Concurso de Crimes e Concurso de Pessoas

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Universidade Federal Fluminense

Instituto de Ciências Humanas e


Sociais de Volta Redonda Curso de
Graduação em Direito
Disciplina: Direito Penal
Prof. Taiguara Libano Soares e Souza

Trabalho apresentado como parte


dos pré-requisitos necessários à
avaliação do(a) aluno(a) na disciplina
Direito Penal.

Graduando: Guilherme Pereira Andrade


Matrícula: 120090015

Volta Redonda
Julho/2021
Concurso de Pessoas e Concurso de Crimes

Volta Redonda
Julho/2021
I. Introdução.
Tendo em vista o entendimento de que cabe ao Direito Penal tutelar
as ofensas mais graves aos valores máximos da existência social, os
bens jurídicos, destaca-se o esforço do autor em arquitetar,
observando a letra fria da lei e ao conjunto argumentativo doutrinário
nacional, um documento íntegro e autêntico acerca do tema:
concurso de pessoas e concurso de crimes. Para fazê-lo, no entanto,
faz-se necessário que se construa, inicialmente, um estudo prévio
sobre os conceitos basilares dos institutos em questão. São eles:
conceito de
autoria, autor, coautoria e participação.

Autoria. Sob as diretrizes do sistema unitário de autor, o conceito


pode comportar todos os intervenientes no crime. Já, sob os moldes
de um sistema diferenciador de autor, pode estar restringido à
conduta dos agentes principais.

“A autoria dentro de um sistema diferenciador não pode


circunscrever-se a quem pratica pessoal e diretamente a figura
delituosa, mas deve compreender também quem se serve de outrem
como “instrumento” (autoria mediata). É possível igualmente que
mais de uma pessoa pratique a mesma infração penal, ignorando que
colabora na ação de outrem (autoria colateral), ou então, consciente e
voluntariamente, coopere no empreendimento criminoso, praticando
atos de execução (coautoria). Várias teorias procuram definir o
conceito do autor dentro de um sistema diferenciador. “
(BITENCOURT, Cezar. pg.1209)

A partir da leitura dos escritos de Bitencourt extraímos três


importantes conceitos inerentes ao de autoria. São eles: autoria
mediata, autoria colateral e coautoria.

Autoria mediata. Em linhas gerais, o autor mediato realiza a ação


típica através de outrem, isto é, utiliza o outro como instrumento. A
legislação, ao perceber essa situação, enxerga cinco momentos em
que se materializa a autoria mediata:
a) inimputabilidade penal do executor por menoridade penal,
embriaguez ou doença mental (CP, art. 62, III);
b) coação moral irresistível (CP, art. 22);
c) obediência hierárquica (CP, art. 22);
d) erro de tipo escusável, provocado por terceiro (CP, art. 20, § 2.°);
e e) erro de proibição escusável, provocado por terceiro (CP, art. 21,
caput).

Em teor exemplificativo, expõe-se o pensamento doutrinário:


(...)o decisivo para distinguir a natureza da responsabilidade do
homem de trás reside no domínio do fato. O executor, na condição de
instrumento, deve encontrar-se absolutamente subordinado em
relação ao mandante. (BITENCOURT, Cezar. pg.1218)

Por fim, não poderíamos deixar de alertar o leitor acerca dos casos
em que a designação de autoria mediata não vale, isto é, quando o
intermediário é consciente - e por isso, é inteiramente responsável
pelas consequências de seus atos -, assim como, nos casos de
delitos especiais de mão própria em que, por sua vez, só pode haver
participação – falso testemunho ou falsa perícia, art. 342, CP.

Autoria Colateral. Apesar de não integrar o concurso de agente,


demonstra-se imprescindível a citação do termo em questão para
que se tenha uma visão clara acerca dos demais institutos. Diremos
que ocorre caso de autoria colateral quando duas ou mais pessoas
executam ato típico de modo independente umas das outras, como
no caso de linchamento.

Há autoria colateral quando duas ou mais pessoas, ignorando uma a


contribuição da outra, realizam condutas convergentes objetivando a
execução da mesma infração penal. (...) A ausência do vínculo
subjetivo entre os intervenientes é o elemento caracterizador da
autoria colateral. (BITENCOURT, Cezar. pg.1236)
Coautoria. De modo simplório, porém objetivo e coerente, afirma-se
que o vocábulo “coautoria” designa a execução conjunta, com a
participação de mais de um agente, de uma mesma infração penal.
Aos olhos de Bitencourt:

É, portanto, a atuação consciente de estar contribuindo na realização


comum de uma infração penal. Essa consciência constitui o liame
psicológico que une a ação de todos, dando o caráter de crime
único. A resolução comum de executar o fato é o vínculo que
converte as diferentes partes em um todo único. (BITENCOURT,
Cezar. pg.1220)

Como exemplo inicial, recorremos ao crime tipificado pelo art. 157,


§2º, I e II do Código Penal. Em outras palavras, nos referimos ao
caso de “A” e “B” que, portando arma de fogo, ingressam em um
estabelecimento bancário, anunciam assalto e fogem do local após
subtraírem os valores almejados. Dando continuidade ao estudo do
conceito, salienta-se a classificação coautoria parcial (ou
funcional) e coautoria direta (ou material). Nada, ao nosso ver,
esclarece melhor o assunto que os dizeres de Masson:

Coautoria parcial, ou funcional, é aquela em que os diversos autores


praticam atos de execução diversos, os quais, somados, produzem o
resultado almejado. Exemplo: enquanto “A” segura a vítima, “B” a
esfaqueia, produzindo a sua morte.
Por sua vez, na coautoria direta ou material todos os autores
efetuam igual conduta criminosa. Exemplo: “A” e “B” efetuam
disparos de arma de fogo contra “C”, matando-o. (MASSON, Cleber.
pg. 507)

Autor. Dentre as inúmeras dissertações sobre o termo, buscaremos


realçar aquelas que fundamentam o modelo teórico incorporado pelo
Código Penal Brasileiro. Para fazê-lo, lembramos do art. 29, caput do
CP, “Quem, de qualquer modo, concorre para o crime incide nas
penas a este cominadas, na medida de sua culpabilidade”, pelo qual
se constata o acolhimento do conceito restritivo de autor, sob o
prisma da Teoria Objetivo-Formal.

Conceito restritivo de autor. Para compreendermos os caminhos


adotados pelo Direito brasileiro sobre o conceito de autor devemos,
antes de mais nada, tratar do conceito restritivo do autor. Segundo as
diretrizes desse termo, nem todos os intervenientes de um concurso
de crime são executores do mesmo, mas sim aquele ou aqueles que
praticam o verbo nuclear do ato típico.

(...)somente é autor quem realiza a conduta típica descrita na lei, isto


é, apenas o autor (ou coautores) pratica(m) o verbo núcleo do tipo:
mata, subtrai, falsifica etc. Sob essa perspectiva, os tipos penais da
Parte Especial devem ser interpretados de forma restritiva, pois, ao
contrário do conceito extensivo de autor, nem todo aquele que
interpõe uma causa realiza o tipo penal, pois causação não é igual
a realização do delito. (BITENCOURT, Cezar. pg.1211)

Esse modo de interpretar o concurso de realização de fato típico é


incorporado pela Teoria objetivo-formal e, a partir dessa perspectiva
primeira, estende-se sobre a relação autor e partícipe de modo
decisivo.

Teoria Objetivo-Formal. Agregando em seu seio o conceito restritivo


de autoria, a teoria adotada pelo Código Penal Brasileiro impõe que
seja designado o status de autor aquele agente que, em concurso
com outros indivíduos, se dispõe a exercer a ação típica ou nuclear
(ou ainda alguns de seus elementos) prevista em lei. Sob esse viés,
resta ao partícipe a conduta auxiliar no processo de cristalização do
crime.
Essa teoria atém-se à literalidade da descrição legal e define como
autor aquele cujo comportamento se amolda ao círculo abrangido
pela descrição típica e, como partícipe, aquele que produz qualquer
outra contribuição causal ao fato. (BITENCOURT, Cezar. pg.1213)

Ora, havemos de questionar, mas se nos limitamos a literalidade da


descrição legal, não seria o partícipe um agente auxiliar que, tendo
em vista a sua participação acessória ao delito, sairia impune? A
esse questionamento, nos responde Masson:

Destarte, a atuação do partícipe seria impune (no exemplo


fornecido, a conduta de auxiliar a matar não encontra
correspondência imediata no crime de homicídio) se não
existisse a norma de extensão pessoal prevista no art. 29,
caput, do Código Penal. A adequação típica, na participação, é
de subordinação mediata. Nesse contexto, o autor intelectual, e
dizer, aquele que planeja mentalmente a conduta criminosa, é
partícipe, e não autor, eis que não executa o núcleo do tipo
penal. Essa teoria é a preferida pela doutrina nacional e tem o
mérito de diferenciar precisamente a autoria da participação.
Falha, todavia, ao deixar em aberto o instituto da autoria
mediata. (MASSON, Cleber. pg. 502)

Participação. Com a responsabilidade de encerrar a nossa reflexão


introdutória, o exame do conceito “participação” é compreendido
como vital para o desenvolvimento de nosso estudo. Nessa
perspectiva, exaltamos o entendimento de Masson sobre o assunto:

É a modalidade de concurso de pessoas em que o sujeito não realiza


diretamente o núcleo do tipo penal, mas de qualquer modo concorre
para o crime (...) Portanto, a participação reclama dois requisitos: (1)
propósito de colaborar para a conduta do autor (principal); e (2)
colaboração efetiva, por meio de um comportamento acessório
que concorra para a conduta principal. (MASSON, Cleber. pg.
514)
A princípio, nos deparamos com dois elementos intrínsecos ao
instituto da participação; aquele referente a cooperação – auxílio ou
contribuição – na infração penal coletiva (elemento objetivo),
somado ao acordo de vontades, ou seja, a cooperação consciente e
livre do partícipe ao delito (elemento subjetivo). Tratado de seus
elementos estruturais, cabe a exaltação de suas espécies, ou seja,
analisar as espécies do instituto de participação: moral - em que se
faz necessário o discurso sobre os verbos induzir e instigar - ou
material – em que se faz necessário dissertar sobre o verbo auxiliar.

Participação moral é aquela em que a conduta do agente restringe-se


a induzir ou instigar terceira pessoa a cometer uma infração penal.
Não há colaboração com meios materiais, mas apenas com ideias de
natureza penalmente ilícitas. Induzir é fazer surgir na mente de
outrem a vontade criminosa, até então inexistente (...) Instigar é
reforçar a vontade criminosa que já existe na mente de outrem. Em
suma, o partícipe deve criar ou reforçar, frente a um indivíduo
determinado, o cometimento de uma infração penal também
determinada.
Por sua vez, na participação material a conduta do sujeito consiste
em prestar auxílio ao autor da infração penal. Auxiliar consiste em
facilitar, viabilizar materialmente a execução da infração penal, sem
realizar a conduta descrita pelo núcleo do tipo. (MASSON, Cleber. pg.
514)

Somente a partir da análise de seus elementos e de suas espécies é


que se mostra viável a verificação das teorias da punibilidade da
participação. Como antes já observado, nossa dissertação preza pela
objetividade e se atém a inspecionar o arquétipo teórico
predominante no Direito brasileiro.

Teoria da causação ou do favorecimento. Sob as diretrizes oriundas


dessa teoria, a participação apresenta um caráter autônomo e
independente perante a conduta típica do autor. Desse modo,
declara-se que se consolida na contribuição causal do partícipe para
a produção do resultado.

O fundamento da punição do partícipe, para essa teoria, reside no fato


de ter favorecido ou induzido o autor a praticar “um fato socialmente
intolerável, consequentemente típico e antijurídico”. O agente é
punível não porque colaborou na ação de outrem, mas porque, com a
sua ação ou omissão, contribuiu para que o crime fosse cometido. O
desvalor da participação no fato está em causar ou favorecer a
lesão não justificada de um bem jurídico tutelado por parte do
autor. É indiferente que o autor aja ou não culpavelmente.
(BITENCOURT, Cezar. pg.1227)

I. Concurso de Pessoas.
Em uma análise de nada simplória, desenvolveremos a problemática
em questão de modo muito além do estudo oriundo da interpretação
objetiva dos arts. 29 a 31 do Código Penal Brasileiro. Vabe ressaltar,
contudo, que a hermenêutica penal será, notadamente, o ponto de
partida de nossa reflexão.

TÍTULO IV
DO CONCURSO DE PESSOAS
Art. 29 - Quem, de qualquer modo, concorre para o crime incide nas
penas a este cominadas, na medida de sua culpabilidade. (Redação
dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)
§ 1º - Se a participação for de menor importância, a pena
pode ser diminuída de um sexto a um terço. (Redação dada pela Lei
nº 7.209, de 11.7.1984)
§ 2º - Se algum dos concorrentes quis participar de crime
menos grave, ser-lhe-á aplicada a pena deste; essa pena será
aumentada até metade, na hipótese de ter sido previsível o resultado
mais grave. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)
Circunstâncias incomunicáveis
Art. 30 - Não se comunicam as circunstâncias e as condições
de caráter pessoal, salvo quando elementares do crime. (Redação
dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

Casos de impunibilidade
Art. 31 - O ajuste, a determinação ou instigação e o auxílio,
salvo disposição expressa em contrário, não são puníveis, se o crime
não chega, pelo menos, a ser tentado.

i. Conceito.
Em linhas genéricas e objetivas, entende-se como concurso
de pessoas a colaboração empreendida por duas ou mais
pessoas para a realização de uma ação típica, antijurídica e
culpável. Ao buscarmos um olhar mais apurado, recorremos a
Bitencourt:

Frequentemente a ação delituosa é produto da concorrência de várias


condutas praticadas por sujeitos distintos. As razões que podem levar
o indivíduo a consorciar-se para a realização de uma empresa
criminosa podem ser as mais variadas: assegurar o êxito do
empreendimento delituoso, garantir a impunidade, possibilitar o
proveito coletivo do resultado do crime ou simplesmente satisfazer
outros interesses pessoais. Essa reunião de pessoas no cometimento
de uma infração penal dá origem ao chamado concursus
delinquentium. (BITENCOURT, Cezar. pg.1194)

ii. Requisitos do concurso de pessoas.


O instituo do concurso de pessoas fundamenta-se em cinco
requisitos. São eles:

a) Pluralidade de agentes culpáveis;


b) Relevância causal das condutas para a produção do resultado;
c) Vínculo subjetivo;
d) Unidade de infração penal para todos os agentes;
e) Existência de fato punível.

a) Pluralidade de agentes culpáveis: o concurso de pessoas pede


ao menos duas pessoas para a sua concretização e,
consequentemente, requer duas condutas relevantes penalmente.
Sob esse viés, entende-se que tais condutas podem ser
classificadas como principais (no caso de autoria), ou então uma
principal e outra acessória (praticadas pelo autor e pelo
partícipe, respectivamente). Ambos os casos, serão detalhados
mais adiante, por enquanto, nos elucida Bitencourt:

Embora todos os participantes desejam contribuir com sua ação na


realização de uma conduta punível, não o fazem, necessariamente,
da mesma forma e nas mesmas condições (...) A participação de
cada um e de todos contribuiu para o desdobramento causal do evento
e respondem todos pelo fato típico em razão da norma de extensão do
concurso. (BITENCOURT, Cezar. pg.1205)

b) Relevância causal das condutas para a produção do


resultado: constatar concorrência em uma infração penal condiz
na concepção de que mais de um indivíduo contribuiu, de
maneira relevante, para que o feito tenha ocorrido naqueles
moldes e naquela ocasião. Nada mais justo que se extrai da
doutrina uma arguição mais técnica sobre o tema:

O art. 29, caput, do Código Penal fala em “de qualquer modo”,


expressão que precisa ser compreendida como uma contribuição
pessoal, física ou moral, direita ou indireta, comissiva ou omissiva,
anterior ou simultânea à execução. Deve a conduta individual influir
efetivamente no resultado. Destarte, não pode ser considerado
coautor ou partícipe quem assume em relação á infração penal
uma atitude meramente negativa, quem não dá causa ao crime,
quem não realiza qualquer conduta sem a qual o resultado não tenha
se verificado. De fato, a participação inócua, que em nada concorre
para a realização do crime, é irrelevante para o Direito Penal.
Anote-se que esse requisito (relevância causal) depende de uma
contribuição prévia ou concomitante á execução, isto é, anterior à
consumação. A concorrência posterior à consumação configura crime
autônomo (receptação, favorecimento real ou pessoal, por exemplo),
mas não concurso de pessoas. Em tema de concurso de pessoas, a
contribuição pode até ser concretizada após a consumação, desde que
tenha sido ajustada anteriormente. (MASSON, Cleber. pg. 495)

Podemos ainda usufruir, exemplificativamente, da seguinte


situação, também presente nos escritos de Masson:

“A” se compromete, perante “B”, a auxiliá-lo a fugir e a escondê-lo


depois de matar “C”. Será partícipe do homicídio. Contudo, se
somente depois da morte de “C” se dispuser a ajudá-lo a subtrair-se da
ação da autoridade pública, não será partícipe do homicídio, mas autor
do crime de favorecimento pessoal (CP, art. 348). (MASSON,
Cleber. pg. 495)

Regressando aos escritos de Bitencourt, ressalta-se o esforço do


autor em expor a necessidade de um “liame causal” entre as
condutas individuais dos concorrentes ao crime, à saber:

A conduta típica ou atípica de cada participante deve integrar-se à


corrente causal determinante do resultado. Nem todo comportamento
constitui “participação”, pois precisa ter “eficácia causal”,
provocando, facilitando ou ao menos estimulando a realização da
conduta principal. (BITENCOURT, Cezar. pg.1206)

c) Vínculo subjetivo: esse requisito, também chamado de


concurso de vontades, exige que os agentes estejam ligados
por um vínculo de ordem subjetiva, um nexo psicológico. Se
assim não fosse, não poderíamos dizer que se trata de um
crime praticado em concurso, mas a prática de vários crimes
simultâneos, conforme nos orienta Cleber Masson:
“Os agentes devem revelar vontade homogênea, visando a produção
do mesmo resultado. É o que se convencionou chamar de princípio
da convergência. Logo, não é possível a contribuição dolosa para um
crime culposo, nem a concorrência culposa para um delito doloso.
(MASSON, Cleber. pg. 498)

Ora, o doutrinador relata um importante entendimento acerca do


vínculo entre os agentes, isto é, há de se manifestar um objetivo
em comum, um desejo predominante em todas as concepções
particulares, um mesmo crime. Para esclarecer nossas palavras:

“O simples conhecimento da realização de uma infração penal ou


mesmo a concordância psicológica caracterizam, no máximo,
“conivência”, que não é punível, a título de participação, se não
constituir, pelo menos, alguma forma de contribuição causal, ou,
então, constituir, por si mesma, uma infração típica. Tampouco será
responsabilizado como partícipe quem, tendo ciência da realização de
um delito, não o denuncia às autoridades, salvo se tiver o dever
jurídico de fazê-lo, como é o caso, por exemplo, da autoridade
pública. “ (BITENCOURT, Cezar. pg.1207)

d) Unidade de infração penal para todos os agentes: a legislação


brasileira adotou como orientação teórica a Teoria Monista ou
Unitária. Na prática, isso nos conduz a seguinte compreensão:
todos os que concorrem para um crime, respondem pelo mesmo.
Ao discorrer sobre o assunto, Bitencourt nos orienta que “Para
que o resultado da ação de vários participantes possa ser
atribuído a todos, “tem que consistir em algo juridicamente
unitário”. “ (BITENCOURT, Cezar. pg.1207)

Em regra, como visto, o Código Penal brasileira se curva perante


os ensinamentos da Teoria Monista. Entretanto, conforme nos
alerta Masson, excepcionalmente, manifestam-se casos em que,
com a “criação de tipos penais diversos para os agentes que
buscam um mesmo resultado” as condutas devem ser
individualizadas e, sendo assim, materializa-se o usufruto da
Teoria pluralista ou pluralística:

“É o que se dá, por exemplo, nos seguintes crimes:


a) aborto provocado por terceiro com o consentimento da
gestante: ao terceiro executor imputa-se o crime tipificado no art.,
126, enquanto para a gestante incide o crime previsto no art. 124, in
fine;
b) bigamia: quem já é casado pratica a conduta narrada no art., 235,
caput, ao passo que aquele que, não sendo casado, contrai casamento
com pessoa casada, conhecendo essa circunstância, incide na figura
típica prevista no § 1,° do citado dispositivo legal; c) corrupção
passiva e ativa: o funcionário público pratica corrupção passiva (art.,
317), e o particular, corrupção ativa (art. 333); e
d) falso testemunho ou falsa perícia: testemunha, perito, contador,
tradutor ou intérprete que faz afirmação falsa, nega ou fala a verdade
em processo judicial, ou administrativo, inquérito policial, ou em juízo
arbitrai pratica o crime delineado pelo art. 342, caput, e quem dá,
oferece ou promete dinheiro ou qualquer outra vantagem a tais
pessoas, almejando aquela finalidade, incide no art. 343, caput. ”
(MASSON, Cleber. pg. 501)

e) Existência de fato punível: esse último requisito nos alude a


uma coerente, porém, lógica característica do instituto de
concurso de pessoas; deve-se fazer valer, necessariamente, aos
indivíduos que concorrem para um mesmo tipo de infração penal
o princípio de exterioridade. Condição essa, muito bem abordada
pelo art. 31 do Código Penal nacional.

iii. Espécies de crimes quanto ao concurso de pessoas.


Uma vez familiarizados com os pilares essenciais do instituto
de concurso de pessoas, acredita-se que gozamos de
maturidade teórica necessária para darmos continuidade em
nosso estudo e, para fazê-lo, destacaremos as espécies
desse gênero penal.

a) Monossubjetivos ou de concurso eventual: são aqueles


que podem ser cometidos por um ou mais agentes infratores,
a exemplo o caso de homicídio, furto, latrocínio etc. Não é por
acaso, portanto, que constituem a maioria dos crimes
previstos na legislação brasileira e, consequentemente,
recebem uma grande atenção dos doutrinadores nacionais:

“Com efeito, a teoria do concurso de pessoas desenvolveu-se para


solucionar os problemas envolvendo os crimes unissubjetivos ou de
concurso eventual, que são aqueles em regra cometidos por uma
única pessoa, mas que admitem o concurso de agentes. Nesses
delitos, a culpabilidade dos envolvidos é fundamental, sob pena de
caracterização da autoria mediata. ” (MASSON, Cleber. pg. 496)

Em corroboração a esse pensamento, Esther de Figueiredo


Ferraz nos adverte:

“(...) tem por objeto o concurso eventual ou contingente, que


representa ao dizer de ANTOLISEI “a hipótese comum”, ou seja, a
dos crimes que, abstratamente considerados, podem ser praticados
indiferentemente por um só ou por vários indivíduos. Nessa hipótese
que corresponde á regra geral se enquadra a maioria dos crimes
definidos nas leis penais” (MASSON, Cleber. pg. 496)

b) Plurissubjetivos ou de concurso necessário: por sua vez,


essa espécie de concurso de pessoas refere-se a crimes que,
necessariamente, só podem ser praticados por dois ou mais
agentes em concurso. São os casos de quadrilha, bando, rixa
etc.

“Vale recordar que no tocante aos crimes plurissubjetivos,


plurilaterais ou de concurso necessário, é dizer, aqueles em que o
tipo penai exige a realização da conduta por dois ou mais agentes, a
culpabilidade de todos os coautores ou partícipes é prescindível.
Admite-se a presença de um único agente culpável, podendo os
demais enquadrar-se em categoria diversa. De fato, não se faz
necessária a utilização da norma de extensão prevista no art. 29, caput,
do Código Penal, uma vez que a presença de duas ou mais pessoas é
garantida pelo próprio tipo penal. Nessas espécies de crimes não se diz
“quem, de qualquer modo, concorre para o crime incide nas penas a
este cominadas, na medida de sua culpabilidade”, pois é a própria lei
penal incriminadora que, por si só, reclama a pluralidade de
pessoas. É o que se dá, por exemplo, nos crimes de rixa (CP, art.
137) e quadrilha ou bando (CP, art. 288), nos quais o crime estará
perfeitamente caracterizado quando existir entre os rixosos ou
quadrilheiros pessoas sem culpabilidade, desde que algum dos
envolvidos seja culpável. ” (MASSON, Cleber. pg. 496)

Ainda sobre a óptica de Masson, somos conduzidos a uma


análise mais abrangente sobre o tema de tal maneira que
vislumbramos a espécie de crimes eventualmente
plurissubjetivos. Nesses casos, nos atenta o doutrinador,
figura-se um crime que geralmente é executado por apenas
um agente, mas que quando resume-se em concurso agrega
pena maior à seus executores.

“Nesses crimes (necessariamente plurissubjetivos ou eventualmente


plurissubjetivos) há, portanto, um pseudo-concurso, concurso
impróprio, ou concurso aparente de pessoas. É o que se extraí da
lição de Manzini: Não se- pode, juridicamente, falar em participação
criminosa se pelo menos dois dentre os concorrentes não forem
capazes em termos de direito penal e imputáveis. Quando o fato
tenha sido cometido por duas pessoas, uma das quais não sejam
imputável, esta não será co-partícipe daquela, mas um simples
instrumento da primeira (non agíd sed agitur), a qual responde
sozinha pelo delito cometido. “ (MASSON, Cleber. pg. 497)
Espécies de crimes plurissubjetivos. O estudo sobre as
espécies de crimes plurissubjetivos baseia-se na análise das
condutas dos agentes executores da infração penal.

Tendo em vista essa orientação, constata-se a presença de


três classificações: condutas paralelas, condutas
convergentes e condutas contrapostas. Enquanto a
primeira refere-se as condutas que auxiliam-se mutuamente
objetivando a produção de um mesmo resultado, isto é,
centram esforços para a realização do crime – é o caso do
assalto a ônibus. Já, nas condutas convergentes os
comportamentos dos agentes tendem a afluir e desse
encontro surge o resultado pretendido, ou seja, são ações que
não se dirigem ao resultado, mas sim a outras ações – é o
exemplo do revogado crime de adultério. Por fim, discorre-se
sobre as condutas praticadas uma em oposição a outra, em
outros termos, os agentes são ao mesmo tempo autores e
vítimas – crime de rixa.

iv. Punibilidade no concurso de pessoas.


Nada teríamos nada a pontuar sobre o assunto se o Código
Penal se limitasse a regra, consagrada pelo art. 29, caput, de
que todos os intervenientes no fato típico devem responder
pelo mesmo crime – unidade do título de imputação. Todavia,
basta lembrarmos do §1º e §2º do mesmo artigo para
constatarmos um entendimento mais aprofundado sobre a
problemática da participação e cooperação no crime.

a) Participação de menor importância: em consonância


com a redação do art. 29, §1º - Se a participação for de
menor importância, a pena pode ser diminuída de um
sexto a um terço – devemos salientar que a participação,
nesse caso, refere-se, necessariamente, ao partícipe da
produção do fato típico, isto é, não se estende sobre uma
possível noção de “coautor”. Sob um olhar mais detalhado
e técnico, Masson complementa nosso pensamento:

Anote-se que a diminuição da pena se relaciona à participação, isto é,


ao comportamento adotado pelo sujeito, e não á sua pessoa. Portanto,
suas condições pessoais (primário ou reincidente, perigoso ou não)
não impedem a redução da reprimenda, se tiver contribuído
minimamente para a produção do resultado. (MASSON, Cleber. pg.
518)

b) Cooperação Dolosamente Distinta: entende-se que


ocorre cooperação dolosamente distinta quando um dos
agentes (incumbido de dolo) anseia cooperar na execução
de um fato típico menos grave e não do delito mais grave
executado. Sob essa perspectiva, a culpabilidade deverá
ser apreciada individualmente, com aplicação proporcional
de sanção penal, uma vez presente o caso de desvio
subjetivo de conduta. Para detalhar nosso argumento,
nossa arguição será montada em dois momentos: quanto a
primeira parte do art. 29, §2º, CP e quando a segunda a
parte do mesmo.

1º parte: § 2º - Se algum dos concorrentes quis participar


de crime menos grave, ser-lhe-á aplicada a pena deste.
Idealizado a partir de um sentimento de cautela perante a
possibilidade de aplicação da responsabilidade objetiva no
concurso de pessoas, as primeiras palavras desse
parágrafo pretendem explicitar a aplicação proporcional da
pena entre os agentes.

“A” e “B” combinam a prática do furto de um automóvel que estava


estacionado em via pública. Chegam ao local, e, quando tentavam
abrir a porta do veículo, surge seu proprietário. “A” foge, mas “B”,
que trazia consigo um revólver, circunstância que não havia
comunicado ao seu comparsa, atira na vítima, matando-a. Nesse caso,
“A” deve responder por tentativa de furto (CP, art. 155 c/c o art.
14, II), e “B” por latrocínio consumado (CP, art. 157, § 3.°, in fine).
(MASSON, Cleber. pg. 505)

2º parte: Essa pena será aumentada até a 1/2 (metade),


na hipótese de ter sido previsível o resultado mais grave.
Construído a concepção de que o agente aspirador da
infração penal menos grave deve contrair uma sanção
penal condizente com o grau negativo de seus atos, a
segunda parte do parágrafo visa retratar a possibilidade de
aumento em até ½ metade da pena, tendo constatado a
previsibilidade do resultado mais grave.

Imaginemos que, no exemplo indicado, “A” tivesse agido da mesma


forma, isto é, queria cometer um furto e evadiu-se com a chegada da
vítima. Era objetivamente previsível, contudo, o resultado mais
grave (latrocínio), pois tinha ciência de que “B” andava armado
com frequência e já tinha matado diversas pessoas. Se não
concorreu para o resultado mais grave, pois não quis dele participar,
responde pela tentativa de furto, com a pena aumentada da metade, em
face da previsibilidade do latrocínio. Essa previsibilidade deve ser
aferida de acordo com o juízo do homem médio, ou seja, o
resultado mais grave será previsível quando a sua visão prévia era
possível a um ser humano dotado de prudência razoável e inteligência
comum. (MASSON, Cleber. pg. 506)

v. Circunstâncias Incomunicáveis.
Ao nos limitarmos a leitura do Código Penal - art. 30 - Não se
comunicam as circunstâncias e as condições de caráter
pessoal, salvo quando elementares do crime -, extraímos a
seguinte definição acerca de nosso tópico atual: são as
circunstâncias que não alcançam os coautores ou partícipes
do delito, pois incidem exclusivamente sobre o autor ou
executor do verbo da infração penal. Contudo, a partir da
mesma orientação de análise, nos deparamos com a sentença
“salvo quando elementares do crime”. Para distinguirmos os
termos, recorreremos a Masson:

Elementares são os dados fundamentais de uma conduta criminosa.


São os fatores que integram a definição básica de uma infração penal.
No homicídio simples (CP, art. 121, caput), por exemplo, as
elementares são “matar” e “alguém”.
Circunstâncias, por sua vez, são os fatores que se agregam ao tipo
fundamentai, para o fim de aumentar ou diminuir a pena.
Exemplificativamente, no homicídio, que tem como elementares
“matar” e “alguém”, são circunstâncias o “relevante valor moral” (§
1.°), o “motivo torpe” (§ 2°, I) e o “motivo fútil” (§ 2.°, II), dentre
outras. (MASSON, Cleber. pg. 523)

Espécies de elementares e de circunstâncias. Somente a


partir da diferenciação de ambos os termos é que somos
capazes de classificá-los, de modo concomitante, e assim
darmos continuidade em nossa arguição. Nessa perspectiva,
vislumbra-se o caráter subjetivo ou de caráter pessoal –
aqueles referentes à pessoa do agente, isto é, a presença de
reincidência ou não, maioridade ou menoridade,
relacionamento agente-vítima sendo, portanto, indispensável
que a qualidade ou condição de sujeito ativo seja conhecida
pelo partícipe -, assim como, a possibilidade de aspecto
objetivo ou de caráter real – que, por sua vez, resumem-se a
infração penal executada, ou seja, tratam dos dados materiais
do delito e, por assim ser, são comunicáveis a todos os
agentes do crime.

II. Concurso de Crimes.


i. Conceito.
Buscando trazer ao leitor uma definição autêntica sobre o
instituto jurídico de concurso de crimes, diremos que o mesmo
se verifica quando o agente infrator, mediante conduta única
ou diversas, executa duas ou mais infrações penais. Em
corroboração ao nosso argumento, pontua-se os escritos do
saudoso Bitencourt:

Já constatamos que o crime tanto pode ser obra de um como de vários


sujeitos, ocorrendo, nessa hipótese, o “concurso de pessoas”, mas
pode, também, um único sujeito praticar dois ou mais crimes. Quando
um sujeito, mediante unidade ou pluralidade de comportamentos,
pratica dois ou mais delitos, surge o concurso de crimes —
concursus delictorum. (BITENCOURT, Cezar. pg.1273)

ii. Sistemas de aplicação de penas.


É unânime entre os jurisconsultos que o instituto de concurso
de crimes dá origem ao concurso de penas. Nesse contexto,
nos curvamos aos ensinamentos de Cleber Masson, no
momento em que o doutrinador pontua três modelos de
aplicação de penas que, aos seus olhos, repercutem no
cenário jurídico brasileiro. São eles: cúmulo material,
exasperação e absorção.

Sistema do cúmulo material. O mais simples e direto, ao


nosso ver, dos três sistemas de aplicação de pena, uma vez
salientado que aplica-se ao culpado a soma de suas sanções
penais referentes a cada ato típico executado.

Aplica-se ao réu o somatório das penas de cada uma das infrações


penais pelas quais foi condenado. Esse sistema foi adotado em
relação ao concurso material (art. 69), ao concurso formal imperfeito
ou impróprio (art. 70, caput, 2.a parte), e, peio texto da lei, ao
concurso das penas de multa (art. 72). (MASSON, Cleber. pg. 710)

A esse sistema de aplicação de pena, Bitencourt direciona


uma ressalva contundente: essa simples operação aritmética
pode resultar em uma pena muito longa, despropocionada
com a gravidade dos delitos, desnecessária e com amargos
efeitos criminógenos. É possível que o agente atinja a
ressocialização com pena menor (BITENCOURT, Cezar.
pg.1724).

Sistema de Exasperação. Segundo as diretrizes de tal


modelo, tendo em vista a responsabilidade do agente pela
execução de mais de uma infração penal, deve ser aplicado a
pena de apenas um dos crimes cometidos (o mais grave),
somado em um quantum.

Aplica-se somente a pena da infração penal mais grave praticada


pelo agente, aumentada de determinado percentual. É o sistema
acolhido em relação ao concurso formal próprio ou perfeito (art. 70,
caput, 1” parte) e ao crime continuado (art, 71). (MASSON, Cleber.
pg. 710)

Sistema da Absorção. Sistema amplamente utilizado em


casos de crimes falimentares, o modelo de aplicação penal da
absorção prevê, exclusivamente, a aplicação de pena da
infração penal mais grave.

Aplica-se exclusivamente a pena da infração penal mais grave,


dentre as diversas praticadas pelo agente, sem qualquer aumento.
Esse sistema foi consagrado pela jurisprudência em relação aos crimes
falimentares praticados pelo falido, sob a égide do Decreto-lei
7.66111945, em virtude do princípio da unidade ou unicidade dos
crimes falimentares. Isso, porém, não impedia o concurso material ou
formal entre um crime falimentar e outro delito comum. (MASSON,
Cleber. pg. 710)

iii. Espécies de concurso de crimes: tendo em vista o nosso


claro objetivo de arquitetar uma abordagem coerente e
detalhada acerca dos tópicos nos quais debruçamos o nosso
olhar analítico, não mediremos esforços para que as três
espécies de concurso de crimes – concurso material,
concurso formal e crime continuado – sejam amplamente
averiguadas.

a) Concurso Material: afirma-se tratar de caso concurso de


crimes material quando na produção de um ou mais crimes
idênticos (homogêneos) ou não (heterogêneos), perceber-
se mais de uma ação ou omissão por parte de um único
agente, conforme os ditames do art. 69 do Código Penal.

Há pluralidade de condutas e pluralidade de resultados. O agente,


por meio de duas ou mais condutas, pratica dois ou mais crimes,
pouco importando se os fatos ocorreram ou não no mesmo contexto
fático, (MASSON, Cleber. pg. 712)

Consequência. Convencionou-se adotar para essa


espécie de concurso de crimes o sistema de cúmulo
matéria de pena, ou seja, aplica-se ao réu o somatório dos
crimes cometidos. Vale a ressalva, de que a soma das
penas privativas de liberdade não pode ultrapassar,
conforme estabelece o art. 75, CP, de quarenta anos.

b) Concurso Formal: ocorre em situações fáticas nas quais


o agente, mediante a produção de apenas uma conduta,
exerce dois ou mais fatos típicos idênticos (homogêneos)
ou não (heterogêneos), consagrando uma única finalidade
(perfeito) ou, através de uma conduta externa, seus
desígnios autônomos (imperfeito).

Nessa espécie de concurso há unidade de ação e pluralidade de


crimes. Assim, para que haja concurso formal é necessário que exista
uma só conduta, embora possa desdobrar-se em vários atos, que são os
segmentos em que esta se divide. (BITENCOURT, Cezar. pg.1226)
Concurso formal homogêneo. Designado para a
execução de crimes idênticos a partir de uma mesma
conduta do sujeito ativo – um indivíduo, de forma
imprudente, sobe a calçada com seu veículo e fere várias
pessoas; contrai a pena de lesão corporal culposa (art.
129, §6º. Como consequência, aplica-se apenas uma
pena, com o aumento de um sexto até metade.

Concurso formal heterogêneo. Afirma-se, por sua vez,


heterogêneo o concurso formal em que se presencia
delitos diversos, originários de uma mesma conduta – no
mesmo exemplo supra, o indivíduo mata uma vítima e fera
as demais. O efeito repressivo para esse caso baseia-se
na aplicação da pena mais grave, aumentada de um sexto
até a metade.

Concurso Formal Perfeito ou impróprio. Caracterizado


pela apuração de que o agente infrator comportava apenas
uma finalidade, argumento pelo qual se sustenta a
aplicação do sistema de exasperação da pena. Ou seja,
aplica-se ao réu a pena de apenas um dos crimes
praticados (o de maior pena), aumentado em um quantum
(1/6 até a ½).

O concurso formal pode ser próprio (perfeito), quando a unidade de


comportamento corresponder à unidade interna da vontade do agente,
isto é, o agente deve querer realizar apenas um crime, obter um
único resultado danoso. Não devem existir — na expressão do
Código — desígnios autônomos. (BITENCOURT, Cezar. pg.1726)

Concurso formal Imperfeito ou impróprio. Espécie de


concurso formal em que se apura uma conduta dolosa e
crimes concorrentes oriundos de desígnios autônomos –
isto é, propósito de produzir, mediante a execução de uma
conduta, mais de uma infração penal. Como medida
punitiva, consagrou-se aquelas derivadas do sistema de
cúmulo material.

(...) no concurso formal impróprio aplica-se o sistema do cúmulo


material, como se fosse concurso material, diante da diversidade de
intuitos do agente (art. 70, § 2º). (BITENCOURT, Cezar. pg.1727)

c) Crime continuado: também tutelado pelo Código Penal


brasileiro, art. 71, o crime continuado resume-se na
produção de mais de um crime, necessariamente, da
mesma espécie, mediante a execução de mais de uma
conduta por parte do autor. Para esclarecer nossa
definição, nos amparamos em Bitencourt:

São diversas ações, cada uma em si mesma criminosa, que a lei


considera, por motivos de política criminal, como um crime único. A
regra do crime continuado deve ser aplicada tendo em vista o caso
concreto e sob a inspiração das mesmas razões da política criminal
que o inspiraram. (BITENCOURT, Cezar. pg.1728)

Nos momentos de continuidade delitiva, será direcionado,


se idênticos os delitos, a pena de um só dos crimes com o
acréscimo de um sexto a dois terços. Já, se os crimes
forem diversos, aplica-se a mais grave com a possibilidade
de aumento de um sexto a dois terços.

Requisitos do crime continuado. Ao interpelarmos as


linhas do art. 71, caput, do CP percebemos alguns
requisitos de existência do crime continuado. São eles:
pluralidade de condutas, pluralidade de crimes da mesma
espécie, conexão temporal, conexão espacial, conexão
modal, conexão ocasional e outras semelhantes.
Pluralidade de condutas. A redação do Código Penal é
explícito ao requerer mais de uma ação ou omissão para a
aplicação da expressão crime continuado. Masson, nessa
óptica, o compara com o concurso – ambos reclamam
essa característica - no intuito de nos fazer uma ressalva:

Tal como no concurso material, o crime continuado reclama uma


pluralidade de condutas, o que não se confunde com a mera
pluralidade de atos. Repita-se, nada impede seja uma conduta
composta de diversos atos. (MASSON, Cleber. pg. 719)
Pluralidade de crimes da mesma espécie. É extensa e
infrutífera para nós, tendo em vista o objetivo de nossa
dissertação, o embate doutrinário referente a expressão
mesma espécie. Dito isso, nos amparamos nos escritos de
Julio Fabbrini Mirabete, em que se sustenta que o
entendimento majoritário prevê que: “há continuação,
portanto, entre crimes que se assemelham nos seus tipos
fundamentais, por seus elementos objetivos e subjetivos,
violadores também do mesmo interesse jurídico”.

Conexão temporal. Entende-se como exigência da letra


da lei que deve-se levar em consideração o intervalo de
tempo entre um delito e outro. Antes de nos atermos a
doutrina, faz-se necessário salientar que nos referimos a
conexão temporal, de fato, e não de imediatismo
cronológico.

Deve existir, em outros termos, uma certa periodicidade que


permita observar-se um certo ritmo, uma certa uniformidade,
entre as ações sucessivas, embora não se possam fixar, a respeito,
indicações precisas. (BITENCOURT, Cezar. pg.1734)
Conexão espacial. Reclama-se ainda que os delitos
sejam consumados em circunstância de lugar
semelhantes. A jurisprudência, alude Masson, fixou o
entendimento devem os crimes serem concretizados na
mesma cidade, ou no máximo em municípios contíguos.
Em colaboração a essa concepção, intervém Nelson
Hungria:

Não é necessário que seja sempre o mesmo lugar, mas a diversidade


de lugares pode ser tal que se torne incompatível com a ideia de uma
série continuada de ações para a realização de um só crime. É a
consideração total das condições mais do que de cada uma delas
que permite concluir pela continuidade ou não do crime.

Conexão modal. Exige-se ainda um padrão análogo na


execução das diversas condutas do autor, isto é, uma
semelhança no modo de produção pelo qual os delitos são
arquitetados.

A lei exige semelhança e não identidade. A semelhança na “maneira


de execução” se traduz no modus operandi de realizar a conduta
delitiva. (BITENCOURT, Cezar. pg.1735)

Conexão ocasional. Ainda que não prevista em lei, a


presença de um liame entre os momentos anteriores a
execução dos crimes é amplamente requisita pelo
entendimento doutrinário nacional.

Outras semelhantes. Expressão extraída da redação do


art. 71 do Código Penal brasileiro, recebe desenvolvimento
doutrinário e germina, entre outros requisitos, a
circunstância de mesma oportunidade e mesma situação
propícias para a prática do crime. Os exemplos lembrados
por Hungria sobre o assunto são: o doméstico subtrai
diariamente charutos ao patrão; o morador da causa
frauda, por vezes sucessivas, o medido de luz elétrica; e,
por fim, o coletor de rendas apropria-se, por várias vezes,
do dinheiro do estado. O que nos leva a concordar com
Bitencourt, quando o mesmo menciona que:
Por essa expressão, a lei faculta a investigação de circunstâncias que
se assemelhem às enunciadas e que podem caracterizar o crime
continuado. Essa expressão genérica — “e outras semelhantes” — tem
a finalidade de abranger quaisquer outras circunstâncias das quais
se possa deduzir a ideia de continuidade delitiva. (BITENCOURT,
Cezar. pg.1735)

d) Crime continuado específico: encontra-se sob tutela da


legislação penal brasileira, art. 71, parágrafo único, o
intitulado crime continuado específico. A diferença entre os
termos, ao nosso ver, resumem-se no acréscimo de três
requisitos existenciais singulares a esse conceito - vítimas
diferentes, violência ou grave ameaça à pessoa e dolo – e
ainda, na aplicação da pena – em que são levado em
consideração a culpabilidade; os antecedentes; a conduta
social; a personalidade; os motivos e outras circunstâncias
do crime.

iv. Limite das penas: conforme previsto no art. 75, caput, exige-
se que o tempo de consagração das penas privativas de
liberdade não extrapole o limite de quarenta anos. Outra
importante questão a ser avaliada, seria o caso de cúmulo
material benéfico, em que, tendo em vista a sua consonância
com o artigo citado, impossibilita que a regra de concurso
formal perfeito material – o mesmo se observa no crime
continuado - ultrapasse o quantum de pena que seria obtido
pela regra do concurso material. Logo, se um indivíduo se
dispõe a praticar 10 latrocínios, cuja punição seria de 300
anos, em virtude das regras do concurso material, será
tutelado pelo art. 75 do CP e contrairá pena de 40 anos. No
entanto, alerta-se que seus benefícios de progresso
(progressão, livramento etc.) estarão atrelados a partir de sua
condenação inicial, ou seja, ele terá que cumprir 1/6 de 300
para pleitear a progressão, mas necessariamente será liberto
após 40 anos.

III. Referências bibliográficas:


BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal – Parte
Geral 1. São Paulo: Saraiva, 2021;
BITENCOURT, Cezar Roberto. Código Penal Comentado. São
Paulo: Saraiva, 2016.
Direito Penal - Parte Geral (Arts. 1º a 120) - Vol. 1 - 2021
SOUZA, Taiguara Libano Soares e. Apostila de Direito Penal I.

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