Ensaio Cientifico PDF
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dricafigueiredo@uol.com.br
Resumo: Este estudo tem como objetivo apresentar uma breve pesquisa sobre o gênero
textual ensaio, buscando uma aproximação conceitual dialogada com distintos
posicionamentos teóricos e filosóficos que servirão de suporte para a fundamentação
das ideias. Além disso, será discutida a subjetividade do ensaísta, ainda que pertencente
aos núcleos acadêmicos, bem como a legitimidade do gênero textual em questão para
fins científicos.
CONSIDERAÇÕES INICIAIS
desde sua origem, no século XVI, quando surgiu pelas mãos do escritor francês Michel
Para Montaigne, a arte de ensaiar seria o exercício livre do pensamento, com uma
educação, entre outros, eram frequentes em seus textos. Montaigne recorria aos fatos
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passados e, com significativo domínio erudito dos clássicos, escrevia pelo gosto da
aventura e pela emoção, tornando o leitor cúmplice e escravo das suas preciosas linhas.
por Montaigne no século XVI, e o ensaio acadêmico, demandado hoje como um dos
gêneros científicos do século XXI, vejo que ambos apresentam como marca textual a
gênero textual que, inclusive em tempos atuais, ainda se apresenta com caráter ambíguo.
Para isso, serão apresentadas algumas posições de linguistas, filósofos e teóricos sobre a
marcados pela liberdade intelectual, ainda que sejam produzidos pela sugestiva rigidez
desejável rigor técnico referente à escrita que é produzida por pesquisadores de todas as
áreas.
espelho do avanço dos tempos e da necessidade de uma escrita científica que, embora
híbrida, traga a lume a “verdade” ou, quiçá, “verdades” de uma pesquisa ainda
incipiente, mas que, certamente, poderá se tornar ponto de partida para investigações
futuras.
Sabemos que, desde sua gênese, o ensaio traz as marcas da subjetividade, melhor
O ensaísta não tem como meta convencer seu interlocutor. Seu alvo é explicitar
um juízo de valor, por meio da reflexão de fatos que fazem parte do seu contexto e da
sua historicidade, com um viés subjetivo. Desse modo, o ensaio é também uma espécie
de retrato daquele que escreve, pois traz as suas vivências, suas leituras e também o
estrutura prévia de sentido. Penso que o ensaísta é, por assim dizer, um autêntico
Conforme Heidegger:
Desse modo, em sendo o homem uma composição dele mesmo e das experiências
que adquire ao longo de sua vida, bem como das suas impressões prévias marcadas
também pelo reflexo da sua cultura, pode-se afirmar que seu juízo valorativo, espelho
Vale ressaltar que a interpretação, para Gadamer, "começa sempre com conceitos
prévios que serão substituídos por outros mais adequados” (GADAMER, 1997, p.42).
afirmar que não haveria “nem mais o assujeitamento do sujeito às essências e nem o
Nesse diálogo com o mundo das ideias, e com os espelhos referenciais que
subjetividade que se coloca não mais como uma simples vontade ou arbítrio, mas sim
como um diálogo que poderia ser multiplicado por diferentes vozes discursivas,
1
Termo utilizado por Ernildo Stein (1996), ao tecer suas considerações sobre a hermenêutica e sua
incômoda relação com a verdade. Lenio Luiz Streck (2009), conceituado jurisconsulto, cita esse autor
quando argumenta acerca da “viragem lingüístico-pragmática e hermenêutica da filosofia”, como
proposta de uma nova construção interpretativa do Direito.
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Embora o trabalho de Lenio Luiz Streck (2009) esteja voltado para os estudos jurídicos, penso que seus
achados, de caráter filosófico e questionador, podem ser empregados como alicerce para os estudos da
linguagem em qualquer área do conhecimento, pois escrever, melhor dito, ensaiar, é necessariamente
também interpretar e exercer juízos, escolhas.
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Nesse viés, entra em jogo a noção de alteridade do texto exposta por Gadamer,
pois
quem quer compreender um texto, em princípio, tem que estar disposto a deixar
que ele diga alguma coisa por si. Por isso, uma consciência formada
hermeneuticamente tem que se mostrar receptiva, desde o princípio, para a
alteridade do texto. Mas essa receptividade não pressupõe nem neutralidade com
relação à coisa nem tampouco auto-anulamento, mas inclui a apropriação das
próprias opiniões prévias e preconceitos, apropriação que se destaca destes
(GADAMER, 1997, p.405).
Nos ensaios, de modo geral, essa alteridade dialoga com uma subjetividade que é
do texto. Outras vezes, essa subjetividade é velada, implícita, escondendo-se num jogo
se deseja é a tão famigerada “verdade real” da pesquisa que vai circular pelas esferas da
será mesmo possível que a razão humana encontre a verdade? Será essa suposta verdade
condições do mundo, assim, não há que se falar nem em verdade empírica e nem em
A hermenêutica será, assim, esta incômoda verdade que se assenta entre duas
cadeiras, quer dizer, não é nem uma verdade empírica, nem uma verdade absoluta –
é uma verdade que se estabelece dentro das condições humanas do discurso e da
linguagem (STEIN, 1996, p.38).
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Portanto, essa “verdade científica” pode e deve ser questionada pela voz do
enigmático ensaísta, pois o ensaio é um texto que tem como proposta traçar uma
posição sobre determinado tema sem pretender a finalização da discussão. Seu giro
ensaio, diferentes autores têm se debruçado a especular sobre o assunto. Para João
Bosco Medeiros (2007), por exemplo, ensaio é um texto que traz uma “exposição
metódica dos estudos realizados e das conclusões originais a que se chegou após
(Ensaios). Há também o ensaio formal, caracterizado pela seriedade dos objetivos e pela
metódica dos estudos realizados e das conclusões originais obtidas após o exame de um
assunto” (RAUEN, 1999, p.137). Vale destacar que, para um cientista, o ensaio é um
concisa e interessante.
Medeiros (2007) também afirma que, no Brasil, tem sido usado o termo paper
pelos pesquisadores em vez de ensaio. Desse modo, há uma definição de que paper é
“uma síntese de pensamentos aplicados a um tema específico. Esta síntese deverá ser
pesquisa bibliográfica e em descobertas pessoais” (ROTH, 1994, p.2). Ora, mais uma
vez notamos similitudes entre as definições de paper e ensaio, uma vez que em ambos
2007, p.235).
que lhe seja atribuída, difere de um relatório, uma vez que se espera do ensaísta um
juízo valorativo ou uma interpretação dos fatos ou das informações que foram
que esse gênero textual exige: um assunto específico para abordagem; interpretação
pesquisadores também dizem sobre o assunto escolhido – e conclusão. Esses pontos são
produto final, precisa ser bem planejada, “caso contrário o investigador, em determinada
altura, encontrar-se-á perdido num emaranhado de dados colhidos, sem saber como
relevante é ter clareza e discernimento na escolha do assunto para que o mesmo não seja
conter impressões pessoais, conforme dito, e, por isso, deve-se ter cuidado para que não
Assim, o planejamento e a escolha do tema são primordiais para que seja feito o
detalhes que pareçam sinalizar questões para futuros aprofundamentos sobre o assunto
periódicos, revistas… – para que se possa, a partir de leituras diversas sobre o tema
por assim dizer, uma leitura exploratória. Muitos materiais interessantes, como fontes
constam dos livros e periódicos consultados, além dos fichários de bibliotecas. Depois
disso, o ensaísta já estará apto a escrever com mais propriedade sobre o assunto,
Sugiro, após as leituras das diferentes fontes consultadas, que sejam feitos
perpassará. Nesse momento, já se tem um esboço do que vai ser escrito e o ensaio
rascunho.
Para que essa escrita atenda à necessidade formal do ensaio acadêmico, deve-se
tomar como base a estrutura textual exigida, que norteia o caráter técnico do gênero. O
ensaio deve deixar clara a posição do ensaísta como o sujeito que tem as reflexões
pessoais, mas isso não o exime de citar as fontes – que já foram pesquisadas – e de
sugerir de forma direta, indireta ou ainda nas entrelinhas textuais, as ideias de outros
possam ser sugeridas pelo texto, denotando que o pesquisador, no caso, o ensaísta,
possui conhecimentos teóricos sobre o seu campo de estudos. Dialogar com outros
dúvida, “prova de respeito aos direitos autorais”, conforme nos alerta Wander Emediato
(2005).
ABNT, ao término do ensaio. Elas são importantes para justificar as fontes de pesquisa
que auxiliaram na elaboração do texto final. Além disso, em alguns casos, pode haver a
Vale lembrar, ainda, que o ensaio deve conter uma estrutura típica, que engloba
Importante comentar que esse gênero textual deve ser escrito na 3ª pessoa, mas
pode conter também momentos em que se usa a 1º pessoa do discurso (“eu” / “nós”),
conforme mencionado, uma vez que é desejável que se marque o espaço da enunciação
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de onde fala o sujeito que escreve, bem como suas preferências e juízos de valor sobre o
assunto pesquisado.
seguintes aspectos:
forma equilibrada, considerar ideias e diferentes informações sobre o tema, ainda que
normas técnicas (ABNT). Por isso, deve-se recorrer às fontes que orientam o seu correto
manuseio;
se não há erros ortográficos e gramaticais, e, além disso, se o ensaio sugere uma leitura
atingir.
CONCLUSÃO
Pelo exposto, pode-se afirmar que, por mais que se pretenda apagar a voz do
normalizadora, engessada pelas regras técnicas infiltradas na academia, penso que não
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interessem pelo exercício livre do pensamento, aliás, nem tão livre assim, quando se
trata de uma produção feita dentro dos núcleos acadêmicos. Lembremos que o ensaio é
Assim, o ensaio, a meu ver, configura-se, talvez, como um dos meios mais eficientes de
problematizada pelo ensaísta, mas sempre com argumentos que sejam válidos e
academia. Isso não impede que certa dose de emoção, até mesmo literária, com jogos e
figuras de linguagem, não deixe de transparecer por meio das sombras discursivas de
um ensaio formal.
pensamento, iniciada por Montaigne, no século XVI. A arte de ensaiar permite ao seu
autor especular sobre fatos (passados, presentes e futuros) com as marcas da atualidade,
questão apresentada, desvelando o local de onde fala a voz que ganha corpo no discurso.
Desse modo, a cientificidade proposta pelo ensaísta pode apresentar contornos de uma
convém reforçar que é preciso, sim, observar as normas da ABNT, órgão responsável
pelos padrões técnicos de toda produção científica do país, já que fornece a base
deseja que seu trabalho seja lido por outros pesquisadores e, por isso, torna-se
fundamental a normalização para que se tenha a devida ou, quiçá, merecida publicação
no ambiente acadêmico.
Resumen
Este estudio tiene como objetivo presentar una breve investigación del género textual
ensayo, en búsqueda de un enfoque conceptual dialogado con las diferentes posiciones
teóricas y filosóficas que se apoyan como soporte para el razonamiento de las ideas.
Además, se discute la subjetividad del ensayista, aunque pertenezca a los núcleos
académicos, así como la legitimidad del género en cuestión con fines científicos.
Palabras-clave:
Referências
HEIDEGGER, Martin. Sobre a essência da verdade: a tese de Kant sobre o ser. São
Paulo: Livraria Duas Cidades, 1970.
MOISÉS, Massaud. A criação literária: poesia. v.1. São Paulo: Cultrix, 1987.
MONTAIGNE, Michel de. Ensaios. 5.ed. São Paulo: Nova Cultural, 1991.
ROTH, Audrey. The research paper: process, form, and content. 7. ed. Belmont:
Wadsworth, 1994.
SANTOS, Antonio Raimundo dos. Produção e apresentação do conhecimento
científico. Rio de Janeiro: Perspectivação, 2003.
STRECK, Lenio Luiz. Hermenêutica jurídica e(m) crise: uma exploração hermenêutica
da construção do Direito. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2009.