Laranjeiras-Mc1 - Perguntas e Respostas PDF

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P&R

PERGUNTAS E RESPOSTAS

Mensagens emitidas por e-mail pelo Professor A.C.R. Laranjeiras


(Salvador, BA), entre 2009 e 2013, ao Grupo Calculistas da Bahia.

Coletânea elaborada por Marcos Carnaúba (Maceió, AL),


setembro 2020.
SUMÁRIO

P & R (1) Resistência característica com idade > 28 dias ......................... 1


P & R (2) Resistência característica de concretos com cimentos
pozolânicos. ............................................................................................... 3
P & R (3) O uso do fck63 .............................................................................. 5
P & R (4) Relação entre resistências em corpos de prova e em
testemunhos .............................................................................................. 7
P & R (5) Redução de cargas acidentais em edifícios (1) ......................... 9
P & R (6) Redução de cargas acidentais em edifícios (2) ....................... 10
P & R (7) Alternância de sobrecargas (1) ................................................ 12
P & R (8) Alternância de sobrecargas (2) ................................................ 14
P & R (9) Ações truncadas ...................................................................... 16
P & R (10) Imperfeições geométricas ...................................................... 18
P & R (11) Suporte das armações........................................................... 21
P & R (12) Controle simplificado da fissuração ....................................... 24
P & R (13) Resistência do concreto na estrutura para retirada de
escoramentos .......................................................................................... 27
P & R (14) Pilares cintados ..................................................................... 30
P & R (15) Lajes sem armadura transversal ............................................ 34
P & R (16) Ligação estaca - bloco no caso de estaca metálica carregada
lateralmente ............................................................................................. 37
P & R (1)
Resistência característica com idade > 28 dias

Colegas,

Com esta mensagem, dou início a uma série que busca obter Respostas a Perguntas
controversas do nosso dia-a-dia profissional, daí seu título P&R. Nada tem de original,
pois seções semelhantes existem em revistas técnicas, como na Concrete International
(ACI).

Colocarei perguntas de interesse, para as quais eu já tenha uma resposta. A intenção é


que essa resposta possa motivar outras mais, comentários, depoimentos e
controvérsias. O formato seguirá sempre o mesmo roteiro: enunciarei a pergunta, dando
preferência às dificuldades de aplicação das Normas, e, em seguida, apresentarei uma
possível resposta.

Nos enunciados, poderei simular circunstâncias, cuja semelhança com a realidade é


desejável, porém, será sempre uma mera coincidência: nomes, empresas, locais serão
sempre fictícios, por motivos óbvios.

PERGUNTA
O colega Arlindo telefonou do Rio preocupado! Algumas empresas, suas clientes, estão
a realizar os ensaios dos corpos de prova de concreto com idade, não de 28 dias (4
semanas), como é de praxe, mas sim com 42 dias (6 semanas) e até com 63 dias (9
semanas).

Pretendem, com isso, tirar proveito do aumento de resistência do material após os 28


dias, e assim ter menos dificuldades em atender às especificações com resistências mais
altas, como C50 e C60, que estamos, atualmente, a usar nos pilares inferiores dos
edifícios.

Pergunta ele: podemos usar, nos nossos projetos, valores de fck que só são
atingidos aos 42 dias ou aos 63 dias, em lugar do fck aos 28 dias?

RESPOSTA
Antes de responder à pergunta, é conveniente destacar que o símbolo f ck é reservado,
com exclusividade, para a resistência característica do concreto aos 28 dias de idade.
Se a idade do ensaio é diferente da de 28 dias, essa deve ser acrescentada a esse
símbolo. Assim, teremos aos 7, aos 42 e aos 63 dias, fck7, fck42 e fck63, respectivamente.
Aliás, como bem prescreve a NBR 6118, 8.2.4.

1
Respondendo diretamente à pergunta: Não, nós não podemos adotar em nossos
projetos valores de resistência característica do concreto obtidos em idades
superiores a 28 dias. Seja no dimensionamento, na verificação ou na revisão de
projetos, o valor de cálculo da resistência do concreto (fcd) será calculado em função de
fck (dispensável dizer, aos 28 dias). Quando se trata de uma verificação na fase de
construção, em que a idade j seja inferior a 28 dias, nesses casos sim, usaremos f ckj,
com j< 28 dias. Aliás, como claramente também prescreve a NBR 6118, 12.3.3.

A razão disso é simples. A resistência à compressão dos concretos cresce com


a idade, porém com variações diferentes, a depender do cimento usado. Os concretos
com cimentos ARI (alta resistência inicial), após os 28 dias apresentam menor
crescimento relativo de sua resistência do que os concretos com cimentos pozolânicos,
por exemplo. Antes dos 28 dias, essa situação se inverte, a resistência dos concretos
com cimento ARI, como seu nome indica, cresce mais rapidamente do que a dos demais.
Há, pois, evidente necessidade de se ter uma idade de referência para a especificação
do material e a escolhida é a de 28 dias. Não só entre nós, mas em todos os países. As
especificações dos cimentos acompanham necessariamente essa mesma idade de
ensaio, e assim as resistências dos concretos e dos cimentos são igualmente referidas
aos 28 dias de idade.

Além disso - nunca será demais frisar - que entre a resistência do corpo de prova e a
resistência da estrutura, construída com o mesmo concreto, existem sensíveis
diferenças, por muitas razões, bem conhecidas. Com isso, a especificação da resistência
do concreto assume o caráter de uma prescrição, de uma referência de qualidade e não
necessariamente a resistência do concreto na estrutura. Na verdade, tudo se passa
como se houvesse um acordo tácito, um contrato, um compromisso do construtor com o
proprietário assim expressa: se a resistência do concreto, medida de acordo com os
procedimentos padronizados, atender ao valor especificado para esse material, assim
como o aço, fica combinado que a obra, executada sob procedimentos normatizados e
em obediência ao projeto, será recebida e aceita como satisfazendo as exigências
normativas de segurança, etc.

Antonio C.R. Laranjeiras


Salvador, BA
13/02/2009

2
P & R (2)
Resistência característica de concretos com cimentos
pozolânicos.

Dou continuidade à série Perguntas & Respostas, animado pelo interesse inicial.

PERGUNTA
O colega Arlindo voltou a ligar, um tanto inconformado com minha resposta à sua
pergunta.

Disse-me ele:- Os argumentos das concreteiras merecem atenção. Elas esclarecem que
estão a usar o cimento CP II Z 32, um cimento com pozolana, que endurece mais
lentamente do que o cimento CP II F 32, por exemplo, e tem um bom ganho de
resistência após 28 dias. Com base nisso, lá na obra, estamos praticamente a descartar
os resultados a 28 dias, e adotando como referência os resultados a 63 dias. E então?
O que v. me diz? Se esse cimento tem esse diferencial, e atinge maiores resistências
após os 28 dias, por que não considerar esse fato nas nossas aferições de qualidade e
nos nossos projetos? Por que não adotar a resistência desses concretos aos 63 dias?

RESPOSTA
O cimento CP II Z 32, junto com o cimento CP II F 32 e o cimento CP II E 32, são objeto
de nossa Especificação EB 2138 – Cimentos Portland Compostos. A letra Z identifica a
adição de pozolana, enquanto as letras F e E identificam adição de filler e escória,
respectivamente. E agora vem a parte mais interessante: o número 32 representa a
resistência dos três cimentos, em MPa, aos 28 dias de idade, o que significa dizer que,
independente de Z, F ou E, qualquer desses cimentos deve atender ao mesmo valor de
resistência, aos 28 dias. Mais do que isso, segundo a EB 2138, devem também atender
aos mesmos valores mínimos de resistência aos 3 e aos 7 dias de idade. A EB 2138 não
faz qualquer referência ou exigência, quanto a resistências após os 28 dias, permitindo
entender que essa variação é irrelevante para a caracterização desses cimentos.

Com a crise do petróleo de 1973, a indústria mundial de cimento foi induzida a


abandonar a fabricação de cimento portland comum, substituindo-o por cimentos
compostos, cuja produção exige menor consumo de combustível. A condição
fundamental, no entanto, era que as resistências dos novos cimentos, nas idades de 3,
7 e 28 dias, não se alterassem, para as mesmas classes do produto. Por que? Para que
não se modificassem os procedimentos construtivos arraigados, referentes a prazos de
desforma e remoção de escoramentos. Mudavam-se os cimentos, mas de resto tudo
continuava igual. Mexer nisso é como enfiar um pau curto em um vespeiro!! Dizem os
construtores: diga-me como reduzir prazos, mas nem me fale em manter escoramentos
por intermináveis 2 meses!
3
Assim é que a idade de referência dos cimentos, qualquer que seja sua adição, é a de
28 dias. O projeto especifica resistência do concreto também aos 28 dias, e o controle
de qualidade desse material será, necessariamente, referido a 28 dias, a nenhuma outra
idade.

Quanto ao aumento de resistência após 28 dias, insisto que o ensaio aos 28 dias é mais
uma aferição de qualidade, e, dadas as diferenças entre resistência do concreto no CP
e na estrutura, não representa com fidelidade a resistência da estrutura. Se a resistência
do concreto, medida em corpos de prova, aumenta 25% após 28 dias, isso é bom, pois
quem sabe se, na estrutura, isso não acontecerá também, em pelo menos algumas de
suas peças! Pena que as estruturas, ao envelhecerem e antes de completar sua vida útil,
possam perder esse ganho, vitimadas pela inexorável deterioração.

Se algum dia no futuro, as Normas deixarem de ser prescritivas como agora, e passarem
a ser Normas de desempenho - uma tendência que já se visualiza - em que a qualidade
da estrutura não será aferida, meramente, pela qualidade dos materiais que a compõem,
mas sim pela sua resposta às diversas ações, perguntas como essas perderão
receptividade.

Respondendo objetivamente às perguntas:

- As aferições de qualidade do concreto devem ser feitas através de ensaios aos 28 dias
porque as especificações desse material, nos projetos, referem-se a essa idade e não a
outra.

- A escolha arbitrária da idade aos 28 dias tem muito a ver com os procedimentos
construtivos e prazos de remoção de escoramentos e formas. Aumentar a idade de
aferição de resistência traz consigo novos paradigmas na prática construtiva, exigindo
revisão de nossa normatização a respeito. Nada proíbe, nem impede, no entanto, que se
façam ensaios do concreto aos 63 dias, ou em outra idade, para fins específicos.

Antonio Carlos Reis Laranjeiras


Salvador, BA
15/02/2009

4
P & R (3)
O uso do fck63

PERGUNTA
Arlindo voltou a ligar:

- V. já leu a mensagem do Marcos? Ele toca justamente no meu caso! Nos pilares
inferiores lá da obra, antes da concreteira ajustar melhor o traço, o concreto apresentou
fck (28 dias) inferior ao fck= 60 MPa, especificado no projeto.

Pedimos ao projetista que verificasse a resistência desses pilares com os resultados de


fck63, que já se ajustam melhor ao 60 MPa, para ver se podemos aceitar esse concreto,
sem necessidade de reforço. E agora? O que v. acha? Estou errado? V. disse que, nem
em revisão de projeto, posso usar fck63, pois, segundo a NBR, devo usar fck. Posso ou
não posso usar fck63, nesses casos?

RESPOSTA
Pode sim! Nesse caso, não se trata de projeto, nem de revisão de projeto, em que a
estrutura ainda está por ser construída, quando ainda prevalece aquele acordo,
convencionado em Norma, de que já falei, pelo qual, atendidas as especificações dos
materiais, considera-se que a estrutura está conforme os requisitos normativos.

Agora, trata-se de uma situação de não conformidade de um material usado em um pilar


com as suas respectivas especificações, quando teremos de deixar de lado o
convencional e nos aproximarmos da realidade desse pilar possivelmente prejudicado
pela não-conformidade apontada.

A estratégia agora é a de tentar identificar, se o pilar, nas condições reais em que se


encontra, ainda atende aos requisitos de resistência. Nesses casos, o tratamento
normativo é outro, conforme esclareço a seguir.

A NBR 6118 regulamenta essa situação no capítulo 25 (25.3), onde trata da interface do
projeto com a construção. A Velha Senhora prevê, em caso de não-conformidade, a
"revisão do projeto para determinar se a estrutura, no todo ou em parte, pode ser
considerada aceita, considerando os valores obtidos nos ensaios." Revisão de projeto
tem aqui outra semântica diferente da revisão na fase de projeto, justificada por
alterações arquitetônicas ou outras. Ao se referir a ensaios, a VS não fixa idade do
concreto, pois pretende-se uma aproximação mais real entre corpo de prova e
estrutura. Como ações corretivas suplementares, a VS ainda prevê a extração de
testemunhos do próprio pilar, o que expõe, claramente, a sua intenção de ter uma
avaliação real do concreto existente no mesmo.

5
Portanto, a verificação de não-conformidades do concreto dos pilares pode fazer uso dos
resultados de ensaio a 42 dias, 63 dias ou 90 dias, de amostras do concreto usado nos
mesmos, conforme prevê a NBR 6118, 25.3.1.

Essa aparente permissividade, ditada pelas novas circunstâncias da não-conformidade,


não conflita, nem invalida a exigência da mesma NBR 6118, 12.3.3: "... o controle da
resistência à compressão do concreto deve ser feito aos 28 dias, de forma a confirmar o
valor de fck adotado no projeto."

Antonio Carlos Reis Laranjeiras


Salvador, BA
16/02/2009

6
P & R (4)
Relação entre resistências em corpos de prova e em
testemunhos

PERGUNTA
Um colega, em mensagem pessoal, perguntou:

No caso de extração de testemunhos do concreto de um pilar, e de posse de seus


resultados, como obter o valor do fcd, para a devida verificação do mesmo? A antiga
Norma específica, 7680:1983, referia-se ao assunto, mas a nova NBR 7680:2007
parece-me omissa a respeito.

O caro colega e amigo Prof. Marcello da Cunha Moraes (Brasília), por sua vez, em
mensagem divulgada no grupo, demonstra interesse pelo mesmo assunto e, pergunta:

Obtidos os resultados de resistência à compressão dos testemunhos extraídos do


concreto, como fazer para obter o fck,estimado?

O Prof. Marcelo enriquece sua pergunta com informações sobre resultados de pesquisa,
conduzida no Rio de Janeiro, na qual se buscam correlações entre a resistência à
compressão dos testemunhos com a resistência aos 28 dias de corpos de prova.

Associando o esclarecimento à pergunta acima, permito-me entender, salvo engano, que


o Prof. Marcello pergunta como obter o fck,est, correspondente a corpos de prova, a partir
de resultados obtidos em testemunhos. Esse fck,est permitiria rever a não-conformidade,
permitindo a aceitação do concreto, caso esse fck,est satisfaça ao especificado no projeto.

RESPOSTA
As respostas a essas perguntas necessitam de esclarecimentos preliminares, que as
fundamentam.

A conformidade ou não-conformidade do concreto com a especificação do projeto


(através de sua resistência à compressão) fica definitivamente estabelecida pelos
resultados dos respectivos ensaios de corpos de prova aos 28 dias de idade. Se os
resultados desses ensaios indicarem valor de fck,est menor do que o fck especificado no
projeto, convencionou-se dizer que o concreto usado não está em conformidade com as
especificações, e não há nada mais que possa vir a modificar essa afirmativa, capaz de
substituir não-conformidade por conformidade.

A NBR 6118 analisa a situação das não-conformidades e estabelece, em seu Capítulo


25 (Interfaces do projeto com a construção), que, apesar da existência de não-
conformidades, a estrutura, no todo ou em parte, poderá ser aceita, caso uma revisão
do projeto, considerando os valores obtidos nos ensaios, constate que a mesma satisfaz
7
os requisitos de segurança da mesma NBR. A estrutura será aceita, sem que isso
signifique dizer que a não-conformidade deixou de existir. Obviamente, se a estrutura foi
aceita, o concreto deverá ser pago pois recebido, podendo, no entanto, o fornecedor ser
penalizado pela não-conformidade constatada.

Em caso negativo, a NBR 6118 ainda permite o recurso seguinte da extração de


testemunhos do concreto da estrutura e a utilização de seus resultados, na revisão do
projeto da mesma, caso sua resistência à compressão seja, obviamente, superior à
utilizada na verificação anterior. Em caso positivo, a estrutura será aceita, mas, a meu
ver, a não-conformidade do material permanece, embora “eliminada”, na linguagem da
própria NBR 6118, por tornar-se sem efeito.

Entende-se do exposto que, havendo não-conformidade do concreto, o problema não


reside em verificar a possibilidade de aceitação desse material, através de outros
ensaios, como o dos testemunhos, mas sim em verificar a possibilidade de aceitar a
estrutura, apesar da não-conformidade constatada, adotando como resistência do
concreto a obtida através desses novos ensaios, com o concreto em idade maior do que
28 dias.

É conveniente que seja esse o entendimento porque a conversão de resultados de


testemunhos em resultados de corpos de prova padronizados é muito errática, e não há
relações unívocas entre seus valores. De fato, o ensaio de testemunhos afasta-se muito
do ensaio padronizado, ao introduzir muitos fatores de influência desfavoráveis,
inexistentes neste. O Prof. Adam Neville afirma (Concrete International, Nov.2001) que
os ensaios de testemunhos não conseguem ser convertidos, com grau aceitável de
confiabilidade, em resistência de cilindros padronizados.

Quanto à verificação da estrutura a partir dos resultados dos testemunhos,


recomenda a NBR 6118 que o valor correspondente de f ckj, est seja avaliado, em função
do número de testemunhos, de acordo com a NBR 12655, e que o valor de fcd seja
calculado pela expressão

fcd = fckj,est / (c/1,1), no ELU fcd = fckj,est /1,27

O coeficiente 1,1 é citado na NBR 6118, 12.4.1, e confirmado na NBR 7680:2007, 6.1.7.

Antonio Carlos Reis Laranjeiras


Salvador, BA
20/02/2009

8
P & R (5)
Redução de cargas acidentais em edifícios (1)

PERGUNTA

Uma colega, residente na bela Aracaju, questiona se as áreas destinadas a garagens,


que hoje ocupam andares inteiros, devem ou não devem ser classificadas como áreas
destinadas a depósitos, para efeito da redução de cargas acidentais prevista na NBR
6120:1980, 2.2.1.8, no cálculo de pilares e fundações.

RESPOSTA

Para tornar mais clara a pergunta, transcrevo o que dita o citado item da NBR 6120:

"No cálculo dos pilares e das fundações de edifícios para escritórios, residências e casas
comerciais não destinados a depósitos, as cargas acidentais podem ser reduzidas de
acordo com os valores indicados na Tabela 4". (o grifo é meu)

O que está pois por trás da pergunta é, na prática, o seguinte: se área de garagem não
é depósito, posso fazer a redução de sobrecarga; mas se, ao contrário, é classificada
como área de depósito, não posso fazer a redução prevista na NBR 6120.
Uma leitura ao pé-da-letra do texto normativo não incluirá as áreas destinadas a
garagens entre as áreas "destinadas a depósitos", já que a própria NBR 6120 trata
diferenciadamente na Tabela 2 os "Depósitos" das "Garagens e Estacionamentos" e
o projeto arquitetônico costuma identificar, separadamente, as áreas de Garagens das
áreas de Depósitos. Portanto, é lícito entender que se a Norma diferencia,
explicitamente, as Garagens dos Depósitos na Tab. 2, mas não exclui as garagens, e
sim apenas os depósitos da redução do item 2.2.1.8, é porque faz isso deliberadamente
e não por esquecimento ou omissão.
Salvo se nós - no uso de nossa autonomia em decisões a favor da segurança
- identificarmos entres as áreas de garagens e de depósitos semelhanças irmãs entre
suas características de uso e sobrecargas, que aconselhem excluir também as garagens
das reduções de sobrecargas, no cálculo de pilares e fundações.
Diria, sem receio de errar, que as garagens são de fato depósitos de veículos, pois os
mesmo lá permanecem, geralmente, por longo período de tempo; que as sobrecargas
de garagens (3 kN/m²), representam o peso dos veículos armazenados e têm as mesmas
características das sobrecargas dos depósitos.
Portanto, a resposta objetiva à pergunta é que as áreas destinadas a garagens, para
efeito da redução de cargas acidentais prevista na NBR 6120, devem ser entendidas
como áreas destinadas a depósitos, não cabendo, pois, essa redução de cargas nas
mesmas.
Antonio Carlos Reis Laranjeiras
Salvador, BA
08/03/2009

9
P & R (6)
Redução de cargas acidentais em edifícios (2)

PERGUNTA
A colega de Aracaju tinha mais uma pergunta:

A NBR 6120, pela sua Tabela 4, permite reduzir, no cálculo de pilares e fundações, 60%
das cargas acidentais até o 6º piso - contado de cima para baixo (incluindo, nessa
contagem, a cobertura). Isso quer dizer que, em um edifício de 20 andares, do 1º até o
15º, pode-se aplicar apenas 40% das cargas variáveis. Em que se baseia a Norma para
permitir essa grande redução?

RESPOSTA
Como a NBR 6120 não oferece esclarecimento a respeito, a resposta a essa
pergunta será intuitiva.

O cálculo dos esforços nos diversos elementos de uma mesma estrutura pressupõe que
sua probabilidade de ocorrência é a mesma, independentemente se é pilar, viga ou laje.
Realmente, os coeficientes de segurança (f) da Norma são sempre de mesmo valor,
indistintamente, para lajes, vigas ou pilares. Acontece porém que a grandeza da força
normal (N) nos pilares, em um dado andar, depende do carregamento nos vários pisos
que lhe ficam acima, enquanto que a grandeza dos esforços (M e V), nas lajes e vigas,
só dependem, praticamente, do carregamento no seu respectivo andar (se omitir a ação
do vento).

Dito isso, é intuitivo constatar que a probabilidade da carga variável atuar com seu valor
característico, simultaneamente, em todos os pisos que carregam um pilar, é menor do
que a probabilidade de ter essa carga atuando em apenas um piso. (Elementar, meu
caro Watson!).

Logo, só teremos a mesma probabilidade nessas duas situações, se, ao considerar


diversos pisos carregados, simultaneamente, para cálculo de N, adotarmos a carga
variável com valor menor do que o característico.

Portanto, bem pode ser essa a razão da redução preconizada na NBR 6120 para as
cargas variáveis, no cálculo de pilares e fundações, e esta é a minha resposta à
pergunta.

Devo frisar, porém que os pilares não são solicitados apenas por força normal (N), mas,
também, por momentos fletores. Estes, ao contrário da força normal, dependem apenas,
praticamente, das cargas atuantes no andar, não se deixando influenciar tão fortemente,
como acontece com N, pelos carregamentos nos pisos acima. Portanto, o procedimento
da NBR 6120 de fazer a redução nas próprias cargas variáveis do andar não é próprio,
pois assim ficam reduzidos simultaneamente todos os esforços, N e M. Correto seria
aplicar as cargas variáveis com seu valor característico em todos os andares, e fazer a
10
redução diretamente nas cargas N, devidas às cargas variáveis. Desse modo, preserva-
se o valor integral de M, que só depende da carga do andar e reduz-se N, que depende
da carga em todos os andares superiores.

A pergunta classifica a redução de 60% como sendo "grande" e eu também sou da


mesma opinião. Exageradamente grande. Senão vejamos. Reduzir a sobrecarga de
60%, significa dizer que basta de fato aplicar apenas 40% do valor característico da
mesma. Ora, 40% da sobrecarga é também, coincidentemente, a parcela quase-
permanente da carga variável nos edifícios, segundo a NBR 6118,Tabela 11.2.

Qual o significado físico dessa parcela quase-permanente da sobrecarga? É a parcela


da sobrecarga representada por móveis, armários, mesas, pias, geladeira, peças
sanitárias, etc. que atuam por grande parte da vida da estrutura, como se permanente
fossem. Portanto, por exclusão, o peso das pessoas não se inclui como parcela quase-
permanente. Óbvio!

Pelo visto então, em um prédio de 20 andares, como na pergunta, por exemplo, os


primeiros 15 andares só estão carregados com carga equivalente à parcela quase-
permanente da sobrecarga. Será que isso quer dizer, que, em um dia normal de serviço
no edifício comercial, ou em uma hora qualquer da noite em um edifício residencial, não
há uma vivalma, ninguém, em 15 dos seus 20 andares, já que a sobrecarga foi reduzida
para 40%?? Se estou sofismando, alguém estará exagerando: ou nos 40% da quase-
permanente ou nos 40% da carga reduzida para os pilares.

Essa inconsistência ainda fica maior, quando consideramos a combinação de


sobrecarga com vento, e reduzimos a sobrecarga para 70%. Se a mesma já estiver
reduzida para 40%, teremos, nessa combinação: 0,7 x 0,4 = 0,28. Só restam agora 28%
do valor característico da sobrecarga! Abaixo da parcela quase-permanente!!

Antonio Carlos Reis Laranjeiras


Salvador, BA
10/03/2009

11
P & R (7)
Alternância de sobrecargas (1)

PERGUNTA

Um colega de Salvador procurou-me, em busca de respostas às dúvidas que o afligiam


em um projeto seu de um edifício, submetido à verificação de conformidades.

O Relatório da verificação alegava que o colega não teria considerado, devidamente, em


seu projeto, a alternância de cargas variáveis, conforme prevê a NBR 6118 14.6.7.3. O
colega argumentava, inconformado, que se tratava de um edifício usual, de escritórios,
no qual, a sobrecarga prevista para "salas de uso geral e banheiro", segundo a NBR
6120, é de apenas 2 kN/m².

- "Nunca considerei alternância de sobrecargas com valores menores do que 3kN/m².


Esse limite, salvo engano, constava da Norma anterior!!"

Perguntou ele: Essa exigência, para sobrecargas de 2 kN/m², está correta? Como
interpretar devidamente esse item citado da Norma?

RESPOSTA

Façamos, inicialmente, uma leitura atenta do item 14.6,7.3 da NBR 6118. Diz a Norma,
textualmente:

-"Para estruturas de edifícios em que a carga variável seja no máximo igual a 20% da
carga total, a análise estrutural pode ser realizada sem a consideração de alternância de
cargas."

Portanto, em outras palavras, o que a Norma pretende é que, no caso contrário, quando
a sobrecarga representar mais de 20% da carga total, a alternância da mesma deve ser
considerada na análise estrutural. Ou seja, a sobrecarga deve ser disposta, nos painéis
de lajes e nos vãos das vigas, com os arranjos que conduzam aos valores mais
desfavoráveis de esforços na estrutura, sempre que a sobrecarga for maior do que 20%
da carga total.

No projeto do edifício do colega, tinha-se o seguinte:

a) espessura média de piso, obtida pela divisão do volume total de concreto das lajes e
vigas do piso pela área do mesmo = 0,17 m. A essa espessura, corresponde um peso
unitário = 0,17 x 25 = 4,25 kN/m².

b) peso do revestimento de piso = 1 kN/m²

c) sobrecarga = 2 kN/m².

Logo, temos, para o peso total= 4,25 + 1 + 2= 7,25 kN/m².

12
A sobrecarga representa, portanto, 2 / 7,25 x100 = 27,6% > 20%

De fato, nesse caso, a sobrecarga representa mais de 20% da carga total, e, por isso,
segundo a NBR 6118, a análise estrutural deve considerar a alternância da sobrecarga.

Talvez seja essa, como diz o colega, uma exigência da Norma que se contrapõe à prática
corrente de projeto.

Talvez seja essa, por isso mesmo, um dos itens da Norma menos observado pelos
projetistas, meio escondido, lá em meio do capítulo 14.

Talvez, na próxima revisão, esse item seja modificado, tornando-se mais permissivo.

Mas a exigência em vigor é essa!

E o Relatório da verificação de conformidades estava correto.

Mesmo sobrecargas de 1,5 kN/m2, no projeto do colega, exigiria alternâncias, para


determinação de esforços máximos na estrutura.

Antonio Carlos Reis Laranjeiras


Salvador, BA
22/03/2009

13
P & R (8)
Alternância de sobrecargas (2)

PERGUNTA

O colega tinha mais uma pergunta sobre esse assunto.

Ao fazer alternância de cargas, em vigas contínuas, teremos, alternadamente, vãos


carregados com a sobrecarga e outros não. (Daí a designação "alternância de
sobrecargas"). Nos vãos carregados, a carga permanente soma-se à sobrecarga,
produzindo assim efeito desfavorável, aumentando os esforços nesses vãos. Já a carga
permanente situada nos vãos vizinhos, descarregados, exerce, ao contrário, um efeito
favorável, reduzindo os esforços nos vãos carregados.

Pergunta: Como levar em conta esses efeitos favoráveis e desfavoráveis das cargas
permanentes ao fazer a análise das vigas sob alternância de sobrecargas, exigida na
Norma?

RESPOSTA

A resposta é simples.

Basta fazer a análise aplicando sobre as cargas os coeficientes de ponderação f


indicados na NBR 6118 Tabela 11.1, a qual inclui valores diferentes para esses
coeficientes, quando os efeitos da carga permanente são desfavoráveis (D) ou
favoráveis (F). Assim, tudo se passa como se tivéssemos dois valores diferentes de
cálculo para as cargas permanentes g: um igual a 1,4.g, para a permanente desfavorável
e outro, igual a 1,0.g, para a permanente favorável. A sobrecarga q, por sua vez, será
multiplicada por 1,4, aplicando-se, assim, nos vãos mais carregados, a combinação 1,4.g
+ 1,4.q, e, nos vãos descarregados, apenas 1,0.g.

Acontece que a NBR 6118 Tabela 11.3 esclarece, em uma nota ao pé dessa Tabela,
textualmente:

" No caso de estruturas usuais de edifícios, essas combinações que consideram g


reduzido (1,0) não precisam ser consideradas."

A pergunta inevitável, que decorre, naturalmente, desse esclarecimento da Norma, é a


seguinte:

Em que casos as estruturas de edifícios não devem ser mais consideradas como
"usuais"?

Essa pergunta é, para mim, bem mais difícil de responder do que a outra pergunta acima.

14
De fato, o que será que caracteriza uma estrutura não-usual de edifício, que nos obriga
a considerar, os efeitos favoráveis e desfavoráveis da carga permanente, ao fazer
a alternância de sobrecargas?

Será que são os vãos acima de 5 m?

Ou será que são as sobrecargas maiores do que 3 kN/m²?

Ou quando vãos maiores que 5 m se associam a sobrecargas maiores do que 3 kN/m²?

Ou pisos de lajes sem vigas, pela sua maior sensibilidade às ações da sobrecarga?

Ou os pisos protendidos, com vigas ou sem vigas, já que associam vãos de pelo menos
8 m com a protensão?

Posso até enunciar e justificar uma opinião como resposta. Difícil, porém, será saber se
essa resposta coincide com o que pensava a nossa Velha Senhora (a NBR 6118), ao
redigir seu esclarecimento. Confiemos que ela (a V.S.), em sua próxima edição,
complemente esse esclarecimento, de modo que o mesmo não enseje mais essa difícil
pergunta.

Antonio Carlos Reis Laranjeiras


Salvador, BA
26/03/2009

15
P & R (9)
Ações truncadas

PERGUNTA

Um colega de Salvador questiona, por e-mail:

"Como considerar devidamente as cargas ditas "truncadas"? A NBR 8681 (Tabela 4)


define-as como aquelas que não podem superar um determinado limite, por estar este
truncado por um "dispositivo físico". A NBR 6118 11.4.1.3, por sua vez, parece
exemplificar essa condição ao dizer que o nível d'água adotado para o cálculo de
reservatórios, etc. deve ser o máximo possível com o sistema de extravasão. Ora, o
dispositivo físico, no caso dos reservatórios, representado pelo sistema de extravasão
pode falhar, permitindo que o nível d'água se eleve até à borda dos reservatórios
e piscinas, aumentando assim o empuxo. A rigor, portanto, a carga só será truncada, ao
nível máximo possível da água - a borda do reservatório - e não ao nível do "dispositivo
físico". Não seria este um caso do projeto entender como carga truncada a referida ao
nível máximo, em vez de referi-la ao dispositivo físico de extravasão? Em apoio a essa
idéia, veja-se a força de protensão, por exemplo, que não é limitada por nenhum
dispositivo físico, mas sim por uma limitação de tensão que pode ser aplicada no aço de
protensão, por ocasião de seu esticamento."

RESPOSTA

Esclareço que as nossas Normas (NBR 6118 e NBR 8681) preveem dois tipos de
carregamento, nos estados limites últimos: o carregamento normal e o especial, com
seus respectivos valores de coeficientes de proporcionalidade f .

O carregamento normal decorre do uso previsto para a estrutura e,


extensivamente, para a construção.

São assim exemplos de carregamentos normais:

(a) o empuxo da água em reservatórios, limitado pelo sistema extravasor, pois esse é o
uso previsto. Com f= 1,2;

(b) a subpressão em uma estrutura, referida ao nível do lençol d'água no solo, conforme
previsto. Com f= 1,2 ;

(c) a força de protensão especificada pelo projetista. Com f= 1,2.

O carregamento especial decorre de ações com intensidades especiais, cujos efeitos


superam em intensidade os efeitos dos carregamentos normais, cuja possibilidade de
ocorrência pode justificar a necessidade de sua consideração. Esclarece a NBR 8681
4.3.2.2 que os carregamentos especiais são transitórios , e, ao contrário dos
carregamentos normais, considerados apenas na verificação dos estados limites últimos.

16
Servem como exemplos de carregamentos especiais:

(a) o empuxo da água em reservatórios, referido ao bordo superior de suas paredes,


sob a hipótese de falência do extravasor, com f= 1,1;

(b) a subpressão em uma estrutura, referida a nível d'água superior ao previsto, com
f= 1,1;

(c) força de protensão referida ao limite máximo de tensão da NBR 6118, apesar do
projeto fazer uso de tensões menores ao especificar a força inicial de protensão, sob a
hipótese de que a operação de protensão pode, deliberadamente, usar esses limites
para compensar alongamentos deficientes, mantido f= 1,2, especificamente, pela NBR
6118 Tabela 11.1. Contraditoriamente, a NBR 8681 Tabela 4, prevê, para as ações
especiais, truncadas, entre as quais se inclui força de protensão, f= 1,1.

Antonio Carlos Reis Laranjeiras


Salvador, BA
07/04/2009

PS - O critério de escolha das questões dos P & R é que tenham caráter polêmico e, por
isso, possam comportar respostas controversas. As Respostas apresentadas à todas as
Perguntas são apenas as minhas respostas, na esperança de estimular outras. Fiquem
à vontade!!

17
P & R (10)
Imperfeições geométricas

PERGUNTA

Recebi da Engª Iracema, Salvador, perguntas por e-mail, que correspondem a uma
dúvida e a uma curiosidade:

"A NBR 6118, ao indicar a expressão para cálculo do ângulo de desaprumo dos pilares,
item 11.3.3.4.1, esclarece que "n é o número de prumadas de pilares". O que significa
esse "número de prumadas"? É o número de prumadas contidas em um mesmo plano,
correspondendo, na figura da Norma, n=3; ou é o número total de pilares que estão em
um mesmo andar? Qual a origem da expressão do desaprumo da Norma? Como se
chegou a esses valores? "

RESPOSTA

De fato, a NBR 6118 estabelece que, na análise da estabilidade global dos edifícios,
devemos considerar um desaprumo na verticalidade dos pilares, medido pelo ângulo a,
em radianos, dado pelas equações:

a= 1. n
onde:
1= 0,01/raiz(H)

H - altura do edifício, em m

n= raiz((1+1/n)/2)

n - número de prumadas de pilares, isto é, número total de pilares existentes em um


mesmo andar. O verbete "prumada" pretende dar a entender que os pilares são
contínuos nos diversos andares.

O coeficiente redutor n tem em conta a diversidade de desaprumos dos pilares


superpostos, contínuos, os quais, de um andar para outro, mudam de valor, podendo até
inverter seus sinais, conforme ilustra a figura abaixo.

18
A expressão da Norma para os desaprumos nos pilares baseia-se no trabalho dos
autores Stoffregen, U & König, G, publicado na revista Beton-und Stahlbetonbau 74
(1979), nº 1, p.1-5, intitulado "Desaprumo de pilares em estruturas aporticadas, de
elementos pré-moldados de concreto" (do original, em alemão). Nesse trabalho, os
autores apresentam uma avaliação estatística de 2.000 medições de prumo, feitas em 8
estruturas de edifício, pré-moldadas, e propõem que o desaprumo (em radianos) seja
estimado, em projeto, pela expressão:

a= 0,001 + 0,007/raiz(n)

onde n é o nº total de pilares por andar.

A figura abaixo demonstra, para um edifício de 5 andares, que a expressão da


NBR6118, comum ao Eurocode EC2, coincide relativamente bem, a favor da
segurança, para n igual ou maior do que 10.

19
Referência: LITZNER, H - Design of Concrete Structures to ENV 1992 - Eurocode 2.
In: Concrete Structures Euro-Design Handbook. 1994-1996.p.169

Que os valores de desaprumo, medidos em estruturas pré-moldadas, são igualmente


válidos para estruturas moldadas in-loco é o que se depreende da utilização genérica
pela Norma dos resultados de Stoffregen & König. Há, no entanto, controvérsias a
respeito, pelas sensíveis diferenças entre os parâmetros envolvidos, nos dois casos, que
influenciam nos desaprumos dos pilares. A meu ver, uma pergunta ainda sem resposta.

Antonio Carlos Reis Laranjeiras


Salvador, BA
12/04/2009

20
P & R (11)
Suporte das armações

PERGUNTA

"O Construtor pediu-me para fornecer detalhes dos ferros que devem suportar a armação
da face superior de blocos de fundação relativamente altos. Imaginava que a fornecedora
dos ferros cortados e dobrados se encarregasse desses ferros suplementares, sendo
dispensável esse detalhamento. Mas esse Construtor deverá ele próprio cortar esses
ferros no canteiro e quer os detalhes. Entendo que, como esses ferros têm apenas a
função construtiva de suportar a armação, não necessitam atender rigorosamente aos
diâmetros de dobramento da Norma e exigências de ancoragem. Será que v. poderia
orientar-me? Quais os detalhes aconselháveis para esses ferros?"

RESPOSTA

Os ferros de suporte das armações superiores de blocos de fundação a que v. se refere


estão ilustrados na foto abaixo.

As nossas Normas não oferecem indicações quanto aos detalhes desses ferros, mas
exigem que "a armadura deve ser posicionada e fixada no interior das formas de acordo
com as especificações de projeto, com as tolerâncias estabelecidas ..., de modo que
durante o lançamento do concreto se mantenha na posição estabelecida, ..." (NBR 14931
8.1.5.5), acrescentando: "O posicionamento das armaduras negativas deve ser objeto
de cuidados especiais em relação à posição vertical. Para tanto devem ser utilizados
suportes rígidos e suficientemente espaçados para garantir o seu posicionamento."

21
Na literatura, recomendam-se os dois tipos de ferros de suporte representados nas
figuras abaixo.

Recomenda-se também que os pinos de dobramento tenham os diâmetros


correspondentes a estribos, por serem menores, maximizando assim os trechos retos
(B, F e D, nas figuras). Caso os suportes se assentem diretamente sobre formas, os
comprimentos mínimos de B e F são os indicados na Tabela abaixo.

Caso os suportes se apoiem diretamente sobre a armadura inferior, é necessário que os


comprimentos B e F sejam pelo menos 1,5 vezes o espaçamento das barras dessa
armadura, a fim de que encontrem apoio em pelo menos duas barras horizontais, como
ilustra a foto baixo. Do mesmo modo, o comprimento superior D deve ser também 1,5 o
espaçamento das barras superiores, para que sirva de apoio a duas dessas barras.

22
O suporte tipo (1) é mais fácil de dobrar do que o tipo (2), mas este, por sua vez, por
possuir pernas verticais em vez de inclinadas como os do tipo (1), resistem melhor ao
peso da armação que devem suportar, embora, convenhamos, as pernas inclinadas
permitem um ajustamento melhor da altura, ao aumentar ou diminuir a inclinação das
mesmas.

Caso os suportes tenham altura maior do que 1,2 metros, é recomendável contraventá-
los a meia altura, com barras horizontais de bitolas 10 ou 12.

Condensado e adaptado de Concrete Q&A, Fabrication of Standees, ACI Concrete International, March
2009, p.84-5

Antonio Carlos Reis Laranjeiras


Salvador, BA
21/04/2009 Dia de Tiradentes

23
P & R (12)
Controle simplificado da fissuração

PERGUNTA

"A NBR 6118 apresenta, na Tabela 17.2, valores de diâmetro e espaçamento máximos
das armaduras, que, se respeitados, atendem, segundo essa Norma, ao estado limite de
fissuração, dispensando a verificação da abertura de fissuras pelas equações do item
17.3.3.2.

Como é que a Norma chegou a esses valores da Tabela 17.2?

V. poderia esclarecer mais detalhadamente o uso dessa Tabela para o controle


simplificado de fissuração?"

RESPOSTA

Como a Norma chegou aos valores da Tabela 17.2:

Os valores da Tabela 17.2 não foram obtidos, como v poderia supor, a parir das
equações de abertura de fissuras wk do item 17.3.3.2. Na realidade, essas equações de
wk foram propostas pelo saudoso Prof. Lobo Carneiro (COPPE-Rio), com base em um
artigo de sua autoria, publicado na já extinta revista ESTRUTURA, enquanto que
a Tabela 17.2 é uma transcrição literal das Tabelas 4.11 e 4.12 da norma europeia EC2,
dezembro, 1991, originadas, por sua vez, de uma proposição do Prof. Karl
Kordina (Alemanha), publicada em um dos cadernos (Heft 425) da Assoc. Alemã do
Concreto Armado (DAfStb).

Apesar de suas origens diversas, seus resultados são consistentes entre si, o que vale
dizer, que, se respeitados os valores da Tabela 17.2 para max e s, os valores de
abertura de fissuras calculados segundo as equações do item 17.3.3.2 resultarão de fato
inferiores aos valores limites (0,3 mm para concreto armado e 0,2 mm para concreto
protendido).

Para chegar aos valores das citadas Tabelas, o Prof. Kordina utilizou as equações de
fissuração do EC2 para representar, graficamente, a relação entre  e a taxa de
armadura, em seções retangulares de diferentes alturas (40 a 80 cm), para uma dada
tensão s, e um mesmo valor de wk (0,3 mm ou 0,2 mm). Traçou um gráfico para cada
valor de s adotado (160, 200, 240, 280, 320, 360 e 400 MPa), mantidos sempre
constantes o cobrimento (h-d=4 cm) e a resistência à tração do concreto (fctm= 2,5 MPa).
Confira abaixo um desses gráficos, justamente o referente a wk= 0,3 mm e s = 280
MPa, que resultou na escolha de fmax = 16 mm.

24
Pela figura, v. pode ver que, para s = 280 MPa, foi escolhido o diâmetro máximo de 16
mm, correspondente à curva mais baixa (h= 40cm) e, arbitrariamente, à taxa de
armadura igual a 0,4%, (dispensando os valores mais favoráveis das taxas mais baixas
que essa). De modo semelhante, para cada gráfico, correspondente aos demais valores
de s, foram determinados os valores dos diâmetros máximos, que compõem a Tabela
do EC2 e da NBR 6118.

Pela figura, v. pode identificar também que, para vigas com altura maior do que 40 cm,
os valores do diâmetro máximo são maiores, mais favoráveis portanto do que os da
Tabela.

V. poderá induzir também que se o concreto tiver fctm > 2,5 MPa (fck > 25 MPa), e se
(h-d) < 4 cm, os diâmetros máximos das barras também podem ser maiores, isto é, mais
tolerantes do que os da Tabela da Norma. Esses valores a favor da segurança da Tabela
justificam-se pelo caráter simplificado e aproximado da verificação pretendida.

A Norma europeia EC2 permite, nos casos de fissuração por flexão, provocada por
cargas externas, que se considere, opcionalmente, correções devidas a h> 40 cm e a
valores de (h-d) < 4 cm, supondo uma variação linear. Isso significa dizer que os valores
dos max podem ser corrigidos pelo coeficiente de majoração (vamos chamar ) :

= 4/(h-d). h/40 = 1/10. h/(h-d) >= 1,0

Como aplicar os valores da Tabela 17.2:

A verificação da segurança à fissuração das vigas de concreto armado ou protendido


devem ser realizadas com carregamento sob combinação frequente, conforme preconiza
a NBR 6118, Tabela 13.3.

25
A tensão s, para uso da Tabela 17,2, "deve ser determinada no estádio II", segundo
próprio item 17.3.3.3 da NBR 6118. Com isso, podemos determinar s pela expressão:

s= (M/z + N) / As

onde z, pode ser adotada simplificadamente = 0,9.d, e N - força normal ou força de


protensão, após perdas, positiva se tração.

Vamos ilustrar com um exemplo numérico de uma viga de concreto armado.

Seja uma viga de concreto armado, seção T, que, em um determinado vão, apresenta
os seguintes dados (símbolos de acordo com a NBR 6118):

b= 66 cm; bw= 30 cm; h= 60 cm; hf= 19 cm; d= 55 cm

Mfreq= 179,3 kNm

armadura de tração: 2 20 + 2 25; As= 16,1 cm² (CA-50)

Calculando s:

s= Mfreq/As/0,9/d= 179,3/ 16,1/ 0,9/ 0,55* 10= 225 MPa

Entrando na Tabela 17.2, verifico que a tensão de 225 MPa situa-se entre os valores 200
e 240 MPa, correspondentes às bitolas 25 e 20, respectivamente. Interpolando entre
esses valores, encontro:

max = 25 - (25-20). (225-200) / (240-200) = 25 - 5.25/40 = 21,9 mm

Como a armadura é composta de barras 20 e 25 > 21,9 mm, concluo que a seção não
satisfaz a verificação simplificada de fissuração (wk=0,3 mm), sendo necessário calcular
abertura de fissuras pelas equações do item 17.3.3.2, para verificar se wk,calc é menor
do que 0,3mm. Antes disso, vou lançar mão do recurso de corrigir o valor do diâmetro
máximo por ter h=60 > 40 cm; e (h-d)= 60-55= 5 > 4cm.

= 1/10. h/(h-d)= 1/10. 60/ 5 = 1,2

Com isso, o novo valor do diâmetro máximo passa a ser

max = 1,2. 21,9= 26,3 > 25 mm

Ufa!! Livrei-me daqueles cálculos de wk!!

Referência: LITZNER, H. Design of Concrete Structures to ENV 1992 - Eurocode 2. In:


Concrete Structures. Euro-Design Handbook.Ernst & Sohn, 1995

Antonio Carlos Reis Laranjeiras


Salvador, BA
03/05/2009

26
P&R (13)
Resistência do concreto na estrutura para retirada de
escoramentos

PERGUNTA

Nossa Norma exige que a retirada dos escoramentos e das formas só seja feita quando
o concreto tiver a resistência e o módulo de elasticidade definidos pelo calculista. Como
determinar se o concreto, na estrutura, atende essas condições?

RESPOSTA

Realmente, a Norma ABNT NBR 14931:2004, Execução de Estruturas de Concreto,


estabelece, na subseção 10.2.2:

“A retirada das fôrmas e do escoramento só pode ser feita quando o concreto estiver
suficientemente endurecido para resistir às ações que sobre ele atuarem e não conduzir
a deformações inaceitáveis...”,

“Para o atendimento dessas condições, o responsável pelo projeto da estrutura deve


informar ao responsável pela execução da obra os valores mínimos de resistência à
compressão e módulo de elasticidade que devem ser obedecidos concomitantemente
para a retirada das fôrmas e do escoramento...”

Portanto, o Projetista deve informar ao Construtor os valores mínimos de fc e de Eci; o


Construtor, por sua vez, antes de remover os escoramentos, deve verificar, através de
procedimento normatizado, se a resistência à compressão fc e o módulo de elasticidade
Eci do concreto, na estrutura, atendem às especificações ditadas pelo Projetista.

Não existe, no entanto, normatização brasileira de como proceder para verificar se as


especificações do concreto, na estrutura, foram atendidas, salvo por extração e análise
de testemunhos. Não se trata de realizar ensaios de controle de recebimento do
concreto, em que os corpos-de-prova são mantidos protegidos e sob cura úmida,
padronizada, pois, essas não são as condições do concreto na estrutura. Logo, a Norma
ABNT NBR 5738, referente à moldagem e cura de corpos-de prova, não se aplica ao
caso.

Como v. vê, não tenho apoio em Normas ABNT para responder à sua pergunta, salvo se
apelar para a extração de testemunhos, o que não é uma alternativa razoável, dados os
custos e dificuldades desse tipo de ensaio. Esse lapso das nossas Normas se contrapõe
a um princípio básico da garantia de qualidade, preconizado na literatura técnica, o qual
ensina que “você só pode controlar o que pode verificar, e você só pode exigir o que
pode controlar.” Logo, se a Norma manda especificar, tem a obrigação de dizer como
verificar, pois, as duas coisas estão associadas como as duas faces de uma mesma
moeda.

27
Posso, no entanto, responder à sua pergunta, informando o que dizem a respeito normas
estrangeiras, como as americanas, por exemplo, embora a validade desses
procedimentos possa ser contestada entre nós, justamente por falta de normatização
nacional.

Mas vamos lá! As normas americanas ACI 318 e ACI 301- correspondentes às nossas
NBR 6118 e NBR 14931- exigem corpos-de-prova cilíndricos, curados no canteiro
conforme a norma ASTM C31, para determinar se o concreto atingiu a resistência
especificada para retirada das formas ou escoramentos. Apesar das grandes diferenças
que podem ocorrer entre a resistência medida nesses corpos-de-prova e a da estrutura,
pela dificuldade em conseguir condições semelhantes de adensamento e cura, esse é o
procedimento convencional, preconizado nessas Normas.

Essas mesmas Normas admitem procedimentos alternativos, se aprovados pelo


Proprietário, entre os quais destaca-se o da utilização de corpos-de-prova moldados e
curados na própria estrutura, sob as mesmas condições desta, conforme a norma ASTM
C 873. Nesse procedimento, moldam-se os corpos-de-prova cilíndricos junto com a laje
da estrutura, com auxílio de moldes devidamente fixados às formas, conforme ilustra a
figura abaixo. A laje deve ter espessura variando entre 12 cm e 30 cm.

Outros procedimentos alternativos são também lembrados, como o ensaio de


penetração, Norma ASTM C 803 - em que se correlaciona a resistência à penetração de
um pino de aço no concreto com sua resistência – ou o ensaio de arrancamento, Norma
ASTM C 900 – em que a correlação é entre a resistência ao arrancamento de um pino
de aço e a resistência do concreto. Esses procedimentos necessitam de ser previamente
calibrados com o concreto a ser usado na obra, o que dificulta muito seu emprego. As
figuras abaixo ilustram esses dois procedimentos.

28
Antonio Carlos Reis Laranjeiras
Salvador, BA
18/06/2009

29
P & R (14)
Pilares cintados

PERGUNTA
"A nova norma simplesmente não fala, (pelo menos eu não encontrei nada), sobre pilares
cintados. Com a nova formulação do cálculo de pilares os pilares cintados ficaram
proibidos?" Pergunta, do Maranhão, o estimado colega Antonio Palmeira, em sua msg
de 26/06/2009.

RESPOSTA

Proibidos os pilares cintados não estão, antes, diria eu, esquecidos! Talvez, por mais um
desses caprichos inexplicados da Velha Senhora - como é também carinhosamente
chamada a nossa Norma ABNT NBR 6118, pela precedência que tem sobre as demais
- caprichos esses sobre os quais silenciam, respeitosa e enigmaticamente, os
Comentários editados pelo IBRACON. Razões há para que os pilares cintados não
tenham hoje o destaque de antes, mas não justificam o seu esquecimento. Vamos
explorar essas razões.

Os pilares curtos, cintados distinguem-se dos pilares comuns, não cintados, por
substituírem os estribos regulares, que envolvem as barras principais, por uma densa
armação em forma de hélice, designada cintamento, conforme ilustra a figura 1, abaixo.

Figura 1, ilustrativa dos pilares comuns, não-cintados, e dos pilares cintados

30
Os ensaios com pilares cintados e não-cintados demonstram que, até uma determinada
carga, ambos se comportam de modo semelhante, não fazendo qualquer diferença a
presença do cintamento, conforme representação gráfica na Figura 2, abaixo.

Figura 2- Diagramas idealizados de carga-deformação de pilares comuns e cintados

Logo após atingir essa carga, identificada, na fig. 2, para os pilares comuns, como carga
máxima, esses pilares se rompem. A ruptura se dá pelo esmagamento do concreto, de
modo semelhante à ruptura dos corpos de prova, acompanhada do encurvamento para
fora das barras longitudinais, no intervalo entre estribos, conforme ilustra a figura 3,
abaixo. Já os pilares cintados, ao atingir essa carga, entram em processo de fissuração
e de ruptura da capa de concreto que serve de cobrimento ao cintamento, conforme
ilustra também a figura abaixo;

Figura 3. à esquerda, uma ruptura típica de um pilar curto, comum, não cintado, com
relação altura/largura= 7,5; à direita, a ruptura de um pilar cintado, com diâmetro de 80
cm, e relação altura/diâmetro= 6,6
31
O cintamento só passa a colaborar após o colapso do cobrimento e de grandes
encurtamentos (ver gráfico da figura 2). Nessa fase, o cintamento exerce pressões de
compressão sobre o núcleo do pilar (ver fig. 1), aumentando sua resistência às cargas.
Quando o cintamento é muito grande, esse aumento pode elevar essa capacidade de
carga do núcleo a um valor acima da carga máxima do pilar não-cintado (ver novamente
a figura 2). A Norma americana ACI 318 recomenda que, havendo cintamento, este seja
apenas o suficiente para dar ao núcleo a mesma capacidade de carga do pilar sem o
cintamento (ver figura 2).

Os excessivos encurtamentos necessários à participação do cintamento tornam o


mesmo de valor questionável na segurança à ruptura, como definida atualmente, em
termos de estado limite. E essa bem pode ser a razão do esquecimento dos pilares
cintados pela Velha Senhora!

Mas é importante notar que, se o cintamento não aumenta a resistência do pilar, se


referida a estado limite último, por outro lado, dá ao pilar uma capacidade muito maior
de resistir a grandes deformações, antes de seu total colapso.

Essa é uma característica muito importante no comportamento do pilar sob efeitos de


uma explosão ou de um forte impacto sobre ele, pois o cintamento permite que ele
absorva muito mais energia do que um pilar comum.

Em ocorrência de terremotos, por exemplo, o pilar cintado é mais eficaz em evitar


colapsos do que os pilares comuns, conforme ilustra a foto abaixo, onde se vê um pilar
cintado ao lado de um não-cintado, e de como o cintado foi capaz de evitar o colapso do
piso.

Figura 4- Na foto à esquerda, vê-se o pilar comum completamente destruído pelo terremoto, ao lado de
um pilar cintado, semidestruído, mas ainda suportando o piso. A foto da direita é uma outra vista do
mesmo pilar cintado

32
Os pilares cintados mantêm, portanto, sua importância, em virtude de seu
comportamento mais favorável em situações extremas de explosões, impactos e
sismos. Merecem, pois, ter sua importância resgatada, como parece reivindicar o
colega Palmeira.

================
Todas as figuras desta msg foram extraídas do livro do saudoso mestre PHIL M.
FERGUSON - Reinforced Concrete Fundamentals, 4ª edição, 1981

Antonio Carlos Reis Laranjeiras


Salvador, BA
27/06/2009

33
P & R (15)
Lajes sem armadura transversal

PERGUNTA

"O limite para dispensa de armadura para força cortante em lajes está indicado no item
19.4.1 da Norma.

A publicação Comentários do Ibracon recomenda que "sob elevadas cargas" deve-se


adotar o critério de revisão da norma 6118, publicado na NBR 7197, de 1989. Este valor
é muito maior que o prescrito na norma atual.

Há também uma recomendação no recente livro do ilustre Prof. Fusco (Solicitações


Tangenciais) que conduz a valores completamente diferentes de nossa NBR 6118.

Como podemos definir elevadas cargas?

Em projetos de obras hidráulicas, normalmente, as lajes estão submetidas a elevadas


cargas de subpressões ou de equipamentos pesados. Poderemos considerar as
recomendações do Ibracon? E em edificações industriais? Como os colegas têm
procedido?"

Pergunta dirigida ao nosso grupo pelo colega José Roberto Pinto, RJ, em julho, 2009.

RESPOSTA

Apresentarei alguns esclarecimentos preliminares, que julgo indispensáveis às


respostas.

Desde a nossa NBR 6118 anterior, que os limites para dispensa de armadura para força
cortante em lajes, espelhando-se na regulamentação internacional da fib (CEB), foram
fixados em valores praticamente iguais à metade dos valores da versão de 1960 dessa
mesma Norma. A fib justifica esses baixos valores, aquém inclusive dos resultados
de ensaios, pelas incertezas que a ausência de armadura transversal pode gerar. Alega
a fib que a fissuração diagonal, uma das formas de ruptura por força cortante, pode ser
precocemente induzida pela presença de fissuras ou microfissuras, nas estruturas reais,
provocadas por fenômenos erráticos, tais como retração térmica e hidráulica,
temperatura, etc. A idéia é que, se esses mesmos fenômenos tornam obrigatório o uso
da armação transversal em vigas, a sua dispensa, nas lajes, deve ser acompanhada e
avalizada por cautelas extraordinárias de segurança. Ainda hoje, as Normas Européias
mantêm essa postura conservativa nos limites para dispensa de armadura transversal
em lajes.

Os ensaios demonstram que lajes sob carga distribuída (uniforme), com relação entre
vão (L) e altura útil (d) igual ou maior do que 24, não rompem sob efeito de força cortante,
independente do valor da carga. O mesmo acontece sob carga concentrada, se a sua

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distância (a) do apoio, resultar em relação a/d igual ou superior a 7, independente do
valor da carga (ver, por ex., LEONHARDT, Construções maciças, 1º vol.). Isso se explica,
teoricamente, pelo fato do momento fletor crescer mais rapidamente do que a força
cortante, com o aumento de vão, do que resulta a ruptura por flexão preceder sempre a
ruptura sob influência da força cortante, nas lajes com as condições de esbeltez (L/d;
a/d) acima indicadas. . Assim é que, em lajes de edifícios residenciais e comerciais, com
valores de d em torno de 10cm, vãos superiores a 2,4m já não representam risco para
ação da força cortante, sendo inclusive de praxe, por esse motivo, dispensar-se essa
verificação nas lajes dessas edificações.

Seria o caso das Normas dispensarem, explicitamente, essa verificação, sempre que
L/d>24 (carga distribuída), e a/d>7 (carga concentrada), para qualquer grandeza de
carregamento. Mas as Normas não o fazem, sob a mesma alegação de que o efeito das
cargas pode ser potencializado pela fissuração de outra natureza, sendo necessária a
cautela. (Ver op.cit.)

Essa redução de limites a partir da Norma NBR 6118:1978 teve um grande impacto no
projeto das lajes das obras hidráulicas e hidrelétricas, que ativavam, na época, nossas
grandes consultoras (PROMON, THEMAG, HIDROSERVICE,etc.), cuja diretriz de
projeto das lajes de reduzidos vãos, associados a elevadas cargas, como radiers,
fundações de casas de máquinas e assemelhadas, que v. mesmo identifica em sua
pergunta, era evitar a armação transversal, fixando espessuras que a dispensassem. Só
que essas alturas passaram a ser muito grandes, se comparadas com a prática
precedente à nova Norma de 1978.

Nesse momento, interveio em socorro dessa situação, o respeitável e competente Prof.


Péricles Fusco, que, com base em extensa e minuciosa análise dos resultados
disponíveis em literatura, de ensaios de lajes sem armação transversal, concluiu pela
possibilidade de elevação desses limites, tornando-os mais liberais. Converteu seu
achado em uma proposta de modificação da NBR 6118:1978, a qual, aprovada, foi
publicada sob a forma de Anexo da NBR 7197:1989, conforme v. bem identifica em sua
pergunta. O Prof. Fusco não levou em conta, em sua proposição, salvo engano, os
argumentos da fib, acima expostos, que justificavam os valores mais baixos.

Veio a revisão da NBR 6118, que resultou em sua edição de 2003, e, ao contrário do que
se poderia supor, não ratificou a modificação introduzida através da NBR 7197,
confirmando os valores mais baixos da fib, com expressões semelhantes às do Eurocode
(EC-2; EN 1991-1-1).

Para v. ter uma idéia dos valores limites dessas diversas Normas, apresento uma
listagem abaixo, para uma laje com os seguintes dados:

- concreto C30;

- altura útil d= 0,60m;

- taxa de armadura de flexão: 0,15%;

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NORMA VRd1 / (bwd)
kN/m²
NBR 6118:1978 480
Norma Internacional CEB:1978 420
ANEXO da NBR 7197:1989 820
NBR 6118:2003 410
Eurocode EC2, versão 2003 310
(100 kN/m² = 10 tf/m² = 1 kgf/cm²)

Passo agora a responder objetivamente às suas perguntas:

- Como podemos definir elevadas cargas?

Não sei responder. Talvez seja uma forma indireta que o autor usa para referir-se
àquelas lajes acima identificadas, em que a presença da força cortante tem forte
influência em seu dimensionamento.

- Poderemos considerar as recomendações do Ibracon?

As Recomendações e Comentários do IBRACON ou de outra instituição não têm poder


normativo, salvo se incorporados às Normas ABNT NBR. Nem mesmo os Anexos dessas
Normas têm caráter normativo, servindo apenas como esclarecimento complementar,
conforme esclarecem as Diretivas para Redação de Normas da própria ABNT. Se v.
seguir os Comentários do IBRACON, neste caso, e seu projeto for submetido a uma
avaliação de conformidade, como é de praxe ocorrer com projetos de obras hidráulicas,
...

Deixe pra lá! Não falemos em coisas desagradáveis!

- Como os colegas têm procedido?

De minha parte, abandono, quando julgo necessário, a diretriz de projeto de evitar lajes
com armadura transversal. Quando a coisa fica feia, e a laje está muito espessa, uso a
espessura que me parece economicamente adequada, e dimensiono e detalho a
armadura transversal necessária. Tudo em conformidade com a NBR 6118:2003.

Antonio Carlos Reis Laranjeiras


Salvador, BA
13/09/2009

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P & R (16)
Ligação estaca - bloco no caso de estaca metálica
carregada lateralmente

PERGUNTA:

Tem sido frequente o emprego de estacas metálicas verticais em nossos projetos,


mesmo nos casos em que o bloco e as próprias estacas estão submetidos a forças
horizontais. Nestes casos, surgem momentos e cortantes não desprezíveis no
engastamento das estacas no bloco, e, por isso, pergunta-se como projetar
adequadamente a ligação dessas estacas com o bloco?

RESPOSTA:

A ligação estaca-bloco, nesses casos, deve ser dimensionada sob a condição de que a
resistência dessa ligação seja superior à resistência da mesma estaca aos esforços de
seu engastamento no bloco (na seção da mesma junto e imediatamente abaixo deste).

A nossa prática usual de projeto nos casos de estacas comprimidas é a de fazer a estaca
penetrar apenas 10 a 20 centímetros no bloco, conectando-a ao mesmo, opcionalmente,
com auxílio de algum tipo de armação complementar com barras verticais (ou pouco
inclinadas) presas à estaca ou com armação em hélice, envolvendo o topo da estaca. A
análise costuma supor que, nessa ligação, a estaca está articulada no bloco.

Esse tipo de ligação, no caso de estacas carregadas lateralmente, conforme


demonstram os ensaios experimentais, não atende à premissa definida acima, segundo
a qual a ligação estaca-bloco deve resistir mais do que a própria estaca.

Xiao e outros (2006), por exemplo, conduziram estudo experimental em estacas HP


14x89 (em unidades SI: HP 360X132), embutidas no bloco apenas 5” (12,5 cm), para
avaliar a eficiência dessa pequena penetração da estaca no bloco, lateralmente
carregada. Em algumas estacas foi adicionada uma armadura complementar constituída
de 2 25 com 75 cm de comprimento dentro do bloco.

Os resultados desse estudo indicaram que a ligação estaca-bloco não se comportou


como articulada, mas sim resistiu de 25 a 60% da capacidade última à flexão da estaca,
contribuindo a presença da armação complementar para uma maior resistência da
ligação. Os ensaios demonstraram que a hipótese de estaca articulada no bloco, além
de afastar-se da realidade, conduz a estimativas exageradas dos deslocamentos laterais
do bloco.

Os ensaios de Rollins & Stenlund (2010) com estacas metálicas tubulares ( 32cm)
confirmaram os resultados de Xiao e acrescentaram mais informações para projeto
dessas ligações. Esses estudos demonstraram que penetrações de até 30 cm da estaca
no bloco sem armação complementar de barras verticais oferecem precária resistência.
37
A presença de armação complementar em penetrações até 30 cm da estaca no bloco
eleva a capacidade da ligação de 40 a 60% da resistência da estaca. Os melhores
resultados foram obtidos com penetrações de 60 cm dos perfis nos blocos - o que
corresponde a duas vezes a altura do perfil - sem armação complementar de barras de
aço. Esses resultados coincidem com os de Shama e outros (2002) em ensaios com
perfis HP 10x42 (unidades SI: HP 250x62), que chegaram a penetrações de 1,5 a 2
vezes a altura do perfil.

De todo o exposto, conclui-se, em termos práticos, que, no projeto de ligações estaca-


bloco em que se têm estacas metálicas carregadas lateralmente:

1) Considerar na análise que as estacas estão engastadas no bloco;

2) As estacas devem penetrar no bloco 2x a altura do perfil, dispensando-se uso de


armações complementares com barras de aço;

O emprego de armação complementar com barras de aço em estacas com penetrações


de pelo menos 30 cm no bloco pode aumentar significativamente a resistência da ligação,
mas a sua quantificação carece ainda de melhor conhecimento.

Referências:
Xiao, Y ET allii- “Experimental Studies on Seismic Behavior of Steel Pile-to-Pile-Cap
Connections.” Journal of Bridge Engineering, ASCE, Vol. 11, No. 2, p. 151-159 (2006);

Rollins, K.M et Stenlund, T.E.- Laterally Loaded Pile Connections. Report No. UT-10.16,
Utah Department of Transportation, August 2010 ;

Antonio C R Laranjeiras
Salvador, BA
25/02/2013

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