégias de leitura e Já Afflerbach, Pearson e Paris oferecem as seguintes definições d
habilidades de leitura que evidenciam essa inconsistência: "Os termos estratégias de leitura e de habilidades de leitura, reforçando o ponto
habilidades e estratégias são parte do vocabulário usado pelos profes- que defendo:
sores para descrever o que eles ensinam e o que as crianças aprendem.
Contudo, apesar do uso frequente no discurso profissional, os termos Estratégias de leitura são tentativas deliberadas e direcionadas a uma

são usados inconsistentemente". Acredito que a inconsistência decorre meta para controlar e modificar os esforços do leitor para decodifica r
o texto, entender as palavras e construir sentidos para o texto. Habili-
do fato de estratégias e habilidades estarem fortemente imbricadas,
dades de leitura são ações automáticas que resultam na decodificação rv
estreitamente relacionadas.
na compreensão com velocidade, fluência, e geralmente ocorrem sem a
E aí? O que fazer para evitar essa confusão terminológica? Fiquei
consciência acerca dos componentes ou controle envolvidos (Afflerbach;
pensando nisso e em como ajudar você a se situar nessa história. En-
Pearson; Paris, 2008: 368). I
tão, visitei alguns artigos na busca de posições mais esclarecedoras
sobre o tema e percebi que parece haver unanimidade quanto ao ele- Ao participarem da discussão acerca das estratégias e habili-
mento que diferencia estratégias de habilidades: o grau de consciên- dades, Afflerbach, Pearson e Paris (2008) não se limitaram a tentar
cia do indivíduo no momento de realizar atos linguísticos, como ler e diferenciá-Ias. Eles forneceram uma aproximação entre elas: o fato
escrever. Clark Chinn e Lisa Chinn (2014), por exemplo, afirmam que de o ensino das estratégias poder e dever levar os alunos a trans-
as habilidades são diferentes das estratégias "por serem realizadas de formarem-nas em habilidades, mais especificamente em micro-habi-
forma automática, enquanto as estratégias geralmente exigem que os lidades, em ações fluentes e automáticas. Em outras palavras, para
indivíduos pensem a respeito de qual estratégia estão usando". esses teóricos, as estratégias são ações planejadas e conscientes usa-
Liu (2010: 154) faz uma revisão da literatura sobre estratégias e
das por um indivíduo para atingir determinado propósito e as habi-
habilidades e chega à mesma conclusão, que transcrevo em inglês para
lidades são ações automáticas e inconscientes das quais o indivíduo
apontar outro problema termino lógico que enfrentamos ao lidar com
lança mão para atingir esse mesmo propósito. Consequentemente, no
essa discussão em português: "A skiLLis an ability which has been uu-
entendimento deles, uma mesma ação pode ser uma estratégia num
tomatized and operates largely subconsciously, whereas a strategy is
a conscious procedure carried out in order to solve a problem". Creio
Confira essa definição em: <http//www.macmillandictionary.com/dictionary/
american/skill#skill_ 4>; acesso: 5 jun. 2015.
Cf. o texto Strategies for Developing Listening Skills. Disponível em: <http.zywww. 4 Confira essa definição em: <http//www.macmillandictionary.com/dictionary/
nclrc.org/essentials/listening/stratlisten.htm>; acesso: 5 jun. 2015. american/ability#ability_5>; acesso: 5 jun. 2015.

50 Aula de inglês: do planejamento à avaliação CAPiTULO2 I Sobre o ensino das quatro habilidad !lI

\
momento do processo de aprendizagem e transformar-se numa habi- [...] é frequentemente difícil para os pesquisadores empregarem o rnéto
lidade num momento posterior do processo de aprendizagem por se do padrão de observação. Portanto, muito da pesquisa sobre as estraté-
tornar uma ação automática. gias de aprendizagem de línguas depende da boa vontade e da capacida-
Vejamos um exemplo disso. Um professor que dá aulas a uma tur- de dos aprendizes de descreverem seus comportamentos internos, tanto
ma de iniciantes ensina a seus alunos a buscarem informações espe- cognitivos quanto afetivos (emocionais).
íficas em um texto escrito. Ele lhes diz que devem ter claro em suas Em outras palavras, as pesquisas sobre estratégias não podem ser
mentes as informações que precisam localizar no texto para, então, realizadas por meio da observação direta porque estamos falando aqui
estabelecerem palavras-chave que servirão de norte para sua busca, de processos mentais. Por isso, elas dependem da boa vontade e da
mostrando-lhes ser desnecessário, nesse caso, ler o texto em sua to- capacidade dos aprendizes de falarem sobre tais processos. E isso não
Lalidade. Nesse momento, podemos afirmar que o professor está reali- é algo muito interessante para a credibilidade das pesquisas, embora
ando um trabalho de apresentar aos alunos uma estratégia de leitura. não as torne desmerecedoras de credibilidade.
Com o passar do tempo, espera-se que eles automaticamente sigam A impossibilidade de observação direta não é suficiente para ig-
esse plano de ação para buscarem informações específicas em um tex- norarmos o que já se pesquisou e escreveu sobre as estratégias. Pelo
to escrito. Se eles fizerem isso, podemos afirmar que aquela estratégia contrário, devemos aproveitar o que for útil para ajudar nossos alunos
se transformou em uma micro-habilidade. a aprenderem inglês da maneira mais eficaz possível. E isso se mate-
Em suma, fica claro que a questão da consciência e da automa- rializa no nosso planejamento de aula: sempre que houver uma opor-
ção é o que distingue estratégia de habilidade. Logo, é seguro afirmar tunidade, o professor deve incluir na sua aula um componente de trei-
que as estratégias representam intenções, processos deliberadamen- namento no uso de estratégias. Mas é importante não perder de vis-
te planejados, controlados e conscientes, enquanto que as habilidades ta que, embora viável, isso provoca uma competição por tempo entre
representam ações, processos automáticos e inconscientes. Creio que o treinamento sistematizado no uso de estratégias, que requer aulas
isso ajuda você a sair daquela confusão teórica. inteiras para ser realizado, e o ensino básico de inglês, que também
Contudo, embora muito se tenha pesquisado acerca da relação requer aulas inteiras. Por isso, o treinamento pode ser salutarmente
entre o treinamento no uso de estratégias e a proficiência no uso da incidental e acontecer nos momentos da aula em que seus alunos apre-
língua, e embora muito se tenha escrito sobre estratégias, há um pon- sentem alguma dificuldade que crie uma oportunidade para o profes-
to cego que não pode ser desconsiderado: a natureza escorregadia do sor falar sobre uma estratégia útil para superar tal dificuldade.
conceito de estratégia por não estar sedimentado em uma fundamen- Nas discussões sobre estratégias, geralmente elas são divididas em
tação teórica sólida. Sima Khezrlou (2012: 50), citando Peter Skehan e metacognitivas e cognitivas. Jennifer Livingston (2014) define estraté-
Zóltan Dõrnyeí, lembra que "é questionável a possibilidade de as estra- gias metacognitivas como os "processos sequenciais que um indivíduo
tégias cognitivas serem determinadas em termos de comportamentos usa para controlar atividades cognitivas e assegurar que uma metacog-
observáveis, específicos e universais que poderiam ser ensinados ou nitiva (e.g., entender um texto) seja atingida. Esses processos ajudam a
avaliados". Khezrlou (2012: 51) complementa: "A ambiguidade e a vaguí- regular e a supervisionar o aprendizado e consistem no planejamento e
dade que marcam a natureza das estratégias de aprendizagem de lín- no monitoramento de atividades cognitivas e na verificação dos resul-
guas leva a uma controvérsia a respeito dos vários modos de percebê- tados dessas atividades". Já Chinn e Chinn (2014) definem estratégias
-Ias em diferentes tarefas sob condições diversas". Rebecca Oxford e cognitivas como os "processos mentais ou procedimentos usados para
Judith Burry-Stock (1995: 153), defensoras notórias do treinamento no atingir uma determinada meta cognitiva". Grosso modo, podemos r"-
LISO de estratégias, não negam esse problema: sumir essas definições desta forma: as estratégias metacognitivas suo

Aula de inglês: do planejamento à avaliação CAPíTULO 2 I Sobre o ensino das quatro habillclll(lu !l,
empregadas pelo aprendiz para garantir que as estratégias cognitivas A organização do vocabulário é um exemplo de estratégia cogní-
por ele empregadas sejam bem-sucedidas. Já as estratégias cognitivas tiva essencial para a internalização de itens lexicais. Quando comecei
S<lO aquelas empregadas por ele para aprender com sucesso. a estudar inglês, eu tinha um caderno em que organizava listas de pa-
A busca consciente de oportunidades de aprendizagem e de prá- lavras por categorias semânticas. No período de recesso e nas férias,
tica é um exemplo de estratégia metacognitiva. Há aprendizes que eu visitava as listas e as traduzia para saber se lembrava de tudo. Fiz
têm a iniciativa de procurar tais oportunidades, mas há aqueles que isso durante quatro anos, o que me ajudou muito a internalizar itens
acreditam que apenas ir às aulas basta para aprenderem inglês. É aí lexicais. Entretanto, há aprendizes que não sabem que organizar o vo-
que o professor entra em cena, sugerindo a seus alunos que busquem cabulário ao qual são apresentados e revisá-lo sistematicamente são
oportunidades como, por exemplo, atividades extras que o instituto de estratégias importantes para seu aprendizado. Por isso, o professor
idiomas ofereça: aulas de conversação e de música; eventos em que a precisa orientar seus alunos a fazerem isso.
língua inglesa seja utilizada; o uso da legenda em inglês ou a retirada Outro exemplo de estratégia cognitiva é o resumo de conteú-
da legenda de filmes e séries a que assistem em casa. Ao fazer isso, ele dos. Manter um caderno em que se coloquem resumos dos assuntos
ajudará aqueles alunos que não têm consciência da importância dessa gramaticais estudados e das informações sobre os gêneros textuais
estratégia a se tornarem conscientes delas. estudados é importante para a fixação dos assuntos no momento de
Outro exemplo de estratégia metacognitiva é o planejamento para revisá-los. E a revisão estruturada é outra estratégia cognitiva. O pro-
fessor tem o papel importante de incentivar seus alunos a tomarem
a realização de tarefas. O professor precisa orientar seus alunos acerca
conhecimento dessas estratégias.
de como estudar para melhor aproveitar o curso de inglês. Ele pode
Um último exemplo de estratégia cognitiva é a repetição de pala-
lhes sugerir, por exemplo, que reservem um tempo todo dia para as
vras e frases, algo importantíssimo para o desenvolvimento da fluência
atividades extrac1asse e que sempre tenham em mente um objetivo na
do aprendiz. Obviamente, isso é algo a ser feito fora da sala de aula
realização de leituras e na produção textual.
como parte do seu aprendizado. De novo, vem à tona o caso dos alu-
O monitoramento do desempenho e a avaliação da aprendizagem
nos que acreditam que só precisam ir às aulas para aprenderem inglês
são outros exemplos de estratégias metacognitivas. Eu tive um aluno
e, assim, acabam não usando o tempo fora da aula para intensificar o
particular que estava se preparando para realizar o TOEFL. Eu costu-
processo de aprendizagem. E o professor precisa conversar com seus
mava lhe designar atividades para casa. Ele não apenas era disciplina-
alunos sobre essa estratégia cognitiva.
do, pois realizava todas elas, como também lançava mão dessas estra-
Creio serem suficientes, para nossos propósitos, as considerações
tégias metacognitivas. Ele me dizia sempre na aula seguinte: "Fiz essa
que teci até aqui. Os capítulos 3, 4, 5 e 6 tratam, cada um, de uma das
atividade, acertei tantas questões e errei tantas questões. Entendi por quatro habilidades linguísticas e, neles, abordo algumas micro-habi-
que errei as questões tal e tal, mas ainda tenho dúvidas sobre isso e lidades envolvidas em cada uma delas, mas evito falar de estratégias.
aquilo". Era fantástica a autonomia dele. A seguir, discuto outra questão muito importante: os tipos de co-
Infelizmente, muitos aprendizes não são assim - alguns, por pre- nhecimentos necessários para que os aprendizes desenvolvam as qua-
guiça e falta de vergonha acadêmica na cara; outros, por não terem tro habilidades linguísticas.
consciência dessas estratégias. Eu já tive alunos para quem perguntei
como estavam indo no curso que me responderam: "Você é que é o
2.2 Conhecimentos necessários para o desenvolvimento
professor. Você é quem tem de dizer como eu estou". Novamente, é aí
das quatro habilidades
que o professor entra em cena, reservando uma aula ou parte de algu-
mas aulas para ajudar seus alunos a se tornarem conscientes da neces- Começo esta seção com uma pergunta: o que significa: 0tJ.t.J!)
sidade de eles próprios monitorarem e avaliarem seu aprendizado. cn.tMld:W-r'-g-;fn? Não sabe? Hum ... E se eu colocar isso em letras do

1'4 Aula do inglês: do planejamento à avaliação CAPíTULO 2 I Sobre o ensino das quatro hnbllldlltlUA Ia
nosso alfabeto'? Vejamos: AnaLa no o namae wa nan desu ka? Se, por têm mais chances de tomarem a iniciativa para criarem oportunidades
acaso, você continua sem saber o que isso significa, eis uma pergunta de aprendizagem. Conforme vimos na seção anterior, o professor tem
que significa basicamente a mesma coisa, em outra língua, que pode o importante papel de motivar seus alunos a utilizarem estratégias
ajudar você: KaKsac 30ByT?Se isso não ajuda, eis a forma de dizer a cognitivas que contribuam para a construção de seus conhecimentos
mesma coisa numa terceira língua: Wie heifien Sie? E aí? Sabe o que linguísticos, como, por exemplo, a elaboração de listas de palavras e
ssas perguntas significam? de expressões idiomáticas, o uso de gramáticas pedagógicas e o uso
Minha intuição me diz que algumas leitoras e alguns leitores sa- de dicionários para o aprendizado da pronúncia (algo que atualmente
bem que essas perguntas equivalem a What's your name? em japonês, é facilitado pelos dicionários online, que disponibilizam não apenas os
em russo e em alemão respectivamente. Vou além e arrisco-me a afir- significados e a transcrição fonética das palavras, mas também o áudio
mar que a maioria das leitoras e dos leitores deste livro não sabia disso. de sua pronúncia).
E essa maioria não sabia por uma razão específica: ela não possui os Não há dúvida da importância do papel dos conhecimentos lin-
CONHECIMENTOS LINGUÍSTICOS necessários para decodificar pala- guísticos no desenvolvimento da competência comunicativa do apren-
vras escritas em japonês, em russo ou em alemão. diz. Contudo, tais conhecimentos são insuficientes: mesmo os apren-
Os conhecimentos linguísticos englobam os conhecimentos se- dizes com alto grau de conhecimentos linguísticos podem ter dificul-
mânticos, lexicais, morfológicos, sintáticos e fonológicos acerca de de- dades para compreender ou para produzir um texto falado ou um tex-
terminada língua. Isto é básico: sem conhecimentos linguísticos sobre to escrito. E por que isso acontece?
uma língua, a pessoa não consegue ler, escrever, falar ou compreender Vejamos um exemplo que pode nos indicar o caminho de respos-
enunciados produzidos nessa mesma língua. Nenhum professor de in- ta a essa pergunta. Imaginemos que o texto a seguir, retirado de um
glês há de discordar disso. material de divulgação da empresa havaiana Snorkel Bob, disponível
Obviamente, um cidadão japonês, um russo e um alemão ou um no site <www.snorkelbob.corn>, seja apresentado a aprendizes de nível
austríaco, mesmo sendo analfabetos, entenderiam, respectivamente, avançado que vivem em uma pequena cidade interiorana e que nunca
cada uma das perguntas no primeiro parágrafo se as ouvissem. Isso tiveram a oportunidade de viajar a uma cidade litorânea:
quer dizer que uma pessoa analfabeta tem conhecimentos linguísticos
para compreender textos falados e para falar, mas não possui conhe-
Welcome to snorkelbob.com and the best masks, fins and
cimentos linguísticos para ler ou escrever. Portanto, podemos pensar
snorkels in the world. You want to make reservations here for
em graus de conhecimentos linguísticos, que, por sua vez, indicam ní- your Hawaii adventure too? Worry not!
veis distintos de competência comunicativa. Por exemplo, um turista
que esporadicamente vai à Inglaterra precisa ter um grau de conheci- My masks, fins and snorkels come from decades of testing in the
mentos da língua inglesa inferior ao grau de conhecimentos da língua largest research facility on Planet E.YES! I, Snorkel 8ob, learned
inglesa que um aprendiz precisa ter para fazer o doutorado em uma what to do from 3 million snorkelers through the 80's and 90's
universidade britânica. and OO's.These mask skirts are crystal sili-
É importante o professor ajudar seus alunos a se conscientizarem cone - surgical grade! I, Snorkel 8ob, can
do papel que os conhecimentos linguísticos desempenham na cons- spend a clam or 2 more and STILL build
trução da competência comunicativa. Afinal, quanto mais palavras e cheaper than the mass producers - like,
estruturas sintáticas eles internalizarem e aprenderem a usar, mais say, U.S. Divers building for Costco. Do
conseguirão entender textos falados e escritos e mais conseguirão ex- you really want to snort seawater and call
pressar-se oralmente e por escrito. Tendo consciência disso, os alunos it economical? Or would you rather have a SUMOTM

6 Aula de inglês: do planejamento à avaliação CAPíTULO 2 I Sobre o ensino das quatro hobilidados 57
m.isk that WOf1'tyellow, that will stay solt as silk and snug your snorkeltcnha originado o estrangeirismo snorkel, já parte integrante
muo with hardly an oz of pressure? do vocabulário do português brasileiro e que já está dicionarizado,
Did I, Snorkel Bob, mention high-density polymers, no pvc,
os alunos que não sabem o que é mergulho de snorkel encontrariam
compression-molded sub-frames (c-m s-f) and Optic sphero-
dificuldades para entenderem o texto de Snorkel Bob, um empresário
sis (Os)? AND I, Snorkel Bob'll warrant these masks for 2 years
havaiano.
(save your receipt). At 2 feet or 200, the SUMOTM, SEAMOTM,
Esses mesmos alunos provavelmente teriam dificuldades para
MIDMOTM, SEAMO BETIATM and LI'L MO BETIATM top the mo- compreender um texto falado, como o diálogo que apresento a seguir,
dality graphs. NOBODY GIVES YOU MORE BANG FOR YOUR
por falta de conhecimentos linguísticos e enciclopédicos:
BUCK THAN ME, SNORKEL BOB! THE-
SE MASKS WILL OUTLlVE YOU, EVEN IF - Hi, Sean.
YOU DON'T DROWN!
- Hey, dude. What's up?
MOFLEXTM Fins are simply the best per-
- Not much. I'm on my way to Molokai. l'rn going snorkeling.
forming snorkel fins anywhere. And the
I hear there's a lot of different fish and eels there.
patent pending MoflO2™ Snorkel feels
like breathing in a forest compared to - Oh, yeah. And the coral reefs there are awesome! You're
the stuffy elevator available with any ganna lave it. Have fun!
other snorkel. I, Snorkel Bob, have no re-
MOFLEXTMFINS - Thanks, mano Take care.
ceptionist, no water cooler, no secretary
and no dictation. lt's only her, Catfish, and me, Snorkel Bob, get- - See ya.
ting it right with real value for you.

NOTE: Name brands sell at discount stores cheap as dirt, but


Os conhecimentos enciclopédicos englobam desde conhecimen-
it's garbage. Go to the top on any brand, and you'll see pricing
tos gerais até conhecimentos específicos de determinado campo de
20-40% higher than here - for tribute. Phooey, say I, SB. But
estudos. É curioso observar que, embora absolutamente nenhum pro-
enough of the nay say. Here is THE BEST from the only snorkel
fessor se esqueça do papel dos conhecimentos linguísticos nos usos
gear builder in the world a mere step & a stumble from the
da língua, há professores que se esquecem do papel que os conheci-
ching ch ching to the reef. Now who's gonna know what works
mentos enciclopédicos desempenham nesses usos. Quando esse es-
and what won't? quecimento ocorre, e os alunos sentem dificuldade para realizar uma
atividade pelo fato de ela focar um tema não familiar a eles, o professor
~M;~ deixa de entender a verdadeira razão pela qual eles sentem dificuldade
e acredita erroneamente que a dificuldade é causada pela falta de co-
Podemos prever as dificuldades que esses alunos teriam na leitu- nhecimentos linguísticos deles.
ra do texto causadas não apenas por falta de conhecimentos linguís- Agora imaginemos uma turma de nível ainda mais avançado. Me-
Licos relacionados a itens lexicais pouco frequentes para os apren- lhor: imaginemos um grupo de professores de inglês, fluentes, com
dizes brasileiros como snug, OZ, high-density polymers, compression- um elevado nível de proficiência. Você faz parte desse grupo, ao qual
molded sub-frames, Opctic spherosis e ching ch ching, mas também eu solicitarei que escreva um exemplo dos seguintes gêneros textuais:
por falta de CONHECIMENTOS ENCICLOPÉDICOS. Embora a palavra biU of sale, prenuptial agreement, power of attorney, research prOT)()SIII.

8 1\1110do inglês: do planejamento à avaliação CAPíTULO 2 I Sobre o ensino das quatro hnllllldllclll6 59
lntuitivamcntc, posso afirmar que os professores leriam dificuldad o professor precisa preparar seus alunos para ela. Abordarei isso deta-
('111redigir a maior parte desses gêneros. E por que haveria dificulda- lhadamente nos capítulos dedicados a cada uma das habilidades, mas,
de para a produção desses gêneros? Seria por faltar aos professores a seguir, trato de dois elementos fundamentais para o ensino das qua-
rn questão conhecimentos linguísticos ou conhecimentos enciclopé- tro habilidades: os esquemas mentais e os processos de decodificação
dicos? Não exatamente. A razão residiria na falta de CONHECIMEN- da informação.
TOS TEXTUAIS dos professores, os quais englobam os conhecimentos
acerca dos gêneros textuais e dos elementos de textualidade. Afinal,
2.3 Esquemas mentais e os processos de decodificação
para que possam redigir, por exemplo, powers of attorney ou research
da informação
proposals, eles precisam estar familiarizados com a estrutura, a lin-
guagem prototípica e a função social desses dois gêneros textuais. A No filme Como se fosse a primeira vez, Lucy Whitmore, a perso-
lógica inversa se aplicaria se eu solicitasse a esses professores que re- nagem interpretada por Drew Barrymore, tem um problema curioso:
digissem gêneros mais frequentes como, por exemplo, personalletters, após sofrer um acidente de carro em que leva uma pancada na cabeça,
notes e essays, ou produzissem gêneros orais mais frequentes como, passa a sofrer de um tipo de amnésia que a faz esquecer os aconteci-
por exemplo, jokes, fairy tales e urban legends. E seria inversa essa ló- mentos do dia anterior. Já pensou se nós simplesmente nos esquecês-
gica exatamente pelo fato de tais professores provavelmente terem os semos das coisas que aprendemos no dia anterior, se não armazenás-
conhecimentos textuais necessários para produzirem esses gêneros. semos os conhecimentos que construímos e tivéssemos de aprender
Um ponto importante a ser esclarecido aqui é a separação teórica tudo novamente a cada dia? Seria terrível; seria um verdadeiro traba-
que faço entre os três tipos de conhecimentos, que juntos constituem lho de Sísifo.
os CONHECIMENTOS PRÉVIOS dos usuários da língua. Tal separação Felizmente a realidade é mais generosa com a gente, pois os co-
é um artifício analítico que facilita a apresentação de cada um deles. nhecimentos que construímos ao longo da vida não se perdem: eles
Que fique claro que os conhecimentos linguísticos, enciclopédicos e ficam armazenados em nossas mentes. E esse armazenamento ocor-
textuais entrelaçam-se, imbricam-se e são mobilizados simultanea- re na forma de ESQUEMAS MENTAIS (ou apenas ESQUEMAS)5, que,
mente pelo usuário da língua no momento da recepção e da produção segundo George Yule (1996: 85-86), são estruturas de conhecimentos
de textos. É possível, portanto, perceber que os conhecimentos enci- preexistentes na memória. O termo preexistente aí tem como ponto de
clopédicos implicam conhecimentos linguísticos e conhecimentos tex- referência o ato da recepção ou da produção do texto.
tuais a eles relacionados. Por exemplo, uma advogada conhece gêneros A estruturação dos conhecimentos na mente é objeto de estudo
textuais como petição, contestação e sentença, e domina o jargão ne- da teoria dos esquemas. Chris Anson, Ellen Bommarito e Jeffrey Deu-
cessário para elaborar textos que circulam na forma desses gêneros ser (1983: 197) citam Frederic Bartlett, psicólogo que propôs essa teoria
na esfera jurídica. Em suma, os tipos de conhecimentos são acionados nos anos 1930, para esclarecer um ponto importante: nosso passado é
simultaneamente pelos usuários da língua inglesa. "representado em esquemas: massas ativas e organizadas de informa-
Entretanto, apesar dessa imbricação, durante o planejamento ções em constante desenvolvimento". Em outras palavras, os esquemas
das aulas, o professor precisa considerar cuidadosamente a possibi- mentais são estruturas dinâmicas. Concebê-los dessa forma é impor-
lidade de a falta de um tipo de conhecimento dificultar a realização tante porque isso mostra que os conhecimentos que vamos construin-
das atividades que objetivam auxiliar os alunos a desenvolverem sua do ao longo do tempo podem alterar os esquemas mentais que possuí-
competência em cada uma das quatro habilidades. Essa consideração mos. Por exemplo, em meados dos anos 2000, mediei uma oficina d
é essencial para ele decidir se deve realizar certa atividade ou se deve
modificá-Ia para realizá-Ia ou se deve descartá-Ia. Decidindo realizá-Ia, Em inglês, schema (singular) e schemata (plural).

60 Aula de inglês: do planejamento à avaliação CAPiTULO 2 I Sobre o ensino das quatro habllid(l(lus
textos tendem a deixar de fora boa quantidade de informações, prcssu
aperfeiçoamento de professores do Estado da Bahia no Instituto Anísio
pondo que os leitores fornecerão os detalhes a partir de seus próprios
Tcixeira. Eu estava falando sobre esse tema e pedi aos cursistas que
squemas mentais.
me dissessem o que vinha às suas cabeças quando ouviam a palavra
funeraL. Eu estava querendo apenas dar um exemplo de um esquema O professor precisa orientar seus alunos a sempre considerarem
mental conhecido, FUNERAL, para mostrar-lhes a prototipicidade dos os esquemas mentais de seus interlocutores no momento de produ-
lementos que constituem os esquemas. Ouvi o que eu esperava: cai- zirem textos escritos e falados. E ele deve levar em consideração os
xão, defunto, cemitério, missa, velas, flores, choro, tristeza. E, curiosa- esquemas mentais dos seus alunos no momento de planejar suas aulas.
mente, ouvi o que eu não esperava, pois duas cursistas disseram que Pelo fato de os esquemas mentais serem dinâmicos e poderem
também vieram às suas mentes elementos como comida, bebida, ca- variar de pessoa para pessoa, podemos prever, mas sem poder garan-
fezinho, jogo de dominó, jogo de baralho e bate-papo, os quais não fa- tir, que os usuários da língua não mobilizarão exatamente as mesmas
iam parte do meu esquema mental FUNERAL. Eu estranhei aquelas res- informações que nós mobilizamos. Em outras palavras, os usuários da
postas. Porém, as duas cursistas me explicaram que é dessa forma que língua podem ter esquemas mentais construídos de maneiras dife-
os funerais acontecem na sua cidade de origem. Foi aí que finalmente rentes, o que os faz mobilizar informações mais ou menos diferentes
ntendi a expressão beber o defunto. E foi aí que o esquema mental ao ouvirem uma palavra que os remete a determinado esquema men-
FUNERAL que eu armazenara em minha mente modificou-se para aco- tal. Por exemplo, ao ouvir a palavra restaurant, a maioria dos falan-
modar aquelas novas informações, evidenciando a natureza dinâmica tes de inglês imediatamente ativa o esquema RESTAURANT, que os faz
dos esquemas mentais. mobilizar os elementos associados a esse esquema: waitress, waiter,
E o que os esquemas mentais têm a ver com o ensino das quatro menu, food, beverage, biH, tip, table, fork, knife, dish, dessert etc. A mo-
habilidades? Tudo. Anson, Bommarito e Deuser (1983: 197) explicam: bilização desses elementos é resultante das suas idas a restaurantes;
"Os esquemas mentais são moldados pelas experiências e, por sua vez, das imagens de restaurantes que viram em jornais, em revistas, no
guiam nossas percepções da experiência". Ora, isso precisa ser leva- cinema ou na TV; dos restaurantes sobre os quais leram ou ouviram
do em conta pelo professor no momento da preparação das suas aulas falar. Contudo, há pessoas socialmente excluídas que nunca foram a
porque seus alunos podem, por exemplo, produzir um texto com insu- um restaurante. Embora algumas delas possam ter construído o es-
ficiência ou excesso de informações por não levarem em consideração quema RESTAURANT indiretamente por meio de filmes e anúncios pu-
os prováveis esquemas mentais dos leitores ou ouvintes dos seus tex- blicitários, outras podem não possuir esse esquema mental. Daí eu
tos, por não saberem que devem levar em consideração a possibilidade falar em tendência.
de seus leitores e ouvintes perceberem a realidade ou aspectos da rea- Obviamente, os elementos que compõem um esquema mental são
lidade de maneira diferente das suas. E eles não levam isso em consi- prototípicos. No caso do exemplo anterior, isso significa que pessoas
deração por não saberem que só podemos produzir textos adequados com pouco dinheiro, que já foram a restaurantes compatíveis com sua
se nos esforçarmos para prever quais são os prováveis esquemas men- renda, possuem uma ideia de restaurante diferente daquela que pesso-
tais dos leitores ou ouvintes, ou seja, se nos esforçarmos para prever as ricas possuem, embora os elementos gerais e prototípicos do esque-
omo os receptores dos nossos textos concebem suas experiências de ma RESTAURANT estejam presentes nos seus esquemas: menu, chairs,
mundo. Anson, Bommarito e Deuser (1983:197)deixam isso claro: tuble, waiter, waitress, food, beverage, dessert, biU, tip etc. Dessa for-
ma, por exemplo, beverage pode fazer vir à mente uma marca cara d
[...] quando recebemos novas informações, temos uma impressão geral
champanhe ou uma cerveja barata; menu pode fazer vir à mente uma
delas e, então, construímos os detalhes prováveis baseados nos esque-
mas mentais que construímos a partir das nossas experiências. Essa
folha de papel manuscrita ou um conjunto de páginas plastificadas
habilidade é especialmente importante na leitura e na escrita, pois os encadernadas em couro. Enfim, como cada indivíduo cresce e convive

(j 1\11111
do mglôs: do planejamento à avaliação
CAPiTULO 2 I Sobre o ensino das quatro habllldodos
numa determinada comunidade sociocultural, os esquemas das pesso- ativam esquemas mentais e permitem aos tcítorcs compreenderem ()
as pertencentes à comunidade A podem ser mais ou menos diferentes texto". É por conta dos esquemas mentais que construímos acerca do
dos esquemas mentais das pessoas pertencentes à comunidade B. gênero textual "discurso de formatura" que as pessoas presentes a uma
Imaginemos que uma estudante, Penny, produza este enunciado formatura estranham quando faço um discurso em cordel. Similar-
em um e-maii enviado para uma colega, Amy, que acaba de conhecer mente, os leitores da revista Veja sentiriam um estranhamento inco-
num curso de educação a distância na Califórnia: "Yesterday morning mensurável se lessem um artigo de opinião favorável a Luiz Inácio Lula
I drove to Berkeley, which is near my hometown". Penny não precisa es- da Silva por causa do viés conservador de direita dessa revista.
crever detalhes como estes: I woke up. I took a shower. I had breakfast. Para outros teóricos, os esquemas mentais também englobam
I changed. I grabbed my purse and the car key. I opened the caro I got in conhecimentos linguísticos. Isso é o que ressalta Ya-Jun Zeng (2007:
the caro I started the car and drove to a city called Berkeley, which is not 33-34): "Os esquemas envolvidos na compreensão oral podem ser cate-
the city where I tive, which is located in the state of California, which is gorizados em dois tipos maiores: o esquema de língua e o esquema de
near the city where I was born. E ela não precisa escrevê-los porque ela conhecimento". Fica evidente que o "esquema de língua" corresponde
supõe que Amy já possui os esquemas mentais MORNING, GET UP, TRAVEL, aos esquemas mentais que estruturam os conhecimentos linguísticos,
DRIVE, HOMETOWN e BERKELEY: por mais diferenças pontuais que esses i.e., lexicais, semânticos, fonológícos, morfológícos e sintáticos, e que
esquemas possam apresentar na cabeça de Penny e na cabeça de Amy, "esquema de conhecimento" corresponde aos esquemas mentais que
eles compartilham elementos prototípicos semelhantes que permitem estruturam os conhecimentos enciclopédicos.
um entendimento relativamente previsível da interpretação do enuncia- Portanto, podemos falar de esquemas de conteúdo, esquemas for-
do de Penny por parte de Amy. Além disso, Penny não precisa explicar mais e esquemas linguísticos porque os tipos diferentes de conhecimen-
que a palavra drove implica que ela foi de carro e que foi ela quem dirigiu tos são estruturados na nossa memória de longo prazo para que fiquem
o carro, algo expresso pelo pronome I. Afinal, ela espera que essa infor- à nossa disposição no momento da recepção e da produção de textos.
mação linguística faça parte dos esquemas mentais da sua nova colega. De qualquer forma, enfatize-se que, geralmente, quando se fala de es-
Os esquemas mentais estão estreitamente relacionados aos co- quemas mentais, está-se falando dos conhecimentos enciclopédicos que
nhecimentos enciclopédicos. Não por acaso, quando se fala de esque- um indivíduo possui estruturados em sua memória de longo prazo.
mas mentais, muitos teóricos os relacionam automaticamente a eles. Em suma, as atividades que o professor leva para a sala de aula
Entretanto, para alguns teóricos, os esquemas mentais não se relacio- para auxiliar seus alunos a desenvolverem suas habilidades linguísticas
nam apenas a esse tipo de conhecimento. Nigel Scott (2001), por exem- podem causar dificuldades para os alunos se eles não possuírem os es-
plo, nos informa que os esquemas mentais podem ser divididos em dois quemas mentais relacionados aos temas abordados nessas atividades,
tipos: os esquemas de conteúdo, relacionados aos conhecimentos en- aos gêneros textuais que elas trazem e aos elementos linguísticos que
ciclopédicos, e os esquemas formais, relacionados aos conhecimentos elas contêm. No que diz respeito aos conhecimentos enciclopédicos,
textuais ou conhecimentos das estruturas retóricas. Scott cita John essa dificuldade se potencializa porque os livros didáticos usados nas
Swales para lembrar que, ao abrirem um jornal ou uma revista científi- aulas de inglês costumam ser publicados em outras culturas diferentes
ca, as pessoas esperam encontrar determinados gêneros textuais e es- das culturas dos aprendizes brasileiros. Por essa razão, uma ação da
peram não encontrar outros gêneros textuais. É por isso que, se abrir- qual o professor não pode abrir mão é a preparação dos alunos para a
mos uma revista científica e encontrarmos um anúncio publicitário realização das atividades voltadas para o desenvolvimento das quatro
de uma marca de cerveja, teremos um grande estranhamento. Ainda habilidades. Falarei delas com mais atenção nos próximos capítulos.
citando Swales e Scott (2011)lembra que o processo de leitura "envolve Estreitamente vinculados aos esquemas mentais estão os dois Li-
a identificação do gênero, da estrutura formal e do tópico, os quais pos de processamento cognitivo das informações que ocorrem nos atos

64 Aula de inglês: do planejamento à avaliação CAPiTULO 2 I Sobre o ensino das quatro habilidad s
de leitura e de compreensão oral: o PROCESSAMENTOASCENDENTE .ultural comum e acabam criando urna interpretação coerente com ele
ou BOTTOM-UP, aquele em que o leitor se baseia nos seus conhecimen- num texto que potencialmente não permite tal ínterpretaçào.
tos linguísticos para processar as informações, e o PROCESSAMENTO Em 2010, a rede de TV estadunidense CNN mostrou um trecho de
DESCENDENTEou TOP-DOWN, aquele em que o leitor se baseia em uma entrevista em que o comediante Sasha Cohen (aquele que inter-
seus conhecimentos enciclopédicos e textuais para processá-Ias. preta o personagem Borat Sagdiyev) pergunta a Buzz Aldrin, segun-
Mary Kato (1999: 60) traz uma adaptação de um texto original- do homem a pisar na Lua, acerca dos seus sentimentos em relação ao
mente publicado em inglês para testar que tipo de processamento o primeiro homem a pisar lá, tentando confundi-lo: "Do you envy Louis
leitor usa na leitura. Transcrevo esse texto a seguir, pois ele serve para Armstrong?". Mas, o ex-astronauta percebeu a pegadinha e não con-
ilustrar a diferença entre o processo descendente e o processo ascen- fundiu o ex-músico com seu ex-colega Neil Armstrong.
dente no ato interpretativo: Esses dois exemplos servem para evidenciar como os processos
de decodificação funcionam. No caso da quantidade de animais na
Um avião americano que voava de Boston para Vancouver caiu exata-
arca, as pessoas que respondem "Tuio" privilegiam o processamento
mente na fronteira entre os Estados Unidos e o Canadá. Em que país os
descendente e não realizam um processamento ascendente. Se o rea-
sobreviventes devem ser enterrados?
lizassem, perceberiam que a palavra Moses está ocupando o lugar na
Apresentei este texto no I Encontro de Leitura e Escrita do Cam- sentença que deveria estar preenchido pela palavra Noah e descobri-
pus XV da Universidade do Estado da Bahia em 2007, em Valença, e riam o engodo. Já Buzz Aldrin foi mais esperto: não se deixou levar
houve participantes que acharam que os sobreviventes deveriam ser automaticamente pela pergunta frequente sobre a suposta inveja que
enterrados no Canadá, outros acharam que eles deveriam ser enter- sentiria do primeiro homem a pisar na Lua e realizou um processa-
rados nos Estados Unidos e outros questionaram a possibilidade de se mento ascendente, detectando a palavra Louis no lugar da sentença
enterrarem sobreviventes. As reações foram divertidas e, principal- em que deveria estar a palavra NeiL
mente, elucidativas. Zeng (2007: 33) resume a maneira como os dois tipos de processa-
As respostas favoráveis ao enterro dos sobreviventes num ou nou- mento cognitivo da informação ocorrem no ato da recepção linguística:
tro país vieram de leitores que se basearam exclusivamente nos seus Ao encontrarem-se sinais explícitos ou estímulos no meio ambiente (tais
conhecimentos enciclopédicos para responder a pergunta, ou seja, como sons ou imagens), o processamento ascendente é aplicado para
realizaram apenas o processamento descendente. Eles ativaram o es- reunir informações relacionadas à fonologia, ao léxico, à sintaxe e à gra-
quema mental ACIDENTE DE AVIÃO e concluíram, de maneira lógica, que mática para construir um entendimento do que é percebido. Entretanto,
todos os passageiros e tripulantes morreram na queda. Aqueles que o processamento descendente utiliza as experiências e os conhecimen-
questionaram a possibilidade de se enterrarem os sobreviventes foram tos prévios (esquemas mentais) para predizer, filtrar, analisar e interpre-
os leitores que realizaram os dois tipos de processarnento, sendo o as- tar as informações recebidas.
cendente aquele que os fez refletir sobre a pista linguística no texto, Os aprendizes de inglês, principalmente os que se encontram
i.e., a palavra sobreviventes, e se perguntarem: "Oxe! Como assim? En- nos níveis iniciais, tendem a se concentrar nos estímulos linguísticos
terrar sobreviventes?" no momento de realizarem atividades de leitura e de compreensão
George Yule (1996:85) comenta sobre a seguinte pergunta do tipo oral. Ou seja, eles tendem a lançar mão do processamento ascen-
pegadinha: "How many animals of each type did Moses take on the Ark?". dente e a negligenciar o processamento descendente. E isso não é
Ao lerem ou ouvirem essa pergunta, muitas pessoas tendem a respon- interessante, pois os usuários de inglês bem-sucedidos nos atos de
der automaticamente "Tuio", sem prestar muita atenção às palavras que interpretação textual tendem a lançar mão dos dois tipos de proces-
a compõem. Para Yule, essas pessoas acessam algum conhecimento samento da informação.

66 Aula de inglês: do planejamento à avaliação CAPíTULO 2 I Sobre o ensino das quatro habilidades 6
Por essa razão, o professor precisa incluir no seu planejamento maneira estanque, scgrcgacionista? l lá, sim. Robin Scarcclla (' Rdw('(';t
das aulas atividades de pré-leitura e de pré-compreensão oral para xford (1992) esclarecem que existem duas perspectivas a partir d'ls
ajudar seus alunos a ativar ou até mesmo a construir esquemas men- quais considerar o ensino das quatro habilidades: a segregaclonlstn (' .1
tais úteis para a realização das atividades de leitura e de compreensão integrativa. De acordo com as autoras:
oral. Nos próximos quatro capítulos, tratarei das atividades que visam
Muitos programas de inglês como segunda língua tradicionalmente St'
preparar os aprendizes para a realização de atividades especificamen-
gregam as habilidades linguísticas para fins instrucionais, frequente
te voltadas para o desenvolvimento da fala, da compreensão oral, da mente destacando apenas uma habilidade de cada vez. Assim, Ircqucn
leitura e da escrita. temente encontramos cursos de inglês como segunda língua rotulados
Do exposto até aqui, fica claro que o desenvolvimento das quatro de "Intermediate Reading", "Advanced Writing" ou "Basic Listening". Essa
habilidades linguísticas depende tanto de conhecimentos linguísticos forma de instrução - incluindo a elaboração do sylLabus, a organizaçao
quanto de conhecimentos enciclopédicos e conhecimentos textuais. do currículo e o nivelamento dos alunos - é geralmente baseada em
Consequentemente, o professor deve sempre tentar prever dificulda- decisões administrativas e práticas em vez de ser baseada em uma teoria
des que seus alunos podem sentir pela falta de algo em um desses três conceitualmente sadia de ensino e aprendizagem de línguas (Scarccllu:
tipos de conhecimento. E uma forma de prever isso e de se preparar Oxford, 1992: 87).
para evitar ou minimizar possíveis problemas é a realização de ativi-
É possível pensar num caso em que uma habilidade seja o úni
dades de preparação para a realização de atividades voltadas para o
co foco das aulas. Refiro-me aos cursos de inglês instrumental" vol .
desenvolvimento das quatro habilidades. Os próximos quatro capítulos
tados para o desenvolvimento da leitura. Geralmente, o professor ll'a
serão dedicados ao ensino de cada uma das habilidades e neles comen-
balha com textos falando em português sobre eles (e sobre vocabu
tarei essas atividades de preparação. Antes, porém, na próxima seção,
lário e gramática), o que faz com que os alunos não pratiquem nem a
preciso falar de algo importante sobre o ensino da leitura, da escrita,
compreensão oral, nem a fala, nem a escrita.
da compreensão oral e da fala.
Afora os cursos de inglês instrumental dessa natureza, realmente
há cursos rotulados a partir de uma habilidade que sugerem segr
2.4 A integração das habilidades gação. Entretanto, como lembram Scarcella e Oxford, na prática, essa
segregação não se concretiza ou se concretiza apenas parcialmente.
Pensei bastante se deveria incluir ou não esta seção. Acabei de-
Por exemplo, em um curso de Advanced Writing, o professor provavel-
cidindo pela inclusão e isso por duas razões. A primeira é o fato de os
mente dá instruções em inglês, o que leva os alunos a praticarem sua
professores de inglês costumarem ouvir falar, em Teachers' Training
compreensão oral, e provavelmente apresenta eventualmente algum
Courses (TTCs), da necessidade de levarem em consideração a integra-
texto escrito para sua leitura servir de base para a escrita sobre d
ção das habilidades no planejamento de suas aulas. Tal necessidade é
terminado tema. Em um curso de Advanced Conversation, o professor
enfatizada, é comentada, sem que geralmente se esclareça aos profes-
pode levar textos para serem lidos ou ouvidos e servirem de trampolim
sores a origem desse tema. A segunda razão é o fato de os capítulos
3, 4, 5 e 6 serem dedicados, respectivamente, à compreensão oral, à
leitura, à fala e à escrita, o que pode causar a impressão de que há uma 6 Note-se que o termo instrumentaL não é teoricamente apropriado para o ensino
de línguas porque traz subjacente a concepção de língua como instrumento de comu
segregação natural das habilidades, que uma não tem nada a ver com a nicação e não a concepção de língua como interação social. Conceber a língua como
outra, que cada uma deva ser tratada isoladamente. instrumento de comunicação implica considerá-Ia um código transparente e não um
fenômeno opaco, como Oswald Ducrot já esclareceu. Sobre essa questão, recomendo
Afinal de contas, por que a íntegração das habilidades é um tema? a leitura do primeiro capítulo do seu livro Princípios de semântica linguística (Dizer ('
Há quem proponha o ensino de cada uma das quatro habilidades de não dizer).

68 Aula de inglês: do planejamento à avaliação CAPíTULO 2 I Sobre o ensino das quatro habiliclncluR
para discussões sobre certo tema. Enfim, na prática, a scgregaçao aca- Finalmente, após lermos os diálogos em voz alta (sim, a leitura se limi-
ba nao se materializando nesses cursos. Luvaa isso), praticávamos a escrita no livro de exercícios.
Quanto à impressão de segregação que posso passar ao dedicar Podemos facilmente perceber a falha nessa ideia da segrega-
um capítulo a cada habilidade, ela é exatamente isto: uma impressão. ção das habilidades, pois os usos reais da língua envolvem, pelo me-
E uma impressão equivocada. Afinal, a separação teórica se justifica na nos, duas habilidades. Por exemplo, a fala de uma pessoa implica a
medida em que podemos nos concentrar em aspectos específicos de compreensão dessa fala por parte de outra pessoa - e as duas seguem
ada uma das habilidades para os analisarmos, o que não significa, in- usando as duas habilidades numa conversa. Também há muitas pesso-
sisto, que aspectos de uma habilidade não possam estar estreitamente as que comentam com outras acerca de algo que leram, sendo que esse
relacionados com aspectos de outra(s) habilidade(s). Aliás, vale lembrar comentário pode se dar oralmente ou por escrito. Você pode estar-se
que a fala e a escrita compartilham características por serem habili- perguntando: uma pessoa não pode falar sozinha, o que significa que
dades produtivas, assim como a compreensão oral e a leitura compar- não haveria compreensão oral envolvida aí? Sim. Isso é possível no caso
tilham características por serem habilidades receptivas. Por exemplo, de alguém estar diante do espelho ensaiando uma apresentação oral
quando os alunos realizam atividades para o desenvolvimento da com- para outras pessoas a ouvirem posteriormente ou no caso de alguém
preensão oral (ou da leitura) em que o professor os auxilia a lançarem estar vivenciando um episódio de loucura (mas, neste caso, quem ga-
mão da estratégia de predição e da estratégia de adivinhação cotextual, rante que a pessoa louca não esteja conversando com alguma entida-
eles acabam internalizando tais estratégias e utilizando-as no momen- de fantasmagórica?). Entretanto, raramente uma habilidade linguística
to de realizarem atividades de leitura (ou de compreensão oral). ocorre sozinha.
Algo que contribuiu para a ideia de se segregarem as habilidades Além disso, no que diz respeito a uma suposta sequência natural
linguísticas foi a suposta existência de uma ordem natural de aquisi- de aprendizagem de habilidades no caso da primeira língua, podemos,
ção das habilidades defendida por alguns métodos de ensino de lín- sim, aceitar, com reservas, que uma criança desenvolva primeiramente
guas estrangeiras. Um deles foi o método audiolingual, cujo princípio a a compreensão oral para depois desenvolver a fala e, depois, a leitu-
respeito da sequência das habilidades linguísticas a serem trabalhadas ra e a escrita. E por que digo "com reservas"? Simplesmente porque
em sala é esta: compreensão oral, fala, leitura e escrita. Essa sequência não podemos nos esquecer do fato de que, mesmo não sabendo ler, as
está lastreada na lógica da aquisição da língua materna: "Primeiro ou- crianças estão expostas a textos escritos que as circundam: outdoors;
vimos para depois falarmos; somente depois aprendemos a ler para, em rótulos de produtos; palavras escritas na TV quando sua mãe ou seu
seguida, aprendermos a escrever" (Oliveira, 2014: 100). Estudei em um pai estão assistindo a programas com ela no colo; palavras e frases es-
curso de inglês que seguia essa lógica (imagino que ainda a siga): pri- critas em camisetas e brinquedos; livros infantis e jornais a seu redor.
meiro, éramos apresentados aos sons da língua por meio de diálogos E ao começar a falar, a criança estará imersa em situações de intera-
ilustrados em slides e gravados em fitas de rolo; depois, praticávamos ção verbal em que utilizará a fala e a compreensão oral. Não há, enfim,
a pronúncia e realizávamos driHs. Perceba-se aí a ideia limitada do que um isolamento total, uma segregação completa das habilidades nem no
seja a fala, vista como um meio de internalização de estruturas grama- processo de aprendizagem da primeira língua.
ticais e de aperfeiçoamento da pronúncia. Somente depois disso é que Quanto ao processo de aprendizagem de inglês como língua es-
éramos autorizados a receber o texto impresso com os diálogos: nos- trangeira, a lógica da segregação das habilidades também não fa
so livro didático, produzido pela empresa que detém a franquia, vinha sentido, pois o brasileiro letrado "pode capitalizar os conhecimentos
com um ticket destacável para ser trocado pela unidade impressa com linguísticos que possui de português, mobilizando-os para aprender
os diálogos e com explicações gramaticais, o que nos forçava a não ter uma língua estrangeira e podendo aprender as quatro habilidades
contato com a forma escrita até o momento determinado para a troca. ao mesmo tempo" (Oliveira, 2014: 100). Ora, este é um fato básico ela

70 Aula de inglês: do planejamento à avaliação CAPíTULO 2 I Sobre o ensino das quatro habilldodo 71
'lprcnclií';ugcm de línguas: por mais que algum teórico teimoso queira
Vale lembrar que atividades sem o objetivo de prepará-los para outras
nos convencer do contrário, aprender a primeira língua não é a mesma
atividades podem servir como atividades "pré": basta que o professor
oisa que aprender uma língua estrangeira. Daí não ser automática e
consiga fazer uma conexão lógica entre elas.
imediata a analogia entre a sequência de aprendizagem das habilida-
De qualquer forma, vale registrar que o professor tem nas ativida-
des na primeira língua e a sequência de aprendizagem das habilidades
des "pós" excelentes oportunidades de promover a integração de ha-
numa língua estrangeira.
bilidades. Por exemplo, após realizar uma atividade de compreensão
Em suma, apesar de ser possível analisar o ensino de cada uma
oral, ele pode preparar uma atividade voltada para o vocabulário usado
das quatro habilidades separadamente, é extremamente raro se utili-
no texto, apresentando o tapescript impresso (ou em síides) para os
zar uma única habilidade sem envolver outra. Por essa razão, ao plane-
alunos. Uma atividade de leitura pode ser seguida por uma atividade
jar suas aulas, o professor deve sempre propor atividades que envolvam
de produção textual tendo como tema o mesmo abordado na atividade
pelo menos duas habilidades. É, por exemplo, o caso do ditado: con-
de leitura. Enfim, são várias as possibilidades que o professor tem para
forme nos explica Miguel Sánchez (2000: 30), "quando os procedimen-
promover a integração de habilidades nos estágios de pós-compreen-
tos do ditado são empregados para reprodução, duas habilidades estão
são oral, de pós-leitura, de pós-fala e de pós-escrita.
sendo exercidas ao mesmo tempo: compreensão oral e escrita".
Vamos agora ao próximo capítulo, que trata do ensino da compreen-
Miguel Sánchez ainda nos diz algo bastante útil: "O input linguís-
são oral.
tico deve ser usado como um trampolim para a produção dos alunos"
(Sánchez, 2000: 38). Assim, o professor pode planejar uma atividade
de compreensão oral seguida por uma atividade de fala e/ou de escri-
ta, ou uma atividade de leitura seguida por uma atividade de fala e/
ou de escrita. O corolário disso é que uma forma de promover a inte-
gração das habilidades é realizar, além das atividades especificamente
voltadas para o desenvolvimento de determinada habilidade, atividades
"pré" e "pós" que envolvam outra habilidade. Por exemplo, em inglês,
podemos pensar em pre-Listening activities e posHistening activities,
que envolvam fala, leitura ou escrita.
Nos próximos quatro capítulos, dedicados a cada uma das habili-
dades, haverá uma seção específica sobre o papel das atividades "pré",
mas não haverá uma seção especificamente voltada as atividades "pós".
Essa minha decisão se deve ao fato de as atividades "pré" estarem inevi-
tavelmente vinculadas às atividades de desenvolvimento da habilidade
em foco e ao fato de as atividades "pós" não o estarem necessariamen-
te. Assim, por exemplo, uma atividade de pré-compreensão oral deve
obrigatoriamente preparar os aprendizes para realizarem determinada
atividade de compreensão oral, mas as atividades do estágio de pós-
-compreensão oral podem focar algo apenas perifericamente relacio-
nado ao que foi abordado na atividade de compreensão oral, como, por
exemplo, o desenvolvimento do conhecimento lexical dos aprendizes.

72 Aula de inglês: do planejamento à avaliação


CAPíTULO 2 I Sobre o ensino das quatro habilidado 3
o ensino da
compreensão oral
ompreensão oral: "Processo de receber,
atentar para e atribuir sentido a estímulos
orais" (Scarcella; Oxford, 1992: 138). Ou seja,
a compreensão oral não se limita à percepção dos
sons, obviamente fundamental: ela também está
vinculada à atribuição de sentidos aos sons percebi-
dos, tarefa nada fácil para os aprendizes de línguas
estrangeiras.
Segundo Scarcella e Oxford (1992: 139), "muitos
peritos em ensino de línguas estrangeiras tradicio-
nalmente consideravam a compreensão oral como a
criada, a serva, a prima pobre das outras três prin-
cipais habilidades Iinguísticas: a leitura, a fala e a es-
crita". Não surpreendentemente, a compreensão oral
costumava ser vista como uma mera ferramenta para
o desenvolvimento das outras três habilidades, sen-
do, assim, negligenciada ao longo da história do en-
sino de línguas estrangeiras, de acordo com Michael
Rost (1994).Nobuko Osada (2004) reforça essa visão ao
lembrar que foi a abordagem comunicativa o método
que deu foco sistemático ao desenvolvimento da com
preensão oral, ressaltando que o método audiolingual
partia da ideia equivocada de que bastava expor o
aprendiz ao inglês falado para que ele desenvolvesse
sua habilidade de compreensão oral.

CAPITULO 3 I o ensino da cornpr auusuo uI1I1 1II


Iloje os professores sabem da importância da compreensão oral 3.1 O papel das atividades de pré-compreensão oral
para o desenvolvimento da competência comunicativa dos seus alu- 4 de abril de 2014. Quinta-feira. Uma de muitas audiências ('S
nos. Além disso, sabem que, das quatro habilidades linguísticas, a com- tava ocorrendo em uma sala do Senado do Tio Sam. Nessa audiência
preensão oral é seguramente a que apresenta mais dificuldades para a específica, dentre outras pessoas, estava o Subsecretário do Tesou ro,
maioria dos aprendizes brasileiros de inglês. E isso se deve, principal- David Cohen, aguardando para ser interrogado sobre questões relu
mente, mas não apenas, a uma razão específica: embora haja alguns cionadas ao... Tesouro. "Hum...", você deve estar-se perguntando, "...
aprendizes que se expõem ao inglês falado ao ouvirem músicas e ao isso não é óbvio?". Vejamos se isso é óbvio mesmo: adentra o recinto
assistirem a filmes e séries de TV, a maioria deles ouve palavras, frases o Senador Dan Coats. Cumprimenta todos os presentes, senta-se e
e textos falados em português quase o tempo todo e só fica exposta ao começa a fazer um discurso inicial elogiando a brevidade com que seu
inglês falado nas aulas, que costumam ocorrer duas vezes por semana departamento respondeu a uma carta do escritório de contabilida
durante 100 minutos cada vez, sendo que apenas parte desse tempo é de militar sobre assuntos relacionados aos veteranos de guerra. Pera í!
feita de inglês falado. Ora, quanto menos nós nos expomos ao inglês Como assim?! Veteranos de guerra?! O que assuntos relacionados aos
falado, mais lentamente desenvolvemos nossa habilidade de compre- veteranos de guerra têm a ver com o Tesouro norte-americano? Nada,
ensão oral. Simples assim. né? Por essa razão, o que o senador estava dizendo não era nada óbvio
Obviamente, outros fatores desempenham papéis fundamentais para as pessoas ali presentes. Em outras palavras, elas não estavam
no processo de desenvolvimento da compreensão oral dos aprendi- conseguindo produzir sentidos que formassem um todo lógico a par
zes de inglês, como, por exemplo, o vocabulário, os elementos fo- tir da fala dele.
nológicos e as estruturas sintáticas que eles dominam ou não do- O problema é que Coats achava que estava na sala em que ocor
minam; os assuntos com os quais estão ou não familiarizados, ou reria a audiência do Subcomitê de Agências Relacionadas à Construção
seja, os esquemas mentais que possuem ou não possuem; dificulda- Militar e a Assuntos dos Veteranos. Dá para imaginar a expressão de
des físicas de audição; qualidade do equipamento de som usado nas "não tenho a menor ideia do que essa criatura está falando" estampa-
aulas; determinadas características do inglês falado, como as pausas da na cara das pessoas ali presentes, aguardando por uma discussão
e o sândi (que diz respeito às alterações fonológícas que as palavras relacionada ao Tesouro e, por isso, fazendo um esforço hercúleo para
sofrem ao serem justapostas); e a maneira como o professor planeja tentar produzir algum sentido lógico a partir das palavras do senador.
Felizmente o esforço desnecessário foi interrompido por um funcioná-
e conduz as aulas voltadas para o desenvolvimento da compreensão
rio que passou um bilhete para Coats, que o leu silenciosamente e, em
oral de seus alunos.
seguida, comunicou a todos: "I just got a note saying I'm at the wrong
Diante da importância que o desenvolvimento da compreensão
hearing". Pois é. A criatura estava na audiência errada! Essa informa-
oral dos aprendizes tem para o desenvolvimento de sua competên-
ção aliviou a tensão do angustiado e perdido senador Mark Udall, qu
cia comunicativa e diante das dificuldades por eles encontradas de
presidia a audiência e que disse: "Oh, that uiould expLain why I didn't
engendrar esse processo, o professor precisa dedicar algum tempo
know anything about this Ietter", É claro que as pessoas ali presentes
ao planejamento das atividades que visam ao desenvolvimento dessa
não conseguiram segurar o riso. E Coats brincou colocando a culpa
habilidade. Por isso, abordarei, a seguir, o papel que as atividades nos russos: "I think the Russians have been messing with my schedule'".
de pré-cornpreensão oral desempenham nas aulas de inglês. Depois,
tratarei das micro-habilidades de compreensão oral e dos recursos
I Se quiser ler mais a respeito desse caso curioso, acesse o seguinte linfz: htlp:j /
à disposição do professor para a realização das atividades de com- www.washingtonpost.com/blogs/in-the-loop/wp/2014/04/03/coats-im-at-th"
preensão oral. wrong-hearíng /; acesso: 17jun. 2015.

6 Auln do inglês: do planejamento à avaliação


CAPíTULO 3 I O ensino da compreensão orol
Esse episódio nos mostra uma coisa importante: a cornprccnsã Trocando em miúdos: a lntcrvcnçao do professor é essencial para
que os usuários da língua têm de um texto falado depende dos seus o desenvolvimento da capacidade que os alunos têm de compreender
onhecimentos prévios. Nesse caso específico, as pessoas presentes à o inglês falado. Por isso, eles precisam ser preparados para realizar as
audiência possuíam conhecimentos linguísticos relativos ao inglês, sua atividades de compreensão oral. Se não houver uma preparação, eles
primeira língua. O problema se deveu à confusão de contextos que foi provavelmente encontrarão dificuldades para realizá-Ias e, pior, sen-
instaurada: Coats produziu um texto oral com base em determinado tirão um baque na sua autoestima, o que pode se tornar uma barreira
contexto; as outras pessoas tentaram interpretar o texto de Coats com psicológica para o aprendizado.
base em um contexto totalmente diferente. E certo contexto implica a Tal preparação não é algo que deve ocorrer apenas na sala de
mobilização de conhecimentos diferentes dos conhecimentos que um aula. Como nos lembra Gareth Rees (2104), na vida real, é incomum as
contexto diferente faz os ouvintes mobilizarem. Enfim, foi a confusão de pessoas realizarem a tarefa de compreenderem a fala de alguém sem
contextos que falou mais alto ali. terem a menor ideia do que elas vão ouvir:
Situação semelhante pode se instaurar na sala de aula se o pro-
fessor e seus alunos não operarem com base em um mesmo contexto, Quando ouvem um programa de rádio, as pessoas provavelmente sabem
se eles não compartilharem determinados conhecimentos enciclopé- que tópico está sendo discutido. Quando ouvem uma entrevista com uma
dicos, se não ativarem os esquemas mentais apropriados. Isso significa pessoa famosa, elas provavelmente já sabem alguma coisa sobre essa
pessoa. Um garçom conhece o cardápio a partir do qual o cliente está
que eles precisam de um mínimo de preparação para interpretar os
fazendo seu pedido.
textos que ouvirão em sala de aula.
[...]
Não por acaso, Scarcella e Oxford (1992: 140) criticam duramente
Por isso, apenas pedir aos alunos que ouçam algo e respondam a algumas
Stephen Krashen por exortar os professores de línguas estrangeiras a
perguntas é um tanto injusto e torna o desenvolvimento da habilidade de
"fornecerem aos alunos grandes quantidades de input compreensível
compreensão oral mais difícil.
sem lhes oferecer nenhuma instrução especial sobre como lidar com
esse input. Esse conceito, compartilhado por outras autoridades, pa- A preparação é feita pelo professor por meio de atividades realiza-
rece ser o de que a compreensão oral simplesmente cuida de si mesma das imediatamente antes das atividades de compreensão oral. Refiro-
sem qualquer ajuda do ensino e que osmose é tudo de que se precisa". -me às ATIVIDADES DE PRÉ-COMPREENSÃO ORAL, que possuem al-
Gillian Brown faz eco a essa crítica questionando se os professores es- guns objetivos bem claros. Vejamos alguns deles.
tão mesmo ajudando os alunos a desenvolverem sua compreensão oral O primeiro objetivo é o ESTABELECIMENTO DO CONTEXTO: o
ou apenas testando a habilidade de compreensão oral deles: professor precisa situar seus alunos quanto às personagens ou pes-
soas que participam da fala que ouvirão, onde elas estão, quando a
Por muitos anos, sugeriu-se que os alunos aprenderiam a entender a for-
fala ocorre. Muitas vezes, as atividades propostas em livros didáticos
ma falada da língua simplesmente sendo expostos a ela. Muitos cursos
que alegam 'ensinar' compreensão oral de fato consistem em exercícios trazem informações para o estabelecimento do contexto. Nesse caso,
que expõem os alunos a um trecho de material falado em uma fita e de- ele precisa se assegurar de que seus alunos leram as informações ne-
pois fazem 'perguntas de compreensão' para tentar descobrir se o aluno cessárias antes de reproduzirem o CD ou o áudio onLine. Se não hou-
entendeu ou não a língua do texto. Isso parece mais um exemplo de 'tes- ver tais informações, ele precisará fornecê-Ias. Na vida real, quando
te' do que de 'ensino'. Os alunos não estão recebendo nenhuma ajuda na alguém conversa conosco sem que o contexto esteja estabelecido,
aprendizagem de como processar essa língua estranha - a eles está sim- costumamos dizer: "Peraí, meu fio. Me situe." ou "Como assim? Cê tá
plesmente sendo dada uma oportunidade de descobrirem por si mesmos falando de que mesmo?". Portanto, na sala de aula, o contexto tam-
orno lidar com ela (Brown, 1990: 8). bém é um elemento fundamental para a realização das atividades de

18 1\11111 (lu II1gl0s: do planejamento à avaliação CAPiTULO 3 I o ensino da compreensão 01"1 I·


comprccnsao oral e deve ser estabelecido para que os alunos tenham ajude ti ativar ou a construir os esquemas mentais necessários para
ndiçocs de realizá-Ias com sucesso. que a produção de sentidos ocorra a partir do texto que ouvirão.
segundo objetivo das atividades de pré-cornpreensão oral é a Joan Rubin (1994: 209) cita pesquisas de Michael Long (1990), d
MOTIVAÇÃO dos alunos. Elas os motivam a realizarem a atividade de Barbara Schmidt-Rinehart (1992) e de Chung Chiang e Patricia Dunkel
compreensão oral planejada quando ela tratar de um tema que pode, a (1992) sobre o papel que os conhecimentos enciclopédicos desempe-
princípio, não ser interessante para eles devido ao seu perfil. Por exem- nham na compreensão oral dos aprendizes de línguas estrangeiras
plo, uma atividade que traz um diálogo entre dois adultos sobre oportu- e resume os resultados de maneira simples: "Em todos os três estu-
nidades de emprego pode ser considerado chato por adolescentes, em dos, mostra-se que os conhecimentos enciclopédicos melhoram a
cuja realidade a questão do emprego ainda não é relevante. Mas sempre compreensão oral". Por isso, a ativação (ou a construção) dos esquemas
é possível provocá-los a falar sobre o que querem e sobre o que não é importante para a mobilização de conhecimentos e dos processos de
querem ser quando crescerem, sobre o que eles pensam acerca de de- decodificação da informação e deve ser planejada pelo professor. Ste-
terminadas profissões etc. Analogamente, um diálogo sobre esportes ven Brown (2006: 3) explica por que isso deve ser feito:
radicais pode não suscitar o menor interesse numa turma de adultos de
Os alunos devem ouvir alguns sons (processamento ascendente), mantê-
meia idade. Novamente, pode-se mexer com a imaginação dessas pes-
-los em sua memória operacional por tempo suficiente (alguns segundos)
soas, provocando-as a se imaginarem praticando algum esporte radical para conectá-los uns aos outros e depois interpretar o que acabaram de
e analisando as vantagens e desvantagens de praticá-lo. ouvir antes de algo novo aparecer. Ao mesmo tempo, os ouvintes estão
O terceiro objetivo é a ATIVAÇÃO OU CONSTRUÇÃO DOS ES- usando seus conhecimentos enciclopédicos (processamento descenden-
QUEMAS MENTAIS dos alunos. Conforme vimos no capítulo anterior, te) para determinar o sentido com base nos conhecimentos prévios e nos
os esquemas mentais são essenciais para o processamento descen- esquemas mentais.
dente, no caso dos esquemas vinculados aos conhecimentos enciclo-
Nunca é demais enfatizar que as atividades de pré-cornpreensão
pédicos, e para o processamento ascendente, no caso dos esquemas
oral devem ajudar os alunos a ativarem seus esquemas mentais ou, até
vinculados aos conhecimentos linguísticos. As atividades de pré-com-
mesmo, a construírem novos esquemas mentais. E isso vale tanto do
preensão oral possibilitam ao professor avaliar se seus alunos possuem
ponto de vista dos conhecimentos enciclopédicos quanto do ponto de
os esquemas mentais necessários para realizarem a atividade de com-
vista dos conhecimentos linguísticos. Nesse segundo caso, refiro-me
preensão oral. Ao realizá-Ias, ele pode perceber que precisa ajudá-los a
especificamente a itens de vocabulário desconhecidos dos alunos, mas
construir determinados esquemas mentais. Rees (2014) esclarece isso
necessários para a realização das atividades de compreensão oral.
de maneira bem didática:
Há tipos diferentes de atividades de pré-compreensão oral, que
"You are going to listen to an ecoLogicaL campaigner taLk about the des- geralmente costumam focar temas e/ou palavras e frases. O professor
truction of the rainforest." Isso estabelece o contexto. Mas se você for deve decidir que tipo de atividade é mais adequado, tendo sempre em
diretamente para a atividade de compreensão oral, os alunos não terão mente a ideia de variar as atividades para não provocar tédio nos alunos.
tempo de transferir ou ativar seus conhecimentos (que podem ter sido Uma questão importante a se considerar é a duração das ativida-
construídos na primeira língua) na língua estrangeira. O que eles sabem des de pré-compreensão oral. Não existe uma duração definida. Em-
sobre florestas tropicais? Onde elas ficam? O que elas são? Que problemas
bora, geralmente, tais atividades devam ser breves, o professor terá de
enfrentam? Por que são importantes? O que um ativista ambiental faz?
levar em consideração alguns fatores para decidir quanto à sua dura-
Que organizações fazem campanhas voltadas para problemas ecológicos?
ção: complexidade temática e frequência das palavras que constituem a
Em outras palavras, não basta que o professor estabeleça o con- atividade de compreensão oral; familiaridade dos alunos quanto ao tip
texto para que os alunos realizem a atividade: é necessário que ele os de atividade de compreensão oral; o perfil dos alunos. Obviamente,

80 Aula de inglês: do planejamento à avaliação CAPíTULO 3 I o ensino da compreensão oro I 81


importante que ele ajude seus alunos a se prepararem para realizar as A breve exposição oral sobre () tema da fala ou do di{Jlogoqllt' os
atividades de compreensão oral. Contudo, repito, as atividades de pré- alunos ouvirão é outro tipo comum de atividade de pró compn-cnsào
-compreensão oral devem ser breves, pois o objetivo principal é a reali- oral. Nela o professor comenta o que os alunos vão ouvir, destacando o
ação das atividades de compreensão oral. Afinal, não faz sentido reali- tema e, se necessário, palavras e frases que ocorrerão e que ele consi
zar uma atividade de pré-compreensão oral que seja mais longa do que dera importante apresentar antes de os alunos ouvirem o texto.
a atividade de compreensão oral ou que dure o mesmo tempo que ela. Outra sugestão de atividade de pré-compreensão oral está direta
Um tipo comum de atividade de pré-compreensão oral é a tem- . mente relacionada à atividade de compreensão oral: o professor I)('d('
pestade de ideias, o brainstorming. Nela o professor informa aos alu- aos alunos que leiam o comando da atividade e prevejam as respostas
nos que realizarão uma atividade de compreensão oral sobre deter- às perguntas propostas pelo comando, justificando por que prevccm
minado tema e os encoraja a dizerem que palavras e tópicos esperam tais respostas. Isso faz com que eles se concentrem nas inforrnaçôcs
ouvir sobre aquele tema. Se achar necessário, o professor escreve no relacionadas àquelas perguntas ao ouvirem o texto.
quadro o que os alunos vão dizendo e até acrescenta palavras e frases Você pode pensar em outras propostas de atividades além das que
esclarecedoras para o sucesso dos alunos na realização da atividade. se encontram no livro didático. O importante é você compreender a aju
Ao decidir escrever no quadro as palavras, frases e tópicos que da que as atividades realizadas no estágio de pré-compreensão ora I po
seus alunos dizem, o professor pode lançar mão de uma ferramenta dem trazer na hora de seus alunos se prepararem para a realizaçao d;ls
interessante: o mapa semântico. Ele coloca o tema, em forma de pala- atividades de compreensão oral. Afinal, não basta ao professor solicíuu
vra-chave, numa posição central no quadro e puxa linhas a partir dele -lhes que abram o livro didático em determinada página e leiam o co
para ir registrando o que os alunos dizem. Vejamos um exemplo de um mando de uma atividade para, em seguida, reproduzir o áudio ou o vkk-o
mapa semântico que pode ser criado a partir do tema vacation, com li- relativo àquela atividade. Isso não é pedagogicamente recomendável. ()
nhas que emergem a partir do centro e linhas secundárias que surgem que é recomendável é a preparação dos alunos para as atividades.
a partir das outras palavras. Na próxima seção, tratarei das micro-habilidades de comprecnsao
oral que os alunos precisam desenvolver.
MAPA SEMÂNTICO

TRAIN
PLANE

~\
CAR

TRIP
-. \/
HOTEL HOSTEL

ACCOMMODATION
MOTEL

-:
INN
3.2 Miero-habilidades de compreensão oral

A compreensão oral é, repito, das quatro habilidades Iínguísticas,


a que apresenta mais dificuldades para o aprendiz brasileiro de inglês.
Consequentemente, o professor precisa ajudar seus alunos a desen-
volverem micro-habilidades de compreensão oral que os ajudem não
INSURANCE apenas a realizar as atividades de compreensão oral na sala de aula,
mas também a compreender o inglês falado em situações extraclassc,
VACATION PASSPORT
Essa ajuda é facilitada pelas atividades que geralmente os livros didá
LUGGAGE ticos trazem ou que o próprio professor prepara. O mais importante é
SIGHTSEEING
ATTRACTION
que o professor tenha consciência de qual micro-habilidade está sendo

BAGGAGE \~PACK

MUSEUM
/ v -.
CHURCH MONUMENT
praticada quando leva uma atividade para a sala de aula.
Nesta seção, destaco micro-habilidades de compreensão oral ('
comento apenas de passagem algumas atividades. A razão disso é que

8 I\IIln do Inglês: do planejamento à avaliação CAPíTULO 3 I O ensino da compreensão 01111


os professores de inglês já estão familiarizados com os tipos de ati- por meio ele atividades, sejam elas oferecidas pelo livro didático adota
vidades de compreensão oral oferecidas pelos livros didáticos. O que do, sejam criadas pelo professor, embora eu considere extremamente
esses livros muitas vezes não fazem é explicitar a artieulação entre as improvável que os livros didáticos publicados pelas grandes editoras
atividades propostas e as miero-habilidades que elas objetivam pra- estadunidenses e britânicas não forneçam atividades voltadas para a
tiear. E, repito, o professor precisa estar consciente de qual miero- prática dessa miero-habilidade.
-habilidade está sendo focada quando realiza qualquer atividade na Um tipo comum de atividade que oferece aos alunos a oportuni-
sala de aula. dade de desenvolver a miero-habilidade de buscar informações especí-
As micro-habilidades de compreensão oral são ações automátieas ficas é aquele em que eles ouvem um texto, na forma de diálogo ou não,
realizadas por um ouvinte as quais contribuem para que ele compreen- para preencherem quadros, mapas ou lacunas em um texto. A título de
da um texto e retenha informações em sua memória. Por exemplo, ilustração, vejamos uma atividade vislumbrada para alunos inieiantes
quando estamos no aeroporto aguardando para embarcar, costuma- com base no seguinte script:
mos prestar atenção aos anúncios dos voos, mas não ouvimos todos
eles: nós só ouvimos na íntegra o anúncio específico do nosso voo. E
como fazemos isso? Ao ouvirmos o sinal sonoro que indiea que uma - Jean! Hi! How are you?
mensagem será transmitida pelo sistema de som do aeroporto, mo- - Katy! Hey! I'm fine. Long time no see, huh?
bilizamos algumas palavras-chave e nos concentramos em ouvi-Ias. - Yeah! lt's been a long time. After high school, I moved to
Se nosso voo é o AC420, tendo como origem Toronto com destino a New York, went to university, got married and now l'rn back to
Montreal, operado pela empresa Air Canada, temos quatro palavras- San Francisco.
-chave em que nos concentrar. Se reconhecermos as palavras-chave, - Got married?
prestamos atenção à repetição do anúncio. Já se ouvirmos o anúncio
- Uh-huh. To Dale.
abaixo, não o ouviremos novamente pelo fato de não localizar nele as
palavras-chave que havíamos selecionado: - Dale?! Really?
- Yeah. We married three years ago.
Good afternoon, passengers. This is the pre-boarding announ-
- Wow! And what are you doing for a living?
cement for flight 898 to Rome. We are now inviting those pas-
sengers with small children, and any passengers requiring spe- - l'm a doctor at San Francisco General Hospital and Dale's a
cial assistance, to begin boarding at this time. Please have your teacher at Kennedy High. How about you?
boarding pass and identification ready. Regular boarding will - Well, 1have a law office now and a husband.
begin in approximately ten minutes time. Thank you-. - Really?

Essa miero-habilidade é a BUSCA POR INFORMAÇÕES ESPECÍFI- - Yeah. 1married my accountant, Josh. He's Rachel's brother.
CAS. Ela leva o ouvinte a realizar o processo de decodifieação ascen- Remember Rachei?
dente, em que o ouvinte estabelece palavras-chave que vão direcionar - Sure. She lived down the street where we lived. How's she?
sua atenção no momento de ouvir o texto. O professor precisa for- - She's great. She opened a restaurant here is San Francisco,
necer a seus alunos oportunidades de prátiea dessa miero-habilidade
the Tropical Palace, and married Laura. She is also the chef of
the restaurant.
Disponível em: <http://www.englishclub.comjenglish-for-workjairline-an- - Laura? Is she the Laura who graduated a year before us?
nouncements.htm>; acesso: 17jun. 2015.

84 Aula de inglês: do planejamento à avaliação CAPíTULO 3 I O ensino da compreensão orol 85


Yes. She teaches Philosophy at the University of California at () doze pode ler trcs formatos diferentes, segundo Brown (ID!lt1).
San Francisco. Um formato é aquele em que o método de apagamento segue uma ra
ão fixa, ou seja, cada enésima palavra é apagada. Nesse método, nao
- Wow! We should get together one of these days. What do
há uma lógica discursiva para o apagamento. Outro formato é aquele
you think?
que segue um apagamento racional: as palavras a serem apagadas são
- That sounds great. Here's my cardoGive me a call.
selecionadas com base em algum critério discursivo. Por exemplo, os
- 1will. It was really nice to see you. conectivos ou os pronomes são apagados. O terceiro formato de doze é
- Me too. Bye. aquele em que há alternativas para cada lacuna. Para ilustrar esses três
- Bye. formatos de doze, eis três exemplos que criei a partir do artigo Roving
reporter recounts her travels in Turkey, de Kathy Barrows, publicado
no San Leandro Journal em 29 de novembro de 1996:
Cada aluno recebe uma cópia da atividade abaixo, na qual deve
preencher o quadro com informações retiradas do diálogo acima, re-
FORMATO 1:
produzido a partir de um CD ou de outro recurso de áudio:
1have to admitthat prior to a to Turkey a few weeks ago,
1had to ali my stereotypical images ofthat county _
Jean and Katy are friends. They run into each other in a café in
its people. 1 had expected to see passersby in the fali
San Francisco. Listen to their conversation and fill in the chart
to their knees on rugs when the calls for prayer floated
with information about them, Dale, Rachei and Laura.
from the minarets. 1 that my only contact with women
would be sight of dark eyes peering out from behind
MARITAL STATUS OCCUPATION PLACE OF WORK veiled o 1 had even planned to avoid any deep _
JEAN corners of Istanbul's Grand Bazaar, where mustached men
KATY ___ be dealing drugs behind colorful Turkish carpets.
DALE But 1learned on this trip, as 1do ali my wande-
rings, is how travei serves to the myths that we have un-
RACHEL
consciously etched into psyches.
LAURA
FORMATO 2:
1 have to admit that to a trip to Turkey a few weeks
Outro tipo de atividade, muito comum também, é o doze, em que ago, 1 had succumbed ali my stereotypical images of
uma palavra é apagada e substituída por uma lacuna. Por exemplo, that county and its people. 1 had expected to see passersby
você seleciona uma músiea relacionada com o conteúdo da aula e faz in the street fali to their knees rugs when the mournful
a substituição de palavras por lacunas. Neste caso, a miero-habilidade calls for prayer floated the minarets. 1figured that my
de compreensão oral praticada é o RECONHECIMENTO DE PALA- only contact women would be the sight of dark eyes
VRAS. Infelizmente, não posso colocar um exemplo com uma músiea
peering out behind veiled faces. 1had even planned to
popular aqui por conta da complicada questão dos direitos autorais,
avoid any deep dark corners lstanbul's Grand Bazaar,
mas imagino que você já tenha usado ou, pelo menos, visto uma ativi-
where mustached men might be dealing drugs colorful
dade desse tipo. Turkish carpets.

8 Aula de Inglôs: do planejamento à avaliação


CAPíTULO 3 I O ensino da cornpreensao OJ ul 8/
I lá fatores, portanto, que contribuem para os aprendizes lerem
But what I learned this trip, as I do ali my wan
dificuldade para reconhecer palavras. Vejamos três deles.
derings, is how travei serves to dispel the myths that we have
O fator mais óbvio é o nível de proficiência dos aprendizes.
unconsciously etched our psyches.
Quanto menos conhecem palavras e estruturas sintáticas, menos
FORMATO 3: serão capazes de reconhecer palavras ao ouvirem um texto. Inver-
I have to admit that __ (1) to a trip to Turkey a few weeks ago, I samente, quanto maior o vocabulário e o conhecimento gramatical
had succumbed __ (2) ali my stereotypical images of that coun- dos aprendizes, mais facilmente eles poderão reconhecer palavras d
ty and its people. I had expected to see passersby in the street fali textos falados.
to their knees __ (3) rugs when the mournful calls for prayerflo- Outro fator complicador é o sotaque do falante. Se estão acostu-
ated __ (4) the minarets. I figured that my only contact __ mados com inglês estadunidense, os aprendizes estranham o inglês
(5) women would be the sight of dark eyes peering out __ (6) britânico, e vice-versa. Aqueles que estão acostumados com o inglês
behind veiled faces. I had even planned to avoid any deep dark de nova-iorquinos e de angelinos estranham o inglês texano. E não
corners __ (7) Istanbul's Grand Bazaar,where mustached men vou nem mencionar o estranhamento que o inglês australiano cau-
might be dealing drugs __ (8) colorful Turkish carpets. sa em muitos aprendizes não afeitos a ele. Por isso, é interessante os
But what Ilearned __ (9) this trip, as I do __ (10) ali my produtores de livros didáticos incluírem sotaques variados nas ati-
wanderings, is how travei serves to dispel the myths that we vidades de compreensão oral para que os alunos não se acostumem
have unconsciously etched (11) our psyches. apenas a um sotaque.
(1) before - prior - de (5) with - to - for (9) in - on - onto O terceiro fator é o chamado connected speech e que traduzirei
(2) to - for - against (6) to - from - within (10) in - on - with aqui como fala encadeada, fenômeno que ocorre nas falas espontanea-
(3) in - on - from (7) in - on - of (11) in - onto - into mente produzidas em velocidade normal. Muitas vezes, o professor d
(4) to - from - above (8) behind - in front of - on turmas de iniciantes tende a falar com uma velocidade mais lenta do
que o normal para facilitar o entendimento por parte de seus alunos,
Reconhecer palavras é uma micro-habilidade essencial para a com- aproximando-se daquilo que, em inglês, é chamado de motherese ou
preensão oral. Afinal, o ouvinte só consegue buscar informações espe- baby talk, ou seja, a maneira como uma mãe fala com seu bebê.
cíficas ou ideias principais e só consegue fazer inferências e resumos de Na fala encadeada, ocorrem junções de palavras, as quais pro-
um texto falado se reconhecer as palavras que compõem esse texto. vocam efeitos que obscurecem os limites sonoros das palavras jus-
O reconhecimento de palavras depende fortemente do processo tapostas. Um desses efeitos é a ASSIMILAÇÃO,em que um som in-
de decodificação ascendente e é uma micro-habilidade mais complexa fluencia um som vizinho provocando alterações sonoras, sendo uma
do que parece, pois reconhecer palavras implica outras ações como, delas a palatalização, como ocorre com som final de [did] no sintag-
por exemplo, reconhecer suas pronúncias, seus significados e as fun- ma did you, geralmente pronunciado como [dI3jU] e não como [drd ju].
ções sintáticas que desempenham no texto ouvido. Rost explica a com- Outra alteração sonora é o ensurdecimento (de sons sonoros). Por
plexidade dessa micro-habilidade assim: exemplo, o som consonantal sonoro Ivl é pronunciado Ifl após o
som surdo Itl no sintagma have to go: [beeftagco]. Outro efeito im-
o reconhecimento de palavras consiste de três processos praticamen- portante da fala encadeada é a ELISÃO, ou seja, o total apagamen-
te simultâneos: encontrar um candidato adequado (ou seja, uma palavra
to do som de uma consoante ou de uma vogal, que estaria present
provável), estimar o sentido da palavra (que é aquele que a maioria das
se pronunciássemos as palavras isoladamente. É o que vemos nes
pessoas pensa ser o significado da palavra) e encontrar a referência cor-
tes exemplos: a frase Next, please é pronunciada [nekspli:z], com
reta para ela no contexto de linguagem que não ouvimos (Rost, 1994: 24).

CAPiTULO 3 I O ensino da compreensão orul 8U


88 Aula de inglês: do planejamento à avaliação
apagamento de IV, e o sintagrna you and rue é pronunciado [ju:nmi:], personagens no processo de construção de sentidos, pois já COJlIH'
com o apagamento de Id/ cem um repertório de linguagem não verbal que expressa sentimentos
Fica claro que a fala encadeada torna difícil, para os aprendizes e que os ajuda a construir sentidos. Em outras palavras, os esquemas
nos níveis iniciais, a compreensão de textos falados. A esse respeito, mentais que os alunos possuem são muito úteis para a compreensão
Michael Rost e 1.1.Wilson (2013:11)lembram: de textos falados já que de tais esquemas depende o processo de d
codificação descendente.
Os aprendizes de uma segunda língua tipicamente podem
O uso de esquemas mentais na compreensão oral é a base de ou-
conhecer uma palavra isolada, mas podem não reconhecê-Ia
tra micro-habilidade: a REALIZAÇÃODE INFERÊNCIAS,que podemos
em uma fala conectada. Por exemplo, um aprendiz pode clara-
chamar também de INFERENCIAÇÃO.Ela permite ao ouvinte fazer
mente conhecer itens lexicais como vegetable ou comfortable
deduções a partir do que não está dito no texto, do que está nas en-
ou first of ali, mas, na fala encadeada, pode ouvir 'vech tipple',
trelinhas, do contexto de produção textual, dos indivíduos envolvidos
'come to Pau/' ou 'festival'.
no texto e dos elementos não linguísticos, como tons da voz, gestos
Por isso, o professor precisa ajudar seus alunos a se tornarem expressões faciais desses indivíduos. Em outras palavras, a partir dos
conscientes dos efeitos que a fala encadeada provoca na pronúncia das seus conhecimentos prévios e de pistas textuais e contextuais - lin-
palavras. Essa conscientização é essencial para o desenvolvimento da guísticas e não linguísticas -, o ouvinte chega a conclusões sobre o
sua competência comunicativa. texto que ouve por conta dessa micro-habilidade.
Outra micro-habilidade de compreensão oral que precisa ser pra- Há teóricos, como Krashen, que consideram a inferenciação uma
ticada é a BUSCA POR IDEIAS GERAIS. Os aprendizes precisam ser micro-habilidade inata. Não sei se ela é inata, mas acredito piamente
capazes de ouvir um texto e, mesmo sem entender seus detalhes, en- que todos inferimos, independentemente do nosso grau de escolari
dade. A inferenciação faz parte da competência comunicativa de to-
tender do que ele trata. Muitas atividades de compreensão oral podem
dos os usuários da língua pelo fato de nós, desde nossa infância, não
ser facilmente adaptadas para a prática dessa micro-habilidade: basta
apenas ouvirmos pessoas fazendo inferências, mas também fazermos
que o professor faça perguntas aos alunos sobre elementos genéricos
inferências. Vemos nuvens no céu e inferimos que vai chover. Quan-
do texto. Eis alguns exemplos de perguntas comumente relacionadas a
do pessoas diferentes ficam nos olhando, inferimos que há algo er-
ideias gerais de um diálogo:
rado ou esquisito com nossa roupa. Se tentamos conversar com uma
cWho are the speakers?
pessoa e ela insiste em nos responder monossilabicamente, inferimos
cWhere are they?
que ela não está a fim de conversar. Há alguns dias, fui a um shopping
cWhat are they talking about?
center e passei apressadamente pelo corredor que conecta o estacio-
Para responder a perguntas sobre pontos genéricos assim, os
namento às lojas. Passei por duas mulheres que conversavam e ouvi o
aprendizes precisam mobilizar conhecimentos linguísticos, obviamen- seguinte trecho:
te, a fim de reconhecerem as palavras, e conhecimentos enciclopédi-
cos. Afinal, os conhecimentos que eles já trazem de suas experiências A - Eu tenho dez chips.
de mundo ajudam no processo de interpretação de textos em língua B - Pra que cê quer dez chips se só tem quatro operadoras?
inglesa. Por exemplo, os sons de talheres e pratos ajudam a situar a Como passei rapidamente, não ouvi o resto da conversa. Confesso
conversa em um restaurante ou na casa de um dos personagens do que fiquei curioso e quase desacelerei para ouvir a resposta de A, pois,
diálogo no horário de uma refeição. Outro exemplo: ao assistirem a para mim, possuir dez chips parece completamente sem lógica. Deci-
um vídeo, os alunos podem utilizar as expressões faciais e gestos dos di seguir meu caminho - fiquei sem saber a razão da criatura, mas

90 Aula de inglês: do planejamento à avaliação CAPíTULO 3 I o ensino da compreensão oral 91


fiquei com esse caso para contar aqui. O que interessa nessa história ral. E um elemento essencial para a rcalizaçao das atividades de ('0111
o fato de eu ter inferido que elas estavam falando de telefonia celular preensão oral são os recursos à disposição do professor. É disso que iI
por causa da palavra chips e da frase quatro operadoras. Isso parece próxima seção trata.
óbvio, não é? Contudo, uma pessoa idosa, avessa às novas tecnologias
de informação e que detesta celulares, não faria a inferência que fiz (e
3.3 Recursos tecnológicos e o ensino da compreensão oral
que você certamente faria). Isso serve de alerta para o professor: pode
haver alunos que não possuem determinados esquemas mentais que Até o advento do ensino comunicativo de línguas estrangeiras, ()
lhes permitam fazer inferências claramente óbvias para o professor, desenvolvimento da compreensão oral dos aprendizes não era alvo de
conforme abordei no capítulo anterior. sistematização. Até aquele momento, no entendimento de muitos t
Brown (2006: 5) dá um exemplo simples e claro de como a infe- ricos, os aprendizes desenvolveriam essa habilidade se fossem expos-
renciação é necessária para a produção de sentidos a partir do breve tos à língua falada - era aquilo que Oavid Mendelsohn, segundo Osa-
diálogo a seguir: da (2004), rotulou cinicamente de "abordagem da osmose", Scarcella
Oxford (1992) também utilizam o termo osmose para criticar Krashcn
WOMAN: We're going out to dinner after class. Do you want to e outros teóricos que acreditam que o desenvolvimento da habilidade
come, toa? de compreensão oral se dá a partir da mera exposição do aprendiz ~l
MAN: Maybe. Where are you going? língua falada.
WOMAN: Pizza King. Preparar atividades especificamente voltadas para o desenvolvi
MAN: Pizza? I lave pizza! mento da compreensão oral e preparar os aprendizes para realizá Ias
eram coisas impensáveis há algumas décadas. Osada (2004) comenta
Afinal de contas, o homem vai ou não vai jantar com a mulher com que a compreensão oral foi negligenciada durante um longo tempo
quem conversa e as outras pessoas? Um ouvinte com a micro-habili- pelo fato de muitos teóricos considerarem-na uma habilidade passiva,
dade de inferência desenvolvida e com um mínimo de capacidade de o que explica a ideia segundo a qual ela seria adquirida pela mera ex-
reconhecimento de palavras responderá que ele vai. E a resposta está posição dos aprendizes à língua falada.
contida nas entrelinhas do enunciado "I love pizza!". Hoje, graças às pesquisas de teóricos vinculados ao ensino comuni-
Em suma, parece realmente que os usuários de uma língua já pos- cativo de línguas, sabemos que a compreensão oral não é uma habilida-
suem a micro-habilidade de inferenciação internalizada, bastando-lhe de passiva, que é a mais difícil para um aprendiz de línguas estrangeiras
transferi-Ia para o uso de uma segunda língua. Entretanto, como não e que, exatamente por isso, precisa ser trabalhada em sala de aula. Por
há evidências de que isso seja verdadeiro, vale a pena o professor ficar conta dessa tomada de consciência e do melhor entendimento do papel
atento às atividades de compreensão oral que envolvem o uso da infe- da compreensão oral no desenvolvimento da competência comunicati-
renciação para ajudar seus alunos a tomarem consciência da sua im- va dos aprendizes, os livros didáticos passaram a contemplar atividades
portância e, assim, ajudá-los a ter a confiança de realizar inferências, voltadas para o desenvolvimento da compreensão oral, que dependem
Aliás, reforçar a confiança é muito importante no caso dos aprendizes de recursos tecnológicos para a reprodução de textos falados.
iniciantes, que costumam se apegar mais ao processo de decodifica- Entretanto, essa relação estreita entre compreensão oral e re-
ção ascendente. cursos tecnológicos precisa ser analisada com cuidado para evitar
As quatro micro-habilidades de compreensão oral são as mais equívocos, como os cometidos pelas pessoas que adotam a aborda-
comumente praticadas nos cursos de inglês exatamente por serem gem da osmose. Afinal, o ato de reproduzir textos falados não sig-
as mais básicas e essenciais para a macro-habilidade de compreensão nifica que a compreensão oral seja alvo de prática. Lembro-me de

92 Aula de inglês: do planejamento à avaliação CAPiTULO 3 I o ensino da compreensão orul


Who em' they'? Wfwl ls Iftdr re[c.t!io'ttshi,,'? Ilow <Ú) Ih('y /('(" ín Iftis
quando estudei num instituto de idiomas que adotava o que eles cha-
mavam de método audiovisual: os professores usavam gravadores d conuersutíon? Quanto à fase de compreensão oral, eles fornerr-m ()
rolo e projetores de filmes para reproduzir textos falados e não havia seguinte procedimento:
sequer uma atividade de compreensão oral até os níveis mais avança- (Iistening) Read the first dialogue with your choice of inflection
dos. Nestes, a única atividade que realizávamos era o preenchimento and intonation, taking both parts. (Or you may pre-record th
de lacunas para a prática do reconhecimento de palavras e frases. Os dialogues with two actors.) Ask the students to think of situa
gravadores de rolo foram substituídos por minicassetes e os projeto- tions. Encourage as many guesses as possible. There is, of cour
res de filmes, por VHS. Provavelmente, na década de 2000, passaram se, no single correct answer (Rost; Wilson, 2013: 33).
a usar cos e ovos, e agora devem usar recursos mais modernos. Mas
acredito que a metodologia não se modificou, pois é um instituto de É o próprio professor que deve ler, em voz alta, os diálogos. Ou
idiomas que ganha muito dinheiro até hoje (e em time que está ga- seja, ele deve representar o papel de dois personagens diferentes, com
nhando não se mexe, não é?). a inflexão e a entonação que quiser. A não ser que ele grave os diálogos
O uso de recursos tecnológicos para as atividades de compreen- com antecedência com dois atores! Ora, ler sozinho e em voz alta cada
são oral é um fator motivador para os aprendizes. Esses recursos reti- um dos diálogos não é nada motivador para os alunos, além de não ser
ram momentaneamente a voz do professor de foco, dando aos alunos a nada próximo do que é um diálogo autêntico; e conseguir dois atores
oportunidade de ouvirem vozes diferentes e apresentando-lhes desa- para gravarem os diálogos é uma tarefa bastante surreal.
fios, especialmente quando as falas ocorrem em velocidades acima da Rost e Wilson apresentam algumas atividades em que há () uso
velocidade pedagógica que o professor está acostumado a imprimir em de vídeos e gravações disponíveis na internet. Por exemplo, eles pro
sala de aula. põem a atividade Word grab, voltada para a prática do reconheci
Por isso O professor deve evitar a ideia de ser ele a fonte exclusiva mento de palavras, e orientam o professor, da seguinte forma, acerca
de voz nas atividades voltadas para a compreensão oral. Além de ser dos materiais:
mais trabalhoso para ele, isso retira dos seus alunos a oportunidade Materiais
mencionada no parágrafo anterior. Curiosamente, Rost e Wilson pu- Any listening passage of at least a minute's length. Stories are a
blicaram um livro em 2013 pela Pearson intitulado Active Listening, o good genre for this activity.
qual propõe dezenas de atividades de compreensão oral nas quais o htpp://storyteller.net/stories/audio contains audio recordings
professor é quem deve ler em voz alta os diálogos e os outros gêneros of fictional stories, fairies tales and myths, told quite slowly and
textuais orais (além de ser aquele que terá um trabalho enorme para appropriately for language learners.
preparar os materiais das atividades). Newspapers and magazines such as Reader's Oigest often con-
Ao apresentarem os procedimentos das atividades, Rost e Wilson tain human interest stories that are short enough to read to the
frequentemente fornecem instruções muito vagas para o professor. c1ass (Rost; Wilson, 2013: 109).
A título de exemplo, comentarei uma atividade que eles chamam de
Pinch and ouch, em que o professor deve levar diálogos curtos e am- Você deve ter percebido que o professor terá de ter tempo, muito
bíguos para os alunos realizarem determinada tarefa. Os autores ex- tempo disponível, para selecionar os trechos. Além disso, os autores dei
plicitam os procedimentos, desde a fase de pré-compreensão oral até xam aberta a possibilidade da leitura em voz alta, o que, já sabemos, é
a fase de pós-compreensão oral. Eles pedem que o professor explique bastante chato para os alunos e uma ação nada próxima de diálogos reais.
aos alunos que ele lhes pedirá para imaginar uma situação para cada As propostas de atividades feitas por Rost e Wilson no livro Acuw
um dos diálogos com base nestas perguntas: Where are the speakers? Listening são inadequadas para o contexto brasileiro por, pelo menos,

94 1\1110cio Inglôs: do planejamento à avaliação


CAPiTULO 3 I o ensino da compreensão ornl
três razões. A primeira é a carga de trabalho cxtraclasse imposta a
professor, que deverá procurar os materiais e prepará-Ios para as aulas
(sem ser remunerado por isso!). A segunda é o fato de tais atividades
retirarem o fator motivador que os recursos tecnológicos trazem para
os alunos. E a terceira razão é o fato de não oferecerem aos alunos vo-
zes diferentes, deixando a cargo do professor a leitura em voz alta de
todas as falas de um diálogo.
Um ponto que ainda preciso comentar é o fato de Rost e Wil-
son proporem o uso de vídeos e áudios disponíveis na internet. Eles
o ensino da leitura
se demonstram, com isso, antenados e pari passu com o papel que as
novas tecnologias da informação podem desempenhar no ensino e no
aprendizado de línguas estrangeiras. Há, inclusive, uma tendência de
as editoras pararem de produzir CDS de áudio para os livros didáticos: leitura é um processo cognitivo de constru-
elas manteriam um hot site com os áudios ali disponíveis a alunos e
professores. Contudo, o uso de recursos da internet para a realização
de atividades de compreensão oral na sala de aula tem prós e contras.
A j
ção de sentidos a partir de um texto escrito,
que pode conter imagens. Esta é uma definição
tranquila, passível de ser aceita sem contestação. Gos-
Vejamos: taria de enfatizar duas frases nessa definição: constru
ção de sentidos e processo cognitivo. A ênfase se deve
PRÓS CONTRAS ao fato de a leitura não se reduzir à mera decodifica-
O professor tem muitas possiblidades O professor precisa de muito tempo
ção de símbolos impressos no papel, na tela, na cami-
de encontrar vídeos e áudios na internet. extra classe para garimpar os materiais seta ou em outros suportes: os sentidos são produzi
adequados e não será remunerado dos a partir da interação entre o que está no texto e os
pelo tempo gasto nessa tarefa.
conhecimentos que o leitor traz para o ato de leitura.
O uso de materiais que se encontram O acesso ao hot site das editoras de- Esses dois fatores, os símbolos linguísticos im-
em um hot site torna desnecessária pende da boa conexão da internet na pressos e os conhecimentos do leitor, suscitam algu-
a compra de cos de áudio, que geral- escola. Se a conexão cair ou estiver len-
mente são caros. ta na hora da aula, não dá para realizar
mas dificuldades no ensino da leitura, grosso modo,
as atividades. categorizáveis em dois grupos. Um grupo é o das di-
ficuldades textual-linguísticas, relacionadas ao nível
o professor precisa levar em consideração os prós e contras do de conhecimentos que os alunos possuem (ou não) da
uso de recursos tecnológicos no ensino da habilidade de compreensão língua inglesa e dos gêneros textuais. O outro grupo
oral, que, como vimos, não é uma habilidade passiva, e sim receptiva. O é o das dificuldades de leitura, relacionadas às habili-
próximo capítulo tratará da outra habilidade receptiva: a leitura. dades que eles possuem (ou não) como leitores em lín-
gua portuguesa, habilidades passíveis de serem trans-
feridas para a leitura em língua inglesa. Entretanto,
há um tipo diferente de dificuldade à qual o professor
precisa ficar atento e que não se encaixa em nenhum
desses dois grupos: a resistência que os alunos podem

I1 96 Aula de inglês: do planejamento à avaliação CAPiTULO 4 I o ensino da 1000ur I

II
ter a ler um texto que não escolheram, um texto que alguém escolheu século XXI: as operadoras ainda praticam preços cscorchantcs, excluiu
para eles lerem. do muitas pessoas desse acesso, especialmente diante da precoce de
Para superar ou minimizar essa dificuldade, o professor precisa saparição das Lan houses. Outros recursos importantes são o ovo c a TV
informar a seus alunos quais os objetivos da leitura que eles vão reali- por assinatura, excelentes para a prática da compreensão oral.
zar caso esse objetivo não venha expresso no comando das atividades Além disso, o texto escrito é mais concreto do que o texto fala
de leitura constantes no livro didático adotado. Afinal, sempre se lê um do. Ele é duradouro e subsiste diante dos olhos do aprendiz, que pode
texto com algum objetivo. Se não fizer isso, o professor correrá o risco lê-lo, relê-Io, relê-Io de novo, observando cuidadosamente trechos c
de deixar acontecer uma situação, infelizmente, frequente: seus alunos palavras, algo que geralmente não pode fazer com o texto falado. Os
acabam tendo de ler um texto sem objetivos, apenas porque o profes- textos escritos têm outra vantagem de logística em relação aos textos
sor lhes disse para lerem. E isso pode provocar resistência. Quando os falados: eles podem ser lidos confortavelmente em ônibus, aviões, na
objetivos da tarefa pedagógica estão claros, possíveis resistências por praia. E isso não acontece com a mesma comodidade em relação aos
parte dos alunos tendem a ser minimizadas. textos falados por conta, principalmente, do acesso ainda não demo-
É importante fornecer aos alunos uma razão para a leitura por cratizado a redes wi-fi.
uma questão de gerenciamento didático. Como lembra Christine Nut- Em comparação com a escrita, a leitura se torna mais fácil até
tall (2001: 154), "na maioria das salas de aula, não é viável os alunos es- por causa da dificuldade que os brasileiros enfrentam para desenvol
colherem seus próprios textos. Ter de ler textos escolhidos por outra ver sua habilidade de escrita na própria língua materna. Essa díficul
pessoa levanta uma questão: por que os alunos devem ler e querer ler dade, que faz com que muitos professores universitários se queixem
tais textos?". Portanto, é recomendável que o professor sempre expli- da falta de proficiência escrita dos estudantes recém-ingressados nos
cite o(s) objetivo(s) da atividade de leitura que seus alunos realizarão. cursos superiores, acaba resvalando no desenvolvimento da escrita
Se comparada às outras três habilidades linguísticas, a leitura em língua inglesa.
se configura como a mais fácil de ser desenvolvida pelos aprendizes Em relação à fala, a leitura se apresenta também como uma habi-
brasileiros. Percebemos isso no discurso de pessoas que já estuda- lidade mais fácil de ser desenvolvida porque não exige a construção de
ram inglês e que costumam fazer o seguinte comentário: "Eu consi- enunciados em tempo real e não requer o concomitante cuidado com a
go ler bem, mas falar e escrever pra mim é complicado". Geralmente pronúncia. A fala não permite muito tempo de reflexão sobre o que está
essas pessoas sequer mencionam a compreensão oral, a mais difícil sendo enunciado, diferentemente da leitura, que permite ao leitor retomar
de ser desenvolvida. partes do texto mais de uma vez no processo de construção de sentidos.
Historicamente, o aprendizado da leitura em línguas estrangeiras Entretanto, considerar a leitura mais fácil de ser desenvolvida do
sempre foi um processo menos complicado por conta de alguns fatores. que as outras três habilidades não significa que ela seja fácil de ser de-
Um deles era o fato de o acesso a textos escritos ser bem mais fácil do senvolvida. A leitura é uma habilidade complexa, que depende profun-
que o acesso a textos falados. Quando comecei a estudar inglês no final damente dos conhecimentos prévios do leitor, sem os quais a produção
dos anos 1970, a única possiblidade de ouvirmos textos em inglês fora de sentidos se torna difícil ou até mesmo impossível.
da sala de aula era nas salas de cinema (que não eram chamadas de "sa- Diante das dificuldades que os aprendizes podem encontrar, o
las" naquela época e que não tinham som DoLby Stereo=) e na rádio AM, desenvolvimento da sua capacidade leitora exige do professor o pre-
quando conseguíamos arduamente sintonizar na BBC, que chegava até paro cuidadoso de atividades que contribuam para o desenvolvimen-
nós com um sinal muito ruim. Hoje a internet potencializa o acesso a to de micro-habilidades de leitura. Pensando no papel do professor na
textos falados. Digo "potencializa'' porque não compartilho da ideia de promoção do desenvolvimento da capacidade leitora dos seus alunos,
democratização do acesso à internet no Brasil nesta segunda década do organizei este capítulo da seguinte forma: inicialmente, abordarei a

98 Aula de inglês: do planejamento à avaliação CAPíTULO 4 I o ensino da leitura 9


questão da coerência textual; em seguida, comentarei o papel das ati- surge (ou não) a partir do encontro dos dois (entendendo-se tanto boca
vidades de pré-leitura e, na sequência, tratarei de cinco micro-habi- quanto oLhos de forma metonímica).
!idades de leitura; finalmente, abordarei três questões importantes e Em outras palavras, ao contrário do que alguns (ou muitos) pro-
controversas relacionadas ao ensino da leitura. fessores pensam, a coerência de um texto não está nele nem no leitor.
Ela depende não apenas das palavras que o autor coloca no texto, mas
4.1 A coerência textual também dos conhecimentos prévios do leitor, ou seja, dos seus esque-
mas mentais, que, como vimos no capítulo 2, são estruturas de conhe-
o ensino da leitura requer do professor um entendimento mínimo cimento nas quais se armazenam os conhecimentos que construímos a
de conceitos teóricos a ela relacionados. Um desses conceitos é o de partir de nossas experiências.
COERÊNCIA TEXTUAL, que é, muitas vezes, mal compreendido. É essa Consideremos, no seguinte texto, como a construção da coerên-
má compreensão que leva pessoas a dizerem coisas do tipo: "Este texto cia é instaurada no ato da leitura:
não tem coerência". Mas, será que a coerência de um texto está nele
mesmo? Será que procede a visão imanentista de coerência, segundo a The bus careered along and ended up in the hedge. Several
qual a coerência é algo inerente a um texto e, por isso, um texto é ou passengers were hurt. The driver was questioned by the police.
não é coerente para qualquer leitor? A partir desse breve texto, Nuttall nos oferece uma explicação
Jorge Luis Borges, em seu livro intitulado Esse ofício do verso, faz bastante didática de como nossos esquemas mentais nos ajudam a in-
um comentário sobre as diferentes interpretações possíveis de um terpretar um texto, i.e., nos ajudam no processo de construção da coe-
mesmo texto a partir de uma reflexão curiosa sobre o sabor de uma rência textual:
fruta, que nos ajuda a entender a questão da coerência:
Fazemos conexões entre os elementos das três orações porque temos
Falando sobre o bispo Berkeley (que, permitam-me lembrar, foi um profe- um esquema mental sobre ônibus; esse esquema inclui o fato de que os
ta da grandeza dos Estados Unidos), lembro que ele escreveu que o gosto ônibus transportam passageiros e que um ônibus tem um motorista. Daí
da maçã não estava nem na própria maçã - a maçã não pode ter gosto entendermos que os passageiros mencionados estavam no ônibus (e não
por si mesma - nem na boca de quem come. É preciso um contato entre em um carro que, por acaso, estava lá) e que o motorista era o motorista
elas. O mesmo acontece com um livro ou com uma coleção deles, uma do ônibus, não o motorista de outro veículo. Entretanto, as orações não
biblioteca. Pois, o que é um livro em si mesmo? Um livro é um objeto fí- nos dizem realmente essas coisas: nós é que fazemos as interpretações
sico num mundo de objetos físicos. É um conjunto de símbolos mortos. E baseadas nas nossas experiências (Nuttall, 2005: 7).
então aparece o leitor certo, e as palavras - ou antes, a poesia atrás das
palavras, pois as próprias palavras são meros símbolos - saltam para a Todas as pessoas que já tiveram a experiência de andar de ônibus
vida, e temos uma ressurreição da palavra (Borges, 2004: 54). possuem esquemas mentais que lhes permitem realizar as conexões
mencionadas por Nuttall. Isso significa que a produção de sentidos a
Parece-me inevitável fazer uma analogia entre a maçã, objeto da- partir de um texto escrito depende, obviamente, das marcas línguís-
quela reflexão de Berkeley (e de uma boca faminta), e o texto, objeto da ticas ali presentes e dos conhecimentos prévios do leitor, ou seja, de
interpretação do leitor: a maçã equivale ao texto; o come dor da maçã elementos que não estão no texto.
equivale ao leitor; e o sabor da maçã equivale à coerência textual. As- As conexões a que Nuttall se refere nos remetem ao conceito de
sim como o sabor da maçã não está nem nela nem na boca de quem a coerência textual, que, conforme explicam Robert-Alain de Beaugrand
come, mas surge (ou não) a partir do encontro entres as duas, a coe- e Wolfgang Dressler (1996 [1981J), diz respeito às maneiras pelas quais
rência textual não está nem no texto nem nos olhos de quem o lê, mas conceitos e relações subjacentes à superfície do texto são acessíveis c

100 Aula de inglês: do planejamento à avaliação


CAPiTULO 4 I o onsino dn IUIIIIIII 101
relevantes. Para ilustrar (' esclarecer o que esses dois teóricos querem Afinal de contas, se a dois leitores diferentes, com conhecimentos pré
dizer quando falam de conceitos e de relações, voltemos ao exemplo vios diferentes, é apresentado um determinado texto, esse texto pode
fornecido por Nuttall: ser considerado incoerente por um e coerente pelo outro.
(a) o conceito the bus remete o leitor a um tipo de veículo e es- Uma questão estreitamente relacionada à coerência é esta: exis-
tabelece uma relação com o conceito the driver, a qual, para o tem textos inerentemente fáceis ou difíceis? Logo a seguir, encontram-
leitor, é bem diferente da relação que the bus estabelece com o -se três textos curtos: um aviso; um texto informativo sobre a Grande
conceito severat passengers: embora ambos remetam o leitor a Esfinge de Gizé disponibilizado aos turistas pelo órgão oficial de turis-
seres humanos, the driver estabelece uma relação ativa com the mo do Egito; e um verbete de um glossário de termos da física subatô-
bus, paciente da ação realizada pelo agente the driver, enquanto mica. Você acha que esses textos são fáceis ou difíceis?
the bus desempenha o papel temático de locativo, expressando a
localização de passengers;
(b) os conceitos career atong e end up estabelecem relações com o
conceito the bus e expressam ações que ocorrem com o veículo as
quais remetem o leitor à interpretação de que um acidente ocorreu;
(c) o conceito end up estabelece uma relação com o conceito in
bEmI
CONFINED SPACE
(Disponível em: <http://
funny-pictures.picphotos.netl
confined-space-authorized-
personnel-signs/lockouttag.
com*img*lg*S*authorized-

the hedge que remete o leitor ao destino do veículo; AUTHORIZED personnel-da nger-sig n-s-

(d) o esquema mental ACIDENTE DE VEÍCULO é ativado na mente PERSONNEL ONLV 0693g.png/>;
acesso: 17 ago. 2014.)
do leitor e reforçado com a relação que se estabelece entre o
conceito several passengers e o conceito be hurt, que expres-
THE GREAT SPHINX
sa uma consequência negativa sofrida no corpo dos indivíduos
The greatest mystery of An-
representados pelo conceito severat passengers, que desem-
cient Egyptian mysteries is
penha o papel temático de paciente;
also the largest monolithic
(e) o conceito question estabelece uma relação com os conceitos
statue and the oldest known
the poíice e the driver, indicando ao leitor, por meio da voz ver-
monumental sculpture in the
bal utilizada, quem é o sujeito e quem é o paciente da ação
world. When was it built, for
expressa por questiono
what purpose, which pharaoh
Essa breve análise evidencia como a construção da coerência de-
does it represent, and who broke the nose? Any answer is a
pende dos conhecimentos prévios do leitor, pois as relações estabele-
matter of conjecture. Egyptologists have not found any conclu-
cidas entre os conceitos dependem profundamente de suas experiên-
sive evidence. No matter. The Great Sphinx of Giza is a wonder
cias de mundo. A análise mostra também o quanto eu tive de escrever
to behold. (Disponível em: <http://en.egypt.travel/attraction/
para explicitar, sem pormenores, mecanismos de produção de sentidos
index/the-great-sphinx>; acesso: 19 ago. 2014. Imagem: acer-
que ocorrem na mente do leitor em uma fração de segundo.
vo pessoal.)
Em suma, o professor de inglês precisa ter consciência de que a
coerência textual não está no texto nem no leitor, pois ela surge (ou não) THE ROLE OF THE HIGGS BOSON
a partir do encontro desses dois elementos. Ele precisa ter em mente The Higgs boson was the last particle of the Standard Model
que uma concepção imanentista de coerência não procede porque ne- to be discovered. It is a critica I component of the Standard
nhum texto é inerentemente coerente ou inerentemente incoerente. Model. Its discovery helps confirm the mechanism by which

102 Aula de inglês: do planejamento à avaliação CAPíTULO 4 I O ensino do 101111111 10


fundamental particles get mass. These fundamental particles of sao as tais partículas transportadoras de energia. E saber o que (' ('SSfI
the Standard Model are the quarks, leptons, and force-carrier tal teoria padrão é essencial para o entendimento da entrada do glos
particles. (Disponível em: <http://www.particleadventure.org/ sário. Entretanto, se o leitor desse verbete for um físico que domina él
the-role-of-the-higgs-boson.html>; acesso em: 19 ago. 2014.) língua inglesa, logicamente ele o considerará fácil. Isso significa que o
verbete também não é inerentemente fácil nem difícil: o grau de difi
Então, o que podemos dizer? Talvez fiquemos tentados a dizer que culdade depende de quem é o leitor, dos conhecimentos que ele possui
o aviso é fácil por ser um gênero textual que as pessoas veem com fre- ou não possui.
quência em locais públicos urbanos e por ter poucas palavras. No caso Consequentemente, ao planejar uma aula de leitura, o professor
do aviso em questão, ainda há o fato de várias de suas palavras serem precisa prever se seus alunos terão dificuldade para ler certo tex-
cognatas para os falantes de português. Assim, aprendizes adultos pro- to com base na linguagem nele presente e no tema por ele abordado.
vavelmente não teriam dificuldade em produzir sentidos a partir desse Caso preveja que eles terão alguma dificuldade, mapeie as prováveis
aviso, mesmo que eles estivessem no nível iniciante, porque provavel- causas da dificuldade para auxiliá-los na atividade de leitura. O pro-
mente já seriam pessoas não apenas com conhecimentos linguísticos da fessor precisa ajudar seus alunos a se prepararem para as atividades
língua portuguesa, o que lhes permitiria reconhecer os cognatos con- voltadas para o desenvolvimento da leitura por meio das atividades d
fined, space, authorized e personneL, mas também com conhecimentos pré-leitura, foco da próxima seção.
textuais e enciclopédicos, o que lhes permitiria reconhecer a forma do
gênero textual aviso e a palavra danger, presente em tomadas de equipa- 4.2 O papel das atividades de pré-Ieitura
mentos eletrônicos. Contudo, uma criança brasileira aprendendo inglês
provavelmente não teria a mesma facilidade, que seria menor ainda se O professor chega à sala de aula, cumprimenta os alunos e con-
ela vivesse em uma pequena cidade da zona rural, onde geralmente não versa rapidamente com eles sobre o final de semana, pois hoje é se-
há avisos nas paredes dos prédios. Logo, o aviso não é um texto ineren- gunda-feira. Após o bate-papo em inglês, ele lhes diz para abrirem o
temente fácil: ele pode ser fácil para muitos leitores e difícil para alguns. livro didático em certa página e lerem o texto que ali se encontra. Após
E o informativo turístico é fácil ou difícil? Provavelmente alguém 5 minutos, pergunta-lhes: ''Are you done?". Os alunos respondem afir-
diria que é fácil para aprendizes que se encontram em níveis mais mativamente, o professor lhes solicita que façam o exercício sobre o
avançados de proficiência e difícil para iniciantes, embora mesmo os texto que está na mesma página.
iniciantes possam construir alguns sentidos por conta da imagem da Bem, reflitamos sobre a aula apresentada no parágrafo anterior. A
Grande Esfinge de Gizé e dos conhecimentos que construíram nas au- conversa em inglês sobre o final de semana funciona como warm-up.
las de história antiga, os quais lhes permitem reconhecer alguns cog- Ponto para o professor. Contudo, ao solicitar aos alunos para lerem
natos. Tal probabilidade já aponta para o fato de esse informativo tu- um texto sem uma preparação mínima para a leitura, ele perde pon-
rístico não ser inerentemente fácil nem difícil. tos. Sem preparação, seus alunos não têm a menor ideia do objetivo da
Quanto ao verbete do glossário, muitas pessoas diriam se tratar leitura. E para complicar ainda mais a vida dos alunos, ele não lhes dá
dum texto difícil, embora seja bem curtinho e ironicamente seja um a oportunidade de ativarem seus esquemas mentais para realizarem a
texto cujo objetivo é fornecer uma definição esclarecedora de algo. Afi- atividade.
nal, é essa a ideia de um glossário, não é verdade? Para mim, ele é um A lição que podemos tirar dessa situação imaginária é que os pro-
texto difícil porque me faltam conhecimentos enciclopédicos do campo fessores precisam sempre preparar seus alunos para as atividades d
da física que me permitam saber que teoria padrão é essa, além de eu leitura, diferentemente do professor do exemplo fictício. E como eles
não ter uma ideia clara do que sejam quarks e léptons e não saber quais devem fazer isso? Por meio de ATIVIDADES DE PRÉ-LEITURA.

104 Aula de inglês: do planejamento à avaliação CAPiTULO 4 I O ensino do IUlh1l1l 10


Essas atividades possuem propósitos pedagógicos bem claros. Um
deles é possibilitar ao professor fazer ideia dos conhecimentos relacio-
nados ao texto que os alunos possuem ou não possuem e, assim, to-
mar decisões quanto à forma de conduzir a atividade de leitura. Outro Keeping FIDO Safe:
objetivo é ajudar os alunos a ativarem ou a construírem os esquemas Car Travei Safety
mentais exigidos pelo texto a ser lido. A maioria dos livros didáticos Tips for Big and
atuais oferece atividades de pré-leitura. Entretanto, você pode não Small Dogs!
considerar algumas dessas atividades interessantes ou até não encon-
trar uma atividade de pré-leitura em alguma lição. Nesses casos, você
precisa elaborar uma atividade de pré-leitura.
Um ponto importante a ser considerado é o tempo de duração das
atividades de pré-Ieitura, O professor precisa ter bom senso quanto A partir desses elementos, o professor pode perguntar aos seus
a esse tempo, que não deve ser igual nem maior do que o tempo de alunos onde o cachorro da foto está para certificar-se de que todos
duração da atividade de leitura. É necessário que ele tenha isso em prestaram atenção à imagem. Em seguida, pergunta-Ihes qual a relação
mente para não desequilibrar a alocação de tempo no plano de aula e entre a foto e o título e o subtítulo. Talvez algum aluno queira saber o
na realização da aula. Não faz o menor sentido realizar uma atividade que fido significa. Nesse caso, o professor fornece a explicação neces-
de pré-leitura que dure dez minutos para preparar os alunos para uma sária. Finalmente, ele lhes pede sugestões de quais seriam as formas
atividade de leitura que não dura nem cinco minutos. mais seguras de se levar um cachorro em um carro. Depois da atividade
Um tipo comum de atividade de pré-leitura é a tempestade de ideias de leitura, ele pode lhes perguntar se o texto traz alguma das sugestões
ou brainstorming. O professor informa aos alunos que lerão um texto so- que eles deram na conversa sobre a imagem, o título e o subtítulo.
bre determinado tema e os encoraja a dizerem que palavras, frases e tó- E se, durante o planejamento da aula, o professor perceber que
picos vêm às suas mentes ou que eles esperam encontrar no texto. Se o determinadas palavras podem causar dificuldade para a realização da
professor achar necessário, escreve no quadro o que os alunos vão dizen- atividade de leitura, deve preparar uma atividade para que os alunos
do, podendo estruturar as respostas no formato de um mapa semântico. aprendam essas palavras antes de realizarem a atividade? Ou deve
Outro tipo de atividade simples e eficaz para preparar os alunos ignorar tais palavras e deixar que os alunos gerenciem seu contato
para a leitura é explorar, com eles, o título, o subtítulo e as imagens com elas, lançando mão de estratégias de compensação?'
do texto, fazendo-lhes perguntas e comentários sobre eles. Aliás, a Depende. Se o número de palavras desconhecidas for elevado, isso
realização dessa atividade representa uma oportunidade para o pro- significa que o texto, a depender da atividade de leitura proposta, está
fessor conscientizar seus alunos acerca da importância de prestarem num grau de complexidade linguística muito além daquela com a qual
atenção a esses elementos para a ativação dos esquemas mentais, pois os alunos são capazes de lidar. Logo, é melhor ponderar se vale a pena
alguns deles, por alguma razão, tendem a ígnorá-los no ato da leitura usar esse texto. Caso o número de palavras seja reduzido, o professor
por acreditarem que o texto se resume ao que está escrito do primeiro precisa levar em consideração dois pontos:
ao último parágrafo. (a) se ele sempre trabalhar o vocabulário antes da atividade de
Imaginemos um texto que tenha o título, o subtítulo e a imagem leitura, não estará ajudando seus alunos a desenvolverem
apresentados abaixo, que esteja em um livro didático voltado para o
nível intermediário e que o professor irá utilizá-lo para uma atividade Para mais informações sobre as estratégias de compensação, veja as páginas 56 e 57
de leitura: de Métodos de ensino de inglês: teorias, práticas, ideologias (Oliveira, 2014).

106 Aula de inglês: do planejamento à avaliação


CAPíTULO 4 I O ensino da laitut o 10
estratégias de compcnsaçao para lidar com palavras desco- WHAT IS AN ORCHESTRA?
nhecidas, atrapalhando, assim, a construção de sua compe- The word orchestra derives from the Greek word oPX1Ícr'tpo., which
tência comunicativa; is the name for the area in front of an ancient Greek stage where
(b) se ele trabalhar o vocabulário esporadicamente e por meio de musicians and dancers performed. An orchestra is a large in-
uma atividade que leve os alunos a interagirern, vale a pena strumental ensemble that contains four sections of instruments:
realizar a atividade de pré-leitura com o objetivo de ensinar strings (cello, double bass,viola), brass (trumpet, horn, trombone,
itens lexicais. Nesse caso, o professor pode planejar uma ativi- tuba), woodwinds (bassoon, clarinet, oboe, flute, piccolo, cor an-
dade de vocabulário que servirá como atividade de pré-leitura. glais, saxophone) and percussion (timpani, harp, keyboards).
Realizar ou não algo desse tipo é uma decisão que o professor A smaller-sized orchestra (of about 50 musicians or fewer) is cal-
deve tomar no momento de planejar suas aulas. led a chamber orchestra. A full-size orchestra (about 100 musi-
Se decidir trabalhar com o vocabulário, o professor tem algumas cians) may sometimes be called a "symphony orchestra" or "phi-
opções. Por exemplo, pode informar aos alunos o tema do texto a ser Iharmonic orchestra". These modifiers do not necessarily indica-
lido e pedir-lhes para dizer que palavras esperam encontrar no texto, te any strict difference in either the instrumental constitution or
o que se configura como uma atividade de brainstorming. Isso ajuda os role of the orchestra, but can be useful to distinguish different
alunos a ativarem esquemas mentais. ensembles based in the same city (for instance, the London
Vejamos uma atividade pré-leitura, a título de ilustração, baseada Symphony Orchestra and the London Philharmonic Orchestra).
em um texto que adaptei a partir de duas entradas da Wikipédia. Essa A symphony orchestra will usually have over eighty musicians
enciclopédia online não é uma fonte confiável da qual se devam retirar on its roster, in some cases over a hundred, but the actual num-
informações para citações pelo fato de ser uma enciclopédia na qual ber of musicians employed in a particular performance may
qualquer pessoa pode inserir verbetes, mas é uma fonte legítima de vary according to the work being played and the size of the ve-
material para leitura. nue. For example, a violinist may be necessary in some pieces
but not in others. A leading chamber orchestra might employ
PRE-READING ACTlVITY: Write the word orchestra on the as many as fifty musicians; some are much smaller than that.
board and tell the students they are going to read a text about Besides the players, the orchestra has a conductor, whose pri-
something related to it. Ask them what words they expect to mary duties are to unify performers, set the tempo, execute

find in the texto Write on the board the words they say. Give out clear preparations and beats, and to listen critically and shape
the texts and ask them to check if those words are in the texto the sound of the ensemble. Conductors act as guides to the or-
chestras they conduct. They choose the works to be performed
READING ACTIVITY: Tell the students to read the following and study their scores to which they may make certain adjust-
questions and then read the text to answer them:
ments, work out their interpretation, and relay their ideas to the
1. How many players does an orchestra have? performers. They may also attend to organizational matters,
2. What's the difference between a symphony orchestra and such as scheduling rehearsals.
a philharmonic orchestra?
3. What do conductors do? Creio que os exemplos dados até aqui sejam suficientes para ilus-
4. What words in the text refer to the people who play the trar a importância de o professor realizar atividades de pré-lcitura
instruments? para ajudar seus alunos a se prepararem para as atividades de leitura

108 Aula de inglês: do planejamento à avaliação


CAPíTULO 4 I o ensino do 101111111 10
, assim, a desenvolverem micro-habilidades de leitura, das quais trata processo de se tornarem capazes de reeonh r os padrões orlOgrún
a próxima seção. cos da língua inglesa.

4.3 Miero-habilidades de leitura (a) Rewrite these sentences with contractions.


1. I am a student.
o atoda leitura é complexo: envolve uma série de outros atos que 2. She is an engineer.
dependem de diversas habilidades do leitor. Por essa razão, podemos 3. He is a waiter.
pensar didaticamente na leitura como uma macro-habilidade com- 4. They are soccer players.
posta de micro-habilidades que o aprendiz deve desenvolver para ser 5. It is time for lunch.
capaz de ler fluentemente textos em inglês. Esta seção é dedicada a 6. You are Brazilian.
cinco micro-habilidades que o professor precisa considerar na hora de
7. We are from Bahia.
planejar suas aulas voltadas para o desenvolvimento da habilidade de
leitura dos seus alunos. (b) These words are misspelled. Write them correctly.

Uma micro-habilidade básica é o RECONHECIMENTO DOS PA- 1. saturday


DRÕES ORTOGRÁFICOS. Para o aprendiz brasileiro, desenvolvê-Ia é 2. agust
relativamente fácil pelo fato de o português e o inglês utilizarem o al- 3. canadien
fabeto latino. 4. thrusday
No estágio inicial, os aprendizes precisam se concentrar nas ca- 5. spanish
racterísticas ortográficas do inglês que não existem em português, 6. februery
como, por exemplo, a ocorrência dos seguintes dígrafos consonantais: 7. wenesday
th, ph, sh, ng e wh. Eles também precisam se familiarizar com as con-
trações de uma palavra com outra (e.g., I am ~ I'm; she would ou she Outra micro-habilidade de leitura que os aprendizes precisam de
had ~ she'd) e com o uso de iniciais maiúsculas nos nomes de dias da senvolver é o RECONHECIMENTO DAS CLASSES DE PALAVRAS. Isso
semana, meses do ano, línguas nacionais e nacionalidades (e.g., Wed- soa como tópico de uma aula de gramática, não é? Entretanto, ser ca-
nesday, February, Swahili, Nigerian). paz de distinguir, em um texto, que palavras são substantivos, adjeti-
O processo de familiarização com esses aspectos deve ser inicia- vos, verbos, preposições e conectivos é crucial para o desenvolvimento
do no primeiro semestre do curso por meio das atividades extraclasse. da habilidade de leitura, o que implica que os aprendizes devem conh •...
-
Vale notar que, apesar de focarem a grafia, estando, a rigor, vinculadas cer também as regras que regem as palavras pertencentes a uma clas-
ao desenvolvimento da escrita, elas possuem um papel crucial no de- se e suas relações com as palavras de outras classes. Um exemplo das
senvolvimento da capacidade dos aprendizes de reconhecerem os pa- relações entre as palavras de uma mesma classe é o papel de modifi-
drões ortográficos da língua inglesa. cador que os substantivos exercem quando são usados imediatament
antes de outros substantivos, como podemos ver nestas ocorrências:
Apresento, a seguir, dois tipos de atividades voltadas para o de-
senvolvimento dessa micro-habilidade, comuns em livros de exercícios.
kitchen door kitchen table table leg
Preciso enfatizar que atividades desse tipo podem parecer bastante
leg bones soccer player cat food
bobas por não exigirem muito esforço cognitivo por parte dos aprendi-
s. Entretanto, elas são extremamente importantes para ajudá-los no toe nail wine glass road sign

110 Aulo do inglês: do planejamento à avaliação CAPiTULO 4 I O ensino da leitura


Novamente, as atividades extraclasse são essenciais para a familia- xemplo, no caso de hazards e leases, o S final serve para que eles perco
rização dos aprendizes com as classes de palavras. Os livros didáticos bam que estão lidando com o plural de substantivos e não com verbos na
provavelmente trazem atividades para o desenvolvimento dessa micro- 3a pessoa singular do simple present, conclusão reforçada pela posiçao
-habilidade. De qualquer forma, apresento, a seguir, um exemplo de ati- dessas palavras nas orações: hazards está no final de uma oração cujo
vidade voltada para o reconhecimento das classes das palavras que pode verbo principal é have to, portanto não pode ser um verbo; leases an-
ser utilizada com aprendizes do nível intermediário elaborada a partir tecede imediatamente o verbo rnust, isto implica que ele é o sujeito de
de um trecho da brochura Protect Your FamiLyfrom Lead in Your Horne". must; disclosure é imediatamente antecedido por um artigo indefinido, o
REAOING ACTIVITY: Read the text below and underline ali the
que demonstra ser disclosure um substantivo.
nouns and circle ali the prepositions.
A BUSCA POR INFORMAÇÕES ESPECÍFICAS é outra micro-habi
lidade de leitura que o aprendiz precisa desenvolver para se tornar um
ARE VOU PLANNING TO BUY, RENT, OR RENOVATE A HOME
leitor eficiente. Ela se caracteriza por ser realizada com uma velocida-
BUILT BEFORE 1978?
de razoavelmente elevada pelo fato de o leitor ignorar várias partes do
Many houses and apartments built before 1978 have paint that
texto quando procura por informações específicas. É muito provável
contains high levels of lead (called lead based paint). Lead
que os aprendizes brasileiros de inglês já tenham desenvolvido essa
from paint, chips, and dust can pose serious health hazards if
micro-habilidade e a utilizem nas leituras em língua portuguesa. Con-
not taken care of properly.
tudo, eles podem não ter consciência disso e acabam não a transferin-
OWNERS, BUYERS, ANO RENTERS are encouraged to check
do para as leituras em língua inglesa. Por essa razão, é muito impor-
for lead before renting, buying or renovating pre-1978 housing.
tante que o professor leve atividades voltadas para o desenvolvimento
Federallaw requires that individuais receive certain information
dessa micro-habilidade, sejam elas parte do livro didático ou não.
before renting, buying, or renovating pre-1978 housing:
Saber localizar informações específicas é importante para a leitura
LANOLOROS have to disclose known information on lead-
que impomos a vários gêneros textuais, como catálogos telefônico (qua-
-based paint and lead-based paint hazards before leases take
se extintos por causa da internet), guias turísticos, horários de trens,
effect. Leases must include a disclosure about lead-based paint.
enciclopédias e dicionários. O professor precisa lembrar a seus alunos
SELLERS have to disclose known information on lead-based que, para buscarem informações específicas em um texto, eles precisam
paint and lead-based paint hazards before selling a house. Sa- saber de que informações necessitam para, a partir daí, estabelecerem
les contracts must include a disclosure about lead-based paint. palavras-chave que os guiarão na busca. Por exemplo, se eles precisam
Buyers have up to 10 days to check for lead.
alugar um apartamento ou uma casa em Montreal, eles podem seguir
RENOVATORS disturbing more than 2 square feet of painted este percurso: buscar no Google ou em outra máquina de buscas um
surfaces have to give you this pamphlet before starting work. jornal por meio da palavra-chave "Montreal newspapers"; selecionar, di-
Você provavelmente observou que esse texto contém palavras que gamos, o Montreal Gazette; buscar a palavra-chave Classlfieds e nela cli-
podem ser desconhecidas dos aprendizes, como, por exemplo, hazards, car; procurar por algo relacionado à palavra-chave rent, o que os levará
leases e disclosure no terceiro parágrafo. Entretanto, elas são oportuni- a Rentals, seção que os oferece duas possibilidades: Property For Rent
dades excelentes para o professor conversar com os alunos sobre estra- e Vacation Rentals; clicar em Property For Rent por causa da palavra-
tégias que os ajudam a decidir se essas palavras são substantivos. Por -chave; localizar no mapa a área em que prefere alugar e analisar as pos-
sibilidades apresentadas.
Essa brochura está disponível em: <https:fjwww.fsa.usda.govjlnternetjFSA_Filej
Vejamos uma atividade voltada para o desenvolvimento dessa
pfflinyhbrochure.pdf>; acesso: 22 jun. 2015. micro-habilidade, a qual se adequa ao nível intermediário. Nela incluo

112 Aula de inglês: do planejamento à avaliação CAPíTULO 4 I O ensino da leitura 113


também uma atividade de pró-leitura que explora elementos que s dded lhcll lhe drugs problem should be handled as a rnauor
encontram no título e acrescento uma imagem da folha da maconha of public health. Gil had already defended the idea of decrimi
que não está no texto original". nalization during an interview with Brazilian magazine Veja.
Gilberto Gil, and the drummer Chiquinho Azevedo, were ar
PRE-READING ACTIVITY: Before the students receive the text,
rested in 1976 in Florianópolis because they were carrying
write its title and its publication date on the board and exploit
marijuana. There is no consensus on decriminalization among
this information with them. Ask them if they know what marijua-
Brazilians. Some people, like this Brazilian Anti-drugs website,
na is and if they have any idea of who the minister mentioned in
believe that psychoactive drugs are dangerous and can lead to
the title is. Hand out the text and ask them to look up the name
health problems, including chemical dependence.
of the minister to check if they guessed correctly. Then show
them the image of the leaf of marijuana 50 that they can check Nessa atividade específica, o professor deveria perguntar aos alu-
if they really know what marijuana is. nos como eles encontraram as respostas. Ele deveria reforçar que as
READING ACTIVITY: Tell the students to answer the questions palavras-chave das perguntas 1, 2 e 3 são, respectivamente, decrimi-
below according to the text and to show where they found their naLizatian, 1976e defended. Além disso, ele precisa explicar aos alunos
answers in the texto Remind them to read the questions first 50 que, na pergunta 4, não há uma palavra-chave pelo fato de essa per
that they will have key-words to guide their search for information. gunta exigir uma leitura nas entrelinhas do final do último parágrafo
1. 15 Gil for or against the decriminalization of marijuana? para ser respondida.
2. Why did the police arrest Gil in 1976? Por extensão, em qualquer atividade desse tipo, o professor
3. Was the interview Gil gave to Folha de São Paulo the first precisa incentivar os alunos a explicarem como encontraram as res-
time he defended the decriminalization of marijuana? postas. Afinal, essa discussão pode ajudar os alunos que não con-
4. What argument do people who have a different opinion seguiram encontrá-Ias a pensarem sobre o porquê de não terem
from Gil use? conseguido e, dessa forma, terem insights importantes a respeito da
BRAZILlAN MINISTER OF CULTURE SAYS THAT HE SMOKED maneira como estão realizando a leitura por meio da qual objetivam
MARIJUANA UNTIL THE AGE OF 50 buscar informações específicas.
A BUSCA POR IDEIAS GERAIS é outra importante micro-habili-
dade. Ao utilizá-Ia, o leitor empreende uma leitura menos atenta a de-
talhes, mais acelerada que o normal e mais atenta às ideias principais
Wednesday, June 1,2005 do texto. É assim que lemos um jornal, a fim de saber quais as princi-
The Brazilian Minister of Culture Gilberto Gil, aged 62, said that
pais informações e notícias, e é assim que lemos uma matéria jornalís-
he smoked marijuana until he was 50. In addition he defended tica, o que nos faz decidir se a leremos mais atentamente ou não.
the decriminalization of drug's consumption.
E um tipo de atividade útil para ajudar os aprendizes a desenvol-
verem essa micro-habilidade é aquela em que eles leem um texto e de-
Gil took part in a press conference with journalists of Folha de
vem criar um título para ele ou escolher o título mais adequado a par-
São Paulo on Monday (May, 30). During the interview the Bra-
tir de algumas alternativas apresentadas. Eis um exemplo elaborado a
zilian minister asked: "Why should drugs be forbidden?" He
partir de um trecho de um texto retirado da brochura Bahia: Land af
Happiness, publicada pela Bahiatursa, órgão oficial de turismo do Es-
Disponível em: <httP//en.wikinews.org/wikijBrazilian_Minister_oCCulture_
says_thache_smoked_marijuana_untiLthe_age_oC50>; acesso: 15jun. 2015. tado da Bahia:

114 Aula do inglês: do planejamento à avaliação CAPiTULO 4 I O ensino da 101luI 11:>


READING ACTIVITY: Tell lhe studenls to read lhe text, choos xplicar um fenômeno, narrar um evento, informar alguém acerca d('
lhe best title for it from the ones presented below and explain algo. Uma atividade interessante que o professor pode levar para seus
lheir choice. alunos é aquela em que ele lhes apresenta alguns parágrafos, de um
mesmo texto ou de textos diferentes, para que eles digam qual a fun-
( ) The Pearl of the Atlantic
ção de cada um deles.
( ) Land of Good Opportunities A seguir, apresento um exemplo desse tipo de atividade em que há
três parágrafos: o primeiro é argumentativo e visa convencer o leitor
( ) Bahia: the Best Tourist Choice da necessidade social de legalizar o uso e o comércio da maconha nos
TEXT: Estados Unidos; o segundo é descritivo e objetiva exatamente descre-
ver uma mulher chamada Lenka, com ênfase na descrição do seu ros-
Beyond its wealth of natural resources, Bahia is also known as a
to; o terceiro é um parágrafo expositivo, cujo objetivo é apresentar ao
commercial center where "good business" can be done. With a leitor os efeitos que a nicotina produz no organismo (não há como não
territory larger than the area of France, Bahia's economy is the enxergarmos aí também um caráter argumentativo do parágrafo volta-
sixth largest in Brazil, achieving self-sufficiency in oil generation do para convencer o leitor a parar de fumar).
and power supply. Bahia also possesses an extensive network
of roads and highways connecting ali of its production centers. READING ACTIVITY: What is the function of each of these

The State is an important producer of grains, fruits, cattle, cellulo- paragraphs?

se paper, chemicals, petrochemicals and minerais, among many 1. The federal government should repeal the ban on marijua-
other products, and it boasts three large seaports strategically na. The social costs of the marijuana laws are vasto There
located along the midriff of the Brazilian coast, Salvador, Aratu were 658,000 arrests for marijuana possession in 2012, ac-
and Ilhéus. Fifty-one percent of the basic petrochemicals produ- cording to F.B.I.figures, compared with 256,000 for cocaine,
ced in Brazil come from the Camaçari Petrochemical Complex heroin and their derivatives. Even worse, the result is racist,
in Bahia. Gold, copper, dimension stones, barite, rock salt and falling disproportionately on young black men, ruining their
manganese are just of minerais found and mined in the state. lives and creating new generations of career crirninals".

To help realize the State's full business potential, Bahia has 2. My best friend is Lenka. She is small and quite slim. She
created specialized bureaus to aid potential investors in ali has got an oval face with bright blue eyes and a big mouth.
these areas, as well as tourism. Come to Bahia and find a good She has long brown wavy hair but she usually wears it in a
clirnate, for investment that is! ponytail. She is quite beautiful, especially when she srniles'.

Em atividades como essa, o professor precisa incentivar os alunos 3. Nicotine is a drug that is naturally present in the tobacco
a explicarem por que a segunda alternativa é a correta e as outras, plant and is primarily responsible for a person's addiction
erradas. Essa discussão, após uma atividade de escolha de título para to tobacco products, including cigarettes. During smoking,
um texto, é importante para ajudar os alunos a ganharem confiança na
busca das ideias centrais dos textos. Parágrafo adaptado de um editorial do jornal New Yore Times disponível em:
O professor pode considerar também as atividades voltadas para <http:j /www.nytimes.com/interactive/2014/07/27/opinion/sunday/high-time-mari-
juana-legalization.html>; acesso: 2 jul. 2015.
a busca da função de parágrafos, como, por exemplo, descrever algo 5 Disponível em: <http://www.essayforum.com/writing-3/best-friend-lenka-de-
ou alguém, defender um ponto de vista, apresentar razões para algo, scription-person-16612/>; acesso: 2 jul. 2015.

116 Aula de inglês: do planejamento à avaliação CAPiTULO 4 I Oensino da leitura 117


nicotine enters lhe lungs and is absorbed quickly into the 4. Residonts of Scotland voted against becoming an If)UP

bloodstream and travels to the brain in a matter of seconds. pendent nation yesterday in the Scottish independenc
Nicotine causes addiction to cigarettes and other tobacco referendum.
products that is similar to the addiction produced by using
SCOTLAND SAYS 'NO' IN INDEPENDENCE REFERENDUM
drugs such as heroin and cocaine".
Friday, September 19/ 2014
Em atividades desse tipo, é importante o professor solicitar aos
alunos que justifiquem suas respostas. Isso ajuda os que acertaram a __________________ .The country is to
reforçar seus raciocínios e ajuda os que erraram a entender o porquê remain part of the United Kingdom. In a turnout of 84.6% of
do erro. some 4.3 million eligible voters, 55% voted against and 45%
Outra atividade voltada para a busca da ideia central de parágrafos voted for the proposition "Should Scotland be an independent
é aquela em que o primeiro período de cada parágrafo de um texto é country?".
retirado do parágrafo e colocado junto com os outros períodos fora de
__________________ . Overnight, af-
ordem, cabendo aos alunos a tarefa de associar cada período a seu res-
ter the first result was announced at 1:30 a.m., the "No" vote
pectivo parágrafo. A seguir, apresento um exemplo desse tipo de ativi-
slowly edged ahead. Just after 6:00 a.m., with the declaration
dade apropriado para aprendizes no nível avançado de pr oficiência. Ele é
of the results for Fife, the "No" campaign attained an unassaila-
baseado numa adaptação do texto Scotland says 'No' in ínriependence re-
ble lead. With the final declaration by the Highland Council this
jerendum? (para seu controle, a ordem correta das respostas é 4-3-2-1).
gave a final total of 1/617/989 "Yes" and 2/001/926 "No" votes.
READING ACTIVITY: Tell the students to match the sentences
__________________ . On the eve of
below to the paragraphs that follow them.
the referendum this had narrowed to "No" 45%/ "Yes" 41% with
1. On the package of greater devolved powers for Scotland 14% remaining undecided. With a greater margin than recent
promised late in the day to the Scottish people, David Ca- polls had suggested the majority of these undecided voters ul-
meron, Prime Minister of the United Kingdom said: "We will timately voted "No" to win it for the pro-union campo
ensure that those commitments are honoured in full."
_________________ . He added that
2. When the referendum was announced in March of 2013 "We have delivered on devolution and we will do 50 in the next
Australia's ABC reported that opinion polls showed only parliament." Promising that in delivering the "vow" a parallel
30% of the Scottish population supported independence, process will address the West Lothian question and work to-
with 50% favouring the preservation of the Union. wards greater devolution of powers to Wales, Northern Ireland,
and at Westminster, English only votes on English issues.
3. Polling stations opened at 7.00 a.m. on the 18th with queues
outside some of the 5/579 stations, and many were busy Cameron must now negotiate with the Westminster parties and
until the polls closed at 22.00 p.m. convince them - especially some within his own party - to
pass legislation through Westminster to enable this before the
March 2015 date promised.
Disponível em: <http://www.cancer.gov/cancertopics/factsheetjTobacco/cessa-
tion>; acesso: 21 set. 2014.
o Disponível em: <http://en.wikinews.org/wikijScotland_says_%27No%27 _in_in-
No capitulo anterior, tratei de uma micro-habilidade de compreen-
dcpendence_referendum>; acesso: 22 jun. 2015. são oral muito importante: a REALIZAÇÃO DE INFERÊNCIAS ou

'18 Aula de inglês: do planejamento à avaliação CAPíTULO 4 I o ensino da leitura 11(


INFERENCIAÇÃO. Os leitores também precisam desenvolver a micro- serve para sua conscicntízaçâo sobre a realização de infe!('n{"ias. ()
-habilidade de realização de inferências. Todas as considerações que texto curto da atívídade acima é perfeito para isso. E aqui estão as I íl
faço sobre essa miero-habilidade a partir de textos falados se aplica à ões que, espera-se, levarão os alunos às respostas corretas:
inferenciação feita a partir de textos escritos, à exceção do fato de eu
1. The author is married. We know that because he uses the
estar agora falando de sinais gráfieos e imagens, e não mais de sons.
words "my wiie".
Por isso, serei breve e apresentarei apenas uma atividade que ilustra o
que professor pode fazer para propiciar a seus alunos oportunidades 2. They're going to travei. We know that because they "tried to
de praticar essa miero-habilidade. pack light" and packing is something we do before we travei.
Uma forma muito eficiente de contribuir para o desenvolvimen- They're also going to go swimming. We infer that from their
to da micro-habilidade de realização de inferências dos aprendizes é, making sure not to forget their "bathing suits and sun biock":
obviamente, oferecer-lhes atividades em que eles devem responder a
3. They're going to use some kind of boat. We know that be-
perguntas que só podem ser respondidas por meio da inferência. E
cause he's afraid he'If get seasick again. And one only gets
isso deve ser feito desde o nível inicial. Digo isso porque há professores
seasick on a boat ar a similar means of transportation.
que acreditam que a inferenciação, por depender profundamente dos
conhecimentos prévios do leitor, deve ser pratieada apenas nos níveis 4. There are two c/ues in the text that telf us they're going to
mais avançados. Para ilustrar isso, vejamos um exemplo de atividade be around water: the bathing suits and the fear of getting
bem simples, que elaborei a partir de outra oferecida por Eileen Bailey seasick.
(2014) e que é adequado para o segundo nível iniciante.
5. Yes. He says he wesn't sure he would get seasick again. The
word "eqein" is the key to answer this questiono
READING ACTIVITY: Answer the questions below according to
the texto Explain how you got the answers. Em atividades desse tipo, o professor precisa discutir com os
1. What's the author's marital status?
alunos a respeito de como eles chegaram a suas respostas. Isso deve
acontecer mesmo que eles precisem justifiear suas escolhas falando
2. What are the author and his wife going to do? português, pois o importante aí não é a resolução da atividade em si:
3. What means of transportation are they going to use?
o importante é o desenvolvimento da consciência acerca da realização
de inferências.
4. Are they going to be around water? Se os aprendizes desenvolverem as cinco miero-habilidades abor-
5. Did the author get seasick before this time?
dadas neste capítulo, a probabilidade de se tornarem leitores fluentes
em língua inglesa é grande. É claro que isso depende também do de-
TEXT senvolvimento dos seus conhecimentos linguístieos.
My wife and I tried to pack light but we made sure not to for-
Vale notar que essas cinco miero-habilidades estão relacionadas a
get our bathing suits and sun block. I wasn't sure if I would get
uma modalidade de leitura extensiva, não a uma leitura intensiva. Esta
é aquela forma de leitura que um estudante, por exemplo, impõe a um
seasick again so I made sure to pack some medicine for upset
stomachs.
texto que será cobrado em uma prova no seu curso universitário. EI
precisa apreender e entender não apenas a ideia geral do texto, mas
É importante
o professor solicitar aos alunos para explicarem, também todos os detalhes de todas as partes do texto para estar apto
mesmo em português, como chegaram às respostas. Essa conversa a fazer a prova. Já a leitura extensiva é aquela em que não há, por parte

120 Aula de inglês: do planejamento à avaliação CAPiTULO 4 I o ensino da leuurn 121


do leitor, uma preocupação com todos os detalhes do texto. No caso não foram escritos para ser lidos em voz alta. E um texto escrito para
do ensino da leitura a aprendizes brasileiros de inglês, a leitura inten- ser lido silenciosamente tem uma estrutura discursiva diferente da es-
siva não se justifica, pois o objetivo das aulas de leitura não é levar os trutura discursiva de um texto escrito com o propósito de ser lido em
alunos a estudarem intensivamente um texto: o objetivo é levá-los a voz alta, marcado por características próximas da fala, como os textos
desenvolver a habilidade de leitura por meio do desenvolvimento das dramáticos, por exemplo. Resultado: a leitura em voz alta se torna can-
micro-habilidades de leitura, focando nas ideias principais e em alguns sativa, enfadonha e um verdadeiro martírio para a plateia.
detalhes do texto. Ponto interessante a observar aqui nos é fornecido por pesqui-
Há ainda três questões controversas que envolvem o ensino da sadores que escreveram sobre a história da leitura. Refiro-me ao pro-
leitura para as quais o professor precisa estar atento: a leitura em voz cesso em que os leitores passaram da prática de leitura em voz alta
alta, o uso de materiais autênticos e o uso da literatura na aula de in- para a prática da leitura silenciosa, que lhes permitiu estabelecer uma
glês. É delas que a próxima seção trata. relação mais íntima com o texto. Esse processo é considerado uma das
mais importantes revoluções na leitura. Ela fez surgir, por exemplo, a
censura. Conforme nos informa MangueI (2006: 68), os padres católi-
4.4 Três controvérsias: a leitura em voz alta, o uso de
cos ficaram preocupados com a leitura silenciosa porque ela permitia
textos autênticos e o uso de textos literários
que um livro fosse lido "em particular e sobre o qual se pode refletir
Inicio esta seção com uma pergunta: com que frequência as pes- enquanto os olhos revelam o sentido das palavras", deixando de ficar
soas fazem LEITURA EM VOZ ALTA?Intuitivamente posso responder "sujeito às orientações ou esclarecimentos, à censura ou condenação
que essa frequência é muito baixa. A não ser que você seja um radialis- imediata de um ouvinte".
ta ou um jornalista que apresenta reportagens lidas em voz alta. Existe As palavras de MangueI fazem surgir uma questão importante re-
ainda a possibilidade de você trabalhar como leitor para uma pessoa lacionada à leitura em voz alta: a relação entre o ato visual de proces-
com deficiência visual aguda, como foi o curioso e interessante caso de sar as palavras e o ato cognitivo de processar os sentidos dessas pala-
Alberto MangueI, que teve a sorte de fazer isso para ninguém menos vras. Será que ler em voz alta nos permite processar os significados do
do que Jorge Luis Borges (e acabou inevitavelmente se tornando um texto com a mesma velocidade com que os processamos na leitura em
excelente escritor). Lembro-me também daqueles pais e mães que cos- silêncio? A velocidade dos olhos é maior do que a da voz, o que faz com
tumam ler histórias para seus filhos e filhas na hora de dormir, prática que a leitura em voz alta dificulte muito o processamento semântico
aparentemente não muito comum no Brasil. para quem a realiza.
Afora esses casos, as pessoas geralmente não realizam leituras em Considerando que raramente lemos textos em voz alta e a proble-
voz alta. Evidência disso é a inexistência de textos deliberadamente es- mática relação entre o ato visual de processar as palavras e o ato cog-
critos para serem lidos em voz alta disponíveis para o público em geral. nitivo de processar os sentidos dessas palavras, uma pergunta é inevi-
tável: o professor de inglês deve solicitar aos alunos que leiam textos
Há pessoas que leem textos em voz alta em eventos nos quais
tradicionalmente há discursos, como formaturas, eventos políticos e em voz alta?
Françoise Grellet (2001: 10) faz um comentário sobre a leitura em
eventos religiosos. Contudo, são poucas as pessoas que realizam essas
voz alta nas aulas de língua estrangeira, transcrito aqui in extenso:
leituras. Há também professores que leem textos em voz alta em con-
gressos. Aliás, muitas pessoas que fazem parte da plateia de eventos Os alunos não deveriam ler em voz alta. É um exercício extremamente
em que textos são lidos em voz alta geralmente classificam essa prática difícil, altamente especializado (muito poucas pessoas precisam ler em
de enfadonha. E por quê? Simplesmente porque a grande maioria dos voz alta em sua profissão), o qual dá a impressão de todos os textos terem
textos lidos em voz alta em congressos, formaturas e outros eventos sido feitos para serem lidos na mesma velocidade. Além disso, quando

122 Aula de inglês: do planejamento à avaliação CAPiTULO 4 I O ensino da laitut o 173


lemo», nossos olhos não seguem cada palavra do texto, uma depois da Para além das dificuldades que apresentam para a leitura em voz
outra - pelo menos no caso dos leitores eficientes. Ao contrário, rnuí- alta, textos autênticos contribuem para inflamar uma forte controvér-
tas palavras ou expressões são simplesmentepuladas;nós voltamospara sia: o professor deve usar textos autênticos nas atividades de leitura? A
hecar algo,ou avançamospara confirmar alguma das nossas hipóteses.
discussão em torno da propriedade ou impropriedade do uso de textos
Tais táticas se tornam impossíveisna leitura em voz alta, e essa atividade
autênticos nas aulas de inglês como língua estrangeira procede do fato
de leitura, portanto, tende a impedir que os alunos desenvolvamestraté-
gias de leitura eficientes. de os aprendizes não encontrarem textos especificamente produzidos
para determinados níveis de proficiência e veiculados em jornais, re-
Diante dessas considerações, fica claro que o professor precisa se vistas, livros, programas de rádio, programas de televisão ou em qual-
perguntar: para que pedir aos alunos para lerem textos em voz alta na quer outro meio de veiculação. Os aprendizes não encontram, nem em
sala de aula? Talvez a leitura em voz alta possa até servir ao professor TV a cabo, programas produzidos para quem se encontra no nível ini-
para ele saber se o aluno conhece as correspondências entre a forma ciante ou intermediário de aprendizagem de inglês.
.scrita e o som. Excetuando-se isso, não há razões defensáveis para a Por essa razão, conforme abordei alhures (Oliveira, 2014),há quem
leitura em voz alta de textos que não sejam dramáticos. defenda a ideia de que textos autênticos sejam usados na sala de aula
Muitas vezes, exatamente por não terem o hábito nem a habili- para que os alunos aprendam a acessar textos produzidos para usos
dade necessária para ler textos em voz alta, os aprendizes de inglês, não pedagógicos da língua se quiserem funcionar comunicativarnen-
ao lerem textos em voz alta na sala de aula, o fazem de forma sofrí- te numa comunidade de usuários da língua inglesa. Afinal, repito, não
vel, com os colegas educadamente demonstrando ter paciência para existem versões facilitadas de textos circulando na sociedade, à exce-
ouvi-los, Curiosamente, há alunos que pedem ao professor para lerem ção do ambiente escolar (e, é claro, do ambiente familiar, quando os
textos em voz alta. Suspeito que uma das razões para isso seja a falsa alunos levam atividades da escola para casa).
sensação que eles têm de estarem falando inglês quando, na verdade, Os adeptos da abordagem comunicativa, por exemplo, são alguns
não estão falando nada: eles estão apenas oralizando um texto escrito. dos que defendem o uso de textos autênticos. De acordo com Alan
Nada mais do que isso. Cunningsworth (1995:66), um dos argumentos usados por eles é o fato
Que o professor reflita com cuidado sobre essa questão da leitura de os textos elaborados com fins pedagógicos serem, em geral, tão ar-
em voz alta, que se complica quando pensamos em uma questão im- tificiais que não possuem uma estrutura discursiva natural, considera-
portante: o professor deve ou não solicitar aos seus alunos para lerem da por adeptos do ensino comunicativo um dos fatores essenciais para
TEXTOS AUTÊNTICOS nas suas aulas de leitura? o aprendizado da língua.
Antes de mais nada, precisamos nos lembrar de que textos autên- Entretanto, há teóricos e professores que consideram os textos au-
ticos são aqueles que não foram produzidos especificamente para o tênticos muito difíceis para os aprendizes, especialmente os iniciantes.
ensino de inglês. É o caso, por exemplo, de romances, contos, reporta- Consequentemente, eles defendem o uso de textos elaborados especi-
gens de jornais, cartas comerciais e anúncios publicitários. Tais textos ficamente para iniciantes e a simplificação de textos autênticos. David
não possuem nenhum tipo de simplificação linguística, fato que obvia- Nunan (1989),por exemplo, acredita que o simples uso de textos autên-
mente complicaria a vida dos aprendizes que decidissem lê-los em voz ticos em sala de aula não garante que as tarefas que os alunos realizarão
alta por conta da mais do que provável presença de palavras de baixa com esses textos se assemelhem a tarefas realizadas fora da sala de aula.
frequência no uso oral da língua e com as quais eles não terão a menor Os defensores do uso de textos autênticos sustentam que um mes-
familiaridade. Ler em voz alta textos autênticos que não foram escritos mo texto autêntico, escrito ou falado, pode ser utilizado na sala de aula
para serem lidos em voz alta é uma tarefa difícil de ser realizada e de com aprendizes de todos os níveis de proficiência desde que a atividade
ser pedagogicamente justificada. que eles realizem, referentes a esse texto, seja adequada a seu nível d('

124 Aula de inglês: do planejamento à avaliação


CAPiTULO 4 I o ensino do IOilllJ (I 1'H
'ompctência comunicativa. r~lesalegam ainda que, se um texto aprescn- Quando pensamos em literatura e ensino de inglês, não podemos
Ul determinado grau de dificuldade para o aprendiz, isso pode servir d nos esquecer do método de gramática e tradução, cujo principal obje-
motivação para ele praticar o uso de estratégias de compensação. tivo é levar os aprendizes a se tornarem leitores eficientes. Em sua fase
Quanto ao argumento de que a atividade realizada com um tex- mais popular, no final do século XIXe no início do século passado, os
to autêntico pode não se assemelhar em nada às atividades realizadas professores só usavam textos literários na sala de aula. Poemas, contos
pelo aluno fora da sala de aula, os defensores do uso de textos autênti- e possivelmente romances eram estudados minuciosamente em sala de
s podem rebatê-lo afirmando que, mesmo que essa semelhança não aula. Contudo, com a modernização das tecnologias da informação -
se materialize, a atividade didática pode proporcionar ao aprendiz a e aqui me refiro especificamente à invenção do rádio, do telefone e do
prática de habilidades comunicativas necessárias à comunicação nas televisor -, os textos literários começaram a perder espaço para ou-
situações de interação que ocorrem fora da sala de aula. tros tipos de textos, e.g., textos jornalísticos e anúncios publicitários,
E aqui vai um alerta: nas aulas do método de gramática e tradução.
Nos anos 1980, ressurgiu o interesse no papel que a literatura
Há professores de inglês que selecionam textos para usá-los em sala de
pode desempenhar no processo de ensino-aprendizagem de inglês
aula e os simplificam, os adaptam para seus alunos. Esses professores
como língua estrangeira. E esse ressurgimento parece estar muito
precisam ter cuidado com esse processo de adaptação, pois podem tor-
ligado à perspectiva intercultural do ensino de inglês que começou
nar os textos até mais difíceis para os alunos a depender do que reti-
a fazer parte da agenda de linguistas aplicados e professores. Afinal,
rem dos textos: a estrutura discursiva pode ser negativamente afetada
(Oliveira, 2014:162-163). os textos literários podem contribuir para a construção da compe-
tência comunicativa intercultural dos aprendizes de inglês exata-
Esse alerta é importante porque muitos professores ficam ten- mente pelo fato de a literatura ser parte integrante da cultura de
tados a simplificar textos. Mas simplificar textos é uma tarefa muito uma sociedade.
mais complicada do que parece. Não por acaso, existem profissionais O debate em torno do papel da literatura no ensino e na apren-
especializados na elaboração dos easy readers: não é qualquer um que dizagem de línguas estrangeiras se intensificou e trouxe uma reflexão
está apto a fazer isso. inevitável: o professor deve promover o uso de textos literários ou o
Por isso, adote uma posição equilibrada: faça uso racional tanto estudo da literatura nas suas aulas?
do livro texto adotado na instituição em que trabalha quanto dos tex- Questão fácil de ser respondida: o professor deve promover o uso
tos autênticos que decidir levar para a sala de aula. Considere o grau de textos literários nas suas aulas e não promover o estudo da literatu-
de dificuldade da linguagem e do tema do texto diante dos alunos que ra. Estudar literatura é algo que os estudantes fazem nos cursos de le-
você possui. Não se recuse terminantemente a usar textos autênticos. tras. Os institutos de idiomas, as escolas e os colégios não são espaços
Você pode até decidir usar apenas textos autênticos, mas saiba logo de adequados para estudar literatura. Em contrapartida, nada impede que
uma coisa: você terá um trabalho hercúleo para encontrar textos que o professor de inglês use textos literários em suas aulas, desde que ele
se adequem a todos os objetivos didáticos que você deve alcançar em tenha consciência do principal objetivo desse uso: ajudar seus alunos a
um semestre letivo. Finalmente, não se recuse a usar textos que não aprenderem inglês.
sejam autênticos, pois eles têm um lugar no processo de ensino-apren- Entretanto, usar textos literários nas aulas de inglês não é tarefa
dizagem, como os livros didáticos e os easy-readers têm demonstrado fácil, por duas razões. Vejamos cada uma delas.
ao longo das últimas décadas. A primeira é a própria natureza da literatura, que, como já nos
Aliás,os easy readers me remetem à terceira controvérsia que propus ensinava Ezra Pound (2006 [1934]:32), "é linguagem carregada de síz-
abordar nesta seção: o USO DE TEXTOS LITERÁRIOS na aula de inglês. nificados", Isso já aponta para um fato: é elevada a densidade semântica

176 Aula de inglês: do planejamento à avaliação CAPiTULO 4 I O ensino da lenur


das palavras que um poeta escolhe para expressar imagens em seus Claramente, a adequação dos textos selecionados para dctcrtuinnd •• ólll
poemas ou que um romancista escolhe para descrever personagens, permanece um fator crucial para o sucesso da abordagem. Os textos !lI
estados psicológicos e cenários. Consequentemente, podemos facil- tendem a ser escolhidos são aqueles que não são muito longos, nun '.ó
mente prever que tende a ser elevado o número de palavras desconhe- linguislicamente muito complexos, não estão muito distantes dos ('011111
cidas dos aprendizes, mesmo os que se encontram nos níveis avança- cimentos de mundo dos alunos e não são muito anacrônicos.
dos, porque geralmente falta-lhes a capacidade de ler textos literários,
conforme ressalta Alan Maley (2001: 181), citando Henry Widdowson:
***
"Os alunos são frequentemente expostos a textos literários como se Espero que esta breve seção sirva para suas reflexões sobre ('sI.
já soubessem lidar com eles". A lógica subjacente a esse comentário três questões importantes para o ensino da leitura nas aulas ele i I
é a natureza específica dos textos literários (líricos ou em prosa), que glês: a leitura em voz alta, o uso de textos autênticos e o uso de tcxtr
possuem uma carga semântica elevada, são repletos de figuras de lin- literários.
guagem, principalmente a metáfora. Dedico o próximo capítulo ao ensino da fala.
A segunda razão é o despreparo da maioria dos professores para
trabalhar com literatura. Tal despreparo é um reflexo do fato de a
maioria arrasadora dos cursos de letras no Brasil não oferecer uma
disciplina voltada para a metodologia do ensino de literatura. O resul-
tado disso é que os alunos se formam e vão para a sala de aula repetir
a fórmula fracassada de ensino de literatura que se tradicionalizou nas
escolhas brasileiras: o ensino superficial de uma história estereotipada
da literatura. É uma fórmula ainda vigente tanto nos cursos de letras
vernáculas quanto nos cursos de letras com línguas estrangeiras, com
raras e honrosas exceções, e geralmente com um agravante: os textos
literários são usados como pretextos para os professores ensinarem
elementos gramaticais.
Se decidir usar textos literários em suas aulas, o professor de
inglês deve ter o cuidado de não repetir o erro cometido por profes-
sores de literatura e de português no ensino médio, qual seja, usá-los
como pretexto para ensinar elementos gramaticais. Ele pode até usá-
-los como pretexto para discutir questões interculturais, para provo-
car discussões sobre um tema ou sobre aspectos linguísticos relacio-
nados a textos literários, como, por exemplo, a rima, a assonância e
a aliteração, que podem contribuir para a prática da pronúncia. Mas,
insisto, não deve utilizá-lo como pretexto para ensinar gramática.
Isso contribui para que os aprendizes não se sintam interessados por
literatura.
Se você decidir usar textos literários em suas aulas, recomendo
que pense nestas palavras de Maley (2001: 184):

128 Aula de inglês: do planejamento à avaliação CAPiTULO 4 I o ensmo da IUIIII


o ensino da fala
história do ensino de línguas estrangeiras nos
mostra que a fala nem sempre teve lugar 11(l
sala de aula. O método de gramática e tradu
ção, por exemplo, lhe nega esse espaço, difcrcntcnun
te do que fazem o método direto e a abordagem ('0
municativa. Ainda há, no Brasil, muitas escolas, ('ol!'
gíos e faculdades que lançam mão do método de grél
mática e tradução. Entretanto, é seguro afirmar que
todos os institutos de idiomas em nosso país incluem
o desenvolvimento da fala dos seus alunos não apenas
nas suas listas de prioridades, mas também nos seus
anúncios publicitários. Existem cursos que chegam :1
anunciar milagres deste tipo: "Fale inglês em 3 meses".
Ora, os religiosos dogmáticos que me desculpem, mas
não há milagres no processo de ensino-aprendizagem
de línguas estrangeiras. Para aprender a falar inglês,
o aprendiz tem de ralar. Ele tem de estudar, de se d
dicar, de praticar. A não ser que esses cursos tenham
uma ideia bem limitada do que "falar inglês" signifi
que. Se eles entendem "saber falar inglês" como sendo
a capacidade de se dizer My name's Luciano e 1 am
Brazilian e a capacidade de responder a meia dúzia
de perguntas, então o que eles anunciam é possível.
Porém, se por "falar inglês" entendemos a capacida
de de interagir com outras pessoas utilizando a língua

CAPiTULO 5 I o ensino do lolu


inglesa, entendendo-as c fazendo-nos entender acerca de assuntos método de ensino adotado pelo professor. Mas existem também luto
diversos, três meses é obviamente uma pequena parte do começo do res de ordem psicológica, importantíssimos para o desenvolvimento dél
processo de desenvolvimento da fala. fala dos aprendizes, que nos colocam diante da seguinte questão: QUE
Tal processo envolve o aprimoramento da pronúncia das palavras BARREIRAS PSICOLÓGICAS ATRAPALHAM O DESENVOLVIMENT
na fala encadeada e o desenvolvimento de conhecimentos linguísticos, DA FALA?
enciclopédicos e textuais, de micro-habilidades, da precisão gramati- O professor precisa pensar sobre essa questão porque a aprcn-
cal' e da fluência. Podemos perceber que não se trata de um processo dizagem de uma língua é uma atividade que envolve não apenas éI
simples. Exatamente por essa razão, os aprendizes que não são autodi- cogníção, mas também os estados psicológicos dos aprendizes. Esses
tatas (ou seja, quase todos os aprendizes) precisam da ajuda do profes- elementos são tão importantes que Lozanov propôs a suggestopeclicl
sor para desenvolverem a fala de maneira eficaz e consistente. O papel concentrando-se em formas de superar as barreiras psicológicas que
do professor nesse processo é essencial, principalmente nos níveis ini- eles podem criar e que dificultam a aprendizagem. E fontes de barrci
ciantes de aprendizagem. ras psicológicas muito comuns são a timidez e o medo de errar, que
E para ajudar seus alunos nesse processo, o professor de inglês acabam provocando nos aprendizes ansiedade e insegurança, princi
precisa evitar a questão que historicamente se instaurou de maneira palmente nas atividades de fala.
confusa em torno do ensino da fala: ela é um fim em si mesma e deve Há pessoas com barreiras psicológicas tão fortes que se rccusnm
ser pensada como uma habilidade a ser desenvolvida ou é apenas um a responder uma pergunta do professor diante de todos os colegas.
meio para se desenvolverem conhecimentos gramaticais e a pronún- Essa recusa pode se dar de maneira explícita ou camuflada, que se mu
cia? Atualmente, o professor de inglês bem informado sabe que a fala terializa na forma da resposta I don't know. Lembro-me de uma situa-
deve ser vista como uma habilidade que os alunos precisam desenvol- ção, em 1990, durante uma aula em que eu estava revisando a pronún-
ver para serem usuários competentes da língua e que ela depende do cia dos nomes de cidades e de países, na qual perguntei a uma aluna da
desenvolvimento dos conhecimentos linguísticos, aí incluído o aprimo- minha idade: What's the capitaL af EngLand? Ela prontamente respon
ramento da pronúncia. deu: I dan't knaw. Ao final da aula, quando todos se retiraram, ela me
Com o objetivo de ajudar o professor na tarefa de ajudar seus alu- disse em português bem claro e com um tom irritado: "Nunca mais me
nos a desenvolverem sua fala, escrevi este capítulo e o dividi em três faça perguntas de geografia numa aula de inglês!". Enfatize-se que era
seções. Incialmente, abordo três questões essenciais para o ensino da um estágio da aula voltado para a reciclagem de vocabulário: não era
fala. Em seguida, trato do papel das atividades de pré-fala no ensino da uma atividade de produção oral complexa, embora estivesse tentand
fala. Finalizo o capítulo comentando micro-habilidades de fala. estabelecer um diálogo simples com ela. Felizmente, esse é um caso
extremo de barreira psicológica e, por isso, raro. O mais comum é a
5.1 Três questões importantes: barreiras psicológicas, existência de alunos temerosos de cometerem erros ao falar. E esse V'-
leitura em voz alta e fluência vs. precisão mor acaba provocando uma espécie de timidez contingencial no aluno,
que não necessariamente é tímido, mas que sente insegurança e evita
Existem vários fatores didático-pedagógicos que interferem no tentar falar para não correr riscos.
desenvolvimento da fala dos aprendizes, como, por exemplo, o tempo Como o professor pode ajudar os alunos que sentem medo de erra r
de exposição ao inglês falado e escrito, o tempo investido na práti- a tentarem se arriscar, a não evitarem tentar falar na sala de aula? Sei
ca da fala, seu nível de conhecimentos linguísticos e enciclopédicos, o que estamos aqui retornando à questão do gerenciamento da sala de
aula, retorno inevitável quando falamos de ensino da fala. Por isso, V"
Optei por usar o termo precisão gramaticaL como equivalente do termo accuracy. jamos algumas sugestões para o professor conseguir essa diminuição.

I\ulo do inglês: do planejamento à avaliação CAPiTULO 5 I O ensino da foln 1,


No prirnciro dia de aula, eu costumava perguntar nos meus alunos do trabalho em grupo: "Determinadas capacidades de um iuclivkluo
se havia alguém tímido naquele grupo. Invariavelmente, alguns levan- não são trazidas à Lonaa não ser sob o estímulo da sua associaçao com
tavam a mão. Eu levantava a minha mão também e dizia-lhes que sou outros indivíduos" (Dewey, 1916 apud Ellis, 2004: 266). Entretanto, Ellis
tímido, embora muitas pessoas não acreditassem naquilo. Afinal, eu lembra que "nem Lodos os aprendizes estão positivamente dispostos
sou um professor! Explicava-lhes, então, que não posso deixar minha a trabalharem com outros aprendizes na realização de tarefas" e cita
timidez interferir no meu trabalho e que eles também não deveriam uma pesquisa feita por Ken Willing com estudantes imigrantes na Aus
deixar sua timidez interferir no seu aprendizado. Dizia-lhes que errar trália, a qual revelou que os alunos pesquisados afirmaram ser as tare-
é parte natural do processo de aprendizagem e que, por isso, eles não fas em duplas aquelas das quais eles menos gostam (Ellis, 2004: 266). A
deveriam ter medo de errar. Lernbrava-lhes que só podemos aprender mensagem que isso passa para o professor é que ele deve estar atento
a falar falando: não há outro jeito. ao perfil do seu grupo de alunos para gerenciar as atitudes deles pa ra
O objetivo dessa conversa com meus alunos logo no primeiro dia com o trabalho em dupla.
de aula era criar cumplicidade entre eles e entre eles e mim. A sensa- No capítulo anterior, comentei que há casos curiosos em que alu
ção de cumplicidade, de união em torno do objetivo de aprender inglês, nos tímidos pedem para ler texto em voz alta. Para muitos desses alu-
contribui positivamente para ajudar os alunos a se sentirem mais se- nos, a leitura em voz alta na sala de aula lhes dá a sensação de que
guros, mais autoconfiantes, sem medo de errar. Incentivar os alunos estão falando inglês. E aí surge a segunda questão desta seção: A LEI-
a se arriscarem, a tentarem se expressar oralmente na sala de aula é TURA EM VOZ ALTA É UMA FORMA DE FALA?
importantíssimo para eles se sentirem estimulados a tentar falar. Não!
Além de conversas, há medidas práticas que contribuem para a Ler em voz alta não é falar, é oralizar textos escritos. O professo!'
diminuição do medo de errar que alguns alunos sentem. Uma delas é precisa ter consciência disso para não cair na armadilha de acredita!'
fornecer instruções bem claras para os alunos realizarem as atividades que seus alunos estão falando inglês ao realizarem leituras em voz alta.
de fala. Isso faz com que eles se sintam seguros quanto ao que têm de Já vi professores colocarem no quadro um tipo de atividade de fala que
fazer. Instruções confusas podem levar os alunos a sentirem dificulda- é uma espécie de diálogo que segue um formato semelhante ao qu
des na realização das atividades e até a acreditarem que as dificulda- apresento a seguir:
des que sentem são causadas por sua incapacidade.
A-Hi.
Outra medida prática é não colocar os alunos tímidos no centro
B
das atenções da turma. O trabalho em duplas, o popular pair work, se
A - How are you?
apresenta como uma forma de implementar essa medida, já que o alu-
B- _
no só se expõe a um colega. O professor pode também atribuir iden-
A - Do you want to go to the movies tonight?
tidades diferentes aos alunos em role plays e scenarios. Assim, se eles
B- _
cometerem erros, quem estará errando são os personagens, não eles
A - Blade Runner is playing again.
mesmos. Aliás, essa é uma solução proposta por Lozanov na suggesto-
B- _
pedia para ajudar a diminuir as barreiras psicológicas (Oliveira, 2014).
A - At the Savoy.
Vale lembrar que scenarios nada mais são do que atividades de role
B- _
play que envolvem uma situação específica para estabelecer o contex-
A - Seven-thirty is fine.
to para o diálogo que os alunos realizarão.
B- _
Entretanto, as atividades em dupla não são unanimidade. John
A - See you there. Bye.
Dewey talvez tenha sido a primeira pessoa a falar sobre as vantagens

134 Aula de inglês: do planejamento à avaliação CAPíTULO 5 I o ensino da falo 13~


Se observarmos atentamente esse tipo til' diúlogo, um dos alu a mensagem independentemente da forma como ela é transmitida. Na
1l0S não fala nada, pois ele apenas lê em voz alta, Nesse exemplo, é o verdade, o que é importante para os aprendizes é aprenderem a usar
que acontece com A. Apenas B produz enunciados: A apenas reproduz a língua inglesa para ínteragirem com outras pessoas de maneira ade-
cuunciados. Além disso, o aluno que desempenha o papel de B nem quada e precisa.
pl ccísa ouvir o que A diz porque pode ler as falas de A: não há um abis- Ficou claro: o professor precisa ajudar seus alunos a combaterem
mo de informações. o medo de errar, a não confundirem fala com oralização de textos es-
utro tipo de atividade que pode provocar ilusões quanto ao critos e a se conscientizarem de que a fluência e a precisão gramatical
aluno estar falando inglês é a apresentação oral. Nela o aluno tem de são igualmente importantes.
apresentar oralmente determinado tema por, digamos, cinco minutos. Passo agora a tratar da preparação dos aprendizes para as ativi-
I:: um excelente tipo de atividade, potencialmente muito boa para a dades de fala.
prática da fala, principalmente se estiverem nos níveis mais avançados.
() problema é esse "potencialmente" que usei aí. Explico: há alunos que
5.2 O papel das atividades de pré-fala
simplesmente memorizam um texto inteirinho e a apresentação não
passa de uma espécie de leitura em voz alta a partir de um texto im- Já vimos a importância de preparar os alunos para as atividades
presso em sua memória. Por isso, o professor precisa estar atento para de compreensão oral e de leitura. Similarmente, o professor não deve
não cair nas armadilhas das coisas que parecem com a fala, mas que simplesmente dar instruções para que seus alunos, em seguida, come-
são apenas leituras em voz alta. cem a realizar uma atividade de fala. Ele tem de prepará-los para ela.
A terceira questão que me propus abordar nesta seção é esta: A Geralmente, o livro didático traz atividades de pré-fala, mas, se não as
FLUÊNCIA É MAIS IMPORTANTE DO QUE A PRECISÃO GRAMATI- trouxer, caberá ao professor suprir essa lacuna.
AL? Se respondermos "sim" a essa pergunta, estaremos aderindo à Um dos objetivos das atividades de pré-fala é ESTABELECER O
ideia segundo a qual o importante é que o aprendiz consiga transmitir CONTEXTO dentro do qual os alunos devem situar a atividade de fala.
sua mensagem de maneira que seu interlocutor a entenda. Isso implica Esse objetivo se aplica tanto a uma simples atividade com abismo de
que a precisão gramatical chega até a ser irrelevante. Por exemplo, se informações voltada para as práticas do alfabeto quanto a um role
perguntado "What did you do Iast night?", o aprendiz pode responder play ou scenario voltado para a prática de funções comunicativas mais
'" go movie". É verdade que seu interlocutor entenderá o que ele quis complexas, como convencer alguém a aderir a um ponto de vista. Por
dizer. Afinal, "quanto mais contexto, menos gramática", de acordo com exemplo, se o professor vai utilizar um role play em que um aluno é o
Scott Thornbury (1999: 8). Mas também é verdade que seu interlocutor garçom e outro aluno é o cliente em um restaurante, o professor pode,
saberá que o aprendiz sabe pouco inglês. Só que o entendimento pode como atividade de pré-fala, fazer perguntas sobre o ato de comer fora,
se complicar em outras situações. Imagine que o aprendiz quer dizer e.g., How often do you eat out?, What kind of food do you like?, What's
a seu interlocutor que é casado há cinco anos e que ele produza o se- your favorite dish?
guinte enunciado: "I was marriedfive years". Agora seu interlocutor vai Ao estabelecer um contexto, o professor ajudará seus alunos a ATI-
ntender que o aprendiz não é mais casado. VAREM OU CONSTRUÍREM ESQUEMAS MENTAIS necessários para a
Percebe-se que a resposta correta à pergunta "a fluência é mais realização das atividades de fala, o que se constitui em outro objeLivo
importante que a precisão?" é "não". Ambas são igualmente importan- das atividades de pré-fala. Já vimos, nos dois capítulos anteriores, que o
tcs para o desenvolvimento da fala dos aprendizes de inglês. Uma con- brainstorming é uma atividade que ajuda os alunos a ativarem esquemas
scquência dessa resposta é a recusa a um dos mitos que se instaura- mentais e que ela pode culminar em um mapa semântico. Por exemplo,
ram em torno da abordagem comunicativa: o que importa é transmitir imagine que o professor preparou uma atividade de fala que depende da

6 I\ula de inglês: do planejamento à avaliação CAPITULO 5 I O ensmn do 111111 137


rculizaçào de funções comunicativas. Ele pode solicitar aos alunos qu
1. Hi. Is Mary there?
digam formas diferentes de realizar as funções que ele lhes disser. Se na
2. Would you like to leave a message?
atividade houver as funções greet someone e make a request, o profes-
3. Good morning. Sean speaking. May I help you?
sor pode escrevê-Ias no quadro e, abaixo delas, ir escrevendo o que os
4. Can I speak with Janet?
alunos forem dizendo. O quadro provavelmente ficaria com as seguin-
5. 1'11tell her to call back.
tes formas linguísticas em uma turma de nível intermediário:
6. Is this Henry?
7. She isn't here right now. Do you wanna leave a message?
GREET SOMEONE MAKE A REQUEST
Hi. Please _
Helio. Could you ? Ao mesmo tempo em que permite ao professor diagnosticar s
Good morning. Is it OK if I ? seus alunos têm consciência das diferenças de registro entres as for-
Good afternoon. Do you mind ? mas linguísticas apresentadas na lista, essa atividade serve para ajudar
Good evening. Would you mind ? os alunos a ativarem esquemas mentais e a se aprontarem para se en-
Hey! What's up? I'd appreciate if you __ . gajarem na atividade de fala.
Will you ? No estágio da pré-fala, o brainstorming pode ser associado à cs
crita. Para exemplificar isso, voltemos ao exemplo anterior. Imagine
Objetivo importante das atividades de pré-fala é DIAGNOSTI- que o professor planeja que seus alunos ativem esquemas mentais re
CAR A FAMILIARIDADE DOS ALUNOS COM O TÓPICO DA ATIVI- lacionados às funções comunicativas greet someone e make a request.
DADE. Para realizar o diagnóstico, o professor pode fazer perguntas Ele pode solícítar-lhes que anotem formas linguísticas para cada uma
aos alunos relacionadas ao tópico da atividade de fala. Por exemplo, das funções e lhes dá um minuto exato para fazerem as anotações.
se a atividade é sobre a localização de prédios públicos e privados Depois o professor pede que eles socializem com os colegas o qu
nas ruas, ele pode projetar um mapa e fazer perguntas sobre a loca- anotaram. Isso ajuda alguns alunos a ouvirem formas linguísticas das
lização de determinados estabelecimentos e prédios: What's next to quais não se lembravam.
the schooL?, Where's the barber shop?, e assim por diante. Pode tam- Uma vez preparados para realizarem as atividades de fala, os alunos
bém colocar no quadro preposições e locuções prepositivas que ex- estão prontos para darem seguimento a seu aprendizado de inglês de-
pressam posição (e.g., across from, between, next to, on the right) e senvolvendo micro-habilidades de fala. É disso que trata a próxima seção.
solicitar aos alunos exemplos que as contenham. Assim, ele poderá
diagnosticar se esse vocabulário será ou não um entrave para a reali- 5.3 Micro-habilidades de fala
zação da atividade, analisando a necessidade de reapresentá-lo antes
da atividade de fala. A fala requer o desenvolvimento de diversas micro-habilidades
Um tipo de atividade útil para diagnosticar o conhecimento dos para as quais o professor deve estar atento, a fim de garantir que seus
alunos, ativar esquemas e estabelecer o contexto é o popular Odd man alunos tenham oportunidades de desenvolvê-Ias. Nesta seção, veremos
out. Imagine que os alunos realizarão um diálogo funcional no qual de- cinco delas.
vem manter uma conversa telefônica formal. O professor pode prepa- E a primeira é a PRODUÇÃO INTELIGÍVEL DOS SONS. Obvia-
rar uma lista de frases para eles riscarem da lista aquelas que não se mente, estamos aqui falando da pronúncia. Enfatize-se o modificado r
adequam ao registro formal. Eis um exemplo de elementos que pode- inteligíveL para que o professor não caia na armadilha do mito do fala n
riam compor essa lista: te nativo. Esse mito baliza os objetivos de alguns métodos de ensino,

138 Aula de inglês: do planejamento à avaliação CAPiTULO 5 I O ensino do 1010 13!l


('OI1l0 o 11)('(Odo aucliolinguul, os quais estabelecem o nível de proücí- visitar a Alemanha certa vez, alguém elogiou sua pronúncia c sua flu-
('n('in c o nível de pronúncia a serem atingidos pelos aprendizes como ência, dizendo-lhe que ele falava alemão como um nativo. Bolitho nos
sendo os níveis de um falante nativo. Conforme discuto alhures (Oli- disse que aquilo o incomodou profundamente, porque não queria soar
veira, 2014), o falante nativo é um mito porque é um conceito vago, como um alemão, não queria soar como um falante nativo: ele queria
.xtrcmamente difícil de ser definido para ser usado como balizador ou soar como um britânico, pois britânico é o que ele é. Ele não queria
parârnetro de algo em termos de aprendizagem de inglês. Para resumir perder esse traço identitário.
essa discussão, apresento uma lista de falantes cuja primeira língua é O depoimento de Bolitho foi muito legal. Ele me faz pensar nos
o inglês, o que, em tese, Ihes confere o rótulo de falantes nativos. Você brasileiros que sonham falar inglês como um falante nativo (seja lá o
consideraria todos como falantes nativos? Em caso afirmativo, consi- que isso signifique), o que pode trazer subjacente uma séria questão de
deraria todos o tal modelo de falante nativo sobre o qual tanto se fala subalternidade, do desejo de ser o Outro colonizador.
na área de ensino de inglês? Os livros didáticos trazem atividades para a prática da pronúncia
oum nova-iorquino negro cujo dialeto é o ebonics; envolvendo os sons vocálicos e consonantais, a tonicidade e a entona-
o uma londrina branca analfabeta cujo dialeto é o cockney; ção. Há atividades, por exemplo, voltadas para os pares mínimos, que
o uma jamaicana mestiça com escolaridade completa; objetivam desenvolver a consciência dos aprendizes a respeito das di-
o um australiano aborígene semianalfabeto; ferenças semânticas que os sons vocálicos provocam e do fato de uma
oum estadunidense pardo cujo dialeto é o texano; mesma vogal possuir mais de uma forma de realização, a depender
ouma irlandesa mestiça com escolaridade incompleta. do ambiente fonológico em que está inserida, como é o caso desses
Acredito que você considere nativos todos os falantes dessa lista, exemplos:
mas desconfio que você não elegeria todos como exemplos do proto-
típico falante nativo do qual tanto se fala em anúncios de cursos de not - note kit - kite cap - cape mutt- mute

inglês e em TTC's. Duvido que algum professor brasileiro pretenda que hop - hope sit - site mad - made cut - cute
seus alunos adotem o paradigma verbal do ebonics para o simple pre- cop - cope shin - shine hat - hate jut - jute
sent ou a forma ain't para o verbo to be. Duvido também que algum
professor brasileiro pense no jamaicano ou na irlandesa ao ouvirem Contudo, os livros didáticos produzidos fora do Brasil não apre-
"falante nativo". Simplesmente, não é esse o esquema FALANTE NATIVO sentam os problemas que os aprendizes brasileiros costumam ter ao
que a maioria dos professores brasileiros de inglês possui. produzirem os sons em inglês. O professor é quem tem de planejar ati-
É preciso estar claro na cabeça dos professores de inglês que os vidades voltadas para tais problemas ou abordá-los incidentalmente à
alunos precisam aprender a pronunciar as palavras de forma inteligí- medida que eles surgirem na sala de aula. Vejamos alguns deles.
vel, de maneira que sejam entendidos. Afinal, eles não precisam apren- Um problema bem conhecido dos professores é a produção das
der a pronunciar as palavras como um falante nativo, que, como vimos, consoantes fricativas interdentais surda j8j e sonora jôj, que, res-
um conceito escorregadio, vago. O sotaque não é relevante para a pectivamente, são os sons do dígrafo th de thanks e there. Os apren-
interação com outros falantes, desde, que, repito, ele não interfira na dizes brasileiros têm dificuldade para reproduzir esses sons por uma
inteligibilidade. razão muito simples: esses sons não existem no português brasileiro.
Aliás, há, nesta discussão sobre pronúncia e falante nativo, uma Assim, eles acabam substituindo esses sons por outros: /v/, jfj, jsj,
questão identitária muito importante. Em 1998, participei da Laurels jz/, jt/, jd/ Por isso, o professor precisa falar com seus alunos sobre
Tcacher Trainers' Convention em Maceió, e tive a oportunidade de ou- esses dois sons, orientá-Ios acerca de como pronunciá-Ios e rnonitorur
vir Rod Bolitho comentar sua proficiência em alemão. Ele disse que, ao essa produção.

o Aula de inglês: do planejamento à avaliação CAPiTULO 5 I O ensino Ilu fll!tl 141


A letra E no final de palavras em inglês também apresenta uma pontual é cntonação das chamadas W 11quesuons e das tag 4IH'stio/ls.
dificuldade para os aprendizes brasileiros. Pelo fato de, em português, omo as perguntas em português sempre são pronunciadas com <:11
a letra E ser pronunciada no final das palavras, geralmente de forma tonação final ascendente, os aprendizes brasileiros tendem a fazer a
átona, eles acabam fazendo a mesma coisa com as palavras inglesas. mesma coisa em inglês. O problema é que as perguntas que são ini
Assim, em vez de Ineymj, eles pronunciam Ineymij ao pronunciarem ciadas com pronomes interrogativos, as W-H questions, devem ser
a palavra name. Curiosamente, a palavra coffee (/kofij), que tem dois pronunciadas com entonação final descendente. Já as tag questions
EE no final, é pronunciada por muitos brasileiros da forma que se pro- são pronunciadas com entonação final ascendente se o locutor esti
nuncia a palavra cough (/kof/). O professor precisa chamar a atenção ver verificando uma informação junto ao seu interlocutor, e aí elas são
de seus alunos para esses detalhes. perguntas mesmo, ou com entonação final descendente se o locutor
Um terceiro problema enfrentado pelos aprendizes brasileiros é a estiver apenas buscando a confirmação de algo junto ao interlocutor,
falta de consciência do papel que a tonicidade pode desempenhar na Se o professor não chamar a atenção para problemas pontuais
diferenciação entre verbos e substantivos homógrafos. Há pares deles como esses e outros que encontrar durante as aulas, seus alunos terão
em que um dos membros, cuja sílaba tônica é a primeira, é substantivo, dificuldade até de saber que eles existem, e isso se refletirá negativa-
enquanto o outro membro, cuja sílaba tônica é a segunda, é verbo. O mente na sua capacidade de automonitoramento. Afinal, se seus alunos
quadro a seguir traz alguns pares de verbos e substantivos homógrafos pronunciarem algo de maneira inadequada e se ele não os ajudar a se
para ilustrarem isso (a sílaba tônica está em negrito): conscientizarem da inadequação, eles não saberão que a inadequação
existe e, assim, não terão como se automonitorar.
NOUN
Outra micro-habilidade importante é o USO APROPRIADO DOS
VERB
ELEMENTOS GRAMATICAIS E DO VOCABULÁRIO. Para se tornarem
refuse to refuse falantes eficientes de inglês, os aprendizes precisam ter um vocabulá-
increase to increase rio amplo e saber usar as palavras adequadamente. Simultaneamente,
eles precisam dominar os elementos sintáticos, como as regras de con-
decrease to decrease
cordância e de conjugação verbal. Note que estamos falando do desen-
record to record volvimento da precisão dos aprendizes.
import to import
Um tipo de atividade voltada para o desenvolvimento dessa mi-
cro-habilidade é o popular Find someone who ..., que se encaixa na ca-
conflict to conflict tegoria guarda-chuva das cocktaiL party activities, aquelas que exigem
permit to permit que os alunos se levantem e circulem pela sala de aula. Eis um exemplo:

FINO SOMEONE WHO ...


Há ainda problemas pontuais que muitos aprendizes brasileiros
podem ter no processo de aprimoramento da pronúncia. Por exemplo, 1. went to the beach last Saturday.
muitos aprendizes não sabem que as palavras there, their e they're são 2. saw a movie yesterday.
pronunciadas da mesma forma. Outro exemplo é o hábito de pronun- 3. ate at a restaurant last week.
ciarem a palavra eraser com a fricativa alveolar sonora Izl em vez da 4. read the newspaper yesterday morning.
fricativa alveolar surda Is! Além disso, eles costumam não saber que 5. bought a book last month.
o verbo perifrástico have to é pronunciado com a fricativa labiodental 6. ate bacon and eggs for breakfast today.
surda Ifl em vez da fricativa labiodental sonora Iv! Outro problema 7. took a shower last night.

142 Aula de inglês: do planejamento à avaliação CAPiTULO 5 I O ensino do Inln 14 a


Esse tipo de atividade IlOS permite alglllllíls consklcraçõcs. 1\ pri- produzem. Se o livro didático adotado pclo instituto de idiomas ou pela
nu-ira é a assunção de que a rcpctlçao é necessária para o descnvol- scola em que leciona não oferecer atividades voltadas para o uso apro
virncnto da fala. E cssc é um tipo de atividade dc repetição do padrão priado de registros, ele deverá planejar atividades que deem foco a isso.
verbal Did you ...? Contudo, não é aquela repetição mecânica, sem sen- Uma atividade útil para que a prática desse micro-habilidade é
tido, proposta pelo método audiolingual. A segunda consideração é aquela em que o professor pede aos alunos para, em duplas, criarem
que podemos notar que essa atividade de repetição é significativa por um diálogo entre as personagens que o professor indicará às duplas.
ter um propósito a ser atingido, além de possuir um abismo de infor- Quando as duplas terminarem de preparar os diálogos, cada uma delas
mações, apesar de não haver opções de escolhas de formas linguísticas terá que encenar o diálogo para que os colegas digam se o diálogo foi
para os alunos realizarem as perguntas. Podemos perceber claramente
formal ou informal e para que tentem adivinhar a relação existente en-
que o foco dessa atividade é a prática da formação de perguntas do
tre os personagens. O professor, então, distribui cartões com as duplas
tipo YES-NO no simpLe past com verbos irregulares. E os aprendizes
de personagens, como estas:
precisam, dentre outras coisas, saber fazer perguntas sobre eventos
o boss - employee;
passados para ampliarem sua competência comunicativa. Daí a neces-
o doctor - patient;
sidade de praticarem o uso do simpLe pasto A terceira consideração é
o hotel receptionist - guest;
que atividades voltadas para a prática de estruturas gramaticais são
o detective - suspect;
propostas por um dos mais influentes proponentes da abordagem co-
o mother - daughter;
municativa, William Littlewood (1991),o que reforça a desconstrução
do mito segundo o qual não se pratica a gramática nas aulas da abor- o salesperson - customer;
o friend - friend.
dagem comunicativa. Afinal, tanto a fluência quanto a precisão grama-
tical precisam ser desenvolvidas pelos aprendizes para que eles pos- O scenario é outro tipo de atividade em que os papéis atribuídos
sam, consequentemente, desenvolver sua competência comunicativa. aos alunos os forçam a escolher uma linguagem mais ou menos formal.
O USO APROPRIADO DOS REGISTROS é outra micro-habilidade Basta que o professor, ao elaborar o scenario, escolha personagens que
de fala muito importante e faz parte da competência sociolinguística. façam os alunos optarem por formas linguísticas mais ou menos for-
Saber adequar a fala aos diferentes contextos e aos diferentes interlocu- mais. As duplas de personagens do exemplo anterior podem ser o pon-
tores faz parte da competência sociolinguística de um usuário da língua. to de partida para se criar um scenario. Eis um exemplo:
Dois elementos marcam os graus de formalidade na interação so-
cial. Um deles são as escolhas lexicais. Por exemplo, os verbos frasais, STUDENT A: You are a hotel receptionist in London. There is
como to Look up to, to get away with, to caH off e to give up, são ge- only one room available today. It has a single bed but no view.
ralmente empregados em situações informais. As gírias, como dude e It is on the first floar. The computer system is offline, so you
awesome, obviamente, ocorrem em situações informais. Há verbos mo- cannot check reservations.
dais, que expressam usos sociais, que tendem a ocorrer em situações
informais, como é o caso de can e couíd, e que tendem a ocorrer em STUDENT B: You are a businessman and has just arrived in
situação formais, como é o caso de may, wouLd e wiLL O outro elemen- London. You are at a hotel where you have for the penthouse
to que marca graus de formalidade são as estruturas gramaticais. Por suite overlooking the Thames. You are very tired and it is alre-
xemplo, I wish I was e I ain't são estruturas informais, cujas estruturas ady 11 P.M.
formais correspondentes são I wish I were e I am not respectivamente.
É importante que o professor chame a atenção dos seus alunos O professor explica aos alunos que eles receberão um cart ao
para a necessidade da adequação sociolinguística dos enunciados que com uma personagem que deverão encarnar e resolver a sítuaçao ;di

.4 4 Aula de inglês: do planejamento à avaliação CAPiTULO 5 I O ensmo dn fnln 14 r


descrita. Entü<>,ele distribui o cartão, dá a eles uns dois minutos para Em diálogos funcionais, os alunos precisam escolher que for-
lerem c se prepararem para iniciar a conversa. mas linguísticas usar. Nesse exemplo específico, os alunos precisam
Existe um tipo de atividade chamada diálogo funcional. Ele foca perceber que o registro da conversa é formal para poderem escolher
a REALIZAÇÃO DAS FUNÇÕES COMUNICATIVAS, outra importan- as formas linguísticas mais adequadas para realizarem as funções
te micro-habilidade de fala, mas também serve para a prática do uso indicadas.
apropriado dos registros. Nela há dois grupos de comandos a partir A última micro-habilidade que abordo nesta seção é o USO DE
de funções comunicativas que os alunos devem realizar com formas ESTRATÉGIAS DE COMUNICAÇÃO, que servem para o falante superar
linguísticas apropriadas. A seguir, um exemplo desse tipo de atividade. problemas de comunicação no momento da interação e, assim, pro-
SPEAKING ACTIVITY: Functional dialog.
duzirem os sentidos que desejam transmitir a seus interlocutores. Os
aprendizes brasileiros provavelmente já levam para a aula de inglês es-
LEVEL: Upper intermediate.
tratégias de comunicação que construíram ao usarem a língua portu-
PROCEOURES: Tell your students that they'll work in pairs and guesa. Entretanto, é possível que eles não tenham consciência delas. É
that they'lI receive a card with a group of commands. Tell them aí que entra o professor para ajudar seus alunos a tomarem consciên-
they cannot look at their partner's cardo Pair them off and distri- cia dessas estratégias ou até a tomarem conhecimento da existência
bute the cards. de algumas delas.
CAROS: O professor pode planejar uma aula ou mais de uma aula para
apresentar a seus alunos as estratégias de comunicação e formas lin-
STUDENT A: You work in the marketing department of a big guísticas de materializá-Ias. Há cinco estratégias que devem ser apre-
company. This Friday you and your colleagues are going to a din- sentadas e comentadas em sala de aula.Vejamos cada uma delas.
ner party at your house. You are responsible for inviting your boss. A primeira delas é NEGOCIAÇÃO DE SENTIDOS. Uma forma de
1. Greet B. negociar sentidos é repetindo algo que o interlocutor disse, o qual,
2. Ask B if he/she has plans for this Friday. em seguida, parafraseia o que disse antes. Por exemplo, se o professor
3. Give an explanation and invite B to join you. pergunta a uma aluna "Do you like seafood?",e ela não sabe o que é sea-
4. Answer B's questiono food, ela pode repetir "Seafood?", com uma interrogação na testa, e ele
5. Tell B your address. provavelmente dirá "Fish, shrimp, lobster..". Ela também pode solici-
6. Answer B's questiono tar um esclarecimento, repetindo ou nãoa palavra, dizendo "(Seafood?)
7. Say goodbye. What do you mean?", ou dizendo "I don'tunderstand".
A segunda estratégia de comunicação é a CIRCUNLOCUÇÃO, que
é o uso de várias palavras para se dizer algo,descrevendo esse algo. Por
STUDENT B: You are the director of a big company. You are
exemplo, se a aluna do parágrafo anterior estiver em Liverpool, preci-
working in your office when an employee enters to talk to you.
1. Greet A.
sar comprar uma bucha para parafuso enão souber como se diz bucha
em inglês, ela pode lançar mão da circunlocução e dizer o seguinte à
2. Ask B why.
vendedora: "I need that plastic thing thatwe put in the waH and that the
3. Ask A about the date and time.
screw goes into". Com certeza, a vendedora entenderá o que ela quer
4. Accept A's invitation. Ask where A lives.
comprar. A aluna poderia também lançar mão de um NEOLOGISMO,
5. Ask A if you should take anything.
da criação de uma palavra, que se constitui na terceira estratégia, ex-
6. Thank A and say goodbye.
plicando à vendedora que precisa de umscrew holder.

~6 Aula de inglês: do planejamento à avaliação CA~II UlO 5 I O onSlllO 11111111/1 14/


EVITAR UM TÓPICO é a outra estratégia de comunicação. Mui-
tas pessoas evitam falar de determinado tópico, mudando de assunto,
quando não se sentem confortáveis para falar sobre ele. Esse descon-
forto pode ser causado pela falta de conhecimentos sobre o tópico ou
por questões emocionais. Por exemplo, nas décadas de 1980 e 1990,
muitos pais e mães estadunidenses simplesmente evitavam falar sobre
o vício em drogas e mudavam de assunto. Curiosamente, segundo uma
reportagem apresentada pelo âncora Peter Jennings no telejornal ABC
News no início dos anos 1990, muitos jovens estavam com problemas
o ensino da escrita
de vício e morando nas ruas de Los Angeles porque suas famílias esta-
vam desestruturadas. Assim, evitar falar da questão do vício em drogas
era evitar falar sobre a falência da família como instituição social.
Aúltima estratégia é o USO DE LINGUAGEM NÃO VERBAL. Apon-

D
e vez em quando, estudantes universitários
tar para algo ou alguém, fazer mímica são formas legítimas de que o / me perguntam onde fazer um curso de inglês
falante dispõe para superar problemas de comunicação. E os aprendi- I que os ajude a desenvolver sua habilidade de
zes precisam saber disso. leitura para que possam fazer a prova de língua cs
O desenvolvimento dessas cinco micro-habilidades é fundamental trangeira da seleção de determinado programa de
para o desenvolvimento da habilidade de fala dos aprendizes. No próxi- pós-graduação. Já tive alunos particulares que que
mo capítulo, trato do ensino da outra habilidade linguística produtiva: riam apenas desenvolver a fala para viajar e se comu
a escrita. nicar em situações típicas que envolvem os turistas,
como, por exemplo, pedir pratos e bebidas em restau-
rantes e bares, comprar roupas e sapatos, alugar car
ros, buscar atendimento médico emergencial. Esses
dois grupos de aprendizes claramente não desejavam
desenvolver a escrita. É um não desejo legítimo, em-
basado em necessidades imediatas e pontuais.
Contudo, os aprendizes brasileiros de inglês em
geral não focam o desenvolvimento desta ou daquela
habilidade: em suas aulas de inglês, o foco é o desen-
volvimento da sua competência comunicativa. Inevi-
tavelmente, o desenvolvimento da competência co-
municativa dos aprendizes passa pelo desenvolvimen-
to da habilidade de escrita, que deve ser vista com
uma habilidade linguística a ser desenvolvida.
Isso parece óbvio, não é? Conceber a escrita
como uma habilidade linguística a ser desenvolvida
parece óbvio. O problema é que, durante muito tempo,

148 Aula de inglês: do planejamento à avaliação CAPiTULO 6 I o ensino da escruu 14 ti


a escrita foi vista meramente como um meio para o aprendizado da or- Por isso, ° professor precisa planejar atividades voltadas para li COI\S
tografia, para a memorização de palavras e frases e para a prática de .lcnuzação dos seus alunos acerca da estrutura interna do parágrafo,
estruturas gramaticais. Há até métodos que claramente não colocam o aso o livro didático que utiliza não faça isso.
desenvolvimento da escrita na sua lista de objetivos, como é o caso do Os aprendizes que se encontram nos níveis avançados precisa 111
método de gramática e tradução. Existem métodos que não descartam saber que existem quatro tipos de parágrafos: o parágrafo comum (que
a escrita, mas que explicitamente elegem o desenvolvimento da fala chamarei de parágrafo, sem modificador), o parágrafo introdutório, ()
como prioridade e relegam a escrita a último plano, como faz o método parágrafo de transição e o parágrafo conclusivo.
audiolingual. Outra informação que todos os aprendizes precisam ter sobre ()
Resgato esse fLash de memória acerca da posição ocupada pela es- parágrafo é que ele contém apenas uma ideia principal. Essa informa
crita no ensino de inglês como língua estrangeira para enfatizar este ção é importante porque um dos problemas mais comuns encontrados
ponto: a escrita precisa ser vista pelo professor como uma habilidade a nos textos produzidos por alunos é a existência de mais de uma ídcía
ser desenvolvida e não meramente como um meio para ajudar os alunos principal no mesmo parágrafo, provocando uma fuga temática.
a memorizarem a grafia das palavras e a praticarem estruturas grama- Outra informação importante sobre o parágrafo é que ele é com;
ticais. Note que a maioria dos livros didáticos disponíveis no mercado tituído por um tópico frasal e orações-suporte. O tópico frasal é urna
atualmente não negligencia o desenvolvimento da habilidade de escri- oração constituída por um tópico e uma ideia-controle, desenvolvida
ta. Isso significa que, se ela for negligenciada, a responsabilidade por no parágrafo por meio das orações-suporte. Gro Frydengerg c Cyn
tal negligência não pode ser atribuída aos autores dos livros didáticos. thia Boardman (1990) lembram que todo tópico frasal é uma opíníao,
Outro ponto teórico essencial para o ensino da escrita é o posi- do contrário sua ideia-controle não pode ser desenvolvida. Em outras
cionamento consciente do professor quanto à polêmica instaurada, há palavras, orações que são afirmações de fato não podem ser descnvol
algumas décadas, acerca da natureza dessa habilidade: a escrita é um vidas. É o caso das seguintes orações:
produto ou um processo? O professor precisa ter uma resposta clara
1. Salvador is the capital of 8ahia.
para essa pergunta porque a adoção de uma ou de outra concepção de
2. Feira de Santana is the second largest city in 8ahia.
escrita tem implicações diretas na prática pedagógica.
3. Lampião was killed by the police.
A CONCEPÇÃO DE ESCRITA COMO PRODUTO imperou no ensi-
no de línguas estrangeiras durante muitos anos. Uma das suas impli- Um parágrafo que serve para visualizar isso é o que apresen-
cações para o ensino é o foco que o professor dá à análise de textos to mais adiante e que retirei de um livro de Frydengerg e Boardman
que servem como modelos para serem imitados pelos alunos. A análise (1990: 19). No momento, apresento apenas sua primeira oração, seu tó-
abarca desde os elementos sintáticos e o vocabulário até a organização pico frasal, destacando o tópico com negrito e a ideia-controle com
das ideias, que são menos valorizadas que sua organização. Em outras sublinha:
palavras, a forma acaba sendo mais importante que o conteúdo quando
My first full day in Yugoslavia turned out to be my worst day
se segue essa concepção.
there.
Por focar na análise de modelos de textos, a concepção de escrita
como produto deu contribuição importante para a construção dos co- A forma mais prática de desenvolver a ideia-controle é fazer uma
nhecimentos sobre o parágrafo. E como muitos textos são compostos ou mais perguntas sobre ela. Nesse caso, a pergunta óbvia é "Why?".
por mais de um parágrafo, os aprendizes precisam estar familiarizados As respostas à pergunta que se faz sobre a ideia-controle se consti
com a constituição interna dos parágrafos para serem capazes de re- tuem nas orações-suporte. Vejamos, no parágrafo completo, como as
digirem ensaios e artigos quando estiverem nos níveis mais avançados. orações-suporte desenvolvem a ideia-controle desse tópico frasal:

150 I\ula de inglês: do planejamento à avaliação CAPiTULO 6 I o ensino da OSCI Itu


My Iirst full day in Yugoslavia lurned oul to be my worsl day se coloca a canela no papel ou os dedos no teclado e termina ao f'inul
there. I woke up late in my small hotel room. I wanted to take da primeira e única versão do texto. Em outras palavras, eles perdem
quick shower, but there was no hot water. In fact, there was de vista todo o processo de escrita, que vai desde a geração de idcias,
only ice cold water. I went down to breakfast and was served planejamento da organização dessas ideias, a avaliação da adequa-
a stale roll and lukewarm tea. Next, I got lost trying to find my ção das ideias e da linguagem ao público-alvo e ao gênero textual até
way to the meeting I was already late for. I couldn't find anyone a redação da primeira versão, seguida da revisão com a consequente
who spoke English and my Croatian was still not very good. redação de, pelo menos, mais uma versão do texto.
At last I found the meeting place, but I also found out that the Ora, imaginar que uma pessoa se senta à mesa ou ao computador
meeting had been postponed to the following day. I got lost e escreve um texto num só fôlego é equivocado. A não ser que esteja-
again on my way back to the hotel and spent most of the day mos falando de um médium que psicografa textos ditados por algum
"sightseeing" on the various city buses. Finally, I arrived back at
espírito do além. Como a maioria dos aprendizes de inglês não conse-
the hotel ready for dinner. The waiter politely told me that I was
gue psicografar textos, o professor precisa ajudá-los a desenvolver sua
too late for dinner. I went to my room tired and hungry. Little
capacidade de produzir textos escritos. Para isso, é interessante que
did I know that this would be my worst day, so I had nothing but
o professor adote a CONCEPÇÃO DA ESCRITA COMO PROCESSO. O
good days to look forward to.
professor que adota essa concepção sabe que a escrita começa antes
Podemos observar claramente que as orações-suporte desenvol- de se pousar a caneta no papel ou os dedos no teclado: ela tem início
vem a ideia de que o primeiro dia inteiro da autora ou do autor do texto no momento em que começamos a pensar no que vamos escrever. E ele
na Iugoslávia (que não existe mais, vale lembrar) foi bem ruim. Daí a sabe que esse processo desemboca em um produto - O texto.
inclusão de informações como "was served a stale roll and lukewarm E por que se fala de processo ao se falar de escrita? Exatamente
tea", "I got Iost", "Ifound out the meeting had been postponed" e "I went porque há uma série de passos que precisamos seguir até a versão fi-
to my roam tired and hungry". E ainda podemos perceber que há uma nal de um texto, que nunca é a primeira versão. Embora não haja uma
oração conclusiva, que retoma a ideia-controle. fórmula rígida a ser seguida, podemos pensar em uma sequência pro-
Há casos de parágrafos em que o tópico frasal não existe ou se vável de passos que um produtor de textos eficiente segue, conforme a
encontra no meio ou no final do parágrafo. São casos menos frequen- imagem a seguir ilustra.
tes que devem fazer parte de um curso de escrita avançada e que po-
dem ficar de fora de um curso de inglês básico. PROCESSO DE ESCRITA: PASSOS PROVÁVEIS
Gêneros textuais como ensaios e artigos geralmente possuem os
outros três tipos de parágrafos, que não desenvolvem nenhuma ideia. GERAÇÃO REDAÇÃO
ELABORAÇÃO
O parágrafo introdutório apenas introduz o tema e chama o leitor para DEIDEIAS
~ ~ DA PRIMEIRA
DO ESQUELETO
SOBREO VERSÃO
a leitura. O parágrafo de transição objetiva sinalizar a mudança de um
TEMA
tópico para outro. E o parágrafo conclusivo tem a função de fechar o
texto. Essas informações precisam ser compartilhadas com os apren-
dizes nos níveis mais avançados.
Apesar de contribuir para melhor conhecermos a estrutura de um
parágrafo, a concepção de escrita como produto tem uma implicação
complicada para a prática pedagógica: ela faz com que o professor leve
seus alunos a acreditarem que a escrita começa no momento em que
REVISÃO DA
PRIMEIRA
VERSÃO
~
REDAÇÃO
SEGUNDA
VERSÃO
DA
~
[J
Aula de inglês: do planejamento à avaliação CAPiTULO 6 I O ensino da oscrun 1~l
Ao pensar no tema, começamos a Ler ideias sobre o que escrever 'rcio que L('nha ficado clara a vantagem qu« a udoçuo dtl ("011
a seu respeito. Devemos colocá-Ias em um papel para não esquecê- pçao da escrita como processo possui sobre a conccpçao dtl ('SC"I i
-Ias. Depois, organizamos a sequência das ideias em um esqueleto ta como produto. As seções que seguem Lratam de questões sobre as
do texto. quais o professor precisa Ler conhecimenLo para ajudar seus alunos"
A elaboração do esqueleto é essencial para o processo de escrita, desenvolverem a escrita. Na primeira, abordo os elementos de tcxtuuli
seja de um artigo, um ensaio, um livro ou uma tese, por ele servir de dade, que os aprendizes precisam conhecer para terem consciência do
norte para a redação, por ele não apenas indicar onde o texto come- que está em jogo na produção de um texto. A segunda seção trata da
ça e termina, mas também por estabelecer o público-alvo, o título e o importância das atividades de pré-escrita para a realização das aLivi
número de parágrafos do texto. No esqueleto, colocamos também que dades de escrita. As micro-habilidades de escrita são o foco da terceira
ideia será desenvolvida em cada parágrafo, que informações utilizare- seção. Finalizo o capítulo discutindo duas questões controversas: a cs
mos em cada parágrafo. crita colaborativa e a correção dos textos produzidos pelos aprendizes.
Depois de esqueletar o texto, redigimos a primeira versão. Para
revisar eficientemente essa versão, precisamos deixá-Ia de molho por
6.1 Os elementos de textualidade
um tempo para poder nos distanciar do texto o máximo possível. Essa
distância é essencial para sermos capazes de encontrar problemas o ato de escrever um texto não se limita à tarefa de colocar uma
sintáticos, ortográficos, de pontuação, de organização das ideias e de palavra depois da outra, uma oração depois da outra. Se ele se Iimitas
adequação da linguagem e das informações. Quanto mais envolvidos se a isso, o que está dentro do quadro a seguir seria um texto:
ficamos com os textos que escrevemos, menos seremos capazes de en-
xergar problemas óbvios. Daí a importância do distanciamento. E os A hot dog costs two dollars. The doi lar is the currency of the
aprendizes precisam saber disso. United States. The United States invaded Iraq and killed a lot
Depois dessa revisão, redigimos a segunda versão. As reticências of innocent people in 2003.2003 was a weird year. A leap year
no último retângulo da imagem significam que o processo pode parar has 366 days.
na segunda versão ou continuar por mais versões, até chegar à versão
final. Muitas vezes, só há tempo hábil para os alunos fazerem duas ver- Hum... Pode haver algum leitor mais apressado que se pergunte':
sões do texto, principalmente por causa do número de turmas e o con- "E isso não é um texto não?". Esse leitor apressado mordeu a isca co
sequente número de alunos que o professor tem. E, infelizmente, em locada no que está escrito no quadro por causa da fácil compreensão
regra geral, o professor não é remunerado pelo trabalho extraclasse. do sentido literal de cada uma das orações tomadas de forma isolada.
A ideia do processo de escrita se aplica à produção de qualquer Contudo, se tomarmos as sentenças em conjunto, perceberemos que'
gênero textual, incluindo-se aí textos ficcionais, como contos e ro- elas não formam um texto, um todo semanticamente coerente. Afinal,
mances, e textos acadêmicos, como dissertações e teses. Por exemplo, se fizermos a pergunta "Sobre o que é isso aí que está no quadro?", o
antes de iniciar a redação deste livro, elaborei o sumário, ou seja, o que responderemos? Diremos que isso aí não é sobre nada porque não
esqueleto, e, à medida que redigia os capítulos, realizei diversas mu- é um texto, e sim um punhado de orações emendadas umas às outras.
danças: alterei a ordem de alguns capítulos; alterei uma ou outra seção A ajuda do professor é necessária para que os alunos entendam
vislumbrada inicialmente, até chegar a esta versão que você está lendo; que um texto não é construído dessa forma - emendando-se uma
modifiquei até mesmo o título do livro. Sempre elaboro o esqueleto dos oração à outra -, principalmente se eles forem crianças e jovens ado
Lextos que escrevo e acredito que é importante ajudar os alunos a se lescentes, que ainda estão sendo escolarizados. Além disso, e óbvia
acostumarem com essa prática. mente, por não formar um todo semântico, um punhado de oraçocs

1!>4 I\ulo de inglês: do planejamento à avaliação CAPíTULO 6 I o ensino da eSCrl11I


tis outras n50 leva o leitor construçao
l'1ll('1l(1;'1<!<lS limas da COERÊN-
à
tentarem prever se os membros desse público-alvo terão ou n50 dificul-
IA TEXTUAL, elemento de tcxtualidade que já comentei detalhada- dade para entender seu texto por conta do tema. A decisão sobre a lin
mente no quarto capítulo. guagern que usarão também depende do público-alvo, pois terão de op-
Todavia, um leitor pode ter diante dos olhos um texto adequada- tar por um vocabulário mais ou menos formal, mais ou menos técnico.
mente redigido e, mesmo assim, não conseguir formar um todo coe- Por falar em linguagem, há elementos lexicais e sintáticos qu
rente a partir da sua leitura. Já vimos que isso acontece por falta de co- servem para realizar a COESÃO TEXTUAL, ou seja, a ligação existente,
nhecimentos enciclopédicos e/ou conhecimentos linguísticos do leitor. na superfície do texto, entre suas partes. É possível construir textos
O anúncio a seguir, por exemplo, pode não ser facilmente interpre- sem elementos de coesão, mas isso é raro. A não ser que sejam tex-
tado por aprendizes que já se encontram no nível avançado por causa tos que contenham imagens que ajudam na construção da coerência,
cio vocabulário, do produto anunciado, da estranheza que a presença como podemos ver no aviso a seguir. Nele, a imagem nos ajuda a en-
do palavra cocaine causa em um anúncio com crianças nele presentes tender que "ahead" tem a ver com a estrada na beira da qual a placa foi
, da distância temporal que nos separa do contexto de produção desse fincada. Além disso, podemos inferir que um conectivo de consequên-
anúncio, qual seja, a Nova lorque de 1885. É um anúncio que nos deixa cia, como, por exemplo, so ou therejore, foi suprimido depois de "icy
intrigados para saber como é que a cocaína acabou se tornando uma conditions ahead"2.
droga ilícita já que era não apenas usada em remédios para crianças, Exemplos de elementos coesi-
mas também era objeto de anúncios publicitários'. vos são os sinônimos, os hiperônimos,
a repetição lexical, os pronomes e os
conectivos. A implicação disso para
o ensino da escrita é que o professor
precisa ajudar seus alunos a tomarem
consciência de que um texto é um todo
composto de partes que se articulam
de maneira lógica, de que um texto é
AllNJE um tecido semanticamente costura-

TOOTHACHE DROPS do por elementos linguísticos, que são


chamados de elementos coesivos quan-
Instantaneous Cure!
FRICE ~5 CENTS. do desempenham a função de realizar
Preparcd by the
essa articulação.
llOYD MANUFAOTURING00. Os sinônimos merecem um co-
219 HUDSON AVE., AL9ANY, PI. Y.

For sale by all Druggists. mentário especial por causa de um


mito que os envolve: o mito de que a sinonímia é a igualdade de signi-
ficados. É preciso que o professor esclareça a seus alunos que a sinoní-
Os aprendizes precisam ser orientados a incluírem no planejamen- mia é semelhança de significados e que, consequentemente, não exis-
to da escrita do seu texto o público-alvo ao qual se dirigirão, a fim de tem sinônimos perfeitos. Ou seja, duas palavras podem até ser sinôni-
mas num contexto, mas não serão sinônimas em todos eles. Por isso,
I Disponível em: <http//www.telegraph.co.uk/health/healthpicturegalleries/
9519906/Cocaine-tooth-drops-morphine-teething-syrup-and-other-Victorian-quack- Disponível em: <http://www.photos-public-domain.com/wp-content/uploads/
ures.htrnl>; acesso: 22 jun. 2015.
2014/07/icy-conditions-ahead-use-extreme-caution-road-sign.jpg>; acesso: 22 ju n. 2015.

1j6 Aula de inglês: do planejamento à avaliação


CAPíTULO 6 I O ensino da oscrun 1!> /
precisam ter cuidado ao se sentirem tentados a substituir uma palavra ('OIllO os apresentados no qundro il seguir. Vale notar que JW() divido os
por um sinônimo, que é um mecanismo de coesão legítimo e impor- ('OIl('CtivOSdo tipo corurast nos subupos concession e cont raciict ;Otl.
tante. Por exemplo, hardworking e diligent são sinônimos, mas não ca-
r--
bem no mesmo contexto, já que a segunda é menos frequente - logo, TYPE CONNECTOR
mais formal - do que a primeira; os verbos lend e loan são sinônimos --
quando o complemento verbal é um nome que representa uma coisa AOOITION in addition (to), furthermore, moreover, besides, neither ... nor ...
--
concreta (e.g., money, book, pen), mas não quando esse complemento
REASON as, due to, since, given, for
é um nome que expressa algo metafórico (e.g., hand), situação em que
apenas lend é usado. PURPOSE in order to, 50 that, in order that

Os hiperônimos constituem outro mecanismo de coesão impor-


RESULT therefore, thus, as a result (of), consequently, hence
tante, embora não sejam tão frequentes quanto os sinônimos. Vale
lembrar que a hiperonímia é a relação semântica que se estabelece en- CONTRAST however, nevertheless, nonetheless, although, even though, though,
tre duas palavras, na qual uma delas - o hiperônimo - tem um sig- despite, in spite of while, whereas, on one hand ... on the other hand ...

nificado mais abrangente que engloba o significado da outra palavra -


- o hipônimo. Por exemplo, flower é hiperônimo de rose, tulip, lotus, Geralmente, quando se fala de elementos de textualidade, f'tllil
sunflower e orchid. Similarmente, chair, table, sofa and armchair são -se de coerência e coesão. O próprio Widdowson, que fez provoca
hipônimos de furniture, hiperônimo deles. ções e propostas importantes sobre o ensino de línguas estrangeiras ('
O trecho a seguir ilustra o uso de diferentes elementos coesivos: que, no meu entendimento, influenciou Michael Canale a acresccnuu
a componente competência discursiva no modelo de competência ('O
I saw a boy in the garden. The boy was climbing a tree. I was
municativa que ele e Merril Swain elaboraram no final da década <1('
worried about the child. The Door lad was obviously not up to
1970, limitou-se a esses dois elementos quando tratou da necessidade
it. The idiot was going to fali if he didn't take care'.
de desenvolver a competência discursiva dos aprendizes.
Vemos aí o uso da repetição lexical (the boy), da hiperonímia (the Entretanto, há outros elementos de textualidade conforme a pro
child), de uma expressão geral (the idiot) e de um pronome (he). posta teórica apresentada por Beaugrande e Dressler em 1981, que
Obviamente, os alunos precisam aprender a usar os pronomes e pode soar datada por conta do ano aí mencionado, mas que é o ponto
os conectivos deixando clara a relação entre os elementos a que os de origem de uma miríade de trabalhos sobre linguística textual desde
pronomes se referem e as partes que são ligadas pelos conectivos. Afi- então. Para eles, além dos elementos linguístico-semânticos, i.e., a coe-
nal, conexões mal feitas podem provocar dificuldades para o leitor. rência e a coesão, há cinco elementos pragmáticos, ou seja, elementos
Entretanto, gostaria de fazer um comentário sobre os conectivos. diretamente relacionados aos usuários da língua e que, por isso, pr
Os aprendizes brasileiros costumam usar, com frequência and, but, so, cisam ser levados em consideração pelos aprendizes no processo d
because e because of. Realmente, com esses conectivos, eles podem se vi- escrita. Vejamos cada um deles.
rar muito bem e veicularem mensagens, principalmente na fala. Contu- A INTENCIONALIDADE diz respeito aos objetivos do autor. Esse
do, se eles quiserem desenvolver sua habilidade de escrita, eles precisa- elemento tem uma implicação importante para escrita: todo texto é a
rão ampliar seu vocabulário, aprendendo conectivos menos frequentes, escrito tendo-se algum objetivo em mente.
Conforme explicam Beaugrande e Dressler (1997 [1981J:113),a in
3 Disponível em: <http://www.uniroma2.itjdidattica/ling_ingLlinfo/deposito/ tenção mais básica de todo produtor textual é elaborar um texto coe
Tcxtual_cohesion.doc>; acesso: 22 jun. 2015. rente e coeso. Entretanto, alguém pode ter a intenção de produzir um

158 Aula do inglês: do planejamento à avaliação CAPíTULO 6 I O ensino da escrun 111


texto que pareça incoerente. Por exemplo, você já percebeu como os POLONIUS f,1sIdej I houqh this be rnadness. yet tlwrp io.; ,I
contratos de empresas de telefonia celular costumam ser longos e re- method in't. Will you walk out of the air, my lord
digidos em fonte de tamanho bem pequeno para dificultar a leitura? HAMLET Into my grave?
Pois é. O cliente acaba não o lendo e o assina logo. Outro exemplo in-
POLONIUS Indeed, that is out o' th' air. [Aside] How pregnant
teressante nos foi dado por Shakespeare em Hamiet. O personagem
sometimes his replies are! a happiness that often
principal, Hamlet, é informado pelo fantasma de seu pai de que foi as-
madness hits on, which reason and sanity could
sassinado por seu cunhado, Cláudio, que ainda teve a audácia de se ca-
not so prosperously be delivered of. I will leav
sar com a mãe de Hamlet, tornando-se o rei da Dinamarca. Para vingar
him and suddenly contrive the means of meeting
a morte do pai, ele elabora um plano no qual precisa se fingir de louco.
between him and my daughter. - My honourable
Ora, uma característica que costuma ser atribuída aos loucos é sua in-
lord, I will most humbly take my leave of you.
capacidade de produzir textos que permitam ao ouvinte ou ao leitor
HAMLET You cannot, sir, take from me anything that I will
construir sentidos lógicos. Hamlet tem consciência dessa característi-
more willingly part withal - except my life, except
ca e começa a não falar coisa com coisa para convencer as pessoas de
my life, except my life.
que está louco. Produz textos que dificultam a construção de sentidos.
A seguir, apresento um trecho dessa obra, no qual Hamlet conversa
com Polônio, pai de Ofélia, sua amada, e bajulador de Cláudio: Hamlet fala coisas desconexas, emendando tópico com tópico
sem nenhuma articulação lógica. É claro que ele conseguiu COnV('IH'I'1
POLONIUS [aside] How say you by that? 5till harping on my as pessoas ao seu redor de que estava louco. Ah, e o plano dele (\1'\1
daughter. Yet he knew me not at first. He said I was certo? Bem, leia a peça e descubra.
a fishmonger. He is far gone, far gone! And truly A ideia de que todo texto é produzido com uma intenção tem umn
in my youth I suff'red much extremity for love - implicação direta para o ensino de inglês: sempre que o professor so
very near this. 1'11
speak to him again. - What do licitar aos alunos que redijam um texto, deve deixar claro o objetivo
you read, my lord? que devem perseguir ao produzirem o texto. Obviamente, não estou 1lH'
HAMLET Words, words, words. referindo aqui às atividades especificamente voltadas para o desenvol
POLONlUS
vimento de micro-habilidades, como o uso correto da ortografia e d,1
What is the matter, my lord?
concordância verbal. Vale lembrar que o objetivo do texto deve vir ex-
HAMLET Between who?
presso nas instruções dadas pelo professor ou no comando da atividade.
POLONIUS I mean, the matter that you read, my lord. Além disso, o professor precisa informar aos alunos que gêneros
HAMLET 5landers, sir; for the satirical rogue says here that textuais diferentes estão vinculados a objetivos diferentes. Por exem-
old men have grey beards; that their faces are wrin- plo, cartas de apresentação, artigos de opinião, ensaios, anúncios pu
kled; their eyes purging thick amber and plum-tree blicitários e editoriais têm o objetivo de convencer os leitores a ad
gum; and that they have a plentiful lack of wit, to- rirem a uma opinião; receitas culinárias e manuais de instruções têm
gether with most weak hams. Ali which, sir, though o objetivo de ensinar o leitor a realizar determinadas tarefas. Assim,
I most powerfully and potently believe, yet I hold sempre que o livro didático oferecer atividades de escrita voltadas para
it not honesty to have it thus set down; for you determinados gêneros textuais, o professor não pode perder a oportu
yourself, sir, should be old as I am if, like a crab, nidade de conversar com seus alunos sobre a relação entre os gêneros
you could go backward. e as intenções do produtor textual.

160 Aula de inglês: do planejamento à avaliação CAPiTULO fi I O ensino da OSCIIIII


Estreitamente relacionada à íntencionalidadc encontra-se a ACEI- A guy was scnt rrOJ11 EHSl Cel'J11any lO work in Sibcr ia. I k- kncw his mnll
TABILIDADE, que diz respeito às atitudes do leitor para com o texto would be read by censors, so he told his friends: "LCl'S cstubllsh li ('0(1('.
que lê. O leitor sempre espera ler um texto que seja coerente e rele- Ir a lcucr you get frorn me is written in blue ink, iL is Lrue what I say, Ir

vante para si. Fica claro que não podemos escrever um texto sem saber it is written in red ink, it is false". After a month, his friends get Lhe first
para quem o fazemos e, ao mesmo tempo, acreditar que escreveremos letter. Everything is in blue. It says, this letter: "Everything is wondcr
fui here. Stores are full of good food. Movie theatres show good films
eficientemente um texto adequado. É por essa razão que os alunos pre-
from the west. Apartments are large and luxurious. The only thing you
cisam ter consciência de que não podem escrever o que quiserem para
cannot buy is red ink". This is how we live. We have all the freedoms wc
quem quiserem: seus textos podem não ser aceitos pelo leitor porque a
want. But what we are missing is red ink: the language to articulate ou r
linguagem está inadequada, porque suas ideias são impróprias, porque
non-freedorn. The way we are taught to speak about freedom - war on
a norma linguística usada não é a esperada, porque o tema é impróprio.
terror and so on - falsifies freedom. And this is what you are doing her v.
Vejamos um exemplo, um caso real que aconteceu no dia 20 de
You are giving all of us red ink (Zizek, 2014).
dezembro de 2013. Justine Sacco, então executiva da empresa InterAc-
tive Corp, publicou a seguinte mensagem na sua conta de Twitter antes A censura é a situação mais extrema de limitação imposta à es-
de embarcar em uma viagem para a Cidade do Cabo, na África do Sul: crita e faz com que as pessoas tomem consciência da importância da
situacionalidade, mesmo que não conheçam esse conceito teórico. F
Going to Africa. Hope I don't get AIDS. Just kidding. l'rn white!
usar a cor da tinta como um código para driblar a censura foi uma ídcín
Se analisarmos a linguagem do seu post, veremos que não há pro- genial. Essa piada serve para ilustrar que devemos escrever um texto
blemas de sintaxe ou de vocabulário. O problema está no discurso pre- pensando sempre no seu contexto de recepção, mesmo que não este
conceituoso, extremamente racista. Seu post se tornou viral, e os leito- jamos (graças a Deus!) numa ditadura.
res a criticaram acerbamente. O resultado disso foi sua demissão. Aliás, por vivermos num ambiente em que a liberdade de exprcs
Os aprendizes precisam estar alertas à adequação dos seus textos são vige, precisamos ter cuidados com os limites que devemos res-
às expectativas do leitor. E isso implica saber, por exemplo, quando po- peitar para que nossos textos funcionem adequadamente. Faço ess
dem e quando não podem contrair palavras (e.g., I'H,doesnt't, would've), alerta porque, infelizmente, há pessoas que confundem liberdade de
usar gírias (e.g., roach, beats me, bitchy) e expressar preconceitos. expressão com liberdade de discriminar, de ofender e de disseminar
O terceiro elemento pragmático de textualidade é a SITUACIONA- ódios de naturezas diversas. Enfim, a situacionalidade deve estar pre-
LIDADE, que diz respeito aos fatores contextuais de recepção do texto. sente na cabeça dos alunos no momento de planejarem sua escrita.
Ela está estreitamente vinculada à intencionalidade e à aceitabilidade, A INFORMATIVIDADE é o quarto elemento pragmático de tex-
pois o produtor textual precisa construir um texto para atingir deter- tualidade e diz respeito ao grau de previsibilidade dos elementos que
minado objetivo pensando não apenas em como o leitor vai reagir ao compõem o texto, tanto as estruturas sintáticas e o vocabulário quan-
texto, mas também no contexto situacional de recepção do texto. to o tema, os tópicos relativos ao tema e a forma do texto. Os alunos
No dia 16 de dezembro de 2013, jovens realizaram uma manifes- precisam saber que um texto com baixa informatividade é aquele que
tação em Wall Street como parte do movimento Occupy Wall Street, possui tantos elementos previsíveis que o leitor acaba ficando entedía-
para protestar contra a crise financeira e econômica estadunidense. do e impaciente, pois um texto redundante, que não progride tema-
Slavoj Zizek estava presente e discursou. No seu discurso, ele citou ticamente, é realmente muito chato. Já um texto com uma inforrnati-
uma piada dos tempos do comunismo, ou do suposto comunismo, da vidade elevada apresenta tantos elementos imprevisíveis que o leitor
União Soviética. Essa piada toca exatamente na questão da sítuaciona- acaba sentindo dificuldade para entendê-Io, Ambos os casos não são
lidade e, por isso, apresento-a a você: interessantes, pois o ideal é que haja uma informatividade média, ou

162 Aula de inglês: do planejamento à avaliação CAPiTULO 6 I O ensino da OSC! un 163


seja, um equilíbrio entre os elementos previsíveis e a quantidade d ma forma de elevar inadequadamente a informativicludc de um
elementos imprevisíveis. texto é usar pronomes sem referência clara. Isso faz com que o I('i
Uma forma de ajudar seus alunos a evitarem um nível muito baixo tor sinta estranhamento, interrompa a sequência da leitura e procu
de informatividade é orientá-los a não redigirem orações redundantes. re o referente do pronome. Recorro a Conrad (1993: 128) novamente
Eis alguns exemplos do que deve ser evitado, fornecidos por Ronald para apresentar um exemplo de pronomes mal empregados que cau
Conrad (1993: 52-53): sam problemas de referência e, assim, aumentam exageradamente a
informatividade:
1. None of us will ever forget the true meaning of Christmas,
and I doubt that we ever will. 1. In the Far North, they do very little in the winter. They stay
2. The chair is green in colour. inside their shelters because the weather can kill,
3. My grandfather always told me, "You have to take a bit but Não se sabe a que elemento do trecho os pronomes sublinhados
you have to give a bit as well". This little saying that he told
se referem. Provavelmente, o primeiro pronome sublinhado deveria ser
me is still in my memory.
substituído por peopLe para corrigir esse erro. O que se pode afirmar
Os trechos sublinhados são aqueles em que há redundância. Vale com segurança é que o problema aí é decorrente do uso incorreto dos
a pena o professor planejar uma aula para abordar essa questão da re- pronomes, o que provocou uma elevação indesejável da inforrnatividadc.
dundância para alertar seus alunos sobre como ela empobrece o texto Mas o produtor textual pode, propositadamente, elevar a infor
reduzindo seu nível de informatividade. Ele pode inclusive apresen- matividade. Pode fazer isso, por exemplo, lançando mão de pronomes
tar uma lista de frases redundantes usadas na oralidade com relativa catafóricos. Catherine Emmott (2014) fornece um exemplo que ilustra
frequência, mas a serem evitadas em um texto escrito em contextos isso claramente. Ela o retirou de Brighton Rock, de Graham Greene, de
acadêmicos ou profissionais. São expressões como as que apresento a 1943 (p. 120, 121):
seguir. Note que o trecho sublinhado é a parte redundante.
"I'm going to work on that kid every hour of the day until I get som"
eabsolutely essential
thíng,' She rose formidably and moved aeross the restaurant, like a war-
ecompletely surrounded ship going into aetion, a warship on the ríght side in a war to end wars,
eactual facts the signal flags proc1aiming that every man would do his duty. Her big
eA.M. in the morning breasts, whieh had never suekled a ehild of her own, felt a merciless eom-
eand etc. passion. Rose fled at the sight of her, but IDA moved relentlessly towards
ebest ever the serviee door.
ebrief summary
ecompete with each other Emmott informa que esse trecho é a abertura de um capítulo
que Ida não é mencionada antes desse trecho. Note que os pronomes
ecould possibly
emany different kinds sublinhados ocorrem antes do seu referente, que está em negrito. O
ean emergency situation efeito que isso tem para o leitor é óbvio: ele lê o pronome she e depois
efly through the air as três ocorrências de her e fica se perguntando qual o referente deles.
e future plan Sua curiosidade aumenta e isso é ótimo para a leitura.
introduced a new
e
O último elemento pragmático de textualidade é a INTERTEXTUA-
local residents
e
LIDADE, que diz respeito à presença de um ou mais textos no text
esame exact produzido. A intertextualidade torna o entendimento do texto ou d

164 Aula de inglês: do planejamento à avaliação CAPíTULO 6 I o ensino da escrito 16!)


parte do texto dependente do conhecimento que o leitor possui de ou- poderem escrever sobre ele; logo, precisam ativar ou construir csquc
tros textos. Há dois tipos de intertextualidade: a explícita, cm que a mas mentais para ser capazes de escrever um texto sobre um tema.
fonte é citada; e a implícita, em que a fonte não é citada porque o autor Um dos propósitos das atividades de pré-escrita é ajudar o pro
espera que o leitor a reconheça facilmente por conta da suposta fami- fessor a diagnosticar o grau de conhecimentos dos alunos a respeito
liaridade com o intertexto. do tema sobre o qual escreverão, do gênero textual designado e da Iin
A intertextualidade precisa ser abordada pelo professor nas aulas guagem de que precisarão. Outro propósito é ajudar os alunos a ativa
dos níveis mais avançados. Afinal, é nesses níveis que os aprendizes rem ou a construírem esquemas mentais relativos aos temas propostos
começam a produzir textos mais longos e mais densos, como os en- nas atividades de escrita.
saios. Nos níveis iniciantes e intermediários, não é necessário tratar Algumas atividades de escrita presentes nos livros didáticos vol
da intertextualidade, a não ser que haja alguma necessidade pontual. tarn-se para o desenvolvimento de micro-habilidades de escrita, como,
Todos os elementos de textualidade devem ser levados em consi- por exemplo, o uso adequado da ortografia, principalmente nos níveis
deração pelos aprendizes no momento do planejamento da escrita. E, iniciais de proficiência. Tais atividades podem ser úteis também para ()
por falar em planejamento, na próxima seção, tratarei das atividades desenvolvimento de micro-habilidades de leitura.
de pré-escrita. Para esses tipos de atividades, basta o professor instruir seus alu
nos acerca da sua realização. As instruções se constituem na atividade
de pré-escrita. Contudo, atividades que solicitam aos alunos a produ
6.2 O papel das atividades de pré-escrita
ção de um parágrafo ou de um texto com mais de um parágrafo, ou
Atividades de escrita costumam vir no final das unidades na maio- gêneros textuais como o anúncio publicitário, exigem do professor :1
ria dos livros didáticos disponíveis no mercado. Consequentemente, os realização de atividades de pré-escrita que não se limitam às suas ins
professores tendem a dar espaço a essas atividades na aula que finaliza truções. Afinal, os alunos precisarão estabelecer um contexto de IT
cada unidade. cepção, vislumbrando os possíveis leitores.
Se as unidades do livro didático adotado pelo professor forem Por exemplo, no primeiro livro da série Freeway, de Cheryl Pavlik
organizadas no formato de sequência didática, em que as atividades e Anna Stumphauser de Hernandez (2001: 17),encontramos a seguinte
giram em torno de determinado tema e se articulam Iogicamente atividade:
umas às outras, os aprendizes podem chegar às atividades de escrita
DICTATION
razoavelmente preparados. Isso significa que o professor não precisa
You will hear the dictation three times. The first time listen, the
realizar uma atividade de pré-escrita específica. Entretanto, se o livro
second time write, and the third time check your work.
didático não possuir uma organização com tal grau de articulação, o
professor precisará planejar atividades de pré-escrita para ajudar seus O ditado é uma atividade que integra as habilidades de compre-
alunos a realizarem as atividades de escrita. ensão oral e de escrita, voltada para a prática do uso adequado da or-
As atividades de pré-escrita são fundamentais para que os apren- tografia e da pontuação. Nada além das instruções é necessário, a não
dizes compreendam alguns pontos em relação à escrita. Em primeiro ser uma informação sobre o tema do ditado para ajudar os alunos a
lugar, eles precisam entender que a escrita é um processo e que, por ativarem esquemas mentais, o que pode ajudá-los a entenderem mais
isso, sempre precisamos pensar, planejar, antes de escrever algo. Em se- facilmente o texto a ser ditado pelo professor.
gundo lugar, eles precisam conhecer um ensinamento de Arthur Scho- Outro exemplo é a atividade de escrita proposta por Sue Kay e Vau-
penhauer (2005 [1881]):a primeira regra do bom estilo é ter o que dizer. ghan Jones (2011:13)no volume da série New American Inside Out desti-
Em outras palavras, eles precisam de conhecimentos sobre o tema para nado a aprendizes que se encontram no nível intermediário superior:

166 Aula de inglês: do planejamento à avaliação CAPíTULO 6 I O ensino da cscrun 1('


WRITE A LETTER INTROOUCING YOURSELF TO A PEN PAL. descartando O que não é. Nao concordo com a ideia de que a cscritu
INCLUOE INFORMATION ABOUT THE FOLLOWING: livre seja aLividade de pré-escrita, pois o texto resultante já é a primei
Your family ra versão de um texto. Considero-a uma atividade de escrita feita após
Your work / studies se pensar sobre o tema e após a elaboração do esqueleto do texto. Por
The place where you live isso, sugiro que o professor não a use como atividade de pré-escrita.
What you would like to know about your pen pai O que apresentei até aqui sobre atividades de pré-escrita basta
para deixar clara a importância de preparar os aprendizes para a rea-
Escrever uma carta requer preparação. Por isso, Kay e Jones apre- lização das atividades de escrita. Na próxima seção, trato de oito mi-
sentam três atividades de pré-escrita: uma atividade de fala baseada cro-habilidades de escrita que precisam ser desenvolvidas para que os
em três perguntas relacionas a pen país, que deve ser realizada em du- aprendizes desenvolvam sua capacidade redacional.
plas; uma atividade de leitura que tem como objeto uma carta e uma
proposta de reflexão sobre a adequação da linguagem usada na carta; 6.3 Miero-habilidades de escrita
uma atividade de registro de formalidade relacionada ao vocabulário
da carta lida. O cuidado que Kay e Jones tiveram com a preparação dos Assim como a leitura, a fala e a compreensão oral, a escrita possui
alunos para a produção da carta é o mesmo que o professor precisa ter uma natureza complexa. A abordagem pedagógica da escrita exige sua
sempre que propuser aos alunos atividades de escrita. decomposição em micro-habilidades a serem focadas em sala de aula
Em uma aula em que o livro didático, ou o professor, integra duas e nos materiais didáticos, o que ajuda os aprendizes a se conscientiza-
ou mais habilidades linguísticas por meio de atividades que se arti- rem de cada uma delas.
culam umas com as outras e culminam em uma atividade de escrita, A micro-habilidade mais básica é o USO CORRETO DAS CON-
as atividades voltadas para as outras habilidades já funcionam como VENÇÕES ORTOGRÁFICAS E DA PONTUAÇÃO. Obviamente, se uma
atividades de pré-escrita. No caso de isso não acontecer, o professor pessoa não conhece o sistema ortográfico usado na língua inglesa,
precisa preparar uma. terá mais dificuldades para desenvolver a escrita nessa língua. Isso
Um tipo de atividade de pré-escrita frequentemente usado por acontece, por exemplo, com os russos, que adotam o alfabeto ciríli-
professores é o brainstorming, técnica que já comentei bastante nos co, e os japoneses, que adotam os silabários Hiragana e Katakana e
três capítulos anteriores e que pode desembocar num mapa semântico o ideograma Kanji. Os aprendizes brasileiros não possuem essa difi-
ou numa lista, que podem ficar registrados no quadro ou no caderno culdade, mas precisam aprender como as letras do alfabeto romano
dos alunos. Entretanto, no caso da habilidade de escrita, esse mapa se- se combinam para formar palavras em inglês. Por isso, os materiais
mântico ou essa lista devem ficar registrados no caderno, porque ser- didáticos, principalmente o livro de atividades extraclasse, oferecem
virão na elaboração do esqueleto do texto. atividades aparentemente bobas, mas fundamentais para o desenvol-
Há um tipo de atividade que alguns consideram atividade de pré- vimento dessa micro-habilidade.
-escrita na produção de textos mais densos como o ensaio e o artigo Essas atividades vão desde a simples cópia de palavras, frases e
nos níveis mais avançados de proficiência: a chamada escrita livre (em orações até exercícios de desembaralhamento de letras e de correção
inglês, free writing). Ela se baseia na seguinte técnica: os aprendizes de palavras e textos curtos. Por exemplo, um exercício comum que ob-
escrevem sobre um tema sem parar, sem pensar, sem se preocupar jetiva a prática da grafia de nomes de objetos usados na sala de aula
com questões ortográficas, gramaticais ou lexicais durante 5 ou 10 mi- aquele em que são apresentadas imagens para os aprendizes escreve
nutos, após os quais eles param de escrever e selecionam o que é útil, rem os nomes delas, como a seguir.

168 Aula de inglês: do planejamento à avaliação CAPíTULO 6 I O ensino do OSCIIIII 16


Label the pictures with the names of the items. eonscíêncta da sua cxistcncla. Uma dessas diferenças é ti ordem do
éHljcLivoe do nome por ele modificado: enquanto em português li or
dern é NOME ADJETIVO, a ordem é inversa em inglês, como o exemplo li
~ -:';::;::""=""'_w_
sczuír ilustra:
~ 1. A Áustria é um país bonito.
2. Austria is a beautiful country.
1. _ 2. _ 3. _ Em português, há a possibilidade estilística de se colocar o adj
tivo antes do nome, às vezes com implicações semânticas importantes
(e.g., "mulher grande" e "grande mulher"). Mas, em inglês, essa possibi
!idade não existe. E essa é uma informação que o aprendiz precisa ter.
Outra diferença entre inglês e português diz respeito à presença
de mais de um adjetivo modificando um nome. Em português, não h
uma regra para qual adjetivo vem antes do outro. Na língua inglesa, h
uma ordem de colocação dos adjetivos, a qual foi analisada por gra
4. _ 5. _ 6. _ máticos a partir da análise de dados baseados em enunciados reais e
chegaram a esta ordem prototípica:
Não há como não pensar nos livros didáticos para crianças quan- -
do vemos exercícios desse tipo. Muitas séries de livros didáticos ofere- 1 2 3 4 5 6 7 8
cem exercícios assim no livro do nível iniciante. E há adultos que po- OPINION SIZE SHAPE AGE COLOR NATIONALlTY MATERIAL PURPOSl
dem considerá-Ios banais, mas o professor precisa orientá-los acerca
da importância de realizá-los para ficarem mais e mais familiarizados Dessa forma, teríamos, por exemplo, a seguinte ordenação d
com as convenções ortográficas da língua inglesa. adjetivos:
Eis outro tipo de atividade voltada para o desenvolvimento dessa 3. a small black Japanese car
micro-habilidade, agora incluindo-se também a prática da pontuação: 4. a great ancient purple Peruvian silk ritualistic gown

REAO THE PARAGRAPH BELOW ANO CORRECT THE SPELL- Mais uma diferença importante entre inglês e português diz res-
ING ANO PUNCTUATION MISTAKES VOU FINO. peito à presença de palavras que expressam sentido negativo, como
mary smith lives kalifornia but is originaly from new yorke she is not, never, nobody, hardly ever e seldom, no início da oração. Em portu-
a doktor at los angeles general hospital she lives with her son
guês, uma palavra negativa no início da oração não tem implicação ne-
peter hes a studente and works part time as a waitre at marys nhuma para a ordem das palavras, diferentemente do que acontece em
friends restaurant inglês. Conforme observamos nos exemplos que seguem, a presença
de uma palavra negativa no início da oração provoca a inversão entre o
A ORDENAÇÃO CORRETA DAS PALAVRAS é outra micro-habili- sujeito e o verbo auxiliar (o único verbo principal que sofre a inversão
dade de escrita que os aprendizes precisam desenvolver. E ela é muito é o verbo to be):
importante por causa das diferenças entre o inglês e o português, que 5. Hardly had I arrived at the beach it started to rain.
devem ser comentadas pelo professor para que seus alunos tenham 6. Never have I seen something so weird.

170 Aula de inglês: do planejamento à avaliação


CAPíTULO 6 I o ensino da escrito 17
A inversão ocorre também com expressões formadas com a pala- prcparaçao dos aprendizes p:lI'iI redigirem um currículo c uma C,II'\iI
vra only e com a palavra littLe usadas no início da frase: ele apresentação. Parte dessa preparação é o desenvolvimento ela ('OIlS'
.iência dos alunos acerca da adequação do texto ao contexto de rc
7. Only after John left was Dorothy able to see he didn't love her.
8. Little did the poor girl realize the trouble she was in. pção. Assim, eles apresentam uma carta de apresentação escrita por
um jovem chamado Brad Arnoldson e propõem a seguinte ativídad
Outra macro-habilidade de escrita a ser desenvolvida pelos
aprendizes é o USO CORRETO DAS REGRAS SINTÁTICAS, aí incluí- Read Brad's application letter. Some parts of the letter are ac
das as regras de concordância, regência e conjugação verbal. O de- ceptable, and some parts are completely inappropriate. Cross
senvolvimento dessa micro-habilidade está diretamente relacionado out ali the parts which you think are inappropriate in order to
aos exercícios de gramática. Não vou fazer maiores comentários sobre produce a good letter.
essa micro-habilidade porque o oitavo capítulo é dedicado ao ensino
da gramática, que é importante para o desenvolvimento da competên- Para você ter uma ideia do que está inadequado na carta em ques
cia gramatical dos aprendizes. Vou apenas dar um exemplo de ativi- tão, eis um trecho da carta:
dade de escrita voltada para o desenvolvimento dela. Refiro-me a uma
First of ali, I worked as a sales clerk where I learned a lot about
atividade proposta por Pavlik e De Hernandez (2001: 25) que objetiva a
the industry. But it was my rnother's store and we fought ali th
prática da 3a pessoa singular do simple present:
time, 50 I quito After that I worked at a beach resort in Mexico
WRITING
where I enjoyed working as part of a team and improved my
spoken Spanish. I quit because the pay was awful and I never
Write about your typical day. Then give your paragraph to your
had time to scuba diving.
partner. Rewrite his/her paragraph. Begin like this:
Jose is my classmate. Every morning he ... Os problemas da carta de Brad são causados pela inadequação ele
algumas informações para o gênero textual em questão. Informar que
Atividades de escrita como essa, em que não há um propósito co- ele brigava com a dona da loja, que é sua mãe, o tempo todo não ;,
municativo para a produção do texto, são válidas e legítimas pelo fato apropriado. Criticar explicitamente o salário que recebia no emprego
de focarem o desenvolvimento da precisão gramatical dos aprendizes. anterior é deselegante. E reclamar de não ter tempo para mergulhar é,
Mas precisão gramatical não basta. Não custa relembrar uma famo- no mínimo, reflexo de ingenuidade.
sa frase de um dos principais proponentes do ensino comunicativo de O USO ADEQUADO DOS ELEMENTOS COESIVOS é outra micro-
línguas, DeU Hymes: há regras de uso sem as quais as regras grama- -habilidade importante. Já tratei desses elementos na seção 6.1, quando
ticais não funcionariam. Por isso, para os aprendizes desenvolverem abordei os pronomes, conectivos e sinônimos. Por isso, quero apenas
a habilidade de escrita, eles precisam desenvolver a micro-habilidade reforçar a ideia de que os exercícios estruturais de gramática são part
de ADEQUAÇÃO DO TEXTO AO CONTEXTO DE PRODUÇÃO E RE- integrante do processo de desenvolvimento de micro-habilidades das
CEPÇÃO. Em outras palavras, os aprendizes precisam desenvolver sua quatro habilidades linguísticas, mesmo que não tenham nenhum ob-
competência sociolinguística para decidir que vocabulário, estruturas jetivo diretamente relacionado a elas. Assim, os professores que ado-
sintáticas e informações são adequadas aos gêneros textuais que pro- tam um método comunicativo não devem cair na armadilha do mito
duzem e ao público-alvo a quem dirigirão seus textos. de que não se ensina gramática na abordagem comunicativa: eles de
Um exemplo de atividade voltada para o desenvolvimento des- vem, sim, municiar seus alunos com informações e atividades voltadas
sa micro-habilidade é a que Kay e Jones (2011: 117) apresentam na para elementos sintáticos, como os pronomes e conectivos, pois isso

172 Aula de inglês: do planejamento à avaliação CAPiTULO 6 I o ensino do usei 11/1 1/:1
.sscnctal para a construção, tanto da compctcncia gramatical, quanto writing about?', we are not going to dismiss that curiosity as irr
da competência discursiva deles. levant or impertinent. It seems reasonable for us to make expli
Vejamos dois exemplos de atividades voltadas para a prática do cit, for instance, that of us identifies as heterosexual:
uso de conectivos. O primeiro é uma atividade de preenchimento de that we are, respectively, a lesbian and a gay manoThis is rele-
lacunas em que os aprendizes devem optar por um conectivo que não vant information for our readers to have, it would be
apenas expresse a ideia correta, mas que também se adeque à posição strange if our views on sexuality had not been affected signifi-
na oração e à pontuação: cantly by our status as members of sexual minorities. Our who-
le outlook on life is affected by that status by other
FILL IN THE BLANKS WITH AN APPROPRIATE LOGICAL social characteristics we happen to have in common, such as
CONNECTOR. being white, having received an elite academic education, and
belonging to the generation that came of age in the late 1979: a
1. It was raining, Sean didn't go to the beach. decade after Stonewall, a decade before Oueer Nation.

2. it was raining, Sean didn't go to the beach. ____ while this biographical information may help the rea-
der to situate our ideas and arguments, it does not in and of itself
3. It was raining. , Sean went to the beach. explain why we think what we do. There are plenty of people who
4. Sean didn't go to the beach it was raining. could say exactly the same things about themselves that we have
just said about ourselves, who would not bythattoken
5. the rain, Sean didn't go to the beach. subscribe to the same opinions. Clearly, educated white non-he-
terosexuals in their forties are not a homogeneous group. Even
6. the rain, Sean went to the beach.
as a group of two, we have our differences and disagreements.
7. Sean went to the beach it was raining. ANSWERS: although /neither / since / and / yet / but

(POSSIBLE ANSWERS: 1.50 2. 5ince 3. However 4. Because Outra micro-habilidade de escrita é a ESTRUTURAÇÃO INTERNA
5. Because of 6. Despite 7. Although)
DO PARÁGRAFO. Isso inclui a capacidade de ordenar logícamente as
orações e a capacidade de não inserir no parágrafo informações des-
O segundo exemplo é um doze baseado em um trecho do prefácio
vinculadas de seu tópico.
do livro Language and Sexuality, de Deborah Cameron e Don Kulick
(2009: xv): O tipo de atividade mais desafiador para praticar a ordenação de
orações em um parágrafo é aquele em que as orações são retiradas da
Below there is an excerpt from the preface of the book Lan- ordem, e os aprendizes devem ordená-Ias num parágrafo adequada-
guage and Sexuality, written by Deborah Cameron and Don mente organizado. E para mostrar a você como o professor pode ela-
Kulick. Some connectors were deleted. Read it and fill in the borar atividades desse tipo, vou usar o parágrafo que usei no início do
blanks with an appropriate connector from this Iist: but, yet, capítulo para falar sobre tópico frasal e que é apresentado no livro de
and, since, neither, although. Frydenberg e Boardman (1990: 19):
____ we are critical of contemporary identity politics, we
Put the sentences below in the right order to form a paragraph.
recognize that our identities have a bearing on our scholarly
() I woke up late in my small hotel room.
work. If readers feel impelled to ask, 'who are these authors and () Little did I know that this would be my worst day, so I had
from what kind of experiences do they come to subject they are nothing but good days to look forward to.

174 Aula de inglês: do planejamento à avaliação


CAPiTULO 6 I O ensino do uscrltn 1/'
( ) In fact, there was only ice cold water. means, in lhe languagc of their ancestors, a "porson <'<lp"
( ) At last I found the meeting place, but I also found out that ble of intelligible speech".
the meeting had been postponed to the following day. ( ) lt is this readiness for meaningful dialogue that charactcri
() Next, I got lost trying to find my way to the meeting I was zes today's Hungarian political leadership in questions of
already late for. both foreign and economic organizations (UN, International
() I went down to breakfast and was served a stale roll and Atomic Energy Agency, FAO, UNESCO, CMEA, GATT etc.).
lukewarm tea. () From the 1960s on, more and more "bridges" of dialogu
() Finally, I arrived back at the hotel ready for dinner. were built over the economic, political, and ideological
() My first full day in Yugoslavia turned out to be my worst day "gulf" dividing Europe into a Western and Eastern bloc.
there. () Hungary regularly and actively participates in their work.
() I got lost again on my way back to the hotel and spent most
(ANSWERS: 5 - 1 - 3 - 4 2)
of the day "sightseeing" on the various city buses.
() I wanted to take a quick shower, but there was no hot water. Para ajudar os aprendizes a desenvolverem a capacidade de evitar
( ) The waiter politely told me that I was too late for dinner I fugas temáticas locais, um tipo de atividade que se apresenta como ('fi
went to my room tired and hungry. caz é aquela em que o professor cria ou seleciona e adapta parágrafos
() I couldn't find anyone who spoke English and my Croatian com uma ou duas orações que fogem aos tópicos desses parágra fos
was still not very good. para que seus alunos as identifiquem.
A título de ilustração, criei a atividade a seguir a partir de dois
(ANSWERS: 2 - 12 - 4 - 8 - 6 - 5 - 10- 1 - 9 - 3 - 11 - 7)
textos do livro The Age of Shakespeare, de François Laroque (19D:3),
o professor deve analisar cuidadosamente o parágrafo que esco- e de um texto do livro Spotlight on the USA, de Randee Falk (19n:\)
lhe para elaborar esse tipo de atividade. O parágrafo deve ser classica- respectivamente.
mente organizado para possibilitar aos alunos serem bem-sucedidos
na ordenação, tarefa que não é fácil. Eis mais um exemplo, elaborado a REAO THE PARAGRAPHS BELOW ANO IOENTIFY THE SEN-
partir de um parágrafo de um texto informativo da brochura Hungary TENCES THAT OON'T BELONG IN THEM.
Today, publicado pelo Hungarian Tourist Board of the Ministry of Tra- 1. By 1592 Shakespeare established himself in London, caught
de no final dos anos 1980: up in the capital's astonishing growth. He started life as the
son of a glove maker and was given only an average edu-
Put the sentences below in the right order to form a paragraph. cation. This once small city, numbering some 50,000 in the
( ) Yet, it is constantly searching for possibilities of cooperation reign of Henry VIII (ruled 1509-47), underwent a huge influx
with organizations of which it is not a member, but where from the countryside to become a metropolis of 200,000 un-
dialogue is nonetheless useful for both parties. (That is the der Elizabeth I (ruled 1558-1603). Overpopulated and filthy,
attitude that prompted the agreement signed between the London was a city of seething activity, spectacle, and theater.
European Economic Community and Hungary.) 2. Thanks to the wide range of prices offered by the "box of-
( ) On April 4th, 1945, the War ended on the country's territory, fices" of the time, theaters were places of popular entertain-
and a new chapter began in the life of Hungary. ment. Shakespeare loved going to the theater. Entrance to the
( ) We believe that the Hungarian people have taken a lead in "pit" - standing room around the stage - cost only a penny;
that "bridge-building" - after ali, even their name ("Magyar") prices rose to sixpence for seats in the covered galleries. The

176 Aula de inglês: do planejamento à avaliação CAPiTULO 6 I O ensino da oscrun 1.


first were within reach of ali pockets, representing scarcely READING ACTIVITY: 1he paragraphs below lorm the texi Boy 511/

one-twelfth of a London worker's weekly salary. The second vives flight in wheel well or Boeing 737. Put them in the right order
were the preserve of rich city merchants and the nobility. ( ) Stowaways in wheel wells risk freezing to death after take off
3. The United States is rich in natural resources. It is a leading or being crushed when the wheels retractoThis year, a body
producer of fuel - of oil, natural gas, and coal. It is also a was found in the wheel well of a jet in San Francisco after
leading copper, gold, aluminum, iron, and lead. Its coastline a flight from Shanghai and another body was found in At
is stunning and attracts a lot of tourists. The United States lanta after a flight from Dakar, Senegal.
grows wheat, corn, and other crops and raises many cows, ( ) The boy was delivered to the hospital by the airport staff
pigs, and chickens. and is said to be in a critica I condition. His arms and legs
were 50 severely frozen and swollen that the rescuers were
Em 1,a ideia-controle do parágrafo é o surpreendente crescimen- not able to remove his coat and shoes. There is a probability
to da cidade de Londres na época de Shakespeare: não é sobre a in- that his hands may have to be amputated. However, accord
fância de Shakespeare. Logo, a segunda oração se configura em fuga ing to the medical staff at the hospital, it is nothing short of
temática. Em 2, a fuga temática também se encontra na segunda ora- a miracle that the boy survived the ordeal. The Boeing 73
ção, que traz uma informação sobre um habby de Shakespeare, o que has a cruising speed of 900 kilometres per hour and was fly
não tem nada a ver com a ideia-controle do parágrafo: a popularidade ing constantly at an altitude of 10,000 metres for two hours.
dos teatros por conta da gama variada de preços dos ingressos. Em 3, As a result, the boy suffered severe frostbite in both of his
a ideia-controle do parágrafo é a riqueza estadunidense em termos de hands. Doctors in Ural city would have to remove his finger
recursos naturais. Logo, a informação acerca de a orla marítima atrair tips, which contracted gangrene after they had frozen, but
muitos turistas é uma fuga temática. O professor precisa discutir as they were committed to do everything within their power to
respostas a questões de atividades desse tipo com os alunos, pois essa stop it from spreading.
discussão é importante para eles terem consciência das razões que ( ) When Scherbakov finally came to his senses, he told the po-
justificam a estruturação interna dos parágrafos. lice that he had run away from his family 50 as to escape his
A ORDENAÇÃO LÓGICA DE PARÁGRAFOS é uma micro-habilida- alcoholic father. He said that he was wandering around the
de fundamental para os aprendizes produzirem gêneros textuais como territory of the airport and noticed a hole in the fence. He
ensaios, artigos e monografias. Um tipo de atividade voltada para o fell asleep during his examination of the stowaway of the
desenvolvimento dessa micro-habilidade é aquela em que se desfaz a plane. He woke up when the plane was already flying. It is
sequência lógica dos parágrafos de um texto para que os aprendizes a curious how the inspection staff and the technicians found
refaçam corretamente. nothing on their inspection of the aircraft just before the
Ao levar uma atividade dessas para a sala de aula, o professor deve flight. The boy claims that he fainted soon after and came
orientar seus alunos a prestarem atenção a conectivos, pronomes, around only when the plane had landed in Moscow after
tópicos, todos úteis na tarefa de buscar a sequência lógica dos pará- traveling hundreds of kilometres from Perm.
grafos. Para ilustrar esse tipo de atividade, apresento um exemplo que ) A Russian teenager has accomplished an unprecedented
criei a partir do texto Bay Survives FLight in Wheel WeU af Baeing 7374: feat in the history of world aviation. He flew a distance of
1,300 kilometres in a wheel well of a Boeing 737 and lived.
The fifteen year old Andrey Scherbakov spent two hours
Disponível em: <http://en.wikinews.org/wiki/Boy_survives_f1ight_in_whee1_
well_oCBoeing_737>; acesso: 22 jun. 2015. in the wheel well of the airplane at extreme temperature

178 Aula de inglês: do planejamento à avaliação CAPiTULO 6 I O ensino do escrun


of -500 centigrade. The rear wheels do not go ali the way Esse é um exemplo oferecido por Conrad (1993: 91). 1\ prillH'iril
into the plane; the wheel merely retracts into an opening parte desse trecho é uma oração completa. A segunda parte, no cutnn
and remains exposed. The boy managed to bypass security (0, é um fragmento oracional, pois não possui sujeito nem prcdicado.
at the Perm city airport to hide in the plane as it took off. 1\ solução mais simples para esse problema é substituir o ponto da pri
Airport workers found the boy after the plane had landed mcira oração por uma vírgula:
at Moscow. He had collapsed on the tarmac. Canadians eat too much, whieh is why they weigh too much.
( ) The airport did not confirm the reportoHowever, Moscow's air
and water transport control department said that the claim (B) QUEBRA DE PARALELISMO:
was true. A department spokesperson said that the incident o My brother prefers luxuries like eating good food and nice clothin.g.
happened on Friday, and the boy's parents were immediately Esse exemplo vem de um exercício proposto por Conrad (199:!:
informed and flew into the capital on the same day. 167). A quebra de paralelismo que ocorre é provocada pelos cornplc
mcntos da forma verballike: eating good food e nice clothing. O problc
(ANSWERS: 5 - 2 - 3 - 1 - 4)
ma é que um desses complementos é um sintagma verbal e o outro, LI m
É fundamental que o professor discuta com os alunos as razões sintagma nominal. Para recuperar o paralelismo, precisamos escolher
pelas quais eles decidiram por determinada ordem. Isso é importante como complementos desse verbo dois sintagmas verbais ou dois sill-
para saber que elementos linguísticos e textuais eles levaram em con- tagmas nominais. Eis as possibilidades:
sideração para organizar a sequência dos parágrafos. o My brother prefers luxuries like eating good food and waarinq
A última miero-habilidade a comentar é a REVISÃO TEXTUAL, nice clothing.
fundamental para o processo de escrita na medida em que ajuda os o My brother prefers luxuries like good food and nice clothing.
aprendizes a encontrarem problemas e corrigi-los. O desenvolvimento
dessa miero-habilidade é feito por meio de atividades especificamen- (C) ERROS DE ORTOGRAFIA:
te voltadas para a revisão textual, que devem fazer parte da vida dos o Jean is in the dinning room studing for the testo
aprendizes desde o começo do curso. Aí estão dois erros comuns cometidos por estudantes brasileiros.
As atividades que contribuem para o desenvolvimento dessa mi- O primeiro sofre uma clara influência da palavra dinner e o segun-
cro-habilidade são os exercícios que apresentam aos aprendizes ora- do resulta de uma supercorreção por conta da regra de formação do
ções ou textos com erros para que eles os localizem e os corrijam. Tais simple past dos verbos regulares terminados em Y precedido por con-
exercícios devem ser feitos em todos os semestres durante o curso soante: o Y é apagado ao acrescentar-se o morfema ED, como ocorr
para que os alunos tenham a oportunidade de refletir sobre a necessi- com studied. Isso acaba levando os aprendizes a apagarem o Y ao adi-
dade de aprenderem a revisar seus próprios textos. cionarem o morfema ING. A solução é simples:
São vários os alvos do ato de revisão textual com os quais os alu- o Jean is in the dining room studying for the testo
nos precisam se acostumar, mas comentarei apenas nove: fragmenta-
(D) PONTUAÇÃO EQUIVOCADA:
ção sentencial, quebra de paralelismo, erros de ortografia, pontuação
o People should not drink excessively, alcohol can cause damage to
equivocada, falta de concordância verbal, falta de concordância prono-
the liver.
minal, referência pronominal equivocada, modifieadores mal posiciona-
Esse erro de pontuação é chamado de comma splice, que resulta
dos e modifieadores pendurados. Vale a pena analisar alguns exemplos.
da união de duas orações independentes por uma vírgula. A solução
(A) FRAGMENTAÇÃO SENTENCIAL: é a substituição da vírgula por um ponto, o uso de um conectivo ou a
o Canadians eat too much. Which is why they weigh too much. inversão das orações com o uso de um conectivo:

180 Aula de inglês: do planejamento à avaliação CAPíTULO 6 I O ensino da OSC! 1til 11


D People should not drink excessively. Alcohol can cause damag E aqui CSl[1 uma vcrsao corrigida de maneira mais radical lal1l-
to the liver. IlI'lll oferecida por Conrad:
D People should not drink excessively because alcohol can cause " A hundred years ago people had time to sit down and write lct
damage to the liver. ters, but today we are so busy that we just pick up the telephon
D Alcohol can cause damage to the liver, so people should not drink
(E) FALTA DE CONCORDÂNCIA VERBAL:
excessively.
The good news are the pai ice has found the seria I killer.
é a fused sentence, que resulta da
D
Outro tipo de erro de pontuação
Aí estão dois erros comuns de concordância verbal. A palavra
união de duas orações independentes sem vírgula ou conectivo:
D People should not drink excessively alcohol can cause damage to
ueios, embora tenha um S que apontaria para uma forma plural, é sin-
Mular; e a palavra police, embora não tenha um s, é plural. Logo, a cor
the liver.
rccão é simples:
As soluções são as mesmas usadas para corrigir o comma splíce
The good news is the pai ice have found the seria I killer.
anterior.
Outro erro provocado por uma pontuação equivocada é o que se (F) FALTA DE CONCORDÂNCIA PRONOMINAL:
chama de run-on sentence. Conforme explica Conrad (1993: 117),"quan- D The sensible drinker will have only one or two beers, so he ar shn
do uma sentença cresce a tal ponto que fica fora de controle, especial- will not lose their self-control.
mente se suas partes não estiverem conectadas de maneira próxima, Conrad (1993: 139) fornece esse interessante exemplo de faltn
ela se torna uma run-on sentence". Eis um exemplo: de concordância pronominal. Ele explica que a junção de dois pro
D A hundred years ago people were not as busy as they are today,
nomes singulares com o conectivo or exige que a concordância seja
and they could sit down and write letters and send them to their
feita com verbos ou outros pronomes no singular. Assim, a forma
friends and their business associates, but in our modern times orreta é esta:
people are really busy, and they find that writing is toa much
D The sensible drinker will have only one ar two beers, so he ar sh
work, so they just pick up the telephone and make a call to so-
will not lose his or her self-control.
meone else.
A partir desse exemplo, em que há uma repetição desnecessária (G) REFERÊNCIA PRONOMINAL EQUIVOCADA:
do conectivo and, Conrad (1993: 117) faz um comentário importante: D Smoking is an expensive habit.jj burns away as soon as a person
"Conectar muitos pensamentos de maneira frouxa em uma única afir- lights 11up, even when 11is not being smoked.
mação é algo que fazemos na fala, pois geralmente falamos mais rapi- Esse exemplo, oferecido por Conrad (1993: 128), ilustra perfeita-
damente do que pensamos. Entretanto, quando escrevemos, a oportu- mente o caso da referência pronominal equivocada. No trecho, há ape-
nidade de revisar não nos deixa nenhuma desculpa para a linguagem nas um referente possível para os três pronomes sublinhados: smoking.
desorganizada e inútil". E ele está certo. Por isso, o professor precisa O problema é que smoking não pode ser o referente por uma ques-
ajudar seus alunos a se conscientizarem da importância de revisarem tão de coocorrência: smoking não pode ser sujeito dos verbos to burn
seus textos. Eis uma versão corrígída desse exemplo: away, to light up e to be smoked, que claramente têm como sujeito lógi-
D A hundred years ago people were not as busy as they are today: co o sintagma nominal a cigarette, que não aparece nesse trecho. As-
and they could sit down and write letters and send them to their sim, a referência pronominal pode ser corretamente restaurada com a
friends and their business associates. But in our modern times pe- substituição do primeiro pronome por a cigarette:
ople are really busy. They find that writing is toa much work, so D Smoking is an expensive habito A cigarette burns away as soon as
they just pick up the telephone and make a call to someone else. a person lights it up, even when it is not being smoked.

182 Aula de inglês: do planejamento à avaliação CAPíTULO 6 I O ensino da escrito 183


(H) MODIFICADORES MAL POSICIONADOS: 1111101
forma de cxprcssao do pensamento. E por que me fez pt'llsar'? POI
o Covered with chocolate syrup and strawberries, the waiter served q\1I' coloca em qucstionarncnto a ESCRITA COLABORATIVA, aquelu Idla
Maria a bowl of ice cream. (Inl' mais de uma pessoa. Afinal, se a escrita expressa o pensamento, <'1:1,
O modificador sublinhado claramente tem como escopo ice cre- ('111 lese, tende a ser um ato individual, não um ato colaboratívo,

amo Do jeito que está escrito ali, esse modificador tem como referente Realmente, a escrita colaborativa é difícil de ser realizada. Multas
the waitress. Para corrigir esse tipo de erro, basta mover o modificador vezes, vemos artigos sendo feitos por duas pessoas desta forma: uma
para próximo do seu referente: laz algumas seções e a outra faz outras. Ou seja, é uma escrita indivi
o The waiter served Maria a bowl of ice cream covered with choco- dual de partes unidas para formar um todo. Se as duas escrevem uma
late syrup and strawberries. mesma seção, isso significa que uma faz uma parte e a outra faz ores
t ante. É mais complicado as duas escreverem juntas uma mesma scçao,
(I) MODIFICADORES PENDURADOS:
pois é preciso muita harmonia entre elas, tanto na maneira de pensa r
o As a child, my mother would take me to the movies on Sunday
(' de redigir quanto no saberem lidar uma com a outra, aceitando e re-
mornings.
cusando pontos de vista e sugestões. É mais fácil a colaboração acon
Podemos observar que As a child parece estar modificando my
tecer na revisão textual: a revisão se torna mais eficaz quando uma
mother. Apenas parece, pois, se estivesse, a sentença estaria semanti-
pessoa revisa a parte que a outra fez pelo distanciamento que se tem
camente errada. Afinal, como é que uma mãe iria levar o filho ao cine-
da parte que a outra escreveu.
ma quando ela era uma criança? Logo, esse modificador está pendura-
O professor precisa ter cuidado com as atividades rotuladas d('
do na sentença (escolhi traduzir dangling modifier como 'modificador
escrita colaborativa, porque elas podem não passar de uma colcha d('
pendurado'). Para corrigir esse tipo de erro, é necessário analisar caso
retalhos textuais. Há uma atividade em que o professor indica um tema
a caso. Nesse exemplo, a forma correta seria a seguinte:
e o gênero textual, dá uma folha de papel para cada aluno e pede que
o When I was a child, my mother would take me to the movies on
cada um escreva a primeira oração do texto. Depois, os alunos passam
Sunday mornings.
o papel para o colega à direita (ou à esquerda) para ele escrever a se
A ajuda do professor é essencial para os alunos desenvolverem a
micro-habilidade de revisão textual, a qual depende diretamente de gunda oração. Essa troca se repete até que cada aluno receba o papel
seus conhecimentos linguísticos. Se o livro didático usado na institui- em que está a primeira oração que escreveu. Depois todos leem os tex-
ção em que ele trabalha não trouxer atividades voltadas para a prática tos para ver que bicho vai sair dali. Enfim, isso pode ser chamado d
da revisão textual, ele precisará preparar atividades para isso. qualquer coisa, jamais de escrita colaborativa, pois não houve planeja
A revisão textual está diretamente relacionada a duas controvér- mento nem diálogo entre os escritores para tomarem decisões quanto
sias que se instauraram nas discussões sobre o ensino de escrita para ao que escreveriam.
aprendizes de inglês como língua estrangeira. A próxima seção é de di- Concebendo a escrita como processo, podemos vislumbrar a es-
cada a elas. crita colaborativa em etapas desse processo, não necessariamente em
todo o processo. A etapa da geração de ideias é propícia ao trabalh
colaborativo, pois um aluno pode vislumbrar tópicos que seus colegas
6.4 Escrita colaborativa e correção dos textos
não vislumbrariam, e compartilhar isso com eles. A etapa da revisão
escritos: questões polêmicas
textual também pode ser feita por meio da avaliação horizontal, qu
Em 1998,durante a Laurels Teacher Trainers' Convention em Maceió, aquela em que um aluno revisa o texto do outro. Contudo, a revisão h
participei de uma oficina sobre escrita conduzida por Penny Ur. Dentre rizontal depende muito dos conhecimentos explícitos dos aprendizes c
várias coisas interessantes que ela disse, uma me fez pensar: a escrita é da maneira como eles encaram a legitimidade desse tipo de revisão.

184 Aula de inglês: do planejamento à avaliação CAPíTULO 6 I o ensino da escruu 1111


Em uma pesquisa realizada no Teachers' Collegc da Universida- (<I) o critério de íormaçüo das duplas;
de King Saud, Khalid Al-Nafiseh (2013) investigou o efeito da escrita (e) () objetivo pedagógico da atividade;
colaborativa e da avaliação horizontal na escrita dos alunos de duas (I')o nível de conhecimentos dos seus alunos.
turmas. Vários dos alunos participantes da pesquisa afirmaram pre- Você pode estar perguntando: "Como assim, características p('s
ferir que seus textos fossem corrigidos pelo professor e alguns afir- soais dos alunos?". Ora, há alunos que podem não se sentir à vontuck-
maram preferir receber comentários dos colegas. E esse é um ponto para fazer um texto com outra pessoa; há alunos que são preguiçosos
importante: devido à forma tradicional de ensino em que o professor é (' que gostam de pongar no colega, que acaba fazendo o texto sozinho
o responsável pela correção dos textos, muitos alunos não consideram em nome dos dois; há alunos com ritmos mais rápidos e outros COI1l
legítima a avaliação horizontal. ritmos mais lentos para a escrita.
Além disso, "para alguns alunos, a avaliação horizontal foi inútil Realizar uma atividade de escrita colaborativa não é algo simples.
porque seus colegas não estavam qualificados para criticar seus tex- professor deve pensar com cuidado antes de decidir levar uma para
tos" (Al-Nafiseh, 2013: 241). Essa informação nos faz perceber que, mes- a sala de aula.
mo que os alunos se sintam à vontade em ter seus textos revisados pe- Outra questão relacionada ao desenvolvimento da escrita dos
los colegas, essa revisão depende profundamente dos conhecimentos aprendizes diz respeito àquilo que tradicionalmente chamamos <1('
explícitos que eles possuem sobre a língua e sobre escrita. Ter conhe- CORREÇÃO dos textos escritos pelos alunos. E por que considero íI
cimentos explícitos significa não apenas saber realizar, por exemplo, correção uma questão polêmica? Por três razões, que explicito a segu ÍI.
concordância e referência, mas também saber o que é concordância, A primeira é a existência de uma questão básica: o professor
que elementos ela envolve, o que é pessoa do discurso e saber o que é deve ou não corrigir os erros de gramática que seus alunos COJ1lC(('lll
referência e conhecer os elementos coesivos. ao escrever? Já virou senso comum a ideia de que o professor tem d('
Obviamente, os aprendizes possuem conhecimentos implícitos, corrigir os textos dos alunos e que a correção inevitavelmente envol
mas muitos deles não possuem conhecimentos explícitos a ponto de ve erros de gramática. Entretanto, há quem defenda a não corrcçao
serem capazes de revisar eficientemente os textos de seus colegas. E desses erros. É o caso de John Truscott, cujo artigo "The Case Againsl
isso é uma pena porque a avaliação horizontal se apresenta como um Grammar Correction in L2 Writing Classes", publicado em 1996, pro
ato de escrita colaborativa que pode ser interessante para os apren- vocou muita discussão" pelo fato de defender a não correção de erros
dizes: a revisão textual é teoricamente mais eficaz quando feita por de gramática. Ele alega haver evidências empíricas de que a correção
alguém que não o próprio autor do texto. dos erros de gramática não apenas não contribui positivamente pa ra
Outro ponto que chama atenção é a reclamação tanto dos pro- o desenvolvimento da habilidade de escrita dos aprendizes, como os
fessores quanto dos alunos acerca da logística da avaliação horizon- prejudica. Contudo, ele não apresenta evidências empíricas de que a
tal: eles acharam que ela consumiu muito tempo (Al-Nafiseh, 2013: não correção contribua positivamente para esse desenvolvimento.
241). E estamos falando aí de estudantes universitários. Dá para ima- Na falta de evidências, recomendo ao professor que seja mais con
ginar como a logística se complica em uma sala de inglês como língua servador e corrija os erros que seus alunos cometem nos textos que
estrangeira. escrevem, independentemente de quais erros sejam: ortografia, gra
De qualquer forma, se o professor decidir realizar alguma ativida- mática, estruturação textual, organização das ideias. A correção, se
de de escrita colaborativa, ele precisa pensar nestes elementos: adequadamente feita, serve de parâmetro para as reflexões dos alunos
(a) as características pessoais dos alunos;
(b) o tempo que será gasto para realizá-Ia; Cf. Truscott (1999) para ter uma ideia do debate instaurado entre ele e Dana F<'l'rls
(c) a logística da atividade; sobre essa questão.

186 Aula de inglês: do planejamento à avaliação CAPíTULO 6 I O ensino da ascutu


acerca dos seus enunciados, o que pode, de alguma maneira, contri CON conncc tOl 1It,t'c)t'd

buir para o desenvolvimento da habilidade de escrita. O aprendizado é cs comma splico


caótico e, por isso, segue caminhos às vezes imprevisíveis. DM dangling modifier
Além disso, recomendo que o professor pense acerca do que o FRAG sentence fragment
termo correção significa: o ato de procurar erros e corrigi-los. E aí re- fused sentence
FS
side a segunda razão pela qual a correção dos textos escritos pelos
MW missing ward
aprendizes é uma questão polêmica: a razão de ser de um texto escri-
PAR faulty parallelism
to é sua leitura. Se o professor procura apenas erros num texto, não
PL plural
o lê e acaba se transformando em mero revisor, em vez de se tornar
PREP prepasitian needed
um leitor dos textos de seus alunos. Talvez devêssemos substituir a
pranaun needed ar wrang pranaun reference
palavra correção pela palavra avaliação para que o professor entenda PRO

claramente que precisa avaliar a escrita dos alunos tanto em termos PUN punctuatian needed

de conteúdo, organização das ideias e fluência, quanto em termos da RO run-an sentence


forma e da precisão gramatical e lexical. 5 subject needed
A terceira razão da polêmica em torno da correção da escrita dos SCL small case letter
aprendizes diz respeito à maneira como realizar a correção: direta ou SING singular
indiretamente? A correção direta é aquela em que o professor risca o spelling
SP
que está errado e escreve a forma supostamente correta por cima. Digo
v verb needed
"supostamente" porque pode haver alternativas para o erro que não são
VT verb tense
apresentadas aos alunos pelo professor, o que faz com que eles acreditem
WF wrang word farm
haver só uma forma correta de dizer o que tentaram e não conseguiram.
Já a correção indireta é aquela em que o professor apenas aponta wo ward arder

os erros e atribui aos alunos a tarefa de corrigi-los, Alguns professores ww wrong ward

apenas circulam ou sublinham os erros para que os alunos descubram # begin a new paragraph
que erros cometeram e como corrigi-los. Outros sublinham os erros e 0 unnecessary ward
os codificam. Considero essa maneira a mais interessante para ajudar ....• indent
o aprendiz a desenvolver a capacidade de revisar seus próprios textos.
Para isso, o professor precisa apresentar aos alunos uma lista de códi- Bem, para concluir esta seção, reforço a necessidade de o pro
gos, como a que mostro a seguir. fessor avaliar os textos escritos por seus alunos. Essa é uma forma
de feedback importante para o desenvolvimento da consciência deles
CORRECTION SYMBOLS
acerca dos aspectos linguísticos e textuais envolvidos no ato da escri
ADJ adjective needed ta. Além disso, recomendo o uso de lista de símbolos para ajudá-Ios (1
ADV adverb needed desenvolverem a micro-habilidade de revisão textual.
AGR subject-verb agreement No próximo capítulo, trato de um tema importantíssimo para
ART article needed o desenvolvimento das quatro habilidades linguísticas: o ensino do
CAP capitalizatian needed vocabulário.

188 Aula de inglês: do planejamento à avaliação


CAPiTULO 6 I o ensino da escrun 11
o ensino do vocabulário
ocê provavelmente já passou por alguma situa
ção em que desejava ou precisava dizer al~o ('
lhe faltaram palavras para isso. Não me refi I()
aqui a situações emocionalmente carregadas, mns li
situações mais simples. Por exemplo, imagine qut: li
gás de cozinha na sua casa é encanado. Um dia, ,I 1)('<";\
que une a mangueira do fogão ao encanamento da pa
rede se quebra, e você precisa de uma nova. Você salx:
o nome dessa peça para comprá-Ia numa loja de mil
teriais de construção?
Situações como essa ocorrem de vez em quando
em nossas vidas de falantes de português, mas ocor
rem com mais frequência na vida dos aprendizes (\e
inglês. E isso se deve ao fato de seu vocabulário ainda
não estar suficientemente desenvolvido.
O desenvolvimento do vocabulário é essencial
não apenas para falar, mas também para compreen
der textos falados, escritos e para escrever. Por isso, o
ensino do vocabulário deve constar na agenda do pro
fessor. Duvido que algum professor discorde disso: to
dos os professores sabem da importância que o voca
bulário desempenha na aprendizagem de inglês. Mas a
unanimidade acaba aí: não existe consenso entre eles
quanto à maneira como o ensino do vocabulário deve
ser realizado. E essa falta de consenso é salutar, pois

CAPíTULO 7 I o ensino do vocabulánu 1


J
aponta caminhos diferentes que podem ser mais ou menos adequados I.~t'OIIH'1l10 lima estratégia de aprendizado de vocabulário que pode sei
em situações de ensino distintas. Basta que o professor não se restrinja ut II paru os aprendizes.
a apenas um caminho.
Um ponto importante na discussão sobre o ensino do vocabulário .1 Formas de ensino do significado lexical
é a maneira como se aprende o vocabulário. Paul Nation (1990) comen-
ta que o aprendizado pode ser indireto ou direto. Você está planejando uma aula na qual ensinará a seus alunos o
No aprendizado indireto, os aprendizes são expostos a palavras por /{ignificado de uma palavra. Parte desse ensino é o significado dela e
meio de atividades voltadas para a prática das habilidades linguísticas ou parte de seu planejamento é decidir como apresentará esse significa-
do. E você terá duas maneiras de fazer isso: ou demonstrando o signifi-
da gramática. Eles apenas são expostos a elas. Ou seja, o professor não
cado ou explicando-o verbalmente. A demonstração pode ser feita por
explica seus significados nem faz nenhum comentário sobre sua pro-
meio de reaLia, imagens prontas, gestos ou desenhos que você faz no
núncia ou sobre seus usos. Como as palavras, nesse caso, estão contex-
quadro na hora da apresentação. A explicação verbal pode ser realiza-
tualizadas e, teoricamente, não são em grande número por fazerem par-
da por meio do fornecimento, na língua inglesa, da definição da palavra
te de um material didático especificamente preparado para o nível em
ou por meio da tradução.
que os aprendizes se encontram, espera-se que eles acabem internali-
Como decidir qual a forma mais eficaz de ensinar o significado
zando algumas delas. Pode até ocorrer um ensino incidental de uma pa-
de uma palavra? Isso depende do nível que você estiver lecionando
lavra ou outra quando o professor considera isso válido, mas isso não é
da palavra em questão. Se seus alunos estiverem no nível iniciante, '
algo propositadamente planejado para servir como aula de vocabulário. óbvio que o fornecimento de definições em inglês não surtirá efeito.
O aprendizado indireto é muito importante. Contudo, os alunos Pelo contrário, poderá deixar o aluno não apenas sem saber o que é a
precisam de sugestões de estratégias de aprendizagem para lidar com palavra, mas também com o sentimento de frustração. Se a palavra for
palavras novas e recic1ar as palavras já aprendidas. Por essa razão, o um substantivo abstrato, demonstrá-Ia por meio de imagens ou reaLia
ensino direto do vocabulário tem espaço nas aulas de inglês. pode ser complicado.
Vale lembrar que o vocabulário de uma pessoa pode ser dividido em Imagine que você precisa explicar aos alunos uma série de pala-
dois tipos: o ativo e o passivo. O vocabulário ativo compreende as pala- vras que remetem aos objetos comumente usados na sala de aula: pen,
vras que a pessoa usa com frequência. O vocabulário passivo engloba as penciL, eraser, notebook, board, desk e chair. É óbvio que você precisará
palavras que ela não usa com frequência, que talvez nem use, mas que apenas mostrar-lhes os objetos e nomeá-los para que eles associem as
reconhece ao ouvi-Ias ou lê-Ias. Dá para perceber que nosso vocabulário palavras a seus significados.
passivo é muito maior do que o ativo. De qualquer forma, a ideia é o pro- Entretanto, se as palavras cujos signi-
fessor ajudar os aprendizes a ampliarem tanto um tipo quanto o outro ficados você precisa ensinar remetem a ob-
de vocabulário para atingirem níveis mais altos de proficiência. jetos ou a entidades que não fazem parte do
É por conta do espaço que o professor deve dedicar, em suas au- ambiente da sala de aula, a demonstração por
las, ao ensino de vocabulário que escrevi este capítulo. Abordarei, em reaLia ou por imagens é uma opção interes-
primeiro lugar, algumas formas diferentes de ensinar o significado le- sante, assim como o é também o desenho feito
xical. Em seguida, discuto o que é necessário para os aprendizes co- na hora. Mas, neste caso, se você não souber
nhecerem uma palavra. Veremos que essa necessidade depende do que desenhar, pode perder tempo e ainda confun-
eles farão com as palavras em termos de recepção ou de produção, em dir seus alunos. Por exemplo, se você precisa
termos das quatro habilidades linguísticas. Depois disso, apresento al- explicar o que significa rooster, uma imagem
guns fenômenos semânticos que devem ser abordados em sala de aula como esta aqui ao lado é útil.

192 Aula de inglês: do planejamento à avaliação


CAPíTULO 7 I O ensino do vocabulário 193
Porém, se a palavra em questão for um substantivo abstrato, sua dos í'lllcndií'.l's. Num breve arti~o (Oliveira, 20<n), dou como exemplo
vida pode ficar mais difícil. Por exemplo, imagine um aluno pergun I p;t1;IVI'(l
wctpcj'ruil, que nos remete a uma fruta que não íaz pillH'
tando o que significa a palavra outside. Isso aconteceu em uma aula do dlla (;1I1turas da minha cidade, Salvador. Isso implica que a maioria dos
primeiro nível de iniciantes que observei há alguns anos. Um aluno dis- '11'1undlzcs naturais de Salvador provavelmente nunca viu ou ouviu fa
se: "Teacher, 'outside'?". O professor explicou o significado da palavra 1;11'dessa fruta. Então, discuto o ensino do significado dessa palavra
em inglês e usou gestos. Não adiantou. Outro aluno disse: "Outside?". 1I;!!'élmostrar os limites com que o professor pode esbarrar no ensino
Novamente, o professor forneceu a definição da palavra em inglês e do vocabulário. Pergunto qual seria a forma mais eficaz de ensinar o
usou gestos. Aí um terceiro aluno disse: "1 don't understand.". O profes- ,Igllificado dessa palavra e dou quatro opções, que transcrevo a seguir:
sor, então, disse a uma aluna:
1. define grapefruit: 'a large round yellow citrus fruit with slight-
Iy sour flesh'
TEACHER: Mary, what does your mom do?
2. show the students a picture of a grapefruit
MARY: Businesswoman.
3. show the students a real grapefruit
TEACHER: Businesswoman? Good. Does she work inside (mi-
4. translate it into the students' native language
med) or outside (mimed)?
MARY: Inside. Qual alternativa você considera a mais eficaz? Com certeza, dcf'i
TEACHER: John, what does your mother do? nir grapefruit não adianta se o aprendiz não estiver em níveis elevados
JOHN: Teacher. dc proficiência e não tiver conhecimentos enciclopédicos suficientes
TEACHER: Teachers work inside (mimed). OK? que o ajudem a fazer ideia do significado. É algo do tipo fiat lux: quase
um milagre. Aliás, definir animais e plantas é complicado. Experimente
O diálogo acabou aí. O professor se deu por satisfeito e passou à definir Ieech, honey badger, blueberry e Brussel sprouts para seus alu-
atividade seguinte. O que chama a atenção nesse caso é o tempo que o nos. A alternativa A, portanto, fica descartada.
professor levou tentando fazer os alunos entenderem o significado de Talvez mostrar a imagem de grapefruit funcione. Eu faria isso.
outside por meio do fornecimento da definição em inglês e por meio de Mas... funcionaria mesmo? Veja a imagem que apresento a seguir. Qu
exemplos, sem sucesso. Perguntei discretamente ao aluno que estava aprendiz brasileiro não confundiria essa fruta com a laranja, por mais
ao meu lado se ele havia entendido e ele disse: não. perfeita que a imagem possa estar? A alternativa B também é carta
O professor deste exemplo tinha uma crença que acabava atra- fora do baralho.
palhando suas aulas: ele achava que só a língua inglesa deve ser usada
em sala. Ele baniu o português de suas aulas. E esse professor não está
sozinho: há outros que têm a mesma crença. Só que, às vezes, o uso da
língua portuguesa pode ser muito útil, como teria sido naquela aula: se
o professor tivesse traduzido a palavra outside, teria economizado um
tempo valioso, a ser usado em outras partes da aula, e teria satisfeito
a curiosidade dos alunos. Sim, a tradução é uma forma de ensino de
vocabulário útil em alguns momentos. Não o é em todos, obviamente.
Mesmo assim, há palavras cujo significado é difícil de ser explica- E que tal levar uma grapefruit para a sala de aula? Não há forma
do. E não estou falando aqui de substantivos abstratos, não. Falo de pa- mais autêntica, mais real de ensinar o significado de uma palavra do qu
lavras que nos remetem a entidades culturais inexistentes na cultura a associação dela a seu significado diretamente por meio do objeto que

194 Aula de inglês: do planejamento à avaliação CAPíTULO 7 I o ensino do vocabulério 19!


ela representa. Entretanto, se os alunos não souberem que fruta é essa, I fllllll111jú ler instituklo a ideia de que conhecer lima palavra equivale <l
vão aprender que ela se chama grapeJruit, mas não terão a menor idcia .1I1t'1seu significado. Logo, seria óbvia a resposta: saber o significado
de como ela se chama em português, nem de seu sabor. Além disso, em ti" 11111(1 palavra é o que é necessário para conhecê-Ia. O problema é qu
muitos lugares do Brasil, é muito difícil (às vezes, até impossível) encon- 11)('1'o significado de uma palavra é apenas parte do que é necessário
trar uma grapefruit. Então, a alternativa C também não daria certo. 1'001'n conhecê-Ia. Parte importante, é verdade, mas apenas uma parte.
Resta, então, a alternativa D, que faz os professores ortodoxos e Para responder à pergunta que intitula esta seção, precisamos
radicais estrebucharem: traduzir grapefruit para o português. O equi- ,,'sponder a outra antes: para que aprender determinada palavra? Para
valente é toranja. Experimente perguntar a alguém se gosta de toranja. 1IIIIiy.ú-lana fala e/ou na escrita ou para compreendê-Ia em textos Ia-
Provavelmente, a reação será: "Se eu gosto de quê?!". A não ser que l.ulos c/ou escritos? O professor precisa saber quantas informações
existam toranjas na terra dessa pessoa. obre as palavras deve compartilhar com seus alunos. Essas informa-
Para os professores que adotam uma postura ortodoxa em relação "O('S dizem respeito à grafia, à pronúncia, a sua frequência de uso e,
ao uso de português na sala de aula, aqui vai um lembrete: ser radical obviamente, a seu significado.
na área de ensino não é uma atitude interessante. O que se deseja é Nation (1990: 31) propõe um conjunto de perguntas que ajudam o
que os aprendizes aprendam inglês. Logo, é óbvio que professor e alu- professor a refletir sobre quantas informações deve compartilhar com
nos devem evitar o uso de português durante as aulas. Contudo, isso seus alunos no momento de preparar aulas de vocabulário. Essas per-
não quer dizer que tanto um quanto os outros devam fazer malaba- guntas se dividem em quatro categorias: forma da palavra, posição da
rismos mentais, contorcionismos cognitivos e rezas sem sucesso para palavra na oração e nos sintagmas nominais, função da palavra nos
que os alunos entendam explicações em inglês a ponto de eles não en- ntos comunicativos, significado da palavra. Cada uma dessas catego-
tenderem as explicações. Esse tipo de radicalismo não vale a pena. rias é dividida em duas subcategorias. A seguir, apresento e comento
Bem, parece que grapefruit é uma palavra que se encontra no li- cada uma dessas categorias seguindo a proposta de Nation.
mite das possibilidades de ensino do vocabulário em inglês. Mas mui- c FORMA DA PALAVRA:
tas outras palavras estão longe desse limite e permitem ao professor
uma destas alternativas para a apresentação dos seus significados: R Qual é o som da palavra?
Falada
(a) definir a palavra; p Como a palavra é pronunciada?
FORMA
(b) demonstrar por meio de imagens; R Qual é a aparência da palavra?
(c) demonstrar por meio de reaLia; Escrita
p Como a palavra é ortografada?
(d) traduzir a palavra.
Enfim, ele deve decidir qual a forma mais eficaz de apresentar os A forma da palavra a ser ensinada pode ser considerada do ponto
significados das palavras a seus alunos de acordo com o nível deles e de vista da oralidade ou da escrita e do ponto de vista da recepção (R)
com o grau de complexidade dos significados. ou da produção (P). Por exemplo, se uma pessoa quiser aprender pa-
Discutiremos, na próxima seção, o ensino do vocabulário, que vai lavras apenas para ler, precisa saber reconhecer sua forma gráfica, ou
além do ensino do significado das palavras. seja, a aparência que tem. Aprender a pronunciá-Ia ou a ortografá-la é
irrelevante para essa pessoa, que poderia sentir estar perdendo tempo
7.2 O que é necessário para conhecer uma palavra? se seu professor lhe propusesse atividades voltadas para esses dois as-
pectos das palavras.
Talvez alguma leitora ou algum leitor estranhe a pergunta que dá Já no caso de uma pessoa que deseja aprender a falar inglês
título a esta seção. E o estranhamento pode se dever ao fato de o senso para viajar, a maneira como a palavra é ortografada e sua aparência

196 Aula de inglês: do planejamento à avaliação CAPiTULO 7 I o ensino do vocabuláno 19/


geralmente são irrelevantes. Para realizar os atos comunicativos 11" l'ftlllH'('t'I"('Jl)tiS puluvrus ic« Ct'('CWI e soup, precisam sulx-r 11<10 <lI>I'II;lS
cessários em uma viagem de turismo em hotéis, restaurantes e aer ('1114
sil1nilk,l(los, mas também com que verbos elas podem ('()()(,OIT('I.
portos, por exemplo, basta a essa pessoa aprender a pronúncia tan-
" FUNÇÃO DA PALAVRA NOS ATOS COMUNICATIVOS:
to do ponto de vista da produção quanto da recepção. Afinal, do qu
---
adianta alguém saber pronunciar razoavelmente palavras e frases s R Quão comum é a palavra?
não consegue reconhecer sons? Esse é um dos problemas daqueles li- Frequência -
P Com que frequência a palavra deve ser usada?
vrinhos de frases para viagens: o turista pode até aprender a pronun- lU NÇÃO -
ciar as frases, mas terá problemas se as respostas dadas na situação R Onde esperamos encontrar essa palavra?
Adequação
real forem com palavras diferentes daquelas que o livrinho apresenta. P Onde essa palavra deve ser usada?
o POSIÇÃO DA PALAVRA:
A frequência de ocorrência de palavras é algo que ocupa a cabeça
R Em que padrões gramaticais a palavra de teóricos e de elaboradores de materiais didáticos desde o século
Padrões ocorre? XVII, de acordo com informações de Louis Kelly (1969: 184). E isso nao
gramaticais (, por acaso: raciocinando pedagogicamente, precisamos estabelecer
Em que padrões gramaticais devemos usar
P
a palavra? 11mcritério para selecionar as palavras que os aprendizes prccisaráo
POSiÇÃO
Que palavras ou tipos de palavras
aprender para se comunicar em inglês. Afinal, palavras como " yOll,
R esperamos encontrar antes ou depois she, ís, am, Live, Like, do, don't, can't, of, an, a, the e here são muito Ilwis
Coocorrências dessa palavra? frequentes do que palavras como drenched, thou, ain't, sibLings,brcHO/,
Que palavras ou tipos de palavras devemos
[oe, woe e fowL Faz parte da competência comunicativa do aprendiz nau
P
usar com essa palavra? usar frequentemente uma palavra de baixa frequência de ocorrência.
O professor precisa levar em consideração a frequência com que
Os aprendizes precisam saber que posições as palavras ocupam as palavras ocorrem na fala e na escrita, receptiva ou produtivamente,
dentro de uma oração. Essa posição pode ser considerada tanto do saber o que fazer no ensino dessas palavras. Palavras muito frequentes
ponto de vista sintático ou lexical quanto do ponto de vista da recep- devem ser ensinadas, e os livros didáticos já dão conta disso. Cabe ao
ção (R) ou da produção (P). Por exemplo, do ponto de vista sintático, professor decidir o que fazer com as palavras menos comuns.
os aprendizes brasileiros precisam saber que o verbo to discuss não é Além disso, os aprendizes precisam saber em que contextos as pa-
regido por nenhuma preposição. Eles costumam colocar a preposição lavras podem ser usadas, em que registros podem ser empregadas. Por
about após esse verbo por causa da influência do padrão gramatical de exemplo, but, however, nevertheLess e notwithstanding são conectores
discutir em português. Ou seja, para conhecerem os verbos, eles de- que expressam contraste e que não são intercambiáveis em quaisquer
vem saber não apenas o que significam, mas também os padrões gra- contextos de uso por conta dos seus diferentes graus de formalidade.
maticais em que ocorrem. Similarmente, a tot of é frequente e informal enquanto a great deaL aI
Do ponto de vista lexical, eles precisam conhecer as COOCORRÊN- é menos frequente e formal. Um último exemplo: os chamados phrasaL
CIAS, ou seja, saber que palavras podem vir acompanhadas de outras. verbs, compostos por um verbo e uma partícula são informais se com-
Por exemplo, muitos aprendizes brasileiros tendem a construir enuncia- parados a seus sinônimos formados por uma só palavra, como ocorr
dos com os nomes ice cream e soup como objetos do verbo take, influen- com to cut down on e to reduce. Conhecer o grau de formalidade dos
ciados pelas coocorrências tomar sorvete e tomar sopa em português, contextos em que as palavras são usadas é essencial não apenas para o
quando deveriam usar o verbo to eat: eat ice cream e eat soup. E para desenvolvimento da competência gramatical dos aprendizes - já que o

198 Aula de inglês: do planejamento à avaliação CAPíTULO 7 I o ensino do vocabulórlO lU!!


vocabuláriofazpartcdcssacomponcntcdacompelcnciacomunicaLiva-, UII\ (ksses r('11011W110S (' " SINONIMIA, s('lI\el hu n~'il ('111 n' Slgll 11i
mas também para o desenvolvimento da sua competência sociolin- c.lllos. Como não se trata (\e igualdade de significados, sinonímia P('I
guística. E aí fica bem claro por que conhecer uma palavra vai além de I't:it fi nao existe. O professor precisa não apenas alcrtar seus alunos
saber seu significado. .IlTH'a desse falo IinguísLico, mas também planejar a apresentação de
monirnos de maneira a não sobrecarregá-Ios cognitivamenlc. Se vai
D SIGNIFICADO DA PALAVRA:
.ipn-scntar o verbo to dose a aprendizes iniciantes, é interessante nao
''IlIl'sentar, na mesma aula, os vertos to shut e to sLam, pois o verbo to
R O que a palavra significa?
dose servirá de base para os alunos entenderem os outros dois verbos
Conceito
p Que palavra deve ser usada para expressar \' suas diferenças semânticas em relação a to dose. É necessário dar o
esse significado?
u-mpo de eles internalizarem esse verbo mais frequente para depois
SIGNIFICADO
Em que outras palavras essa palavra nos ''1)resentar-Ihes os sinônimos. Similarmente, os adjetivos open e aj(tr
R
faz pensar? SilO smônimos; não é boa ideia apresentá-los simultaneamente.
Associações
Que outras palavras podemos usar em vez Em níveis avançados, principalmente nas aulas de cursos prcpa
p
dessa palavra? I ntórios para exames de proficiência, é comum o professor apresem ar
grupos de sinônimos para discutir as diferenças semânticas entre eles.
Ao propor essas quatro perguntas sobre o significado das pala- Mas estamos falando de aprendizes com níveis de proficiência eleva
vras, Nation enfatiza a importância de os aprendizes saberem o signi- dos, com mais experiência no aprendizado de inglês, com um mak»
ficado lexical e de saberem que palavras podemos usar para expressar repertório de estratégias de aprendizagem, o que dá mais possibilidn
um significado e as associações que fazemos. Não basta ao aprendiz dcs ao professor de trabalhar com sinônimos. Por exemplo, ele pode
saber o que, por exemplo, dog significa: ele deve saber que o signifi- apresentar listas de sinônimos para os alunos testarem quais deles J:I
cado de dog está diretamente associado ao significado de bark e de conhecem e quais precisam aprender. Eis uma lista ilustrativa de séncs
puppy e indiretamente associado ao significado de pet. de sinônimos que servem para aulas com esse propósito:
Quando Nation pergunta: "Que outras palavras podemos usar
1. to cook / to fry / to boil / to bake / to roast / to flamb
em vez dessa palavra?", ele abre a discussão para a sinonímia e para
2. rain / storm / drizzle / tempest / hail / tornado / typhoon
a hiperonímia, dois fenômenos dos significados que permeiam os
3. home / house / apartment / flat / tent / motorhome / tepee /
usos linguísticos. Deixarei para comentar acerca da sinonímia e de
outros fenômenos semânticos na próxima seção. Por ora, quero ape- igloo
4. to walk / to run / to jog / to hike / to wade / to march / to tread
nas reforçar o fato de que conhecer uma palavra não se limita a
saber seu significado. 5. wet / humid /moist / soaked / damp / drenched
6. to hate / to dislike / to abhor / to loathe
7. anger / fury / ire / wrath / rage
7.3 Fenômenos semânticos e organização do vocabulário
As primeiras duas palavras de cada série têm ocorrência bem
Conhecer o significado das palavras é uma condição básica - e maior do que as outras. E é com o aumento do nível de proficiência do
até óbvia - para que os aprendizes de inglês ampliem seu vocabulário. aprendiz que essas palavras infrequentes começam a ser incorporadas
Entretanto, eles também precisam aprender as relações que os signi- a seu vocabulário,
ficados das palavras estabelecem entre si. Ou seja, precisam conhecer A ANTONÍMIA é outro fenômeno semântico com espaço na aula
os fenômenos semânticos. de inglês, embora seja muito menos frequente do que a sinonímia em

200 Aula de inglês: do planejamento à avaliação CAPíTULO 7 I o ensino do vocabutáuo 10


- -

CRIME
termos de uso como mecanismo de cocsao. Geralmente, quando o pro
loubo
fessor apresenta uma palavra que possui antônimo, tende a apresentá-Ia
juntamente com seu antônimo ao mesmo tempo. Por exemplo, em aulas
IIU 11

MURDER
- assassinato

homicídio culposo
sobre medidas, é comum o professor apresentar os seguintes pares: MANSLAUGHTER

BURGLARY
arrombamento
c big - small contrabando
SMUGGUNG
o wide - narrow
ROBBERY assalto
o tall - short
incêndio criminoso
o deep - shallow ARSON
sequestro (de pessoas e animais)
o thick - thin KIDNAPPING
sequestro de veículos
HIJACKING
Entretanto, isso pode não ser uma boa ideia. Quem nos alerta é apropriação indébita
LARCENY
Nation (1990: 46): alguns alunos podem fazer associações equivocadas, assassinato de pessoas públicas
ASSASSINATION
pois, ao ensinar um par de antônimos ao mesmo tempo, "o professor
FORGERY
falsificação
torna as palavras duas vezes mais difíceis de serem aprendidas". A lógi-
ca que permeia o pensamento de Nation é simples: os alunos precisam Howard Jackson e Etienne Zé Amvela (2000) comentam: há dois
aprender e reter na memória não apenas o significado de cada uma das Iipos de relações hierárquicas entre significados lexicais. Uma delas'
palavras, mas também a relação entre seus significados. E a coisa fica " hiperonímia: o hiperônimo é hierarquicamente superior a seus hipô-
ainda mais complicada se o professor usar, por exemplo, a mesma ima- nimos por seu significado fazer parte do significado dos hipônimos, ou
gem para apresentar um par de antônimos porque a imagem é associada seja, é uma relação "tipo de" que se instaura entre os hipônimos e o hi-
aos dois significados ao mesmo tempo. É um alerta importante, não é? perônimo, conforme acabamos de ver. O segundo tipo de relação hie-
Outro fenômeno semântico que precisa ser abordado em sala de rárquica entre significados é a MERONÍMIA, que é uma relação "parte
aula é a HIPERONÍMIA (e, por extensão, a HIPONÍMIA). OS hiperô- de". Por exemplo, a palavra car possui merônimos como estes: trunk,
nimos podem funcionar como elementos coesivos por serem palavras hood, bumper, doar, fender, steering wheel, tyre e windshield. Observe-
que possuem um significado geral contido no significado de outras pa- -se a relação "parte de" aí: trunk é uma parte de car, assim como win-
lavras, seus hipônimos, que estabelecem com o hiperônimo uma rela-
dshield é uma parte de caro
ção "tipo de". Por exemplo, oak, elm, sycamore e giant sequoia são tipos A meronímia também é um critério interessante para os apren-
de tree, ou seja, essas quatro palavras são hipônimas de tree. dizes organizarem seu vocabulário, e o professor pode sugerir a seus
A hiperonímia se apresenta como um critério muito simples e alunos organizarem as palavras que representam partes de algo. Eis
eficaz para os alunos organizarem o vocabulário à medida que vão um exemplo, baseado em Jackson e Zé Amvela (2000: 103),de organiza-
aprendendo hiperônimos. O professor pode lhes sugerir que, a cada
ção do vocabulário referente às partes de plant:
hiperônimo que aprendam, o anotem em uma folha do caderno e re-
PLANT
servem essa página para irem acrescentando hipônimos. Nessa pági-
na, eles podem colocar informações sobre cada palavra, e.g., signifi-
cado, coocorrência, grau de formalidade, pronúncia. Eis um exemplo
de como essa organização seria feita da maneira mais simples, ou seja, FLOWER
LEAF BUD STEM
apenas com a palavra e seu significado, por um aprendiz de proficiên- (botão) (talo)
(flor)
(folha)
cia mais elevada:
CAPíTULO 7 1 O ensino do vocabulário o
02 Aula de inglês: do planejamento à avaliação
A organizaçao do vocabulário é uma estrall'gia de aprcndíza
gem importante para a construção da competência comunicaLiva dos
aprendizes. E ela não se limita à organização de acordo com hipero-
nímia ou meronímia. Por exemplo, eles podem organizar palavras que
têm pronúncias parecidas ou iguais, como estas:
D

D
son
some
o scene

o horse
-
-
-
-
sun
sum
seen
hoarse
o ensino da gramática
right - rite - write

,
D

D root - route
o knows - nos e
As palavras acima são exemplos de outro fenômeno semântico em
que duas ou mais palavras possuem a mesma pronúncia e/ou a mesma
grafia: a HOMONÍMIA. Vale a pena o professor alertar seus alunos acer-
(2; )
ramática: palavra que causa arrepios em
muitos alunos. Que professor nunca ouviu
um aluno dizer algo do tipo "Grammar is so
boring!"? E, por causa da suposta chatice da gnllnú
ca desse fenômeno para eles não utilizarem palavras incorretamente. tica, ainda dizem coisas como estas: "I hate grmn-
Os aprendizes podem escolher quaisquer critérios que tenham mar!". Mas... será que a gramática é chata mesmo'}
lógica organizacional, que passe por uma categorização que faça sen- Ou será que a suposta chatice da gramática não pus
tido para eles. Podem categorizar as palavras que vão registrar em seu sa de um mito? Deixemos Larsen-Freeman (2003: 21)
caderno a partir das classes gramaticais, e.g., prepositions e irregular responder: "Agramática nunca é chata. O que ped i
verbs, dos tipos de palavras quanto à sua natureza contável, e.g., count mos aos alunos para fazer a fim de aprendê-Ia é que
nouns e uncount nouns, do grau de formalidade; e.g., idioms e slang pode ser chato".
expressions. O importante é que organizem o vocabulário e consultem Pois é. A gramática não tem culpa nenhuma no
seu caderno de tempos em tempos para fixarem as palavras. cartório. Lembremo-nos da mesma lengalenga que
No próximo capítulo, trato de outra área de ensino fundamental ocorre nas aulas de português: a maioria arrasadora
para o desenvolvimento da competência comunicativa dos aprendizes: dos estudantes brasileiros detesta gramática. Tam-
a gramática. bém pudera: a maioria dos professores enche o saco
dos alunos com a memorização de uma nomencla-
tura gramatical inconsistente e com regras norma
tivas questionáveis, muitas vezes alheias à realidade
linguística deles. O professor é que precisa prestar
atenção às atividades sobre gramática que leva à sala
de aula para que seus alunos não as considerem cha
tas e para que não acabem transferindo para a gra
mática o tédio das atividades propostas pelo profcs
sor e pelo livro didático.

204 Aula de inglês: do planejamento à avaliação


CAPiTULO 8 I o ensino da gramál1cII
~já que estou falando aqui de um mito, permita-me abordar lima defendeu o nào cnslno da gram~lLictl. O que houve foi <I
I 1lll\lllli(,lILiva

questão controversa que acabou desembocando em um mito: o profes- t:Ilt.lfH' dada por alguns teóricos, como Christopher Brurnfjt, à nucn
sor deve ensinar gramática ou não? ei;1 I~tn detrimento da precisão gramaLical, reação natural ao domínio
Se pensarmos na aquisição da primeira língua, é óbvio que não 1''''\ luLllralisLado método audiolingual até a década de 1950, que enfa-

pensaremos no ensino da gramática (e nem no ensino da fala). Como II/,;Ivaa precisão gramatical em detrimento da fluência. William Lit-
a criança é exposta à primeira língua 24 horas por dia todos os dias, 1ll'wood, por exemplo, um dos mais importantes proponentes da abor-
ela acaba desenvolvendo sua competência comunicativa nessa língua, t1,Ij.{em comunicativa, deixou claro o espaço que o ensino da gramática
a qual engloba, não nos esqueçamos, a competência gramatical. Aliás, possui nas aulas de línguas estrangeiras, um espaço materializado na-
foi com base nas características da aquisição da primeira língua que quilo que chamou de atividades pré-comunicativas dentro das quais as
Krashen propôs a abordagem natural, considerada por alguns teóricos ,1\ ividades estruturais se inserem.
Enfim, o não ensino da gramática nas aulas de inglês como língua
como um método que se encaixa no ensino comunicativo de línguas.
Esse método defende o não ensino da gramática ao advogar que basta ('strangeira não faz sentido. Os aprendizes podem se beneficiar de ex-
expor os aprendizes ao input linguístico que eles acabam adquirindo a plicações e práticas voltadas para determinados pontos gramaticais.
língua estrangeira. Por exemplo, o present perfect e a causative farm são estruturas gra-
O problema no raciocínio de Krashen é que ele perde de vista o maticais que costumam causar dificuldades aos aprendizes brasileiros.
fato de que a aquisição da primeira língua é diferente da aquisição de Logo, a intervenção do professor ao apresentá-Ias, esclarecer pontos
outra língua, principalmente se estivermos falando de uma língua es- que pareçam obscuros a seus alunos e oferecer-Ihes atividades para a
trangeira, como o inglês aprendido no Brasil, em vez de uma segunda prática desses pontos é bem-vinda.
língua, como o inglês aprendido na Inglaterra. Além disso, a proposta Portanto, é imprescindível ensinar gramática nas aulas de inglês
teórica de Krashen foi muito criticada por defender a diferença en- como língua estrangeira, pois seu ensino pode ser útil aos aprendi-
tre aquisição e aprendizagem sem ter explicitado essa diferença (para zes. As questões a que o professor deve responder são: para que seus
mim, não há nenhuma) e o tal do i + 1, que ninguém (nem Krashen!) alunos precisam aprender determinado elemento gramatical e quantas
sabe explicar direito o que é. Logo, a abordagem natural não é parâme- informações sobre esse elemento ele deve lhes fornecer?
tro para a discussão do ensino de gramática. Essas perguntas só podem ser respondidas adequadamente se
A questão de ensinar ou não gramática nas aulas de línguas es- esclarecermos que concepção de gramática é mais adequada para o
trangeiras é, na verdade, reflexo de um mito que tomou corpo com o ensino. Afinal, a concepção de gramática adotada pelo professor é fun-
advento da abordagem comunicativa - o mito segundo o qual esse damental para o norte que ele dará às aulas e aos tipos de atividade
método de ensino defende o não ensino formal da gramática em sala que desenvolverá com seus alunos.
Há diferentes concepções de gramática, cada uma com suas im-
de aula porque o aprendiz supostamente a aprende naturalmente.
Lembro-me de alguns professores em um centro binacional em que plicações teóricas e práticas, todas elas legítimas. Podemos conceber a
trabalhei justificando por que não explicavam pontos gramaticais aos gramática como um conjunto de estruturas e de regras que regem es-
seus alunos: "Grammar takes care af itself". sas estruturas. Contudo, essa não é uma concepção interessante para
Conforme já explicitei alhures (Oliveira, 2014), essa estória de o ensino de línguas estrangeiras, pois o professor que a adota acaba
que não se ensina gramática na abordagem comunicativa não passa focando apenas a forma, a estrutura dos elementos gramaticais. Por
de um mito. Parece até um fiat Iux gramatical: um belo dia, o apren- exemplo, ao dar uma aula voltada para o simpLe present, o professor
diz vai acordar iluminado, dominando as regras gramaticais todinhas. ensina aos alunos como formar orações afirmativas, negativas c in
Ora, nenhum, absolutamente nenhum, dos proponentes da abordagem terrogativas, mas não lhes informa que as situações atemporais SUO

CAPiTULO 8 I O ensino da gramlltlc


06 Aula de inglês: do planejamento à avaliação
xpressas apenas por esse tempo verbal, que curiosamente nao cx 11', ('ll'l\)el1Losgramaticais qut' lhcs ensina. Toda vez que o professor
pressa situações que ocorrem no momento presente, a não ser quando ,...•\ivt'1 planejando uma aula em que precise ensinar determinado ele
se trata dos chamados stative verbs, como to see e to hear. Podemos uu-nto gramatical, deve se perguntar: "Qual o uso que se faz desse el
também conceber a gramática como um conjunto de estruturas e de 111I'I1LO'? Que significado esse elemento veicula?". O professor não deve
regras que as regem e que é usado por sujeitos no estabelecimento da I' limitar à forma do elemento gramatical.

interação social. Logo, a partir dessa concepção, o professor não ape- Assim, a partir de uma perspectiva pragmática, apresento, neste
nas dá foco às formas linguísticas, mas também aos significados que ("pílulo, uma forma pedagogicamente fecunda de conceber a gramá-
elas expressam em diferentes situações de usos da língua. \ l(,lI, proposta por Celce-Murcia e Larsen-Freeman. Aproveito para co-

Não por acaso, teóricos como Thornbury e Larsen-Freeman de- montar uma questão pedagógica importante: o escopo que o professor
fendem a gramática como ferramenta para a produção de significados. Iirccísa estabelecer para o ensino de determinado elemento gramati-
Para Thornbury (1999: 4), a implicação dessa ideia para os professores ('aI. Em seguida, comento os erros gramaticais cometidos pelos apren-
"é que a atenção do aprendiz precisa ser direcionada não apenas para dizes a partir do problema do conhecimento inerte e do conceito de
as formas da língua, mas também para os significados que elas veicu- Interlíngua. Finalmente, discuto a questão do uso da língua portuguesa
lam". Larsen-Freeman dá um exemplo que evidencia essa ideia: 110ensino da gramática da língua inglesa e o papel da metalinguagem
Se um aluno diz It's a pencil on the table, com a intenção de veicular o
no processo de ensino e aprendizagem.
sentido There is a pencil on the table, eu diria que a forma está correta,
mas seu sentido não veicula o sentindo pretendido pelo aluno. A afirma- 8.1 The pie chart: a concepção tridimensional da gramática
ção com it é usada para mostrar identidade (It's a pencíl, not a pen, on
the table) enquanto a oração com there mostra a localização. A gramática Estudei num instituto de idiomas que adotava (e acho que ainda
não diz respeito apenas à forma: ela também diz respeito ao significado adota) o que chamavam de método audiovisual, que se constituía de uma
(Larsen-Freeman, 2003: 14). teoria estruturalista de língua e de uma teoria behaviorista de aprendi-
agem, materializadas em aulas que se baseavam em slides e, nos níveis
Esse exemplo não apenas corrobora as palavras de Thornbury,
mais avançados, em filmes também. Estudávamos a gramática da língua
mas também evidencia que não há como negar os aspectos semânticos
inglesa com foco na forma, na estrutura. Os significados dessas formas
relacionados à gramática. Algum teórico ou professor pode até ignorá-
e os usos que se fazem delas não eram foco das aulas. Nesse mesmo
-los, não negá-los.
instituto, iniciei minha carreira de professor de inglês em 1983. Logica-
A preocupação com os significados veiculados pelas estruturas
mente, eu ensinava gramática da mesma maneira que meus professores
gramaticais na interação social é um reflexo da virada pragmática, mo-
a ensinaram a mim, até porque o instituto era uma franquia, tínhamos
vimento epistemológico que tomou corpo nos anos 1960 e se consoli-
dou na década seguinte. Os adeptos desse movimento defendiam a in- de seguir rigidamente as diretrizes estabelecidas pelo dono.
clusão, nos estudos linguísticos, do sujeito usuário da língua, dos usos Provavelmente, após sair daquele instituto de idiomas, eu teria
que se fazem da língua e das variações linguísticas. A influência da vi- continuado a ensinar gramática focando apenas na forma se, um belo
rada pragmática no ensino de línguas estrangeiras foi exatamente dar- dia, não tivesse posto minhas mãos em um livro sobre gramática peda-
-lhe um viés pragmático: ensinam-se línguas estrangeiras para serem gógica escrito por Celce-Murcia e Larsen-Freeman: The Grammar Book.
usadas, para que as pessoas interajam socialmente com as outras, e não Já na introdução, as autoras anunciavam algo que me intrigou:
para que os aprendizes memorizem regras gramaticais e itens lexicais. "two approaches to teaching Language". Hum... Pensei com meus bo-
A consequência disso para o ensino da gramática é simples: o tões: "Quer dizer que tem mais de uma maneira de ensinar a língua ~,
professor precisa ajudar seus alunos a se tornarem capazes de usar consequentemente, a gramática?". Minha curiosidade foi aumentando.

08 Aula de inglês: do planejamento à avaliação


CAPíTULO 8 I O ensino da gramátic ou
Naquele pequeno trecho, aprendi que as aulas de gramática podem dar tl'lul('n'lll a dar foco tll>l'llílS b dimcnsuo formal, negligt'lu:itlIHlo í1S di
foco à forma ou aos usos que se fazem dessa forma. Eram ecos da vira- 11I('IlS()('S semântica e pragmática. O professor nao deve íocar CXCIIISI
da pragmática sobre a qual eu ainda não ouvira falar. v.uncntc a forma do elemento gramatical nem negligenciar seu uso ('
A introdução daquele livro continuou a me provocar. Aprendi que xr-u significado, se quiser ajudar seus alunos a desenvolverem a cornpc
existem diferentes formas de definir gramática. Descobri que pode- t r-nela comunicativa. Afinal, os professores precisam entender que os
mos pensar na gramática a partir de uma perspectiva tridimensional. I'Ivl11entos gramaticais vão além de suas formas. O segundo ponto é II
Foi então que vi o pie chart, o gráfíco-pizza que Celce-Murcia e Lar,:- rnzáo pela qual Celce-Murcia e Larsen-Freeman colocaram essas tn's
sen-Freeman (1999: 4) escolheram para ilustrar a concepção tridimen- perguntas no gráfico: para auxiliar o professor a refletir sobre cada
sional da gramática que estavam propondo. elemento gramatical que planejam ensinar. O terceiro ponto é a difi
culdade que o professor pode ter para lidar com esse gráfico. Deixarei
THE PIE CHART
para comentar esse ponto no final desta seção.
As perguntas contidas no gráfico são ferramentas que o profcs
sor tem à disposição para pensar qual das dimensões dos elementos
MEANING gramaticais que ensina pode ser mais desafiadora para seus alunos,
What does it mean?
sem desconsiderar a importância das outras. É isso que diz o PRINCÍ
(Meaningfulness)
FORM PIO DO DESAFIO, conforme Larsen-Freeman (2003: 45). As setas ('0111
How is it
formed?
pontas duplas estão presentes no gráfico exatamente para indicar '1"('
(Accuracy)
USE
uma dimensão está estreitamente à outra.
When / Why is
it used? É importante lembrar que, com qualquer elemento da língua, todas ilS
(Approppriateness) três dimensões da língua estão presentes. É impossível separar a forma
do significado e do uso. Entretanto, por razões pedagógicas, é possível
focar a atenção dos alunos em uma dessas três dimensões (Larsen-Frcc
man, 2003: 45).

o que esse gráfico nos diz é que os elementos gramaticais po- Se você for apresentar a seus alunos os pronomes possessivos,
dem ser concebidos a partir de três perspectivas diferentes, ou seja, a que dimensão será a mais complicada para eles? Lembremo-nos do
partir de três dimensões. A DIMENSÃO FORMAL, representada pela quadro de pronomes:
fatia FORM do gráfico, diz respeito à precisão gramatical e responde à
SUBJECT OBJECT POSSESSIVE POSSESSIVE REFLEXIVE
pergunta: "Como esse elemento gramatical é formado?". A DIMENSÃO
PRONOUNS PRONOUNS ADJECTIVES PRONOUNS PRONOUNS
SEMÂNTICA, representada pela fatia MEANING do gráfico, refere-se ao
I me my mine mysetf
significado expresso pelo elemento gramatical e, obviamente, respon- you you your yours yourself
de à pergunta: "O que esse elemento gramatical significa?". A DIMEN- she her her hers herself
SÃO PRAGMÁTICA, representada pelo fatia USE do gráfico, diz respeito he him his his himself
à adequação contextual do elemento gramatical e responde à pergun- it it its 0 itself
ta: "Quando e por que esse elemento gramatical é usado?". we us our ours ourselves

Há três pontos a observar acerca da natureza tridimensional da you you your yours yourself
-
gramática. O primeiro é o fato de tradicionalmente os professores they them their theirs themselves

I1

210 Aula de inglês: do planejamento à avaliação CAPíTULO 8 I O ensino da gramétic 11


11,,11
s aprendizes brasileiros já cstao Iamiliarizados com o conceito I hat lian is walk IIlS lowly. l think leg is hurt. (its / his)
de pronome e com a ideia de que alguns pronomes expressam rela- 4. Jane hurt I when she was hiking yesterday. (her /
ções de posse. Além disso, os aprendizes já estão familiarizados com hers)
os adjetivos possessivos quando eles Ihes são apresentados. Por isso, o 5. Bill's English teacher is terrible. is great. (Our / Ours)
significado e o uso dos pronomes possessivos não são, em si, grandes 6. The teacher told the children to open books. (their /
problemas, embora sejam obviamente tão importantes quanto a for- theirs)
ma. O principal desafio que os pronomes possessivos apresentam aos 7. 1'11park car on the street (my - mine) so you can
aprendizes brasileiros é sua forma. leave in the garage. (your/ yours)
Em português, os adjetivos possessivos e os pronomes possessi-
vos possuem exatamente a mesma forma. Por exemplo, em "Meu livro Se o maior desafio dos pronomes possessivos para os aprendizes
é azul. O dela é vermelho." e "O livro dela é vermelho e o meu é azul.", brasileiros reside na dimensão formal, a voz passiva vai concentrar a
meu está funcionando como determinante e o meu, como pronome. E atenção dos aprendizes muito mais na dimensão pragmática. Insisto:
eles possuem exatamente a mesma forma, havendo apenas a inserção as três dimensões são importantes. Mas o que dificulta a vida desses
do artigo definido na função de pronome. aprendizes é saber quando usar a voz passiva.
Entretanto, as formas pronominais possessivas em inglês não são A dificuldade sentida pelos aprendizes brasileiros no uso da voz
tão simples assim. Apenas a 3a pessoa singular masculina possui duas passiva tem uma origem claramente localizada: o ensino da voz passi-
formas iguais: his e his. Para dificultar as coisas, não existe um pronome va nas aulas de português. Conforme já expliquei em outro livro (Oli-
possessivo para a 3a pessoa singular neutra correspondente ao adjetivo veira, 2010), os professores tradicionalmente ensinam aos alunos qu
possessivo its. Daí a presença do símbolo 0 no quadro de pronomes. A a voz passiva é uma transformação da voz ativa, o que é equivocado.
forma pronominal its só pode funcionar como determinante, conforme Até Noam Chomsky, para quem essa transformação foi tão importan-
explicam Celce-Murcia e Larsen-Freeman (1999: 323): "Para todos os te para a construção da sua teoria padrão, desistiu da ideia de que as
propósitos práticos, os pronomes possessivos its e one's não existem". orações na voz passiva sejam transformações impostas a orações na
Assim, muitos aprendizes brasileiros começam a misturar as for- voz ativa: ele entendeu que elas são estruturas verbais independentes,
mas my e mine, her e hers, your e yours, our e ours, e their e theirs logo embora exista semelhança semântica no nível proposicional entre a
após Ihes serem apresentados os pronomes possessivos. Eles levam um maioria das orações ativas e das suas orações passivas semanticamen-
tempo para se acostumarem com essas formas, com a ideia de inexis- te correspondentes. E como ele chegou a esse entendimento? Ao se
tência do pronome its e para distinguirem os adjetivos possessivos dos deparar com orações na voz ativa que não possuem correspondentes
pronomes possessivos. Por essa razão, é aconselhável que o professor passivas. Consideremos as orações a seguir:
prepare atividades sobre pronomes possessivos e adjetivos possessi-
1. Ali the students in this c/ass speak two languages.
vos para os alunos se familiarizem com eles. Algumas dessas atividades
2. Two languages are spaken by ali the students in this ciess.
podem ter o formato tradicional do preenchimento de lacunas, como a
apresentada a seguir. Elas possuem significados proposicionais totalmente diferentes.
Em 1, todos os alunos da turma falam duas línguas. Não sabemos que
Choose a possessive adjective or a possessive pronoun to fill línguas são essas, mas sabemos que cada um deles fala duas línguas, que
in the blanks. podem ser diferentes ou não. Já em 2, duas línguas específicas, X e Y,
1. Jean's bicycle is red. is blue. (My / Mine) são faladas por todos os alunos da turma. Pode haver alunos que falem
2. Mom, do you know where keys are? (my / mine) três, quatro ou cinco línguas, mas duas dessas línguas necessariament

12 Aula de inglês: do planejamento à avaliação CAPiTULO 8 I o ensino da gramátlc 13


são X e Y e todos eles as falam. E como regras gramaticais que se pre- de que () signiflcado da voz passiva em inglês é o mesmo que o ela voz
am não podem ter exceções, concluiu Chomsky que a voz ativa e a vo passiva em português. E precisam ser informados acerca do seu uso:
passiva são estruturas verbais independentes uma da outra. quando e por que se usa a voz passiva em vez da voz ativa?
O resultado pedagógico dessa visão equivocada da voz passiva é Evidenciando esse desafio, Larsen-Freeman (2003: 46) dá um
que os professores torram a paciência dos alunos com as inutilidades exemplo interessante:
de transformação de orações passivas em ativas e vice-versa. Além dis-
so, professores de português tendem a não ensinar aos alunos quando [00'] which is the better way to complete this mini-text, with the
se usa a voz passiva, já que nenhum falante normal do português bra- active voice (a) or passive voice (b)?
sileiro usa a voz passiva na oralidade. Pense em você, leitora ou leitor, Some of the Olympic athletes from the smaller countries, such
usando a língua portuguesa: qual das orações a seguir você usaria para as Korea and Romania, were truly remarkable. In fact,
1. the Romanians won three gold medals in gymnastics.
expressar a informação acerca de algo que aconteceu com a janela da
2. three gold medals in gymnastics were won by the Romanians.
sala da diretora da instituição em que você ensina ou estuda?

3. O vidro da janela da sala da diretora foi quebrado. Esse tipo de exercício é interessante para levar os aprendizes a
4. O vidro da janela da sala da diretora quebrou-se. pensarem sobre a razão para se usar a voz ativa ou a voz passiva. Nesse
5. Quebraram o vidro da janela da sala da diretora. caso, a alternativa adequada é a primeira porque o texto claramente
6. O vidro da janela da sala da diretora quebrou. está dando foco ao agente (the Romanians) e não ao paciente (three
goLd medaLs). Larsen-Freeman (2003: 47) explica que se o texto desse
A não ser que esteja numa situação extremamente formal ou que foco às medalhas de ouro, a história seria diferente:
tenha algum problema espiritual, você jamais dirá 3 ou 4. Os brasilei-
ros, na absoluta maioria das vezes, usam o tal sujeito indeterminado de Many medals were awarded to athletes from smaller countries.
5 ou a construção ergativa de 6 para expressar passividade'. In fact,
Enfim, o professor de português tradicionalmente não explica aos 1. the Romanians won three gold medals in gymnastics.
alunos quando se usa a voz passiva. Ele geralmente explica seu signifi- 2. three gold medals in gymnastics were won by the Romanians.
cado, que é a mudança de foco do agente para o paciente de uma ação.
Agora, é a alternativa B que completa adequadamente o trecho em
Mas ele não costuma falar nem do uso da voz passiva nem dos gêneros
questão: o foco recai sobre medaLs.
textuais que favorecem sua ocorrência. Em outras palavras, a dimen-
A dimensão pragmática da voz passiva, portanto, é a que vai apre-
são formal e a dimensão semântica da voz passiva são contempladas no
sentar mais desafios para os aprendizes. Apenas a título de curiosidade, já
ensino de português, mas a dimensão pragmática é negligenciada. Por
que o objetivo desta seção não é tratar das especificidades dos elementos
essa razão, os aprendizes brasileiros de inglês levam o reflexo dessa
gramaticais discutidos, apresento as principais razões pelas quais a voz
negligência para o estudo da voz passiva na língua inglesa.
passiva é usada, seguindo Ce1ce-Murcia e Larsen-Freeman (1999: 353).
É claro que as três dimensões devem ser apresentadas aos apren-
RAZÃO 1: o agente é redundante, óbvio ou fácil de ser inferido. No
dizes. Eles precisam se acostumar com a forma da voz passiva: a cons-
exemplo a seguir, inferimos facilmente que quem cultiva as bananas
trução com o verbo to be ou com o verbo to get como auxiliar e do par-
são os agricultores.
ticípio passado de um verbo transitivo. Eles precisam ser informados
BANANAS ARE GROWN in tropical regions where the avera-
Se você quiser saber mais sobre a questão da passividade em português, recomen- ge temperature is 80°F (27°C) and the yearly rainfall is between
do a leitura da seção 6.2 do livro Coisas que todo professor de português precisa saber: a
teoria na prática (Oliveira, 2010). 78 and 98 inches.

14 Aula de inglês: do planejamento à avaliação CAPiTULO 8 I O ensino da gramétic


1111 voz pnssiva e dl' l'xpll(,:1I :lW! uluuo» que o agente (. prcccdklo 1)('1:1
RAZÃO 2: o agente é desconhecido, como no exemplo a seguir.
jll cposiçao by e que, se o "gellte for someone, somebody ou people, de

BANK OF THE WEST GOT ROBBED on July 16,2014. V('IllOSomitir o agente e a preposição. Eu estava fazendo tudo errado,
pois, além de a transformação de orações na voz ativa para orações na
RAZÃO 3: o falante ou o escritor quer ser cuidadoso com as pala- V()~passiva ser reflexo de um entendimento equivocado da natureza
vras, como no exemplo abaixo, em que uma pessoa envia uma pergun- sintática das vozes verbais, a maioria das orações na voz passiva nao
ta para uma coluna de aconselhamento jurídico, tentando não criticar possui agente. Logo, eu não apenas deveria parar de usar exercícios
(mas criticando) um amigo personaL trainer que lhe deu sugestões so- de transformação desse tipo, como deveria explicar aos alunos quando
bre dieta e exercícios, a fim de saber se pode processar o amigo. H(' insere o agente e não quando se omite o agente. E devemos inserir

() agente nas orações na voz passiva quando ele é muito importante


I WAS GIVEN BAD ADVICE about fitness and nutrition. What para ser omitido (e.g., The Sistine Chapel was painted by MicheLangeLo
can 1do? fl('tween 1508 and 1512)ou quando ele é inesperado (e.g., This book was
Illritten by a 12-year-oLd Indian girL).
RAZÃO 4: o falante quer ser evasivo, como no exemplo a se- Pois é. Há muitas informações sobre a voz passiva que o professor
guir, em que uma funcionária de uma empresa, durante uma reu- precisa saber: quando usar o verbo to get no lugar do verbo to be como
nião, criticou um erro no orçamento sem citar o nome do colega que auxiliar; que verbos só podem ser usados na voz passiva; que verbos
o cometeu. nunca podem ser usados na voz passiva; como se forma a voz passiva
complexa; como se estrutura o sintagma verbal quando o verbo é bi
I AN ERROR WAS MADE in the budget. I transitivo. Contudo, o fato de o professor precisar ter muitas informa
Aliás, encontrei
na internet- um comentário sobre o uso da frase ções não quer dizer que ele deva compartilhar com seus alunos todas
Mistakes were made, semelhante ao uso da frase An errar was ma de r-Ias ou muitas informações numa mesma aula ou num mesmo serncs
nesse exemplo: t re letivo. O professor há de se preocupar com aquilo que chamo d"
'SCOPO DA APRESENTAÇÃO, ou seja, quanto deve informar a seus
"Mistakes were rnade" is an expression that is commonly used
alunos sobre determinado elemento gramatical. E isso deve ser pensa-
as a rhetorical device, whereby a speaker acknowledges that
do no momento do planejamento da aula.
a situation was handled poorly or inappropriately but seeks to Por exemplo, imagine que você introduzirá o present perfect
evade any direct admission or accusation of responsibility by para seus alunos. Esse elemento gramatical apresenta desafios nas
not specifying the person who made the mistakes. Irês dimensões por uma razão simples: não existe, em toda a língua
Em todos esses exemplos, o agente não aparece. Notou? Isso se portuguesa, um tempo verbal similar. Os significados expressos pelo
deve ao fato de a grande maioria das orações na voz passiva não pos- present perfect são expressos, em português, pelo pretérito perfeito
suir agente, conforme pesquisas comentadas por Ce1ce-Murcia e Lar- do indicativo, pelo presente do indicativo e pela locução verbal cons-
sen-Freeman (1999). Iruída com o auxiliar ter no presente do indicativo e o particípio pas-
Lembro-me de quando comecei a ensinar inglês e tinha de ensinar sado do verbo principal.
a voz passiva seguindo o livro didático do instituto de idiomas: eu tinha Que informações sobre o present perfect o professor precisa ter.
de apresentar a transformação das orações na voz ativa para orações quadro abaixo apresenta algumas informações importantes sobr
esse elemento gramatical agrupadas de acordo com cada dimensão do

Disponível em: <http://sussle.orgjtjMistakes_were_made>; acesso: 23 jun. 2015.


pie chart.

CAPiTULO 8 I O ensino da graml1l1clI


216 Aula de inglês: do planejamento à avaliação
-
(a) O present perfect é formado pelo auxiliar to have no simple Na verdade. t{li', osu uturas sao incomuns, mas não impossivr-i
present e do particípio passado de um verbo regular ou ir
regular. (embora os aprendizes devam evitá-Ias). Aqui estão algun
(b) O verbo auxiliar inverte posições com o sujeito nas orações exemplos reais retirados de transmissões de TV, artigos de jor
interrogativas diretas.
nais, anúncios publicitários, cartas e conversas.
(c) A negativa é formada com a colocação da partícula not
após o verbo auxiliar.
France has detonated a Hiroshima-sized nuclear bomb on Mu
FORMA ruroa Atol! in the South Pacific at 17.02 GMT on Wednesday.
(d) Pode ocorrer a contração da forma has do verbo auxiliar
com qualquer elemento que ocupe a posição de sujeito. Police have arrested more than 900 suspected drugs traffickers
(e) Pode ocorrer a contração da forma have do verbo auxiliar
in raids throughout the country on Friday and Saturday.
com o elemento que ocupar a posição de sujeito se ele for I,
you, we ou they. ... a runner who's beaten Linford Christie earlier this year.
(f) A 24-year-old soldier has been killed in a road accident while
Uma expressão adverbial de tempo concluído pode ocorrer
em uma oração com o present perfect, embora essa ocor- on patrol last night.
rência seja rara.
A lot of the drivers wil! be thinking about the circuit, because
SIGNIFICADO Como o aspecto perfeito em inglês significa "antes de", present we've had some rain earlier today.
perfect significa "antes do momento presente".
The borse's trainer has had a winner here yesterday.
O present perfect expressa uma ação realizada ou uma situa-
ção ocorrida antes do momento presente com resultados no Swan dá mais alguns exemplos, mas esses bastam para ilustrar'
momento presente que fazem o falante olhar para o passado sua explicação. Fica evidente: não procede a informação dada pelas
apoiando-se nesses resultados presentes.
gramáticas e professores sobre não usar uma expressão adverbial d('
USO O present perfect expressa uma ação que começou a ser reali-
tempo concluído do ponto de vista teórico e do ponto de vista de ocor-
zada ou uma situação que começou a ocorrer antes do momen-
to presente que continuam no momento presente. A presença rências reais da língua inglesa. Entretanto, do ponto de vista pedagÓgi
de for ou de since na oração é necessária para indicar esse uso. co, essa informação é válida, pois reduz o escopo da aula sobre a forma
O present perfect expressa uma ação que acabou de acontecer.
do present perfect e evita confusão na cabeça dos alunos. O professo I
A presença de just na oração é necessária para indicar esse uso.
não precisa contar tudo. Precisa contar apenas o necessário e de ma
neira didática. Talvez seja pedagogicamente mais sensato nunca dar
É uma quantidade razoável de informações. Só que o professor aos alunos a sexta informação sobre a forma. Que eles descubram isso
não deve apresentar todas elas aos alunos numa mesma aula ou num estudando gramática avançada algum dia na vida, estudo improvável
mesmo semestre. Eles precisam de tempo para se acostumar com a para a maioria.
forma do present perfect, embora ela não seja muito desafiadora. A ex- Quanto à dimensão semântica, o significado do present perfect (,
ceção fica por conta da sexta informação a respeito da forma porque desafiador para os aprendizes. Afinal, muitos deles ficam com uma in
muitos professores de inglês e gramáticas pedagógicas dizem a seus terrogação na cabeça: "Como é que um tempo verbal que tem a palavra
alunos que não se usam expressões adverbiais de tempo concluído, present no nome se refere a algo que aconteceu no passado?". Pergunta
como, por exemplo, Last month ou Wednesday. Swan (1995: 422-423) es- procedente, não é? Lewis (1986: 76) esclarece esse ponto: "A coisa mais
clarece essa questão: importante acerca do present perfect, ou presente retrospectivo, é que
ele é uma forma do presente. Está essencialmente ancorado no AGORA
As gramáticas geralmente dizem que os tempos verbais do
do tempo, o momento da fala". O aposto usado por Lewis é interessam
present perfect não podem ser usados com expressões de tem-
mente intuitivo: "presente retrospectivo". É como se, ao usarmos o prr
po concluído - podemos dizer I have seen him ou I saw him
sent perfect, ficássemos de pé sobre o tempo AGORA e olhássemos para ()
yesterday, mas não podemos dizer I have seen him yesterday.
passado por causa dos seus efeitos que observamos agora no presente.

218 Aula de inglês: do planejamento à avaliação


CAPiTULO 8 I o ensino da grOlo(1I11.1I
Os alunos precisarão se acostumar ao significado do present perJect
Michael Halliday une as duas dimensões e que, portanto, eu estaria em
para se acostumarem a seus usos, pois há uma relação muito estreita
hoa companhia se o fizesse. Entretanto, defendeu a separação das duas
entre o significado e os usos do present perfect. Por isso, eles precisam
dimensões porque elas, principalmente a dimensão pragmática, costu-
de tempo, muito tempo, para se acostumarem a seus diferentes usos,
mam ser ignoradas pelos professores.
principalmente o primeiro, pois o simple past também expressa uma
Então, me recomendou a leitura de um de seus livros, From Gram-
ação realizada ou uma situação ocorrida antes do momento presente.
mar to Grammaring. Nessa obra, Larsen-Freeman (2003) reproduz a
Eu costumava dar um exemplo simples para meus alunos perceberem a
onversa que teve com um professor chamado Ed, que também sente
diferença entre esses dois tempos verbais. Colocava os dois grupos de
dificuldade para separar as duas dimensões e que lhe pergunta por que
sentenças a seguir no quadro e fazia o comentário que os segue:
é importante distingui-Ias se são difíceis de serem distinguidas. Ela faz
1. Not Hawaii. I was there last year. um comentário a esse respeito que transcrevo in extenso:
2. Not Hawaii. I've been there.
Tenho de admitir desconforto com a pergunta de Ed. Preciso me afastar
Imagine that Mary, Oale and Sally are planning a trip. They're mentalmente da minha tendência analítica e do meu treinamento linguís-
trying to decide where to go. Mary suggests that they go to Ha- tico para perguntar se faz sentido ou não distinguir significado de uso.
waii. But Sally doesn't want to go there and explains why. Which Muitos tratamentos dados à língua não fazem essa distinção. Realmente,
sentence is more appropriate for her to use in this situation? já é lugar-comum ouvir falar de oposições binárias, forma-significado e
forma-função, mas não da oposição terciária que estou fazendo. Contu-
A alternativa mais adequada é a 2. E explicava: a oração no simple
do, parece-me inadequado dizer que o que os aprendizes têm de aprender
past veicula apenas um fato ocorrido antes do presente, enquanto a
é conectar a forma ao significado porque eles também têm de aprender
oração no present perfect expressa um fato que ocorreu antes do mo-
quando usar essa conexão forma-significado. Além disso, às vezes, linguís-
mento presente e que tem efeitos importantes para esse momento: o tas falam de significado pragmático, apontando que o significado não pode
resultado de Sally ter ido ao Havaí no ano passado é que ela já conhece ser determinado separadamente do seu contexto de uso. Embora isso pos-
o Havaí e esse conhecimento se reflete na discussão presente acerca sa ser verdadeiro, acho que os aprendizes precisam aprender o significado
do destino que ela e seus amigos estão escolhendo. das unidades linguísticas que transcendem o contexto. Contudo, tenho de
Depois de um tempo, com os alunos acostumados à forma, o sig- me perguntar: apenas porque eu consigo fazer a distinção das três dimen-
nificado e o primeiro uso do present perfect, o professor pode planejar sões, o esforço é realmente válido? (Larsen-Freeman, 2003: 42).
uma aula para apresentar o segundo uso. Tempos depois, apresenta o
É muito legal perceber a preocupação pedagógica de Larsen-
terceiro. O escopo da apresentação, repito, deve ser levado em consi-
-Freeman ao ler suas ponderações. No frigir desses ovos, fui conven-
deração na hora de o professor planejar aulas de gramática.
cido por suas palavras. O professor de inglês precisa fazer um esforço
Você já deve ter observado que a distinção entre a dimensão se-
para distinguir a dimensão semântica da dimensão pragmática. Mas se
mântica e a dimensão pragmática não é simples. Pelo menos para mim
determinado elemento gramatical tornar essa tarefa muito difícil, ele
não é. Por essa razão, há alguns anos, enviei um e-mail para a pro-
pode momentaneamente esquecer essa distinção e focar a atenção na
fessora Larsen-Freeman comentando minha dificuldade de distinguir
dimensão pragmática, pois isso lhe garantirá que estará ajudando seus
essas duas dimensões no momento de planejar as aulas sobre deter-
alunos a aprenderem a usar o elemento em questão.
minados elementos gramaticais. Perguntei-lhe se essa distinção era
Creio que consegui deixar claro o que é a concepção tridimensio-
mesmo necessária e se não seria mais prático unirmos as duas em uma
nal da gramática proposta por Celce-Murcia e Larsen-Freeman. Passo
única dimensão semântico-pragmática. Ela admitiu que distinguir uma
agora à próxima seção, na qual discuto uma questão importante para o
dimensão da outra é realmente difícil às vezes. Inclusive me disse que
ensino da gramática: os erros cometidos pelos aprendizes.

220 Aula de inglês: do planejamento à avaliação


CAPíTULO 8 I O ensino da gramática
8.2 O problema do conhecimento inerte e a interlíngua .rplk-am", E acrescenta: "Os alunos podem lembrar-se das regras gr;l
na discussão sobre os erros dos aprendizes uraticals quando sao solicitados a fazê-lo, mas não as utilizarão espon-
I nncarnente na comunicação, mesmo quando elas forem relevantes".
Vez por outra, quando estava numa sala dos professores de um
Conhecimento inerte: aí está a causa da frustração de muitos pro-
instituto de idiomas em que trabalhei, ouvia um ou outro colega se
k-ssores por seus alunos não colocarem o S da 3a pessoa singular das
queixando de seus alunos do nível mais avançado do curso básico por
lorrnas verbais afirmativas no simple present quando estão engajados em
eles não colocarem o S da 3a pessoa singular nas formas afirmativas
lima atividade comunicativa, voltada para o desenvolvimento da fluência.
dos verbos no simple present quando estavam engajados numa ativi-:
E o que o professor pode fazer para ajudar seus alunos a trans-
dade de fala. Alguns colegas chegavam a dizer que alguns alunos já
formarem conhecimento inerte em conhecimento ativo? Em uma en-
haviam atingido um estado de fossilização no que diz respeito a essa
Irevista concedida a Maria Carmen Pérez-Llantada (2007: 158), Larsen-
estrutura gramatical. Outros reclamavam porque já haviam apresen-
Freeman aponta um caminho possível ao comentar que os métodos
tado aos seus alunos do nível iniciante o verbo can e realizado vários
comunicativos "colocam os alunos para usar a língua desde o começo
exercícios sobre esse verbo e, mesmo assim, alguns deles ainda esta-
em vez de fazê-los aprender sobre a língua com a esperança de que,
vam usando o auxiliar do para fazer perguntas com cano
mais tarde, possam aplicar o conhecimento das regras de maneira ati-
Reclamações e queixas desse tipo não apenas explicitam a frus-
va". O corolário disso é óbvio: em vez de o professor focar exclusivamen-
tração de professores, mas também deixam transparecer, nas entreli-
nhas, duas questões importantes. te na forma dos elementos gramaticais, fazendo com que seus alunos
realizem apenas exercícios estruturais, ele deve oferecer-lhes também
A primeira é aquilo que Alfred North Whitehead chamou de PRO-
atividades em que tenham de usar esses elementos. Ou seja, o professor
BLEMA DO CONHECIMENTO INERTE. Nathalie Cote explica o que é:
deve adotar uma perspectiva pragmática no ensino da gramática.
Em muitas situações em que se espera que o aprendizado ocorra, os alu- Isso implica que o professor tem de contemplar tanto as atividades
nos deixam de armazenar novas informações na memória de uma manei- voltadas para a precisão gramatical quanto para a fluência. Nas ativi-
ra tal que elas fiquem acessíveis ou que sejam úteis. Eles podem até ser dades de fluência, se o professor notar, por exemplo, que alguns alunos
capazes de regurgitar a informação em exames, mas, quando solicitados estão sempre "comendo" o S da 3a pessoa singular do simple present,
a raciocinar ou a resolver problemas em que fatos e procedimentos que ele pode mostrar ao aluno três dedos para indicar que se trata da 3a
acabaram de adquirir poderiam ser úteis, não conseguem usar ativamen-
pessoa e que ele deve acrescentar o S ao verbo. Essa correção sistemá-
te seu conhecimento. Ou seja, a informação que adquiriram está inerte
(Cote, 1994:3). tica ajuda os alunos a se acostumarem com o monitoramento da fala.
Obviamente, os aprendizes desempenham papel importante no
Whitehead estava pensando no aprendizado em geral quando processo de tornar ativo seu conhecimento inerte. Uma forma de faze-
propôs o problema do conhecimento inerte. Enoch Hale (2013), di- rem isso é estudando fora da sala de aula. É por essa razão que o pro-
retor do Institute for Critica I and Integrated Thinking, por exemplo, fessor precisa ajudar seus alunos a se conscientizarem da importância
baseou-se no problema do conhecimento inerte para discutir as difi- de realizarem as atividades extraclasse: elas aumentam o tempo de ex-
culdades de estudantes de geografia de utilizarem as informações que posição à língua. Isso também contribui para os alunos desenvolverem
recebem nas aulas. Larsen-Freeman (2003: 8) também lança mão do a capacidade de automonitoramento.
problema do conhecimento inerte para descrever o que acontece com A questão dos erros cometidos pelos aprendizes de línguas es-
os aprendizes de inglês que, por exemplo, não conseguem colocar o S trangeiras não está circunscrita à discussão do problema do conhe-
a
da 3 pessoa singular nas formas verbais no simple present: "[...] mesmo cimento inerte. Ela passa inevitavelmente pela discussão da segunda
que os alunos entendam a regra explícita, eles não necessariamente a questão que sussurra nas entrelinhas das reclamações dos professores.

222 Aula de inglês: do planejamento à avaliação


CAPiTULO 8 I o ensino da gramática
Refiro-me ao conceito de INTERLÍNGUA, que, segundo Rod Ellis, foi 11I11!llin~uístico, associado a IIll1;' 111\('1 fcrencia provocada especifica
criado por Larry Selinker em 1972 para se referir: Ilu'nlc pela primeira língua do aprendiz. O outro é o erro intralinguís
tu-o, cometido por aprendizes de línguas estrangeiras independente-
[...] ao conhecimento sistemático de uma segunda língua, o qual é ind
nu-ntc de qual seja sua primeira língua.
pendente tanto da primeira língua do aprendiz quanto da língua-alvo.
comentário de Larsen-Freeman e Long levanta algumas ques-
termo passou a ser usado com significados diferentes, mas relacionados:
t oes. Primeira: como o professor brasileiro pode saber se os erros co-
(a) para se referir à série de sistemas interconectados que caracterizam
mcudos por seus alunos se devem à interferência do português ou se
a aquisição;
'l:IO universais? Segunda: essa interferência é inevitável? Terceira: co-
(b) para se referir ao sistema observado num único estágio de desenvol-
vimento (i.e. "uma interlíngua"); meter erros é algo ruim?
(c) para se referir a combinações específicas da língua-mãe com a lín- Responder à primeira questão é muito difícil, pois ou precisaría-
gua-alvo [00'] (Ellis, 1991:299). mos realizar uma pesquisa com aprendizes de várias nacionalidades
para comparar seus erros com os dos aprendizes brasileiros, algo fora
Os aprendizes brasileiros de inglês podem criar uma forma de lín- de nossa realidade, ou precisaríamos ter acesso a alguma pesquisa
gua que não é nem português nem inglês, mas que se baseia nessas realizada que envolva também aprendizes brasileiros. Não conheço ne-
duas línguas. Essa forma de língua é a interlíngua. O professor precisa nhuma, o que não quer dizer que não haja alguma.
ter consciência disso para diminuir o sentimento de frustração se, por A resposta à segunda questão é afirmativa: a interferência da pri-
exemplo, alguns de seus alunos construírem orações interrogativas meira língua na aprendizagem da língua estrangeira é inevitável. Os
com o verbo do auxiliando o verbo modal cano Talvez esse seja um es- aprendizes, que já desenvolveram totalmente ou mesmo razoavelmente
tágio da sua interlíngua a ser superado após algum tempo de estudos e sua competência comunicativa em português, consciente ou incons-
de exposição à língua inglesa. iientemente recorrem a seus conhecimentos fonológicos, sintáticos
Por que os aprendizes criam uma interlíngua? Há uma ordem semânticos para realizarem enunciados em inglês. Os teóricos cha-
fixa para a aquisição de inglês por aprendizes brasileiros? Será que mam isso de transferência linguística, que acaba por provocar interfe-
a interlíngua é resultante de uma predisposição mental ou genética rências na pronúncia, na construção gramatical e no uso das palavras.
vinculada a algo como a gramática universal? Quando observamos Por exemplo, a letra E no final de palavras tende a não ser pronun-
crianças brasileiras aprendendo português, ficamos com pulgas atrás ciado na língua inglesa, à exceção de poucas palavras como she, he, we,
da orelha: por que todas elas, independentemente de classe social, me, catastrophe e recipe e de palavras com dois EE no final, e.g., coffee
cor da pele e origem geográfica passam pelos mesmos estágios de e committee. Contudo, muitos brasileiros a pronunciam por causa de
aquisição da língua? Por exemplo, todas elas produzem estruturas uma clara influência das regras fonológícas do português brasileiro.
que fogem totalmente às regras sintáticas do português como "eu Em termos sintáticos, um exemplo é o apagamento dos auxiliares
sabo", "eu faz i", "espera eu" e "eu vou ir". Essas questões são impor- do e did na formação de perguntas. Isso ocorre exatamente porque a
tantes, mas fogem ao escopo deste livro e requerem muito tempo e língua portuguesa não possui um verbo com essa função. Assim, em
muitos recursos para serem respondidas por meio de pesquisas cui- vez de Did you go to the movies yesterday?, há alunos que dizem You
dadosamente realizadas. went to the movies yesterday? Note que essa construção sem o auxiliar
Após analisarem os resultados de algumas pesquisas sobre a aqui- é possível de ocorrer em inglês, especialmente quando o falante repe-
sição de línguas estrangeiras, Larsen-Freeman e Michael Long (1997) te o que seu interlocutor falou por conta de algum estranhamento ou
comentam que há dois tipos de erros cometidos pelos aprendizes de por outra razão, o que não é o caso dos aprendizes em questão. Outro
línguas estrangeiras relacionados à interlíngua. Um deles é o erro exemplo de erro sintático provocado por transferência linguística é a

224 Aula de inglês: do planejamento à avaliação CAPíTULO 8 I o ensino da gramática 225


junção de preposições a verbos que em inglês não sao regidos por prc cI('sscs termos. Imagino que nao. Portanto, vou usar a grana em ingles
posições (e.g., tike of, discuss about). .rqui. A diferença entre eles, segundo Ellis (1997: 17), é a seguinte: "OS
Um exemplo de interferência no nível semântico é o de um apren- ,'I rors refletem lacunas em um conhecimento do aprendiz; eles ocorrem
diz que estava em um nível avançado. Durante uma conversa, ele usou porque o aprendiz não sabe o que é correto. Os mistakes refletem lapsos
a palavra candle para se referir ao tecido ou à lona colocada em barcos ocasionais no desempenho; eles ocorrem porque, em uma situação es-
movimentados pelo vento - a palavra que ele deveria ter usado para pecífica, o aprendiz é incapaz de colocar em uso o que ele ou ela sabe".
expressar esse significado é saiL O que o confundiu é o fato de tanto Às vezes, é fácil sabermos se erros cometidos por um aluno são
candle quanto sai! serem equivalentes a vela e vela, duas palavras ho- ('rrors ou mistakes. Uma forma de saber isso é verificar se ele comete
mônimas em português. um erro uma vez e usa a forma correta em seguida. Por exemplo, ima-
De acordo com Ellis (1991: 48), há alguns processos que operam gine que ele esteja falando sobre o que fez no último final de semana e
para a criação de uma interlíngua. Dentre eles, além da transferência produza estes enunciados:
linguística, está a supergeneralização das regras da língua estrangeira.
Saturday evening I went to the movies with some friends. After
Um exemplo dessa supergeneralização é o uso do auxiliar do em orações
that, we go to a bar on Sunset Boulevard. On Sunday morning
interrogativas diretas com o verbo modal can: há aprendizes brasileiros
I went to the beach with Dale. It was crowded.
que dizem Do you can play the guitar? em vez de Can you play the guitar?
Quanto à terceira questão provocada pelo comentário de Larsen- Percebemos que o aluno sabe que a forma do sírnple past do verbo
-Freeman e Long (i.e. "cometer erros é algo ruim?"), a resposta óbvia seria to go é went porque ele o usa duas vezes. Portanto, ele comete um mis-
"sim", correto? Que professor vai desejar que seus alunos cometam erros? take ao usar a forma go em vez de went.
Contudo, de novo, a obviedade pode nos enganar, pois é possível enxer- Agora imaginemos que esse aluno produza os seguintes enun-
gar algo de positivo nos erros cometidos pelos aprendizes. E essa possi- ciados errando consistentemente o simple past do verbo to go:
bilidade nos é dada se adotarmos uma concepção construtivista de erro.
Saturday evening I go to the movies with some friends. After
Seguindo essa concepção, o professor vê os erros dos seus alunos
that, we go to a bar on Sunset Boulevard. On Sunday morning
como evidências do seu processo de aprendizagem, do processo de
I go to the beach with Dale. It was crowded.
construção de conhecimentos linguísticos, e essas evidências podem
ser positivas. Voltemos ao exemplo do uso do auxiliar do em pergun- Poderíamos concluir, a partir desses enunciados, que ele não sabe
tas que envolvem o modal can: podemos enxergar algo positivo aí em qual é o simple past do verbo to go e que, assim, ele cometeu um errar?
termos do processo de aprendizagem? Sim. Podemos ver algo muito Ainda não. Teríamos de lançar mão de um artifício para ter certeza
positivo: o fato de eles já terem assimilado uma importante função sin- disso: solicitar ao aluno que corrija o erro. Se ele conseguir, sabere-
tática do verbo auxiliar do, a qual é exatamente construir perguntas mos que cometeu um mistake e estaremos diante de um caso provável
diretas. Esse erro também diz ao professor que seus alunos ainda não do problema do conhecimento inerte. Se ele não conseguir, saberemos
entenderam a autossuficiência sintática do modal can, que não precisa que cometeu um errar.
de verbos que o auxiliem na formação das orações em que se encon- O problema é que as coisas não são tão simples assim quando se
tram. Logo, ele precisará planejar aulas para que eles apreendam essa trata de distinguir errors de mistakes. Ellis (1997: 17-18)explica isso: "Os
informação sintática sobre o modal cano aprendizes podem usar consistentemente um elemento como o passa-
Uma questão importante acerca dos erros cometidos pelos apren- do em alguns contextos e consistentemente falhar em usá-lo em ou-
dizes é a diferença do que se chama em inglês de errar e de mistake. tros contextos. No fim das contas, uma distinção clara entre um errar
Desconheço se há termos consagrados em português para cada um e um mistake pode não ser possível".

226 Aula de inglês: do planejamento à avaliação CAPíTULO 8 I o ensino da gramálic


o papel do professor no desenvolvimento da competência grama "Errar uma V('Z (. luuuuno. Errar duas vezes é burrice." Esse é o
tical dos seus alunos é importante. Entretanto, o maior papel é desem- dito popular, que faz scnudo em algumas situações de nossas vidas.
penhado pelos próprios alunos, pois o domínio das estruturas grama- Mas nenhum sentido se estivermos falando das situações de aprendi-
ticais depende do seu empenho em estudar fora da sala de aula, do seu zagern em que nos inserimos. Errar é parte inevitável do processo de
interesse em desenvolver seu nível de proficiência. Afinal, há aprendi- aprendizagem. E o professor precisa entender isso e aprender a inter-
zes que chegam a um nível de proficiência que lhes permite ler textos pretar os erros cometidos por seus alunos. Só assim poderá ajudá-los
acadêmicos ou se comunicar satisfatoriamente em viagens turísticas, a superar os erros.
ficam satisfeitos com esse nível e não têm intenção de aprender mais Na próxima seção, discuto duas questões importantes para o en-
do que o que já sabem. Nesse caso, não adianta o professor tentar aju- sino de gramática: o uso do português e o papel da metalinguagem na
dar o aluno a melhorar sua precisão gramatical. aprendizagem.
Quando o aprendiz acha que não precisa aprender mais do que
aquilo que já sabe; quando está satisfeito com os enunciados que pro-
8.3 Duas questões importantes:
duz, mesmo em desacordo com as regras gramaticais; quando até de-
o uso de português e o domínio da meta linguagem
seja produzir enunciados gramaticalmente corretos, mas não conse-
gue, independentemente do que ele e seus professores façam, podemos O uso de português nas aulas de inglês é polêmico. De um lado,
pensar que ele está passando pelo processo de FOSSILIZAÇÃO. Segun- há professores que assumem uma posição injustificavelmente radical
do Ellis (1991: 299), Selinker "observou que a maioria dos aprendizes de de total rejeição ao uso da língua portuguesa nas suas aulas. De outro
línguas estrangeiras falham em atingir a competência na língua-alvo. lado, há professores que assumem uma posição mais racional, demons-
Ou seja, eles param de aprender quando seu sistema de regras interna-
trando consciência de que seus alunos precisam ser expostos à língua
lizado contém regras diferentes daquelas da língua-alvo". É a isso que
inglesa o máximo de tempo possível e, mesmo assim, veem a impor-
Selinker chamou de fossilização.
tância estratégica do uso ocasional da língua portuguesa para darem
A fossilização faz com que formas gramaticais incorretas se ins-
instruções aos alunos no nível inicial e para explicarem determinados
talem no sistema de conhecimentos do aprendiz de uma maneira tão
elementos gramaticais.
forte que dificilmente são corrigidas, fazendo com que o aprendizado
Há uma prática comum a quase todos - se não a todos - os
cesse temporária ou definitivamente. Conforme esclarece Ellis, apesar
aprendizes brasileiros: a tradução de palavras e orações para o portu-
da dificuldade de serem corrigi das:
guês. O curioso é que muitos professores resistem a essa prática como
As estruturas fossilizadas podem, contudo, não ser persistentes. De vez em se fosse algo ruim. Ora, é mais do que normal que os aprendizes nos
quando, o aprendiz pode ser bem-sucedido na produção da forma línguís- níveis iniciais recorram ao sistema da língua que já dominam, no caso
tica correta, mas quando está focado no significado - especialmente se o o sistema do português brasileiro, para elaborar e testar hipóteses so-
assunto for difícil -, escorrega de volta para a interlíngua (Ellis, 1991: 48).
bre a língua estrangeira que estão aprendendo. Até os professores cos-
É difícil afirmar, com segurança, que um aluno atingiu a fossili- tumam buscar traduções de algumas palavras para se certificarem de
zação. Ele precisaria ser exposto à língua inglesa por mais tempo, e o que entenderam seus significados. À medida que o aprendiz avança em
professor precisaria investigar se alguma intervenção altera a produ- proficiência, recorre à tradução com menos frequência porque já co-
ção linguística dele. Sugiro que o professor não se apresse a rotular meça a pensar em inglês. Por isso, o professor de inglês não pode des-
de fossilizada a produção gramatical de seus alunos, pois, além de ser cartar a tradução e o uso do português de maneira radical e sem um
difícil afirmar isso com segurança, tal afirmação não adianta nada em mínimo de consideração pedagógica. Vejamos dois elementos grama
termos práticos, não ajuda o aluno a superar esse estágio. ticais que justificam o uso da língua portuguesa na sua apresentação.

228 Aula de inglês: do planejamento à avaliação CAPíTULO 8 I o ensino da grOll1ólicu


Um deles é o present perfecL Muitos aprendizes brasileiros tcn djuda muito os <lpl('IHli:,CH:1 SI: üuulllartzurcm com os sigllilk<ldos do
dem a traduzir equivocadamente muitas orações nesse tempo verbal. fi resen t TJerfeCL
O quadro abaixo ilustra isso: Um segundo exemplo da importância do uso de português em <l1I-
Ias de gramática é o ensino do verbo moda! would. A dificuldade que
ORAÇÕES NO PRESENT PERFECT TRADUÇÃO PROVÁVEL FEITA esse verbo apresenta para os aprendizes brasileiros é o fato de ele S(,I'
POR APRENDIZES BRASILEIROS
-svazíado de significado lexical. Afinal, o que would significa? Podemos
(a) I have met Jennifer Lawrence. pensar no significado que veicula como verbo auxiliar, mas não podemos
Eu tenho conhecido Jennifer
Lawrence pensar em um significado da palavra would. É um caso semelhante ao
(b) Mary's has worked as a secretary. Mary tem trabalhado como auxiliar ir em português, em construções como Eu vou estudar amanha:
secretária. a forma verbal vou expressa a ideia de futuro, mas não possui significado
(c) Dale's lived in Montreal for 25 years. Dale tem vivido em Montréal há 25
lexical, diferentemente do que vemos em Eu vou à praia amanhã.
anos. O professor precisa passar essa informação sobre would para seus
(d) Penny's often visited Omaha since
alunos e ilustrá-Ia com exemplos como estes:
Penny tem visitado Omaha
2010. frequentemente desde 2010.
ORAÇÕES COM WOULD EQUIVALENTES EM PORTUGU~S

As únicas orações que estão traduzidas satisfatoriamente são a (c) Mary would be on the beach now if Mary estaria na praia agora se ela
e a (d), embora a tradução mais apropriada para elas fosse aquela em she could. pudesse.

que o tempo verbal é o presente do indicativo. -


l'd resign from that job if I were you. Eu pediria demissão se fosse você.
É pedagogicamente recomendável que o professor mostre aos -
alunos quais tempos verbais em português veiculam os mesmos sig- Se o professor comparar as orações que contêm toould com ora
nificados que o present perfect. Assim, ele precisa mostrar-lhes que ções no futuro do pretérito, o entendimento do significado expresso
as orações em que o present perfect é usado sem as preposições for por would ficará mais simples para seus alunos.
nem since (explícitas ou subentendidas) cor respondem a orações em Enfim, não há por que o professor resistir a usar pontualmente
português construídas com o pretérito perfeito do indicativo. É o a língua portuguesa nas aulas de gramática. A não ser, repito, que e!
caso das orações (a) e (b) do quadro anterior, as quais correspondem, seja radical no que diz respeito ao espaço ocupado pela primeira língua
respectivamente, a Eu conheci Jennifer Lawrence e Mary trabalhou nas aulas de línguas estrangeiras.
como enfermeira. O professor precisa informar aos seus alunos que Antes de finalizar este capítulo, preciso tocar em uma questão
as orações no present perfect que contêm for ou since correspondem, breve, mas importante: o papel que a metalinguagem desempenha no
em português, às orações no presente do indicativo que contêm ex- ensino de inglês. Lembremo-nos de que metalinguagem é a linguagem
pressões adverbiais temporais com por ou há. É o caso das orações usada para se falar da própria linguagem. Termos como verb, verb ten-
(c) e (d) do quadro anterior, embora sejam aceitas as construções em se, subject-verb agreement, modifier e artide são parte da metalingua-
português ali apresentadas, com a locução formada pelo presente gem da língua inglesa. A pergunta que materializa essa questão é esta:
do indicativo do verbo ter e o particípio passado do verbo principal. os aprendizes precisam dominar a metalinguagem?
Construções com essas locuções são mais adequadas para traduzirem Talvez você esteja tentado a responder com um "não" bem grande.
orações no present perfect progressive. Uma pessoa realmente não precisa conhecer os termos do parágrafo
A tradução das orações no present perfect é essencial para con- anterior e mais outros termos metalinguísticos para ser uma usuária
trastar esse tempo verbal com construções verbais em português. Isso da língua inglesa. Aliás, o exemplo máximo disso é um estadunidensc

30 Aula de inglês: do planejamento à avaliação CAPíTULO 8 I o ensino da gramá!i :l


quai» os nomes dos (lrordl's l'IHIlIillllO Im',1 lima l>e(;:I de B<ldvll Powoll.
analfabeto: ele não sabe o que é subject, verb ou reLative cLause, mas os
Ele atingiu o quarto estágio: ('slÚ inconscienlemente compeLenle.
utiliza eficientemente para formar enunciados quando conversa com
O objetivo ideal da aprendizagem é levar o aprendiz a se tornar
outras pessoas.
inconscientemente competente. No caso da aprendizagem de inglês
Entretanto, pensemos com cuidado. O desenvolvimento da compe-
'orno língua estrangeira, ele usa os elementos gramaticais de maneira
tência comunicativa dos aprendizes brasileiros não se limita ao desen-
adequada e fluente, tanto na fala quanto na escrita, sem precisar se
volvimento da fala e da compreensão oral: ela passa também pelas habi-
lidades de leitura e de escrita. Importante micro-habilidade de escrita é lembrar da metalinguagem.
Espero que este capítulo tenha contribuído para suas reflexões
a revisão textual. Ora, para que os aprendizes a desenvolvam e se tornem
sobre o ensino da gramática. Daremos atenção agora a um elemento
capazes de revisar seus próprios textos, ele precisará dominar a meta-
linguagem para entender as explicações do professor acerca da concor- importantíssimo na vida do professor de inglês: a avaliação.
dância, da fragmentação sentencial, da quebra de paralelismo sintático e
semântico, do uso indevido dos tempos verbais etc. Uma evidência dessa
necessidade é a lista de símbolos para revisão textual que apresentei no
sexto capítulo e que é usada por muitos professores de inglês.
Agora, deixemos claro que o domínio da metalinguagem é necessá-
rio apenas durante o período em que o aprendiz está desenvolvendo sua
micro-habilidade de revisão textual. Depois disso, ele não precisará dela:
ele precisará usar adequadamente os elementos gramaticais rotulados
pela metalinguagem sem nem se lembrarem de que os estão usando.
Conforme discuto em outro lugar (Oliveira, 2010), podemos pen-
sar em quatro estágios de aprendizagem:
(1)incompetência inconsciente;
(2) incompetência consciente;
(3) competência consciente;
(4) competência inconsciente.
Imaginemos que uma pessoa, digamos, Zé, esteja aprendendo a to-
car violão. Se ele estiver no estágio 1, seu aprendizado demorará muito
para decolar porque não tem consciência do que não sabe. Se ele entrar
em um curso, o professor lhe apresentará, aos poucos, o que ele pre-
cisa aprender. Ele, então, terá consciência do que não sabe - estágio
2 - e, com a ajuda do professor, escolherá as melhores estratégias para
aprender. Com o passar do tempo, ele aprende os acordes naturais e os
dissonantes. Fica tão feliz que mostra para sua mãe o que já sabe. Ele
se encontra no estágio 3. Mas Zé quer ser músico profissional e decide
estudar violão oito horas por dia todos os dias. E se torna um grande
violonista, conseguindo se apresentar no palco principal do Teatro Cas-
tro Alves, em Salvador. Durante o show, Zé toca e nem se lembra mais

CAPíTULO 8 I o ensino da gramlltlcH 3:\


232 Aula de inglês: do planejamento à avaliação
Avaliação do aprendizado
e do ensino
~
N
o início dos anos 2000, tive uma turma de
." nível intermediário composta por adoles-
centes na faixa dos 14 anos. Era uma turma
relativamente homogênea - a exceção era uma alu-
na que tinha muita dificuldade para responder a per-
guntas básicas e elaborar enunciados simples, o que
a fazia nunca tomar a iniciativa de falar algo. Inicial-
mente pensei que ela fosse uma aluna recém-ingressa
no curso e equivocadamente nivelada. Mas descobri
que ela fazia parte daquele grupo há três semestres.
Procurei informações sobre seu desempenho oral nos
dois semestres anteriores e descobri que ela recebe-
ra notas altas (9,0 e 9,5). Conversei com duas de suas
professoras anteriores, e elas me explicaram que ha-
viam designado uma apresentação oral como instru-
mento de avaliação e que a aluna se saiu muito bem,
embora admitissem que ela era uma aluna com muitas
dificuldades para se expressar oralmente.
Esse episódio diz respeito a uma questão im-
portante na vida do professor de inglês: a avaliação.
Grosso modo, avaliar algo significa coletar informa-
ções sobre esse objeto e interpretar as informações
para conhecer o estado desse objeto. A coleta das
informações pode ser feita por meio de instrumen-
tos como o teste escrito, o teste oral, a observação, a

CAPíTULO 9 I Avaliação do aprendizado e do ansmo 13~


(d) ela p0(\l' 1'l<'illl1l'nLese Lransformar em um recital de um texto
apresentação oral, o projeto didático, o diário, a monografia, o resumo,
memori;l,<ldo, possibilidade decorrente da segunda razão.
a resenha, o artigo e o ensaio. Os objetos da avaliação podem ser a
No episódio em questão, a aluna, adolescente de 14 anos, muito
aprendizagem do aluno, o ensino do professor, o livro didático, o curso
de um modo geral e a instituição. A avaliação pode ter propósitos va- provavelmente decorou um texto e o recitou na sala.
riados: o nivelamento de alunos recém-ingressos no curso; a certifica- Contudo, a escolha inadequada das professoras resulta de uma
ção de aprendizes mediante comprovação de sua proficiência para ele dificuldade que todos os professores de inglês enfrentam: como ava-
poder, por exemplo, participar de cursos de graduação e de pós-gra- liar o desempenho oral? A verdade é que avaliar o desempenho oral
duação em universidades no exterior; o diagnóstico do desempenho dos alunos é uma questão realmente muito difícil de ser resolvida. E
bimestral ou semestral dos alunos para que eles possam ser aprovados essas duas professoras não são as únicas com essa dificuldade: todos
para estudarem o nível seguinte; a tomada de decisões instrumentais os professores de inglês a vivenciam. Comentarei a avaliação oral na
e institucionais. primeira seção.
Há instrumentos de coleta de informações que não costumam fa- Avaliar o desempenho dos alunos quanto à escrita parece, teori-
zer parte do universo de ensino e aprendizagem de inglês. É o caso da camente, menos complicado, não é? Afinal, temos um produto palpá-
monografia, do resumo, da resenha, da apresentação oral, do artigo e vel, observável em nossas mãos. Podemos analisar esse produto uma
do ensaio, que figuram constantemente na esfera acadêmica. Outros vez, duas vezes, três vezes. Mas, o que devemos levar em consideração
instrumentos fazem parte desse universo, mas não são frequentes, na hora de avaliar a aprendizagem da escrita? Devemos solicitar aos
como, por exemplo, o projeto didático, realizado em alguns colégios, e alunos que redijam um texto ou que respondam a questões de múlLi-
o diário, utilizado em cursos de escrita avançada. E há dois instrumen-
pia escolha?
tos de avaliação que são muito comuns nas salas de aula de inglês: o E o que dizer do ensino? Ele deve ser avaliado? Como isso deve ser
teste e a observação da aula. feito? Por que muitos professores não gostam de terem suas aulas ob-
Voltemos ao episódio que abre este capítulo. O instrumento de servadas por coordenadores ou por outros professores? A observação
coleta de informações escolhido pelas duas professoras para avaliarem
de aula é importante?
o desempenho oral dos seus alunos foi a apresentação oral. E a aluna Neste capítulo, concentrarei nossas atenções nas avaliações nas
com dificuldade "se saiu bem" na apresentação, o que fez as professo- quais o professor sempre está diretamente envolvido: a avaliação da
ras interpretarem seu desempenho oral como excelente. Claramente, aprendizagem e a avaliação do ensino. A avaliação do livro didático ge-
elas escolheram uma forma inadequada de avaliar o desempenho oral ralmente fica a cargo da coordenação acadêmica e apenas raramente
de seus alunos. Por que foi uma escolha inadequada? Exatamente por- envolve algum professor. Por isso, não a comentarei aqui. Tratarei dos
que a apresentação oral não é um instrumento de coleta de informa- instrumentos de coleta de informações mais comuns no universo de
ções recomendável para o universo de ensino e aprendizagem de inglês ensino e aprendizagem de inglês, i.e. o teste e a observação de aulas, e
por, pelo menos, quatro razões:
apenas incidentalmente comentarei algum outro instrumento de ava-
(a) ela requer um nível elevado de proficiência por conta do voca-
liação. A ideia é levar você a construir respostas para as perguntas dos
bulário e da fluência exigidos para uma fala que dura cerca de
três parágrafos anteriores. Para isso, apresentarei os princípios gerais
5 a 10 minutos;
para a elaboração de testes e, em seguida, os tipos de testes. Depois
(b) ela exige que o aluno tenha conhecimentos de determinado
discutirei a observação de aula, o instrumento por excelência de ava-
assunto;
liação do ensino, e finalizarei o capítulo discutindo duas questões im-
(c) ela requer competência para fazer apresentações orais em públi-
co, o que muitos brasileiros não possuem, mesmo em português; portantes relacionadas à avaliação.

CAPíTULO 9 I Avaliação do aprendizado e do ensino 3


236 Aula de inglês: do planejamento à avaliação
9.1 Princípios gerais para a elaboração de testes
Par" q(l(' un: t cstc Lenha validade de conteúdo, ele nao pode exigir
o que é um teste? Sandra Savignon (1997: 210) oferece uma res- dos alunos conhecimentos de conteúdos não trabalhados em sala ou
posta a essa pergunta: "Um teste é uma amostra de comportamento" não trabalhados suficientemente em sala ou que não fazem parte d
(grifos dela). Ela acrescenta: "Com base no rendimento observado ob- conteúdo que se espera que eles conheçam.
tido em um teste, inferências são feitas sobre a competência mais ge- A VALIDADE DE FACE diz respeito à aparência do teste: ele real-
ral subjacente que o indivíduo possui para realizar tarefas semelhantes mente parece testar aquilo que anuncia que vai testar? Ele parece um
ou relacionadas". Em outras palavras, o professor aplica um teste para teste legítimo para os alunos? Eles precisam responder a essa pergunta
saber se seus alunos, ao longo do bimestre ou do semestre, desenvol- afirmativamente ao olharem para o teste para que ele seja legitimado
veram habilidades suficientes para realizar, fora da sala de aula, tarefas como tal, do contrário seu desempenho no teste será negativamente
semelhantes às do teste. afetado. Brown (2004 apud Anyassari; Pudyastuti, 2014) explica que a
A definição proposta por Savígnon é simples e dá conta do recado. validade de face de um teste será elevada se os alunos encontrarem os
Entretanto, elaborar testes está longe de ser uma tarefa simples, e há seguintes elementos:
duas razões para isso. A primeira é o fato de precisarmos estar atentos (a) um formato esperado, bem construído, com tarefas às quais os
ao perfil dos nossos alunos para não elaborar testes inadequados. Por alunos estejam familiarizados;
exemplo, se temos uma turma de adolescentes, precisamos compor o (b) um teste claramente possível de ser feito dentro do tempo
teste com textos que não apenas apresentem um grau de dificuldade alocado;
linguística adequada, mas que também abordem temas relevantes para (c) itens claros e não complicados;
sua realidade. A segunda razão é a necessidade teórica e prática de (d) instruções claríssimas;
seguir os princípios gerais de elaboração de testes para garantir sua (e) tarefas relacionadas com o que eles fizeram nas aulas (valida-
eficácia como instrumentos de avaliação que obtêm uma amostra sig- de de conteúdo);
nificativa do comportamento dos alunos. (f) um grau de dificuldade que apresente um desafio razoável.
Muitos professores desconhecem esses princípios, o que pode Uma situação que pode levar à ausência de validade de face é
afetar negativamente a qualidade dos testes que elaboram. Por isso, aquela em que o teste traz atividades com as quais os alunos não es-
apresento-os a seguir.
tão familiarizados. Por exemplo, se o professor nunca designa reda-
O primeiro princípio é a VALIDADE, que descreve até que ponto o ções para os alunos redigirem e o teste traz uma redação, a validade de
teste realmente mensura aquilo que pretende mensurar. Há três tipos face fica comprometida. Outra situação é aquela em que os comandos
de validade. Vejamos cada um deles.
das diversas partes do teste são complicados. Isso afeta o desempenho
A VALIDADE DE CONTEÚDO, como o próprio nome anuncia, diz dos alunos. O pior é que há professores que, ao serem solicitados pelos
respeito ao conteúdo do teste, que deve se limitar ao que os alunos
alunos para lhes explicar os comandos, lhes dizem que a compreensão
estudaram ao longo do período coberto por ele. Brown esclarece esse
tipo de validade: dos comandos é parte da avaliação. Nada mais equivocado: os alunos
têm de realizar as atividades propostas; eles não têm de tentar enten-
Um teste de competência de tênis que pede à pessoa para correr 100 der comandos confusos ou complicados. Esse entendimento não faz
metros rasos não possui validade de conteúdo. Se você estiver tentando parte da avaliação. E o professor tem, sim, a obrigação de explicar os
avaliar a habilidade de uma pessoa para falar uma segunda língua em comandos das questões aos seus alunos.
uma situação conversacional, um teste que lhe pede para responder a A VALIDADE DE CONSTRUTO é a medida na qual o conteú-
questões de múltipla escolha que exigem julgamentos gramaticais não do do teste reflete o arcabouço teórico que sustenta as habilidades
atinge a validade de conteúdo (Brown, 1994: 255).
os conhecimentos avaliados. Brindley (2001: 140) nos apresenta uma

238 Aula de inglês: do planejamento à avaliação


CAPiTULO 9 I Avaliação do aprendizado e do onsino 3
pergunta importante feita por Bernard Spolsky, útil para situarmos a itens para iI (OIIlPI ('('11SÜO, mas, por causa de um barulho vindo do lado
validade de construto: "O que significa saber usar uma língua?". O pró- de fora da sal", alguns alunos não conseguiam ouvir a fita com cxat i
prio Brindley esclarece que, para responder a essa pergunta, precisa- dão". Nesse caso, a falta de condições físicas adequadas no ambiente
mos "descrever a natureza das habilidades que estão sendo avaliadas: em que o teste estava sendo realizado tornou o teste não confiável,
isso é conhecido como definição de construto. Assim, se estivermos pois não seria possível interpretar corretamente respostas incorretas
desenvolvendo um teste oral, precisamos ser capazes de especificar o de algum aluno: foi o aluno que teve dificuldades para compreender
que queremos dizer com 'habilidade de fala'", textos orais ou foi o ruído que o atrapalhou?
Dois exemplos bastam para ilustrar o esclarecimento de Brindley. Há um aspecto da confiabilidade que também é muito importante:
Por exemplo, no curso em que estudei inglês, que seguia a teoria es- a CONFIABILIDADEDO AVALIADOR.Às vezes, ouvimos alunos recla-
truturalista de língua como parte do que chamavam de método audio- mando por terem respondido a questões abertas de uma maneira mui-
visual, havia testes orais constituídos por perguntas e nós tínhamos de to semelhante à maneira que algum colega respondeu, tendo obtido
fornecer respostas completas, pois os criadores daquele método acre- uma pontuação bem mais baixa do que a do colega. Pode ser impli-
ditavam que saber dar respostas completas significava saber falar in- cância dos alunos, mas pode ser também uma falha na correção do
glês. Aquele teste era, na verdade, uma espécie de entrevista estrutu- professor, o que é muito provável se ele não houver estabelecido ante-
rada, que não nos dava a oportunidade de expandir a interação. A uma cipadamente critérios claros de correção. Se a pessoa corrige um teste
pergunta como Did you stay home Last Friday?, tínhamos de responder e lhe atribui determinada nota hoje e o corrige novamente dias depois
Yes, I stayed home Last Friday ou No, I didn't stay home Last Friday. Se lhe atribuindo a mesma nota ou uma nota próxima, então existe con-
respondêssemos Yesou Yes,I did ou No ou No, I didn't ou Nope ou Yeah, fiabilidade do avaliador.
perderíamos pontos no teste. Agora, se o curso em que você trabalha Nesse caso, como se trata de um avaliador só, podemos falar de
adota a abordagem comunicativa, você não deve criar um teste oral confiabilidade intra-avaliador. Mas há também o que se chama de con-
com perguntas às quais seus alunos devem dar respostas completas fiabilidade interavaliadores: ao avaliarem resultados de um mesmo tes-
porque, na comunicação real, essa exigência não existe, nem mesmo te, dois ou mais professores precisam chegar à mesma nota ou a notas
em entrevistas para se conseguir um visto ou em um interrogatório bem próximas para que o teste seja confiável em termos de critérios de
policial. Você pode preparar um teste oral que consiste de um role pLay correção. Os testes de múltipla escolha são totalmente confiáveis em
a ser realizado por uma dupla de alunos e analisar como eles realizam termos de confiabilidade interavaliadores: simplesmente não há como
as funções comunicativas exigidas por ele. haver diferenças nas correções porque existe um gabarito para ser se-
O segundo princípio geral de elaboração de testes é o que se cha- guido. São os testes com itens abertos que apresentam desafios a esse
ma, em inglês, de reLiabiLity, que eu escolhi traduzir como CONFIABI- tipo de confiabilidade.
LIDADEe que diz respeito à consistência dos resultados. Uma forma A PRATICALIDADEé o terceiro princípio geral de elaboração de
de verificar se o teste é confiável, se mensura consistentemente os co- testes e diz respeito aos fatores de ordem prática que interferem na
nhecimentos dos alunos é aplicá-lo mais de uma vez ao mesmo gru- realização dos testes. Não adianta o teste ser confiável e válido em ter-
po de alunos. Se os resultados forem semelhantes, o teste é confiável. mos de face, de conteúdo e de construto: ele também precisa ser práti-
Obviamente, há fatores que podem afetar essa verificação, tais como a co para o professor, para os alunos e para a instituição.
motivação, o estado emocional e a saúde dos alunos. Um fator importante para a praticalidade são os recursos finan-
Brown (1994:254) dá um exemplo de como a confiabilidade de um ceiros disponíveis para a elaboração do teste. No Brasil, as escolas par-
teste pode ser negativamente afetada: "Uma vez, presenciei a aplica- ticulares e os institutos de idioma não têm dificuldades quanto a isso,
ção de um teste de compreensão oral no qual um gravador reproduzia mas as escolas públicas, em sua maioria, sofrem e penam por conta

240 Aula de inglês: do planejamento à avaliação CAPiTULO 9 I Avaliação do aprendizado e do ensine L41
de sérias restrições orçamentárias. Muitas vezes, faltam Ihes cadeiras, ser bancado porque há recursos do Governo federal para isso. Se os
materiais didáticos, impressoras, papel e toner. Por isso, se o professor testes são de múltipla escolha, a correção é mais rápida c mais barata.
faz um teste com mais de uma folha para ser aplicado a cinco lurmas Vejamos outro exemplo de como a questão da aplicação do teste
com quarenta alunos, ele pode ouvir da coordenação que precisa re- afeta a praticalidade. Imagine que você trabalhe em um instituto d
duzir o tamanho do teste para ele caber em apenas uma folha, a fim de idiomas, no qual tem cinco turmas com 15 alunos cada. O que você
economizarem papel. acha de aplicar um teste oral nas suas turmas? Um teste que dure, em
Outro fator que afeta diretamente a praticalidade é o tempo dis- média, 5 minutos? Você teria de pensar na logística para isso: enquanto
ponível para a realização do teste e o tempo que ele exige para ser você fica na sala de aula com um aluno sendo testado, onde os outros
realizado. Testes longos demais interferem no desempenho dos alunos, ficarão? O que eles farão enquanto não são avaliados? O que farão de-
que podem se cansar e errar coisas que não errariam se estivessem pois de serem avaliados? Poderão ir para casa? Então, provavelment
descansados. Um teste para nivelar alunos recém-ingressados na ins- todos desejarão ser os primeiros a ser avaliados para poderem ir logo
tituição pode parecer demasiadamente longo para alguns alunos, sem para casa: como decidir quem ficará por último? Talvez você tenha um
o ser. Isso se explica pelo fato de um teste de nivelamento ter de ser o pouco de dificuldade para resolver essas questões, mas é possível re-
mesmo para todos os novos alunos e ter as perguntas organizadas em solvê-Ias. Contudo, imagine agora que você trabalha numa escola pú
ordem crescente de dificuldade. Alguns alunos são capazes de respon- blica, na qual você tem cinco turmas com 45 alunos em cada. E agora'?
der a todas as perguntas no tempo alocado por estarem em níveis mais Como seria aplicar o teste oral nesse contexto? Seria inviável por ra
avançados de proficiência; outros não conseguem responder a todas zões óbvias, não é?
elas no tempo alocado e acabam achando o teste longo ou o tempo Em suma, para elaborarmos testes, precisamos levar em consid
curto, o que dá no mesmo, por estarem em níveis de proficiência mais ração a validade de conteúdo, a validade de face, a validade de cons-
baixos. Isso é um aspecto positivo de um teste de nivelamento. truto, a confiabilidade e a praticalidade. Só assim poderemos almejar
Ainda em relação ao fator tempo, há um aspecto que deve ser le- sucesso na elaboração de testes.
vado em consideração na elaboração de um teste: o tempo que o pro- Antes de finalizar esta seção, gostaria de retomar o episódio com
fessor precisa para corrígí-lo. Não basta que o teste seja viável para os o qual abro o capítulo, aquele em que duas professoras escolheram a
alunos em termos de tempo: ele também deve ser viável para o pro- apresentação oral como instrumento de avaliação de alunos adoles-
fessor em termos de tempo de correção, principalmente se ele tiver centes de nível intermediário. Analisemos a apresentação oral com
muitas turmas. base nos três princípios gerais de elaboração de testes.
Um terceiro fator relevante para a praticalidade são os procedi- A validade de face da apresentação oral foi prejudicada porque os
mentos de aplicação e de correção do teste. E é por desconhecerem alunos não realizaram nenhuma apresentação oral além da que ser-
esse fator que muitas pessoas criticam os concursos públicos por utili- viu de instrumento de avaliação. Como não vi as apresentações dos
zarem testes de múltipla escolha. Essas pessoas dizem: "Testes de múl- alunos, não posso afirmar se a validade de conteúdo existiu ou não,
tipla escolha não provam nada. Melhor seria se trouxessem questões mas certamente houve apresentações que não serviram como amos-
discursivas", Só que há um sério problema de logística relacionado à tras do aprendizado do conteúdo abordado em sala ao longo do s<>-
correção dos testes: quantas pessoas seriam necessárias para corrigir mestre (refiro-me às funções comunicativas, elementos lexicais e ele-
várias questões discursivas de dezenas de milhares de candidatos? A mentos gramaticais estudados). Os alunos me informaram que faziam
correção da redação do ENEM [Exame Nacional do Ensino Médio], por a apresentação oral e que não havia uma seção de discussão sobre elas
exemplo, mobiliza um número enorme de corretores que precisam ser nem uma tarefa escrita sobre as apresentações. Logo, a validade d
treinados e coordenados para a tarefa. O custo é elevadíssimo e só pode construto não existiu, já que o objetivo do curso era ajudar os alunos

242 Aula de inglês: do planejamento à avaliação CAPiTULO 9 I Avaliação do aprendizado e do ensuio 74.
a desenvolverem sua competência comunicativa, a qual pressupõe a construto, runs, como ressalta Weir (1993: 55), "há um problema em po
interação entre os interlocutores. Se a apresentação cumpria proto- tencial com a condição de reciprocidade se um dos participantes domi
colarmente o papel de atribuir uma nota ao desempenho dos alunos nar a interação, já que o outro participante pode ter uma oportunidade
na apresentação oral sem envolver os colegas em uma interação sobre limitada para demonstrar seu potencial comunicativo". Se um aluno do-
a apresentação feita, a validade de construto não existiu. A apresenta- mina a interação, a avaliação do outro aluno fica comprometida.
ção oral seguiu o princípio da praticalidade, pois a turma era compos- Enfim, a avaliação oral é complexa e os instrumentos de coleta de
ta por apenas 10 alunos e o syllabus não era extenso, permitindo que informações sobre o rendimento oral dos alunos possuem vantagens
as apresentações fossem confortavelmente alocadas no planejamento e desvantagens. Cabe ao professor conversar com os colegas e com
das aulas. Quanto à confiabilidade, não tenho dados que me permitam a coordenação acadêmica de sua instituição para tomar as decisões
especular, com segurança, sobre a aderência ou não da apresentação mais adequadas.
oral em questão a esse princípio, nem do ponto de vista intra-avaliador Elaborar teste não é uma tarefa simples e exige do professor co-
nem do ponto de vista interavaliadores. nhecimentos teóricos mínimos. Além disso, fica claro que os instru-
Eu não recomendaria o uso da apresentação oral como instru- mentos de avaliação não são adequados para todos os contextos: h
mento de avaliação do desempenho oral de aprendizes que se encon- que se analisar cuidadosamente o contexto de ensino-aprendizagem
tram em um curso básico de inglês. Recomendaria o uso desse instru- para escolher o instrumento de avaliação adequado. Passo agora à pr
mento num curso especificamente voltado para o desenvolvimento da xima seção, na qual apresento alguns tipos de testes.
fala de alunos em níveis avançados de proficiência, pós-curso básico,
desde que o professor ensine os alunos a produzirem esse gênero tex-
9.2 Os tipos de testes
tual oral ao longo do curso.
Entretanto, enfatizo o lado positivo da escolha que as duas pro- O teste é, sem sombra de dúvidas, o instrumento de avaliação
fessoras fizeram para a avaliação oral: elas tentaram encontrar uma mais comum no universo de ensino e de aprendizagem de inglês. Por
solução para a eterna questão de saber como avaliar adequadamente essa razão, o professor precisa estar familiarizado com os tipos mais
o desempenho oral dos alunos. Essa questão é tão séria e de difícil comuns de testes, mesmo que não os elabore.
resolução que há professores que decidem atribuir uma nota pelo de- Um dos critérios usados para oferecer uma tipologia de testes é a
sempenho dos alunos em cada aula. O problema disso é que a avaliação maneira com que se mensura o conhecimento que o aprendiz possui:
não segue nenhum critério consistente e, por isso, é baseada em gut direta ou indiretamente. Assim, as habilidades produtivas, i.e., a fala
feeling, ou seja, no instinto ou na intuição do professor. Se o professor e a escrita, podem ser avaliadas por meio de TESTES DIRETOS, exi-
não tiver de atribuir uma nota, mas apenas um pass ou faH, o problema gindo do aprendiz o uso da habilidade sendo testada. Ou seja, em um
é minimizado, mas a questão ainda não é satisfatoriamente resolvida. teste oral direto em um curso que adota a abordagem comunicativa,
Lançar mão de um instrumento como apresentação oral, como vi- por exemplo, o aprendiz fala inglês para realizar determinada tarefa
mos, não é adequado. E que tal a entrevista como instrumento de ava- e, em um teste escrito direto nesse mesmo curso, o aprendiz escre-
liação? Como lembra Cyril Weir (1993: 57), a entrevista tem a desvan- ve em inglês para realizar determinada tarefa. Nesses dois casos, há
tagem de não poder "cobrir a gama de situações em que o aprendiz um produto observável para ser avaliado. Uma redação e uma atividade
pode se encontrar". E que tal usar atividades com abismo de informa- comunicativa que envolve dois falantes são exemplos de formatos qu
ções ou role plays como instrumentos de avaliação do desempenho oral os testes diretos podem tomar.
dos alunos? Em um curso que adota a abordagem comunicativa, essas Quando se trata das habilidades receptivas, i.e., a compreensã
opções seriam claramente válidas em termos de conteúdo, de face e de oral e a leitura, a habilidade ou o conhecimento do aprendiz não podem

244 Aula de inglês: do planejamento à avaliação CAPíTULO 9 I Avaliação do aprendizado e do onslno 74 b


ser mcnsurados dírctarncntc, pois não há um produto obscrvável nos considerada ('UIIIU um todo complexo e indivisível. Brown cita John 01
atos de ler e de ouvir. Tanto a habilidade quanto o conhecimento do ler para contrastar esses dois tipos de testes: "Se os itens discretos
aprendiz, nesse caso, só podem ser mensurados por meio de TESTES desmontam a habilidade linguística, os testes integrativos a montam
INDIRETOS. Os testes de múltipla escolha sobre um texto oral ou um novamente. Enquanto os itens discretos tentam testar o conhecimento
texto escrito são exemplos de testes indiretos. O ditado, o doze e a da língua pedaço por pedaço, os testes integrativos tentam avaliar a
atividade de preenchimento de lacuna são exemplos de itens que apa- capacidade de um aprendiz de usar muitos pedaços todos ao mesmo
recem em testes indiretos. tempo" (Oller 1979 apud Brown, 1994: 262).
Cerezo (2014) lembra que a fala e a escrita também podem ser ava- Você deve estar se perguntando: "Como seria um teste integra-
liadas por meio de testes indiretos: "Se acreditamos que o conhecimen- tivo?" Os dois exemplos mais citados por vários autores (e.g., Spolsky,
to gramatical contribui para a habilidade de escrita, então um teste de 1992; Brown, 1994) são o ditado e o doze, que exigem dos alunos o co-
gramática pode ser usado como um teste indireto de escrita". Ela cita nhecimento de vários elementos da língua ao mesmo tempo. Entretan-
como exemplo a seção Structure and Written Expression do TOEFL. to, as tarefas comunicativas orais e escritas, como, por exemplo, um
Por extensão, esse raciocínio pode ser aplicado à avaliação da fala. Por role play e uma carta, também são itens integrativos pela mesma razão
exemplo, considerando-se que o conhecimento da pronúncia das pala- que o ditado e o doze o são.
vras contribui para a habilidade da fala, um teste voltado para a pronún- Savignon (1997: 225) lembra: "A palavra discreto significa 'sepa-
cia de pares mínimos pode ser usado como um teste indireto da fala. rado' ou 'distinto' e tem sido usada para descrever dois aspectos di-
Contudo, Cerezo aponta um problema, que você já deve ter per- ferentes dos testes de línguas: (1) conteúdo ou tarefa, e (2) maneira
cebido, no uso de testes indiretos para a fala e para a escrita: até que como a resposta é dada e a maneira como a resposta é computada". Já
ponto saber resolver um teste de gramática e saber pronunciar pa- comentei os testes de pontos discretos concebidos a partir de con-
lavras isoladas significa que se sabe escrever e falar inglês? Ora, não teúdos, mas o que seriam testes de pontos discretos concebidos a
significa, né? A fala e a escrita precisam ser testadas diretamente. partir da maneira como os alunos respondem aos itens e de como
A maneira como os testes são construídos é outro critério que se suas respostas são computadas? Seriam exatamente os testes com
pode usar para pensar uma tipologia. De acordo com Spolsky (1992), foi itens no formato de múltipla escolha, de preenchimento de lacunas
John Carroll quem cunhou os termos TESTES DE PONTOS DISCRE- e de questões do tipo verdadeiro/falso. Além disso, nesses testes, as
TOS e TESTES INTEGRATIVOS. respostas dos alunos são computadas de uma maneira óbvia e muito
Brown (1994: 262) explica: os testes de pontos discretos "foram prática: elas são corretas ou incorretas. Não há como os corretores
construídos com base na suposição de que a língua pode ser dividida divergirem quanto a isso.
em partes componentes e que essas partes podem ser adequadamente Entretanto, Savignon nos lembra que um teste pode ser, ao mes-
testadas". E que partes são essas? Ainda segundo Brown, são as quatro mo tempo, integrativo em termos de conteúdo, por exigir que os alu-
habilidades linguísticas e as unidades hierárquicas dentro de cada ha- nos mobilizem conhecimentos diferentes, e de pontos discretos na
bilidade, i.e., o léxico, a sintaxe, a fonología, a morfologia e as subcate- maneira com que eles respondem, pelo fato de o teste ser composto
gorias dessas unidades. Assim, exemplos de testes de pontos discretos de itens no formato de múltipla escolha, de preenchimento de lacunas
são aqueles em que há itens específicos sobre gramática, vocabulário, (como é o caso do doze) e de questões do tipo verdadeiro/falso.
ortografia, morfemas, compreensão de textos escritos, compreensão Savignon (1997: 225), citando Rebecca Valette, dá um exemplo d
de textos orais e redação. item de pontos discretos de um teste de compreensão oral de francês.
O corolário disso é que os testes integrativos partem do pressu- É interessante notar que aos alunos é apresentado um contexto para
posto de que a língua não pode ser dividida em partes: ela deve ser que vão ouvir: uma conversa que ocorre num café em Paris. Só que isso

246 Aula de inglês: do planejamento à avaliação CAPiTULO 9 I Avaliação do aprendizado e do cosmo L4/
não basta para o item deixar de ser um item de pontos discrelos em
Podemos P"IIS;'" Ullllh('1ll em tipos de testes a partir dos propu
termos de conteúdo. Eis o contexto:
sítos que eles rutnprcru. Um desses propósitos é avaliar os conlu:ci
Imagine you are sitting in a Paris café and are overhearing sna- mentos de um aluno que pretende ingressar em um curso e que prc
tches of conversations. Can you tell whether the speakers are cisa ser alocado em um nível de proficiência adequado. É o chamado
talking about present or past events? Listen carefully for the TESTE DE NIVELAMENTO.
verbo If it is in the present tense, mark column A. If it is in the Os testes de nivelamento geralmente são baseados no syHabus do
imperfect, mark column B: curso, o qual, por sua vez, costuma ser representado pelo livro didá
tico adotado. A aplicação de um teste de nivelamento é muito simples
Os alunos precisam reconhecer apenas a pronúncia dos verbos.
quando o aluno não possui nenhum ou quase nenhum conhecimento cv
Deles não é exigida a compreensão dos trechos das conversas que ou-
virão, o que qualifica esse item como sendo de pontos discretos em é alocado no primeiro nível do curso e quando o aluno é muito fluente
termos de conteúdo. e é alocado no último nível do curso. As dificuldades começam quando
Para exemplificar um item integrativo em termos de conteúdo o professor deve alocar o aluno acima do primeiro nível e abaixo do
que é também de pontos discretos em termos da maneira como as res- último porque, à medida que o aluno avança na sua proficiência, fica
postas são dadas e computadas, recorro a um pequeno texto de um mais difícil determinar em que nível ele deve ser alocado. E aqui vai
exemplo fornecido por Bailey (2014) que apresentei no capítulo 4: uma sugestão: se você avaliar um aluno e ficar na dúvida se o aloca no
nível X ou em um nível imediatamente acima de X, seja conservador ('
LlSTEN TO CHARLES TALK ABOUT HIS PREPARATION
aloque-o no nível X. Será menos complicado para o professor da turma
FOR SOMETHING HE IS GOING TO DO TOMORROW ANO em que ele se matricular convencê-lo a mudar para um nível mais alto
ANSWER THE QUESTIONS. do que o contrário.
[TAPESCRIPT: My wife and I tried to pack light but we made sure Geralmente, o teste de nivelamento inclui um teste oral e um tcs
not to forget our bathing suits and sun block. I wasn't sure if I te escrito, sendo o primeiro direto - materializado no gênero textual
would get seasick again 50 I made sure to pack some medicine entrevista - e o segundo indireto, materializado em um teste de múl-
for upset stomachs.] tipla escolha. Entretanto, se você se deparar com um aluno com um ní-
1. What is Charles going to do? vel de proficiência oral relativamente elevado, vale a pena designar-lhe
(a) He's going to go fishing. uma redação para que você veja se ele terá condições de acompanhar
(b) He's going to go to the beach. as atividades escritas no nível mais avançado. Se você perceber que el
(c) He's going to go on a boat trip. terá problemas, seja conservador.
(d) He's going to go to the hospital. Outro propósito dos testes é o de avaliar os conhecimentos qu
os alunos construíram e as habilidades que desenvolveram num mo-
Os alunos ouvem o texto e precisam marcar uma alternativa den- mento de um curso, geralmente no meio do semestre e no final do Se-
tre quatro, a que responde adequadamente à pergunta. Para serem mestre. Podemos chamar os testes que têm esse propósito de TESTES
capazes de responder corretamente, eles precisam mobilizar conheci- DE RENDIMENTO. Eles são baseados não apenas no conteúdo das uni-
mentos sintáticos, lexicais e fonológicos, além de terem de fazer infe- dades do livro didático trabalhadas em sala de aula, mas também nos
rências. Nesse sentido, esse item é integrativo em termos de conteúdo tipos de atividades que os alunos realizam nas aulas.
e, ao mesmo tempo, é um item de pontos discretos na maneira como é
Há testes que visam avaliar os conhecimentos e habilidades
respondido e as respostas, computadas.
rais do aprendiz, independentemente de conteúdos programáticos ou

248 Aula de inglês: do planejamento à avaliação


CAPíTULO 9 I Avaliação do aprendizado e do ansmo 74
de currículos: os TESTES DE PROFICIÊNCIA!. Um dos propósitos des-
ses testes é a certificação, a legitimação de que o aprendiz está apto O professor precisa evitar a MISTURA DE HABILIDADES no mo
mento da avaliação. Esse cuidado é importante para o teste avaliar
para participar de algum curso de graduação ou de pós-graduação nos
quais se usa a língua inglesa ou para trabalhar em uma empresa em exatamente o que se propõe avaliar. Por exemplo, se o objeto da avalia-
ção é a compreensão oral dos alunos, é essencial que os itens referen
que a língua inglesa seja falada. Outro propósito é proporcionar di-
nheiro, muito dinheiro, às instituições que os criam e aplicam. tes a essa habilidade não exijam outras habilidades.
Raymond Traynor (1985: 46) discute a mistura de habilidades qu
Os testes de proficiência mais frequentemente aplicados no Brasil
ocorreu em um item da seção Listening Comprehension de um test
são o Test of English as a Foreign Language, o First Certificate in En-
do TOEFL relatada por John Clark. Nesse item, os candidatos ouvem o
glish, o Certificate in Advanced English, o International English Lan-
seguinte enunciado proferido por uma mulher: "Having answered all
guage Testing System e o Certificate of Proficiency in English. Geral-
the questions, Tom left the room". Em seguida, eles devem escolher uma
mente, eles são mais conhecidos pelas suas siglas: respectivamente,
paráfrase dessa oração dentre as alternativas que reproduzo a seguir:
TOEFL, FCE, CAE, IELTS e CPE. Um ponto importante acerca desses
testes é que os candidatos precisam treinar especificamente para se
1. Tom left because ali of his questions had been answered.
familiarizarem com seus formatos e, assim, terem mais chances de
2. As he was leaving the room, Tom answered ali the questions.
atingirem escores mais elevados. Em outras palavras, não basta domi-
3. Tom left after ali of his questions had been answered.
nar a língua inglesa para ser bem-sucedido nesses testes: é necessário
4. Tom left after he had answered ali the questions.
conhecê-Ios muito bem. Em tese, um candidato familiarizado com a
estrutura do TOEFL, por exemplo, pode ter um escore melhor do que
Traynor comenta acerca desse item e explicita um problema que
um candidato com um nível de proficiência mais elevado, mas sem ne-
nhuma familiaridade com ele. os candidatos enfrentam ao respondê-lo: "Assim como deve ser capaz
de entender o enunciado falado, o candidato deve ser capaz de, em 12
Nesta seção, apresentei os tipos de testes mais comuns no uni-
segundos, ler quatro opções estreitamente relacionadas, eliminar três,
verso de ensino e aprendizagem. Na próxima, discuto duas questões
marcar sua resposta na folha de respostas e se preparar para ouvir a
importantes relacionadas à elaboração de testes.
próxima questão".
Você pode estar-se perguntando: "Tá, E daí? Qual é o problema,
9.3 Duas questões importantes: afinal de contas?". O problema é que, se um candidato escolher a alter-
a mistura de habilidades e o efeito washback nativa incorreta, como será possível saber a razão do seu erro? Ele er-
rou porque não compreendeu o que ouviu ou porque teve dificuldade
Quando abordei o ensino das quatro habilidades, no segundo ca-
para realizar a leitura das alternativas? A mistura de habilidades é clara
pítulo, discuti a importância da integração das habilidades. Entretanto,
nesse item do TOEFL (e podemos imaginar que é provável que esse
quando avaliamos a compreensão oral, a leitura, a fala ou a escrita dos
problema ocorra em outros itens desse teste de proficiência).
aprendizes, é de suma importância avaliar apenas uma habilidade. Por
A mistura de habilidades pode ocorrer na seção destinada a ava-
essa razão, Weir (1993: 19) enfatiza: "Um teste deve se limitar, tanto
liar a habilidade de leitura dos alunos em testes de rendimento aplica-
quanto possível, a mensurar apenas o que pretende e não mensurar
dos em institutos de idiomas. Nessa seção, obviamente, há pelo menos
habilidades não pretendidas ou estranhas".
um texto sobre o qual são feitas perguntas para mensurar a compre-
ensão dos alunos. E o problema pode surgir se o item do teste exigir
I Caso queira ler sobre o que é ser proficiente em inglês, recomendo a leitura da
as respostas escritas em inglês, o que, por sua vez, exige dos alunos a
seção 1.6 de Métodos de ensino de ingLês: teorias, práticas, ideoLogias (Oliveira, 2014).
habilidade de escrita. Para exemplificar isso, retomo um pequeno texto

250 Aula de inglês: do planejamento à avaliação


CAPiTULO 9 I Avaliação do aprendizado e do ensino I:>
um resumo?". C'l.uu '1\1(' d('vl'!ia. Só que isso nao apaga () fato dI' \1111 tt'str'
de um exemplo fornecido por Bailey (2014)que usei no quarto capítul
voltado para LI {,olllpreensao da leitura em inglês não dever exigir dos (',\lI
e crio um item bem simples para testar a habilidade de leitura de alu-
didatos a produção escrita de um gênero textual em português para mcn
nos do segundo nível iniciante:
surar sua habilidade de compreender um texto escrito em inglês. Afinal,
trata-se de um teste de leitura (em inglês) e não de escrita (em português).
ANSWER THE QUESTIONS ACCORDING TO THE TEXT BE-
Um estudante que deseje se preparar para fazer o teste de in
LOW. EXPLAIN YOUR ANSWERS.
glês para a seleção da pós-graduação que exige a produção de um r
My wife and I tried to pack light but we made sure not to for-
sumo em língua portuguesa precisará estudar não apenas inglês, mas
get our bathing suits and sun block. I wasn't sure if I would get
também a redação de resumos em português. Assim, em um curso de
seasick again 50 I made sure to pack some medicine for upset
inglês voltado para a preparação para a seleção de programas de pós
stomachs.
-graduação, o professor precisará incorporar às suas aulas o ensino d
1. What's the author's marital status?
2. What are the author and his wife going to do? produção de resumos em língua portuguesa.
Isso é uma evidência da influência que um teste exerce sobre o
3. What means of transportation are they going to use?
conteúdo curricular, sobre a maneira como o professor leciona e so
4. Are they going to be around water?
bre a aprendizagem. Essa influência é chamada de EFEITO WASHBACK
5. Did the author get seasick before this time?
(também chamado de efeito backwash) e a importância estratégica que
Os alunos não terão dificuldade em responder à primeira questão. os testes possuem no processo de ensino e aprendizagem.
Contudo, não podemos afirmar o mesmo acerca das outras questões O efeito washback é tão poderoso que influenciou a criação de
porque elas envolvem inferenciação, o que, por sua vez, vai exigir dos um método de ensino importante. Quem nos conta é Anthony Howat t
alunos a habilidade de escrita. Se eles tiverem dificuldades para es- (1991:133):
crever uma resposta e acabarem respondendo equivocadamente, como Na Inglaterra, o desenvolvimento mais significativo na educação da classe
saberemos se eles erraram porque não entenderam o que leram ou média, e o mecanismo que alavancou as línguas modernas para o currícu
porque não acertaram escrever o que queriam? 10do ensino médio, foi o estabelecimento, nos anos 1850, de um sistema
Eu gostaria de comentar um caso curioso de avaliação que não de exames públicos controlados pelas universidades. O 'efeito washback'
é exatamente mistura de habilidades, mas um caso em que se perde desses exames teve o resultado inevitável de determinar tanto o syUabus
de vista o objeto da avaliação por conta da exigência da produção de quanto os princípios metodológicos dos professores responsáveis por pre-
um gênero textual que não tem nada a ver com o objeto da avaliação. parar crianças para realizá-Ios. Embora os exames públicos não tenham
Refiro-me aos testes de inglês exigidos na seleção de alguns progra- criado o método de gramática e tradução, eles fixaram suas prioridades.
mas de pós-graduação em letras, cujo objetivo é oficialmente avaliar a
O efeito washback pode ser negativo ou positivo. De acordo com
capacidade de leitura dos candidatos.
Lynda Taylor (2005: 154), ele é considerado negativo "quando o con-
Nesses testes, geralmente se apresenta um texto sobre o qual se
teúdo ou o formato do teste se baseia em uma definição estreita d
fazem perguntas em português para serem respondidas em português,
habilidade linguística, limitando, assim, o contexto de ensino e apren-
como, por exemplo, "Qual é a ideia central do texto?". Até aí, tudo bem.
dizagem". Ainda segundo Taylor, ele é positivo quando "o teste encoraja
O problema começa no momento em que se solicita dos candidatos isto:
"Faça um resumo do texto". Ora, fazer um resumo é uma micro-habili- a 'boa' prática pedagógica".
Um exemplo de efeito washback negativo dado por Taylor (200
dade de escrita, não de leitura. Talvez você possa estar pensando: "Mas
154),citando Alan Davies e outros, é este: "Se, por exemplo, a habilidade
um candidato ao mestrado ou ao doutorado não deveria saber produzir

CAPiTULO 9 I Avaliação do aprendizado e do onSH10

252 Aula de inglês: do planejamento à avaliação


de escrita for testada apenas por itens de múltipla escolha, haverá uma intcracionul (\(' lillgu;t (' u concepção trldlrncnsionul <lu ~ramúli(';t, d;ts
grande pressão para se praticarem tais itens em vez de se praLicar a lerão um efeito washback positivo sobre o ensino c a aprendizagem.
habilidade de escrita propriamente dita". Em outras palavras, o teste Portanto, os professores e a coordenação acadêmica precisam ler cui
acaba forçando os professores a treinarem seus alunos a responderem dado ao elaborar os testes, pois eles têm impacto sobre o universo de
a itens de múltipla escolha, e esse treinamento retira tempo da aula ensino e aprendizagem. Obviamente, não é possível afirmar que o efei-
que seria destinado à prática da produção de textos escritos. to washback atingirá todos os professores ou apenas alguns, todos os
Outro exemplo é o que a prova de português dos vestibulares alunos ou apenas alguns, mas precisamos saber que existe algo cha
provocava no ensino de português no Brasil até o início da década de mado efeito washback e que ele pode afetar o ensino" a aprendizagem
1990. A prova continha questões de múltipla escolha, muitas das quais a coordenação acadêmica da instituição.
eram sobre gramática normativa. O efeito disso no ensino era claro: Do que foi exposto até aqui, fica claro que o professor precisa ler
os professores davam muito espaço ao ensino da gramática normativa, o cuidado de não misturar habilidades nos testes que visam avaliar
da nomenclatura gramatical, sem levar em consideração os elementos habilidades específicas dos seus alunos. Além disso, ele deve levar em
de textualidade e outros gêneros textuais, o que implicava a adoção da consideração o efeito washback dos testes, o qual pode influenciar
concepção estruturalista de língua. objeto e a maneira do ensino.
Taylor (2005: 154) dá como exemplo de efeito washback positivo Na próxima seção, abordarei uma questão vital para a formação
aquele provocado pela introdução de um teste de proficiência oral em dos professores de inglês: a observação da aula.
um instituto de idiomas com a expectativa de que isso leve os profes-
sores a ensinarem as micro-habilidades de fala. A ausência de um teste 9.4 A avaliação do ensino: a observação de aulas
desse tipo não coloca os professores sob a pressão positiva de plane-
jarem aulas voltadas para o desenvolvimento da habilidade de fala dos 1983: ano em que iniciei minha carreira de professor de inglês.
seus alunos. Lembro-me da primeira vez em que minha aula foi observada. Eu
Lembro-me do momento em que algumas universidades brasilei- tinha 19 anos e estava trabalhando em um instituto de idiomas qu
ras decidiram substituir a tradicional redação pela carta argumentati- adotava uma variação do método audiolingual. Fiquei muito ansioso
va nos seus vestibulares. Houve reação imediata de alguns cursinhos e tenso antes, e mais tenso ainda durante a observação. Não gostei
pré-vestibulares porque eles teriam de se adaptar ao novo formato da de ver aquela coordenadora ali na minha sala, uma criatura estranha
prova: eles não gostaram da novidade, pois seus professores de portu- àquele habitat, friamente marcando itens em uma checklist. Não tive-
guês teriam de se acostumar à nova realidade e seus módulos teriam mos nenhuma conversa antes da aula, nem depois! Recebi apenas uma
de ser reformulados. E esse é um exemplo de efeito washback positivo, cópia da checklíst com alguns itens ticados. Fiquei aliviado quando
pois os professores passaram a ter de levar em consideração os ele- tudo terminou. Mas só me acostumei com aquilo depois de quatro ou
mentos de textualidade e o conceito de gêneros textuais para poderem cinco observações, pois fui construindo mais experiência e adquirin-
abordar, de maneira eficaz, a produção de textos argumentativos em do mais confiança.
sala de aula. A observação de aulas é um instrumento de avaliação do desem-
As instituições de ensino, abertamente ou de maneira camuflada, penho do professor, que pode ser realizada a partir de duas perspecti-
costumam fazer seus professores darem aulas voltadas para as avalia- vas diferentes. Uma delas é a perspectiva da instituição, interessada em
ções internas ou externas. Logo, se as avaliações forem realizadas por avaliar profissionalmente o professor para decidir se ele precisa de mais
meio de testes aos quais subjazam pressupostos teóricos mais inte- treinamento ou não, se deve continuar trabalhando ali ou não. A outra
ressantes para o ensino e a aprendizagem de inglês, e.g., a concepção a perspectiva do professor, interessado em avançar na formação.

254 Aula de inglês: do planejamento à avaliação CAPiTULO 9 I Avaliação do aprendizado e do ensino I~


Infelizmente, é a primeira perspectiva que costuma habitar o ima- sem csuu pn's('I)le na sala de aula? A presença do observador al\('1íI il
ginário dos professores de inglês, levando-os a criarem resistência e a rotina da turma e pode até alterar os comportamentos que coStllllléllll
não vislumbrarem a observação de aula como um instrumento de ava- ocorrer. Não há como resolver esse paradoxo. Isso significa que () oh
liação essencial para sua formação. E não estou falando apenas de pro- servador nunca terá uma amostra fiel dos comportamentos do proles
soro Portanto, a melhor estratégia é não fazer observações-surpresa,
fessores brasileiros: Ramin Akbari, Reza Samara e Leila Tajik (2006) co-
pois isso pode afetar emocionalmente o professor, o que, por sua vez,
mentam que, em uma pesquisa realizada no Irã, professores demons-
pode afetar negativamente a qualidade da sua aula.
traram ressentimento em relação à observação de aulas pelo fato de
A observação de aulas precisa ser vista como um instrumento I
suas preferências terem sido totalmente ignoradas, o que aponta para
gítimo de avaliação do ensino. Para isso, os professores precisam par-
um modelo de observação autoritário, de cima para baixo.
ticipar ativamente do processo de observação, o qual deve incluir, pelo
Um modelo autoritário de observação, que não empodera mini-
menos, três momentos:
mamente o professor, é uma das razões para a resistência por parte
(a) uma reunião entre observador e observado antes da aula para
dos professores. No instituto de idiomas em que iniciei minha carrei-
que se decida qual o foco da observação e a data;
ra, a observação seguia um modelo autoritário. Não havia uma reunião
(b) a observação da aula;
prévia entre professor observado e coordenadora observadora. Além (c) uma reunião entre observador e observado após a aula para
disso, a coordenadora só queria saber se eu estava seguindo as dire- discutirem o que foi observado tendo em vista o foco previa
trizes da franchise. Para piorar as coisas, a coordenadora aparecia de
mente combinado.
surpresa na sala: sem informar aos professores, agendava a data e o Às vezes, nessa reunião, observador e observado podem decidir
horário da observação. A aura de patrulhamento tomava conta das ob- que o professor precisa elaborar um plano de ação para melhorar ai
servações de aulas naquele instituto. E o mesmo deve ocorrer até hoje gum aspecto fora do nível desejado por ele ou pelo observador. G
em muitos institutos de idiomas pelo Brasil e mundo afora. ralmente os aspectos observados são elementos do gerenciamento da
Alguém pode tentar defender a estratégia adotada por algumas aula, e.g., a maneira como o professor dá as instruções, a forma como
instituições de realizarem observações-surpresa baseando-se na ideia explica pontos gramaticais e significados de itens lexicais, a maneira
de que o professor preparará a aula de maneira mais cuidadosa do que como monitora as atividades. Uma vez elaborado e posto em prática o
o habitual se souber a data da observação. Parece lógico, não é? E é plano de ação, outras observações serão necessárias.
lógico se partirmos do pressuposto de que a observação de aula é um Em suma, a observação de aulas é um importante item de avalia-
instrumento de patrulha, sendo o elemento surpresa necessário para ção tanto para o professor quanto para a instituição na qual trabalha.
pegar o criminoso em flagrante. Como o professor precisa saber como está sua prática docente e como
Ora, é desnecessário afirmar que a observação da aula não deve ele não consegue observar sua própria aula, é necessário que outra
se transformar em um instrumento de patrulha institucional. Isso sim- pessoa realize a observação. Já a instituição precisa saber como o pro-
plesmente não se encaixa em termos de educação e de formação de fessor faz seu trabalho. A observação se apresenta como o instrumento
professores. Obviamente, as instituições precisam saber do desempe- mais adequado para isso.
nho de seus professores, e a melhor forma de saberem isso é por meio Entretanto, a observação de aulas vai além da sua função avalia-
das observações de aulas. Mas elas precisam conduzir as observações tiva, pois ela se torna um instrumento para a formação de professores
de maneira apropriada e honesta, ou seja, combinando com os profes- em treinamento: observar as aulas de um colega mais experiente pod
sores as datas para as observações e os focos das observações. levá-los a intuições importantes. O problema é que muitos professores
Além do mais, não se pode perder de vista o paradoxo do obser- não se sentem à vontade para receber, em suas aulas, colegas em trei-
vador: como o observador pode saber o comportamento do professor namento, como explica Jack Richards:

256 Aula de inglês: do planejamento à avaliação


CAPiTULO 9 I Avaliação do aprendizado e do onsmo I!ll
No tipo mais frequente de observação, professores em treinamento as- a observação, pois o professor não pode olhar para o espelho todo ao
sistem às aulas de professores experientes. Na verdade, os professores mesmo tempo: seu olhar vai se concentrar em uma parte dele. Ainda
experientes frequentemente não gostam de ser observados. Muitos pro- pegando uma ponga na metáfora de Medgyes, lembro que um espelho
fessores se sentem distraídos pela presença de um observador e acham não nos mostra uma imagem vaga, a não ser que tenha algum defeito.
que, apesar da ideia de que os observadores devem observar e não avaliar, Analogamente, o observador deve evitar comentários vagos ou itens
é impossível não assistir outro professor ensinando sem formar algum
vagos na checkList. Richards e Nunan (1990:79) oferecem quatro exem
tipo de impressão de quão bem-sucedida foi a aula. Por isso, é natural
plos de itens vagos numa checkList:
que os professores prefiram não ser expostos a uma situação na qual seja
dada a professores inexperientes em treinamento a oportunidade de ava- 1. Materiais and learning activities were appropriate;
liarem suas aulas, particularmente se eles não puderem escolher quem os 2. There was enough variety in the lesson;
observará, quando e por que serão observados (Richards, 2000: 142-143). 3. The teacher did not talk too much;
4. General classroom management was good.
As palavras de Richards apontam para uma provável resistência
dos professores a serem observados: os julgamentos que, muitas vezes, As palavras sublinhadas expressam vaguidade. Não ajudam o pro-
se misturam à observação. E isso, naturalmente, deixa os professores fessor a ter ideia clara do que ocorreu em sua aula nessas áreas. Em
tensos, pois quem é que gosta de ser julgado? vez de dizer que os materiais e as atividades foram apropriadas, o ob-
É importante que isso fique claro: observar não significa julgar. O servador deve descrever como os alunos reagiram aos materiais e às
observador precisa fazer o máximo possível para observar sem julgar, atividades, se tiveram dificuldades e como o professor lidou com elas.
o que não significa que ele deva fazer vista grossa para as áreas em Em vez de dizer que houve variedade suficiente, deve informar quantos
que o professor precisa melhorar seu desempenho. Observar sem jul- tipos de atividades foram realizadas e quantas habilidades, praticadas.
gar significa fornecer ao professor informações úteis para ele refletir O observador deve informar quantos minutos da aula foram ocupa-
criticamente sobre sua prática docente e, assim, crescer profissional- dos pela fala do professor, em vez de dizer que o professor não falou
mente. Não por acaso, Péter Medgyes, durante uma palestra na First muito. Finalmente, afirmar que o gerenciamento geral da aula foi bom
Laurels Teacher Training Conference em Maceió, em julho de 1998, fez não ajuda em nada, pois o professor fica sem saber de que aspectos
um comentário metafórico que brilhantemente resume o papel do for- do gerenciamento o observador está falando. Nesse caso, ele deveria
mador de professores: o formador tem de segurar um espelho para o especificar os aspectos do gerenciamento que observou e descrever o
professor se olhar nele. comportamento do professor.
Quando eu observava um professor, eu o descrevia o mais fide- A observação de aulas é um instrumento excelente no processo
dignamente possível e enviava a descrição para que ele a lesse antes da de formação dos professores de inglês. Mas requer atitudes não au-
nossa reunião pós-observação. Na reunião, eu lhe perguntava se havia toritárias por parte do observador e atitudes proativas do professor.
algo que desejava comentar sobre a descrição e compartilhava com ele Lembro-me de que solicitei à coordenadora acadêmica de um instituto
o que eu achava importante. A partir daí, discutíamos os pontos que de idiomas para me observar algumas vezes. Em cada uma delas, eu
considerássemos relevantes. propunha um foco para a observação. E isso me ajudou muito.
Um ponto importante sobre o observador: ele não deve se in- Finalizo esta seção comentando o jogo de damas. Com quantas
trometer na aula do professor. Mesmo que o observador presencie pessoas se jogam damas? Provavelmente, você dirá "duas". Na minha
um erro sério do professor, não deve corrigi-lo à queima-roupa. Deve terra, todo jogo de damas que se preze tem um peru, ou seja, uma pes-
guardar os comentários para a reunião pós-observação. Outra impli- soa que fica assistindo ao jogo e dando pitacos o tempo todo. Quem
cação disso é o necessário estabelecimento prévio de um foco para mais sabe do jogo? O peru, é claro, pois não está envolvido diretamente

258 Aula de inglês: do planejamento à avaliação CAPiTULO 9 I Avaliação do aprendizado o do OllSII1Cl


no jogo. Analogamcnte, uma aula de inglês precisa de dois grupos de
sujeitos: o professor e os alunos. Um observador funciona como o peru
do jogo de damas, pois ele não está diretamente envolvido na aula e, por
isso, pode perceber coisas que o professor não vê. Recomendo que você
se mantenha aberto a observações de aula e participe ativamente do
processo dialogando com o observador antes e depois das observações.

Conclusão
inal do livro! Quero aproveitar este espaço para
tocar em alguns pontos importantes que não
cabiam diretamente em nenhum dos nove capí-
tolos e para fazer duas recomendações.
A formação de professores de inglês é um proces-
so complexo. Exige do indivíduo uma gama variada de
conhecimentos. Se esse indivíduo for brasileiro, as coi-
sas ficam ainda mais complicadas no contexto atual,
em que alguns cursos de letras no Brasil ainda não fa-
zem um trabalho eficiente na formação de professo-
res. Evidência disso é que, após quatro ou cinco anos
de curso, muitos licenciados em letras com inglês des-
conhecem a maior parte dos métodos de ensino e não
sabem exatamente o que é competência comunicati-
va. Muitos licenciados em letras com inglês continuam
acreditando na diferença entre aquisição e aprendi-
zagem, e no tal i + 1, que Krashen popularizou. Além
disso, há licenciados que proíbem terminantemente o
uso de português na sala de aula de todos os níveis,
se tornam professores orientados por materiais, acre-
ditando que o melhor para os alunos é levar a maior
quantidade possível de materiais para a sala de aula.
A ineficiência de muitos cursos de letras com
inglês é tão grande que há cursos de treinamento d
professores em institutos de idiomas que formam um

260 Aula de inglês: do planejamento à avaliação Conclusão z61


professor de inglês em um período de tempo mais curto e com mais construção dessa ponte. E aí é o caso da má formação do licenciado
eficiência. Resultado: o ensino de inglês nas escolas públicas sofre, c em letras por conta de uma licenciatura em letras mal pensada, com
os Parâmetros Curriculares Nacionais recomendam que os professo- muito foco, por exemplo, em componentes curriculares voltados para
res foquem no ensino da leitura por reconhecer que muitos deles não a linguística dura. A segunda possibilidade é um afastamento pós-for-
dominam a língua inglesa. Isso não deixa de ser surreal, pois evidencia matura: o licenciado em letras até teve as oportunidades oferecidas
que universidades estão licenciando professores de inglês que não do- por componentes curriculares e por professores para construir essa
minam a língua inglesa. ponte, mas, após receber seu diploma, simplesmente para de estudar,
Quantos professores de inglês da rede pública municipal e es- de ler e de refletir sobre sua prática docente com base nas coisas que
tadual anseiam por cursos de formação continuada e por textos que estudou na universidade.
deem a eles alguma luz acerca de questões que os inquietam? E esse Outro fator que contribui para dificultar a formação de professo-
anseio, geralmente, tem suas raízes fincadas lá atrás, na formação ini- res é o equívoco que permeia a maioria arrasadora dos cursos de letras
cial do professor de inglês. com inglês: aceitar que ingressem estudantes que não sabem inglês.
Vale notar o mito que se cria a partir dessa má formação: o mito Esse é um ponto delicado, que faz muitos professores sapatearem no
segundo o qual há uma distância enorme entre a escola e a universida- alto de suas tamancas acadêmicas. Existem até algumas pessoas com
de. Quantas pessoas dizem que a academia não se aproxima da escola? um discurso bastante falacioso segundo o qual exigir o conhecimento
Só que a tal distância não passa de um mito. E por quê? Por que os de inglês para se tornar professor de inglês é um ato elitista. Sem co-
professores das escolas públicas e privadas são formados pela univer- mentários, né? Afinal, essa lógica é tão sem pé nem cabeça que, se a
sidade! É de lá que eles vêm. seguirmos, teremos de defender o ingresso de estudantes estrangeiros
Recusemos o mito da separação entre a escola e a universidade. que não dominam a língua portuguesa nas licenciaturas em letras ver-
E vale aqui um alerta: é verdade que há pesquisadores na universidade náculas. E aí vai ser preciso muita cara de pau para me dizerem algo
que se aproveitam da escola de forma bastante egoísta, mas isso não como "Ah,mas aí é diferente". Não, não é diferente, não!
quer dizer que a universidade se afaste da escola. O uso egoísta é fei- Com todas essas dificuldades no contexto da formação de pro-
to por pesquisadores que estão fazendo mestrado ou doutorado e que fessores de inglês no Brasil, recomendo que você tome as rédeas da
usam alunos e professores das escolhas públicas (raramente das esco- sua formação. E a melhor maneira de fazer isso é ler bastante e refle-
las privadas) para conseguirem seus títulos e engordarem seus Lattes tir criticamente sobre o que lê. Leia sobre planejamento de aula, ge-
sem nunca terem, ao menos, a delicadeza de voltarem às escolas para renciamento da sala de aulas, ensino das quatro habilidades. Amplie
socializar os resultados de suas pesquisas. seu vocabulário e aprofunde seus estudos de gramática. Exponha-se,
Então, a pergunta de um milhão de dólares é esta: em que pon- o máximo possível, ao inglês falado. Tudo isso vai dar a você uma base
to o professor se afastou da universidade? Sim, o professor é que se forte para avançar na formação.
afasta. Duas respostas possíveis: ou ele teve uma formação ruim no Além disso, recomendo que você considere aquela frase tão batida
seu curso de letras e não buscou meios de compensar a má formação, atribuída a Sócrates, que a teria pronunciado em frente ao Templo de
ou simplesmente parou de estudar, de ler, de refletir sobre sua prática Delfos: "O que sei é que nada sei". Essa frase parece ter inspirado Eins-
docente. Ou seja, duas possibilidades de afastamento se instauram. A tein, que chegou a esta conclusão: "Quanto mais eu aprendo, mais eu
primeira é o afastamento na origem: não se estabelece a ponte neces- dou conta da minha ignorância".
sária entre o que se estuda na universidade e o que o professor ensi- E por que recomendo isso? Para evitar cair na arapuca em que
nará nas escolas e colégios após se graduar porque os componentes alguns professores caem: eles se tornam arrogantes achando que
curriculares e/ou os professores não favorecem ou não estimulam a já sabem de tudo. Isso é um perigo que os impede de avançarem na

262 Aula de inglês: do planejamento à avaliação Conclusão z63


formação. Eles acham que não precisam estudar mais por dominarem
a língua inglesa e simplesmente não leem nenhum texto teórico. Além
disso, acham que suas aulas não precisam ser observadas e se sentem
até ofendidos se elas forem.
Lembro-me de um caso emblemático em uma universidade em
que eu acabara de ingressar. Solicitaram-me para lecionar a disciplina
Língua Inglesa VI. Era o primeiro dia de aula e eu havia preparado uma
atividade diagnóstica para ter uma ideia do nível de proficiência dos
meus alunos. Também quis saber o que eles achavam do livro didático
Referências bibliográficas
adotado - a segunda metade das unidades do livro deveria ser traba-
lhada naquela disciplina. Para minha surpresa, eles me informaram que
não haviam usado o livro no semestre anterior pela seguinte razão: o
professor havia alegado que não precisava usar um livro didático por AFFLERBACH, P.; PEARSON, P. D.; PARIS, S. (2008) Clarifying Dif-
ferences between Reading Skills and Reading Strategies, The
ser falante nativo. Isso é ou não é surre ai? E eu, até então, achava que Reading Teacher, v. 61, n. 5, p. 364-373.
já havia visto de tudo na área de ensino de inglês. AKBARI, R; SAMAR, R.; TAJIK, L. (2006) DeveIoping a Classroom
Além disso, existem professores que gostam de zombar dos er- Observation Model Based on Iranian EFL Teachers' Attitudc.
ros dos alunos. O pior é que, muitas vezes, fazem isso sem saberem Journaí of Facu!ty of Letters and Humanities, v. 49, n. 198, p. 1-37.

que muitos dos tais erros nem são erros. Certa vez, um professor es- AL-NAFlSEH, K. (2013) Collaborative Writing and Peer-Editing in
EFL Writing Classes. Journal of Emerging Trends in Educatio-
tava comentando jocosamente uma construção que um aluno dissera: na! Research and Poticy Studies, v. 4, n. 2, p. 236-245.
what o'dock? O aluno queria obviamente saber as horas e lançou mão ANSON, c:BOMMARITO, E.; DEUSER, 1. (1983) From Schemes to
de uma construção esquisita. Mas estará isso errado mesmo? Bem, em Themes: Implications of Schema Theory for Teaching Writing.
Romeo and Juliet, Shakespeare escreveu: "What o'clock tomorrow?". Al- Journal of Teaching Writing, v. 2, n. 2, p. 193-211.

guém pode argumentar que isso é inglês antigo. OK. Mas isso mostra ANYASSARI, N.; PUDYASTUTI, Z. Princip!es of Language Asses-
sment. Disponível em: <http://www.academia.edu/4587581j
que o aluno não fez nenhuma besteira absurda: fez algo que tem base PRINCIPLES_OF _LANGUAGE_ASSESSMENT>. Acesso em:
na história da língua inglesa, embora esteja fora de uso, algo que foi 24 jun. 2015.
interessantemente instintivo e lógico. AUERBACH, E. R (1986) Competency-Based EFL: One Step
Por isso, precisamos entender que formar-se professor exige do- Forward and Two Steps Back? TESOL Quarter!y, v. 20, n. 3,
p.411-429.
mínio nas áreas abordadas em cada um dos capítulos deste livro e do-
BAILEY, E. MaRing Inferences: Improving Reading Comprehension
mínio da língua inglesa. Mais importante: exige do professor a humil- for Students with dys!exia. Disponível em: <http://specialed.
dade de reconhecer que não sabe tudo e a disposição para estar sem- about.com/od/readingliteracy/a/makinginferences.htm>.
pre aprendendo. Acesso em: 24 jun. 2015.
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AULA DE ...

1. Aula de português: encontro & interação -Irandé Antunes


2. Aula de inglês: do planejamento à avaliação - Luciano Amaral Oliveira

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