Bioquímica Cervejeira: Me. Maycon Vinícius de Senna Ribeiro
Bioquímica Cervejeira: Me. Maycon Vinícius de Senna Ribeiro
Bioquímica Cervejeira: Me. Maycon Vinícius de Senna Ribeiro
Bioquímica
Cervejeira
ME. MAYCON VINÍCIUS DE SENNA RIBEIRO
GRADUAÇÃO
Bioquímica
Cervejeira
Me. Maycon Vinícius de Senna Ribeiro
DIREÇÃO UNICESUMAR
Reitor Wilson de Matos Silva, Vice-Reitor e
Pró-Reitor de Administração Wilson de Matos
Silva Filho, Pró-Reitor Executivo de EAD William
Victor Kendrick de Matos Silva, Pró-Reitor de
Ensino de EAD Janes Fidélis Tomelin, Presidente
da Mantenedora Cláudio Ferdinandi.
C397 CENTRO UNIVERSITÁRIO DE MARINGÁ. Núcleo de Educação a
Distância; RIBEIRO, Maycon.
NEAD - NÚCLEO DE EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA
Bioquímica Cervejeira. Maycon Vinícius de Senna Ribeiro.
Maringá-PR.: Cesumar, 2020.
Diretoria Executiva Chrystiano Mincoff, James
168 p. Prestes e Tiago Stachon; Diretoria de Graduação
“Graduação - Híbridos”. e Pós-graduação Kátia Coelho; Diretoria de
1. Bioquímica. 2. Cervejeira. 3. Industial 4. EaD. I. Título. Permanência Leonardo Spaine; Diretoria de
Design Educacional Débora Leite;Fukushima;
ISBN 978-65-5615-016-1 Gerência de Projetos Especiais Daniel F. Hey;
CDD - 22 ed. 663.4
CIP - NBR 12899 - AACR/2 Gerência de Produção de Conteúdos Diogo
Ribeiro Garcia; Gerência de Curadoria
Carolina Abdalla Normann de Freitas;
Supervisão de Projetos Especiais Yasminn
Talyta Tavares Zagonel; Projeto
Gráfico José Jhonny Coelho e Thayla
Guimarães Cripaldi; Fotos Shutterstock
13
Macromoléculas
Cervejeiras
45
Enzimas Cervejeiras
83
Processos de
Obtenção de Energia
pelos Organismos
111
Biotecnologia
Cervejeira
143
19 Transporte passivo na célula
do fermento cervejeiro
93 Cinética Enzimática
Utilize o aplicativo
Unicesumar Experience
para visualizar a
Realidade Aumentada.
Me. Maycon Vinícius de Senna Ribeiro
Introdução à
Bioquímica Cervejeira
PLANO DE ESTUDOS
OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
• Conhecer a unidade básica da vida, as células envolvidas • Compreender a composição das biomoléculas cervejeiras.
nos processos cervejeiros. • Entender como a água influenciou no surgimento da vida
• Analisar as características da estrutura celular e sua in- e nos processos cervejeiros.
fluência nos processos cervejeiros. • Introduzir os conceitos da bioquímica cervejeira.
A Vida e
a Cerveja
UNIDADE 1 15
Em temperaturas maiores, a velocidade de reações químicas
que acontecem pelos seres vivos é muito maior. Alguns, inclusive,
se multiplicam muito mais rapidamente em altas temperaturas.
Por isso, em temperaturas maiores, sem os controles que possuí-
mos hoje, as cervejas eram habitadas por leveduras e bactérias, em
uma guerra bioquímica pelos nutrientes do mosto cervejeiro. As
bactérias, apesar de mais poderosas no quesito de se multiplicar,
são seres vivos menos complexos que as leveduras, forma que são
chamados os nossos fermentos. No entanto, todas elas têm algo em
comum: são formadas por uma unidade chamada de célula, que
nada mais é do que um conjunto de biomoléculas delimitado por
uma membrana, caracterizando um organismo unicelular, ou seja,
ser vivo de uma única célula (Figura 2).
UNIDADE 1 17
Células
Cervejeiras
Complexo
Vacúolo
de Golgi
Grânulo de lipídio
UNIDADE 1 19
Por vezes, alguns açúcares maiores e outras biomoléculas do mosto cervejeiro precisam de uma
avaliação mais criteriosa por parte das células. As dextrinas, por exemplo, que são os açúcares com-
plexos do mosto cervejeiro não são utilizados pelas leveduras. Seus sensores reconhecem que ela não
consegue quebrá-los. Por outro lado, a maltose pode ser quebrada. Nesse caso, os sensores da mem-
brana reconhecem que o açúcar pode ser quebrado, realizando o transporte interno da molécula para
posterior quebra. A esse tipo de transporte, denominados de transporte ativo.
Núcleo Cápsula
Ribossomos
Ribossomo
Complexo DNA
de Golgi
Parede
Retículo celular
endoplasmático
Membrana
Membrana plasmática
plasmática
Mitocôndria
Citoplasma Citoplasma
Lisossomo
Muitas vezes, em cervejas muito alcoólicas, observamos as chamadas “lágrimas” ou “pernas” nas
taças e copos. Esse aspecto é relacionado a um composto chamado de glicerol e é produzido quando
a levedura sente que está perdendo água para o meio ambiente, principalmente em mostos de alta
gravidade, com elevadas concentrações de açúcar. A produção de glicerol é uma forma de proteger a
membrana plasmática do rompimento celular. Para saber mais acesse: https://blog.famigliavalduga.
com.br/lagrimas-do-vinho-saiba-o-que-sao-e-como-identifica-las.
Fonte: adaptado de Beronia (2017, on-line)1.
Sim, a célula possui um script. Quando ela vai se duplicar, uma biomolécula muito importante entra
em cena: o DNA. Este é uma molécula carregadora de informação, mais especificamente, o DNA car-
rega todas as informações da célula. É conhecido como ácido desoxirribonucleico e é formado pelos
grupos fosfato, desoxirribose e bases nitrogenadas. Em sua totalidade, ele é uma fita dupla, formado
por repetições desses conjuntos. Entretanto, as bases nitrogenadas se alternam, formando sequências
diferentes por toda a biomolécula. Essas sequências diferentes são o coração da informação. Assim
como os computadores possuem sequências de 1 e 0, o DNA possui sequências em bases nitrogenadas,
T, G, C e A (Figura 7) (CHAUDHURI, 2015).
UNIDADE 1 21
ESTRUTURA DO DNA
Ligação de hidrogênio
Timina Adenina
Citosina Guanina
Desoxirribose
Base Base
nitrogenada nitrogenada
Grupo fosfato
Já percebeu a vasta quantidade de fermentos disponíveis para produzir cervejas? Cada um deles com
um comportamento diferente, uns produzindo mais aromas, outros com maior neutralidade. Isso
acontece porque o DNA desses fermentos é diferente. Cada célula segue o script do seu DNA para
sobreviver, e nele está gravado alguns comportamentos que observamos na produção de nossa cer-
veja. Os fermentos de trigo, por exemplo, têm a capacidade de produzir aroma de banana. Para saber
mais, acesse: https://www.hominilupulo.com.br/cervejas-caseiras/guia-basico/escolher-fermento/.
Fonte: adaptado de White e Zainasheff (2010).
UNIDADE 1 23
O que Há no
Mosto Cervejeiro
AMIDO
UNIDADE 1 25
Os compostos formados majoritariamente por
carbono são chamados de compostos orgânicos.
A casca do malte é formada por celuloses. As As biomoléculas são compostos orgânicos, porém
celuloses nada mais são do que açúcares arran- de complexidade elevada, sendo formados por
jados e ligados de forma diferente do amido do grupos diversos. O aumento da complexidade dos
interior do grão. Uma única diferença de liga- compostos orgânicos cria moléculas maiores, com
ção permite que um tipo de açúcar se dissolva e maior número de átomos e com estrutura tridi-
seja quebrado, enquanto o outro permanece no mensional. Isso possibilita que uma molécula de-
mosto durante todo o processo de mosturação. sempenhe funções específicas. A quebra do amido
Tudo isso tem como objetivo proteger o grão da em açúcares menores só é possível devido a uma
umidade, do calor e do frio durante o plantio. macromolécula que se encaixa aos filamentos do
Para saber mais, acesse: http://cti.ufpel.edu.br/ amido e rompe as ligações (Figura 10). Essa ma-
siepe/arquivos/2014/CA_01770.pdf. cromolécula é chamada de enzima, e por ser tão
Fonte: adaptado de Study ([2020], on-line)2. grande e complexa cria um espaço com o único
objetivo de quebrar ligações (MALCATA, 2020).
UNIDADE 1 27
A água é uma molécula pequena, polar e com características específicas para interagir com outras
moléculas, por exemplo sua angulação e capacidade de dissociação natural (Figura 11). A diferença
de eletronegatividade entre os átomos de hidrogênio e do oxigênio criam um ângulo de 104,5º, com
uma nuvem eletrônica no ângulo maior, responsável por deslocar um dipolo negativo para a nuvem
(CK12, [2020], on-line)3.
O arranjo espacial e a polaridade da molécula permitem que a água seja líquida em temperaturas
medianas, o que aumenta sua interação com diversos componentes nas temperaturas médias do nos-
so planeta. Além disso, a água no estado sólido possui menor densidade em relação ao estado líquido,
o que permite deslocamento de componentes conforme a temperatura da água varia. Essa capacidade
permitiu que nutrientes da superfície dos oceanos fossem levados ao fundo, garantindo a formação
da vida em condições submersas.
O processo de fervura na produção cervejeira permite que biomoléculas oriundas do malte e do lúpulo
se agreguem e precipitem (trub), devido à energia transferida para a água. Previamente ao processo,
essas moléculas estão dissolvidas em água, devido à grande capacidade da molécula de água em
solubilizar substâncias. Para saber mais, acesse: https://www.youtube.com/watch?v=G21aF7OsEZM.
Fonte: adaptado de Palmer (2017).
As principais interações da molécula de água com outros componentes são as interações hidrofílicas e
as interações hidrofóbicas. A primeira se refere a interações maiores, com as cargas positivas e negativas
parciais da água interagindo com as opostas de determinado composto. Podemos utilizar como exemplo
as interações dos sais com a água. Os sais se dissociam na água, formando íons positivos e negativos. A
região positiva da molécula de água se liga ao íon negativo, enquanto a região negativa da água se liga
ao íon positivo. Essas interações permitem que substâncias polares se dissolvam facilmente na água.
UNIDADE 1 29
δ-
δ+ δ+
O
H H
H H
O δ+ δ+
δ+ δ+
H H
H δ- H δ+ δ+
O δ- Na+ δ- O
δ- O Cl- O δ-
δ+
δ+
H H
H δ- H δ+ δ+
δ+ δ+ H H
O
O
H H
δ+ δ+ δ-
Figura 13 - Estrutura do cloreto de sódio, quando dissociado em água, formando íons
Fonte: adaptada de Nelson e Cox (2014).
As interações hidrofóbicas se referem a substâncias com baixa polaridade, por exemplo, os componen-
tes da parede celular. A água interage muito mais fracamente com essas substâncias do que as polares.
Por esse motivo, biomoléculas apolares são de interesse para a vida, pois permitem a transferência de
componentes, regulando a força das interações. Elas garantem a integridade da membrana celular e a
movimentação interna dos nutrientes na célula.
Outro fenômeno comum do meio cervejeiro é observar como o malte se encharca ao entrar em con-
tato com a água. Ao adicionar o malte seco na panela de mostura, observa-se o rápido aumento do
volume do grão pela água que entra. Essa capacidade de absorver água está diretamente relacionada
a um conceito chamado de pressão osmótica.
A pressão osmótica é definida como a pressão exercida pelo solvente, do meio menos concentrado
para o mais concentrado, através de uma membrana semipermeável. Ela demonstra que os dois siste-
mas tendem a equilibrar suas concentrações por meio do fluxo do solvente, que atravessa a membrana
(Figura 15). O malte está com uma concentração alta de amido, proteínas e outros constituintes, en-
quanto a água de mostura está com baixo ou quase nada desses componentes no início do processo.
A água naturalmente tende a atravessar a membrana das células, com o objetivo de solubilizar os
componentes do malte.
UNIDADE 1 31
A osmose não é totalmente controlada pela célula.
Como a molécula de água é pequena, ela atravessa
a membrana de forma passiva. Por isso, se uma
célula se situa em um meio muito concentrado de
sais, as células murcham, perdendo água para o
meio. Se estiverem em um meio muito pouco con-
centrado, a água entra nas células, inchando-as. Se
as condições não forem favoráveis, esses processos
podem, inclusive, causar morte celular. Por isso
sempre devemos estar atentos às condições de
fermentação que não exerçam pressões osmóticas
altas para as células de leveduras. Por mais que al-
gumas espécies tenham capacidade de se proteger
dos estresses osmóticos, alguns choques podem
ser fatais, prejudicando a fermentação por baixo
número de células viáveis.
UNIDADE 1 33
Figura 16 - Nativos de Uganda preparando e bebendo cervejas antigas
Malteação
Primeiro processo de produção de cerveja, a malteação é a transformação dos cereais em malte, por
meio da germinação controlada e posterior secagem (Figura 17). O principal malte é o malte de ce-
vada, devido às características únicas da cevada, mas também pode ser obtido de grãos, como sorgo,
milho, trigo e outros. O processo de malteação é necessário por diversos motivos, porém devemos nos
atentar a alguns descritos a seguir:
Mosturação
UNIDADE 1 35
Fervura
Fermentação
O mosto resfriado recebe as leveduras e se inicia sendo intermediada por diversas reações no in-
o processo de fermentação. Aqui, a temperatura é terior das células de leveduras, podendo conferir
controlada de acordo com o estilo de cerveja a ser subprodutos que impactam sensorialmente na
produzido e o fermento realiza a transformação cerveja (Figura 20). A genética do fermento, as
bioquímica do mosto em cerveja. As principais características do mosto resfriado e a temperatura
reações que ocorrem são a conversão de açúcares de fermentação são os principais atributos que
fermentescíveis em gás carbônico e álcool etílico, impactam no processo fermentativo.
Quanto conhecimento assimilamos até aqui! Percebemos que produzir cervejas está muito mais
relacionado à bioquímica do que imaginávamos. Essas bases nos darão sustentação para todo o co-
nhecimento que ainda está por vir. Do processo de produção do malte até a seleção de linhagens de
leveduras, as bases da vida estão totalmente presentes, assim como a influência da água. Seguimos,
então, na caminhada do aprendizado.
UNIDADE 1 37
Você pode utilizar seu diário de bordo para a resolução.
1. A unidade básica dos seres vivos é a célula. Qual é a composição de sua camada?
a) Unicamente proteínas de alto peso molecular.
b) Uma mistura de ácidos graxos e RNA.
c) Unicamente de proteínas de baixo peso molecular.
d) Camada bilipídica.
e) Camada biproteica.
38
3. A produção de cervejas envolve quatro processos básicos: mosturação, fervura,
fermentação e maturação. Sobre os processos de produção das cervejas, assinale
Verdadeiro (V) ou Falso (F):
( ) Na malteação, o grão germina e se torna uma nova planta, para só assim uti-
lizarmos a planta para extrair o líquido cervejeiro.
( ) Na mosturação, as enzimas presentes no malte atuam quebrando moléculas
grandes em menores.
( ) Na maturação, ocorre a incorporação de algumas substâncias geradas pela
própria levedura.
4. Descreva sucintamente por que a célula das bactérias é diferente das leveduras.
39
LIVRO
40
WEB
Brewer’s Association
O Brewer’s Association é a maior associação de cervejeiros dos Estados Unidos,
inclusive sendo responsável pela elaboração de um dos mais utilizados guias de
estilos no mundo. O site da BAs apresenta notícias do meio cervejeiro, mapas
interativos e diversos conteúdos gratuitos.
Para acessar, use seu leitor de QR Code.
WEB
41
CHAUDHURI, K. Microbial Genetics. The Energy and Resources Institute (e-Book), 2015.
DANIELS, R. Designing Great Beers: The Ultimate Guide to Brewing Classic Beer Styles. Brewer’s Publica-
tions, 1998.
HIERONYMUS, S. For the Love of Hops: The Practical Guide to Aroma, Bitterness and the Culture of Hops.
Boulder: Brewer’s Publications, 2012.
HOHMANN, S.; MAGER, W. H. Yeast Stress Responses. New York: Springer, 2010.
MALCATA, F. X. Mathematics or Enzyme Reaction Kinetics and Reactor Performance. Vol. 2. 1. ed.
Wiley-Blackwell, 2020.
MALLETT, J. Malt: A Practical Guide from Field to Brewhouse, Boulder: Brewer’s Publications, 2014.
NELSON, D. L.; COX, M. M. Princípios de bioquímica de Lehninger. 6. ed. Porto Alegre: Artmed, 2014.
PALMER, J. How to Brew: Everything You Need to Know to Brew Great Beer Every Time. 4th Edition. Boulder:
Brewer’s Publications, 2017.
WHITE, C.; ZAINASHEFF, J. Yeast: The Practical Guide to Beer Fermentation. Boulder: Brewer’s Publications,
2010.
REFERÊNCIAS ON-LINE
Em: https://www.ck12.org/biology/structure-and-properties-of-water/lesson/Biochemical-Properties-of-
3
Em: https://edisciplinas.usp.br/pluginfile.php/1202527/mod_resource/content/1/Aula13BioqAvan_
4
42
1. D.
2. B.
3. D.
4. As bactérias são microrganismos procariontes, ou seja, não possuem um núcleo definido que guarde o
material genético. Seu DNA está inserido no citoplasma. As leveduras são microrganismos eucariontes, ou
seja, possuem um núcleo definido, que guarda o material genético.
43
44
Me. Maycon Vinícius de Senna Ribeiro
Macromoléculas
Cervejeiras
PLANO DE ESTUDOS
Proteínas Carboidratos
OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
46 Macromoléculas Cervejeiras
Aminoácidos
A palavra aminoácido pode soar um tanto quanto estranha para você, porém fica mais fácil compreen-
der o que é um aminoácido quando falamos em proteínas. De senso comum, sabemos que as proteínas
são moléculas presentes em alimentos como as carnes e alguns grãos e fazem parte dos músculos nos
dando força. Mais à frente, falaremos sobre proteínas, entretanto o que devemos compreender aqui
é que os aminoácidos são os blocos de construção das proteínas. Pequenas unidades que, juntas, tor-
nam-se proteínas. Para conhecer o todo, devemos conhecer suas parcelas e, principalmente, a função
que desempenham.
O malte por si só possui uma quantidade de proteínas, que serão conferidas ao mosto, durante o
processo de mosturação. Essas proteínas serão quebradas pela ação de enzimas e, assim, seus blocos de
construção estarão mais presentes no mosto cervejeiro. Quando as proteínas se quebram, elas podem
se tornar aminoácidos livres ou o que chamamos de peptídeos, que são alguns aminoácidos ligados,
mas que não são uma proteína.
Se as proteínas são feitas de aminoácidos, então do que são feitos aminoácidos? Eles possuem esse
nome, pois são ácidos orgânicos ligados a um grupo amina. O que difere um aminoácido de outro é a
ligação com o radical, que é variável.
UNIDADE 2 47
Radical apenas utilizar aminoácidos livres. Um mosto
R cervejeiro sem aminoácidos pode trazer sérios
problemas de fermentação, como odores e sabores
O desagradáveis, fermentação lenta e travada, e até
H
N C C turbidez indesejada pela quantidade de proteínas
inteiras. Por isso, é importante que o cervejeiro
H OH siga uma rampa de proteases, enzimas responsá-
H veis pela quebra das proteínas.
Grupo amino Grupo carboxílico Desde a descoberta dos aminoácidos até o
(ácido) descobrimento do último e vigésimo – treonina
– passaram-se mais de 130 anos. Os aminoácidos,
Figura 2 - Fórmula genérica dos aminoácidos
hoje, são compostos por 20 unidades diferentes,
A maioria dos seres vivos utiliza os aminoácidos com seu radical sendo o ponto de mudança. Re-
para formar proteínas e, assim, auxiliar o orga- cebem seus nomes como sendo uma referência à
nismo em todas as suas tarefas. Todos necessitam sua fonte: a asparagina foi isolada primeiramente
produzir proteínas, porém nem todos conseguem do aspargo, por isso recebeu esse nome (BELLÉ;
absorver a proteína (como nós fazemos), quebrá- SANDRI, 2014). Perceba, caro(a) aluno(a), que
-la internamente e produzir proteínas à própria todas as proteínas e peptídeos são compostos por
maneira. É por esse motivo que o cervejeiro deve apenas 20 aminoácidos. No entanto, imagine a in-
manter aminoácidos no seu mosto. As leveduras finidade de combinações que 20 unidades podem
não conseguem quebrar as proteínas do mosto, gerar, produzindo proteínas diferentes.
O quinto e último gosto básico, chamado de umami, nada mais é do que a percepção humana
para aminoácidos. Geralmente, quando é utilizado ácido glutâmico nos alimentos, ou é reali-
zado algum tipo de cocção em carnes e alimentos proteicos, o umami se torna muito evidente.
Fonte: Wash (2019, on-line)1.
48 Macromoléculas Cervejeiras
H
O H
C C N
O H H H
HO H O H H
H CH2 C C N O H
O H C C N
CH2 HO H H C C N
C C N CH2 HO CH2 HO H
HO H CH2 CH2
CH3 NH C C
H2N O HO O SH
C
H2N NH
Alanina Arginina Asparagina Ácido aspártico Cisteina
O H H H
O H H
C C N C C N O H
HO H H
CH2 O O O H HO H C C N
CH2
C C N H HO H
CH2 H2N OH N C
CH
HO H
NH2 H H C H3C CH2
C
HO O N C H CH3
Ácido glutâmico Glutamina Glicina Histidina Isoleucina
H H
O H O H H
H C C N O H
O H C C N O
HO H C C N
C C N CH2 HO H H
CH2 HO H
HO H CH2 CH2
CH2 CH2 OH
CH2
CH S NH
CH2
H3C CH3
NH2 CH3
Leucina Lisina Metionina Fenilanina Prolina
H H
O H O H
H H C C N H
O H O H C C N O H
HO H HO H
C C N C C N CH2 CH2 C C N
HO H HO H HO H
CH2 CH CH
OH HO CH3 H3C CH3
HN
OH
Serina Treonina Triptofano Tirosina Valina
Peptídeos
Quando os aminoácidos se ligam, formam-se peptídeos. Estes são cadeias de aminoácidos, com ta-
manhos variados, sem função específica. Quando um peptídeo começa a exercer alguma função, é
denominado proteína. Eles formados pelo que chamamos de ligações peptídicas. Os aminoácidos se
unem pela ligação do grupo amino de um deles com o grupo carboxílico (ou grupo ácido) de outro,
liberando uma água como produto final. Dessa maneira, os organismos vivos conseguem desempenhar
diversas funções, unindo aminoácidos para formar peptídeos e proteínas (BARACAT-PEREIRA, 2014).
UNIDADE 2 49
As proteases quebram as proteínas do malte, gerando aminoácidos
e peptídeos menores. Como vimos anteriormente, os aminoácidos
são nutrientes para a levedura, mas qual a função dos peptídeos no
seu mosto?
AMINOÁCIDO 1 AMINOÁCIDO 2
PEPTÍDEO
ÁGUA
Ligação peptídica
50 Macromoléculas Cervejeiras
Proteínas
UNIDADE 2 51
Enzimas
As enzimas são uma classe de proteínas com uma importante função: catalisar reações biológicas. E afinal,
o que é catalisar? Veremos a seguir.
Os organismos biológicos necessitam desempenhar reações químicas para produzirem energia, seja
para manutenção ou movimento. Essa energia vem dos alimentos, seja qual for. Para transformar esse
alimento em energia, são necessárias diversas reações químicas de quebra de moléculas, e para isso as
enzimas entram em cena: aceleram as reações biológicas, tornando-as possíveis em poucos segundos
(MALCATA, 2020).
Para que uma mistura de água e malte se torne um mosto cervejeiro, muitas enzimas precisam que-
brar as moléculas de amido, de proteínas do malte, entre outros compostos e, assim, liberar moléculas
menores, as quais podem ser absorvidas pelas leveduras.
O amido é uma imensa molécula de açúcares que, com a ação das enzimas amilolíticas, fornece ao
mosto dextrinas (cadeias complexas de açúcares que dão corpo à nossa cerveja) e açúcares fermen-
tescíveis (pequenos aglomerados de maltose, glicose e maltotriose, que serão transformados em álcool
pelas leveduras). Além disso, vimos, anteriormente, a importância da enzima protease, que quebra as
proteínas do malte liberando peptídeos e aminoácidos.
Devemos sempre lembrar que as enzimas são proteínas responsáveis pela catálise das reações bioló-
gicas. Por esse motivo, as proteases são proteínas responsáveis por quebrar outras proteínas. Quando
se fala em conteúdo proteico do malte, fala-se também em proteínas e em enzimas importantes.
52 Macromoléculas Cervejeiras
Uma reação química ocorre quando se tem três situações favoráveis:
• Deve haver uma concentração de substratos razoável no meio.
• A reação deve ser termodinamicamente possível.
• A energia de ativação deve ser alcançada.
Quando nos atentamos para o terceiro item, percebemos que o sistema deve conter energia suficiente
para que a reação ocorra. Vamos exemplificar no nosso dia a dia. O cervejeiro pretende brassar uma
cerveja no fim de semana e, para isso, arruma seu fogareiro, conectando a um botijão de gás. Para
dar a ignição, ele acende um fósforo e abre a válvula. Perceba, caro(a) aluno(a), a ignição é a energia
necessária para que a reação do gás com o oxigênio do ar se inicie. Sem o fogo (energia na forma de
calor), a reação não ocorre tão facilmente. Dizemos, então, que a energia de ativação da reação gás e
oxigênio é fornecida com uma ignição, uma chama inicial.
Sem enzima
Energia fornecida
Energia fornecida
Energia de
ativação
Com enzima
Energia de
ativação
Reagentes Reagentes
Energia liberada
Energia liberada
Produtos Produtos
Progresso de uma reação sem enzimas Progresso de uma reação com enzimas
Figura 6 - Esquema de diminuição da energia de ativação da reação química sem e com enzimas
Com as enzimas, a energia de ativação das reações é reduzida, possibilitando que a reação ocorra
sem muita energia inicial. Afinal, seria muito difícil para uma célula controlar uma ignição, por isso
as reações biológicas podem ocorrer em temperaturas amenas. As enzimas se ligam aos substratos
(ou reagentes), ativam determinadas regiões responsáveis pela diminuição da energia de ativação,
porém sem a modificação da enzima. Ao final da reação, a enzima não é consumida ou modificada,
ela está pronta para participar de outra reação. Os mecanismos mais conhecidos e aceitos são o do
sistema chave-fechadura e de encaixe induzido, para enzimas. As enzimas são específicas, ligam-se ao
substrato ao qual foram criadas para atuar, com uma imensa seletividade. Por exemplo, as proteases só
podem quebrar proteínas, não conseguirão quebrar moléculas de açúcar devido à sua especificidade
(MALCATA, 2020).
UNIDADE 2 53
Como compreendemos, as en-
zimas são muito específicas. As
amilases só atuam quebrando
Complexo
cadeias de amido, as glucanases enzima-substrato
só atuam quebrando glucanos
e assim por diante. E para que
Substratos
isso ocorra, as enzimas atuam
em faixas específicas de tem-
peratura e pH, pois mínimas
variações no ambiente podem Produtos Complexo
Enzima enzima-produto
danificar regiões importantes
das enzimas.
Na mosturação, cada pata-
mar de temperatura favorece
uma enzima específica, mes-
mo que outras estejam atuan- Enzima
do simultaneamente, porém
de maneira mais lenta. Entre-
Figura 7 - Esquema chave-fechadura para a atuação das enzimas
tanto, quando as temperaturas
aumentam muito, pode ocorrer a desnaturação da enzima, ou seja, irreversivelmente sua estrutura
se rompe, danifica-se, e a enzima passa apenas a ser uma proteína inativa em suspensão. Na fervura,
muitas proteínas se coagulam pela desnaturação pelo calor, sendo retiradas por decantação (KUNZE,
2004). No entanto, as enzimas são apenas um tipo de proteína e estão por toda a parte, em alimentos,
produtos de limpeza, entre outros.
As proteínas podem ter outras funções além de serem enzimas. Muitas proteínas são fundamentais para
a manutenção da vida, por exemplo, as hemoglobinas presentes no nosso sangue e a clorofila nas plan-
tas. Sem elas, não poderíamos viver da forma como vivemos. Elas têm a importante função de auxiliar
na troca gasosa para nós respirarmos e para as plantas realizarem a fotossíntese. Por isso, aluno(a), as
proteínas são a base das funções de todos os seres vivos.
Facilmente confundimos os termos enzimas e proteínas no dia a dia, porém devemos deixar claro
que as enzimas são um tipo de proteína, ou seja, todas as enzimas são proteínas, mas nem todas
as proteínas são enzimas.
54 Macromoléculas Cervejeiras
Conforme os aminoácidos se ligam, formam-se peptídeos, depois polipeptídeos e, por fim, proteínas.
Quando as cadeias de ligações crescem, outras forças intermoleculares atuam, criando estruturas es-
paciais. Dessa maneira, dividimos as estruturas das proteínas em quatro classes: proteínas de estrutura
primária, secundária, terciária e quaternária (BARACAT-PEREIRA, 2014). Veremos, a seguir, como
funcionam cada uma delas.
• Estrutura primária: é a ligação dos aminoácidos formando peptídeos. Dizemos que essa estrutura
é linear, geralmente representa peptídeos de baixo peso molecular.
• Estrutura secundária: os resíduos dos aminoácidos começam a exercer forças intermoleculares,
causando a torção da cadeia, que começa a se dispor em hélice. Dessa forma, estruturas como
alfa-hélice e beta pregueada são possíveis.
• Estrutura terciária: as hélices, conforme ficam maiores, começam a se enrolar sobre si, como se
fossem novelos de lã. A molécula possui alto peso molecular e começa a produzir regiões fun-
cionais em escala tridimensional.
• Estrutura quaternária: a disposição tridimensional da proteína começa a desempenhar funções
específicas em cada região dela, que podem ser chamadas de subunidades.
Estrutura terciária:
Estrutura primária: Estrutura secundária: cadeia polipeptídica Estrutura quaternária:
cadeia de aminoácidos alfa hélice torcida sobre si subunidades reunidas
Quanto maior a estrutura da proteína, mais funcional ela se torna. A interação dos resíduos dos ami-
noácidos com as forças intermoleculares pode produzir proteínas com funções ilimitadas. Algumas
proteínas ainda possuem metais fazendo parte de sua estrutura, como a hemoglobina que possui ferro.
Toda essa complexidade torna cada ser vivo único, com um conjunto de interações e reações químicas,
criando enzimas específicas.
UNIDADE 2 55
Funções das Proteínas
Caro(a) aluno(a), por que é tão importante manter aminoácidos no mosto para as leveduras? Parece
um pouco óbvio que elas usem esses aminoácidos para produzir suas enzimas e conseguirem se ali-
mentar dos açúcares, mas vai muito além disso. Os aminoácidos servirão como matéria-prima para
as proteínas, e estas desempenharão muitas outras funções, além das enzimas que já vimos anterior-
mente. Vamos, agora, conhecer um pouco das outras funções das proteínas nos organismos vivos
(BARACAT-PEREIRA, 2014).
56 Macromoléculas Cervejeiras
Lipídeos
UNIDADE 2 57
Devido às características hidrofóbicas dos lipídeos, não é possível
solubilizar óleos e gorduras em da água. Para isso, utilizam-se
solventes como hexano, éter de petróleo e outros. Muitas análises
de conteúdo lipídico são obtidas por extração.
Fonte: USP ([2020], on-line)2.
Os lipídeos são derivados dos ácidos graxos, que nada mais são do
que cadeias hidrocarbonadas com um grupo carboxil em uma das
extremidades. Esse grupo carboxil, também chamado de grupo
ácido, torna essas substâncias com uma característica hidrofóbica
(que não se liga à água) em uma substância hidrofílica (que pode
se ligar à água), como é o caso dos ácidos graxos. A polaridade da
extremidade carboxílica permite a interação com a água, enquanto
as cadeias não polares repelem a água. Dessa maneira, essas substân-
cias são essenciais para a existência da vida. Sem elas, as membranas
celulares dos microrganismos não existiriam, seriam totalmente
dissolvidas pela água interna e externa (NELSON et al., 2018).
Os ácidos graxos se diferenciam por meio do tamanho da sua
cadeia e da sua quantidade de insaturações. O tamanho da cadeia é
determinado pela quantidade de carbonos presentes, que abrevia-
mos pela letra “C” e o número de carbonos na cadeia. Por exemplo,
um ácido graxo com 9 carbonos é referenciado como C-9. Quando
falamos de insaturações, dizemos que no meio da cadeia podem
haver ligações duplas, o que chamamos de insaturação. Ácidos gra-
xos insaturados são aqueles que possuem ligações duplas na cadeia.
58 Macromoléculas Cervejeiras
Grupo O O O O
carboxil C C
Cadeia
hidrocarbonada
Figura 10 - Imagem ilustrativa dos ácidos graxos saturados e insaturados, indicando o grupo carboxila
Fonte: adaptada de Nelson e Cox (2014).
Os ácidos graxos podem se ligar a uma molécula de glicerol, formando uma cadeia neutra chamada de
triacilglicerídeos (ou triacilgliceróis). Dessa maneira, é possível que os seres vivos armazenem esses ácidos
graxos, para serem utilizados como reserva energética. Para formar um triacilglicerol, é necessário que
uma molécula de glicerol se ligue a três ácidos graxos, construindo, assim, uma reserva energética para os
seres vivos. Mais adiante, falaremos sobre os carboidratos e sua importância energética, porém devemos
salientar que a energia de triacilgliceróis é superior à fornecida por carboidratos. Além disso, há menor
requerimento de água para a transformação dessas moléculas em energia.
UNIDADE 2 59
Ácidos graxos e triacilglicerí- Esses sabões são conhecidos por promover a solubilização de
deos são fundamentais para gorduras em água.
o correto funcionamento dos
organismos vivos. Para as le-
veduras, esses compostos são
utilizados para a sintetização
de novas membranas celulares,
imprescindível para a repro-
dução celular. Em organismos
superiores, como nós humanos,
eles são reservas energéticas e
constituem grande parte dos
hormônios, que são substân-
cias necessárias para a comu-
nicação interna do corpo. A
hidrólise dos triacilglicerídeos
é facilmente assistida por ácidos
ou bases, gerando sabões que
diminuem a tensão superficial
da água (NELSON et al., 2018).
Podemos perceber que a polaridade da molécula tem efeito sobre a sua solubilização. Tanto os
fosfolipídeos das membranas celulares quanto os sabões conseguem ser polares em uma região
e apolares em outra região da molécula, produzindo o que chamamos de micelas. Estas são aglo-
merados de ácidos graxos ou sais de ácidos graxos que podem solubilizar substâncias em água ou
manter uma bicamada estável, como as membranas celulares.
60 Macromoléculas Cervejeiras
Formação de Estrutura de Membrana
Como já vimos até aqui, a membrana celular, além de fundamental para a vida, é necessariamente com-
posta por uma bicamada lipídica, que chamamos de lipossomo. A principal diferença entre a micela e
o lipossomo é a presença de duas camadas, ao invés de uma. Isso permite polaridade nas extremidades
e no centro, possibilitando uma unidade aquosa interna e externa.
Lipossomo Micela
Bicamada lipídica
Dessa maneira, prezado(a) estudante, percebemos como é importante a presença de ácidos graxos
para a manutenção da vida. Normalmente, as leveduras conseguem sintetizar os ácidos graxos a partir
dos demais compostos presentes no mosto, para assim se reproduzirem. Contudo, só o conseguem na
presença de oxigênio. Por esse motivo, é fundamental que o mosto cervejeiro seja aerado previamente à
fermentação, pela necessidade de as células produzirem ácidos graxos. A falta de oxigênio pode causar
estresses, gerando subprodutos indesejáveis na cerveja pronta.
UNIDADE 2 61
Carboidratos
62 Macromoléculas Cervejeiras
Figura 14 - O malte tem como principais constituintes os carboidratos
Tenha sua dose extra de conhecimento assistindo ao vídeo. Para acessar, use
seu leitor de QR Code.
Os carboidratos são chamados assim por se tratarem de hidratados de carbono, ou seja, a mistura
das moléculas de gás carbônico (CO2) e água (H2O). Dessa maneira, após a sua quebra, são liberadas
quantidades de energia e essas duas moléculas. Os carboidratos são a classe mais numerosa de biomo-
léculas do planeta, sendo a fonte principal de energia para os seres vivos. Não é por acaso que a nossa
levedura cervejeira aguarde ansiosamente os açúcares do mosto para transformá-los. Afinal, essa é a
maneira que o fermento tem para sobreviver naquele meio.
Dividem-se os carboidratos de acordo com a composição de sua molécula. Dos mais simples, com
apenas uma unidade, até os mais complexos, com numerosas unidades, podemos destacar a glicose e
o amido, sendo o último uma longa cadeia de glicoses ligadas. Aos carboidratos de uma única unidade,
damos o nome de monossacarídeos, os de duas chamamos de dissacarídeos e os grandes carboidratos
denominamos de polissacarídeos (BELLÉ; SANDRI, 2014). Exemplificaremos para que fique mais claro.
UNIDADE 2 63
Glicose Galactose Frutose
Sacarose Maltose
Lactose
Observe pela Figura 15 como a união das unidades pode formar dissacarídeos. Eles são muito presen-
tes no nosso dia a dia. A sacarose, por exemplo, está presente na cana-de-açúcar e na forma de açúcar
refinado nas nossas casas, a maltose está presente no nosso mosto cervejeiro e a lactose nos leites. Todas
essas substâncias são utilizadas pelo nosso organismo como fonte de energia. Para as leveduras, são os
precursores do álcool, do gás carbônico e de outros subprodutos da fermentação.
64 Macromoléculas Cervejeiras
São numerosas as quantidades de carboidratos existentes. As nossas leveduras cervejeiras só
conseguem trabalhar com alguns carboidratos em específico: glicose, frutose, sacarose, maltose e
maltotrioses (com algumas exceções). A leveduras não conseguem quebrar os outros carboidratos,
o que faz com que estes, se presentes, permaneçam no meio após a fermentação. Aos açúcares que
as leveduras conseguem transformar, denominamos de açúcares fermentescíveis.
Como dito anteriormente, os carboidratos são a principal fonte de energia dos seres vivos. As le-
veduras possuem uma alta preferência pela glicose do que qualquer outra biomolécula para trans-
formar em energia. A forma que elas conseguem realizar esse trabalho é por meio da respiração ou
da fermentação. Quando em presença de oxigênio, as leveduras conseguem oxidar os carboidratos
plenamente, liberando gás carbônico e água. Quando em ausência de oxigênio, a opção é a fermen-
tação alcoólica (MALLETT, 2014).
Durante a mosturação, o amido, enorme biomolécula de açúcares, é quebrado, liberando diversos
açúcares no mosto. A priorização das enzimas cervejeiras é o que define quais açúcares estarão presentes
em maior quantidade no mosto. O amido, quando quebrado aleatoriamente, produz o que chamamos
de dextrinas, ou seja, carboidratos menores, porém de variada composição, não sendo fermentescíveis.
Isso trará características como corpo para a cerveja, além de dulçor residual. Quando há a priorização
da quebra do amido em suas extremidades, há maior formação de açúcares fermentescíveis no mosto
cervejeiro, como principalmente a maltose. Isso trará maior teor alcoólico, menor corpo e mais sensa-
ção de secura para a cerveja final. É muito importante ao cervejeiro conhecer a diferença entre essas
moléculas e projetar sua receita com base nisso.
UNIDADE 2 65
Função Estrutural dos Carboidratos
66 Macromoléculas Cervejeiras
Insumos, Mosto
e Cerveja
Insumos
UNIDADE 2 67
Malte
68 Macromoléculas Cervejeiras
Tabela 1 - Parâmetros do malte Pale Ale Agrária
Parâmetro Mínimo Máximo Unidade
Umidade - 4,5 %
Extrato de moagem final 80,5 - %
Friabilidade 83,0 - %
Cor do mosto 5,5 7 EBC
B-glucanas - 150 mg/L
Viscosidade - 1,60 mPa/s
Proteína 10,0 11,5 %
Poder diastático 200 - Wk
UNIDADE 2 69
Lúpulo
70 Macromoléculas Cervejeiras
Tabela 2 - Composição média do lúpulo Cascade
Floral, com elementos
Características
cítricos e notas de toranja
Proposta Aroma e amargor
Composição de alfa-ácidos (%) 4,5-8,9
Composição de beta-ácidos (%) 3,6-7,5
Composição de co-humulonas (%) 33-40
País de origem Estados Unidos
Tamanho do cone Médio
Densidade do cone Compacto
Maturidade sazonal Média
Rendimento (kg/hectare) 2017-2465
Taxa de crescimento Moderada a alta
Retenção de 48 a 52% de alfa-ácidos após 6
Estocagem
meses guardado a 20 ºC
Colheita Difícil
Composição total de óleos (mL/100g) 0,8-1,5
Composição de óleo de mirceno (%) 45-60
Composição de óleo humuleno (%) 8-16
Fonte: Hopslist ([2020], on-line)4.
UNIDADE 2 71
Fermento
72 Macromoléculas Cervejeiras
Ficha técnica
Levedura Kveik
elha Frutas tr
erm op
çãv ica
a is
M
Ba
ro
ut
na
Ne
na
Maçã verd
óolico
Alc
e
a
A
t lh
en o
Pim
Ácido
Fermento Ale
Porcentagem de sólidos:
93 a 96%
Viabilidade:
>= 5x 109 CFU
por grama de levedura seca
Estilo utilizados:
Norwegian farmhouse Ale, ales
de fermentação rápida
Aroma:
Relativamente neutro em altas
temperaturas com baixas notas
cítricas e de laranja
Atenuação:
Média à alta
Faixa de temperatura:
25 a 40 ºC com faixa ótima em
35-40 ºC
Floculação:
Muito alta
Tolerância alcoólica:
12%
Taxa de inóculo:
50-100 g/hL para atingir um
mínimo de 2,5 a 5 milhões de
células/mL
Tabela 3 - Característica da levedura Kveik Voss da Lallemand
Fonte: Lallemand Brewing ([2020], on-line)5.
UNIDADE 2 73
Perceba que, na produção cervejeira, os principais insumos cervejeiros estão repletos de biomolécu-
las. A água, que aqui não citaremos, possui uma mínima quantidade de biomoléculas, sendo, em sua
maioria, repleta de sais minerais. Entretanto, ao juntarmos tudo isso, teremos nosso mosto cervejeiro.
Mosto
Como já conhecemos o processo de produção cervejeira, falaremos apenas do mosto pronto, contex-
tualizando todos os conhecimentos que vimos até agora sobre as biomoléculas. Adicionamos o malte
à água, aquecemos o mosto cervejeiro para cada enzima atuar de maneira adequada, realizamos a
finalização da mostura, filtramos e passamos para a fervura. Na fervura, calculamos e adicionamos
os lúpulos, resfriamos nosso mosto e estamos quase indo para a fermentação. Estudante de Produção
Cervejeira, afinal, o que é o mosto cervejeiro prévio à fermentação?
O mosto cervejeiro pode ser definido como uma solução rica em carboidratos (dextrinas e açúcares
fermentescíveis), proteínas coaguladas, aminoácidos livres, peptídeos livres e substâncias de sabor e
aroma oriundas do malte e dos lúpulos. Esse balanço deve estar da maneira correta, de acordo com as
receitas que o cervejeiro quer, porém em acordo com o que a levedura também precisa. Um mosto pobre
de aminoácidos livres acarretará estresse fermentativo, causando uma fermentação lenta e com sabores
e odores desagradáveis. Um mosto pobre de açúcares fermentescíveis, porém com alto teor de dextrinas,
também será pobre para as leveduras, que sem alimento não trarão teor alcoólico suficiente para a cer-
veja pronta. O inverso acarretará maiores teores alcoólicos, mas falta de corpo e dulçor para sustentar
tanto álcool. Dessa maneira, perceba como a forma em que a mostura é conduzia impacta totalmente na
cerveja pronta. O mosto, feito por nós, humanos, depende unicamente de nós e de nossas técnicas. Já a
cerveja é produzida pelo fermento.
Os guias de estilos são uma importante ferramenta para que o cervejeiro projete sua receita. Ele
deve observar as características necessárias ao estilo e replicar utilizando os insumos corretos. Os
guias de estilos mais utilizados são o Beer Judge Certification Program (BJCP) e o guia de estilos do
Brewer’s Association (BA).
Veja-os no links: https://www.bjcp.org/index.php e https://www.brewersassociation.org/edu/brewer-
s-association-beer-style-guidelines/.
74 Macromoléculas Cervejeiras
Cerveja
Podemos generosamente chamar a cerveja de um mosto processado pela levedura ou, até mesmo,
como sendo o resultado de uma vida toda de uma levedura. Apesar dessas colocações um pouco
estranhas, a levedura viveu no mosto cervejeiro consumindo os açúcares fermentescíveis, minerais
e aminoácidos livres, produzindo álcool, gás carbônico e outras substâncias secundárias. Todo esse
conjunto de biomoléculas é a cerveja pronta. Fermentações saudáveis costumam apresentar boas cer-
vejas, com características de acordo com os propósitos a serem alcançados. Os estresses fermentativos
podem causar odor de ovo podre à cerveja (enxofre), característica de amanteigado (diacetil), solvente
(álcoois superiores), entre outros defeitos, por exemplo. A má condução da fermentação e maturação
pode causar sérios danos às cervejas prontas. Por isso, é sempre importante ressaltar alguns pontos:
• O fermento deve estar saudável: entende-se por fermento saudável aquele que está dentro da vali-
dade e é usado de acordo com as recomendações do fabricante (vitalidade). Para garantir a eficácia
do fermento, é necessário que este esteja o mais fresco possível, que tenha sido mantido refrigerado
e sua hidratação (caso necessária) tenha ocorrido da forma correta.
• A temperatura de fermentação deve condizer com o estilo e o fermento empregado: o controle
de temperatura da fermentação é algo crucial na produção moderna de cervejas. As variações de
temperatura permitem que a levedura produza muitas substâncias indesejadas, além de causar
dormência e até morte celular. Além disso, a temperatura deve estar de acordo com o estilo em-
pregado. Fermentar uma lager acima de 15 ºC já se torna um grande risco, pois as características
de fermentação neutra não serão respeitadas.
• O mosto deve ser saudável: o mosto cervejeiro bem feito contém todas as necessidades em termos
de aminoácidos, minerais e açúcares fermentescíveis necessários para a sobrevivência da levedura.
Qualquer mudança na mostura, deve atender as necessidades da levedura. Além disso, um requisito
muito necessário ao início da fermentação é a aeração adequada.
• A maturação deve ser bem conduzida: a maturação também compreende o descanso de diacetil, por
exemplo, por isso ela pode ter uma fase quente e uma fase fria. O importante é que haja tempo para
que a levedura limpe o mosto dos compostos indesejáveis e que haja frio posterior para preservar
as características da bebida, diminuindo proliferação de microrganismos e oxidação em tempera-
turas superiores. Além disso, ocorre clarificação da bebida pela decantação das células da levedura.
Perceba, prezado(a) estudante, como cada insumo, mosto e cerveja é composto por classes de moléculas
específicas, como carboidratos, lipídeos e proteínas. Conhecer quais são essas biomoléculas e sua im-
portância na produção de cervejas coloca a capacidade de replicação de receitas em um patamar muito
alto. A estabilidade da espuma, a quebra do amido, a formação das proteínas, a atuação das enzimas
cervejeiras e tantos outros conhecimentos aqui vistos darão as bases para que possamos seguir adiante.
UNIDADE 2 75
Você pode utilizar seu diário de bordo para a resolução.
76
3. Os carboidratos são biomoléculas caracterizadas por serem compostas de hidrogênio,
carbono e oxigênio, por isso são chamados de hidratados de carbono. A respeito dos
carboidratos, assinale Verdadeiro (V) ou Falso (F).
4. Você foi provar a cerveja de um colega, que está iniciando a produção de cer-
vejas em casa. Contudo, a cerveja dele estava com baixo teor alcoólico, um
odor característico de lúpulo velho e sabor amanteigado. Como você poderia
recomendá-lo a agir para não errar nas próximas receitas?
77
LIVRO
78
BARACAT-PEREIRA, M. C. Bioquímica de Proteínas: Fundamentos Estruturais e Funcionais. Viçosa: Editora
UFV, 2014.
BELLÉ, L. P.; SANDRI, S. Bioquímica aplicada: Reconhecimento e caracterização de biomoléculas. São Paulo:
Érica, 2014.
MALCATA, F. X. Mathematics for Enzyme Reaction Kinetics and Reactor Performance. Wiley-Blackwell,
2020.
MALLETT, J. Malt: A Practical Guide from Field to Brewhouse. Boulder: Brewer’s Publications, 2014.
NELSON, D. L.; COX, M. M. Princípios de bioquímica de Lehninger. 6. ed. Porto Alegre: Artmed, 2014.
NELSON, D. L.; COX, M. M.; DALMAZ, C.; TERMIGNONI, C.; PEREIRA, M. L. S. Princípios de Bioquímica
de Lehninger. Porto Alegre: Artmed, 2018.
REFERÊNCIAS ON-LINE#
2
Em: https://edisciplinas.usp.br/pluginfile.php/4111167/mod_resource/content/1/LIPIDIOS.pdf. Acesso em:
08 fev. 2020.
5
Em: https://www.lallemandbrewing.com/en/australia/product-details/lalbrew-voss-kveik-ale-yeast/. Acesso
em: 08 fev. 2020.
79
1. C.
2. B.
3. E.
4. A primeira recomendação é deixar que as enzimas da mosturação atuem por mais tempo, fornecendo
mais açúcares fermentescíveis. A segunda recomendação é utilizar lúpulos mais frescos, longe da data
de validade e mantê-los refrigerados ao abrigo da luz. Maturação quente visando o descanso de diacetil
também é recomendado.
80
81
82
Me. Maycon Vinícius de Senna Ribeiro
Enzimas Cervejeiras
PLANO DE ESTUDOS
Mecanismos de Amilases
Reação Enzimática
OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
• Introduzir e conceituar os termos relacionados a enzimas • Conhecer as amilases e seu papel na sacarificação do
cervejeiras. mosto cervejeiro.
• Compreender como é realizada a catálise enzimática. • Conhecer as proteases e seu papel na formação de ami-
• Analisar os conceitos de cinética enzimática e suas con- noácidos e peptídeos na mosturação cervejeira.
sequências na produção de cervejas.
Introdução
às Enzimas
A cevada é uma semente e, como a maioria das sementes, ela busca germinar e se tornar uma nova
planta. As plantas recobrem as sementes com amido (reserva energética) e material genético (informação
genética), protegendo tudo isso em uma matriz proteica. Quando a semente de cevada encontra a água,
prontamente seu material genético, recebe a ordem de produzir enzimas. É como se a semente tivesse
muitos equipamentos para construir uma nova planta, mas não soubesse usá-los. Quando encontra
condições de germinar (abundância de água), as “chaves” dos equipamentos são, então, fabricadas. A
semente produz as enzimas capazes de quebrar o amido e formar açúcares simples, indispensáveis para
que a semente inicie a germinação. Além disso, o amido está muito bem protegido com proteínas, em
um sistema chamado de matriz proteica. A semente precisa, então, produzir enzimas quebradoras de
proteínas, para liberar o amido. Percebe, aluno(a), de onde vem as enzimas cervejeiras? Elas surgem
com o intuito de a planta germinar. Nós usamos toda essa energia para produzir ótimas cervejas.
UNIDADE 3 85
História
Do fim do século XVII ao início do século XVIII, Até os anos 1900, não se havia conhecimento das
já era de conhecimento científico que as secreções características bioquímicas das enzimas. Sabia-se
do estômago eram capazes de digerir proteínas, que estavam associadas a proteínas, mas que as
assim como secreções de plantas eram capazes de proteínas convencionais não eram capazes desse
converter o amido em açúcares. No entanto, os feito. Em 1926, outros cientistas conseguiram cris-
mecanismos envolvidos nessas reações não eram talizar as enzimas de forma pura, como a urease,
conhecidos. Em 1833, o químico francês Anselme a catalase e a pepsina, evidenciando seu caráter
Payen foi o primeiro a descobrir uma enzima: a proteico. Assim, as técnicas de cristalografia por
diástase. Décadas depois, Louis Pasteur observou raios-X permitiram o vislumbre de suas estrutu-
a conversão de açúcares em álcool e gás carbônico, ras. Esse foi o marco de estudos das enzimas, em
associando essas transformações a organismos que se iniciaram as investigações a nível atômico
vivos: as leveduras. Em 1897, Eduard Buchner de como as enzimas atuavam.
descobriu que os extratos de levedo também eram
capazes de converter os açúcares em etanol e gás
carbônico, desassociando a necessidade da vida
nessas reações químicas. A essas enzimas, ele as
denominou como sendo “zymases” (NOBEL PRI-
ZE, [2020], on-line)1.
86 Enzimas Cervejeiras
Enzimas como Maquinário da Vida
Todas as transformações químicas da vida são assistidas por enzimas. Quando inoculamos os fer-
mentos no mosto cervejeiro, a primeira coisa que as leveduras irão fazer é verificar o que elas têm nas
proximidades. Há oxigênio? Está fácil de se obter? Há açúcares fermentescíveis, de fácil acesso? Mi-
nerais? Aminoácidos? pH controlado? Temperatura em boas condições? O que há de novo e estranho
nesse meio? Há frutose? Após todo esse reconhecimento, as leveduras passam, então, por expressão
genética, a produzir todas as enzimas necessárias para trabalharem. Há frutose? Produz-se enzimas
capazes de sintetizá-la. Há sacarose? Produz-se enzimas capazes de quebrá-la. Há fontes lipídicas no
meio? Produz-se enzimas de quebra de lipídeos. E assim por diante. Quando você, cervejeiro, olhar
novamente para o período de tempo entre o inóculo e a primeira atividade no airlock, lembrará: as
leveduras estão sintetizando enzimas. As enzimas são as ferramentas necessárias para a obtenção de
energia e sobrevivência.
Tempo
Figura 4 - Curva de Crescimento Microbiano
Fonte: adaptada de Nelson e Cox (2014).
UNIDADE 3 87
Mecanismos de
Reação Enzimática
88 Enzimas Cervejeiras
As enzimas são altamente específicas. Elas atuam em faixas de temperatura, pH, concentração de
substratos e em moléculas muito bem definidas. As amilases apenas quebram o amido, as proteases
quebram apenas as proteínas, as ureases a ureia, e assim por diante. As enzimas possuem alto peso
molecular, pois necessitam que cada átomo esteja espacialmente no lugar correto, com a abertura
correta para o encaixe do substrato, provendo a energia necessária para que essa reação ocorra, só
assim a vida consegue controlar a velocidade das reações químicas, iniciando ou parando algumas,
ao seu próprio ver.
As enzimas podem atuar de diversas maneiras, como ativação por cofatores, especificidade de subs-
tratos e, até mesmo, possuir mais do que um substrato. Os modelos de mecanismos enzimáticos são
“chave-fechadura” e encaixe induzido. (Figura 5). A enzima se liga ao substrato formando um complexo
enzima-substrato, reage formando um complexo enzima-produto e há a liberação do produto. A velo-
cidade da reação química depende da formação do complexo, que pode depender de outros fatores. É
por essa razão que a concentração de substrato e de enzimas é importante para o mecanismo ocorrer
de maneira correta. Geralmente, quando se inicia a mosturação, recomenda-se uma razão água/malte
de 2:1, devido às características das enzimas associadas nas primeiras rampas de mostura. A seguir,
quando o foco é nos processos de sacarificação, recomenda-se a adição de mais duas partes de água,
obtendo uma relação água/malte de 4:1. Isso demonstra que as amilases atuam melhor em mostos
menos concentrados (KUNZE, 2004).
UNIDADE 3 89
Substrato
Sítios ativos
similares
ao formato
do substrato
Enzima
Complexo enzima substrato:
sítios ativos se tornam se tornam
exatamente do formato do substrato
Ativadores e Inibidores
Algumas enzimas ainda atuam apenas na presença de ativadores e podem ser paradas pela presença
de inibidores ou pela ausência de ativadores. Esses mecanismos permitem que os organismos vivos
consigam regular a ocorrência das reações químicas, mesmo quando há contato entre enzimas e
substratos no meio.
Ativadores
Também chamados de cofatores, são moléculas ou metais responsáveis por se ligarem às enzimas (não
permanentemente) para que ela consiga atuar normalmente (Figura 7). Um cofator muito importante
no meio cervejeiro é o zinco, oriundo do malte, capaz de garantir o desempenho das enzimas na mos-
turação e a saúde da levedura no processo de fermentação. Além disso, algumas moléculas orgânicas
na presença de cofatores também contribuem para o desempenho das enzimas. Essas substâncias são
chamadas de coenzimas.
90 Enzimas Cervejeiras
ATIVAÇÃO Substrato
ENZIMÁTICA
2
1 Ativador
Sítio aberto
Enzima inativa
Inibidores
Sítio ativo
Sabemos muito bem que as vitaminas são importantes para a nossa saúde e a saúde das leveduras,
mas dificilmente sabemos o porquê. A questão principal é que muitas vitaminas são coenzimas e
sem elas as reações catalisadas pelas enzimas não podem ocorrer.
UNIDADE 3 91
Cinética
Enzimática
92 Enzimas Cervejeiras
E a, sem catalisador
Energia
E a, com catalisador
Substratos
Produtos
E a = Energia de ativação
E+S↔E•S↔E•P→E+P
Levando-se em conta que cada enzima possui uma afinidade com seu substrato, podemos dizer que
a velocidade da reação química enzimática depende da concentração do substrato, até certo limite,
predefinido experimentalmente, a que chamamos de velocidade máxima.
Km + S
V0 =
Vmax • S
UNIDADE 3 93
Esse comportamento prediz que a velocidade de reação química assistida por uma enzima irá crescer
com o aumento da concentração de substrato e, quanto mais rápido crescer, maior a afinidade química
da enzima com o substrato. Quanto maior o valor de Km, menor é a afinidade química.
Vmáx
Velocidade Inicial, V0 (µM/,min)
1
2
Vmáx
Km
Concentração de substrato, [S] (mM)
Figura 10 - Curva da concentração de substrato em relação à velocidade de reação
Fonte: Nelson e Cox (2014, p. 201).
Você deve estar se perguntando então: por que é necessário utilizar essas equações complexas? Quando
se projeta um biorreator enzimático ou prevê-se a quantidade de tempo que uma enzima atua sobre
um substrato, faz-se necessário ter as características da enzima como parâmetro, como o valor de Km
e o valor de Vmax. Como exemplo, o tempo de hidrólise do amido na mostura foi definido com base
na quantidade de enzimas presentes no malte, na concentração do substrato (relação água/malte) e
na temperatura de atuação. Por essa razão, os valores de Km e Vmax podem ser afetados por condições
do meio. Veremos essas condições a seguir.
O valor de Km define a afinidade da enzima com o substrato. Isto é, qual é a facilidade do substrato se
ligar à enzima. Isso depende do substrato, da enzima e das condições do meio, como temperatura,
pH etc., porém não depende da concentração do substrato.
94 Enzimas Cervejeiras
As enzimas não são uma chave liga-desliga. Elas permanecem atuando mesmo não estando nas
condições ótimas. Por menor que seja a atividade longe dos pontos ótimos, as enzimas permanecem
catalisando reações químicas.
pH Desnaturação
Temperatura
UNIDADE 3 95
Amilases
96 Enzimas Cervejeiras
Amido
O amido é uma grande molécula composta por inúmeras unidades de glicose, ligadas tanto em con-
figurações lineares (amiloses) quanto em configurações ramificadas (amilopectinas). Por esse motivo,
as enzimas amilolíticas são diferentes. Cada uma irá atuar em um tipo de molécula.
Amilose Amilopectina
O amido é a reserva energética das plantas, sendo composto por amiloses e amilopectinas em uma
relação 1:3, aproximadamente. Quando ocorre a quebra das ligações do amido, são produzidas inú-
meras moléculas possíveis de açúcares. Conforme as enzimas quebram, “pedaços” com 3, 4, 10 glicoses
são formados e a esses açúcares chamamos de dextrinas. As dextrinas são responsáveis por dar corpo
e dulçor residual à nossa cerveja, pois as leveduras são incapazes de metabolizar esses açúcares. Inver-
samente, quando as pontas das moléculas de amido são quebradas, são liberados açúcares menores,
como a maltose e a glicose, capazes de serem metabolizados e se tornarem álcool e gás carbônico. O
balanço entre a quantidade de dextrinas e de açúcares fermentescíveis é de alto impacto à cerveja
pronta (KUNZE, 2004).
UNIDADE 3 97
α-amilase
Essa enzima é muito familiar aos cervejeiros. Ela é a enzima responsável pela quebra aleatória do
amido. Isso quer dizer que ela pode atuar em qualquer ponto da cadeia de amido, podendo formar
desde glicoses e maltoses (se atuar nas pontas) até dextrinas ramificadas (atuando em pontos no in-
terior da cadeia). Esta enzima hidrolisa o amido, favorecendo mais as dextrinas do que os açúcares
fermentescíveis, dando um caráter encorpado e com dulçor residual característico para a cerveja final.
A priorização dessa enzima sobre as demais (deixando-a atuar por mais tempo em suas condições
ótimas) irá trazer menor conteúdo alcoólico para a cerveja final. Nessas condições, você terá corpo,
dulçor e pouco álcool. Perceba, como a manipulação da atuação das enzimas pode mudar totalmente
as características finais da cerveja.
chamado de clorofenol.
98 Enzimas Cervejeiras
A ∝-amilase atua de 65 a 75 ºC, com pH de 5,6 a 5,8, em relações água malte de 3,5:1 a 4:1. Esses valores
são faixas de atuação em que a enzima trabalha em suas melhores condições de velocidade de reação.
Contudo, devemos estar cientes de que, nessas faixas, outras enzimas estarão igualmente atuando. Por
essa razão, quando priorizamos a ∝-amilase sob as demais (principalmente em relação a β-amilase),
devemos colocá-la para atuar nos limites de atuação das outras enzimas, ou seja, em um ponto em que
ela se sobressaia às demais. Por isso, quando priorizamos a ∝-amilase, utilizamos temperaturas de 69
a 73 ºC. Em breve, veremos um comparativo a respeito das faixas ótimas.
β-amilase
A β-amilase é a enzima respon- Por mais que pareçam básicos alguns conceitos, a forma de
sável pela quebra das ligações nas atuação das amilases tem alto impacto no mosto final, podendo
extremidades da molécula de arruinar uma cerveja pelo exagero em determinados patamares
amido. Ela tem por função pro- ou por atuar em faixas limites, 65 ºC, por exemplo, em que as
duzir a maior quantidade possí- duas enzimas estão atuando. Na Figura 13, temos um esquema
vel de açúcares fermentescíveis de quebra das enzimas amilases nas cadeias de amido.
para o mosto cervejeiro. Ela se
encaixa perfeitamente no final a) b) β
β α
das cadeias de amido, produzin-
do maltoses. Esta enzima, quan- α
β α
do priorizada na mosturação, dá β
caráter seco para a cerveja final, α
bem como maior teor alcoólico, β
em vista de maior capacidade de
β β
consumo pelas leveduras. α
Essa enzima tem como me-
c) β d)
lhor faixa de atuação de 60 a 65
β
ºC, pH de 5,4 a 5,5 e é muito β
β β
sensível em temperaturas altas, Glicose
β β
rapidamente inativada a 70 ºC β
Maltose
(KUNZE, 2004). Por isso, é im- β
β
portante compreender que, se β Maltotriose
β β
você deve produzir uma cer-
veja com características inter- Dextrina limite
β β
mediárias (corpo e teor alcoó- β
lico médio), você deve iniciar a
mosturação de forma crescente α: α-amilase Resíduo de Glicose
de temperatura, pois a 70 ºC a β: β-amilase
β-amilase já não tem impacto Figura 13 - Esquema de atuação das enzimas amilases na quebra das cadeias de amido
suficiente. Fonte: adaptada de Kunze (2004).
UNIDADE 3 99
Outras Enzimas Amilolíticas
Dextrinase limite
Amiloglicosidase
β-glucanases
UNIDADE 3 101
A atuação das proteases tem como principais benefícios duas
situações: liberação de aminoácidos livres e de peptídeos de médio
peso molecular no mosto cervejeiro. Os primeiros serão responsá-
veis pela nutrição das leveduras, que, assim como citamos anterior-
mente, necessitam de aminoácidos para uma fermentação saudável
e menos estressante possível. Os peptídeos de cadeia média são
responsáveis pela estabilidade da espuma. Sem eles, as espumas se
tornam rasas e pouco persistentes. Esteticamente falando, é muito
importante que alguns estilos possuam persistentes e cremosas
espumas (Figura 14).
Ao final da fervura, as proteínas de alto peso molecular são desnaturadas e aglutinadas, permanecen-
do no trub durante o whirlpool. Tanto a ausência dos patamares de proteases quanto um whirlpool
mal feito podem causar turbidez indesejada em algumas cervejas, devido à aglutinação das proteínas
com compostos do lúpulo.
Aminoácidos Livres
Sempre deve haver um equilíbrio entre o tempo disposto para cada patamar de temperatura de atuação
das proteases. Quando as faixas de aminoácidos prevalecem muito sobre as de peptídeos, como resul-
tado podemos ter uma cerveja sem espuma e com baixa persistência. Quando o contrário é observado,
diversos problemas podem ocorrer, por exemplo:
• Redução do crescimento da levedura.
• Demora na fermentação e na maturação.
• Retenção de compostos indesejáveis na cerveja final.
UNIDADE 3 103
Uso de Adjuntos e Grãos
com Baixo Conteúdo Proteico
105
3. As proteases são as enzimas responsáveis pela quebra das proteínas no mosto
cervejeiro. Com base nesse exposto, assinale Verdadeiro (V) ou Falso (F):
( ) A produção de peptídeos se faz necessária para a formação e estabilidade
da espuma.
( ) A concentração média ideal de aminoácidos livres está entre 14 e 20 mg/mL.
( ) Exceder o patamar de temperatura que libera aminoácidos livres pode preju-
dicar a espuma da cerveja final.
106
LIVRO
Brewing
Autor: James C. Hunter
Editora: Royal Society of Chemistry
Sinopse: acredita-se que a cerveja tenha sido produzida, de alguma forma, há
milhares de anos – sendo os antigos egípcios uma civilização com conhecimento
do processo de fermentação. A produção de cerveja sofreu muitas mudanças
ao longo dos séculos e o livro “Brewing” atualiza o leitor com os avanços da
última década. Cobrindo as várias etapas da produção de cerveja, também é
feita referência à microbiologia dentro da cervejaria e alguns indicadores para
a pesquisa sobre o tópico. Escrito por um cervejeiro recém-aposentado, este
livro agradará a todos os amantes de cerveja, mas principalmente àqueles da
indústria que desejam entender os processos e será relevante para estudantes
de ciências biológicas ou alimentares.
FILME
WEB
107
BORZANI, W.; SCHMIDELL, W.; LIMA, U. de A.; AQUARONE, E. Biotecnologia Industrial: Fundamentos.
São Paulo: Blucher, 2008. Volume 1.
MALCATA, F. X. Mathematics for Enzyme Reaction Kinetics and Reactor Performance. Wiley-Blackwell,
2020.
MALLETT, J. Malt: A Practical Guide from Field to Brewhouse. Boulder: Brewer’s Publications, 2014.
NELSON, D. L. COX, M. M. Princípios de bioquímica de Lehninger. 6. ed. Porto Alegre: Artmed, 2014.
REFERÊNCIAS ON-LINE
mar. 2020.
108
1. D.
2. C.
3. A.
109
110
Me. Maycon Vinícius de Senna Ribeiro
Processos de Obtenção de
Energia pelos Organismos
PLANO DE ESTUDOS
OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
• Compreender as demandas energéticas dos fermentos • Conhecer os mecanismos de oxidação dos ácidos graxos
no mosto cervejeiro. e do lúpulo.
• Analisar como os fermentos transformam a glicose para • Compreender como são formadas as biomoléculas a partir
obterem energia. de suas unidades básicas.
• Compreender as etapas do processo aeróbio.
Sobrevivência por meio
da Obtenção de Energia
Perceba que a quantidade de energia gerada pela transformação de 1 mol de glicose em álcool etílico e
gás carbônico é a principal reação ocorrida dentro dos tanques de fermentação (Figura 1). Parece até
simples, porém é importante ressaltar que essa reação não ocorre espontaneamente fora das células. Nós
sabemos que é possível guardar açúcar em potes durante longos períodos de anos, claro que bem vedados
e longe do consumo de outros microrganismos, mas que não se transformarão em álcool tão facilmente.
Esta é a grande “sacada” da vida: ela utiliza enzimas para degradar essas substâncias e produzir energia.
Um microrganismo é um grande “pacote” de enzimas, que trabalham incessantemente, reguladas
geneticamente para a sobrevivência da célula. Transformar glicose em álcool não se consegue em apenas
um passo, mas sim em vários, e em cada um deles, uma enzima extremamente específica atua. Nesse
processo, diversas substâncias são produzidas, as quais chamaremos de intermediários. Estes são subs-
tâncias produzidas e, posteriormente, consumidas para a conclusão do objetivo final: produzir energia.
UNIDADE 4 113
Quando os nutrientes começam a se esvair, a
célula passa a consumir suas reservas de glicogênio.
Dessa maneira, entendemos que o meio no qual a
vida está inserida regula a maior parte das trans-
formações internas, e cada substância produzida
nesse processo depende das condições do meio e da
saúde das células. A todas estas transformações cha-
mamos de metabolismo. E cada conjunto de pas-
sos chamamos de rotas ou caminhos metabólicos.
Você, futuro(a) profissional da Produção Cervejei-
ra, deve conhecer os caminhos metabólicos para
diagnosticar sintomas de estresse dos fermentos e
atuar caso algum metabólico indesejável apareça no
meio, dando odor ou sabor desagradável à cerveja.
UNIDADE 4 115
Adenina
Para o correto aproveitamento
Trifosfato
da energia da quebra das bio-
moléculas, como os carboidra-
Fosfato
tos, deve haver grupos fosfato Ribose
responsáveis por absorver essa
energia, que a seguir será desti-
Energia
Energia
nada para as moléculas de ATP. absorvida Ciclo liberada
(de alimentos) ADP-ATP (para a célula)
Fosfato
Adenina Difosfato
Ribose
Dinucleótido de Nicotinamida e
Adenina Oxidada (NAD) e Reduzida (NADH)
Para que possamos compreender o caminho metabólico da glicose, dividiremos ele em fases, em que
mostraremos o antes e o depois e qual a enzima responsável (BORZANI et al., 2008).
O primeiro passo da glicólise envolve a transformação da glicose em glicose-1-fosfato, por meio de uma
enzima chamada de fosforilase. A seguir, a ligação 1 do grupo fosfato é transferida para 6, transforman-
do a glicose-1-fosfato em glicose-6-fosfato, assistida por uma enzima chamada de fosfoglicomutase.
Lembre-se, aluno(a): os grupos fosfatos ligados são originários das moléculas de ATP.
6
CH2 OPO2-3
CH2 OH
5
O ATP ADP O
H H H H H H
Mg2+
4 1
OH H Fosfoglicomutase OH H
HO OH HO OH
3 2
H OH H OH
Glicose Glicose-6-fosfato
ΔG’o = - 16,7 kJ/mol
Figura 4 - Conversão da Glicose em Glicose-6-fosfato
Fonte: adaptada de Nelson e Cox (2014).
UNIDADE 4 117
6
CH2OPO2-3
6
CH2OPO2-3
5
O 1
H H O CH2OH
H Mg 2+
4 1 5 2
OH H H HO
HO OH Fosfo-hexose- H OH
3 2 isomerase 4 3
H OH OH H
Glicose-6-fosfato Frutose-6-fosfato
A frutose-6-fosfato recebe mais um grupo fosfato, vindo de outra molécula de ATP, formando fruto-
se-1,6-difosfato assistida pela enzima fosfofrutoquinase na presença de íons magnésio.
6
CH2OPO2-3 6
1 CH2OPO2-3
O CH2-OH ATP ADP 1
O CH2-OPO2-3
5 2 Mg2+
H HO 5 2
H OH Fosfofrutoquinase H HO
4 3 (PFK-1) H OH
4 3
OH H
OH H
Frutose-6-fosfato
Frutose-1,6-bifosfato
ΔG’o = -14,2 kJ/mol
Perceba, prezado(a) estudante, como essas reações químicas são possíveis apenas na presença de
fósforo, magnésio, vitamina B3 e, claro, aminoácidos utilizados para a formação dessas enzimas. A
nutrição do mosto cervejeiro deve conter essas substâncias para uma fermentação saudável.
Por meio da atuação de uma enzima chamada de aldolase, a molécula de frutose-1,6-difosfato é que-
brada em outras duas, chamadas de fosfodiihidroxiacetona (PDHA) e gliceraldeído-3-fosfato (GA-3P).
6 1
CH2OPO2-3 CH2OPO2-3 O H
O (1) CH
2
OPO32- (4) C
5
H HO
2
(2) C O + (5) CHOH
H OH Aldolase
4 3 (3) CH OH (6) CH2OPO32-
2
OH H
Fosfodiihidroxiacetona Gliceraldeído-3-
Frutose-1,6-bifosfato (PDHA) -fosfato
Observe que os dois produtos formados possuem os mesmos átomos. Dessa forma, uma enzima chama-
da de triose-fosfato isomerase converterá a fosfodiihidroxiacetona (PDHA) em gliceraldeído-3-fosfato
(GA-3P), pois apenas essa última dará sequência nas reações posteriores.
O H
CH2OH C
C O Triose-fosfato HCOH
isomerase
CH2OPO2-3 CH2OPO32-
Fosfodiihidroxiacetona Gliceraldeído-3-
-fosfato
UNIDADE 4 119
Agora que duas moléculas de gliceraldeído-3-fosfato foram formadas, cada uma delas seguirá para a
fase seguinte, sendo transformadas em 3-fosfoglicerilfosfato pela enzima gliceraldeído-3-fosfato desi-
drogenase. Esse processo gera energia por meio da liberação de um grupo fosfato, este que se ligará a
uma molécula de ADP formando um novo ATP. Como produto final, temos o 3-fosfoglicerato e uma
molécula de ATP.
O-
O P O- P O
O O -
O O P O- P P
C
C O - + Fosfoglicerato-cinase
O HCOH P
HCOH
Rip Adenina CH2OPO 2-
O
CH2OPO2-3 Mg2+ 3
Rip Adenina
3-fosfoglicerilfosfato ADP
3-Fosfoglicerato ATP
ΔG’o = -18,5 kJ/mol
O O- O O-
C Mg2+ C
HC OH Fosfoglicerato- HC O PO2-3
-mutase
CH2 O PO32- CH2 OH
3-Fosfoglicerato 2-Fosfoglicerato
ΔG’o = 4,4 kJ/mol
O fim da glicólise é marcado pela formação do piruvato, que se dá pela retirada de água da molécula
de 2-fosfoglicerato formando o fosfoenolpiruvato, assistida pela enzima enolase.
O O- O O-
H2O
C C
H C OPO2-3 C OPO2-3
Enolase
HO CH2 CH2
2-Fosfoglicerato Fosfoenolpiruvato
ΔG’o = 7,5 kJ/mol
Por fim, o fosfoenolpiruvato é, de fato, convertido em piruvato, pela retirada do grupo fosfato para
uma molécula de ADP, que agora se torna um ATP.
O O- O O- O-
P C
C O O- P O
ΔG’o = kJ/mol Piruvato-
C O P O- + P -cinase C O + P
CH2 O- O CH3
Mg2+, K+ P
Piruvato
Rip Adenina
O
Fosfoenolpiruvato ADP
Rip Adenina
ATP
ΔG = -31,4 kJ/mol
’o
Perceba como todas essas reações e transformações tiveram como objetivo aproveitar a energia das
ligações da glicose para produzir ATP. Perceba também que, para que a reação inicie, também é for-
necida uma energia na forma de ATP, para só então, ao fim, essa energia ter um balanço positivo. O
ATP é como se fosse a “bateria” das células, armazenando energia e sendo utilizada posteriormente.
Contudo, o piruvato é um íon negativo, com um elétron que ainda pode ser utilizado. É nesse mo-
mento que o NAD atua, retirando esse elétron e reduzindo o piruvato. Dessa forma, o NAD consegue
se tornar NADH e voltar ao ciclo. Tanto as moléculas de ATP quanto de NADH são imprescindíveis
para deslocar elétrons e armazenar energia para as células.
UNIDADE 4 121
Destinos do Piruvato
Mais adiante, veremos como o piruvato é totalmente oxidado pelo oxigênio, quando há a presença
deste. No entanto, como sabemos, as leveduras atuam na produção de cervejas por vias sob a ausência
de oxigênio. Nestas situações, o piruvato é transformado em etanol e gás carbônico, como está apre-
sentado a seguir. O primeiro passo é a transformação do piruvato em acetaldeído, por meio da enzima
piruvato-descarboxilase (BORZANI et al., 2008).
Fermentação alcoólica
CO CO2 + CHO
CH3 CH3
Piruvato Acetaldeído
Figura 13 - Conversão do piruvato em acetaldeído
Fonte: adaptada de Borzani et al. (2008).
CHO CH2OH
+
+ NADH + H + NAD
CH3 CH3
Acetaldeído Etanol
O acetaldeído é um conhecido off-favor do meio cervejeiro. Ele confere sabores exagerados de uvas
e maçãs verdes, porém pode ser consumido durante a maturação das cervejas pelas leveduras. Perce-
ba que ele é a molécula precursora da formação do etanol, dessa maneira, o acetaldeído presente na
cerveja indica uma falha no metabolismo, causada por uma fermentação estressante. Fatores como
leveduras com baixa atividade (vencidas e velhas) e falhas na oxigenação do mosto podem ser fatores
influenciadores na formação do acetaldeído.
Durante a fermentação alcoólica, outros subprodutos podem ser produzidos, dependendo das con-
dições do meio. Assim como vimos para o acetaldeído que não consegue se tornar etanol, veremos, a
seguir, algumas condições que podem gerar on/off-flavors em nossa cerveja.
Choque hipertônico
(sal, açúcar)
Segundos
FLUXO DE GLICEROL Horas ACÚMULO DE GLICEROL
para minutos
Adaptação:
fluxo normal
de água,
Rápido ganho de água, crescimento normal
aumento da pressão DIMINUIÇÃO DA
interna e esticamento OSMOLARIDADE
da célula DO MEIO
Choque hipotônico
UNIDADE 4 123
Formação dos álcoois superiores
Álcoois superiores são uma Quadro 1 - Biossíntese de aminoácidos e respectivos álcoois superiores
classe de álcoois também cha-
Cetoácido
mados de óleos fúseis, aos quais Aminoácido Álcool superior
intermediário
muitas vezes é atribuída a sen-
sação de solvente, queimação, Leucina alfacetoisocapróico álcool isoamílico
ocasionada por algumas bebi-
das alcoólicas. Nem todos os ál- Valina alfacetoisovalérico álcool isobutílico
coois superiores são off-flavors,
porém em excesso podem pre- alfaceto betametil-
Isoleucina Álcool isoamílico
valérico
judicar a bebida final. Eles são
formados durante a biossíntese Treonina alfacetobutírico Álcool n-propílico
de alguns aminoácidos, como
a valina, a treonina e a leucina. Fonte: adaptada de Borzani et al. (2008).
Fermentação lática
Algumas bactérias dão outro destino para o piruvato, e não é o etanol. Lactobacillus, Streptococcus e
Pedicoccus fermentam glicose, frutose, galactose, manose e lactose formando ácido lático como pro-
duto final. Nesse caso, o piruvato é assistido pela enzima lactato desidrogenase, conforme Figura 16.
O O- NADH + H+ O O-
C NAD+ C
C O HO C H
CH3 Lactato- CH3
-desidrogenase
Piruvato L-Lactato
G’º = -25,1kJ/mol
Figura 16 - Conversão do piruvato em lactato
Fonte: adaptada de Nelson e Cox (2014).
Algumas cervejas, principalmente as ácidas (ou sour, em inglês) são assistidas por uma acidificação
lática, fazendo uso de microrganismos que fermentam até ácido lático. Dessa maneira, o pH é reduzido
como ação das bactérias e uma fermentação alcoólica posterior é conduzida.
A seguir, a Acetil-CoA entra no ciclo de Krebs e coenzimas como NAD e FAD são reoxidadas pelo
acoplamento de elétrons das moléculas de oxigênio, conforme Figura 18.
+ H2O HS-CoA
Acetil-CoA Citrato
Fe+2
Oxaloacetato Isocitrato
NAD NAD CO2
NADH2 NADH2
Malato Cetroglutarato
NAD NADH2
+ H2O
TPP Mg+2
Fumarato + HS-CoA CO2
Succinil-CoA
FAD HS-CoA
+ H2O
FADH2 GDP + Pi
GTP
Figura 17 - Ciclo de Krebs
Succinato Fonte: adaptada de Borzani et al. (2008).
Mais importante que compreender os passos para que o ciclo ocorra de maneira correta, cada passo
exige cofatores, coenzimas, íons metálicos e outras substâncias. Fica fácil analisar que a ausência deles
pode complicar a correta conversão das substâncias. Você, como profissional da Produção Cervejeira,
ao diagnosticar substâncias “indevidas” na fermentação, deve se atentar para em qual parte do processo
os fermentos não conseguiram completar o ciclo, muito provavelmente pela ausência de cofatores e
coenzimas. É muito importante que o mosto seja saudável e que os fermentos possuam células saudáveis.
Antimicina A Citrocromo b
ATP
Citrocromo c
Citrocromo a/a3
Cianeto
Sulfeto ATP
Figura 18 - Reoxidação de coenzimas
-2 assistidas pelo oxigênio
O O Fonte: adaptada de Borzani et al. (2008).
Bactérias Acéticas
Uma característica muito conhecida quando se trata de contamina- Quando há a ausência de eta-
ção é a acidificação acética das bebidas alcoólicas. O famoso aroma/ nol no meio, as bactérias acéti-
sabor de vinagre está associado à contaminação por bactérias acé- cas convertem a glicose em gás
ticas, que sob condições aeróbias convertem o etanol das leveduras carbônico e água, utilizando do
em ácido acético (BORZANI et al., 2008). ciclo de Krebs normalmente.
No entanto, em vias aeróbias,
CH3 CH3 outras moléculas podem ser
+ Coenzima ox. + Coenzima red. convertidas a acetil-coenzima
CH2OH CHO A. Ácidos graxos e aminoácidos,
etanol acetaldeído por exemplo. A seguir, veremos
como os microrganismos con-
CH3 H2O CH3 seguem converter ácidos graxos
+ Coenzima ox. + Coenzima red. e metabolizá-los.
CHO COOH
ácido acético
UNIDADE 4 127
Oxidação dos Ácidos
Graxos e Compostos
do Lúpulo
Os lipídeos podem ser degradados de duas maneiras: por vias enzimáticas, sendo assistidos por li-
pases em presença de oxigênio, ou pelo mecanismo que chamamos de auto-oxidação. De qualquer
forma, essas duas vias chegam a um resultado final de uma molécula chamada de trans-2-nonenal,
que é caracterizada pelo off-flavor de papelão. A oxidação do mosto e da cerveja pronta pode acelerar
o processo de formação dessa substância. Podemos verificar os mecanismos por meio da Figura 20.
Lipídios
Não
Enzimático Enzimático
Lipase
Auto-oxidação
Ác. Graxos
livres
Lipoxygenase O2
9 - LOOH 9 - LOOH
Precursores
T-2-nonenal
Além das leveduras, os lipídeos e ácidos graxos estão presentes no malte e nas resinas do lúpulo, sendo
extremamente sensíveis à oxidação. Quando a mosturação é bem conduzida, dificilmente as lipases
do malte atuarão degradando essas substâncias, porém processos de autólise e oxigenação incorreta
do mosto podem prejudicar sensorialmente a cerveja, com relação aos lipídeos. As resinas do lúpulo,
principalmente as iso-humulonas pós-fervura, são facilmente oxidadas pela ação da luz, produzindo um
composto conhecido como metilbut-2-eno-1-tiol (MTB), sendo sensorialmente percebido na ordem
de ng/L. Esse off-flavor também é conhecido como “lightstruck” e está presente na maioria das cervejas
que não são acondicionadas em garrafas âmbares ou quando lúpulo utilizado não é fresco.
UNIDADE 4 129
O mecanismo de formação do “lightstruck” está esquematizado
na Figura 21.
O O O O
h (350-500 nm)
R R
HO Sensitizador HO
O OH (Riboflavina) OH
ISOHUMULONAS
HS
Fonte de enxofre
O termo “biossíntese” vem de uma síntese biológica, ou seja, a geração de um produto por fins biológicos,
em que duas ou mais unidades formam uma única, maior em tamanho e de maior peso molecular. Esse
termo é empregado quando falamos de construção das biomoléculas cervejeiras, que verificamos na
Unidade 2; e a construção de proteínas, que depois se tornarão enzimas, de lipídeos, de coenzimas, ATP,
NAD e tantas outras necessidades que a célula precisa para que, de fato, ela consiga sobreviver. Quando
uma célula vai se multiplicar, dividindo-se, ela precisa produzir tudo que ela já tem, só que em dobro.
A nova célula precisa possuir uma carga nova das mesmas substâncias, garantindo sua propagação.
Os sistemas que envolvem a biossíntese são complexos, porém devemos compreender que há uma
regulação genética que auxilia a célula a produzir novas biomoléculas. Na próxima unidade, com-
preenderemos como essa regulação ocorre, mas por hora, é importante entender que a célula com-
preende o que ocorre no seu meio e se divide, geralmente, quando há condições saudáveis no meio.
Sua levedura só irá se multiplicar se o mosto cervejeiro estiver com boa quantidade de nutrientes e,
claro, depende também das características genéticas da levedura.
Quando falamos sobre biossíntese de carboidratos, não podemos deixar de falar sobre o malte. Você já
parou para pensar como o grão de malte adquiriu todo aquele amido? O amido que vai ser quebrado
e se transformará na sua cerveja veio da fotossíntese da planta, antes da colheita do grão de cevada. As
plantas, principalmente, têm a capacidade de utilizar a energia oriunda da luz para agregar gás carbônico e
água em unidades maiores, ou seja, em açúcares prontos para serem utilizados como energia (Figura 23).
As leveduras não têm essa capacidade, e apenas conseguem sobreviver em meios que possuem
açúcares, para só assim quebrá-los e aproveitarem sua energia. Ao longo do ciclo de vida da planta,
unidades de glicose são formadas, oxigênio é liberado na atmosfera e a planta consegue acumular
energia na forma de açúcares. Para compactá-los em unidades menores, a planta retira água das cadeias
e as une, formando o amido.
UNIDADE 4 133
Assim como as plantas possuem
Amilase
as enzimas ideais para a união
das unidades de glicose, elas
possuem as enzimas necessárias
para a quebra do amido. As uni-
dades de glicose serão absorvi-
das pela planta nos estágios de
germinação, assim como ocorre
com o malte. As leveduras ab-
sorvem os açúcares, utilizando-
-os e acumulando-os, de acordo
com as necessidades, sendo um
Amilopectina
equilíbrio de transferência de
Figura 24 - Comparação entre as estruturas do amido (esquerda) e do glicogênio energia dentro da nossa cerveja.
(direita)
A síntese de ácidos graxos tem um papel importante na produção cervejeira, pois está relacionada
com a formação de novas membranas celulares, o que é imprescindível para a replicação das levedu-
ras. Como vimos várias vezes neste livro, uma bicamada lipídica produz o lisossomo para as células.
Assim, o principal “ingrediente” para a síntese dos lipídeos é biossíntese de ácidos graxos. Para isso, a
biossíntese se inicia a partir da coenzima acetil-CoA, que surge do ciclo de Krebs. Sabe o que isso quer
dizer? Há necessidade de vias aeróbias para a formação de ácidos graxos, devido a essa coenzima ser
sintetizada apenas no ciclo de Krebs. O oxigênio, ou melhor, a oxigenação do mosto é fundamental
para garantir aceti-CoA suficiente para a replicação celular, no início da fase de fermentação. Além
disso, é um processo cíclico de incorporação até a formação de ácido mirístico ou ácido palmítico
(BORZANI et al., 2008).
D(-)-beta-oh-butiril-SACP crotonil-SACP
O composto butiril-SACP, da Figura 26, retorna para a reação inicial de condensação de malonil em
um processo de agregação.
Quanto conhecimento a respeito do processo cervejeiro você compreendeu até aqui, não é mesmo?
Entendeu como os fermentos cervejeiros transformam os açúcares em álcool e em outros subprodutos,
compreendeu como a nutrição do mosto cervejeiro evita estresses e produz uma cerveja mais limpa e
neutra. Agora, após mais um passo na escadaria do conhecimento, você analisou a nível molecular como
as reações químicas dentro das células ocorrem, e em cada ciclo você conseguirá analisar problemas e
verificar quando um produto indesejado aparece na sua cerveja, oriundo de um passo mal sucedido.
Por fim, compreendeu as reservas energéticas das células, como elas são produzidas e a importância
da oxigenação do mosto cervejeiro.
A oxigenação do mosto cervejeiro é extremamente importante para que a fermentação seja saudável.
Caso haja falta de oxigênio no início, as leveduras irão produzir acetil-CoA por meio da degradação
de outros produtos ali presentes, que podem produzir off-flavors como subprodutos. Normalmente,
satura-se o meio de oxigênio para a inoculação da levedura.
Para saber mais, acesse:
https://learn.kegerator.com/wort-aeration-and-oxygenation/.
UNIDADE 4 135
Você pode utilizar seu diário de bordo para a resolução.
136
3. O ciclo de Krebs é a via aeróbia de aproveitamento das ligações do piruvato. Por
vias aeróbias, a glicose fornece 32 ATPs por molécula.
Assinale Verdadeiro (V) ou Falso (F):
( ) O oxigênio do ciclo de Krebs serve para reagir com o piruvato em uma reação
semelhante a uma queima, gerando energia de combustão.
( ) O oxigênio atua como o aceptor final de elétrons.
( ) Por vias anaeróbias, há maior geração de energia do que por via aeróbias.
4. Você está trabalhando com adjuntos em sua cerveja, por esse motivo você anda
tomando muito cuidado com o processo. Contudo, tem percebido que suas
cervejas mais alcoólicas estão com sensação de solvente, quando tragadas.
O tecnólogo em produção cervejeira de sua cervejaria alerta que as cervejas
estão produzindo álcoois superiores. Disserte sucintamente o que pode estar
ocorrendo para a formação de álcoois superiores e sugira uma maneira de
evitar esse transtorno.
137
LIVRO
A Arte da Fermentação
Autor: Sandor Ellix Katz
Editora: Tapioca
Sinopse: Sandor Ellix Katz é um experimentalista autodidata da fermentação.
Ele também escreveu Wild fermentation: the flavor, nutrition and craft of live-cul-
ture food (Chelsea Green, 2003), que a revista Newsweek chamou de “a bíblia
da fermentação”, para divulgar a sabedoria da fermentação e desmitificar a
fermentação caseira. Desde a publicação do livro, Katz conduziu centenas de
workshops por toda a América do Norte e ao redor do mundo, na função do
que ele descreve como um “revivalista da fermentação”.
WEB
Fusel alcohols
Nesse artigo da Beer and Brewing, o autor explica a formação dos álcoois su-
periores na produção cervejeira e a sua contribuição no aroma e sabor final.
Além disso, o site promove muitos artigos interessantes a respeito da produção
de cervejas.
Para acessar, use seu leitor de QR Code.
WEB
138
BORZANI, W.; SCHMIDELL, W.; LIMA, U. de A.; AQUARONE, E. Biotecnologia Industrial: Fundamentos.
São Paulo: Blucher, 2008. Volume 1.
DE KEUKELEIRE, D.; HEYERICK, A.; HUVAERE, K.; SKIBSTED, L. H.; ANDERSEN, M. L. The Lighstruck
Flavor: The Full History. Cerevisia, 33, pp. 133-144, 2008.
HOHMANN, S.; MAGER, W. H. Yeast Stress Responses. New York: Springer, 2010.
NELSON, D. L.; COX, M. M. Princípios de bioquímica de Lehninger. 6. ed. São Paulo: Artmed, 2014.
REFERÊNCIA ON-LINE
139
1. D.
2. D.
3. D.
4. Os álcoois superiores são produzidos quando há sintetização de aminoácidos, o que pode estar relacionado
à pouca ação de enzimas proteolíticas, devido ao baixo teor proteico dos adjuntos. Deve-se substituir os
adjuntos por grãos com maior nível de proteínas ou utilizar nutrientes comerciais.
140
141
142
Me. Maycon Vinícius de Senna Ribeiro
Biotecnologia
Cervejeira
PLANO DE ESTUDOS
OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
• Compreender os mecanismos de síntese proteica através • Analisar recombinação gênica e seu impacto em micror-
de ácidos nucléicos e cromossomos. ganismos.
• Elucidar a seleção de fermentos, lúpulos e maltes cerve- • Compartilhar conhecimentos a respeito de ética e segu-
jeiros através da seleção artificial. rança referentes a modificação genética.
Ácidos Nucleicos
e Cromossomos
P A
P + D + A = D
Grupo fosfato Pentose Nucleotídeo Base nitrogenada
UNIDADE 5 145
Grupo fosfato
O grupo fosfato encontrado nos nucleotídeos é o mesmo encontrado nas moléculas de ATP (Unidade
4). Afinal, o próprio ATP, como o estudamos, é um nucleotídeo.
Bases nitrogenadas
É importante compreender que, quando falamos de regulação gênica, DNA e RNA, estamos falando de
informações criptografadas por seres vivos. A levedura sabe qual enzima produzir para metabolizar os
açúcares, pois seu DNA possui a informação correta para que ela produza tal enzima. Essa informação vem
da disposição das bases nitrogenadas ao longo da cadeia. Cada base é um código que irá determinar a união
de um aminoácido, produzindo, assim, a proteína necessária. As bases nitrogenadas são ao todo 5, sendo 4
para o DNA e 4 para o RNA, com a mudança de apenas uma do DNA para o RNA (Figura 3).
Formados os nucleotídeos, agora eles serão unidos para a construção de uma molécula maior, que possa
decodificar a produção de todas as proteínas e enzimas da célula. Em uma única molécula, todos os
passos da vida estão inseridos. Os nucleotídeos se ligam por meio das ligações do grupo fosfato com
as pentoses, pois, como sabemos, o grupo fosfato agrega alta energia em suas ligações, impedindo o
rompimento dessa cadeia. O DNA, em particular, irá se comportar como uma fita dupla, em que as bases
nitrogenadas de uma fita se ligarão às bases nitrogenadas da outra, como está apresentado na Figura 4.
ligação de
hidrogênio
Timina T A Adenina
Citosina G C Guanina
G C
Açúcar
A T
Grupo Fosfato
UNIDADE 5 147
Em particular, a molécula de
DNA é muito grande. Pense:
ela deve conter o “script” de
toda uma vida de uma célula.
A fita ensina como a célula re-
plica, como sintetiza proteínas,
enzimas, paredes celulares, en-
zimas de reservas energéticas,
de locomoção e tantas outras
necessidades de sobrevivência
das células. Tudo decodificado
em uma única molécula. Ape-
sar de imensa, a molécula de
DNA é fina, e consegue reali-
zar um empacotamento per-
feito para caber dentro de uma
célula. Uma molécula de DNA
pode ter centenas de milhões
de nucleotídeos. Na Figura 5,
vemos a diferença de tamanho
de uma cápsula viral e seu DNA Figura 5 - Cápsula de um vírus e sua fita única de DNA em seu entorno
Fonte: Nelson e Cox (2014, p. 979).
que foi retirado.
O RNA é composto de fita única, e isso se deve ao fato de que essa fita irá encaixar perfeitamente quando
for necessária a produção de proteínas. O DNA carrega a informação genética que será repassada ao
RNA, este que irá se responsabilizar pela síntese de proteínas (Figura 6).
Transcrição
Translação
Replicação
Transcrição reversa
Proteína
Dentre os diversos tipos de RNA, daremos enfoque a alguns tipos que possuem consequências diretas
na produção cervejeira.
Proteína formando
Sítio ativo
Subunidade longa
Aminoácido
tRNA
mRNA
Figura 8 - Esquema
Subunidade pequena da síntese proteica
no ribossomo
UNIDADE 5 149
Cromossomos
Já compreendemos como as
proteínas são formadas, onde a
informação genética se encontra
e a complexidade das moléculas
dos ácidos nucleicos. No entan-
to, por várias vezes, falamos do
tamanho dessas moléculas. Uma
única fita de DNA pode chegar
a 8,5 cm de comprimento! É
um comprimento muito gran-
de para uma única molécula.
A vida criou uma maneira de
organizar essa fita de forma que
ela não se enrole desgovernada-
mente e consiga ser replicada fa-
cilmente quando as leveduras se
dividem e formam novas células.
Para isso, proteínas chamadas de
chaperonas dão cabo de enrolar
o DNA de forma correta, con-
Figura 9 - Proteínas chaperonas condensam o DNA formando o cromossomo
densando-o em uma estrutura
chamada de cromossomo. O Agora que você já compreendeu como a informação gênica se
cromossomo carrega o mate- manifesta e é guardada nos seres vivos, entenderemos como que
rial genético do DNA de forma determinadas partes do DNA podem determinar características,
compacta, auxiliando a célula a como, por exemplo, a capacidade de esterificação das leveduras
transmitir essas informações. belgas, que conferem aromas e sabores variados à cerveja.
UNIDADE 5 151
Com os lúpulos, não foi diferente. O cruzamento e seleção de plantas, principalmente quando
nos referimos a lúpulos americanos, trouxeram aromas e sabores de frutas amarelas, abacaxi, manga
e maracujá, coisas impensadas nos cultivos de lúpulo da Alemanha antigamente. Devemos reforçar,
aqui, que não se trata de organismos geneticamente modificados, assunto que veremos no próximo
tópico, mas são apenas fruto da seleção artificial, do simples mecanismo de orientar as mutações para
uma determinada direção.
Quando sequenciaram o material genético das leveduras Lagers, de cervejas produzidas na Alema-
nha, observou-se grande similaridade com uma levedura patagônica. Por esse motivo, acredita-se
que leveduras originárias da Argentina tenham sido trazidas em porões de navios e se adaptado às
condições das cervejarias alemãs. Com o tempo, as mutações as tornaram uma nova espécie.
Para saber mais, acesse: https://www.latimes.com/science/sciencenow/la-sci-sn-lager-yeast-geno-
me-20150811-story.html.
Mutações
As mutações ocorrem ao acaso, quem as direciona para a criação de uma nova linhagem é a seleção
artificial. Fazemos isso com fermentos, lúpulo e até cevada. Dessa maneira, conseguimos fermentos
mais resistentes, lúpulos com aromas diversos e cevadas mais resistentes a temperaturas altas.
UNIDADE 5 153
Recombinação
em Microrganismos
Recombinação em Bactérias
A conjugação bacteriana foi descoberta com ex- Quando uma bactéria ou uma linhagem morre,
perimentos com a bactéria Escherichia coli, em seu material genético é expulso da célula e ele fica
que duas linhagens com problemas nutricionais à deriva. Contudo, se uma linhagem conseguir
entraram em contato durante certo tempo e pas- absorver esse material genético, ele poderá pro-
saram a desenvolver células recombinantes sem duzir recombinantes com características da célula
problemas nutricionais (BORZANI et al., 2008). morta (BORZANI et al., 2008). Esse mecanismo
Se apenas uma nova mutação tivesse ocorrido, não é chamado de transformação bacteriana e está
seriam apresentadas tantas células sem deficiên- apresentado na Figura 12.
cias, nem em tão pouco tempo. Era evidente que as
linhagens haviam trocado seu material genético.
A
A a a
B B B B
C Lise da Fragmentos b
célula C incorporados c c
à bactéria Recombinação
Fragmentos
livres de DNA
Figura 12 - Mecanismo de transformação bacteriana
Fonte: adaptada de Borzani et al. (2008).
Transdução
A transdução é muito similar à transformação, porém é realizada por um vírus. Um vírus infecta a
célula e compartilha com ela um material genético, que agora a bactéria passará a ter. A partir dela,
surgem bactérias transformadas e, por assim dizer, recombinantes (BORZANI et al., 2008). Hoje em
dia é o método mais comum para seleção de características e de modificação genética.
Novas partículas
Bactéria do vírus
Capa viral
A A a
A
A Infecção e
Infecção
Vírus Recombinação
DNA do Lise da
vírus célula Nova bactéria
UNIDADE 5 155
Recombinação em Leveduras
Anteriormente, falamos sobre a hibridização das leveduras para a criação da levedura Lager, falando
sobre um cruzamento das Ales com uma levedura patagônica. Agora, entenderemos como ocorreu esse
cruzamento e como podemos utilizar dos ciclos sexuais das leveduras para produzir recombinantes.
Gemulação haplóide
a
Fusão nuclear
Heterocário
Ascóporos transitório
Fusão nuclear
Asco
Meiose
Gemulação diploide
Além do ciclo normal sexual das leveduras, apresentado na Figura 14, as leveduras Saccharomyces ce-
revisiae e outros fungos realizam o ciclo parassexual dos fungos. Esse ciclo descreve o cruzamento com
linhagens distintas com fases diploides e haploides, em que há troca genética e surgem recombinantes.
Além disso, as leveduras também podem sofrer os processos de transformação e transdução, em
ambientes específicos. Hoje, a maioria das recombinações de leveduras ocorre por um desses processos
descritos anteriormente.
Recentemente uma empresa desenvolveu uma linhagem de leveduras para vinho incapaz de produ-
zir sulfeto. Esse foi um marco para a produção de vinhos, que sempre sofreu com a geração desse
produto em seus mostos. Os geneticistas encontraram o gene responsável por essa produção e o
impediram de ser passado adiante, criando uma linhagem sem o gene em questão.
UNIDADE 5 157
ponto é seguro trabalhar com essas bactérias em vez de procurar o gene em outros microrganismos?
É sobre essas questões que este último tópico irá tratar: os conceitos de bioética e biossegurança nos
processos biotecnológicos.
Bioética
O código de Nuremberg surgiu a partir de um tribunal no mesmo local, em que dez tópicos foram
descritos como necessários a serem seguidos quando algum tipo de pesquisa com seres humanos
fosse adotado. Foi o marco dos conceitos bioéticos da década de 70.
Para saber mais, acesse: http://www.bioetica.org.br/?siteAcao=DiretrizesDeclaracoesIntegra&id=2.
A biossegurança está mais envolvida em relação a patologias, seja direta ou indiretamente. Ao longo
dos anos, as populações, desconhecedoras dos procedimentos sanitários, tiveram muito do seu povo
dizimado, principalmente durante a Idade Média. Com a criação do microscópio, em 1676, pode-se
observar que as doenças eram causadas por criaturas vivas muito pequenas. No entanto, apenas no
fim do século XVIII é que as cidades passaram a ter condições sanitárias que evitassem as doenças
contagiosas. Os trabalhos de Pasteur evidenciaram a eficácia das condições de assepsia para evitar
contágios e contaminações (FONSECA; MELLO, 2015, on-line)1.
Em 1995, com a aprovação da Lei nº 8.974, de 5 de janeiro de 1995 (BRASIL, 1995), o Brasil evoluiu
em termos de procedimentos de segurança em laboratórios e serviços de saúde. A biossegurança no
Brasil possui duas vertentes: a legal, que engloba os procedimentos realizados em relação ao uso de DNA
recombinante, células-tronco; e a praticada, que se refere aos procedimentos de químicos, biólogos e
físicos no dia a dia de experimentos e identificação de perigos. Além disso, existe a biossegurança do
dia a dia da população, que se refere às condições de trabalho de diversos trabalhadores que estejam
direta ou indiretamente em contato com situações similares de patogenia.
É muito comum que alguns conceitos de Bioética e Biossegurança sejam, muitas vezes, os mesmos.
Isso ocorre, porque as duas vertentes caminham juntas, com um único objetivo em comum: o bem-
-estar social, livre das patologias e dos sofrimentos, humanos e não humanos.
Iniciamos este tópico levantando algumas situações em que os conceitos de bioética e biossegurança
fossem testados. Muitas vezes, as principais polêmicas possam estar envolvidas apenas nas patologias
da medicina e pouco tenham a ver conosco. No entanto, é importante que você compreenda que as
cervejas são alimentos, e que são muito passíveis de contaminação. Além disso, o uso de matérias-
-primas de procedência duvidosa pode causar problemas a longo prazo. Em uma era em que testar
de tudo é diferencial, esteja atento e observe o que é seguro e o que não é. E, principalmente, utilize os
equipamentos de segurança e adote os procedimentos de assepsia e sanitização em todos os processos
que envolvam a produção cervejeira.
UNIDADE 5 159
Caro(a) aluno(a), percorremos um grande trecho na estrada do conhecimento. Nesta última unidade,
conhecemos como a síntese proteica ocorre, como os seres vivos desenvolvem outras características
baseando-se no seu DNA e como isso afeta os descendentes. Além disso, você conheceu como os orga-
nismos se modificam para obterem características diferenciadas e como elas podem ser selecionadas
por meio da seleção artificial. Depois, você analisou a tecnologia do DNA recombinante e como ele
pode ser utilizado para direcionar as mutações nos seres vivos, produzindo leveduras diferenciadas
para a produção cervejeira. Por fim, com todo esse conhecimento, você verificou a história dos padrões
éticos e seguros da biotecnologia e como você, produtor de cervejas, tem tudo a ver nessa história.
Despedimo-nos aqui, mas a caminhada continua.
161
3. Sobre mutações e seleção artificial, assinale Verdadeiro (V) ou Falso (F):
( ) As mutações ocorrem ao acaso e podem ou não ser úteis aos seres vivos.
( ) As mutações sempre são úteis e sempre geram uma nova espécie.
( ) A seleção artificial nada mais é do que o direcionamento de organismos mu-
tantes a se tornarem uma nova linhagem.
162
LIVRO
FILME
WEB
DNA recombinante
Neste conteúdo do site Toda Matéria, há explicações alternativas para a tecno-
logia do DNA recombinante.
Para acessar, use seu leitor de QR Code.
163
BORZANI, W.; SCHMIDELL, W.; LIMA, U. de A.; AQUARONE, E. Biotecnologia Industrial: Fundamentos.
São Paulo: Blucher, 2008. Volume 1.
BRASIL. Lei nº 8.974, de 5 de janeiro de 1995. Regulamenta os incisos II e V do § 1º do art. 225 da Consti-
tuição Federal, estabelece normas para o uso das técnicas de engenharia genética e liberação no meio ambiente
de organismos geneticamente modificados, autoriza o Poder Executivo a criar, no âmbito da Presidência da
República, a Comissão Técnica Nacional de Biossegurança, e dá outras providências. Brasília: Presidência da
República, 1995. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L8974.htm. Acesso em: 01 abr. 2020.
NELSON, D. L.; COX, M. M. Princípios de bioquímica de Lehninger. 6. ed. São Paulo: Artmed, 2014.
REFERÊNCIA ON-LINE
1
Em: https://www.researchgate.net/publication/330422009_BIOETICA_E_BIOSSEGURANCA. Acesso em:
28 fev. 2020.
164
1. D.
2. B.
3. D.
165
166
167
CONCLUSÃO
Caro (a) aluno (a), como é bom olhar para trás e ver o quanto aprendemos nestas 5
unidades. Iniciamos nossos estudos compreendendo e contextualizando a bioquímica
com a produção cervejeira. Compreendemos como o fato de produzir cervejas não só
tem tudo a ver com a bioquímica, mas como pode ser muito bem analisada por esse
ponto, por meio do conhecimento das biomoléculas. A seguir, compreendemos cada
um dos tipos de biomoléculas no mosto cervejeiro e a importância de cada uma delas
para o resultado final. Entendemos como o malte influencia nas características desde
sua germinação até a cerveja final. Depois disso, compartilhamos os conhecimentos a
respeito das enzimas cervejeiras, como elas funcionam e quais são as consequências
de otimizar a atuação de umas em relação a outras, do parâmetro bioquímico ao
parâmetro cervejeiro. Vimos como as leveduras e bactérias (fermentos cervejeiros)
transformam as biomoléculas do mosto em cerveja, tudo isso para obterem energia
e sobreviverem. Entendemos, também, a importância da oxigenação do mosto cer-
vejeiro e o que isso tem a ver com a sobrevivência do fermento.
Por fim, vimos porque os seres vivos são tão diferentes, principalmente as nossas
leveduras com características tão diferentes e guiadas pela molécula de DNA. Anali-
samos como as mutações podem criar linhagens diferenciadas, guiadas pela seleção
artificial. O DNA recombinante e sua capacidade de transferir características entre
espécie também foi nosso objeto de estudo. Para fechar nosso conhecimento da Bio-
química Cervejeira, vimos os conceitos de Bioética e Biossegurança, compreendendo
os anseios e as necessidades de padronizações seguras e livre de sofrimentos para
humanos e não humanos. Agora, caro(a) aluno(a), é com você! E lembre-se: a estrada
do conhecimento nunca termina. Abraços!
Quando identificar o ícone de QR-CODE, utilize o aplicativo Unicesumar Experience para
ter acesso aos conteúdos digitais. O download do aplicativo está disponível nas plataformas:
OÃÇAUDARG
ISBN: 978-65-5615-016-1
0 251081 820203
RADUAÇÃO
OÃÇAUDARG
OÃÇAUDARG