06 Direitos Humanos

Fazer download em pdf ou txt
Fazer download em pdf ou txt
Você está na página 1de 53

DEPEN PR

Policial Penal

DIREITOS HUMANOS

O início da proteção internacional de Direitos Humanos: direito internacional humani-


tário, direito internacional dos refugiados e o surgimento da organização internacional
do trabalho ..................................................................................................................... 1

DIREITOS HUMANOS
Características dos direitos humanos. Interpretação e aplicação dos tratados interna-
cionais de direitos humanos. Dignidade da pessoa humana........................................... 11
Sistemas internacionais de proteção e promoção dos Direitos Humanos Sistema glo-
bal de direitos humanos. Organização das Nações Unidas: declarações, tratados, re-
soluções, comentários gerais, relatórios e normas de organização e funcionamento
dos órgãos de supervisão, fiscalização e controle. Órgãos convencionais e extra con-
vencionais ..................................................................................................................... 11
Sistema interamericano de direitos humanos. Organização dos estados americanos:
declarações, tratados, resoluções, relatórios, informes, jurisprudência (contenciosa e
consultiva da corte interamericana de Direitos Humanos), opiniões consultivas, nor-
mas de organização e funcionamento dos órgãos de supervisão, fiscalização e con-
trole. Relatorias temáticas e por países. Audiências públicas ......................................... 24
Sistemas regionais de proteção dos direitos humanos ................................................... 27
A incorporação dos tratados internacionais de proteção dos direitos humanos ao di-
reito brasileiro. Posição hierárquica dos tratados internacionais de direitos humanos.
A aplicabilidade das normas contidas em tratados internacionais de direitos humanos
ratificados pelo Brasil. A execução de decisões oriundas de tribunais internacionais de
direitos humanos no Brasil. Controle de Convencionalidade ................................................. 29
A proteção dos grupos socialmente vulneráveis pelo direito internacional dos direitos
humanosMecanismos de proteção aos direitos humanos na Constituição Federal .......... 33
Direitos humanos de natureza civil, política, social, econômica, cultural e ambiental ....... 40
Direitos humanos de titularidade individual, coletiva ou difusa ........................................ 42
Exercícios ..................................................................................................................................... 46
Gabarito ........................................................................................................................ 52
Teoria geral dos direitos humanos. Conceito, fundamentos e bases teóricas e filosófi-
cas dos direitos humanos

Os Direitos Humanos correspondem a uma disciplina e um ramo de extrema importância e relevância no


Direito, não só pelos seus princípios e precedentes normativos, mas por sua especificidade e a aplicabilidade,
sobretudo no Brasil, ante as obrigações assumidas pelo Estado brasileiro no plano internacional e toda a
complexidade que a temática envolve na atualidade. Ao nascer, todo ser humano é livre, mas adquire direitos
e deveres para a posteridade, dentre eles, diversos intrínsecos ao exercício e manutenção de sua própria
dignidade.

O conceito de direitos humanos


“Os direitos humanos consistem em um conjunto de direitos considerado indispensável para uma vida hu-
mana pautada na liberdade, igualdade e dignidade. Os direitos humanos são os direitos essenciais e indispen-
sáveis à vida digna” (RAMOS, 2020, p. 24).
Os Direitos Humanos são, portanto, direitos naturais de todos os homens, como aspectos essenciais da con-
dição humana. Como normas universais de reconhecimento e proteção, a expressão “direitos humanos” indica
aquilo que é inerente à própria existência do homem e não há um rol predeterminado desse conjunto mínimo
de direitos essenciais.
Princípios
Vários são os princípios que norteiam a temática dos Direitos Humanos, mas vale a pena destacar o princípio
da dignidade da pessoa humana, núcleo dos direitos fundamentais e vai além de qualquer normatização jurídica,
uma vez que, como parte essencial da pessoa humana, é anterior ao Direito, diretamente ligado ao direito à
vida e à igualdade ou isonomia.
Tem-se também o princípio básico da não-discriminação no Direito Internacional dos Direitos Humanos,
uma vez que todos os indivíduos são iguais como seres humanos e pela dignidade de cada pessoa humana,
fazem jus ao exercício de seus direitos sem discriminação de raça, cor, sexo, etnia, idade, idioma, religião,
nacionalidade, preferência política, condição física e social, orientação sexual e identidade de gênero. O
princípio da não-discriminação remete-se também ao princípio basilar da isonomia, ou igualdade.
E ainda, o princípio da primazia (ou prevalência) da norma mais favorável às vítimas que diz que em caso
de conflito de normas de Direitos Humanos, sejam elas de direito interno ou internacional, será aplicada a
norma que for mais favorável à vítima que sofrer quaisquer tipos de violações em seus direitos e garantias
fundamentais. Esse princípio reduz ou minimiza divergências de aplicação de preceitos e normas de direitos
humanos.
Características
Os direitos humanos são: históricos, frutos de conquistas graduais e de um processo de evolução ao longo
do tempo; universais e devem alcançar a todos os seres humanos indistintamente; relativos: não são absolutos
e podem sofrer limitações; irrenunciáveis pois, inerentes à condição humana, ninguém pode abrir mão de sua
própria natureza; inalienáveis, pois não podem ser transacionados ou condicionados, imprescritíveis, uma vez
que não se perdem com o passar do tempo.
Os direitos humanos são ainda autônomos e interdependentes, complementares e indivisíveis, devendo
ser interpretados de forma conjunta e interativa com os demais direitos e não isoladamente, sempre sujeitos à
proteção jurisdicional efetiva nos níveis nacional e internacional.
Gerações de Direitos Humanos (Teoria de Vasak):
– Direitos Humanos de 1ª Geração: liberdade individual – direitos civis e políticos;
– Direitos Humanos de 2ª Geração: igualdade – direitos sociais e econômicos;
– Direitos Humanos de 3ª Geração: fraternidade ou solidariedade – direitos transindividuais, difusos e cole-
tivos.

1
— Fundamentos filosóficos dos Direitos Humanos
Filosoficamente, os direitos humanos apresentam na contemporaneidade não só fundamentos e
características do naturalismo, como também do contratualismo, dado o expresso reconhecimento dos
documentos internacionais que versam sobre direitos humanos – tratados, acordos, convenções etc., pelas
nações.

– Jusnaturalismo: teoria ou corrente filosófica pautada no direito natural, no que é justo por natureza, e
consubstancia-se no direito inerente à própria condição do homem nascido com vida.
– Positivismo: corrente filosófica consistente no Direito Positivo, juspositivismo ou contratualismo,
correspondente ao direito convencionado, imposto por força das leis e convenções.
O Direito Humanitário, o Direito dos Refugiados e o Direito Internacional dos Direitos Humanos formam,
juntos, as três vertentes jurídicas dos Direitos Humanos no plano internacional e de proteção à pessoa humana.
O Direito Internacional dos Direitos Humanos é o ramo do Direito Internacional que tem por principal objetivo
proteger e promover a dignidade humana em caráter universal e imperativo, consubstanciado no interesse
da paz e do bem comum, a todos os Estados. Por sua vez, o Direito Humanitário é revelado através de um
conjunto de normas internacionais pautadas nas convenções e costumes aplicados especificamente nos casos
de guerra ou conflitos armados. Visam a proteção internacional das vítimas de conflitos armados, e a limitação
dos meios e dos métodos de combate, nos termos da Convenção de Genebra, de 1949. E, o Direito dos
refugiados, pautado no Estatuto da ONU sobre os Refugiados, de 1951 visa proteger toda pessoa ameaçada
de perseguição por motivos políticos, raciais ou sociais que a coloquem em perigo iminente de vida ou fundado
receio de dano à sua integridade física. Em que pesem, portanto, as particularidades, todas as vertentes
convergem para a proteção Internacional da Pessoa Humana e a garantia da manutenção de sua dignidade e
integridade em caráter universal.
Evolução e importância histórica dos Direitos Humanos
Apesar de sua expressão moderna, os Direitos Humanos têm raízes para além da modernidade, tendo em
vista a antiga inclinação humana para o senso de justiça. A verdadeira consolidação dos Direitos Humanos se
deu em meados do século XX, como um fenômeno do pós-guerra, em resposta às atrocidades e os horrores
do nazismo. Diante da necessidade de resguardar e efetivar os direitos fundamentais da pessoa humana,
foram surgindo normas que tutelam os bens primordiais da vida. E, dentre esses bens primordiais, a dignidade
humana tornou-se princípio basilar dos Direitos Humanos, trazendo novos direitos e acepções à legislação.

Historicamente, desde a Antiguidade, na fase pré-Estado Constitucional a afirmação dos direitos humanos
tem influência da Democracia Ateniense, da República Romana, do Cristianismo da Idade Média, das revoluções
liberais e das ideias iluministas até a sua internacionalização e constitucionalização. Somente num momento
histórico posterior ao absolutismo se permitiu algum resgate da aproximação entre a Moral e o Direito, qual seja
o da Revolução Intelectual dos séculos XVII e XVIII, com o movimento do Iluminismo, que conferiu alicerce para
as Revoluções Francesa e Industrial. O Iluminismo lançou base para os principais eventos que ocorreram no
início da Idade Contemporânea, quais sejam as Revoluções Francesa, Americana e Industrial.
No final do século XIX e no início de século XX, o mundo passou por variadas crises de instabilidade
diplomática, posto que vários países possuíam condições suficientes para se sobreporem sobre os demais,
resultado dos avanços tecnológicos e das melhorias no padrão de vida da sociedade. Neste contexto, surgiram
condições para a eclosão das duas Guerras Mundiais, eventos que alteraram o curso da história da civilização
ocidental.

Embora o processo de internacionalização dos direitos humanos tenha antecedentes no pós-Primeira Guerra
Mundial, notadamente, com a criação da Liga das Nações e da Organização Internacional do Trabalho com
o Tratado de Versalhes de 1919, é no pós-Segunda Guerra Mundial que se encontram as bases do direito
internacional dos direitos humanos.
Os eventos da Segunda Guerra Mundial foram marcados por retrocesso e desumanização em matéria de
Direitos Humanos, com o devido respaldo jurídico do ordenamento dos países bélicos.

2
A perspectiva contemporânea de direitos humanos emerge no contexto do Pós-Segunda Guerra Mundial,
tendo como marcos:a Carta da ONU, de 1945, que institui a Organização das Nações Unidas e a Declaração
Universal dos Direitos Humanos, de 1948, que é o primeiro documento a reconhecer materialmente os direitos
humanos.
DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS DIREITOS HUMANOS
ADOTADA E PROCLAMADA PELA ASSEMBLEIA GERAL DAS NAÇÕES UNIDAS (RESOLUÇÃO
217 A III) EM 10 DE DEZEMBRO 1948.
Preâmbulo
Considerando que o reconhecimento da dignidade inerente a todos os membros da família humana e de
seus direitos iguais e inalienáveis é o fundamento da liberdade, da justiça e da paz no mundo,
Considerando que o desprezo e o desrespeito pelos direitos humanos resultaram em atos bárbaros que
ultrajaram a consciência da humanidade e que o advento de um mundo em que mulheres e homens gozem de
liberdade de palavra, de crença e da liberdade de viverem a salvo do temor e da necessidade foi proclamado
como a mais alta aspiração do ser humano comum,
Considerando ser essencial que os direitos humanos sejam protegidos pelo império da lei, para que o ser
humano não seja compelido, como último recurso, à rebelião contra a tirania e a opressão,
Considerando ser essencial promover o desenvolvimento de relações amistosas entre as nações,
Considerando que os povos das Nações Unidas reafirmaram, na Carta, sua fé nos direitos fundamentais do
ser humano, na dignidade e no valor da pessoa humana e na igualdade de direitos do homem e da mulher e
que decidiram promover o progresso social e melhores condições de vida em uma liberdade mais ampla,
Considerando que os Países-Membros se comprometeram a promover, em cooperação com as Nações
Unidas, o respeito universal aos direitos e liberdades fundamentais do ser humano e a observância desses
direitos e liberdades,
Considerando que uma compreensão comum desses direitos e liberdades é da mais alta importância para o
pleno cumprimento desse compromisso,
Agora portanto a Assembleia Geral proclama a presente Declaração Universal dos Direitos Humanos como o
ideal comum a ser atingido por todos os povos e todas as nações, com o objetivo de que cada indivíduo e cada
órgão da sociedade tendo sempre em mente esta Declaração, esforce-se, por meio do ensino e da educação,
por promover o respeito a esses direitos e liberdades, e, pela adoção de medidas progressivas de caráter nacio-
nal e internacional, por assegurar o seu reconhecimento e a sua observância universais e efetivos, tanto entre
os povos dos próprios Países-Membros quanto entre os povos dos territórios sob sua jurisdição.
Artigo 1
Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e direitos. São dotados de razão e consciência
e devem agir em relação uns aos outros com espírito de fraternidade.
Artigo 2
1. Todo ser humano tem capacidade para gozar os direitos e as liberdades estabelecidos nesta Declaração,
sem distinção de qualquer espécie, seja de raça, cor, sexo, língua, religião, opinião política ou de outra nature-
za, origem nacional ou social, riqueza, nascimento, ou qualquer outra condição.
2. Não será também feita nenhuma distinção fundada na condição política, jurídica ou internacional do país
ou território a que pertença uma pessoa, quer se trate de um território independente, sob tutela, sem governo
próprio, quer sujeito a qualquer outra limitação de soberania.
Artigo 3
Todo ser humano tem direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal.
Artigo 4
Ninguém será mantido em escravidão ou servidão; a escravidão e o tráfico de escravos serão proibidos em
todas as suas formas.

3
Artigo 5
Ninguém será submetido à tortura, nem a tratamento ou castigo cruel, desumano ou degradante.
Artigo 6
Todo ser humano tem o direito de ser, em todos os lugares, reconhecido como pessoa perante a lei.
Artigo 7
Todos são iguais perante a lei e têm direito, sem qualquer distinção, a igual proteção da lei. Todos têm direito
a igual proteção contra qualquer discriminação que viole a presente Declaração e contra qualquer incitamento
a tal discriminação.
Artigo 8
Todo ser humano tem direito a receber dos tribunais nacionais competentes remédio efetivo para os atos que
violem os direitos fundamentais que lhe sejam reconhecidos pela constituição ou pela lei.
Artigo 9
Ninguém será arbitrariamente preso, detido ou exilado.
Artigo 10
Todo ser humano tem direito, em plena igualdade, a uma justa e pública audiência por parte de um tribunal
independente e imparcial, para decidir seus direitos e deveres ou fundamento de qualquer acusação criminal
contra ele.
Artigo 11
1. Todo ser humano acusado de um ato delituoso tem o direito de ser presumido inocente até que a sua cul-
pabilidade tenha sido provada de acordo com a lei, em julgamento público no qual lhe tenham sido asseguradas
todas as garantias necessárias à sua defesa.
2. Ninguém poderá ser culpado por qualquer ação ou omissão que, no momento, não constituíam delito
perante o direito nacional ou internacional. Também não será imposta pena mais forte de que aquela que, no
momento da prática, era aplicável ao ato delituoso.
Artigo 12
Ninguém será sujeito à interferência na sua vida privada, na sua família, no seu lar ou na sua correspondên-
cia, nem a ataque à sua honra e reputação. Todo ser humano tem direito à proteção da lei contra tais interfe-
rências ou ataques.
Artigo 13
1. Todo ser humano tem direito à liberdade de locomoção e residência dentro das fronteiras de cada Estado.
2. Todo ser humano tem o direito de deixar qualquer país, inclusive o próprio e a esse regressar.
Artigo 14
1. Todo ser humano, vítima de perseguição, tem o direito de procurar e de gozar asilo em outros países.
2. Esse direito não pode ser invocado em caso de perseguição legitimamente motivada por crimes de direito
comum ou por atos contrários aos objetivos e princípios das Nações Unidas.
Artigo 15
1. Todo ser humano tem direito a uma nacionalidade.
2. Ninguém será arbitrariamente privado de sua nacionalidade, nem do direito de mudar de nacionalidade.
Artigo 16
1. Os homens e mulheres de maior idade, sem qualquer restrição de raça, nacionalidade ou religião, têm o
direito de contrair matrimônio e fundar uma família. Gozam de iguais direitos em relação ao casamento, sua
duração e sua dissolução.
2. O casamento não será válido senão com o livre e pleno consentimento dos nubentes.

4
3. A família é o núcleo natural e fundamental da sociedade e tem direito à proteção da sociedade e do Estado.
Artigo 17
1. Todo ser humano tem direito à propriedade, só ou em sociedade com outros.
2. Ninguém será arbitrariamente privado de sua propriedade.
Artigo 18
Todo ser humano tem direito à liberdade de pensamento, consciência e religião; esse direito inclui a liberda-
de de mudar de religião ou crença e a liberdade de manifestar essa religião ou crença pelo ensino, pela prática,
pelo culto em público ou em particular.
Artigo 19
Todo ser humano tem direito à liberdade de opinião e expressão; esse direito inclui a liberdade de, sem
interferência, ter opiniões e de procurar, receber e transmitir informações e idéias por quaisquer meios e inde-
pendentemente de fronteiras.
Artigo 20
1. Todo ser humano tem direito à liberdade de reunião e associação pacífica.
2. Ninguém pode ser obrigado a fazer parte de uma associação.
Artigo 21
1. Todo ser humano tem o direito de tomar parte no governo de seu país diretamente ou por intermédio de
representantes livremente escolhidos.
2. Todo ser humano tem igual direito de acesso ao serviço público do seu país.
3. A vontade do povo será a base da autoridade do governo; essa vontade será expressa em eleições peri-
ódicas e legítimas, por sufrágio universal, por voto secreto ou processo equivalente que assegure a liberdade
de voto.
Artigo 22
Todo ser humano, como membro da sociedade, tem direito à segurança social, à realização pelo esforço
nacional, pela cooperação internacional e de acordo com a organização e recursos de cada Estado, dos direitos
econômicos, sociais e culturais indispensáveis à sua dignidade e ao livre desenvolvimento da sua personalida-
de.
Artigo 23
1. Todo ser humano tem direito ao trabalho, à livre escolha de emprego, a condições justas e favoráveis de
trabalho e à proteção contra o desemprego.
2. Todo ser humano, sem qualquer distinção, tem direito a igual remuneração por igual trabalho.
3. Todo ser humano que trabalha tem direito a uma remuneração justa e satisfatória que lhe assegure, assim
como à sua família, uma existência compatível com a dignidade humana e a que se acrescentarão, se neces-
sário, outros meios de proteção social.
4. Todo ser humano tem direito a organizar sindicatos e a neles ingressar para proteção de seus interesses.
Artigo 24
Todo ser humano tem direito a repouso e lazer, inclusive a limitação razoável das horas de trabalho e a férias
remuneradas periódicas.
Artigo 25
1. Todo ser humano tem direito a um padrão de vida capaz de assegurar a si e à sua família saúde, bem-es-
tar, inclusive alimentação, vestuário, habitação, cuidados médicos e os serviços sociais indispensáveis e direito
à segurança em caso de desemprego, doença invalidez, viuvez, velhice ou outros casos de perda dos meios de
subsistência em circunstâncias fora de seu controle.

5
2. A maternidade e a infância têm direito a cuidados e assistência especiais. Todas as crianças, nascidas
dentro ou fora do matrimônio, gozarão da mesma proteção social.
Artigo 26
1. Todo ser humano tem direito à instrução. A instrução será gratuita, pelo menos nos graus elementares e
fundamentais. A instrução elementar será obrigatória. A instrução técnico-profissional será acessível a todos,
bem como a instrução superior, esta baseada no mérito.
2. A instrução será orientada no sentido do pleno desenvolvimento da personalidade humana e do fortale-
cimento do respeito pelos direitos do ser humano e pelas liberdades fundamentais. A instrução promoverá a
compreensão, a tolerância e a amizade entre todas as nações e grupos raciais ou religiosos e coadjuvará as
atividades das Nações Unidas em prol da manutenção da paz.
3. Os pais têm prioridade de direito na escolha do gênero de instrução que será ministrada a seus filhos.
Artigo 27
1. Todo ser humano tem o direito de participar livremente da vida cultural da comunidade, de fruir as artes e
de participar do progresso científico e de seus benefícios.
2. Todo ser humano tem direito à proteção dos interesses morais e materiais decorrentes de qualquer pro -
dução científica literária ou artística da qual seja autor.
Artigo 28
Todo ser humano tem direito a uma ordem social e internacional em que os direitos e liberdades estabeleci-
dos na presente Declaração possam ser plenamente realizados.
Artigo 29
1. Todo ser humano tem deveres para com a comunidade, na qual o livre e pleno desenvolvimento de sua
personalidade é possível.
2. No exercício de seus direitos e liberdades, todo ser humano estará sujeito apenas às limitações deter-
minadas pela lei, exclusivamente com o fim de assegurar o devido reconhecimento e respeito dos direitos e
liberdades de outrem e de satisfazer as justas exigências da moral, da ordem pública e do bem-estar de uma
sociedade democrática.
3. Esses direitos e liberdades não podem, em hipótese alguma, ser exercidos contrariamente aos objetivos
e princípios das Nações Unidas.
Artigo 30
Nenhuma disposição da presente Declaração pode ser interpretada como o reconhecimento a qualquer Es-
tado, grupo ou pessoa, do direito de exercer qualquer atividade ou praticar qualquer ato destinado à destruição
de quaisquer dos direitos e liberdades aqui estabelecidos.

O início da proteção internacional de Direitos Humanos: direito internacional humani-


tário, direito internacional dos refugiados e o surgimento da organização internacional
do trabalho

O Direito Internacional Humanitário tem suas raízes a partir da situação mundial pós-guerra, em que civis e
combatentes foram vítimas de crueldades extremas. Essa realidade fez surgir a preocupação com grande parte
do que hoje conhecemos por Direitos Humanos.
O Direito dos Refugiados se ocupa das situações de requisição de asilo, ou seja, protege as pessoas que
buscam se refugiar em outros países porque sofrem perseguição em seu país de origem, provavelmente por
motivos de raça, religião, nacionalidade, grupo social ou opiniões políticas, ou mesmo em decorrência de
conflitos armados ostensivos que inviabilizam a permanência segura de civis nacionais no território de guerra.

6
Proteção dos imigrantes e refugiados
Refugiado é todo aquele que sofre algum tipo de perseguição em seu país de origem numa situação de
guerra e busca asilo em outro país.
Imigrante é todo aquele que sai de seu país de origem e vai para outro em busca de melhores condições de
vida.
Em ambos casos, são pessoas em locais que não são comuns a elas, convivendo com a população local
já habituada. Episódios envolvendo xenofobia e desigualdade no acesso a direitos são, infelizmente, comuns.
Cabe ao Estado propiciar que imigrantes e refugiados gozem de igual proteção jurídica aos seus direitos
fundamentais. Segundo a ONU, a questão dos refugiados nos remete à pior crise humanitária do século.
O refúgio e a migração não trazem em si o terrorismo e necessariamente o agravamento dos problemas
sociais. Tal perspectiva seria totalmente contrária aos preceitos de cidadania e acolhimento para com outros
povos.
Em 1948, a Declaração dos Direitos Humanos da ONU reconheceu como direito humano a possibilidade de
as pessoas fugirem de situações de guerra e fome e migrarem para outros países. Internacionalmente, o Alto
Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados – ACNUR é um órgão das Nações Unidas criado pela
Resolução nº 428 da Assembleia da ONU em 14 de dezembro de 1950 para dar apoio e proteção a refugiados
de todo o mundo. Ainda internacionalmente a Convenção das Nações Unidas sobre o Estatuto dos Refugiados
ou Convenção de Genebra de 1951 e seu Protocolo relativo ao Estatuto dos Refugiados de 1967 constituem
os principais instrumentos internacionais estabelecidos para a proteção dos refugiados e asseguram, que
qualquer pessoa, em caso de necessidade, possa exercer o direito de procurar e de gozar de refúgio em outro
país, sendo altamente reconhecidos internacionalmente.
O Brasil é reconhecido internacionalmente como um país tolerante e aberto aos imigrantes e refugiados. O
Brasil assinou a Convenção de Genebra em 1952, relativa ao Estatuto dos Refugiados, aprovada pelo Decreto
Legislativo nº 11, de 1960 e promulgada pelo Decreto nº 50.215/1961 e o Protocolo de Nova York de 1967,
recepcionado pelo Decreto nº 70.946/1972 e retificado pelos Decretos 98602/1989 e 99757/1990. Internamente,
a nova Lei de Migração – Lei 13.455/2017 revogou o antigo Estatuto do Estrangeiro, Lei 6815/1980. O referido
dispositivo é pautado pelo princípio da não-discriminação.
Importante mencionar que nem todo imigrante possui o status de refugiado e que asilo político (individual)
é diferente de Refúgio (coletivo). Portanto, não se deve confundir o asilo político, direito individual, requerido e
outorgado caso a caso, com o moderno ramo do direito dos refugiados, que trata de fluxos maciços de popula-
ções deslocadas. Ambos institutos podem ocasionalmente coincidir, já que cada refugiado pode requerer o asilo
político individualmente (BRASIL, 2023).
A OIT é uma das organizações multilaterais que melhor tem conseguido cumprir o seu mandato. A experiên-
cia adquirida ao longo das oito décadas de existência da OIT demonstra que o seu sucesso se deve, em grande
parte, à sua capacidade de renovação, evolução e adaptação. Criada num momento de esperança, ainda que
efémero, sobreviveu à Grande Depressão e à Segunda Guerra Mundial 1.
Fundada em 1919 pelos países industrializados a fim de dar resposta aos seus problemas, a OIT rapidamen-
te encontrou uma forma criativa de se adaptar ao drástico aumento do número dos seus membros nas duas
décadas posteriores à Segunda Guerra Mundial.
Durante o período da Guerra Fria, a organização manteve a sua universalidade, reafirmando, sem com-
promissos, os seus valores fundamentais. O fim da Guerra Fria e a aceleração do processo de globalização
forçaram a Organização a reformular, mais uma vez, a sua missão, os seus programas e os seus métodos de
trabalho.

— As origens da OIT
Organização de carácter universal, a OIT tem as suas origens na matriz social da Europa e da América do
Norte do século XIX. Estas regiões assistiram ao nascimento da Revolução Industrial, que gerou um extraor-
dinário desenvolvimento econômico, muitas vezes à custa de um sofrimento humano intolerável e graves pro-
blemas sociais.

1 https://www.ilo.org/wcmsp5/groups/public/---europe/---ro-geneva/---ilo-lisbon/documents/publication/
wcms_711836.pdf

7
A ideia de uma legislação internacional do trabalho surgiu logo no início do século XIX em resposta às preo-
cupações de ordem moral e econômica associadas ao custo humano da Revolução Industrial. Alguns indus-
triais notáveis, entre os quais Robert Owen e Daniel Le Grand, apoiaram a ideia de uma legislação progressista
no domínio social e laboral.
No final do século XIX, os sindicatos começaram a desempenhar um papel decisivo nos países industrializados,
reivindicando direitos democráticos e condições de vida dignas para os trabalhadores. Argumentos humanitários,
políticos e econômicos a favor da definição de normas internacionais do trabalho levaram à criação da OIT.
O argumento inicial era de natureza humanitária. As condições a que se encontravam sujeitos os trabalhado-
res, cada vez mais numerosos e explorados sem qualquer consideração pela sua saúde, pela sua vida familiar
ou pelo seu desenvolvimento, eram cada vez mais intoleráveis.
Esta preocupação encontra-se claramente expressa no Preâmbulo da Constituição da OIT, segundo o qual
“existem condições de trabalho que implicam para um grande número de pessoas a injustiça, a miséria e pri-
vações...”.
O segundo argumento era de natureza política. Se as suas condições de vida e de trabalho não melhoras-
sem, os trabalhadores, em número cada vez maior devido ao processo de industrialização, criariam certamente
distúrbios sociais, podendo mesmo fomentar a revolução.
O Preâmbulo da Constituição refere que a injustiça gera um tal “descontentamento que a paz e a harmonia
universais são colocadas em perigo.”
O terceiro argumento estava relacionado com aspectos econômicos. Em virtude dos inevitáveis efeitos de
uma reforma social sobre os custos de produção, qualquer sector econômico ou país que tentasse implemen-
tá-la ficaria em desvantagem face aos seus concorrentes.
No Preâmbulo afirma-se que “a não adopção por uma nação de um regime de trabalho realmente humano
é um obstáculo para os esforços das outras nações que desejam melhorar a condição dos trabalhadores nos
seus próprios países.”
Estes argumentos foram consagrados no Preâmbulo da Constituição de 1919, que começa com a seguinte
afirmação: “só se pode fundar uma paz universal e duradoura com base na justiça social.” Aprofundados na
Declaração de Filadélfia, adotada em 1944, estes ideais continuam a ser mais importantes do que nunca na
atual época de globalização e constituem ainda a base ideológica da OIT.
As origens da OIT traduzem-se em quase um século de debates intelectuais e iniciativas de personalidades
notáveis, associações privadas, governos e movimentos sociais e políticos. Nas últimas décadas do século XIX,
em todo o mundo industrializado, aumentaram as pressões da opinião pública no sentido da adopção de uma
regulamentação internacional no domínio do trabalho.
Um dos resultados mais importantes deste processo intelectual foi a criação da Associação Internacional
para a Proteção Legal dos Trabalhadores, em 1901, em Basileia. A nível nacional, as leis sociais progressistas
adotadas pelo Governo alemão nas duas últimas décadas do século XIX contribuíram igualmente para fomen-
tar a adoção de uma legislação destinada a proteger os trabalhadores.
Em 1905-06, a Suíça organizou várias conferências técnicas e diplomáticas em Berna, que resultaram na
adoção das duas primeiras convenções internacionais do trabalho, uma que regulamentava o trabalho noturno
das mulheres e outra que visava a eliminação do uso de fósforo branco no fabrico de fósforos.
Durante a Primeira Guerra Mundial, os sindicatos organizaram várias reuniões internacionais destinadas a
apoiar a iniciativa lançada por notáveis líderes de sindicatos e dos trabalhadores com o objetivo de incluir no
futuro tratado de paz um capítulo social que estabelecesse normas mínimas de trabalho a nível internacional e
a criação de um Bureau Internacional do Trabalho.
Estes líderes consideravam ainda que os trabalhadores deveriam ser recompensados pelos sacrifícios su-
portados durante a guerra. A Constituição da OIT foi redigida entre Janeiro e Abril de 1919 pela Comissão da
Legislação Internacional do Trabalho, constituída pelo Tratado de Versalhes.
Esta Comissão era composta por representantes de nove países (Bélgica, Cuba, Checoslováquia, Estados
Unidos, França, Itália, Japão, Polônia e Reino Unido), sendo presidida por Samuel Gompers, presidente da
Federação Americana do Trabalho (American Federation of Labour, AFL).

8
Esta Comissão deu origem a uma organização tripartida, a única do gênero, cujos órgãos executivos são
compostos por representantes de governos, empregadores e trabalhadores. A Constituição da OIT foi integrada
no Tratado de Versalhes, correspondendo à Parte XIII.
Os autores do texto inglês, que a Comissão utilizou como modelo, foram Harold Butler e Edward Phelan,
futuros directores da OIT. A Organização demarcou-se, logo desde o início, do resto da Sociedade das Nações,
a antecessora da Organização das Nações Unidas entre as duas guerras mundiais.
Enquanto a Sociedade das Nações sentiu sérias dificuldades para se consolidar, a OIT desenvolveu-se ra-
pidamente, graças à extraordinária competência do seu primeiro Diretor, Albert Thomas, ao empenho do seu
Secretariado no estabelecimento de um diálogo interativo com os ministros do Trabalho dos Países Membros e
ao dinamismo da Conferência Internacional do Trabalho.
Entre 1919 e 1920, foram adotadas nove convenções e dez recomendações.
— A OIT até à II Guerra Mundial
Durante os primeiros quarenta anos da sua existência, a OIT dedicou parte significativa dos seus esforços
à elaboração de normas internacionais do trabalho e à garantia da sua aplicação. No período de vinte anos
decorrido entre 1919 e 1939, foram adotadas 67 convenções e 66 recomendações.
Inicialmente, as normas visavam sobretudo as condições de trabalho: a primeira convenção, adotada em
1919, regulamentava a duração do trabalho, tendo estabelecido o famoso dia de trabalho de oito horas e a se-
mana de trabalho de 48 horas.
Em 1926, a Conferência Internacional do Trabalho criou um inovador sistema de controle de aplicação das
normas, que ainda existe atualmente. Foi criada para o efeito uma comissão de peritos composta por juristas
independentes, cuja missão consistia em examinar os relatórios apresentados pelos governos sobre a aplica-
ção das convenções por eles já ratificadas.
Todos os anos, a Comissão apresentava o seu próprio relatório à Conferência. Desde então, o seu mandato
passou igualmente a abranger os relatórios sobre convenções não ratificadas e recomendações.
Em 1932, após um mandato de treze anos durante o qual assegurou uma forte presença da OIT em todo o
mundo, Albert Thomas faleceu. O seu sucessor, Harold Butler, foi rapidamente confrontado com os problemas
de desemprego massivo causados pela Grande Depressão.
Durante este período, representantes dos trabalhadores e dos empregadores debateram ideias antagônicas
sobre o tema da redução da duração do trabalho, sem resultados significativos. Em 1934, sob a presidência de
Franklin D. Roosevelt, os Estados Unidos, que não pertenciam à Sociedade das Nações, tornaram se membros
da OIT.
Em Agosto de 1940, a situação da Suíça, no centro de uma Europa em guerra, levou o novo Diretor, John
Winant, a deslocar provisoriamente a Organização para Montreal, no Canadá. Em 1944, os delegados à Confe-
rência Internacional do Trabalho adoptaram a Declaração de Filadélfia que, em anexo à Constituição, constitui
ainda hoje a Carta dos Fins e Objetivos da OIT.
Esta Declaração antecipou e serviu de modelo à Carta das Nações Unidas e à Declaração Universal dos
Direitos do Homem
— A Declaração de Filadélfia
Em 1944, a Conferência Internacional do Trabalho, reunida em Filadélfia, nos Estados Unidos, adotou a
Declaração de Filadélfia, que redefinia os objetivos e a finalidade da Organização. A Declaração consagra os
seguintes princípios:
• O trabalho não é uma mercadoria.
• A liberdade de expressão e de associação é uma condição indispensável para um progresso constante.
• A pobreza, onde quer que exista, constitui um perigo para a prosperidade de todos.
• Todos os seres humanos, qualquer que seja a sua raça, a sua crença ou o seu sexo, têm o direito de efetuar
o seu progresso material e o seu desenvolvimento espiritual em liberdade e com dignidade, com segurança
econômica e com oportunidades iguais.

9
— Da cooperação técnica a uma parceria ativa
O fim da Segunda Guerra Mundial marcou o início de uma nova era para a OIT. A eleição do americano David
Morse para o cargo de Diretor Geral da OIT, em 1948, coincidiu com o reforço da atividade da Organização no
domínio das normas do trabalho e com o lançamento do seu programa de cooperação técnica.
As convenções adotadas após a Segunda Guerra Mundial centravam-se sobretudo nos direitos humanos
(liberdade sindical, eliminação do trabalho forçado e da discriminação), bem como em questões mais técnicas
relacionadas com o trabalho. Em 1948, foi adotada a importante Convenção (n.º 87) sobre a liberdade sindical,
que reconhecia formalmente o direito dos trabalhadores e dos empregadores se associarem de forma livre e
independente.
Posteriormente, foi criado um comitê especial tripartido, o Comitê da Liberdade Sindical, com o objetivo de
promover a plena aplicação deste direito fundamental no mundo do trabalho. Este Comitê tratou de mais de 2
000 casos ao longo das últimas cinco décadas.
Durante os vinte e dois anos do mandato de David Morse, o número de países membros duplicou, a Orga-
nização assumiu o seu carácter universal, os países industrializados tornaram-se uma minoria face aos países
em desenvolvimento, o valor do orçamento aumentou cinco vezes e o número de funcionários quadruplicou.
Em 1969, ano em que comemorou o seu 50º aniversário, a OIT foi distinguida com o Prêmio Nobel da Paz.
Durante a entrega deste prestigiado prêmio, o presidente do Comitê do Prêmio Nobel afirmou que “a OIT teve
uma influência duradoura sobre a legislação de todos os países”, sendo ainda “uma das raras criações institu-
cionais de que a raça humana se pode orgulhar”.
Em 1970, Wilfred Jenks, um dos autores da Declaração de Filadélfia e um dos principais arquitetos do proce-
dimento especial de exame das queixas de violação da liberdade sindical, foi eleito para o cargo de Diretor-Ge-
ral. Entre 1974 e 1989, o Diretor-Geral Francis Blanchard conseguiu evitar que a OIT fosse gravemente afetada
pela crise desencadeada com a saída temporária dos Estados Unidos da Organização (entre 1977 e 1980).
A OIT desempenhou um papel fundamental na emancipação da Polônia do domínio comunista, apoiando
incondicionalmente a legitimidade do sindicato Solidarnosc com fundamento no respeito pela Convenção nº 87
sobre a liberdade sindical, que a Polônia tinha ratificado em 1957.
A Francis Blanchard sucedeu o belga Michel Hansenne, o primeiro Diretor-Geral do período que se seguiu à
Guerra Fria. Ao abrigo da Política de Parceria Ativa, Michel Hansenne lançou a OIT numa via de maior descen-
tralização das suas atividades e dos seus recursos, que até então estavam centralizados em Genebra.
A Declaração da OIT relativa aos princípios e direitos fundamentais no trabalho, adotada pela Conferência
Internacional do Trabalho em Junho de 1988, assinalou a reafirmação universal da obrigação, imposta a todos
os países membros da Organização de respeitar, promover e aplicar os princípios relativos aos direitos funda-
mentais objeto de algumas convenções da OIT, ainda que não as tivessem ratificado.
Estes direitos abrangem, nomeadamente, a liberdade de associação (ou liberdade sindical), o reconheci-
mento efetivo do direito de negociação coletiva, a eliminação de todas as formas de trabalho forçado ou obri -
gatório, a abolição efetiva do trabalho infantil e a eliminação da discriminação em matéria de emprego e de
profissão. Por outro lado, a Declaração reconhece que a OIT tem o dever de ajudar os seus membros a atingir
estes objetivos.
Em Março de 1999, o Diretor-Geral da OIT, o chileno Juan Somavia, subscreveu o consenso internacional
sobre a promoção do conceito de sociedades abertas e economias abertas, desde que “gere benefícios reais
para o homem comum e para a sua família”.
O Sr. Somavia procurou “modernizar e orientar a estrutura tripartida com o objetivo de impor os valores da
OIT no novo contexto mundial”. É o primeiro representante do hemisfério sul a dirigir a Organização.
Posteriormente, como décimo Diretor-Geral da OIT, Guy Ryder, com cerca de trinta e cinco anos de expe-
riência no mundo do trabalho, a maior parte a nível internacional, foi eleito pela primeira vez Diretor-Geral da
OIT em maio de 2012 e assumiu o cargo de Juan Somavia em setembro de 2012.
Em 2016, Guy Ryder foi reeleito pelo Conselho de Administração da OIT para um novo mandato de cinco
anos, que começou oficialmente em 1º de outubro de 2017.

10
Características dos direitos humanos. Interpretação e aplicação dos tratados interna-
cionais de direitos humanos. Dignidade da pessoa humana

Para eficácia das normas de proteção de Direitos Humanos é fundamental a interação do Direito Internacional
com o direito interno dos Estados, efetivando sua aplicabilidade e fortalecendo os mecanismos de proteção
face a eventuais violações. Os tratados de Direitos Humanos não são regidos pela autonomia da vontade dos
Estados, mas sim coercitivos quanto às suas normas. A Constituição Federal brasileira adota a aplicabilidade
imediata das normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais, nos termos do artigo 5º, parágrafo
primeiro:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e
aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e
à propriedade, nos termos seguintes:
§ 1º As normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata.
Ademais, o Brasil tem como fundamento a dignidade da pessoa humana, nos termos do art. 1º, III, CF e o
texto constitucional dá aos direitos e garantias fundamentais, tratamento de cláusulas pétreas, que não podem
ser abolidas ou modificadas sem um rígido procedimento de aprovação, nos termos do art. 60, § 4º, IV, CF.
O texto constitucional conferiu, portanto, especial proteção aos direitos humanos, e por isso, com a entrada
em vigor de um tratado internacional de direitos humanos, toda norma preexistente incompatível com seus
preceitos perde automaticamente a vigência, observando-se sempre em caso de conflito, a norma mais
favorável à vítima.

De acordo com a Resolução da Defensoria Pública Geral do Estado do Rio de Janeiro, DPGE n° 988 de 11
de junho de 20192, que institui o Programa Circuito de Favelas por Direitos no âmbito da Defensoria Pública do
Estado do Rio de Janeiro, fixando seus princípios, diretrizes, objetivos e ações e contribuições dos parceiros
envolvidos nesta iniciativa, são direitos das pessoas moradoras de favelas:
— Os princípios da dignidade da pessoa humana, da igualdade e da presunção de inocência, e demais pre-
ceitos amparados pela Constituição Federal de 1988;
Princípio da Dignidade da Pessoa Humana
O princípio da dignidade da pessoa humana se refere à garantia das necessidades vitais de cada indivíduo,
ou seja, um valor intrínseco como um todo. É um dos fundamentos do Estado Democrático de Direito, nos ter-
mos do artigo 1º, III da Constituição Federal, sendo fundamento basilar da República.
Tal princípio concede unidade aos direitos e garantias fundamentais, sendo inerente às personalidades hu-
manas. Afastando dessa forma, as vertentes trans pessoalistas de Estado e Nação.

Sistemas internacionais de proteção e promoção dos Direitos Humanos Sistema glo-


bal de direitos humanos. Organização das Nações Unidas: declarações, tratados, reso-
luções, comentários gerais, relatórios e normas de organização e funcionamento dos ór-
gãos de supervisão, fiscalização e controle. Órgãos convencionais e extra convencionais

A partir da Declaração Universal de 1948, desenvolveu-se um novo ramo do direito caracterizado como um
direito de proteção: o Direito Internacional dos Direitos Humanos. O processo de universalização dos Direitos
Humanos iniciou a sua fase legislativa com a elaboração de Pactos e Tratados que trouxeram caráter realmente
normativo aos direitos consagrados, e de avaliação e reafirmação dos princípios através de Conferências Mun-
diais sobre Direitos Humanos 3.

2 https://defensoria.rj.def.br/legislacao/detalhes/9147-RESOLUCAO-DPGE-N-988-DE-11-DE-JUNHO-
-DE-2019
3 https://edisciplinas.usp.br/pluginfile.php/4286318/mod_resource/content/1/Manual_de_Direitos_Acesso_
aos_Sistemas_global_e_Regional.pdf

11
Apesar dos primeiros passos rumo à construção de um Direito Internacional dos Direitos Humanos terem
sido dados logo após o fim da Primeira Guerra Mundial, com o surgimento da Liga das Nações e da Organiza-
ção Internacional do Trabalho, a consolidação deste novo ramo do Direito ocorre apenas com o fim da Segunda
Guerra Mundial.
Nesses casos, podemos encontrar progressos similares, seja pela redefinição do conceito tradicional de so-
berania estatal, até então tida como absoluta e ilimitada, seja pelo reconhecimento de que o indivíduo também,
e não apenas o Estado, é sujeito de Direito Internacional. Com efeito, à medida que se passa a admitir interven-
ções internacionais em prol do indivíduo por ocasião de violação aos direitos humanos no âmbito interno dos
Estados, a noção tradicional de soberania absoluta dos Estados resulta prejudicada.
A contribuição destes órgãos ao processo de universalização dos direitos humanos é inegável. Afinal, ao pro-
teger os direitos fundamentais em época de guerra, promover a paz e a segurança internacionais, e estabelecer
um padrão global mínimo para as condições de trabalho, deu-se o primeiro passo rumo ao reconhecimento
de que os direitos humanos devem ser protegidos independentemente de raça, credo, cor ou nacionalidade,
podendo a comunidade internacional intervir no caso dos Estados furtarem-se a fornecer tal proteção a seus
nacionais.
Com o advento daqueles institutos, prenuncia-se o fim da era em que a forma pela qual o Estado tratava
os seus nacionais era concebida como um problema de jurisdição doméstica, restrito ao domínio reservado do
Estado, decorrência de sua soberania, autonomia e liberdade.
— Sistema global de direitos humanos. Organização das Nações Unidas: declarações, tratados, resoluções,
comentários gerais, relatórios e normas de organização e funcionamento dos órgãos de supervisão, fiscaliza-
ção e controle. Órgãos convencionais e extraconvencionais
Após as duas guerras mundiais ocorridas no século XX, em que inúmeras atrocidades foram cometidas
em nome da soberania nacional, a criação de um sistema internacional de proteção dos direitos humanos foi
a resposta para que se pudesse reconstruir a esperança de paz duradoura no mundo. Com o fim da segunda
guerra mundial, crescia a consciência de que os direitos humanos são universais e indivisíveis. Universais na
medida em que se busca a aquisição e o exercício de direitos para todos e todas e indivisíveis no sentido de
que os direitos humanos devem possuir igual validade, independentemente de serem classificados como civis,
políticos, econômicos, sociais ou culturais 4.
Com base nessa construção histórica, é crescente a demanda das Nações Unidas em torno dos direitos
humanos. Entidades da sociedade civil de todo o mundo acionam o sistema global de proteção dos direitos
humanos, diante da consciência de que os estados são, muitas vezes, coniventes ou ineficientes para dar res-
postas às violações dos direitos humanos. Por outro lado, o sistema da ONU tem sido uma grande possibilidade
de prevenir conflitos internos, razão pela qual maior ênfase deveria ser dada para os recentes mecanismos de
proteção dos direitos humanos, assim como ao fortalecimento de instituições nacionais para solucionar ques -
tões relacionadas a direitos humanos.
A utilização dos sistemas internacionais de proteção dos direitos humanos não implica, portanto, em abando-
nar o uso dos sistemas nacionais. Ambos devem ser fortalecidos, na perspectiva do pleno respeito aos direitos
humanos. No plano internacional, o desafio é, através de instrumentos e mecanismos de proteção, ampliar o
respeito aos direitos humanos.
O sistema de proteção dos direitos humanos das Nações Unidas tem como principais órgãos:
→ a Assembleia Geral, a cujo organismo compete, principalmente, legislar em matéria de direitos humanos;
→ o Conselho Econômico e Social (ECOSOC), a cujo organismo cabe promover o respeito dos direitos
humanos; coordenar as atividades da ONU e suas agências especializadas; elaborar estudos, relatórios e re-
comendações sobre assuntos de interesse social, econômico, cultural e educacional;
→ o Conselho de Segurança, a cujo organismo compete desenvolver operações pela manutenção da paz;
decidir sobre graves violações aos direitos humanos que ponham em risco a paz mundial; e estabelecer tribu-
nais penais internacionais.

4 https://edisciplinas.usp.br/pluginfile.php/4286318/mod_resource/content/1/Manual_de_Direitos_Acesso_
aos_Sistemas_global_e_Regional.pdf

12
Na estrutura do Conselho Econômico e Social, a Comissão de Direitos Humanos é o espaço através do qual
a ONU monitora a situação dos direitos humanos no mundo. Suas propostas, recomendações e relatórios são
submetidos ao Conselho Econômico e Social, com o que a Comissão de Direitos Humanos presta assistência
àquele na coordenação das atividades relacionadas a direitos humanos no sistema das Nações Unidas.
O sistema da ONU de proteção dos direitos humanos é formado por instrumentos normativos e mecanismos
práticos de realização de tais direitos.

Principais instrumentos normativos do sistema global de proteção dos direitos humanos


São os principais instrumentos normativos de proteção dos direitos humanos, no plano das Nações Unidas,
a saber:
• a Declaração Universal de Direitos Humanos
Em seu preâmbulo, a Declaração Universal de Direitos Humanos (1948) assegura o princípio da indivisi-
bilidade dos direitos humanos. Com base no princípio da indivisibilidade dos direitos humanos, a Declaração
dedica os artigos 1º ao 21 aos direitos humanos civis e políticos; e os artigos 22 a 27 aos direitos humanos
econômicos, sociais e culturais.
Entre os direitos humanos civis e políticos estão relacionados o direito às liberdades de locomoção, de as-
sociação, de reunião e de expressão, à igualdade, à vida, à segurança pessoal e à integridade física, à perso-
nalidade, ao julgamento justo e ao devido processo legal, ao respeito à privacidade, ao asilo, à nacionalidade,
ao casamento, à propriedade e à livre escolha dos governantes.
Entre os direitos humanos econômicos, sociais e culturais encontram-se o direito à segurança social e ao
bem estar social, direito ao trabalho, a condições justas de trabalho e igual e justa remuneração para trabalho
igual, assim como a proteção contra o desemprego e a organização sindical para a proteção de seus interes -
ses, direito ao repouso e ao lazer, à limitação das horas de trabalho e férias remuneradas, direito à saúde, à
alimentação, ao vestuário, à habitação, a serviços sociais e previdência social, à proteção especial à materni-
dade e à infância, direito à educação, à gratuidade e obrigatoriedade do ensino fundamental, e educação para
promover a paz e a tolerância racial e religiosa, e direito à cultura e à proteção histórica e promoção cultural.
Apesar da maior prevalência, inclusive em termos do número de artigos, ao todo são 21, relacionados direta-
mente aos direitos humanos civis e políticos, a Declaração Universal enuncia muitos dos direitos que hoje são
considerados fundamentais direitos humanos econômicos, sociais e culturais.

O Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos, e o Pacto Internacional de Direitos Econômicos, Sociais
e Culturais
Tanto o Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos quanto o Pacto Internacional de Direitos Econômicos,
Sociais e Culturais foram aprovados pela Assembleia Geral em 1966, e que entraram em vigor em 1976, reco-
nhecendo e reforçando o princípio da indivisibilidade dos direitos humanos, presente no preâmbulo de ambos.
Os Pactos Internacionais, diga-se de passagem, deveriam ser um só, a detalhar a Declaração Universal de
Direitos Humanos, não o sendo em função da guerra fria, que impedia os blocos socialista e liberal de verem,
como hoje não resta dúvida, os direitos humanos numa perspectiva integral. De qualquer forma, os pactos
representam a juridicização da Declaração Universal de Direitos Humanos, na medida em que detalham e am-
pliam os direitos nela contidos.
O Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos enuncia os seguintes direitos:
1) à igualdade;
2) às liberdades (de locomoção, de associação, de reunião e de expressão);
3) ao julgamento justo e ao devido processo legal;
4) à vida;
5) à integridade física e à segurança pessoal;
6) à privacidade;
7) à paz;
8) à família;

13
9) ao casamento.
Além de detalhar e ampliar direitos em relação à Declaração Universal, o Pacto Internacional de Direitos
Civis e Políticos institui o Comitê de Direitos Humanos, com a competência de monitorar a sua implementação,
através do recebimento e análise de relatórios periódicos dos estados e da apresentação de comunicações
pelos estados em relação a outros (que tenham aceitado formalmente essa possibilidade).
Os dois Protocolos Facultativos foram adotados pelas Nações Unidas com a finalidade de ampliar as con-
quistas em torno dos direitos humanos civis e políticos: o Protocolo I, que estabelece a possibilidade de apre-
sentação de comunicações individuais ao Comitê de Direitos Humanos; e o Protocolo II, que proíbe a pena de
morte.
São os seguintes os direitos constantes do Pacto Internacional de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais:
1) ao trabalho;
2) à associação em sindicatos;
3) à greve;
4) à previdência social;
5) à constituição e manutenção da família;
6) à proteção especial de crianças e adolescentes contra a exploração econômica e no trabalho;
7) à proteção contra a fome;
8) à cooperação internacional;
9) à saúde física e mental;
10) à educação;
11) ao respeito à cultura de cada povo e região;
12) ao progresso científico e técnico:
13) alimentação:
14) vestuário;
15) moradia adequada.
Diferentemente do que aconteceu com o Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos, o Pacto Internacio-
nal de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (PIDESC) estabeleceu um sistema de monitoramento restrito à
apresentação de relatórios periódicos elaborados pelos estados, a serem apresentados, a partir do primeiro ano
da entrada em vigor do Pacto, ao secretário geral, que encaminhará cópia ao Conselho Econômico e Social.
Só em 1987, por meio de resolução, é que foi criado o Comitê de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais
com a atribuição de monitorar a implementação do PIDESC, através da elaboração de relatórios ou pareceres
com conclusões e recomendações para os estados. Ao comitê foi dada também a prerrogativa de receber rela-
tórios alternativos da sociedade civil dos estados ratificantes do Pacto, o que resultou num aperfeiçoamento do
sistema, num esforço por atribuir igualdade aos direitos humanos econômicos, sociais e culturais, em relação
aos direitos humanos civis e políticos, que já contavam, e de modo convencional, com um sistema de monito-
ramento.
O Protocolo Facultativo do Pacto Internacional de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (PF-PIDESC)
foi adotado pela Assembleia Geral das Nações Unidas no dia 10 de dezembro de 2008, 60 anos após a adoção
da Declaração Universal dos Direitos Humanos. Foi aberto a assinatura em 24 de setembro de 2009. O Protocolo
Facultativo estabelece três procedimentos internacionais de proteção:
1) um de comunicações individuais;
2) outro de comunicações interestatais e;
3) procedimento de investigação das violações graves ou sistemáticas dos Direitos Econômicos, Sociais e
Culturais - DESC.

14
A Declaração sobre o Direito ao Desenvolvimento
A Declaração sobre o Direito ao Desenvolvimento, de 1986, buscou ampliar as ferramentas direcionadas à
proteção dos direitos humanos econômicos, sociais e culturais, embora seja uma declaração, e não um tratado,
portanto, desprovida de capacidade jurídica de obrigatoriedade em relação aos estados. Apesar dessa limita-
ção, a Declaração conta com a mais clara definição para o princípio da indivisibilidade dos direitos humanos
contida num instrumento internacional.
Em seu preâmbulo, a Declaração define desenvolvimento como um processo econômico, social, cultural e
político abrangente, com o que reafirma a ideia da indivisibilidade, que visa ao constante incremento do bem-
-estar de toda a população e de todos os indivíduos com base em sua participação ativa, livre e significativa no
desenvolvimento e na distribuição justa dos benefícios daí resultantes.
De igual importância é o reconhecimento, também contido no preâmbulo do Pacto, de que violações mas-
sivas e flagrantes aos direitos humanos são resultado do colonialismo, neocolonialismo, apartheid, de todas
as formas de racismo e discriminação racial, dominação estrangeira e ocupação, agressão e ameaças contra
a soberania nacional, à unidade nacional e à integridade territorial de ameaças de guerra. O reconhecimento
é de grande importância na perspectiva da construção de um futuro em que não sejam cometidos os erros do
passado, no sentido em que abre caminho para a validação das políticas de ação afirmativa.
A Declaração consta ainda do reconhecimento de que a paz e a segurança internacionais dependem do
respeito aos direitos humanos econômicos, sociais e culturais e são essenciais para a garantia do direito ao
desenvolvimento.
Em remissão ao art. 2º do PIDESC, o preâmbulo da Declaração sobre o Direito ao Desenvolvimento esta-
belece a responsabilidade primária dos estados na criação das condições favoráveis ao desenvolvimento, em
vinculação com a participação ativa das sociedades nacionais.

A Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher


A Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher, CEDAW, de 1979,
já em seu preâmbulo justifica os direitos da mulher como uma necessidade para a sociedade moderna se
desenvolver, e demonstra a preocupação com a situação de particular vulnerabilidade da mulher (incluindo a
feminilização da pobreza).
O art. 4º - 1 da Convenção, também conhecida por CEDAW (conforme sigla em inglês), respalda a aplicação
de políticas de ação afirmativa, enquanto forma de reparar e superar injustiças cometidas no passado.
Também importante é a definição do art. 10 da CEDAW, que estabelece a igualdade de acesso à educação
para as mulheres, em todos os níveis, assim como os artigos 11 e 12, que, respectivamente, estabelecem a
igualdade de acesso ao emprego e à saúde. A eliminação de barreiras na esfera da vida econômica e social
está prevista no art. 13 (benefícios familiares, comércio, recreação, cultura).
A CEDAW criou o Comitê dos Direitos da Mulher, com prerrogativa de monitorar sua implementação. For-
mado por 18 membros, o Comitê deve examinar relatórios oferecidos pelos estados membros da Convenção,
informando sobre as medidas legislativas, judiciárias, administrativas ou outras que adotarem para tornarem
efetivas as disposições desta Convenção e dos progressos alcançados a respeito, pelo menos a cada quatro
anos ou sempre que o Comitê solicitar.
Em 2002, o Brasil ratificou o Protocolo Facultativo ao CEDAW, que, entre outras medidas, estabelece a
possibilidade de apresentação de comunicações individuais, por parte de qualquer pessoa do país membro da
Convenção, ao Comitê. Esse importante passo do Brasil possibilitou um grande avanço na implementação dos
direitos da mulher para os grupos de direitos humanos do país.

A Convenção sobre os Direitos da Criança


A Convenção sobre os Direitos da Criança, de 1989, que influenciou profundamente a legislação brasileira
através da Constituição Federal e do Estatuto da Criança e do Adolescente, dá destaque à necessidade de
respeito aos direitos humanos civis, políticos, econômicos, sociais culturais para as crianças, embora seja evi-
dente a preocupação especial com dois desses direitos: o direito à saúde, constante do art. 24 (inclusive em
suas dimensões de redução da mortalidade infantil, universalização dos serviços básicos de saúde, assistência
pré e pós-natal às mães, adoção de medidas de saúde preventiva) e o direito à educação, constante do art. 28,
mas desdobrados em outras partes da Convenção.

15
É importante mencionar, entre tantas normas com repercussão para os direitos humanos econômicos, so-
ciais e culturais, os artigos 17, 18 e 23 da Convenção sobre os Direitos da Criança, que se referem, respectiva-
mente, à necessidade de encorajamento, por parte do poder público, dos meios de comunicação para a difusão
da informação e dados de benefício social e cultural à criança; à necessidade de manutenção de serviços de
assistência social e creches para crianças e adolescentes; e ao reconhecimento das crianças portadoras de de-
ficiências físicas ou mentais como devendo desfrutar de uma vida plena e decente em condições que garantam
sua dignidade, favoreçam sua autonomia e facilitem sua participação ativa na comunidade.
No campo dos direitos humanos civis e políticos, a Convenção sobre os Direitos da Criança define “crian-
ça” como todo ser humano com idade abaixo de dezoito anos (art. 1º), digno de respeito sem qualquer tipo de
discriminação (art. 2º) e à atenção e à proteção especial (art. 3º, 11, 40) sempre que seu interesse estiver em
jogo. Encontram-se também entre essa categoria de direitos os direitos a um nome e à nacionalidade (art. 7º),
à preservação da identidade (art. 8º), a fazer parte de uma família (art. 5º, 9º, 10), ao respeito de sua opinião e
expressão (art. 12, 13, 14), à proteção da privacidade (art. 16), ao acesso à informação (art. 17), à integridade
física e psicológica (art. 19, 23, 34, 35, 36, 37, 38, 39).
Como dispõe a Convenção no seu art. 43, é criado o Comitê para os Direitos da Criança, integrado por dez
especialistas, e dotado de competência para monitorar a implementação daquele instrumento, examinando os
relatórios que devem ser apresentados pelos estados-partes, ao Comitê, a cada cinco anos.

A Convenção Internacional sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial


Respaldada pelas ideias de que a doutrina da superioridade baseada em diferenças raciais é cientificamente
falsa, moralmente condenável, socialmente injusta e perigosa e de que a discriminação entre as pessoas por
motivo de raça, cor ou origem étnica é um obstáculo às relações amistosas e pacíficas entre as nações e é ca-
paz de perturbar a paz e a segurança entre os povos e a harmonia de pessoas vivendo lado a lado, constantes
de seu preâmbulo, a Convenção Internacional sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Ra-
cial, de 1968, tem o grande mérito de convalidar as políticas de ação afirmativa enquanto remédios temporários
de inclusão social de grupos étnicos e raciais.
Entre os direitos humanos mencionados pela Convenção, no art. 5º, alínea e, encontram-se, a título exempli-
ficativo, os direitos ao trabalho, a fundar sindicatos e a eles se filiar, à habitação, à saúde pública, à previdência
social, à educação, à formação profissional e à igual participação nas atividades culturais.
Conforme descrito nos artigos 8º e 9º, a Convenção criou o Comitê sobre a Eliminação da Discriminação
Racial, composto por dezoito especialistas, com o mandato de monitorar a implementação do tratado, através
do examine de relatórios dos países membros que devem ser apresentados a cada quatro anos.

A Convenção contra a Tortura e Outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos ou Degradantes


Por fim, a Convenção contra a Tortura e Outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos ou Degradantes,
de 1984, parte da ideia, constante de seu preâmbulo, de que os direitos humanos emanam da dignidade ineren-
te à pessoa humana e da necessidade de concretizar o artigo 5º da Declaração Universal de Direitos Humanos
e o artigo 7º do Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos, que determinam que ninguém será sujeito a
tortura ou a pena ou tratamento cruel, desumano ou degradante.
A Convenção designa como tortura, nos termos do Art. 1º: “(...) qualquer ato pelo qual dores ou sofrimentos
agudos, físicos ou mentais, são infligidos intencionalmente a uma pessoa a fim de obter, dela ou de terceira
pessoa, informações ou confissões; castigá-la por ato que ela ou terceira pessoa tenha cometido ou seja sus-
peita de ter cometido; de intimidar ou coagir esta pessoa ou outras pessoas; ou por qualquer motivo baseado
em discriminação de qualquer natureza; quando tais dores ou sofrimentos são infligidos por um funcionário pú-
blico ou outra pessoa no exercício de funções públicas, ou por sua instigação, ou com o seu consentimento ou
aquiescência. Não se considerará como tortura as dores ou sofrimentos que sejam consequência unicamente
de sanções legítimas, ou que sejam inerentes a tais sanções ou delas decorram”.
O art. 14.1 da referida Convenção busca assegurar que os estados estabeleçam em seus sistemas jurídicos
o direito à reparação e à indenização justa e adequada para as vítimas ou familiares de vítimas de tortura.
Conforme dispõe o art. 17.1, a Convenção cria o Comitê contra a Tortura, composto de dez membros es-
pecialistas no tema, com a função de monitorar a implementação do tratado, através da análise de relatórios
periódicos fornecidos pelos estados. Além dos relatórios dos estados-partes, os comitês de monitoramento dos

16
tratados de direitos humanos da ONU estão autorizados a receber relatórios alternativos (também chamados
relatórios paralelos ou relatórios-sobra), elaborados por entidades da sociedade civil dos estados, os quais de-
vem ser apreciados na qualidade de informação complementar à prestada por estes.
— Mecanismos do sistema global de proteção dos direitos humanos
Os mecanismos de proteção dos direitos humanos podem ser de dois tipos: convencionais e extra conven-
cionais. Seu funcionamento está sob a responsabilidade direta da Comissão de Direitos Humanos da ONU.
Esta, por sua vez, tem sua atuação balizada pelo Conselho Econômico e Social (ECOSOC).
Passamos a distinguir os mecanismos convencionais e não convencionais5:
Mecanismos convencionais (treaty-monitoring bodies)
Os mecanismos convencionais de proteção dos direitos humanos são assim chamados porque foram es-
tabelecidos através de convenções. De uma maneira geral, são organismos compostos por especialistas que
atuam em sua responsabilidade individual, portanto, com independência em relação aos países dos quais são
provenientes.
À exceção do Comitê sobre os Direitos da Mulher, integrado por 23 membros, do Comitê sobre os Direitos
da Criança e do Comitê contra a Tortura, integrados por 10 membros, os demais comitês são formados por
18 membros. Esses comitês têm a competência de examinar relatórios dos governos e da sociedade civil, na
perspectiva do monitoramento da implementação dos tratados nos estados-partes.
São os seguintes os comitês responsáveis pelo monitoramento dos tratados que constituem os treaty-moni-
toring bodies no âmbito das Nações Unidas:
Comitê de Direitos Humanos: Monitora a implementação do Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos
(art. 28);
Comitê contra a Tortura e Outros Tratamentos Cruéis, Desumanos ou Degradantes: Monitora a implementa-
ção da Convenção contra a Tortura e Outros Tratamentos Cruéis, Desumanos ou Degradantes (art. 22);
Comitê sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial: Monitora a implementação da
Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial (art. 14);
Comitê sobre os Direitos da Criança: Monitora a implementação da Convenção sobre os Direitos da Criança
(art. 43);
Comitê sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher: Monitora a implementa-
ção da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher (art. 21);
Comitê de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais: Monitora a implementação do Pacto Internacional de
Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (criado por resolução do Conselho Econômico e Social).
Ao serem responsabilizados pelo exame de relatórios fornecidos pelos estados partes (e pela sociedade civil
desses estados), os comitês de monitoramento dos tratados de direitos humanos elaboram pareceres que têm
a finalidade de auxiliar os países a melhorar a implementação daqueles tratados, no plano interno. Na avaliação
do Comitê de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, embora as observações finais do Comitê, em particular
suas sugestões e recomendações não sejam de caráter legalmente vinculante, elas revelam a opinião do único
órgão de especialistas encarregado de fazer essas declarações e capaz de fazê-las.
Em consequência, os estados-partes que menosprezarem essas opiniões ou que não as acatarem na prá-
tica estariam demonstrando má fé no cumprimento de suas obrigações derivadas do Pacto. Em vários casos
tem-se observado mudanças em matéria de política, prática e legislação que se deveram pelo menos em parte
às observações finais do Comitê.
Além de observações finais, os presidentes dos comitês podem dirigir cartas aos estados-partes com a fi-
nalidade de informá-los sobre as preocupações desses órgãos de monitoramento. Os comitês têm também a
prerrogativa de adotar projetos de decisão para eventual aprovação pelo Conselho Econômico e Social.

5 https://edisciplinas.usp.br/pluginfile.php/4286318/mod_resource/content/1/Manual_de_Direitos_Acesso_
aos_Sistemas_global_e_Regional.pdf

17
Assim acontece, por exemplo, quando o Comitê pede a um estado-parte que o convide a visitar o país e,
assim, possa proporcionar ao governo a assistência técnica ou de outro tipo que venha a ser útil com vistas à
plena aplicação dos tratados. O Comitê (de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais) já pediu, por exemplo, em
duas ocasiões para que fosse convidado a visitar os territórios de estados-partes (a República Dominicana e o
Panamá). Entretanto, só em um desses casos (Panamá) recebeu o convite necessário para a missão, que se
realizou em abril de 1995.
Outra função dos comitês é a de elaborar observações gerais sobre os direitos e as disposições contidos
nos tratados, com vistas a assistir os estados-partes no cumprimento de suas obrigações concernentes à apre-
sentação de informes e contribuir para esclarecer sobre a interpretação do significado e conteúdo dos tratados
de direitos humanos. A aprovação de observações gerais é uma maneira de promover a aplicação dos tratados
pelos estados-partes, na medida em que sejam apontadas as carências reveladas em muitos informes e facili-
tar para que determinadas disposições dos tratados recebam maior atenção dos estados, dos organismos das
Nações Unidas e de outras entidades, com a finalidade de que se possa alcançar progressivamente a plena
efetividade dos direitos proclamados nos tratados.
Além do mais, as observações gerais são um meio de criar jurisprudência em torno da interpretação das nor-
mas incorporadas aos tratados de direitos humanos. Até o ano 2000, o Comitê de Direitos Econômicos, Sociais
e Culturais adotou quatorze observações gerais, a saber:
– Observação geral nº 1 (1989), sobre a apresentação de informes por parte dos estados-partes;
– Observação geral nº 2 (1990), sobre as medidas de assistência técnica internacional (artigo 22 do Pacto);
– Observação geral nº 3 (1990), sobre a índole das obrigações dos estados-partes (parágrafo 1º do artigo
2° do Pacto);
– Observação geral nº 4 (1991), sobre o direito à moradia adequada (parágrafo 1º do artigo 11 do Pacto);
– Observação geral nº 5 (1994), sobre as pessoas portadoras de necessidades especiais;
– Observação geral nº 6 (1995), sobre os direitos econômicos, sociais e culturais das pessoas idosas;
– Observação geral nº 7 (1997), sobre o direito à moradia adequada (art. 11.1 do Pacto): despejos;
– Observação geral nº 8 (1997), sobre a relação entre sanções econômicas e o respeito aos direitos econô-
micos, sociais e culturais;
– Observação geral nº 9 (1998), sobre a aplicação doméstica do Pacto;
– Observação geral nº 10 (1998), sobre o papel das instituições nacionais de direitos humanos na proteção
dos direitos econômicos, sociais e culturais;
– Observação geral nº 11 (1999), sobre os planos de ação para a educação primária;
– Observação geral nº 12 (1995), sobre o direito à alimentação adequada;
– Observação nº 13 (1999), sobre o direito à educação;
– Observação nº 14 (2000), sobre o direito ao mais alto padrão de saúde.

Mecanismos extra-convencionais (Procedimentos especiais/special procedures)


Os mecanismos extra-convencionais de proteção dos direitos humanos são aqueles criados através de reso-
lução de órgãos legislativos da ONU, como a Comissão de Direitos Humanos, o Conselho Econômico e Social
ou a Assembleia Geral. Eles não resultam de convenções, embora, em última instância, sejam autorizados por
elas, no sentido de que medidas devem ser tomadas pelos estados-partes para assegurar o cumprimento dos
tratados, nos termos, por exemplo, do que estabelece o art. 2º do Pacto Internacional de Direitos Econômicos,
Sociais e Culturais. Constituem os mecanismos, mandatos ou sistema de procedimentos especiais, através do
qual as Nações Unidas buscam avançar na implementação dos direitos humanos.

— Relatores Especiais, Representantes Especiais, Experts Independentes


Os mecanismos extra-convencionais das Nações Unidas datam de 1979, e foram criados com a finalidade
de examinar violações cometidas pelos países. Na ocasião, havia a avaliação de uma certa impotência da ONU
diante das massivas e graves violações aos direitos humanos ocorridas em diversas partes do mundo.

18
Os relatores especiais, representantes especiais ou experts independentes têm seu mandato estabelecido
pela Comissão de Direitos Humanos das Nações Unidas, órgão ao qual devem prestar contas anualmente, du-
rante a reunião da Comissão, em Genebra. A Comissão estabelece dois tipos de mandatos: temáticos, quando
se referem a situações específicas de direitos humanos, e por países, quando se referem à situação dos direi-
tos humanos em determinados países.
Em termos gerais, aos relatores especiais, representantes especiais ou experts independentes são atribuí-
dos os poderes de investigar situações de direitos humanos, através de visitas in loco, receber denúncias ou
comunicações, e oferecer recomendações de como solucioná-las. São, assim, uma contribuição, no plano in-
ternacional, para que os países consigam implementar seus compromissos com os direitos humanos, resultado
da ratificação de instrumentos internacionais e dos seus próprios instrumentos nacionais (constituições, leis
ordinárias, programas e planos de direitos humanos) de proteção dos direitos humanos.
Embora sejam considerados mecanismos extra-convencionais da ONU, os relatores especiais são os “ex-
perts em missão” previstos na Convenção sobre Privilégios e Imunidades das Nações Unidas, de 1946, instru-
mento que, de alguma forma, respalda convencionalmente a sua ação.
Atualmente, existem os seguintes relatores especiais, representantes especiais ou experts independentes
relacionados a temas de direitos humanos:
- Relator Especial sobre Execuções Sumárias, Arbitrárias ou Extrajudiciais;
- Relator Especial sobre a Independência dos Juízes;
- Relator Especial sobre a Tortura e Outros Tratamentos Cruéis, Desumanos ou Degradantes;
- Representante Especial sobre Refugiados Internos;
- Relator Especial sobre Intolerância Religiosa;
- Relator Especial sobre o Uso de Mercenários como Meio de Impedir o Exercício do Direito à Autodetermi-
nação dos Povos;
- Relator Especial sobre Liberdade de Opinião e Expressão;
- Relator Especial sobre Racismo, Discriminação Racial e Xenofobia;
- Relator Especial sobre a Venda de Crianças, Prostituição e Pornografia Infantil;
- Relator Especial sobre a Eliminação da Violência contra a Mulher;
- Relator Especial sobre os Efeitos do Lixo Tóxico e Produtos Perigosos para o Gozo dos Direitos Humanos;
- Relator Especial sobre o Direito à Educação;
- Relator Especial sobre Direitos Humanos e Extrema Pobreza;
- Relator Especial sobre o Direito à Alimentação;
- Relator Especial sobre o Direito Moradia Adequada;
- Expert Independente sobre os Efeitos do Ajuste Estrutural nas Políticas de Direitos Econômicos, Sociais e
Culturais e Direito ao Desenvolvimento;
- Representante Especial sobre Defensores de Direitos Humanos;
- Representante Especial sobre a Proteção de Crianças Afetadas por Conflitos Armados;
- Relator Especial sobre o Direito à Saúde.
São exemplos de países que possuem relatores especiais: Afeganistão, Guiné Equatorial, República Islâmica do
Irã, Iraque, Myamar, Territórios Ocupados da Palestina, Sudão, Ex-Iugoslávia, República Democrática do Congo,
Ruanda, Burindi, Camboja, Haiti e Somália.
Os relatores especiais, representantes especiais ou experts independentes têm seu trabalho balizado por
um termo de mandato estabelecido pela Comissão de Direitos Humanos das Nações Unidas. A depender do
interesse da comissão, os relatores podem ter mandatos mais ou menos amplos em relação aos poderes a
serem exercidos e ao tempo de execução.

19
Grupos de trabalho
Os grupos de trabalho, no sistema das Nações Unidas, são constituídos com o objetivo de receber denúncias
e elaborar propostas relacionadas a situações de direitos humanos, inclusive novos instrumentos internacionais
de proteção dos direitos humanos. São dois grupos de trabalho em funcionamento, vinculados à Comissão de
Direitos Humanos, ambos relacionados à proteção dos direitos humanos civis e políticos:
Grupo de Trabalho sobre Desaparecimentos Forçados ou Involuntários (composto por cinco membros ex-
perts independentes);
Grupo de Trabalho sobre Detenção Arbitrária (composto por cinco membros experts independentes).
Nada impede, no entanto, que sejam estabelecidos grupos de trabalho relacionados à proteção dos direitos
humanos econômicos, sociais e culturais. Além da Comissão de Direitos Humanos, outros órgãos da ONU,
como os comitês de monitoramento dos tratados de direitos humanos e a Subcomissão de Direitos Humanos,
podem estabelecer grupos de trabalho investigativos e propositivos.

Procedimento 1503
O Procedimento 1503 foi estabelecido, através da resolução 1503, de 27 de maio de 1970, pelo Conselho
Econômico e Social das Nações Unidas (ECOSOC), com a finalidade de dar resposta à grande quantidade de
graves e sistemáticas violações de direitos humanos que frequentemente chegam à ONU.
O Procedimento não lida com casos individuais de violações aos direitos humanos, mas com situações
que afetam grandes contingentes populacionais. Embora tenha sido criado para responder mais que tudo a
violações a direitos humanos civis e políticos, nada impede que seja usado também para a proteção de direi-
tos humanos econômicos, sociais e culturais, com base no princípio da indivisibilidade dos direitos humanos,
abraçado pelas Nações Unidas.
O mecanismo de proteção é administrado pelo Grupo de Trabalho da Subcomissão de Direitos Humanos
sobre a Promoção e a Proteção dos Direitos Humanos, composto por cinco experts. Recentemente, foi ampla-
mente utilizado em relação aos conflitos na Chechênia e o que envolve Israel e a Palestina.

— Sistema interamericano de direitos humanos. Organização dos estados americanos: declarações, tra-
tados, resoluções, relatórios, informes, jurisprudência (contenciosa e consultiva da corte interamericana de
Direitos Humanos), opiniões consultivas, normas de organização e funcionamento dos órgãos de supervisão,
fiscalização e controle. Relatorias temáticas e por países. Audiências públicas
A Convenção americana sobre direitos humanos (Pacto de San Jose da Costa Rica)
Apesar de ser uma eficiente ferramenta na efetivação de direitos humanos, o Sistema Interamericano de
Direitos Humanos é pouco conhecido, estudado e utilizado no Brasil. O conteúdo dos tratados internacionais é
considerado disperso e confuso, sua utilização é reduzida, em comparação com outros países das Américas, e
nem de longe é representativa das frequentes violações ocorridas 6.
Há países na América Latina nos quais as entidades de direitos humanos vêm, há mais de quinze anos,
incluindo em sua estratégia de ação o trabalho nas instâncias internacionais de proteção aos direitos humanos
e beneficiando-se das suas decisões, que visam primordialmente fortalecer o ambiente democrático e alcançar
a plena efetividade.
Em 12 de fevereiro de 1969, os países-membros da Organização dos Estados Americanos – OEA, adotaram
a Convenção Interamericana de Direitos Humanos, um tratado internacional multilateral, também conhecido
como “Pacto de San Jose da Costa Rica”, porque fruto de uma conferência da OEA realizada naquele País.
A Convenção Americana só entrou em vigor em 1978, quando o décimo primeiro país ratificou aquele tra-
tado. Carecia de sentido instituir um fórum internacional com jurisdição sobre reduzido número de países, por
isso a Convenção Americana demorou quase uma década para entrar em vigor. Pode-se afirmar que seu ob-
jetivo primordial era instituir órgãos com competência para supervisionar a atuação dos países integrantes em
relação aos direitos humanos.

6 https://edisciplinas.usp.br/pluginfile.php/4286318/mod_resource/content/1/Manual_de_Direitos_Acesso_
aos_Sistemas_global_e_Regional.pdf

20
A ratificação tardia da Convenção Americana sobre os Direitos Humanos, pelo Brasil, ocorrida apenas em
1992, coincidiu com o retorno do país à tradição democrática, iniciado ao final da década de oitenta. Enquanto
o país vivia sob a égide da ditadura militar, era inconcebível a adesão a um sistema de monitoramento supra-
nacional acerca do respeito aos direitos humanos. Com a consolidação do regime democrático, o Brasil passou
a lentamente, ratificar os principais tratados internacionais.
O Sistema Interamericano foi concebido contando com dois órgãos de funções complementares, mas distin-
tas: a Comissão Interamericana de Direitos Humanos e a Corte Interamericana de Direitos Humanos. O primei-
ro desses órgãos possui a sede em Washington, Estados Unidos, e o segundo em San José, na Costa Rica.
As atribuições concernentes a cada um dos órgãos do Sistema estão previstas na Convenção Americana
Sobre Direitos Humanos e nos seus respectivos Regimentos Internos, recentemente remodelados e em vigor a
partir de 01 de maio e 01 de junho de 2001 (Regimentos da Comissão e da Corte, respectivamente).
Mesmo antes da instituição do Sistema Interamericano pelo Pacto de San José, a Comissão já estava em funcio-
namento desde 1959, em função da adoção da Resolução de Santiago. No entanto, prestava-se a um papel diverso
e bem mais tímido que o atual porque sequer havia previsão regimental para o recebimento de petições individuais.
Resumia-se a resguardar a “promoção” dos direitos humanos nas Américas. A partir de 1965 a Comissão
passou a receber petições individuais com a edição da Resolução do Rio de Janeiro, mas apenas quando da
entrada em vigor do Pacto de San José e do Protocolo de Buenos Aires, seu papel foi reformulado para ganhar
as feições que detém hoje, assumindo função de extrema relevância na promoção e defesa dos direitos huma-
nos nas Américas.
A Comissão Interamericana de Direitos Humanos
A Comissão Interamericana de Direitos Humanos está sediada em Washington, EUA, na sede da Organi-
zação dos Estados Americanos. É integrada por sete membros eleitos a título pessoal, mas provenientes de
países integrantes da OEA.
Os comissários (comissionados) não representam seus países de origem ou mantém qualquer tipo de vínculo go-
vernamental, seu papel é o de assegurar o respeito aos direitos humanos pelos Estados-Membros. Os comissários
são eleitos pela Assembleia Geral da OEA, para um mandato que dura quatro anos e é renovável por igual período.
A Comissão, na versão atual, exerce duplo papel no Sistema Interamericano: é o órgão que recebe as pe-
tições individuais, relatando a violação a algum dos artigos da Convenção Americana sobre Direitos Humanos
ou de outros tratados de alcance regional de conteúdo específico; além de elaborar relatórios diversos sobre a
situação dos direitos humanos nos países signatários.
Estes relatórios podem ser temáticos, focalizando um ponto específico, ou ainda, geográficos, no qual tratam
da situação dos direitos humanos num único país. Deve, ainda, a Comissão produzir relatórios anuais sobre a
situação dos direitos humanos, periodicamente submetidos à Assembleia da OEA.
A Comissão detém ainda, entre suas faculdades, o poder de realizar visitas in loco, quando julgar indispen-
sável que um de seus membros faça pessoalmente uma verificação de condições a ela relatadas, ou ainda,
para fazer uma missão de verificação geral. O rol de atribuições da Comissão encontra-se descrito no art. 41
da Convenção Americana.
No entanto, a função primordial da Comissão é receber as denúncias individuais de violações perpetradas
por Estados-Partes da OEA. A legitimidade ativa dos denunciantes é amplíssima: qualquer pessoa ou grupo de
pessoas, ou ainda entidades não governamentais legalmente constituídas podem levar um caso a Comissão.
Não é necessária vinculação específica à violação ou ser vítima para levar uma denúncia ao órgão A Comis-
são é competente para receber casos de violação perpetrados por Estados membros da OEA que ratificaram ou
não a Convenção Americana. O Protocolo de Buenos Aires dotou a Comissão de poderes para dar seguimento
a denúncias de violações à Carta da OEA ou à Declaração Americana, agora dotadas de exigibilidade. Alguns
casos brasileiros foram apresentados antes de 1992, com base na Declaração Americana, como por exemplo
o dos Yanomamis.
Necessário é que se cumpram os requisitos estabelecidos na Convenção Americana para a apresentação
de uma petição, que estão elencados no art. 46 do Pacto de San José. Paradoxalmente, apesar de ser o órgão
que recebe as denúncias individuais, a Comissão não possui competência para emitir sentenças.

21
Ao constatar a responsabilidade do Estado por uma violação, a Comissão elabora um Relatório Final com
recomendações ao Estado a fim de fazer retornar o status quo ante, ou fazer cessar imediatamente a violação
denunciada e indenizar a vítima por todos os prejuízos sofridos, ou ainda, nas palavras do tratado “determina
que se assegure ao prejudicado o gozo do seu direito ou liberdade violados”.
Requisitos da petição no sistema interamericano
Para que uma petição seja considerada admissível perante o Sistema Interamericano, deve contemplar os
requisitos previstos na Convenção Americana: o esgotamento dos recursos de direito interno, a apresentação
da petição em um prazo inferior a seis meses da ciência da última decisão, e a proibição da litispendência inter-
nacional. A regra do prévio esgotamento dos recursos de direito interno originou-se nas relações diplomáticas
entre os Estados, mas foi incorporada pelo Direito Internacional dos Direitos Humanos.
O Preâmbulo da Convenção Americana estabelece que os mecanismos internacionais “oferecem proteção
internacional aos direitos essenciais da pessoa humana” de forma “coadjuvante ou complementar da que ofe-
rece o direito interno dos Estados Americanos”. Por conseguinte, os órgãos internacionais não têm legitimidade
para conhecer de uma violação sem que antes se tenha dado oportunidade ao Estado denunciado de solucio-
ná-lo.
Por outro lado, o propósito da regra não é incentivar situações burocráticas insolúveis para que os peticionários
nunca possam ascender ao sistema, mas como estímulo à solução das violações de direitos humanos pelo fortaleci-
mento das vias internas. A proibição da litispendência veda que um mesmo caso seja apresentado simultaneamente
a duas instâncias internacionais de caráter convencional.
Assim, uma denúncia pode ser levada a um dos mecanismos extra-convencionais das Nações Unidas e ao
Sistema Interamericano, pois os mandatos não são da mesma natureza. Os mecanismos extra-convencionais
possuem mandato de natureza política, enquanto os órgãos do Sistema Interamericano possuem natureza ju-
risdicional ou quase-jurisdicional.
Há, no entanto, exceções ao requisito do esgotamento dos recursos de direito interno, previstos no art.
46.2. As exceções podem ser invocadas em três situações distintas: quando não existam recursos previstos na
legislação interna; quando estes recursos existem, mas são ineficazes ou inacessíveis e quando haja demora
injustificada na decisão de recursos interpostos.

Os trâmites no sistema interamericano


O procedimento levado a cabo perante o Sistema Interamericano visa à verificação da responsabilidade
internacional do Estado frente a uma violação de um direito estabelecido na Convenção Americana. A respon-
sabilidade internacional difere fundamentalmente das estabelecidas pelo direito interno e estão assentadas no
compromisso de “respeitar” e “garantir” os direitos previstos no art. 1.1 da Convenção.
O binômio “respeitar” e “garantir” impõe aos Estados deveres de abstenção e de implementação, ou como
se diz, positivos e negativos. Os deveres de abstenção estão relacionados ao “respeito”, de forma que o Estado
deve se abster de cercear os indivíduos no exercício das liberdades individuais, seja expressão, locomoção ou
associação.
Já o termo “garantir” impõe uma obrigação positiva de implementar ou de fazer. O Estado deve oferecer uma
legislação harmônica com a Convenção Americana, em direitos e deveres.
Também deve garantir que seus agentes atuem em conformidade com estas regras, já que não é suficiente
haver consonância meramente aparente. A presença de normas hipoteticamente aptas a garantir os direitos
humanos não elidem o descumprimento art. 1.1 da Convenção Americana, apenas o resultado adequado o faz.
A Corte Interamericana tem assentado entendimento sobre a responsabilidade internacional, bem como
sobre a importância do art. 1.1 na sua configuração.
Medidas cautelares e provisórias
Embora o procedimento no Sistema Interamericano exija, via de regra, o esgotamento dos recursos de direi-
to interno, há casos urgentes em que o risco a que a potencial vítima está submetida seria de dano irreparável.
Não há como esperar proteção ou garantia do Estado.

22
Nestas situações a Convenção Americana, bem como os Regimentos Internos da Comissão e da Corte,
preveem procedimentos urgentes de forma a “evitar danos irreparáveis as pessoas”, chamados de medidas
cautelares e medidas provisórias.
A Comissão, de acordo com o artigo 25 do seu Regimento Interno, está autorizada a solicitar ao Estado a
adoção de medidas cautelares, por iniciativa própria ou a requerimento das partes interessadas. Este procedi-
mento, no entanto, carece de força convencional, uma vez que foi estabelecido pelo Regimento Interno daquele
órgão.
Por outro lado, as medidas provisórias ordenadas pela Corte Interamericana, não estão apenas previstas no
art. 25 do seu Regimento, mas também no artigo 63.2 da Convenção Americana. Caso o Estado não cumpra
estas medidas, isto se transforma em violação adicional da Convenção Americana, dado o seu caráter conven-
cional.
As medidas provisórias podem ser adotadas ex officio em relação a casos sob análise da Corte ou a reque-
rimento da Comissão nos casos que ainda não tenham chegado à Corte, desde que o Estado envolvido tenha
reconhecido a competência da Corte.

A Corte Interamericana de Proteção aos Direitos Humanos


A Corte Interamericana de Direitos Humanos é o órgão jurisdicional do Sistema por excelência. Enquanto
os membros da Comissão são chamados de Comissários, os membros da Corte detêm o título de Juízes; en-
quanto a Comissão elabora um relatório final com “recomendações”, a Corte emite uma sentença “definitiva e
inapelável”, nas palavras da Convenção Americana.
As sentenças da Corte são, ainda, obrigatórias, não podendo os Estados recusar-se a cumpri-las. Enquanto
o reconhecimento da competência da Comissão para conhecer de casos individuais decorre automaticamente
da ratificação da Convenção Americana, o procedimento de aceitação da função contenciosa da Corte Intera-
mericana depende de manifestação expressa em documento escrito depositado na sede da OEA.
Embora o Brasil tenha ratificado a Convenção Interamericana em 1992, e, portanto, automaticamente tenha
se sujeitado ao monitoramento pela Comissão Interamericana, o documento relativo à Corte só foi depositado
em dezembro de 1998. É importante lembrar que os indivíduos não são aptos a recorrer diretamente à Corte
Interamericana de Direitos Humanos, uma vez que não há tal previsão na Convenção Americana que os legiti-
me para tanto.
Apenas os Estados-Partes e a própria Comissão Interamericana podem decidir submeter ou não um caso à
Corte Interamericana de Direitos Humanos. Em ambas as situações, o Estado denunciado deve expressamen-
te haver reconhecido a competência daquele órgão.
Em relação aos casos levados pela Comissão para o processo judicial na Corte, é necessário o cumprimento
de todas as etapas previstas na Convenção Americana. A Corte Interamericana de Direitos Humanos não está
vinculada aos trabalhos e/ou conclusões da Comissão.
Assim, pode optar por repetir toda a fase probatória, e concluí-las de forma diferenciada. Isto quer dizer que,
hipoteticamente, a Comissão pode decidir pelo reconhecimento de uma violação de um dos direitos estabeleci-
dos na Convenção Americana e, a Corte Interamericana de Direitos Humanos rejeitá-lo, posteriormente.
Além da função jurisdicional, a Corte Interamericana de Direitos Humanos também produz os chamados
Pareceres Consultivos (Opiniones Consultivas). Esses são frutos da função hermenêutica do órgão.
Nestes Pareceres a Corte Interamericana faz pública e obrigatória a sua interpretação concernente a dispo-
sitivos previstos nos tratados regionais de direitos humanos, definindo sentido e alcance das normas em ques-
tão; também se pronuncia sobre a compatibilidade de leis nacionais com os tratados interamericanos. A leitura
dos Pareceres Consultivos permite utilizar, quando da apresentação internacional de um caso, conceitos que
foram estabelecidos pela própria Corte na busca de um resultado semelhante.
A Corte Interamericana produz, como resultado de um processo sob a sua jurisdição, uma sentença que, se-
gundo a Convenção, deve ser executada internamente como se produzida em direito interno.

23
O litígio de direitos humanos econômicos, sociais e culturais
Recentemente as entidades que litigam na Corte Interamericana vêm buscando o reconhecimento da supe-
ração das diferenças historicamente criadas entre os direitos humanos civis e políticos e os direitos humanos
econômicos sociais e culturais. Isto porque a Convenção Americana não prevê o trâmite de casos individuais
relativos a DhESC no sistema interamericano.
Há, na Convenção Americana, apenas um artigo, o art. 26, que trata dos direitos humanos econômicos, so-
ciais e culturais, mas com as reservas de praxe: progressividade e capacidade econômica de implementação
de acordo com as possibilidades de cada Estado.
Tal omissão foi parcialmente sanada com a edição do Protocolo Adicional à Convenção Americana em Ma-
téria de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, também conhecido como Protocolo de San Salvador, que
entrou em vigor em 1988.
Ainda assim, tal Protocolo não equalizou a matéria de forma ideal, uma vez que apenas dois artigos, o art. 8º e o
13, relativos à educação e direitos sindicais, estão expressamente previstos como passíveis de denúncia no Siste-
ma Interamericano. Várias estratégias para superar estas diferenciações estão sendo levadas a cabo por entidades
peticionárias, com vistas a forçar os órgãos do Sistema a conhecer de violações aos direitos humanos em sua inte-
gralidade, interdependência e indivisibilidade, como recomenda a Declaração de Viena, de 1993.
São utilizados os seguintes estratagemas para buscar o reconhecimento da indivisibilidade dos direitos
humanos: a primeira busca construir uma ponte argumentativa entre os direitos humanos civis e político esta-
belecidos na Convenção Americana e os do Protocolo de San Salvador. Desta forma, em alguns casos, uma
violação do direito à saúde pode ser litigada como direito à vida ou à integridade física; a segunda forma é feita
com base no art. 24 da Convenção Americana que veda a discriminação, e em função disso a Comissão não
pode se recusar a conhecer de casos de violação aos direitos humanos econômicos, sociais e culturais porque
estaria ela própria violando o preceito; e por fim, a terceira possibilidade diz respeito a uma interpretação do
Protocolo de San Salvador, afinal este afirma que os direitos à educação e os sindicais ensejam denúncias à
Comissão Interamericana, mas não vedam expressamente outros direitos.
E segundo o velho corolário jurídico, “tudo que não está proibido é permitido”. Abre-se, portanto, uma brecha
na legislação. Ultimamente, a Corte Interamericana vem editando sentenças nas quais se percebe uma evolu-
ção da sua jurisprudência ampliando o conceito dos direitos humanos.
Como exemplos, os casos Aloeboetoe e outros contra o Suriname, no qual a Corte reconhece a organização
social matriarcal das vítimas para efeitos do recebimento e distribuição do montante indenizatório, reconhecen-
do a primazia dos direitos culturais daquela tribo para efeitos de sucessões; Villagrán Morales e outros contra
Guatemala, no qual redefine o direito à vida integrando direitos civis e econômicos, sociais e culturais, Baena
Ricardo e outros contra Panamá, no qual são analisados direitos sociais relativos ao trabalho, desligamentos
ilegais e indenizações devidas.

Sistema interamericano de direitos humanos. Organização dos estados americanos:


declarações, tratados, resoluções, relatórios, informes, jurisprudência (contenciosa e
consultiva da corte interamericana de Direitos Humanos), opiniões consultivas, normas
de organização e funcionamento dos órgãos de supervisão, fiscalização e controle. Re-
latorias temáticas e por países. Audiências públicas

Além do Sistema Global de proteção aos Direitos Humanos representado pela ONU, vários são os Sistemas
Regionais de Proteção aos Direitos Humanos, dentre eles o Sistema Interamericano, o Sistema Europeu, o
Sistema Árabe, o Sistema Africano, o Sistema Asiático, o Sistema do Mercosul.
Num processo de regionalização dos direitos humanos, no qual as peculiaridades das grandes regiões glo-
bais poderiam ser levadas em consideração, permitindo maior efetividade, os países americanos se reuniram
para a formação de uma Organização (dos Estados Americanos) com o compromisso internacional continental
pela preservação dos direitos humanos.
O Sistema Interamericano de proteção dos Direitos Humanos se centraliza na atuação institucional da
Organização dos Estados Americanos – OEA e tem por principais instrumentos: a Carta da Organização dos
Estados Americanos (1948); a Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem (1948), a Convenção

24
Americana sobre Direitos Humanos (1969), também chamada de Pacto de San José da Costa Rica e o Proto-
colo Adicional à Convenção Americana em Matéria de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, apelidado de
Protocolo de San Salvador (1988).
A OEA reúne 35 países americanos independentes, sendo o Brasil um de seus membros originários e seu
principal objetivo é a garantia da paz e da segurança dos países americanos.
A Comissão Interamericana de Direitos Humanos é um órgão consultivo e deliberativo da Organização dos
Estados Americanos – OEA, criado pela Carta da OEA em seu artigo 106 com a “principal função promover o
respeito e a defesa dos direitos humanos e servir como órgão consultivo”.
Por sua vez, a Corte Interamericana de Direitos Humanos é o único órgão jurisdicional na estrutura da
Organização dos Estados Americanos. Além de sua função jurisdicional própria para o julgamento de casos
concretos de violação dos preceitos da Convenção Americana sobre Direitos Humanos por seus Estados-par-
tes desempenha também a função consultiva, de interpretação das disposições da Convenção, bem como de
tratados relativos à proteção dos direitos humanos nos países americanos.
Fontes, Classificação e Princípios dos Direitos Humanos Internacionais
São fontes dos Direitos Humanos Internacionais: os tratados e convenções internacionais, os costumes in-
ternacionais e os princípios gerais do Direito, além da analogia e equidade como soluções ante a falta de uma
norma internacional, atos unilaterais dos Estados e decisões das organizações internacionais.
Quanto à sua classificação os direitos humanos são:
– Históricos: frutos de conquistas graduais e de um processo de evolução ao longo do tempo;
– Universais e devem alcançar a todos os seres humanos indistintamente;
– Relativos: não são absolutos e podem sofrer limitações;
– Irrenunciáveis: pois, inerentes à condição humana, ninguém pode abrir mão de sua própria natureza;
– Inalienáveis, pois não podem ser transacionados ou condicionados;
– Imprescritíveis, uma vez que não se perdem com o passar do tempo.
Os direitos humanos são ainda autônomos e interdependentes, complementares e indivisíveis, devendo
ser interpretados de forma conjunta e interativa com os demais direitos e não isoladamente, sempre sujeitos à
proteção jurisdicional efetiva nos níveis nacional e internacional.
Princípios dos Direitos Humanos Internacionais
Todos os indivíduos são iguais como seres humanos e pela dignidade da pessoa humana fazem jus ao
exercício de seus direitos sem discriminação de raça, cor, sexo, etnia, idade, idioma, religião, nacionalidade,
preferência política, condição física e social, orientação sexual e identidade de gênero. O princípio da não-dis-
criminação no Direito Internacional dos Direitos Humanos é intrínseco ao direito à vida e remete-se também ao
princípio basilar da isonomia, ou igualdade.
Outro importante princípio dos Direitos Humanos Internacionais é o da primazia da norma mais favorável.
Pelo princípio da primazia (ou prevalência) da norma mais favorável às vítimas de violações de Direitos Huma-
nos, em caso de conflito de normas de Direitos Humanos, sejam elas de direito interno ou internacional, deverá
ser aplicada a norma que for mais favorável à vítima que sofrer quaisquer tipos de violações em seus direitos
e garantias fundamentais. Esse princípio reduz ou minimiza divergências de aplicação de preceitos e normas
de direitos humanos.
A eficácia e aplicabilidade dos direitos humanos torna necessária a complementação e ampliação da atuação
do Sistema Universal de Direitos Humanos por outros sistemas regionais e nacionais, ampliando-se o alcance
das normas protetivas e mais adequadas a cada contexto e região específica. Surgem, portanto, os Sistemas
Regionais de Direitos Humanos, com seus próprios sistemas protetivos.
Além do Sistema Global de proteção aos Direitos Humanos consubstanciado pela ONU, vários são os
Sistemas Regionais de Proteção aos Direitos Humanos, dentre eles o Sistema Interamericano, o Sistema
Europeu, o Sistema Árabe, o Sistema Africano, o Sistema Asiático, o Sistema do Mercosul.

25
— Sistema Interamericano: Comissão e Corte Interamericanas de Direitos Humanos
Os direitos humanos na Organização dos Estados Americanos
O Sistema Interamericano de proteção dos Direitos Humanos se centraliza na atuação institucional da
Organização dos Estados Americanos – OEAm tem por principais instrumentos:
– A Carta da Organização dos Estados Americanos (1948);
– A Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem (1948);
– A Convenção Americana sobre Direitos Humanos (1969), também chamada de Pacto de San José da
Costa Rica e o Protocolo Adicional à Convenção Americana em Matéria de Direitos Econômicos, Sociais e
Culturais, apelidado de Protocolo de San Salvador (1988).
A OEA reúne 35 países americanos independentes, sendo o Brasil um de seus membros originários, seu
principal objetivo é a garantia da paz e da segurança dos países americanos.
A Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem
A Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem (1948), apesar de não ser tecnicamente um
tratado, explicita os direitos mencionados na Carta da OEA. Com o reconhecimento internacional dos direitos
humanos na criação da ONU e elaboração da Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948 ainda seria
necessário buscar sua efetivação, garantindo a dignidade inerente à pessoa humana em qualquer localidade,
de modo que fossem consideradas regiões globais em suas peculiaridades para maior efetividade das normas
de direitos humanos universalmente reconhecidas.
Num processo de regionalização dos direitos humanos, no qual as peculiaridades das grandes regiões
globais poderiam ser levadas em consideração, permitindo maior efetividade, os países americanos se reuniram
para a formação de uma Organização (dos Estados Americanos) com o compromisso internacional continental
pela preservação dos direitos humanos.
É interessante observar que a Declaração Americana sobre Direitos e Deveres do Homem foi assinada
seis meses antes da própria Declaração Universal dos Direitos Humanos. Ambos documentos são, portanto,
bastante alinhados. Se a Declaração Universal deu origem à Carta Internacional dos Direitos Humanos, a
Declaração Americana impulsionou a Convenção Americana sobre Direitos Humanos, também chamada de
Pacto de São José da Costa Rica e seus Protocolos Facultativos, principal documento de proteção aos direitos
humanos no continente americano.
O Estatuto e o Regulamento da Comissão Interamericana de Direitos Humanos
A Comissão Interamericana de Direitos Humanos é um órgão consultivo e deliberativo da Organização dos
Estados Americanos – OEA, criado pela Carta da OEA em seu artigo 106 com a “principal função promover o
respeito e a defesa dos direitos humanos e servir como órgão consultivo”.
Possivelmente, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos é o órgão mais ativo da OEA, que também
funciona como um informativo de estudos e pesquisas a respeito dos países americanos.
Além disso, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos tem um Estatuto aprovado pela Assembleia
Geral, e um regulamento, elaborado nos termos do estatuto (artigo 39, CADH). O seu Estatuto trata em seus
26 artigos de sua natureza e propósitos, composição e estrutura, sede e reuniões, funções e atribuições,
secretaria, regulamento e disposições transitórias.
O Estatuto e o Regulamento da Corte Interamericana de Direitos Humanos
A Corte Interamericana de Direitos Humanos é o único órgão jurisdicional na estrutura da Organização
dos Estados Americanos. Além de exercer sua função jurisdicional para o julgamento de casos concretos de
violação dos preceitos da Convenção Americana sobre Direitos Humanos por seus Estados-partes, ela também
desempenha a função consultiva, interpretando as disposições da Convenção, bem como de tratados relativos
à proteção dos direitos humanos nos países americanos.
Para que um país se submeta à sua jurisdição, este deve reconhecer sua competência para apreciação de
denúncias e queixas contra ele dirigidas no âmbito internacional. O Brasil reconheceu a competência da Corte
para fatos ocorridos a partir de 10 de dezembro de 1998, através do Decreto nº 4.463/2002.

26
Como instituição judiciária internacional autônoma, a Corte Interamericana de Direitos Humanos tem como
principal objetivo a aplicação e a interpretação da Convenção Americana sobre Direitos Humanos. É regida
por um Estatuto próprio, composto por 32 artigos que tratam de sua natureza, regime jurídico, competência,
funções, composição, estrutura, direitos, deveres e responsabilidades, funcionamento, relações com estados
e organismos, reforma e vigência. Além disso, também é disciplinada por seu Regulamento, que estabelece as
normas de procedimento, conforme previsto no artigo do Estatuto.

Sistemas regionais de proteção dos direitos humanos

Paralelamente à criação da ONU, em 1945, a emergência da proteção dos direitos fundamentais dos indiví-
duos num nível supranacional, após a Segunda Guerra Mundial, impulsionou a criação de sistemas regionais
de proteção aos direitos humanos. Esses sistemas regionais caracterizam-se por uma maior homogeneidade
entre seus membros, se os compararmos à abrangência da ONU, tanto no que se refere aos seus sistemas
jurídico políticos, quanto aos aspectos culturais. Isto acaba por tornar os seus mecanismos de proteção mais
eficazes em relação àqueles do sistema global 7.
Por sistemas regionais de proteção aos direitos humanos, deve-se entender os atuais organismos interna-
cionais regionais existentes nos diversos continentes, como no europeu, representado pela Corte Europeia de
Direitos Humanos; no americano, representado pela Comissão Interamericana e pela Corte Interamericana de
Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos; e no africano, representado pela Comissão Africa-
na de Direitos Humanos e dos Povos.
Dentro do Sistema Africano, a Comissão Africana de Direitos Humanos e dos Povos foi criada pela Carta
Africana de Direitos Humanos e dos Povos (adotada em Nairobi/Quênia, em 1981, pela Assembleia Geral da
Organização da Unidade Africana), que entrou em vigor em 21 de outubro de 1986, e tem o objetivo de promo-
ver e proteger os direitos humanos e dos povos dentro do continente africano.
Esta Comissão recebe e analisa petições sobre violações de direitos humanos, através de procedimento
altamente confidencial, que varia, sejam elas advindas de Estados, de pessoas físicas ou jurídicas. Além deste
órgão, o Protocolo Adicional à Carta Africana, adotado na 34ª Sessão Ordinária da Assembleia da Organização
da Unidade Africana, de 8 a 10 de junho de 1998, dispõe sobre a criação de uma Corte Africana de Direitos
Humanos e dos Povos, com mandato complementar ao da Comissão, que terá poder jurisdicional e consultivo
(interpretativo).
No continente europeu, o marco inicial do sistema de proteção é a Convenção sobre Direitos Humanos de
1950. Ela estabeleceu a criação de três órgãos de monitoramento: a Comissão Europeia de Direitos Humanos
(criada em 1954), a Corte Europeia de Direitos Humanos (criada em 1959), e o Comitê de Ministros do Conse-
lho da Europa (criado em 1959).
O direito de petição denunciando violações de direitos humanos era assegurado a qualquer indivíduo, grupo
de indivíduos ou organizações não-governamentais, e passavam primeiro pela Comissão (exame preliminar de
admissibilidade e tentativa de solução amistosa), que em seguida podia enviar ao Comitê (no caso de Estados
que não haviam aceitado a jurisdição da Corte, até então facultativa; além de supervisionar a execução das
sentenças da Corte), ou então à Corte (competência jurisdicional e consultiva, esta última a partir do Protocolo
adicional nº 2).
Em 11 de maio de 1994, o Protocolo nº 11 reestruturou o sistema de monitoramento, uma vez que o grande
número de petições encaminhadas provocou a necessidade de simplificar os mecanismos. A solução adotada
foi a criação de uma Corte permanente, para diminuir a demora nos procedimentos, e reforçar o caráter judicial
do sistema, extinguindo-se a antiga Corte (31 de outubro de 1998), a Comissão (um ano depois, em 31 de ou-
tubro de 1999, pois tinha que cuidar dos casos previamente declarados admissíveis), e o papel do Comitê no
exame de petições.

7 https://edisciplinas.usp.br/pluginfile.php/4286318/mod_resource/content/1/Manual_de_Direitos_Acesso_
aos_Sistemas_global_e_Regional.pdf

27
Como o Protocolo exigia a ratificação de todos os Estados-membros para entrar em vigor, a nova Corte só
começou a funcionar em 01 de novembro de 1998, em Estrasburgo, França. A partir daí, foi conferida a qual-
quer Estado ou indivíduo a capacidade de denunciar um caso diretamente à Corte.
Nos últimos anos, porém, com a ratificação da Convenção Europeia pelos Estados do centro e leste euro-
peu, mais uma vez o grande número de petições encaminhadas à Corte Europeia (13.858 em 2001) tem pro-
vocado reflexões acerca de reformas no sistema. O Comitê de Ministros tem estudado a proposta de um novo
Protocolo à Convenção Europeia, que conferiria poder à Corte para recusar-se a examinar em detalhe petições
que tratem de assunto irrelevante, e criaria uma nova divisão para o exame preliminar de petições, mas o as-
sunto permanece controvertido.
No âmbito das Américas, em 30 de abril de 1948, durante a IX Conferência Internacional Americana, realiza-
da em Bogotá, foi adotada a Carta da Organização dos Estados Americanos (OEA), criando a Organização da
qual fazem parte todos os 35 Estados das Américas do Norte, Central (incluindo o Caribe), e do Sul. O Sistema
Interamericano de Direitos Humanos tem como seu marco inicial a Declaração Americana de Direitos e Deveres
do Homem, que foi aprovada na mesma ocasião, pela Resolução XXX.
Há de se destacar que a Declaração Americana foi o primeiro instrumento internacional de direitos humanos
anterior à Declaração Universal dos Direitos Humanos. A Declaração Americana sobre Direitos Humanos ab-
sorveu basicamente os mesmos conteúdos da DUDH. Também na versão americana é reproduzida a divisão
acerca dos direitos humanos civis e políticos em oposição aos econômicos, sociais e culturais, fruto da divisão
do mundo em blocos econômicos.
Segundo a Declaração Americana, o sistema de proteção no âmbito internacional deveria ser posteriormente
fortalecido, na medida do possível com a elaboração de tratados com força vinculante obrigatória, quando as
circunstâncias fossem mais propícias. Embora a Declaração Americana, como a das Nações Unidas, não fosse
mais que uma carta de intenções, sem valor vinculante, constituiu-se em verdadeiro marco para a produção de
futuros tratados regionais sobre direitos humanos. Anos mais tarde, os principais órgãos de proteção de direitos
humanos acabaram por conceder força vinculante a ambas as Declarações.
No Preâmbulo da Declaração lê-se clara indicação de que a dignidade da pessoa humana bem como a sua
proteção seriam motes fundamentais da atuação daquele organismo regional. Já a Carta da Organização dos
Estados Americanos, por sua vez, continha poucas e gerais disposições acerca de direitos humanos, apesar
de trazer em um de seus artigos que os Estados Americanos reafirmam e proclamam como um princípio da
Organização os direitos fundamentais da pessoa humana sem distinção de raça, nacionalidade, credo ou sexo,
mas, no entanto, adverte-se para a falta de identificação desses direitos.
A conferência de Bogotá deixou claro o entendimento que a Declaração não havia sido incorporada à Carta
da OEA. O Comitê Jurídico Interamericano reforçou este ponto de vista com seu ditame de 1949 no sentido
de que a Declaração não cria obrigações contratuais jurídicas, e que carecia do caráter de direitos positivos
substantivos.
Tal situação perdurou até à década de setenta quando, ao se reconhecer a necessidade de dotar de bases
jurídicas tanto a Declaração Americana como a Carta da OEA, entrou em vigor o Protocolo de Buenos Aires,
em 1970. Este Protocolo, instrumento jurídico vinculante, absorveu expressamente os conteúdos contidos na
Declaração e na Carta, dotando-os de valor normativo.
Assentadas as bases legais da OEA em relação aos direitos humanos, o passo seguinte foi efetivar um sis-
tema que atuasse substancialmente na proteção aos direitos humanos nas Américas.

28
A incorporação dos tratados internacionais de proteção dos direitos humanos ao di-
reito brasileiro. Posição hierárquica dos tratados internacionais de direitos humanos.
A aplicabilidade das normas contidas em tratados internacionais de direitos humanos
ratificados pelo Brasil. A execução de decisões oriundas de tribunais internacionais de
direitos humanos no Brasil. Controle de Convencionalidade

Internacionalmente, os mecanismos de proteção contra as violações de Direitos Humanos derivam das


próprias fontes do Direito Internacional, bem como da atuação do Sistema Global (ONU) e dos Sistemas
Regionais de proteção aos direitos humanos.
Os documentos internacionais de proteção dos direitos humanos trazem diferentes acepções com regras,
origens, conteúdo, força e efeitos dos mais variados. Podem ser mundiais, regionais ou locais e determinam
também a atuação de seus mecanismos protetivos, geralmente órgãos criados com competência investigatória,
jurisdicional ou ainda, meramente consultiva.
No âmbito da ONU temos o que chamamos de sistema universal ou global de Direitos Humanos, além dos
existem 3 sistemas regionais (interamericano, europeu e africano).
Para a vigilância, supervisão, monitoramento e fiscalização da proteção dos direitos humanos foram criados
no âmbito da ONU mecanismos extraconvencionais e convencionais.
Os mecanismos convencionais são aqueles que resultam de tratados, convenções ou acordos internacionais,
podendo ser aplicados somente aos Estados signatários de tais instrumentos, sendo muito comum que tragam
em seu bojo a criação de um órgão específico para implementar suas proposições, com mecanismos e
instrumentos de fiscalização, inclusive.
Os mecanismos não-convencionais decorrem de medidas afirmativas tomadas em casos de violação
sistemática de Direitos Humanos aplicáveis em relação a qualquer Estado, por serem decorrentes de assunto
de interesse da comunidade internacional.
Sistema convencional e extraconvencional
Em suma, os mecanismos convencionais são criados por convenções específicas de direitos humanos, como
a Convenção pela Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial, a Convenção pela Eliminação de
Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher, a Convenção sobre os Direitos da Criança, o Pacto Internacional
sobre Direitos Civis e Políticos, dentre outras. Já os mecanismos extraconvencionais são decorrentes da participação
da sociedade civil, de mecanismos dos países e mecanismos temáticos, além de resoluções elaboradas por órgãos
das Nações Unidas, como a Assembleia Geral e o Conselho Econômico e Social, extraindo sua legitimidade para
proteção da ampla estrutura de competência das Nações Unidas, tal como os mecanismos originalmente instituídos
na Carta da ONU.

O órgão não convencional mais relevante das Nações Unidas é o Conselho de Direitos Humanos, criado
após votação da Assembleia Geral, substituindo a antiga Comissão de Direitos Humanos, sendo um órgão
subsidiário da Assembleia Geral. Outro órgão não convencional de extrema importância é o Alto Comissariado
das Nações Unidas para os Direitos Humanos, que se enquadra como um departamento especializado do
Secretariado da ONU.
Já no sistema convencional de proteção dos direitos humanos os Estados-partes do tratado internacional se
comprometem internacionalmente com a proteção de determinados direitos fundamentais. Este esquema de
salvaguarda pode ser desmembrado em três diferentes formas:
a) Não-contencioso: um Estado, espontaneamente, diante da ratificação de um tratado, obriga-se a respeitar
e proteger os direitos humanos. Uma das modalidades de acompanhamento e controle da observância das
obrigações é o sistema de envio de relatórios periódicos;
b) Quase-judicial: ocorre a responsabilização dos Estados por violações dos tratados de direitos humanos
em que são partes, mas esta não vem de órgão jurisdicional do sistema. Geralmente parte de Comitês e
Comissões especialmente criados para tal fim. As decisões proferidas não são sentenças, de tal forma que
suas decisões não são coativas, embora seja usual que os Estados as acatem;

29
c) Judicial: no plano universal, a Corte Internacional de Justiça (CIJ) é órgão competente para julgar os
Estados por violação de direitos humanos. A CIJ é o órgão judicial das Nações Unidas que tem competência
para julgar qualquer demanda que envolva os membros da ONU. Contudo, o papel da Corte Internacional de
Justiça no âmbito da proteção da pessoa humana tem sido muito modesto.
Os mecanismos de proteção às violações de direitos humanos podem atuar tanto através do sistema de
petição, mediante provocação do próprio interessado – reclamações de Estados, pessoas ou grupos, conforme
condições de admissibilidade previstas nos próprios instrumentos; quanto de ofício, através do sistema de
relatórios, e ainda, através da instauração procedimentos de investigação em determinadas situações
específicas.
Os diversos mecanismos internacionais de proteção aos Direitos Humanos podem ser convencionais ou
não, e ainda unilaterais ou coletivos.

O mecanismo unilateral decorre da atuação de um Estado, ao requerer e exigir reparação quando sentir-
se ofendido ou lesado por outro Estado, podendo, inclusive, aplicar sanções. É um dos mecanismos menos
recomendados quando se trata da reparação de violações de direitos humanos.
Por sua vez, o mecanismo coletivo – também chamado de institucional de responsabilização internacional,
decorre da atuação de um órgão independente, na análise da ocorrência de possíveis violações de forma a
apurar a responsabilidade internacional dos envolvidos. Este tipo de mecanismo tem se tornado cada vez mais
essencial na tomada de providências quanto às violações de Direitos Humanos.
Os sistemas internacionais de proteção aos direitos humanos compreendem o conjunto de normas, órgãos
e mecanismos internacionais criados com o intuito de promover a proteção dos direitos humanos.
A proteção aos Direitos Humanos na ordem jurídica nacional
Frutos do processo de democratização, o Brasil foi reinserido no plano internacional de proteção aos Direitos
Humanos, com a Convenção Americana de Direitos Humanos, de 1969, também chamada de Pacto de São
José da Costa Rica, da qual o Brasil é signatário, e que trouxe a consequente ampliação do seu universo de
direitos fundamentais.
A política nacional de Direitos Humanos do Brasil começou a ser desenvolvida em 1985, sendo mais definida
a partir de 1995, pelo governo do então presidente Fernando Henrique Cardoso, refletindo a concepção de
direitos humanos em nível internacional.
Foi quando pela primeira vez na história republicana brasileira, quase meio século depois da Declaração
Universal de Direitos Humanos de 1948, que os direitos humanos passaram a ser assumidos como política oficial
do governo brasileiro, num contexto político-social bastante adverso. Importante mencionar que a proteção aos
Direitos Humanos está também intimamente relacionada aos objetivos fundamentais da República Federativa
do Brasil, nos termos do que prescreve o art. 3º, da Constituição Federal.
Tratados Internacionais de Direitos Humanos no Brasil

Tratados Internacionais ratificados pelo Brasil após a Constituição de 1988


20.07.1989 Convenção Interamericana para Prevenir e Punir a Tortura.
Convenção contra a Tortura e outros Tratamentos Cruéis,
28.09.1989 desumanos ou degradantes.
24.09.1990 Convenção sobre os Direitos da Criança.
24.01.1992 Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos.
24.01.1992 Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais.
25.09.1992 Convenção Americana de Direitos Humanos.
Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a
27.11.1995 Violência contra a Mulher.
Protocolo à Convenção Americana referente à abolição da Pena
13.08.1996 de Morte.
Protocolo à Convenção Americana referente aos Direitos
21.08.1996 Econômicos, Sociais e Culturais (Protocolo de San Salvador).

30
Reconhecimento da jurisdição da Corte Interamericana de
12.1998 Direitos Humanos.
Convenção Interamericana para a Eliminação de todas as
15.08.2001 Formas de Discriminação contra Pessoas Portadoras de Deficiência.
20.06.2002 Estatuto de Roma, que cria o Tribunal Penal Internacional.
Protocolo Facultativo à Convenção sobre a Eliminação de todas
28.06.2002 as formas de Discriminação contra a Mulher.
Protocolos Facultativos à Convenção sobre os Direitos da
24.01.2004 Criança, referentes ao envolvimento de crianças em conflitos
armados e à venda de crianças e prostituição e pornografia infantis.
Protocolo Facultativo à Convenção contra a Tortura e outros
11.01.2007 Tratamentos Cruéis, Desumanos ou Degradantes.
Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência
01.08.2008 (inclui Protocolo Facultativo).
Com a Emenda Constitucional nº 45, que introduziu na Constituição de 1988 o § 3º do art. 5º, os tratados e
convenções internacionais sobre direitos humanos aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois
turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, passaram a ter status equivalentes às emendas
constitucionais. Assim, apenas os Tratados e Convenções Internacionais sobre Direitos Humanos aprovados
em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros
terão status de Emenda Constitucional! Os demais, terão status supralegal e os que não tratem sobre Direitos
Humanos terão status de Lei Ordinária.

Política Nacional de Direitos Humanos


A Política Nacional de Direitos Humanos é a política pública brasileira de abrangência nacional cujas ações
devem se pautar pelas diretrizes do Programa Nacional de Direitos Humanos (PNDH). A Política Nacional de
Direitos Humanos envolve não só a legislação vigente, mas todas as ações governamentais pela promoção
e defesa dos Direitos da Pessoa Humana no Brasil. É importante não confundir a sigla PNDH refere -se ao
Programa Nacional de Direitos Humanos e não à Política Nacional de Direitos Humanos.
Programa Nacional de Direitos Humanos
O Programa Nacional de Direitos Humanos – PNDH foi lançado em 13 de maio de 1996 e trouxe sensíveis
mudanças ao sistema político brasileiro, com o desafio maior da diminuição da violência no país.
Segundo Mesquita Neto e Pinheiro (1998), o Programa Nacional de Direitos Humanos “foi o primeiro programa
para proteção e promoção de direitos humanos da América Latina, e o terceiro no mundo”. O Programa ressaltou
a importância dos direitos econômicos, sociais e culturais, e a garantia dos direitos civis, particularmente dos
direitos à vida, à integridade física e à justiça.
O Programa Nacional de Direitos Humanos foi criado pelo Decreto nº 1.904 de 13 de maio de 1996, como
resultado dos compromissos internacionais assumidos pelo Brasil em relação a defesa, proteção e promoção
dos chamados Direitos Humanos. Representa o principal instrumento da Política Nacional de Direitos Humanos.
Visando consolidar a Política Nacional de Direitos Humanos, foram criadas mais duas versões do PNDH
desde então, sendo as versões I (1996) e II (2002) publicadas durante o governo de Fernando Henrique
Cardoso, e a última, atualmente vigente – a PNDH III, publicada em 2009 através do Decreto n. 7.037/2009,
no governo Lula.
Como dito, o PNDH-1 foi resultante de um longo processo de democratização da sociedade e do Estado
brasileiro, de natureza de plano de ação com ênfase nos direitos civis, relacionados diretamente à integridade
física e à cidadania. Assim, foram abordados nesse programa os entraves à cidadania plena, que, por sua vez,
levam à violação sistemática dos direitos, visando a proteger o direito à vida e à integridade física, à liberdade
e à igualdade perante a lei.
O PNDH-2, por sua vez, instituído pelo Decreto nº 4.229/2002 (revogado pelo Decreto nº 7.037/2009) tinha
dentre suas principais finalidades a promoção dos Direitos Humanos como um conjunto de direitos universais,
indivisíveis e interdependentes, que compreendem direitos civis, políticos, sociais, culturais e econômicos.
Nesta segunda versão foram incluídos, portanto, direitos econômicos e sociais, tais como o direito à moradia
e alimentação. Assim, o PNDH-2 promovia a inclusão dos direitos econômicos, sociais e culturais em seu rol,

31
mantendo a coerência com a noção de indivisibilidade e interdependência dos direitos expressos na Declaração
de Viena (1993), orientando-se pelos parâmetros estabelecidos na Constituição Federal de 1988, no Pacto
Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais de 1966 e no Protocolo de San Salvador em matéria
de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais. Nesse sentido, o PNDH-2 incorporou ações específicas visando
garantir diversos direitos sociais: educação, saúde, previdência e assistência social, trabalho, moradia, meio
ambiente saudável, alimentação, cultura, lazer, entre outros.
Esse segundo programa buscou construir e consolidar uma cultura de respeito aos Direitos Humanos, voltada
não só à dignidade do homem, mas a sua real possibilidade de sobrevivência e qualidade de vida.
Enfim, o Decreto nº 7.037, de 21 de dezembro de 2009 oficializou o que temos até hoje como PNDH-3,
programa dividido em seis eixos orientadores, 25 diretrizes, 82 objetivos estratégicos e 521 linhas de ações
programáticas, que visam concretizar os Direitos Humanos.
O PNDH-3 resultou de uma ação articulada entre governo e diversos setores sociais. Não foi, portanto,
uma política exclusiva de um órgão da Administração Pública, mas envolveu a discussão de interesses de
diversos grupos em sua execução. Assim, surgiram diversas controvérsias dos setores sociais contrários às
ideias defendidas pelo PNDH-3, tais como descriminalização do aborto, laicização do Estado, responsabilidade
social dos meios de comunicação, conflitos sociais no campo e repressão política da ditadura militar. Como
resposta, o governo editou o Decreto nº 7.177/2010, que providenciou alterações em sete ações e determinou
a eliminação de duas no PNDH-3.
A competência para realizar e gerir políticas públicas de implementação dos Direitos Humanos é comum
a todos os entes federados. Assim, são permitidos programas de Direitos Humanos na esfera federal,
estadual e municipal, pelo que vários Estados desenvolvem políticas próprias, conforme suas características e
necessidades específicas.
Internacionalmente, vários são os documentos históricos que iniciaram a jornada pela positivação dos
Direitos Humanos no mundo.

No Brasil, algumas leis históricas, embora não façam menção específica, possuíam um certo teor humanitário
em suas proposições, tais como: a Lei Eusébio de Queiroz, de 4 de setembro de 1850, que proibiu a entrada de
africanos escravos no Brasil, criminalizando tal prática; a Lei do Ventre Livre que determinou em 28 de setembro
de 1871 em diante, que as mulheres escravizadas dariam à luz apenas a bebês livres; a Lei dos Sexagenários,
aprovada em 1885, determinando que as pessoas em condição de escravidão com 60 anos ou mais deveriam
ser livres. E, a Lei Áurea, que em 13 de maio de 1888, aboliu a escravidão no Brasil.
As Constituições brasileiras também trouxeram algumas noções que poderiam ser consideradas ainda que
indiretamente, de direitos humanos:

A Constituição de 1824: trouxe a previsão de inviolabilidade de um rol de direitos civis e políticos, “que tem
por base a liberdade, a segurança individual, e a propriedade”). Entretanto, ainda havia escravidão e o voto era
censitário.
A Constituição de 1891: garantia aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade dos
direitos concernentes à liberdade, à segurança individual e à propriedade, com reconhecimento de seu rol
exemplificativo, cujos direitos expressos não excluiriam outros não enumerados.
A Constituição de 1934: previa expressamente vários direitos civis e políticos, estabelecendo vários direitos
sociais trabalhistas. Reconheceu também que “a especificação dos direitos e garantias expressos nesta
Constituição não exclui outros, resultantes do regime e dos princípios que ela adota”.
A Constituição de 1937: trouxe menção formal a um rol de direitos, entretanto, era clara a prevalência
absoluta da razão do Estado sobre os direitos humanos. Proibiu o direito de greve.
A Constituição de 1946: instaurou uma nova ordem democrática no Brasil, com previsão de um rol de alguns
“direitos e garantias individuais”, e vários direitos sociais, inclusive o direito de greve.
A Constituição de 1967: com a ditadura militar, previu formalmente um rol de direitos e garantias individuais,
mas ameaçava os inimigos do regime, com a possibilidade de suspensão de direitos individuais e políticos.

32
Mas, foi a Constituição de 1988, denominada de Constituição Cidadã que consagrou a internalização
dos chamados Direitos Humanos como Direitos e Garantias Fundamentais, aproveitando amplamente das
emanações jurídicas fundamentais dispostas pela Declaração Universal dos Direitos Humanos e recepcionando
Tratados e Convenções Internacionais posteriores, a partir do princípio primordial da dignidade da pessoa
humana.
O Brasil, como Estado democrático, compromete-se a respeitar os direitos humanos não só internamente,
mas também no âmbito internacional. A natureza jurídica da incorporação de normas internacionais sobre
direitos humanos ao direito interno brasileiro é um processo complexo, que envolve tanto a adoção de tratados
internacionais quanto a sua integração ao ordenamento jurídico nacional.
Processo de Incorporação
No Brasil, a incorporação de tratados internacionais de direitos humanos segue um procedimento específico.
Primeiro, o tratado é assinado pelo Presidente da República e, em seguida, deve ser aprovado pelo Congresso
Nacional. Após essa aprovação, o Presidente ratifica o tratado, e ele se torna parte do direito interno brasileiro.
Esse processo é regido pelo artigo 5º, § 3º, da Constituição Federal de 1988, que confere aos tratados de
direitos humanos aprovados pelo Congresso Nacional em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos
membros, status equivalente às emendas constitucionais.
Hierarquia Normativa
Os tratados internacionais de direitos humanos que seguem esse procedimento especial têm hierarquia
supralegal, posicionando-se acima das leis ordinárias e complementares, mas abaixo da Constituição. Essa
hierarquia é crucial para assegurar a efetividade dos direitos humanos no Brasil, pois garante que as normas
internacionais tenham força normativa significativa, permitindo que prevaleçam sobre legislações nacionais que
possam estar em desacordo com os princípios de direitos humanos.
Impacto no Direito Brasileiro
A incorporação de tratados internacionais de direitos humanos afeta diretamente o direito interno brasileiro.
Ela obriga o país a ajustar suas leis e práticas para garantir a conformidade com os padrões internacionais. Isso
pode envolver a revogação ou alteração de leis existentes, a criação de novas legislações, ou mudanças nas
práticas judiciais e administrativas.
A natureza jurídica da incorporação de normas internacionais sobre direitos humanos ao direito interno
brasileiro reflete o compromisso do país com os princípios universais de direitos humanos. Através de um
processo constitucionalmente estabelecido, o Brasil assegura que essas normas internacionais não só
influenciem, mas também fortaleçam o seu sistema jurídico, promovendo a proteção e o respeito aos direitos
humanos no país.

A proteção dos grupos socialmente vulneráveis pelo direito internacional dos direitos
humanos Mecanismos de proteção aos direitos humanos na Constituição Federal

Podem constituir grupos vulneráveis ou minorias as mulheres, os negros e afrodescendentes, as crianças e


adolescentes, os idosos, as pessoas com deficiência, as pessoas em situação de rua, os povos indígenas, os
LGBTQIA+, os quilombolas, os sem-teto, os sem-terra, os imigrantes e os refugiados, dentre outros grupos
aos quais chamamos de minorias e que são vítimas de injustiças e violações históricas de Direitos Humanos.
Direitos da mulher
A garantia desta igualdade sem uma proteção específica é insuficiente, pois muitas mulheres ainda se
encontram numa posição subjugada da sociedade e, em casos extremos, vítimas do domínio masculino. Assim,
as mulheres formam uma categoria vulnerável que merece proteção especial para que seja possível garantir a
igualdade material entre os sexos. A razão desta vulnerabilidade reside no fato de que as conquistas femininas
de independência pessoal e financeira são relativamente recentes na história da humanidade.

33
Internacionalmente, esta fragilidade feminina é reconhecida, notadamente, na Declaração da ONU sobre a
Eliminação da Discriminação contra as Mulheres, de 7 de novembro de 1967; na Convenção da ONU sobre a
Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher, de 18 de dezembro de 1979; e na Convenção
Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher, de 9 de junho de 1994. Estes
documentos foram estudados anteriormente neste material.
Regionalmente, uma grande vitória das mulheres na busca de proteção foi a decisão da Comissão
Interamericana de Direitos Humanos que reconheceu a violação do direito feminino de proteção contra a
violência doméstica e familiar, diante dos fatos que cercaram o caso de Maria da Penha (a decisão é estudada
no tópico 5.4.6.1.7.10). A decisão no âmbito regional gerou a aprovação, no plano nacional, da Lei nº 11.340,
de 07 de agosto de 2006, que cria mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher.
Direitos da criança e do adolescente
As crianças podem ser consideradas outro grupo vulnerável protegido no âmbito dos direitos humanos,
tendo em vista a promoção da igualdade material.
Embora não exista um instrumento que aborde especificamente os direitos das crianças no Sistema
Interamericano, normas genéricas do sistema permitem a proteção neste âmbito. Aliás, o artigo 16 do PCADH
reforça as posturas ativas necessárias por parte do Estado, dos pais e da sociedade com os fins de garantir os
direitos da criança.
Contudo, há instrumentos internacionais específicos voltados à proteção dos direitos da criança no âmbito
das Nações Unidas, quais sejam a Declaração dos Direitos da Criança de 20 de novembro de 1959, e a
Convenção sobre os Direitos da Criança 20 de novembro de 1989, confirmada no Brasil pelo Decreto Legislativo
nº 28, de 14 de setembro de 1990.
No Brasil, o Estatuto da Criança e do Adolescente trouxe importantes preceitos quanto à proteção da infância,
devendo garantir à criança a proteção de uma infância feliz e saudável, e o seu crescimento num seio familiar
amparado pelo afeto e um ambiente seguro, garantindo também o Direito à educação, gratuita e obrigatória e
a prioridade de atendimento e socorro em caso de necessidade.
Direitos dos idosos
O envelhecimento é um direito personalíssimo diretamente relacionado ao direito à vida e a sua proteção é
um direito social, nos termos da Lei. É obrigação do Estado, da sociedade e da família garantir à pessoa idosa
a proteção à vida e à saúde, mediante a garantia de condições mínimas e a efetivação de políticas sociais pú-
blicas que permitam um envelhecimento saudável em atenção à sua dignidade, bem como liberdade, respeito,
como pessoa humana e sujeito de direitos civis, políticos, individuais e sociais.
No âmbito da ONU, ainda não há Convenção específica de proteção, mas apenas normativas principiológi-
cas não diretamente coativas, que podem ser combinadas com normas genéricas como as dos Pactos Inter-
nacionais de 1966. Neste sentido, de forma mais relevante, em 1991 sobrevieram os Princípios Das Nações
Unidas para as Pessoas Idosas; e em 2002, na II Conferência Internacional de Madri sobre o Envelhecimento,
surgiram a Declaração Política e o Plano de Ação Internacional de Madri sobre Envelhecimento (MIPAA), estes
de ordem um pouco mais pragmática.
Em janeiro de 2010, o Comitê Consultivo do Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas publicou
estudo apontando a necessidade de uma convenção internacional específica, o que indica que futuramente é
possível que tal documento seja elaborado e ratificado pelos países-membros da ONU.
Em relação à normativa brasileira, destaca-se o Estatuto do Idoso (Lei nº 10.741/2003), que entrou em
vigor no dia 1º de janeiro de 2004, em consonância com a já manifestada preocupação brasileira em conferir
proteção específica aos direitos dos idosos.
Não se pode perder de vista, ainda, o texto constitucional, que no título VII (Ordem Social) traz no capítulo
VII a proteção da Família, da Criança, do Adolescente, do Jovem e do Idoso, sem prejuízo da menção ao direito
à assistência social feita anteriormente no artigo 203, V.

34
Direitos da pessoa com deficiência
A proteção à pessoa com deficiência é uma discussão de grande relevância na atualidade, à luz dos Direitos
Humanos. A preocupação com a proteção das pessoas com deficiência e a eficácia desse caráter protetivo
no plano nacional e internacional tornou-se constante. No Brasil e no mundo, a eficácia e a aplicabilidade da
proteção às pessoas com deficiência dependem, principalmente, da efetividade da inclusão social, dever não
só do Estado, mas também de toda a sociedade. É na integração entre Estados, que vemos surgir medidas
mais eficazes de combate às desigualdades.
Há quatro fases históricas no desenvolvimento dos direitos humanos da pessoa com deficiência:
a) Fase da intolerância: a deficiência simbolizava impureza, pecado ou castigo divino;
b) Fase da invisibilidade: ignorava-se a existência das pessoas com deficiência e de seus direitos;
c) Fase assistencialista: pautada na perspectiva médica e biológica de que era preciso encontrar uma cura
para a deficiência, que era exclusivamente vista como enfermidade;
d) Fase humanista: orientada pelo paradigma dos direitos humanos, na qual emergiram os direitos à inclusão
social, com ênfase na relação da pessoa com deficiência e do meio em que ela se insere, além da necessidade
de eliminar obstáculos e barreiras (culturais, físicos ou sociais) que possam ser superados.
Destaca-se a inovação promovida pela Convenção da ONU, que reconhece a deficiência como resultado da
interação entre indivíduos e seu meio ambiente, não residindo apenas intrinsecamente no indivíduo.
Internacionalmente, três documentos merecem destaque, quais sejam: Declaração das Nações Unidas
sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, de 9 de dezembro de 1975, complementada pela Convenção
Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e seu Protocolo Facultativo, assinados em Nova
York, em 30 de março de 2007, e promulgados pelo Decreto nº 6.949 de 25 de agosto de 2009; e a Convenção
Interamericana para a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Pessoas Portadoras de
Deficiência, assinada na Guatemala, em 28 de maio de 1999, promulgada no Brasil pelo Decreto nº 3.956 de
8 de outubro de 2001.
No âmbito das Nações Unidas, a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e
seu Protocolo Facultativo desponta como o mais relevante tratado internacional na matéria em estudo que foi
ratificado pelo Brasil com status de Emenda Constitucional. como é o caso da Convenção sobre os Direitos da
Pessoa com Deficiência. Essa convenção aproxima-se da realidade que se almeja alcançar.
Proteção da diversidade sexual (LGBTQIA+)
A Organização das Nações Unidas, no âmbito de seu Conselho de Direitos Humanos, tem elaborado
resoluções voltadas a este grupo vulnerável, a exemplo dos Princípios de Yogyakarta, que são princípios
voltados à aplicação da legislação de direitos humanos em todo o planeta em relação à diversidade sexual e
à identidade de gênero, delimitando a igualitária aplicação dos direitos humanos consagrados a pessoas que
se encaixem em grupos com sexualidade diferenciada. Outro documento a respeito que assume relevância é
a Declaração condenando violações dos direitos humanos com base na orientação sexual e na identidade de
gênero, de 18 de dezembro de 2008. O Brasil estava presente quando tal Declaração foi aceita pela Assembleia
Geral da ONU e votou a favor, tratando-se assim de documento corroborado pelo país no âmbito internacional.
Pode-se dizer que a maior conquista no âmbito interamericano é a recente Convenção Interamericana contra
Toda Forma de Discriminação e Intolerância, de 5 de junho de 2013 (ainda não incorporada ao ordenamento
interno brasileiro, mas já assinada pelo Brasil), que pode ser considerado o primeiro documento internacional
juridicamente vinculante a expressamente condenar a discriminação baseada em orientação sexual, identidade
e expressão de gênero.
Proteção da população em situação de rua e sem teto
Situação extremamente delicada é a da chamada população em situação de rua. Trata-se de grupo
populacional que possui em comum a pobreza extrema, assim como os vínculos familiares interrompidos ou
fragilizados. Seja por conta da constante – e grave – crise econômica dos tempos atuais, e/ou do déficit de
moradia, e/ou tendo em vista conflitos pessoais (como questões familiares ou vícios em drogas), não se pode
fechar os olhos para um problema cada vez maior, notadamente nos grandes e médios centros urbanos.

35
Em termos normativos internacionais, é fraca a proteção da população em situação de rua, destacando-se
relatório sobre uma habitação adequada como elemento integrante do direito a um nível de vida adequado e
sobre o direito de não discriminação a este respeito, preparado em cumprimento à Res. nº 25/17 do aludido
Relatório propõe, inclusive, um enfoque tridimensional:
A 1ª dimensão se refere à ausência de moradia – a ausência tanto do aspecto material de uma habitação
minimamente adequada quanto do aspecto social de um lugar seguro, para estabelecer uma família ou relações
sociais, e participar da vida em comunidade.
A 2ª dimensão considera a situação de rua como uma forma de discriminação sistêmica e de exclusão social,
e reconhece que a privação de um lar dá lugar a uma identidade social através da qual as pessoas em situação
de rua formam um grupo social sujeito à discriminação e estigmatização.
A 3ª dimensão reconhece as pessoas em situação de rua como titulares de direitos que são resilientes na
luta pela sobrevivência e dignidade. Com uma compreensão única dos sistemas que negam seus direitos,
deve-se reconhecer as pessoas em situação de rua como agentes centrais da transformação social necessária
para a realização do direito a uma moradia adequada.
Internamente, o Decreto nº 7.053 de 23 de dezembro de 2009, institui a Política Nacional para a População em
Situação de Rua e seu Comitê Intersetorial de Acompanhamento e Monitoramento, dentre outras providências.
Proteção da população sem-terra
O Brasil é um dos países com maior concentração de terras do mundo, onde se encontram os maiores
latifúndios. A concentração de terras deriva da exploração portuguesa no Brasil, com a escravidão e a monocultura
voltada à exportação. Esse perfil de ocupação de nossas terras gerou profundas raízes de desigualdade social
sentidas até hoje.
A proteção à população sem terra tem suas bases nos valores da solidariedade e do humanismo ante ao
legado histórico da classe trabalhadora.
Nacionalmente o Brasil dispõe do Estatuto da Terra, que regula os direitos e obrigações concernentes aos
bens imóveis rurais, para os fins de execução da Reforma Agrária e promoção da Política Agrícola. O uso da
terra decorre do direito de propriedade e da necessidade de esta atender à sua função social. Busca-se pela
reforma agrária para que as terras do Estado não permaneçam improdutivas em grandes latifúndios, enquanto
pequenos produtores se vêm privados de sua subsistência.
Proteção da população indígena
O direito de autodeterminação ou livre determinação dos povos indígenas está embasado nos postulados
da igualdade, da liberdade e da fraternidade, e encontra embasamento no Direito Internacional, em especial no
sistema internacional de proteção aos direitos humanos a garantir o desenvolvimento humano global.
A Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas foi aprovada pela Assembleia da
ONU em 07 de setembro de 2007.
No artigo 1º é trazida a fórmula genérica que garante aos indígenas, como povos ou pessoas, o desfrute
pleno dos direitos humanos e liberdades fundamentais. O ideário da igualdade de direitos e liberdades é
reforçado pelo artigo 2º e pelos artigos 3º e 4º (estes focados no direito à autodeterminação). Em seguimento,
garantem-se os direitos políticos no artigo 5º e o direito à nacionalidade no artigo 6º. Outros direitos humanos
são reforçados no artigo 7º.
O artigo 8º tem o seguinte teor:
1. Os povos e as pessoas indígenas têm direito a não sofrer a assimilação forçada ou a destruição de sua
cultura.
2. Os Estados estabeleceram mecanismos eficazes para a prevenção e o ressarcimento de:
a) Todo ato que tenha por objeto ou consequência privar aos povos e as pessoas indígenas de sua integri-
dade como povos distintos ou de seus valores culturais ou sua identidade étnica;
b) Todo ato que tenha por objeto ou consequência alhear-lhes suas terras, territórios ou recursos;
c) Toda forma de mudança forçada de local de povoado que tenha por objeto ou consequência a violação ou
o menosprezo de qualquer de seus direitos;

36
d) Toda forma de assimilação ou integração forçadas;
e) Toda forma de propaganda que tenha como fim promover ou incitar à discriminação racial ou étnica diri-
gida contra eles.
O sentido do artigo 8º é aprofundado nos artigos 10, 11, 12, 13, 14, 15, 16, 24, 25, 26, 31, 32, 33, 34, 35,
que conferem direitos específicos culturais, religiosos, medicinais, territoriais, de ensino, de autoadministração
e outros aos indígenas. No mais, enquanto no artigo 8º garante-se a cultura, no artigo 9º garante-se o direito
de pertencer a uma comunidade. Nos termos dos artigos 18, 19, 23 e 27, assegura-se a representação política,
notadamente participando de decisões que envolvam a comunidade indígena.
Portanto, o desenvolvimento social também é um direito, que deve ser garantido sem discriminações,
permitindo o melhoramento das condições econômicas e sociais, em áreas como educação, emprego,
capacitação e adaptações profissionais, moradia, saneamento, saúde e seguridade social (artigo 21, DDPI).
Necessidades especiais de seus grupos vulneráveis, como idosos, mulheres e crianças também devem ser
respeitadas (artigo 22, DDPI).
A respeito da retirada de povos indígenas de suas terras originais, embora seja colocada como exceção,
pode ocorrer, caso em que o povo local deve ser ouvido e em que é preciso garantir a justa indenização (justa,
imparcial e equitativa), que poderá ser paga em terras, territórios e recursos de igual qualidade aos tomados
(artigo 28, DDPI).
As comunidades indígenas não devem ficar isoladas e alheias aos acontecimentos fora de seu âmbito,
mesmo os que envolvam decisões estatais. Neste sentido, o artigo 36 volta-se ao direito de manter e desenvolver
contatos, relações e cooperação e suas atividades; o artigo 37 reforça questões sobre a possibilidade de
celebrar tratados, acordos e pactos; o artigo 39 traz o direito à assistência financeira e técnica; o artigo 40
trata dos procedimentos para solucionar controvérsias que surjam etc. Reforça-se nos demais dispositivos a
necessidade de adotar medidas para garantir todos estes direitos.
Nacionalmente, Constituição de 1988 pode ser considerada um marco na conquista e garantia de direitos
pelos indígenas no Brasil, por garantir o respeito e a proteção à cultura das populações originárias, direitos
esses expressos em capítulo específico do Título Da Ordem Social, com preceitos que asseguram o respeito
à organização social, aos costumes, às línguas, crenças e tradições, além de estabelecer como obrigação da
União, a proteção e a demarcação das terras indígenas.
Proteção dos negros e quilombolas
Muito embora a sociedade brasileira seja pluralista e altamente miscigenada, ainda são comuns os casos
de preconceito racial e étnico, o que coloca pessoas como negros, índios, quilombolas e membros de grupos
étnicos minoritários em geral na situação de vulnerabilidade que assegura uma especial proteção sob o viés da
igualdade material.
Há diversos documentos internacionais específicos voltados à proteção deste grupo vulnerável, destacando-
se: Declaração das Nações Unidas sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial, de 20 de
novembro de 1963; Convenção Internacional sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial,
de 21 de dezembro de 1965 (Decreto nº 65.810 de 8 de dezembro de 1969); e, recentemente, a Convenção
Interamericana contra o Racismo, a Discriminação Racial e Formas Correlatas de Intolerância, de 5 de junho de
2013 (ainda não incorporada ao ordenamento interno brasileiro, mas já assinadas pelo Brasil).

O racismo é a manifestação de um preconceito racial em determinadas situações e constitui crime inafiançável


e imprescritível, previsto na Lei 7.716/1989. Diferencia-se do crime de injúria racial, previsto no art. 140, § 3º do
Código Penal brasileiro.
Os povos quilombolas
Os quilombolas são pessoas das comunidades formadas por descendentes de africanos que fugiram da
escravidão durante o período colonial – os quilombos, onde ao longo dos anos conseguiram preservar algumas
de suas tradições e costumes.
A população quilombola no Brasil é de 1,32 milhão de pessoas, ou 0,65% do total de habitantes do país e
assim como os indígenas, tem o seu direito à terra reconhecido na Constituição Federal, que também prevê a
obrigação do Estado de demarcar e titular as terras ocupadas por essas comunidades. A Lei nº 12.288/2010,
conhecida como Estatuto da Igualdade Racial trata especificamente dos quilombolas e estabelece estabelece

37
diretrizes e políticas públicas para a promoção da igualdade racial. A legislação que trata especificamente
dos quilombolas é a Lei nº 12.288/2010, conhecida como Estatuto da Igualdade Racial. Essa lei estabelece
diretrizes e políticas públicas para a promoção da igualdade racial no Brasil, incluindo medidas de proteção
e promoção dos direitos dos povos quilombolas, com o objetivo promover o desenvolvimento sustentável
dessas comunidades, garantindo-lhes acesso a serviços básicos, como saúde, educação, saneamento básico
e infraestrutura, além da criação de políticas de reparação para os povos quilombolas, como ações afirmativas
e programas de inclusão social e econômica. Essas medidas visam compensar os séculos de discriminação e
exclusão enfrentados por essas comunidades.
Proteção dos imigrantes e refugiados
Refugiado é todo aquele que sofre algum tipo de perseguição em seu país de origem numa situação de
guerra e busca asilo em outro país.
Imigrante é todo aquele que sai de seu país de origem e vai para outro em busca de melhores condições de
vida.
Em ambos casos, são pessoas em locais que não são comuns a elas, convivendo com a população local
já habituada. Episódios envolvendo xenofobia e desigualdade no acesso a direitos são, infelizmente, comuns.
Cabe ao Estado propiciar que imigrantes e refugiados gozem de igual proteção jurídica aos seus direitos
fundamentais. Segundo a ONU, a questão dos refugiados nos remete à pior crise humanitária do século.
O refúgio e a migração não trazem em si o terrorismo e necessariamente o agravamento dos problemas
sociais. Tal perspectiva seria totalmente contrária aos preceitos de cidadania e acolhimento para com outros
povos.
Em 1948, a Declaração dos Direitos Humanos da ONU reconheceu como direito humano a possibilidade de
as pessoas fugirem de situações de guerra e fome e migrarem para outros países. Internacionalmente, o Alto
Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados – ACNUR é um órgão das Nações Unidas criado pela
Resolução nº 428 da Assembleia da ONU em 14 de dezembro de 1950 para dar apoio e proteção a refugiados
de todo o mundo. Ainda internacionalmente a Convenção das Nações Unidas sobre o Estatuto dos Refugiados
ou Convenção de Genebra de 1951 e seu Protocolo relativo ao Estatuto dos Refugiados de 1967 constituem
os principais instrumentos internacionais estabelecidos para a proteção dos refugiados e asseguram, que
qualquer pessoa, em caso de necessidade, possa exercer o direito de procurar e de gozar de refúgio em outro
país, sendo altamente reconhecidos internacionalmente.
O Brasil é reconhecido internacionalmente como um país tolerante e aberto aos imigrantes e refugiados. O
Brasil assinou a Convenção de Genebra em 1952, relativa ao Estatuto dos Refugiados, aprovada pelo Decreto
Legislativo nº 11, de 1960 e promulgada pelo Decreto nº 50.215/1961 e o Protocolo de Nova York de 1967,
recepcionado pelo Decreto nº 70.946/1972 e retificado pelos Decretos 98602/1989 e 99757/1990. Internamente,
a nova Lei de Migração – Lei 13.455/2017 revogou o antigo Estatuto do Estrangeiro, Lei 6815/1980. O referido
dispositivo é pautado pelo princípio da não-discriminação.
É importante mencionar que nem todo imigrante possui o status de refugiado e asilo político (individual) é
diferente de Refúgio (coletivo).
No Brasil, o mecanismo do Refúgio é regido pela Lei 9.474/1997, que estabelece todo o procedimento para
a determinação, cessação e perda da condição de refugiado, os direitos e deveres dos solicitantes de refúgio e
refugiados, bem como soluções duradouras para essa população.
Portanto, não se deve confundir o asilo político, direito individual, requerido e outorgado caso a caso, com
o moderno ramo do direito dos refugiados, que trata de fluxos maciços de populações deslocadas. Ambos
institutos podem ocasionalmente coincidir, já que cada refugiado pode requerer o asilo político individualmente
(BRASIL, 2020).
Para eficácia das normas de proteção de Direitos Humanos é fundamental a interação do Direito Internacional
com o direito interno dos Estados, efetivando sua aplicabilidade e fortalecendo os mecanismos de proteção
face a eventuais violações. Os tratados de Direitos Humanos não são regidos pela autonomia da vontade dos
Estados, mas sim coercitivos quanto às suas normas. A Constituição Federal brasileira adota a aplicabilidade
imediata das normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais, nos termos do artigo 5º, parágrafo
primeiro:

38
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e
aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e
à propriedade, nos termos seguintes:
§ 1º As normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata.
Ademais, o Brasil tem como fundamento a dignidade da pessoa humana, nos termos do art. 1º, III, CF e o
texto constitucional dá aos direitos e garantias fundamentais, tratamento de cláusulas pétreas, que não podem
ser abolidas ou modificadas sem um rígido procedimento de aprovação, nos termos do art. 60, § 4º, IV, CF.
O texto constitucional conferiu, portanto, especial proteção aos direitos humanos, e por isso, com a entrada
em vigor de um tratado internacional de direitos humanos, toda norma preexistente incompatível com seus
preceitos perde automaticamente a vigência, observando-se sempre em caso de conflito, a norma mais
favorável à vítima.

A Constituição Federal de 1988 (atual), deve ser compreendida com o momento histórico em que foi promul-
gada. Após os anos de chumbo (ditadura militar), a Constituição Cidadã nasceu com forte espírito democrático.
Alguma de suas características são:

• Amplos instrumentos para a proteção dos direitos constitucionais – habeas corpus, habeas data, mandado
de injunção, mandado de segurança coletivo etc.

• Nascimento do STJ.

• Estados e Municípios fortalecidos.

• Super detalhada, enumerando diversos direitos fundamentais, para cada setor da sociedade.

• Veda a discriminação, inclusive, tornou o racismo crime imprescritível.

• Prezou pela seguridade social.

A CF/88 nasceu de uma emenda na Constituição de 1969, que convocou a Assembleia Nacional Constituin-
te, para a redemocratização do país. Assim, deve ser interpretada à luz dos direitos humanos.
A Constituição Federal brasileira adota a aplicabilidade imediata das normas definidoras dos direitos e
garantias fundamentais, nos termos do artigo 5º, parágrafo primeiro:
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e
aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e
à propriedade, nos termos seguintes:
§ 1º As normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata.
O texto constitucional conferiu, portanto, especial proteção aos direitos humanos. Por isso, com a entrada
em vigor de um tratado internacional de direitos humanos, toda norma preexistente incompatível com seus
preceitos perde automaticamente a vigência, observando-se sempre em caso de conflito, a norma mais
favorável à vítima.
Com a Emenda Constitucional nº 45, que introduziu na Constituição de 1988 o § 3º do art. 5º, os tratados e
convenções internacionais sobre direitos humanos aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois
turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, passaram a ter status equivalentes às emendas
constitucionais.
Os demais tratados sobre Direitos Humanos, sem a aprovação desse quórum, têm status supralegal e os
Tratados e Convenções Internacionais de assunto geral, que não tratam sobre Direitos Humanos, têm status
de Lei ordinária.

39
TRATADOS INTERNACIONAIS NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO
Tratados Status
Tratados Internacionais que versem sobre Direitos Humanos aprovados
Emenda
em cada casa do Congresso, em 2 turnos por 3/5 dos respectivos
Constitucional
membros.
Tratados Internacionais sobre Direitos Humanos, mas não aprovados em
Supralegal
2 turnos por 3/5 dos membros de cada casa do Congresso.
Tratados internacionais que não versem sobre Direitos Humanos. Lei Ordinária

Direitos humanos de natureza civil, política, social, econômica, cultural e ambiental

A II Conferência Mundial de Direitos Humanos, organizada pela ONU e realizada em Viena, 1993, chegou a
uma compreensão não evolucionista dos direitos humanos8.Na Declaração e no Programa de Ação de Viena
lê-se:
“Todos os direitos humanos são universais, indivisíveis e interdependentes e estão relacionados entre si.
A comunidade internacional deve tratar os direitos humanos de forma global e de maneira justa e equitativa,
em pé de igualdade, dando a todos o mesmo peso. Deve-se ter em conta a importância das particularidades
nacionais e regionais, assim como aquelas dos diversos patrimônios históricos, culturais e religiosos, porém, os
Estados têm o dever, sejam quais forem seus sistemas políticos, econômicos e culturais, de promover e prote-
ger todos os direitos humanos e as liberdades fundamentais”.
É comum identificar várias dimensões dos direitos humanos, para alguns até gerando certa classificação dos
direitos. Isto, em hipótese alguma, pode significar determinar maior ou menor importância a uns ou a outros.
Também não pode significar endossar uma leitura geracional evolucionista pela qual uns direitos, por terem
sido reconhecidos antes do que os outros, já teriam sido superados pelos que vieram depois ou então têm mais
importância.

— Direitos humanos de natureza civil e política


Proclamados pela ONU através do Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos (PDCP) (1966), rati-
ficado pelo Brasil em 1992, e também, entre outras da Declaração sobre a Proteção contra Tortura e outros
Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos ou Degradantes (1975). Em termos gerais, poderíamos dizer que
são aqueles direitos relativos às garantias e liberdades fundamentais.
Apesar da dificuldade de consenso sobre sua classificação poderíamos dizer que os direitos civis são, entre
outros: o direito ao reconhecimento e igualdade diante da lei; dos prisioneiros; a um julgamento justo; de ir e vir;
à liberdade de opinião, pensamento e religião.
Os direitos políticos, entre outros, são: o direito à liberdade de reunião; liberdade de associação; à participa-
ção na vida política. Muitos consideram que estes são os direitos individuais por excelência e que constituem
garantias absolutas contra o Estado, ou seja, direitos negativos.
O conceito atual de direitos humanos indica que não é suficiente esta concepção, já que os direitos civis e
políticos implicam também responsabilidades do Estado na sua garantia, sem que isso diminua ou interdite a
responsabilidades de cada pessoa.

— Direitos humanos de natureza social, econômica e cultural


Proclamados pela ONU através do Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (PI-
DESC) (1966), ratificado pelo Brasil em 1992. Em termos gerais, poderíamos dizer que são aqueles direitos que
os indivíduos demandam ao coletivo, por isso, implicam na garantia de condições coletivas e mais estruturais
de desenvolvimento, implicando não somente os indivíduos, mas toda a coletividade.

8 http://www.dhnet.org.br/direitos/militantes/carbonari/carbonari_dimensoes_dh.pdf

40
Apesar da dificuldade de consenso na sua classificação, poderíamos dizer que os direitos econômicos são
os direitos: a um desenvolvimento autônomo, a um meio ambiente sadio, a alimentar-se, ao trabalho e os di-
reitos do trabalhador; os direitos sociais os relativos: à segurança social; à família, à maternidade e infância, à
moradia e à cidade e o direito à saúde; e os direitos culturais são relativos à educação, à participação da vida
cultural e ao progresso científico.
Também incluem os direitos à não discriminação e os direitos das mulheres e de outros segmentos sociais
vulneráveis. Muitos consideram estes direitos como sendo aqueles cuja ação do Estado deveria ser determi -
nante para sua garantia, direitos positivos.
O conceito atual, novamente, assim como no caso dos direitos civis e políticos, exige compromissos tanto
do Estado quanto da cidadania. Estes direitos são de realização progressiva, o que não significa, em hipótese
alguma, admitir retrocessos.

— Direitos humanos de natureza ambiental


Proteção do meio ambiente, promoção dos direitos humanos e desenvolvimento sustentável, temáticas cada
vez mais entrelaçadas, passaram a ocupar lugar de destaque nas agendas nacional e internacional nos últimos
anos. Embora a Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948) tenha sido silenciosa, à época, quanto ao
direito humano ao meio ambiente, falar em direito a um meio ambiente saudável é uma das faces do direito à
saúde e a um padrão de vida digno e adequado, para citar alguns 9.
Por outro lado, o pleno gozo e a garantia dos direitos humanos só são possíveis em um contexto ambiental
sadio. Portanto, é clara a inter-relação e interdependência entre esses direitos, que são princípios fundamentais
a permear o campo da proteção dos direitos humanos.
Alinhada a essa conexão entre proteção ambiental e direitos humanos, tem ganhado cada vez mais espaço,
nas últimas décadas, a agenda em prol do desenvolvimento sustentável: unir as dimensões social, econômica
e ambiental tornou-se um dos principais desafios desse século. E esse desafio produziu reflexos na arquitetura
internacional e doméstica.
No âmbito das Nações Unidas, as preocupações em torno de um crescimento socioeconômico inclusivo e
ambientalmente equilibrado ganharam nova roupagem com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, lan-
çados no final de 2015. Já quanto ao Brasil, o país sempre assumiu papel importante nessa agenda.
Desde o início do ciclo de conferências das Nações Unidas nessa matéria, se reconhece a liderança brasilei-
ra no debate sobre meio ambiente, direitos humanos e desenvolvimento sustentável. A decisão por sediar duas
dessas conferências, por exemplo, evidencia essa posição estratégica assumida.
Por outro lado, o país, até então, também se destacava pelos resultados das políticas públicas adotadas
nessa área. Redução da fome, da pobreza, crescimento econômico, diminuição do desmatamento e da emis -
são de gases poluentes eram exemplos a comemorar internamente e a inspirar outros países.
No entanto, paradoxalmente, o modelo de desenvolvimento brasileiro tem deixado marcas negativas. Vio-
lações aos direitos de povos indígenas, impactos sociais e ambientais adversos causados pela construção de
grandes obras de infraestrutura, dentre outros, levam o país a figurar no banco dos réus nas principais instân-
cias internacionais de proteção dos direitos humanos.

9 Direitos Ambiente e Humanos. Coordenação de Antônio Augusto Cançado Trindade e César Barros Leal.
- Fortaleza: Expressão Gráfica e Editora, 2017.

41
Direitos humanos de titularidade individual, coletiva ou difusa

— Os direitos humanos e os interesses transindividuais


O primeiro encontro das duas teorias se dá em razão da transição do modelo de Estado liberal clássico pelo
welfare state10, que decorre da substituição do paradigma do ser humano abstrato, em situação de igualdade
formal quanto ao gozo das liberdades individuais, pela verificação das condições materiais de vida, que revelam
um estado de desigualdade substancial entre as classes e grupos sociais11.
Para os direitos humanos, este novo vetor significou o ingresso, no rol de atribuições da Administração, do
dever de interferir na sociedade, a fim de prover os recém estabelecidos direitos econômicos, sociais e cultu-
rais, cuja titularidade é coletiva na medida em que as prestações demandadas destinam-se a reparar a situação
de iniquidade de todo um grupo de pessoas, ainda que seja possível a cada uma delas usufruir individualmente
das facilidades instituídas.
Assim, a preocupação com a desigualdade substancial erode o conceito de direito subjetivo, pois às novas
relações jurídicas não mais se aplica o clássico modelo para o qual o titular do direito material é o legitimado a
requerer seu cumprimento. Realmente, as demandas de natureza econômica, social e cultural não são neces-
sariamente divisíveis, pois a providência estatal requerida em geral somente pode ser adotada tendo em vista
o todo e não o particular.
Diferentemente da violação das liberdades civis, em que se destaca a relação entre o indivíduo e o Estado,
no caso dos chamados interesses transindividuais a indevida omissão estatal atinge o grupo desfavorecido
como um todo, pois as pessoas que o integram somente possuem alguma demanda como resultante de sua
inclusão naquele universo. Em suma, não fosse o desenvolvimento da doutrina do Estado social, não haveria
lugar nem para os direitos econômicos, sociais e culturais, nem para os interesses transindividuais de natureza
pública.
Aqui é importante assinalar que a relação entre Estado e sociedade, quanto à realização dos direitos econô-
micos, sociais e culturais, não é unívoca, isto é, não há um único interesse público envolvido, mas uma grande
contradição entre os interesses dos diversos grupos sociais e destes com os interesses individuais. Daí que não
pode ser aceita a asserção de que os direitos humanos sociais constituem uma categoria diversa dos direitos
difusos e coletivos, como se fosse uma mera ampliação da dualidade Estado-indivíduo, própria dos direitos
civis e políticos, esta sim de outra natureza.
Na realidade, a possibilidade de prestação estatal é múltipla e certamente não tem como alcançar todos os
interesses envolvidos, seja pela limitação de ordem material, seja pela contradição eventual entre alguns deles,
no que coincide a realização dos direitos sociais com a característica da litigiosidade intensa dos interesses
transindividuais.
Também a indeterminação dos sujeitos é comum a grande parte dos direitos humanos, com especial des-
taque para os ditos “globais”, também conhecidos como “direitos de solidariedade”. Neste caso, os direitos ao
meio ambiente saudável, à paz, ao desenvolvimento sustentado, à livre determinação dos povos, entre outros,
possuem o dado comum de pertencerem a um conjunto impreciso de pessoas, se não a toda a humanidade,
unidas por uma situação de fato e pelo interesse comum de garantir a qualidade de vida no planeta.
Ademais, a indivisibilidade do objeto é evidente, pois ainda que seja do interesse de cada membro do grupo,
categoria ou classe social a proteção do interesse, a prestação correspondente não pode ser realizada, senão
tendo em vista toda a comunidade, sem possibilidade de sua divisão em fração ou quota.

10 O Estado de bem-estar social, ou Estado-providência, ou Estado social, é um tipo de organização política,


económica e sociocultural que coloca o Estado como agente da promoção social e organizador da economia.
Nesta orientação, o Estado é o agente regulamentador de toda a vida e saúde social, política e econômica do
país, em parceria com empresas privadas e sindicatos, em níveis diferentes de acordo com o país em questão.
Cabe, ao Estado de bem-estar social, garantir serviços públicos e proteção à população, provendo dignidade
aos naturais da nação.
11 http://www.pge.sp.gov.br/centrodeestudos/bibliotecavirtual/Congresso/xtese3.htm

42
Na realidade, os direitos humanos globais são típicos interesses difusos positivados ou direitos difusos. En-
quadram-se plenamente nas características gerais comuns a todos os interesses transindividuais, já descritas
acima, que constituem uma nova classificação das relações jurídicas, para além do esquema individualista
dual, dentro do qual podem caber inúmeros direitos substantivos, desde que as demandas que regulem pos-
suam os mesmos elementos construídos pela doutrina e referendados pela legislação.
Igualmente, aqui podem ser vislumbrados os direitos econômicos, sociais e culturais, cujas demandas pos-
suem, ao lado do sentido individual, como condição de exercício dos direitos civis e políticos, no que se afastam
dos interesses difusos e coletivos, o de garantir a segmentos vulneráveis prestações que reduzam ou eliminem
situações de desigualdade na sociedade.
Tais conjuntos de pessoas dificilmente possuem o que o Código de Defesa do Consumidor chama de “re-
lação jurídica base” (art. 81, § único, II), estando vinculadas pelo simples fato de possuírem características
comuns. Suas demandas não são individualizáveis e as obrigações estatais decorrentes das normas constitu-
cionais ou dos tratados internacionais são indivisíveis, isto é, não podem, em regra, serem realizadas tendo em
vista uma pessoa determinada.
Aliás, é a desigualdade material que constitui o dado central identificador do grupo social (que não necessa-
riamente corresponde à realidade de cada um dos seus membros), em razão do que as providências eventual-
mente adotadas o são em vista da situação do grupo e não do indivíduo, muitas vezes não identificável.
Por fim, percebe-se a correspondência entre a constante mutabilidade de conteúdo dos interesses difusos
e a inerência, típica dos direitos humanos contemporâneos. Ocorre que a alteração das situações de fato, ao
longo do tempo, conduz ao surgimento de novas pretensões pelos grupos sociais, ou à modificação, ou mesmo
extinção, das já existentes.
É o que garante a eterna atualização dos interesses transindividuais. Da mesma forma, o reconhecimento
de que os direitos humanos são inerentes ao ser humano cria a possibilidade de surgimento de novos direitos,
na medida em que as condições sociais se alteram.
Fica então visível a concepção comum a ambas teorias, de encontrar nos seres humanos a fonte dos inte-
resses e direitos humanos, sendo necessário frisar neste ponto que os últimos, ainda que positivados, jamais se
desconectaram do jusnaturalismo, ora matizado pelas transformações históricas, mas sempre remanescendo
como o repositório último de legitimidade das normas erigidas ou reconhecidas pelos Estados.
Tendo em vista a grande similaridade entre as teorias em estudo, parece interessante enquadrar o Direito Inter-
nacional dos Direitos Humanos nas categorias criadas pelo artigo 81, do Código de Defesa do Consumidor, o que se
faz a título ilustrativo, tomando como exemplo as normas consagradas em alguns tratados internacionais.
Cabe ressaltar que não há uma correspondência perfeita entre as categorias de uma e de outra teoria, ou
seja, é possível identificar, v.g., direitos de natureza social portadores de interesses individuais, coletivos ou
difusos, às vezes advindos da mesma norma internacional, diante da antes assinalada complementariedade
das medidas requeridas para plena realização do direito previsto.

— Os direitos humanos difusos


Tendo em vista a definição contida no inciso I do citado artigo 81 do Código de Defesa do Consumidor,
surgem como direitos humanos difusos, em primeiro lugar, aqueles decorrentes dos tratados referentes aos
direitos globais, sempre que for possível identificar com clareza as medidas requeridas. Porém, este ramo do
Direito Internacional dos Direitos Humanos ainda se encontra em fase de desenvolvimento, buscando resolver
questões ligadas ao obrigado por suas prescrições.
Como direitos humanos difusos podem ser enquadradas muitas das prescrições relacionadas aos âmbitos
econômico, social e cultural. A rigor, seguindo a terminologia legal, a titularidade de parte dos direitos de tal
natureza não é coletiva, mas difusa, pois o grupo social que a detém não é plenamente identificável e seus
membros estão ligados por circunstâncias de fato.
Tome-se como exemplo o artigo 12 - 2, c, do Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Cultu-
rais, que dispõe sobre a adoção pelos Estados das “medidas que se façam necessárias para assegurar (...) a
prevenção e o tratamento das doenças epidêmicas, endêmicas, profissionais e outras, bem como a luta contra
essas doenças”.

43
Verifica-se que não há possibilidade de determinação do grupo de interessados, tanto porque não se tem
como identificar os doentes existentes ou potenciais, pois são diversas as moléstias que se enquadram na
descrição da norma. Soma-se a isso a circunstância de que as prestações estatais requeridas para alcançar o
fim indicado são múltiplas e indivisíveis, em regra não podendo ser particularizadas em face de cada uma das
pessoas beneficiadas, o que nada tem a ver, vale repetir, com o gozo individual do serviço oferecido, como no
caso verídico do fornecimento de medicamentos de combate à AIDS, ordenada judicialmente.
Para cumpri-la, o Estado foi obrigado a tomar medidas destinadas a todo o grupo beneficiado (importação
de um lote de medicamentos, criação de um serviço de distribuição e controle etc.), mas cada portador do vírus
pode se beneficiar particularizadamente.
A interdependência própria dos direitos humanos contemporâneos indica que mesmo direitos de origem
liberal atualmente requerem ações estatais para que se tornem efetivos, como no caso do artigo 9º do Pacto
Internacional dos Direitos Civis e Políticos, concernente aos direitos da pessoa privada de liberdade, cujo inci -
so 4 diz: “Qualquer pessoa que seja privada de sua liberdade, por prisão ou encarceramento, terá o direito de
recorrer a um tribunal para que este decida sobre a legalidade de seu encarceramento e ordene a soltura, caso
a prisão tenha sido ilegal”.
Como resta evidente, o recurso ao tribunal pressupõe a institucionalização das garantias respectivas, cujo
interesse não é somente do preso, mas de toda a sociedade. Considerando que o exercício de liberdades fun-
damentais está condicionado à criação de condições objetivas e subjetivas, nem sempre previstas em direitos
econômicos, sociais e culturais, é possível concluir que o sistema de normas criado pelo Direito Internacional
dos Direitos Humanos permite ao intérprete a identificação de diversos novos interesses e direitos, eventual-
mente demandáveis pela via judicial.
A respeito, a doutrina dos interesses transindividuais costuma identificar a eliminação de toda forma de dis-
criminação social como um interesse difuso. Ora, o princípio da igualdade formal é basilar na teoria dos direitos
humanos, estando presente nas codificações liberais do século XVIII.
Sua realização, porém, pode necessitar de providências estatais, como a criação de um departamento poli-
cial voltado à investigação de práticas delituosas relacionadas ao tema, a inclusão da matéria no ensino funda-
mental, a concessão de subsídio para atividades artísticas relacionadas a uma cultura etc.

— Os direitos humanos coletivos


Em primeiro lugar, é necessário esclarecer que os direitos humanos coletivos não se confundem com o que
internacionalmente se está denominando “collective rights”, que nada mais são que os direitos ditos de “solida-
riedade”, apelidados de “globais”.
Em vista da classificação legal antes aludida, os direitos humanos coletivos têm como traço fundamental
o vínculo jurídico entre as pessoas que compõem o grupo, categoria ou classe social, entre si ou perante a
parte oposta. Não se confundem com a soma dos interesses individuais, mas são a expressão de um interes -
se coletivo com natureza própria, dada pela proximidade entre os membros do grupo social e de sua mínima
organização.
Resulta que um primeiro foco destes direitos decorre das relações trabalhistas, em que efetivamente pode
ser vislumbrado um universo definido de pessoas, sendo expressiva a utilização das palavras “classe” e “ca-
tegoria” pelo inciso II do artigo 81 do Código. Tanto assim é que cada vez mais os conflitos são resolvidos por
acordos gerais.
Estes, por sua vez, observam uma expansão no seu conteúdo para abarcar, além das condições de traba-
lho, a cooperação entre patrões e empregados para melhorar a gestão e a produtividade das empresas, como
condição de sobrevivência de ambos.
Em vista dos direitos humanos de natureza política, os partidos mostram-se centros de aglutinação de in-
teresses coletivos, como no caso da liberdade de sua existência e de participação no processo eleitoral. E o
interesse partidário não se mistura com o de seus membros ou de seus eleitores, merecendo caracterização e
proteção próprias.

44
— Os direitos humanos individuais homogêneos
Não são propriamente interesses transindividuais, mas foram abarcados pelo Código de Defesa do Consu-
midor, o que abre espaço para que deles se cuide. Neste campo situam-se especialmente os direitos civis e
políticos que, embora em essência individuais, possuem necessidade de exercício coletivo, sem o que não se
realizam.
Fundamentalmente, são os direitos de associação, como o de fundar sindicato ou de nele ingressar, previsto
pelo Direito Internacional dos Direitos Humanos nos dois Pactos Internacionais de 1966, pela singularidade de
constituir um direito civil que se exerce no âmbito das relações trabalhistas.
Também podem ser aqui classificados os direitos econômicos, sociais e culturais, sempre que de suas previ-
sões decorrerem direitos individualmente exercitáveis, tendo em vista sua caracterização como “direitos-meio”
de que é titular o indivíduo, igualmente detentor de liberdades civis cuja materialização pode depender da cria-
ção das condições materiais pelo Estado.
A possibilidade de se exercer individualmente direitos sociais ressalta a inserção dos direitos sociais na ótica
liberal, colocando-os não como direitos de um grupo social, mas do próprio indivíduo, eis que são condições de
exercício das liberdades clássicas. São, então, duas vertentes de um mesmo direito, que encontra sua identi-
dade na possibilidade do ser humano de demarcar o limite de intervenção estatal, mesmo que isso se dê por
meio da ação do Estado.
Mas a meta a ser alcançada perpassa a elevação de um grupo social a um nível superior de vida, alcançando
o indivíduo, que com isso ganha os meios que permitirão exercer plenamente sua liberdade. Tal ótica se distin-
gue da que vê nos direitos econômicos, sociais e culturais um fim em si mesmos, antes instrumentalizando-os,
tendo em vista o ganho pessoal de cada um que, guindados a um padrão de vida mais condigno, deixam de
pertencer aos modernamente chamados grupos marginalizados ou excluídos para assumir sua individualidade.
Figura como exemplo o direito a que o Estado combata as epidemias (PIDESC, art. 12-2, c); se isso depen-
der da aplicação de uma vacina, não há problema em que uma pessoa exija esta prestação que, neste caso
não, é indivisível e nem se destina a um número indeterminado de pessoas.
Nesta categoria podem ser divisadas pretensões concernentes à ampliação das possibilidades de partici-
pação no poder, tradicionalmente restritas às instâncias da democracia representativa. Neste caso, soma-se à
situação individual do eleitor a sua eventual aglutinação em torno de um interesse comum, deduzido por meio
da iniciativa popular e da gestão compartida das decisões estatais, realizada por diversas maneiras, como as
audiências públicas, o orçamento participativo, a descentralização do poder municipal etc.
Tais ações vão ao encontro da primeira maneira de proteger os interesses difusos e coletivos, a via legislati-
va, em que ao Legislador é dado criar normas substanciais correspondentes aos seus diversos ramos.
As formas de democracia participativa, porém, ampliam essa possibilidade, ao permitir que o próprio proces-
so legislativo sofra a influência dos grupos interessados, que passam de meros pacientes a atores no cenário
estatal, capacitados tanto a criar as normas que positivem seus interesses, como a demandar seu cumprimen-
to, mesmo judicialmente.
Realça, portanto, uma nova conformação dos chamados “corpos intermediários”, como maneira do cidadão
fazer valer seus interesses, que a rigor não se individualizam, mas comungam com os de outras pessoas que
integram um grupo social, pelo mais variado motivo de fato ou de direito. Nada mais são que as conhecidas
“organizações não-governamentais”, verdadeiras associações de pessoas reunidas para demandar prestações
estatais na proteção de interesses e, em alguns casos, participar da tomada das decisões e na implantação da
política pública.

45
Exercícios

1-AOCP - 2018
Segundo a Convenção nº 138 da OIT (Organização Internacional do Trabalho), a idade mínima de admissão
a todo tipo de emprego ou trabalho, que, por sua natureza ou condições em que se realize, possa ser perigoso
para a saúde, segurança ou moralidade dos menores, não deverá ser inferior a
(A) 21 anos.
(B) 18 anos.
(C) 16 anos.
(D) 15 anos, desde que na condição de aprendiz.
(E) 14 anos, desde que na condição de aprendiz.

2-AOCP - 2018
De acordo com a Convenção Internacional sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Ra-
cial, será constituído um Comitê para a Eliminação da Discriminação Racial, composto por peritos reconheci-
dos pela sua imparcialidade e alta estatura moral. Nesse sentido, o aludido comitê será formado por quantos
peritos?
(A) 10 peritos.
(B) 12 peritos.
(C) 14 peritos.
(D) 16 peritos.
(E) 18 peritos.

3-AOCP - 2018
Assinale a alternativa correta de acordo com o contido na Declaração Universal dos Direitos Humanos.
(A) Toda pessoa tem direito ao repouso e aos lazeres, especialmente, a uma limitação razoável da duração
do trabalho e às férias periódicas pagas.
(B) O casamento não pode ser celebrado sem o livre e pleno consentimento dos futuros esposos, salvo nos
casos em que do contrário for o costume de seu país de origem.
(C) Ao Estado pertence a prioridade do direito de escolher o gênero de educação a dar aos filhos de seus
jurisdicionados.
(D) Toda pessoa tem o direito de abandonar o país em que se encontra, incluindo o seu, podendo ser impe-
dida de regressar ao seu país.
(E) Ninguém será submetido à tortura nem a penas ou tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes,
salvo em tempo de guerra.

4-AOCP - 2018
A respeito das disposições da Convenção sobre a eliminação de todas as formas de discriminação contra a
mulher, assinale a alternativa INCORRETA.
(A) Devem ser tomadas medidas apropriadas, inclusive de caráter legislativo, para suprimir todas as formas
de tráfico de mulheres e exploração da prostituição da mulher

46
(B) Os Estados-Partes convém que todo contrato ou outro instrumento privado de efeito jurídico que tenda
a restringir a capacidade jurídica da mulher será considerado anulável, salvo se a própria mulher referendar
o ato.
(C) Nada do disposto nesta Convenção prejudicará qualquer disposição que seja mais propícia à obtenção
da igualdade entre homens e mulheres e que seja contida na legislação de um Estado-Parte ou em qualquer
outra convenção, tratado ou acordo internacional vigente nesse Estado.
(D) É assegurado às mulheres o direito às mesmas oportunidades de emprego, inclusive a aplicação dos
mesmos critérios de seleção em questões de emprego.
(E) Os Estados-Partes outorgarão à mulher os mesmos direitos que ao homem no que diz respeito à nacio-
nalidade dos filhos.

5-AOCP-2016
Assinale a alternativa correta acerca dos direitos previstos na Declaração Universal dos Direitos Humanos.
(A) A educação correspondente ao ensino elementar fundamental deve ser gratuita.
(B) O ensino técnico e profissional é obrigatório.
(C) O acesso aos estudos superiores deve estar aberto a todos em plena igualdade, independentemente
do seu mérito.
(D) O ensino técnico e profissional dever ser gratuito.
(E) A instrução elementar será acessível a todos, sendo o acesso a esta baseado no mérito.

6- INSTITUTO AOCP - 2022


Em 1948, pela Declaração Universal dos Direitos Humanos, foi reconhecida a dignidade inerente a todos os
membros da família humana e seus direitos iguais e inalienáveis, sendo esses elementos fundamento da liber-
dade, da justiça e da paz no mundo. Com base na teoria geral dos direitos humanos e na Declaração Universal
dos Direitos Humanos, assinale a alternativa correta.
(A) Todo ser humano acusado de um ato delituoso tem o direito de ser presumido inocente até que a sua
culpabilidade tenha sido demonstrada, em julgamento arbitral.
(B) Todo ser humano, quando vítima de perseguição, não terá o direito de procurar e de gozar asilo em ou-
tros países quando se tratar de atos contrários aos objetivos e princípios das Nações Unidas.
(C) O direito à liberdade de pensamento, consciência e religião deve ser relativizado quando se tratar de
mudança de religião ou crença.
(D) Todo ser humano tem direito à instrução, que não deve ter caráter de obrigatoriedade, mas deve ser
oferecida de forma gratuita pelo menos nos graus elementares e fundamentais.
(E) Todo ser humano tem direito a uma nacionalidade, a qual irá acompanhar o indivíduo até o dia de sua
morte, uma vez que lhe é vedada a mudança de nacionalidade.

7- FGV - 2023
Leia o trecho a seguir.
Hoje, o Direito Internacional Humanitário (DIH) é um dos ramos mais codificados do direito internacional. No
entanto, o DIH dos tratados aplicáveis a conflitos armados não internacionais está muito menos desenvolvido,
carecendo assim de maior proteção. Já em situações de conflito armado internacional, existem várias fontes
importantes do DIH aplicável, e.g., as quatro Convenções de Genebra de 1949, juntamente com seu Protocolo
Adicional I, e tratados sobre armas. Nesse sentido, impende destacar que os esforços para evitar o sofrimento
desnecessário entre combatentes e minimizar os danos incidentais aos civis resultaram em uma série de pro-

47
tocolos e convenções internacionais que proíbem ou restringem o desenvolvimento, armazenamento ou uso
de diversos armamentos, como armas químicas e biológicas. Além disso, os Estados agora são obrigados a
realizar uma análise da compatibilidade de qualquer nova arma com as normas e os princípios do DIH.
MEZLER, Nils; KUSTER, Etienne (Coord.). Direito Internacional Humanitário: uma introdução abrangente.
CICV, 2020. (Adaptado)
Com base no trecho e em seus conhecimentos, assinale a afirmativa que não se harmoniza com as normas
do DIH relativas às guerras química e biológica.
(A) Depois dos horrores da guerra química e da trágica experiência de milhões de soldados capturados
durante a Primeira Guerra Mundial, a Convenção de Genebra original (1906) e os Regulamentos de Haia
(1907) foram complementados pelo Protocolo sobre a Proibição do Emprego na Guerra de Gases Asfixian-
tes, Tóxicos ou Similares e de Meios Bacteriológicos de Guerra (1925).
(B) A Convenção sobre Armas Químicas de 1993 estabeleceu um regime de verificação, que é supervisio-
nado pela Organização para a Proibição das Armas Químicas (OPAC), cuja competência abrange a exi-
gência para que os Estados Partes forneçam relatórios nacionais sobre a produção industrial de produtos
químicos; aceitem inspeções de rotina e monitoramento contínuo de instalações relacionadas ao tratado; e
permitam inspeções por denúncia, comunicadas com pouca antecedência, de qualquer instalação no terri-
tório nacional.
(C) As proibições de armas químicas e biológicas se aplicam a conflitos armados não internacionais como
Direito Internacional Humanitário Consuetudinário, conforme referido no estudo do Comitê Internacional da
Cruz Vermelha (DIHC).
(D) A Convenção sobre Armas Biológicas, de 1972, proíbe o desenvolvimento, produção e estocagem de
“agentes microbiológicos ou outros agentes biológicos ou toxinas” de tipos e em quantidades que não se
justifiquem para fins pacíficos, e de armas, equipamentos ou vetores destinados à utilização destes agentes
ou toxinas para fins hostis ou em conflitos armados.
(E) A Convenção sobre Armas Químicas de 1993 proíbe o uso, aquisição, estocagem, conservação e trans-
ferência de armas químicas. Tal proibição aplica-se “em quaisquer circunstâncias” e pode, portanto, ser
considerada absoluta. Além disso, a Convenção de 1993 exige ainda que as partes destruam as armas
químicas existentes.

8- INSTITUTO AOCP - 2022


Considere os seguintes casos em que o Brasil foi condenado pela Corte interamericana de Direitos Huma-
nos:
• Caso Favela Nova Brasília;
• Caso Empregados da Fábrica de Fogos de Santo Antônio de Jesus e Seus Familiares vs. Brasil;
• Caso Márcia Barbosa de Souza e Outros vs. Brasil;
• Caso Ximenes Lopes vs. Brasil.
O que tais condenações têm em comum?
(A) Em todas elas, considerou-se que o Brasil, dentre outros pontos, violou a independência e a imparciali-
dade previstas no artigo 8.1 da Convenção Interamericana de Direitos Humanos.
(B) Em todas elas, considerou-se que o Brasil, dentre outros pontos, violou a igualdade perante a lei prevista
no art. 24 da Convenção Interamericana de Direitos Humanos.
(C) Em todas elas, discutiu-se o direito de circulação e residência previsto no art. 22 da Convenção.
(D) Em todas elas, considerou-se que o Brasil, dentre outros pontos, violou o prazo razoável previsto no
artigo 8.1 da Convenção Interamericana de Direitos Humanos.
(E) Não há nenhum direito previsto na Convenção Interamericana de Direitos Humanos que foi discutido em
todas as condenações listadas.

48
9- FGV - 2022
Pedro e João realizaram alentado debate a respeito das dificuldades enfrentadas para a proteção interna-
cional dos direitos humanos. De acordo com Pedro, o maior problema a ser enfrentado decorre do fato de os
sistemas de proteção serem exclusivamente consensuais, além de os universais disporem de mecanismos de
acesso com eficácia inferior aos regionais. João, por sua vez, entendia existir um segundo problema, tão grave
quanto o primeiro, decorrente da existência do domínio reservado de jurisdição interna, o que significa dizer
que atos afetos à soberania estatal não podem ser avaliados por organismos internacionais fora de bases de
natureza consensual.
À luz das considerações de Pedro e João, é correto afirmar que
(A) Pedro está totalmente certo e João, totalmente errado.
(B) Pedro está parcialmente certo, ao se referir aos sistemas universais, e João, totalmente certo.
(C) Pedro está parcialmente certo ao se referir aos sistemas universais, e João, totalmente errado.
(D) Pedro está parcialmente certo ao se referir ao caráter consensual dos sistemas de proteção, e João,
totalmente certo.
(E) Pedro está parcialmente certo ao se referir ao caráter consensual dos sistemas de proteção, e João,
totalmente errado.

10- INSTITUTO AOCP - 2022


De acordo com a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, assinale a alternativa correta.
(A) A anuência do extraditando ao pedido de sua entrega desobriga o Estado requerente de instruir devida-
mente esse pedido. Mais: o assentimento do acusado com a extradição dispensa o exame dos requisitos
legais para o deferimento do pleito pelo STF. O STF que participa do processo de extradição para velar pela
observância do princípio que a CF chama de “prevalência dos direitos humanos”
(B) Uma vez que a legislação ordinária protetiva está em fina sintonia com a Convenção sobre a Elimina -
ção de Todas as Formas de Violência contra a Mulher, não se pode exigir que os Estados adotem medidas
especiais destinadas a acelerar o processo de construção de um ambiente onde haja real igualdade entre
os gêneros. Há também de se ressaltar a harmonia dos preceitos com a Convenção Interamericana para
Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher – a Convenção de Belém do Pará –, no que mostra
ser a violência contra a mulher uma ofensa aos direitos humanos e a consequência de relações de poder
historicamente desiguais entre os sexos.
(C) Marcha da Maconha: o sentido de alteridade do direito à livre expressão e o respeito às ideias que confli-
tem com o pensamento e os valores dominantes no meio social. Caráter não absoluto de referida liberdade
fundamental (CF, art. 5º, IV, V e X; Convenção Americana de Direitos Humanos, art. 13, § 5º). A proteção
constitucional à liberdade de pensamento salvaguarda tão somente das ideias e propostas prevalecentes
no âmbito social, não havendo que se falar em amparo às posições que divergem, pois que radicalmente
contra às concepções predominantes em dado momento histórico-cultural, no âmbito das formações sociais.
(D) A Convenção Americana sobre Direitos do Homem, que dispõe, em seu art. 7º, item 5, que “toda pessoa
presa, detida ou retida deve ser conduzida, sem demora, à presença de um juiz”, posto ostentar o status
jurídico supralegal que os tratados internacionais sobre direitos humanos têm no ordenamento jurídico bra-
sileiro, legitima a denominada “audiência de custódia”, cuja denominação sugere-se “audiência de apresen-
tação”. O direito convencional de apresentação do preso ao juiz, consectariamente, deflagra o procedimento
legal de habeas corpus, no qual o juiz apreciará a legalidade da prisão, à vista do preso que lhe é apresen-
tado, procedimento esse instituído pelo CPP, nos seus arts. 647 e seguintes. O habeas corpus ad subjicien-
dum, em sua origem remota, consistia na determinação do juiz de apresentação do preso para aferição da
legalidade da sua prisão, o que ainda se faz presente na legislação processual penal (art. 656 do CPP).

49
(E) Ainda que haja prescrição constitucional que confere prevalência aos direitos humanos como princípio
que rege o Estado brasileiro nas suas relações internacionais (art. 4º, II), não se afasta a imunidade de juris-
dição em situações específicas. Os atos ilícitos praticados por Estados estrangeiros em violação a direitos
humanos, via de regra, gozam de imunidade de jurisdição.

11- INSTITUTO AOCP - 2020


A Declaração Universal dos Direitos Humanos prevê, no artigo III, que todo ser humano tem direito
(A) à vida, à liberdade e à democracia.
(B) à vida, à família e ao trabalho.
(C) à vida, à saúde e ao trabalho.
(D) à vida, à segurança pessoal e ao pleno emprego.
(E) à vida, à liberdade e à segurança pessoal.

12- INSTITUTO AOCP - 2021


Principalmente a partir da segunda metade do Século XX, as relações internacionais entre os países gera-
ram inúmeros tratados protetivos e afirmativos dos Direitos Humanos. Referido sistema estabelece um perene
diálogo entre os tratados e entre os tratados e os ordenamentos jurídicos internos dos países signatários. Acer-
ca da interpretação e da aplicação dos tratados internacionais de proteção aos Direitos Humanos pelo Supremo
Tribunal Federal, assinale a alternativa correta.
(A) O entendimento do Supremo Tribunal Federal em controle de convencionalidade sobre a Convenção
Americana de Direitos Humanos (Pacto de San Jose da Costa Rica – 1969) é de que, tendo em vista a
soberania do Estado brasileiro, nada impede que um brasileiro seja processado e julgado pelos mesmos
fatos pelos quais fora condenado em ação penal já transitada em julgado sob a jurisdição de outro Estado.
(B) O Supremo Tribunal Federal julgou incompatível com a Constituição da República e a Convenção Inte-
ramericana de Direitos Humanos o tipo penal do desacato, previsto no art. 331 do Código Penal brasileiro.
(C) Seguindo entendimento da Corte Interamericana de Direitos Humanos, é constitucional a exigência de
diploma para o exercício da profissão de jornalista, posto tratar-se de medida que assegura a credibilidade
e a liberdade de expressão e pensamento.
(D) Nos termos do decidido liminarmente pelo Supremo Tribunal Federal na ADPF 347, por força do Pacto
dos Direitos Civis e Políticos, da Convenção Interamericana de Direitos Humanos e como decorrência da
cláusula do devido processo legal, a realização de audiência de apresentação é de observância obrigatória.
(E) Segundo o Supremo Tribunal Federal, não há obrigatoriedade do Estado brasileiro em adotar medidas
para garantir o pleno exercício do direito de propriedade de comunidades formadas por descendentes de
escravos fugitivos sobre as terras tradicionais com as quais mantêm relações territoriais.

13-(DPE/AM - DEFENSOR PÚBLICO – FCC/2021)


A definição de saúde prevista pela Organização Mundial de Saúde, no preâmbulo de sua carta de consti-
tuição, envolve a busca do mais elevado nível de saúde física e mental, a qual também está inserida com o
mesmo conceito no seguinte documento:
(A) Pacto Internacional de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais.
(B) Convenção Internacional sobre os Direitos das Crianças.
(C) Declaração Universal dos Direitos Humanos.
(D) Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência.
(E) Convenção Internacional para a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher.

50
14- INSTITUTO AOCP - 2022
Estabelece o art. 4º, inciso II, da Constituição Federal que a República Federativa do Brasil deve ser regida
nas suas relações internacionais pelo princípio da prevalência dos direitos humanos, sendo a dignidade da
pessoa humana (art. 1º, inciso III) um de seus fundamentos. Por esse balizamento, há outras previsões no texto
constitucional, a exemplo do artigo 245, que determina o dever estatal de proteção especial à vítima de crimina-
lidade, inclusive direito à reparação do dano decorrente do crime que sofreu. Já em âmbito internacional, temos
a Resolução nº 40/34 da ONU, aprovada pela Assembleia Geral em 29 de novembro de 1985, que, além de
trazer conceito amplo de vítima, recoloca-a em posição mais relevante no processo penal e estabelece um rol
diversificado de direitos que devem ser reconhecidos. Com base nesses postulados, o Conselho Nacional do
Ministério Público (CNMP) regulamentou a Política Institucional de Proteção Integral e de Promoção de Direitos
e Apoio às Vítimas (Resolução 243/2021 - CNMP). Considerando o arcabouço normativo citado, a fim de asse-
gurar direitos fundamentais às vítimas de infrações penais, o(a) candidato(a), uma vez aprovado(a) e empos-
sado(a) no cargo de Promotor(a) de Justiça Substituto(a), deverá adotar as seguintes providências, EXCETO
(A) diligenciar a fim de que seja assegurada às vítimas a prestação de apoio e atendimento especializado
por meio de equipe multidisciplinar da própria instituição ou pelo devido encaminhamento às redes de apoio
externas.
(B) zelar para que as vítimas tenham participação efetiva na fase da investigação e no processo, seja por
meio da materialização dos direitos de serem ouvidas, de terem seus bens restituídos, de apresentarem ele-
mentos de prova, de serem comunicadas de decisões no curso do processo, notadamente acerca do ingres-
so e saída do autor do fato da prisão, caso assim manifestem interesse, entre outras formas de participação.
(C) estimular políticas públicas e criar, em sua estrutura interna, meios de atendimento às vítimas que
busquem evitar a revitimização, bem como núcleos próprios de jurimetria para diagnosticar e produzir uma
política de atuação mais eficaz, resolutiva e preventiva.
(D) implementar projetos e mecanismos de resolução extrajudicial de conflitos, por meio da negociação, me-
diação e conferências reparadoras dos traumas derivados dos eventos criminosos ou de atos infracionais.
(E) compilar informações do número de casos atendidos, do número de casos em que se verificou a repara-
ção dos danos sofridos, das taxas de vitimização, além de outras políticas que permitam a identificação de
direitos difusos, coletivos ou individuais homogêneos lesados.

15- INSTITUTO AOCP - 2021


Os direitos humanos constituem matéria cuja tutela não se reserva unicamente ao âmbito doméstico dos
Estados nacionais, mas também ocupa lugar na agenda da comunidade internacional. Sobre a teoria contem-
porânea dos direitos humanos, assinale a alternativa correta.
(A) Os Direitos Humanos de defesa relacionam-se com a prerrogativa de a pessoa solicitar uma conduta
ativa do Estado a fim de promover seus direitos fundamentais.
(B) Pode-se afirmar que a concepção contemporânea de Direitos Humanos é marcada pela universalidade
e pela divisibilidade desses direitos.
(C) Pode ser conferida interpretação aos artigos da Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948) de
forma que o exercício de um direito ali previsto anule ou restrinja o exercício de outro, destruindo esse último
direito.
(D) Positivistas como Hans Kelsen e Alf Ross afirmam que os direitos humanos são direitos inatos à pessoa,
que decorrem da sua própria condição de ser humano.
(E) A partir de um resgate da visão kantiana, a única condição exigida para que alguém seja titular de Direi-
tos Humanos é sua condição de ser humano.

51
Gabarito

1 B
2 E
3 A
4 B
5 A
6 B
7 E
8 D
9 C
10 D
11 E
12 D
13 A
14 E
15 E

52

Você também pode gostar