Das Situações Do Jogo Ao Ensino Das Fixações No Handebol

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Motriz, Rio Claro, v.17 n.1, p.39-47, jan./mar. 2011 doi: http://dx.doi.org/10.5016/1980-6574.

2011v17n1p39

Artigo Original

Das situações do jogo ao ensino das fixações no handebol

Rafael Pombo Menezes


Centro Universitário Nossa Senhora do Patrocínio, Itu, SP, Brasil

Resumo: Os objetivos deste trabalho são apontar a importância das fixações no handebol como ações
táticas ofensivas e apontar possíveis desdobramentos individuais e coletivos vantajosos e desvantajosos
para os atacantes durante o jogo. O ensino desse elemento técnico-tático é abordado com vistas às
categorias de formação no handebol, para o qual sugere-se que os jogadores, a partir da imprevisibilidade
das situações impostas, sejam inseridos em um contexto de ensino-aprendizagem-treinamento que propicie
a vivência dos mais variados tipos de situação. As variações das experiências anteriores permitem a
formação de jogadores que possam agir inteligentemente e que adaptem seus comportamentos às
pressões impostas pelos adversários e às possibilidades oferecidas pelos companheiros.
Palavras-chave: Pedagogia do Esporte. Handebol. Tática Ofensiva. Ensino.

From the game situations to the teaching of fixations in handball


Abstract: The aims of this work are to show the importance of the fixations in handball as a technical-
tactical offensive element and pointing to possible advantages and disadvantages for the attackers in the
game. The teaching of this technical-tactical element is discussed in the young categories in handball, for
which it is suggested that players, from the unpredictability of conditions imposed, are embedded in a
context of teaching-learning-training which provide experience of all kinds of situation. Changes from
previous experiences allow the formation of players who can act intelligently and to adapt their behavior to
the pressures imposed by the opponents and the possibilities offered by fellow.
Key Words: Sport Pedagogy. Handball. Offensive Tactic. Teaching.

Introdução manutenção ou conservação da posse de bola, a


Os Jogos Coletivos Esportivizados (ou JCE’s, progressão em direção ao alvo ou à meta
em concordância com REIS, 1994) estão adversária e a consecução ou anotação dos
ganhando atualmente, em sua dimensão pontos ou gols.
pedagógica e na abordagem das questões de Para a obtenção de êxito no que se refere à
ensino e aprendizagem específicos, um enfoque contemplação de cada um dos princípios
mais voltado para as questões técnico-táticas, em operacionais são necessários procedimentos
oposição a um enfoque técnico (GRECO, 2001; técnico-táticos (denominados no handebol de
DAOLIO, 2002; GRAÇA; MESQUITA, 2002; meios técnico-táticos) que possibilitem aos
COSTA; NASCIMENTO, 2004; GRAÇA; atacantes certa continuidade do seu jogo. No
MESQUITA, 2007). Ante esse enfoque técnico, ou caso da conservação da posse de bola, são
tecnicista, historicamente construído e baseado requisitados alguns deslocamentos para gerar
na teoria associacionista, os autores situações de desmarque e boa qualidade nos
mencionados anteriormente tecem importantes passes e recepções dos jogadores,
considerações sobre a relevância de se preferencialmente com o menor risco possível de
considerar também os fatores táticos, interceptação do passe pelos defensores. No
principalmente nas relações envolvidas entre as caso específico da progressão dos atacantes em
ações dos jogadores e o momento de realização direção ao alvo, além da conservação da posse
dessas, além da situação ou contexto que envolve da bola, os mesmos devem preocupar-se em
tal tomada de decisão. executar os fundamentos técnicos (passe, drible,
Quaisquer ações ou decisões ofensivas, sejam recepção, empunhadura, ritmo trifásico, duplo
essas do atacante em posse ou não da bola, ritmos trifásico e arremesso) e os meios táticos
devem buscar atender os princípios operacionais ofensivos (individuais e coletivos) para
(BAYER, 1994) inerentes à tal fase nas desequilibrar os defensores a fim de conseguir
modalidades coletivas, em específico caso do situações favoráveis à infiltração e,
handebol – foco desta pesquisa –, que são: a principalmente, para arremessar de posições
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vantajosas para marcar o gol, contemplando o táticos, individuais e coletivos, dessa fase do jogo;
terceiro princípio ofensivo. e b) apontar possíveis desdobramentos coletivos
a partir da execução de cada tipo de fixação.
Para solucionar com êxito as tarefas
referentes a essa fase, os atacantes devem Contextualização das fixações
buscar alternativas que se baseiam nas suas Os deslocamentos se constituem em
possibilidades de intervenção técnico-tática e nas conteúdos importantes do jogo de handebol e da
interações com os companheiros, bem como no maioria dos JCE’s. Quando se observam os
posicionamento e atitudes dos defensores e das deslocamentos dos atacantes, foco central desta
suas relações de oposição com os demais pesquisa, atenta-se para fatores como a posse ou
atacantes. não da bola pelo jogador, as distâncias que os
Entende-se, então, que os jogadores devam apoios (atacantes próximos ao possuidor da bola
ter bem desenvolvidas as capacidades de e potenciais receptores) se encontram e as
percepção, antecipação e tomada de decisão respostas dadas pelos defensores, com a
(GRECO, 1988), que serão os pilares no seu premissa do cumprimento dos três princípios
processo de formação, permitindo aos jogadores ofensivos (BAYER, 1994).
intervenções inteligentes no jogo, com principal Uma das ações realizadas pelos atacantes,
ênfase à resolução dos problemas técnico-táticos. dentre os deslocamentos, que merece atenção e
Ainda para Greco (1997) os jogadores devem que também fornece os parâmetros e
buscar uma constante associação entre a decisão informações espaciais e temporais necessários
a ser tomada e a possibilidade de obtenção de para a execução dos meios táticos ofensivos e
êxito, gerando também associação de respostas mesmo para a continuidade do jogo ofensivo, é a
táticas do tipo “quando-então”, ou seja, “quando” fixação.
o defensor apresentar um determinado
comportamento, “então” o atacante toma tal Quanto ao termo “fixação” Molina (2006, p.56)
decisão. afirma que o principal objetivo é o de “chamar a
atenção de um defensor”, assim o atacante deve
Os atacantes, além de conhecerem todas as fixar o marcador em uma determinada posição
formas de atuação, ou o “como fazer” de cada vantajosa para este. Já para Romero et al. (1999,
fundamento, devem tirar proveito da vantagem p.118) as fixações no jogo de handebol têm por
que possuem em relação aos defensores quanto finalidade “obter superioridade numérica e obter a
ao planejamento de suas ações. O atacante que penetração ou a progressão (quando não ocorre a
possui a bola deve criar uma diversidade de penetração)”. Dessa forma, entende-se que, o
opções em que tenha como possibilidades a fato de o atacante buscar constantemente a
progressão, um arremesso, uma finta ou um atenção do defensor deve estar inserido em um
passe, por exemplo, ao ponto que o defensor contexto técnico-tático, com uma finalidade bem
deverá tentar reagir e intervir o mais rápido definida, como citado anteriormente por Romero
possível quanto à decisão tomada pelo atacante. et al. (1999), e que possibilite uma série de
O mesmo ocorre para as situações nas quais o desencadeamentos grupais ou coletivos
atacante não possui a bola, como na ocupação ofensivos.
temporária, pelos pontas ou armadores, do posto
específico de pivô. Com base nas afirmações supracitadas, é
possível afirmar que o principal objetivo das
Essa criação de diversidade de opções fixações é buscar situações favoráveis aos
ofensivas inicia-se antes do recebimento da bola, atacantes, provenientes de desequilíbrios
principalmente com a variação das trajetórias temporários de um ou mais defensores, tendo
adotadas pelo jogador que a receberá e sua como conseqüência a superioridade numérica
conseqüente fixação do defensor adversário ofensiva ou rápidas interações entre os atacantes
(descrita posteriormente), que possibilitará a que possibilitem ocupações inteligentes dos
execução de determinados meios táticos espaços gerados para a progressão em direção
ofensivos baseados nas interações com as ao gol adversário ou para o arremesso.
respostas dadas por cada um dos defensores.
Para tanto, os objetivos deste trabalho são: a) Dessa forma, as fixações trazem a
destacar a importância das fixações como ações necessidade de constantes reposicionamentos
táticas ofensivas iniciadoras da maioria dos meios dos atacantes, seja para servir de apoio ao

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possuidor da bola ou para dispersar a atenção desequilíbrio defensivo a partir de superioridade


dos defensores. Para Antón et al. (2000, p.97) “o numérica ofensiva ou de desequilíbrio corporal na
domínio dos parâmetros espaço-temporais é uma situação 1x1, e que se apresentam como base
exigência básica do handebol”, apontando para para a continuidade do jogo ofensivo. Latiskevits
que a execução dessas ações na relação (1991, p.101) afirma que as ações individuais
adequada de espaço-tempo e situação ofensivas “constituem a base para o êxito de toda
(considerada aqui como a relação espaço- a equipe”, o que justifica a importância de
temporal-situacional) traz implicações ao considerar as fixações como ações individuais
posicionamento de cada defensor (por ter que com profundas implicações coletivas.
deslocar-se para regiões próximas da marcação
O desencadeamento coletivo das ações de
de seu oponente direto ou ocupar os espaços
fixação tem como premissa que o possível
gerados para a cobertura de um companheiro) e,
receptor da bola tenha uma boa percepção da
conseqüentemente, ao funcionamento dos
situação de jogo. As atividades perceptivas no
sistemas defensivos (pelos constantes
jogo de handebol são variadas e em grande
desequilíbrios e ameaças sofridas).
número e que a visual e a proprioceptiva são as
Então podemos considerar as fixações como principais, pois permitem ao jogador “captar os
ações táticas inseridas em um plano de ação estímulos que definem a situação e o momento
inicialmente individual, mas com um importante do jogo, ajustando a ação de forma imediata”
desencadeamento coletivo, que visam o (ANTÓN et al., 2000, p.52).

Os tipos e as implicações das fixações


Entendendo que as fixações, de forma sumária, estão relacionadas diretamente com os defensores
atraídos pelo atacante que a realiza, podem ser identificados três tipos básicos:
- Fixação par: a qual o atacante atrai seu marcador direto (Figura1A);
- Fixação ímpar: a qual o atacante atrai seu marcador indireto (Figura1B);

- Fixação par-ímpar: a qual o atacante atrai os marcadores direto e indireto (ou ataque ao intervalo,
Figura1C).

É importante salientar que em qualquer tipo de fixação provoca um contato maior entre o
fixação durante o jogo de handebol os atacantes atacante em posse de bola e seu marcador direto,
deverão realizar com a maior velocidade possível, que favorece o defensor pela possibilidade de
objetivando dificultar o reposicionamento dos diminuir a velocidade do atacante, roubar a bola,
defensores e suas possibilidades de coberturas, ou mesmo possibilitar aos outros defensores uma
as trocas de marcação e as ajudas mútuas. marcação mais ofensiva nos atacantes que não
Assim, os atacantes devem oferecer perigo estão com a bola para dificultar a sua recepção.
constante ao gol adversário dificultando as ações Algumas situações para essa fase do jogo são
defensivas individuais e coletivas. criadas ou beneficiadas a partir da execução da
Fixação par fixação par, tais como:
Segundo Romero et al. (1999, p.117) o a) A criação ou o aumento do espaço para a
movimentação do pivô, entre o marcador atraído
conceito par significa “que um atacante conseguiu
e a linha da área, principalmente nos momentos
uma situação frontal com seu oponente na linha nos quais o defensor encontra-se na primeira
de arremesso, ou seja, há um emparelhamento linha defensiva (Figura 2A);
bem definido do atacante com o defensor”. Essa

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b) Combinada com um bloqueio frontal de outro distância sem a intervenção do marcador direto
atacante possibilita o arremesso de longa (Figura 2B);

c) A partir de uma rápida circulação de bola o atacante próximo pode realizar um passe nas costas desse
marcador, tanto para o pivô (Figura 3A) como para o jogador que executou o passe (realização de um passa
e vai – Figura 3B);

d) A possibilidade de realizar cruzamentos, desde que os deslocamentos dos atacantes sejam realizados em
altas velocidades e, possivelmente, com mudanças de direção das trajetórias, como representado na Figura
4;

e) Em superioridade numérica ofensiva a seqüência de fixações pares pode ser vantajosa, devido à
tendência de desmarque do atacante oposto à saída da bola (Figura 5).

Outras situações decorrentes da fixação par adaptação dos defensores aos seus marcadores
diretos;
podem ser desvantajosas para os atacantes na
tentativa de realizarem suas ações, b) O constante contato com o defensor provoca
individualmente e/ou coletivamente, tais como: um desequilíbrio corporal no atacante em posse
da bola, que pode diminuir a eficácia dos passes,
a) As constantes situações de 1x1 podem provocando retardos nas ações ofensivas.
dificultar as ações individuais dos atacantes Também pode desencadear situações de contra-
(como as fintas), provocar lentidão nos passes e ataques para a equipe adversária, devido à maior
descontinuidade do jogo ofensivo, devido à

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possibilidade de interceptação do passe, como possibilidades de realizar uma marcação de boa


representado na Figura 6A; qualidade e, como conseqüência, diminuir os
espaços para a penetração dos atacantes por
c) A manutenção do posicionamento do marcador
ajudas mútuas e coberturas (Figura 6B).
indireto faz com que esse jogador tenha melhores

Fixação ímpar distante em relação ao seu marcador direto, ao


Consiste do atacante em posse de bola comparada com a fixação par, para dificultar que
realizar o ataque direto, ou “chamar a atenção”, a marcação seja capaz de pará-lo ou de
do seu marcador indireto. Romero et al. (1999, desequilibrá-lo. Ainda com base na afirmação de
p.117) define que o conceito de ímpar indica que Romero et al. (1999), a partir de uma fixação
“um atacante conseguiu a oposição de um ímpar as penetrações sucessivas tornam-se
defensor que não é o seu direto, ou seja, centrar meios viáveis quando o potencial receptor da bola
a atenção ou objetivar uma fixação de um aproveita a situação imposta pelo iniciador de
oponente indireto”. desequilíbrio defensivo (Figura 7).
A fixação ímpar exige do atacante que possui
a bola uma trajetória, geralmente curva, mais

A fixação ímpar, assim como a par, possibilita situações ofensivas favoráveis a alguns
desencadeamentos coletivos, bem como à ação do atacante que atua sem a posse da bola nas zonas
próximas a essa, tais como:
a) A atração da atenção dos marcadores indireto e direto pode gerar possíveis situações de superioridade
numérica (como o 2x1) a partir de uma situação de inferioridade numérica ofensiva (1x2), como
representado na Figura 8A;

b) A possibilidade do jogo com o pivô caso haja falha no mecanismo de troca de marcação (Figura 8B).
c) A possibilidade de executar arremessos de longa distância, caso os defensores não impeçam os
deslocamentos ou não marquem adequadamente (Figura 9);

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d) O desencadeamento dos meios táticos ofensivos que dificultem a ação defensiva, como os bloqueios
(Figura 10A) e os cruzamentos (Figura 10B);

Porém alguns aspectos ou condutas ofensivas, originários da fixação ímpar, podem influenciar
negativamente o bom desenvolvimento dessa fase de jogo, tais como:
a) Se o atacante em posse da bola executa a sua trajetória muito próximo do seu marcador direto, esse
pode ser desequilibrado e com ações comprometidas, o que pode dificultar o passe, reduzir a possibilidade
de arremesso e a eficácia dos eventos ofensivos posteriores (Figura 11A);
b) Nas categorias mais jovens (infantil e cadete) a fixação ímpar pode confundir o atacante que não possui a
bola (apoio), o que pode estar relacionado com a dificuldade de leitura das situações de jogo. Na Figura 11B
está representado um possível erro de leitura no qual dois jogadores atacam a mesma região;

Fixação par-ímpar gerado pela atração de seu marcador direto pelo


Nesta fixação o atacante em posse da bola primeiro atacante.
objetiva atrair a atenção de seus marcadores Algumas situações de jogo podem ser
direto e indireto, deslocando-se em direção ao visualizadas quando da utilização das fixações
espaço pré-existente entre esses dois defensores, par-ímpar:
o que pode provocar falhas no setor defensivo.
- É favorável à finalização, devido ao grande
Esse atacante deve deslocar-se com a intenção desequilíbrio dos defensores;
de arremessar ao gol, mantendo dessa forma
- Permite, na maioria dos casos, melhor leitura da
uma postura adequada e orientada de frente para situação do jogo;
o gol. Caso os defensores não o marquem
- Facilita o desencadeamento de alguns meios
adequadamente, esse poderá finalizar, caso
táticos ofensivos, como as penetrações
contrário o atacante vizinho (ou apoio) poderá sucessivas (Figura 12A) e os cruzamentos (Figura
receber a bola em condições de finalização, 12B)

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- Proporciona a utilização de jogadas aéreas (Figura12A) e desequilíbrio defensivo, passando de uma


situação de 1x2 para o 2x1 (Figura12B);

Algumas das desvantagens do jogo baseado Partindo da prerrogativa de que a fixação é


em fixações par-ímpar são: uma ação realizada pelo jogador em posse da
- A necessidade de maior velocidade do atacante bola e que depende da leitura da situação de jogo
para buscar o espaço existente entre dois desse e dos comportamentos muitas vezes
defensores, o que torna a sua postura corporal imprevisíveis dos adversários e companheiros,
um fator importante pelo fato de poder ser entende-se que uma das possíveis formas de
marcado por dois defensores simultaneamente, ensino baseia-se em situações de jogo.
exigindo que o passe ou o arremesso seja feito no
momento correto; O processo de EAT nas faixas etárias de
formação, como nas categorias infantil (sub-14) e
- Aumento da possibilidade de interceptação do
cadete (sub-16), deve contemplar alguns dos
passe, caso o marcador indireto perceba que
essa ação foi tomada apenas com o objetivo de níveis de relação, descritos por Garganta (1995)
passar a bola e não o de tentar um arremesso ao como o eu-bola-adversário, no qual o atacante
gol. terá a possibilidade de deslocar-se para uma
determinada posição e observar a adaptação do
O ensino das fixações defensor à essa ação, ou a relação mais simples
de oposição direta (2x1) que é caracterizada
O processo de ensino-aprendizagem-
como eu-bola-colega-adversário.
treinamento (EAT, segundo GRECO, 1997) das
fixações torna-se, então, um aspecto importante A aplicação das situações de jogo, ou do
devido aos fatores que são considerados durante método situacional, apresenta como pressuposto
a situação, tais como: que o atacante deva adaptar seu comportamento
- A percepção que o jogador em posse da bola com vistas à situação que é imposta (GRECO,
tem da situação de jogo e sua forma de atuação 2001). Sendo assim, o ensino das fixações nas
ou decisão tomada; categorias de formação esportiva deve visar a
- As adaptações provocadas no sistema defensivo “expansão de todas as capacidades motoras em
com base na tomada de decisão de cada uma base ampla que sirva de reserva para
defensor; facilitar, futuramente, o aprendizado de técnicas
específicas” (GRECO, 2001, p.58).
- A percepção da situação ajustada do jogo pelo
jogador que receberá a bola. Em concordância com o autor supracitado,
entende-se aqui que durante a formação

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esportiva a ênfase deva estar voltada para as de um marcador direto para cada atacante e a
questões relacionadas ao “porque fazer” e redução dos espaços para infiltrações. Ao mesmo
“quando fazer”, com o intuito de formar jogadores tempo, essa situação provoca nos atacantes a
críticos das suas atuações em diferentes cenários necessidade de descoberta de outras
do jogo. Justifica-se, assim, que os jogadores possibilidades, como as fixações ímpar ou par-
devam possuir uma leitura adequada das ímpar objetivando, inicialmente, a criação de
situações do jogo, nas quais possam alterar as novos espaços que permitam uma melhor
suas ações em qualquer instante para a circulação da bola.
manutenção da posse de bola e progressão ao
No desequilíbrio dessa relação numérica de
gol adversário.
jogadores em prol dos defensores (2x3, 3x4,
Ao enquadrarmos as fixações em um contexto 4x5...) há problemas ainda maiores para os
espaço-temporal-situacional é importante que os atacantes, como a diminuição dos espaços para
atacantes compreendam as duas questões infiltrações, a presença de um marcador direto e
citadas anteriormente, bem como possuam um indireto em condições de equilíbrio e a
vivências suficientes que os permitam perceber, possibilidade de cobertura permanente dos
atuar e alterar o panorama ofensivo objetivando defensores, tendo em vista que as distâncias que
marcar o gol preferencialmente a partir de terão que percorrer até alcançarem os atacantes
situações simplificadas, como é o caso da serão mais curtas. Dessa forma, tais situações
superioridade numérica ofensiva. são propícias ao ensino da fixação ímpar, devido
à necessidade em buscar inicialmente a
A questão relacionada ao “como fazer”, ou à
igualdade numérica ofensiva para então alcançar
forma analítica do ensino das habilidades
a superioridade numérica, o que exige dos
(derivada da teoria Associacionista), quando
atacantes melhor percepção das situações de
lidamos com o ensino das fixações nas categorias
jogo, bem como a aplicação de elementos
de formação passa a ocupar uma posição
técnico-táticos que os permitam superar os
secundária à situação de jogo. Essa
defensores.
secundarização significa que a fragmentação do
ensino (GRECO, 2001) que visa a perfeição na
Considerações Finais
execução do gesto técnico pode estar
Ao pensar no ensino das fixações para a
descontextualizada da situação do jogo, e
categoria infantil (sub-14) devem ser priorizadas
também a automatização de uma determinada
situações de jogo nas quais os atacantes tenham
tomada de decisão pode provocar erros táticos
facilidade para vencer a defesa, como as
(como passar a bola ou arremessá-la em
superioridades numéricas, principalmente pelo
momento inoportuno).
entendimento de conceitos como a continuidade
Sugere-se, então, como ponto de partida para do jogo ofensivo e o aproveitamento de espaços
o ensino das fixações a situação de 2x1, por se vazios. Quando para tais situações os atacantes
tratar de uma simples relação de causa e efeito apresentarem soluções eficazes, a igualdade
da tomada de decisão do jogador que está com a numérica se torna um problema a ser
posse da bola e de fácil assimilação pelo atacante apresentado para os jogadores.
que não possui a bola. A escolha por uma
Já na categoria cadete (sub-16) as igualdades
situação de superioridade numérica ofensiva para
numéricas devem fazer parte do cotidiano de
o ensino das fixações funda-se na premissa de
aulas/treinos, partindo do pressuposto de que as
maior facilidade para os atacantes e melhor
situações de superioridade numérica já foram
possibilidade de desenvolvimento das suas
aprendidas. Nessas situações de igualdade
ações.
numérica tanto a fixação ímpar como a par-ímpar
Conforme aumenta o número de jogadores na devem ser utilizadas como ferramentas para o
relação ataque x defesa, como o 3x2, o 4x3 e o desenvolvimento do jogo ofensivo. No final desta
5x4, por exemplo, aumentam as variáveis a categoria torna-se conveniente o ensino das
serem controladas pelos atacantes e, ao mesmo situações de inferioridade numérica, enfatizando
tempo, outras possibilidades de ações são os desdobramentos técnico-táticos ocasionados
proporcionadas, porém mantendo a superioridade pela ausência de um jogador.
ofensiva. Essas situações são propícias para o
Tendo em vista que o atacante em posse de
ensino da fixação par, pelo fato de o ataque já
bola realiza seu ataque visando arremessar ou
iniciar em vantagem numérica.
deixar um companheiro em boas condições de
Quando essa relação é equilibrada em desenvolver suas ações, inúmeros
situações de igualdade numérica, surgem novos desdobramentos ofensivos podem ser possíveis,
problemas a serem resolvidos, como a presença devendo ser treinados pelos jogadores das

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Handebol: Ensino tática ofensiva

diferentes idades em suas mais diversas GARCIA, E. S.; LEMOS, K. L. M. Temas Atuais
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