De Iniciado A Perito - Benner Capt 2
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CAPÍTULO 2
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O MODELO DREYFUS
DE AQUISIÇÃO DE
COMPETÊNCIAS
APLICADO À
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O matemático e analista dos sistemas Stuart Dreyfus e o filósofo
Hubert Dreyfus desenvolveram um modelo de aquisição de
competências fundado sobre o estudo de jogadores de xadrez e
de pilotos de aviões. O modelo Dreyfus (Dreyfus & Dreyfus,
1980; Dreyfus, 1981) estabelece que, na aquisição e no
desenvolvimento de uma competência, um estudante passa por cinco níveis
sucessivos de proficiência: iniciado, iniciado avançado, competente, proficiente
e perito. Estes diferentes níveis são o reflexo de mudanças, em três
aspectos gerais, que se introduzem aquando da aquisição de uma
competência. O primeiro é a passagem de uma confiança em princípios
abstractos à utilização, a título de paradigma, de uma expe riência passada
concreta; o segundo é a modificação da maneira como o formando se apercebe de
uma situação - não a vê tanto como um conjunto de elementos tirados
aqui e ali, mas como um todo no qual só algumas partes são
relevantes; o terceiro aspecto é a passagem de observador desligado a
executante envolvido. Este último já não está do lado de fora da situação e
do processo, mas está empenhado na situação.
Iremos apresentar os resultados de um estudo sistemático da aplicabilidade
deste modelo em enfermagem. As expressões "competência" e "práticas
competentes" serão utilizados indistintamente; com efeito, as duas
englobam a noção de cuidados de enfermagem competentes e as
capacidades de julgamento clínico. Em nenhum caso estes termos serão
utilizados para falar de capacidades psicomotoras ou outras,
demonstráveis fora do contexto normal da prática da enfermagem.
Assim, competências e práticas competentes referem-se aos
cuidados de enfermagem desenvolvidos em situações reais.
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44 | De iniciado a perito
Métodos
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pessoa possui qualidades ou traços caracterizadores de
competência. O objectivo não era encontrar o indivíduo competente em
todos os campos, apesar das circunstâncias ou do nível de formação.
Uma série de conversações - uma por dia a dois por semana – em pequenos
grupos, de quatro vezes duas horas, foram conduzidas por quatro a oito
enfermeiras experientes que vinham de diferentes serviços do mesmo
hospital. As 51 enfermeiras experientes tiveram uma conversa individual e
as observações foram feitas para 26 delas. Em todos os casos, a
participação nos cuidados era mínima - ajudar de tempos a tempos as
enfermeiras a transportar os doentes ou noutras tarefas menores afim
de tornar a observação menos incomoda e importuna. Antes das
conversações, distribuímos aos participantes um texto que dava
as grandes linhas do género de descrição que nos interessava (cf.,
em anexo, o Guia para a descrição de incidentes críticos). Com a
experiência, apercebemo-nos de que o termo “incidente crítico” tinha
sido mal escolhido porque fazia pensar em doentes num estado crítico e
em situações de crise. Foi necessário explicar que também estávamos
interessados em acontecimentos significativos, que não estavam ligados a
uma situação de crise.
As entrevistas foram conduzidas pela autora, por uma enfermeira
investigadora, um estudante de mestrado em antropologia e um
investigador da área de psicologia. As entrevistas foram gravadas e
transcritas palavra por palavra, afim de se analisar o texto. Em
todas as séries de conversações de grupo, excepto uma, pelo menos
dois dos investigadores estavam presentes, afim de facilitar
o trabalho de grupo.
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46 | De iniciado a perito
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Tinha trabalhado até tarde e estava quase para ir para casa quando
uma enfermeira tutora me diz: “Jolene, vem ver". Havia urgência
na sua voz, mas não como quando há uma paragem cardíaca. Entro
e examino o doente. A sua frequência cardíaca está nos 120,
está sob respiração artificial e a ventilação parecia normal.
Pergunto: “O que é que não está bem?". Uma recém
diplomada que tratava do doente aponta um mar de sangue.
Uma grande quantidade de sangue saia da sua boca. Esse homem
tinha sido submetido a uma ressecção de um cancro mandibular.
Mais ou menos uma semana atrás tinha sofrido uma hemorragia ao
nível da carótida externa, que tinha sido ligada, devido à sua ruptura
causada pela radioterapia. Essa ferida infectou-se e o doente fez
uma insuficiência respiratória, pela qual tinha sido internado nos
tratamentos intensivos.
Examino assim o penso e constato que está seco. Mais sangue
saia da sua boca. O homem tinha uma traqueostomia por causa da
operação à qual se submeteu. Tinha também uma sonda
nasogástrica para o alimentar, e penso que talvez a artéria carótida
ou o tronco bráquio cefálico tinha cedido. Desligámos o doente do
respirador para ver se qualquer coisa saía da traqueia. Havia
um pouco de sangue, mas parecia que quase tudo tinha
passado da faringe aos pulmões. Começámos então por ventilá-lo
ma-nualmente tentando adivinhar o que poderia estar na sua boca
para fazer sair uma tão grande quantidade de sangue...
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48 | De iniciado a perito
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estudo; utiliza um vocabulário não muito apropriado e dá informações inúteis. A
sua compreensão do acontecimento não é tão completa nem tão clara
como a da enfermeira perita. Essa tem um grande avanço quando é
necessário mobilizar os recursos disponíveis e fazer frente ao
problema seguinte inesperado.
Através da análise desta situação e de muitas outras, e pelo modelo Dreyfus,
tornou-se possível descrever as características, os comportamentos em cada
nível de desenvolvimento e identificar em termos gerais as necessidades
em matéria de ensino/aprendizagem em cada nível.
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50 | De iniciado a perito
As estudantes de enfermagem entram em cada serviço novo, com o
estatuto de iniciadas; têm dificuldade em integrar o que aprenderam nos
livros com aquilo que vivem em situação real. Mas estas estudantes não
são as únicas iniciadas; todas as enfermeiras que integram um novo serviço em
que não conhecem os doentes podem encontrar-se a este nível, se os objectivos e os
aspectos inerentes aos cuidados não lhes forem familiares.
Este ponto ilustra as hipóteses do modelo Dreyfus fundadas sobre a
experiência em situação, o que distingue o nível dos actos competentes, que
podem ser atingidos graças aos princípios e à teoria aprendida numa sala de
aulas, e as decisões e aptidões que dependem do contexto, as quais só podem
ser adquiridas perante situações reais (Dreyfus, 1982). Por exem plo, uma
enfermeira especializada e tendo muita experiência no tratamento dos doentes
adultos em estado crítico encontrar-se ia num nível de ini-ciada do ponto vista
das competência se fosse transferida para uma unidade de cuidados
intensivos em neonatologia. O modelo Dreyfus de aquisição de
competências é um modelo dependente da situação e não relativo à inteligência
ou aos dons de uma pessoa.
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Antes, pensava que ele se sentia perdido perante a operação a
que tinha acabado de se submeter. Parecia abatido tanto
fisicamente como moralmente e estava num estado de
nervosismo extremo. Além disso
tratava a ferida com precaução a mais, visto já não
haver essa i necessidade. Mas essa manhã foi diferente,
começou a fazer perguntas
sobre o tratamento que lhe era feito.
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Dou instruções muito detalhadas e muito explícitas à recém
diplomada: “Quando entrar e vir o bebé pela primeira
vez, tome-lhe os sinais vitais e faça um exame físico.
Verifique, de seguida, os pontos de injecção das
perfurações assim como o respirador e assegure-se
que funciona. Verifique os monitores e os alarmes.” E é
o que elas fazem exactamente ponto por ponto,
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52 | De iniciado a perito
seriam incapazes de fazer uma triagem entre o que pode ficar de lado e o que é mais
importante. Seriam incapazes de ir de um bebé para o outro fazendo o que é mais
importante e desempenhar mais tarde o resto da tarefas,
As principiantes e as principiantes avançadas só podem apreender um
pequeno aspecto da situação: isso tudo é muito novo, muito estranho e cada vez mais
têm que se concentrar nas regras que lhes ensinaram.
A enfermeira perita continua:
Se digo: "façam estas oito coisas" elas fazem-nas sem se preocupar se o outro bebé
chora até perder o fôlego. Quando se dão conta, ficam espe cadas, sem saber o que
fazer.
No início, uma só coisa era importante no doente todo o resto estava quase excluído.
Por exemplo, fizemos um electrocardiograma e achava que o doente tinha
extrasistoles ventriculares e que era necessário avisar
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O A enfermeira competente trabalha no mesmo serviço há dois ou três anos. Torna-se
competente quando começa a aperceber-se dos seus actos em termos objectivos ou
dos planos a longo prazo dos quais está cons ciente. Este plano dita quais os
atributos e aspectos da situação presente ou prevista que devem ser considerados
como os mais importantes, e os que podem ser ignorados. Assim, para a enfermeira
competente, um plano estabelece uma perspectiva e baseia-se sobre uma análise
consciente, abstracta e analítica do problema. Uma orientadora descreve
como ela evoluiu do estado estímulo-resposta ao da competência adquirida ao
longo da prática da enfermagem:
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:: Tinha quatro doentes. Um tinha de aprender a tomar conta da sua o
colostomia, os outros necessitavam de muito mais coisas. Estava ocupada
com variadíssimas coisas. A perfusão de um tinha acabado e tive que resolver a
situação, de seguida, tinha-me esquecido de dar alguns medicamentos e tive
que me despachar para distribui-los. Depois, alguém
começou a ter náuseas e tentei reconfortá-lo. E por fim, a bolsa da colostomia
tinha-se descolado e tive que ensinar o doente a resolver a situação. De
repente, apercebi-me que a manhã já tinha acabado e que ninguém tinha sido
lavado.
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Quando digo a um médico: “Este doente é psicótico", não sei como sustentar a minha
afirmação. Mas nunca me engano, porque conhece as psicoses de A a Z. De facto,
sinto-o, sei-o e contio. Pouco me importa que mais nada se produza. Sei que tenho
razão. Isto pode ser comparado com outra enfermeira do grupo, que descreveu
durante a entrevista, quando disse de uma doente "que havia alguma coisa que
não estava bem com ela". Uma das coisas que faço agora é encontrar uma
linguagem propria do serviço para que a comunicação passe melhor entre nós.
Mas, na rea lidade, tudo o que eu tento fazer é tirar palavras da gíria para falar de
qualquer coisa que eu penso ser indescritível.
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trecho. A enfermeira não diz que nunca se enganava, mas referia-se
à sua própria percepção - a sua capacidade de reconhecimento. Esse tipo
de certeza e de percepção parece ter pontos em comum com a
capacidade de reconhecer o rosto humano sem errar. Esta enfermeira diz
que pode reco nhecer as mudanças frequentes nos psicóticos, devido
aos seus quinze anos de prática. Essa afirmação abre uma via de
investigação interessante, se està certeza aparece empiricamente e,
se for o caso, quais são as enfermeiras que a têm e em que
condições. 39 Esta enfermeira, de seguida, descreve uma situação
onde sabe que um doente muito zangado é, por erro, diagnosticado
como sendo psicótico. Convencida de que o doente só está muito
zangado diz: "vamos fazer um MMPI (Inventário de Personalidade Multi-
fásica do Minnesota) para ver quem tem razão." Continua: "tenho a certeza
que tenho razão, pouco importa o resultado do IMMPI". Felizmente para
ela os resultados confirmaram o que tinha dito, e já tinha
começado a cuidar o doente, com sucesso, com base na sua
avaliação.
Dreyfus e Dreyfus (1977) notam que:
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. Enquanto o aprendiz de piloto, o estudante em línguas, o jogador
de xadrez ou o condutor seguem as regras, as suas competências
estagnam e ficam medíocres. Mas com o domínio da actividade vem
a transformação da competência, mecanismo parecido ao que
é produzido quando por um cego que aprende a utilizar uma
cana. O principiante ressente, na planta da mão, uma pressão
que pode utilizar par detectar a presença de um objecto distante
tais como os passeios. Mas com a prática, já não é a pressão que
a pessoa cega sente na planta da mão mas simplesmente o
passeio. A cana transformar-se-á numa extensão do seu próprio
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Podem ser particularmente eficazes quando se trata de pedir uma avaliação Umédica
mais avançada quando detectam precocemente alterações clínicas. No entanto,
excepto nas unidades de tratamento intensivo, a maior parte das enfermeiras
peritas tem poucas oportunidades de comparar e desenvolver com as suas colegas
um consenso a respeito das suas observações. Assim, se fizéssemos
sistematicamente esforços para desenvolver uma linguagem descritiva
aceite por todos e destinada a comparar as observações das
enfermeiras peritas, as suas competências şeriam melhoradas.
O estudo dos comportamentos proficientes e peritos permitiriam descre
ver o comportamento das enfermeiras peritas, assim como suas
consequências para os doentes. Esse conhecimento pode ser desenvolvido para
alargar o campo de acção das enfermeiras que desejam e são capazes de atingir a
excelência.
A visão de "o que é possível” é uma das características que diferenciam os
comportamentos da competência dos da proficiente e por fim os da
ita. Nem todas as enfermeiras serão capazes de se tornarem peritas. As
descrições que dão as peritas da excelência oferecem, no entanto, horizontes
para as enfermeiras competentes e podem facilitar a sua passagem ao estado
proficiente. Quando as peritas podem descrever situações clínicas onde a sua
intervenção fez a diferença, uma parte dos conhecimentos decorrente da sua
prática torna-se visível. E é com esta visibilidade que o realce e
reconhecimento da perícia se tornam possíveis.
O significado da experiência
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