ÁFRICA ANTES DA PARTILHA Apostila 2

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ÁFRICA ANTES DA PARTILHA Apostila 2

• A escravidão foi um fenômeno de exploração do


ser humano que esteve presente em diversos
lugares do mundo desde a antiguidade clássica até
o século XX, tendo como característica principal a
relação de domínio de um indivíduo sobre o outro.
• Nesta relação, o dominado – o escravo – era visto
como uma propriedade, devendo ter sua força de
trabalho, bem como seu corpo, a disposição dos
seus senhores. Estes, por sua vez, podiam usar da
coerção para obterem a devida obediência
(LOVEJOY, 1983: 29).
Escravidão Doméstica
• É importante fazer um adendo ao que se refere
as terminologias escravo e escravatura.
• Ambos os termos são conceitos ocidentais
derivados da palavra “eslavo”, que designa o
povo nascido no leste europeu, submetido a
escravidão na Europa na Idade Média e
substituído aos poucos pelos africanos a partir
do século XV.
Nenhuma língua africana conhecia, antes da
chegada dos europeus, a palavra escravo e
menos ainda escravatura. HENRIQUES, 2006: 62 e 67).
• Dentro da África, a expansão de impérios,
as disputas por rotas comerciais e por
acesso aos rios eram alguns fatores
desencadeadores de grandes conflitos entre
as diversas etnias africanas, que acaba por
provocar a “escravidão”.
• Organizadas principalmente através das
relações de parentesco, pelas quais os
indivíduos estabeleciam suas identidades, as
etnias derrotadas nestas batalhas eram
submetidas ao domínio das etnias
vencedoras.
• Na áfrica, o parentesco determinava o lugar
do indivíduo na sociedade, desta maneira, a
hereditariedade também o condicionava a
escravidão ou a liberdade, a depender da
regra de parentesco existente em cada
sociedade.
• Além da guerra e da hereditariedade,
existiam outras maneiras pelas quais o
indivíduo poderia tornar-se escravo.
• O cativeiro era uma forma de punir pessoas
condenadas principalmente por assassinato,
roubo, adultério e feitiçaria.
•A compra, venda ou troca eram outras
maneiras de escravizar o indivíduo. Pessoas
endividadas penhoravam parentes como
garantia de pagamento da dívida, sendo elas
libertadas com sua quitação.
• Os escravos deste sistema tinham sua força
de trabalho utilizada principalmente na
agricultura de pequena escala, podendo
desempenhar outras funções dentro da
sociedade, como o artesanato e o comércio,
por exemplo, funções desempenhadas
também por homens livres.
• Os escravos eram poucos por unidade
familiar, mas a posse deles assegurava poder
e prestígio para seus senhores, já que
representavam a capacidade de auto-
sustentação da linhagem.
• Não por acaso, nesse tipo de cativeiro se
preferia mulheres e crianças. A fertilidade
das mulheres garantia a ampliação do
grupo. Daí que era legítimo as escravas se
tornarem concubinas e terem filhos com os
seus senhores.
• Seguindo a mesma lógica, a incorporação
dos escravos na família se dava de modo
gradativo: os filhos de cativos, quando
nascidos na casa do senhor, não podiam ser
vendidos e seus descendentes iam, de
geração em geração, perdendo a condição
servil e sendo assimilados à linhagem.
• Assim o grupo podia crescer com o
nascimento de escravos, fortalecendo as
relações de parentesco e aumentando o
número de subordinados ao senhor.
• A integração dos cativos também explica a
predileção pela escravização de crianças, visto
que elas mais facilmente assimilavam regras e
constituíam vínculos com a família do seu senhor.
• Em algumas sociedades, a exemplo do povo
Sena de Moçambique, a escravidão também era
uma estratégia de sobrevivência quando a fome e
a seca se faziam desastrosas. A venda ou troca
de um indivíduo da comunidade podia garantir a
sobrevivência do grupo, inclusive de quem era
escravizado. A troca de alguém por comida era
uma forma de evitar a extinção do grupo.
ESCRAVIDÃO ISLÂMICA
• Desde que os árabes ocuparam o Egito e o
norte da África, entre o fim do século VII e
metade do século VIII, a escravidão doméstica,
de pequena escala, passou a conviver com o
comércio mais intenso de escravos.
• A escravidão africana foi transformada
significativamente com a ofensiva dos
muçulmanos. Os árabes organizaram e
desenvolveram o tráfico de escravos como
empreendimento comercial de grande escala na
África.
• Desde os fins do século VIII, os árabes, partindo
da região do Golfo Pérsico e da Arábia,
disseminaram o islamismo pela força da palavra,
dos acordos comerciais e, principalmente, das
armas. Eram as guerras santas, as jihad,
destinadas a islamizar populações, converter
líderes políticos e escravizar os “infiéis”, ou seja,
quem se recusasse a professar a fé em Alá.
• Um dos primeiros povos a se converter ao
islamismo, na África do Norte, foi o povo berbere.
As cáfilas, como ficaram conhecidas as grandes
caravanas que percorriam o Saara, eram formadas
principalmente por berberes islamizados.
• As cáfilas rumavam do Norte da África para
as savanas sudanesas carregadas de
espadas, tecidos, cavalos, cobre, contas de
vidro e pedra, conchas, perfumes e,
principalmente, sal.
• No retorno, depois de meses, traziam ouro,
peles, marfim e, cada vez mais, escravos.
Calcula-se que, entre 650 e 1800, esse
tráfico transaariano de escravos vitimou
cerca de 7 milhões de pessoas, sendo que 20
por cento delas morreram no deserto.
Rotas comerciais através do deserto do Saara.
• Nessa interação, o Islã dos mercadores ia
encontrando ora uma maior receptividade, ora a
firme resistência das populações sudanesas
adeptas de crenças tradicionais. Em muitos
lugares a fé em Alá e o culto aos ancestrais
conviveram, noutros a conversão ficou restrita
ao soberano e à aristocracia, enquanto as
pessoas comuns continuavam a professar as
crenças herdadas dos antepassados.
• Mas também se viu a conversão de populações
inteiras, fosse para escapar do risco do cativeiro,
já que apenas os infiéis podiam ser escravizados,
fosse por sincera convicção religiosa.
• Respaldados pela religião, que permitia a
escravização de “infiéis”, ou seja, de não
muçulmanos, os árabes capturaram e
escravizaram muitos africanos. Para os
seguidores de Maomé, a escravização era uma
oportunidade de conversão, podendo o
escravizado ser libertado ap ser instruído nos
preceitos islâmicos.
• No entanto, eram primordialmente as razões
comerciais, e não as altruístas, que definiam a
condição do escravizado, uma vez que este era
uma peça fundamental para o comércio dos
mercadores muçulmanos.
• No mundo árabe, as ocupações destinadas aos
cativos eram diversas: agricultores, concubinas,
artesãos, domésticas, tecelões, entre outras.
• Mas era como soldados que os escravos se
faziam indispensáveis. A crescente busca
muçulmana por novos territórios demandava
um número cada vez maior de escravos para
lutarem nas guerras, o que acentuou a violência
nas buscas por novos escravos dentro do
continente africano.
• Além de produto de troca, o escravo era o
carregador nas exaustivas viagens. Estava a seu
encargo o transporte das barras de sal, dos
fardos de tecidos, dos cestos de tâmaras, das
armas, dos objetos de cobre.
• Todo o mundo árabe foi se revelando um bom
mercado para os cativos trazidos não só da
África, mas também da Índia, China, Sudeste da
Ásia e Europa Ocidental. Mas foi a África negra
quem mais abasteceu os mercados de escravos,
principalmente depois da ocupação do Egito e do
Norte da África pelos árabes.
• Ainda no século IX, o califado de Bagdá chegou
a contar com 45 mil escravos negros trazidos
pelos comerciantes berberes.
• Esse tráfico voraz de gente de cor preta explica
a presença de negros nas populações árabes.
Desta maneira, a escravidão doméstica foi
aos poucos substituída pelo comércio
escravo em larga escala. No século XV, com a
chegada dos europeus na costa africana,o
tráfico de escravos foi intensificado atingindo
dimensões intercontinentais.
À partir deste momento a África passou a
desempenhar um papel cada vez mais
importante para a economia mundial, na
qual os escravos de lá exportados passaram a
constituir a base do modelo econômico que
emergia.
África Branca e África
Negra

Mesquita de Abuja, na Nigéria


ESCRAVIDÃO CRISTÃ
• Iniciado no século XV com a expansão
europeia, o comércio Atlântico de escravos
representou uma das maiores formas de
violência contra o ser humano de que se tem
notícia na História.
• Considerado um dos empreendimentos mais
complexos do mundo pré-industrial, o
comércio atlântico de escravos transportou
pessoas e bens entre a África, a Europa e as
Américas, movimentando uma quantidade
enorme de capital.
• E foi grande o assombro dos africanos que viviam
em Arguim, região do atual Senegal ao sul do
Cabo Branco, ao notarem que barcos enormes e
estranhos se aproximavam da costa.
• Embora já estivessem acostumados com a
presença estrangeira dos árabes, a visão dos
europeus e de embarcação tão grande deve ter-
lhes causado estranheza.
• Após conquistarem Ceuta (1415), importante
centro comercial localizado no extremo norte da
África, os lusitanos tomaram direção rumo ao sul
da costa ocidental.
• No século XV, a presença portuguesa se
restringiu a costa da África Ocidental, mais
especificamente a região da Senegâmbia, a qual
engloba, em seu contexto histórico, além do
Senegal e da Gâmbia, Guine-Bissau e toda a
área que circunda Serra Leoa.
• Os primeiros escravos foram capturados ao
sul do cabo Bojador (Saara Ocidental) e
levados para Portugal em 1441. Respaldados
pela Igreja, que via na escravidão uma forma
de cristianizar os hereges.
• Novas expedições de exploração na África
chegaram a ilha Arguim (atual Mauritânia)
em 1443.
• Os escravos capturados neste período eram
destinados principalmente a Europa, onde
desempenhavam basicamente funções
domésticas e agrícolas substituindo a
defasagem de homens empenhados nas
expedições marítimas.
• Neste período, o ouro ainda era o produto mais
desejado pelos portugueses, que seguiam suas
explorações cada vez mais ao sul da costa oeste
africana, mas a dificuldade em se chegar as
fontes produtoras de ouro fez com que a
presença lusitana se limitasse ao litoral.
• A construção do forte São Jorge da Mina na
Costa do Ouro (Gana), no ano de 1482, permitiu
o estabelecimento de relações comerciais nas
quais os portugueses trocavam escravos, vindos
principalmente do Benim, por ouro em pó.
• Pierre Verger (1987) classifica a fase do
comércio escravo para o Brasil durante a
segunda metade do século XVI, como o ciclo
da Guine, designando “Guine” como a costa
oeste ao norte do Equador.
• A fim de suprir a demanda por escravos para
as colônias hispânicas e portuguesas nas
Américas, o predomínio lusitano se
intensificou no litoral oeste africano tornando
a região compreendida entre os atuais
Senegal e Camarões o principal pólo
exportador de escravos no século XVI.
• Neste mesmo período a região congo-angolana
(também conhecida como África Centro-
Ocidental) já despontava como o segundo maior
fornecedor de mão de obra escrava do continente.
• Em fins do século XVI iniciou-se o segundo ciclo
do comércio de escravos para o Brasil, no qual a
maioria dos cativos importados foi tirada da
região congo-angolana.
• Com a decadência do Reino do Congo, os
portugueses se voltaram para Angola, que além
de ter uma população mais densa que o Congo,
estava em melhor posição para atender ao
aumento da procura portuguesa.
• Desta maneira, Portugal intensificou sua
participação no comércio de escravos em
Angola, o que deu novo impulso a atividade
em Luanda e (a partir de 1617) em Benguela.
• Embora a maior parte dos escravos tenha
sido dirigida as possessões espanholas no
Novo Mundo, foram os portugueses quem
forneceram os cativos aos espanhóis.
• Desta forma, durante todo o século, os
lusitanos foram os protagonistas do
comércio Atlântico de escravos para a
América espanhola.
• Angola e a Costa dos Escravos (que se
estendia do rio Volta ao rio Benim) tornaram-
se as principais fomentadoras de cativos para
as Américas, ultrapassando a Alta Guine e a
Senegâmbia.
• A crescente demanda por escravos no Brasil
fez com que Luanda se tornasse desde o início
do século XVII o mais importante porto
atlântico de embarque de escravos.
• Neste mesmo período, a procura por
escravos na África Centro-Ocidental (Cabinda,
Malembo, Sonio e Loango) se intensificou.
• O ouro e os diamantes descobertos em meados
da década de 1690 e a demanda por escravos para
trabalhar nas minas da capitania do interior do Rio
de Janeiro ocasionaram o aquecimento da
economia desse porto atlântico e de suas
plantações de cana de açúcar.
• A expansão desses dois setores econômicos da
colônia – a mineração e as plantações açucareiras
– levou as casas comerciais do Rio de Janeiro a
estabelecerem negócios com o porto de Luanda.
• O aumento na procura por escravos para as
Américas reforçou as atividades portuguesas em
África, resultando na construção do Forte de São
João Baptista de Ajuda, em Daome (1677-1680), e
na instalação de uma feitoria em Bissau, em 1696.
• Entretanto, a corrida por escravos não se
restringiu a costa ocidental africana. O
substantivo crescimento da produção de
açúcar na América portuguesa - que fez com
que as exportações da África Centro-
Ocidental superassem as dos portos do norte
- e a descoberta de minas de ouro em Minas
Gerais em fins do século XVII provocaram uma
intensa procura por escravos, os quais
passaram a ser importados também da África
Oriental, principalmente dos portos de
Moçambique.
• No século XVIII, o tráfico atlântico de escravos
alcançou seu apogeu devido a expansão das
plantation nas Américas.
• A especialização na produção de algodão da
porção sul das 13 Colônias britânicas na América
do Norte, a extração de ouro e diamantes nas
minas no Brasil e o desenvolvimento da
indústria açucareira no Caribe e demais regiões
das Américas fizeram com que as exportações de
escravos para o Novo Mundo chegasse a 5,6
milhões, quase seis vezes mais do que no século
anterior.
• Do total de escravos exportados para as
Américas no século XVIII, mais da metade foi
destinada as colônias das ilhas caribenhas e
aproximadamente um terço desembarcou no
Brasil.
• No início das explorações das minas no Brasil,
houve uma preferência por escravos oriundos de
regiões auríferas da África, uma vez que estes
sabiam extrair o ouro dos rios e cavar os túneis
nas minas.
• A África Centro-Ocidental, o Golfo do Benim e
o Golfo de Biafra, foram as principais regiões
fornecedoras de mão de obra escrava para as
Américas durante o século XVIII.
• A maior parte dos escravos exportados neste
período saiu da porção centro-ocidental da África:
30 a 45% do total de cativos comercializados.
• O século do apogeu do comércio atlântico de
escravos foi também marcado pelo início do
declínio do sistema escravagista.
• Foram as modificações surgidas na política
econômica da Grã-Bretanha após a secessão das
colônias americanas, que moveram a luta pela
abolição do comércio de escravos.
• A revolução industrial que acontecia na
Inglaterra via na escravatura um obstáculo a
expansão comercial, desta forma, o período do
tráfico legal de escravos chega ao seu fim no
século XIX.
• Se no século XVIII o comércio de africanos
escravizados foi a base sob a qual se
estabeleceram a indústria e o comércio
colonial dos Estados europeus, o
fortalecimento econômico proporcionado pela
acumulação de capital alcançado neste
período implicou na necessidade de se
ampliar o mercado consumidor dos produtos
manufaturados.
• Desta forma, a Grã-Bretanha iniciou uma
luta pelo fim do comércio atlântico de
escravos.
• Entre 1803 e 1836, praticamente todos os países
europeus abandonaram a prática Escravagista.
• Brasil (independente do Império Português desde
1822) recebeu neste século o maior fluxo de
escravos da história do comércio atlântico.
• Os escravos desembarcados nos portos
brasileiros neste período vinham de Moçambique
e principalmente da África Centro-Ocidental, que
exportou uma quantidade de cativos para o Brasil
ainda maior que a do século anterior.
• Foi somente no final do século XIX, com a lei
Áurea de 1888, que a escravidão chegou ao fim
no Brasil.
• O século XIX e marcado, desta forma, pelo
fim da exploração do comércio de cativos por
parte dos europeus no Novo Mundo e pelo
início de uma nova corrida imperialista dessas
potências sobre o continente africano,
especialmente com Conferência de Berlim em
1884-1885.
• Hernandez,Leila Leite, África na Sala de Aula - Visita À História Comtemporânea - 2ª Ed.
Brasília: UNESCO, Secad/MEC, UFSCar, 2010.
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Volume IV: África do século XII ao XVI (PDF, 9.3 Mb)
ISBN: 978-85-7652-126-6
Volume V: África do século XVI ao XVIII (PDF, 18.2 Mb)
ISBN: 978-85-7652-127-3
Volume VI: África do século XIX à década de 1880 (PDF, 10.3 Mb)
ISBN: 978-85-7652-128-0
Volume VII: África sob dominação colonial, 1880-1935 (9.6 Mb)
ISBN: 978-85-7652-129-7
Volume VIII: África desde 1935 (9.9 Mb)
ISBN: 978-85-7652-130-3

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