Psicologia e Vida Espiritual - FAC 15-11-22
Psicologia e Vida Espiritual - FAC 15-11-22
Psicologia e Vida Espiritual - FAC 15-11-22
(Oferecido na FAC
Anápolis, Setembro-Outubro 2022)
Procuramos conhecer o próprio autor, Santo Tomás, sua vida e obra. (p. 2)
Santo Tomás, não é um pensador do qual se precisa distinguir o 1º e 2º ou até 3º fase na vida,
como estamos bem acostumados no estudo dos filósofos na História de Filosofia.
Podemos antes constatar que não poucas vezes conseguiram outros autores pelo contato com as
Obras de Santo Tomás chegar a sua fase definitiva de seus pensamentos;
Podemos lembrar de Edith Stein – a melhor aluna de Husserl e sua fenomenologia,
Ou de Conrad Baars que queria desistir da Psicologia para não perder a fé, mas não desistiu
quando foi indicado a Psicologia de S. Tomás.
“Brasil Paralelo” lembrou nestes dias de Chesterton que tinha chegado à tentação de suicídio, e o
mesmo aconteceu a Jacque Maritain e sua esposa; nenhum deles se entregou ao desespero por ter
encontrado os escritos de Santo Tomas.
Santo Tomás
- não só perguntou desde o início – segundo o que sabemos – pelo último fim, Deus, de modo
que este rumo nunca precisava corrigir.
Mas também recebeu durante 9 anos no Mosteiro beneditino de Monte Cassino uma grande
familiaridade com a Revelação divina, e em particular devemos pensar nos Salmos, que na
Liturgia são recitados dia por dia no coro dos Monges.
Neste livro dos Salmos se encontra tudo da vida humana, se fala de todos os aspetos,
principalmente dos lados dolorosos com da persegução por outros, ou da experiência de angústia
interior – porém, o orador é sempre conduzido à entrega confiante em Deus onipotente e
cuidador. (Sl 55: “Meu coração treme no meu peito e terrores mortais se abateram sobre mim.
Temor e tremor me invadem e me oprime o horror...
Eu invoco a Deus e o Senhor me salva.”
Sl 56: “Na hora do medo, em ti me refugio.”)
Se Santo Agstinho (e outros) entendem os Salmos como descrição da vida do Messias que virá,
como Redentor de todo o mal, então mais ainda, depois da Encarnação e obra redentor de
JESUS. Quem reza estas orações, encontra sempre luz nas trevas de sua vida porque é guiado a
JESUS e olha a Ele.
Aqui devemos partir quando queremos procurar entender este Autor tão distante de nós segundo
o tempo, e tão próximo segundo os seus pensamentos e ensino (como estas pessoas do nosso
tempo mostram).
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Psicologia como próprio estudo - não digo como “ciência” – surgiu apenas nos últimos tempos,
no século 19, alguns colocam até no século passado, depende se se quer ver nas reflexões de
Herbart, que quis ocupar oa cátedra de Kant ou, mas tarde com Wundt que institui o primeiro
laboratório com exames tecnicas de funcionamentos espirituais.1
Santo Tomás de Aquino viveu no seculo XIII. Então, deve-se anted de tudo perguntar: Será que
pode ter uma concexão? Ele tem um lugar entre psicólogos que tem a ideia do homem como uma
máquina ou um objeto (Torelló, 90). Ou é só por piedade que se refere a ele?
Echavarría faz referência a tantos assuntos tratados por Santo Tomás, hoje chamados psicológicos,
e como tema apresenta três, quatro ou seis diferentes espécies, motivos e efeitos (cf. p. 592).
Não se espera hoje tal com um autor do passado, e assim conhecer Tomás de Aquino como um
dos maiores psicólogos! Echavarría diz:
“Santo Tomás, em particular, se mostrou não apenas um grande sintetizador da tradição neste
ponto [a vastidão da experiência acumulada pela tradição cristã (cf. p. 580) no conhecimento dos
problemas que afligem a personalidade humana], mas também identificou inteligentemente o
núcleo espiritual que distingue essa desordem de outras formas de tristeza ... soube reconduzir
todos os sintomas e efeitos que os Padres atribuíram à acídia ao seu princípio e à sua causa. De tal
maneira, sem descuidar da descrição deste mal, ele o tornou mais inteligível, a ponto de sua
contribuição poder bem considerar-se como perene.
Comprovamo-lo ao estudar o modo pelo qual os psicólogos contemporâneos analisam essa doença
e podemos concluir, por um lado, a atualidade da solução tomista; por outro, a dificuldade da parte
dos autores recentes para alcançar uma descrição que atinja a riqueza tradicional...” (p. 541)
O segredo desse religioso da Idade Média é que ele tinha como último fim de sua vida glorificar a
Deus e, no caminho, a preocupação sacerdotal pela salvação do homem, por uma vida na verdade.
A sinceridade da sua intenção e sua santidade lhe deram a sensibilidade necessária pela alma do
homem, especialmente pelos que estão longe de Deus, pelos pecadores.
1 Wilhelm Wundt que veio a ser tradicionalmente considerado como o primeiro psicólogo experimental.
Assistente de Helmholtz em Heidelberg depois de ter sido professor em Zurique, obteve a cátedra de psicologia na
Faculdade de Filosofia de Leipzig em 1875. Foi ai, em 1879 (data crucial para a história da psicologia), que Wundt
fundou o primeiro instituto de psicologia experimental. (G. Reale, História da Filosofia, vol. 3, 390).
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do século 19 que é chamada a “psicologia sem alma”, com uma mentalidade que diz: Pode ir ao
médico como fosse ao mecânico para reparar o seu veículo; e se espera do médico demasiado
frequentemente uma “pílula mágica” com a dose exata (cf. p. 44). Este refere também certas
estatísticas com observações psico-somáticas (Ex. Sth I, 20, a 1 ad1; Torr., 33, 128).
Todos sabem hoje o que se quer dizer com isso, se trata de doenças físicas que encontram sua
causa em tensões psíquicas (cf. Torrelló, 37, 39, 40, 42). E como se explica este fenômeno? É
impossível na base da filosofia de Descartes (1596-1650) que declarou a alma e o corpo do homem
com duas substâncias independentes; segundo o corpo o homem – como todos os seres vivos – é
uma máquina. Ele é apenas relacionado, ou melhor conectado com a alma por uma “pequena
glândula, chamada pineal, situada no centro do cérebro, que constitui a sede da alma” (Reale,
História, vol. II, 386). Então, para poder explicar este fenômeno, tão claramente constatado hoje,
é necessário voltar atrás de Descartes.
E atrás desse homem e sua ideia se chega a Santo Tomás que coloca como base de toda a
compreensão do homem a união de alma e corpo,
Referindo-se ou a Aristóteles com seu hile-morfismo ou ao Cristianismo com a união da natureza
divina e humana na Pessoa de Cristo e que semelhante se encontra em cada homem, na natureza
do homem de hoje, de cada um de nós.
1) Descendência:
O Pai Conde, parente do Imperador Frederico I; Mãe é da normandia e suebia, T37.
Um eremita revelou à mãe que já estava grávida com um filho e descreveu a sua missão; T 1;
Santo Tomás nasceu 1224 ou antes do 7 de março de 1225 como mais jovem de 7 Irmãos e 5
irmãs;
escapou do fogo de um relâmpago que entrou no castelo e matou uma sua irmã, T2.
História do papel c/ “Ave Maria”, T3; BB 9; V3.
Seus irmãos serviram no exército do Imperador; mais tarde
um passou ao lado do papa e morreu martir, V6.
2) Formação:
1230 - Santo Tomás foi entregue à Abadia de Montecassiono com 5 anos para a formação, V3;
pergunta: “Quem é Deus?”.
1239 - O abade mandou em 1239 à Nápoles a) pela insegurança política e b) por causa de sua
inteligência.
Clima em Nápoles: o mundo de cidade e universidade; encontrou a filosofia de Aristóteles
e o movimento de pobreza da 1ª geração dos Dominicanos (S.Dom. + 1226).
3) Entrada na Ordem Dominicana:
1243/4 - Um irmão dominicano teve a visão de um rosto irrandiante sobre o mundo, T7.
1243 ou Janeiro 1244: Entrada na Ordem Dominicana, problema: São do lado do Papa, e pobre
(contra a dignidade da família); falece o pai.
Visita da piedosa Mãe, não cedida pelos dominicanos por desconfiança; isto causou a perseguição
pelos irmãos.
Maio 44-fim de 45: prisão familiar: leu Sagr.Escr., Officio, Sentenças de Pedro Lombardo e a
“Sofistica” de Aristóteles, e contato com a Logica e Metafísica de Arist. (V4).
Procuram convertê-lo, mas eles se converteram; uma irmã tornou-se benedictina e santa. Tentação
por uma prostituta e a vitória de Santo Tomás e aparição de (2) anjos: T8-10; V4-5.4
4) Estudos:
1245/6: Transferência a Paris, estudando com Santo Alberto Mg.,
1248: Este o levou a Colônia. Ordenação sacerdotal 1251 (V6; 1248 ?). Estuda Dionísio e
Neoplatonismo com Aristotelismo (Ética). História da “vaca voante” e do “boi mudo” (cf.
V6).
Oferta de ser abade de Monte Cassino – S.T. recusa (cf. aparição de N.Sra. seg. a V6; BB 21).
(Começa ensinar)
1252: Chamado para Paris para ensinar – Bachelar; sobre a S.Escr. e Sentenças de Pedro
Lombardo, V6.
Luta entre o clero diocesano e religioso.
Carta pessoal de Papa Alexandre IV a S. Tomás (que acabou tornar-se 30!).
3 Fontes: Tocco (1320 = T + cap.); Pieper (Tomás de Aq.); Grabmann (Thomas v.Aq.; Seelenleben); Royo Marin
(Grandes mestres de Vida espiritual, p. 255-261); Ameal (São Tomáz, p. 1-228); Vida (= V + pág.); “Breve Biografia
de S. Tomás de Aquino” (Pdf; BB); Fraile, p. 259-282.
4 Na sua clausura doméstica foi preparada uma tentação contra a sua pureza. Vencida esta como firme decisão,
implorou a Deus pela santa virgindade. Aí, caiu num sonho e lhe foram mandados dois anjos que disseram: “Nós te
cingimos em nome de Deus como pediste com o cinto de castidade que não pode ser tirado por nenhuma outra luta. E
o que não se podia obter por méritos de virtudes humanas, te será dado pelo dom da liberalidade divina. ... Tomás
acordou pela dor que este contato com os Anjos causou.” (Cf. Wilhelm von TOCCO. Das Leben des hl. Thomas von
Aquino. capítulo 4 e 34. Em: W. Eckert. Das Leben des heiligen Thomas von Aquino erzählt von Wilhelm von Tocco
und andere Zeugnisse. Düsseldorf: Patmos-Verlag, 1965, cap. 10; cf. ibid., cap. 39-41). Aqui, Santo Tomás recebeu
a graça de uma tranquilidade da mente e pureza especial que lhe fez capaz de uma perspicácia intelectual, semelhante
a dos Santos Anjos, aquele, que receberá o título “doctor angelico”.
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1256 licença de ensinar. Aula inaugural por indicação de São Domingos: Ps 103,13; V10.
5) Missão (universal):
Santo Tomás é chamado para o Cap. Geral da Ordem (com apenas 30 anos, deve elaborar com
Alberto Mg e Pedro Tarantasia Direções pelos estudos na Ordem), V11.
Chamado por Urbano IV a Orvieto por causa de re-unificação com a Igreja oriental (1261-
1264), V12. 5
Encontra Moerbecke que pode traduzir Aristóteles do grego. Agora: Mandato papal a estudar
Aristóteles!
Chamado a Roma para formar o estudo da Ordem (8 de set.1265-67), V14;
Clemente IV quer fazer T. Arcebispo de Nápoles – Tomás o implora que não; Clemente IV
chamou-o a Viterbo como leitor, V15.
1269-72: Chamado a Paris por serem as divergências tão grandes com os Averroistas (=
eternidade do mundo; nega providência e liberdade do homem; unidade do intelecto contra
alma individual, V 15-18).
Fim de 73/ini.74: Gregório X chama-o para o Concílio de Lyon (por causa do tema da união
com os gregos).
6 de dec. 73: Visão: “Tu falaste bem de mim, Tomás. Qual será a tua recompensa?". E a
resposta que Tomás deu: “Nada mais do que Tu, Senhor!” (T 34 e 52; V 19-24);
E para a escrever pois percebe na luz da graça: Tudo que escrevi é “um monte de palha!”).
5 CHESTERTON quer saber que “o franciscano Boaventura contraiu tão grande amizade com o dominicano Tomás,
que os contemporâneos os compararam a Davi e Jónatan” (C.G.CHESTERTON. Santo Tomás de Aquino: Biografia.
Nova Friburgo, RJ: Edições Co-Redentora, 2002, p. 70).
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Papa :
Imperador
1230 Monte Igreja : Estado, Estudo
Casino Internos, com
- Judeus e
- Muçulmanos
1239 Nápoles Estudo de
Aristóteles
1244/45 - familiar Prisão Pequenos opúsculos filosóficos
Aquino
1246 Paris - universitário Estudo
1248 Colonia - universitário Ordenação sac.
1251
1252-59 Paris - clero secular- 52:Bacharel bíbl.
De ente et essentia;
religioso 54: Bacharel De principiis naturae
sentenciario 54-56: Commentário às Sentenças de
56: Licentia Pedro Lombardo
docendi 56-59: In Isaiam;
57: grau: Mestre In Matthaeum;
In Boetii Trinitate,
Ad Hebreos
56 Contra impugnantes Dei cultum et
religionem
56-59 De Veritate
1259 Itália - eclesiástico Para Capítulos 59: Summa contra Gentiles, lib, 1
gerais da Ordem 59-65 In S.Paulo (de 1 Cor 11 até o
fim)
60-66 De regimine principum
1261-64 Orvieto - ecumênico Teólogo papal 61-64: Summa contra Gentiles, II-IV;
(Urbano IV) Catena aurea: 61-64 Mt; 65 Mc; 66 Lc;
67 João6
63: Contra errores Graecorum
64: Piae preces;
Officium de festo Corporis Christi.
1265 Roma Formação de 65-66: In Dionysium De Div.Nom.;
estudos p/Ordem 66: In Arist. De Anima;
Summa theologiae, pars I;
67: Summa theologiae, I-II;
De spiritualibus creaturis
67-69: In Ieremiam;
1267 Viterbo Por Clemente IV 68-72: Summa theologiae, II-II;
De Malo;
De virtutibus cardinalibus;
De spe;
De Caritate;
De substantiis separatis.
In Aristotelis Metaphysicorum;
69-72: In Ar. Meteorologicorum;
6 I.T.Eschmann afirma que Catena aurea “marca um ponto de volta no desenvolvimento da teologia do Aquinato” (A
Catalogue of St. Thomas’ Works: Bibliographical Notes” in E. Gilson. The Christian Philosophy of St. Thomas
Aquinas. New York: 1956, p. 381-430, 397); Torrell é também desta opinião (cf. p. 139).
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Perihermeneias;
I+II Post.Analyticorum;
In decem libros Ethicorum;
In librum de Causis;
In Iob;
In Ioannem.
1269 Paris Sac.secular-relig. Ensino 70: Compendium Theologiae
Ortodoxia: Polémicas com De Unitate Intellectus;
-aristot-neoplató. - João Peckham De aeternitate mundi
-aristotelismo - Siger de Brab. Quodlibetales I-IV e XII.
musulmano/crist
ão
1272 Nápoles Ensino 72: Summa theologiae, III;
In Aristotelis, De Coelo;
In Aristotelis Politicorum;
In A., Generatione et corruptione;
In Psalmos;
In epistolas S.Pauli (Rom - 1Cor 10)
6-12-1273 Parou a escrever
+ + + +
b) Visão psicológica
7 Para isso precisa a revelação, porque “a verdade sobre Deus pesquisada pela razão humana chegaria apenas a um
pequeno número, depois de muito tempo e cheio de erros” (STh, p. I, q. 1, a.1).
8 Cf. também a notícia de São Pedro-Julião Eymard, em: Theologisches. Jg. 37, n. 5-6, p. 235-238.
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Gentios; pureza e
- a obediência ele deixa-se mandar no lugar de outro, humildade de
quase cada dois anos; Santo Tomás
sempre recomeçando outro trabalho; – e não
obedece até em acompanhar um irmão à sobre a sua
cidade. inteligência e
- a devoção saudade do tabernáculo; sabedoria !
zelo no oração no coro;
celebração diária da santa Missa e
participação em 1 ou 2 outras cada dia;
oração pessoal (confessou que aprendeu
mais de joelho diante do Crucifixo
de que dos livros!
- sentido sobrenatural pensa que uma velha analfabeta é
mais sábia que um filósofo pagão.
- caridade na verdade: não aceita respeito humano:
não pergunte quem fala, mas o que disse;
respeita a liberdade até diante da questão
batizar ou não (cf. Sth p. II-II, q.10, a.12).
Sobre o fim da Vida de Santo Tomás, Tocco no capítulo 60, conta uma visão de um frade, “Irmão
Paulo de Áquila, um homem muito bom e de boa fama”. Ele teve uma visão de Santo Tomás numa
aula com muitos alunos. Nessa viu entrar São Paulo, associado com outros Santos. Santo Tomás
queria descer da cátedra para ir ao seu encontro. Porém, o Apóstolo indicou a ele de continuar a
aula iniciada. Mas o Mestre pediu ao Apóstolo de lhe dizer se sua compreensão de suas cartas
corresponde à verdade. Aí este respondeu: “Ela é tão boa como um homem nesta vida – vivendo
no corpo – pode ter; mas eu quero, que venhas comigo e eu te conduzirei ao lugar onde terás um
entendimento ainda mais claro de tudo.” Parecia que pegou ele no manto e o conduziu fora da
escola. Sobre isto, o Frade começou lamentar-se muito”, e os irmãos que estavam com ele lhe
perguntaram o que viu na visão. Ele lhes contou segundo a ordem visto. Dias mais tarde, chegou
um mensageiro a este convento e contou o falecimento de Santo Tomás. E os irmãos observaram
que era a hora na qual São Paulo convidou Tomás – nessa visão – de ir à Glória.”9
9 Fontes sobre a vida são particularmente (veja nota 23 e a Bibliografia): Tocco, Pio XI (Studiorum ducem), e “Vida
de Santo Tomás de Aquino” (www.geocities.com/tomistas/life.htm?20069).
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No fim da sua vida repetiu freqüentemente (como fosse a resposta à pergunta de sua infância):
“DEUS se tornou homem para nós. DEUS morreu por nós!”
“O Filho unigênito de Deus, querendo-nos participantes de sua divindade, assumiu nossa natu-
reza para que aquele que se fez homem dos homens fizesse deuses.” (S.Tomás. Em: CIgC 460)
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Porcurou a VERDADE:
(16) Dito isto, é bom ter consciência daquilo que se aprende da pastoral: quando se trata de
pessoas, se trata mais da vida e menos de teorias ou posições abstratas, e na compreensão das
pessoas é importante ver sua “história” pessoal (cf. n. 4), começando com eles mesmos como
com seu temperamento e seus talentos que são como potências a serem ativadas; junta a esses o
seu histórico desde a infância em casa até o acolhimento ou a rejeição pelo público. Começa com
a educação por um pai presente, violento ou paciente e uma mãe amorosa, por irmãos e irmãs
como coeducadores constantes, o ensino recebido individualmente (como nos tempos anteriores
era muito frequente) ou na comunidade de uma escola, tendo guias com sua visão particular e
pessoal de vida e do mundo, encontrando este ou outro livro que marca, conhecendo correntes
filosóficas e religiões com suas práticas.
Além disso, deve-se perguntar por acontecimentos durante a vida que tinham um impacto grave
e, consequentemente, influenciaram os pensamentos.10
Aqui vale observar que a maior contribuição na busca da verdade veio e virá também no futuro
por parte de homens das Congregações religiosas. E as razões são várias:
- Devido a sua formação pessoal cultural e religiosa;
- seus defeitos humanos são em grande parte eliminados;
- interesses pessoais, mais motivados pela curiosidades do que pela procura da verdade, também
são excluídos, em grande parte devido a renúncia de qualquer ambição pessoal;
- eles são livres, não precisam ganhar seu pão com teorias extravagantes e publicar livros novos
com ideias arriscadas por motivo financeiro.
- E por fim, eles partem de um depósito já iluminado pela verdade revelada.11
10
Seja lembrado um filme que apresenta um professor de filosofia que exige no início do seu curso que todos os
alunos escrevam numa folha: “Deus não existe”. Como, apenas, um hesitou e chegou a confrontação, se
desenvolveu primeiro uma reflexão objetiva ou teórica, mas no fim se chega a ver que o professor exigiu isto apenas
porque não conseguiu acreditar, ou melhor aceitar, que se existe Deus, como ele podia perder a sua mãe quando
tinha apenas 12 anos.
11 A consideração da vida dos filósofos permite dizer:
D. Um filósofo é um homem, e
E. No homem se distingue sua natureza ou essência (imutável e substancial), isto é, de ter alma e corpo,
e o que lhe é acidental (e variável) como a altura, o peso, a cor, conhecimento ...
e, toda a formação pertence ao acidental (pode adoecer, saber mais ou menos, ...)
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1. Que preferes entrar através dos riachos, e não imediatamente no mar, porque se deve ir através
do mais fácil até o mais difícil.
2. Isto é a minha admonição e tua instrução. Te digo: Seja lento no falar e tardio em ir ao parlatório.
3. Cuide de ter a pureza de consciência.
4. Não cesses de rezar.
5. Ama tua cela se queres ser introduzido na adega da sabedoria.
6. Mostra-te amável para com todos.
7. Não te preocupes com a vida dos outros.
8. Não te comportes com ninguém confidencialmente demais, porque confidencialidade exagerada
produz desprezo e também é uma causa do desvio do estudo.
9. Não te intrometas no falar e agir dos homens do mundo.
10. Fuja de discussões sobre todas as coisas.
11. Não deixes de imitar os exemplos dos santos e de homens justos.
12. Não olhes a pessoa que fala, mas a todo o bem que te foi dito, e retenha na memória.
13. Procura entender o que lês e ouves.
14. Sobre dúvidas, procura certeza.
15. Tudo que pode guardar no cofre da mente, coloque, como quererias encher um vaso.
16. Não procures o que é alto demais para ti.
Se seguires este exemplo, reflorescerás e darás frutos úteis na vinha do Senhor Deus".
F. Logo, um filósofo é humano, cresce, ser mais ou menos inteligente, pode errar ... (o que é diminuído num
monge ou religioso pelos motivos indicados ou, porque “morreu” a muitas dimensões variáveis da vida
humana.
Psicologia e vida espiritual - 2022, 14
Vendo a Obra de Deus como harmonioso e, assim, perfeito, é facil entender que todas as criaturas,
também Anjos e homens, “apenas” participam, ou forma uma parte desse universe maravilhoso do
Divino Criador. Consequentemente, a prudência, ou a sabedoria mais alta possivel nos diz:
Observa Deus, olha a Sua obra, tenta de entender o que Ele fez … assim conseguirás de participar
na Sabedoria Daquele que sabe TUDO e FEZ tudo Segundo as suas ideas, e essas ideas são as
originais. Não há nada mais sábio de que humildemente ecomo Maria Santíssima escutar e olhar,
ler e tentar entender o que Deus nos disse na sua obra, a criação. Isso vale para a Filosofia como,
e ainda mais, para a Teologia. Assim entendemos:
Para estudar bem, a filosofia ou seja a criação toda criada por Deus ou a Teologia como ciência de
verdades reveladas por Deus, que é o mais importante? É a attitude Mariana ou a abertura e
docilidade, a recpetividade (para o estudo fundamental, ou n sala ou pela leitura pessoal) vale dizer
1 Acolher a matéria oferecida tomando notas. Fixa-se o essencial - e para poder distinguir isto,
o professor deve apresentar a matéria em forma pedagógica e clara e o aluno deve ter certa
formação intelectual.
Em quase todas as disciplinas teológicas se transmite a fé revelada, que o homem quer acolher
com gratidão e humildade intelectual, com a atitude mariana que a Igreja se faz sua (cf. II.
Vaticano, Dei Verbum). Além deste motivo principal condicionado pela própria natureza da
teologia, cabe ao aluno a atitude acolhedora, porque
- seu mister como aluno é aprender;
- não pode já saber o que vai precisar na sua vida futura;
- sendo incapaz de especializar-se em cada uma das disciplinas, o aluno deve aproveitar dos
estudos especiais do professor;
- não se trata na Teologia de teses ou ideologias a serem discutidas, mas sim daquela doutrina da
S. Igreja, para cujo pregador e ministro o aluno quer ser formado;
- o professor ensina pela missão e confiança recebida pela autoridade eclesiástica. A base comum
no estudo teológico, como em todos os niveis da formação sacerdotal deve ser a consciência de
formar o exército de Cristo “para combaterem ospacíficos mas duros combates da verdade contra
o erro, da luz contra as trevas, do Reino de Deus contro o reino de Satanás” (Pio XI, Sobre o
Sacerdócio Católico,1935, 81)!
2 Pela revisão das aulas vale o mesmo como é dito em cima para qualquer disciplina.
3 Se depois de todo este esforço o aluno não adquire clareza nem paz e até alegria sobre a verdade
do assunto, poderia haver três causas:
a) O aluno simplesmente não compreende a verdade e talvez não se aproxima suficientemente da
matéria com oração e fé, (a filosofia se deve compreender meditando, a teologia adorando!).
b) O professor está errado com aquilo que ensinou; para chegar a esta conclusão deve-se verificar
isto antes com o julgamento de outros e a repetição de tais desarmonias com o ensino oficial da
Igreja em outros pontos.
c) O aluno não há vocação (por falta de penetração e alegria) para tornar-se membro deste
exército de estudo.
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2º Mas para isso, refletiu, raciocinou, combinou um trecho com outro etc.
Logo praticou TEO-LOGIA
Na introdução à 2ª questão da 1ª parte, no prólogo, Santo Tomás descreve o plano de sua obra
partindo do todo e sempre mais especificando – um exemplo do seu método claro no tratar
qualquer assunto!
O objetivo principal da doutrina sagrada está em transmitir o conhecimento de Deus não
penas quanto ao que ele é em si mesmo, mas também enquanto é o princípio e o fim das
coisas, especialmente da criatura racional, conforme ficou demonstrado.
[Refere às III partes de toda a obra:] No intento de expor esta doutrina, havemos de tratar:
Parte I: de Deus;
p. II: do movimento da criatura racional para Deus;
p. III: do Cristo, que, enquanto homem, é para nós o caminho que leva a Deus.
Como Exegeta
c) Sua relação pessoal à Sagrada Escritura torna-se clara nas suas duas aulas inaugurativas:
1252: De Commendatione et Partitione Sacrae Scripturae.17
12 Tradução inglêsa: The Literal Exposition on Job: A Scriptural Commentary Concerning Providence. Antlanta,
Georgia: Scholar Press, 1989.
13 Em 2011 foi publicado a versão inglês desse comentário com 1026 páginas, só do texto inglês, não bilingue.
14 A tradução do Comentário ao evangelho de São João, com 1044 páginas. O grande conhecedor de Santo Tomás,
Josef Pieper, traduziu e publicou apenas o comentário de Santo Tomás sobre o Prólogo no evangelho de São João,
como um próprio livro de 137 páginas: THOMAS VON AQUIN. Das Wort. (cf. nota 28. Na “nota introdutória” Pieper
conta que seu Professor indicou a ele os escritos de Santo Tomás como “nutritivo como pão. É era estranho,” assim
conta o grande interprete de Santo Tomás, “que o Comentário a São João era a primeira obra de Santo Tomás que caiu
na minha mão, ... desde aquele tempo não perdi de vista este homem e sua obra” (ibid., p. 8s.).
15 “São Tomás de Aquino deixou-nos um bonito comentário às ‘cartas paulinas’, que representa o fruto mais maduro
da exegese medieval” (Bento XVI, 4 de fevereiro de 2009).
16 S. THOMAE AQUINATIS. Catena aurea in Quatuor Evangelia. Taurini-Romae: Ed. Marietti, 1953; trad. em
português: Catena Aurea: Exposição contínua sobre os Evangelhos. Campinas: Ecclesiae, 2016ss. Cf. Grabmann,
Santo Tomás de Aquino, especialmente p. 42.
17 Cf. em baixo, 91-97; T. KIENINGER; P. SEEANNER. A Aula inaugural de Santo Tomás como baccalaureus
bíblicus. (latim e português) Em: Sapientia Crucis, 12 (2011), 5-53, p. 33-49: “De commendatione et partitione Sacrae
Scripturae – Sobre a Recomendação e Divisão da Sagrada Escritura”. O texto em latim é de Opuscula Theologica I,
ed. Marietti, Turino, 1954, 435-439; cf. ibid. p. 5-31: para Santo Tomás e a Sagrada Escritura; cf. TOCCO, cap. 16.
As exposições de Santo Tomás sobre os livros bíblicos são unidas no volume VI de Opera Omnia do Index
Thomisticus (sob o cuidado de R. Busa SJ). Stuttgart: Frommann-holzboog, 1980.
Psicologia e vida espiritual - 2022, 18
2 - Segue na segunda parte uma divisão da Sagrada Escritura nos livros do At e NT; especialmente
interessante são as caracteristicas que dá aos livros dos grandes profetas (ed. Marietti [= Ma] 1206)
e os livros atribuidos às virtudes cardeais (Ma 1207.b) e a divisão e característica de todos os livros
do NT.
Papa Bento XV. (1914-1922) se dirigiu já no seu primeiro ano de pontificado à Academia tomista.
Em 1917 publicou o Código do Direito Canônico em que se prescreveu no Canon 1366 § 2: “Os
mestres devem observar santamente o método, as doutrinas e os princípios do Doutor
Angélico.”
Desorientação dentro da Igreja chama para “Voltar à escolástica!”18 O novo impulso de Leão XIII
com o apoio dos seus sucessores tinha um grande sucesso. Levou o tesouro dos escritos e a genial
sabedoria do Santo Doutor de novo à luz da Igreja e da humanidade. Esta iniciativa levou ao
movimento filosófico que é conhecido hoje pelo nome de “Neotomismo”.
Nele deve-se distinguir três fases:
1º A volta dos manuais escolásticos aos textos originais de Santo Tomás.19
2º A elaboração dos princípios de Santo Tomás (um passo seriam as 24 teses tomistas) e
3º A discussão sobre os problemas atuais a serem resolvidos (por ex. a Clonagem de seres
humanos; para isso servem os grandes Congressos Tomistas).
São representantes principalmente de filosofia devido ao fato que a teologia
a) como ciência - precisa do instrumentário filosófico que consiste nos elogiados momentos
– de método (sistemático)
– princípios (verdades fundamentais, das quais se pode conhecer outras) e
– doutrina (verdades fixas) e
b) enquanto disciplina ensinada - precisa estes somente na justificação e explicação racional que
vem depois dos argumentos escriturísticos, da tradição e do magistério.
Fulton Sheen escreveu 1925: “Santo Tomás nunca foi mais atual do que hoje, ... só acidentalmente
pertence ao século XIII.” (Deus e a Inteligência, p. 14)
Etienne Gilson (1884-1978) é hoje conhecido como um dos grandes filósofos tomistas, apesar –
ou será porque ? Escreve:
“O único filósofo que me fez entender claramente todas as implicações metafísicas deste
problema [da existência de Deus] foi São Tomás de Aquino. Prezo tanto a minha liberdade
intelectual como qualquer outra pessoa, mas quero ser livre para concordar com alguém quando
considero que o que diz é correto. São Tomás de Aquino nunca pensou em nada semelhante a
uma ‘verdade tomista’. Estas palavras nem sequer fazem sentido. Considerando diversas
respostas ao problema de Deus e avaliando a sua capacidade relativa de corresponder a todos os
requisitos, cheguei à conclusão de que a melhor resposta foi dada pelo homem que, por ter sido o
primeiro a compreender as implicações mais profundas deste problema, também foi o primeiro a
curvar-se livremente à necessidade metafísica da sua solução única.
18 De 1800 – 1920 se conta 2219 publicações; 1920-1940: mais 4.764; hoje mais que 15.000 publicações!
Bochenski diz (em: A filosofia contemporânea ocidental, 1975, p. 218-227): O tomismo é um dos movimentos mais
importantes da atualidade: Bulletin Thomiste (Bibliografia com ca. 500 títulos por ano); 25 revistas de tomismo
científico no mundo; muitos Congressos, já em 1932 ss., fundação da Academia tomista no Vaticano; cf. Sapientia
Crucis VII (2006), p. 251-253.
19 A edição crítica chamada “Edição Leonina” segundo o Papa que a exigiu, uma tarefa ainda muito longe de ser
completada, deve tornar-se o instrumento para isto.
Psicologia e vida espiritual - 2022, 21
Como Ler
A Suma teológica
A Suma de Teologia de Santo Tomás de 1266 até 1273 quando parou de escrever, de modo que
ficou incompleto. Santo Tomás descreveu sua intenção logo no início assim:
PRÓLOGO
O doutor da verdade católica deve não apenas ensinar aos que estão mais adiantados, mas também
instruir os principiantes, segundo o que diz o Apóstolo: "Como a criancinhas em Cristo, é leite o
que vos dei a beber, e não ali mento sólido". Por esta razão nos propusemos nesta obra expor o que
se refere à religião cristã do modo mais apropriado à formação dos iniciantes.
Observamos que os noviços nesta doutrina encontram grande dificuldade nos escritos de diferentes
autores, seja pelo acúmulo de questões, artigos e argumentos inúteis; seja porque aquilo que lhes é
necessário saber não é exposto segundo a ordem da própria disciplina, mas segundo o que vai sendo
pedido pela explicação dos livros ou pelas disputas ocasionais; seja ainda pela repetição frequente
dos mesmos temas, o que gera no espírito dos ouvintes cansaço e confusão.
No empenho de evitar esses e outros inconvenientes, tentaremos, confiando no auxílio divino,
apresentar a doutrina sagrada sucinta e claramente, conforme a matéria o permitir
Conseguido realizar seu plano faz entender que essa obra “permanece, mesmo em nossa época,
por seu conteúdo e seu método a melhor exposição sistemática de toda a teologia especulativa,
dogma e moral” (M. Grabmann, Introdução, pág. 115).
1) Sua tríplice divisão é já mencionado nos documentos da universidade de Paris nos anos 1275-
1286, a Suma naturalis (Iª), moralis (IIª) e sacramentalis (IIIª).
Se recebe uma visão de tudo pela leitura dos prólogos para as diversas partes.
2) Há uma subdivisão em 38 tratados; 512 questões (sem contar o Supplementum) e 2669 artigos.
A referência se faz assim: Parte Iª, questão 34, artigo 5
Psicologia e vida espiritual - 2022, 22
Cada artigo é estruturado sempre na mesma forma que oferece “espaço” para uma ampla
discussão das opiniões ou posições sobre o assunto. Pode-se olhar a ela em duas maneiras:20
1. Objeções (na maioria das vezes são 3) 1. Opiniões a) contrárias à solução de S.T.
b) em favor da solução de S.T.
2. - Sed contra (opinião positiva ou seg. a
posição de Tomás) 2. - Solução de Santo Tomás – ou:
- Solução de Santo Tomás – ou: corpo do artigo
corpo do artigo 3. Respostas às objeções
3. Respostas às objeções
4) Para uma leitura rápida desse imensa obra pode-se proceder dessa forma simples como nos
Catecismos:
1 - Se lê o título, por exemplo, da primeira parte da Suma, p. I, q. 2, art. 3, que é formulado em
forma de pergunta, da dúvida metódica: “Utrum ... sit? – Se Deus existe?”; na tradução de
Loyola: “Deus existe?”).
2 – A resposta breve é expressada na Opinião positiva ou favorável à resposta de Santo Tomás,
que em cada artigo sempre se inicia com as palavras “Sed contra - Mas, em contrário (seg. Corrêa)
ou “Em sentido contrário” (seg. Loyola); nesta artigo então seria assim:
Pergunta: “Se Deus existe?”
Resposta: “Mas, em contrário, diz a Escritura (Ex 3, 14), da pessoa de Deus: Eu sou quem
sou.”
Desta maneira, quando se sabe, em qual parte Santo Tomás trata do assunto desejado então pode-
se rapidamente informar dos artigos e da solução que Santo Tomás dá.
20 Cf. T. KIENINGER, O método no artigo da Suma teológica de S. Tomás, em: Sapientia Crucis V (2004) 229-267.
Psicologia e vida espiritual - 2022, 24
C – em força do princípio (B), aplicando ao caso (A), tira a conclusão ou solução do problema
(C).
Então dá para ver, o que é muito valioso, não é tanto este ou outro problema, mas o principio
que vale para este caso, mas também ainda para muito mais casos. Aí está escondido a força,
sabedoria e riqueza de Santo Tomás.
Valorizando os princípios de Santo Tomás – devido do seu valor universal e sempre atual
seja dado alguns exemplos:
Seguem alguns exemplos de princípios filosóficos ou teológicos que Santo Tomás usa na
Summa Theologiae e Summa contra Gentiles
1. Principia philosophica
“Nullum corpus potest esse simul in pluribus locis - Nenhum corpo pode estar simultaneamente
em vários lugares.” (III,75, 1 obj. 3).
“Materia sine forma esse non potest - a matéria não pode existir sem a forma.” (III, 75, 3c).
“Propria operatio rei sequitur formam substantialem eius - A operação própria de um ser resulta
da sua forma substancial.” (III,75,6 obj 3).
„Natura dat formam substantialem,…sed omnes formae artificiales sunt accidentales“ (III,66,4).
“Finis habetur in desiderio et intentione. - alcançamos o fim pelo desejo e pela intenção.” (III,
73,3c).
“Omne ens est propter finem - Todos os agentes agem necessariamente para um fim” (I-II, q. 1, a.
2c).
“Generans generat sibi simile in specie. - O gerador gera um ser semelhante em espécie” (III, 74, 3 ad
2um).
“Est naturale homini ut per sensibilia ad intelligibilia veniat; quia omnis nostra cognitio a sensu
initium habet – é natural ao homem chegar, pelos sensíveis, aos inteligíveis — pois todo o
nosso conhecimento começa pelos sentidos.” (STh, p. I, q. 1, a. 9c).
“Per accidentia iudicamus de substantia - pelos acidentes julgamos da substância” ((III, 75,5 obj
2).
“Intellectus autem, cuius est proprium objectum substantia (ut dicitur III De Anima c.6,n.7), per
fidem a deceptione praeservatur - o intelecto, cujo objeto próprio é a substância, como diz
Aristóteles, é preservado do engano pela fé.” (III, 75,5 ad 2um).
“Impossibile est multiplicatio genere, non multiplicari speciem. – É impossível multiplicar-se o
gênero, sem multiplicar-se a espécie;” (III, 73, 2 obj 2).
“Omne agens agit in quantum est actu - todo agente age enquanto atual” (III, 75,4c).
“Sapientis enim est non curare de nominibus - não é com questões de palavras que se deve ocupar”
(In II Sent 3, 1, 1 resp.)
2. Principia theologica
Psicologia e vida espiritual - 2022, 25
“Bonum gratiae unius maius est quam bonum naturae totius universi - O bem da graça é, para
o indivíduo, melhor que o da natureza, para todo o universo“ (I-II, 113,9 ad 2um).
“Vita spiritualis vitae corporali conformatur. - a vida espiritual se conforma com a corporal, porque
com as causas corpóreas têm semelhanças as espirituais” (III, 73,1c).
“Gratia non tollit naturam, sed perficiat - a graça não tolhe, mas aperfeiçoa a natureza” (I, 1, 8 ad
2um).
“A maioria dos homens, não podendo alcançar os prazeres espirituais, que são próprios dos
virtuosos, resulta que
se voltem para os prazeres do corpo.” (Santo Tomás de Aq., Suma Teológica, I-II, 31, 5 ad1)
“O bem da graça é, para o indivíduo, melhor que o bem da natureza de todo o universo.” (S.
Tomás, Suma Teológica, I-II, 113, a. 9, ad 2) ou segundo Santa Maria Rivier: “A graça de Deus
numa alma é um Tesouro imensamente maior do que todas as riquezas do universo.” (L.-A.
LASSUS, Chama de Fogo, 47)
“só acidentalmente Santo Tomás pertence ao século XIII. Seu pensamento, como a tabuada de
multiplicar, não se limita a esse período da história humana; a verdade, embora sua expressão
verbal esteja situada no tempo e no espaço, é eterna” (Fulton SHEEN. Deus e a Inteligência na
Filosofia Moderna: Um Estudo Crítico à Luz da Filosofia de Santo Tomás. São Paulo: Molokai
Editora, 2021, p. 14)
5º Terminologia tomista (para saber ler seus textos, e a base do seu pensar)
a) O crescimento do homem
Uma boa parte do que estuda a “psicologia” hoje é a atenção ao desenvolvimento porque deixa
as suas sequências ou sequelas.
- No seio da mãe só existe a criança, e isto continua ainda nos primeiros meses:
Tudo que é e dela (escuta o que vem de fora, mas não sabe ainda bem distinguir)
- Quando chora, pede o leite ou se sinta incômoda e quer ser limpada, acontece que não será
LOGO atendia. Aí aprende que eu e mamãe ou outros não somos idênticos;
então começa a conversa ou comunicação entre eu e tu: a mãe vem e provoca um sorriso como
resposta do nenê – conscientização psicológica – autoconsciência).
- Por fim, chega o tempo da opção própria, da escolha de valores e princípios com os quais
assume e forma sua vida!
No pensar assimilamos, fazemos estas coisas nossas. Elas são em nós – igual como lá fora,
por isso, no nosso pensar se pode distinguir dois momentos:
– mesmo sendo em nós – é ainda sobre as coisas de fora!!!
- mas como elas tornaram-se nossas, nos podemos “pegá-las” e virar,
modificar, unir ou separar, criar novas combinações etc.
E isto leva ao terceiro momento, que chamamos:
Santo Tomás descreve num artigo de sua Suma de Teologia o caminho à profundidade,
Summa Theologiae, [= ST], parte I, questão 44, artigo 2 corpo21.
Ele descreve o processo do conhecimento que o homem faz e também historicamente se pode
observar:
partindo (1) do exterior e superficial, das “transmutações acidentais”
a (2) “causas mais universais”, e ao que é substancial e ainda submetido a “transmutações”,
até chegar (3) ao “ser enquanto ser” e a última “causa das coisas”, “a causa universal dos seres”.
Os antigos filósofos aos poucos, e como pé por pé, entraram no conhecimento da verdade.
(1) Assim, a princípio, como que, mais grosseiros de existência, não reputavam entes senão os corpos
sensíveis. E dentre eles, os que em tais corpos admitiam o movimento, consideravam-no a este
somente segundo certos acidentes, p. ex., segundo a raridade e a densidade, por congregação e
segregação. E supondo sem causa a substância mesma dos corpos, buscavam certas causas a tais
transmutações acidentais, como a amizade, a luta, a inteligência e coisas semelhantes.
(2) Outros filósofos, porém, mais em progresso, distinguiram, pelo intelecto, entre a forma
substancial, e a matéria sem causa; e perceberam transmutação nos corpos segundo formas essenciais.
Dessas transmutações admitiam certas causas mais universais como o círculo oblíquo, segundo
Aristóteles, ou as Idéias, segundo Platão. Deve-se, porém, considerar que a matéria é limitada pela
forma a uma determinada espécie; assim como a substância de uma espécie é limitada, por acidente
superveniente, a um determinado modo de ser; p. ex., homem é limitado por branco.
Uns e outros filósofos, portanto, consideraram o ser por certa consideração particular, seja enquanto
este ser, seja enquanto tal ser. E, por isso, atribuíram às coisas causas agentes particulares.
(3) Mas ulteriormente alguns se alçaram a considerar o ser enquanto ser e consideraram a causa das
coisas não só enquanto estas ou tais, mas enquanto entes.
Ora, a causa das coisas enquanto entes deve sê-lo
- não somente enquanto são tais coisas, pelas formas acidentais,
- nem somente enquanto são estas coisas, pelas formas substanciais;
- mas também segundo tudo o que lhes pertence ao ser de qualquer modo.
Assim que, é necessário também admitir a matéria prima como causada pela causa universal dos seres.
21 Na ed. Loyola se lê este comentário ao artigo: “A resposta deste artigo apresenta uma história argumentada da
filosofia grega.”
Psicologia e vida espiritual - 2022, 28
Na Filosofia de Santo Tomás, seu vocabulário é bem limitado e muito exato. Uma vez
entendido ele e a que corresponde na realidade, é FACIL de entender Santo Tomás e seus
pensamentos. Por isso falta nos aqui ainda de dar umas palavras essenciais e seu significado
aqui.22
Começamos com o
SER (esse, em latim) – indica simplesmente o existir. Se refere ao fato que algo (qualquer coisa
– caneta, árvore, chão, ar, perna, madeira........, Deus ... ) existe,
o que nos expressamos pela palavra “é”.
É tão simples, mas importante, porque muitas filosofias, muitas mesmas, não começam com a
realidade, mas com os pensamentos – aqui o famoso ponto de partida de Descartes
com o seu “Cogito = penso em mim; - ergo sum = logo existo” – por isso mencionei
antes esse processo do desenvolvimento, porque
Cada criança começa observar si mesmo como 1º objeto, mas como objeto!!! E hoje, muitos não
querem aceitar o próximo, a realidade lá fora, e assim ficam nesse estado – se diz:
infantil e não crescem acima dele!!!!
Voltamos:
1 - O que observamos em cada coisa que existe são vários aspetos; tomamos a caneta:
Ela é algo – logo possui seu SER e é ESSE ser por uma determinação que faz ela caneta
e não sapato ou janela, e uma tal determinação (especificação) chama-se
ESSÊNCIA.
É importante constatar que não há nada = não existe nada, não há algo que seja somente ser,
mas também não há uma essência a não ser unido, isto realizada pelo ser, de modo que
TUDO QUE EXISTE é sempre composto por estes dois momentos: SER e
ESSÊNCIA.
E qualquer composto de Ser e Essência chamamos “ente” ou existe de fato e na realidade.
Nos entes materiais s fala em vez de ser – matéria e em vez de essência se diz forma.
Um ente espiritual se chama pessoa, e por ser espiritual é ipso fato também livre.
2º Agora, em cada ente, especialmente em cada coisa ou ente desse mundo material, que nos
conhecemos pelos sentidos do nosso corpo, se pode distinguir
22 Para os que querem já aproximar mais a Santo Tomás sejam indicados estes ajudas:
O “vocabulário da Suma Teológica” por Marie-Joseph Nicolas, no início do primeiro volume da Suma Teológica
na edição de Loyola, p. 69-102 (completado pela apresentação dos “Autores e Obras citados na Suma
Teológica”, p. 103-123 – que porém varia em cada volume). Além desse, imediatamente acessível há:
JOLIVET, R. Vocabulário de Filosofia, Agir, Rio de Janeiro 1975 (vale para a filosofia tomista em geral).
J. B. MONDIN. Dizionario enciclopédico del pensiero di San Tommaso d’Aquino. Seconda edizione rivedutta e
correta. Bologna: Edizioni Studio Domenicano, 2000 (é específico para Santo Tomás, em italiano).
Summa Theologiae da editora BAC (5 volumes, só em latim, Madrid 1958, oferece no 5º volume com o
“Supplementum” um “Index Quaestionum”, um índice dos títulos das 512 questões, p. 1*-6* e um “Index
rerum” ou índice dos assuntos com frases e a indição onde nessa Suma só Santo Tomás trata desse assunto,
p. 7* - 332* (é tudo em latim). Este é semelhante ao trabalho do século XV, por
BERGAMO, Pedro de (+ 1482). Tabula aurea: In Opera Sancti Thomae Aquinatis Index. Alba-Roma: Ed.
Paulinae, 1960 (tudo em latim).
SCHÜTZ, L., Thomaslexikon. Sammlung, Übersetzung und Erklärung, Schöningh, Münster 1895; Holzboog,
Stuttgart 1983 (se estende sobre todas as obras de Santo Tomás; é em alemão, mas os termos são todos em
latim, segundo o original de Santo Tomás).
Psicologia e vida espiritual - 2022, 29
- o fato que consistem em si, tal qual é aqui, e isto chamamos a SUBSTÂNCIA e
- momentos ou aspetos que podem mudar, sem, por isso, já mudar a coisa com tal; são aspetos
mudáveis em certos sentido num nível superficial, estes se chama
ACIDENTES, os aspetos mudáveis ou variáveis no mesmo ente;
o significado as palavras exprimem isso:
sub-stância quer dizer que “stá – sub = embaixo” dos aspetos variáveis e por isso fica,
permanece, mesmo que na superfície há mudanças; e
“acidentes” quer dizer “ad-iacere – algo que “cai a algo”, sob essa coisa, mas também se pode
retirar; a coisa (ou seja o ente, a substância) pode ter ou não ter esses características,
como por ex. a caneta de 5 ou 10 centímetros de comprimento (quantidade),
a cor azul ou vermelha (qualidade) que, neste momento (tempo),
está colocada na mesa ou pegado na mão (posição, lugar, relacionada a) ...
Se precisa dar atenção a eles para identificar exatamente esse ente aqui agora – inconfundível
com qualquer outra coisa, como a verdade do que conheço cá dentro em mim.
O “ser” é o conceito mais simples, de modo que pode se dizer este de TUDO que existe: essas
coisas todos são - ou possuem SER.
A essência é um pouco diferente, pois se pode considerar de diversos aspetos, por isso pode
receber outros nomes, mas sempre significando essa mesma determinação concreta
do ente; este outros nomes são
forma substancia (= a forma do ser dessa substância)
ou natureza (= se refere mais ao aspecto dinâmico: serve para ...).
3º a) Quando dizemos
“Ato” queremos dizer que algo “existe”, por seu ser e sua essência específica,
E por ser isto, tem uma devida potência, isto é capacidade, força de fazer e agir.
O ato chama-se um ente existente, composto por ser e essência.
e a potência chama-se o que ainda não é, mas pode ser – por um ente em ato.
Um homem pode se mover e falar, porque é um ente com a essência humana que possui
essas faculdades;
Uma pedra (como qualquer ente de natureza an-orgânica) não canta como um pássaro
nem cresce de dentro para fora como a semente de uma planta.
Psicologia e vida espiritual - 2022, 30
Ato e potência explicam a relação e proporção entre o que já é e o que ainda não é,
E suas leis nos explicam também apenas a possibilidade de mudanças.
3º b) Então, precisa ainda mais algo que põe essas proporções em movimento, e isto se chama
CAUSAS:
Não qualquer coisa chama-se “causa”, mas só o que influencia a existência, que faz que uma coisa
é ou não é.
Por exemplo: A serpente no paraíso conversou, falou com Eva.
Um animal não tem o ato necessário para poder falar (potência de falar).
Mas se mesmo falou, deve ter sido presente um ente com essa capacidade (potência)
como um espírito puro, o diabo.
Neste caso, a causa veio de fora a serpente,
como também o efeito, o pecado, a distância de DEUS não era planejado por dentro do homem,
mas ele se afastou do fim pelo qual foi criado
Assim se distingue:
- Causas exteriores e objetivos: duas que ficam “fora” do ente (causas extrínsecas):
(1) causa eficiente (faz que o ente existe ou seja “por quem” o virou a ser ou é este ente)
(4) causa final (que é a finalidade: a intenção inicial e o fim para alcançar, “para que” é).23
- E são causas internas dos entes (quer dizer: se encontram no sujeito, como o próprio ser e
essência: são também duas causas que permanecem no ente enquanto existe:
(2) causa formal (faz “o que” o ente é – é a essência; ou a “forma substancial”) e
(3) causa material (faz “de que” o ente é, ou o ser desse ente).
Também sobre estas 4 causas dá para refletir e descobrir princípios válidos para todos os entes;
por ex. como não há o puro ser sem essência e não uma pura essência sem um ser,
Assim não há uma causa formal sem pensar também já numa causa material e vice-versa e
Um condicionamento mútuo.
23 Um cientista da NASA costumava repetir: “Crer que o universo é fruto do acaso é o mesmo que acreditar que da
explosão de uma tipografia nascesse uma encíclopédia.” (Paulo L. Medeiros Vieira, Deus nos bancos dos Réus. Uma
resposta da Ciência ao Ateismo Militante, ed. LEDIX, Florianópolis 2010, 53).
Psicologia e vida espiritual - 2022, 31
Causa formal
= O que a coisa é
Sua forma substancial
Ou essência
(alma do homem)
E
Causa material
= Que é
Ou seu ser
(nas coisas materiais)
A matéria
(corpo do homem)
Os transcendentais
Outras características, que o ente possui simplesmente porque é, logo que se encontram em
cada ente, são chamadas ‘transcendentais’. O nome quer dizer que eles transcendem todas as
particularidades provenientes de essências determinadas ou tudo que faz os entes diferentes um do
outro, e, por isso, são características ou propriedades do ser enquanto ser.
Cada ente, simplesmente pelo fato que é e somente por isso, possui:
- a propriedade de ser ‘um’ ou ser indiviso em si mesmo, e por isso ser ‘identificável’,
- de ser ‘verdadeiro’, conhecível ou ser em conformidade com uma inte-ligência (“Veritas est
adaequatio rei et intellectus”, Sth I, 16, 1),
- de ser ‘bom’ ou possuir uma perfeição desejável, uma bondade absoluta (ou independente
de outras referências) enquanto desejado pelo Criador, ou
uma bondade relativa enquanto desejado por uma criatura e
- de ser ‘belo’ ou agradável para aqueles que o vêem (“quod visum placet – que é agradável
de ver”, Sth I, 5, 4 ad 1um).
A participação: cada ente – participa na ideia ou essência ou forma (substancial) segundo qual é
Feita (Madeira, caneta, telefone...)
E como cada ente – pela essência só não existiria, se deve dizer também que
Pelo fato que existe (fo ifeito e é agora) participa também na “ideia” do Ser ou no ser, mesmo que
- Por ser um ente concreto, ESTE aqui, com a limitação constituiva pela essência,
Não está presente SER ABOLUTO E UNIVERSAL, mas apenas ESTE – logo se pode
dizer participa – no ser como todas as coisas.
Só o SER por ESÊNCIA é absoluto e possui, melhor É o SER ilimitado.
E a METAFÍSICA – geral - que estuda as leis do ser (o que estamos falando)
e específica – que estuda entes segundo essências diferentes:
= DEUS,
= entes vivos (psicologia – estuda tudo que tem uma alma = princípio de vida) e
Psicologia e vida espiritual - 2022, 32
Suma teológica, parte I-II, q. 37, artigo 1: Se a dor elimina a faculdade (= potência) de aprender.
O primeiro discute-se assim. — Parece que a dor não elimina a faculdade de aprender.
1. — Pois, diz a Escritura (Is 26, 9):
A - Quando exercitares na terra os teus juízos, aprenderão justiça os habitadores do orbe; e mais adiante
(Is 26, 16): saudável lhes foi na tribulação do seu murmúrio a tua doutrina.
B - Ora, dos juízos de Deus e da tribulação resulta a dor ou tristeza nos corações dos homens.
C – Logo, a dor ou tristeza não elimina, mas antes desenvolve a faculdade de aprender.
2. Demais —
A - Diz a Escritura (Is 28, 9): A quem ensinará a ciência? E a quem fará entender o que se ouviu? Aos que
já se lhes tirou o leite, aos que já foram desmamados, i. é, dos prazeres.
B - Ora, a dor e a tristeza é que sobretudo exclui os prazeres; pois, impede qualquer prazer, como está em
Aristóteles1; e a Escritura diz (Ecl 9, 29), que o mal presente faz esquecer os maiores prazeres.
A - Logo, a dor não elimina, mas antes desenvolve a faculdade de aprender.
3. Demais —
A - A tristeza interior é mais forte que a dor externa, como já dissemos2.
B - Ora, o homem pode aprender, embora possuído de tristeza.
C - Logo, com maior razão, quando possuído pela dor corpórea.
Mas, em contrário, diz Agostinho:
Embora, nesses dias estivesse duramente afligido por uma dor de dentes, não me era possível voltar o
ânimo, senão talvez para o que já havia aprendido; pois, achava-me completamente impedido de aprender
o que estava completamente na tendência do meu espírito3.
SOLUÇÃO.
A — Como todas as potências da alma se lhe radicam na essência una, é necessário que, quando a intenção
da alma é levada veementemente à operação de uma potência, retraia-se da operação de outra, pois uma
mesma alma não pode ter senão uma intenção. E por isso o que atrair para si a intenção total da alma, ou
grande parte dela, não se compadecerá com mais nada que reclame grande atenção.
B - Ora, é manifesto que a dor sensível atrai soberanamente para si essa intenção; pois, as coisas tendem,
na sua intenção total, a repelir o que lhes é contrário, como bem se vê já nos seres naturais. E
semelhantemente, também é manifesto que para aprender de novo uma noção é necessário estudo e esforço,
com grande intenção, conforme está claro na Escritura (Pr 2, 4-5): Se buscares como o dinheiro, e cavares
pelo achar como os que desenterram tesouros, então acharás a ciência.
C - E portanto, se a dor for intensa, o homem não poderá aprender nada; e poderá ser tão intensa que nem
mesmo, enquanto domina, possa pensar no que antes já sabia.
Há nisto porém diferenças, relativas às diferenças do amor com que aprendemos ou refletimos; a este quanto
maior for tanto mais impedirá a intenção da alma de ser completamente dominada pela dor.
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. — A tristeza moderada, exclusiva da evagação da alma,
pode ser útil para adquirirmos a ciência; e principalmente daquilo pelo que esperamos nos libertar da
tristeza. E deste modo, na tribulação do seu murmúrio, os homens recebem mais facilmente a doutrina de
Deus.
RESPOSTA À SEGUNDA. — Tanto o prazer como a dor, na medida em que arrastam a intenção da alma,
impedem a consideração racional; e por isso Aristóteles diz ser impossível compreendermos seja o que for
durante o prazer venéreo4. A dor entretanto, mais que o prazer, absorve essa intenção, como vemos, nos
seres naturais, em que a ação de um corpo natural é mais intensa em relação ao que lhe é contrário; assim,
a água quente, sofrida mais intensamente por um corpo frio, congela-se mais fortemente. Se portanto a dor
ou a tristeza for moderada, pode acidentalmente ser útil para aprendermos, na medida em que exclui a
superabundância do prazer; mas em si mesma é um impedimento; e se for intensa privará totalmente da
faculdade de aprender.
RESPOSTA À TERCEIRA. — A dor externa provém da lesão do corpo, e por isso é, mais que a interna,
acompanhada da transmutação corpórea; a interna porém é maior, relativamente ao que há de formal na
dor, que depende da alma. E por isso, a dor corpórea impede, mais que a interna, a contemplação, que exige
o repouso completo. E contudo, se a dor interna também for demasiado intensa, arrastará a intenção de tal
modo que o homem não pode aprender nada de novo. Assim Gregório, levado da tristeza, abandonou a
exposição do livro de Ezequiel
Psicologia e vida espiritual - 2022, 34
Psicologia e vida espiritual - 2022, 35
Ia Parte: DEUS
2. a) O Criador (1) A criação (em geral: visível e invisível) (De Creatione) qq. 44-49
Prólogo:
Afirma Damasceno que o homem é criado à imagem de Deus, enquanto o termo imagem significa
o que é dotado de intelecto, de livre-arbítrio e revestido por si de poder.
Após ter discorrido sobre o exemplar, a saber, Deus, e sobre as coisas que procederam do poder
voluntário de Deus, deve-se considerar agora a sua imagem, a saber, o homem, enquanto ele é o
princípio de suas ações, possuindo livre-arbítrio e domínio sobre suas ações.
Raiz de sua vida: O desejo natural para o último fim e a bem aventurança24 qq. 1-5
(como motores)
24 Santo Tomás vai constatar “est implebile desiderium naturale” (ScG III, 48); por isso termina a I-II com o tratado
da graça e segue a toda a IIª parte a IIIª parte com o mistério da Encarnação.
Psicologia e vida espiritual - 2022, 36
Necessidade 109
Graça essência 110
Divisão 111
Causa, efeito e méritos 112-114
Todos estes momentos tomam influência a cada ato humano.
Deve-se sempre levar todos estes momentos em consideração,
seja para exigir das pessoas,
seja para descobrir as causas principais,
seja para a avaliação do pecado.
Prólogo:
Depois do tratado geral das virtudes e dos vícios e de outros dados referentes à· moral, é necessário
considerar cada ponto ém particular. Porqué, na moral, as generalidades são pouco úteis, já que as
ações se realizam em situações particulares.
Na moral, pode estudar-se algo em especial de duas maneiras: a primeira, a partir da própria matéria
moral, quando, por exemplo, se estuda tal virtude ou tal vício; doutro modo, quanto aos estados
especiais dos homens; assim, quando se estudam os súditos e os superiores; os de vida ativa ou
contemplativa e todas as outras categorias. Portanto, em primeiro lugar, abordaremos o que convém
a todas as categorias de homens; em segundo lugar, especialmente o que diz respeito a determinados
estados.
É preciso ter presente que se nós quisermos analisar separadamente as virtudes, os dons, os vícios
e os preceitos, seremos obrigados a muitas repetições. Com efeito, quem quiser tratar plenamente
deste preceito: Não cometerás adultério, é obrigado a estudar o adultério que é um tipo de pecado,
cujo conhecimento depende do conhecimento da virtude oposta. Será, pois, um método mais rápido
25 Santo Tomas tratou sobre as paixões humanas anterior a Suma em: In 3 Sent d 16 q 1 aa 1-5; De Ver q 26; De Malo
qq 10 e 12; De virtutibus; ScG; In Arist. Ethica Nichom., esp. II, l e 5; Quaest. De Anima.
Psicologia e vida espiritual - 2022, 37
e mais cômodo se, no mesmo tratado, passarmos da virtude ao dom correspondente, aos vícios
opostos, aos preceitos afirmativos e negativos. Este modo de considerar será aplicado aos próprios
vícios, segundo sua espécie própria.
Como foi mostrado anteriormente, os vícios e os pecados se diversificam segundo sua matéria ou
objeto, não segundo outras diferenças de pecados, como os de sentimento, de palavra e de obra; ou
os pela fragilidade, a ignorância ou a malícia e outras diferenças desse tipo. É sobre a mesma
matéria que a virtude age retamente, enquanto os vícios opostos agem sem retidão. · Sintetizando,
portanto, toda a matéria moral no estudo das virtudes, podemos reduzir todas as virtudes a sete: três
teologais, que abordaremos em primeiro lugar (q . 1-46), e quatro cardeais, que trataremos em
seguida. Entre as virtudes intelectuais, uma delas é a prudência, que se arrola e enumera entre as
virtudes cardeais (q. 47-56). A arte, contudo, não pertence à ciência moral, que trata do 'agir',
enquanto a arte é o modo certo do 'fazer', como acima foi dito. As outras três virtudes intelectuais,
isto é, sabedoria, inteligência e ciência, têm os mesmos nomes de alguns dons do Espírito Santo.
Assim também, as estudaremos, ao considerarmos os dons que a elas correspondem. Quanto às
outras virtudes morais, todas se reduzem, de algum modo, às virtudes cardeais como está claro
pelo que acima foi dito. Portanto, na consideração de cada virtude cardeal, também serão
estudadas todas as virtudes que a ela se relacionam sob qualquer título, assim como os vícios
opostos. Dessa maneira, nada será omitido em nosso tratado de moral.
Fé qq 1 ss.
Teologais Esperança qq. 17 ss.
Caridade qq. 23 ss.
I. Virtudes
Prudência qq. 47 ss.
Cardeais Justiça qq. 57 ss.
Fortaleza qq. 123 ss.
Temperança qq. 141 ss.
26 “Em nenhum lugar o dom da sistematização de S. Tomás se manifestou tão brilhantemente como no domínio da
moral” (Baumgartner, em: Grabmann, Introdução à Suma, p. XLIV).
Psicologia e vida espiritual - 2022, 38
Salmo 55(54)
2 Ó Deus, escuta a minha oração, não rejeites minha súplica;
3 presta-me atenção e atende-me. Estou ansioso na minha tristeza e me perturbo
4 pelo grito do inimigo, pelo clamor do malvado. Pois sobre mim fazem cair desgraças, me
perseguem com furor.
5 Meu coração treme no meu peito e terrores mortais se abateram sobre mim.
6 Temor e tremor me invadem e me oprime o horror.
7 Então digo: “Ah! Se eu tivesse asas como a pomba para voar em busca de descanso!
8 Fugiria para longe, iria morar no deserto,
9 buscaria um lugar de refúgio, protegido da fúria do vento, longe de qualquer tempestade”.
10 Dispersa-os, Senhor, confunde suas línguas. Vejo na cidade violência e discórdia:
11 dia e noite circulam sobre seus muros, dentro há iniqüidade e tormento.
12 Insídias reinam no seu interior e não cessam em suas praças a opressão e a fraude.
13 Se fosse um inimigo que me insultasse, eu agüentaria; se fosse um adversário que se
levantasse contra mim, me esconderia dele.
14 Mas és tu, meu companheiro, meu amigo e confidente;
15 uma doce amizade nos unia, na casa de Deus caminhávamos alegres.
16 Que a morte caia sobre eles, que desçam vivos ao lugar dos mortos, pois a maldade mora
com eles.
17 Eu invoco a Deus e o Senhor me salva.
18 De tarde, de manhã e ao meio-dia lamento-me e suspiro, e ele escuta minha voz;
19 vai me dar a paz, livrando-me dos que me combatem: pois meus adversários são tantos!
20 Deus me escuta e os humilha, ele que domina desde sempre. Pois para eles não há
conversão, eles não têm temor a Deus.
21 E cada qual estendeu a mão contra seus aliados, violou sua aliança.
22 Mais macia que a manteiga é sua boca, mas no coração têm a guerra; mais fluidas que o
óleo são suas palavras, mas são espadas afiadas.
23 “Entrega ao Senhor tua ansiedade e ele te dará apoio, nunca permitirá que vacile o justo”.
24 Tu, ó Deus, os precipitarás no fundo do sepulcro; os homens sanguinários e fraudulentos;
não chegarão à metade dos seus dias. Mas eu em ti confio.
Psicologia e vida espiritual - 2022, 39
Salmo 56 (55)
2 Piedade de mim, ó Deus, porque um homem me persegue; o dia todo um agressor me
oprime.
3 Meus adversários me humilham o dia todo, são muitos os que me atacam, ó Altíssimo.
4 Na hora do medo, em ti me refugio.
5 Em Deus, cuja promessa eu louvo, em Deus confio, não temerei: o que um homem me pode
fazer?
6 Estão sempre falando e tramando, não pensam senão em fazer-me o mal.
... 9 Contaste os passos da minha caminhada errante, minhas lágrimas recolhes no teu odre;
acaso não estão escritas no teu livro?
10 Então vão recuar meus inimigos, quando eu te invocar, sei que Deus está do meu lado.
11 Em Deus, cuja promessa eu louvo, no Senhor, cuja promessa eu louvo,
12 em Deus confio, não temerei: o que um homem me pode fazer?
13 Mantenho, ó Deus, os votos que te fiz: vou te render ações de graças,
14 porque me livraste da morte, preservaste meus pés da queda, para que eu caminhe na
presença de Deus, na luz dos vivos.
Psicologia e vida espiritual - 2022, 40
2 - A fome de felicidade: partir da Suma teol.: Exitus - reditus = voltar à origem = infinito.
- O caminho do reditus: I-II: vontade (racional, apetitivo - hábito - virtude / vício + ajuda divina.
- Determinar o que será para o homem saúde e doença (com / sem DEUS) que leva a
- Definição do homem: Ama (= deseja, quer por ser limitado) ser-amado (pelo Infinito,
único que satisfaz plena e perfeitamente).
3 - Então felicidade consiste em que? Santo Tomás analisa extensamente este ponto de partida
(I-II, qq 1-5). Base para entender os aspetos discutidos e o entendimento da estrutura interior do
homem que permite raciocinar pela "conaturalidade" entre o homem e o mundo em que vive.
e aprofundar (formar a sensibilidade em observar a realidade)
Vegetativo - comida - > crescer
sensitivo: olhos - cores -> ver e perceber uma caverna como proteção
emoções -> querer gozar dessa proteção
intelectivo: Intelecto (abstrair o geral = essência) - Entender objeto (casa como caverna) =
vontade (construir) querer fazer uma casa etc.
proteção é um bem; ... participação no Sumo Bem que é o Infinito real =
“o que todos chama DEUS.”
Seja que for, - se me alimento, - se trabalho para a família, - se me sacrifico para um amigo, - se
... é para ser amado por o “próximo” e/ou por Deus.
É a arte das artes, de observar o próximo, descobrir seu anseio por amor e ajuda-lo na medida
infinita pela união com Deus.
Psicologia e vida espiritual - 2022, 41
1º A felicidade –
a) Observação universal (um desejo universal e perene dos homens: material/espiritual,
Aristóteles)
b) Definição (O que se entende por “felicidade” - conduz o homem fora de si; somos
parte de um universo)
2º A resposta de Santo Tomás: Suma teológica: As 5 questões da I-II parte (um fim; em que; é
material ou espiritual e como alcança-lo)
3º Felicidade psicológica
a) A inspiração de Santo Tomás
b) A psicologia da afirmação – “Feliz és tu – porque és!” (Tomas e Filosofia)
c) Aconselhamento “nutético” – com sabedoria bíblica (Jay E. Adams; Cristianismo) –
d) A saúde da alma no amor de Deus (vida sacramental: Catolicismo)
(Histórico)
É o que cada homem procura, - e sem ela não descansa
O apático é o oposto de uma pessoa feliz – interessante aqui é para onde leva estes na fuga da
infelicidade, da dor e do sofrimento.
Mais interessante ainda é, quando se conta que de repente assim em 1919 – jogam toda essa
solução supérfluo ou oposto – mas de fato nem isto é – fora e correm atrás da busca da
felicidade, quando abraçam com força os valores do Ocidente.
Porém, ao menos em China, se fala de uma grande revolução no dia 4 de maio de 1919 (cf. W.
FRANKE. Chinas kulturelle Revolution, die Bewegung vom 4. Mail 1919. München 1957). Liga
as suas tradições, olhando ao “eterno ontem”, começou, de repente, dar valor ao futuro. Causa
Psicologia e vida espiritual - 2022, 42
foi a ameaça de sua existência no último século. Nos anos 20 e 30 foram sistematicamente
destruídos os valores tradicionais, e abraçado os novos que são: ciência, democracia, liberdade,
afirmação da nação, revolução mundial etc. (cf. Thaddäus HANG. Grundzüge des chinesischen
Volkscharakters. Würzburg: Echter-Verlag, 1964, p. 33)
Depois de Sócrates teve vários que sentiram o estímulo e desenvolveram suas ideias –
exatamente ao redor da felicidade.
Em geral, pode-se dizer dos “cínicos” (cf. Reale, I, 231-236): Seus aderentes pregavam o total
desprezo aos valores tradicionais (prazer, riquezas, fama) e a liberdade total (que chegava à
animalidade e licenciosidade). Eles apontavam aos defeitos de tempo, mas não ofereciam valores
alternativos. Assim, a palavra “cinismo” acabou adquirindo o caráter pejorativo de ironia.
Claro, aqui entram também os primeiros grandes filósofos como Platão e Aristóteles:
Os dois – mesmo que andaram um caminho diferente – viram a felicidade na contemplação ou
vida intelectual-espiritual. ...
Um exemplo famoso é Séneca, um dos homens mais ricos e poderosos no império romano: Foi
pedido pelo imperador de sair da vida e, assim, com “indiferença estóica” se suicidou.
2º O que é “felicidade”
Vamos começar – como se faz num estudo sólido – e procuramos primeiro de eu se trata, ou: o
que se entende por FELICIDADE?
Entre as definições se distingue
as definições nominais (ou etimológicas, seg. o significado da palavra)
e definição real ou o que significa na realidade da nossa existência.
- algumas vezes se insere a definição descritiva – que é menos científico, mas pode ajudar.
a) Definição nominal:
b) Definição descritiva:
c) Definição real:
Entre os nomes pala “felicidade” também há outros – que não precisam ser totalmente
sinônimos, e por isso, podem contribuir a dizer algo.
Feliz – quer dizer alegre, ter paz, sossego, tranquilidade, satisfação -– Genügsamkeit.
Felicidade é o contentamento,
Desejos.
Isto já nos leva a uma certa análise: Satis-fação – Quando será satisfeito - o que? e como?
Porque não se pode dizer que a música causa felicidade ao homem intelectual – porque é captada
pelo homem sensitivo...
Estas observações mostram que a felicidade é algo não restrita a um determinado nível ou a uma
certa faculdade;
Então deve-se localizar na ALMA do HOMEM, no centro de sua pessoa. ELE é feliz.
É o homem TODO que é feliz.
Sofrer: Nossa Senhora de Guadalupe a San Juan Diego: Não tema a doença do teu tio. ... Não
sofre por causa da doença do teu tio .
Lourdes: Nossa Senhora A Santa Bernadette: Não te prometo felicidade nesta vida, mas na outra.
3º A resposta de Santo Tomás: Suma teológica: As 5 questões da I-II parte (um fim; em
que; é material ou espiritual e como alcança-lo)
Santo Tomás trata desse desejo natural fundamental já na sua primeira Suma, a Suma contra os
Gentios, no 3º do 4º livros, quando trata de “Deus, do fim último e do supremo Governador”; já
trata muitas perguntas. Diz um estudioso desse tempo (Grabmann): “Em nenhuma outra obra
humana desta pequenez é contida uma plenitude de ideias como nesta.” Mais sistemático trata do
nosso tema na Suma Teológica, a Obra principal de Tomás, logo no início da Segunda Parte.
Se chama a 1ª parte “exitus” – a saída das criaturas de Deus, seu criador e
Agora a 2ª parte o “reditus”, ou seja a volta das criaturas a Deus, nisto se pode incluir a 3ª parte
também e quem trata de Cristo e dos sacramentos, pois
A 2ª parte é a volta do homem pelas virtudes e a 3ª parte trata de Deus que vem ao seu auxílio
para conduzi-lo de volta a Deus – obra da graça ou do amor de Deus para com as criaturas.
Santo Tomás, passando além do seu “Filósofo” Aristóteles, e como novidade na história
desenvolveu na Sua Suma Teológica, parte I-II, uma extensa análise da vida interior do homem:
Começa com o desejo natural de querer ser feliz (qq. 1-5), e
distingue para isso já o que nisso é “voluntário e involuntário” (q. 6) e
outros aspectos da vontade (qq.7-22),
presta nisso grande atenção
- ao apetite sensitivo e as emoções (qq. 23-48),
- à possibilidade de firmar-se mais e mais, seja no bem pelas virtudes (qq. 49-70),
seja no mal pelos vícios (qq. 71-89) e
- à ajudas que o homem encontra na Lei (de Deus, natural) e pela graça Divina (qq. 90-
114).
Apesar dessa riqueza e sua consideração na avaliação moral dos atos humanos, é verdade, como
Ignace Lepp menciona, que nos manuais, seja metafísicos seja morais, não se presta tanta
Psicologia e vida espiritual - 2022, 45
atenção a este mundo tão rico onde se encontram simpatia e antipatia, ódio e amor, entusiasmo e
desanimo etc.27
De um lado, se deve dizer, que olhando a esta vida interior da pessoa, se encontra mais e mais
diante da riqueza profunda individual-pessoal e de um mistério que é difícil de tratar em termos
gerais; mas
do outro lado, não se pode esquecer tampouco, que todos os homens participam na mesma natureza
humana, por isso valem as mesmas causas e se encontram todos no mesmo horizonte.
E como o agir está baseado no ser e segue ele, assim também o agir não goza qualquer liberdade.
A Filosofia, como ciência das causas, aponta às causas eficientes (Deus, pais, cultura etc.), a causa
formal e material do homem e de cada um (marcam o indivíduo, por isso são intrínsecas,
constituem o ente em si), e a causa final que, por último, é o Criador (Cat 1721, 282, 294...).
Por isso, a “matéria” na qual se considera hoje, na maioria das vezes, só o homem, era na cultura
judia-cristã sempre tratada, porém em vista da meta final, do destino do homem no céu, na vida
eterna. Desde o paraíso, em todo o Antigo Testamento (pensamos especialmente nos livros
sapienciais), no evangelho, nas Cartas de São Paulo e em toda a literatura na Patrística se ensina
sobre o bem e o mal, as inclinações a um e ao outro, se desenvolveu os “catálogos” de virtudes e
vícios (pensamos nos sete vícios capitais!).28 Não se era inconsciente das múltiplas influências
que o homem é exposto nas diversas fases de sua vida, seja no ambiente familiar (irmãos, irmãs,
avós, trabalhos e profissão do pai como contatos por visitas); seja na formação social, paroquial
ou escolar, por vizinhos e eventos culturais e costumes, circunstâncias políticas e climáticas...
27 Ignace LEPP. Psychoanalyse der Liebe. 10. ed. Freiburg: Herder, 1980, p. 7-11. Porém, em favor dessas tradições
deve-se dizer que se encontra extensas introduções às manuais de moral e espiritualidade com muitas distinções que
exatamente levam em consideração situações concretas da vida psicológica.
28 Rm 1, 29-31; Gal 5,19-21; 2 Tim 3,2-5; por ex. João CASSIANO. Instituições Cenobíticas. Juiz de Fora: Edições
Subiaco, 2015; R. ALVES GOMES. A Terapêutica das Doenças espirituais: Uma introdução à ascética da Igreja
ortodoxa. Aproximações psicológicas. Limeira, 2015; Gertrude und Thomas SARTORY. Lebenshilfe aus der Wüste:
Die alten Mönchsväter als Therapeuten. 5. ed. Freiburg: Herder, 1992; B. COLE. The Hidden Enemies of the
Priesthood: The Contributions of St. Thomas Aquinas. Staten Island, NY, 2007 (trata, entre outros, os vícios capitais
na vida do sacerdote). … cf. http://alexandriacatolica.blogspot.com.br
Psicologia e vida espiritual - 2022, 46
No início do seu primeiro trabalho, “De ente et essentia – O ente e a essência”, Santo Tomás cita
logo na 1ª frase Aristóteles que diz: “Um erro insignificante no princípio faz-se considerável no
fim”29. Assim se entende que Santo Tomás vai com muita cautela (e não só neste tema).
Ele trata esse tema, a felicidade, em 5 questões, e em cada questão distingue e discuta 8 artigos,
então trata esse tema, a felicidade, em 40 perguntas. Isto já é incrível para a nossa maneira de
pensar rápido e, consequentemente superficialmente.
Mas ainda mais devemos considerar: em cada um desse 40 artigos, segundo o método
sistemático dele, apresenta primeiro diversas opiniões sobre esta mesma pergunta particular,
opiniões opostas ou contrárias a sua opinião e uma em seu favor. Contando, mesmo só por
curiosidade, ele discute 127 argumentos contrário a sua posição, e 40 autoridades em seu favor.
E ainda deve-se anotar esta característica: Se hoje um autor trata um tema e divide a análise e
solução em 40 capítulos, além disso discute 127 opiniões ou pontos de vista contrárias, qual
volume daria tal livro? Santo Tomás trata isto em duas colunas de 48 páginas, então se queremos
em 90 páginas.
Com esta pequena apresentação do tratado “por fora” ou sob o ponto de vista material se entende
também que não podemos agora neste tempo disponível apresentar tudo.
Para apresentar as ideias de Santo Tomás seguiremos a maneira como ele procede sempre, do
geral ao concreto
Ele verifica primeiro se felicidade existe, se há felicidade
E se sim, em que realmente consiste.
Se realmente existe, deve ser possível de alcança-la.
Sempre procede da maneira já explicada nos artigos:
Primeiro colhe as opiniões de outros,
Depois apresenta seu próprio raciocínio e reflexão, e
Por fim, discute as opiniões dos outros e vê o que é bom e o que seria errado.
Como procede? Primeiro pergunta para o fim último que se encontra em tudo e do qual tudo
recebe sua razão (de ser etc.), isto na vida cotidiana, e aqui para a vida, existência toda do
homem, ou seja o que depende do homem (seu fazer, 2ª parte) e o que DEUS faz para lhe ajudar
(a 3ª parte da Suma teológica), a Encarnação do Filho de DEUS e os sacramentos.
Para o homem, o fim último é a bem-aventurança que trata aqui no início dessa IIa e IIIa parte da
Suma toda.
Pergunta:
q. 1: o fim último em comum
q. 2: em que consiste a bem-aventurança
q. 3: o que é (a essência d-) a bem-aventurança
q. 4: os elementos da bem-aventurança
aa. 1-4 = o papel da vontade
aa. 5-8 = o papel do corpo
q. 5: de que modo podemos conseguir a bem-aventurança
29 Aristóteles, De coelho et mundo, I, V, a 271: “Para quem exorbita, um pequeno desvio da verdade torna-se dez
mil vezes maior quando se vai mais longe... assim é que pequeno erro, no princípio, faz-se grande no fim.”
Psicologia e vida espiritual - 2022, 47
Parte I-II, q. 1, a.1: Sem mais sem menos, Santo Tomás logo enfrenta a questão do “último
fim” – durante as análises se explica a razão.
O homem vive e age, diríamos hoje: ao seu agir específico pertence apenas aquelas ações sobre
as quais ele tem Domício, e estas são “as ações pela razão (rationem) e pela vontade”.30
Este domínio ele chama “livre arbítrio” que não abrange só a vontade, mas “a faculdade da
vontade e da razão” (1,1 e 2).
Agora o objeto da vontade é o fim (1, a.2) e o bem universal (ad 3), e se move por si mesmo a
ele – e depende desse fim, se a ação do homem aperfeiçoa ele ou o diminui (a. 3). A razão é este:
O fim é “o último na execução e o primeiro na intenção” (1,1, ad 1), mas a intenção pertence à
vontade, e por isso, ele dá ao ato humano a qualidade moral (1,3 ad2).
Dito isto,
S.T. levanta a pergunta se há um último fim e responde (a.4): Se não um último fim, o homem
nem começa mexer: “Eliminando o princípio (que move), não haverá o que mova o apetite”.31
30 Estas ações chama “ações humanas” enquanto há outras, que o homem tem em comum com os animais como
respirar, ou digerir etc. Estes ele chama atos do homem (actus hominis).
Mas aqui deve-se logo completar o entendimento pelo fato que a alma racional do homem assume as funções da
vida vegetativa e sensitiva; consequentemente, o homem racional tem uma certo poder ou certa influência também
sobre os atos do homem, logo uma certa responsabilidade.
31 Aqui devemos hoje já juntar essa observação, hoje, quando encontramos tantas pessoas que vive a vida sem
pensar muito (ou nada); elas se “deixam” viver ou pela opinião de outros ou pelos impulsos do apetite sensitivo
(gosto, paixões, fome e sede ...), mas não dirigindo sua vida pela razão e livre vontade – o que S.T. considera como
agir especificamente humano. - A experiência da vida hodierna mostra isso por tantas pessoas que não olham /
creem mais em Deus como último fim: elas ficam sem rumo e sem sentido verdadeiro de sua vida; se o sofrimento
não é “demais” percorrem a vida de 80 anos mas sem saber por que ou para que – e terminam como um animal: se
enterra o corpo e “o mundo” continua como não tivessem vividas, lhes esquece.
Psicologia e vida espiritual - 2022, 48
I-II, 1, aa.5-8:
a. 5: Quantos últimos fins há?
Só um, pois ninguém pode servir dois senhores.
- a vontade quer a plena satisfação – e não pare, cansa enquanto não alcançou – logo só
descansa num só
- a natureza tende a uma coisa – que deve ser o seu fim – que pode ser apenas um só.
- cada gênero há um só princípio – assim também cada homem.
a. 6: Então – se há só um último fim – é tudo que o homem quer em vista do último fim?
- tende para o bem – e esse deve ser o bem perfeito, logo tende, desde o início para a sua
consumação – que só encontra no último fim.
- segundo os movimentos, todos são movidos pelo primeiro motor e este é ordenado ao primeiro
desejado.
- Todos são iguais no desejo do último fim porque querem alcançar a PERFEIÇÃO que é a
razão do último fim.
- E em que se encontra essa razão? Não todos estão de acordo !
Alguns deseja riqueza, outros o prazer,
outros o agradável ao paladar... e isto pode ser a doçura do vinho ou mel ou ...
e em que alguém pensa encontrar o seu último fim, esse deve alcançar perfeitissimamente.
Em si, mesmo para nós hoje não é difícil entender e aceitar que
o homem não encontra sua última felicidade nestes – pois todos são tão frágeis, perecerias
que não demoram e satisfazem o homem.
Mas, vale apena escutar o Santo como ele argumenta para cada um.
Art. 1 – a riqueza: S.T. distingue entre riquezas naturais e artificiais. As duas servem para matar
As necessidades do homem como comida e bebida etc. logo não são o
último fim.
Ad 2: O dinheiro em particular serve para comprar coisas materiais – mas não espirituais
Como a sabedoria.
Art. 2: - a honra: A honra está no que honra – e não no honrado – por isso, não é o fim!
[o aplauso do presidente do banco ou do diretor de uma escola vale (pois sabem
que falam), e não de um empregado ou apenas de um vizinho]
Ad 1: Outra observação de S.T.: Honra é um prêmio – mas não o verdadeiro que é a bem-
aventurança; logo, quem procura honra, age mais por uma ambição que por
virtude.
[Ex. a “Miss Brasil” ligou a um colega da primária, que sabia ser Bispo, e pediu ajuda, pois
estava triste e perdida – a “Miss Brasil” !]
Olhando para trás dessas quatro razões e referindo-se a eles, dize ainda
A Bem-aventurança é o sumo bem do homem - esses bens podem ser encontrados nos bem
e maus;
Psicologia e vida espiritual - 2022, 50
O home ordena a ela os principais - eles originam de coisas exteriores e, muitas vezes,
intenções naturalmente de sorte, logo não constituem a bem-avent.
No segundo grupo, Santo Tomás olha ao homem mesmo [por isso, interiores]
Ele lista o - bem do corpo, o prazer, algum bem da alma, e pergunta: consiste em algo criado?
Art. 5 – num bem do corpo: s.c. há animais que – seg. o corpo - são melhores que nos no corpo.
1º O corpo não tem seu último fim em si – é dirigido pela vontade como um barco pelo
navegador; e seu fim é apenas conservar a existência.
E 2º o Corpo depende da alma (não vice-versa) – como a matéria da forma;
e o instrumento do motor;
logo todos os bens do corpo se ordenam para os bens da alma com seu fim
[a vida física é “sacrificada” para a vida da alma como nos mártires; S. Maximiliano Kolbe)
Art. 6 – no Prazer (em latim: voluptas): s.c. Boécio: Lembrar-se das paixões faz nos triste;
resulta da voluptuosidade – não fazem feliz.
1º Em cada coisa há o que pertence à sua essência e o que lhe é acidental;
o prazer é acidental e apenas acompanha a beatitude.
2º O prazer é o bem de um sentido do corpo, e de um indivíduo; mas o bem da alma é
universal e infinito, logo superior do bem do corpo e do prazer.
“A maioria dos homens, não podendo alcançar os prazeres (delectationes) espirituais, que são próprios
dos virtuosos, resulta que se voltem para os prazeres do corpo.” (Suma Teológica, I-II, 31, 5 ad1)
Art. 8 – em algo criado: s.c. Sto Agostinho: “Feliz o povo cujo Deus é o Senhor!” (Sl. 143,15)
A bem-aventurança é – um bem perfeito; tranquiliza o desejo totalmente;
Se não fosse o fim último, ficasse algo a desejar!
O objeto da vontade é o bem universal e do intelecto a verdade universal
Só pode aquietar os dois o bem universal;
Este não se encontra em algo algo criado que apenas participa na bem-avent.
LOGO: “Só em Deus consiste a bem-aventurança do homem” (c.fi), pois “o bem do universo
não é o último fim do homem, mas o próprio Deus.” (ad 2).
S.Th. I-II, q. 3 e 4
q. 3 = a essência da bem-aventurança
q. 4 = os elementos da bem-aventurança
aa. 1-4 = o papel da vontade
aa. 5-8 = o papel do corpo
S.Th. I-II, q. 3
É belo de ver o procedimento lógico de Santo Tomás – tão agradável (= belo!) sua ordem:
A Bem-aventurança é algo criado?
Se criado uma ação?
Se uma ação, então ação sensitiva ou intelectiva?
Se é uma ação intelectiva é do intelecto ou da vontade?
Se uma ação do intelecto é do intelecto especulativo ou prático?
Se do intelecto especulativo é das ciências especulativas?
Então consiste no conhecimento - dos Anjos?
Ou, mesmo na visão da essência divina?
a.2 - A Bem-aventurança é uma ação? Se é algo a ser alcançado, então seria um agir do
homem; e seg. isto deve – seg. Arist. (sc) “proceder de uma virtude perfeita”.
Para agir precisa ser em ato – e possuir a potência;
A última perfeição do homem consiste na bem-aventurança, no último ato do homem;
Logo deve ser o ato de considerar [= pensar, refletir, contemplar]
Ad 4: Há graus de perfeição: DEUS, Anjos, o homem in via, - na vida ativa dedicado a muitas ocupação e
na vida contemplativa onde há bem-aventurança mais contínua, maior, m.perfeita.
Desejamos o fim inteligível, mas o intelecto o faz presente, logo consiste num ato da
inteligência. - Em seguida a vontade gozosa descansa no fim já possuído , logo pertence à
vontade o prazer consequente: Agostinho: “A bem-aventurança é o gozo da verdade.”
Ad 1: A BA é perfeita seg. o intelecto que transcende o corpo; não enquanto a alma é a forma do
corpo. (cf. ad 4)
Felicidade perfeita: não é necessário a sociedade de amigos por possuir a plena perfeição em
Deus. Mas a companhia contribui ao bem estar da BA.
Psicologia e vida espiritual - 2022, 55
Art. 2 – Pode um ser mais BA que o outro? (Jo 14,2: há muitas moradas)
- o próprio fim = o Sumo Bem - = é objeto e causa das BA: É DEUS = um só
- enquanto “posse” ou gozo do bem: um mais que outro “porque está melhor disposto ou mais
ordenado para esse gozo.”
Ad3: “A nenhum b-ado falta algum bem a ser desejado.
Um mais disse por causa da participação diverso.
Art. 3 – Alguém pode ser b-a nesta vida? (Jó 14,1: nesta vida cheia de misérias)
É impossível
1º a BA pelo Bem perfeito exclui todo o mal e satisfaz todo o desejo – “nesta vida o desejo do
bem não pode ser saciado.” (Os bens são transitórios; o homem foge da morte por natureza...)
2º A BA consiste essencialmente na Visão da essência divina – não se pode atingir nesta vida.
Art. 6 – o homem consegue a BA pela ação e uma criatura superior ? (= Anjo, Santo)
Sl 83,12: Deus draá a graça e a glória.
C: “o que excede a natureza criada não pode ser feita pelo poder da criatura.
Ad 1: “o homem é auxiliado pelos anjos para conseguir o último fim, mediante algumas coisas
preparatórias, que o dispõem (só).
Art. 7 – Obras boas são exigidas? (s.c.: Rom 4,6: Se sabeis, sereis b-a se fizerdes)
A BA exige a retidão da vontade ... não se conclui que alguma ação do homem deve preceder a
sua BA. - ter a BA por natureza pertence só a DEUS. Com ao BA excede cada criatura,
nenhuma consegue convenientemente. ... mas conseguem-na por muitos movimentos de aç~eos
que são os méritos.
sustentados pela graça do Espírito Santo. Fecundados pela Palavra de Cristo, daremos, aos
poucos, frutos na Igreja para a glória de Deus (Cf. a parábola do semeador: Mt 13,3-23).
Salmo 55 (54)
1 [Ao maestro do coro. Com instrumentos de corda. Poema de Davi.]
2 Ó Deus, escuta a minha oração, não rejeites minha súplica; 3 presta-me atenção e atende-me.
Estou ansioso na minha tristeza e me perturbo
4 pelo grito do inimigo, pelo clamor do malvado.
Pois sobre mim fazem cair desgraças, me perseguem com furor.
5 Meu coração treme no meu peito e terrores mortais se abateram sobre mim.
6 Temor e tremor me invadem e me oprime o horror.
7 Então digo: “Ah! Se eu tivesse asas como a pomba para voar em busca de descanso!
8 Fugiria para longe, iria morar no deserto,
9 buscaria um lugar de refúgio, protegido da fúria do vento, longe de qualquer
tempestade”.
10 Dispersa-os, Senhor, confunde suas línguas.
Vejo na cidade violência e discórdia:
11 dia e noite circulam sobre seus muros, dentro há iniqüidade e tormento.
12 Insídias reinam no seu interior e não cessam em suas praças a opressão e a
fraude.
13 Se fosse um inimigo que me insultasse, eu agüentaria;
se fosse um adversário que se levantasse contra mim, me esconderia dele.
14 Mas és tu, meu companheiro, meu amigo e confidente;
15 uma doce amizade nos unia, na casa de Deus caminhávamos alegres.
16 Que a morte caia sobre eles, que desçam vivos ao lugar dos mortos, pois a
maldade mora com eles.
23 “Entrega ao Senhor tua ansiedade e ele te dará apoio, nunca permitirá que vacile o
justo”. 24 Tu, ó Deus, os precipitarás no fundo do sepulcro; os homens sanguinários e
fraudulentos; não chegarão à metade dos seus dias. Mas eu em ti confio.
“Amabilíssimo Jesus, meu bom salvador, única felicidade de minha vida!” (Livrinho sobre as
Chagas, 87)
Não deveríamos chegar ao mesmo suspiro? – ao menos na Sta. Comunhão, na 1ª S.Co.?
3,25-30:
25 Quanto a
Epafrodito – que é para mim irmão e companheiro de trabalho e de luta, e que foi enviado por
vós para me atender nas minhas necessidades – julguei que devia mandá-lo de volta a vós. 26
Ele estava com saudades de todos vós e andava muito preocupado, porque ficastes sabendo de
sua doença. 27 Realmente, ele esteve às portas da morte, mas Deus compadeceu-se dele, e não
somente dele, mas também de mim, para que eu não tivesse tristeza sobre tristeza. 28
Apressei-me, pois, em vo-lo enviar, para que tenhais a alegria de revê-lo e eu fique mais
aliviado. 29 Recebei-o, no Senhor, com muita alegria, e tende em grande estima pessoas como
ele. 30 Pois, pela causa de Cristo, ele esteve bem perto da morte, arriscando a própria vida
para me atender em vosso lugar.
4,4: Alegrai-vos sempre no Senhor! Repito, alegrai-vos! 5 Seja a vossa amabilidade conhecida
de todos! O Senhor está próximo. 6 Não vos preocupeis com coisa alguma, mas, em toda
ocasião, apresentai a Deus os vossos pedidos, em orações e súplicas, acompanhadas de ação
de graças. 7 E a paz de Deus, que supera todo entendimento, guardará os vossos corações e os
vossos pensamentos no Cristo Jesus. 8 Quanto ao mais, irmãos, ocupai-vos com tudo o que é
verdadeiro, digno de respeito ou justo, puro, amável ou honroso, com tudo o que é virtude ou
louvável. 9 Praticai o que de mim aprendestes e recebestes e ouvistes, ou em mim
observastes. E o Deus da paz estará convosco.”
Psicologia e vida espiritual - 2022, 60
III.
TRATADO SOBRE O HOMEM - A antropologia de Santo Tomás
A. No início seja permito esta observação: Profundos conhecedores de Santo Tomás não acham
bom de falar de “tomismo” ou, como neste contexto nosso, de “antropologia ou psicologia
tomista”; e isto por vários motivos:
- O que se encontra nos escritos de Santo Tomás é demasiado amplo para restringir a um -ismo.
- Também, porque o ensino de Santo Tomás não é uma opinião ao lado de outros, ou seja, um
-ismo ao lado de outros...
- Principalmente, porque Santo Tomás queria simplesmente conhecer e ensinar a VERDADE,
aquilo que é, a REALIDADE, e essa é a obra de DEUS – como já falamos: Observa e ensina o
que leio na realidade.
Alguém pode opor: Mas, não querem todos apenas isto? Não querem todos os psicólogos apenas
tratar do mesmo, do homem? Não querem todos apenas apresentar e explicar a Verdade?
Bem se aceitamos essa intenção, surge a pergunta: Por que, então, não chegam todos a mesma
doutrina? Se todos querem o mesmo, será então que eles tratam de algo diferente? Será que dão
respostas diferentes a pergunta: “Quem é o homem?”
E alguém especifica: Quem é o homem? - ou: Quem é a alma?
Direi: se se pergunta pelo homem, então a pergunta é filosófica,
se a pergunta é pela alma será psicológica, porém consciente de que se olha só a uma parte, que
certamente dificultará uma visão correta e um conselho adequado, se consegue um
(entendermos mais sobre isso mais para frente).
Quando olhamos à felicidade com último fim da vida humana (aula passada), olhamos para fora,
para onde e para que viver; agora aqui queremos olhar principalmente para dentro do homem e
perguntar: Quem é o homem e como “funciona” ou realiza ele sua vida?
Seguiremos este fio de pensamento:
Tudo que há ou que existe, é composto por estes dois princípios, ser e essência, e sem estes não
teria nada, não existiria nada e não teríamos ideia de nada. Para nos conhecer algo e saber algo
precisa isto primeiro existir, e existe quando estes dois princípios são unidos, quando uma ideia
recebe um ser, ou um ser e determinado por uma essência e assim começa existir uma coisa, um
ente, qualquer coisa real, existe conforme a essência ou a forma substancial.
Isto comenta a filosofia do camponês, e do motorista do ônibus e cada um que tem bom senso32:
Um princípio podemos também chamar “matéria” ou “material” e ou outro princípio “forma”
que permite depois de identificar uma coisa da outra, como distinguimos a caneta do meu dedo
ou de um livro. Nunca mencionei ainda, mas já captaram, mas vou ainda dizer: Estes dois
princípios são unidos e, enquanto são unidos, constituem a coisa! Quer dizer: Não há caneta sem
esse material, e não há esse material senão tivesse a determinação ou forma de caneta. Claro,
mais exatamente seria dizer petróleo em vez de caneta, pois a forma natural da caneta é petróleo,
e esse petróleo virou caneta por juntar ao petróleo algumas características acidentais que variam
32 H. DOPPLESTEIN. Psychiatry for Priests – (orig. German: Psychiatrie und Seelsorge). New York: Kenedy &
Sons, 1953, p. 23.
Psicologia e vida espiritual - 2022, 62
(Nós ajudámo-nos com a caneta porque o que vemos (uma coisa) é marcado por mudanças
acidentais e nós vemos as substâncias através dos acidentes, como mencionamos entre os
princípios de S. Tomás: “Pelos acidentes julgamos da substância”; ST. III, 75,5 obj 2).
b) Homem (alma com corpo) existente
Para aplicar esta lei fundamental, valido para toda a realidade, ao homem, peço seguir os
seguintes passos:
6º Encontramos em todas as coisas, em tudo que existe, em cada ente os dois princípios unidos,
Matéria e forma - o ser e a determinação como TAL ser, pela essência.
7º A matéria faz que existe aqui algo – e a forma é aquilo que nós captamos, entendemos que é.
(Agora olhamos às causas extrínsecas, à forma como pensamento de Deus e ideia
e a matéria (ao ser, que dá existência) criada por Deus do nada.)
8º Que isto é possível (e de fato é assim, como vimos), pressupõe que
DEUS pensa as coisas como um composto por matéria e forma, tem isto como ideia,
depois, num momento de tempo, histórico, quer que estes pensamentos sejam realizados,
existissem e por isso, e nesta hora, cria o ser para esta ou outra ideia.
9º Isto é o momento em que começa ser, agora podemos dizer existir algo, porque tem já ideia, e
ela, juntando o ser, dá a coisa, aquilo que nos vemos em cada ente:
uma matéria e forma, ou uma “matéria formada”, concreta, individual,
10º Distinto da ideia na mente de DEUS por possuir agora um ser próprio:
É lá, em Deus, como ideia – e cá, na terra ou entre as criaturas, como um ente concreto.
13º Quando agora essa ideia “animal racional”, essa forma, ou essência de “corporal-espiritual”
Se faz existir (cria) ou se uma com um ser, começa existir um homem,
um indivíduo, uma pessoa única, existencial, corporal-espiritual.
Isto se verifica, ao mais tradar, na morte que é a separação da alma do corpo: pois aí o corpo não
continua ser ele (quer dizer, com próprio ser), mas volta tornar-se pó(eira), enquanto a alma,
devido de sua espiritualidade, é capaz continuar existir por si só.
15º A racionalidade se percebe em cada parte do corpo – percebemos a dor..., se vê no rosto que
é uma pessoa. Todo o corpo é animado pela alma – mesmo que o corpo não é igual a alma.
Pela alma, o homem pode transcender, isto é ultrapassar os limites da matéria, do corpo, mas,
Enquanto o homem vive, a alma não existe fora do corpo.
c) Com uma união total (alma como único princípio de vida do homem)
Ela é baseada na própria natureza do homem, por isso, se pode e deve chama-la natural e é
normal – não como uma norma que se impõe e por isso, o homem orgulhoso, ou quem quer ser
independente, quer fugir como o fogo do inferno, mas
- como norma do ambiente em que se encontra e em que se desenvolve sua existência na
dinâmica da vida.
18º Neste homem se observa um sentir e pensar, uma vida em vários níveis,
- um inconsciente como a digestão da comida ou batida do coração... (nível vegetativo)
- outro perceptível se queremos dar atenção como a lembrança de um encontro ontem,
Ou do sabor do vinho... (nível sensitivo)
- outro os pensamentos e amores de objetos distantes, passados e futuros etc.
e que (nível espiritual)
“eu” posso me conscientizar de todos estes modos de minha vida, ou seja, que
em todos estes níveis de vida está presente a minha e única alma (= princípio vital).
20º Na base dessa união em mim – eu observo diversos objetos lá fora, as cores, os sons, ...
Mas cá dentro de mim, sou sempre EU que percebe, vê, escuta, reflete ou deseja....
as coisas materiais recebo pelas faculdades específicas do meu corpo,
as “coisas” espirituais (como ideias) acolho pela faculdade espiritual, do intelecto e vontade, e
respondo respectivamente:
uma flor movo pelo meu braço; a um cachorro dou um som que ele interpreta devidamente;
a uma pessoa (mesmo existente num corpo, a uma pessoa humana), e mais ainda a uma pessoa
puramente espiritual como aos anjos e a Deus – basta qualquer manifestação do meu interior e
talvez nem isto é necessário (pois basta o encontro direto).
Ambos desses dois exemplos são hoje – sempre com excepções – deixado ao lado como teorias
insatisfatórias. No fundo, todos separaram alma e corpo, espírito e matéria.)
Precisamos recorrer a toda essa estrutura que consideramos deste o início, deste a composição de
cada coisa, para entender e analisar tudo que
entendemos, captamos ou / e nos influencia.
Para proceder corretamente, Santo Tomás faz esta observação radical (S.T. p. I, q. 77, a. 3):
(1) Pelos objetos – lá fora no mundo, com os quais o homem tem contato –
(2) se distingue os atos – com os quais o homem entra em contato, vive e se comunica
com o mundo, e por estes
(3) se distingue as potências/faculdades – que capacitam o homem dessa convivência.
Assim seja começado pelas observações mais imediatos, que se encontra, em cero sentido, na
superfície das coisas,
- as cores (e com elas a luz) – que o homem percebe, capta pela visão (os olhos)
- o som (que é transmitido pelo ar) - que o homem percebe, capta pelos seus ouvidos, a audição.
- o sabor que o homem percebe e capta pela paladar
- o odor que o homem é capaz de perceber pelo olfato (a nariz) e
- a temperatura e resistência, dois aspetos que, parece, a mesma faculdade percebe, o tato.
Nem por Aristóteles, nem por Santo Tomás de Aquino nós conhecemos da realidade ao nosso
redor outras coisas, que fariam necessário de supor outra faculdade ou outro sentido (I, 78,3).
Se pensamos no peso ou na redondeza de um objeto – como se explica este conhecimento ou
outros ainda (I, 78,4 e 79,6s)? Eles nos indicam um sentido comum – que será já interno na vida
humana. Este acolhe tudo o que estes sentidos – chamados – externos percebem e passam ao
Mundo interno do homem, a este sentido e ele junta, para assim dizer estes dados e forma uma
imagem completa.
Este estaria presente ao homem interno em colaboração de duas outras faculdades, da estimativa
que possui uma certa capacidade organizativa (pensamos quando dirigimos e “calculamos” por
ex. as distâncias; se chama faculdade estimativa. Outra é a memória que é semelhante um
armazém ou depósito do que já tinha entrado no homem e de onde o homem pode – num outro
tempo – chamar de volta à presença atual o que uma vez passou. Há uma faculdade ainda que
S.T. considera diferente nos animais e no homem, mas ainda só no nível sensitivo; esta chama a
faculdade imaginativa ou fantasia, que é capaz de unir várias imagens para uma nova – como
um tipo de colagem. É ainda no nível dos sentidos porque não deixa de tratar sempre com
imagens sensitivas – não ainda com ideias abstratas.
Depois, observamos que nos homens temos uma faculdade que abstrai do que é típico dessa
reprodução visto até aqui: Se vejo com os olhos a caneta – desconsidero seu ser material, mas
tomo em mim seu comprimento, sua cor, sua resistência etc. E tudo isso, está ainda presente
quando me perco, como se diz, na fantasia sobre a caneta. Mas vem um momento, em que capto
a ideia da caneta, como instrumento para escrever. Neste momento, não dou importância se é de
cor verde ou preta, e consequentemente se é esta ou outra, e assim abstraio mais uma vez: esta
vez dos detalhes acidentais que permitem distinguir um do outro, e fico só com a ideia, que tem
como característica de ser universal ou que se encontra em muitas coisas, em todas as coisas que
possuem esta característica e capacidade de escrever. Esta ideia não fui eu que criei, mas se
encontra no ente, lá fora, no mundo, e eu apenas conheci, e isto pela faculdade que se chama
intelecto (I,79). – Até aqui, observamos quase só o nosso conhecimento das coisas do mundo.
Agora há ainda um detalhe na nossa vida que até aqui ainda não se considerou: o interesse para
as coisas, a vontade, o apetite, a ânsia de possuir e ter aquilo ou aquele – e quantos sacrifícios o
homem assume para ter isto ou aquilo! Quanto sacrifício de nós aqui para chegar ao entendimen-
to do ser humano, e para depois, com este, viver mais prudentemente e poder ajudar outros...
A faculdade que observamos em nós e nos faz agir assim é a vontade; S.T. fala do apetite que
pode ser sensitivo ou racional espiritual (I, 80-83).
Se fala da vontade espiritual quando recebe do intelecto o conhecimento de algo, inclusive do
seu valor ou de sua bondade ontológica, e então quer mover-se até possui-lo. É uma própria
faculdade porque não procura automaticamente o que entende de ser bom. Uma vez vai e faz
esforço, outras vez não. O que observamos nisto? 1º a liberdade, uma certa independência da
Psicologia e vida espiritual - 2022, 68
Santo Tomás estudou estes movimentos no homem e os descreveu com tantas distinções, como
ninguém antes dele na história, e - segundo os estudiosos de psicologia hoje – como ninguém
depois dele até hoje. É na descrição do caminho do homem a sua meta final e definitivo em
Deus, na I-II da Suma Teológica, nas questões 22-48.
Não só aqui não podemos entrar nestas tantas detalhadas observações e distinções que o Santo
faz. Este é um trabalho que Professor Echavarría e Sales Victor Pinheiro estão fazendo.
Esperamos que muito mais capacidades intelectuais e namorados do ser humano seguem nesta
análise e assimilam esta sensibilidade e amor para a alma e vida humana.
Isto será o caminho de substituir as pobrezinhas psicologias que se encontra hoje tão espalhadas
no mundo e se oferecem como salvadoras do homem, mas que se baseia numa filosofia e
interpretação errada da realidade em geral e da do homem mesmo, e por isso, são longe de trazer
ajuda ás pessoas necessitadas.
Seguem dois esquemas que ajudariam
- assimilar esta estrutura rica e tão perfeito da vida psicológica do homem e
- facilitam, espero, entender o seu funcionamento concreto, prático e constante!
É importante familiarizar-se com isto porque
Em cada momento de nossa vida pessoal vivemos isto – e queremos viver bem, e
Esta visão global é importante de ter presente quando uma outra pessoa nos conta de sua vida – e
pede um conselho ou uma orientação para uma decisão que deve tomar.
Não queremos que reage e vive numa forma que depois se precisa arrepender por ter sido errado
e, se machucado na sua alma pessoalmente, um erro que depois carrega consigo até encontrar
uma cura ou alívio e correção...
Psicologia e vida espiritual - 2022, 69
1o Diante de mim, meu eu, diante da minha consciência está tudo aberto. A consciência ilumina,
com sua luz tudo, para refletir e escolher.
2º Não tudo que cai (bate) sob o meu olhar ou ouvido é tão forte ou explícito que me torno
consciente; esta restrição já não vale mais quando algo passa a porta do “sentido comum”.
3º Apesar dessa fraqueza da percepção humana, o homem é capaz de dirigir sua atenção através
dos sentidos externos a aqueles objetos aos quais quer-se dirigir: posso abrir ou fechar estas
“janelas” da alma.
4º As emoções são como os cachorros num largo redil: Seja que for, que entra, causa a reação
correspondente, se é bom ou mal, já eminentemente presente ou apenas avisado...
O dinamismo básico na alma humana e várias observações
Psicologia e vida espiritual - 2022, 70
Conscientizando-me dessa rica realidade minha, e da imensa grandeza de decidir por mim sobre
a minha vida eterna, escuto JESUS dizer:
“Todo aquele que faz a vontade do meu Pai, que está nos céus,
esse é meu irmão, minha irmã e minha mãe.” (Mt 12,50).
2. O problema da opinião de alma e corpo separados no tempo moderno
34 Um médico pensa que depressões podem ser causadas pelo barulho constante durante o dia, ao qual não se dá
mais atenção, logo não se reage, se suporta inconscientemente, mas tira força de nós. Pode ser o barulho constante
dos carros na rua ou do Rádio ou da TV nunca desligado. Isto deixa-nos na noite esgotados, mesmo que não fizemos
tanto.
35 Se penso no que está diante de mim na mesa... e se imagino que, de repente, soube enfrente uma cobra, creio, que
não preciso “pensar muito” para reagir, e apesar disto, todas faculdades cumprem sua função, uma após outra.
Psicologia e vida espiritual - 2022, 71
Até aqui, constatamos que sempre teve bêbados, adultério e até o “negócio de prostituição” –
prova do fato do “pecado original” que toca todos. Mas também o homem sempre podia corrigir-
se, converter porque sabia o que é correto.
No tempo da renascença (aí explicita e largamente aceito) nasceu de novo o paganismo, quer
dizer a exclusão da intervenção divina em e por Cristo, e assim o Cristianismo. Os pensadores
retomaram as posições dos filósofos gregos, até iam para antes de Aristóteles (ainda diziam que
queriam conhecer a verdade como Sócrates). Com isto, “cortaram” os dois braços do homem, ou
seja, o “braço esquerdo” que lhe disse de onde veio, a causa eficiente, ou ser criatura, e o
“bração direito” que lhe indicou para onde ia, ou sua causa final, a volta a Deus seu criador.
Continuando a imagem do corpo, não se admira que também perdeu a cabeça, quer dizer: chegou
a uma “psicologia sem alma” – como por muitos livros é caracterizado a psicologia do século 19.
Que aconteceu? – Se entende, estamos em plena área de filosofia!
a) Por Descartes
Apareceu no século 17 um homem que se chamava “Descartes” em francês ou “Cartésio” em
latim. Ele achou que tinha um sonho no qual “descobriu” que a única verdade é que ele pensa, e
só enquanto pensa em si, sabe existe – “cogito – ergo [= em consequência, não antes!] – sum!”
E, em consequência disto, pensou e afirmou (ensinou) que o homem consiste por duas
substâncias, a “res cogitans” – o pensar e a “res extensa” – a parte material que estão conectadas
apenas por uma “pequena glândula, chamada pineal, situada no centro do cérebro, que constitui a
sede da alma” (Reale, III, 386). Isto levou a separação do que acabamos indicar com união.
Os que aceitam essa nova concepção do homem e seguiram a filosofia de Descartes
- distanciam o homem de Deus e de religião – des-considerando primeiro sua origem espiritual,
depois – em certas partes – também de sua origem física e histórica. Metafisicamente falando:
desconsideram a causa eficiente do homem, e consideram apenas como ele está agora aqui (cf. a
descrição por Papa Francisco (veja p. 19 aqui): eles cortam toda a ligação com o passado).
- des-consideram também um fim de vida, a causa final, o sentido do viver que todos desejam
entender. A intenção dessa filosofia é de declarar o homem totalmente livre. Mas como tal
sentido ou meta implicaria um “dever” e uma “responsabilidade, ou seja, a obrigação de
responder a algo ou alguém”, e limitaria a liberdade, fica lógico de excluir essa da visão e ficar
apenas com o homem em si, com sua causa formal e material, ou, de alma e corpo.
b) Ideia materialista da alma por Herbart
Mas, para salvar a autonomia do homem individual, houve duas inovações:
- o filósofo Johann Friedrich Herbart (1776-1841), um dos mais decididos e significativos
contestadores do idealismo de Hegel, deu uma própria (e nova) interpretação da “alma” que nega
ela, a alma, e considera o homem apenas com uma máquina com certas funções e certa lógica de
procedimento, sempre controláveis.
- A outra inovação deixou o homem abandonado a si mesmo, totalmente livre (“condenado à
liberdade”, segundo o existencialismo).
36 “A psicologia científica tem apenas um século de vida. Se considera o ano 1879 como início... (Benito GOYA.
Psicologia e Vita spirituale. Sinfonia a due mani. Bologna: Edizioni Dehoniane Bologna, 2000, p. 9). O autor deixa
seguir uma breve história e descreve um desenvolvimento, p. 9-19. Mais para frente volta a história e diz:
Psicologia e vida espiritual - 2022, 72
O homem foi considerado sem a causa ou início e sem fim (causas eficiente e finais), e
consequentemente, ou foi considerado como um mecanismo determinado ou como um ente
absolutamente livre.
“Quem estudou psicologia ainda 30 anos atras, precisava confrontar-se com uma série de dificuldades para entender
em qual maneira esta matéria, apresentada com científica, podia andar juntos como a verdade evangélica ou com a
submissão filial. Esta foi elaborada sobre pressupostos completamente materialistas e ao mesmo tempo se
apresentava como absolutamente neutral ao nível teórico. Agora tornou-se claro que tal fingida neutralidade
filosófica-antropológica constitui no fundo uma sutil estratégia para impor as próprias teorias com única verdade
moderna.” (p. 39) E ainda (p. 50):
“Em certos ambientes psicológicos, a exigência religiosa aparece como algo de esterno, não veem nessa um convite
íntimo a realização do próprio ser, mas uma imposição externa, um peso inútil. De tal modo, o fato de ser um crente
é considerado sinônimo com ignorante, antiquariato, imaturo, dependente de ideais escuras da Idade Média: a fé,
segundo estes, destrói a personalidade, a liberdade e autonomia; e assim, para eles, a crença na dignidade e
independência da pessoa são valores fundamentais e prioritários36, desconfiam à fé em Deus que parece assim com
uma ameaça para a sua autonomia e liberdade ou como um inimigo da sua personalidade. Talvez são provocados
dos que praticam com decisão sua afirmação que creem em Deus, mas, ao mesmo tempo, não dão nenhum sinal de
fé na pessoa humana.” (Observação: a tradução é nossa; parece que existe uma tradução e publicação em português,
mas não podia ainda verificar se é fidedigna pois segundo o índice accessível não corresponde perfeitamente.)
37 É isto a explicação que um psicólogo publicou um livro com apenas 200 páginas sobre a Psicologia. Na
introdução escreve: “Toda a Psiquiatria e Psicoterapia em 200 páginas? ... Par ter certeza deixei ler o livro por
peritos de nome que tinham escritos grandes volumes de ensino, e eles acharam que estas 200 páginas seriam
absolutamente suficientes.” (H. LÜTZ. Neue Irre! Wir behandeln die Flaschen. Unser Problem sind die Normalen.
München: Kösel-Verlag, 2020; München: Penguin Verlag, 2022.
Psicologia e vida espiritual - 2022, 73
Só entendemos que tem um sentido, e por isso serve para algo. Como ao lado uma oficina está
aberta, custa nada de pegar o parafuso e entregar a um funcionário lá. Ele logo disse: Ah, que
bom, esse pertence à bicicleta e é muito importante para a segurança ...
Como a reflexão filosófica no início mostrou que tudo tem sentido, e este é indicado pela forma
substancial ou essência (ou, natureza), tudo é útil e serve no seu lugar. No mundo há ordem, mas
que conta é que cada coisa está no seu lugar que a filosofia universal e até a verdadeira religião
indica. De uma psicologia sem correta visão filosófica e consideração religiosa não se pode
esperar muito! Um fato de 2021:
- O pequeno Pedro de 4 anos parou falar por longo tempo. Os pais preocupados levaram ao
médico, ao psicólogo; suspeitaram autismo. A avó escutou do caso, começou rezar ... de repente
a criança chamou “Pai!” – todos correram, ele fala! “Pedro – que foi?” “Pai, tu me bateste!” o
Pai: “Pedro, não te bati! Quando foi que te teria batido?” “Quando ...” e Pedro mencionou o
momento, aconteceu um bom tempo atrás; o pai lembrou, pediu perdão e a paz entrou no lar.
(1) Como a medicina conhece hoje tantos elementos numa só célula, assim é importante de
conhecer a estrutura da alma como Santo Tomás mostra com Aristóteles.
(2) Isto permite de observar e procurar a causa (dentro do homem – passadas, doenças, sexo,
Temperamento, educação; e fora - social, espirit.-religioso)
(3) Depois olhando ao contesto total e
(4) orientar o paciente nele de modo que
(5) se aceita (com livre vontade) encontra sua paz.
- Um Senhor tornou-se depressivo; se esforçou para seguir uma ambição razoável, mas não
conseguiu. – Mostrando a ele que essa meta era desnecessário para ele, e convencendo-o de
deixar seguir nessa direção, ele logo recuperou sua alegria.
- Um religioso estava no hospital, por poucas horas, num quarto com 5 outros doentes. Estes
logo perceberam queer diferente e 2 ou 3 dirigiram-se a ele para receber ajuda espiritual. Por
que? Porque eles – como cada homem – sabe que a verdadeira felicidade está no espiritual.
- Outra experiência mostra isto: Viajei uma vez com a ajuda do MapQuest (naquele tempo). O
que me indicou era fazer uma mudança de estrada quase cada 2 km. Era difícil demais porque
estava sozinho e não podia constantemente olhar a estrada e mapa ao mesmo tempo. Deixei ao
lado, peguei o livro com os mapas, olhei ao país e a região e vi que em apenas 20 km do local em
que me encontrei tinha acesso à autoestrada (Highway) que me levara diretamente a cidade que
precisava ir. - Usar bom senso, olhar ao todo, facilita encontrar a solução de problemas.
Semelhante experiência conta V. Frankl nas suas conferências no Radio, quando decidiu ir à
distância das técnicas e optar para o bom senso: Um juiz queria que ele examinasse um rapaz.
Frankl conta: Os testes de Inteligência falharam. No último momento, tinha ainda um
pensamento, inventou um caso diante do rapaz ao qual ele imediatamente reagiu, o que deu a
Frankl a resposta procurada.38
É na vida com Deus, na liturgia que o homem inteiro, com alma e corpo, e unido e dirige-se ao
seu fim último, ao qual anseia com todo o seu ser e com todas as suas faculdades (cf. por ex. Cat
1387).
Goya conclui uma parte do seu estudo (cf. p. 74):
“A psicologia é chamada de abrir-se sempre mais amplamente à uma visão integral do
desenvolvimento antropológico e de oferecer um contributo parcial, mas precioso ao
conhecimento e à promoção do crescimento espiritual numa base humana sólida e plenamente
desenvolvida.”
3º A vida concreta do homem na visão cristã
Anda deseja
Come escreve
Fala constrói
c) exemplo da educação
O ser perfeito do homem pode e deve-se formar (4) Exemplo: O Belo e a (auto-)educação
Psicologia e vida espiritual - 2022, 76
I. A moldura da formação
1º O Belo como transcendental implica uma conaturalidade entre objetos belos e o homem.
2º Educação é a formação de bons hábitos (firmes e fortes) para agir rápido, fácil e alegremente.
3º Estas duas afirmações exigem que os meios de formação (“o que entra no homem”) sejam
bons e belos em si (segundo o seu ser) – não falsos e maus.
“Com a sua fineza e delicadeza, a arte auditiva ou visual penetra na inteligência e sensibilidade
do espectador ou do ouvinte a uma profundidade onde a palavra... jamais poderia chegar.” (Papa
Pio XII, 3.9.50)
Psicologia e vida espiritual - 2022, 77
O cultivo de uma moradia harmônica, de sons agradáveis, cores como na natureza - do belo
íntegro, ordenado e claro conduz o homem ao que é bom e à verdade, a DEUS!
A Filosofia, como ciência das causas, aponta às causas eficientes (Deus, pais, cultura etc.), a
causa formal e material do homem e de cada um, e a causa final que, por último, é o Criador (Cat
1721, 282, 294...).
Por isso, o objeto do estudo, o homem, era na cultura judia-cristã sempre tratado, porém em vista
da meta final, do destino do homem no céu, na vida eterna. Desde o paraíso, em todo o Antigo
Testamento (pensamos especialmente nos livros sapienciais), no evangelho, nas Cartas de São
Paulo e em toda a literatura na Patrística se ensina sobre o bem e o mal, as inclinações na pessoa
humana a um e ao outro, se desenvolveu os “catálogos” de virtudes e vícios (pensamos nos sete
vícios capitais!).40
O texto mais explícito encontramos na carta aos Romanos de São Paulo (convida ler com atenção
– como faríamos se fosse de Descartes, Kant ou Freud, pois Paulo é também – um autor, um
pensador, um que se interessa do homem interior ou psicológico):
Rom 7, 5: “Quando vivíamos no nível da carne, as paixões pecaminosas, ativadas pela Lei,
agiam em nossos membros, a fim de que frutificássemos para a morte.
6 Agora, porém, mortos para aquilo que nos aprisionava, fomos libertados da Lei, de modo a
servirmos no novo regime do Espírito e não mais no regime antiquado da letra.”
- Se em seguida, São Paulo continua discutir sobre a lei” e o “pecado” no homem, não faz
menos “psicologia” que Freud quando este fala do “ego” e “id” que lhe atrapalha, de
repressão e liberdade limitada etc... Santo Tomás indica exatamente a lei como ajuda e
orientação para sair do pecado ou dos vícios (I-II, qq. 71-89 e em seguida a “lei”, qq. 90-108).
7 Que diremos então? Que a Lei é pecado? De modo algum. Mas foi por meio da Lei que eu
conheci o pecado. Nem mesmo a cobiça eu conheceria, se a lei não dissesse: “Não cobiçarás”.
8 Aproveitando a ocasião oferecida pelo preceito, o pecado produziu em mim toda espécie de
cobiça. Pois, sem a Lei, o pecado é coisa morta. 9 Outrora, sem lei, eu vivia; sobrevindo o
preceito, o pecado começou a viver, 10 e eu morri, pois o preceito feito para a vida se tornou,
para mim, fator de morte.
Quer dizer: Se não conhecemos a lei o que nos diz o que é correto e o que devemos fazer, eu sou
a minha norma, e nada parece errado, pois faço o que quero. Mas isto me leva a morte, fica
objetivamente errado. Aí a lei como descrição da ordem objetiva me revela esse caminho à
morte e me chama a mudar.
40 Rm 1, 29-31; Gal 5,19-21; 2 Tim 3,2-5; por ex. João CASSIANO. Instituições Cenobíticas. Juiz de Fora: Edições
Subiaco, 2015; R. ALVES GOMES. A Terapêutica das Doenças espirituais: Uma introdução à ascética da Igreja
ortodoxa. Aproximações psicológicas. Limeira, 2015; Gertrude und Thomas SARTORY. Lebenshilfe aus der Wüste:
Die alten Mönchsväter als Therapeuten. 5. ed. Freiburg: Herder, 1992; B. COLE. The Hidden Enemies of the
Priesthood: The Contributions of St. Thomas Aquinas. Staten Island, NY, 2007 (trata, entre outros, os vícios capitais
na vida do sacerdote). … cf. http://alexandriacatolica.blogspot.com.br.
Psicologia e vida espiritual - 2022, 78
11 O que houve é que o pecado, aproveitando a ocasião oferecida pelo preceito, me seduziu e
acabou me matando. 12 Assim, a Lei é santa, como também o preceito é santo, justo e bom.
13 Então, o que é bom se tornou morte para mim? De modo algum. Mas o pecado, a fim de se
tornar conhecido como pecado, se serviu do que é bom para me matar. E assim, por meio do
preceito, o pecado mostrou ao extremo seu caráter pecaminoso.
- Então, esta guerra interior ou conflito se revela como guerra entre o homem espiritual com o
olhar a seu último fim, a DEUS, e a lei da carne que lhe puxa para o erro, a deformação, des-
ordem e destruição. É o trauma do qual a psicanálise fala sem, porém, conhecer uma saída,
conseguir dar uma luz ou – segundo o tentativo de Frankl – dar um sentido; - por que nem
segundo Frankl? Por que ele quer deixar cada um a sua absoluta liberdade e não lhe
prescrever nada; segundo ele, a consciência é a única e absoluta norma.
(“Com certeza: Tudo isto [gerar filhos, plantar árvores, escrever livros] são valores, valores
reais; mas eles são relativos – ao contrário, absoluto pode ser apenas uma coisa, e isto é o
mandato de nossa consciência ...”; V. FRANKL. Psychotherapie für den Laien - Psicoterapia
para os leigos. 7. ed. Freiburg: Herder, 1978, “Higiene psiquica do madurecimento”, pp. 58-61,
p. 60s.).
Então a que São Paulo se refere é a atenção exagerada ao objeto de uma ou outra faculdade da
alma, de modo que tal exagero exige das outras de dobrar-se diante dela e assim causa
desarmonia na vida interior do homem (como S. Paulo diz: “o deus deles é o ventre, a glória
deles está no que é vergonhoso.” Fil 3,19).
14 Sabemos que a Lei é espiritual; eu, porém, sou carnal, vendido ao pecado como escravo.
15 De fato, não entendo o que faço, pois não faço o que quero, mas o que detesto.
16 Ora, se faço o que não quero, estou concordando que a Lei é boa. 17 No caso, já não sou eu
que estou agindo, mas sim o pecado que habita em mim. 18 De fato, estou ciente de que o bem
não habita em mim, isto é, na minha carne. Pois querer o bem está ao meu alcance, não, porém,
realizá-lo. 19 Não faço o bem que quero, mas faço o mal que não quero. 20 Ora, se faço
aquilo que não quero, então já não sou eu que estou agindo, mas o pecado que habita em mim.
21 Portanto, descubro em mim esta lei: quando quero fazer o bem, é o mal que se me
apresenta. 22 Como homem interior, ponho toda a minha satisfação na Lei de Deus; 23 mas
sinto em meus membros outra lei, que luta contra a lei de minha mente e me aprisiona na lei
do pecado, que está nos meus membros. 24 Infeliz que eu sou! Quem me libertará deste corpo
de morte? 25 Graças sejam dadas a Deus por Jesus Cristo, nosso Senhor.
Em suma: pela minha mente sirvo à Lei de Deus, mas pela carne sirvo à lei do pecado.” (Rom 7)
Já antes, no início dessa carta, São Paulo se refere a todos os homens, judeus e não-judeus, que
justifica ainda mais de levar suas reflexões em conta. Escreveu:
“Quando os pagãos, embora não tenham a Lei, cumprem o que a Lei prescreve, guiados
pelo bom senso natural, esses que não têm a Lei tornam-se Lei para si mesmos.
Por sua maneira de proceder, mostram que a Lei está inscrita em seus corações: disso dão
testemunho igualmente sua consciência e os juízos éticos de acusação ou de defesa que
fazem uns aos outros. É o que se verá no dia em que Deus vai julgar, segundo meu
evangelho, por Cristo Jesus, as intenções e ações ocultas das pessoas.” (Rom 2,14-16)
Quão maravilhoso é a descrição de São Paulo do homem e da convivência em estima e liberdade
verdadeira quando fala do escravo Onésimo na carta a Filêmon.
Papa Francisco alertou nos fortemente na sua Carta encíclica “sobre a Fraternidade e a amizade
social – Fratelli tutti”, 2020, sobre
Psicologia e vida espiritual - 2022, 79
“uma perda do sentido da história que desagrega ainda mais. Nota-se a penetração cultural duma
espécie de «desconstrucionismo», em que a liberdade humana pretende construir tudo a partir do
zero. De pé, deixa apenas a necessidade de consumir sem limites e a acentuação de muitas
formas de individualismo sem conteúdo. Neste contexto, colocava-se um conselho que dei aos
jovens: «Se uma pessoa vos fizer uma proposta dizendo para ignorardes a história, não
aproveitardes da experiência dos mais velhos, desprezardes todo o passado olhando apenas para
o futuro que essa pessoa vos oferece, não será uma forma fácil de vos atrair para a sua proposta a
fim de fazerdes apenas o que ela diz? Aquela pessoa precisa de vós vazios, desenraizados,
desconfiados de tudo, para vos fiardes apenas nas suas promessas e vos submeterdes aos seus
planos. Assim procedem as ideologias de variadas cores, que destroem (ou desconstroem) tudo o
que for diferente, podendo assim reinar sem oposições. Para isso, precisam de jovens que
desprezem a história, rejeitem a riqueza espiritual e humana que se foi transmitindo através das
gerações, ignorem tudo quanto os precedeu».[10]
14. São as novas formas de colonização cultural. Não nos esqueçamos de que «os povos que
alienam a sua tradição e – por mania imitativa, violência imposta, imperdoável negligência ou
apatia – toleram que se lhes roube a alma, perdem, juntamente com a própria fisionomia
espiritual, a sua consistência moral e, por fim, a independência ideológica, económica e
política».[11] Uma maneira eficaz de dissolver a consciência histórica, o pensamento crítico, o
empenho pela justiça e os percursos de integração é esvaziar de sentido ou manipular as
«grandes» palavras. Que significado têm hoje palavras como democracia, liberdade, justiça,
unidade? Foram manipuladas e desfiguradas para utilizá-las como instrumento de domínio, como
títulos vazios de conteúdo que podem servir para justificar qualquer ação.
15. ... “Usa-se hoje, em muitos países, o mecanismo político de exasperar, exacerbar e polarizar.
Com várias modalidades, nega-se a outros o direito de existir e pensar e, para isso, recorre-se à
estratégia de ridicularizá-los, insinuar suspeitas sobre eles e reprimi-los. Não se acolhe a sua
parte da verdade, os seus valores, e assim a sociedade empobrece-se e acaba reduzida à
prepotência do mais forte.” (n. 15)
Psicologia e vida espiritual - 2022, 80
passos de distância, onde ficou estendido sem sentidos. Aí ficou um bom pedaço de tempo;
felizmente, porém, chegou um carniceiro empurrando um carrinho com um leitãozinho dentro.
- Que brincadeira sem graça! - disse êle, e ajudou João a levantar-se.
João contou-lhe tudo o que havia acontecido; o carniceiro ofereceu-lhe o seu frasquinho dizendo:
- Bebe um trago, que logo te reanimarás. Aquela vaca nunca mais dará leite, já está velha e sêca,
boa, quando muito, para ser atrelada a uma carroça ou então para ser levada ao matadouro.
- Oh diabo, - disse João puxando os cabelos desgrenhados; - quem diria uma coisa destas!
Naturalmente, seria uma grande vantagem matar o animal em casa! Quanta carne teríamos! Mas
não gosto de carne de vaca, não a acho saborosa. Ah! se fôsse um leitãozinho igual a êsse; então,
sim, seria delicioso! Sem falar nas salsichas que daria!
- Escuta, João, - disse o carniceiro; - por seres quem és e porque desejo ser-te agradável, estou
disposto a trocar o meu leitão pela tua vaca.
- Que Deus te recompense tanta bondade! - disse João.
Entregou-lhe a vaca e levou o leitão, segurando-o pela corda com que estava amarrado no
carrinho.
João continuou o caminho pensando em como tudo lhe ia às mil maravilhas; apenas tinha uma
contrariedade e logo se remediava. Nisso, aproximou-se um rapazinho, que levava debaixo do
braço um belo pato branco, muito gordo. Cumprimentaram-se desejando um bom dia e, conversa
vai conversa vem, João contou-lhe as suas aventuras, gabando-se da boa sorte, e das trocas
sempre tão vantajosas. O rapazinho, então, contou que levava o pato à aldeia vizinha e que
estava destinado a um banquete de batizado.
- Experimente o seu pêso, - disse, levantando-o pelas asas, - é pesado, não acha? Também, já faz
dois mêses que o venho engordando com o que há de melhor! Quem tiver a sorte de meter os
dentes em semelhante assado, verá a banha escorrer-lhe pelos cantos da bôca.
- E' verdade, - disse João levantando o pato com uma das mãos - é um bonito animal. Mas,
também, o meu leitão não é mau e tem o seu valor!
Entretanto, o rapaz olhava para todos os lados com certa precaução; depois, abanando a cabeça,
disse:
- Olha, a história do teu leitão não me parece muito limpa: acabam, justamente, de roubar um ao
prefeito da aldeia onde passei agora. Tenho palpite que deve ser êsse que levas aí. Mandaram
gente a procurá-lo por toda parte e seria uma coisa terrível se te apanhassem com êle; o menos
que te aconteceria era ser metido numa prisão escura.
O pobre João ficou assustadíssimo e exclamou:
- Ah, Deus meu! Livrai-me desta desgraça! Tu que conheces a região melhor do que eu e sabes,
portanto, onde esconder-te, leva o meu leitão e dá-me o teu pato.
- Arrisco-me muito com isso, - disse o rapazinho, - mas, só para te livrar de apuros, vou fazer o
que me pedes.
Pegou, então, na corda e bem depressa levou o lei- tãozinho, desaparecendo por um atalho. O
honrado João, livre dessa preocupação, continuou a caminhar rumo a casa, levando o pato
debaixo do braço e ia pensando:
- Calculando bem, saí ganhando na troca. Primeiro, a carne de pato é mais fina para assado e
mais saborosa que a de leitão; e com tôda esta banha terei gordura por uns bons três mêses e,
finalmente, com as belas penas brancas farei uma boa almofada, na qual dormirei sem que seja
preciso embalar-me. Santo Deus, como minha mãe vai ficar contente com tão lindo animal!
Após ter atravessado a última aldeia, antes de chegar à sua, viu um amolador parado com a sua
carangue- jola; a roda girava, girava e êle acompanhava-a cantando:
João parou e ficou olhando o que êle estava fazendo, depois disse:
- Parece que tudo vai à medida dos teus desejos, visto que trabalhas tão alegremente!
Psicologia e vida espiritual - 2022, 82
- Oh, se vai! - respondeu o outro. - Qualquer ofício manual é ouro em barra. Um bom amolador é
um homem que, quando mete a mão no bôlso, sempre encontra dinheiro. Mas, onde compraste
êsse belo pato? Nunca vi tão bonito por aqui!
- Não o comprei, ganhei-o em troca de um leitão- zinho.
- E o leitão?
- Ganhei-o em troca de uma vaca.
- E a vaca?
- Tive-a em troca de um cavalo.
- E o cavalo?
- Por aquêle dei um pedaço de ouro do tamanho da minha cabeça.
- E o ouro?
- Era o pagamento que me deu meu amo por sete anos de serviço.
- Vejo que sabes te defender muito bem neste mundo; se agora chegares a ouvir tôdas as manhãs
tinir dinheiro no bôlso quando enfiares as calças, tua fortuna está feita.
- Sim, mas que devo fazer para isso? - perguntou João.
- Deves tornar-te amolador como eu; para isso é preciso, primeiro, ter a pedra de amolar; o resto
vem depois. Tenho aqui uma, na verdade está um pouco gasta, mas em troca desejo apenas que
me dês o teu pato; aceitas?
- Ainda mo perguntas? - respondeu João. - Se, como dizes, terei sempre dinheiro no bôlso, serei
o homem mais feliz do mundo; que mais posso desejar?
Entregou ao amolador o pato e recebeu em troca a pedra de amolar e mais uma outra qualquer
que apanhou no chão.
- Eis-te aqui mais esta bela pedra, - disse o amolador - é excelente para fazer uma bigorna e para
endireitar pregos ou arranjar as ferramentas. Fica com ela e guarda-a com cuidado.
João pegou nas duas pedras e partiu muito alegre, os olhos brilhando de felicidade.
- Devo ter nascido com a camisa da felicidade, - pensava êle - pois tudo o que desejo se realiza!
No entanto, como estava caminhando desde manhã bem cedo, sentiu-se cansado; além disso a
fome começava a atormentá-lo, pois já não tinha nada que comer, tendo devorado o farnel de
uma só vez a fim de festejar a troca da vaca. Por fim, andava a custo e a cada instante era
obrigado a descansar; as pedras pesavam tremendamente e lá consigo pensava quanto seria
agradável não ter de as carregar, agora que estava tão cansado. Arrastando-se como uma lesma,
conseguiu chegar até uma fonte, contente de poder refrescar a goela e descansar um pouco
estendido na erva.
Não querendo estragar as pedras, colocou-as cuidadosamente à beira da fonte, bem perto dêle.
Depois sentou e foi abaixar-se para encher o boné de água, mas, sem querer, empurrou um
pouquinho as pedras, que rolaram para dentro da água.
- João, quando as viu desaparecer dentro da água, deu um pulo de alegria, depois ajoelhou-se e
agradeceu a Deus, com lágrimas nos olhos, por tê-lo atendido mais essa vez, desembaraçando-o
do pesado fardo sem que êle tivesse de se censurar.
- Não há ninguém neste mundo mais feliz do que eu! - exclamou.
De coração aliviado, livre de qualquer pêso, saiu a correr e só parou quando chegou à choupana
de sua mãe.
Psicologia e vida espiritual - 2022, 83
IV.
Introdução
Procuramos conhecer o próprio autor, Santo Tomás, sua vida e obra (I).
A filosofia procura a verdade objetiva – perguntando pelas últimas causas de tudo que existe, e a
parte das coisas e dos entes reais. Logo tem, como objeto, a realidade mais ampla.
E a psicologia, enquanto ciência, deve também ter um próprio objeto (matéria e formal) e, para
conseguir isto, um seu método próprio.
Mas como estamos no meio do curso, aproximamos no momento a nossa pergunta pela
observação histórica, mas depois procuramos seguir com certa sistemática, e deixamos a resposta
a pergunta pelo objeto da psicologia para o fim (p. 126).
b) (Sed contra) A visão cristã: A criação boa por Deus e hierarquia de criaturas (e de
valores, dados com os graus de ser); o homem e suas faculdades e a harmonia entre elas.
Por fim, a saúde do homem consiste na sua vivência (o sujeito) segundo a correta ordem
hierárquica objetiva (seg. a natureza) e a vontade de Deus. (p. 90)
Mostrar a perspectiva:
Pela entrega ao Onipotente (e união com Ele) à onipotência – essa torna-se minha!
Essa é a solução universal, para mim e os outros, do passado e do futuro!
Psicologia e vida espiritual - 2022, 85
A filosofia procura a verdade objetiva. Ela pergunta pelas causas a partir das coisas e dos entes
reais. Logo tem, como objeto, a realidade mais ampla de todas as ciências.
O objeto da psicologia, segundo a sua definição e denominação seria a “psyché”, a alma.
Segundo a definição tradicional, a partir de Aristóteles, a “alma é o princípio vital de um
organismo”. Segundo este entendimento, a alma não é uma substância subsistente, mas apenas o
princípio animador ou a forma substancial de uma coisa. Mas o que a coisa é, e por que é
animada e possui um “princípio vital”, é assunto da filosofia.
Por isso surge a séria pergunta sobre o relacionamento da psicologia com a filosofia.
1º Visão global
Vamos primeiro olhar à história recente da “psicologia” e depois voltar a questão se tratamos aqui
realmente de um assunto de psicologia ou da filosofia. E o exame das propostas na área da
psicologia, especialmente aquelas que são dadas no último tempo, indicam uma opção
fundamental sobre a definição do homem antes de estudar sua alma.
A respeito do seguinte esquema se deve fazer logo três observações importantes:
- É sempre um grande risco (não necessariamente erro!) de resumir uma vasta pesquisa dos
pensamentos de um autor, muitas vezes desenvolvidos por anos ou até por sua vida toda. Porém,
cada um sempre procura o princípio, uma raiz, logo um ponto central. E isto justifica a procura de
uma ideia básica, muitas vezes inicial e geral de um pensador.
- Também é importantíssimo de constatar que ninguém se encontra fora da realidade. Por isso,
para tudo que alguém afirma, se encontra uma referência à realidade e neste sentido algo
verdadeiro. Mas na interpretação ou na passagem para a teoria e generalização acontece facilmente
uma distância à realidade que é a causa de erro, e este deve ser rejeitada.
- Seja também já permitido dizer: Quão maravilhoso é ver o homem todo, em todos os níveis,
ativada na liturgia da Igreja: Pela palavra do celebrante (apelo ao intelecto), toda a assembleia olha
a ele e escuta-o falar (com sentidos externos); o homem re-age (vontade), se levanta (corpo) e
responde animada e com alegria (paixões).
Em muitas fontes se indica a “psicologia” como ciência recente. Alguns indicam concretamente
W. Wundt como iniciador pelo seu laboratório em que tentou medir os fenômenos psíquico. Isto
se pode encontrar ainda em várias formas, seja de observação (quando dizem que uma alma que
reza bem, desenvolve uma energia mais forte de que uma emissora de Radio), seja de tratamento
(quando se espera resolver todos os problemas “mentais” como “tratáveis” com remédios).
Mas a história aponta mais para trás, por ex. a Herbart (1776-1841) com sua explicação da “alma”
e ainda a Descartes com sua separação de alma e corpo: permitindo apenas uma conexão, mas
entre duas substâncias diferentes e separadas, a “res cogitans” – o pensar e a “res extensa” – a
parte material, e estas são conectadas apenas por uma “pequena glândula”. Por fim, tudo isto
manda voltar aos pré-socráticos quando os filósofos ainda procuraram a unidade e raiz de tudo, e
nesta procura generalizaram suas descobertas parciais. É exatamente isto que observamos hoje
nesta área da psicologia.
Na base do esquema mencionamos Nicolai Hartmann que na sua filosofia apresenta as pedras
como substância maior e melhor por sua persistência pelos séculos. Mencionamos este porque
mesmo na nossa visão cristã precisamos considerar esta parte enquanto também tais partes
encontramos no ser humano, bem simples como na força dos nossos dentes ou na flexibilidade dos
Psicologia e vida espiritual - 2022, 86
cabelos que em si são como “material morto” e ainda parte do nosso organismo pela influência e
animação de nervos.
Psicólogos Acentos A natureza do Visão cristã – tudo tem seu valor
/ Autores homem próprio – e unido forma41
Graça de a harmonia universal, cada coisa
DEUS participa nas propriedades do ser
revelação divino (é individual, inconfundí-
vel, verdadeiro, bom e belo.
Pela graça o homem
pode viver com Deus e nele.
C.G.Jung Universo dos Intelecto No intelecto consta a
(Suborde- Arquétipos grandeza do homem e
nação anônima) sua capacidade de entender
Frankl (self-made Dar-se sentido Intelecto e
Eu autônomo)
Adler – complexo Percepção dos Intelecto Pela vontade
da inferioridade outros (social)
Piaget Evolução – Vontade Desejar o Infinito,
Deixa se Amá-lo, viver para Deus e
desenvolver é capaz de possuí-lO um dia.
Konrad Lorenz Igual aos sentidos
Psicologia da Animais apetitivos, O corpo humano é querido por
comparação cognitivos Deus Criador e contribui à vida
sentidos No nível espiritual
externos pelo contato com o mundo
material ao redor do homem.
Freud O instinto, só o vida A vida vegetativa é querida por
organismo vale vegetativa Deus e ser santificado pela
presença do homem com Deus.
Toland O cérebro é tudo vida vegetativa
Nic. Hartmann Pedra é a Mundo Temos elementos como cabelo,
realidade maior anorgânico dentes nos quais se distingue entre
por ser estável a matéria e os nervos que animam
Aqui deve-se mencionar também “um certo Senhor Toland. Já em 1720 declarou o cérebro uma
máquina que segundo suas próprias leis produz nossos pensamentos”42. Hoje se conhece muito
essa teoria materialista e mecânica da psique do homem que termina num determinismo como por
exemplo a determinação da pessoa para o hetero- ou homossexualismo segundo o seu cérebro.43
A facilidade com que “alguns psicólogos transpessoais falam, em consequência, de uma cultura
41
“Enquanto que a psiquiatria moderna, em cada uma de suas tendências, parece de certo modo redutora, a concepção
dos Padres tem o mérito de levar em conta as três dimensões do ser humano: corporal, psíquica e espiritual.”
(Reginaldo Alves CAMPOE. (Tradução e compilação; autor: Jean-Claude LARCHET). A Terapêutica das doenças
espirituais: Uma Introdução à Tradição ascética da Igreja ortodoxa. Aproximações psicológicas. Limeira, 2015
(Reginaldo.campoe@yahoo.com.br), p. 5)
42 M. LÜTZ. Neue Irre! Wir behandeln die Falschen. Unser Problem sind die Normalen. München: Penguin Verlag,
2022, p. 7.
43 Cf. PEARS, Allan & Barbara. Why men don’t listen and women can’t read maps - Por que os homens nunca
ouvem nada e as mulheres não sabem ler mapas de estradas. Moir, A., Brainsex. The real differences between men
and women, London 1989. Lütz resolve o problema com a indicação que um piano sozinho [= cérebro] não toca a
sonata que Beethoven compus, mas isto faz o pianista Chinês Lang Lang ou com o hóspede num restaurante que
confunde a carta com a comida (cf. LÜTZ, p. 7s.). Para uma visão harmônica cf. Narciso IRALA. Controle Cerebral
e Emocional. 26. ed. São Paulo: Ed. Loyola, 1984.
Psicologia e vida espiritual - 2022, 87
do lado esquerdo e de uma cultura do lado direito”44 do cérebro parece dar razão a tal ideia. – Se
examinamos tal teoria, segundo Jesus, pelos frutos, não sobra o homem racional e livre; e se
perguntamos pela origem chegamos ao fundador da maçonaria.45
Freud se concentra no nível da vida vegetativa, a sexualidade por causa do seu confronto com
pacientes que foram sexualmente abusados; aprendeu isto em Paris, e, voltado a Viena, também
em Áustria. Esta causa não lhe foi permitido enfrentar abertamente no ambiente tradicional
religioso de Áustria. Por isso foi levado a inventar a psicanálise com traumas e complexos, em
grande parte inconscientes, mas que se manifestam no nível consciente ou até exterior devido da
forte perturbação sofrida. Depois de ter visto na casa da filha de Freud documentos não editados,
Masson escreveu a filha Anna (* 1895) de Freud que seu pai “estava errado em abandonar a
hipótese da sedução”. Então,
“Anna Freud escreveu-me (10 de setembro de 1981): ‘Manter a teoria da sedução
significaria abandonar o complexo de Édipo e, com ele, toda importância da fantasia,
fantasia consciente ou inconsciente. Na realidade, acho que não teria mais existido
psicanálise [sic!] depois disso.”46
Isto – mas não apenas esta razão - explica com qual ênfase Freud generalizou a sexualidade de tal
maneira que até a criatividade artística e a prática religiosa foram explicadas apenas por impulsos
sexuais. –
Rudolf Allers pertence aos psicólogos de Viena. Ele alargou sua visão psicológica por estudos
filosóficos. A partir desse novo ponto de vista conseguiu apontar com belíssima exatidão ao erro
fundamental de Freud: A sexualidade pertence à via vegetativa do homem e com este ao seu
inconsciente. Quando soube desse nível inconsciente ao nível consciente, ela acabe de estar “fora
do seu lugar” e perturba o homem como pessoa, e por isso pode causar problemas até no nível
espiritual. Que a vida vegetativa só sobe à consciência quando adoecemos, quando percebemos e
quando nos conscientizamos de uma batida acelerada do coração ou de uma dor no estômago.
Atendamos esta chamada de atenção, cuidamos até que volta ao seu nível inconsciente ou
saudável, e nos deixa em paz. Qual erro gravíssimo estamos expostos hoje com esta vastíssima
conscientização da sexualidade por todos os lados, mesmo na mais simples convivência com
pessoas imodestas. – E que esta tese da psicanálise fantasiosa gira ainda e influencia problemas
espirituais se pode ver na argumentação contra o celibato, quando se argumenta: “Quem não vive,
não entende!” A tal lógica está baseada na filosofia materialista que diz: O que não se experimenta,
não se conhece, então também não pode dar conselhos e orientação.
Difícil de encontrar algo sobre Konrad Lorenz (1903-1989) que considerou o homem apenas
como um animal. Por isso, aconselhou a observação da vida dos animais para saber como viver a
nossa vida emocional.
Muito mais conhecido e divulgado é como Piaget explicou a vida do homem – e assim também,
no maior tempo do seu ensino e de sua prática psicológica, Charles Rogers, não porém no fim de
sua vida! Piaget pensou poder sido capaz de observar que as crianças desenvolvem dons e
capacidades que já se encontram nelas. Logo, não seria bom de interferir, mas apenas oferecer
condições melhores para elas se desenvolvem seus talentos naturais. Sua teoria se vê aplicada hoje
amplamente na educação – num campo em que causou, de fato, e ainda causa uma influência
desastrosa. – Podemos pensar que aqui encontramos simplesmente uma forma do Darwinismo, do
desenvolvimento exclusivo de dentro para fora. Que tal teoria também ultrapassa um horizonte,
44 B. GOYA. Psicologia e Vita Spirituale: Sinfonia a due mani. Bologna: Edizioni Dehoniane 2000, p. 87.
45 John Toland (1670-1722) mencionou “que originalmente quisesse refutar Spinoza, suas obras polêmicas deístas,
mas quase materialistas, foram contestadas por Leibniz.” “Em 1717, ele reuniu todos os druidas sobreviventes Da
[sic!] Inglaterra e Irlanda para fundar a Ordem dos Druidas [Maçonaria], o primeiro movimento neo-druídico e do
qual ele foi o primeiro ‘Grande Druida’.” (Wikipedia (acesso 17-8-22, 9.01).
46 Jeffrey Moussaieff MASSON. Atentado a verdade. 2.ed. Rio de Janeiro: Ed. José Olympio, 1984, p. 107; ênfase
nossa. Já antes escreveu Sheen: “Se as pressuposições desta doutrina caírem, a teoria do complexo de Édipo perde
seus fundamentos.” (SHEEN. Angústia e Paz, p. 46, nota 1).
Psicologia e vida espiritual - 2022, 88
em que talvez ainda tem certo valor, e vira ser generalizada se vê no nível espiritual e teológica
(por ex. Teilhard de Chardin) na larga aceitação da negação do pecado original. A raiz dessa
heresia se encontra muito antes e por vários motivos. Mas sua larga aceitação hoje, especialmente
no relativismo moral, é mais fácil compreensível quando se considera uma pedagogia e educação
baseada em tal psicologia.
Alfred Adler é um outro psicólogo que se distanciou de Freud pela atenção a dimensão social do
homem. Ele percebeu que se pode e deve explicar muitos comportamentos dos homens pelo mútuo
relacionamento com outros. Estes podem ser causados por rivalidades ou por tentativos de agradar
ou impressionar, por respeito humano com suas muitas formas de falsidade etc. etc.
Encontramos hoje muito espalhado a “logoterapia” de Viktor Frankl, por quem o homem é mais
que só um corpo animado. O homem é uma pessoa com própria vontade,47 e essa, em situações
não planejadas, pode libertar energias que antes não conhecia. Frankl descobriu essa dimensão do
ser humano no Campo de Concentração dos Nazis, sua vontade de sobreviver.48 Frankl, judeu,
mas sem fé judia ou em Deus vivo, preso, não encontrou outro motivo de opor-se aos Nazis de que
seu querer, seu orgulho de ser e existir. Daí desenvolveu a teoria da logoterapia, da cura de
perturbação interna ou psicológica por motivar sua vontade por um sentido. Seu querer é tudo. Se
há uma motivação para querer algo, ainda melhor. E se chega a uma situação em que não se vê
razão e motivação de aceitar, aceita por não ter outra opção, mas sejamos nós que aceitamos e
assim, mesmo em tais situações, ainda somos nós que ficamos “senhor” do destino. – Frankl não
libera o homem de si, pois “nessa regra de vida” o homem constrói a si mesmo. Se deve perguntar:
até qual ponto? Esta pergunta – e sua resposta – trona-se ainda mais clara quando perguntamos ele
para Deus: Que é Deus?
Frankl ou Jung, parece, que ainda querem dirigir seus pacientes a Deus, mas que Deus? “Para
Frankl, isto significa que de Deus não se pode dizer nada (e ‘do que não se pode falar, é melhor
calar’, dizia Wittgenstein, citado por ele). Não se poderia falar de Deus, mas somente a Deus,
através da oração.” (La vontade de sentido, Herder, Barcelona 1988, 66-67). De que Deus se trata?
Segundo Frankl, do ‘interlocutor de nossos mais íntimos solilóquios’. Como não se pode saber o
que é Deus, esta não é uma definição essencial, mas ‘operacional’. Neste sentido, pode ser religioso
tanto um teísta com um ateu. Só que o teísta nega a aceitar a hipótese de que este interlocutor seja
ele mesmo, coisa aceita pelo ateu. (Frankl. Homo Patiens. Ensayo de uma patodicea)”49
(Echavarría. A Práxis, p. 390). E ainda: “Contudo, mais profundamente, diz Frankl, o autêntico
interlocutor é o nada [griffo do editor]. O nível mais profundo seria chegar a Deus como ‘nada’,
que é o transcendente inexprimível.” (ECHAVARRÍA. A Práxis, p. 391)
Goya conclui sua observação sobre a “logoterapia de V. Frankl” com esta frase: “Parece supérfluo
insistir sobre a fé cristã como sentido e princípio de integração de toda a existência” (GOYA, p.
159), parece supérfluo pois é demasiado evidente! Ou perguntamos: Onde está a lembrança das
grandes figuras ou dos “nomes” da história da humanidade? Não são 99,9 % porcento dos homens
esquecidos – contrário de uma freira simples como a Santa Bernadette, que se chama “vassoura de
casa”, que é lembrada na Igreja universalmente como santo exemplo a ser honrado e imitado!
47 Herman Dobbelstein cita A. Bonnar que observou no seu livro The Catholic Doctor. (5.ed. New York: Kennedy,
1951, p. 124): “Hoje a medicina considera o homem individual mais e mais como unidade. A isto se chegou
provavelmente principalmente pela aceitação geral (entre não-católicos) do engano filosófico-científico que a mente
fosse um produto da matéria. Mesmo que nós não aceitamos a razão segundo qual chegaram a esta conclusão, nós
alegramo-nos sobre a volta a antiga ideia Católica da união do compositum humano.” (H. DOBBLESTEIN. Psychiatry
for Priests – (orig. German: Psychiatrie und Seelsorge). New York: Kenedy & Sons, 1953, p. 12, nota 4).
48 Em semelhante circunstância, Conrad Baars descobriu a força da emoção de “raiva”: Por não querer que os Nazis
vencem sobre ele, descobriu e libertou – por motivo da raiva – tanta energia que venceu todas as fraquezas e sobreviveu
o Campo de Concentração. Pela indicação de Anna Terruwe encontrou a psicologia nos escritos de Santo Tomás e
desenvolveu sua teoria da “Psicologia da afirmação” – afirmação, porém, não por si mesmo, mas pelos outros,
começando pelo amor e cuidado da mãe pelo seu filho, pois, o bem que merece ser honrado e respeitado está fundado
no ser em si ou por existir e não segundo qualquer outro aspecto (o ser e o bem são convertíveis segundo S. Tomás!).
49 M. ECHAVARRÍA, A Práxis da Psicologia, Rio de Janeiro: Ed. CDB, 2021, p. 390; cf. embaixo nota 106.
Psicologia e vida espiritual - 2022, 89
Por fim, lembramo-nos ainda de C. G. Jung. Ele cativou muitas pessoas pela afirmação que “a
aproximação ao sagrado é a verdadeira terapia”50, e que há “a necessidade de redescobrir a vida
do espírito”51. Porém, mesmo que fala de uma realidade “acima do homem”, não identifica essa,
mas chama antes o “Inconsciente absoluto coletivo” de todas as experiências dos homens, que o
levou a falar de arquétipos universais, “além do bem e mal” (cf. embaixo, nota 106). Mas tudo
isso, não lhe fez pessoalmente capaz de livrar-se da angústia noturna das manifestações por
espíritos. Ele não abraçou um Deus vivo que lhe teria protegido.
Torellò escreve:
“Jung, como Freud e Adler, permanece no âmbito do psicologismo. Os dogmas religiosos
são para eles simples fatos psicológicos, e Jung demonstra uma profunda ignorância do
valor objetivo da religião, quando não uma indiferença ‘profissional’.”52
Benito Goya faz repetidamente referência a Abraham Maslow que pela sua “Hierarquia de
necessidades” e a obra “Motivação e responsabilidade” queria abrir espaço para a auto-realização
como um aspecto da felicidade do indivíduo. Outro autor, frequentemente referido é Gordon
Allport, chamado “pai da personalidade”. Porém, nenhum dos dois dá lugar a Deus como causa
eficiente, e por isso não ultrapassam “uma religião natural imanentista”53, “em um sentido novo,
naturalista, empírico e não eclesiástico”54.
Diante desse espectro seja mais uma vez dito quão importante é de conscientizar-se da base
filosófica de cada autor. Dobbelstein disse já em 1953:
certamente não é por acaso que psiquiatria – mais que outras ciências – abriu, nas últimas
dezenas de anos, o caminho que leva de uma medicina sem alma a um conhecimento mais
profundo da alma. Oswald Bumke, sem dúvida um dos psiquiatras modernos mais
importantes, achou necessário declarar que nenhum investigador moderno podia duvidar
que Deus existe. Uma vida longa, em contato estreito com doentes mentais ensinou-lhe de
reconhecer Deus e a alma humana criado por Ele. (DOBBELSTEIN, p. 140)
Do outro lado escreve hoje, em 2015, Reginaldo Alves CAMPOE (p. 8):
Um fato importante de diferença é de outra parte dado ao fato que a psiquiatria atual está
constituída sobre o modelo das ciências médicas e está deste modo situado numa
perspectiva naturalista excluindo a priori toda a referência ao domínio religioso e moral.
50 GOYA, p. 5; numa outra citação já teria dito: “aproximação ao numinoso...” (ibid., p. 13).
51 Juan B. TORELLÒ. Psicanálise ou Confissão. (orig. italiano). Lisboa: Ed. Aster e Coimbra: Casa do Castelo-Ed.,
1967, p. 32.
52 TORELLÒ, p. 86s; cf. p. 84-90: “A vocação religiosa inconsciente de todo o homem”. Jung gosta de apontar que
as ideias da religião cristã servem muito para despertar nos doentes a esperança para uma vida melhor, e isto tem
grande influência positiva nos doentes (assim por ex. o dogma da Assunção de Nossa Senhora ao céu com alma e
corpo! Mas isto não passa ao utilitarismo psicológico como se encontra bem frequentemente em muitos autores, como
em W. James e outros.
53 ECHAVARRÍA, A Práxis, p. 100, nota 181. Perguntámo-nos antes: devemos aplicar o pensamento de São Paulo
sobre o julgamento de direito também à psicologia: “Quando um de vós tem uma questão contra outro, como se atreve
a entrar na justiça perante os injustos, em vez de recorrer aos santos?” (1Cor 6,1) Esta mesma pergunta se fez J. E.
ADAMS; e isto o levou a pensar no que depois se tornou uma psicologia na base da Bíblia, em particular, nos Salmos.
Adams se refere a Raymond Meyers que disse: O Salmista chama feliz o homem que não seguiu o conselho dos ateus.
Mas porque a Igreja cristã negligenciou de passar este bom e sábio conselho para os outros, os homens são esforçados
de ir aqueles que são ateus para buscar soluções para os seus problemas. ... Temos medo que nosso Senhor não podia
resolver nossos problemas humanos?” (Competent to counsel; título em alemão é: Befreiende Seelsorge - Pastoral
liberadora: Teoria e Práxis de um aconselhamento de vida bíblica. 8. ed., Giessen-Basel: Brunnen Verlag, 1988, p.
X; cf. em baixo, nota 46) Interessante é a análise filosófica de livros bíblicos (Ecclesiastes, Jó e Cântico dos Canticos)
no sentido que tratamos aqui pelo pastor batista, convertido ao Catolicismo: Peter KREEFT. Três Filosofias de Vida.
2.ed. São Paulo: Quadrante, 2016.
54 A. MASLOW. Toward a psychology of being; em: ECHAVARRÍA, p. 100, n. 181. F. INSA faz larga referência
aos “big five”, OCEAN, de R. McCrae e P. Costa no seu livro A Formação da Afetividade: Uma perspectiva cristã.
São Paulo: Cultor de Livros, 2021, p. 37-43 e 392.
Psicologia e vida espiritual - 2022, 90
Parece que os dois se contradizem. Mas podemos reconciliar também assim: Quem é sério
reconhece a dimensão religiosa de cada homem.
Um psicólogo com uma visão do homem e da realidade como vimos até aqui, considerado médico,
como procede com um paciente? Deve 1º procurar um diagnóstico; depois 2º fará o que com o
paciente? Dá sugestões segundo o seu entendimento do homem e da realidade, isto é, procura
reorganizar a vida dele seg. sua ideia (ou seu ideal), ou há mais para oferecer?
b) A Visão cristã
Então, mesmo psicólogos que parecem reconhecer a espiritualidade do homem com suas
faculdades de intelecto e vontade não conduzem o homem ao além de si para o qual o homem foi
criado e para o qual anseia toda a sua vida. Eles podem respeitar outros (relativismo), mas não
resistem de “absolutizar” a sua proposta – sinal típico do relativismo: pedir tolerância dos outros
para mim, mas absolutizo minha opinião diante dos outros.55
Santo Tomás fez isto claro logo no início de sua Obra magistral da Suma teológia. Respondeu
positivamente a pergunta pela necessidade da revelação:
“Para a salvação do homem, é necessária uma doutrina conforme à revelação divina, além
das filosóficas, pesquisadas pela razão humana. Porque, primeiramente,
(A) o homem é por Deus ordenado a um fim que lhe excede a compreensão racional,
segundo a Escritura (Is 64, 4): O olho não viu, exceto tu, ó Deus, o que tens preparado
para os que te esperam. Ora
(B)o fim deve ser previamente conhecido pelos homens, que para ele têm de ordenar as
intenções e atos. De sorte que,
(C)para a salvação do homem, foi preciso, por divina revelação, tornarem-se lhe
conhecidas certas verdades superiores à razão.”56
Aqui também se encontra a razão porque o Santo discuta logo no início do seu tratado sobre toda
a vida do homem o desejo natural para a felicidade que o homem só encontra no fim infinito e
último que só pode ser um, ou seja, Deus.57
Então para tratar a vida do homem ou, se queremos chamar a “psicologia” do homem, do ponto
de vista cristão devemos começar com
a criação por Deus, criação boa, e de uma hierarquia entre as criaturas
(e dos seus valores, que são baseados e dados no grau de ser de cada uma).
Parte dessa criação é o homem com suas faculdades e a harmonia entre elas
pela correta ordem hierárquica objetiva (seg. a natureza) e a vontade de Deus.
Conclusão: como também a criação do homem foi “muito bom”, a saúde do homem
só pode consistir na sua vivência (o sujeito) segundo esta ordem objetiva.
Seja permitida essa observação: Quem escuta isto, facilmente pensa: Isto não tem ainda nada a ver
com a psicologia. Tal pensamento mostra quão avançado o neo-paganismo já é; ou: quão forte é a
separação da fé e razão, da revelação e do conhecimento natural, da vida da fé e da religião com
a vida ordinária e cotidiana, ou, em palavras mais simples: que não vivemos unidos com Deus
que está sempre presente na vida humana, e em todo o lugar!
Em certo sentido é nada novo, pois é o problema desta a Igreja primitiva. Novo é, que isto se
encontra agora no nível científico, e ainda, na área que trata da orientação da vida humana.58
56 ST, p. I, q.1, a.1; cf. II-II, q.2, aa.3 e 4; THOMAS DE AQUINO. Suma contra os Gentios (ScG), I, 4-5; ID.
Quaestiones Disputatae de Veritate, q.14, a.10; Sab 9, 13-17; etc.
57 Cf. ST, I-II, qq. 1-5; CATHY confessou: “Eu era insaciável, vazia por dentro, procurando a felicidade no fundo
da garrafa”. Alcoólicos Anônimos. Disponível em: <https://www.aaonline.com.br>.
58 Antigamente, o problema se limitou à vontade pela qual o homem facilmente falhou, quando não praticou o que
sabia e acreditava que será o correto e podia se corrigir. Hoje, depois de um desenvolvimento pelos últimos séculos,
a verdade é escurecida, de modo que até pessoas de boa vontade não sabem mais o que deveriam observar e como
deveriam viver. É o relativismo não só moral, mas até da verdade, por ele parece ser perdido o critério da correção, e,
em consequência, cada um, individualmente por si, deve fazer ou um ato de vontade conscientemente em favor da fé
e da escuta à voz silenciosa da consciência e natureza (cf. Rom 2,14-16) – ou fica também perdido no mar do
relativismo mais e mais universal. Cf. M. Echavarría. El Relativismo en la psicologia y en la psicopatologia
contemporâneas. El Concepto de Normalodad y Anormalidad.
Psicologia e vida espiritual - 2022, 92
isto, porque sabe que uma pessoa sinta primeiro vergonha de algo, e depois e por esta razão e
causa sobe mais sangue que normal no seu rosto e este torna-se vermelho.
A filosofia que pesquisa as causas não acompamha um erro que algo inferior seria causa de algo
superior, o que acontece em todas essas terorias que partem de um fato concreto observado, mas
depois absolutizam ou generalizam essa parte como fosse a lei que dirige tudo.
Mas, se contesta dizendo: A psicologia nao quer fazer a mesma coisa? Sim, quer, por isso tem ao
menos a filosofia como base ou até emergulha nela, como a estrutura da alma humana e seu
comportamento sempre fez parte da filosofia ou, ao menos, deixou-se orientar por ela – na ética e
na educação (a pedagogia científica é do tempo moderno com Pestalozzi, Herbart etc. e está hoje
em grande crise de identidade também por causa da confusão na filosofia).
Diante da filosofia ou considerando o homem na sua integridade, se vê estas opções para a
psicologia:
- ou se contenta com a observação (analítica) da vida passada (num “tratamento” demorado e
conversas “sem fim”),
- ou, baseada na análise, orienta segundo regras comuns de “bom comportamento” no sentido do
“Imperativo Categórico” de Kant (cf. em baixo, nota 53),
- ou se faz sua própria filosofia e estabelece um próprio “fim último” (como Freud o prazer sexual
ou Frankl o “Ego”) e orienta na direção deste,
- ou relaciona o homem com a filosofia sólida, objetiva (aristotélica-tomista-cristã), mostra a sua
felicidade possível e indica o caminho para lá, inclusive com Deus que vem ao seu socorro.
Diante do fato que o homem transcende a si mesmo, é importante de anotar que a filosofia cristã
se deixa ajudar pela revelação divina e por ela indicar um horizonte que pela razão não é
imediatamente evidente. Por isso, podemos dizer:
Uma obseração válida da psicologia deve ser inserida na visão mais ampla da verdadeira filosofia
e até na Weltanschauung do cristianismo, isto é, na Concepção cristão do mundo que é a filosofia
aperfeiçoada e completada pela revelação, ou a razão corrigida e aperfeiçoada pela luz da fé.
Então, sejam permitidas algumas palavras, mesmo brevíssimas, sobre a “visão cristã” para
conhecer a saúde psíquica do homem, e a partir dessa tratar de uma psicologia
ou ordinária com uma descrição de comportamento normal e natural
ou extraordinária enquanto observa anormalidades e procura ajudar vencê-las.
No início da visão cristã está a verdade da Criação. A primeira frase da toda a Sagrada Escritura
se refere a toda a realidade: “No princípio, Deus criou o céu e a terra. ... Deus viu que ... era boa”
(Gen 1,1 e 4).
Este fato se refere a criação toda, do pó da terra até a via látea mais distante, da perfeição mais
estupenda de um organismo vivo até a hierarquia de espíritos puros incontáveis. É uma perfeição
e beleza tão estupenda que só não percebe que não quer olhar a aquilo.
Agora o homem, do qual estamos tratando e preocupando, faz parte desta criação, e logo,
evidentissimamente, se deve dizer, também é bom, participa nessa perfeição harmoniosa, de modo
que a narração da criação termina assim: “E Deus viu tudo quanto havia feito, e era muito bom.”
(Gen 1,31).
E quem é este homem do qual se fala na criação?
Este homem foi criado como união viva e substancial de alma e corpo, com um nível apenas vivo,
a vida vegetativa, ou sensitivo e espiritual, mas constituindo o único homem que é animado pelo
mesmo princípio vital, sua alma.
Então é necessário falar de um ente só, de uma pessoa humana, que une em si o princípio espiritual
e corporal de tal maneira que tudo participa em tudo, o pensamento beneficia da boa nutrição e o
coração fica calmo quando a vontade opta para o bem e o agradável. E como há uma hierarquia
Psicologia e vida espiritual - 2022, 93
em toda a criação segundo os graus de ser, assim há também uma hierarquia entre as faculdades
no homem.59
Alguém observou si mesmo, esta união e se expressou assim:
“A minha alma tem sede de Deus, do Deus vivo ... As lágrimas são meu pão dia e noite...
Disto me lembro e meu coração se aflige: quando eu passava junto à tenda admirável, rumo
à casa de Deus, entre cantos de alegria e de louvor de uma multidão em festa. Por que estás
triste, minh’ alma? por que gemes dentro de mim? Espera em Deus, ainda poderei louvá-
lo, a ele, que é a salvação do meu rosto e meu Deus.” (Sl 42(41),3-6).
Este é o homem criado por Deus.60
Agora, depois de um tempo, Deus se fez homem, um fato inimaginável e incrível de um lado, mas
do outro lado, olhando hoje para trás, se podia quase esperar porque Deus fez o homem para ser
feliz só na união com Ele, mas esta meta, por parte do homem, nunca seria realizável a não ser por
Deus mesmo. Então Deus mesmo veio:
Verbo se fez carne para tornar-nos "participantes da natureza divina" (2Pd 1,4) ...
"Pois o Filho de Deus se fez homem para nos fazer Deus." (Santo Atanásio)
"Unigenitus Dei Filius, suae divinitatis volens nos esse participes, naturam nostram assumpsit, ut
homines deos faceret factus homo - O Filho Unigênito de Deus, querendo-nos participantes de sua
divindade, assumiu nossa natureza para que aquele que se fez homem dos homens fizesse deuses."
(Santo Tomás de Aquino, Opusc. 57 infesto Corp. Chr.; em: Cat 460)
Ligado a este fato se deve observar a participação desse homem todo, na sua união constitucional,
e nada excluído, nada desprezado, mesmo que fica conservado o valor diferente de cada parte.
Os sacramentos são administrados individualmente e sempre envolvendo o corpo.
A vida sexual recebe a benção sacramental e elevação por uma missão divina, a colaboração
criativa de Deus!
As emoções são marcadas pelo primeiro princípio moral que diz, fazer o bem e evitar o mal, de
modo que pelas emoções o homem é atraído ao bem e movido de rejeitar o mal!
Mais ainda: O ato mais sublime da pessoa humana, sua opção pela sua livre vontade, consiste em
submeter toda a vida à regra fundamental, inicial e final, que é a Vontade de Deus Criador: “Eis
que venho. No rolo do livro está escrito a meu respeito que eu cumpra tua vontade. Meu Deus, é
isto que desejo, tua lei está no fundo do meu coração;” (Sl 40,8-9; cf. Hb 10,7) Neste ato, nesta
união de vontade criada com a Vontade incriado de Deus, a vida humana é levada a uma dimensão
muito mais alta da qual o homem se encontra como criatura ou consigo mesmo.
Entende-se aqui – com conclusão – que em certo sentido Deus plantou no coração do homem uma
decepção existencial ou “depressão natural”, para que ele nunca pare consigo, mas busque mais,
busque Deus, sua origem, à qual todos os seres desejam sempre voltar – um pensamento que para
Santo Tomás vale quase como um princípio que explica tantos comportamentos e ânsias do
homem!61
O desejo de Deus está inscrito no coração do homem, já que o homem é criado por Deus
e para Deus; e Deus não cessa de atrair o homem a si, e somente em Deus o homem há de
encontrar a verdade e a felicidade que não cessa de procurar:
O aspecto mais sublime da dignidade humana está nesta vocação do homem à
comunhão com Deus. Este convite que Deus dirige ao homem, de dialogar com
59 Talvez um ou outro já estava uma vez com o médico que examinava seu coração. Ele nos conecta com a sua
máquina e deixa-nos ver tudo o que observa pela sua câmera. Vemos a pulsação desse órgão. Pode ser que ele pare
aí, porque é isto que ele se propus de ver. Mas, pode ser também que assusta e “fica de boca aberta” em observar que
esse órgão “se mexe”, se move, pulsa – e se questiona: “como ?”.
60 Josef GOLDBRUNNER. Heiligkeit und Gesundheit: Uma conferência. Freiburg im Br.: Herder, 1949, p. 27s.
61 Confira nesta mesma base o que Josef Pieper, na base de Santo Tomás ou dessa doutrina cristã elaborou sobre a
“depressão” (veja embaixo, p. 128-131).
Psicologia e vida espiritual - 2022, 94
ele, começa com a existência humana. Pois se o homem existe, é porque Deus o
criou por amor e, por amor, não cessa de dar-lhe o ser, e o homem só vive
plenamente, segundo a verdade, se reconhecer livremente este amor e se entregar
ao seu Criador (GS 19.1).62
“O nosso coração não descansa enquanto não repousar em vós” (Sto. Agostinho, Conf.
I,1,1; em Cat 30)
Neste união e por ela se abre uma verdadeira e nova dimensão da vida humana que o uso da razão
pelo homem comum talvez não vê !
Um Cristão dizia (e São Paulo está no início de uma multidão de mártires):
“Alegro-me nos sofrimentos que tenho suportado por vós” (Col l,24).
Seguindo esta visão cristã completada, a Igreja não hesita de exortar todos os seus membros com
estas palavras: “Vós, que participais dos sofrimentos do Cristo, alegrai-vos, para que, ao
manifestar-se a sua gloria, vossa alegria não tenha limites” (Ant. da Comunhão no dia 15 de
setembro). Se refere ao sofrimento vicarial ou expiação como missão da parte de Deus!
Esta verdade dá acesso à muitos sofrimentos na vida de cristãos que se manifestam em muitas
formas, mas que não tem causa natural e não há cura por remédios naturais. A fé nós diz:
O homem é uma criatura a qual Deus nunca se ausenta, sempre a acompanha e assiste, especial-
mente a aqueles que o amam mais.
Esta verdade, a mais profunda e raiz de toda a vida humana, escapa a todos que não acreditam em
Deus. Essa dimensão da vida real do homem escapa a uma consideração psicológica isolada.
Necessariamente, psicólogos que não consideram Deus ativamente presente na vida de cada
homem, podem observar a vida e interpretar segundo vários pontos de vista; mas eles não acertam
as conexões reais. Por isso precisamos tomar claro conhecimento de como Deus criou o homem,
como sua vida se realiza e, apenas depois, poder determinar desvios.
Repetimos que o Cristianismo aceita e reconhece todas as partes que vimos tocadas pelos autores
mencionados, mas coloca elas no seu lugar, cada um segundo a sua função e seu próprio sentido
e com sua contribuição ao todo, inclusive a vontade. Mas complementa que nenhuma parte serve
como norma absoluta ou explicação do resto, pois esta só se encontra no Criador.
Diante da seguinte imagem da realidade toda, do homem todo - se for necessário com a ajuda (dos
pais, dum mestre, professor, padre, psicólogo) - deve-se perguntar constantemente e, especial-
mente, em momentos de dificuldades (cf. em baixo p. 37s.)
- onde se localiza seu(s) “valor(es)” (interesse, desejo), qual é a hierarquia de valores dele
- se este peso que lhe dá é justificado e com qual esforço pode ou deve lutar para este e
- como este se insere no quadro inteiro da realidade temporal e eterna; e
se for deve corrigir a ênfase que lhe dá.
Aquelas pessoas que a Igreja reconhece terem alcançado a meta eterna, servem também como
orientadores (Maria SS., Lc 1,34: tenho nada; S. Paulo se considera “ser nada“, 2Cor 12,11; S.
Pedro: deixamos tudo, Mt 19,27; Santo Antão; S. Francisco de Assis; S. Maximiliano Kolbe ...)
62 Catecismo da Igreja Católica (= Cat), n. 27; cf. 27-30. Só quando se inclui Deus o homem encontra paz consigo:
James HILLMAN. Insearch. Psychology and Religion. London: 1967; trad. alemã: Stuttgart: Klett Verlag, 1969.
Psicologia e vida espiritual - 2022, 95
DEUS – Senhor do universo – Nada Lhe escapa – Tudo está na SUA Mão
“Mei Pai trabalha sempre, e Eu também trabalho.” (Jo 5,17)
O homem
Milagres
---
vontade
Ar Fogo (luz)
Intelecto
Água terra
O que tendes direito de exigir? – O necessário para a vida natural, mas não absolutamente;
mesmo a vida terrestre só é de passagem; o último fim cada um alcançará se quer (Cat 1847).
– Dai graças ao Senhor sempre e em todo o lugar – recebei o bem e o mal e lovai ao Senhor! –
Ordem, harmonia, ou saúde do homem e a paz na sua alma consistem na vivência (do sujeito)
segundo a correta ordem hierárquica no homem mesmo e segundo os valores (dos objetos).
A partir dessa deve-se fazer o diagnóstico.
Por doença entendemos primeiro defeitos físicos, temporários ou permanentes;
doença “mental” não se pode atribuir à simplicidade da alma, como ainda vamos tratar, mas se
deve entender como comportamento contrário à ordem e vontade de Deus ou à natureza; mas
este depende da vontade.
Agora, tal erro pode ser ocasionalmente ou com certa constância (neste caso se fala de “vício”).
Quando se quer chamar um vício uma “doença”, há ao menos o perigo de não considerar a
liberdade e responsabilidade da pessoa, e ver apenas como um defeito que aparece como doenças
físicas.
Psicologia e vida espiritual - 2022, 96
Já mostramos uma vez esta estrutura estática da interioridade ou psique da natureza humana:
C/sentidos
internos
imaginação ou fantasia (criativa)
sensitivo cognitivos: memória (guardando) – estimativa (organizando)
(corpo) sentido comum (componendo)
Com
funções vegetativas (três): (pertencem à sub-consciência!)
- A função nutritiva (fome e sede ..., para a conservação do ser individual),
- A função de crescimento,
- A função de geração (sexualidade, para a conservação da espécie humana).
Junto com esta visão estática deve-se conscientizar-se do desenvolvimento do homem consciente
da limitação e união de todas as funções, das vegetativas ate as espirituais. O “Eu” é o ponto
unificante com o intelecto como orientador e a “vontade” como comandante.
Benito GOYA oferece uma lista de “manifestações fisiológicas das emoções” e das “‘ações das
emoções sobre a mente”. (Psicologia Dinamica e vita spirituale. Roma: Teresianum, 1985):
Psicologia e vida espiritual - 2022, 99
Psicologia e vida espiritual - 2022, 100
A desordem na vida se pode manifestar em vários ou todos níveis. Porém, é evidente que
- não é a língua que gosta a cerveja,
- não é a mão que bate o vizinho, e
- não é a memória que perturba a fantasia.
Mas também
- não é o gosto que me faz pegar a garrafa, e
- não é a raiva que me faz bater o próximo, como também
- não é a memória que me tira a concentração.
É sempre a pessoa do homem, seu “Eu”, que é responsável para o seu agir, para a opção ou a
direção da sua vontade, do seu “querer” que é a causa desses comportamentos.
É a pessoa que não está disposta (não “tem vontade”)
- de perdoar uma ofensa, uma falsa acusação ou uma (aparente ou real) injustiça,
- de levantar da cama ou largar um jogo de futebol para assumir seu compromisso e dever,
- de superar o medo da opinião dos outros, da falha na prova, ...
Para a formação da pessoa, seja de suas virtudes, seja de vícios, não preciso explicar muito
porque se entende facilmente quando se tem conhecimento destas faculdades que acabamos de
ver e de sua coordenação, de umas às outras que era já assunto das aulas anteriores.
O que nesta base podemos ver, entender pessoalmente e – depois orientar outros – sejam os
seguintes pontos:
a) Vamos pensar quem é um homem maduro, ou se queremos riscar a palavra, “perfeito”.
Devemos primeiro procurar descrever
a.1) a maturidade natural (a natureza é a base pela graça) e a maturidade cristã ou
sobrenatural – que consiste na união com a Vontade de Deus e na imitação de Cristo.
a.2) o papel decisivo da vontade (p. 21).
b) Esta meta faz possível de examinar o caminho, as condições e meios a percorrer
b.1) o caminho ascético ou da própria conversão (p. 23) e
b.2) o caminho de oração para a união com Deus, e da vivência pela sua força (p. 25).
c) Este caminho ideal ou comum para todos leva, por fim,
c.1) a reconhecer os tropeços no caminho, o fato da desordem (p. 30) e
c.2) a uma orientação curativa (p. 38).
Tratamos na “visão cristã” da parte estático do homem perfeito, das suas faculdades e de sua
coordenação hierárquica. Conseguindo isto, temos uma “pessoa madura”.
a.1) A maturidade
Nas conversas cotidianas, somos já acostumados de falar de “personalidade” que corresponderia
em certo sentido a “maturidade”.
Mas “o que é a personalidade?” pergunta Insa já no início do seu estudo. Sua resposta é:
“Personalidade é um modo estável de se relacionar consigo próprio, com os demais, e com o
mundo. Esta noção procede de ... George Kelly e é, como todas, incompleta e limitada...”,
Psicologia e vida espiritual - 2022, 101
observa já o autor.64 Também Goya trata da “Maturidade psicológica” e afirma, como Insa: “A
riqueza da personalidade madura é tal que dificilmente se pode ser descrita exaustivamente em
toda a sua plenitude e complexidade.”65 Por isso o Padre Carmelita toma refúgio no decreto
sobre a formação dos sacerdotes do II Concílio no Vaticano, Optatam totius (n. 11). Lá se lê:
A uma formação sapientemente ordenada, cultive-se nos alunos a
devida maturidade humana, que se manifeste principalmente
- em certa estabilidade de ânimo,
- na capacidade de tomar decisões ponderadas, e
- no reto juízo sobre homens e acontecimentos.
Porque são apenas indicações escolhidas (“principalmente”), os Padres do Concílio juntaram
mais umas características:
Habituem-se os alunos
- a dominar o próprio temperamento,
- cultivem a fortaleza de ânimo e
- aprendam a estimar em geral aquelas virtudes que são tidas em maior conta diante dos homens e
recomendam o ministro de Cristo,66 como são
a sinceridade, o sentido da justiça, a fidelidade às promessas, a urbanidade no trato,
a reserva e caridade no falar.
Depois, não tanto pastoralmente como o Concílio, mas sistematicamente como teólogo, indica
“cinco critérios da maturidade” (Goya, 100):
1 - Filosofia unificante da vida (- maturidade moral);
2 - Objetividade – e empenho no mundo, e
3 - cordial relacionamento com os outros (- maturidade social);
4 - Segurança emocional e
5 – o conhecimento e aceitação de si mesmo (- maturidade psíquica)
(maturidade afetiva localiza nos critérios 3 e 4).
A “aceitação de si mesmo” (Goya, p. 101-103; ST, I-II, 47,1) não se deve considerar como
último, mas antes como base de todos. Esta inclui todo o passado (por ex. de não ter vergonha de
meus pais e do meu país, da minha formação ou dos meus erros passados, ...; se não estou
reconciliado comigo mesmo e não me aceito, caio facilmente no pecado capital ou a “doença” da
inveja com tantos filhos e filhas entristecedoras e desanimadores e reações até descontroladas
que a vida realmente torna-se complicada.
Isto não só faz parte da identidade natural, mas onde também pertence a “consciência e aceitação
da dignidade cristã” (Goya, p. 103-104). Na Áustria se pediu, até um meio século atrás, para a
identificação civil ou no passaporte também a indicação da “religião” a qual se adere.
Quanto mais seria necessário acolher esta pergunta na “ficha” do psicólogo que precisa conhecer
o “paciente” (se podemos ou queremos ainda chamá-lo assim), quando acredita que o homem
transcende a si mesmo, ou que é criado para a eterna união com Deus. É importante saber se ele
está consciente dessa profundidade de sua vida, ou se ainda deve ser conduzido a ela.
Para cada homem vale a afirmação de São Bernardo: “No caminho da vida, não crescer significa
cair para trás!” (Goya, 97)! E para descobrir isto, precisa princípios, as leis de Deus que indicam
não só onde se deve ir, mas principalmente se estamos caminhando.67
Segundo os tentativos humanos, psicológicos ou filosóficos, vemos que devemos, com Santo
Tomás, recorrer a revelação. Santo Tomás procurou saber desde os primeiros anos de vida não
“quem é o homem?”, mas “quem é Deus?” e só a partir dele entendesse também o homem. Por
isso, sua psicologia se encontra tanto no conjunto total da teologia que seus pensamentos e suas
reflexões sobre a psicologia do homem ficaram quase desconhecidas68, mesmo que com estas se
pode aprender mais que de grande parte dos manuais atuais de psicologia segundo o psicólogo
neomarxista Fromm69.
Na luz da revelação cristã, não se trata apenas de uma personalidade humana como do homem
perfeito (em si), mas da maturidade que exige de ir além de si e além do ambiente imediato.
Penso, maturidade se pode descrever em forma mais breve assim:
O homem maduro é quem possui domínio sobre si mesmo
(ou suas faculdades inferiores)
pela submissão à Vontade de Deus.
A primeira parte corresponde à maturidade natural, e a segunda à maturidade cristã ou
sobrenatural.
São João da Cruz ajuda com esta afirmação mais específica:
“A força da alma reside nas suas potências, paixões e apetites, governados pela vontade.
Quando esta os dirige para Deus e os afasta de tudo o que não é ele, guarda a fortaleza da
alma para o Senhor, e na verdade ama-o com toda a sua força.”70
Ou seja, o homem maduro cumpre o mandamento principal de Jesus:
“Amarás o Senhor, teu Deus, com todo o teu coração, com toda a tua alma e com todo o
teu entendimento!’ Esse é o maior e o primeiro mandamento.
Ora, o segundo lhe é semelhante: ‘Amarás teu próximo como a ti mesmo’. Toda a Lei e
os Profetas dependem desses dois mandamentos” (Mt 22,37-40).
Não precisamos estender-nos mais sobre isso.
O homem alcança sua maturidade na conformidade com a Vontade de Deus. Esta incluí seguir os
10 mandamentos – sempre e em todos os lugares. Isto, sem dúvida, é difícil para uma criatura
que – segundo os teólogos – dificilmente pode amar a Deus totalmente desprendida de si mesmo
ou sem olhar a um benefício seu (como por exemplo, “para chegar ao céu”). Por isso, disse São
67 É interessante ver qual profundidade está atrás de uma frase como essa: “Deus te ama como és”, quer dizer: aceita-
te a ti mesmo, como base, sem dúvida! Mas vai, se não se complementa com a segunda: “- e deseja que tornes-te
semelhante a Ele, e que seja como Ele quer para ti!”
68 Vale a pena dizer: Toda a 2ª e 3ª parte da Suma teológica tem como tema basicamente a “Volta do homem” ou de
toda a criação a Deus, o reditus. E ainda: Dando atenção à orientação à vontade do homem, seu agir, não se justifica
tão facilmente a qualificação “intelectualista” de Santo Tomás, mesmo que ele trata de todos os detalhes objetiva e
racionalmente.
69 E. Fromm, Psicologia per non psicologi, em: L’amore per la vita, Milão, 1992, p. 82, em: ECHAVARRÍA, 49 e
101.
70 São JOÃO DA CRUZ. Subida ao Monte Carmelo. III, 16.2.
Psicologia e vida espiritual - 2022, 103
Francisco de Sales, “se pode-se considerar feliz se se alcança a plena maturidade mesmo só um
quart’ hora antes da morte” (em: GOYA, p. 97).
Lembrando as terias materialistas, citado no início (cf. n. 2), podemos falar aqui de uma inversão
das ideias deles, da verdadeira hierarquia de valores:
1º é necessário a partitura – que é escrita pela Vontade de Deus
2º depois precisa um pianista que é capaz e pronto a tocar a música escrita, e só como
3º precisa o piano que o pianista toca conforma a partitura e só assim chegaremos à música.
a.2) A vontade
Sendo assim, se chega a pergunta:
Como o homem pode ao menos procurar crescer na direção de sua maturidade?
Recorrendo a nossa definição da maturidade temos duas respostas:
- Procurar o domínio sobre nós mesmos e
- aperfeiçoar nossa submissão à vontade de Deus.
A vontade está sob a influência imediata pelos impulsos internos, especialmente do intelecto,
e sob a influência mediata por Deus e o mundo social e material.
A vontade deve ser treinada (não tanto formada!) para querer e optar pelo bem.73 “Não digas
‘Eu sou assim..., são coisas do meu caráter.’ São coisas de tua falta de caráter. Sê homem – ‘esto
vir!’” (S.J. ESCRIVÁ. Caminho, n. 4).
71 S. BERNARDO. In tempore Paschae, Sermão III. (Ges. Werke, vol. VIII, Innsbruck: Tyrolia, 1997, p. 281.
72 ST, p. I-II, q. 77, a. 4c. Pieper no seu artigo sobre a “Acedia y desesperación anota: “La psiquiatría se encuentra
frecuentemente con el hecho de que un neurótico tiene superficialmente el deseo de curarse, pero en realidad nada
teme más que la exigencia delo que naturalmente se exige a una persona sana.” (em J. LAUAND. “O pecado capital
da Acídia na Análise de Tomás de Aquino”; www.pecapi.com.br/- Univ. Fed. Do Rio Grande do Sul, setembro de
2004). Torellò diz, “todos os neuróticos são egocêntricos” (TORELLÒ, p. 139). Echavarría na sua “Práxis da
Psicologia” afirma: O “egocentrismo é o núcleo central da maioria dos transtornos de caráter, em particular do ‘caráter
neurótico’” (p. 465); a “desordem cognitiva”, contra a prudência, abre para uma desordem interior, o “narcisismo”, o
“ódio de si”, a “concupiscência”, “um falso fim” e a dependência de afetos; “na base dos transtornos ... uma
desfiguração no modo de perceber a própria realidade” (p. 481-490).
Se a vontade tem a palavra decisiva no agir do homem, deve-se ter em mente que um paciente construiu muitos muros
ao redor de si e não deixa ninguém chegar perto à verdadeira raiz de sua vida; facilmente desvia a atenção do seu
“tesouro” e só permite acesso a quem realmente confia (cf. DOBBELSTEIN, p. 39, 59s).
73 Aqui se pode ver a diferença entre a formação do intelecto que é pelo estudo, e a formação da vontade que é a
própria tarefa da “educação”, abrangendo mais de que apenas o estudo; seu lugar é um ambiente de vida como a
família ou um seminário.
Psicologia e vida espiritual - 2022, 104
Sobre as qualidades do uso da vontade se pode encontrar facilmente indicações. Goya74 por ex.
fala que a vontade por “ser o princípio unificador” deve ser forte, “capaz de regular e orientar in
modo construtivo as energias biológicas, psíquicas e intelectuais”, através a concentração que é
“indispensável para desenvolver uma atividade interior”, deve ser determinada com coragem e
audácia para perseverar no que deve fazer. Aqui entram também as muitas motivações (cf.
GOYA, p. 141-164).
Mesmo olhando ainda somente ao ponto de vista natural, Santo Tomás, como vimos segundo o
início da parte I-II da Suma teológica sobre o homem, perguntaria esse paciente: Você está feliz?
Pois, como lá examina e concluí: Todo o mundo quer ser feliz, e essa felicidade deve ser a
máxima, isto é, sem necessidade de recorrer anda a mais algo! E tal felicidade, nós
alcançaríamos apenas na união com Deus (cf. ST, p. I-II, qq. 1-5).
Então, com todo o respeito da liberdade da pessoa, do paciente, não dá para excluir a pergunta se
ela considerar Deus como uma realidade, ou se ela quer acreditar em Deus? Pois sem esta meta,
como já dissemos antes, sem Deus, a pessoa não pode ser feliz – no fundo do seu ser (ou
“coração”) e quando é sincera consigo mesma. Também não pode ser guiada a felicidade por
uma outra pessoa; e quão triste é o resultado que se encontra pelas novas religiões e seus
“pastores” ou seja pelas correntes psicológicas que se espalham desde um século.
Campoe começa seu trabalho sobe a “Terapeútica de doenças espirituais” segundo os Padres da
Igreja primitiva (especialmente os monges no deserto) com esta afirmação: “A finalidade do
cristianismo é a deificação do homem.” (CAMPOE, p. 2) E igualmente e como consequência
afirma Josef Goldbrunner na sua conferência sobre “Santidade e Saúde”: “Santidade é saúde.”75
Ao contrário, a filosofia existencialista, excluindo toda a determinação (pela essência) foi
chamada “a filosofia do desespero orgulhoso”76, “excluindo a priori toda referencia [sic!] ao
domínio religioso e moral” (CAMPOE, p. 8).
b) O caminho de atravessar
Uma vez concentrado na vontade e olhando a última felicidade, se abre o caminho a percorrer.
74 Cf. GOYA, 187-206: “A vontade humana e a união com a vontade divina”. – Aqui gostaria lembrar – apenas na
nota para não cansar pela repetição – que na noite se vê nada, então há nada para optar e a vontade está sem objeto;
talvez gira, mas sem motivo e meta, então esquenta e queima, que conhecemos como estresse e, em seguida, depressão.
Isto é hoje a situação de muitas pessoas. Este é o homem da civilização super-saturada e aquele psicólogo que não
considera uma causa final para a vida humana, e isto significa, “sem luz” e rumo; e se alguns psicólogos percebem a
necessidade de uma meta como os da “psicologia transpessoal” (Maslow, 1968; cf. GOYA, p. 16-18), eles não tem
coragem de indicar um rumo, preferem de não tocar a liberdade (absoluta) do paciente e, então, ficam na indiferença
religiosa; encorajam ainda o paciente, mas sem dizer para que (uma mentalidade que se encontram em tantas áreas da
vida humana hoje: cada um escolhe – qual religião quer seguir, qual quer aprender, que sexo quer ser ...
Ainda se junta outra tendência, a qual Papa Franciso com franqueza apontou: o desligar do passado, pessoal e histórico
(Fratelli tutti, 2020, 13-14; cf. em frente, nota 70 e apêndice III sobre escrever para pensar), filosoficamente dito,
desligar da causa eficiente ou do passado, então nós não sabemos mais quem somos, animais ou anjos, e acabamos
totalmente nas mãos dos que querem fazer de nós o que querem que somos, seja vivos ou mortos, vivos pelo
regulamento da natalidade (ou “remédio” até o aborto) e mortos pela eutanásia.
Assim, o homem se encontra sem luz ou no escuro; então, sua vontade não tem para que optar ou o que quer, é o
homem do WhatsApp dia e noite, influenciado, não escolhe mais; ele gira, e gira tanto até que é gastado (como os
dentes de uma roda dentada) – e não consegue mais e cai na depressão, um fenômeno mais e mais universal.
75 J. GOLDBRUNNER, p. 9. „Aos não-crentes se oferece no amor infeliz somente resignação ou a morte, o que é
ilustrado tão frequentemente na literatura... Mas ao Cristão, nesta sua maior necessidade, Deus vem ao encontro pelo
dom do seu amor, que contém em si a redenção: a Eucaristia.” (Ibid., p. 55)
76 G. SIEGMUND. Christentum und gesundes Seelenleben. Paderborn: Verlag Ferdinand Schöningh, 1940, p. 40.
Psicologia e vida espiritual - 2022, 105
Colocando ao claro esta última e mais profunda miséria de um homem, a ânsia pela felicidade,
deve-se ter clareza sobre o caminho para aquela meta pela qual cada um – inconscientemente ou
conscientemente – anseia: é Cristo que diz ser “o Caminho, a verdade e a Vida” (Jo 14,6), ou em
palavras mais próximos a nós: Cristo é o caminho verdadeiro à vida!, ou ainda, o Caminho à
verdadeira vida – onde não se sofre mais nenhuma excepção.
Aqui, se deveria apresentar toda a teologia ascética da história da Igreja nestes dois mil anos.77
Pois todas essas reflexões não tem nenhum outro objetivo que ajudar o homem chegar ao
autodomínio e com ele à união com Deus. Colocar as ligações com as criaturas na sua medida,
conforme à vontade de Deus: Ele quer que dormimos, quer que comemos, quer que o homem se
multiplica pela vida sexual – porém tudo isso “segundo a natureza” e “na medida certa”. Para
ordenar nossa vida interior a Deus, o evangelho nos fala do controle do olhar (cf. Mt 5,28) ... e
oferece tantos outros conselhos; até o preceito da Igreja da penitência de “cada sexta-feira em
memória da morte do Senhor” (Cat 1438), ou do descanso semanal dominical que põe um limite
ao esforço humano e pede um ato de confiança na providência divina que acompanha e, por fim,
abençoe todo o esforço humano... tudo isto são ajudas e exercícios do domínio de nossas
tendências exageradas que tem como finalidade servir e ajudar a pessoa de submeter-se a Deus
sempre e em todas as circunstâncias da vida, nos olhos do homem situações boas ou menos boas.
A regra antiga serve como orientação para uma ascese saudável: Mens sana in corpore sano –
Uma mente saudável se encontra (ou pressupõe) num corpo saudável (cf. GOYA, p. 219). Então,
segundo outra regra fundamental da Igreja, se deve cuidar primeiro do estado físico da pessoa
antes de exigir um esforço espiritual – o que a Igreja desde o início observou quando cuida
sempre da dignidade da vida humana pela Caritas.78
Olhando a medida como caraterística de todas as virtudes, deve-se hoje especialmente apontar a
necessidade da tranquilidade psíquica ou mental: Como o corpo consegue passar um bom tempo
sem comer e até beber, mas não sem dormir, assim deve ser também com a alma: não nos damos
conta, mas os outros percebem: se nós não paramos frequentemente (para não dizer, cada dia,
além do descanso noturno) por um tempo como uma meia hora, em que não fazemos nada ou
imitamos o povo antigo que se sentou diante da casa descansando mentalmente, olhando ao céu à
natureza ao seu redor etc. nós tornemo-nos “nervosos” e irritamo-nos facilmente sem
pessoalmente perceber, mas como uma “cruz a carregar” pelos outros.
Todo o argumento de Goldbrunner sobre a saúde da alma trata desse equilíbrio. Primeiro aponta
ao ideal de santidade que faz o corpo doente (exige morti-ficação) pois que elevá-lo à
proximidade de Deus que na Sagrada Escritura é descrita como morte: Não te aproximes demais,
se não morras! Nesta base distingue entre “doenças legítimas” pois a graça aperfeiçoa a natureza
de “doenças ilegítimas” que seriam consequências de falsas ideias de santidade ou perfeição, ou
do “querer ser santo ao seu modo” ou segundo a própria vontade (e cada pecador é inimigo de si
mesmo, cf. Tb 12); e isto leva a comportamentos contra as leis naturais. A medida seria a síntese
do ser guiado pelo amor disciplinado pela autoridade (obediência). Desta maneira dá espaço ao
largo mundo inconsciente na alma e alcança “viver sua verdade”, enquanto “doença” seria “viver
77 “A ascética... torna uma verdadeira medicina espiritual do homem total” (CAMPOE, p. 3, cf. DOBBELSTEIN,
p. 13; cf. em baixo, p. 132s).
78 Cf. BENTO XVI, Deus Caritas est, 2005: “A caridade como dever da Igreja” (20-25) e “As múltiplas estruturas
de serviço caritativo no atual contexto social” (30ss.).
Psicologia e vida espiritual - 2022, 106
contra a sua verdade” (individual e única) e perseguir uma ficção, mesmo pelos propósitos mais
nobres.79
Mas fica claro: A pratica de ver e atender o próximo ao meu lado nas suas necessidades é a
melhor prova da maturidade humana, ou seja do domínio sobre si mesmo.
Aqui deve-se apontar ainda um aspecto importante. Sabemos que muitas correntes de psicologia
não querem considerar a causa eficiente e causa final para não limitar a liberdade da pessoa
(esquecendo que com isto cada pessoa fica desorientada, abandonada aos impulsos internos, e,
por fim, cai no “nada” e no desespero, aonde guia a ideia do existencialismo). O homem não é
apenas como uma planta que cresce de dentro para fora (mas mesmo as plantas dependem da
água e luz de fora!). Ele é o homo sapiens e o homo social e religioso. Por isso deve-se
considerar na sua vida ordinária também o relacionamento com o mundo objetivo e exterior e
com Deus.
Desde os primeiros tempos da reflexão humana se considera como sua tarefa o autodomínio
como fundamental e se falou das virtudes cardeais
- da prudência nos julgamentos do intelecto prático que olha a todas as circunstâncias exteriores
em que o homem se encontra,
- da temperança e fortaleça no domínio das emoções internas, mas também na confrontação com
o mundo que lhe circunda; e especialmente
- a justiça que reconhece o valor próprio de cada ente, de si mesmo e dos exterior de si, de
criaturas e do Criador, o devido respeito no seu agir.
Não só deve-se dar atenção a essa convivência, mas também ver a base para julgar os valores.
Para Santo Tomás (com Aristóteles) o valor de tudo que existe está baseado no próprio grau de
ser: algo é bom porque é, e possui tanta bondade (valor80) quanto grau de ser possui.81
O homem é considerado como ente existente dentro de um mundo real e existente, significa, os
dois são limitados e criados por Deus que é a meta e felicidade de tudo.
As criaturas encontram si mesmo, quem são e como foram feitas somente em harmonia e
correspondência a este plano universal divino.
79 GOLDBRUNNER, p. 9-16. Ele concluiu sua conferência assim: “Santidade e saúde são conectadas pela Cruz do
Senhor” (p. 59).
80 De “valor” se fala também mais recentemente, no tempo moderno. No uso desta palavra se toma uma certa distância
do ser e olha mais a um outro critério com referência, especialmente segundo utilidade, logo a um ponto de vista
predominantemente material.
81 Frankl, por exemplo, considera “três tipos de valores: Os valores de criação… Os valores de experiência… e os
valores de actividade” (cf. Frankl, La idea psicológica del hombre, 1963, p. 85, em: VIAL. El sacerdote, Psicologia
de una vocación. Madrid: Palabra, 2020, p. 159).
Pensamos como podemos considerar estas três referências? São completas, são selecionadas segundo qual critério,
por referência a o que?... Como resposta Vial faz a sugestão: “estos valores se reflejan en un programa de vida: homo
faber – homo amans – homo patiens” (p. 19s). E então, ganhamos com isto algo? - É comparável como a estrutura
ética, das virtudes e vícios que o cristianismo oferece?
Partindo da ideia de Frankl, VIAL dá uma interessante extensão da moral cristã em Santo Tomás ao ambiente
psicológico de hoje quando diz (p. 86):
Prudência leva a autonomia, seguridade, coerência;
Justiça a sociabilidade, diálogo, tolerância, autoestima
Fortaleza a equilíbrio, perseverança, identidade
Templanza a autodominio, humorismo, creatividad, espontaneidade.”
Me parece um belo exemplo como se pode fazer psicologia até ao infinito quando não se baseia em algo firme,
objetivo, universalmente válido e reconhecido. Muitas coisas se pode dizer, são belos, úteis, razoável ... mas são a
resposta da verdade que se deveria procurar ou a qual se deve corresponder e o que é verdadeiramente importante?
Psicologia e vida espiritual - 2022, 107
Consequentemente, não adianta de fazer poesia, mesmo com a forma artística mais linda e
cativante, mas conta simplesmente se aquilo que é dito ou afirmado ou ensinado corresponde ou
não corresponde à natureza do homem e das coisas e assim ao plano de Deus; só se corresponde
serve para a verdadeira realização de si.
E isto ganha mais uma importância quando se leva em consideração da unicidade da existência.
Ninguém voltou já e provou que sua vida anterior foi assim e assam e que agora quer viver de
outra maneira etc. A vida de cada homem é única e lhe é dada só por uma só vez. Daí torna-se
evidente a seriedade com que cada pessoa deve considerar sua vida e quão importante é que
ajudarmo-nos uns aos outros para não falhar.
“Está determinado que os homens morram uma só vez, e depois vem o Julgamento” (Hb 9,27)
Essa submissão a Deus começa de um lado com o conhecimento de Deus, ao qual dedica o Padre
Carmelita Benito Goya o último capítulo da Psicologia e vida espiritual: “Psicologia e Oração”
(p. 207-228), “o conceito de Deus” (p. 214-216); este é oferecido à vontade da pessoa para sua
opção.
Depois de ter visto o caminho pelo esforço humano, podemos descrever os seguintes passos
diretamente em direção à meta final ou a Deus que é o caminho da oração.
Logo seja respondido a pergunta: Mas se pode sugerir ao paciente de rezar? Respondo com essa
pergunta: Se pode esperar que alguém mata sua sede quando lhe ofereço um copo de água sem
água? –
O homem é feito para Deus – creia quem quer ou não (já falamos da livre vontade própria). E se
queremos ajuda-lo, devemos leva-lo a fonte. Muitas ligações que o prendem se desfazem com
isto já.
São Paulo VI, o papa, chamou o programa dos “doze Passos” do movimento “Alcoólicos
Anônimos” como um livro caído do céu. Este movimento, fundado em 1935, contou em 2001
cerca de 2 milhões de membros ou mais com 100.800 grupos em cerca 150 países. A Jenyfer
apresentou os doze passos no seu trabalho “A Conquista de si mesmo pela Educação da
Vontade”, p. 37. Neste programa de tanta ajuda diz o 1º passo “admitimos que éramos
impotentes perante o álcool...” e o 2º Viemos acreditar que um Poder superior a nós poderia
devolver-nos à sanidade.” E, então o 3º passo é: “Decidimos entregar nossa vontade e nossa vida
aos cuidados de Deus, na forma em que O concebíamos.”
1 - Para ajudar ou “alimentar” a vontade precisa primeiro luz, que vem do conhecimento, do
conhecimento - de uma filosofia realista e
- das verdades transcendentes ou da fé.
Aqui se sublinha a importância - do ensino verdadeiro e exigente, e
- da Catequese na religião.82
Talvez nunca era mais fácil de que hoje de ter acesso a informações e leitura. Por isso se deve
aplicar muito discernimento para saber o que se permite entrar em nós, e o que oferecemos à
nossa vontade de optar e dedicar-nos.
82 Aqui se vê a importância dos livros em geral – que parecem (apenas) serem substituídos pelo “onisciente” Google
– e um livro como o Catecismo da Igreja Católica com um sumário extra-ordinário do conhecimento da realidade
natural e sobrenatural, da criação e salvação, do que cabe ao homem e do que Deus assume em nosso favor! Além
disso deve-se dar ênfase na imensa riqueza da tradição milenar do Cristianismo, seja no início pelos Padres da Igreja
primitiva, seja por imensa literatura sobre todos os assuntos... (tenho um livro do século 17, em que se encontram 55
páginas sobre “diversas tentações dos demônios”, que se apresenta hoje como um assunto apenas hoje descoberto...)
Psicologia e vida espiritual - 2022, 108
Ao conhecer não se chega pelo olhar de vídeos ou pela passagem de leituras no Tablet; isto fica,
na grande parte, no perceber. O que é necessário é o pensar, o refletir sobre o que leu e assimilá-
lo. Torna-se sempre mais claro que pouca gente é capaz de entender o que estão lendo (cf.
apêndice III). Logo devem aprender refletir ou, “meditar”, meditar não como um método de
acalmar, “a meditação psicológica” por uma instrução “Como meditar”, no sentido que revela o
subtítulo: um “Guia para descoberta de si mesmo” como pelo Yoga e outros métodos
sugestivos;83 mas meditar como olhar a obra reveladora de Deus e escutar a “voz” de Deus, do
divino Pai e amigo, como a Igreja explica no Catecismo em forma breve, mas explicita e bela.84
3 – A meditação é a reflexão sobre a realidade, a realidade viva espiritual que é Deus e sua obra.
E o efeito da meditação ou reflexão verdadeira, profunda e séria, é a “saída de si”, a expressão do
seu íntimo, pôr para fora do “que o coração está cheio” (Mt 12,34), livrar-se e manifestar-se, um
produzir. Mas principalmente poder ir ao encontro do que é real, e mais ainda quando se trata de
pessoas e em especial da pessoa de Deus com que se pode intercalar ou, como se chama isto
também, rezar.85 Isto é para cada pessoa uma oportunidade tão grande que significa para eles
uma nova vida, a chance de se desenvolver de verdade, de entrar numa convivência valiosa, de
encontrar alguém que tem tempo, escuta, responde e – por fim, ama. Podemos e devemos ainda
mais dizer: Saindo de si para ir ao encontro de sua origem, daquele que conhece, planeja e
orienta, que quer – com amor – aperfeiçoar e levar a plenitude que cada criatura deseja no seu
coração.
A maravilha desse passo se encontra no livro dos Salmos, como se lê já no primeiro: “Feliz
quem ... na lei do Senhor encontra sua alegria e nela medita dia e noite” (Sl 1,1-2). A este livro
de Oração se dedica especialmente o pastor protestante, Jay E. Adams com seu livro “Competent
to Counsel”, como já indicamos.86
4 – O resultado maior dessa descoberta e desse passo, se alguém acompanha e resolve dar esse
passo, é a paz que resulta da posse do bem desejado, um aconchego e sossego, um saber-se
acolhido, uma libertação de si que se reconhece como um pobre “nada”. E como se explica tal
fruto? É pela calma – contra a agitação da vida de hoje (e não só de hoje), e o amor que de Deus
se recebe, pois a pessoa passa este tempo com quem é o AMOR EM PESSOA: “Quem não ama,
não chegou a conhecer a Deus, pois Deus é amor” (1Jo 4,8). A este fim conduz F. Sheen com sua
83 Cf. GOYA, 209s; isto não só no “mundo”, pois uma psicóloga de seminaristas recomenda “exercício” e “medi-
tação”, inclusive “dança” e “ioga” (L. CAMPOS. A dor invisível dos presbíteros. Petrópolis: Ed. Vozes, 2018, p. 58).
84 Cf. Cat 2705-2719; cf. GOYA, p. 213-228 e tantos outros livros sobre a oração segundo a tradição cristã.
85 Se trata da possibilidade de escrever, o que é muito mais de que apenas um “Diário” de desabafo. Devido de sua
importância (também psicologicamente) me permito de juntar no fim, como apêndice alguns pensamento sobre isto.
86 J. E. ADAMS (cf. nota 13); “A intenção desse livro é de mostrar que a psiquiatria (não a psicologia!) se apropriaram
a tarefa do pastor numa maneira injusta. ... A ideia de explicar que dificuldades espirituais fossem “doenças” tornou-
se o meio para assumir o poder.” (p. 11, nota 24). “Este livro quer tocar um tom totalmente novo. Servo do Evangelho
e outros colaboradores cristãos que são chamados por Deus de ajudar o seu povo nas necessidades, sejam encorajados,
de dirigir homens não ao psiquiatra, mas de assumir de novo seus direitos e deveres.” (Ibid. p. 17) Se refletimos bem,
o II Concílio no Vaticano insistiu numa forma máxima possível ao que o pastor queria dizer. O Concílio decretou que
todos são chamados á Santidade! (LG 40; Cat 823-829; 1265-1270; 2012-2016; 2807-2815). A ideia é simples:
Conduzir o “paciente” ao contato com Deus por meio da leitura dos Salmos que tanto falam das dores do homem e da
assistência poderosa de Deus.
Seria um bom projeto de procurar para cada doença mental um Salmo com resposta saudável, ou vice versa: Ler os
150 Salmos e listar para qual doença este Salmo serviria com remédio! Pelos Salmos a pessoa é conduzida diante de
Deus e, pela recitação confiante, Deus é permitido tocar a alma, entrar e concertar o que está torto, de restaurar a saúde
com a qual a pessoa foi criada e que agora está ferida e necessita de recuperação por uma mão forte que ninguém tem
melhor que o próprio Deus.
Psicologia e vida espiritual - 2022, 109
recomendação da “Hora do seu dia”, de uma “Hora Santa” diante do Santíssimo Sacramento87,
ou, no caso de protestantes numa hora com a Palavra de Deus diante de si.88
Este é o caminho que se tornou tradição na Igreja, mas não impede adaptar ainda melhor a
“psiquê” do homem ou de formular em termos mais accessíveis.89
O passo importante é que a pessoa entra em si, toma coragem de enfrentar-se consigo mesmo e
ao mesmo tempo com Deus Amor, Libertador e Salvador. Isto acontece conscientemente na
meditação – pela disciplina física da tranquilidade, pelo tempo reservado, e pelo olhar interior e
pessoal a realidades espirituais e invisíveis. Isto deve levar a atualização ou a pratica na oração,
no encontro “Tu a tu com Deus amigo e amor”. Se realmente comunicamos com Deus, o
verdadeiro e vivo, será aquele que se fez homem por amor a nós e continua querer ser presente
entre nós e por isso fundou a Igreja, autorizou sacerdotes para faze-lO presente – para nós, de
modo que na Igreja, a oração vira ser e é uma “oração sacramental”, sacramentalizado – de modo
que o homem pode deixar que Deus toma posse de si (cf. Lc 10,16; At 9,5; Jo 14,23 e 25).
Quem chega a fé em Deus, naturalmente, em um Deus universal, encontra sempre a solução da
entrega a ele que sempre me espera e quer me ajudar; ele quer dar. Deus é sempre o Bem Maior
– por isso posso renunciar ou me livrar (soltar) de tudo, de mim mesmo, das criaturas amadas ou
de sonhos imaginados, com isto superar já todas as possíveis ofensas ou decepções, para abraçar
ele totalmente, com ambos os braços. E esta generosidade de fé e confiança me faz já feliz (cf.
TORELLÒ, p. 152-172).
Para não me estender mais, se pode contemplar o seguinte esquema que no seu centro coloca a
vida segundo a natureza, dada por Deus. O quadro mostra todas as dimensões da vida do
homem. Pode facilitar a diagnose do agir humano.
Então além [I] do nível natural se vê as maneiras [III] como Deus vem ao encontro do homem,
mas também, [II] como o homem está em perigo de opor-se a Deus.
87 “Às vezes, eu gostaria ter mantido um registro dos milhares de cartas que recebi de padres e leigos dizendo-me
como eles aderiram à prática da Hora Santa ... Muitas vezes, os retiros são parecidos com palestras sobre saúde. Todos
concordam que precisamos ter saúde, mas faltam recomendações específicas sobre como ser saudável. ... Um
monsenhor, devido a uma fraqueza pelo álcool e consequente escândalo, teve que deixar sua paróquia ... largou o
vício, voltou à atividade de seu sacerdócio, fez a Hora Santa todos os dias e morreu na Presença do Santíssimo
Sacramento.” (F. SHEEN. Tesouro em Barro: Autobiografia. São Paulo: Molokai, 2020, p. 208).
88 Um Sr. Jack McAllister, depois de um encontro com F. Sheen no aeroporto de Los Angeles, inseriu na sua
“evangelização mundial” o pedido “a seus fiéis que passassem uma hora inteira com as Sagradas Escrituras, em oração
e reparação pelos pecados do mundo”. Ele conseguiu por “um panfleto com o título ‘Jack McAllister escreve aos
Vigilantes de Uma Hora’ ... no fim do primeiro ano ... setecentos ministros que se haviam comprometido a fazer uma
Hora Santa por dia”, e escreveu a F. Sheen “cerca de seis anos após ... ‘Nós já mobilizamos e treinamos mais de cem
mil Vigilantes de Uma Hora” (F. SHEEN. Tesouro em Barro: Autobiografia, p. 211-212).
89 Me seja permita esta observação: Se digo que este método ou caminho é conhecido desde séculos, por quase mil
anos (cf. Catecismo 2654), os passos de leitura à meditação e de oração à contemplação, então alguém pode virar as
costas e dizer: É velho. Mas se dou um outro nome como fosse um “novo método” na ciência da Psicologia e digo:
“Recomendo conduzir seus pacientes no caminho PPPP, do perceber a pensar, e do produzir a possuir” (com
desenho de um quadrado para os quatro passos), aí talvez encontro interessados e promotores. E se num curso de
formação destes revelasse a eles que este método – como cada método – tem um fim em vista e que é tão rico e
eficiente porque inclui Deus vivo como “partner - companheiro” – aí, não será que uns desistem e outros se
entusiasmam ainda mais?
Psicologia e vida espiritual - 2022, 110
“Deus nos colocou no mundo para conhecê-lo, servi-lo e amá-lo e, assim, chegar ao paraíso...
participar da natureza divina (1 Pd 1,4) e da vida eterna (cf. Jo 17,3)” (Cat 1721).
III. Nível (Com DEUS FILHO) (com DEUS PAI) (Com DEUS
Sobrenatural ESPÍRITO SANTO)
9. Virtudes Fé Esperança Caridade
Teologais90
8. Conselhos Obediência Pobreza Castidade /
Evangélicos continência
7. Espiritual. Cristã Oração Esmola Jejum
/ boas obras
↕ ↕ ↕
I. Nível natural
3. Relacionado com Deus Natureza ou o mundo “próximo”
material
2. Direitos humanos Formação intelectual Propriedade privada Vida social e
cada um tem o e liberdade religiosa - individual formação de família
direito para:
Gn 1,27-28: ”Deus disse: “Façamos o homem à Que ele reine sobre os ... criou o homem e a
nossa imagem e peixes do mar, sobre as mulher. Deus os aben-
semelhança.” aves dos céus, sobre os çoou: Frutificai, disse ele,
- - - animais domésticos e e multiplicai-vos, enchei
1. Natureza sobre toda a terra ... disse a terra”
seg. Gn 1,27-28 cada Imagem de Deus ele, ... enchei a terra e - - -
homem é: (pela alma imortal, o submetei-a.
intelecto, vontade e - - -
“coração”) Senhor da terra Um ser sexual
↕ ↕ ↕
II. Nível do pecador
“No batizado, porém, certas consequências temporais do pecado permanecem, tais como os
sofrimentos, a doença, a morte ou as fragilidades inerentes à vida, como as fraquezas de caráter
etc., assim como a propensão ao pecado, que a Tradição chama de concupiscência ou,
metaforicamente, o ‘incentivo do pecado’.” (Cat 1264)
4. Concupiscências Orgulho (soberba): Concupis. dos olhos: Concupiscência da
herdadas Querer saber tudo Querer possuir tudo carne
(cf. 1 Jo 2,16; (enfim: ser tudo = ser (= querer ter e poder (= querer gozar tudo,
Gn 3,5) como Deus!) tudo) experimentar)
5. Ato pecaminoso Presunção, Ambição, Injustiça, Idolatria, Intemperança,
vanglória (jactância, intolerância, impureza
ostentação,hipocrisia) ociosidade
6. Vícios capitais Soberba, ira Avareza, inveja, Gula, luxúria
(Cat 1866 e outros) Preguiça ou acídia
90 GOLDBRUNNER, p. 35-59: Die Drei Göttlichen Tugenden und ihre Auswirkung auf die Gesundheit - As três
virtudes teologais e seu efeito à saúde.
Psicologia e vida espiritual - 2022, 111
Talvez os seguintes dois exemplos servem como ponte para o próximo passa da nossa reflexão.
De São João da Cruz ouvi no meu estudo este exemplo (não procurei uma fonte para isto):
Se se vê uma criança com uma faca na mão [isto é, num perigo de se machucar] – que se faz?
- quando se toma a faca, ela chora;
- quando oferece um bem, um chocolate, ela solta e esquece a faca com sorriso.
De São João Dom Bosco se aprende: Quando viu vários rapazes juntos, sabia que não leva a um
bem, então que fez? Se iria perguntar, sobre o que falam, receberia provavelmente uma mentira;
então foi lá e pediu a um deles fazer aquilo e a um outro ajudar para tal etc. eles se irão separar
tranquilo e a conversa terminou. Resumindo: Vencer o mal pelo bem ! (Rm 12,21)
Precisa oração para receber a correta inspiração na hora. Isto foi dito por Santa Jacinta em
Fátima: Os médicos falham no diagnóstico porque não rezam.
E aplicado ao tratamento psicológico – bem semelhante ao aconselhamento no sacramento da
Confissão: Seria bom encontrar o bem que abraça a pessoa de bom grado e, em consequência,
afasta do mal que a faz doente. É um conselho dado na Teologia moral de conhecer a virtude
ofendida pelo vício, ou seja, o caminho de andar a Deus oposto ao do erro. No fundo se trata da
oposição entre Deus e o Eu.
Um Padre se aprofundou em Roma nos Exercícios espirituais de Santo Inácio de Loyola. Hoje
está formando em todos os Estados Unidos de América no nível paroquial “diretores espirituais”
leigos. Provavelmente, estes têm pouco conhecimento de psicologia, mas com uma boa
catequese podem indicar o caminho à “autoestrada”, à “Highway para o céu”, partindo onde uma
pessoa atualmente está. Cada um que conversa com eles pega esse caminho com as condições
que tem, com seu “VW-fusca” ou “Fiat-Cinquecento” ou “Rolls Roys” ou “Mercedes”,
importante que pega o caminho correto e vai com a esperança de chegar ao Céu.
Lembramo-nos de Meyers, citado por Adams, que apontou ao primeiro versículo do primeiro
Salmo (cf. em cima, nota 13):
“Feliz quem não segue o conselho dos maus, não anda pelo caminho dos pecadores nem
toma parte nas reuniões dos zombadores” (Sl 1,1).
Ou, para apenas indicar qualquer uma das frases da Sagrada Escritura:
“Tranquilo espero o dia da angústia, que há de vir para o povo que nos oprime. ... E,
mesmo que a figueira não renove seus brotos, mesmo que ... estarei feliz no Senhor,
cantando a Deus, meu salvador.” (Hab 3,16-18)
Quando se acredita no projeto objetivo e universalmente válido, a chamada de Deus que quer
que cada um chegue a ele para sempre, então é importante que qualquer um que quer ajudar ao
outro, deve ser familiar com esta visão total para poder entender onde o outro está, quais passos
deve fazer para pegar a estrada correta. Na nossa visão cristã deve-se exigir, e o outro, o
“paciente”, deve poder confiar que quem quer ajudar, padre ou psicólogo, é familiar com Deus,
conhece o caminho a Ele e sabe dirigir a Deus, a meta final e feliz.
É sabido que a vida ascética coincidiu em muitos pontos com as orientações psicológicas, e que
os “Diretores espirituais”, os Superiores (Padres no deserto), homens e mulheres santos, dotados
de sabedoria e experiência cumpriram, por muitos séculos as tarefas de “psicólogos” com seus
conselhos.91
91 Por exemplo quantos benefícios todos ganhariam com as reflexões de São João da Cruz sobre as quatro emoções,
a alegria e esperança, a dor e o medo, e a explicação tão extensa da alegria na Subida ao Monte Carmelo, III, 16-45.
Psicologia e vida espiritual - 2022, 112
c) Os tropeços no caminho
A obra de Deus Criador é perfeita. Mas com vimos, a vida espiritual exige a participação da
criatura, participação livre, e a vontade livre é como um instrumento: se pode usar para o bem e
corretamente, mas – em certas circunstâncias, ou mesmo por pura fraqueza de vontade ou por livre
decisão (não se pode negar isto sem negar a liberdade em si!) é possível de usar o instrumento mal,
para fazer um mal e não o bem pelo qual é dado. Por isso há de fato a possibilidade de uma
desordem, e essa em vários graus.
A possibilidade de uma desordem deve-se procurar exatamente na perfeição dessa obra, nas
criaturas racionais e inteligentes. “O livre-arbítrio é indiferente a escolher bem ou mal” (Sth I, q.
83, a. 2). Então pode ser usado para o bem, e pode ser usado para o mal. E responsável, ou quem
decide, é a pessoa, com ficou claro anteriormente.
A desordem na vida se pode manifestar em vários ou todos níveis. Porém, é evidente, como já
dizemos, que é sempre a pessoa do homem, seu “Eu”, que é responsável para o seu agir, para a
opção ou a direção da sua vontade, do seu “querer” que é a causa desses comportamentos.
É a pessoa que não tem vontade
- de perdoar uma ofensa, uma falsa acusação ou uma (aparente ou real) injustiça,
- de levantar da cama ou largar um jogo de futebol para assumir seu compromisso e dever,
- de superar o medo da opinião dos outros, da falha na prova, ...
O fato da desordem foi causado pelo pecado original92 e suas consequências que afetou todos
os homens (cf. Rom 5,12-19).
A harmonia na qual estavam, estabelecida graças à justiça original, está destruída;
o domínio das faculdades espirituais da alma sobre o corpo é rompido;
a união entre o homem e a mulher é submetida a tensões; suas relações serão marcadas pela cupidez
e pela dominação.
A harmonia com a criação está rompida: a criação visível tornou-se para o homem estranha e hostil.
Por causa do homem, a criação está submetida "à servidão da corrupção". (Cat 400)
O pecado original levou então a um enfraquecimento do intelecto como da vontade e pede de fazer
certas distinções na procura das causas dessa desordem. Se pode ver em tais comportamentos dois
motivos, um do lado objetivo, outro no lado interno do homem.
92 “Neste pecado, o homem preferiu a si mesmo a Deus, e com isso menosprezou a Deus: optou por si mesmo contra
Deus, contrariando as exigências de seu estado de criatura e consequentemente de seu próprio bem. Constituído em
um estado de santidade, o homem estava destinado a ser plenamente ‘divinizado’ por Deus na glória. Pela sedução do
Diabo, quis ‘ser como Deus’ (cf. Gn 3,5), mas ‘sem Deus, e antepondo-se a Deus, e não segundo Deus’ (S. Máximo
Confessor).” (Cat 398; cf. em baixo nota 106).
Psicologia e vida espiritual - 2022, 113
- Do lado objetivo externo, as coisas se apresentam ao homem como ele encontra diante de si (ou
como aquilo que ele mesmo procura!). Elas têm seu valor, seu significado intrínseco, e segundo
este o homem deve valorizá-las. Porém, além desse valor real ou ontológico, pode facilmente
acontecer que elas se apresentam não como de fato são, mas aparecem melhores ou piores que em
realidade são, bens inferiores aparecem como fossem superiores e enganam pela aparência
acidental. Assim chamam atenção não adequadamente: atraem ou prometem mais de que são
capazes de cumprir ou causam repulsão exagerada, medo e tentativo de fugir sem razão justificada.
- Do lado interno, o homem ou a pessoa percebe e conhece as coisas ou reflete sobre o que já tinha
conhecido antes. O processo do conhecimento do homem (a abstração) passa pelas diversas
faculdades cognitivas e recebe apoio pelas faculdades apetitivas. Este processo está baseado na
presença clara do objeto de modo que não há motivo de questionar a realidade daquilo que
conhecemos.
Mas há situações, onde nós não dedicamos a devida atenção ao conhecimento, ou deixamo-nos
influenciar por lembranças passadas e assim, o resultado do nosso conhecimento pode, por um
momento, apresentar à vontade o “objeto” para a escolha não com toda a fidelidade e por isso, se
pode dizer, em certo sentido, que seduzimos e enganamos a nós mesmos em optar algo que no
fundo nem queremos. Normalmente, tais erros se corrige rápida e facilmente na vida cotidiana.
Tais erros fazem parte da nossa vida humana (errare humanum est) e mais ainda quando
consideramos nossa caminhada como de peregrinação para uma meta sublime como é a do céu.
Mas pode acontecer também que o homem
- não quer renunciar coisas de “valor inferior” mesmo que eles se tornam obstáculo no alcance de
valores superiores.
- Pode ser que duvida no alcance de bens no futuro e por isso, se agarra nos bens presentes;
- pode ser que não quer renunciar prazeres sensitivos em favor de alegrias espirituais e por isso, se
fixa em bens inferiores mais que eles merecem e que faz bem para ele.93
Todas essas variações na vida cotidiana constituem o “combate espiritual” que é comum a todos,
e por isso, nada de extraordinário. Seja o combate seja as quedas em pecados são comuns com
todos os homens e representam nada sensacional e especial na vida e história humana.94
Alguns defeitos todos nós temos.
Aí precisa apenas um pouco de humildade ou humilhação95, isto para um doente que precisa ir ao
médico, e assim para um fiel para se aproximar ao confessionário.
Foi o próprio Freud, que disse a uma paciente com acento irlandês:
A Senhora é católica? – Sim – Então não deveria vir cá, mas procurar o confessionário!
Imaginamos, num livro de psicologia se pode ler o seguinte:
93 Ainda existe em geral a ideia que o “Psicólogo” e a “Psicologia” tratam de doentes, são ramos da medicina. Mas
se deve anotar que em muitos livros de temas psicológicos se trata hoje simplesmente de “regras de comportamento”
ou se oferece indicações pedagógicos e orientações para a educação, como a proposta de Maslow com sua “Hierarquia
de necessidades” ou como Francisco Insa que dedica só uma de 4 partes do seu livro sobre a “formação” a
“transtornos” ou “afetividade enferma”, 60 das 440 páginas (ibid. por ex. “Um estilo formativo sadio”, 419-440). Isto
se pode explicar, de um lado, como consequência da perda do cristianismo, segundo a observação de V. Frankl que
percebeu que que parte das pessoas que hoje buscam um psiquiatra teriam procurado um pastor, sacerdote ou rabino
em épocas anteriores” (Cf. V. FRANKL. Em busca de sentido. 47. ed. Petrópolis: Ed. Vozes, 2019, p. 140). Mas se
pode também entender segundo Echavarría, que a Psicologia neste sentido ou com tal função deveria ser antes
considerada como parte da ética e pedagogia: pois psicologia com esta temática “é mais próxima à pedagogia” e à
ética que a medicina; E. referiu a seguinte palavra de “Santo Tomás: ‘A filosofia [moral] se refere à cura da alma,
como a medicina à cura do corpo’ (In II Ethic., l. 4)” (cf. Echavarría, A Práxis da Psicologia, p. 614 e 616; cf. 613-
629).
94 Neste sentido, Lütz marca que os que são realmente psicologicamente doentes são uma grande minoria; mas quem
de fato são os doentes é a enorme quantia dos “normais” (cf. LÜTZ, p. XVIII).
95 “A humildade... sem ela ‘é impossível de se libertar do mal’ (Doroteu de Gaza)” (CAMPOE, p. 87; cf. 66, 72s).
Psicologia e vida espiritual - 2022, 114
“Professor F. Raymond e P. Janet dizem: ‘Confessar-se regularmente parece ser introduzido por
um médico genial de doentes mentais para curar pessoas que sofrem imaginações torturadoras.’
Mas por que só dessas pessoas...?”96
De fato, quando se pensa nas diversas dimensões do sacramento da Confissão, da possibilidade de
poder falar sem medo devido do sigilo da confissão, de ser ouvido e receber conselhos e orientação,
e isto na presença de Deus que, mais vezes que se pensa, inspira o confessor e, acima de tudo,
Deus mesmo perdoa os erros mais vergonhosos; e ainda, pode se repetir tal encontro tantas vezes
quantas vezes necessita.
96 Fr. V. RAYMOND. Der Freund der Nervösen und Skrupulanten - O amigo de nervosos e escrupulosos.
Wiesbaden, 1911, p. 36-37.
97 INSA, p. 359; cf. Ibid., p. 383; esta orientação faz lembrar do pastor Jay E. Adams que conta: os pastores foram
alertados com insistência pela Mental Health Association, de não aconselhar ninguém pastoralmente cuja dificuldades
ultrapassaram a medida de uma “rachadura psíquica”, como ele chama (ADAMS, p. X). No sentido de Adams, se
pode tomar esta observação, junto com as vantagens psicológicas que acabamos de listar, como motivo de entender a
“Confissão regular”, recomendada pela Igreja (Cat 1459), como confissão de duas em duas semanas. Dobbelstein
recomenda de não tirar semelhante conclusão tão rapidamente; ele fala “de meses ou até anos” (cf. DOBBELSTEIN,
p. 16). – Num lugar, e seja talvez aqui, gostaria fazer a pergunta: Faz sentido de levar uma criança com suponhamos
4 aninhos ao psicólogo? Conheço uma pessoa que com 4 anos insistiu de poder confessar-se com o padre, logo uma
criança nessa idade já tem tanto uso de razão que sabe distinguir entre reto e falso; mas será que já tem as condições
de seguir ou raciocinar com um psicólogo? – Não seria mais propício que, se já parece bom de consultar um psicólogo
que este fale com os pais sobre a educação que dão ao seu filho? (cf. com grande esforço, Michael Winterhoff olha
além da miséria da juventude aos seus pais com três perturbações dos seus relacionamentos; Tyrannen müssen nicht
sein: Warum Erziehung allein nicht reicht – Auswege. 4. ed. Gütersloh: Gütersloher Verlagshaus, 2009 = Não precisa
ter tiranos).
Psicologia e vida espiritual - 2022, 115
vícios. Falar de vícios é nada novo no ambiente cristão, pois desde sempre se interessa do
homem e o homem como pecador que luta para a santidade.98
Vícios se pode entender assim:
Vícios são consequências de opções e ações muitas vezes repetidas que formam um
hábito, e este toma tanta influência à vontade espiritual que esta é quase anestesiada e
paralisada diante do impulso da parte da vida vegetativa ou sensitiva e torna a pessoa
como uma escrava dos impulsos carnais, instigados, da sua parte, por circunstâncias
exteriores (como por exemplo o cheiro de álcool ou a pornografia).99
Aqui é talvez a ocasião melhor de referir a esta página na Carta de São Paulo aos Romanos que já
apresentamos, mas não conseguimos tratar no último encontro nosso.
São Paulo fala no 7º capítulo sobre a guerra interior ou sobre o conflito entre
- o homem espiritual com o olhar a seu último fim, a Deus, e
- a lei da carne que lhe puxa para o erro, a deformação, desordem e destruição.100
Então a que São Paulo se refere é a atenção exagerada ao objeto de uma ou outra faculdade da
alma, de modo que tal exagero exige das outras de dobrar-se diante dela e assim causa
desarmonia na vida interior do homem (que fez S. Paulo uma vez dizer: seu deus e o ventre, Fil
3,19).
14 Sabemos que a Lei é espiritual; eu, porém, sou carnal, vendido ao pecado como escravo.
15 De fato, não entendo o que faço, pois não faço o que quero, mas o que detesto.
16 Ora, se faço o que não quero, estou concordando que a Lei é boa.
17 No caso, já não sou eu que estou agindo, mas sim o pecado que habita em mim.
18 De fato, estou ciente de que o bem não habita em mim, isto é, na minha carne.
Pois querer o bem está ao meu alcance, não, porém, realizá-lo.
19 Não faço o bem que quero, mas faço o mal que não quero. ...
21 Portanto, descubro em mim esta lei: quando quero fazer o bem, é o mal que se me
apresenta.
22 Como homem interior, ponho toda a minha satisfação na Lei de Deus;
23 Mas sinto em meus membros outra lei, que luta contra a lei de minha mente e me aprisiona na
lei
98 O problema é tão velho como o pecado, e a preocupação de “cura” ou melhoramento igualmente; cf. os livros
sapienciais antes de Cristo e a rica tradição na Igreja primitiva no esforço espiritual dos Padres no deserto como mostra
o trabalho de Reginaldo Alves CAMPOE que já indicamos. Também vale pensar sobre a imensa diferença entre os
conselhos nos livros do Antigo Testamento e dos que os filósofos daquele tempo podiam dar. Será que não devemos
pensar num paralelo entre o cristianismo e a psicologia como filha das filosofias ateistas de hoje?
99 Cf. ST, p. I-II, q. 71, aa. 1-3. No extenso tratado dos pecados em geral e em particular (ibid., qq. 71-89) se pode
ver o problema da nomeação e das definições: o que se entende por pecado, por hábito pecaminoso, por pecado grave
e venial, e mais ainda o fenômeno que “filosofias” (e psicologias que se baseiam em tais filosofias) que não aceitam
um rumo transcendente do homem (ou tal apenas de nome e por motivos terapêuticos) não tem ponto fixo de referência
e por isso não tem fundamento para falar de “pecado” ou “vicio”. Eles, no lugar de tal terminologia da visão cristã e
tradicional, inventam sua própria linguagem e, ainda mais, cada corrente a sua. Diz Insa sobre as “principais
classificações de enfermidades ... que não tem uma definição clara nem um nome unanimemente aceito” (INSA, p.
361). Assim se pode já ler que “o termo neurose está atualmente em desuso” (INSA, p. 356; ou p. 360, 361 etc.), e o
que nós chamamos desordem em distinção da ordem estabelecida por Deus se chama em ambientes moralmente
neutros “transtorno” no sentido de não-comum ou não-costume-da-maioria, considerando ela como norma (cf. INSA,
p. 355-385: “transtornos afetivos”, ibid., 387-416: “transtornos de personalidade”; o que é “pecado” é talvez ainda
uma “doença”, etc. Assim por ex. se pode perguntar na citação de Insa da nota 22, pela diferença entre “patologia” e
“enfermidade”). Campoe diz: “Hoje mesmo há variações notáveis entre as escolas e os países quanto à maneira de
classificar e definir as doenças mentais” (CAMPOE, p. 8; cf. DOBBELSTEIN, p. 8, nota 2).
100 É o trauma do qual a psicanálise fala sem, porém, conhecer uma saída, sem conseguir dar uma luz ou – segundo
o tentativo de Frankl – dar um sentido; mas nem Frankl consegue dar uma luz porque reconhece que precisa um
sentido para a vida, mas quer deixar cada pessoa com sua absoluta liberdade e não lhe prescrever nada. Para ele, a
consciência de cada um é a única e absoluta norma: “Com certeza: Tudo isto [gerar filhos, plantar árvores, escrever
livros] são valores, valores reais; mas eles são relativos – ao contrário, absoluto pode ser apenas uma coisa, e isto é
o mandato de nossa consciência” (V. FRANKL. Psychotherapie für den Laien - Psicoterapia para os leigos. 7. ed.
Freiburg: Herder, 1978, “Higiene psíquica do amadurecimento”, pp. 58-61, p. 60s.).
Psicologia e vida espiritual - 2022, 116
Já antes, no início dessa carta, São Paulo se refere a todos os homens, judeus e não-judeus, que
justifica ainda mais de levar em conta suas reflexões. Escreveu:
“Quando os pagãos, embora não tenham a Lei, cumprem o que a Lei prescreve, guiados pelo bom
senso natural, esses que não têm a Lei tornam-se Lei para si mesmos.
Por sua maneira de proceder, mostram que a Lei está inscrita em seus corações:
disso dão testemunho igualmente sua consciência e os juízos éticos de acusação ou de defesa que
fazem uns aos outros. É o que se verá no dia em que Deus vai julgar, segundo meu evangelho, por
Cristo Jesus, as intenções e ações ocultas das pessoas.” (Rom 2,14-16)
Também quero evitar entrar neste mundo porque, estudando ou lendo sobre tantas exposições da
psicologia humana que me sinto como na mata virginal que me serve só para ser perdido.
Pois o fundamento anterior a todas estas reflexões é sempre a compreensão do homem, que
tratamos no início desta colocação – questão filosófico-teológica que conduz além do horizonte
empírico.
Mesmo que não sou capaz e autorizado de entrar na discussão das doenças psíquicas, mas
também não posso fugir dos problemas da vida tendo uma co-responsabilidade pela salvação dos
homens como religioso, sacerdote e co-irmão do próximo.
Mais ainda que temos o dever de considerar os problemas, pelo dom da revelação divina, na
verdadeira perspectiva.
Assim, me seja permitido de apontar apenas a dois problemas que – num mundo a-religioso, me
parece, raramente se considera como problema porque serve para substituir Deus pelo nosso
“eu”, que é a nova divindade aceitada, por muitos, silenciosamente ou até inconscientemente.
- Já se levantam vozes que indicam a desastrosa consequência do feminismo na depreciação do
homem e de uma sociedade sem pai.102 Uma das contribuições de Santo Tomás é esta: “é
manifesto, que para a criação dos filhos, na espécie humana, não bastam só os cuidados da mãe,
que os amamenta; mas muito mais, os do pai que deve educa–los (instruendus), defendê–los e
dotá–los (promovendus) de bens tanto internos como externos.”103
- Ou qual corrente de psicologia aponta a destruição psicológica da mulher pela esterilização
cedo na vida, quando ela de repente é “transportada” – emocionalmente – da idade de 20 a 50
101 “Não me agradou, que como Cristão e pastor deveria chamar ‘doença’ o que parece ser pecado.” (ADAMS, IX).
102 Não podemos fugir dos problemas da vida, mas considerar da verdadeira perspectiva. Já se levantam vozes que
indicam a desastrosa consequência do feminismo na depreciação do homem e de uma sociedade sem pai.
103 ST, p. II-II, q. 154, a. 2 c. Um fenômeno recente é que mulheres na idade dos 50 sintam tanto falta de filhos que
procuram dar luz, e agora segundo as circunstâncias, pelo caminho torto da fertilização in vitro. Será que não se podia
esperar que hoje os psicólogos que cuidam delas (já que não se quer escutar a Igreja e os padres); que os psicólogos
levantam a voz para proteger a saúde mental das mulheres hoje e apontam ao dano psicológico dos métodos
preservativos? Já faz anos que ouvi: Na medida em que a mulher sai da Igreja, ela entra no consultório do psicólogo.
Ou consta nos EUA que – agora – 70 % das mulheres preferem ficar em casa, enquanto na Alemanha (sempre uns 20
anos atrás dos EUA) querem 70 % trabalhar fora da casa.
Psicologia e vida espiritual - 2022, 117
Para falar um pouco de casos especiais relato apenas três casos que me foram apresentados com
pedido de dar umas orientações.
Paciente diagnosticado com Transtorno Obsessivo Compulsivo (TOC), tem atos e
pensamentos muito semelhantes aos escrúpulos, mas é acometido por premonições,
conhecimento de lugares nunca visitados e é acometido de amnésia após ter tais
eventos.
Paciente relata arroubos, como se "saísse do corpo", aparentemente poderia ser alguma
forma de psicose. Há outros fenomênos: Doenças físicas, após período intenso de oração
que desaparecem quando cessa de rezar, toques físicos quando reza, pesadelos,
pensamentos ordenando fazer coisas más e outros.
Mas gostaria juntar no fim, como um apêndice uma lista de fenômenos para que nós tomemos
consciência na espiritualidade, ou seja, como discernimento das causas. Acho, um psicólogo
cristão deveria ter conhecimento e consciência quando está escutando um paciente destes, pois a
causa do problema ou fenômeno podia vir do lado espiritual. Também, estes exemplos mostram
que se pode provavelmente dizer o mesmo que um exorcista disse: 95 % que vem a mim, não são
para mim (isto é, são sem possessão) e aqui, sem real problema psicológico.
Só gostaria sugerir pensar numa pergunta que fica sempre no “ar” e pouco resolvida. Falando de
Psicologia, surge em certa forma sempre a pergunta:
104 Esta observação oferece a oportunidade de apontar a conscientizar-se de um fenômeno surpreendente: Temos
publicações que tratam da diferença psicológica entre homem e mulher; porém, na grande maioria dos estudos comuns
de psicologia não se dá atenção a este fato tão imediato, constante e universal que o homem-varão é diferente da
mulher em toda a existência e vivência e na psicologia não se leva ela em consideração, não se faz esta distinção! E
este fato não é apenas de agora no clima da ideologia do gênero, onde torna-se talvez perigoso de tratar dessa verdade,
mas de sempre. (Uns exemplos positivos: John FITZSIMONS. Woman today. London and New York: Sheed and
Ward, 1952 – os seus temas são: O dilema moderno; feminismo; a base da feminidade; sobre sexo e matrimônio;
inteligência e emoções da mulher; mulher e amor, trabalho e educação; a solteira e “para uma teologia da mulher”);
ou Christa MEVES. Ich will mich ändern: Geschichte einer Genesung. Freiburg i.Br.: Herder 1981: Uma psicóloga
compôs Cartas de uma esposa ao marido para lhe explicar o que passa numa mulher na vida cotidiana com ele. Já
referimos ao livro de Allan & Barbara Pears (nota 3), no qual, porém, não se sabe bem se a constituição do cérebro
causa a diferença de homem e mulher ou, partindo das diferenças se procura uma justificação no cérebro (problema
grave da causalidade, que é primeiro e o que o segundo!, espírito ou matéria).
105 Gerard van den Aardweg. A Batalha pela Normalidade sexual e homossexualismo. 5. ed. Aparecida-SP: Ed.
Santuário, 2010.
Psicologia e vida espiritual - 2022, 118
106 Echavarría trata dessa pregunta, na sua “Práxis da Psicologia”, no 4º capítulo, “As ‘Enfermidades da alma’” (p.
407-609), depois da “Normalidade e Virtude” (p. 269-404, o 3º capítulo): “Os diferentes sentidos de ‘enfermidade da
alma’ – 1. Enfermidades da alma per accidens. A. Enfermidade da alma e enfermidade corporal” (p. 407ss.) ... “2. As
‘enfermidades’ próprias da alma” (p. 418ss.) e “3. Enfermidade mental e pecado” (p. 446ss.). Assim a proposta de
Echavarría é de ver e identificar “enfermidades da alma” e uma “personalidade viciosa” (405-609). Na base do
hilemorfismo ou do homem como união de alma e corpo, começa por distinguir três causas de doenças: causas físicas
ou orgânicas que afetam a alma só acidentalmente e talvez no comportamento (p. 407-413); causas preternaturais,
ou seja, pelas diversas possibilidades de influências diabólicas (p. 414-417); e causas espirituais humanas por
“desordens” na “atividade das potências cognitivas e apetitivas”, “transtornos que poderiam ser chamados do caráter
ou da personalidade” (p. 418). Porque como as “faculdades (...) são como forma de órgãos corporais” (p. 423; cf. p.
449), elas podem “ter manifestações patológicas também no nível corporal”, que “podem, por analogia, ser chamadas
‘enfermidades da alma’.” (p. 418). “Insânia (da alma) quer dizer corrupção da saúde” sucede “quando alguém perde
o uso da razão ... ou o afeto humano” (p. 425). “A experiência mostra que os vícios patológicos são muitas vezes
voluntários em si mesmos ou em sua causa.” (ibid.; cf. 432, 477, 490, 643 ...)
Vícios, “hábitos operativos maus” (p. 419), são chamados “as vezes, por Santo Tomás ‘enfermidade da alma’” (p.
429). Enquanto “muitas vezes as terminologias pertencentes a diferentes escolas misturam-se” (p. 442), Tomás
distingue vícios “por debilidades (infirmitates)” que é “outro nome para as enfermidades (aegritudines)” e vícios
incuráveis de uma pessoa “que peca por malícia” (p. 429; 429-436). Quando Echavarría deixa claro que “a ‘norma’
não pode ser senão a natureza humana” (p. 444) e, ainda na visão cristã, chama os comportamentos desordenados
“pecado” (435, cf. 446-464), se revela que o problema de muitas correntes psicológicas hodiernas não é apenas a
escolha de uma linha filosófica como a de Hegel ou Nietzsche (p. 455-463), mas uma opção religiosa, uma “espécie
de religião pessoal egocêntrica” (Vitz; p. 100; cf. p. 489), na qual “Deus sou eu” (Fromm; p. 394); “no próprio Freud
aparece essa ideia do pecado como ontologicamente necessário” (p. 460); e Jung ensina que a “autêntica ‘cura’ ...
consistiria em colocar-se ‘além do bem e do mal’, através da aceitação do mal ontológico” (p. 460). Então, é “o tema
do pecado original ... (que) está no núcleo de toda a atividade psicológica contemporânea (Andereggen)” (p. 463).
“Para Santo Tomás, se pode ‘reprimir’ o caráter criatural, ... uma relação com Deus” (p. 540), o que acontece no
pecado e comportamento contra a natureza dada (cf. p. 489).
Psicologia e vida espiritual - 2022, 119
Aí se começa com o exame do organismo físico corporal como a parte mais “acessível”, e se
reage a doença com remédios ou se trata a situação pela influência de remédios farmacêuticos.
Tendo o comportamento da pessoa sob controle, recebe “alta” do hospital e pode voltar a família,
mas deve tomar “remédios para toda a vida”, controlando apenas a disposição corporal pelos
remédios. Com isto o problema não está resolvido, mas apenas controlado.
Na base das teorias de psicologia sem levar em consideração o aspecto religioso não pode ser
diferente: não se pode exigir de alguém uma solução de um problema do homem quando não
conhece nada sobre sua origem e a finalidade da vida desse ente que encontra diante de si (com
vai saber que um prego é para bater numa madeira se não sabe o que é madeira nem martelo, e
no fim, também não o que é um prego e para que serve).
Mas pode ser que se alcança pelos remédios um estado espiritualmente calmo da pessoa. Então,
este permite de tratar o problema no nível da alma. Se examina as causas e, na medida do
possível e o paciente permite e acompanha, conduz (ou reconduz) ele à conformidade com a
vontade de Deus. E aí daria esperar uma solução definitiva do problema.
Olhando a situação de hoje..., será que se pode levantar então a pergunta sobre as “clínicas
psiquiatras”: O que são se as pessoas não encontram cura, mas são “apenas” conduzidas ao um
estado que lhes permite conviver com outras pessoas? Que pode esperar de um psicólogo além
de escutar pacientemente e fazer perguntas se não conhece ou não quer fazer conhecer ao
paciente uma meta para convidar ou conduzir?
Será que elas são o que os presídios são, apenas substituindo os policiais armados por médicos
com remédios e seringas?
O próximo passo neste processo do “veneno latente com efeito em toda a sociedade”107 (dos (1)
presídios as (2) clínicas psiquiatras) seriam – e já temos - (3) clínicas de suicídio assistido com
“um pequeno Cocktail, escolhido por si mesmo”108 ou de eutanásia mesmo. Por que será isto o
futuro? Porque a vida do homem e o homem mesmo não tem valor fora do contexto religioso,
sem Deus.
E “evangelho – a boa nova” dos mais variados psicólogos não muda nada nisto: Pois só há estes
dois caminhos, ou Deus ou eu; ou submissão obediente ao Criador ou a autoafirmação, mas logo
vem a confrontação: autoafirmação para que? E qual seria a resposta que dá sentido a vida, a
vida em todos os seus altos e baixos que se conhece?
O bem-estar da humanidade nos últimos quase 80 anos pode facilmente enganar sobre o valor
(ou desvalor) das múltiplas respostas teóricas enquanto ainda não passaram pelo teste do
sofrimento, das situações extremas e de crise, cristãmente falando, do “Teste da Cruz” que é a
base de toda a vivência (cf. a “Loucura da cruz” na “lógica” das Bem-aventuranças109).
Além disso seja citado ainda Campoe com a contribuição dos Padres que aponta a uma triple
divisão que a Igreja hoje bem observa:
Para os Padres, uma primeira categoria de doenças mentais ou de formas de loucura tem [1]
uma etiologia [= causa] somática, e [2] uma segunda etiologia a etiologia demoníaca, [3] uma
terceira categoria tem uma origem espiritual. Ao passo que a primeira categoria tem uma causa
natural (decaída) e a segunda os demônios, a terceira categoria revela o livre arbítrio do
homem.
107 LÜTZ, p. 9.
108 Ibid.
109 Mt 5,3-11; Lc 14, 27; Fil 3,17-21; Cat 1716-1724.
Psicologia e vida espiritual - 2022, 120
As doenças mentais que têm uma origem espiritual não devem portanto ser confundidas com
as próprias doenças espirituais.
As doenças espirituais são constituídas por uma desordem ou uma perversão da natureza (mais
precisamente de seu modo de existência) na relação pessoal do homem a Deus.
- As doenças mentais correspondem no plano psíquico às desordens análogas àqueles que
constituem sobre o plano do corpo as doenças somáticas; trata-se de perturbações do psiquismo
considerado em si mesmo, de uma disfunção de sua natureza considerada segundo sua ordem
natural. (CAMPOE, p. 7.)
Então vamos voltar a visão cristã como base e cume de toda a vida e de qualquer problema da
vida humana, e vamos ver o que se encontra nela em respostas para os problemas do homem.
Podemos ser conscientes que “segundo numerosos estudos, as crenças e a prática religiosa são
fatores que protegem, ao menos moderadamente, da depressão e do suicídio e melhoram a
capacidade de enfrentar as adversidades” (INSA, 378s.).
Me permitem indicar no trato de pessoas doentes ou com problemas os seguintes passos (mas
não quero ensinar “o Painosso ao pároco” !!!):
- dispor para a comunicação
- escutar com dedicação e grande circunspeção
- procurar a(s) causa(s) – o exemplo de “depressão”
- orientar
Nós, ao menos, devemos ser bem convencidos que a saúde psicológica do homem está baseada
- na aceitação de ser uma criatura dependente de Deus e
- que Deus tem o direito absoluto sobre cada homem, e o homem deve permitir a Deus de agir
sobre si, em todas as maneiras (só não contraditórias aos seus próprios mandamentos).
Assim, Deus pode agir sobre cada um - por pessoas ordinárias ao meu lado,
- pela natureza cósmica em que me encontro e
- por eventos ou acontecimentos como
- por representantes ordinários dele.
Esta atenção e observação, mesmo ao olhar, à posição do corpo, aos movimentos das mãos, a
acentuação as palavras etc... deve-se relacionar com o que a pessoa quer falar ou o que destas
formas indiretas revela o seu coração.110 Estenda-se o “radar” para – com a ajuda de Deus –
captar tudo o que pode ter acontecido à pessoa e levou ao estado em que se encontra no
momento, isto é, para descobrir o nó do problema.111
(4) Orientar
Na orientação também se pode distinguir dois passos:
- a) é bom de deixar o paciente descobrir (com nossa ajuda) os tantos amores que ele já recebeu
na sua vida, mas a que não dá atenção ou simplesmente nunca considerou como tal, por isso é
cego pelo bem na sua vida e descontente com o que atualmente passa.
- b) A descoberta dos bens já recebidos no passado, permite abri-lo os olhos pelas ofertas que
estão diante de si e que Deus, já por muito tempo preparou e espera poder dar agora. Devemos
ajudar de ver sua vida com muita esperança, criar expectativas fundadas – e se não for nesta vida
terrestre, antão na vida que vem e que Jesus prometeu que nos espera.113
Aqui entra a importância da convicção cristã de um psicólogo. Para ele deve existir clara
obrigação de indicar o “Caminho à verdadeira Vida” e oferecer a ajuda para poder andar nele.
110 Um juiz, se encontrando numa situação semelhante, mesmo por outro motivo, contou que se comunica com
palavras por 11 %, e por gestos e reações etc. por 89 %.
111 Posso por exemplo perguntar, o que significa se um fala “é bela” e “sabe tudo”? Primeiro já vale observar que a
primeira observação se refere muito provavelmente a uma mulher e a segundo a um homem (cf. a observação que
fizemos na nota 28); uma segunda observação é, que a frase não é completa e se pode completar em duas maneiras:
pode ser dito “você é bela” e “você sabe tudo”, e assim ser dirigida a pessoa diretamente; e pode ser completada em
tal maneira que será dita a uma terceira pessoa, “ela é bela” e “ele “sabe tudo”. E com esta diferença a frase recebe
um valor bem, e muito diferente, na forma direta é questionável porque foi dita, e não pode tomar a séria; no segundo
caso parece ser já objetivo e veraz.
112 Cf. T. KIENINGER. O Respeito Humano: A Morte de Toda a Religião. (Manuscrito), 2021.
113 cf. Jo 14,2-3; BENTO XVI. Spe salvi – Sobre a esperança cristã. 2007, 41-48.
Psicologia e vida espiritual - 2022, 122
Pode começar com o testemunho de que Deus tem um plano de amor para com cada pessoa
humana. - Qual importância se deve dar a mensagem da Divina Misericórdia para o tempo de
hoje!
E aí segue a “Catequese” básica sobre o sentido e o fim último da vida como sobre a cruz no
caminho e a porta estreita que é a morte...
Aqui agora, na medida do possível – se pode mostrar esta maravilhosa perspectiva:
Pela entrega ao Deus Onipotente (e união com Ele) e à sua onipotência
essa torna-se nossa!
E assim, com ela temos a solução universal, para mim e os outros,
para o que aconteceu no passado (o que seria por ex. a perdoar)
e o que ainda pode acontecer no futuro (esperança e abandono em Deus)!
Esta verdade, tão saudável, precisa ilustração para convencer quem ainda não vê isto. Para isto
podem servir o exemplo de muitos Santos, que se dedicaram ao amor à custa da renúncia do
próprio bem como o exemplo de São Paulo (referindo a um exemplo bíblico).
São Paulo explica seu caminho e sua vida: “Minha vida atual na carne, eu a vivo na fé, crendo no
Filho de Deus, que me amou e se entregou por mim.” (Gal 2,20)
E esta fé é tão claro e firme que São Paulo podia escrever: “Quem nos separará do amor de
Cristo? Tribulação, angústia, perseguição, fome, nudez, perigo, espada? Pois está escrito: ‘Por
tua causa somos entregues à morte, o dia todo; fomos tidos como ovelhas destinadas ao
matadouro’.” (Rom 8,35-36) “Por causa dele, perdi tudo e considero tudo como lixo, a fim de
ganhar Cristo.” (Fil 3,8) “Para mim, de fato, o viver é Cristo e o morrer, lucro.” (Fil 1,21)
Só nesta visão, percebendo que é tanto amado por Deus pode agora vencer o que antes lhe custou
muito. Agora consegue perdoar, agora nem percebe uma ofensa, agora lhe custa nada de ser
ridicularizado por outros ou seu nome mal usado... O AMOR o CUROU (cf. GOYA, 216s.).
E depois, para a resolução prática, pode ser necessário, e certamente sempre muitíssimo útil, o
“desligamento do passado” que seria pela ação do próprio Deus numa boa confissão sacramental
(e essa conversa é uma ótima oportunidade de preparar para esse sacramento, que os exorcistas
chamam “o melhor exorcismo”).
Pode ser bom ou necessário de dar ainda concretas orientações pelo tempo para evitar “ocasiões
de pecado” e aprender andar com (própria) firmeza. Isto pode significar uma certa mudança de
vida, do ambiente (para ganhar mais liberdade emocional), um “deserto” apropriado para a
pessoa... (disciplina corporal, prática da fé, o cultivo do espírito e da prática de oração e um
aprofundamento na nova visão, no conhecimento das promessas de Deus pela meditação para
permanecer aberto para a graça e ação de Deus).
Seria, no fim, ainda permitido de perguntar: É exigido demais para uma pessoa ordinária?
Jesus não pensou assim. Ele não deixou faltar clareza quando disse: “Quem se apega à sua vida,
perde-a; mas quem não faz conta de sua vida neste mundo, há de guardá-la para a vida eterna.”
(Jo 12,25). “O que para o mundo é loucura, Deus o escolheu para envergonhar os sábios” (1 Cor
1,27).
E mais uma vez S. Paulo: “É assim que eu conheço Cristo, a força da sua Ressurreição e a
comunhão com os seus sofrimentos, tornando-me semelhante a ele na sua morte, para ver se
chego até a Ressurreição dentre os mortos.” (Fil 3,10-11)
Se for demais, vem a pergunta: “Onde estava nas Missas em que se celebra a Morte e
Ressurreição de Jesus? E o que pensou, quando aclamou com todos: “Anunciamos, Senhor, a
Vossa Morte, e proclamamos a Vossa ressurreição – Vinde, Senhor JESUS!”
“Pode um cego guiar outro cego? Não cairão os dois no buraco?” (Lc 6,39)
Sempre existe o perigo de crer que a grama no campo do vizinho é melhor e se faz muito esforço
para apanhar mais um pouco. Esta é a tentação muito espalhado hoje na procura da verdade ou,
como aqui, no campo da psicologia.
Que uma vaca é cega e não vê a fartura no seu próprio campo é perdoável. Mas que um cristão
acredita de encontrar fora do cristianismo alimento melhor e luz mais clara de que dentro, é
difícil de perdoar. Só pode ser que se deixa levar pela curiosidade, ou por vergonha do vizinho
etc. – estes são erros que tentamos de ver, mas também, uma vez reconhecidos, procurar superar.
DEUS é MAIOR que tudo e todos, e a Ele devemos conduzir cada pessoa que vem ao nosso
encontro. Isto é - uma questão de gratidão para com Deus, e
- uma questão de justiça para com o outro que tem o mesmo direito de receber
a luz e riqueza do amor de Deus como nos, e é
- uma questão de obrigação nossa para com Deus que deu até sua vida por
nos e todos.
Echavarría escreveu “que ninguém pode avançar sozinho” (p. 618), mas necessita de um guia,
“pode ser um... sacerdote, um médico, um mestre, um trabalhador social”, p. 619). “Santo Tomás
e toda a tradição teológica conheciam de algum modo a intervenção psicoterapêutica, sob várias
formas e métodos. Mas esta chamava-se correção fraterna gratuita, chamava-se prudência no
operar..., ensinar” (p. 618s.). Entre as exigências e necessárias qualidades conta “uma autêntica
‘psicologia profunda cristã’, é aquela que vê no centro da transformação do homem a tripla ação
hierárquica da purificação, iluminação e união, que tem seu princípio divino nos mistérios da
vida de Cristo”114.
Conclui que “parece justo reconhecer uma autonomia profissional à psicologia,” mas
“reiteremos: SOMENTE UMA PESSOA PLENA PODE AJUDAR OUTRA MOVER-SE ATÉ
A PLENITUDE”.115
114 ECHAVARRÍA, p. 655; cf. 705-709; “Os Padres (Irineu, Atanásio de Alexandria...) quase unanimemente, e desde
os primeiros séculos, Lhe (Cristo) aplicarão de maneira corrente o nome de Médico, e ajuntando em seguida os
qualificativos de ‘grande’, ‘celeste’, ‘supremo’ precisando, segundo o contexto, ‘dos corpos’, das almas’, sublinhando
que é o homem inteiro que ele vem curar.” (CAMPOE, p. 3).
115 ECHAVARRÍA, p. 729 e 730; cf. para Psicologia e vida de graça: Luís ROCHA E MELO, Se tu soubesses o dom
de Deus, Braga, 22000, 176 e 215s. B. GOYA, Psicologia e vida consagrada, Paulus, Lisboa, 1999.
116 Se pode também pensar dessa maneira: A Teologia Moral trata no início muitas distinções sobre as condições
subjetivas e circunstâncias objetivas do ponto de partida do agir, e estas, em parte, deram origem a Teologia Pastoral
com a dupla função, examinar a situação (o ponto de partida do agir) e daí descobrir melhoramento dessas condições.
Semelhantemente se pode pensar que à Ética se acrescenta hoje a Psicologia que assume um papel semelhante à
Psicologia e vida espiritual - 2022, 124
Estas perguntas são importantes e levam a vários aspetos que trazem luz:
As correntes psicológicas hoje, como observamos na nota 53, tratam em muitos livros
simplesmente de “regras de comportamento” ou oferecem indicações pedagógicas e orientações
para a educação, como por exemplo a proposta de Maslow com sua “Hierarquia de
necessidades”. Mas isto não é coberto já pela ética, com aprendemos (nesta mesma nota 53) de
Santo Tomás: “A filosofia [moral = ética] se refere à cura da alma, como a medicina à cura do
corpo” (In II Ethic., l. 4); ou talvez pensamos ainda na “pedagogia” como aplicação das regras
gerais da ética à vida concreta. Porém, também a Pedagogia sistemática ou como ciência, é
apenas um filho do neopaganismo da renascença, como dizemos antes (cf. em cima, p. 9).
Por que então uma disciplina extra?
Como a última intenção dos seus “genitores” é de ter um homem absolutamente livre, não se
considera a dimensão religiosa da vida humana, sua causa eficiente e causa final, ou ser criada
por Deus e para Deus. E sem esta dependência existencial ou criatural (cf. nota 66) o homem é
solto mesmo, sem orientação, e por isso, surgiram substituições da ética que interpretou sempre a
lei de Deus; e o mesmo se pode dizer da pedagogia.
Também se chega ao mesmo resultado quando procuramos a método que cada ciência possui
segundo seu objeto específico particular. Há vários, mas sempre dependendo primeiro da
definição do seu objeto, ou mais concretamente do que é a “psyché”, a alma. Como não tem
clara definição desta, assim também não se encontra um método próprio.
Que esta confrontação breve com a filosofia ajude enxergar melhor do que se trata na psicologia
e recebe orientação para o seu próprio campo.
Por enquanto vale que diremos em breve:
A psicologia se manifesta auxiliadora da pastoral para homens que exigem mais tempo devido de
bloqueios comportamentais. Nestes casos, dedicando mais tempo, a descoberta psicológica é
Teologia pastoral. Também examina a situação da pessoa – ponto de partida de sua vida e descobre melhoramentos
dessas condições; mas estes pressupõem e necessitam o conhecimento do ideal e rumo do homem, que é, para uma
psicologia que ajuda, uma sólida filosofia ou até teologia. - Neste sentido, a psicologia assume o caráter auxiliar (e
não independente) e sua função positiva de acolher a pessoa onde está e conduzi-la a Deus, sua meta, por meio da
Igreja e dos sacramentos, esp. a confissão. Como se deve dar hoje mais acento, valor, atenção à teologia pastoral e às
condições subjetivas das pessoas, assim também deve-se dar mais atenção às condições interiores do homem ou
socorrer ao trabalho analítico da psicologia em vista da evangelização do evangelho e da distribuição das graças
Divinas.
117
Cf. Echavarría. Psicologia e Psicoterapia cristã. (2018), p. 25-29.
118 Podemos pressupor saber o que é um “psiquiatra”? Num “Dicionário de Psicologia”, em 3 volumes, de mais que
5.000 títulos e 2611 colunas, de 300 autores de 22 nações, não se explica esta profissão, e “psiquiatria” é explicada
com esta única frase: ”Psiquiatria, o ramo da medicina, se ocupa com perturbações e doenças mentais.” (ARNOLD,
EYSENCK, MEILI. Lexikon der Psychologie. 3 vol. 7.ed. Freiburg i. Br.: Herder, (1971) 1991, col. 1710). A
Wikipédia informa: “Existem dezenas de abordagens e áreas de atuações distintas de psicoterapias. Diferentes
abordagens são mais eficientes com diferentes pacientes e problemas.”
119
Cf. M. CHEVARRÍA. “Personalidad y mal moral. La conexión de los vícios”, em: Espíritu LXIX (2020), n. 159,
p. 71-94.
Psicologia e vida espiritual - 2022, 125
como um guia à Igreja, aos sacerdotes e sacramentos e por este caminho a Deus pelo qual a
Igreja e cada padre é grato (em baixo, p. 131).
Com isto se vê a ligação dos diversos pontos e vista em relação a mesma pessoa humana. Mas
também se vê as diversas dimensões do homem, ser um “animal” dotado com “racionalidade”,
ser um ser social e uma pessoa religiosa. O homem é uma pessoa essencialmente perfeita, que,
porém, deve crescer física e espiritualmente, ajudado por fora, por outros e o ambiente, mas
também tomar suas próprias decisões. Alguns colocam nestas palavras: O homem é
potencialmente um anjo e um animal, um santo e um diabo. E cabe a cada um de se desenvolver,
crescer e amadurecer, ser atento a tudo que recebe no seu “caminho” e aproveitando cada hora e
oportunidade. Cada um constrói sua eternidade, uma vida em plena felicidade ou desesperado
sofrimento.
120
Lembramos da comparação de uma clínica psiquiatra com um presídio.(p. 37) ?
Psicologia e vida espiritual - 2022, 126
O exemplo de “depressão”
Um “médico” deve observar e escutar muito para descobrir a causa de uma doença e poder
indicar um caminho para superá-la. O seguinte quadro quer apenas indicar em que se podia ou
até deveria pensar se estamos diante de uma pessoa com depressão. Qual podia ser a causa:
Possíveis C A U S A S
VONTADE:
“Quero ou não quero?”
Tem um ideal, uma meta? Intercessão de outros (avós)
Preguiça
Quer seu conforto? Deus julga no fim segundo
Acédia nossa decisão (Mt 25:
Tem leitura questionável v.1ss: medíocre diante Dele;
(filosofias orientais; se entrega a Depressão v.31ss: não servir ao próximo
estas? Nada vale para fazer um
esforço) Não levanta, Deus pode tirar a consolação
Não fala, temporariamente para que nós
e-ducar (guiar fora de si: pela Se fecha no quarto podemos provar nosso amor e
atração de um bem; pela No quarto escuro interesse Nele;
abstenção (restrição) até ... ............
Pensamento em suicídio Deus quer compensar o esforço,
educação recebida na família (Dobbelstein, 26) o amor, que pode mostrar com o
(problema da geração anterior; esforço agora aqui;
pais psicologicamente não
maduros; nunca foi nada
exigido, nunca nada negado) Nutrição melhor /
mais variada
sociedade materialista com
- exigências demais aos quais o maus exemplos e
indivíduo não consegue mas companhias
corresponder (-> burnout), Instigação diabólica (hoje tão
- ou que expõe o homem tão fácil pelos questionáveis temperamento melancólico /
constantemente ao barulho que contatos nas mídias: fleumático?
sua energia se esgota sem - Você também tem direitos
perceber. de descanso!
- Não seja loucos! Vou morrer em todos os
sociedade ideologizada - Você não quer trabalhar e casos, por que não já?
(“Fiquem em casa” = mortos, fazer-se escravos de outros;
sem própria iniciativa... - Nada vale nada, não se
– “nós cuidamos de vos, esforça por nada;
mandamos comida, dinheiro”, - Não vale a pena
Mas vos sois mais nada ...” - ....
Prof. Jean Lauand fez um artigo sobre “O pecado capital da Acídia na Análise de Tomás de
Aquino”, comemorando 100 anos do nascimento de Josef Pieper que Lauand chama “meu
mestre” e “sem dúvida um dos mais destacados filósofos do século XX e tratou genialmente do
tema que nos ocupa” (cf. nota 26). Neste trabalho cita o Livro do desassossego de Fernando
Pessoa que “com incomparável lucidez... diagnostica em seus múltiplos aspectos esse tédio” e
Psicologia e vida espiritual - 2022, 127
“ressalta precisamente que o problema não está no trabalho nem no repouso, mas no centro do
eu: “.... estou cansado, não da obra ou do repouso, mas de mim”121. Que surpreende é que a
Igreja no Catecismo refere somente a esta causa:
Outra tentação, cuja porta é aberta pela presunção, é a acídia (chamada também "preguiça").
Os Padres espirituais entendem esta palavra como uma forma de depressão
devida ao relaxamento da ascese, à diminuição da vigilância, à negligência do coração.
"O espírito está pronto, mas a carne é fraca" (Mt 26,41).
Quanto mais alto se sobe, tanto maior a queda.
O desânimo doloroso é o inverso da presunção. Quem é humilde não se surpreende com sua
miséria. Passa então a ter mais confiança, a perseverar na constância. (Cat 2733)
Hoje há muitos estudos sobre este fenômeno que tornou-se a “doença do nosso tempo”. Ainda
deve-se considerar que cada doente tem sua história própria e sua causa particular. Mas a atenção
a acídia não é nova.
Campoe sistematizou as considerações dos padres no deserto e suas recomendações com o título
“A Terapêutica da Acédia”122
1- A virtude da paciência (Lc 21, 19)
2- A esperança (Sl 41, 6)
3- O arrependimento, o luto e a compulsão (Sl 6, 7)
4- Memória da morte (1 Cor 15, 31)
5- Medo de Deus (Clímaco: Nada é tão eficaz)
6- Trabalho manual (1 Ts 4,11)
7- A oração (Salmodia)
Echavarria elogiou o que Santo Tomás tratou sobre esse tema na Suma teológica, sobre a tristeza
(ST p. I-II, qq. 35-39, em 25 artigos!): a tristeza com suas várias causas, manifestações e efeitos,
a ânsia e preguiça, a inveja e angústia; Tomás dá especial atenção à acídia, “a quarta forma de
tristeza” (p. 520), a “enfermidade da cultura ocidental” (seg. Echavarría, p. 537; a depressão, p.
541-549). Echavarría trata esta parte do ponto de vista antropológico: o que se passa no homem
quando não age conforme a ordem objetiva dos valores? Quais são os motivos que o deixam
escolher metas secundárias como se fossem a primeira? É surpreendente como, à luz da
integridade da natureza do homem segundo Tomás e o Cristianismo, as distorções e os desvios
do “fim último” tornam-se evidentes. Echavarría explica: “todas as paixões são ‘hilemórficas’, e,
portanto, têm um aspecto orgânico” (p. 518). “Para explicar isso, Santo Tomás apresenta sua
interessante teoria das relações psicossomáticas: as manifestações corporais das paixões são
proporcionadas aos movimentos afetivos interiores” (p. 552). “Santo Tomás ... distingue essa
desordem de outras formas de tristeza ... soube reconduzir todos os sintomas e efeitos que os
Padres atribuíram à acídia ao seu princípio e à sua causa. De tal maneira, sem descuidar da
descrição deste mal, ele o tornou mais inteligível, a ponto de sua contribuição poder bem
considerar-se como perene.” (p. 541)
Esta base filosófica torna-se decisiva quando Santo Tomás trata dos “remédios contra a tristeza”
(ST p. I-II, q. 38). É belo de ler o que Lauand escreve a respeito: “O que Tomás, sim, afirma é o
homem total, com a intrínseca união espírito-matéria, pois a alma, para o Aquinate é forma,
ordenada para a intrínseca união com a matéria. ... em relação ao nosso tema, a tristeza, os
remédios para a tristeza, que reside na alma Tomás ... chega a recomendar banho e sono como
remédios contra a tristeza! Pois, diz o Aquinate, tudo aquilo que reconduz a natureza corporal a
seu devido estado, tudo aquilo que causa prazer é remédio contra a tristeza. Tomás destrói assim
a objeção ‘espiritualista’. “Sentir a devida disposição do corpo causa prazer e, portanto, mitiga a
tristeza.’ (I, 38, 5 ad 1). De resto, para os remédios contra a tristeza, Tomás não fala de Deus
nem de Satã, mas sim recomenda: qualquer tipo de prazer, a solidariedade dos amigos, a
contemplação da verdade, banho e sono.” (cf. ainda q. 32, a. 8 ad 2)
Lauand transcreveu então no seu artigo um breve trabalho de Pieper sobre “Psicose Maníaco-
Depressiva” existencial que hoje se chama “transtorno bipolar”.
Como sempre, Pieper analisou e pensou o que Santo Tomás disse sobre o tema, e resumindo aqui
as duas fontes, se explica esse fato simplesmente assim:
“A criatura é dúplice em sua estrutura fundamental: por um lado, participa do Ser (e da verdade,
da bondade, da beleza ...) de Deus; mas por outro lado, é treva, enquanto procede do nada.”
Então, a primeira dimensão causa alegria, a segunda tristeza.
Essa estrutura dúplice projeta-se num apelo contraditório ao homem... daí a ‘normalidade’ ... do
transtorno bipolar. A gravidade dessa ‘patológica’ normalidade ... passa, na verdade,
despercebida para a imensa maioria, que não se dá conta de nenhum dos dois pólos [sic!] do
transtorno, situando-se numa morna mediocridade ... a ‘tranquilidade’ do anestesiado, que só se
inquieta para reagir quando algo ameaça romper a segura redoma em que instalou seu pequeno
mundo.”
Então “o pólo positivo do transtorno bipolar ... é uma questão de saber ver” (quer dizer de
conscientizar que todas as coisas revelam ideias de Deus e nos permitem entender deus mehor e
crescer no agradecer, amar e lovó-lO).
E “o pólo negativo do transtorno bipolar” corresponde à bem-aventurança dos que choram .. pois
a criatura, enquanto procede do nada, de per si é treva.
Conclusão: ”Quanto mais scientia, maior a depressão: porque se constata quão deficientes são as
coisas do mundo.”
Pieper ainda cita a surpreende palavra de santo Tomás, comentando o evangelho quando os
Gerasenos mandaram Jesus embora: “a mediocridade não suporta a grandeza da sabedoria” (In
Mt 8,34).
Então, a depressão tem sua base no fundo da nossa existência, mas está dormindo enquanto não
somos confrontados com dificuldades. A reflexão, meditação sobre a dimensão espiritual da
realidade (a participação nos pensamentos de Deus) abriria a mente e daria acesso a alegria de
existir.
Do outro lado, torna-se mais compreensível porque a depressão é tão frequente hoje: a razão
mais profunda se encontra nas correntes filosóficas que negam a dimensão espiritual e tornaram-
se o fundamento de tantos sistemas psicológicas, especialmente a “filosofia do desespero
orgulhoso” como foi chamado o existencialismo (cf. em cima, p. 21).
Echavarría iniciou por isso com muita razão seu estudo sobre a “Práxis da Psicologia” pela
“Filosofia da História da Práxis da Psicologia” (p. 35-111), e nós entendemos, agora, espero, um
pouco mais a nossa pergunta principal: “Psicologia ou Filosofia e Teologia”.
Psicologia e vida espiritual - 2022, 129
Antes de terminar com esta indicação e forte recomendação de colaboração entre os psicólogos e
os padres, seja apresentado uma competente descrição da diferença entre Confissão e
psicoterapia, ou a meta do confessor e a do psicólogo que um padre e psicólogo, na boa base de
experiência formulou, mesmo que também confessou: “todos os grandes mestres da vida
espiritual foram, em todos os tempos, óptimos psicólogos”123; ou, como diz um outro autor,
“nos textos patrísticos, os Padres são correntemente chamados ‘médicos’.”124
123 Cf. TORELLÒ, p. 195-197 e 199; cf. p. 182-188 e 191-194; Sobre a Confissão, cf. em cima, p. 28, 31, 39.
124 CAMPOE, p. 3.
125 TORELLÒ, 182-184.
Psicologia e vida espiritual - 2022, 130
Vale sublinhar a importância para o homem de não precisar andar sozinho na sua vida, ou qual
dom é de ter alguém com que pode compartilhar sua vida toda, interior e exterior. Que isto não
precisa ser um psicólogo como vimos na tradição secular.
Esta observação é feita por todos os que tratam sobre o caminhar do homem.
Enquanto no início parecia que a Filosofia dispensará a Psicologia, vemos agora no fim, que toda
a vida é psicológica, a vida natural e sobrenatural, a vida humana se realiza sempre diante de
Deus e com Ele, pois é vida religiosa e com o fim eterno.
Quando se volta a relacionar o homem e sua vida com Deus, se fala de novo de “pecado”; então
muitas páginas ou até livros de psicologia pode-se suspender.
Por fim, a psicologia se manifesta auxiliadora da pastoral para homens que exigem mais tempo
devido de bloqueios comportamentais. Nestes casos, dedicando mais tempo, a descoberta
psicológica é como um guia à Igreja, aos sacerdotes e sacramentos e por este caminho a Deus
pelo qual a Igreja e cada padre é grato.127
Aqui também vale: É difícil ir sozinho, e ir juntos ou em dois se faz “milagres”. Assim seja.
Apêndice I:
Critérios de Discernimento128
1. intelectuais:
Verdade - não contra a revelação Falsidade - mentiroso, envolvido em outras
ver., engano
Gravidade / Sinceridade - não sobre coisas Curiosidade - interessar-se de coisas
inúteis, infrutuosas inúteis, perder tempo
Luz - leva à claridade e não ao escuro, Angústia, Inquietação, Agitação,
insegurança Perturbação, - tenebroso
Docilidade - capaz ser corrigido (obediência, Teimoso - obstinação
submissão)
Discrição - ser prudente, reto, equilibrado, Indiscrição, espirito agitado, falta de
edificante, com paz, sem precipitação e concentração no seu dever
exagero
Humildade - pensar baixo de si mesmo, poder Soberba e vaidade
calar, ficar com segredos
2. de vontade:
paz - nunca cria confusão humildade falsa
confiança em DEUS - nasce da humildade Desespero, falta de confiança, ou f . de
segurança - ou: Segurança vã e otimismo
irracional
Vontade dócil e prontidão, obediência Desobediência, Dureza de coração
Intenção reta - só a glória de DEUS, sua Impaciência no trabalho e nos sofrimentos
Vontade, sem interesse próprio
= paciente nos sofrimentos
Abnegação de si mesmo - mortificação com Paixões descontroladas e inclinação forte
paciência e equilíbrio p/ a sensualidade
Sinceridade, veracidade e simplicidade na Hipocrisia, Simulação, Engano
conduta
Liberdade de espírito - não ligado Apego às coisas terrestres
Ânsia de imitar CRISTO Falta de devoção a JESUS e MARIA
Amor desinteressado Fanatismo (farisaísmo estreito)
128 Cf. S. INÁCIO DE LOYOLA, Exercícios, nn.313-370. “Physical stigmatization is medically speaking not a
miracle.” (DOBBELSTEIN, p. 37s.)
Psicologia e vida espiritual - 2022, 132
A suscetibilidade não é uma doença mas antes uma fraqueza de vontade devido de uma falha na
educação (e pedagogia).
S. João Paulo II escreveu uns quase 30 anos atrás (Pastores dabo Vobis, 48.4):
“Numa cultura que, com renovadas e cada vez mais subtis formas de auto justificação, se arrisca
a perder fatalmente o ‘sentido do pecado’, e, em consequência, a alegria consoladora do pedido de
perdão (cf. Sal 51, 14) e do encontro com Deus ‘rico de misericórdia’ (Ef 2, 4),
urge educar os futuros presbíteros para a virtude da penitência, que é sapientemente alimentada
pela Igreja nas suas celebrações e nos tempos do ano litúrgico e que encontra a sua plenitude no
sacramento da Reconciliação.
Daqui brotam
- o sentido da ascese e
da disciplina interior,
- o espírito de sacrifício e
de renúncia,
- a aceitação da fadiga e
da cruz.
Trata-se de elementos da vida espiritual que muitas vezes se revelam particularmente árduos para
tantos candidatos ao sacerdócio
- criados em condições relativamente cómodas e abastadas e por isso
- tornados menos dispostos e sensíveis a estes mesmos elementos
pelos modelos de comportamento e
pelos ideais veiculados pelos meios de comunicação social,
mesmo nos países onde as condições de vida são mais limitadas e
a situação juvenil se apresenta mais austera.
Por isso, mas sobretudo para realizar,
segundo o exemplo de Cristo Bom Pastor,
a ‘radical entrega da si mesmo’, própria dos sacerdotes, os Padres sinodais escreveram:
‘É necessário inculcar
o sentido da cruz que está no coração do mistério pascal.
Graças a esta identificação com Cristo crucificado, enquanto servo,
o mundo pode reencontrar
o valor da austeridade,
da dor e mesmo
do martírio,
no interior da atual cultura
embebida de secularismo,
de avidez e
de hedonismo’ (Propositio 23).”
Psicologia e vida espiritual - 2022, 133
No tratado sobre a felicidade ou bem-aventurança na Suma Teológica (I-II, qq. 1-5), Sto. Tomás
pergunta
1º pelo fim - - pois sempre temos um fim em vista, mesmo no pecado (seja no dormir ou comer
ou ler). Procura-se um prazer, e este está ou em mim ou fora de mim.
2º A felicidade ou bem-aventurança é o que?
“Moleza” – seria um parar no que é cômodo e é comigo.
Aí vale que para Santo Tómas é “manifesta”: “é evidente que o amor desordenado de si é a causa
de todo pecado”129.
129 ST, p. I-II, q. 77, a. 4: cf. q. 74, aa. 3-4; cf. em cima, nota 30.
130 Conrad BAARS explica como uma vida celibatária é também necessário antes do casamento, pois sem esta
poderia se pensar de não estar livre para casar. Ou, ao contrário, como São Paulo VI anotou na encíclica sobre o
Celibato: A natureza pode ser tão arruinada que a graça não consegue concertá-la: “Não se deve pretender que a graça
supra o que falta à natureza.” Em outras palavras: Pode ser que a “natureza” é tão ferida que não suportará mais uma
exigência extraordinária que é a vida consagrada de continência total ou a vida sacerdotal celibatária.
(Cf. Paulo VI. Sacerdotalis coelibatus - Sobre o celibato. (24-VI-1967), nn. 51ss:
(51) A Igreja, por outro lado, não pode nem deve ignorar que a escolha do celibato é obra da graça,
quando é feita com prudência humana e cristã e com responsabilidade.
Mas a graça não destrói nem violenta a natureza: eleva-a e dá-lhe capacidade e vigor sobrenatural. ... (53) Não é justo
repetir ainda (cf. n.10) que o celibato vai contra a natureza, por se opor a legítimas exigências físicas, psicológicas e
afetivas, cuja satisfação seria necessária para a completa realização e maturidade da pessoa humana.
O homem, criado à imagem e semelhança de Deus (Gn 1,26-27), não é somente carne, e o instinto sexual não é tudo
nele.
O homem é também e sobretudo inteligência, vontade, liberdade e, graças a estas faculdades, é e deve ter-se como
superior ao universo: elas tornam-no senhor dos próprios apetites físicos, psicológicos e afetivos.
(55) O celibato, elevando integralmente o homem, contribui efetivamente para a sua perfeição. ... (64) Uma vida tão
inteira e amavelmente dedicada, no interior e no exterior, como a do sacerdote celibatário, exclui, de fato, candidatos
com insuficiente equilíbrio psicofísico e moral. Não se deve pretender que a graça supra o que falta à natureza.”
Psicologia e vida espiritual - 2022, 134
O homem é alma e corpo, como espírito refletivo e com lembranças, é um ser e agir
(manualmente),
E esta observação é feita segundo uma certa orientação psicológica – ou pelo bom senso?131
131
Cf. W. HILSBECHER. Schreiben als Therapie (escrever com terapia), Stuttgart: Klett Verlag.
132 “Chi non sa scrivere non solo non sa leggere, ma mostra d’aver capito poco di quel che in qualche modo ha letto.”
(A. CENCINI. La vita al ritmo della Parola: Come lasciarsi plasmare dalla Scrittura. Cinisello Balsamo: Edizioni San
Paolo, 2008, p. 37; cf. “Lectio scripta”, p. 29-38).
Psicologia e vida espiritual - 2022, 135
“Scrivere la lectio è chiudere il circolo ispirativo o ermeneutico, al cui inizio c’è la Scrittura opera
dello Spirito di Dio, che prosegue con l’ascolto o la lettura d’essa da parte del credente e che
termina ora ancora con una scrittura, con la quale lo stesso credente fa suo il verbo delle Scritture
sante, calandolo nella propria esistenza, quasi a purificarla e vivificarla, o immerge la propria
esistenza in quella parola (come intingesse la propria vita nell’inchiostro della Parola). Ed è bello
pensare che lo Spirito, che ha ispirato l’autore sacro, è il medesimo Spirito che ispira e illumina il
lettore a comprendere il brano biblico e infine ispira e tocca cuore e mente del lettore-scrittore a
scrivere il proprio testo, partendo sempre del testo sacro.
È certa una cosa: lo scrivere la lectio è un’espressione ulteriore di coscienziosità, di quanto il
credente prenda sul serio questo appuntamento quotidiano mattutino con la Parola, e cerchi ora,
fissandolo sulla carta, di non perderne il senso, l’illuminazione, la novità.” (Cencini, 31-32)
“Gratry dice che si dovrebbe meditare ‘sempre con la penna in mano’ (em: A.-D. Sertillanges.
A vida intelectual). È indicazione tanto símplice quanto saggio; natural-mente rivolta ai semplici
e umili, non agli ‘intelligenti e sapienti’, che non hanno bisogno di questi suggerimenti.” (Cencini,
p. 32).
Cencini continua e afirma:
“Scrivendo in vario modo la lectio, tra l’altro, si aiuta enormemente la lectio medesima, nel senso
che
- non si corre il rischio di dimenticarla,
- di scordare (= staccare dal cuore) durante il giorno la Parola-del-giorno,
- di perdere nel tempo le ispirazioni e le luci ricevute durante la meditazione; magari
- lo scrivere la lectio può aiutare la preghiera della sera, particolarmente nel momento della
verifica, e ‘solleva e libera dal peso del senso dell’inesprimibile e dell’ineffabile’, che a volte
diventa anche alibi, comoda scusante che dispensa dalla fatica di dire in parole semplici la
ricchezza della Parola.
In tal senso lo scrivere la lectio diventa esercizio tra i più salutari ...” (36-37).
“Chi non sa scrivere non solo non sa leggere, ma
mostra d’aver capito poco di quel che in qualche modo ha letto.” (Cencini, p. 37)
E do outro lado, Cencini se refere a pessoas que dizem de não poder traduzir em palavras humanas
o que meditaram. A este respeito, diz:
“s’illude forse d’essere un mistico che ha visto l’indicibile (e teme che la parola umana
rovinerebbe la bellezza di quel che ha visto-sentito), ma in realtà, se non trova parole umane
per comunicare l’esperienza, dimostra di non esser mai entrato in contatto con la Parola di
Dio” (Ibid., p. 37-38).
A alma deve educar-se para algumas anotações no final, porque isso a mostra mais claramente
quão bem fez a meditação.133
Sertillanges, indicado por Cencini, dá muitas razões para justificar “escrever ao longo de toda a
vda intelectual”:
133 Anota Lercaro: “Inácio não menciona nada no retiro sobre registros escritos após a meditação. Em contraste,
alguns dos seus discípulos imediatos, como o Pe. Peter Le Fèvre, Pe. Natal e Francisco de Bórgia, tinham o hábito de
escrever as iluminações e conhecimentos que eles receberam, e as resoluções que fizeram quando meditaram. Como
são graças divinas, anotá-las significa que se considera devidamente com respeito. Além disso, anotá-la é a maneira
mais segura de memorizá-la e esclarecê-la ainda mais. Os escritos mantêm sua eficácia, quando os lemos novamente,
sentimos seus bons efeitos.
Pe. Meschler não hesita em afirmar que, se você parar de escrever o que aconteceu enquanto o medita, isso pode ser
um sinal do início da mornidão, do relaxação e indiferença (ver M. MESCHLER , O Livro de Exercícios Espirituais
de Santo Inácio de Loyola). Em todos os casos, parece-nos bom atender também nisto à advertência de Santo Inácio:
usar os meios que servem para alcançar a meta. De fato, também pode acontecer que a preocupação excessiva consigo
mesmo prejudique o Espírito.” (Cardeal Giacomo LERCARO. Wege zum betrachtenden Gebet. Freiburg i. Br.:
Herder, 1959, p. 90-91).
Psicologia e vida espiritual - 2022, 136
“Escreve-se
primeiramente para si,
para enxergar claramente sua situação,
determinar melhor seus pensamentos,
manter e reavivar a atenção que logo esmorece se a ação não se impuser a ela,
para desencadear as pequisas cuja necessidade é sucitada durante a produção,
para animar o esforço que se cansaria se não constatasse nunca algum resultado visível, finalmente
para modelar seu estilo e adquirir esse valor que complementa todos os demais: a arte do
escritor.”134
134 A.-D. SERTILLANGES. A vida intelectual. São Paulo: Realizações Editora, 2014, cap. VIII.I: Escrever, p. 157.
135 Jules PAYOT. A Educação da Vontade. (1894). Campinas: Kírion, 2018, p. 126s.
136 Id. O Trabalho intelectual e a Vontade. Campinas: Kírion, 2020, p. 196.
Psicologia e vida espiritual - 2022, 137
A única forma de descobrir os efeitos da escrita à mão seria voltar aos velhos instrumentos — e
quando decidi fazê-lo, percebi que, sim, eu desenvolvia as ideias com mais facilidade, com maior
rapidez. O texto brotava com uma celeridade que eu havia esquecido.
Pode parecer pedante, mas reutilizar a caneta-tinteiro, ver o desenho das letras no papel, alimenta
uma espécie de prazer. Tudo me parece mais real, mais vivo. Estou conectado ao meu próprio eu
de uma forma mais clara, mais intensa. A própria cadência da mão sobre o papel, desenhando os
sinais que me acompanham desde a infância, quando minha mãe ensinou-me a escrever em
pedaços de papel polvilhados de farinha, tudo me torna mais produtivo, mais próximo da minha
índole. A escrita deixou ser um ofício, ofício de que me orgulho, para ser também uma forma de
aconchego.
Estou convencido de que as canetas e o papel trouxeram-me uma conexão parcialmente perdida
entre meus pensamentos e a linguagem, a elaboração do texto. Escrever à mão talvez produza
outros tipos de sinapses. Ou talvez eu esteja apenas sonhando. Mas meus escritos, com certeza,
agora refletem melhor minha personalidade.
Estou convencido de que as canetas-tinteiro e o papel trouxeram-me uma conexão parcialmente
perdida entre meus pensamentos e a linguagem, a elaboração do texto.
Psicologia e vida espiritual - 2022, 138
Psicologia e vida espiritual - 2022, 139
1º Que o homem não é uma máquina que funciona segundo a lei material
Como o sangue, submetido ou exposta a certas condições, indica sua estrutura intrínseca;
Em breve:
Influência (2) do ambiente e próximos \ / (3) de DEUS e da graça
|
Liberdade e flexibilidade da pessoa (1)
Este exemplo sugere outra reflexão: Será que o homem só consegue sua saúde psicológica
quando vive segundo as virtudes, uma vida eticamente boa, ou somente num ambiente religioso?
As experiências no cuidado pastoral entre os prisioneiros confirma essa ideia: Se a assistência
pode oferecer o Amor de DEUS – concretamente nos sacramentos da Igreja – o presidiário
encontra motivos para assumir responsabilidade e depois ser livrado, mudar sua vida e não volta
mais para a prisão!
3º Uma terceira pergunta me vem pensando que raramente, em testes que se oferece, se
considera a diferença entre masculino e feminino (cf. em cima, p. 33).
Será a causa no fato que foi perdido a base metafísica, onde homem e mulher participam na
mesma natureza humana. Segundo uma sólida filosofia, se reconhece a mesma natureza humana
no homem e na mulher, a mesma dignidade. Na Igreja os dois são chamados a mesma santidade
pelos mesmos sacramentos – menos naquele em que se refere a uma função a cumprir: pois
sendo igual no ser, são distintos no agir desde que se fala deles, ou seja, desde o paraíso.
No paraíso se diz:
O Senhor Deus fez vir sobre o homem um profundo sono, e ele adormeceu. Tirou-lhe
uma das costelas e fechou o lugar com carne. 22 Depois, da costela tirada do homem, o
Senhor Deus formou a mulher e apresentou-a ao homem. 23 E o homem exclamou:
“Desta vez sim, é osso dos meus ossos e carne da minha carne! Ela será chamada
‘humana’ porque do homem foi tirada”. 24 Por isso deixará o homem o pai e a mãe e se
unirá à sua mulher, e eles serão uma só carne. (Gn 2,21-24)
E ela é explicitamente chamada “auxiliador”, e diferente de todos os outros seres vivos que
circundaram o homem:
E o Senhor Deus disse: “Não é bom que o homem esteja só. Vou fazer-lhe uma auxiliar
que lhe corresponda”. 19 Então o Senhor Deus formou da terra todos os animais
selvagens e todas as aves do céu, e apresentou-os ao homem para ver como os chamaria;
cada ser vivo teria o nome que o homem lhe desse. 20 E o homem deu nome a todos os
animais domésticos, a todas as aves do céu e a todos os animais selvagens, mas não
encontrou uma auxiliar que lhe correspondesse. (Gn 2,18-20)
São iguais e diferentes, iguais segundo o ser e a natureza, diferente segundo a sua função. Assim
se lê já depois do primeiro pecado. Deus tratou os dois diferentemente
À mulher ele disse:
“(1) Multiplicarei os sofrimentos de tua gravidez.
(2) Entre dores darás à luz os filhos.
(3) Teus desejos te arrastarão para teu marido, e ele te dominará”.
17 Ao homem ele disse: “Porque ouviste a voz da tua mulher e comeste da árvore, de
cujo fruto te proibi comer,
(1) amaldiçoado será o solo por tua causa.
(2) Com sofrimento tirarás dele o alimento todos os dias de tua vida. 18
(3) Ele produzirá para ti espinhos e ervas daninhas, e
(4) tu comerás das ervas do campo. 19
(5) Comerás o pão com o suor do teu rosto,
(6) até voltares ao solo, do qual foste tirado [morte]. Porque tu és pó e ao pó hás
de voltar”.
20 O homem chamou à sua mulher “Eva”, porque ela se tornou a mãe de todos os
viventes. (Gn 3,16-20)
Observando e fiel a esta ação divina São João Paulo II sempre quis aplicar o que Concílio
Vaticano II afirma (GS 48-51; e em outros documentos depois do Concílio):
Os Padres do Sínodo afirmaram repetida e veementemente, perante as mais variadas
formas de descriminação e de marginalização a que se submete a mulher pela simples
Psicologia e vida espiritual - 2022, 141
Como é possível de não considerar esta diferença, que marca toda a vida e comportamento, do
olhar e interessar-se, de falar ou calar, de irritar e aclamar, de – exatamente a área da observação
psicológica.
Sem observar essa diferença na vida ativa, campo específico da “psicologia” só se colhe
confusão. Imaginamos a conversa do seguinte casal:
Uma mãe de três filhos fala aos seu esposo:
Meu Bem, estou cansada, não poderíamos trocar, e você dá luz ao nosso próximo filho.
Talvez também conseguiremos finalmente uma filha que tanto desejas – pois, por
enquanto e mim só vieram três filhos.
Podemos pegar o caso oposto:
Ele ficou decepcionado por sempre receber apenas um filho e faz a esposa a proposta de
trocar os papeis ?
O que diria um psicólogo, quando um deles, o marido ou a esposa lhe consulta e pergunta: Será
que está tudo em ordem com esta proposta de minha mulher / do meu marido?
Psicologia e vida espiritual - 2022, 142
Ainda uma verdade cativante, uma luz para TODOS, por todos serem criaturas de Deus:
O Infinito (Deus) está à procura do homem:
A chamada universal para a união com Deus, à santidade a custo da humildade de criatura
(Indicações sobre o que ou em qual mundo se realiza a vida humana.)
É importante do ponto de vista dinâmico, COMO o homem vive, em qual mundo se realiza a
vida humana.
Sejam sinalados os seguintes pontos, com a devida hierarquia!
1º Toda a criação foi feita PARA AMAR A DEUS sobre todas as coisas
Nisto está seu destino, sua ordem, a saúde da alma do homem.
2º Virtudes – são os repetidos e sempre mais fáceis atos corretos – segundo a natureza humana
(e a Vontade de Deus) – para tornar-se uma pessoa madura – e agradar a Deus.
E como adquirí-las? – Pela educação; pela “formação do caráter”; pela disciplina constante
3º Pecados são doenças que se cura pela confissão (que inclui aconselhamento e direção espir.)
Se eles são tão firmes que se deve falar de vícios, da dependência do espírito da carne.
a) É a pergunta se o homem quer ver e enfrentar - com a ajuda de alguém para descobrir
causas
b) Se não quer, não se pode ajustar nada.
Ao 2º Virtudes que regulam a vida natural, foram vistas já por Aristóteles. Este fato nos diz que
O homem – já como criatura – deve-se entender como ligado a Deus (Gen 1,26ss)
Quanto mais como cristão (batizado; 1 Cor 6,19 etc...)
E ainda, deve ser possível de apontar que como criatura e como batizado,
vale para todo o homem e em todos os momentos da vida de rezar “sem cessar” (Lc 18,1ss;
21,35) – quer dizer, de estar constantemente em contato e comunhão com Deus ...
e deve também ser uma ótima notícia de ouvir que
Deus me espera, tem sede, me procura: Jo 4,28; 19, 28 tem sede;
É ansioso em esperar nossa resposta: Lc 12,50; 15,20; Ap 22,17.
137 “Carta aberta aos pais portugueses” (William Coulson); Coulson foi investigador associado de Carl Rogers.
Em conjunto escreveram 17 volumes sobre psicologia e educação humanística. Neste artigo, Coulson dedica hoje o
seu tempo a falar a católicos e protestantes sobre os efeitos nefastos das suas teorias. Na carta escreve: “Em 1983,
num dos seus livros, Carl Rogers descreveu as nossas experiências como um «padrão de fracasso». Contudo, depois
da sua morte, o editor (que publica livros para professores e alunos de ciências da educação) reeditou o livro
removendo todas as referências ao «padrão de fracasso».”
(WWW.plataforma.rn.org/2009/09/22/Carta-aberta-aos-pais-portugueses-william-coulson - acesso em 20 de outubro
de 2020)
138 L. KOLAKOWSKI, Horror metafísico. Campinas: Papirus, 1990, p. 124. Em: Clodovic BOFF, O Livro do
Sentido. São Paulo: Paulus 2014, p. 491, nota 51.
139 J. B. TORELLÓ. Psychoanalyse und Beichte [Psicoanálise e Confissão], cap 6: “A análise existencial de Frankl
e a logoterapia”, (Wien, 2005), p. 86; existe uma tradução ao portugues!); cf. M. ECHAVARRÍA. A Práxis da
Psicologia, Rio de Janeiro: Ed. CDB, 2021, p. 539-540, 614 nota 1672. “Frankl afirma que é preciso olhar a pessoa
humana não apenas debaixo (os instintos), mas também do alto (as atividades psíquicas mais elevadas), sendo preciso
considerar um eu que decide e cuja decisão dá sentido àquela vida, que normalmente o neurótico percebe como privada
de sentido.” (G. REALE; D. ANTISERI. História da Filosofia. Vol. 3. 8.ed. São Paulo, Paulus, 2007, p. 625).
140 V. FRANKL. Homo Patiens. Wien 950, p. 84.
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ajuda realizar o sentido dado e exigido de um ente, e consideraremos mal o que impede
tal realização de sentido. O sentido não pode ser dado, ele deve ser encontrado.”141
Em várias observações, Frankl quer ser claro a este respeito:
- V. Frankl observa “que parte das pessoas que hoje buscam um psiquiatra teriam procurado um
pastor, sacerdote ou rabino em épocas anteriores. Agora eles ... confrontam o médico com
questões como: ‘Qual é o sentido da minha vida?’.”142 – Com isto, parece ser expressado a
ausência de fé religiosa (virando as costas ao “pastor, sacerdote ou rabino”) e a inquietude e
insatisfação do homem (buscando “um psiquiatra”, e não ficando só consigo mesmo, não
contente sem fé).
- “A logoterapia não é instrução nem pregação. Ela está tão distante do raciocínio lógico como a
exortação moral.”143 - Isto já complica de falar de “sentido”, mas escutamos.
Ele esclarece:
- “O sentido da vida difere de pessoa para pessoa, de um dia para outro, de uma hora para
outra.”144
Isto deve levar-nos a sérias perguntas... Se perguntarmos, como isto é possivel, responde pelo título
de uma outra obra sua: “A vontade para o sentido” do ano 1972.
Continua a esclarecer:
- “O que importa, por conseguinte, não é o sentido da vida de um modo geral, mas antes o sentido
específico da vida de uma pessoa em dado momento. ... Não se deveria procurar um sentido
abstrato da vida. Cada qual tem sua própria vocação ou missão específica na vida; ... “145.
- Tudo isto recebe ainda um esclarecimento maior quando tranquiliza os seus ouvintes com estas
palavras:
“Devo dizer: qual vida seria isto, cujo sentido será e cairá com isto que se casa e tem
filhos, planta árvores e escreve livros? Com certeza: Tudo isto são valores, valores
reais; mas eles são relativos – absoluto, ao contrário, pode ser apenas uma coisa, e
isto é o mandato de nossa consciência ...”146
Agora com este único princípio “absoluto”, “o mandato de nossa consciência”, leva e prende o
homem na sua “prisão doméstica” e com isto, ao caminho da doença psíquica em vez de
cura.147
Juntamos ainda esta referência num livro que parece que estar em muitas mãos:
141 Man before the question of meaning, p. 155. No original alemão: „Sinn geben würde auf Moralisieren
hinauslaufen. Und die Moral im alten Sinn wird bald ausgespielt haben. Über kurz oder lang werden wir nämlich nicht
mehr moralisieren, sondern die Moral ontologisieren – gut und böse werden nicht definiert werden im Sinne von
etwas, das wir tun sollen beziehungsweise nicht tun dürfen, sondern gut wird uns dünken, was die Erfüllung des einem
Seienden aufgetragenen und abverlangten Sinnes fördert, und für böse werden wir halten, was solche Sinnerfüllung
hemmt. Sinn kann nicht gegeben, sondern muss gefunden werden.“ (Der Mensch vor der Frage nach dem Sinn, S.
155)
142 Cf. FRANKL. Em busca de sentido. 47. ed. Petrópolis: Ed. Vozes, 2019, p. 140.
143 FRANKL. Em busca de sentido, p. 134s.
144 FRANKL. Em busca de sentido, p. 133.
145 FRANKL. Em busca de sentido, p. 133.
146 No original e mais extenso: „Und ich muß sagen: was wäre das auch schon für ein Leben, dessen Sinn damit steht
und fällt, daß man heiratet und Kinder kriegt, Bäume pflanzt und Bücher schreibt? Gewiß: das alles sind Werte,
wirkliche Werte; aber sie sind relativ – absolut hingegen kann nur eines sein, und das ist das Gebot unseres Gewissens.
Und dieses Gewissen gebietet uns, daß wir uns unter allen Bedingungen und Umständen unserem Schicksal stellen –
wie immer es auch sein mag; unser Gewissen fordert von uns, daß wir dieses Schicksal gestalten, daß wir handeln,
daß wir das Schicksal in die Hand nehmen, wo dies möglich ist - daß wir aber auch bereit sind, das Schicksal auf uns
zu nehmen – wenn dies nötig ist -, und daß wir dann das rechte, aufrechte Leiden echten Schicksals leisten.“ (V.
FRANKL. Psychotherapie für den Laien (Psicoterapia para os leigos). 7. ed. Freiburg: Herder, 1978, “Higiene
psiquica do madurecimento”, p. 58-61, p. 60s; cursivo no original). Cf. TORELLÓ. Psychoanalyse und Beichte, cap
6: “A análise existencial de Frankl e a logoterapia”.
147 “O homem descobre agora que está aferrolhado dentro de si mesmo, que é seu próprio prisioneiro.” (SHEEN.
Angústia e Paz, 6. ed. Rio de Janeiro: Livraria AGIR Editora, 1957, p. 13s.; existe nova ed. por ed. Molokai)
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3º Em relação a Deus
148 Ed. Vozes, 47ª edição, 2019 (as muitas edições se explicam por narrar extensamente sua história em Ausschwitz,
pp. 15-120).
149 Com a palavra “solto” queremos dizer: sem fundamento objetivo, e em consequência, como afirma Frankl: “o
sentido da vida difere de pessoa para pessoa, de um dia para outro, de uma hora para outra”. Com isto se entende a
“pessoa de hoje” que não tem mais coragem ou força para assumir um compromisso para um preço maior, ou “pela
vida” como a “fidelidade matrimonial” ou um compromisso religioso..., pois pode ser que daqui em dez minutos
descubro outro “sentido de minha vida” e (parece que devo) “tomar outro rumo para a minha vida”. Também a
instabilidade profissional se explica aqui...
150 “Muss man sich denn auch alles von sich gefallen lassen? Kann man nicht stärker sein als die Angst?“
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Torelló nos diz: “A partir da vida, entendida como tarefa151, Frankl abre a porta ao
comitente152: Deus. Frankl acompanha seus pacientes até a esta porta aberta: A eles sozinhos
pertence a decisão, de pisar sobre o limiar ou não.”153
Echavarría olha ainda mais diretamente a este ponto, de modo que chega a perguntar: em Frankl,
“De que Deus se trata?”154 E responde:
“Para Frankl, isto significa que de Deus não se pode dizer nada (e ‘do que não se pode
falar, é melhor calar’, dizia Wittgenstein, citado por ele). Não se poderia falar de Deus,
mas somente a Deus, através da oração.” (La vontade de sentido, Herder, Barcelona
1988, 66-67). De que Deus se trata? Segundo Frankl, do ‘interlocutor de nossos mais
íntimos solilóquios’. Como não se pode saber o que é Deus, esta não é uma definição
essencial, mas ‘operacional’. Neste sentido, pode ser religioso tanto um teísta com um
ateu. Só que o teísta nega a aceitar a hipótese de que este interlocutor seja ele mesmo,
coisa aceita pelo ateu. (Frankl. Homo Patiens. Ensayo de uma patodicea)” (Echavarría. A
Práxis, p. 390.
E ainda: “Contudo, mais profundamente, diz Frankl, o autêntico interlocutor é o nada [griffo do
editor]. O nível mais profundo seria chegar a Deus como ‘nada’, que é o transcendente
inexprimível.” (Echavarría. A Práxis, p. 391)
“... embora para Frankl o ’sentido último’ da vida não seja totalmente inventado pela
pessoa, como nas outras linhas da psicologia existencialista, mas dado, todavia, o doador
não é o Deus cristão, senão que o sentido é, como em Heidegger, um ‘evento’ do ser. O
que explica por que ‘as pessoas que a si mesmas consideram atéias não são menos
capazes de encontrar um sentido em suas vidas que aquelas outras que consideram a si
mesmas como crentes’ (Frankl. El hombre em busca del sentido último, 294).”
(Echavarría. A Práxis, p. 393)
4º Então?
Certamente, podemos começar ler todas as suas, não poucas, publicações para chegar ao
entendimento mais exato dele. Porém, não somos juízes sobre Frankl, descendente judeu e de
“crença” ateu. Mas devemos avaliar e discernir sobre suas ideias, mais ainda quando já vimos da
fé cristã. Também, nada exclui que ele mesmo tinha mudado suas opiniões no decorrer de sua
vida (faleceu em 1997) – como falamos de 1º e 2º e 3º Scheler.
O que conta é o que se entende por seus escritos ou métodos, e o que os seus ouvintes ou alunos
vão entender e passar para frente.
Quando Frankl defende:
“Absoluto pode ser apenas uma coisa, e isto é o mandato de nossa consciência ...”,
ele sente-se totalmente livre de fazer isto. Porém, a fidelidade à nossa crença e filosofia pede a
liberdade do nosso lado de não seguir seus conselhos pois devemos ter medo, e com razão
suspeitar, que podemos ser conduzidos a considerar a nossa vida e as situações que
encontraremos independente de DEUS, a quem queremos acreditar ser nosso “Pai” que vigia
sobre nós com amor dia e noite, de modo que não cai um cabelo de nossa cabeça sem Ele
perceber, permitir ou querer (cf. Mt 10,30; 6,25-34; 10,24-31).
Se encontramos em Frankl alguém que quer ficar reservado “no seu campo psicológico” (como
por ex. insiste também constantemente A. Cury, mesmo que não pare de tomar o nome de Jesus
151 Em alemão: “Aufgabe” como colocou Heidegger, que em si já leva a uma contradição, pois já limita a liberdade
e determina algo; traz consigo uma limitação da qual nunca se pode dispensar: Um homem é um homem e não um
animal ou uma planta ou até nada; não, ele é deste que existe um ser humano, com tudo que esta determinação traz
consigo.
152 “Auftraggeber” ou seja aquele que faz a encomenda, ou o cliente.
153 J. B. TORELLÓ. Psychoanalyse und Beichte, cap. 6; (trad. alemã, p. 86).
154 ECHAVARRÍA. A Práxis da Psicologia, p. 390; 389 nota 1027,
Psicologia e vida espiritual - 2022, 148
na sua boca e chamá-lo o grande “Mestre”), podemos entender isto como um reconhecimento do
serviço que a “Psicologia” pode prestar ao cultivo da nossa vida e no confronto com problemas.
Se, porém, querem se apresentar como ciência que seria capaz de resolver os problemas do
homem, então se apresentam ou declaram o homem (ou sua ciência – a psicologia surgiu com a
decadência da religiosidade das pessoas!) como auto-redentor, por ex. pelo “pensar positivo” ou
pelo “sentido que ele mesmo dá à sua vida e aos eventos”, ou se eles querem ensinar que o
homem deve “afirmar a si mesmo”,
então há o grande perigo de enganar o homem, e seu ensino precisa ser reduzido ao
horizonte e ambiente em que há competência.
Pois sua compreensão do “homem” deixa-nos no “ar”, não oferece fundamento para vida,
principalmente, quando o sofrimento bata na sua porta.
E por falar neste contexto até mesmo de Deus, não deve enganar-nos. Como C.G. Jung, Frankl é
da opinião que acreditar na continuidade da vida “depois da morte é grande ajuda à terapia”,
mas é como muitos psicólogos pensam (e nisto seguem ao marxismo): a fé (talvez até a prática
religiosa) ajuda psicologicamente, é um “ópio” para os que precisam se agarrar em algo ou em
alguém, mas não importa se, objetivamente, isto é, se realmente existe este mundo (seja Deus ou
uma eternidade para a alma imortal)! É uma fé e religião “útil” para o indivíduo, serve para
consolar, porém, só interessa que serve para esse fim, e não precisa interessar ao psicólogo saber
se tal consolo tem fundamento ou não!155
F. Sheen indica e elabora um paralelismo entre os conflitos sociais e individuais; desse consta
sobre o “materialismo histórico” e “materialismo psicológico, a filosofia de Freud, [que] são
filhos da mesma era e exprimem as mesmas atitudes básicas” (Sheen, Angústia e paz, p. 16; cf.
p. 11-25).
155 Sem dúvida, isto já é melhor do que Freud e o primeiro Rogers afirmaram: Segundo Freud seria doente aquela
pessoa que “pergunta pelo sentido e valor da vida”, de modo que se precisaria dizer, em certa consequência, “Ritos
religiosos são ações forçadas neuróticas”; ou, uma discípula de C. Rogers escreveu: “Na medida em que um homem
omite desenvolver sua autonomia, ou perdeu-a, ele é doente.”
156 “O regular exame de consciência antes da confissão”, comparando a vida com a “norma” da Vontade de Deus,
obriga o homem de ser sincero consigo e “é um dos meios mais importantes para uma dieta da alma. Fundamental
para uma autolibertação do sofrimento nervoso é a coragem à veracidade interna” (Georg SIEGMUND, Christentum
und gesundes Seelenleben. Paderborn: Verlag F. Schöningh, 1940, cap. 8, p. 142s.; cf. ibid., cap. 5: “Culpa”; e ID. Fé
em Deus e Saúde Psíquica. São Paulo: Loyola, 1971). “Nenhum ser humano se sente satisfeito com a intranquilidade
no coração, a inflamá-lo e ulcerá-lo. A natureza inteira fala a favor do alívio e a consciência alega as suas
reclamações... A consciência de algo errado – de um pecado clamando para ser expelido – pode ser recalcada e muitos
homens e mulheres usam de tal ocultação para escapar à autocensura. ... esta repressão é bastante perigosa, afetando
a saúde tanto do corpo com do espírito.” (SHEEN. Angústia e paz, p. 139).
Psicologia e vida espiritual - 2022, 149
em vez de cura. E porque? Como nenhum homem vive só para si, mas sempre numa comunidade
(de família, de bairro, de trabalho, ou seja onde for), assim também ninguém pode só seguir a sua
consciência, mas deve fazer o bem e evitar o mal que se encontra na realidade do mundo em que
cada um vive. E se uma pessoa, como acontece com cada um de nós, ofende esta regra de vida
mais básica e universal – fazer o bem e evitar o mal – e não sabe como consertar o seu erro, e se
acumulam tais acontecimentos, então ele entra em um problema interior ou psíquico que nada
alivia, a não ser que se abre com alguém, se acusa do seu erro (ou na religião dito “pecado”),
pede perdão e a recebe.157
Frankl trata dos problemas psicológicos no nivel da consciência intelectual e pessoal, mas se
distancia da consicência moral objetiva e comum a todos. Como não oferece ou se baseia em
uma filosofia objetiva, e por declarar “o mandato de nossa consciência” com único valor
absoluto, seu método leva e termina na prática da autosugestão e do método do “pensar
positivo”, na autonomia e independência, uma visão irreal já em casa, onde ninguém pode viver
só segundo a sua vontade, e menos ainda quando sai de sua casa e entra na vida e ambiente de
muitas pessoas.
Frankl toma a posição da indiferênça religiosa (!), deixa o valor objetivo da doutrina da fé como
qualquer crença religiosa ao critério pessoal do indivíduo.
Quem, porém, acredita em uma história sua, no passado e num futuro (cf. FRANCISCUS.
Fratelli tutti. n. 13), até em Deus como seu Criador e na felicidade esperada na união com Deus,
não pode esperar em Frankl um guia oportuno; Frankl se desculpa nesta parte. Então devemos
deixar ele a este lado e procurar orientação melhor.
A visão cristã (e esta que Santo Tomás explica, onde pode com raciocínios) é esta:
- Deus é amor em si (Um no ser e Três em pessoas) e só sabe agir por amor e destinar ao amor.
- Uma pessoa racional-espiritual, segundo santo Tomás, é necessariamente (seg. a sua natureza)
livre; e nessa espiritualidade e liberdade percebe ser determinado (criado; causa eficiente) e
capaz para o infinito que é Deus no conhecer pelo intelecto, e possuir ou amar pela sua vontade
(causa final). Por isso, diz Santo Agostinho, Santo Tomás (Suma Teológica, p. I-II, q. 2, art. 7;
cf. q.3, a.8) e já o evangelho: Só em DEUS o homem encontra sua meta, seu descanso:
SÓ DEUS Satisfaz todas as expectativas do homem (cf. Jo 14,1-3; Ap 7,13-17).
- Nesta perspectiva da existência do homem, é evidente a definição natural filosófica do homem,
isto é, ser um “animal racional”. Mas surge também uma definição escondida, mas radical no
sentido que explica cada respiro do ser humano e esta diz:
O homem AMA Ser AMADO !
Ele ”gosta”, deseja e faz tudo para receber amor, porque ama ser amado pelos outros e, mais
ainda, pelo INFINITO em Pessoa, por DEUS.158
“Ama” porque é já uma pessoa íntegra com consciência (intelectual e moral) e liberdade, mas
quer ser amado porque não é absoluto, infinito, totalmente autônomo; precisa ser plenamente e
perfeitamente realizado e na sua alma, capaz do infinito, pelas suas faculdades atualizadas. Cada
criatura participa na perfeição do Criador perfeito e enquanto criatura racional anseia ao melhor
ou seja à perfeição total. Esta não consegue alcançar por si mesmo, pois ela é criada e assim
157 Esta lógica de pensamento encontra-se hoje onde se quer reservar a religiosidade ao ambiente “privado”, ou como
Frankl, lavando-se as mãos, deixar o homem sozinho nessa questão. Encontramos isto em várias tendências na
sociedade hodierna, e é contra essa meta da vida humana, contra sua natureza – revela no fim que não se quer
considerar de onde o homem vem (causa eficiente) e para onde é destinado de ir (causa final), está baseada numa
filosofia insuficiente, e objetivamente falsa enquanto nega as dependências do homem – ele não é eterno nem infinito,
também não nas sua liberdade; ele não é deus!
158 É importante de ver a sede de “ser amado” como problema e fome mais radical em cada pessoa humana para
descobrir mais fácil e rapidamente a raiz de um mau comportamento e dirigi-la ao verdadeiro e infinito amor que é
Deus (cf. T. Kieninger. O respeito humano. Manuscrito. Anápolis, 2021). Esta perspectiva da vida humana com o
destino (psicológico) de homem e mulher, igual segundo a natureza (ser), diferente segundo as funções entre si ou
familiares e sociais (agir) fez, por exemplo, Fulton Sheen entender que o homem “bebe” (alcoólatra) porque gosta e a
mulher bebe (alcoólatra) porque tem um problema.
Psicologia e vida espiritual - 2022, 150
limitada. Por isso deve aceitar a si mesmo como dom o que o Bom Deus de bom grado não
apenas quer dar, mas “anseia ardentemente de dar” (Lc 22,15; cf. 12,49-50). A isto se refere São
Paulo em vários lugares quando escreve, por ex. “Por meio de sofrimentos, levou à perfeição
aquele que iniciou a salvação deles.” (Hb 2,10).
Nesta perspectiva tudo começa florescer. Deus mesmo Se revelou a nós homens e explicou
“O Pai amou tanto mundo que deu Seu filho único!” (Jo 3,16)
e - quem aceita e crê nisto, para esta pessoa todos os problemas se resolvem. Em Jesus o próprio
Deus feito homem assumiu o pior mal, a morte, mas resuscitou dela e voltou a viver sem jamais
morrer outra vez. Ele abraçou nossa condição limidada e uniu-a com sua natureza divina na Sua
Pessoa Divina. No sacrifício do próprio Deus-feito-homem torna-se o Amor de Deus tão
evidente e presente que tudo ganhou sentido, o maior sofrimento e o pior mal, a morte. Pensamos
nos mártires, entre tantos, em Maximiliano Kolbe, sacerdote e mesmo como fundador de uma
Congregação religiosa, se prontificou livremente a morrer por um pai de família e estava
cantando no Bunker de fome, no mesmo Campo de Concentração em que Frankl esteve,
Ausschwitz. Como podia? Tem valores maiores dos que Frankl indica?159
A fé judaica e hoje cristã sempre ensinou a vivência diante do Deus Protetor e cuidador, de
modo que nunca deveríamos perder a paz de coração. A entrega confiante sempre deveria vencer
sobre a angústia e quaquer problema. O seguinte Salmo (55(54)) seja apenas um entre muitos
exemplos já do Antigo Testamento.
3 Estou ansioso na minha tristeza e me perturbo pelo grito do inimigo, me perseguem com furor.
5 Meu coração treme no meu peito e terrores mortais se abateram sobre mim.
7 Então digo: “Ah! Se eu tivesse asas ... fugiria para longe, iria morar no deserto,
13 Se fosse um inimigo que me insultasse, eu aguentaria; mas és tu, meu companheiro, meu
amigo e confidente; uma doce amizade nos unia ...
17 Eu invoco a Deus e o Senhor me salva. De tarde, de manhã e ao meio-dia lamento-me e
suspiro, e ele escuta minha voz; vai me dar a paz, livrando-me dos que me combatem.
23 “Entrega ao Senhor tua ansiedade e ele te dará apoio, nunca permitirá que vacile o
justo”. 24 Tu, ó Deus, os precipitarás no fundo do sepulcro; os homens sanguinários e
fraudulentos; não chegarão à metade dos seus dias. Mas eu em ti confio.160
O nosso problema hoje é a vivência da fé, a dificuldade de pôr em prática no dia-a-dia, de incluir
Deus na nossa vida e com ele a dimensão eterna da vida humana. Do mal do que o homem foge
por natureza querendo sobre-viver, e que pela justa auto-estima tenta vencer, ainda tem sentido
por Cristo e se pode abraçar com amor e por amor, como um tesouro para a vida eterna e como
159 Esta doação por amor, seguindo o exemplo e a palavra de Deus é o oposto da orientação de Frankl quando ele diz
que a todo o custo nós devemos afirmar-nos e não deixar-nos “vencer” por outros: “Será que somos mesmos obrigados
de aceitar tudo de nós [“von sich”]? Será que não se pode ser mais forte de que a angústia?”
160 Outro exemplo do livro dos Salmos, Salmo 68/9:
9 Tornei-me um estranho para meus irmãos, um estrangeiro para os filhos de minha mãe.
10 Pois o zelo por tua casa me devorou, os insultos dos que te insultam caíram sobre mim.
11 Se me mortifico com o jejum, eles zombam de mim.
12 Se me visto com traje de luto, sou alvo de sarcasmo.
13 Falam mal de mim os que se sentam junto à porta e os que bebem vinho fazem canções sobre mim.
30 Quanto a mim, pobre e doente, o teu auxílio, ó Deus, me proteja.
31 Quero louvar com um cântico o nome de Deus e exaltá-lo com ações de graças;
32 Que isto agrade ao Senhor mais que um touro, mais que um novilho com chifres e casco.
33 “Vede, humildes e alegrai-vos! Vós que buscais a Deus, vosso coração reviva!
34 Pois o Senhor atende os pobres, não despreza os seus cativos.
35 Que o louvem céu e terra, os mares e tudo quanto neles se move.
36 Pois Deus salvará Sião e reedificará as cidades de Judá; habitarão lá e a possuirão.
37 E a posteridade dos seus servos a herdará, e nela habitarão os que amam o seu nome.
Psicologia e vida espiritual - 2022, 151
uma chance de ganhar perdão e graça e para crescer na união amorosa com o próprio criador
nosso.
Papa Bento XVI, na sua encíclica Sobre a Esperança Cristã (2007, n. 40) fez uma pequena
observação indicando este rumo, ao sentido das “pequenas canseiras da vida quotidiana”:
Gostaria de acrescentar ainda uma pequena observação, não sem importância para os
acontecimentos de todos os dias. Fazia parte duma forma de devoção – talvez menos praticada hoje,
mas não vai ainda há muito tempo que era bastante difundida – a ideia de poder « oferecer » as
pequenas canseiras da vida quotidiana, que nos ferem com frequência como alfinetadas mais ou
menos incômodas, dando-lhes assim um sentido. Nesta devoção, houve sem dúvida coisas
exageradas e talvez mesmo estranhas, mas é preciso interrogar-se se não havia de algum modo
contido nela algo de essencial que poderia servir de ajuda. O que significa « oferecer »? Estas
pessoas estavam convencidas de poderem inserir no grande compadecer de Cristo as suas pequenas
canseiras, que entravam assim, de algum modo, a fazer parte do tesouro de compaixão de que o
gênero humano necessita. Deste modo, também as mesmas pequenas moléstias do dia-a-dia
poderiam adquirir um sentido e contribuir para a economia do bem, do amor entre os homens.
Deveríamos talvez interrogar-nos se verdadeiramente isto não poderia voltar a ser uma perspectiva
sensata também para nós.
O Cristão também é chamado de dar sentido, “dando-lhes assim um sentido”, porém
“convencidas de poderem inserir no grande compadecer de Cristo as suas pequenas canseiras”,
logo é de dar o sentido que a vida e os eventos tem nos olhos de Deus e por ele foram permitidos
por muitas razões para nós mesmos ou por outros. Este dar (como a volta livre do filho pródigo)
é desejado e esperado por Deus como colaboração livre e meritória de cada criatura racional.
Em dimensão maior, a teologia ajuda a entender muitos sentidos do sofrimento. E se uma
pessoa vive sua fé, a comunhão com Cristo, a solução de problemas internos espirituais está “à
mão” de modo que não chega a nós que complicam o comportamento.
161 Nailis, Werktagsheiligkeit, [Santidade quotidiana], Limburg, 1978, p. 153; “A dor é um santo anjo e o homem
aprende por ele mais que por todo o sucesso” (Adalbert Stifter).
162 “Nosso sofrimento é o mesmo sofrimento de Cristo.” O sofrimento “não foi criado por Deus, mas Cristo lhe
deu um enorme sentido.” O poder invisível de Deus se manifesta no sofrimento. Cura a alma, salva o espírito,
quebran-ta o orgulho, elimina a vaidade, abate a opulência, iguala os homens” (F. Aquino, Em busca da perfeição,
63-64).
Psicologia e vida espiritual - 2022, 152
- consola e
- fortalece (cf. Lc 22,42s),
- impele para enfrentar o sofrimento (cf. Mt 4,1), mas
- não o retira (cf. Gen 16,9; At 20,23)163.
Podemos determinar a seguinte “escala de perfeição”:
O pagão diz: Antes viver que morrer!
O cristão “jovem”, ao contrário, diz: Antes morrer que viver!
O cristão adulto e avançado esclarece: Antes sofrer que morrer!
O cristão perfeito, porém, reconhece: Quero o que Deus quer!, ou seja:
a conformidade com a Vontade de Deus,
pois, atrás de todo o resto pode-se ainda esconder facilmente a vontade própria desordenada, que
para Santo Tomás é a raiz de todos os pecados (cf. S.th. I-II,77,4; cf. Imitação de Cristo III,27).
Como Cristão, devemos conscientizar-nos mais da nossa nova identidade pelo Batismo, que São
Paulo esclareceu aos Coríntios com estas palavras (1Cor 6,19-20):
“Acaso ignorais que vosso corpo é templo do Espírito Santo que mora em vós e que
recebestes de Deus? Ignorais que não pertenceis a vós mesmos? De fato, fostes
comprados, e por preço muito alto! Então, glorificai a Deus no vosso corpo.
Assim entendemos que, unidos com Cristo, somos chamados
– não a auto-redenção, mas já redimidos e nesta qualidade –
a colaborar no que ainda falta na redenção, ou seja, a ajudar pelos sofrimentos aqueles que ainda
não abraçaram a fé em Cristo (Col 1,24). Pelo sofrimento contribuimos para a salvação dos
outros e nossa própria.
Então, não devemos aplicar o pensamento de São Paulo sobre o julgamento de direito
também à psicologia?
Ele dizia aos Coríntios:
“Quando um de vós tem uma questão contra outro, como se atreve a entrar na
justiça perante os injustos, em vez de recorrer aos santos?” (1Cor 6,1)164
Não deveríamos entender para a área da psicologia que quer tratar o comportamento do homem e
o estado de sua alma que é destinada para a vida eterna e assim para o nosso campo dizer:
Como queremos esperar
- bons conselhos e
- buscar solução de problemas espirituais ou da alma,
com pessoas que não compartilham a nossa fé?
163 Neste sentido não se entende como Roberto DeGrandis, SSJ, podia declarar “a teologia do sofrimento como
obstáculo da cura”, a não ser que se pergunta “cura de quê?” (cf. R. DeGrandis, SJ, Ministério da cura para leigos,
Ed. Loyola, São Paulo 31986, p. 13).
164 Esta mesma pergunta se fez J. E. ADAMS; e isto o levou a pensar no que depois desenvolveu, uma psicologia na
base da Bíblia, em particular, nos Salmos. (cf. Competent to counsel; título em alemão é: Befreiende Seelsorge -
Pastoral liberadora: Teoria e Práxis de um aconselhamento de vida bíblica. 8. ed., Giessen-Basel: Brunnen Verlag,
1988, p. X)
Psicologia e vida espiritual - 2022, 153
voltamos à posição de Frankl como ouvimos no início e refletirmos de novo, pois será que a
confrontação com o Cristianismo permite de dar uma nova luz às suas afirmações iniciais?
Paramos, por enquanto, só com a primeira citação, já é tão radical que ele sugere de acreditar (ou
até profetiza) que a moral, ou seja, os costumes ou regras ou até leis sobre a conduta humana vão
(até em breve) desaparecer e começa uma nova orientação, quer dizer uma nova maneira de
determinar o que é “bom” e o que é “mau”.
165 “dieses Gewissen gebietet uns, daß wir uns unter allen Bedingungen und Umständen unserem Schicksal stellen –
wie immer es auch sein mag; unser Gewissen fordert von uns, daß wir dieses Schicksal gestalten, daß wir handeln,
daß wir das Schicksal in die Hand nehmen“ (cf. encima, nota 10)
Psicologia e vida espiritual - 2022, 154
A. o homem deve dar sentido aos eventos ou acontecimentos ou a sua própria vida;
B. logo seu agir deve cuidar que este sentido se realiza. Então segue
C. a nova definição do que é bom e do que é mau:
“bom e mau não serão definidos no sentido de algo que devemos ou não fazer, mas bom
nos parecerá o que ajuda realizar o sentido dado e exigido de um ente, e consideraremos
mal o que impede tal realização de sentido.”
Frankl é cuidadoso quando diz “nos parecerá”, e é consequente no que projetou:
Não quer prescrever nada a ninguém e não tirar o valor que é absoluto para cada um, ou seja, sua
própria consciência e decisão (vontade). Consequentemente, fica também determinado o que é
“bom ou mau” pelo sentido que cada uma dá, e que pode num momento ser um e num outro
momento ser outro, como vale numas circunstâncias um e em outras circunstâncias outro, pois,
com diz Frankl, “o sentido da vida difere de pessoa para pessoa, de um dia para outro, de uma
hora para outra.”
4º Quase para confirmar e consolidar esta opinião ou posição, Frankl continua dizer: “mas
[iremos] ontologizar a moral”. Não sei se estou errado quando digo, que talvez 95 % dos leitores
não tem a preparação filosófica para entender seja só a palavra “ontologizar”, seja o significado,
e por isso baixam “com respeito” a cabeça diante de tal afirmação. Me considero parte dos
restantes 5 % que tem uma ideia do que diz “ontologizar”, mas não entendem na hora o que
realmente está implicado com tal afirmação. E se não se pare, fica assim. Só dias depois, me vem
o pensamento que isto significa a inversão da causalidade como apareceu com Descartes.
Me explico: na luz do que entendemos pela “moralidade no sentido antigo” ou pelo bem como
transcendental e propriedade do ser aparece um novo significado da intenção de Frankl (ou será
que ele mesmo não entendeu o que diz ?).
Dizemos primeiro: Lemos na narração da criação na Sagrada Escritura ou Revelação Divina:
“Deus disse: ’Faça-se a luz’! E a luz se fez.” A narração continua dizer: “Deus viu que a luz era
boa.” (Gênsis 1,3-4). Nesta simples descrição é dito: Com o ser das criaturas é também dado sua
bondade, sua “qualidade” de ser bom. Ou: a bondade das coisas está in-scrita no ser das coisas, e
esta união ou identidade ... se quer expressar com a palavra “ontológico” ou, enquanto ação
criativa que inicia ou dá o ser às coisas. Então “ontologizar” quer dizer inscrever a bondade nas
coisas pelo seu ser e com o seu ser.
Agora, quando Frankl fala do “ontologizar a moral”, só pode-se entender assim:
A. Depois de ter acabado – desconsiderado (negado? recusado?) – a ordem objetiva com o
devido valor das coisas segundo seu grau de ser, causada pela criação,
B. E estabelecido o que é bom ou mau, pela consciência (como “valor absoluto de cada
um”) e pelo sentido que essa decidiu de dar, logo o que é bom e mau para si mesmo, ao
menos agora no momento,
C. vamos declarar esta regra de comportamento (ou “moral”) – bom é o que ajuda realizar o
sentido dado e exigido de um ente, e consideraremos mal o que impede tal realização de
Psicologia e vida espiritual - 2022, 155
sentido – como norma absoluta universal, como fosse inscrito em cada pessoa, em toda a
realidade166, ou como fosse inscrita no “ser” e assim “óntológica”, inscrita no ser e por
isso – como na “moralidade no sentido antigo” – universalmente válida.
Isto significa:
A. Depois de “ter acabado” com esta moral antiga enraizada no ser da realidade,
B. falar do “ontologizar a moral - die Moral ontologisieren”,
C. significa que o homem toma a posição de Deus Criador, (se quer ser ou simplesmente se
comporta apenas como fosse Deus, não importa, pois de fato toma para si o que é de
Deus, a determinação o que é “bom” e o que é “mau”).
Com isto, V. Frankl não representa uma novidade na história. Nem foi uma novidade quando
Descartes começou descrever a sua maneira de entender o que é a verdade (sua “ideia clara e
distinta”). Esta maneira de pensar e raciocinar, pronunciar qualquer frase simples ou desenvolver
um sistema enorme com centenas de páginas, não faz grande diferença: é simplesmente errar em
não reconhecer que nós somos criaturas limitadas segundo o corpo (= vivendo no tempo e todos
um dia deixamos este mundo na morte) e segundo a alma (= como ninguém dos homens
consegue tudo que deseja nesta vida terrestre): Cada um nega o “início” que diz: “No princípio,
Deus criou o céu e a terra.” (Gn 1,1)
- - - - - - -
A Filosofia de V. Frankl é da afirmação de si mesmo -
“Será que somos mesmos obrigados de aceitar tudo de nós [“von sich”]?
Será que não se pode ser mais forte de que a angústia?” 167
Contradiz a “renúncia de si mesmo” do Cristianismo:
“renuncie a si mesmo, tome sua cruz e siga-me.” (Mt 16,24)
“Se o grão de trigo que cai na terra não morre, fica só.
Mas, se morre, produz muito fruto.
Quem se apega à sua vida, perde-a; mas quem não faz conta de sua vida
neste mundo, há de guardá-la para a vida eterna.” (Jo 12,24-25)
A filosofia de Frankl é o amor de si mesmo – ninguém vence sobre mim!168 – é compreensível
pela experiência do Campo da Concentração, aí se trata de sobre-viver;
Mas a “filosofia de Cristo”, o amor a Deus e ao próximo, é maior
como foi mostrado por São Maximiliano Kolbe, no mesmo campo de C.
O Amor de si mesmo – sem a devida subordinação ao Amor a Deus e ao próximo – é a raiz de
todos os pecados (cf. Sth, I-II, 77, a. 4169),
Mas a entrega e o oferecimento do nosso “ego” é o caminho para o verdadeiro encontro de nós:
reduzindo o amor a si mesmo ao limite de uma criatura e, a partir daí,
encorajar-nos à doação total e união com o Infinito, com Deus!
“Quem busca a si mesmo não encontra ninguém, pois não sai de si, e, por isso, frustra-se
permanentemente na sua busca.” (Dom João Bisco Óliver de Faria. Coração sacerdotal., p. 19)
Conclui Benito GOYA sua observação sobre a “logoterapia de V. Frankl” com esta frase:
166 Mas que seria a realidade, por exemplo, de uma árvore ou tempestade, do mar e da montanha, até de um peixe
ou pássaro - se em nada disso não se encontra “consciência”? Existe algo fora da consciência, e se for, como parece
evidente no mundo em que nos nos encontramos, como explica esse?
167 Outra afirmação que se encontra em Victor Frankl: “Tudo pode ser tirado de uma pessoa, exceto uma coisa: a
liberdade de escolher sua atitude em qualquer circunstância da vida.” – Será que esta atitude ajuda a pessoa de abrir-
se para a graça divina? – para o abandono na fé e confiança em DEUS – mais ainda quando não se entende mais os
pedidos – não só como no Caso da Abraão, mas também já em coisas menores na vida consagrada, pedidos, ordens
que não se entende (nem falar de não gostar)?
168 “Muss man sich denn auch alles von sich gefallen lassen? Kann man nicht stärker sein als die Angst?“
169 No 3º Sermão no tempo de Páscoa, São Bernardo disse ”Terminai com o Amor Próprio, e não existirá mais o
inferno.”
Psicologia e vida espiritual - 2022, 156
“Parece supérfluo insistir sobre a fé cristã como sentido e princípio de integração de toda a
existência.”170
Num mundo em que o homem toma o início e fim da vida nas suas mãos, o convite de, ele
mesmo, dar sentido a sua própria vida parece o cume de sucesso, mas mostra também já seu
fracasso. Se o próprio Cristo disse: “Eis que eu vim, ó Deus, para fazer a tua vontade!” (Hb
10,7), e confirma este motivo de sua existência várias vezes até a sua morte (Jo 4,34; 5,30; 6,38;
Mt 26,39.42 e Lc 23,46), como não entender nossa vida frágil e de criatura em dependência
existencial e cotidiana de Deus?171
170 B. GOYA. Psicologia e Vita spirituale: Sinfonia a due mani. Bologna: Edizioni Dehoniane, 2000, p. 159.
171 Assim refletiu São Tiago sobre a vida humana: “Agora vós, os que dizeis: ‘Hoje ou amanhã iremos a tal cidade,
passaremos ali um ano, negociando e ganhando dinheiro’! No entanto, não sabeis nem mesmo o que será da vossa
vida amanhã! De fato, não passais de uma neblina que se vê por um instante e logo desaparece. Em vez de dizer: ‘Se
o Senhor quiser, estaremos vivos e faremos isto ou aquilo’, vós fazeis alarde de vossas ostentações. Ora, toda
arrogância deste tipo é um mal. Quem, pois, sabe fazer o bem e não o faz, é réu de pecado.” (Tiago 4,13-17)