119483-Texto Do Artigo-236823-1-10-20161223
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A
Literatura Negra é, muito além de toda a sua presença, um
lugar de ausências. Para abordar mais detalhadamente a afir-
mação ora posta, serão citados alguns acontecimentos rela-
cionados a esta Literatura nos últimos anos. Para dar início ao diálogo,
vamos recordar que, bem recentemente, aconteceu a Feira Literária
Internacional de Paraty, evento literário de grande porte, no Rio de
Janeiro. Neste ano de 2016, foi amplamente veiculado na mídia que a
FLIP seria das mulheres (17 num total de 39 convidados). A princípio
não haveria nenhum problema; ainda não é o ideal, mas já é um bom
começo, em um universo dominado pelos homens. No entanto, uma
polêmica se instaurou, inundando as redes sociais: a ausência de escri-
toras negras na programação oficial.
A Professora Giovana Xavier discute essa ausência no blog Conver-
sas de Historiadoras em carta aberta à Festa Literária Internacional de
Paraty – “Cadê as nossas escritoras negras na FLIP 2016?”. No texto
ela constata: “Em um país de maioria negra e de mulheres, portanto
de maioria de mulheres negras, é um absurdo que o principal evento
literário do país ignore solenemente a produção literária das mulheres
negras (...)” (XAVIER, 2016, s/p). Mais adiante, reitera:
(…) somos rechaçadas toda vez que assumimos papéis que
para nós não foram pensados. No mercado editorial, que
segue definindo a autoria como um lugar masculino e bran-
co. Na Academia, onde nossas pesquisas são desqualificadas
como militantes (como se isso fosse um problema)... (XAVIER,
2016, s/p)
Revista Crioula nº 18 - 2º semestre/2016 34
Ronald Augusto postou um texto há pouco tempo, em uma rede so-
cial, sobre a temática da ausência literária negra em um evento, intitu-
lado: “Escritores negros na 62ª feira do livro de Porto Alegre: quantos
e quais?”. Como resposta, questionaram-lhe, na ocasião, se “escritor
tem cor”, ao que ele respondeu: “escritor tem cor, sexo, CPF e RG”. Tal
questionamento, para Augusto, é uma demonstração da “confiança
na crença anacrônica de uma ‘arte pura’.” (AUGUSTO, 2016, s/p). Vale
destacar que Paulo Colina, em 1987, ao prefaciar a obra O Negro Es-
crito, de Oswaldo de Camargo, trouxe a seguinte reflexão sobre esse
mesmo tema:
Por experiência, sei que toda vez que o negro escrito aparece
em um debate, uma conferência, palestra, surgem, de pronto,
as perguntas de rotina: “Mas, por que literatura negra? Exis-
te? A literatura tem cor?”. E sou obrigado a retroceder às aná-
lises que tenho feito desde que me confronto com o mundo.
Para chegar à conclusão de que à sociedade pátria interessa o
negro mudo.” (COLINA APUD CAMARGO, 1987, p. 11).
Podemos perceber, assim, o quanto continua incomodando ainda
hoje a reivindicação por uma Literatura Negra, optando-se por ten-
tativas recorrentes de apagamento e invisibilização desta Literatura,
como também ocorreu na Feira do Livro de Frankfurt de 2013. Nesta
edição da Feira, o Brasil era o país homenageado. Foram selecionados,
na ocasião, 70 escritores para representar o País e, curiosamente, des-
se total, somente 02 eram negros: Ferréz e Paulo Lins.
Dessa forma, ao discutir a seleção destes escritores, Tenório enfatiza:
A argumentação de que os escritores são chamados para os
eventos porque atendem a uma estética universal e de qualida-
de é falha, primeiro porque o “universal” é apenas mais uma vi-
são construída por um “centro” que não costuma olhar para as
margens. E, segundo, porque é preciso compreender que a falta
de negros em eventos e festivais literários não é um problema
estético. É um problema político. (TENÓRIO, 2016, s/p).
Ah,
Esqueci de dizer. Não vou mais
Resolvi ficar um tempo comigo
Resolvi ler sobre o que se passa conosco
Você nem me espere. Você nem me chame. Não vou
De tudo o que jamais li, de tudo o que jamais entendi,
Você foi o que passou
Passou do limite, passou da medida, passou do alfabeto.
Aboli
Não lavo mais os pratos
Quero travessas de prata, cozinhas de luxo
E joias de ouro.
Legítimas
Está decretada a lei áurea.
(SOBRAL, 2011, p.23)
Referências bibliográficas
Referências legislativas