Do Modelo Biomédico Ao Biopsicossocial
Do Modelo Biomédico Ao Biopsicossocial
Do Modelo Biomédico Ao Biopsicossocial
PALAVRAS-CHAVE: RESUMO
Educação Médica; Dentro do movimento amplo de implantação de um modelo de atenção biopsicossocial em
Capacitação; saúde, temos desenvolvido uma série de ações que incorporam as características de um processo
de educação permanente.
Corpo Clínico Hospitalar;
Desenvolvemos, dentro desta proposta, uma série de atividades com alunos e profissionais e
Psicologia Médica.
destacamos neste trabalho a aplicação de uma metodologia na qual o aluno de graduação tem
uma função que temos denominado de dupla-face, na medida que ele é tanto alvo como
agente do processo de educação permanente.
Dentro desta perspectiva, este ano estamos formalizando a aplicação de um instrumento de
orientação, observação e entrevistas, especialmente adaptado para essa finalidade.
KEY-WORDS: ABSTRACT
Education, Medical; Within the broad movement to introduce a biopsychosocial model in health care we have deve-
loped actions that incorporate features of permanent education.
Training;
With this perspective, we developed many activities with medical students and health professio-
Medical Staff, Hospital;
nals and this paper is focused on a methodology in which the student has what we call a
Psychology, Medical. double-face function, being target but also agent of continued education.
This year we are introducing the use of an instrument of orientation, observation and intervi-
ews, especially adapted to this purpose.
1
Professor Adjunto, Chefe da Disciplina de Psicologia Médica e Psiquiatria Social, Coordenador do Curso de Psicologia Médica do 2º ano
REVISTA BRASILEIRA DE EDUCAÇÃO MÉDICA médico, Coordenador Geral do Serviço de Atenção Psicossocial Integrada em Saúde do Hospital São Paulo, Departamento de Psiquiatria,
60 Rio de Janeiro, v .30, nº 1, jan./abr. 2006 Escola Paulista de Medicina, Universidade Federal de São Paulo, São Paulo, São Paulo, Brasil.
Mario Alfredo De Marco Do Modelo Biomédico ao Modelo Biopsicossocial: um projeto de educação permanente
tes, pacientes e familiares para os fenômenos da vida mental ProCRAI Programa de Capacitação da Rede de Apoio Institucional
e emocional e da dimensão social presente e atuante nas situ- Beneficiário externo Refere-se ao usuário da instituição, ou seja, ao
ações. paciente e aos seus familiares (ou cuidadores).
Beneficiário interno Refere-se ao profissional da instituição, seja
Desenvolvimentos de saúde (médico, enfermeiro, psicólogo, fonoaudiólogo, fisioterapeu-
A partir de 1999, surgiu um interesse mais consistente no ta, alunos dos cursos de saúde etc.) ou de nível técnico-administra-
sentido de uma integração e de uma atuação mais ampla em tivo não terceirizado (escriturário, secretárias, auxiliares adminis-
Saúde Mental no Hospital São Paulo. trativos, seguranças, faxineiros etc.).
Diversos fatores concorreram para o surgimento e a con- Conforme exposto no Organograma, o serviço se articu-
cretização deste interesse, merecendo destaque, como fato- la em duas frentes de organização: programas centralizados e
res mais recentes, os programas de humanização e o desen- descentralizados:
volvimento de sistemas de avaliação da qualidade dos servi-
ços de saúde hospitalares, em concordância com o Sistema A) Programas centralizados: referem-se às medidas
Brasileiro de Acreditação Hospitalar, desenvolvido pelo Mi- gerais, para a instituição como um todo.
nistério da Saúde e pela Organização Nacional de Acredita-
ção. ProBEPI Programa de Bem Estar do Paciente Internado
Para efetivar a integração, foi decidida a implantação de Objetivos:
um serviço visando promover uma atenção mais ampla às Melhorar a sensação de bem-estar do paciente internado.
necessidades gerais e específicas do hospital e seus setores, Favorecer a organização/reorganização, no plano intra
bem como reorganizar a inclusão de profissionais de saúde e extra-hospitalar, de uma rede de apoio social ao paci-
mental nas enfermarias e ambulatórios, definindo critérios de ente.
inserção e capacitação destes profissionais. Oferecer estímulos e possibilidades de opção para ativi-
dades, como, por exemplo, oficinas de terapia ocupaci-
SERVIÇO DE ATENÇÃO PSICOSSOCIAL onal.
INTEGRADA EM SAÚDE (SAPIS-HSP) Implementar e estimular atividades de visita pelo corpo
de voluntários do hospital e líderes espirituais (padre,
ORGANOGRAMA SAPIS-HSP pastor, rabino, grupo de oração etc.) para atender de-
mandas de suporte material e espiritual do paciente.
Distribuir material (folhetos e outros) desenvolvido pelo
SAPIS que abordará tópicos de interesse do paciente,
direitos do paciente, descrição da rotina de atendimen-
to etc.
Realizar palestras abertas à comunidade sobre as doen- que, em alguns anos, seja possível universalizar a aten-
ças mais prevalentes e recursos de tratamento da rede ção psicossocial, ampliando os programas centraliza-
pública. dos e estendendo a aplicação de programas descentra-
lizados a todos os setores.
ProDAPS Programa de Discussão e Apoio ao Profissional
de Saúde EDUCAÇÃO PERMANENTE
Objetivos: Nossa vocação principal tem sido a formação dos profis-
Estreitar contato do profissional de saúde mental com sionais, seja no plano da graduação, onde oferecemos um
os profissionais de saúde da instituição que cuidem di- curso com acentuada ênfase formativa, seja no plano dos pro-
retamente do paciente. fissionais de saúde, incluídos aí tanto os que solicitam nossos
Desenvolver atividades psico-educacionais, isto é, ensi- serviços quanto os que capacitamos para essa tarefa. Nossa
nar e rever conceitos sobre a relação do profissional de intenção é que além do benefício pessoal, esse conhecimento
saúde com o paciente e familiares, além de trabalhar, de possa contribuir com um efeito multiplicador, particularmen-
forma geral e preventiva, as dificuldades emocionais te quando o profissional estiver ocupando cargos e funções
do grupo profissional em lidar com situações adversas diretivas ligados ao ensino, assistência e pesquisa 4.
(óbito, pacientes sem prognóstico, famílias querelan- Todas as nossas ações envolvem sempre a dimensão de
capacitação e educação permanente dos estudantes, dos pro-
tes, etc).
fissionais e dos pacientes e seus familiares. Pacientes e famili-
Desenvolver atividades teóricas (palestras) e práticas
ares são muitas vezes esquecidos neste processo de capacita-
na forma de grupos de discussão dos atendimentos (gru-
ção e educação continuada, o que pode provocar uma série de
pos Balint).
distorções. Consideramos fundamental sua inclusão, pois, só
Oferecer treinamento em técnicas de fácil aplicação que
assim poderemos caminhar para uma mudança consistente
capacitem o profissional a aliviar as tensões resultantes
na relação terapêutica, distanciada de assistencialismo e pa-
da atividade profissional.
ternalismo1.
ProCRAI Programa de Capacitação da Rede de Apoio Na atenção à educação permanente, sempre procuramos
Institucional abarcar os diversos níveis institucionais (alunos, médicos, pro-
fissionais de saúde em geral, profissionais administrativos,
Objetivos:
pacientes e familiares). Com a criação do SAPIS o projeto de
Estabelecer parceria com o Departamento de Recursos
educação permanente ganha um grande impulso, na medida
Humanos do HSP para desenvolver ações de treina-
em que estruturamos um plano de ação ampliado que atinge,
mento e capacitação dos profissionais.
agora, a instituição em seus mais variados níveis.
Desenvolver manuais sobre a relação de cada categoria
A ampliação se produz dentro dos moldes que sempre
profissional com o paciente, orientando quanto à for- nortearam nosso trabalho e a nossa atuação se mantém fiel
ma de procedimento em situações específicas (por exem- aos nossos princípios básicos. Se trabalhamos, por exemplo,
plo, paciente tentando fugir do hospital, paciente agres- com o grupo de familiares, nossa preocupação não é simples-
sivo etc.) mente transmitir informações ou orientações, mas, principal-
mente, capacitar o paciente e os familiares a conhecer seus
B) Programas descentralizados: são ações e programas
direitos, deveres e os meios para alcançar os recursos neces-
elaborados de acordo com as demandas e específicos
sários para atender suas necessidades.
para setores, enfermarias ou ambulatórios, que visam:
O profissional de ligação, destacado para uma determina-
Assessorar e integrar programas já existentes (ações na da enfermaria ou serviço, tem sempre presente a preocupa-
área da atenção psicossocial são desenvolvidas em vá- ção de capacitar, para os diversos aspectos de nosso campo,
rios setores e enfermarias do complexo HSP-Unifesp todos os profissionais envolvidos na tarefa assistencial, bem
de forma isolada e com padrões muito variáveis). como os estudantes (assessorando e complementando nossas
Desenvolver programas específicos que atendam às ações no curso de psicologia médica).
demandas peculiares de cada serviço. Um objetivo central de nosso trabalho é sempre incorpo-
Implementar e universalizar os programas atendendo rar um cuidado com uma real transformação individual e ins-
prioridades de oferta e de demanda. A expectativa é titucional.
O ALUNO DE GRADUAÇÃO COMO ALVO E dizado do aluno quanto a reflexão de todos os profissionais
AGENTE DE TRANSFORMAÇÃO envolvidos nos cenários. As entrevistas são realizadas tanto
O que pretendo abordar mais especificamente neste tra- com os pacientes quanto com os diversos profissionais envol-
balho é um aspecto de nosso projeto que envolve o programa vidos nos atendimentos, e são estruturadas de forma a esti-
de Psicologia Médica na graduação. Conforme já mencionei, mular a curiosidade e a reflexão sobre questões consideradas
cada vez mais temos integrado o ensino de graduação em relevantes para a construção de uma atenção integral e inte-
nossas ações de educação permanente. Algumas característi- grada em saúde. Esta atividade incorpora um aspecto que
cas importantes, visando este objetivo, são as seguintes: temos denominado de dupla-face do ensino em Psicologia
contato com os cenários da prática: o contato direto Médica, no qual o estudante é alvo e agente de construção e
com os cenários tem sido cada vez mais precoce. transformação. Dentro desta perspectiva, e incluindo essa
funcionamento articulado: cada vez mais temos apro- mesma finalidade, elaboramos em 2004 um instrumento mais
fundado a articulação com os demais programas que estruturado de observação e entrevistas que estaremos tes-
desenvolvemos (interconsulta, programas de ligação etc) tando e avaliando.
funcionamento dupla-face em que o aluno funciona tan-
INSTRUMENTO PARA ORIENTAR A OBSERVAÇÃO
to como alvo de nossas ações quanto como agente trans-
E AS ENTREVISTAS
formador.
No aspecto da exposição mais precoce do aluno aos cená- SUMÁRIO PARA ORIENTAR A OBSERVAÇÃO
rios da prática temos contado, conforme já mencionei, com a
contribuição de uma experiência que se iniciou em 2003 com o Observação
programa de aproximação à prática médica, do qual partici- A natureza daquilo que é observado depende da perspec-
pamos intensivamente e com o qual nossas ações procuram tiva a partir da qual observamos.
funcionar articuladamente.
No segundo aspecto, desde há muitos anos, temos funci- Modelo Biomédico
onado dentro desta perspectiva: o aluno de graduação, além O discurso da medicina, via de regra, apóia suas observa-
da oportunidade oferecida pelo programa curricular é objeto ções e formulações, exclusivamente, a partir da perspectiva
de nossa atenção através de uma série de outros contatos. Na do modelo biomédico. Este modelo, refletindo o referencial
solicitação de interconsultas, por exemplo, há algumas que técnico-instrumental das biociências, exclui o contexto psicos-
são pedidas pelo próprio estudante, de forma que ele é alvo social dos significados, dos quais uma compreensão plena e
de nossa atenção. Quando a solicitação ocorre através dos adequada dos pacientes e suas doenças depende. Uma efetivi-
profissionais (médicos, enfermeiros etc), sempre procuramos dade mais abrangente da prática depende desta compreen-
envolver o estudante que está estagiando na enfermaria. são.
Mais recentemente, através dos programas de ligação,
nosso profissional que atua nas enfermarias tem a oportuni- A Formação do Médico
dade de interagir de uma forma ampla e contínua com os A formação do médico está, preponderantemente, anco-
estudantes que realizam estágios nesses cenários. Esta situa- rada no modelo biomédico. Esta situação favorece a constru-
ção tem permitido um acesso privilegiado e oportunidades ção de uma postura de desconsideração aos aspectos psicos-
de aprofundamento muito amplas. O terceiro item é o que sociais tanto dele próprio quanto dos pacientes.
vou abordar de forma mais particularizada.
Já há vários anos os estudantes do 2º ano, como parte do O Modelo Biopsicossocial
programa de Psicologia Médica, apresentam ao final de cada A perspectiva que tem como referência o modelo biopsi-
semestre um trabalho realizado nos cenários de sua ativida- cossocial tem-se afirmado progressivamente. Ela proporcio-
de. O tema do trabalho do 1º semestre é o médico e a medi- na uma visão integral do ser e do adoecer que compreende as
cina num mundo em transformação; no segundo semestre: dimensões física, psicológica e social. Quando incorporada ao
A humanização das práticas em saúde aspectos favoráveis modelo de formação do médico coloca a necessidade de que o
e desfavoráveis do ambiente e das relações. Propostas de in- profissional, além do aprendizado e evolução das habilidades
tervenção para otimização dos recursos disponíveis. técnico-instrumentais, evolua também as capacidades relaci-
Os trabalhos envolvem a realização de observações, en- onais que permitem o estabelecimento de um vínculo ade-
trevistas e intervenções que procuram favorecer tanto o apren- quado e uma comunicação efetiva.
Cada pessoa é um universo muito amplo que é, em A linguagem verbal tem um conteúdo e um corpo. Este é
grande medida, desconhecido para a própria pessoa. denominado paralinguagem e se refere ao som ou à qua-
Você, da mesma forma, vai poder ter acesso somente a lidade de voz que acompanha a fala (altura, tom e rit-
uma parte muito pequena desse ser. mo). A paralinguagem revela muito sobre a situação
Lembre-se: que a pessoa que fala se encontra.
Todo contato produz ansiedade, seja em quem está en- Temos, ainda, a linguagem não-verbal que compreende
trevistando, seja em quem está sendo entrevistado. É as expressões, gestos, contato visual, posturas corpo-
importante que isto seja levado em conta, aceito e ob- rais etc. Tanto a paralinguagem como a comunicação
servado. não-verbal são cruciais no processo de comunicação. É
É útil, então, que você respeite o fato que todo encontro importante perceber as inconsistências entre os dados
entre pessoas desperta algum tipo de tensão. A tendên- verbais e os não-verbais. Estes costumam ser mais con-
cia, quando não há uma percepção adequada das an- fiáveis. Por exemplo, um paciente que diz que tudo está
gústias despertadas no encontro, é a pessoa ficar ar- bem, chorando ou com os olhos marejados, está lutan-
mada. do, tentando manter distantes as emoções que acabam
Os níveis de ansiedade que surgem em cada encontro por se manifestar através da linguagem não-verbal.
são variados e podem ser um indicador importante a
ser considerado. Características do Vínculo
A qualidade da comunicação é conseqüência do vínculo
Observando que se estabelece.
A observação exige, antes de tudo presença. Se você está As características do vínculo podem ter muitas descri-
presente fisicamente, mas sua atenção está ausente, ções, dependendo da perspectiva enfatizada e dos as-
voltada para seus pensamentos, lembranças etc., será pectos destacados.
impossível realizar uma observação adequada. Se você destacar, por exemplo, os aspectos de coopera-
Todos estamos carregados de imagens prévias, resulta- ção e competição, você pode observar se o que preva-
dos de uma série de experiências e também de nossas lece no vínculo é a cooperação ou a competição.
fantasias. Temos imagens sobre tudo e todos. É impor- Há algumas classificações mais gerais que agrupam as
tante, então, para realizar uma autêntica observação, qualidades do vínculo em categorias5. Por exemplo: vín-
não confundir as imagens com a pessoa real que está à culo paternalista, no qual os profissionais de saúde do-
sua frente. Por exemplo, a imagem que você tem de minam a agenda, objetivos e tomada de decisões a res-
um paciente pode ter muito pouca relação com o paci- peito tanto das informações quanto dos serviços. O pres-
ente que está na sua presença. suposto básico é que o profissional de saúde é o guar-
É útil, quando você está realizando observações, deter- dião, agindo no melhor interesse do paciente, a despei-
se a observar a forma como você está observando. to das preferências deste (este costuma ser o modelo de
Observar o que acontece com você, também pode ser vínculo mais prevalente); vínculo mutualista, no qual
muito útil. As impressões, sensações e emoções des- existe um balanceamento do poder, respeitadas as pe-
pertadas pelo contato podem ajudar, quando adequa- culiaridades de cada papel. Os objetivos, agenda e deci-
damente interpretadas, a perceber o que está se pas- sões relacionadas à consulta são resultado de negocia-
sando com a pessoa com a qual você está em contato e ção entre parceiros; paciente e profissional de saúde
qual a natureza do vínculo que está se estabelecendo. trabalham em associação, e o diálogo é o veículo atra-
vés do qual os valores do paciente são explicitamente
A Comunicação articulados e explorados. Através deste processo o pro-
É importante ter presente que a linguagem verbal é fissional de saúde atua como conselheiro ou orienta-
uma forma evoluída de comunicação, que funciona lado dor; vínculo consumerista ou consumista, no qual o mode-
a lado com outras formas mais primitivas (gestos, ex- lo mais típico de relação de poder entre profissional de
pressões corporais etc.) ou de natureza distinta (escrita, saúde e paciente está invertido. O paciente é que dita a
pintura, música etc.). agenda e os objetivos e assume a responsabilidade pela
A linguagem verbal é um instrumento que pode ser tomada das decisões. Este tipo de vínculo redefine o
usado tanto para revelar quanto para encobrir os fatos. encontro como uma transação de mercado.
O que Perguntar? ais. Da mesma forma, o modo como a pessoa vai lidar com a
As perguntas, evidentemente, são conseqüência do ob- doença e com o tratamento depende de todos estes fatores.
jetivo que você tem em mente. Se seu foco está voltado
para a investigação da doença, você deve ter um rotei- ROTEIRO DAS ENTREVISTAS
ro e conhecimentos que possibilitem relacionar sinto- Não existe uma forma correta e determinada de realizar
mas que aparentemente podem parecer não relaciona- uma entrevista. É importante que você tenha seu estilo pesso-
dos. al. A autenticidade é um grande facilitador do contato e da
Da mesma forma, quando o foco está voltado para a comunicação.
pessoa, você precisa ter um roteiro que ajude a focar Os roteiros e indicações são muitos úteis desde que você os
características de personalidade e vivências significati- utilize de acordo com a sua preferência e estilo.
vas. Neste campo, há alguns conhecimentos que são O roteiro é para servir como guia e não para escravizar.
intuitivos e experienciais, outros dependem de um pre- Se você ficar muito preso ao roteiro, vai mecanizar o processo
paro prévio. Por exemplo, você, pela sua própria vi- e prejudicar o contato e a relação. O roteiro é útil para ajudá-
vência, sabe que quando uma pessoa adoece tende a lo a ter presentes as informações relevantes que você precisa
ficar mais fragilizada emocionalmente. Você pode, en- obter.
tão, fazer perguntas e observações para verificar o quan- Existem algumas recomendações gerais que você pode
to a pessoa está fragilizada. considerar:
A ansiedade fica diminuída quando informação apro-
Como Perguntar? priada é fornecida. É importante que a pessoa saiba
Quanto ao conteúdo, existem perguntas que tendem a quem você é e ao que você está se propondo.
direcionar excessivamente e induzir as respostas ou Pode ser útil também não entrar intempestivamente
perguntas muito amplas que, quando em excesso, ten- nos assuntos que você tem interesse em abordar, mas
dem a produzir dispersão e perda de objetividade. De que você faça um pequeno aquecimento da relação.
uma maneira geral, o ideal é se movimentar do mais Perguntas amplas, do tipo É aí, como vão as coisas?
amplo para o mais específico. podem ser úteis para proporcionar esse aquecimento
Quanto ao modo como é formulada a pergunta, vale do contato.
lembrar a piada que define chato como: o sujeito ao
qual você pergunta como vai e ele realmente responde. ROTEIRO 1 a entrevista com o paciente
Ou seja, existem perguntas que são feitas formalmente O objetivo desta entrevista é que você verifique com o
e que não são para serem efetivamente respondidas. É paciente os aspectos biopsicossociais relevantes que influenci-
importante, então, você ter presente se está pergun- aram sua constituição e seu adoecer. Para tanto, propomos o
tando formalmente ou está perguntado com um inte- seguinte roteiro:
resse real na resposta. Isto vai influenciar a qualidade
das respostas que você vai obter.
Procure evitar perguntas fechadas, pois, geralmente as
respostas, não são significativas. Por exemplo, se você
pergunta: você está informado sobre sua doença? A res-
posta seja afirmativa ou negativa vai fornecer informa-
ção irrelevante. É mais proveitoso perguntar, por exem-
plo, que informações você já tem sobre sua doença?
Perguntas sobre a vida pessoal podem despertar an-
gústias tanto nos pacientes como nos profissionais. Uma
forma de defesa comum em relação a essa situação é
pra que ele está me perguntando isto?
I. Identificação
Nome: Procedência:
Idade: Sexo: Estado Civil: Profissão:
Naturalidade: Nacionalidade:
A. O adoecer
1. O paciente
2. A família
3. O trabalho
4. O grupo social
Características de sua inserção social (familiares, amigos, grupos comunitários, grupos religiosos).
Como o contexto social reagiu à doença.
Atuação da rede de apoio social frente à situação (familiares,amigos, grupos comunitários, grupos religiosos.
5. Os profissionais de saúde
Relacionamento com os médicos (sabe quem é o médico ou médicos que o acompanha? Se sente bem atendido?
Adequadamente informado quanto ao seu estado e aos procedimentos? Participa das decisões sobre a condução de seu
tratamento?).
Relacionamento com os outros profissionais de saúde (mesmos quesitos, quando pertinente).
6. O ambiente hospitalar
B. Antecedentes
1. História de vida
Família de origem.
História desde sua concepção até o momento atual.
Acontecimentos que marcaram sua vida e razões por que marcaram.
2. História da profissão
Escolha da profissão.
Formação profissional.
Diferentes empregos e características de sua vida profissional (relacionamento com patrões, com colegas, satisfação com
o trabalho etc.)
Condição financeira.
3. História social
I. Identificação
Nome: Procedência:
Idade: Sexo: Estado Civil: Profissão:
Naturalidade: Nacionalidade:
Considera importante conhecer o paciente e sua história ou considera mais vantajoso centrar-se exclusivamente na
doença? Por quê?
Costuma dar atenção às reações emocionais do paciente frente ao adoecer? Quais as que observa com mais freqüência?
Como lida com essas situações?
2. A condução
O que pensa e como procede quanto a manter o paciente informado sobre as suas condições e a condução do tratamento?
O que pensa e como procede quanto a informar o paciente sobre os procedimentos que estão sendo ou serão realizados?
Considera importante que o paciente participe das decisões do tratamento? Por quê?
3. O vínculo
Como tem vivenciado e o que pensa sobre a questão da fragmentação dos cuidados (vários especialistas cuidando do
mesmo paciente)?
Qual a forma de contato que mantém com os outros profissionais que participam da assistência ao paciente?
Como costuma manejar a alta (orientações quanto aos procedimentos, tratamento e medidas de reabilitação) e o
encaminhamento do paciente?
6. Cuidados paliativos
Como costuma proceder e reagir frente a situações nas quais só são possíveis cuidados paliativos?
7. A morte
8. Os dilemas éticos
Quais os dilemas éticos mais comuns e/ou importantes que verifica na prática profissional?
Ocorreu algum preparo para lidar com estas situações? Como ocorreu este preparo?
Considera importante o médico estar preparado para lidar com estes dilemas? Como deveria ocorrer este preparo?
1. As capacidades
Considera importante que o profissional de saúde seja preparado não só em termos de habilidades técnico-instrumen-
tais, mas também em suas capacidades relacionais? Por quê?
Em caso afirmativo, quais capacidades relacionais considera importantes que o profissional de saúde utilize e evolua para
um desempenho mais apropriado de sua função?
2. As condições
Quais condições (ambiente, horários, volume de trabalho, relacionamento entre profissionais etc.) você tem percebido
como prejudiciais ao seu exercício profissional? Por quê?
Tem conhecimento da descrição da síndrome do burn-out? Através de que meios?
Já observou essa situação na prática? Em que circunstâncias?
3. A equipe
Como tem sido seu funcionamento na equipe multiprofissional (médicos, enfermeiros, psicólogos, assistentes sociais,
terapeutas ocupacionais etc.)
Qual a importância que atribui ao funcionamento em equipe?
4. A educação continuada
De que formas você tem-se mantido atualizado para o exercício de sua atividade?
Que outros recursos considera que poderiam ser úteis? Por quê?
CONCLUSÃO REFERÊNCIAS
Dentro de nossa proposta de que o aluno de graduação 1. DeMarco MA. A face humana da medicina do modelo
seja alvo e instrumento de transformação da atenção em saú- biomédico ao modelo biopsicossocial. São Paulo: Editora
de, visando à incorporação de uma atenção integral e integra- Casa do Psicólogo; 2003.
da, característica do modelo biopsicossocial, temos desenvol- 2. Ferrari H, Luchina N, Luchina IL. La interconsulta médico-
vido uma série de ações e atualmente estamos introduzindo, psicológica en el marco hospitalario. Buenos Aires:
para ser testado e avaliado, um instrumento que orienta a Ediciones Nueva Visión; 1971.
observação e as ações a partir desse modelo. 3. Brasil. Ministério da Saúde. Disponível em: http://
Tal instrumento foi estruturado de forma a fornecer in- www.portal.saude.gov.br/saude/area.cfm?id_area=386
formações básicas ao aluno para nortear suas observações e
4. Nogueira-Martins LA. Consultoria psiquiátrica e psicoló-
as entrevistas. As entrevistas pretendem, além de introduzir
gica no hospital geral: a experiência do Hospital São Paulo.
o aluno à prática desta postura, estimular a reflexão dos en-
Revista ABP-APAL, 1989; 11, 160-164.
trevistados para as questões relevantes enfatizadas pela pers-
pectiva biopsicossocial. 5. Roter Debra. The enduring and evolving nature of the
Esta forma de articular o ensino da graduação procura patientphysician relationship. Patient Education and
Counseling. 2000; 39 (1): 5-15
colocar o aluno na perspectiva que temos denominado de
dupla-face de sua função, na medida em que este é alvo e agen-
te do processo de educação continuada e transformação insti- Endereço para correspondência
tucional. Rua Loefgreen, 2381/92
04040-033 São Paulo SP
e-mail: mdemarco@psiquiatria.epm.br