Vinicius Lou Zada
Vinicius Lou Zada
Vinicius Lou Zada
INSTITUTO VILLA-LOBOS
TCC
Por
Dedico este trabalho a minha avó Letícia Costa do Nascimento (in memorian), pelo
aprendizado e por seu exemplo de vida, que sempre me motivou na condução dos meus
passos. Obrigado por ter doado tempo de sua vida ajudando na minha criação e também pelo
grande incentivo para que eu pudesse dar sequencia aos estudos.
AGRADECIMENTOS
À minha família que me apoiou na escolha pela música, sempre demonstrando ser o
porto seguro em todos os momentos e acreditando em meu sucesso profissional.
À minha futura esposa Thamires Fonseca que, sempre esteve ao meu lado em todos os
momentos bons e ruins, me encorajando e dando forças para caminhar e prosseguir na difícil
trajetória que é a carreira musical. Os meus sinceros e eternos agradecimentos ao amor da
minha vida.
Ao meu orientador, Professor Doutor e amigo Josimar Carneiro, que sempre perdia
parte de seu precioso tempo para atender às minhas solicitações, pedidos de ajuda por email e
pelo whatsapp. Muito obrigado!
Agradeço também ao amigo Luís Armando, responsável por toda parte musical da
PIBBG, que muito me ajudou com ideias e sugestões para melhor desenvolver este trabalho,
muitas vezes tendo função de coorientador. Deus o abençoe, obrigado!
Aos amigos e colegas de faculdade que sempre tinham palavras de incentivo e, muitas
vezes, de descontração para que o ambiente universitário pudesse se tornar um pouco mais
leve. Destaco os grandes amigos Michel Ramos, Ana Elisa, Larissa Ferreira, Jessica Gimenez,
Allan Simplício e a divertida Lídia Baratute, que sempre tornavam nossos momentos mais
alegres. O meu muito obrigado.
Entre as graças que devemos à bondade de Deus,
RESUMO
Esta monografia pretende mostrar o importante papel que a prática musical coletiva tem para
o processo de musicalização, evidenciando pontos relevantes acerca das abordagens musicais
pedagógicas que beneficiam o funcionamento da mesma, sobretudo no ambiente de uma
igreja evangélica. Para maior compreensão da relevância do fazer musical coletivamente, foi
feita uma pesquisa trazendo um levantamento histórico que, dentro da literatura nacional e
internacional, traz informações referentes às influências socioeducativas que esta prática
proporciona para os alunos. Entrevista feita com alunos e professores do projeto Orquestra
Experimental evidencia as relações entre os processos de musicalização que funcionam em
torno da prática musical coletiva, dentro deste contexto, buscando uma educação musical
mais democrática.
This monograph intends to show the important role that the collective musical practice has for
the process of musicalization, highlighting relevant points about the pedagogical musical
approaches that benefit the operation of the same, especially in the environment of an
evangelical church. For a better understanding of the relevance of musical making
collectively, a research was carried out bringing a historical survey that, within the national
and international literature, brings information regarding the socio-educational influences that
this practice provides for the students. Interview with students and teachers of the Orquestra
Experimental project shows the relationships between the processes of musicalization that
work around the collective musical practice, within this context, seeking a more democratic
musical education.
Key words: musical teaching - collective practice - collective teaching of musical instrument
- musical formation - evangelical church
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 9
REFERÊNCIAS 47
INTRODUÇÃO
[...] as igrejas que mais formam músicos são a Assembleia de Deus, a igreja Batista
e a Congregação Cristã do Brasil. Nas duas primeiras, os fiéis aprendem a tocar
desde hinos evangélicos orquestrados até peças consagradas da música sacra, como
as compostas por Johann Sebastian Bach. (FAVARO, 2007, s/p).
Embora existam algumas discussões bibliográficas vívidas em áreas de conhecimento
à respeito da prática musical coletiva, pouco se fala na academia de música sobre as
transformações iminentes que elas trazem ao nosso contexto. Nós, como educadores musicais,
precisamos investigar interações sociais, afetivas, motivacionais e performáticas na medida
em que, estas questões precisam se relacionar de forma a aumentar o interesse geral na
atividade proposta, e também permitir que o acesso à música seja democratizado.
Em geral, quando se inicia um trabalho de musicalização, as aulas partem do princípio
da individualidade, onde há interação do professor com o aluno e orientações sobre as devidas
técnicas do seu instrumento. Com isso, este aluno se habitua a estudar e tocar sozinho as
lições e estudos dos métodos tradicionais. Este método de aprendizagem pode ser importante,
porém, há uma defasagem no que tange à questões relacionadas à performance coletiva,
como, por exemplo, a afinação, as diferenças que existem entre a dinâmica executada por
instrumentos diferentes, os timbres dos instrumentos. Do ponto de vista social há uma
interação entre os músicos e entre os naipes, onde cada um depende do outro para que a
música aconteça e, também podemos considerar o aspecto motivacional que acontece através
da execução em apresentações ou até mesmo nos ensaios.
Cunha (2013) cita um breve comentário da autora Hikiji (2006), onde fala acerca da
motivação quando se participa de grupos musicais;
Anos depois, o canto orfeônico foi instituído como ensino obrigatório no município do
Rio de Janeiro e permaneceu nas escolas até o final da década de 1960.
Na década de 1970 houve uma promulgação da lei 5.692, que passou a agrupar o
ensino das artes, fazendo com que o mesmo professor trabalhasse em todas as artes oferecidas
nas escolas (artes visuais, teatro, música e dança). Com isso, houve um desaparecimento
gradual da educação musical nas escolas, visto que, a formação superior que tinha o objetivo
de preparar os professores na década de 1970 era a licenciatura curta, que não capacitava os
professores a lecionar as aulas de cunho coletivo (música, teatro e dança).
Embora a música jamais tenha deixado de ser ouvida por alunos e professores durante
as décadas de 1980 até meados de 1990, o abandono da legislação permitiu que houvesse um
desaparecimento da música artística nas escolas. A maioria dos cidadãos brasileiros se
tornaram vítimas do mercado musical, atuando como meros ouvintes, sem consciência crítica
e muitos se sentem incapazes de se expressarem através da música. Até que surge a LDB de
1996, que trouxe um discurso da pedagogia mais humanista, baseada no princípio do direito a
educação para todos, respeitando a diversidade cultural. E em 2008 surge a nova lei 11.769
que trouxe uma nova perspectiva para o ensino da música no Brasil. Essa lei diz que a música
deverá ser conteúdo obrigatório, mas não exclusivo do componente curricular. É importante
enfatizar que, o objetivo da educação musical no ensino básico não é formar músicos e sim
dar aos estudantes ferramentas básicas para a compreensão e utilização da linguagem musical.
Podemos entender por prática coletiva, as relações sócio afetivas que são construídas
entre pessoas, pessoas e local onde estão inseridas com o objetivo de trocar saberes, valores e
posturas perante a sociedade. Buscar o reconhecimento social às vezes também é um dos
objetivos, todavia, quando se trata do fazer musical, os processos pedagógicos são atingidos
pelo conjunto de conhecimentos trocados dentro das aulas (ensaios) e nos recitais/concertos.
No ocidente, o aprendizado musical vem de uma tradição em que se prioriza o estudo
individualizado, a prática é isolada, o estudo é solitário, pois a ênfase pedagógica é no
desenvolvimento individual,
A complexidade que caracteriza o fazer musical parece que se amplifica quando essa
prática acontece em grupo. Small (1998) considerou ser a música uma arte coletiva.
Sua perspectiva destacou que os acontecimentos musicais são desdobramentos das
relações estabelecidas entre as pessoas envolvidas no evento, desde o intérprete, até
o vendedor de entradas. Por essa via, o fazer musical se torna uma ação composta,
complexa, derivada de diferentes fazeres e interações. A produção musical coletiva
torna-se assim uma totalidade resultante de diferentes iniciativas. (CUNHA, 2013,
p.347)
1
Joel Barbosa: Mestre e Doutor em Artes Musicais pela University of Wahington, em Seattle, EUA. Com base em sua tese
sobre metodologia de ensino coletivo de instrumentos de banda, escreveu o primeiro método de banda brasileiro “Da Capo”.
Atualmente é professor titular de clarineta da Escola de Música da Universidade Federal da Bahia – UFBA e do Programa de
Pós-Graduação onde orienta trabalhos de mestrado e doutorado nas áreas de clarineta e ensino coletivo. É fundador e maestro
da Filarmônica UFBEBÊ, banda do convênio entre a UFBA e a Sociedade 1º de Maio, projeto que trabalha música e
cidadania com jovens de um bairro popular de Salvador. Neste projeto, experimenta materiais didáticos para banda por ele
elaborado e treina alunos universitários para trabalharem com a metodologia de ensino coletivo de instrumentos. Elaborou a
concepção pedagógica da Escola de Música Maestro Wanderley, da Casa das Filarmônicas, a qual coordena e rege sua banda.
Nos últimos três anos, tem atuado como professor da oficina para músicos e maestros de banda do Programa
Tim-Arteducação– Projeto Música e Cidadania, Bahia (Barbosa, 2004).
saudável entre os alunos em busca de sua posição musical no grupo, desenvolve as
habilidades de se tocar em conjunto desde o início do aprendizado, e proporciona um
contato exemplar com as diferentes texturas e formas musicais. (BARBOSA, 1996,
p.41)
constroem uma relação direta entre eles e com o professor do grupo. Como resultado disso, há
uma comunicação transparente estabelecendo uma conexão com o fazer musical, ou seja, esta
interação músico/músico, músico/professor, professor/grupo é uma das responsáveis pela
2
fluidez das atividades propostas. Vygotsky fundamenta a ideia do desenvolvimento humano
através das interações sociais para a educação.
2
Lev Semyonovitch Vygotysky (1896-1934), psicólogo russo, fundou, a partir de sua produção teórica, a perspectiva
sócio-histórica para a psicologia. Embora tenha falecido há mais de 70 anos, Vygotsky deixou um legado impressionante de
trabalhos que, descobertos no Ocidente durante a década de 60, são discutidos, até hoje, não só na psicologia, mas também
em outros campos, como da educação (Duarte, 2001).
Impacto social
Inclusão social
A identidade pode tanto ser definida como algo que distingue uma pessoa de outra,
como aquilo que une, confunde e assimila. A identidade grupal por sua vez, torna os
membros do grupo iguais entre si, e o grupo em questão, distinto, diferente de outro
grupo. A identidade de cada um vai se construindo no decorrer da construção da
história pessoal e da construção da história coletiva, a partir dos papéis que
assumimos e em função das atividades que exercemos. A construção da identidade
desses músicos assim como em outras etapas de sua vida e profissão vai sendo tecida
em meio aos referenciais por eles assumidos. (BRITO, 2013, p.14)
À medida que o grupo vai sendo firmado, alicerçado, esta identidade vai sendo fincada
nos moldes do grupo. “O que a identidade grupal requer é que exista uma totalidade, uma
unidade de conjunto, e que esta totalidade tenha uma peculiaridade que permita diferenciá-la
de outras totalidades.” (BRITO, 2013, p.14).
Refletindo um pouco sobre a afetividade, é possível perceber que ela abrange duas
vertentes: as emoções e os sentimentos. Segundo SAWAIA (1994),
Os sentimentos seriam os estados mais “estáveis” da afetividade, como o amor, a
felicidade, o ódio, ou qualquer outro sentimento que não seja caracterizado pela
“explosão”. [...] Já as emoções se caracterizam pelo caráter “explosivo” da
afetividade, como a paixão, a alegria, a raiva, etc. A reflexão espontânea os
alimenta, mas não os constitui. Ambos caracterizam-se por afetividade, porém de
maneiras diferentes de se relacionar com algo. (SAWAIA, 1994, apud MAHEIRIE,
2003, p.148).
Ela ainda diz que quando ouvimos uma música, podemos tornar nossos saberes mais
complexos, podendo dar uma direção aos nossos pensamentos, tornar presente algo que está
ausente ou criar objetos imaginários. Ou seja, a música vai muito além da simbologia aplicada
à notação musical e sua estruturação melódica/harmônica, ela está diretamente ligada às
emoções e sentimentos que, nem sempre conseguimos expressar com outra linguagem.
Todas as pessoas estão direta ou indiretamente ligadas à música. Há quem prefira
aprender, ensinar, executar ou criar. Seja qual for a maneira com que se relacionam com a
música, as pessoas encontram variados sentidos para praticar tal atividade, até mesmo os
ouvintes apreciadores que demonstram a satisfação ou insatisfação no resultado final de um
trabalho musical.
LAZZARIN (2008) diz que o termo cultura é “complexo e polissêmico, pois existem
muitas definições para o mesmo”, segundo ele a cultura “pressupõe um entendimento sobre a
constituição de verdades dentro de uma sociedade específica”, em suma, seria a maneira como
a sociedade dá sentido às coisas. Para isto, utilizamos a linguagem como forma de
acessibilidade a todos, ela domina um sistema que representa conceitos, ideias e sentimentos.
Dentro das representações da linguagem, podemos utilizar símbolos que podem ser sons,
escritos, notas musicais, imagens eletrônicas, palavras. Dentro do assunto em questão
abordaremos a diversidade cultural na linguagem musical, mais precisamente no aspecto
pedagógico.
Como trabalhar com a diversidade cultural no processo pedagógico? Em um país
como o Brasil, cercado de diversas culturas espalhadas por toda parte do país, esta é uma
questão que se aplica para todas as áreas de conhecimento que visam construir uma educação
democrática. Isto é muito recorrente na educação musical.
Segundo Lazzarin, todos que fazem parte de determinado grupo musical possuem uma
vivência e, portanto, uma experiência particular de suas atividades musicais e essa vivência e
experiência precisam ser levadas em conta quando se trata de uma prática musical coletiva,
onde o objetivo prioritário é, inclusive, fazer música.
Valorizar as experiências musicais individuais dentro da prática musical coletiva é,
sobretudo, dar importância ao que os alunos têm para acrescentar ao grupo. Muitas vezes as
ideias sugeridas por eles funcionam mais do que a própria proposta planejada pelo professor,
com isso, os alunos se sentem motivados a continuar participando do grupo, tornando as aulas
mais fluidas e interessantes.
Para CANEN (2002, apud PENNA, 2005, p. 10), o multiculturalismo é um
“movimento teórico e político que busca respostas para os desafios da pluralidade cultural nos
campos do saber”.
Quando se está motivado a ouvir por um real desejo, esse desejo conduz o indivíduo
a atenção necessária para o que podemos chamar de intenção de escutar, exercitando
assim a escuta sensível que não se dá em sons isolados, mas pressupõe sua
organização em forma de música (FONTERRADA, 2008 apud BRITO, 2013,
p.18).
O fato de os alunos estarem expostos a outros naipes diferentes do seu, neste caso,
3
quando a prática coletiva é heterogênea , além deles aprenderem assuntos relacionados aos
seus instrumentos, eles aprendem questões relacionadas aos outros naipes. Segundo o
professor Marco Antônio Toledo do Nascimento (2008, p. 96), essas aulas são efetuadas de
4
maneira multidisciplinar .
Dentro da pesquisa aqui realizada, poucos foram os trabalhos e arquivos encontrados
que vão contra às ideias e ideais que a prática musical coletiva pode trazer no campo da
educação musical, porém, alguns professores acreditam que só é possível dominar a técnica
de um instrumento se as aulas forem individuais, principalmente se o foco for o
desenvolvimento profissional do aluno na área musical. Desta forma posicionam-se contra o
aprendizado em grupo para fins de conhecimento avançado e atuação técnica na área, sendo
possível apenas para amadores. (CASTRO, 2013, p. 22).
Por fim, se tratando dos benefícios, destaco a importância que os alunos dão à sua auto
imagem. A maioria deles gosta de chegar às aulas/ensaios com as músicas prontas, ou que
seja um trecho desafiado pelo professor na aula anterior, isso faz com que eles se preocupem
com suas execuções. “O aluno se sente participante de uma orquestra, ou coral, e ao conseguir
executar uma peça, sua motivação aumenta”. (CRUVINEL, 2005, p.78).
TOURINHO (2007) expõe o posicionamento do professor que leciona utilizando um
5
sistema conservatorial , onde prioriza o ensino individualizado, que no texto ele chama de
6
“ensino tutorial ”.
3
Prática coletiva Heterogênea: ocorre quando vários instrumentos diferentes são trabalhados num mesmo grupo
(CRUVINEL, 2006).
4
Multidisciplinar: além da prática instrumental, podem ser ministrados outros saberes musicais intitulados academicamente
como: teoria musical, percepção musical, história da música, improvisação e composição. (NASCIMENTO, 2006).
5
Conservatorial: Sistema construído a partir do Conservatório de Música francês, no final do século XVIII, em sintonia com
os ideais democráticos da revolução francesa.
6
Ensino tutorial: Ensino de instrumento musical individualizado.
Outro fator que pode ser encarado como um desafio para esta proposta no processo de
musicalização, é o fato de que os professores precisam ter certo conhecimento em algumas
áreas que, muitas vezes, não fazem parte da experiência deles, como por exemplo: conhecer
um pouco sobre instrumentação, tessitura, arranjo, transposição, dentre outros. A falta de
conhecimento mínimo dentro das áreas citadas impossibilita que a prática coletiva flua com
mais naturalidade e profissionalismo.
A lógica de que não se ensina o que não se sabe também é evidente, o que implicaria
7
ao unidocente saber muita música. Mas o quadro real, que temos em grande parte
das escolas do Brasil, é de professores unidocentes cometendo “atrocidades” na área
musical por falta de formação e conhecimentos para melhor conduzir seus trabalhos.
Se quisermos que a educação musical, efetivamente, passe a fazer parte de nossas
salas de aula, parece-me que o conhecimento acerca da área é de fundamental
importância para esse profissional. Não defendo a substituição do especialista pelo
unidocente, mas, sim, a formação musical deste último. (B
ELLOCHIO, 2003, p. 21)
Para a autora, existiram três fases onde o ensino coletivo se fez presente nos Estados
Unidos: a primeira delas aconteceu nas academias, onde a prática coletiva era praticada por
grande número de alunos; a segunda fase aconteceu nos conservatórios em que as turmas
tinham cerca de quatro alunos; e a terceira fase nas escolas públicas com muitos aprendizes
tocando em conjunto. A autora relata que no período em que aconteceram essas três fases do
7
Unidocente: Um único professor dando aula de todos os conteúdos. Professor de Educação Infantil e Ensino Fundamental
de 1º ao 5º ano.
ensino coletivo, foi de extrema importância para “formação de orquestras, crescimento da
procura pelo aprendizado de instrumentos e por uma melhora na formação de professores de
nível superior que pretendiam adotar esta forma de ensino”. (CRUVINEL, 2004 apud
OLIVEIRA, 1998, p. 25 ).
No Brasil existiram alguns trabalhos voltados para o ensino coletivo de instrumentos
musicais, como, por exemplo, o de José Coelho de Almeida, que formava bandas de música
em fábricas do interior paulista no final da década de 1950.
Em 1975, Alberto Jaffé e Daisy de Luca iniciaram o projeto de ensino coletivo de
cordas em Fortaleza - CE, a convite do SESI. Este projeto se espalhou por todo o Brasil
apoiado pelo Ministério da Educação (OLIVEIRA, 1998, apud CRUVINEL, 2004).
É possível destacar alguns nomes que norteiam suas ideias e trabalhos dentro da
perspectiva do ensino coletivo, tais como: Maria de Lourdes Junqueira Gonçalves no Rio de
Janeiro e Diana Santiago em Salvador, ambas professoras de piano; José Coelho de
Almeida, sopros em Tatuí; Alda de Jesus Oliveira, iniciação musical com introdução ao
teclado, Salvador; Alberto Jaffé e Daisy de Lucca, cordas, em São Paulo; e Linda Kruger e
Ana Maria Peixoto, cordas, em Belém; e por último, destaco o professor Dr. Joel Barbosa,
que desenvolveu um método de Ensino Coletivo de Instrumentos Musicas para Banda de
Música, o qual nomeou de método “Da Capo”, mostrando resultados satisfatórios no interior
de Minas Gerais.
Como o ensino coletivo era ainda menos utilizado no Brasil há algumas décadas,
poucas eram as partituras disponíveis para os grupos. Muitas vezes os professores
preparavam partes manuscritas para que o trabalho pudesse seguir com fluidez. Com o
passar do tempo, além de partituras, foram surgindo textos sobre o assunto, incluindo
aspectos sociais, históricos, cognitivos e psicológicos, além de muitas sugestões de
procedimentos, que possibilitou a divulgação dessa metodologia de ensino nos meios
acadêmicos.
Este assunto é muito interessante no que diz respeito aos projetos sociais, neste caso,
no processo de aprendizagem musical coletiva numa igreja evangélica, onde o objetivo
principal é a apresentação dos grupos instrumentais em cultos e recitais.
Em concordância com o autor OLIVEIRA (2015), “uma temática de interesse para
educação musical diz respeito à ampliação de seu campo de atuação com a inserção da
música em projetos sociais que hoje ocupam um lugar de destaque nos projetos de
intervenção na sociedade brasileira”.
Hoje em dia é possível encontrar muitos projetos sociais que utilizam esta
metodologia para a inserção dos alunos no meio musical. Entretanto, o ensino coletivo vive
um processo de consolidação e vem afirmando sua eficácia por diferentes profissionais com
curso superior e especialização.
Finalizando este subtópico, é importante salientar que existem profissionais que
atuam neste segmento da educação musical, não só instruindo grupos de prática coletiva,
mas também incentivando que outros profissionais possam construir um interesse no
assunto, fazendo com que o ensino de música seja um pouco mais democrático e acessível a
todos.
Temos notícia que muitos professores de música recém formados, ou até mesmo com
certa experiência, quando encaram uma turma em escola regular, se deparam com algumas
situações desagradáveis, como por exemplo a falta de interesse dos alunos pelas atividades
propostas, muitas vezes há violência da parte dos alunos e, em muitas escolas, a música é
encarada como um momento de lazer e/ou entretenimento. Estes assuntos foram discutidos
no “I Encontro Nacional de Ensino Coletivo de Instrumento Musical”, onde o discurso foi
defendendo a ideia de que é possível aprender conteúdo musical nas escolas sim, e o melhor
de tudo, encarar a abordagem musical com seriedade e ao mesmo tempo deixar que os
alunos se divirtam.
O ensino coletivo visa também, tentar atingir a todos os alunos em igualdade,
obviamente respeitando as diferenças de cada um e valorizando as ideias e sugestões trazidas
para um melhor aproveitamento e desenvolvimento musical coletivo.
O ensino tutorial de música nas escolas especializadas privilegia poucos, quase
sempre exclui iniciantes, que não tiveram oportunidade de um contato anterior com o
instrumento que desejam aprender. Muitos dos alunos que iniciam o aprendizado de um
instrumento musical não se profissionalizam, ou tão pouco pensam nesta possibilidade.
Quando a criança imita ações, ela mostra que é capaz de entendê-las, logo, os
conteúdos por elas imitados já se encontram disponíveis ao seu nível de desenvolvimento,
mesmo que ainda não possam ser realizados independentemente,
Por isso, para Vigotski, a imitação (e a repetição) pode ser uma atividade criativa,
com o poder de agir na ZDP e impulsionar o desenvolvimento psicointelectual,
proporcionando aprendizagem efetiva, desde que aconteçam em determinadas
circunstâncias e momentos. Portanto, nem toda prática musical imitativa é uma
prática adestradora ou passiva. Desde que esteja associada à atenção consciente;
desde que nasça da sensibilidade e tenha um sentido; desde que esteja associada a
um contexto de aprendizagem mais amplo, significativo – a imitação não será uma
prática adestradora, mecânica ou robotizada. ( BENEDETTI e KERR, 2009, p. 96)
8
ZDP: Vigótski cria o conceito de Zona de Desenvolvimento Proximal, segundo o qual toda criança possui um potencial de
aprendizagem que deve ser descoberto e trabalhado nas situações formais/intencionais de ensino. A ZDP seria a “distância”
entre o nível de desenvolvimento efetivo da criança, representado por tudo o que ela é capaz de fazer e elaborar por conta
própria, e seu nível de desenvolvimento potencial. (BENEDETTI e KERR, 2009, p. 83).
2.3.2 - Apreciação Musical
O termo “apreciação musical” não é apenas um simples ato de ouvir, mas sim
quando o aluno está atento a ouvir, pois “qualquer atividade musical implica em audição,
desde a afinação do instrumento a um concerto no teatro”. (OLIVEIRA, 2015, p. 39).
O ouvir permeia toda experiência musical ativa, sendo um meio essencial para o
desenvolvimento musical. É necessário, portanto, distinguir entre o ouvir como
meio, implícito nas outras atividades musicais, e o ouvir como fim em si mesmo.
No primeiro caso, o ouvir estará monitorando o resultado musical nas várias
atividades. No segundo, reafirma-se o valor intrínseco da atividade de se ouvir
música enquanto apreciação musical. (FRANÇA e SWANWICK, 2002, p. 12).
A apreciação é uma forma essencial e pura de participação com a música. Por meio
dela podemos ampliar nossos cenários musicais e nosso entendimento no que diz respeito ao
fazer musical. Ela é a atividade musical mais acessível a todos e, logo, a maioria das pessoas
vai se deparar com ela em alguma parte de suas vidas.
Há quem adote uma posição contrária a esta ideia. FRANÇA e SWANWICK (2002)
citam o autor ELLIOTT (1995) que “qualifica a composição como atividade exclusiva dos
grandes mestres da história da música, alienando os estudantes dessa forma básica do fazer
musical”. Um fato curioso é que, os próprios mestres da composição vão contra esta ideia.
9
Hindemith diz:
9
Paul Hindemith: foi um compositor, violinista, violista, maestro e professor alemão.
CAPÍTULO 3 - ESTUDO DE CASO: ORQUESTRA EXPERIMENTAL
Ora, se a música permitiu a comunicação entre grupos sociais locais pela história da
humanidade, também é válido ressaltar que ela pôde superar suas limitações culturais e se
comunicar muito além da cultura local, podendo se propagar entre culturas e classes sociais
diferentes. Assim, se a música funcionou como comunicação entre povos, pode-se dizer
também, que ela funcionaria como uma ferramenta de comunicação entre o homem e o
Divino.
É importante destacar uma breve citação que descreve o pensamento do monge
alemão Martinho Lutero, que foi o responsável pela a reforma protestante. Para Lutero,
10
Portal Batista: Canal eletrônico onde são disponibilizadas informações sobre as organizações ligadas à Igreja Batista
Brasileira. Disponível em:
http://www.batistas.com/portal-antigo/index.php?option=com_content&view=article&id=13&Itemid=13&showall=1.
Acesso em: 15 out. 2017.
A atividade principal da igreja é o culto, e nela estão envolvidas todas as atividades
musicais que cada igreja possui, como corais, grupos de louvor, bandas e, em algumas,
orquestra. Todo ministério e organização de uma igreja batista devem surgir do culto, pois é
nele que as coisas devem acontecer. O culto também deve ter função de inspirar e entusiasmar
tudo que a igreja faz enquanto igreja.
A música sacra é um dos ministérios que a igreja possui, cuja função prioritária é
servir ao culto, também suprindo as necessidades espirituais dos seus membros.
Os batistas creem que a música sacra comunica a realidade de Deus com o ouvinte,
estimulando uma resposta e revelação Divina, com isso, surge um ambiente condicionado
para proporcionar a comunhão entre as pessoas e das pessoas com Deus.
Um ponto bastante relevante se dá ao fato de os batistas darem muita importância à
música na igreja, para eles, musicalmente falando, a igreja tem o papel de:
A igreja batista confirma a relevância, até mesmo bíblica da música na adoração, que
se manifesta através do canto coletivo na congregação, individual, dos grupos vocais,
instrumentais e/ou mistos, por este motivo os batistas creem que:
“O cântico deve cumprir os objetivos do culto a Deus, sendo, portanto, teocêntrico e
não antropocêntrico; Que sua letra deve ser de conteúdo teologicamente correto, e
conter ensinamentos que proporcionem o crescimento espiritual e a dedicação ao
serviço de Deus e à proclamação da Sua salvação; Que a música deve contribuir para
adoração que se quer prestar a Deus, a quem é dirigida; para exaltar a Sua glória e
para oferta de gratidão pelas grandes coisas que Ele fez e faz; Que, basicamente, o
hino é uma oportunidade para a congregação declarar a sua experiência cristã, à luz
das Sagradas Escrituras, e se regozijar coletivamente na doutrina cristã”. (Portal
batista).
Durante a introdução deste trabalho, foi mencionado que na Primeira Igreja Batista no
Bairro das Graças funciona uma orquestra com cerca de trinta músicos, esta orquestra tem
função completamente diferente da Orquestra Experimental, que também possui cerca de
trinta alunos, são duas orquestras com propostas distintas. A orquestra principal ensaia
semanalmente e tem função litúrgica, ou seja, atender aos cultos e eventos de cunho
missionário. Esta orquestra participa de um culto mensal, com repertório exclusivamente
sacro. A orquestra Experimental tem função, tão somente musical pedagógica, com repertório
que vai do erudito à música popular nacional e internacional.
O projeto Orquestra Experimental surgiu com o objetivo exclusivo de atender, artística
12
e pedagogicamente, os alunos que estudam na escola de música da PIBBG .
Os alunos integrantes da Orquestra Experimental primeiramente participam de aulas
13
coletivas homogêneas , onde são agrupados alunos do mesmo naipe com o professor
específico de cada instrumento, após pelo menos um mês de aula, os alunos de naipes
diferentes são reunidos numa única sala, onde acontecem os ensaios da Orquestra
Experimental. Neste ambiente totalmente acolhedor e educacional, os alunos aprendem a
como se portar em uma orquestra, do ponto de vista musical, educacional, pedagógico e
social.
A orquestra Experimental é dirigida pelo professor/regente, neste caso, este que
escreve, onde faz abordagens no que dizem respeito à prática musical propriamente dita,
como por exemplo: afinação, postura, percepção musical, leitura de escrita musical
convencional, improvisação, experimentação, composição, dentre outros. Nos ensaios, os
alunos interagem entre sim e com os professores, que também participam das atividades para
melhor instruir seus alunos, acima de tudo, para que o ambiente possa se tornar democrático
e, prioritariamente musical, o professor/regente e os professores dos naipes valorizam os
comentários e sugestões levantadas pelos alunos para agregar valor ao resultado sonoro.
Este projeto funciona há um ano e meio e, com o passar do tempo, viu-se a
necessidade de fazer ensaios com os naipes separados. Assim, surgem novas possibilidades,
12
PIBBG: Primeira Igreja Batista no Bairro das Graças
13
Aulas coletivas homogêneas: ocorre quando vários instrumentos do mesmo naipe são trabalhados ao mesmo tempo.
como apresentar peças apenas com as cordas ou sopros separados, além das apresentações
com todos os músicos juntos. Em função desta separação, é possível trabalhar mais detalhes
específicos nos grupos, ou seja, assuntos relacionados à técnica específica dentro dos naipes.
Durante duas semanas do mês os grupos ensaiam separados e nas outras duas semanas todos
ensaiam juntos, formando a orquestra experimental. Vale ressaltar que, os alunos colocam em
prática e executam todo o conteúdo que os professores dos naipes, especificamente abordam
em suas aulas.
Ao final do semestre, na escola de música, são realizadas duas apresentações musicais,
o “Recital” onde os alunos se apresentam por naipes fragmentados (naipe de sax, trompetes,
trombones, flautas, violinos, violas, violoncelos, violões, bateria), e o “Concerto”, onde os
grupos maiores se apresentam, ambos eventos funcionam com o objetivo de mostrar todo o
trabalho desenvolvido durante o semestre. Todos os assuntos abordados nos ensaios, se
refletem diretamente na performance final do grupo.
3.2.1 - Performance como produto final do processo de musicalização
Este trabalho não visa fazer alusão ao termo “performance” apenas no sentido de
habilidade técnica, proficiência e/ou virtuosidade performática, mas principalmente, dentro do
contexto até aqui discutido acerca do processo de musicalização, utilizando o termo em
questão como consequência do trabalho desenvolvido ao longo das aulas no semestre,
resultando na apresentação do grupo em recitais e concertos didáticos.
Em geral, a performance está tão associada com o virtuosismo que muitos questionam
a eficácia dela no ensino coletivo, ou seja, sem fins profissionais.
Seja qual for o nível musical dos alunos, é necessário extrair a melhor capacidade
artística possível, para que ela possa resultar em música relevante e agradável.
As crianças devem ser encorajadas a cantar ou tocar a mais simples peça com
comprometimento e envolvimento, procurando um resultado criativo, expressivo e
estilisticamente consistente. Isso deve ser almejado por ser essa a única forma pela
qual a performance - em qualquer nível – pode-se tornar uma experiência
esteticamente significativa. (FRANÇA ; SWANWICK, 2002, p. 14).
Muitas teorias foram encontradas acerca dos conceitos de motivação, apesar disso,
aqui é abordado o conceito onde estabelece que “motivação é uma força interior que surge,
conduz, orienta e sustenta as ações mais importantes do indivíduo, sendo sua existência e
natureza comprovadas a partir da observação de padrões comportamentais”. (GOMES, 2010,
p.794).
A motivação está diretamente ligada à performance como um todo, não apenas em
apresentações, concertos e recitais, mas também nos preparativos, como ensaios e aulas, pois
dentro destes, já acontece o fator da exposição. O fato do aluno chegar ao ensaio, aquecer,
afinar e tocar seu instrumento já o torna mais motivado para seguir adiante.
A integração e interação que há entre os alunos, faz com que o trabalho do educador
seja mais fluido e valorizado. Vale ressaltar que, quando os alunos estudam juntos, o ambiente
de sala de aula se torna mais interessante do ponto de vista socioeducativo.
Outro fator importante para que haja motivação, é o fato de se fazer necessária a
existência de propostas de atividades para que o indivíduo possa alcançar o nível de
excelência mais alto possível, neste caso, dentro de um conjunto de prática musical coletiva.
“Pode-se ainda dizer que sempre, a partir de um momento, uma causa motiva todo
comportamento. Esse princípio também é fundamental na busca pelo entendimento das ações
individuais e coletivas”. (ANGELINI, 1973, apud GOMES, 2010, p.795).
Embora o ensino tradicional não leve em consideração, a motivação é um componente
indispensável para a prática coletiva, pois o aluno precisa de elementos que de fato o motivem
a concretizar um estudo consolidado e aprofundado.
A participação interativa que há entre os alunos e o professor faz com que o ambiente
se torne ainda mais motivacional. Outra situação significativa para tal motivação é, permitir
que os alunos opinem e compartilhem ideias e sugestões para compor às atividades coletivas.
Por se tratar de um grupo com cerca de trinta alunos, foram escolhidas aleatoriamente
algumas respostas para a comprovação da entrevista. Seguem abaixo as questões levantadas e
suas devidas respostas:
Questão 1: Para você, qual a importância da Orquestra Experimental?
Diante desta questão, grande parte dos alunos fez alusão a alguns aspectos até aqui já
mencionados, como por exemplo: motivação, disciplina e interação social no ambiente
musical.
“A interação entre os músicos, a dinâmica entre os naipes, a harmonia dos
arranjos, além da inclusão dos músicos iniciantes que, na minha opinião, gera uma
motivação maior neles. Porque quando você consegue executar uma peça com
excelência e mínimo de erros e é reconhecido, você fica mais motivado para se
aprofundar nos estudos”. (ALUNO 1).
“A Orquestra Experimental trás consigo uma experiência muito boa em poder tocar
com outros naipes, que auxilia demais no desenvolvimento da sociabilidade entre os
alunos”. (ALUNO 4).
“Me sinto motivado porque, quando estou fazendo música junto com outras
pessoas, sinto que tenho um papel relevante no grupo e só o fato de saber que cada
um está lendo coisas diferentes em função do arranjo apresentado, mas que o
resultado final é aquilo que o maestro ou arranjado esperava como resulto final, é
gratificante”. (ALUNO 1).
“Sim! Pois é sempre bom tocar com outros instrumentos, com isso, podemos ver
como fica a sincronia que não vemos tocando sozinho”. ( ALUNO 6).
De todas as respostas coletadas para esta pergunta, na grande maioria pode-se destacar
a presença das seguintes situações: sincronismo, troca de experiência, cada um ter um papel
relevante para o grupo, tocar junto, performance.
Todas as situações por eles mencionadas fazem parte do aspecto motivacional, do
ponto de vista educacional, pois, como já citado em tópicos anteriores, as práticas coletivas
possibilitam desenvolvimento e elevam consideravelmente o nível de todas essas situações
por eles levantadas, uma vez que, “a interação grupal se utiliza do lúdico que por sua vez,
bem direcionado pelo professor, torna-se uma poderosa força, auxiliando um aprendizado
seguro e estimulante”. (CRUVINEL, 2005, p.78).
Para responderem esta pergunta, a orquestra foi dividida em dois grupos (cordas e
sopros), por se tratar de uma observação mais minuciosa, foi escolhido um representante de
cada grupo para coletar as informações por eles mencionadas. Para esta questão, todos os
professores precisaram sair do ambiente, deixando os alunos mais livres para opinarem.
Sendo assim, cada grupo discutiu e chegou a uma resposta coletiva. Foram coletadas,
resumidamente, apenas duas respostas que representam cada grupo.
A segunda resposta para esta questão foi bem interessante, pois os alunos destacaram
pontos importantes acerca das diferenças entre o ensino/aprendizagem individualizada e
coletiva:
Pontos negativos do ensino musical individual: O participante ou aluno se sente
desestimulado diante dos obstáculos encontrados uma vez que depende tão somente
do seu entusiasmo e do professor ou maestro; O participante ou aluno sabe que não
tem com quem dividir a responsabilidade, que é só dele, e por isso muitas das vezes
não se dedica aos estudos como deveria. Pontos positivos do ensino musical
individual: O participante ou aluno tem a exclusividade durante todo o aprendizado
e pode se dedicar sem a interferência de outrem; O participante ou aluno sabe a
responsabilidade é só dele, e por isso pode estabelecer suas próprias metas para o
aprendizado. Pontos negativos do ensino musical coletivo: O participante ou aluno
não tem muitas das vezes a atenção de seu mestre da mesma maneira que teria se
fosse exclusivo, daí ter que se dedicar ainda mais para que possa estar em
igualdade de condições com os demais; O participante ou aluno dependendo de
cada caso, não consegue se adequar à pratica coletiva, muitas das vezes por não
conseguir acompanhar a performance dos demais . Pontos positivos do ensino
musical coletivo: O participante ou aluno tem a oportunidade de ouvir e se fazer
ouvir, podendo aproveitar para sentir o total resultado do que está executando; O
participante ou aluno pode perceber o nível que o grupo está alcançando e, dessa
maneira, ter o parâmetro ideal do quanto precisa se dedicar. (GRUPO DOS
SOPROS).
É possível notar nos relatos acima que houve um progresso musical dos alunos ao
longo das aulas e atividades na orquestra. Todas as afirmações colocadas aqui contribuem
com resultados significativos e positivos apresentados na análise da pesquisa. Os alunos
entrevistados disseram que o contato com a prática em conjunto lhes proporcionaram
melhorias em suas vidas, no âmbito sócio afetivo, comportamental e musical, sobretudo,
estimula sentimentos de alegria, aumentando assim a autoestima. Sendo assim, a partir das
respostas e observações, fica evidente que após a participação na prática em conjunto, os
alunos passaram a apresentar um comportamento mais carismático, possibilitando a interação
social e um comportamento mais equilibrado. Os dados mostram o interesse e satisfação dos
alunos em fazer música.
Questão 4: O que você aprende na Orquestra Experimental? Você mudaria algo?
“Aprendo às vezes novidades na música ensinada pelo maestro”. ( ALUNO 1).
“Aprendo sobre, não só o meu instrumento, mas como os dos meus colegas”.
(ALUNO 2).
“A saber ouvir melhor um ao outro, prestar mais atenção em detalhes que não
aparecem quando tocamos sozinhos, respeitar o tempo, prestar atenção nos sinais
do maestro, e conseguir acompanhar a música. Não, creio que não mudaria nada”.
(ALUNO 4).
A partir dos relatos acima, é possível observar que as relações concernentes à prática
de música coletiva estão muito associadas ao aspecto sócio afetivo, ou seja, as situações que
acontecem com o “meu colega são tão importantes quanto as que acontecem comigo”. Muitos
comentaram acerca da socialização que há neste ambiente, evidentemente também foram
destacados assuntos extramusicais abordados nos ensaios, como, afinação, teoria, sincronia,
percepção auditiva, dinâmica, etc. Além dos assuntos musicais, a socialização é uma das
principais relevâncias no contexto da Orquestra Experimental, visto a sua importância para o
seguimento do processo. Muitos professores de música não se dão conta da importante
dimensão que tem a prática em conjunto na vida dos alunos.
Questão 5: Para você, existe desenvolvimento individual na prática coletiva?
“Sim, e muito! Eu sou prova disso. Toda prática coletiva gera desenvolvimento
individual sim, por que você vai sempre trazer pro seu solo ou apresentação
individual muita coisa aprendida no coletivo. Sem contar que sempre vai rolar, no
coletivo, aquele “bizú” do maestro em determinado momento, em que você vai usar
depois, com certeza no individual”. (ALUNO 1).
“Sim, pois para aprimorar o som coletivo é necessário o estudo individual de cada
músico. (ALUNO 3).
“Depende se o estudante vai querer desenvolver, pois você não desenvolve sem
estudo”. (ALUNO 6).
“Sim, creio que há. Se o participante conseguir perceber que ele é peça importante
no conjunto como um todo e se empenhar para se desenvolver ombro a ombro com
os demais do grupo, sem dúvida nenhuma o resultado, sem que ele perceba, será
bem subjetivo. Em algum momento ele perceberá que a responsabilidade, a troca de
informações, a disciplina, etc. fizeram com que ele crescesse individualmente”.
(ALUNO 7).
Nota-se, curiosamente, nos relatos acima que todos, sem exceção, responderam que
realmente há desenvolvimento individual na prática coletiva, visto que são abordados
assuntos relacionados ao fazer musical em geral, que consequentemente, influencia
diretamente no processo de aprendizagem individual.
Foram feitas perguntas aos professores que fazem parte da Orquestra Experimental,
perguntas essas que são parecidas com as feitas para os alunos, porém o enfoque é outro,
neste caso, do ponto de vista educacional professor-aluno.
Questão 1: Do ponto de vista educacional, qual a importância da Orquestra
Experimental?
Quando foi perguntado isso aos professores, todos enfatizaram acerca da experiência
socioeducativa que acontece no ambiente de prática de música coletiva e destacaram a troca
de conhecimento, a motivação por tocarem juntos, a competitividade saudável que há neste
contexto. Comprovando estas respostas, os professores responderam:
“A orquestra experimental tem como ponto forte a integração dos alunos no âmbito
interpessoal, onde o mesmo contribuindo direta ou indiretamente, sejam por suas
facilidades ou dificuldades. Assim, um aluno com dificuldades em uma aula
individual acaba se desmotivando, já na prática em conjunto existe esse clima de
parceria e, as vezes de competitividade”. (PROFESSOR 1).
Questão 2: Para você, há desenvolvimento individual no ensino coletivo? Por que?
Para esta questão surgiu certa discordância em alguns pontos, pois, como já
mencionado em tópicos anteriores, alguns professores acreditam que só é possível dominar a
técnica de um instrumento se as aulas forem individuais, principalmente se o foco for o
desenvolvimento profissional do aluno na área musical.
Visto estas informações, deixo os comentários dos professores que discutiram acerca
desta problemática:
“Sim, pois o aluno através desta atividade experimenta e participa do trabalho em
equipe, desempenhando seu papel na construção da obra artística e entendendo o
valor de cada componente do grupo para a realização do objetivo em questão.
(PROFESSOR 1).
“Sim, até certo ponto. Há momentos na vida de um estudante de música que precisa
de um ensino mais direcionado a sanar possíveis problemas técnicos, estéticos e/ou
musicais”. (PROFESSOR 2).
“Quase nenhum! O coletivo traz vantagens mais imediatas”. ( PROFESSOR 3).
Questão 3: Quais os conteúdos abordados no ensino coletivo que não são possíveis
abordar no ensino individualizado?
O primeiro professor comenta sobre a atenção que o aluno precisa ter na hora de
executar as peças, respeito em relação aos demais naipes e interação sentimental coletiva,
situações essas que muito foram abordadas durante esta pesquisa. O segundo aborda acerca da
afinação, dinâmica e expressão dentro de cada naipe e nos demais naipes. O terceiro
menciona conceitos de harmonia, arranjo e percepção entre os naipes.
“Não é possível exigir do aluno no ensino individual algumas coisas que se nota na
coletividade, por exemplo: observar spalla, maestro e chefe de naipe ao mesmo
tempo; noção prática de respeito de dinâmica quando há frases mais importantes no
instrumento do colega; promoção do senso literal do sentimento coletivo”.
(PROFESSOR 1).
As igrejas estão cobrindo o papel antes reservado aos cursos básicos e técnicos de
música. Mesmo sendo instituições que não são formadas para a formação musical
[...] Se por um lado, existe a falta de preparo e da formação específica dos
profissionais em relação às novas propostas de ensino de música, por outro, a igreja
é um espaço que em geral apoia este trabalho tanto financeiramente quanto pelo
esforço por parte dos professores com vistas a um trabalho de preparar os músicos
visando as apresentações em suas igrejas. (FREITAS, 2008 apud BLAZINA, 2012,
p. 13).
É importante salientar que, muitos músicos profissionais tiveram seu início artístico
em alguma igreja evangélica, como menciona FAVARO ( 2007),
Tratando-se especificamente das Igrejas Batistas, é possível dizer que elas são
verdadeiros espaços democráticos que proporcionam efetivamente a prática e a vivência
musical coletiva. Tendo em vista que o município onde está localizada a PIBBG é muito
carente de serviços públicos, dificilmente os jovens e adultos que participam da Orquestra
Experimental se aproximariam de uma pratica musical tão acessível, se não pela oportunidade
proporcionada pelos projetos socioculturais que a igreja promove.
Mediante a pesquisa e, principalmente, refletindo sobre o estudo de caso desenvolvido
neste trabalho, é possível observar a ampla importância que a prática musical coletiva tem
para o processo de musicalização. Todo aluno que inicia o estudo musical, seja qual for o
instrumento, precisa do contato com outros alunos para que possam auferir conhecimentos
que só se alcançam quando há interação, parceria, afetividade e envolvimento no coletivo.
Vale chamar atenção para as abordagens pedagógicas e metodológicas que os
professores adotam em suas aulas, embora existam discussões entre eles, muitos não
enxergam o grande potencial que o ensino coletivo tem para a formação musical do aluno. É
importante que o professor concentre sua abordagem pedagógica em um direcionamento
crítico e perceptível, de maneira que a música o ajude a levar os alunos a aprender a ouvir,
sentir, pensar e expressar, sem que a música se torne um “fardo pesado”, os alunos precisam
trazer suas realidades à sala de aula para que possa haver um compartilhamento de
experiências extramusicais, assim desenvolvendo capacidades, habilidades e competências no
ambiente coletivo. Sobretudo, saber manusear e manipular a música em espaços de ensino
será, sem dúvida, um atrativo para as aulas, sem perder o domínio pedagógico.
O professor precisa auxiliar os alunos a entrarem em contato com a música da forma
mais simples e dinâmica possível, pois muitos professores se mantêm focados em outros
conteúdos relacionados à atividade musical, que acabam deixando de fazer música. Para que
uma atividade musical seja interessante e satisfatória, o professor deve propor ações que
viabilizam o contato direto do aluno com a música e não somente em atividades que não
envolvem o fazer musical.
É de suma importância que as pesquisas e os estudos relacionados à prática musical
coletiva sejam aprofundados, visto que ainda hoje há pouco material disponível na literatura
nacional, ainda mais quando este assunto está inserido no contexto das igrejas evangélicas.
O projeto Orquestra Experimental como um processo de musicalização, pode ser
ampliado em outras igrejas com objetivo sacro ou cultural para atender aos eventos por elas
promovidos, sobretudo também é possível expandir o projeto a outros ambientes
desvinculados à igrejas, como: escolas regulares, escolas de música, ONG’s e projetos sociais,
ou seja, onde há pessoas que gostam de fazer música.
REFERÊNCIAS
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PORTAL BATISTA. Convenção Batista Brasileira. Culto e música sacra. Disponível em:
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&Itemid=13&showall=1. Acesso em: 15 out. 2017.
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partir do conceito de Zona de Desenvolvimento Proximal, de Vygotsky. Monografia
(Licenciatura Plena em Educação Artística - Habilitação em Música) – Instituto Villa-Lobos,
Centro de Letras e Artes, Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro, 2010
SWANWICK, Keith. Musical Knowledge: Intuition, Analysis and Music Education. London:
Routledge, 1994.