A Abolição e Seus Reflexos - Jonas Resende

Fazer download em pdf ou txt
Fazer download em pdf ou txt
Você está na página 1de 7

A ABOLIÇÃO E SEUS REFLEXOS

Ir.: JONAS DUTRA DE RESENDE


LOJA MAÇÔNICA PALADINOS DA PÁTRIA Nº 50
Grande Oriente de Minas Gerais

Primeiramente, abolir significa revogar, anular, extinguir ou


suprimir. Pois bem, por mais de 300 anos a sociedade brasileira
dependeu enormemente do trabalho escravo. Era ele que, nas
fazendas e nas minas, produzia as mercadorias para o comércio
interno e para a exportação. Além disso, ele também era
responsável por muitos serviços nas cidades e nas casas de seus
proprietários. Com a proibição do tráfico negreiro, a partir de
1850 o número de escravos tendeu a cair. As altas taxas de
mortalidade provocaram essa queda, causando na economia o efeito
de ter que encontrar um outro tipo de força de trabalho. Com a
expansão da economia cafeeira, as novas plantações no Oeste
Paulista passaram a empregar o imigrante europeu.

Assim, enquanto as áreas dinâmicas da nossa economia passavam a


empregar mais assalariados, as áreas atrasadas, como o Nordeste
ou as zonas cafeeiras do Rio de Janeiro, continuavam a depender
do trabalho escravo. Enquanto a permanência da escravidão era
defendida pelos fazendeiros das áreas atrasadas, ela sofria
duros ataques nas cidades.

A partir de 1870 o movimento abolicionista cresceu entre a


população urbana. Advogados, jornalistas, comerciantes,
professores, estudantes, artistas e muitos outros clamavam pelo
fim da escravidão. Todas as oportunidades serviam para fazer
comícios abolicionistas. Os abolicionistas usavam vários
argumentos a fim de pressionar o governo, os fazendeiros
escravistas e os políticos. Citavam a Bíblia, lembrando que os
escravos também eram filhos de Deus. Afirmavam ainda que Deus
criou os homens iguais entre si. Os argumentos religiosos não
sensibilizaram muito. Aliás, a própria Igreja possuía muitos
escravos no Brasil. Apelavam para o bolso dos fazendeiros
escravistas, mostrando que ter escravos já não era um bom
negócio. Afirmavam que o trabalhador livre, isto é, o
assalariado, produzia mais do que o escravo. Além disso, não
precisavam ser sustentados pelos fazendeiros durante a infância,
a velhice, doenças ou períodos de pouca produção. Lançaram mão
também dos argumentos liberais: todos os homens têm direitos
naturais à liberdade e à igualdade. Além disso, a escravidão,
segundo eles, feria a nossa Constituição, uma vez que esta
estava baseada em princípios liberais.

Os fazendeiros contra-argumentavam: os escravos eram sua


propriedade e a Constituição lhes garantia esse direito. Até
mesmo o argumento de que a escravidão prejudicava a imagem do
Brasil, pois, junto com Cuba, éramos os únicos países
escravistas do mundo, não convencia os proprietários. Apesar da
reação dos fazendeiros, o movimento abolicionista ganhava cada
vez mais força. Os poemas de Castro Alves, os artigos de José do
Patrocínio, Luiz Gama e André Rebouças e os livros de Joaquim
Nabuco sensibilizavam a população. O abolicionismo era assunto
de quase todas as conversas. Para dar maior impulso ao
movimento, muitos clubes e associações foram criados. Eram
locais onde os abolicionistas se reuniam, discutiam e planejavam
ações para ampliar o movimento. Os nomes eram vários: Centro
Abolicionista da Escola Política, Clube Abolicionista dos
Empregados do Comércio, Sociedade Brasileira contra a
Escravidão. Não apenas as cidades estavam agitadas pela onda
abolicionista.

Em muitas fazendas os escravos também davam mostras de querer


acabar com os grilhões da escravidão. As manifestações de
protesto tornaram-se mais frequentes. Estimulados por
intelectuais abolicionistas, os escravos fugiam ou queimavam as
plantações. Os políticos perceberam que os tempos estavam
mudando. A sociedade dizia não à escravidão. Os fazendeiros
escravistas sentiam-se pressionados. Abolição, abolição, é o
coro da nação. Diante da pressão abolicionista, em 1871 o
Parlamento aprovou a Lei do Ventre Livre. Essa lei estabelecia
que qualquer filho de escravo que nascesse a partir daquela data
seria considerado livre. Outros parágrafos, no entanto,
obrigavam o " favorecido " a prestar serviços gratuitamente até
os 21 anos. Essa lei não satisfez os abolicionistas. Eles
achavam absurdo que filhos de escravos fossem obrigados a
trabalhar até aos 21 anos para os fazendeiros a fim de lhes
pagar os gastos com a criação. Os abolicionistas não queriam
meias medidas.

Por volta de 1880, a agitação nas cidades e nas fazendas assumiu


grandes proporções. Os cafeicultores paulistas se manifestavam
publicamente pelo fim da escravidão. O Exército se recusara a
perseguir escravos fugidos. Os tipógrafos negavam-se a imprimir
qualquer material contra a abolição. Em 1884 os presidentes das
províncias do Ceará e do Amazonas deram uma demonstração de
coragem e aboliram a escravidão nas suas províncias. Diante do
aumento do coro abolicionista, em 1885 o Parlamento aprovou uma
nova Lei: a Lei dos Sexagenários. Essa lei determinava que todos
os escravos com mais de 60 anos de idade eram considerados
livres. A título de indenização, porém, o idoso deveria
trabalhar gratuitamente mais três anos. Essa lei agradou
bastante os fazendeiros, pois, ficavam livres dos escravos
improdutivos e, portanto, da obrigação de dar alimento e moradia
a eles. Quem não gostou foram os abolicionistas. Diziam eles que
a lei era ridícula e exigiam o fim imediato da escravidão. Os
fazendeiros escravistas estavam acuados.

Nas cidades, a opinião pública chamava-os de desumanos e de


ladrões. Seus filhos muitas vezes eram abolicionistas. Esses
fazendeiros sabiam que a escravidão estava com os dias contados,
mas queriam indenização pelo capital investido na compra dos
escravos. A Lei Áurea. Pela terceira vez a Princesa Isabel
assumiria a regência do império, quando da viagem para
tratamento de saúde do Imperador D. Pedro II, em 1887. Nesta
época o gabinete encontrava-se em mãos do conservador barão de
Cotegipe, que era inteiramente contrário a abolição total da
escravatura. Alegava ele que o Brasil teria uma séria crise
econômica, principalmente na agricultura, caso não mais
existisse o braço servil. Defendia este político a abolição
gradativa, através de medidas que fossem libertando aos poucos
os escravos; neste sentido já havia anteriormente votado uma lei
paliativa, a dos sexagenários, e tentava a qualquer custo
impedir a abolição total. D. Isabel, desejando angariar a
simpatia do povo, abraçara a causa abolicionista. Cotegipe, a 7
de março de 1888, demitiu-se em razão da exigência da Princesa
Isabel de que fosse exonerado o chefe de polícia Coelho Bastos,
promotor de inúmeras arbitrariedades contra escravos em sua
gestão. Coube então a João Alfredo Correia de Oliveira a tarefa
de organizar um novo ministério. O último gabinete conservador,
conhecido por ministério da abolição, instalar-se-ia a 18 de
março de 1888. Dois meses depois João Alfredo apresenta para
discussão na Câmara dos Deputados um projeto visando a abolição
total da escravatura no Brasil.

Pressionada pelo enorme clamor popular, a imensa maioria dos


políticos não se dispôs a discutir a questão das indenizações e
apesar da pressão sofrida, a Câmara e o Senado, em sua grande
maioria, aprovou o projeto de lei que libertaria os escravos e
no dia 13 de maio de 1888 a Princesa Isabel assinava a lei que
punha fim à escravidão. Essa lei recebeu o nome de Lei Áurea e
continha apenas dois artigos: Art. 1º - É declarada extinta,
desde a data desta lei, a escravidão no Brasil. Art. 2º -
Revogam-se as disposições em contrário. Sem dúvida alguma, foi a
abolição da escravatura a última e a mais grave das questões que
ocasionaram a Proclamação da República. Com a promulgação da Lei
Áurea, o governo imperial perdia o seu maior sustentáculo, o
apoio dos grandes proprietários rurais.

Da condição de escravistas passaram repentinamente a uma


situação de desespero, vendo suas plantações abandonadas pelos
ex-escravos e ao mesmo tempo perdendo todas as suas riquezas.
Não foi sem motivo que totalidade destes proprietários passaram
para o lado do movimento republicano, deixando o império sem o
apoio do mais forte grupo que o sustentava. A grande crise
anunciada pelos escravocratas não se fez sentir como estes
apregoavam, pois que a organização da produção e a distribuição
de rendas não sofreram mudanças profundas. O que se extinguiu de
fato foi uma das instituições básicas do sistema político até
então dominante, não obstante já ser notória a sua
improdutividade, que compunha uma das origens do entorpecimento
econômico do país. O brutal sistema da escravidão não dava lugar
ao trabalho livre de que o Brasil tanto necessitava, daí a
condição que impossibilitava a imigração estrangeira até os dias
da abolição.

Devemos notar, sobretudo, que a partir de 1865 somente os


senhores de escravos defendiam este sistema, que não encontrava
eco em nenhuma outra camada social, nem facção política. Nos
anos que antecederam a abolição, a escravatura não só encontrava
moralmente condenada, como também já se desconfiava de sua real
importância no setor econômico. Se por um lado os senhores do
engenho do nordeste e os proprietários de fazendas de café no
Rio de Janeiro, Minas Gerais e São Paulo, tinham no sistema da
mão-de-obra escrava a segurança e a crença de que estes
representavam a riqueza e julgavam que com a abolição deste
sistema acarretaria um verdadeiro desastre econômico para a
classe de que faziam parte.

Existia uma outra corrente que concebia o fato de modo oposto,


admitindo a hipótese de que com a extinção da escravatura já não
haveria necessidade do emprego do capital imobilizado na compra
do escravo. Um ordenado correspondente às despesas de manutenção
de um escravo poderia retê-lo e sustentá-lo no trabalho sem
necessidade de investimento inicial. Nas regiões de minas um
fator econômico já havia concorrido para a alforria dos
escravos: inúmeros veios auríferos eram de valor efêmero e,
comumente, o proprietário via-se na contingência de sustentar
seus escravos sem um resultado realmente compensador. E pelo
fato de ser, nas zonas de mineração, os alimentos muito caros,
era mais econômico libertar os escravos que sustentá-los. Por
outro lado, e principalmente como consequência direta da
abolição, muito difícil seria a situação do ex-escravo e seus
descendentes na sociedade brasileira. A maioria era analfabeta.
Portanto, sem condições de conseguir trabalhos mais
qualificados.

As áreas agrícolas, que estavam precisando de mão-de-obra,


preferiam os imigrantes europeus, cuja vinda para o país era
incentivada oficialmente. Nas cidades também havia desemprego,
pois muitos antigos proprietários de escravos não tinham como
pagar salários. Muitos intelectuais do período discutiam qual a
melhor forma de integrar os ex-escravos à sociedade. Os
positivistas afirmavam que cabia ao governo a tarefa de dar
educação, preparo técnico e terra para eles. Diziam que se isso
fosse feito, em pouco tempo eles se tornariam cidadãos
produtivos e integrados à sociedade. Entretanto, e infelizmente,
nada disso foi feito. O governo não tomou nenhuma medida para
ajudar a integração do negro. Quando foi decretada a abolição,
em 1888, a população escrava beirava os 800 mil. Isso
correspondia a um décimo da população brasileira do período.

É curioso notar que nesse mesmo ano entraram nada menos que 133
mil imigrantes no país. Por motivos plenamente entendíveis,
grande parte dos escravos das áreas rurais abandonaram as
fazendas onde moravam. Afinal, elas lembravam algo que eles
queriam apagar das suas vidas para sempre. Queriam sentir-se o
mais longe possível da senzala e do tronco. Sem terras e sem
dinheiro, os ex-escravos procuraram sobreviver nas cidades. Sem
emprego, sem instrução, foram se amontoar nas favelas e viver da
caridade pública, de biscates ou da criminalidade. A sociedade
brasileira, que por mais de três séculos viveu da exploração do
trabalho escravo, agora virava as costas para ele. A
marginalização dos ex-escravos contribuiu para aumentar o
preconceito racial. Durante todo o tempo da escravidão, os
escravos eram vistos e tratados como inferiores. Por serem
livres, explorar e oprimir os negros, os brancos tinham tudo
para se considerar superiores. Quando a abolição decretou a
igualdade jurídica entre negros e brancos, nada foi feito para
construir essa igualdade social. Nenhuma oportunidade foi dada
aos negros para demonstrarem o seu valor. Dessa forma, a
marginalização que a sociedade lhe impôs após a abolição só
serviu para consolidar na consciência dos brancos a idéia de que
os negros eram mesmo inferiores. Infelizmente o preconceito
racial tem sobrevivido até os nossos dias. Por isso muitos
afirmam que a abolição ainda está para ser feita.

Finalizando, todos os grandes abolicionistas foram maçons do


Grande Oriente, desde Feijó, em 1834 até José do Patrocínio.
Castro Alves, o cantor dos escravos, foi maçom, ao lado de Rui
Barbosa, em São Paulo. O movimento abolicionista apresenta, em
seu meio século de lutas, os seguintes marcos luminosos:
1- Padre Antonio Feijó, em 1831;
2- Lei Eusébio de Queiróz, de 4 de setembro de 1850, extinguindo
o tráfico de escravos;
3- Projeto maçônico de Rui Barbosa, na Loja " América ", de São
Paulo, em 4 de abril de 1870;
4- Lei Visconde do Rio Branco, de 28 de setembro de 1871, Lei do
Ventre Livre;
5- Fundação da Confederação Abolicionista, no Rio de Janeiro, em
1883;
6- O Ceará e o Amazonas libertam os escravos de seus territórios
em 1884;
7- Lei Saraiva-Cotegipe, de 28 de setembro de 1885, Lei do
Sexagenário;
8- O Clube Militar

Você também pode gostar