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A ARTE DE ENSAIAR COM UMA PERSPECTIVA CIENTÍFICA

Adriana do Carmo Figueiredo

(Mestre em Letras, UFMG

e professora de Leitura e Produção de Textos no UniBH)

dricafigueiredo@uol.com.br

Resumo: Este estudo tem como objetivo apresentar uma breve pesquisa sobre o gênero
textual ensaio, buscando uma aproximação conceitual dialogada com distintos
posicionamentos teóricos e filosóficos que servirão de suporte para a fundamentação
das ideias. Além disso, será discutida a subjetividade do ensaísta, ainda que pertencente
aos núcleos acadêmicos, bem como a legitimidade do gênero textual em questão para
fins científicos.

Palavras-chave: Subjetividade, verdade, estratégia de escrita.

CONSIDERAÇÕES INICIAIS

Marcado pelo hibridismo textual e notória complexidade de definição, o ensaio,

desde sua origem, no século XVI, quando surgiu pelas mãos do escritor francês Michel

de Montaigne, apresenta-se como produto de uma escrita subjetiva e livre, unindo, em

sua composição, alguns elementos que tornam difícil a sua caracterização.

Para Montaigne, a arte de ensaiar seria o exercício livre do pensamento, com uma

voz que traz, necessariamente, as marcas de uma liberdade argumentativa. Os ensaios

de Montaigne misturavam instinto com experiência, perpassando pelos temas mais

diversos. Tratava-se do registro das suas observações e reflexões extraídas de sua

mirada acerca da vida. Temas como o amor, a religião, a coragem, a política, a

educação, entre outros, eram frequentes em seus textos. Montaigne recorria aos fatos
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passados e, com significativo domínio erudito dos clássicos, escrevia pelo gosto da

aventura e pela emoção, tornando o leitor cúmplice e escravo das suas preciosas linhas.

Os tempos mudam e novos valores (escolhas) se encarregam de produzir

transformações... Assim, podemos afirmar que, atualmente, existem diferentes tipos de

ensaio, de acordo com as demandas e necessidades do espaço da enunciação onde são

produzidos os discursos. A formalidade e o rigor da academia, por exemplo, nos levam

a pensar na rigidez textual, sugerindo o ensaio formal ou acadêmico.

Desse modo, buscando um paralelismo entre o ensaio literário, aquele produzido

por Montaigne no século XVI, e o ensaio acadêmico, demandado hoje como um dos

gêneros científicos do século XXI, vejo que ambos apresentam como marca textual a

subjetividade no exercício livre do pensamento. No entanto, certamente, há algumas

nuances que os diferem.

Assim, como proposta deste estudo, interessa-me desvelar como se dá essa

subjetividade no ensaio de caráter científico, cuja intenção é promover a circulação de

pesquisas que servirão de ponto de partida para futuros trabalhos técnicos.

Este paper também buscará uma aproximação do contorno conceitual desse

gênero textual que, inclusive em tempos atuais, ainda se apresenta com caráter ambíguo.

Para isso, serão apresentadas algumas posições de linguistas, filósofos e teóricos sobre a

linguagem, além de algumas sugestões de estratégias e técnicas para a escrita de ensaios

marcados pela liberdade intelectual, ainda que sejam produzidos pela sugestiva rigidez

entrecortada pelos muros universitários.

DA SUBJETIVIDADE À FORMALIDADE ACADÊMICA: ALGUNS

QUESTIONAMENTOS SOBRE A “VERDADE CIENTÍFICA”


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É notória a necessidade que a academia tem em formalizar sua produção escrita,

haja vista a complexa aplicação das normas da ABNT em textos científicos e o

desejável rigor técnico referente à escrita que é produzida por pesquisadores de todas as

áreas.

No entanto, oscilando entre a rigidez e a liberdade surge o ensaio acadêmico,

espelho do avanço dos tempos e da necessidade de uma escrita científica que, embora

híbrida, traga a lume a “verdade” ou, quiçá, “verdades” de uma pesquisa ainda

incipiente, mas que, certamente, poderá se tornar ponto de partida para investigações

futuras.

Sabemos que, desde sua gênese, o ensaio traz as marcas da subjetividade, melhor

dito, o desenho de um sujeito que argumenta com leveza e se inscreve no discurso.

O ensaísta não tem como meta convencer seu interlocutor. Seu alvo é explicitar

um juízo de valor, por meio da reflexão de fatos que fazem parte do seu contexto e da

sua historicidade, com um viés subjetivo. Desse modo, o ensaio é também uma espécie

de retrato daquele que escreve, pois traz as suas vivências, suas leituras e também o

acervo cultural de uma voz que se posiciona discursivamente.

Nessa perspectiva, convém recorrermos à filosofia de Heidegger e Gadamer,

quando sugerem que a hermenêutica se refere ao mundo da experiência, ao mundo da

pré-compreensão, em que já somos e nos compreendemos como seres a partir da

estrutura prévia de sentido. Penso que o ensaísta é, por assim dizer, um autêntico

hermeneuta, andarilho de ideias...

Conforme Heidegger:

A interpretação de algo como algo funda-se, essencialmente, numa posição prévia,


visão prévia e concepção prévia. A interpretação nunca é a apreensão de um dado
preliminar isenta de pressuposições. [...] Em todo princípio de interpretação, ela se
apresenta como sendo aquilo que a interpretação necessariamente já "põe", ou seja,
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que é preliminarmente dado na posição prévia, visão prévia e concepção prévia


(HEIDEGGER, 1988, p.207).

Desse modo, em sendo o homem uma composição dele mesmo e das experiências

que adquire ao longo de sua vida, bem como das suas impressões prévias marcadas

também pelo reflexo da sua cultura, pode-se afirmar que seu juízo valorativo, espelho

de suas vivências, certamente vai impregnar a sua interpretação. O exercício de

interpretar, portanto, está diretamente relacionado ao contexto histórico, cultural, social

em que se insere a voz do hermeneuta, e o ato de compreender está relativamente

conectado à existência do intérprete.

Vale ressaltar que a interpretação, para Gadamer, "começa sempre com conceitos

prévios que serão substituídos por outros mais adequados” (GADAMER, 1997, p.42).

Assim, o hermeneuta contemporâneo é aquele observador que, muitas vezes,

supera a dicotomia do esquema sujeito-objeto, fazendo nascer as marcas de sua

“infinitividade humana” 1, conforme entendimento de Lenio Luiz Streck (2009), ao

afirmar que não haveria “nem mais o assujeitamento do sujeito às essências e nem o

solipsismo do sujeito assujeitador dos objetos” 2 (STRECK, 2009, p.178).

Nesse diálogo com o mundo das ideias, e com os espelhos referenciais que

surgem das relações entre sujeito-objeto e sujeito-sujeito, vejo a instauração de certa

subjetividade que se coloca não mais como uma simples vontade ou arbítrio, mas sim

como um diálogo que poderia ser multiplicado por diferentes vozes discursivas,

marcadas pelo local da cultura de onde falam os sujeitos.

1
Termo utilizado por Ernildo Stein (1996), ao tecer suas considerações sobre a hermenêutica e sua
incômoda relação com a verdade. Lenio Luiz Streck (2009), conceituado jurisconsulto, cita esse autor
quando argumenta acerca da “viragem lingüístico-pragmática e hermenêutica da filosofia”, como
proposta de uma nova construção interpretativa do Direito.
2
Embora o trabalho de Lenio Luiz Streck (2009) esteja voltado para os estudos jurídicos, penso que seus
achados, de caráter filosófico e questionador, podem ser empregados como alicerce para os estudos da
linguagem em qualquer área do conhecimento, pois escrever, melhor dito, ensaiar, é necessariamente
também interpretar e exercer juízos, escolhas.
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Nesse viés, entra em jogo a noção de alteridade do texto exposta por Gadamer,

pois

quem quer compreender um texto, em princípio, tem que estar disposto a deixar
que ele diga alguma coisa por si. Por isso, uma consciência formada
hermeneuticamente tem que se mostrar receptiva, desde o princípio, para a
alteridade do texto. Mas essa receptividade não pressupõe nem neutralidade com
relação à coisa nem tampouco auto-anulamento, mas inclui a apropriação das
próprias opiniões prévias e preconceitos, apropriação que se destaca destes
(GADAMER, 1997, p.405).

Nos ensaios, de modo geral, essa alteridade dialoga com uma subjetividade que é

explicitada e marcada gramaticalmente pela presença do “eu” ou “nós” na composição

do texto. Outras vezes, essa subjetividade é velada, implícita, escondendo-se num jogo

de máscaras e disfarces de um “eu” que, a exemplo do discurso científico, deseja manter

um distanciamento entre autor e objeto pesquisado.

No discurso acadêmico, muitas vezes o objeto se sobrepõe ao sujeito, pois o que

se deseja é a tão famigerada “verdade real” da pesquisa que vai circular pelas esferas da

academia, ultrapassando, provavelmente, os muros universitários. Por isso, questiono:

será mesmo possível que a razão humana encontre a verdade? Será essa suposta verdade

marcada pelos limites advenientes de valores e princípios de maior relevo?

Streck (2009) sugere o movimento hermenêutico como o estabelecimento das

condições do mundo, assim, não há que se falar nem em verdade empírica e nem em

verdade absoluta. Nessa esteira, argumenta Ernildo Stein (1996):

A hermenêutica será, assim, esta incômoda verdade que se assenta entre duas
cadeiras, quer dizer, não é nem uma verdade empírica, nem uma verdade absoluta –
é uma verdade que se estabelece dentro das condições humanas do discurso e da
linguagem (STEIN, 1996, p.38).
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Portanto, essa “verdade científica” pode e deve ser questionada pela voz do

enigmático ensaísta, pois o ensaio é um texto que tem como proposta traçar uma

posição sobre determinado tema sem pretender a finalização da discussão. Seu giro

argumentativo pode entrecruzar distintas áreas do conhecimento, como a filosofia, a

literatura, o direito, a linguística, entre outras.

Com o intuito de se buscar um conceito ou uma definição mais precisa sobre o

ensaio, diferentes autores têm se debruçado a especular sobre o assunto. Para João

Bosco Medeiros (2007), por exemplo, ensaio é um texto que traz uma “exposição

metódica dos estudos realizados e das conclusões originais a que se chegou após

apurado exame de um assunto” (MEDEIROS, 2007, p.228).

Massaud Moisés (1987) aponta duas ramificações do ensaio: o informal, marcado

pela liberdade criadora e pela emoção, exemplificado com a obra de Montaigne

(Ensaios). Há também o ensaio formal, caracterizado pela seriedade dos objetivos e pela

lógica do texto. Um exemplo deste tipo de gênero textual é o Ensaio acerca do

entendimento humano, de John Locke. O ensaio formal também apresenta outras

características: uso da primeira pessoa, brevidade, serenidade... Ademais, o ensaio é um

texto que apresenta um tom problematizador, antidogmático e nele devem se destacar o

espírito crítico do autor e a originalidade textual.

Do ponto de vista científico, o ensaio, segundo Rauen (1999), é uma “exposição

metódica dos estudos realizados e das conclusões originais obtidas após o exame de um

assunto” (RAUEN, 1999, p.137). Vale destacar que, para um cientista, o ensaio é um

meio de transmitir informações e ideias.

Segundo Barrass (1986), um ensaio é “uma breve explicação escrita de um

assunto bem delimitado, clara e decisiva, sistemática e compreensiva” (BARRASS,

1986, p.51). Assim, destacam-se as principais características desse tipo de produção


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acadêmica: a) exposição bem desenvolvida, objetiva, discursiva e concludente; b) tese

pessoal sem a comprovação última; c) apresentação de certa maturidade intelectual,

incluindo juízos de valor pessoal. No entanto, um ensaio não é apenas um exercício de

reflexão e redação, mas também um veículo por meio do qual os pensamentos de

qualquer escritor são reunidos e organizados e levados ao leitor de maneira clara,

concisa e interessante.

Medeiros (2007) também afirma que, no Brasil, tem sido usado o termo paper

pelos pesquisadores em vez de ensaio. Desse modo, há uma definição de que paper é

“uma síntese de pensamentos aplicados a um tema específico. Esta síntese deverá ser

original e reconhecer a fonte do material utilizado. Em português, a palavra corresponde

a ensaio, mas este nome não encontrou acolhida entre os pesquisadores”

(MEDERIROS, 2007, p.235).

Conforme Audrey J. Roth (1994), “paper é um documento que se baseia em

pesquisa bibliográfica e em descobertas pessoais” (ROTH, 1994, p.2). Ora, mais uma

vez notamos similitudes entre as definições de paper e ensaio, uma vez que em ambos

torna-se necessário o juízo valorativo sobre o assunto pesquisado. Medeiros (2007)

adverte que se o pesquisador “apenas compilou informações sem fazer avaliações ou

interpretações sobre elas, o produto de seu trabalho será um relatório” (MEDEIROS,

2007, p.235).

Portanto, o gênero textual paper ou ensaio, independentemente da nomenclatura

que lhe seja atribuída, difere de um relatório, uma vez que se espera do ensaísta um

juízo valorativo ou uma interpretação dos fatos ou das informações que foram

recolhidas. No ensaio acadêmico, é desejável que haja o desenvolvimento de um ponto

de vista acerca de um tema, uma tomada de posição definida e a expressão dos

pensamentos com certa originalidade.


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SUGESTÕES PARA ESCRITA DE ENSAIOS ACADÊMICOS

Inicialmente, para a escrita de um bom ensaio acadêmico, deve-se ter em mente

que esse gênero textual exige: um assunto específico para abordagem; interpretação

pessoal sobre o tema escolhido; pesquisa referencial – ou seja, o que outros

pesquisadores também dizem sobre o assunto escolhido – e conclusão. Esses pontos são

primordiais para o planejamento inicial.

Importante destacar que toda pesquisa acadêmica, independentemente do seu

produto final, precisa ser bem planejada, “caso contrário o investigador, em determinada

altura, encontrar-se-á perdido num emaranhado de dados colhidos, sem saber como

dispor dos mesmos ou até desconhecendo seu significado e importância”, (LAKATOS e

MARCONI, 1994, p.99). Nessa perspectiva, argumenta Santos (2003):

O desafio do planejamento é, a partir de um tema (uma necessidade humana),


identificar um problema e prepará-lo para ser raciocinado. A necessidade de
pesquisar, de investigar, só toma forma, concretiza-se diante do desafio
representado por um problema, pois temas somente anunciam a presença de uma
necessidade humana qualquer. A atividade intelectual propriamente dita inicia-se
pela percepção e problematização da necessidade. Daí pode-se dizer que sem
problemas não há pesquisas (SANTOS, 2003, p.36).

Vale considerar que, além da necessária problematização do tema, outro aspecto

relevante é ter clareza e discernimento na escolha do assunto para que o mesmo não seja

amplamente genérico e nem totalmente simples, pois o ensaio deve necessariamente

conter impressões pessoais, conforme dito, e, por isso, deve-se ter cuidado para que não

seja um texto desinteressante e sem complexidade na fundamentação das ideias.

Assim, o planejamento e a escolha do tema são primordiais para que seja feito o

levantamento de conceitos novos, o traçado das definições e a sugestão de outros


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detalhes que pareçam sinalizar questões para futuros aprofundamentos sobre o assunto

pesquisado. Também é importante a busca de referências – em bibliotecas, internet,

periódicos, revistas… – para que se possa, a partir de leituras diversas sobre o tema

eleito, entender quais os principais questionamentos levantados até então, promovendo,

por assim dizer, uma leitura exploratória. Muitos materiais interessantes, como fontes

de pesquisa primárias ou secundárias, podem ser encontrados nas indicações que

constam dos livros e periódicos consultados, além dos fichários de bibliotecas. Depois

disso, o ensaísta já estará apto a escrever com mais propriedade sobre o assunto,

podendo, inclusive, opinar a respeito.

Sugiro, após as leituras das diferentes fontes consultadas, que sejam feitos

fichamentos e apontamentos prévios sobre os caminhos ou passos pelos quais o ensaio

perpassará. Nesse momento, já se tem um esboço do que vai ser escrito e o ensaio

começa, então, a ganhar corpo e voz, ainda que na perspectiva de um texto em

rascunho.

Para que essa escrita atenda à necessidade formal do ensaio acadêmico, deve-se

tomar como base a estrutura textual exigida, que norteia o caráter técnico do gênero. O

ensaio deve deixar clara a posição do ensaísta como o sujeito que tem as reflexões

pessoais, mas isso não o exime de citar as fontes – que já foram pesquisadas – e de

sugerir de forma direta, indireta ou ainda nas entrelinhas textuais, as ideias de outros

autores sobre o tema, formando um diálogo teórico interessante e criativo.

Conforme assevera Wander Emediato:

Faz parte dos trabalhos científicos e acadêmicos a citação de discursos ou


fragmentos de discursos de terceiros. Essa prática de citações, que se
consolidou no discurso científico, é essencial para a garantia de credibilidade
das pesquisas produzidas institucionalmente, ou seja, nas universidades e
centros de pesquisa. Não praticá-la é extremamente prejudicial ao trabalho
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científico, pois isola o pesquisador e diminui sua fundamentação e


credibilidade (EMEDIATO, 2005, p.203-204).

Desse modo, a citação em trabalhos acadêmicos é uma estratégia de argumentação

importantíssima, já que imprime um diálogo com argumentos de especialistas sobre o

assunto pesquisado. Isso também confere maior credibilidade às provocações que

possam ser sugeridas pelo texto, denotando que o pesquisador, no caso, o ensaísta,

possui conhecimentos teóricos sobre o seu campo de estudos. Dialogar com outros

estudiosos confere marcas de erudição do sujeito pesquisador, além de evidenciar o

espírito científico no âmbito acadêmico. Citar os autores consultados adequadamente,

conforme padrões da ABNT (Associação Brasileira de Normas Técnicas), é, sem

dúvida, “prova de respeito aos direitos autorais”, conforme nos alerta Wander Emediato

(2005).

Por isso, as referências utilizadas devem ser dispostas, conforme as normas da

ABNT, ao término do ensaio. Elas são importantes para justificar as fontes de pesquisa

que auxiliaram na elaboração do texto final. Além disso, em alguns casos, pode haver a

necessidade de que sejam incluídos anexos e imagens para um melhor entendimento

sobre o tema escolhido.

Vale lembrar, ainda, que o ensaio deve conter uma estrutura típica, que engloba

introdução, fundamentação e conclusão. Na introdução, dá-se uma pincelada básica

sobre o tema; na fundamentação, normalmente, expõem-se os argumentos e contra-

argumentos; e, por fim, na conclusão, coloca-se o ponto principal abordado no ensaio,

de modo que revele a opinião do ensaísta sobre o assunto.

Importante comentar que esse gênero textual deve ser escrito na 3ª pessoa, mas

pode conter também momentos em que se usa a 1º pessoa do discurso (“eu” / “nós”),

conforme mencionado, uma vez que é desejável que se marque o espaço da enunciação
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de onde fala o sujeito que escreve, bem como suas preferências e juízos de valor sobre o

assunto pesquisado.

Além do que foi sugerido, é também conveniente levar em consideração os

seguintes aspectos:

a) reflexão temática – é necessário considerar título e termos de referência, definir

o objetivo da composição, observar o tempo disponível para a escrita distribuindo-o de

forma equilibrada, considerar ideias e diferentes informações sobre o tema, ainda que

seja para criticá-las, decidir o que se pretende que o leitor entenda;

b) desenho textual – é aconselhável que se faça um esquema de tópicos,

sublinhando os pontos mais relevantes; elaborar o plano da redação, destacando a

introdução, o desenvolvimento e a conclusão;

c) normalização – é imprescíndivel digitar o ensaio acadêmico conforme as

normas técnicas (ABNT). Por isso, deve-se recorrer às fontes que orientam o seu correto

manuseio;

d) revisão final – é preciso avaliar se o ensaio é lido com facilidade, apresenta

coesão e coerência na estruturação das ideias, se os pontos essenciais foram destacados,

se não há erros ortográficos e gramaticais, e, além disso, se o ensaio sugere uma leitura

especulativa que possa atender às expectativas do grupo de leitores que se pretende

atingir.

CONCLUSÃO

Pelo exposto, pode-se afirmar que, por mais que se pretenda apagar a voz do

sujeito que se inscreve no discurso acadêmico-científico, por meio da rigidez

normalizadora, engessada pelas regras técnicas infiltradas na academia, penso que não
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há possibilidade de completo apagamento do “eu”, seja ele um simples ensaísta ou um

experiente doutor em determinada matéria.

A propósito: não nos esqueçamos de que doutores, mestres e sábios também

podem escrever seus ensaios... A prática de ensaiar é um convite a todos que se

interessem pelo exercício livre do pensamento, aliás, nem tão livre assim, quando se

trata de uma produção feita dentro dos núcleos acadêmicos. Lembremos que o ensaio é

uma figura híbrida entre os gêneros textuais, em que se mesclam experiências de

liberdade e rigor técnico, além de elaboração estilística.

Sem dúvida, a rigidez acadêmica aponta para uma sobreposição do objeto em

relação ao sujeito, mas as marcas da subjetividade devem ser levadas em consideração

no momento da elaboração da produção ensaística, seja de forma explícita ou implícita.

Assim, o ensaio, a meu ver, configura-se, talvez, como um dos meios mais eficientes de

se traçar as marcas do subjetivismo numa pesquisa científica, dada sua natureza

estilística e a própria legitimidade que já o consagrou nos núcleos de pesquisa.

Desse modo, a suposta “verdade” a ser pesquisada pode ser questionada e

problematizada pelo ensaísta, mas sempre com argumentos que sejam válidos e

legítimos, em conformidade com a estrutura do discurso que se pretende erguer na

academia. Isso não impede que certa dose de emoção, até mesmo literária, com jogos e

figuras de linguagem, não deixe de transparecer por meio das sombras discursivas de

um ensaio formal.

Portanto, o ensaio acadêmico não está totalmente desvinculado do subjetivismo

textual e literário, como meio ou instrumento da expressão livre e reflexiva do

pensamento, iniciada por Montaigne, no século XVI. A arte de ensaiar permite ao seu

autor especular sobre fatos (passados, presentes e futuros) com as marcas da atualidade,

fazendo a exposição do seu giro hermenêutico em relação à problematização de uma


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questão apresentada, desvelando o local de onde fala a voz que ganha corpo no discurso.

Desse modo, a cientificidade proposta pelo ensaísta pode apresentar contornos de uma

“verdade” que se descobriu com matizes heideggerianos.

No entanto, para que essa descoberta tenha validade e legitimidade na academia,

convém reforçar que é preciso, sim, observar as normas da ABNT, órgão responsável

pelos padrões técnicos de toda produção científica do país, já que fornece a base

necessária ao desenvolvimento tecnológico brasileiro. Afinal, todo ensaísta, em regra,

deseja que seu trabalho seja lido por outros pesquisadores e, por isso, torna-se

fundamental a normalização para que se tenha a devida ou, quiçá, merecida publicação

no ambiente acadêmico.

Resumen
Este estudio tiene como objetivo presentar una breve investigación del género textual
ensayo, en búsqueda de un enfoque conceptual dialogado con las diferentes posiciones
teóricas y filosóficas que se apoyan como soporte para el razonamiento de las ideas.
Además, se discute la subjetividad del ensayista, aunque pertenezca a los núcleos
académicos, así como la legitimidad del género en cuestión con fines científicos.

Palabras-clave:

Subjetividad. Verdad. Estrategia de escrita.

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