Cristaos-Novos em Sao Goncalo Inquisicao
Cristaos-Novos em Sao Goncalo Inquisicao
Cristaos-Novos em Sao Goncalo Inquisicao
São Gonçalo
2018
JADSON RAMOS DE QUEIROZ
São Gonçalo
2018
A minha amada e companheira de todos os
momentos… Perla Klícia.
AGRADECIMENTOS
A professora Daniela Calainho pela imprescindível ajuda para a realização deste trabalho,
pois sem o seu apoio não conseguiria.
A professora Célia Tavares pela fundamental contribuição na finalização deste trabalho,
pelas aulas de História Moderna e especialmente a colaboração no “Seminário Sobre os
500 anos da Reforma Protestante” realizado neste campus em outubro de 2017.
Ao professor Carlos Mauro pela confiança em mim depositada ao longo da graduação.
Ao historiador gonçalense Luciano Tardock.
Ao jornalista e entusiasta pela história local, Jorge Nunes.
Aos amigos Ádamo, Ismael, Marcos Fontoura, Henderson, Pedro Rebelo e Daniela Akthar.
Aos demais amigos e colegas que de alguma forma colaboraram em minha jornada.
A minha companheira de todas as horas, aquela que está comigo em todos os momentos,
na alegria e na tristeza, na saúde e na doença… A minha amada esposa Perla Klícia.
Aquele que me amou primeiro, o Autor e Consumador da minha fé, que por sua graça e
misericórdia me sustenta em seus braços e em seus passos guio meu caminho: Jesus de
Nazaré.
“Um governo é tido por violento se pretende
dominar as almas e uma majestade soberana
parece agir injustamente contra os súditos e
usurpar seus direitos quando quer prescrever
a cada um o que admite como verdadeiro ou
rejeita como falso, e também que opiniões
devem mover sua alma para com Deus. Pois
tais coisas pertencem ao direito próprio de
cada um, um direito de que ninguém, ainda
que quisesse, pode se desapegar.”
(Baruch de Spinoza, 1670)
SUMÁRIO
Resumo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 07
Introdução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 08
Capítulo 3 - Criptojudaísmo
Considerações finais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 51
Fontes . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .54
Bibliografia. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .55
Anexos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .60
RESUMO
___________________
1 – MARCONDES, Danilo. Iniciação à História da Filosofia: dos pré-socráticos a Wittgenstein. Jorge
Zahar Ed. 13 Edição: Rio de Janeiro, 2010. Pág. 195
2 – SCRUTON, Roger. Espinosa. Editora UNESP: São Paulo, 2000. Pág 5
3 __________ Introdução à Filosofia Moderna: De Descartes a Wittestein. Zahar Editores: Rio de Janeiro,
1982. Pág. 55
4 – Os dados apresentados foram extraídos da Cronologia Política e Principais Fatos Biográficos In:
GUINSBURG, J.; CUNHA, Newton; ROMANO, Roberto(orgs). SPINOZA. Obra completa III: Tratado
Teológico-Político. Editora Perspectiva: São Paulo, 2014. Pág. 15 a 19.
5 – BRAUDEL, Braudel. Civilização Material, economia e capitalismo: séculos XV-XVIII. O tempo e o
mundo. Volume 3. Editora Martins Fontes: São Paulo, 2009. Pág. 168
Ainda que tenha sido um ambiente de tensões e que em certos momentos as
questões religiosas causaram conflitos, principalmente no período de guerra pelo domínio
da região, foi sob a administração holandesa que os judeus obtiveram liberdade religiosa
em terras brasileiras no período colonial e lá construíram mais de uma sinagoga.6
O que discorro neste trabalho não é sobre Spizona, nem sobre a Holanda, nem sobre
o período em que o nordeste brasileiro esteve sob o domínio holandês. O objeto dessas
descrições é traçar um paralelo entre alguns temas que aproximam Espanha, Portugal,
Brasil e Holanda entre o século XVII e XVIII, mas que ao mesmo tempo também os
distanciam largamente, e assim possamos compreender de forma mais ampla o contexto
histórico que faço a abordagem no trabalho.
A questão judaica é um tema que distancia essas regiões no quesito religioso,
nenhum judeu foi expulso da sinagoga pelos portugueses no Brasil colonial pelo simples
motivo das mesmas não existirem, nem judeu poderia haver. O Reino deveria ser composto
apenas por cristãos, ainda que pela imposição disto.
Desta forma, busquei traçar uma jornada começando pela conversão forçada dos
judeus na Espanha e em Portugal com o surgimento de uma nova categoria de cristão, os
cristãos-novos, motivo este que os levou as práticas secretas, ou criptojudaísmo. Passando
pela instituição da Inquisição na península ibérica no período Moderno, apesar de estar
fundamentada na Idade Média, e a prática do criptojudaísmo no Brasil no capítulo 1.
Para contextualizar o período estudado o capítulo 2 é dedicado a uma apresentação
das características do Rio de Janeiro e São Gonçalo entre o século XVII e XVIII.
No capítulo 3 encontra-se o perfil dos cristãos-novos na capitania do Rio de Janeiro
e na freguesia de São Gonçalo dentro do período em questão, e as suas possíveis práticas
criptojudaicas. Por fim, uma análise do processo de Diogo Bernal da Fonseca, um lavrador
de cana da fazendo Colubandê, local este que pertencia a uma família de cristãos-novos
que foram presos e sentenciados pelo Santo Ofício, na busca dos indícios de que poderia
ser ele um praticante do judaísmo, e características que essas práticas poderiam revelar
uma circularidade cultural.7
___________________
6 – Sobre o período do domínio holandês no nordeste ver: MELLO, Evaldo Cabral de. O Brasil
Holandês(1630-1654). Penguin & Companhia das Letras: São Paulo, 2010. Para a questão dos judeus nesse
período ver: VAINFAS, Ronaldo. Jerusalém Colonial: Judeus portugueses no Brasil Holandês. Civilização
Brasileira: Rio de Janeiro, 2010.
7 - GINBURG, Carlo. O Queijo e os Vermes: o cotidiano e as ideias de um moleiro perseguido pela
Inquisição. Companhia da Letras: São Paulo, 2006.
____ O inquisidor como antropólogo. São Paulo: Revista Brasileira de História, V.1 nº 21, 1990.
Cap. 1 Inquisição moderna na União Ibérica
__________
8 - NOVINSKY, Anita Waingort. A Inquisição. 6 Ed. Editora Brasiliense: São Paulo. p.31
9 - Ibidem. p.25
10 - SCHAMA, Simon. A História do Judeus: À procura das palavras 1000 a.c – 1492 d.c. Companhia das
Letras: São Paulo, 2013. p.295
11 - Ibidem. p.296
12 - Ibidem. p. 297
se ‘anussim’ (conversos forçados) que, cercados de hostilidades,
receberam a denominação pejorativa de ‘marranos’ (porcos). De
acordo com a lei judaica, as conversões forçadas não eram válidas.
Para os judeus, os conversos continuavam judeus, com as portas
sempre abertas para o retorno.”13.
__________
13 - NOVINSKY, Anita Waingort(et al). Os Judeus que Construíram o Brasil: Fontes inéditas
para uma nova visão da história. São Paulo: Planeta do Brasil, 2015. p. 39
14 - Ibidem. p.40
15 - Ibidem. p.409.
16 - SCHAMA, Simon. A História do Judeus: À procura das palavras 1000 a.c – 1492 d.c. Companhia das
Letras: São Paulo, 2013. p.314-315
Não há um consenso quanto ao número de judeus que emigraram da Espanha, as
cifras variam desde 90 mil até 180 mil a depender da fonte 17. Dentre os lugares que os
judeus se dirigiram destaca-se que a maioria foi para Portugal pensando ser a melhor
opção, ou talvez por falta desta. O caráter político e econômico que se apresentou a
instauração da Inquisição moderna na Espanha, que tem como pano de fundo os momentos
finais da expulsão dos mouros da península ibérica que levam a derrocada dos cofres
espanhóis, tem permitido a alguns autores entender o papel da Igreja Católica como uma
entidade apenas legitimadora das ações da monarquia espanhola, e não coautora, e até
certo ponto refém desta para manter a unidade da Igreja.
Como é apontado por João Bernardino Gonzaga:
Deslocar-se para Portugal tornou mais viável quando o rei Português, D. João II,
lhes ofereceu a possibilidade de permanência naquele reino com o pagamento de uma taxa
por pessoa. As circunstâncias difíceis que os judeus se encontraram na Espanha levou
muitos a conversão forçada. Os que optavam pela saída não poderiam levar os bens
valiosos, tiveram que vendê-los e se arriscarem pelos mares ou pelo perigo das estradas.
__________
17. op. cit. NOVINSKY… p.41
18. GONZAGA, João Bernardino. A Inquisição em seu mundo. 4 Ed.Editora Saraiva: São Paulo, 1993. p.179
Essa posição já era apontada por Joaquim Mendes dos Remédios: “deve-se atender-se a que o Papa queria
salvar a unidade da fé ameaçada pelo rei, e aspirava a ter o apoio de todos os príncipes cristãos contra os
sarracenos.” In: Os Judeus em Portugal: Vicissitudes da sua história desde a época em que foram expulsos
até à extinção da Inquisição. Coimbra Editorial: Coimbra, 1928.
A alegria de alcançar um refúgio se tornou em pesadelo, pois em Portugal “os
judeus foram enganados pelo rei, que não os ajudou com as embarcações e vendeu os
pobres como escravos”19. Além de ter enviado as crianças para povoarem a ilha de São
Tomé20.
Segundo Martin Page, D. João II teria concedido a residência permanente apenas
para 600 judeus, os demais receberam vistos de trânsito. Sua afirmativa tem por base as
palavras do rabino David Fintz Altabé, para este a restrição do monarca para os judeus
vindos da Espanha foi decorrente de exigências da própria comunidade judaica Entretanto,
estabelecida em Portugal, “os líderes da comunidade judaica, em Lisboa, receavam que no
caso de a todos ser permitida a estada permanente, um grande fluxo de judeus espanhóis
perturbasse o equilíbrio social”21.
____________________
19 - NOVINSKY, Anita Waingort. Os Judeus que Construíram o Brasil: Fontes inéditas para uma nova
visão da história. São Paulo: Planeta do Brasil, 2015 p.41
20 - SCHAMA, Simon. A História do Judeus: À procura das palavras 1000 a.c – 1492 d.c. Companhia das
Letras: São Paulo, 2013. p.317
21 - PAGE, Martin. Portugal e a Revolução Global: Como um dos menores países do mundo mudou a nossa
história. Nova Fronteira: Rio de Janeiro, 2011. p. 211
1.2 Inquisição em Portugal
__________
22 - NOVINSKY, Anita Waingort. Os Judeus que Construíram o Brasil: Fontes inéditas para uma nova
visão da história. São Paulo: Planeta do Brasil, 2015 p.41
23 - REMEDIOS, Joaquim Mendes dos. Os Judeus em Portugal. Editor França Amador: Coimbra, 1985.
p.332
24 - NOVINSKY, Anita Waingort. A Inquisição. 6 Ed. Editora Brasiliense: São Paulo. p.34
25 - HERCULANO, Alexandre. História da Origem e Estabelecimento da Inquisição em Portugal. Fonte
digital: Biblioteca Digital, 2009. p.109
26 - NOVINSKY… Op. Cit. p.43
27 - HERCULANO… Op. Cit. p.103
Vê-se que o perigo para os cristãos-novos eram mais advindos por parte da
população do que por parte de D. Manuel, este tomou algumas ações que trouxeram
proteção aos conversos, principalmente quando proibiu os inquisidores de interrogar os
cristãos-novos sobre as “suas verdadeiras crenças durante um período de vinte anos”28.
Alexandre Herculano aponta que o prazo de vinte anos encerrava em 1518, mas foi
postergado por mais dezesseis anos, findando em 1534.29 Com a morte de D. Manuel em
1521 ascende ao trono D. João III, este passa a acusar aqueles que foram batizados a força
em 1497 de não serem verdadeiros cristãos. Desta forma inicia uma negociação com o
papa para a instalação de um Tribunal aos moldes do espanhol. 30 “Armou-se assim aberto
confronto entre Lisboa e Roma, com pressões políticas, manobras diplomáticas, atritos,
intrigas, acusações de corrupção, ameaças de cisma”.31
D. João III vence essa disputa, assim o monarca passa a controlar o Tribunal e
demonstra que o caráter de sua instauração era político e econômico. Desta forma:
__________
28 - PAGE, Martin. Portugal e a Revolução Global: Como um dos menores países do mundo mudou a
nossa história. Nova Fronteira: Rio de Janeiro, 2011. p 214
29 - HERCULANO… Op. Cit. p. 110
30 - NOVINSKY, Anita Waingort. A Inquisição. 6 Ed. Editora Brasiliense: São Paulo. p. 35
31 - GONZAGA, João Bernardino. A Inquisição em seu mundo. 4 Ed.Editora Saraiva: São Paulo, 1993.
p.228
32 - NOVINSKY, Anita Waingort. Os Judeus que Construíram o Brasil: Fontes inéditas para uma nova
visão da história. São Paulo: Planeta do Brasil, 2015 p. 43
33 - Ibidem. p.15
Criptojudaísmo
__________
34 - NOVINSKY, Anita Waingort. Os Judeus que Construíram o Brasil: Fontes inéditas para uma nova
visão da história. São Paulo: Planeta do Brasil, 2015 p. 53
35 - Ibidem. p. 95
36 - Ibidem. p. 95
37 - HERCULANO… Op. Cit. p.52
38 - SCHAMA… Op. Cit. p.304
fora do alcance dos inquisidores”39. A finalidade do Tribunal era verificar a autenticidade
da cristandade dos cristãos-novos, para isso os inquisidores não pouparam esforços.
Prisões e torturas durante o interrogatório faziam parte dos métodos que buscavam
arrancar a confissão de terem cometido o crime de judaísmo. Em Portugal esperava-se um
tratamento mais tolerante. Não obstante, lá também os judeus foram forçados a conversão
em 1497, porém ao tornarem-se católicos isso “não os tornou iguais aos cristãos nem lhes
conferiu os mesmos direitos”40. Além das designações anteriormente citadas sobre os
cristãos-novos na Espanha, em Portugal lhes atribuíam os termos “gente da nação” e
“homens de negócio”.
Da mesma forma que a Inquisição na Espanha visava os cristãos-novos, em
Portugal eles também eram o alvo principal. Acredita-se que aproximadamente “três
quartas partes das medidas repressivas recaíram sobre suas cabeças”41. O crime que mais os
cristãos-novos foram acusados foi o de judaísmo, esse era um crime contra a fé e de
natureza mais grave, as características que apareciam com mais frequência era a “guarda
dos sábados, não comer carne de porco, fazer jejum no chamado dia grande do perdão,
colocar roupa limpa nas camas e mesas nas sextas-feiras à noite, vestir as melhores roupas
nos dias santificados”42.
Proibidos de professar sua fé publicamente e obrigados a aceitar o catolicismo,
muitos judeus passaram a viver uma dualidade, pois poderiam expressar uma aparência
cristã mas em segredo manifestar e transmitir a sua verdadeira fé, principalmente no
âmbito familiar. Segundo João Lúcio D’Azevedo “os cristãos-novos compareciam as
cerimônias do culto das igrejas, e continuavam a exercer em casa os seus ritos
mosaicos[…] eram ao mesmo tempo judeus e católicos”43, desta forma “as cerimônias
judaicas eram observadas no mais íntimo de seus lares”44. Para Ângelo Adriano Faria de
Assis “muitos judeus continuaram, dentro das possibilidades – muitas vezes, ínfimas –, a
__________
39 - SCHAMA, Simon. A História do Judeus: À procura das palavras 1000 a.c – 1492 d.c. Companhia das
Letras: São Paulo, 2013.. p.310
40 - NOVINSKY, Anita Waingort. Os Judeus que Construíram o Brasil: Fontes inéditas para uma nova
visão da história. São Paulo: Planeta do Brasil, 2015 p. 95
41 - GONZAGA… Op. Cit. p.230
42 - NOVINSKY, Anita Waingort. A Inquisição. 6 Ed. Editora Brasiliense: São Paulo. p.77
43 - D’AZEVEDO, João Lúcio. História dos Cristãos-novos portugueses. Livraria Clássica Editora: Lisboa,
1922. p.57
44 - NOVINSKY, Anita Waingort. Os Judeus que Construíram o Brasil: Fontes inéditas para uma nova
visão da história. São Paulo: Planeta do Brasil, 2015 p.45
manter fidelidade à fé de Moisés, judaizando em segredo, em boa parte, em família, na
privacidade do lar”45. O autor também destaca a dubiedade vivida pelos cristãos novos:
__________
45 - ASSIS, Ângelo Adriano Faria de. Israel no trópico? Mulheres criptojudias e identidades religiosa s no
Brasil Colonial. São Paulo: Revista Cadernos de língua e literatura hebraica, nº10, 2012. p. 199
46 - ASSIS, Ângelo Adriano Faria de. Uma Família Criptojudaizante nas Garras da Inquisição. Rio de
Janeiro: Revista Acervo, v. 16, no 2, jul/dez 2003. p. 110
47 - ROWLAND, Robert. Cristãos-novos, marranos e judeus no espelho da Inquisição. Rio de Janeiro:
Revista Topoi, v. 11, n. 20, jan.-jun. 2010, p.174
48 - NOVINSKY, Anita Waingort. Os Judeus que Construíram o Brasil: Fontes inéditas para uma nova
visão da história. São Paulo: Planeta do Brasil, 2015 p.98
Muitas vezes Moisés era confundido com Jesus, e a rainha Ester com Nossa Senhora” 49, ou
seja, ocorria uma “diluição e contaminação da tradição original” 50, configurando um
caráter heterodoxo a sua crença.
Espalhados por topo o território da colônia portuguesa na América, os cristãos-
novos fizeram parte do povoamento brasileiro, formando comunidades de praticantes dos
ritos e cerimônias judaicas de forma secreta, “na Paraíba, por exemplo, havia uma
importante comunidade criptojudia, constituída principalmente por lavradores de cana”51.
Antes da inquisição portuguesa alcançar as terras brasileiras os cristãos-novos eram
portadores de uma certa liberdade, como é o caso da família Antunes na Bahia que “na
região de Matoim formou uma significativa comunidade de criptojudeus[…] a família
mantinha em seu engenho do Matoim uma ‘esnoga’, onde reuniam amigos para realizar as
cerimônias judaicas”52. Essa situação passa a ser alterada a partir de 1591 com o envio do
Licenciado Heitor Furtado de Mendonça para realizar a primeira visitação do Santo Ofício
no Brasil. Ainda assim os que eram identificados como judeus continuariam compondo
uma parcela considerável da população. Um viajante francês, François Froger, no ano de
1695 em passagem pelo Brasil relata que a colônia portuguesa “conta com mais de três
quartos de judeus entre a sua população”53.
Desta forma, a dualidade vivida pelos cristãos-novos em Portugal passa a
configurar a realidade dos cristãos-novos residentes no Brasil. A manutenção e
continuidade religiosa da fé judaica se dava de forma secreta, no interior dos lares, muitas
vezes tendo na figura da mulher o papel de ensinadora. Mas também encontra-se homens
que tinham o papel de instruir, como era o caso de João Soares Pereira, morador de São
Gonçalo, conhecido por “ensinar os segredos da Lei Velha” 54. Outro fator que resguardava
essa continuidade eram os casamentos entre familiares, criando desta forma uma rede de
relacionamentos que contribuía para a transmissão da tradição judaica.
__________
49 - NOVINSKY… Op. Cit. p.97
50 - ROWLAND… Op. Cit. p.182
51 - NOVINSKY, Anita Waingort. A Inquisição. 6 Ed. Editora Brasiliense: São Paulo. p.80
52 - NOVINSKY, Anita Waingort. Os Judeus que Construíram o Brasil: Fontes inéditas para uma nova
visão da história. São Paulo: Planeta do Brasil, 2015 p.125
53 - FRANÇA, Jean Marcel Carvalho. Visões do Rio de Janeiro Colonial: antologia de textos(1531-1800). 3
ed. José Olympio: Rio de Janeiro, 2008. p.63
54 - DINES, Alberto. Vínculos do Fogo: Antônio José, o Judeu, e outras histórias da inquisição em Portugal
e Brasil. Companhia das Letras: São Paulo, 1992. p.389
Cap. 2 O Rio de Janeiro ente final do século XVII e início do XVIII
“Essa produção diversificada era garantida, por sua vez, não só pelas
propriedades rurais do recôncavo da Guanabara, mas também pelas
chácaras que existiam no entorno imediato da cidade e que se
voltavam para o abastecimento dessa. As chácaras produziam
mandioca, frutas e legumes e se beneficiavam da proximidade do
mercado urbano.”57
___________
55- SAMPAIO, Antônio Carlos Jucá de Sampaio. Fluxos e Refluxos Mercantis: Centros, periferias e
diversidade regional. In: FRAGOSO, João Luis Ribeiro e GOUVÊA, Maria de Fátima(Org). O Brasil
Colonial(1580-1720).Vol. 2. Civilização Brasileira: Rio de Janeiro, 2014. pp.383
56- Ibidem. ALMEIDA, Carla Maria Carvalho de e OLIVEIRA, Mônica Ribeiro de. pp. 281
57- Ibidem. SAMPAIO, Antônio Carlos Jucá de... Pág. 393
58- Ibidem. COSENTINO, Francisco Carlos. Mundo Português e Mundo Ibérico. pp.147
Após a Restauração interna a Coroa tem como desafio a restauração do nordeste
brasileiro que estava sob domínio holandês(1630-1654). Com a saída dos holandeses do
nordeste o império português enfrentará outras dificuldades conforme aponta o historiador
Arno Wehling:
Uma das medidas adotadas pela Coroa para enfrentar esse problema foi o incentivo
à busca pelo ouro. Os bandeirantes receberam cartas do rei em apoio as suas expedições até
que em 1695 são encontrados os primeiros vestígios do precioso metal60, o que afeta de
maneira exponencial não apenas a dinâmica colonial como um todo, mas também a
capitania do Rio de Janeiro. Em decorrência dessa descoberta o historiador Charles Boxer
denomina o novo momento que a Coroa viverá de renascimento econômico:
__________________
59- WEHLING, Arno. Formação do Brasil Colonial. Rio de janeiro: Nova Fronteira, 1994. pp.109
60- Ibidem. Pág. 117
61- BOXER, Charles R. O Império Colonial Português(1415-1825)...Pág.159
62- Op. Cit. ALMEIDA, Carla Maria Carvalho de e OLIVEIRA, Mônica Ribeiro de. pp.267
Inserido nessa nova dinâmica encontra-se a capitania do Rio de Janeiro tendo em
seu porto um importante escoadouro do metal, bem como de grande fluxo de pessoas que
desejavam chegar a área das Minas quando vinham pelo mar, principalmente após a
abertura de um novo caminho até a região aurífica, ainda em finais do século XVII63.
A partir de então a política e a economia fluminense passariam por uma transição
em que a elite local caracterizada pelas “melhores famílias da terra”, pelos “principais da
terra” ou ainda pela “nobreza da terra”64 com uma economia calcada na agroexportação
agora se caracteriza por uma elite mercantil, baseada no comércio. Conforme é apontado
pelo historiador João Fragoso, partindo de um estudo de caso demonstra que ocorreu uma
“transição entre o domínio econômico da nobreza da terra para os grandes negociantes”.65
Porém, a descoberta do ouro não trouxe apenas benesses ao território fluminense,
juntamente vieram algumas dificuldades. A euforia pela corrida em achar mais ouro
relegou uma escassez da mão de obra, bem como a cobiça dos estrangeiros e as tentativas
de colocar as mãos nas riquezas portuguesas no território americano se intensificaram.
Sobre o primeiro ponto, segundo as análises do historiador João Fragoso não
apenas aqueles que a terra a abandonaram e se dirigiram a região das minas, mas também
os proprietários de terras se lançaram em busca da riqueza que o ouro poderia lhe
proporcionar.
__________
63- ALMEIDA e OLIVEIRA apontam que houve uma disputa entre Bahia e Rio de Janeiro para administrar
a região das Minas e a construção dessa estrada, iniciada em 1698, consolidou a posição do capitão-geral do
Rio de Janeiro como administrador da região. Porém em 1702, a área passou a ser gerida diretamente pela
Coroa. Op. Cit. pp. 302-303
64- “Era com esse título, ‘as melhores famílias da terra’ ou ‘principais da terra’, que os descendentes dos
conquistadores e dos primeiros povoadores gostavam de ser reconhecido pela sociedade colonial.[…] no Rio
de Janeiro, a expressão nobreza da terra estaria ligada à antiguidade da família no exercício do poder político-
administrativo da cidade e à descendência dos conquistadores.” FRAGOSO, João. A formação da economia
colonial no Rio de Janeiro e de sua primeira elite senhorial(Séculos XVI e XVII). In: FRAGOSO, João;
BICALHO, Maria Fernanda e GOUVÊA, Maria de Fátima(Org). O Antigo Regime nos Trópicos: A dinâmica
imperial portuguesa(Séculos XVI-XVIII). Civilização Brasileira: Rio de Janeiro, 2001. Pág. 51
65- Ibidem. Pág. 68
66- FRAGOSO, João. A formação da economia colonial no Rio de Janeiro e de sua primeira elite
senhorial(Séculos XVI e XVII). In: FRAGOSO, João; BICALHO, Maria Fernanda e GOUVÊA, Maria de
Fátima(Org). O Antigo Regime nos Trópicos: A dinâmica imperial portuguesa(Séculos XVI-XVIII).
Civilização Brasileira: Rio de Janeiro, 2001. Pág. 69
Essa situação fez com que as autoridades efetivassem algumas providências, porque
não apenas acontecia a ida voluntária para as minas, a compra de escravos pelos paulistas
em terras fluminenses também contribuía para agravar o quadro. A fim de evitar o colapso
da economia as autoridades realizaram algumas ações:
E é no início do século XVIII que acontece uma das invasões mais emblemáticas
para os cariocas. Em 1711, sobre o comando de Duguay-Trouin, os franceses saqueiam o
Rio de Janeiro causando um enorme prejuízo. Para o comandante francês a cidade do Rio
de Janeiro era uma das mais ricas e importantes do Brasil. 70 A invasão dos corsários
franceses foi financiada com capital privado e estatal, sendo constituída da seguinte forma:
“A frota francesa, composta por 15 velas, levou uma hora para entrar
na embocadura do rio e, duas horas depois, lançou âncora no lugar
mais seguro do porto. No dia seguinte, o almirante Duguay-Trouin
desembarcou 3.500 soldados, dividindo-os entre a pequena ilha, de um
lado da cidade, e a terra firme, do lado oposto. Assim distribuídos, os
__________
69- BICALHO, Maria Fernanda. A Cidade e o Império: O Rio de Janeiro no século XVIII. Civilização
Brasileira: Rio de janeiro, 2003. Pág. 40
70- Ibidem Pág. 43
71- Ibidem. Pág. 44
franceses atacaram os oito fortes portugueses. Quanto a nós não
tivemos tempo nem de levantar âncora[...] os portugueses renderam-se
após oito dias de bombardeamento e deixaram a cidade, repleta de
ouro e prata a mercês do inimigo[…] No dia 11 de setembro, os
franceses tomaram a cidade e no dia seguinte a saquearam. Eles
ameaçaram transformá-la num amontoado de entulhos, mas os
portugueses conseguiram evitar essa tragédia pagando a soma de 15
mil libras.”72
Interessante notar que o relato dos estrangeiros de passagem pelo Brasil nos
permitem compreender melhor como funcionava a sociedade colonial. No caso de Jonas
Fink não apenas apresenta o ataque dos franceses ao Rio de Janeiro, mas também descreve
algumas características da vida carioca do início do século XVIII. Como por exemplo a sua
observação sobre a escravidão em que é descrito que “há cerca de 8 mil escravos negros na
cidade, todos vivendo em condições miseráveis”.73
Porém, a informação de maior valia para esta pesquisa é o seu relato sobre a
inquisição e o embarque de prisioneiros para lisboa que o mesmo presencia:
__________
72- FRANÇA, Jean Marcel Carvalho. Visões do Rio de Janeiro Colonial: Antologia de textos(1531-1800).
José Olympio: Rio de Janeiro, 2008. Pág. 89,90 e 91.
73- Ibidem. Pág. 88
74- Ibidem Pág.87
“Seus habitantes são limpos e de uma circunspecção comum aos de
sua nação; são ricos e apreciam muito o comércio. Em geral, são
possuidores de numerosos escravos e de famílias inteiras de índios,
mantidas a contragosto nos engenhos. Os escravos ocupam-se da
quase totalidade dos trabalhos da casa, o que torna os habitantes moles
e efeminados, ao ponto de serem incapazes de se abaixar para apanhar
alfinete.”75
Sobre as plantações:
As profundas mudanças que ocorrem a partir do final do século XVII tornam o Rio
de Janeiro um lugar estratégico superior a então capital Salvador.78
____________________
76- FRANÇA, Jean Marcel Carvalho. Visões do Rio de Janeiro Colonial: Antologia de textos(1531-1800).
José Olympio: Rio de Janeiro, 2008. Pág. 64
76- Ibidem. Pág.66,67 e 68
77- Ibidem. Pág. 81
78- SAMPAIO, Antônio Carlos Jucá de Sampaio. Os Homens de Negócio do Rio de Janeiro e sua Atuação
nos Quadros do Império Português(1701-1750). In: FRAGOSO, João; BICALHO, Maria Fernanda e
GOUVÊA, Maria de Fátima(Org). O Antigo Regime nos Trópicos: A dinâmica imperial portuguesa(Séculos
XVI-XVIII). Civilização Brasileira: Rio de Janeiro, 2001. Pág. 75
Como consequência da importância que a capitania fluminense passa a ter ao longo
do século XVIII ocorre a transferência da capital para o Rio de Janeiro em 1763, ainda que
geograficamente mais distante, em um período no qual Portugal estava sob administração
do Marquês de Pombal, primeiro-ministro de José I(1750-1777), quando é realizado um
conjunto de reformas administrativas. Desta forma:
Mas algo que não sofre alteração são as relações de domínio em uma sociedade
alicerçada em uma hierarquia social aguda, como é o caso da manutenção do poder por
uma elite local que mantêm sua dominação baseada na sociedade característica do Antigo
Regime.
__________
79- KIRSTEN, Schultz. Versalhes Tropical: Império, monarquia e a Corte real portuguesa na Rio de
janeiro(1808-1821). Civilização Brasileira: Rio de Janeiro, 2008. Pág. 49
80- LARA, Sílvia Hunold. Fragmentos setecentistas: escravidão, cultura e poder na América portuguesa.
Companhia das Letras: São Paulo, 2007. Pág. 84
81- Ibidem. Pág. 100
“Os brancos vestem-se com tecidos pesados. A gente comum usa um
casaco e um amplo manto com o qual cobrem todo o corpo e até
mesmo o rosto[…] os oficiais de Justiça se distinguem por um bastão
ou por uma bengala[…] os oficiais subalternos carregam o mesmo
adereço preso no bolso esquerdo da vestimenta[…] os doutores em
teologia, direito e medicina usam, geralmente, óculos sobre o nariz
para se fazerem respeitar pelos passantes. Os escravos são, na sua
maioria, muito sujos. Os homens andam quase nus, vestidos somente
com um calção[…] as mulheres vestem saia e um tipo de camisa
parecida com as nossas camisas de homem, cuja parte da frente é
aberta e ligada por um colete. Elas não ousam aparecer na rua durante
o dia[…] um marido jamais caminha ao lado de sua esposa na rua. Ele
segue alguns passos à frente, sempre com a sua espada à mostra sob o
manto.”82
A frase “para se fazerem respeitar pelos passeantes” nos esclarece muito bem o
efeito causado pelos signos atribuídos a cada classe e que reforçam a posição de cada
indivíduo nesta sociedade. Cada objeto, cada adereço e o lugar deles são marcadores de
uma “ostentação pública do lugar ocupado por cada um e de suas prerrogativas”.83
Essa percepção sobre o quanto se distinguiam as classes também é apontada pelo
historiador A.J.R. Russell-Wood:
Em suma, o Rio de Janeiro do final do século XVII até meados do XVIII passa
substanciais rupturas em sua economia administração política, entretanto, o seu caráter
social é uma continuidade no que se refere a disparidades entre as classes sociais.
____________________
82- FRANÇA, Jean Marcel Carvalho. Visões do Rio de Janeiro Colonial: Antologia de textos(1531-1800).
José Olympio: Rio de Janeiro, 2008. Pág. 131-132
83. LARA, Sílvia Hunold. Fragmentos setecentistas: escravidão, cultura e poder na América portuguesa.
Companhia das Letras: São Paulo, 2007. Pág. 86
84- RUSSELL-WOOD, A.J.R. Escravos e libertos no Brasil Colonial. Civilização Brasileira: Rio de Janeiro,
2005. Pág.22
2.2 Freguesia de São Gonçalo
Os que recebiam as terras nem sempre tomavam posse da mesma, ou as vezes não
tinham os recursos suficientes, tendo em vista o alto investimento que era até que a mesma
se tornasse próspera. Poderia ocorrer a venda ou arrendamento da terra, ou até mesmo a
doação para outro sesmeiro por parte da coroa portuguesa.
Dentre os que concretizaram a posse da terra estava Gonçalo Gonçalves, que
recebeu as seguintes terras no ano de 1579: “1000 braças de largo e 1500 de comprido em
Suasunhan no Porto de Birapitinga em 6 de Abril”.88
____________________
85 – ABREU, Maurício de Almeida. Geografia Histórica do Rio de Janeiro: 1502-1700. Rio de Janeiro:
Andrea Jakobsson Editorial e Prefeitura do Rio de Janeiro, 2010. Pág. 216
86 – CAETANO, Antonio Filipe Pereira. Entre a Sombra e o Sol – A revolta da cachaça, a Freguesia de
São Gonçalo de Amarante e a crise política fluminense(Rio de Janeiro, 1640-1667). Niterói: Universidade
Federal Fluminense, 2003. Dissertação de Mestrado Pág. 32
87 – ALMEIDA, Maria Regina Celestino de. Os ìndios Aldeados no Rio de Janeiro Colonial – Novos súditos
cristãos do Império Português. Universidade Estadual de Campinas: Campinas, 2000. Tese Doutorado
Pág.29
88 – PIZARRO e ARAUJO, José de Souza. Relação das Sesmarias da Capitania do Rio de Janeiro. Revista
Trimestral do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, Tomo LXIII, Parte I:Rio de Janeiro, 1901. Pág. 105
Segundo os historiadores Salvador Mata e Silva e Evadyr Molina:
Uma capela construída no território deste sesmeiro que foi dedica a São Gonçalo de
Amarante, que seria o santo devotado pelo mesmo, designará o topônimo desta região.90
____________________
89 – SILVA, Salvador Mata e, MOLINA, Evadyr. São Gonçalo no Século XVI. Rio de Janeiro: Companhia
Brasileira de Artes Gráficas, 1995. Pág. 61
90 – Ibidem. Pág. 61
91 – PIZARRO e ARAUJO, José de Souza. Memórias Históricas do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro:
Impressao Régia, Tomo III, 1820. Pág. 19
92 – “A freguesia, designação portuguesa de paróquia, é um território submetido à jurisdição espiritual de um
cura que também exerce a administração civil.” In: FRIDMAN, Fania. Freguesias fluminenses ao final do
setecentos. São Paulo: Revista do Instituto de Estudo Brasileiros, n.48, 2009. Pág. 95
93 – CAETANO, Antonio Filipe Pereira. Entre a Sombra e o Sol – A revolta da cachaça, a Freguesia de
São Gonçalo de Amarante e a crise política fluminense(Rio de Janeiro, 1640-1667). Niterói: Universidade
Federal Fluminense, 2003. Dissertação de Mestrado Pág. 101
Na tentativa de solucionar o problema a Coroa autorizou a escravidão indígena por
meio da “guerra justa”.94
O que acarretará na predominância da escravidão africana:
____________________
94 – COARACY, Vivaldo. O Rio de Janeiro do Século XVI. Rio de Janeiro: Livraria José Olympio Editora,
1965. Pág. 33-34, 95-98
95 – CARDOSO, Ciro Flamarion Santana. O Trabalho na Colônia. In: LINHARES, Maria Yedda(org).
História Geral do Brasil. Rio de Janeiro: Editora Campus, 1990. Pág.80
96 – Esse movimento foi amplamente discutido pelo historiador Antonio Filipe Pereira Caetano em duas
teses: Entre a Sombra e o Sol – A revolta da cachaça, a Freguesia de São Gonçalo de Amarante e a crise
política fluminense(Rio de Janeiro, 1640-1667) e Entre Drogas e Cachaças: A Política Colonial e as
Tensões na América Portuguesa (capitania do Rio de Janeiro e Estado do Maranhão e Grão-Pará, 1640-
1710).
97 – CAETANO, Antonio Filipe Pereira. Entre a Sombra e o Sol – A revolta da cachaça, a Freguesia de
São Gonçalo de Amarante e a crise política fluminense(Rio de Janeiro, 1640-1667). Niterói: Universidade
Federal Fluminense, 2003. Dissertação de Mestrado Pág. 119
privilégios de uma elite local98, tendo em vista o rompimento do pacto entre essa elite e a
administração que foi quebrado pelo seu representante, que na situação em questão era o
governador Salvador Correia de Sá e Benavides. Por isso uma das exigências era a
substituição do mesmo por um indivíduo que representasse essa elite.99
Desta forma nota-se a importância do engenho. Se não produzisse o item que era
tão valorizado na Europa, o açúcar, era produtor de um elemento secundário a economia
canavieira, a cachaça, ou aguardente.
_____________________
98 – “local” aqui não se restringe a freguesia de São Gonçalo, mas remete a relação entre colônia e
metrópole, ou seja, a relação entre elite fluminense e a Coroa portuguesa.
99 – CAETANO, Antonio Filipe Pereira. Entre a Sombra e o Sol – A revolta da cachaça, a Freguesia de
São Gonçalo de Amarante e a crise política fluminense(Rio de Janeiro, 1640-1667). Niterói: Universidade
Federal Fluminense, 2003. Dissertação de Mestrado Pág. 142-144
100 – LAMEGO, Alberto Ribeiro O Homem e a Guanabara. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística:
Rio de Janeiro, 1964. Pág. 198
101 – SILVA, Salvador Mata e, MOLINA, Evadyr. São Gonçalo no Século XVI. Rio de Janeiro: Companhia
Brasileira de Artes Gráficas, 1995. Pág 120
102 – SILVA, Salvador Mata e, MOLINA, Evadyr. São Gonçalo no Século XVIII. Rio de Janeiro:
Companhia Brasileira de Artes Gráficas, 1998. Pág. 137
Porém no final daquele século, a produção diminuiu consideravelmente. Bem como
a descoberta do ouro na última década do século XVII, acarretam em mudanças
significativas para os gonçalenses. Ainda que a produção açucareira tenha reduzido ela
permanece como fator importante para São Gonçalo no século XVIII. 103 O nome de alguns
engenhos que remontam esses séculos perpassaram o tempo e ainda sobreviveram, mesmo
com o encerramento de suas atividades. Muitos engenhos hoje denominam bairros do
município de São Gonçalo.
____________________
103 – SILVA, Salvador Mata e, MOLINA, Evadyr. São Gonçalo no Século XVIII. Rio de Janeiro:
Companhia Brasileira de Artes Gráficas, 1998. Pág.
104 – LAMEGO, Alberto Ribeiro O Homem e a Guanabara. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística:
Rio de Janeiro, 1964. Pág. 203
105 – Para uma discussão sobre o conceito de “redes sociais” ver: CUNHA, Mafalda Soares da. Redes
sociais e decisão política no recrutamento dos governantes das conquistas, 1580-1640. In: FRAGOSO, João
e GOUVÊA, Maria de Fátima(org.). Na trama das Redes: Política e negócios no império português, séculos
XVI-XVIII. Civilização Brasileira: Rio de Janeiro, 2010. Pág. 115-154
106 – SILVA, Lina Gorenstein Ferreira da. Heréticos e Impuros: A Inquisição e os cristãos-novos no Rio de
Janeiro(século XVIII). Secretaria Municipal de Cultura, Divisão de Editoração: Rio de Janeiro, 1995.
107 – NOVINSKY, Anita W.( et al). Os Judeus que Construíram o Brasil:Fontes inéditas para uma nova
visão da história. Planeta do Brasil: São Paulo, 2015.
Cap. 3 Criptojudaísmo
Jonas Fink era tipógrafo e missionário protestante alemão que estava de passagem
pelo Rio de Janeiro em 1711. O navio em que se encontrava o missionário saiu da
Inglaterra, passou pela costa da África, atravessou o oceano Atlântico e chegou em 17 de
agosto no Rio de Janeiro, mas seu destino seria a Índia. 109 Além de ter presenciado os
prisioneiros do Santo Ofício o navio que estava foi tomado pelos franceses quando da
invasão em 11 de setembro de 1711. Porém esta invasão trouxe vantagens para alguns dos
cristãos-novos citados por Fink:
__________
108 – FRANÇA, Jean Marcel Carvalho. Visão do Rio de Janeiro Colonial: Antologia de textos(1531-1800).
Editora José Olympio: Rio de Janeiro, 2008. Pág. 87
109 – Ibidem. Pág. 84-85
110 – Trecho do processo de Francisco Mendes Simões In: DINES, Alberto. Vínculos do Fogo: Antônio
José, o Judeu, e outras histórias da inquisição em Portugal e Brasil. Companhia das Letras: São Paulo, 1992.
p.709
111 – Ibidem. Pág. 715
Alberto Dines faz algumas indagações sobre o que poderia ocorrer com os cristãos-
novos que foram libertos pelos franceses:
O missionário alemão relatou uma situação num período em que a maioria dos
cristãos-novos presos no Brasil eram oriundos do Rio de Janeiro. Segundo Lina Gorenstein
“Cerca de 325 cristãos-novos foram presos no Rio de Janeiro nas primeiras quatro décadas
do século XVIII e enviados para Lisboa, onde foram julgados como hereges.” 113 De 1703 a
1740 foi o período em que houve mais prisões no Rio de Janeiro.114
Até final do século XVII poucos tinham sido os presos nas terras fluminenses, esse
quadro se altera de maneira exponencial no século seguinte conforme apontado pelo
historiador Ronaldo Vainfas:
__________________
112 - DINES, Alberto. Vínculos do Fogo: Antônio José, o Judeu, e outras histórias da inquisição em
Portugal e Brasil. Companhia das Letras: São Paulo, 1992. Pág. 705 e 707.
113 – SILVA, Lina Gorenstein Ferreira da. Cristãos-novos, identidade e Inquisição (Rio de Janeiro, século
XVIII). WebMosaica: revista do instituto cultural judaico Marc Chagall v.4 n.1: Porto Alegre, 2012. Pág. 40
114 – NOVINSKY, Anita W.( et al). Os Judeus que Construíram o Brasil:Fontes inéditas para uma nova
visão da história. Planeta do Brasil: São Paulo, 2015. Pág.148
115 – VAINFAS, Ronaldo. Santo Ofício em Terra Fluminense: Cristãos-novos e Inquisição no Rio de
Janeiro Colonial. Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, ano 177: Rio de Janeiro, abr/jun
2016. Pág.15-16.
“alguns foram os que souberam aproveitar o momento oportuno para o comércio com as
Minas, chegando mesmo a se estabelecer lá enquanto mantinham partidos no Rio de
Janeiro.”116Apesar da maioria dos cristãos-novos exercerem atividades agrícolas,117
senhores de engenho e lavradores, eles participavam de um vasto conjunto de atividades
profissionais que constituíam a sociedade colonial carioca. Quando os observamos:
____________________
116 – OLIVEIRA, Monique Silva de. Inquisição e Cristãos-novos no Rio de Janeiro: O caso da família
Azeredo(1701-1720). Dissertação de mestrado, Universidade Federal Fluminense: Rio de Janeiro, 2016.
Pág.110
117 - “Mais da metade dos cristãos-novos estava ligada a agricultura” In: NOVINSKY, Anita W. Os Judeus
que Construíram o Brasil: Fontes inéditas para uma nova visão da história. Planeta do Brasil: São Paulo,
2015. Pág.146
118 - CALAÇA, Carlos Eduardo. A Confissão Como um Dilema: Cristãos-novos letrados do Rio de Janeiro
– Século XVIII. Revista Antíteses, V.1 N.2.: Londrina, 2008. Pág.306
119 – VAINFAS, Ronaldo. Santo Ofício em Terra Fluminense: Cristãos-novos e Inquisição no Rio de
Janeiro Colonial. Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, ano 177: Rio de Janeiro, abr/jun
2016. Pág.30.
120 - “Havia homens de negócios, médicos e advogados, além de artesãos, mestres-escola, militares,
caixeiros, alfaiates, músicos, carpinteiros e padres.” In: NOVINSKY, Anita W. Os Judeus que Construíram
o Brasil: Fontes inéditas para uma nova visão da história. Planeta do Brasil: São Paulo, 2015. Pág.146
vam cumprir tais preceitos, evitando as suspeitas e desconfianças dos
católicos sinceros.”121
____________________
121 - OLIVEIRA, Monique Silva de. Inquisição e Cristãos-novos no Rio de Janeiro: O caso da família
Azeredo(1701-1720). Dissertação de mestrado, Universidade Federal Fluminense: Rio de Janeiro, 2016.
Pág.125
122 - SILVA, Lina Gorenstein Ferreira da. Cristãos-novos, identidade e Inquisição (Rio de Janeiro, século
XVIII). WebMosaica: revista do instituto cultural judaico Marc Chagall v.4 n.1: Porto Alegre, 2012. Pág. 47
123 - Ibidem. Pág. 41
124 - Ibidem. Pág. 44
125 - DINES, Alberto. Vínculos do Fogo: Antônio José, o Judeu, e outras histórias da inquisição em
Portugal e Brasil. Companhia das Letras: São Paulo, 1992. Pág. 421
a tradição judaica, este “cumpre fielmente os mandamentos: jejuns do Dia Grande, da
rainha Ester e o da Páscoa dos Cordeiros em memória da liberdade que teve o povo de
Israel.”126 Outro judaizante nas terras fluminenses é o médico João Nunes Vizeu: “chamado
à casa de Jerônima Gomes, muito doente e desacordada, teve práticas judaicas com a irmã
desta, Lourença Coutinha., mãe de Antônio José” no ano de 1704.127 Porém, o papel da
mulher era fundamental na manutenção e transmissão da cultura judaica. Segunda Lina
Gorenstein:
____________________
132 – Ibidem. Pág. 133
133 – SILVA, Lina Gorenstein Ferreira da. Cristãos-novos, identidade e Inquisição (Rio de Janeiro, século
XVIII). WebMosaica: revista do instituto cultural judaico Marc Chagall v.4 n.1: Porto Alegre, 2012. Pág. 43
134 – VAINFAS, Ronaldo. Santo Ofício em Terra Fluminense: Cristãos-novos e Inquisição no Rio de
Janeiro Colonial. Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, ano 177: Rio de Janeiro, abr/jun
2016. Pág.34
135 – NOVINSKY, Anita W.( et al). Os Judeus que Construíram o Brasil:Fontes inéditas para uma nova
visão da história. Planeta do Brasil: São Paulo, 2015. Pág. 16-17
136 – SILVA, Lina Gorenstein Ferreira da. Cristãos-novos, identidade e Inquisição (Rio de Janeiro, século
XVIII). WebMosaica: revista do instituto cultural judaico Marc Chagall v.4 n.1: Porto Alegre, 2012. Pág. 40
137 – SILVA, Lina Gorenstein Ferreira da. Heréticos e Impuros: A Inquisição e os cristãos-novos no Rio de
Janeiro(século XVIII). Secretaria Municipal de Cultura, Divisão de Editoração: Rio de Janeiro, 1995.
Pág.110
3.2 Terras da “banda d’além”
__________________
138 – CRULS, Gastão. Aparência do Rio de Janeiro. V. 1. Editora José Olympio: Rio de Janeiro, 1965.
Pág.15
139 – SILVA, Lina Gorenstein Ferreira da. Heréticos e Impuros: A Inquisição e os cristãos-novos no Rio de
Janeiro(século XVIII). Secretaria Municipal de Cultura, Divisão de Editoração: Rio de Janeiro, 1995. Pág. 59
140 – Ibidem. Pág. 62
141 – NOVINSKY, Anita W(et al). Os Judeus que Construíram o Brasil: Fontes inéditas para uma nova
visão da História. Planeta do Brasil: São Paulo, 2015. Pág. 148-149
Montesserrate, teria sido Catarina de Siqueira, mas parece que não teria ficado por muito
tempo com a posse do mesmo, pois logo o engenho teria sido vendido.
O último proprietário cristão-novo foi Duarte Rodrigues de Andrade 142. Quando do
falecimento deste, ficou a cargo da viúva, Ana do Vale, e seus filhos administrá-lo
conforme foi apontado por um deles, Manoel do Vale da Silveira, preso em 1710. Em seu
processo consta o seguinte:
___________________
142 – DINES, Alberto. Vínculos do Fogo: Antônio José, o Judeu, e outras histórias da inquisição em
Portugal e Brasil. Companhia das Letras: São Paulo, 1992. Pág. 386.
143 – Processo n° 4.166 In: NOVINSKY, Anita W. Inventários de Bens Confiscados a Cristãos-novos:
Fontes para a História de Portugal e Brasil. Imprensa Nacional: São Paulo, 1976. Pág. 212
144 – VIEIRA, Fernando Gil Portela. Os Calaças: Quatro gerações de uma família de cristãos-novos na
Inquisição(Séculos XVII-XVIII). São Paulo: Universidade de São Paulo, 2015. Tese Doutorado. Pág. 291
145 – DINES… Op. Cit. Pág. 387
Alberto Dines também aponta que os mesmos eram descendentes de Aboab da
Fonseca que teria fugida da perseguição espanhola e ido para Portugal mas teriam sidos
forçados a se batizar durante o reinado de D. Manuel.
O pai do citado Diogo Rodrigues Calaça, o já também citado senhor de engenho
João Rodrigues Calaça, preso em 1712, afirmou possuir um engenho em Itaúna que teria
sido saqueado pelos franceses na invasão de 1711.146 O mesmo Diogo também declara em
outra confissão que teria realizado jejuns judaicos:
Outro senhor de engenho de São Gonçalo que alega ter sido saqueado pelos
franceses em 1711 é João Dique de souza, preso em 1712. 148 Dono do engenho
denominado Vera Cruz é um dos casos mais emblemáticos no território gonçalense.
Vizinho da família Vale, viúvo e pai de três filhos: Diogo Duarte, Fernão e João Dique; e
seis filhas que foram para um convento em Portugal. 149 Foi o que teve a condenação mais
severa: Pena capital, ou seja, fogueira. Saiu no Auto de Fé de 14 de outubro de 1714.
____________________
146 – Processo n° 955 In: NOVINSKY, Anita W. Inventários de Bens Confiscados a Cristãos-novos:
Fontes para a História de Portugal e Brasil. Imprensa Nacional: São Paulo, 1976. Pág. 145
147 – VIEIRA, Fernando Gil Portela. Os Calaças: Quatro gerações de uma família de cristãos-novos na
Inquisição(Séculos XVII-XVIII). São Paulo: Universidade de São Paulo, 2015. Tese Doutorado. Pág. 312
148 – Processo 10.139 In: NOVINSKY, Anita W. Inventários de Bens Confiscados a Cristãos-novos:
Fontes para a História de Portugal e Brasil. Imprensa Nacional: São Paulo, 1976. Pág. 132.
149 – Ibidem. Pág. 133.
150 – DINES, Alberto. Vínculos do Fogo: Antônio José, o Judeu, e outras histórias da inquisição em
Portugal e Brasil. Companhia das Letras: São Paulo, 1992. Pág. 759
Os bens dos cristãos-novos novos presos pelo Santo Ofício eram confiscados
e leiloados. No caso de João Dique de Souza, o engenho Vera Cruz fora arrematado
por Félix Madeira Gusmão151. Os seus filhos tiveram penas menos rígidas: Cárcere e
hábito perpétuo.152
Alguns lavradores de cana cristãos-novos que tinham Partidos em São
Gonçalo também foram presos pelo Santo Ofício por culpas de judaísmo. O médico
Francisco de Siqueira Machado, homem letrado que estudou na Universidade de
Coimbra153, antes de embarcar em direção ao Reino teria sido instruído por sua avó,
Brites da Paz, a “obrar na Lei de Moisés, rezar o padre-nosso sem ‘Gloria Patri’,
fazer o jejum do Dia grande, o jejum da rainha Ester e do Pão Ázimo” 154, preso em
1708 disse “ter um partido de canas com quinze até dezoito escravos que nele
trabalham no engenho de Ana do Vale moradora no mesmo engenho” 155, neste
mesmo engenho ainda possuíam partidos o genro da dona, João Soares Mesquita, e
Diogo Bernal da Fonseca casado com Maria de Andrade, o irmão deste, João da
Fonseca Bernal também era lavrador em São Gonçalo.
Um dos filhos de Ana do Vale, Domingos Rodrigues Ramires, era
proprietário de um partido. No engenho do sentenciado João Dique possuíam partido
Luís Dique, seu filho, e João Henriques de Castro. 156 Outro lavrador de São Gonçalo,
Francisco Correia de Souza, apesar de denunciado não chegou a ser preso. 157 Nas
terras gonçalenses também encontrava-se um conhecido ensinador do judaísmo
chamado João Soares Pereira, envolvido com a família Vale por matrimônio com
Leonor Gomes da Costa.158
____________________
151 – DINES, Alberto. Vínculos do Fogo: Antônio José, o Judeu, e outras histórias da inquisição em
Portugal e Brasil. Companhia das Letras: São Paulo, 1992. Pág. 770
152 – Ibidem. Pág. 935, 939, 953. “Cárcere e hábito penitencial perpétuo significava que o réu, depois
de ficar encarcerado por determinado tempo nos cárceres da penitência da Inquisição, era obrigado a
usar o hábito penitencial, ou sambenito (espécie de capa com a cruz amarela de Santo André)
perpetuamente, e todos os seus bens eram confiscados.” In: SILVA, Lina Gorenstein Ferreira da.
Cristãos-novos, identidade e Inquisição (Rio de Janeiro, século XVIII). WebMosaica: revista do
instituto cultural judaico Marc Chagall v.4 n.1: Porto Alegre, 2012. Pág 48
153 – CALAÇA, Carlos Eduardo. A Confissão de um Dilema: Cristãos-novos letrados do Rio de
janeiro – século XVII. Revista Antíteses, v.1, n.2: Londrina, 2008. Pág. 305
154 – DINES… Op. cit. Pág 417
155 – NOVINSKY, Anita W. Inventários de Bens Confiscados a Cristãos-novos: Fontes para a
História de Portugal e Brasil. Imprensa Nacional: São Paulo, 1976. Pág. 120
156 – NOVINSKY… Ibdem. Pág. 84, 97, 120, 136, 137, 151 e 176; SILVA, Lina Gorenstein Ferreira
da. Heréticos e Impuros: A Inquisição e os cristãos-novos no Rio de Janeiro(século XVIII). Secretario
Municipal de Cultura, Divisão de Editoração: Rio de Janeiro, 1995. Pág. 195
157 – SILVA… Ibdem. Pág. 194
158 – DINES… Op. cit. Pág. 389
3.3 O cristão-novo Diogo Bernal da Fonseca
__________
159 – NOVINSKY, Anita W. Os Judeus que Construíram o Brasil: Fontes inéditas para uma nova visão da
história. Planeta do Brasil: São Paulo, 2015. Pág. 16
160 – SILVA, Lina Gorenstein Ferreira da. Heréticos e Impuros: A Inquisição e os cristãos-novos no Rio de
Janeiro(século XVIII). Secretario Municipal de Cultura, Divisão de Editoração: Rio de Janeiro, 1995. Pág. 64
161 – Ibidem. Pág. 64
162 – ANTONIL, André João. Cultura e Opulência do Brasil por suas drogas e minas. Typ. Imp. e Const. de
J. Villenueve: Rio de Janeiro, 1837. Pág. 14 [Biblioteca Digital do Senado Federal]
163 – Ibidem. Pág. 16
164 – SILVA… Idem. Pág. 63
Nesse engenho possuía um partido o lavrador de cana Diogo Bernal da Fonseca
conforme descrito em seu inventário quando preso pelo Santo Ofício:
_________________
165 – NOVINSKY, Anita W. Inventários de Bens Confiscados a Cristãos-novos: Fontes para a
História de Portugal e Brasil. Imprensa Nacional: São Paulo, 1976. Pág. 84
166 – “Na sessão genealogia, o réu relacionava os membros de sua família e fornecia informações
sobre batismo e crisma” In: NOVINSKY, Anita W(et al). Os Judeus que Construíram o Brasil:
Fontes inéditas para uma nova visão da história. Planeta do Brasil: São Paulo, 2015. Pág. 50
167 – Processo de Maria de Andrade, N° 9.149, Fl 95. Arquivo Nacional da Torre do Tombo. Código
de Referência PT/TT/TSO-IL/028/09149
168 – Processo N° 6.525, fl 01. Arquivo Nacional da Torre do Tombo.
169 – Processo N° 6.525, fl 76. Arquivo Nacional da Torre do Tombo.
170 – DINES, Alberto. Vínculos do Fogo: Antônio José, o Judeu, e outras histórias da inquisição em
Portugal e Brasil. Companhia das Letras: São Paulo, 1992. Pág. 386
171 – Processo N° 6.525, fl 87 e 88. Arquivo Nacional da Torre do Tombo.
172 – Processo N° 6.525, fl 73. Arquivo Nacional da Torre do Tombo.
173 – Processo N° 6.525, fl 75,76 e 77. Arquivo Nacional da Torre do Tombo.
1681, na casa do cristão-novo Diogo de Almeida numa ocasião em que além deste também
encontrava-se Antonio Mendes de Almeida174, outro cristão-novo, então perguntado em
qual lei vivia respondeu que era na lei de Cristo, disseram-lhes então:
“q nella não hia bem encaminhado e q se queria salvar sua alma havia
de ter crença na Ley de Moyzes por observancia della havia de
guardar os sabbados de trabalho como se focem dias santos e havia de
fazer jejuns judaicos[…] lembrado também de q lhe havia ensinado o
dito Gonçalo de Ledeyma entendendo q o encaminhava no q mais lhe
convinha pa salvação de sua alma se apartou logo aly da Ley de
Christo Sr nosso”175
Porém, não foi esse encontro o motivo de sua prisão. Quando foi emitida sua ordem
de prisão pelo Santo Ofício, em 20 de julho de 1709, apenas em duas confissões fora
citado. Os cristãos-novos Alexandre Soares Pereira em confissão de 17 de abril de 1709 e
Francisco Siqueira Machado, em 11 de maio do mesmo ano, teriam afirmado estar com
Diogo Bernal da Fonseca em ocasiões que o mesmo afirmou crer e viver na lei de
Moisés.176 Ao ser entregue aos carceres da inquisição pelo familiar Diogo de Mendanha,
em 09 de outubro de 1710, havia apenas três dias que o cristão-novo Miguel de Castro e
Lara declarava estar em uma ocasião com Diogo Bernal e outras pessoas quando
afirmaram que “por observancia da mesma[lei de Moisés] disserão fazião as ditas
cerimonias, a saber o jejum do Dia Grande, e Raynha Esther, e guardavão os sabbados de
trabalho”. No dia 7 do mesmo mês foram duas confissões que o envolveu, os cristãos-
novos Antonio do Valle de Mesquita e João Thomas Brum confessaram ter se encontrado
com Diogo Bernal da Fonseca por diversas ocasiões em que o mesmo declarou crer e viver
na lei de Moisés, um dia após sua prisão outro cristão-novo, Joseph Ramires do Valle,
também o denunciava.177
No mesmo dia que chegou ao cárcere foi levado à audiência para ser interrogado
para fazer o levantamento do seu inventário178. Provavelmente omitiu alguns bens, pois
com a ordem de prisão os mesmos deveriam ser confiscados.
___________________
174 - Processo N° 6.525, fl 88. Arquivo Nacional da Torre do Tombo.
175 – Processo N° 6.525, fl 88 e 89. Arquivo Nacional da Torre do Tombo.
176 – Processo N° 6.525, fl 05, 09, 13. Arquivo Nacional da Torre do Tombo.
177 – Processo N° 6.525, fl 7, 16 a 24. Arquivo Nacional da Torre do Tombo.
178 – Processo N° 6.525, fl 62. Arquivo Nacional da Torre do Tombo.
Os presos também deveriam pagar as despesas do seu cárcere. Para os inquisidores
não havia inocente, todos os cristãos-novos eram levados a confessar seus erros heréticos,
consequentemente, no mínimo perderiam seus bens. Sabendo disso Diogo Bernal envia
uma correspondência para Diogo Duarte, filho de João Dique, nela: “Suplica ao amigo,
parente e vizinho que mandasse umas caixas de açúcar para Lisboa de modo que lá tivesse
recursos para viver. E que não mencionasse ao Fisco.”179
Inicialmente, em sua confissão Diogo Bernal da Fonseca negou tudo: disse que
jamais tinha se apartado da Igreja, ou rezado orações judaicas, ou guardado o sábado, ou
feito algum jejum, negou ter feito qualquer cerimônia judaica ou conhecer alguém
judaizante na sessão realizada na tarde de 17 de dezembro de 1710, insistiu “q não tinha
culpas a confessar”180. Não convence os inquisidores, é admoestado de que:
Por insistir em negar suas culpas “foi outra vez admoestado em forma e
mandado ao seu cárcere”182. Nesse momento já eram 16 pessoas que teriam confessado
estar com o mesmo, seja apenas declarando crer na lei de Moisés ou realizando alguma
cerimônia.
Curiosamente, na mesma tarde solicita audiência por dizer que “queria
desencarregar sua consciência e confessar suas culpas”183. Em sua primeira confissão se
refere a 26 cristãos-novos, é quando fala sobre o primeiro contato com a lei de Moisés
na Corte de Madrid e conversão quando instruído pelos cristãos-novos Diogo de
Almeida e Antônio Mendes no Rio de Janeiro. Entre os denunciados muitos membros
da família Vale, inclusive sua esposa Maria de Andrade, o irmão do mesmo, João da
Fonseca, e a esposa deste, Gracia Duarte, também são citados, mas diz que não fala com
___________________
179 – DINES, Alberto. Vínculos do Fogo: Antônio José, o Judeu, e outras histórias da inquisição em
Portugal e Brasil. Companhia das Letras: São Paulo, 1992. Pág. 617
180 – Processo N° 6.525, fl 80. Arquivo Nacional da Torre do Tombo.
181 – Processo N° 6.525, fl 84. Arquivo Nacional da Torre do Tombo.
182 – Processo N° 6.525, fl 85. Arquivo Nacional da Torre do Tombo.
183 – Processo N° 6.525, fl 86. Arquivo Nacional da Torre do Tombo.
o irmão a um ano pois este “não querer seguir aquillo q elle lhe diria”.184 Porém os
inquisidores não são convencidos, foi aconselhado a dizer a verdade por inteiro para “o
descargo de sua consciência salvação de sua alma e bom desp o da sua cauza”, mas por
afirmar que não lembrava de mais nada “foy outra vez admoestado em forma e mandado a
seu carcere”.185
Em 22 de dezembro de 1710 é levado para nova sessão e o inquisidor lhe pergunta
“se cuidou em suas culpas como nesta Meza lhe foi mandado e as quer acabar de
confessar”, responde que sim, porém diz que não é lembrado de outras culpas. Perguntado
em que Deus cria disse que “cria no Deos todo poderoso, e lhe não rezava oração alguma”,
sobre a Santíssima Trindade afirmou que não acreditava. Sobre os sacramentos disse “não
ter por bem, e necessarios pa a salvação da alma, mas q lha não fizera desacato algum”. Ia a
missa “por cumprimento do mundo”.186 Perguntado até quando havia crido na lei de
Moisés para salvação de sua alma e qual o momento a abandonou disse que:
“a crença da d.a Ley lhe durava ate fazer suas confissões nesta Meza, e
então a largou movido das admoestaçoens q nella se lhe fizerão [e
agora] cre firmem.te na Ley de Christo S.r nosso, e nella esperava
salvarce”187
“Foi lhe d.to q suas confissoens tem faltas e diminuiçoens quais se não
declarou nesta Meza todas as pessoas com q.m nela há informação
seCommunicou na crença da Ley de Moyzes, e se dá as cerimonias q
fez por observancia da mesma Ley”188
É novamente admoestado e mandado ao cárcere para ser lembrado das suas culpas
e assim possa da “bom desp,o de sua cauza”189.
Ainda em dezembro, no dia 29, pede audiência para continuar sua confissão e
informar sobre mais pessoas que esteve e se declararam crer e viver na lei de Moisés.
____________________
184 – Processo N° 6.525, fl 86 a 103. Arquivo Nacional da Torre do Tombo.
185 – Processo N° 6.525, fl 104. Arquivo Nacional da Torre do Tombo.
186 – Processo N° 6.525, fl 106 a 108. Arquivo Nacional da Torre do Tombo.
187 – Processo N° 6.525, fl 109 e 110. Arquivo Nacional da Torre do Tombo.
188 – Processo N° 6.525, fl 110. Arquivo Nacional da Torre do Tombo.
189 – Processo N° 6.525, fl 111. Arquivo Nacional da Torre do Tombo.
Nessa confissão são descritos 14 cristãos-novos, alguns nomes se repetem, mas são
ocasiões distintas.190 Entre as novidades está o encontro na casa do senhor de engenho
Duarte Roiz Andrade, em 1682,o denunciado era:
“cazado com Anna do Valle e filho de Simão Roiz e era cunhado dele
confitente se achou com o mesmo e com seu irmão Bento Henrq. s […]
estando ambos tres a saber elle confitente e os ditos Duarte Roiz e
Bento Henriq.s entre praticas q tiverão se declararão e derão conta
como crião e vivião na Ley de Moizes p.a salvação de suas almas”191
____________________
190 – Processo N° 6.525, fl 114 a 124. Arquivo Nacional da Torre do Tombo.
191 – Processo N° 6.525, fl 121. Arquivo Nacional da Torre do Tombo.
192 – Processo N° 6.525, fl 124. Arquivo Nacional da Torre do Tombo.
193 – Processo N° 6.525, fl 126 a 133. Arquivo Nacional da Torre do Tombo.
194 – Processo N° 6.525, fl 132. Arquivo Nacional da Torre do Tombo.
195 – Processo N° 6.525, fl 134 a 144. Arquivo Nacional da Torre do Tombo.
196 – Processo N° 6.525, fl 143. Arquivo Nacional da Torre do Tombo.
Inquisidores satisfeitos, encerram-se os interrogatórios, o réu é culpado de
judaísmo, confessou seus erros, denunciou parentes e amigos de sua nação. Autos vistos na
Mesa da Inquisição em 26 de abril de 1711 convencem os inquisidores de que as
confissões do réu lhes
___________
197 – Processo N° 6.525, fl 148. Arquivo Nacional da Torre do Tombo.
198 – “o cárcere, e hábito, e o arbítrio, o que poderá ser favorável, ordinário, ou dilatado, segundo o tempo e
estado, em que fizerem as ditas confissões[...] o favorável durará por tempo de três meses; o ordinário de
seis, o dilatado de nove.” In: SIQUEIRA, Sonia Aparecida de. Os Regimentos da Inquisição. Revista do
Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, ano 157, n° 392: Rio de Janeiro, 1996. Pág. 836
“O hábito penitencial[…] manto, um saco sobre as roupas com o desenho da cruz amarela de Santo André,
que o réu deveria usar em locais públicos.” In: NOVINSKY, Anita W(et al). Os Judeus que Construíram o
Brasil: Fontes inéditas para uma nova visão da história. Planeta do Brasil: São Paulo, 2015. Pág.51
199 – “Auto de Fé – cerimônia pública festiva realizada pelo Santo Ofício na praça principal da cidade.” In:
NOVINSKI… Ibidem. Pág. 275
200 – VANHAGEM, F.A. de. De varias listas de condennados pelo Inquisição de Lisboa, desde o anno de
1711 ao de 1767, comptreendendo só os Brazileiros, ou Colonos estabelecidos no Brazil. Revista do Instituto
Histórico e Geográfico Brasileiro, Tomo Setimo, N° 25: Rio de Janeiro, 1845. Pág. 54, 57 e 58.
DINES… Op. Cit. Pág. 923,925 e 929.
201 – LISBOA, Balthazar da Silva. Annaes do Rio de Janeiro, Tomo 5. Typ. Imp. e Const. de Seinot-
Plancher e Ca: Rio de Janeiro, 1835 Pág. 373
Considerações Finais
A historiadora Anita Novinsky em recente obra nos alerta de que “uma das mais
difíceis questões enfrentadas por historiadores que trabalham sobre a Inquisição é a da
inocência dos réus”202. A partir dessa perspectiva e do que foi exposto até o memento é de
se perguntar se seria Diogo Bernal da Fonseca culpado ou inocente.
Do ponto de vista dos Regimentos Inquisitoriais certamente sim, pois o processo
era conduzido para levar o réu a confessar suas culpas, tendo cometido elas ou não.
Seria Diogo Bernal da Fonseca um criptojudeu? Quando ele teria dito a verdade e
quando teria mentido durante o processo? No início ao negar tudo ou depois quando
começou a confessar? O que houve na tarde de 17 de dezembro de 1710 para que ele
negasse e na mesma tarde pedisse audiência para confessar suas culpas?
Aos treze anos de idade teve o primeiro ensinamento na lei de Moisés, aos dezoito
se converteu, quando foi preso tinha quarenta e sete anos. Após algumas sessões demonstra
arrependimento e crê firmemente em Cristo em decorrência das admoestações que lhe
fizeram os inquisidores e diz ter abandonado seus erros. Sinceridade ou apenas fez o jogo
dos inquisidores para ter sua vida poupada? Suas respostas “seriam apenas um eco das
perguntas dos inquisidores?”203
“Era ele judaizante? Não faço a menor ideia” 204 assim concluiu o seu artigo o
historiador Ronaldo Vainfas sobre os cristãos-novos fluminenses no Rio de Janeiro
colonial, a frase se reporta a Antônio José, o cristão-novo carioca que é sentenciado à
fogueira em 1737205. Parafraseando-o diria o mesmo sobre Diogo Bernal da Fonseca.
Além das situações já abordadas destaco duas ocasiões apontadas por Fernando Gil
Portela Vieira que no seu trabalha sobre a família Calaça descreve que Diogo Rodrigues
Calaça confessa sobre Diogo Bernal, uma delas é na casa do denunciado.206
___________________
202 – NOVINSKY, Anita W.(et al). Os Judeus que Construíram o Brasil: Fontes inéditas para uma nova
visão da história. Planeta do Brasil: São Paulo, 2015. Pág. 13
203 – GUINZBURG, Carlo. O Inquisidor Como Antropólogo. São Paulo: Revista Brasileira, v.1, n°21, 1990.
Pág. 14
204 – VAINFAS, Ronaldo. Santo Ofício em Terra Fluminense: Cristãos-novos e Inquisição no Rio de
Janeiro Colonial. Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, ano 177: Rio de Janeiro, abr/jun
2016. Pág.42
205 – DINES, Alberto. Vínculos do Fogo: Antônio José, o Judeu, e outras histórias da inquisição em
Portugal e Brasil. Companhia das Letras: São Paulo, 1992.
206 – VIEIRA, Fernando Gil Portela. Os Calaças: Quatro gerações de uma família de cristãos-novos na
Inquisição(Séculos XVII-XVIII). São Paulo: Universidade de São Paulo, 2015. Tese Doutorado. Pág.291, 312
e 341.
Outra situação não descrita em seu processo é sobre uma das escravas dele que teria
sido instruída pelo mesmo na lei de Moisés conforme aponta Alberto Dines: “Mariana,
nascida e batizada em Angola, escrava de Maria de Andrade e Diogo Bernal da Fonseca,
os quais lhe deram a liberdade e a iniciaram na Lei de Moisés” 207. Em decorrência de todas
essas questões seria “judaizante consciente ou mito fabricado pela Inquisição?”208
Envolvido por matrimônio em um dos clãs mais importantes de cristãos-novos no Rio de
Janeiro que teve grande parte de seus membros presos por culpas de judaísmo não o
distanciaria de tais práticas.
Não apenas isto, mas também podemos perceber um indivíduo inserido em uma
complexa rede característica do Antigo Regime tendo em vista as qualificações
profissionais e a diversidade de ofícios dos denunciados por Diogo Bernal, lavradores,
senhores de engenho, advogados, médicos e principalmente mercadores. Essa rede social
pode ser ampliada se considerarmos que nem todos os seus conhecidos cristãos-novos
foram denunciados, além dos cristãos-velhos com que se relacionava.
“Para caracterizar uma rede importa, assim, perceber que certos tipos
de relações existem independentemente da vontade dos atores sociais,
como são, em certa medida, as relações de parentesco.[…] Existem,
porém, outros tipos de relações que nascem diretamente da iniciativa e
da vontade expressa dos atores sociais. Serão os casos das associações
de natureza econômica, da amizade e de alguns laços de dependência
em que se pode incluir o clientelismo ou a fidelidade.”209
Mas ao final foi tudo dissolvido pelo Santo Ofício. Neste caso cabe aqui as
observações de Monique Silva de oliveira em sua pesquisa sobre os cristãos novos,
membros da família Azeredo e o seu drama após a condenação, por isso solicita ao Santo
Ofício autorização para retornar ao Rio de Janeiro com sua irmão.
_____________________
207 – DINES, Alberto. Vínculos do Fogo: Antônio José, o Judeu, e outras histórias da inquisição em
Portugal e Brasil. Companhia das Letras: São Paulo, 1992. Pág. 372
208 – SILVA, Lina Gorenstein Ferreira da. Heréticos e Impuros: A Inquisição e os cristãos-novos no Rio de
Janeiro(século XVIII). Secretaria Municipal de Cultura, Divisão de Editoração: Rio de Janeiro, 1995.
Pág.121
209 – CUNHA, Mafalda Soares da. Redes sociais e decisão política no recrutamento dos governantes das
conquistas, 1580-1640. In: FRAGOSO, João e GOUVÊA, Maria de Fátima(org.). Na trama das Redes:
Política e negócios no império português, séculos XVI-XVIII. Civilização Brasileira: Rio de Janeiro, 2010.
Pág. 120
“A descrição feita por Maria Josefa de sua situação, que chegava ao
ponto de passar necessidade, faz pensar nos dramas que os azeredo
viveriam mesmo depois da prisão. O confisco não era pena menos
grave, chegando a arruinar muitas fortunas. A Inquisição mandava
mais uma de tantas famílias de cristãos-novos fluminenses aos Estaus,
esfacelava suas redes de solidariedade e punia com o rigor
característico, principalmente em se tratando da principal heresia
combatida pelo Tribunal. A perseguição que se abateu sobre o Rio de
Janeiro setecentista confirmava o compromisso dos inquisidores em
reprimir aquele que durante séculos de existência foi seu alvo
principal: o judaísmo.”210
__________________
210 – OLIVEIRA, Monique Silva de. Inquisição e Cristãos-novos no Rio de Janeiro: O caso da família
Azeredo(1701-1720). Dissertação de mestrado, Universidade Federal Fluminense: Rio de Janeiro, 2016.
Pág.128
211 – NOVINSKY, Anita W.(et al). Os Judeus que Construíram o Brasil: Fontes inéditas para uma nova
visão da história. Planeta do Brasil: São Paulo, 2015. Pág. 109
212 – “A cultura popular se define também, de outro lado pelas relações que mantém com a cultura
dominante, filtrada pelas classes subalternas de acordo com seus próprios valores e condições de vida”
VAINFAS, Ronaldo. História das Mentalidades e História Cultural. In: CARDOSO, Ciro Flamarion e
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213 – GINZBURG, Carlo. O Queijo e os Vermes: o cotidiano e as ideias de um moleiro perseguido pela
Inquisição. Companhia da Letras: São Paulo, 2006.
214 – HERMAM, Jaqueline. História das Religiões e Religiosidades. In: CARDOSO, Ciro Flamarion e
VAINFAS, Ronaldo… Op. Cit.
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Anexos