Practice Makes Perfect - Sarah Adams
Practice Makes Perfect - Sarah Adams
Practice Makes Perfect - Sarah Adams
Nossos
grupos não possuem fins lucrativos, sendo este um trabalho voluntário e
não-remunerado. Traduzimos livros com o objetivo de possibilizar a leitura
para aqueles que não sabem ler em inglês.
Para preservar a nossa identidade e manter o funcionamento dos grupos
de tradução, pedimos que:
• Não publique abertamente sobre essa tradução em quaisquer redes
sociais (por exemplo: não responda a um tuíte dizendo que tem esse livro
traduzido);
• Não comente com o autor que leu este livro traduzido;
• Não distribua este livro como se fosse autoria sua;
• Não faça montagens do livro com trechos em português;
• Se necessário, finja que leu em inglês;
• Não poste – em nenhuma rede social – capturas de tela ou trechos
dessa tradução.
Em caso de descumprimento dessas regras, você será banido desses
grupos.
Caso esse livro tenha seus direitos adquiridos por uma editora brasileira,
iremos excluí-lo do nosso acervo.
Em caso de denúncias, fecharemos os canais permanentemente.
Aceitamos críticas e sugestões, contanto que estas sejam feitas de forma
construtiva e sem desrespeitar o trabalho da nossa equipe.
SINOPSE ........................................................................................................5
SUMÁRIO .....................................................................................................6
Aviso — Bookworm’s Cafe & Wicked Lady .................................................3
CAPÍTULO UM .........................................................................................10
CAPÍTULO DOIS ......................................................................................21
CAPÍTULO TRÊS......................................................................................34
CAPÍTULO QUATRO..............................................................................46
CAPÍTULO CINCO ..................................................................................61
CAPÍTULO SEIS ........................................................................................71
CAPÍTULO SETE ......................................................................................75
CAPÍTULO OITO .....................................................................................89
CAPÍTULO NOVE ................................................................................. 100
CAPÍTULO DEZ ..................................................................................... 108
CAPÍTULO ONZE ................................................................................. 113
CAPÍTULO DOZE ................................................................................. 129
CAPÍTULO TREZE................................................................................ 136
CAPÍTULO QUATORZE...................................................................... 148
CAPÍTULO QUINZE............................................................................. 164
CAPÍTULO DEZESSEIS ........................................................................ 182
CAPÍTULO DEZESSETE ...................................................................... 193
CAPÍTULO DEZOITO .......................................................................... 204
CAPÍTULO DEZENOVE ...................................................................... 213
CAPÍTULO VINTE ................................................................................ 221
CAPÍTULO VINTE E UM..................................................................... 233
CAPÍTULO VINTE E DOIS.................................................................. 243
CAPÍTULO VINTE E TRÊS ................................................................. 259
CAPÍTULO VINTE E QUATRO ......................................................... 270
CAPÍTULO VINTE E CINCO ............................................................. 276
CAPÍTULO VINTE E SEIS .................................................................... 283
CAPÍTULO VINTE E SETE .................................................................. 297
CAPÍTULO VINTE E OITO ................................................................. 308
CAPÍTULO VINTE E NOVE ................................................................ 329
CAPÍTULO TRINTA............................................................................. 345
CAPÍTULO TRINTA E UM ................................................................. 365
CAPÍTULO TRINTA E DOIS .............................................................. 374
CAPÍTULO TRINTA E TRÊS .............................................................. 382
CAPÍTULO TRINTA E QUATRO ...................................................... 386
CAPÍTULO TRINTA E CINCO .......................................................... 398
CAPÍTULO TRINTA E SEIS ................................................................ 404
CAPÍTULO TRINTA E SETE .............................................................. 408
CAPÍTULO TRINTA E OITO ............................................................. 417
CAPÍTULO TRINTA E NOVE ............................................................ 428
CAPÍTULO QUARENTA ..................................................................... 439
EPÍLOGO ................................................................................................. 451
AGRADECIMENTOS: .......................................................................... 453
Este livro é para os molengas.
Para os doces com corações ternos.
Para os introvertidos que têm medo de brilhar.
Plantar um jardim é acreditar no amanhã.
— Audrey Hepburn
Annie
quero me casar.
Amelia: Caramba! Você gosta tanto assim dele?
sem mim.
—
Eu me endireito no espelho, aliso para trás meu longo cabelo loiro
(que pelo menos parece muito bonito graças ao modelador de cachos
de Emily, que eu também roubei) e, em seguida, saio do banheiro.
Infelizmente, chego à mesa bem a tempo de ouvir John
terminando um telefonema que ele não pretendia que eu escutasse.
— Sim, estou te dizendo que ela é incrivelmente chata. Meio
estranha e esquisita. Com zero personalidade. — Ele pausa para
escutar a pessoa do outro lado da linha. — Quero dizer, sim, acho que
ela é bonita, mas não quero nem tentar ficar com ela esta noite porque
ela é tão chata. Então me liga em cinco minutos com uma
emergência. Ok, sim. Obrigado.
Minhas bochechas queimam. A senhora da mesa ao nosso lado
ouviu tudo e está me lançando um olhar de pena. Eu odeio olhares
de pena. Eu prefiro que ela ria de mim. Eu posso lidar com o riso.
Minhas irmãs e irmão são piadistas profissionais, então fui
condicionada a rir ao longo da vida. Já aguentar a pena... não.
Respiro pelo nariz para não chorar – porque isso seria mesmo a
cereja no topo do bolo, não é? –, e dou vários passos para trás. Conto
até cinco e, assim que me recomponho, volto a mesa anunciando
minha chegada.
— Voltei!
John se mexe e ajusta o guardanapo, com um novo sorriso
brilhante no rosto (provavelmente para que ele possa estar
convincentemente triste por ter que sair após a ligação de
emergência).
— Ótimo. Você sabe o que quer pedir?
— Provavelmente apenas um brownie — eu digo mais para mim
mesma do que para John antes que veja pela minha visão
estereoscópica um casal entrando no restaurante. Eu olho para cima
e dou uma conferida.
É... o pirata.
Annie
—
Meia hora depois e recém-banhado, bato na porta da frente de Amelia
e Noah. Ela abre com o telefone fixo grudado na orelha.
— Uh-huh. Absolutamente. Esse é um ponto excelente, Harriet,
com certeza passarei adiante. — Ela sorri e acena para que eu entre.
Tenho que passar por cima do fio de telefone encaracolado que vai
da cozinha ao redor da pequena ilha, desaparecendo na parede do
canto, e depois pelo corredor até o telefone que ela está segurando.
Também está enrolado uma vez em volta da cintura.
Amelia aponta para a sala de estar, gesticulando para que eu entre
e me sente. Ela passa a última parte de sua conversa ao telefone se
desvencilhando do fio. Eu ouço uma porta abrir e fechar atrás de
mim, e quando vejo Noah aparecer no corredor, eu me levanto.
— Will — diz ele entrando na sala e estendendo a mão. Eu a
seguro e nos cumprimentamos com firmeza. — É bom ter você de
volta.
Eu realmente gosto de Noah. Amelia namorou alguns caras
anteriores a ele cujos dentes eu queria fazê-los engolir. Mas esse cara é
legal. Ele é leal e coloca Amelia em primeiro lugar. Eu confio nele e
ele parece confiar em mim.
— É bom estar trabalhando para Amelia novamente.
Ele sorri.
— Não tenho certeza se a cidade compartilha sua alegria.
— O que você quer dizer com isso? — Meus olhos seguem seu
olhar por cima do meu ombro para onde Amelia ainda está ao
telefone, acenando distraidamente para quem está tagarelando em
sua orelha.
— Essa é a quarta ligação para ela desde que você voltou da
corrida.
Nós dois voltamos nossa atenção para Amelia quando ela termina
sua ligação, lentamente movendo o telefone de sua orelha, cada vez
mais perto do receptor a cada palavra.
— Sim... Uh-uh... Absolutamente... Ok... Eu vou... Tchau! — Ela
desliga e se apoia dramaticamente contra a parede, escorregando até
o chão. E então ela aponta o dedo para mim. — Você!
— Eu? — Eu digo com as sobrancelhas levantadas, apontando
para mim.
— Sim, você! Você só teve que correr esta manhã sem camisa,
causando um alvoroço na cidade inteira.
— Você está brincando? — Isso deve ser algum tipo de piada.
Noah balança a cabeça.
— Não. A cidade está em um alvoroço. Você realmente conseguiu
esse feito desta vez.
Amelia se levanta e entra na sala de estar.
— Acabei de falar ao telefone com Harriet, que não gostou nem
um pouco da maneira como você desfilou sua nudez pela cidade,
convidando as jovens solteiras a serem corrompidas.
Meu queixo cai aberto. Estou sem palavras.
Noah balança a cabeça para mim.
— Tão impensado. Você está tentando seduzi-las? Em seu
primeiro dia de trabalho?
— Quem? As jovens solteiras? — Eu levanto minhas mãos. —
Não. Juro. Só fiquei com calor e tirei minha camisa como
normalmente faço, e... — Faço uma pausa quando ouço risadas deles
que mal conseguem conter. — E vocês estão brincando comigo.
Noah acena com a cabeça desta vez, sorrindo.
— Estamos brincando com você. — Ele passa e me dá um tapinha
no ombro. — Bem-vindo de volta a Rome. Onde ninguém tem nada
a fazer a não ser reclamar uns dos outros.
Ele passa por Amelia e para a beijando na boca – nem um beijo
longo, nem um beijo curto. Apenas... romântico. Eu esfrego meu
peito.
— Tenho que trabalhar. Vejo vocês daqui a pouco. E Will — ele
se vira para mim. — Por favor, faça o possível para manter suas
malditas roupas hoje.
— Vou tentar.
Assim que ele sai pela porta, Amelia me serve uma xícara de café e
eu me sento à mesinha da cozinha. Conversamos por alguns minutos,
e ela me conta o que está acontecendo com a imprensa em mais
detalhes e alguns fanáticos que se aproximam um pouco demais do
confortável. Estabelecemos um plano de jogo para o mês e decidimos
que faremos uma programação diária. Um encontro matinal para ver
quais são seus planos para o dia, e então estarei por perto para
acompanhá-la à cidade e a qualquer outro lugar que ela precise ir, mas
não preciso ficar por perto enquanto ela estiver em casa ou em seu
estúdio. Ela aparentemente está trabalhando em um novo álbum e vai
passar muito tempo aqui, e eu vou me divertir enquanto ela faz isso.
Bom.
Ela espera que depois do casamento tudo se acalme. De qualquer
forma, pretendo pedir para ser transferido para um cliente diferente
depois que o mês acabar. Não porque não goste de trabalhar para
Amelia, sempre gostei, mas não vou ficar nesta cidade nem mais um
minuto do que o necessário. O tédio não combina comigo.
— Então isso soa bem para você? — Ela pergunta.
Eu concordo.
— Parece bom. Estou aqui para o que precisar. Sério, jardinagem?
Limpar as calhas? Eu sou seu cara. Você sabe que fico louco quando
não tenho nada para fazer.
Amelia ri.
— Eu sei. É por isso que estou feliz em ouvir você dizer que estaria
disposto a ajudar com outras coisas em seu tempo livre.
Me inclino para a frente, ansioso para saber o que ela tem em
mente.
— Sim, qualquer coisa. Basta dizer
Se não me engano, seu sorriso se torna um pouco diabólico.
Qualquer outra pessoa veria aquele sorriso e pensaria que ela está
insinuando algo sexual. Mas conhecendo Amelia como eu conheço,
definitivamente não é isso. É algo diferente. Algo complicado. Algo
que não vou querer fazer.
— Ótimo. Para começar, você se importa de levar uma carta para
a cidade para mim?
— Claro — eu digo, arrastando a palavra para que ela saiba que
irei fazer, claro. — Tipo ir ao correio?
— Não. — Seu sorriso se expande ainda mais. — Na floricultura,
na verdade.
E como só há uma floricultura na cidade, isso significa que vou ver
Annie Walker hoje. Merda.
Se eu não estava nervoso antes, ao sair pela porta com um discreto
envelope branco na mão, Amelia grita:
— Ei, Will!
— Sim?
— Não diga não, ok?
— Para o quê?
— Para o que está nesse envelope. — O olhar em seu rosto é de
súplica e algo genuíno. — Por favor, não diga não.
Will
1
A PETA (People for the Ethical Treatment of Animals) é uma organização não-governamental e ambiental
que se dedica aos direitos dos animais.
ele deve ter parecido autoritário. Tipo... é justo dizer que é uma visão
de dar água na boca?
Will continua antes que eu possa dizer qualquer coisa que me
arrependa.
— E meu momento favorito no livro foi absolutamente a cena da
escada. — Ele faz uma breve pausa. — Estou disposto a apostar todo
o meu dinheiro que foi o seu também. — Meu coração bate
dolorosamente com o olhar quase perverso em seus olhos enquanto
ele lê meus pensamentos com precisão.
— Como você saberia disso? — Ninguém mais no mundo jamais
suspeitaria que minha cena favorita fosse a mais quente do livro, mas
Will suspeita porque, por algum motivo, ele não me vê como todo
mundo vê. Na verdade, ninguém mais imaginaria que gosto desse
tipo de livro. É um segredo que nem mesmo minhas irmãs sabem,
porque mantive minha caixa de romances bem escondida debaixo da
cama, fora de vista por anos.
E sim, eu percebo que devo falar alto e me orgulhar dos meus
hábitos de leitura de romances, mas quando você cresce com irmãs
como as minhas e essas irmãs lhe deram o apelido de Annie Santinha
e com certeza iriam te atormentar cada dia pelo resto de sua vida, se
elas soubessem que você adora livros picantes como “Big Duke
Energy”, você também esconderia o livro debaixo do travesseiro. Este
é um segredo (junto com a caixa de livros de romance debaixo da
minha cama) que levarei para o túmulo. Se alguém roubar meu
túmulo, ficará chocado ao me encontrar coberta por piratas sem
camisa abraçando ferozmente uma mulher em um vestido que não é
nem remotamente exato para a época do livro.
Mas agora Will conhece meu profundo segredo obscuro. Meu
corpo esquenta com o pensamento.
Seus olhos seguram os meus.
— Porque ao contrário do que todos parecem dizer sobre você,
posso ver uma faísca travessa por trás de seus olhos azuis e suaves,
Annie Walker.
Os olhos de Will caem para os meus lábios, e fico sem palavras por
três segundos. O desejo enche o ar como fumaça – densa e pesada –
dificultando respirar.
— Mas... você não vai contar a ninguém, certo? — Eu pergunto
baixinho, fazendo o olhar de Will subir para os meus olhos
novamente. — Nem mesmo sobre nossas aulas? Não quero que
minhas irmãs saibam.
— Por que elas não podem saber?
Eu olho para baixo.
— Elas vão... elas simplesmente não podem. — Eu balanço minha
cabeça. — Se elas descobrirem, ficarão cheias de opiniões e sugestões
que eu não necessariamente quero. — Eu posso ouvir Emily agora –
fazendo vinte perguntas até que ela saiba todos os detalhes do que
estou planejando e sugerindo uma maneira melhor de fazer isso até
que eu acabe cedendo e fazendo as coisas do jeito dela para não ferir
seus sentimentos. E Maddie exigirá ser minha tutora e, de alguma
forma, serei ofuscada, como sempre faço quando minhas irmãs estão
por perto.
Olho nos olhos de Will e quase me encolhe ao ver como seu olhar
é inabalável. Ele está esperando que eu diga mais.
— Eu só quero fazer algo para mim por um tempo – isso é ruim?
Parece errado.
— Não acho que seja errado, mas sou uma pessoa naturalmente
egoísta, então talvez não seja a melhor pessoa para perguntar.
— Você não parece egoísta.
Seus dedos apertam levemente os meus e sua expressão parece
quase desesperada.
— Annie, preciso que você saiba que não tenho relacionamentos.
Nunca. E eu nunca vou ter. Se fizermos essas “aulas” que você deseja,
será como amigos e nada mais.
Suas palavras não deveriam doer. Eu já sei disso sobre ele, e
também sei que estou procurando um homem completamente
oposto a ele. E, no entanto, sinto-as como cacos de vidro. Ele não
pode saber disso, no entanto.
Eu me inclino ainda mais perto.
— E eu só procuro relacionamentos. Então estamos em perfeito
acordo.
Seus olhos procuram os meus.
— Então... apenas amigos?
— Apenas amigos.
— Ótimo. Então podemos começar as aulas hoje à noite, se você
estiver disponível.
Preciso de todo o meu autocontrole para não engolir em seco de
forma audível. E porque não confio na minha voz, simplesmente
aceno com a cabeça.
Não perco o momento em que seu polegar desliza sobre a pele da
minha mão antes de soltá-la.
— Vou te levar as escondidas para o meu quarto. Por volta das seis
e meia? — Eu mal percebo que ele joga uma caixinha na minha cesta
porque estou muito ocupada internamente em pânico com sua
última declaração.
— Mas como? — Pergunto enquanto caminho rapidamente pelo
corredor para alcançá-lo. — Como você vai me esgueirar para dentro?
Esta cidade tem olhos em todos os lugares.
— Apenas espere do lado de fora da pousada pela minha deixa. —
Will não olha para mim. Ele coloca sua cesta no chão e sai do mercado.
Eu olho para baixo e percebo que sua cesta agora está vazia.
Ele só veio aqui para falar comigo?
No caixa, coloco minha cesta no chão e começo a retirar os itens
para Harriet escanear. E, tarde demais, percebo que estou segurando,
cortesia de Will Griffin, uma caixa de preservativos – do tipo “com
textura para o prazer dela”.
Com as bochechas em chamas, olho diretamente para o rosto
carrancudo de Harriet. É por isso que minhas irmãs compram todos
os seus itens íntimos na Amazon.
— Tenha cuidado com aquele garoto, Annie. Ele não é bom para
você e definitivamente não é o tipo de homem que você precisa em
sua vida.
Eu me viro para a janela bem a tempo de ver Will rindo e se
afastando do mercado, tão orgulhoso de si mesmo e de sua
brincadeira.
Acho que Harriet está certa. Will Griffin não é absolutamente o
tipo de homem de que preciso.
Pena que ele está rapidamente se tornando o homem que eu
quero.
Annie
Está na hora de ir.
Olhando da esquerda para a direita, saio do beco atrás da minha
floricultura e entro no estacionamento. Imediatamente vejo Phil e
Todd – os fofoqueiros – então me escondo atrás da minha
caminhonete para evitá-los. Está um calor infernal hoje, um calor do
tipo úmido e espesso subindo da calçada e aquecendo tudo que está
exposto. Quando me inclino contra o para-choque da minha
caminhonete, ele queima a parte de trás do meu braço como um ferro
quente.
Bem-vindos ao Sul, amigos, onde você sofre queimaduras de
terceiro grau por encostar em seu veículo. Vale a pena para evitar ser
vista, no entanto. Eu, com certeza, seria o assunto da cidade. Ouviram
dizer que a doce Annie Walker passou a noite no quarto de Will
Griffin sozinha? Que escândalo!
O que me incomoda é que se fosse Emily ou Madison, ninguém
pensaria duas vezes. Mas como sou eu, teria quinze visitantes no dia
seguinte me alertando para proteger meu coração.
Phil briga com Todd sobre alguma coisa (é sempre alguma coisa),
e eu espero até que eles estejam dentro da caminhonete deles e se
afastando para sair do meu esconderijo. Eles são os últimos lojistas a
sair hoje, então sei que a barra está limpa. Esperei para voltar à cidade
até depois da hora de fechar, para dar a todos a chance de entrar em
seus veículos e irem para casa. Porque, sem querer ser dramática, esta
noite é a noite em que tudo mudará para mim. Will vai me ensinar a
ser um excelente encontro, e eu vou conseguir um marido
rapidamente.
Will deixou um bilhete na minha porta mais cedo (o que me fez
rir, considerando que tenho um celular para o qual ele poderia ter
mandado uma mensagem) dizendo que esta noite vamos escrever um
plano formal para as aulas. Isso causou arrepios porque não há nada
que eu goste mais do que uma boa check-list. A carta também veio
com um mapa desenhado à mão e carimbos de data e hora de quando
cada parte da missão deveria ser concluída. Eu meio que esperava que
o bilhete se autodestruísse depois que eu terminasse de lê-lo.
Uma coisa é certa, esse homem é meticuloso. O que me faz ter o
pensamento intrigante de como seria beijá-lo ou até mesmo...
Nãooooo. Eu não vou lá.
De volta ao plano. Eu deveria estar do lado de fora da Pousada da
Mabel às 18h30, quando Will irá distrai-la para que eu possa entrar
sem que ela veja. Aparentemente, ele vai dar um sinal e eu saberei
quando ver.
Ouça, isso é um perigo de alto risco. Até mesmo Jason Bourne
estaria suando se fosse confrontado com um potencial flagra em uma
de suas missões por Mabel. Se ela descobrir, é melhor eu transmitir
tudo ao vivo no Instagram, porque todo mundo daqui até a periferia
de Kentucky saberá sobre nossas aulas secretas antes que meu pé
tenha tempo de cruzar sua porta.
Meu relógio diz que tenho quatro minutos até precisar sair da
pousada. Assim que o estacionamento está vazio, atravesso a rua
correndo. Não consigo decidir se devo andar normalmente ou me
apressar enquanto estou agachada, e tenho medo de que o resultado
pareça que Annie está prestes a fazer cocô na calça. Eu realmente
espero que Will não esteja olhando pela janela agora.
Mais alguns quarteirões e chego ao meu destino: Pousada da
Mabel.
É uma linda propriedade vitoriana antiga com uma cerca branca
em torno do pequeno gramado. Tem a aparência de uma casa que foi
construída antes da cidade e tem sido uma segunda casa para mim
desde a infância. Todo domingo depois da igreja, minha avó Silvie nos
trazia aqui para almoçar na casa de Mabel. Mabel não ia à igreja, então
ela passava a manhã inteira preparando um grande banquete – e eu
me lembro de pensar como ela era incrivelmente rebelde. Não vai à
igreja?! Inacreditável! Eu perguntei a ela sobre isso uma vez e ela
apenas me disse: “Se eu quisesse ver um monte de gente com suas
roupas chiques e usando máscaras para as mentiras, eu iria à um baile
de máscaras.”. E como um passe de mágica: eu passei a almejar ser
como a Mabel quando crescer.
A ironia é que, embora Mabel não ponha os pés na igreja, ela joga
pôquer com as senhoras da igreja no Hank's Bar toda segunda-feira.
Infelizmente, ela não vai sair daqui para esse evento antes das oito
horas, então tenho que passar por ela.
Em vez de seguir pela calçada, pulo a cerca lateral e coloco minhas
costas na lateral da casa como Will instruiu. Assim que estou no lugar,
a porta da frente da pousada se abre. E então ouço a voz de Will.
— É por aqui, Mabel! Me siga — ele diz em voz alta.
— Merda, filho. Não há necessidade de gritar. Meus aparelhos
auditivos já estão no máximo — diz Mabel com sua voz rouca e doce
que sempre me faz sorrir.
— Desculpa por isso.
— Desculpas aceitas. Agora me mostre este pedaço de
revestimento que te preocupa.
— Sim, é bem aqui... — A voz de Will é cortada quando ele
contorna a lateral da casa onde estou.
Não que seja relacionado, mas só para constar, não sou tão boa em
ler mapas.
Nossos olhares se encontram e os de Will se arregalam. Começo a
acenar freneticamente para ele ir embora, e ele gira nos calcanhares
pouco antes de Mabel virar a esquina.
— Opa! Lado errado. Esqueci totalmente que é... do outro lado.
— As sombras deles se projetam na grama, e vejo Will colocar as mãos
nos ombros de Mabel e guiá-la na direção oposta.
Ela sibila levemente.
— Nossa, William. Pelo menos me leve para jantar primeiro.
A única pessoa na cidade que flerta mais do que Will é Mabel.
— Acredite em mim, Mabel, se eu achasse que tenho uma
chance... — Will diz, fazendo Mabel rir e eu revirar os olhos. Suas
vozes ficam mais distantes, e quando acredito que a barra está limpa,
espio minha cabeça ao virar da esquina.
Não.
Não está limpa.
É claro que Noah estaria andando pela calçada da pousada,
segurando uma caixa de torta.
— Mabel? Você está aqui? — Ele grita.
— Sim! Estou bem aqui — ela diz, dando a volta para a frente da
pousada e abandonando Will.
— Trouxe sua torta.
— Oh ótimo, apenas coloque na varanda e venha dar uma
olhadinha. William estava me mostrando uma parte que está ruim do
revestimento da pousada.
— Sério? Você não acabou de substituir o revestimento no mês
passado?
Mabel abaixa a voz.
— Sim, senhor. Mas cá entre nós, acho que o menino está
solitário. Inventando desculpas para passar o tempo comigo e tudo
mais. Melhor vir fazer companhia a ele comigo.
— O que está acontecendo? — E essa seria a voz de Emily
enquanto ela caminha até a pousada, vindo se juntar ao circo. O que
minhas irmãs estão fazendo pela cidade tão tarde? Elas não têm
vidas?!
— Will está nos mostrando uma parte ruim do revestimento da
pousada — diz Noah.
Emily zomba.
— Impossível. Achei que a Mabel tinha trocado tudo no mês
passado. E Darell é quem fez isso. Ele nunca faz um trabalho ruim.
Parece que eu deveria ter trazido uma barraca, nesse ritmo. O suor
está se acumulando no meu pescoço. Minha calça está grudando nas
minhas pernas. Exatamente como eu queria aparecer para esta noite
com Will – como mulher do pântano.
— Mabel acha que Will está solitário e está tentando chamar a
atenção.
Emily ri.
— Eu duvido muito disso. Pelo que Amelia disse, ele tem muita
companhia feminina sempre que quer.
Sua declaração faz minha pele coçar desconfortavelmente.
— O que está acontecendo aqui? — Ah, puxa. Nós realmente
precisamos adicionar a Harriet nessa mistura? — Esta é outra reunião
municipal improvisada sem mim? — Ela ainda não perdoou Mabel
depois da última.
— Isso parece uma reunião municipal, Harriet? Você sabe usar seu
cérebro? — Pergunta Mabel impiedosamente.
— Pelo menos eu tenho um para usar! E se não é uma reunião, por
que vocês estão parados aqui?
— William vai me mostrar uma parte ruim do revestimento.
— Você não acabou de substituir o revestimento no mês passado?
— Sim — todos dizem em uníssono, inclusive eu baixinho.
Finalmente, ouço a voz de Will.
— Mabel, você está... oh, pessoal. Olha só. — Eu sorrio para mim
mesma, imaginando o olhar de aborrecimento em seu rosto. Eu
apostaria todo o meu dinheiro que ele passa a mão com desenho de
borboleta pelo cabelo.
— Sim, William, a turma toda está aqui. Agora, nos mostre este
revestimento que está podre.
— Bom. Certo. Fico feliz que todos possam vê-lo. — Ele faz uma
pausa e limpa a garganta. — Me sigam, todos.
Espero três segundos, verifico novamente e, em seguida, corro
para o quarto número quatro. O quarto de Will.
Annie
2
Programa de televisão americano no estilo de game show.
— Você está ridículo — Amelia diz enquanto contornamos as
estufas da Fazenda Huxley.
— Não, você está ridícula — eu digo, olhando Amelia de cima a
baixo. Ela está usando shorts curtos feitos em casa, botas de trabalho
marrons, uma regata cinza e um grande chapéu flexível – tão oposto
ao seu visual clássico de costume. — Como uma caipira.
Normalmente eu nunca ousaria falar com um cliente tão
livremente. Mas essa é a Amelia, e trabalhamos juntos por tanto
tempo que somos praticamente parentes. E Amelia é a coisa mais
distante de uma celebridade arrogante que você pode imaginar. No
primeiro dia de trabalho com ela, ela jogou tudo o que me ensinaram
pela janela. A mulher se recusou a andar na minha frente,
acompanhando meu passo, fazendo uma série interminável de
perguntas como: Então, onde você nasceu? Quantos irmãos você
tem? Qual é o seu passatempo favorito?
Depois de um ano assim, Amelia tornou-se minha amiga, quer eu
quisesse ou não. Nunca nada além disso. Sim, eu, com certeza, levaria
um tiro pela mulher, mas nunca em um milhão de anos dormiria com
ela. E tenho mil por cento de certeza de que ela sente o mesmo.
Ela solta uma risada gutural na garganta.
— Melhor uma caipira do que o que você está vestindo. Você
parece um vigarista da cidade saído de um filme da Hallmark que
precisa aprender uma lição no interior. Quem usa tênis branco em
uma fazenda, Will?
Eu olho para baixo e me encolho com as manchas de sujeira já se
formando.
— Foi um descuido com certeza. Mas é melhor do que se vestir
como Elly May Clampett de A Família Buscapé. Eu nem sei mais
quem você é.
Eu provoco com isso, mas a verdade é que eu gosto desse novo lado
de Amelia. Ela parece mais leve e divertida. A vida no campo combina
com ela assim como a aventura combina comigo. Eu só não percebi o
quanto ela precisava deste lugar, dessas pessoas, até que ela estava aqui
com Noah.
Ela toca a aba do chapéu de palha.
— É basicamente o código de vestimenta da fazenda. Não se
preocupe, você vai aprender.
— Não acho. Estarei fora daqui antes que haja tempo suficiente
para que isso me contagie, assim que você persuadir minha chefe a me
deixar ir. — A grama estala sob nossos pés enquanto caminhamos
para uma ampla clareira atrás de cada uma das estufas onde Amelia e
Noah planejam realizar sua cerimônia e recepção.
Amelia semicerra os olhos para mim.
— Você realmente não quer ficar por aqui depois do casamento?
Esta manhã, a caminho da fazenda, conversei com ela sobre a
conversa que tive com minha chefe. Essa é uma das vantagens de ter
um relacionamento não tradicional com o cliente. Eu posso ser
honesto. Amelia não estava muito animada, no entanto. A única
coisa que pareceu tranquilizá-la foi quando eu disse a ela para me ligar
quando estivesse pronta para uma turnê novamente.
— Eu não posso — eu digo, olhando para ela com um sorriso
genuinamente triste. — Você, de longe, é minha pessoa favorita para
trabalhar – e uma boa amiga – mas você me conhece. Eu preciso de
uma vida acelerada. Estou aqui há poucos dias e já estou arrancando
os cabelos. — Mais ou menos. Ok, na verdade não foi tão ruim assim,
mas não quero admitir isso para Amelia, ou ela vai parecer uma
criança em uma loja de doces.
— Uma vida agitada é realmente o que você precisa? — Ela
pergunta, me surpreendendo com a seriedade de seu tom. Ela tem um
olhar de guia espiritual agora e está me assustando.
Eu me viro para ela e franzo a testa.
— O que isso significa?
— Deixa para lá.
Não confio nem um pouco nesse “deixa para lá.”
— Você pode dizer à minha chefe que está tudo bem em ser
designada para um novo APE?
Ela olha para mim com uma expressão significativamente afiada e
um sorriso tenso.
— Vou considerar isso.
Ou seja, não.
Ela levanta a mão até o topo do chapéu enquanto volta o olhar
para o campo aberto.
— Então, o que você acha? Ótimo lugar para um casamento,
certo?
Eu olho para a extensa grama verde polvilhada com pequenas
flores silvestres brancas e dentes-de-leão que desaparecem em uma
linha de árvores exuberantes sob o céu azul-escuro.
— É lindo.
Mesmo um cínico como eu pode apreciar o quão perfeito é este
local para um casamento.
— Eu também acho. — Amelia pula levemente em seus pés e
então começa a andar na minha frente, descrevendo animadamente o
que está em sua imaginação. — Teremos uma fileira de adoráveis
cadeiras dobráveis de madeira aqui. E uma aqui. É aqui que ficará o
corredor central. — Ela aponta para a esquerda. — Lá estamos
instalando uma pista de dança temporária, e haverá todas essas luzes
sonhadoras e tecidos de veludo caindo sobre ela como um dossel. E
então ali é onde teremos a comida.
Observo silenciosamente enquanto Amelia saltita pelo campo
vazio – alegria explodindo dela como a luz do sol enquanto ela
descreve seu casamento. Como é sentir aquela empolgação
desenfreada em compartilhar sua vida com outra pessoa? Estar cheio
de esperança e antecipação, em vez de pavor e cinismo. Eu a invejo.
— Tudo bem, você está ficando entediado aí? — Ela grita através
da extensão de grama.
Fecho os olhos e finjo roncar, fazendo-a rir.
— Tudo bem, me deixe tirar esta foto e podemos ir — diz ela,
pegando seu telefone.
A única razão pela qual estamos aqui agora é para que ela possa
tirar uma foto da área para seu organizador de casamentos, que está
trabalhando remotamente, e então eu a acompanharei até a cidade,
onde ela passará a tarde com Noah na Loja de Tortas. E então estarei
sozinho pelo resto do dia. Onde esse pensamento costumava causar
pavor, agora sinto uma agitação de antecipação. Eu me pergunto o
que Annie está fazendo?
Depois que Amelia termina de tirar as fotos, fazemos a caminhada
de volta pela fazenda em direção à caminhonete dela. Preenchemos o
silêncio com facilidade, como de costume.
— É uma bela fazenda — eu digo, fingindo que sei alguma coisa
sobre fazendas. — Boa grama.
Felizmente, Amelia compartilha meu tipo de humor sarcástico.
— Não é? Esse é claramente o melhor trator também.
— Sim. O... verde é bom.
— Eu dirigi isso — diz ela com orgulho. — É bem lento.
Eu murmuro evasivamente enquanto nos aproximamos
novamente das estufas cheias de produtos e uma de flores. No meu
conhecimento limitado de fazendas, esta parece enorme. Possui
cultivos ao ar livre além das estufas. Algumas vacas-leiteiras também.
Amelia e eu continuamos a fazer comentários ignorantes sobre a
fazenda até que vejo uma figura a vários metros de distância em uma
das fileiras de enormes flores cor-de-rosa. Meus olhos ficam presos
imediatamente, e eu dou uma olhada dupla. Annie. Seu cabelo loiro
está trançado para o lado, seu rosto protegido por um grande chapéu
de palha. Ela está usando luvas de trabalho e segurando uma tesoura
de jardinagem. Hoje ela está com uma blusa branca justa de manga
curta por baixo do macacão jeans. Juro que a luz do sol atinge essa
mulher de maneira diferente das outras pessoas. Ela se infiltra em sua
pele, a faz brilhar.
Me imagino passando as mãos naquela pele aquecida pelo sol, e o
desejo me atinge como um soco no estômago. Ou melhor, em algum
lugar mais ao sul do que o estômago. Eu fico olhando – e tudo fica
pior quando Annie se inclina para cortar alguns longos caules da
fileira de flores. Meu olhar percorre a curva suave de sua bunda, desce
por suas pernas bronzeadas até suas botas de trabalho marrons. Ela
me parece deliciosamente doce.
— Por que você não está comentando que ela se parece com Elly
May Clampett? — Pergunta Amelia, batendo com o ombro no meu
braço.
— Quem? — Minha voz sai tão seca quanto o deserto. Amelia
solta uma gargalhada, e eu saio do torpor para olhar para ela. — Eu
só estava tentando descobrir qual é o nome daquelas flores.
Ela sorri.
— Uh-huh. Claro. Por que você não pergunta para a mulher que
você está olhando?
Eu mexo meus dedos na frente de seu rosto presunçoso.
— Você pode fazer menos disso, por favor?
Ela pisca os cílios.
— Menos de quê?
— Bancar a cupido. Eu posso sentir isso. Esta cidade se infiltrou
em seu cérebro e a transformou em uma romântica incorrigível e
nojenta.
— E eu posso transformá-lo em um também, se você
simplesmente parar de lutar tanto contra isso. Você não vai querer ser
um pegador para sempre, sabia? E se por acaso você conhecer uma
linda loira dona de uma floricultura e quiser tentar namorar sério...
bem, então...
— Eu sabia que você tinha segundas intenções ao me pedir para
ser o treinador de encontros de Annie. Você ficará muito
desapontada quando isso não funcionar da maneira que você deseja.
Não vou me apaixonar por Annie ou seja lá o que você acha que vai
acontecer.
— Sim... a parte do amor. Isso é exatamente o que eu acho que vai
acontecer.
— Como o inferno. Não acho que fui feito para o amor.
Ela estreita os olhos, ainda não convencida.
— Então por que você disse sim para ajudar Annie?
Por que sim. Porque ela tem um poder sobre mim que eu não
consigo entender. Porque os olhos dela brilham quando ela está
animada e a luz os atinge da maneira certa. Porque a curva do lábio
inferior dela é perfeita. Porque me sinto desesperado para saber que
coisa doida ela vai dizer a seguir sempre que estiver por perto.
— Porque não há absolutamente nada para fazer nesta cidade, e
eu preciso de algo para me manter ocupado quando você não precisar
de m...
Eu paro, meus olhos vagando para seguir a nova cena acontecendo
na minha frente. James aparece do nada e caminha pela fileira de
flores em direção a Annie. Ele está carregando um balde cheio de rosas
cortadas e os músculos de seus braços se projetam de forma
desagradável. Ele sorri para Annie e ela parece muito feliz em vê-lo.
Ele coloca o balde no chão e ela se lança em seus braços para um
grande abraço de urso. O aperto que ele dá em troca parece um pouco
demais.
Amelia paira em minha visão novamente, seguindo meu olhar.
— Alguém está sentindo um pouco de ciúme?
— Nem um pouco.
— Seu maxilar acabou de flexionar.
— Ele faz isso naturalmente porque é muito quadrado.
— Você quer dizer que faz isso naturalmente quando você está
com ciúmes. — Ela arrasta a palavra irritantemente.
Eu suspiro e fecho meus olhos, inclinando meu rosto em direção
ao sol, desejando que ele me queime. Seria melhor do que ter que
suportar Amelia em uma missão. A última vez que isso aconteceu foi
com tacos. Cometi o terrível erro de dizer a ela que não gostava deles
– que por acaso é sua comida favorita – e ela passou a parar em todos
os lugares aclamados de taco durante uma turnê nos Estados Unidos
e fez eu experimentar um de cada restaurante até encontrar um que
eu gostasse.
Infelizmente, eu gosto de tacos agora, mas é irritante.
Amelia ri, e tenho medo de que, se ficarmos aqui por muito mais
tempo, eles ouçam sua gargalhada maligna e nos notem.
Eu abro meus olhos e coloco minhas mãos nos ombros de Amelia,
conduzindo-a na direção do carro – oposto ao caminho de Annie e
James.
— Tudo bem. Hora de ir.
— Por que você está morrendo de ciúmes e prestes a jogar seu
punho na cara de James?
— Porque você está claramente tendo uma insolação e ficando
delirante. — Não gosto da Annie. Não gosto, não gosto, não gosto.
Ou se gosto, é puramente luxúria. Desejo pelo qual não vou agir
porque parece uma situação embaraçosa esperando para acontecer.
Você não pode ter um caso de uma noite com alguém em uma cidade
deste tamanho. Sem mencionar a situação em que Amelia acabou de
me colocar como treinador de encontros de Annie. Todos os sinais
apontam para não!
Amelia é implacável, no entanto.
— Você sabe o que? Agora que penso nisso, Annie e James
formam um lindo casal. Em vez disso, eu deveria pedir a ele para
ajudá-la com a prática em encontros.
Eu ando mais rápido, para chegar à caminhonete mais rápido.
— Ainda bem que você encontrou Noah — digo por cima do
ombro.
— Você não quer dar mais uma olhada nela antes de sair? —
Amelia provoca alegremente.
— Não. Estou bem.
— Oh meu Deus, Will, eles acabaram de se beijar! Com tanta baba
que posso ver daqui.
Reviro os olhos e continuo andando. Mas quando chego à
caminhonete de Amelia (ela se recusa a andar no SUV fornecido pela
empresa), olho brevemente por cima do ombro.
Annie está sozinha de novo entre as flores e, por algum motivo,
isso me faz dar um suspiro de alívio.
Annie
—
Trinta minutos depois ouço passos. Eu olho para cima em tempo
suficiente para ver Annie passar por mim – poderosa saindo pela
porta da frente.
— Vamos — diz ela rapidamente. — Já paguei lá atrás.
Mas que raio?
Eu a sigo, acelerando meus passos para alcançá-la.
— Annie! Espera aí. O que aconteceu?
Ela não responde. Ela abre a porta da caminhonete e pula para
dentro, batendo a porta atrás de si.
Eu praticamente corro para o lado do motorista e entro. Os piores
cenários estão passando pela minha cabeça. E então, quando me viro
para olhá-la totalmente, e vejo sua expressão emburrada, fúria e a
raiva me dominam.
— O que aquele idiota fez com você? Ele te machucou? Ele foi
inapropriado? Eu vou matá-lo! — Eu digo, colocando minha mão no
trinco da porta e me preparando para abri-la. Annie me puxa pela
camisa antes que eu consiga.
— Pare. Grady não fez nada de errado. Ele foi tão legal, e eu vou
lhe dar flores para a festa de aniversário de princesa de sua filha de seis
anos no próximo mês.
Eu relaxo apenas um pouco porque agora Annie tem uma lágrima
escorrendo pelo rosto, e eu sou inadvertidamente a causa disso. Eu a
pressionei para fazer isso esta noite. Eu sou o idiota.
— Então por que você saiu de lá?
Pela primeira vez, seus olhos azuis enevoados deslizam para mim e
ela sorri tristemente.
— Eu precisava chegar à caminhonete para poder chorar.
— Por que você odiou a tatuagem?
Seu sorriso se alarga com grandes lágrimas se acumulando em seus
olhos.
— Não. Porque eu amei muito isso – e estou muito orgulhosa de
mim mesma por ter feito. Obrigada por fazer isso acontecer, Will.
Solto um suspiro quando a tensão em meus ombros diminui.
Então isso não foi uma coisa ruim para Annie, afinal? Na verdade, foi
bom. Quero mergulhar mais fundo nessa lógica, mas decido que não
é seguro. Posso chegar a conclusões que não deveria no final.
Eu coloco minha mão contra a mandíbula de Annie e rio,
enxugando a lágrima de sua bochecha.
— Eu teria cometido um assassinato por você agora mesmo.
— Eu aprecio isso — diz ela com uma risada também.
Nós dois estamos rindo e ela está chorando e eu nunca
experimentei esse tipo de emoção com mais ninguém. É tão frágil e
vulnerável. Me sinto culpado por ser eu quem vivencie isso com ela.
E, no entanto, me sinto ávido por isso ao mesmo tempo.
— Posso ver agora? — Eu pergunto, baixando meu olhar para o
pulso dela. Mas não há nada lá.
Ela acena com a cabeça e afasta-se um pouco para mim em seu
assento, juntando todo o seu cabelo comprido e puxando-o sobre um
ombro. E então minha respiração falha quando ela puxa a gola de sua
camisa para baixo, revelando seu lindo ombro nu.
Bem... seu ombro nu tatuado com a pequena tatuagem mais fofa
que eu já vi.
— Eu fiz um livro — diz ela, soando como se tivesse acabado de
ganhar um milhão de dólares. — Eu ia tatuar as flores sobre as quais
conversamos, mas então percebi que as flores sempre foram o sonho
da minha mãe – não especialmente o meu, embora seguir tenha
funcionado muito bem para mim. — Ela faz uma pausa e eu admiro
as linhas finas de um livro aberto com as páginas esvoaçantes como se
o vento as levasse. — Eu queria algo especial para mim. Só para mim.
Eu sorrio ao ver Annie com o ombro virado para mim – o perfil
recortado pelo poste de luz do lado de fora da caminhonete. E sua
boca macia se curvando em um sorriso gentil. Eu nunca vou esquecer
deste momento. E antes que eu possa me conter, me inclino para
frente e beijo a pele ao lado de sua tatuagem. Annie respira fundo e
eu memorizo a sensação de sua pele contra meus lábios, tão suave e
ardente quanto uma dose de uísque caro. Eu quero beijar cada
centímetro quadrado dela. Eu quero lamber a base de seu ombro. Eu
quero beijar meu caminho até o lado de sua garganta até encontrar
sua boca, e lá quero me demorar, acariciando tão completamente que
nossos lábios arderiam depois.
Se fosse do meu jeito, eu puxaria essa mulher calorosa, doce e
compassiva para o meu colo e mostraria a ela como estou maravilhado
com ela. Eu adoraria o seu corpo.
Em vez disso, eu me afasto e gentilmente puxo sua camisa de volta
sobre o ombro.
— Está perfeito, Annie.
Will
Eu estou na feirinha hoje e não estou feliz com isso por dois motivos.
Primeiro, há tantas pessoas. Esses tipos de lugares – locais ao ar livre
com um número infinito de entradas e saídas – são meu pesadelo.
Ingressos não são necessários, então não tenho como verificar todos
os presentes para ter certeza de que nenhum dos perseguidores de
Amelia estará aqui. Mas eu tenho seus rostos memorizados e
pesquiso em todos os lugares que vamos em busca de sinais deles. Ela
está usando um chapéu e óculos escuros, assim como Noah, mas os
fãs obsessivos ainda saberão que é ela. Na verdade, há um homem
com uma mochila a 2,5 metros à direita dela. Ele a notou três vezes
agora. Mesmo que ninguém esteja aqui para prejudicá-la, esses locais
lotados podem se transformar em uma multidão de fãs em um
segundo se não tomarmos cuidado.
Eu não gosto do cara com a mochila.
A segunda razão pela qual não quero estar aqui é porque Annie
está trabalhando em um estande para sua floricultura. É toda a razão
pela qual Amelia quis sair e apoiá-la, e aquela mulher é a distração de
que não preciso hoje. E quero dizer isso no sentido literal atual e no
sentido metafórico de longo prazo.
Estou usando toda a minha força de vontade para me concentrar
no meu trabalho agora, e é uma tortura. Assim como a cada segundo
que Annie está perto de mim ultimamente. Eu só a vi uma vez desde
que ela fez a tatuagem. Amelia e eu estávamos na cidade e, enquanto
ela visitava Noah n’A Loja de Tortas, entrei na floricultura ao lado
para ver Annie. Seus olhos brilharam quando ela percebeu que era eu,
e agora tenho medo de repetir aquela imagem em loop pelo resto da
minha vida.
Estou tentando colocá-la na mesma categoria de todas as outras
mulheres que passaram pela minha vida. Mas não está funcionando.
Ela está rapidamente se tornando especial para mim, como algo raro
e precioso que você deseja colocar em um lugar seguro para nunca
perdê-lo.
É por isso que não posso olhar para ela hoje. Meus olhos precisam
ficar focados e alertas ao meu redor.
E então Annie ri de sua cabine, e como um maldito canto de sereia
na noite, eu viro à direita para ela. Meu olhar se demora, e eu não
entendo como apenas a visão de alguém pode ser tão boa. Deus, ela é
linda. Sem macacão hoje – o que é estranhamente decepcionante –
mas em vez disso ela está vestindo um par de jeans desgastados e uma
camiseta branca com o logotipo da loja nela. Seu cabelo está preso em
um rabo de cavalo, e algumas mechas caem e grudam em seu pescoço
por causa da umidade aqui fora.
Ela parece tão boa.
E soa bem.
E pela primeira vez em muito tempo, gostaria de não estar preso
aqui fazendo meu trabalho. Eu quero estar lá com ela. Quero saber
como foi o dia dela e se ela está se divertindo. Como a tatuagem dela
está cicatrizando e se ela se lembrou de passar loção nela hoje. Eu
quero tocar meus lábios em seu pescoço brilhante e provar o suor de
sua pele. Mas não posso, não só porque não é o tipo de
relacionamento que temos, mas porque estou de plantão agora.
Mas antes de desviar o olhar e me comprometer mentalmente a
não olhar para ela novamente pelo resto da tarde, pego meu telefone
e tiro uma foto dela rindo atrás de sua cabine. Estou juntando todas
essas fotos e vou enviar para ela quando sair da cidade porque a
mulher merece ter fotos bonitas de si mesma. Vou apagá-las do meu
telefone assim que enviá-las para ela. Eu vou. Eu realmente vou. Não
haveria razão para eu mantê-las depois de partir, porque vou seguir
em frente e voltar à vida normal. Não vou me permitir sentir falta de
Annie. Eu não vou.
Eu coloco meu telefone no bolso e me viro para assistir Amelia,
e...
Merda.
Eu a perdi de vista. Ela estava com Noah perto da barraca de
produtos e agora ela se foi, e Noah está com Annie. Cadê o cara da
mochila? Ele também se foi. A adrenalina me atinge enquanto meus
olhos examinam a multidão por trás dos meus óculos de sol. Eu
mantenho meu rosto neutro e tento projetar um comportamento
relaxado, embora por dentro eu esteja correndo em círculos e
pensando nos piores cenários. Mas a última coisa que preciso é que
alguém nos observando saiba que a perdi de vista.
De repente, recebo um tapa nas costas. Eu me viro e encontro
Amelia. Estou dividido entre suspirar de alívio e repreendê-la por ter
sumido de vista.
— Por que você está tão longe de nós hoje? — Ela pergunta com
as mãos nos quadris.
Eu estabilizo minha respiração e olho em volta novamente.
Sempre observando os perímetros. Eu errei agora mesmo perdendo a
cabeça por um segundo, e não vou deixar isso acontecer novamente.
— Você poderia, por favor, ficar onde eu possa vê-la o tempo
todo?
As sobrancelhas de Amelia se levantam quando ela detecta meu
tom curto.
— Claro. Mas sabe? Seria muito mais fácil me acompanhar se você
simplesmente ficasse próximo da gente.
Eu evito ranger os dentes.
— Não posso efetivamente fazer meu trabalho dessa maneira.
— Por que você está falando comigo como um robô?
— Porque — eu digo olhando ao redor da área novamente —,
estou trabalhando. Você nem deveria estar falando comigo agora.
Você vai chamar a atenção. — Eu tenho dois modos. Brincalhão e
sério. E apesar do fato de que eu amo socializar, amo flertar e adoraria
absolutamente cada segundo de passar o tempo no estande de Annie
com todos, estou trabalhando e, portanto, totalmente
comprometido com a seriedade.
— Estamos em Rome, Kentucky, Will. A ameaça é praticamente
zero.
— Praticamente sendo a palavra-chave aqui. Sua gerência não
teria me contratado se pensasse que a ameaça era zero.
Amelia suspira.
— Apenas venha ficar um minuto conosco. Eu me sinto estranha
por você ficar tão longe quando estamos todos lá.
— Por que diabos você se sentiria estranha? É assim que sempre
operamos em lugares como este.
— Sim, mas... as coisas são diferentes agora.
Ah... agora entendo.
Olho nitidamente para Amelia e depois para longe.
— Estou preocupado com você, Amelia. Você parece ter a ilusão
de que de repente sou uma pessoa diferente desde que cheguei a
Rome. Mas ainda sou muito eu – um APE fazendo seu trabalho até
ser liberado e enviado para um novo. Então, por favor, volte para lá e
saia com seu noivo e não desapareça de novo.
— Você está mal-humorado hoje.
Sim, estou mal-humorado hoje. Estou mal-humorado porque
errei no meu trabalho pela primeira vez em... desde sempre. E embora
nada tenha acontecido, estou bem ciente de tudo o que poderia ter
acontecido. A pior parte é que estou tentando o máximo que posso
para pegar essa raiva e projetá-la em Annie de uma forma que vai me
deixar com repulsa pela ideia e me fará querer me afastar. Mas eu não
posso. Em vez disso, estou apenas mais mal-humorado porque tenho
que me concentrar ainda mais agora e não ir até lá, puxá-la e beijar sua
boca rosada, parecendo rosa-melancia.
Uma grande parte de mim teme que seja assim daqui para frente.
Vou deixar Rome e minha atenção estará dividida entre onde estou e
me perguntando o que diabos Annie está fazendo? Isso não deveria
acontecer. Eu não deveria sentir essas coisas. Eu nunca senti antes.
Inutilmente, as palavras de meu irmão voam pela minha cabeça:
“Sou incapaz de fazer qualquer outra coisa”. É disso que ele estava
falando? Esse magnetismo intenso que meu corpo tem pelo dela?
Certamente é apenas desejo, e se finalmente fizéssemos sexo, ele iria
embora. Certo?
Mas e se não for? E se eu repreendesse meu irmão exatamente pelo
que estou começando a sentir por Annie?
— Além disso, esta é provavelmente a última vez que você vai ver
Annie por alguns dias — Amelia acrescenta como se estivesse tirando
uma carta da manga e jogando-a sobre a mesa. Ela tem uma expressão
presunçosa quando olho para ela.
— Por quê?
— Vamos para Los Angeles amanhã por três dias porque tenho
algumas entrevistas na televisão marcadas. Eu ia te contar no
caminho de volta, mas achei que deveria contar agora por que...
Somos interrompidos por nada mais nada menos do que a
aproximação do mochileiro. Eu imediatamente contorno Amelia,
interceptando sua abordagem.
— Posso ajudar?
Ele tem olhos ansiosos, indo e vindo entre Amelia atrás de mim e
meus óculos reflexivos. Aperto minha mandíbula e endireito meus
ombros, lendo sua linguagem corporal e mapeando mentalmente
oito maneiras diferentes de derrubá-lo, se necessário.
— D-desculpe incomodá-los, mas eu queria saber se eu poderia
tirar uma foto...
— Ela não está disponível para fotos hoje — eu digo,
interrompendo-o com finalidade.
Ele sorri timidamente.
— Não... desculpe. Eu não quis dizer com ela. Eu quis dizer com
você. Eu vi o artigo do BuzzFeed e sou um grande fã de... bem, seu
rosto. — Ele fica vermelho.
Atrás de mim ouço Amelia sufocar uma risada.
Bem, isso é inesperado.
— Obrigado, estou lisonjeado, mas tenho que recusar. Tenha um
bom dia.
— Eu entendo. — Ele se vira para ir embora e, em seguida, gira
brevemente. — Posso apenas tirar uma foto à distância?
Amelia espia ao meu redor.
— Sim, mas por favor, o fotografe apenas pela esquerda porque
esse é o lado bom dele. Tem que ter as tatuagens da foto.
Eu viro um olhar lento para Amelia. Ela ri. O cara aproveita esse
momento para tirar uma foto e sai correndo.
— Se eu não tivesse a tarefa de protegê-la agora...
Amelia me dá um sorriso que é o equivalente ao pequeno emoji
amarelo mostrando todos os dentes.
— Agora que a principal ameaça foi neutralizada, parece que você
pode dizer oi para Annie.
Eu inalo em uma respiração longa e lenta pelo nariz e viro meu
corpo para a multidão novamente.
— Você tem que parar com isso de bancar a cupido, Amelia. Você
só vai se decepcionar. Além disso — eu digo, olhando das entradas
oeste para sul — três dias não é nada. Definitivamente não é o
suficiente para me fazer comprometer sua segurança por falar com ela
antes de irmos.
Mas é o suficiente para eu sair furtivamente da Pousada de Mabel
depois de escurecer naquela noite e dirigir até a casa de Annie –
deixando minha caminhonete em uma rua paralela e depois cortando
gramados para chegar à janela dela.
Annie
A luz fraca atinge a parte de trás das minhas pálpebras e eu solto uma
inspiração rápida. Dormi que nem pedra. Que nem morto. Que
nem... eu não estou sozinho.
Merda, merda, merda.
Abro meus olhos para a visão de bananas e cabelos loiros. Annie
está aninhada perto de mim, a perna sobre a minha, a cabeça na curva
do meu ombro nu e a mão espalmada no meu peito. Ela está
respirando profundamente – totalmente adormecida. Devemos ter
caído no sono juntos depois de... Droga, eu nem sei como chamar a
noite passada. Definitivamente não foi apenas um beijo. Foi
devastador.
Isto não é bom.
E por isso não ser bom, quero dizer que toda a situação não é boa.
Estou surtando. Há muita coisa acontecendo dentro de mim com a
qual não sei o que fazer. Estou sentindo coisas por Annie que nem
sabia que era capaz de sentir. Normalmente, nessa altura, estou
entediado em um relacionamento. Isso não é nem mesmo um
relacionamento com Annie, e há uma batalha dentro de mim devido
a necessidade de ser mais para ela. Estar sempre por perto quando ela
precisar de mim. Para ser o tipo de homem que nunca me vi sendo
modelado enquanto crescia.
E ainda assim: eu posso confiar nisso? Posso confiar em me
entregar a ela? Será que ela iria querer um homem como eu com tanta
bagagem e decepções para compartilhar uma vida dentro de sua cerca
branca? Eu me sinto o maior hipócrita vivo por desejar mais com
Annie quando acabei de dizer ao meu irmão para terminar tudo com
a mulher que ele ama. Mas eu não percebi...
Talvez haja esperança para nós.
Ou talvez eu devesse dar um passo para trás e pensar sobre isso sem
essa mulher linda deitada ao meu lado.
Foi uma má ideia voltar a Rome. Deixar Annie me tocar. Me
beijar. Me virar do avesso. Foi muito mais fácil quando pensava que
não gostava de ter um relacionamento e que não queria correr o risco
de acabar em uma posição semelhante à dos meus pais. Por que que
outra opção existe para alguém que suportou dezoito anos de um
casamento cheio de ódio entre seus pais? Quando infidelidade e
abuso emocional eram tudo o que eu via? Não havia ternura. Não
havia paciência. Havia insultos e reprimendas severas e eu me
perguntando se aquela noite seria a noite em que toda a gritaria deles
terminaria com meu pai batendo na minha mãe ou ela nos deixando
para sempre para dormir com outro cara.
Mas nenhuma dessas coisas aconteceu. Ethan e eu estávamos
sempre esperando à beira do precipício por algo terrível – nos
perguntando quando isso aconteceria. Nunca aconteceu – e acho
que sou grato por isso. Em vez disso, o casamento deles fracassou de
uma forma nada esperada que me levou a acreditar que talvez o que
eles tiveram fosse apenas normal. Eles se divorciaram depois que
Ethan e eu saímos de casa e agimos como se todo o inferno que eles
nos proporcionaram nunca tivesse acontecido. Como se eu nunca
tivesse me tornado um homem que evita relacionamentos reais a todo
custo, porque tudo o que conheci foram relações dolorosas. Um
homem que, de forma alguma, confia em si mesmo com uma mulher
tão boa, esperançosa e adorável quanto Annie.
Até eu a conhecer e tomá-la em meus braços, nunca pensei que
pudesse ser capaz de tanta ternura. E não estou falando de sexo. Estou
falando de conversas ternas. Palavras ternas. Uma terna compreensão.
Mesmo a maneira como ela respira contra o meu pescoço enquanto
dorme é terna – e eu quero isso. Tudo isso. Só não tenho certeza se é
sustentável ou se quero descobrir que não é. Desde que percebi que
poderia subir naquela árvore de magnólia no meu quintal, tenho sido
muito bom em me proteger e evitar qualquer coisa que possa me
causar mais dor.
A mulher que estou segurando tem o potencial de causar mais dor
do que qualquer outra pessoa. E eu com certeza posso fazer o mesmo
com ela. Não tenho ideia de para onde ir a partir daqui.
Por enquanto, preciso me mexer. O sol ainda é suave e quente,
apenas começando a nascer, o que significa que é por volta do meu
horário habitual de acordar cedo. Se eu apressar, ainda posso sair
daqui sem que ninguém perceba. Talvez antes mesmo de Annie
perceber.
Mas quando olho para baixo, tentando avaliar a melhor maneira
de me desvencilhar dela, em vez de me afastar, observo meus dedos se
curvarem com mais força ao redor de seu corpo. Percebo tudo em
Annie que não deveria. Como a forma como os cílios dela se curvam
nas pontas e são loiros no início. Como ela tem muitas pequenas
sardas na ponta do nariz. E percebo a forma como ela encaixa em mim
perfeitamente. Sinceramente, não pensei que Annie fosse uma pessoa
que se aconchega. "Eu sempre mantenho minhas mãos para mim
mesma..., Mas com você..." Suas palavras ecoam alto na minha cabeça.
Ela está completamente em cima de mim, jogando seu peso em
mim da maneira mais incrivelmente afetuosa. Eu mantenho meus
dedos leves contra seu lado, embora eu queira enrolá-los no adorável
tecido estampado de banana de seu pijama e, em seguida, começar a
retirá-los um por um. Quero girá-la e acordá-la com beijos no pescoço
e na barriga. Eu quero beijá-la e não parar.
Hora de levantar, Will. Vaza! E ficar longe até que eu possa
pensar com clareza novamente. E eu absolutamente não posso ser
aquele a tirar a virgindade dela. Não apenas porque complicaria as
coisas com Amelia e meu trabalho com ela, mas com certeza porque
estarei fora daqui até o final do mês (assim que eu conseguir que
Amelia concorde com isso) e depois irei para Washington, D.C. Vai
ser um trabalho de alto estresse, alto risco e ritmo acelerado. Meu
favorito. Não há tempo para criar raízes ou cultivar relacionamentos.
Com cuidado, deslizo me afastando de Annie e simultaneamente
puxo o travesseiro para o lugar onde meu ombro estava segurando sua
cabeça erguida. Ela não se move ou se mexe. Por mais que ela odiasse
ouvir isso, ela parece um anjo adormecido com seus lábios rosados
relaxados formando um beicinho e seus cílios curvando contra sua
bochecha. Seu cabelo está meio preso, meio fora do coque que ela
estava usando ontem à noite, e de alguma forma isso torna a visão
ainda mais atraente.
Eu me levanto da cama, movendo um pouco meus ombros em
alguns círculos para aliviar um pouco da tensão. O sol está mais alto
agora, e isso me estimula a sair pela janela e voltar para o meu SUV na
rua antes que alguém perceba. Quando chego à janela, levanto a
vidraça o mais silenciosamente possível, feliz por não ranger ou
arranhar. Deixo cair minha perna para o lado exatamente como entrei
e paro apenas o tempo suficiente para olhar para Annie mais uma vez.
Prendo a respiração quando percebo que ela está de frente para
mim agora, olhos abertos, sorrindo suavemente. Ela não diz nada,
nem eu. Seus olhos azuis brilham ao sol da manhã, e as imagens mais
domésticas passam pela minha cabeça: dela servindo uma tigela de
cereal, eu enchendo com leite e depois ela sentada no meu colo
enquanto comemos juntos na mesa – porque eu sou um filho da puta
pegajoso assim. Isso é tudo errado. Esse não é o tipo de fantasia que
eu deveria ter sobre ela. Deveria ser tudo sexual. Tudo primitivo e
fugaz. Em vez disso, estou esfregando meu peito e dizendo a mim
mesmo para dar o fora daqui antes que acidentalmente a convide para
tomar um café comigo na varanda enquanto o sol nasce.
Dou um último sorriso para Annie e depois saio por sua janela, a
fechando atrás de mim.
Ainda não posso voltar para o meu quarto até ter certeza de que
Mabel se foi. Ela estará rondando a recepção esta manhã esperando
para pegar Terry preguiçosamente jogando o jornal no gramado em
vez de na varanda da frente. Então faço um desvio até a lanchonete
para tomar um café antes de voltar, esperando até que Mabel saia para
sua caminhada das nove horas pela cidade.
Quando chego perto da lanchonete, estaciono no estacionamento
comunitário e começo minha caminhada pela cidade em direção a ela.
Meus olhos estão abertos e estou pronto para alguém aparecer e
tentar me vender algo do qual não tenho interesse, mas, felizmente,
está quieto. Não há narizes encostados nas janelas, nem olhos
espiando pelos cantos, ninguém realmente à vista.
A lanchonete está vazia, exceto por Noah, que está sentado no bar.
Ele vem aqui quase todas as manhãs para tomar café antes de ir até A
Loja das Tortas e fazer ainda mais café. Sento na segunda banqueta
depois dele assim que Jeanine irrompe pela porta, corre de volta para
trás do bar, então joga o avental sobre a cabeça com um sorriso
gigantesco.
— Bom dia, queridos!
Nós dois acenamos para Jeanine, e fazer o mesmo que Noah
parece estranho.
— Estão tendo um bom dia? — Pergunta Jeanine.
Nós dois resmungamos uma resposta.
Jeanine pega seu bloco de notas e caneta e os enfia no bolso.
— Certo. Ok, então o de sempre para Noah: café, preto como
carvão. E quanto a você, Will? — Ela levanta as sobrancelhas para
mim e joga seu longo cabelo ruivo sobre o ombro, esperando minha
resposta.
Eu olho para Noah e de volta para Jeanine, desejando não ter que
fazer meu pedido com ele ouvindo.
— Uh, café também.
— Preto?
— Sim. — Eu me inclino ligeiramente para a frente. — Com
creme e açúcar.
Percebo o sorriso de Noah.
— Cale a boca — eu digo a ele e ele levanta as mãos.
— Eu não disse nada.
— Seu sorriso disse sim. É sexista da sua parte pensar que não
posso ser viril e também gostar de creme e açúcar.
Noah vira os olhos para mim, ainda mantendo um olhar de
completo desinteresse.
— Não posso trabalhar em uma loja de tortas, usar avental todos
os dias da minha vida e também ser machista.
— Estou começando a achar que é tudo fachada. Você e seu café
preto como carvão são machistas para caralho.
Jeanine ri e se vira para a cafeteira para servir nossas bebidas.
— Vocês dois não são apenas raios de sol esta manhã? — Jeanine
passa primeiro o café preto de Noah para ele e depois o meu para
mim. — Noah está sempre mal-humorado, então isso não é novidade
— diz ela, se inclinando sobre o balcão para ficar cara a cara comigo.
— Mas você sempre tem um sorriso para mim. Cadê meu sorriso,
Will?
Ela não está dando em cima de mim – eu acho. É apenas Jeanine.
Ela é naturalmente paqueradora, e as pessoas naturalmente
paqueradoras geralmente são atraídas por mim. Provavelmente
porque eu sou uma delas. Aprendi desde cedo: pessoas paqueradoras
são amplamente amadas, e meu negócio é conseguir o amor de todos
que posso desde o dia em que fui para a escola e disse a Teressa
Howard que ela ficava bonita com sua camiseta de Lisa Frank, e ela
me abraçou. Fazia semanas que eu não era abraçado, e ainda me
lembro de me sentir tão bem.
Eu tomo um gole do meu café e sorrio com a caneca na boca – não
estou me sentindo assim hoje.
— Desculpe, Jeanine. Noite longa.
Seus olhos brilham e ela levanta uma sobrancelha antes de
levantar-se e dar um assobio suave.
— E quem é a sortuda que você trocou por um café da manhã
solo? Alguém que eu conheça? — Eu não perco o sorriso fácil
calculado. Ela está pescando para ver se é Annie porque almoçamos
juntos aqui na lanchonete.
— Eu não... — Eu me contenho, lembrando que o irmão da moça
em questão está sentado a apenas uma banqueta de distância de mim
– e ele também é o noivo da minha chefe. Eu preciso ter cuidado. —
Não foi uma noite tão longa.
Jeanine ri mais alto desta vez.
— Eu entendi. Agora o mau humor faz mais sentido. — Irritante
que ela esteja insinuando que estou de mau humor por não ter feito
sexo com Annie. Eu não poderia me importar menos com isso, e
estou feliz que Annie foi honesta e disse que queria parar. Estou mal-
humorado porque minha noite com ela foi melhor do que qualquer
coisa que já experimentei antes, e não sei o que fazer sobre isso. —
Tudo bem, bem, vou deixar vocês dois sozinhos para o seu tempo de
homem. Gritem se precisarem de mim, queridos. — Jeanine
desaparece na cozinha.
Noah e eu ficamos sentados em silêncio por vários minutos, e sou
grato por isso. Isso me dá tempo para considerar o que vou fazer sobre
Annie e o domínio magnético que ela parece ter sobre mim. Parte de
mim insiste que preciso desistir de me oferecer em ajudá-la. Depois
da noite passada – e depois de adormecer ao lado dela – fica claro que
preciso impor meus limites se quiser permanecer no caminho que
tracei para mim.
— Então... — A voz de Noah me puxa de meus pensamentos. —
Você passou a noite com Annie, hein?
Eu engasgo com meu café. Um engasgo total juntando tosse,
olhos lacrimejando e de falta de ar.
Noah (o idiota) ri.
— Se acalme. Eu não queria que isso saísse como uma ameaça. —
Ele é, talvez, a única pessoa no mundo que pode me fazer sentir
ameaçado. Eu encarei algumas pessoas bastante aterrorizantes, mas
Noah tem uma confiança silenciosa sobre ele que me diz que ele
poderia tornar minha vida um inferno se quisesse.
Tomo outro gole de café para tentar aliviar a tosse e pressiono as
costas da mão na boca. Depois que minha vida parou de passar diante
de meus olhos, olho para Noah.
— De que outra forma eu deveria responder a essa pergunta?
Ele não diz nada, apenas sorri enquanto toma seu café. "Não é
uma ameaça", minha bunda. Ele sabia o que estava fazendo quando
disse isso, e não vou ousar mentir para ele ou tentar convencê-lo de
que não passei a noite com Annie. Mas pelo menos posso ser
honestamente inocente na frente dele. Uma novidade para mim.
— Eu não dormi com ela, só para você saber. — Eu paro. — Bem...
nós dormimos juntos, mas eu não...
Noah levanta a mão, me interrompendo.
— Eu não preciso saber detalhes. Não é da minha conta.
Eu o olho com ceticismo.
— Não é?
Pelo que vi, parece que tudo nesta cidade é da conta de todos.
Noah sorri por baixo de sua barba – e eu trocaria todas as minhas
tatuagens pela habilidade de deixar crescer uma barba como a daquele
homem. Não é justo. Eu sou o ex-militar que virou guarda-costas –
eu deveria ter a barba máscula. Os únicos pelos faciais que posso
deixar crescer de forma excelente são os cílios. Eles são longos e
grossos, e as mulheres sempre reparam neles. Uma pena. Repare nos
meus músculos, repare na minha mandíbula quadrada, repare na
minha bunda pelo amor de Deus – mas, pelo amor de Deus, não
comente sobre o comprimento e o volume dos meus cílios.
— Annie é uma mulher adulta. Não preciso ficar de olho nela ou
monitorar quem ela namora ou não. — Noah vira seu olhar casual
para mim e inclina um ombro. Ele toma um gole de café e, em
seguida, coloca a caneca na mesa e olha para ela. Eu vi ele e Amelia
juntos e é difícil não torcer por eles. Ter inveja descontrolada deles.
Eles são bons um para o outro.
Eu seria bom para Annie?
Instintivamente, sei que ela seria boa para mim. Mas eu me
preocupo em arrastá-la para baixo. Eu não saberia me comunicar bem
e sentiria vontade de sair quando as coisas ficassem difíceis – porque
sou autoconsciente o suficiente para saber que evito todo confronto
e desconforto como se fossem doenças. É por isso que não liguei de
volta para meu irmão. É por isso que não vou a casa dos meus pais há
anos. É por isso que escolhi uma carreira que me permite ser um
nômade despreocupado, onde posso passar de mulher em mulher e
de lugar em lugar, e nunca me apegar o suficiente para ter que lidar
com a vida real.
Jeanine desliza pela porta de vaivém da cozinha e coloca meus ovos
na minha frente com um sorriso e uma piscadela. Só depois que ela
cruza a lanchonete para anotar o pedido de outra mesa é que
pergunto a Noah:
— Como você sabia? Que eu passei a noite com Annie, quero
dizer.
— Sua caminhonete.
— Você mora do outro lado da cidade.
— Não fui eu que vi sua caminhonete. — Ele olha para mim e
sorri, me lembrando que a curiosidade desta cidade é mais profunda
do que posso imaginar. — James a viu quando foi fazer as entregas
esta manhã. Considerando as fofocas na cidade de que vocês
começaram a namorar e depois viram sua caminhonete na estrada da
casa das minhas irmãs... não é preciso ser um gênio para somar dois
mais dois.
Não tenho certeza se isso é bom ou ruim. Annie confirmou que é
virgem ontem à noite – e não tenho certeza de quantas outras pessoas
em sua vida sabem disso ou se isso importa para ela no final do dia.
Mas não sou o tipo de cara que você ouve que está dormindo no
quarto de uma mulher e assume que nada aconteceu. Então,
novamente, ela queria mudar sua reputação nesta cidade.
— Você acha que James contou a mais alguém?
Noah abafa uma risada e me faz uma cara que diz "seu pobre
idiota".
— Não se deixe enganar pelo fazendeiro. James é tão fofoqueiro
quanto Mabel é. — Ele faz uma pausa e inclina a cabeça para o lado e
depois para trás como se estivesse lembrando-se de algo. — Além
disso, há o fato de que Tony, nosso xerife, viu você saindo pela janela
do quarto de Annie esta manhã.
— Merda.
— Sim.
Falando em James, um minuto depois ele entra na lanchonete,
assobiando. James tem o sorriso mais largo que já vi em alguém. Não
há nenhum motivo oculto para isso – é como se ele estivesse
genuinamente feliz o tempo todo. Estranho.
— Bom dia, Jeanine! — Ele grita da porta. Percebo que ele está
carregando uma prancheta na mão, mas ele vai até o outro lado do
bar e a deixa perto da caixa registradora antes de sentar-se no
banquinho ao lado de Noah. Ele dá um tapa nas costas de Noah. —
Bom dia, raio de sol. Sonhou comigo ontem à noite?
— Uh-huh — Noah diz e então toma outro gole de seu café. —
Sonhei que te atropelei com minha caminhonete.
— Bem, é um prazer, James — diz Jeanine, vindo anotar seu
pedido. — Eu nunca vejo você aqui de manhã.
— Eu tinha alguns negócios na cidade para cuidar.
Noah olha para ele com uma carranca.
— Que negócio? Você não tem entrega para minha loja até
amanhã.
— Você vai ver — diz ele com um sorriso enervante. Talvez eu
esteja pensando muito sobre isso, mas combinado com a disposição
anormalmente tranquila da cidade esta manhã, sinto uma pontada de
desconforto. — Vou querer o prato do dia, Jeanine, obrigado. —
James se inclina ao redor de Noah para olhar para mim. — Vocês dois
estão tendo uma conversa estimulante?
— Se você contar com Noah me ameaçando sutilmente, então,
sim, tem sido ótima.
James ri. Noah balança a cabeça olhando para frente.
— Não foi uma ameaça.
— Aposto que foi — diz James. — Se era sobre Annie e a festa do
pijama que tiveram ontem à noite, era absolutamente uma ameaça. E
espere até que as irmãs fiquem sabendo disso.
— Nada aconteceu! — Eu digo, de repente sentindo que preciso
de um advogado presente.
— Pare de tremer. — Noah inclina sua caneca bem alto, engolindo
o último gole de café e então virando-se para mim em seu banquinho.
— Eu gosto de você, Will. Eu sempre gostei. Eu sei que devo ser o
irmão mais velho protetor que avisa o cara com a reputação ruim para
ficar bem longe de sua irmãzinha, mas não é assim que eu trabalho.
Juro que não estou tentando ameaçá-lo, porque, como James disse,
minhas irmãs farão isso sem a minha interferência. Mas, mais do que
isso, confio que minhas irmãs saibam do que precisam melhor do que
eu. E o fato é que o que quer que esteja acontecendo entre você e
Annie, eu apoio.
— Você apoia?
— Sim. — Noah levanta-se e encara-me. — Para ser sincero, estou
mais preocupado com você do que com Annie.
— Por que isso? — Eu digo, embora eu concorde plenamente com
ele.
— Porque eu posso garantir que você nunca conheceu ninguém
como ela — Noah diz ameaçadoramente e então se vira para sair, faz
uma pausa, e então vai para o lado do bar para olhar o que quer que
James tenha deixado. Eu ouço seu grunhido em formato de uma
risada antes que ele me dê um olhar, balança a cabeça e sai sem trocar
nenhuma outra palavra.
— Se vale de algo — James diz enquanto dá uma mordida em seus
ovos —, eu planejo ameaçar você. — Ele joga seu sorriso para mim e,
de repente, não parece mais tão ensolarado. Tem o mesmo brilho que
uma espada tem. — Machuque ela e eu vou matar você e enterrar seu
corpo, utilizando-o como fertilizante para minhas plantas.
Eu aceno uma vez, lentamente.
— Anotado.
Jogo uma nota de dez dólares no balcão e finalmente vou ver o que
está na prancheta. Eu xingo baixinho.
— Você quem fez isso?
Ele ri, nem mesmo olhando para mim enquanto continua a cavar
seus ovos.
— Não. Isso seria coisa de Harriet.
— Quando todos eles tiveram tempo para fazer isso?
— Cerca de trinta minutos atrás, na reunião improvisada de
empresários da cidade. Tem um em cada estabelecimento.
— Claro que tem. — E isso explicaria por que hoje parece uma
cidade fantasma. Todos eles reuniram-se para fazer uma petição para
manter eu e Annie separados. Na parte superior, em negrito, lê-se:
Nós, o povo da cidade, exigimos que Annie Walker e Will
Griffin desistam de terem um novo relacionamento, alegando
que Annie Walker é uma querida e Will Griffin é um... anti-
querido.
Abaixo disso, há uma bela campanha de difamação que lista todos
os motivos pelos quais não sou de confiança (vê-se a cópia do
BuzzFeed anexada) seguida de todas as boas características de Annie.
Estou impressionado por ela ter liderado a campanha de arrecadação
de fundos para alfabetização infantil na biblioteca, mas não surpreso.
E fazer o mercado de Harriet mudar de plástico para sacolas
reutilizáveis também é legal. Na parte inferior há uma publicidade
para a Lojinha de Xerox do Davie.
Legal.
— Isso é mesmo legal? — Eu pergunto a James.
— Duvido. Mas nunca subestime o poder da cidade de Rome de
se intrometer apenas o suficiente por fazer merda. Além disso,
Harriet comprou quinze caixas de biscoitos de escoteira da filha do
xerife, então imagino que ele esteja disposto a fazer vista grossa para
esta petição. — Ele olha de perto. — Então, se você quer se casar com
Annie, é melhor dar o melhor de si e nos mostrar que vale a pena.
Eu gemo.
— Eu não quero me casar com Annie! Este é um grande mal-
entendido. — Um mal-entendido ridículo que está rapidamente
ficando fora de controle.
Ele olha para os ovos com um sorriso.
— Claro que não quer.
Annie
estou viajando?
Annie: Quem é?
Will: Sério?
frente?
Terça-feira
Will: Você já viu a petição?
votando contra.
disso.
Annie: Combina com você. Mas não se preocupe, vou pôr
Will: Ou...
ANNIE: Ou???
Quarta-feira
ANNIE: Oi.
3
Um pequenino ramo de flores que fica na lapela dos ternos de homens em ocasiões como casamento,
combinando com a roupa da madrinha.
ANNIE: Qual você prefere para os padrinhos?
WILL: O da esquerda.
olhos.
Angeles?
aqui.
cancelamento de envio?
Quinta-feira
Annie: Tive um sonho muito engraçado com você ontem à
noite.
Will: Não.
adolescência?
Will: Obrigado :)
Annie
Coloco uma caixa de lenços no balcão do caixa, seguida por uma caixa
de remédio para resfriado, alguns tipos de chá quente e alguns
produtos aleatórios; e então deixo meus olhos percorrerem a petição
da cidade, tentando impedir que eu e Annie ficássemos juntos. Até
agora, está com péssimos resultados. Três votos a favor (Mabel, Emily
e Madison) e mais de cem votos contra. Por que isso faz meu
estômago afundar?
Eu me afasto e olho para os olhos mais aterrorizantes que já vi: os
de Harriet. Essa mulher é severa e calculista o tempo todo. E ela
realmente me odeia.
— Hmm... remédio para resfriado — diz ela de uma forma
estranha.
Concordo com a cabeça e pesco minha carteira no bolso de trás
enquanto ela começa a escanear tudo, exceto o remédio para
resfriado.
De repente, uma voz áspera soa à direita do meu ombro. De
Mabel, ela está em toda parte.
— Muitos produtos para gripes e resfriados, William. Está se
sentindo mal?
— Uh-não, senhora.
— Então por que você precisa de todo esse remédio para resfriado,
hmm? — Diz Harriet, erguendo as sobrancelhas até a linha do cabelo.
— Você está planejando fazer drogas com eles?
Eu franzo a testa para a única caixa de Tylenol Gripe + Resfriado.
— Acho que você está pensando no remédio que contém
pseudoefedrina.
Seus olhos se estreitam em minha direção, descem para minhas
tatuagens e voltam para o meu rosto.
— Você saberia, não é?
Isso me faz rir. Sim, minha manga de flores e folhagens intrincadas
combinadas com a borboleta realmente se enquadra no perfil padrão
para viciados em metanfetamina. Eu me pergunto o que esta cidade,
ou o público em geral, pensaria se descobrissem que eu fui o orador
da turma de formatura. Que eu tinha pontuações tão altas e me
destacava em tantas atividades extracurriculares (alô, clube de
ciências) que entrei no MIT. Que eu nem fui ao meu primeiro
encontro até me formar no ensino médio e decidir que estava cansado
de viver minha vida com perfeição sem que isso ajudasse em nada.
Olho para trás, para o meu eu mais jovem, e encolho ao lembrar
de como pensei que tirar nota máxima ajudaria meus pais a brigar
menos. Que fazer muitas tarefas extras em casa e cuidar do meu irmão
mais novo removeria um pouco do estresse deles, então talvez eles
realmente gostassem de estar perto um do outro. Gritar menos e
sorrir mais. Não. Em vez disso, não me diverti no ensino médio por
nada. No segundo em que me formei, dei de cara com a parede. Eu
não conseguia ir a algum lugar e continuar trabalhando para algo que
não me importava. Foi quando entrei para o exército.
— Harriet, o que você está pensando? Você está desconfiando da
coisa errada — diz Mabel, abrindo caminho ao meu lado para colocar
as mãos nos quadris. — O homem não está tentando fazer drogas, sua
idiota. Ele está tentando fazer amor.
— Desculpa, o quê? — Eu pergunto, mas Mabel não está mais
prestando atenção em mim.
— Não me chame de idiota, sua velha maluca. E isso é ainda pior
se ele estiver tentando fazer amor com uma caixa de remédios.
Eu balanço minha cabeça.
— Não, posso garantir a vocês duas, não estou...
— Que nojo, Harriet. Não com a caixa. Com Annie! A mulher
com quem ele está saindo. Ele está claramente comprando toda essa
merda para cuidar dela porque a ama.
— Não. Mais uma vez, eu não...
— Isso é verdade? — Harriet olha para mim, tentando decidir se
vou fazer coisas indescritíveis com esta caixa de remédio para resfriado
ou não. Não consigo decidir se ela acha que é melhor ou pior do que
fazer isso com Annie. — Você está levando tudo isso para a nossa
Annie?
Eu suspiro, realmente desejando não ter que trazer toda a maldita
cidade para esta decisão mal pensada de cuidar da minha namorada
falsa.
— Sim. É tudo para Annie.
Ela cantarola enquanto seus lábios se franzem firmemente.
— Eu realmente não te vejo como alguém que cuida dos outros.
— Nem eu me vejo. Mas aqui estamos — digo a ela em um raro
momento de vulnerabilidade.
— Só um minuto, William — diz Mabel, desaparecendo em um
corredor antes de retornar com uma braçada de ingredientes e colocá-
los no balcão com um aceno firme. — Vou te ensinar a fazer a sopa
preferida dela. Isso vai animá-la e dar a você alguns pontos extras.
Eu quero pontos extras?
Droga, eu quero.
Agradeço a Mabel com um sorriso e depois me viro para Harriet.
Meu sorriso morre. Eu quase pulo com o olhar severo em seus olhos.
Como se ela estivesse lentamente extraindo minha alma e a
analisando. Silenciosamente, Harriet chega a algum tipo de
conclusão sobre mim, e então pega a caixa de remédio para resfriado
e começa a escanear.
Estranhamente, me sinto aliviado por isso. Talvez até um pouco
orgulhoso.
Há claramente algo na água desta maldita cidade.
Annie
Ok, Annie. Você consegue. Você pode tirar sua bunda do chão e ir à
consulta médica.
Isso é o que eu ganho por precisar de água. Achei que já havia
treinado meu corpo para não precisar mais dela – para viver com uma
dieta rigorosa apenas de café – mas não. A pequena doninha decidiu
desafiar-me e exigir reidratação.
Depois de beber meu gole de água obrigatório, pensei que só
precisava de um pouco de descanso, então me sentei no chão da
cozinha, e então isso se transformou em deitar no chão da cozinha, e
agora aqui estou eu... trinta minutos depois, ainda deitada aqui, a
cabeça latejando, as orelhas parecendo que alguém bateu com um
taco de beisebol nelas e o nariz está tão entupido que é possível que
eu nunca mais respire pelas narinas.
Minhas irmãs viajaram para o México ontem, e agora estou me
perguntando se é aqui que vou morrer e como minhas irmãs vão me
encontrar quando voltarem para casa radiantes e bronzeadas da praia.
Elas vão pairar sobre o meu corpo e rir que eu morri vestindo calcinha
com estampa de banana e regata combinando. Mas não é minha culpa
que eu não consigo dormir com a calça do pijama, e foi muito difícil
me vestir antes de entrar na cozinha porque meu corpo não tem mais
energia de tanto gastar tentando respirar.
Mas eu tenho que me levantar. Devo me levantar. Tenho um
encontro amanhã com Brandon, o cara da floricultura. Eu o
investiguei no Instagram, depois trocamos algumas mensagens de
texto e marcamos um encontro para sábado, que é amanhã. Até
agora, não sinto faíscas quando conversamos, mas tenho certeza de
que isso virá mais tarde. Não precisa se preocupar, Annie. Mais cedo,
consegui ligar para a Dra. Mackey e marcar uma consulta para esta
tarde, então talvez ela pudesse prescrever algo para me deixar melhor
antes do encontro – mas como diabos eu vou chegar lá?
Neste momento, há uma batida na minha porta. Não atendo
porque estou apenas 50% consciente. Acho que pode ser um ladrão
porque ouvi a maçaneta virar, seguida da porta se abrindo. Bom. Vou
pedir uma carona para ele para ir ao médico.
— Annie? — Uma voz paira sobre mim, e eu me encolho porque
conheço aquela voz, e também sei que estou sem calça. Eu ouço um
baque quando ele cai de joelhos. — Merda, Annie. Fale comigo, você
está bem?
— Will? Você está brincando comigo? — Eu abro meus olhos para
encontrar o homem mais atraente do mundo ajoelhado ao meu lado,
parecendo aliviado por eu não estar morta. Isso é doce.
Sei que deveria ficar chateada por ele me ver sem calça
(especialmente porque sei que ele está me evitando desde aquele beijo
mal interpretado no Hank na outra noite), mas, em vez disso, sinto
uma profunda sensação de paz.
— Eu não estava tentando te usar para fazer ciúmes, sabe — digo,
porque estou morrendo de vontade de contar a verdade a ele há dias.
Mas eu não queria fazer isso por telefone.
— Shh... está tudo bem, Annie.
Ele empurra meu cabelo para trás e eu pego seu pulso.
— Não está bem. É importante para mim que você saiba que não
foi um jogo.
Will respira fundo e acena com a cabeça.
— OK.
Eu sorrio, me sentindo como se 40 quilos tivessem saído de
minhas costas agora que isso está fora do meu peito e fecho meus
olhos novamente.
— Ok, agora saia. Você não deveria me ver assim.
— Como o que? Sem calça? Vestindo calcinha estampada com
pequenos desenhos de banana? — Ele pergunta dando um sorriso
torto. — Fofinha. Ela combina com seus pijamas.
Eu gemo e jogo meu braço sobre meus olhos.
— Me deixe morrer.
— Essa é uma opção. Mas então quem atenderia às necessidades
de flores de todos na cidade?
— As chaves estão na minha bolsa. A loja é sua agora. Por favor,
não dê a ninguém buquês de cravos feios.
Uma risada baixa e estrondosa soa em seu peito, e tudo que eu
quero é pressionar meu rosto contra ela e sentir as vibrações contra
minha bochecha.
— Eu não amo flores tanto quanto você.
— Diz o homem que as tem tatuadas na pele por toda a
eternidade.
— Bom saber que você ainda tem seu senso de humor. — Sinto
sua mão repousar sobre minha testa e ele sibila. — Nossa, você está
queimando. Você tomou alguma coisa ultimamente?
— Não. Eu não consigo me mover. Meu corpo não funciona
mais.
A mão de Will acaricia afetuosamente a linha do meu cabelo,
afastando meu cabelo suado do meu rosto.
— Por que você não me ligou para vir cuidar de você? Ou ligou
para Noah?
Eu faço uma careta.
— E arriscar que algum de vocês fique doente? Sem chance. Eu
vou ficar bem. Tenho uma consulta médica em uma hora.
— Bom. Mas como você planeja chegar lá?
— Vou pegar carona nas costas de uma tartaruga.
— Muito prático — diz ele com as costas dos dedos demorando
contra o meu pescoço. — Vamos tirar você do chão, raio de sol.
Raio de sol. Estou tendo alucinações ou Will acabou de me
chamar pelo apelido mais doce que meus ouvidos já ouviram?
Os braços fortes de Will passam por baixo das minhas coxas e
costas nuas, me levantando do chão e me levando para o meu quarto,
onde sou depositada delicadamente na cama. Sou imensamente grata
pela parte gentil porque minha cabeça parece que vai explodir. Eu
poderia apreciar muito mais toda essa ternura se não estivesse perto
da morte. Infelizmente.
Eu ouço Will mexer no meu armário por um minuto e então
voltar para os meus pés.
— Annie, vou colocar essa calça em você para poder levá-la ao
médico, ok? Você pode dar um sinal de vida de que está tudo bem
comigo fazendo isso?
Eu resmungo uma afirmativa, e então Will gentilmente puxa meus
pés e pernas para dentro do meu pijama e o desliza por todo o meu
corpo até que esteja abaixo dos meus quadris. Uso minhas últimas
forças para levantar minha bunda para que ele possa deslizá-la pelo
resto do caminho. O estranho é que sou a pessoa mais recatada que
você já conheceu, mas não me sinto nem um pouco constrangida por
estar seminua. Eu confio nele de uma forma que não deveria. De uma
forma que sei que só vai me machucar mais tarde, quando ele lembrar
que não é o tipo de relacionamento que gosta. Que ele odeia o
casamento. Que ele absolutamente não está retribuindo os
sentimentos que captei.
— Você está tão assustado por acordar ao meu lado de novo — Annie
diz, olhando para mim quando eu pensei que ela estava dormindo.
Eu estive acordado, olhando para o teto nos últimos vinte minutos e
reavaliando todas as minhas escolhas de vida. E a mensagem de texto
que li quando acordei.
— Um pouco, sim.
— Você deveria estar assustado mesmo. Já liguei para o pastor e ele
está a caminho para nos casar imediatamente. — Mesmo sabendo
que ela está brincando, meu estômago afunda e aperta. Infelizmente,
não por medo.
Annie se senta, com o cabelo caindo em cascata sobre o ombro e
apoia o queixo no meu peito.
— Ajudaria se eu dissesse que não estou esperando nada mais? —
Sua voz ainda está rouca e seu nariz está entupido, mas ela soa muito
melhor do que ontem. Quero fazer um chá com mel para ela.
Eu franzo a testa – e minto.
— Sim. Isso é verdade? Porque a noite passada pareceu...
significativa entre nós, e significativa me assusta para caralho.
— Eu sei.
— E então eu dormi aqui novamente, embora eu tenha uma
política muito rígida de não passar a noite – e estou perdendo a
cabeça.
Seus lábios carnudos e rosados se curvam em um sorriso delicado.
Porra, ela é linda. Mesmo com os olhos inchados e um pouco
vermelhos.
— Acho que o que aconteceu conosco ontem à noite foi amizade,
o que também pode te assustar.
— Com certeza.
— Por quê?
Eu faço um som tsc.
— Seu cartão expirou à meia-noite.
Annie é implacável.
— Você realmente não tem amigos, Will?
Suspiro e volto meus olhos para o teto. Ela me prendeu aqui. Não
vou fugir sem contar a ela toda a verdade sobre mim.
— Meu trabalho me mantém ocupado. Não há muito tempo para
os amigos.
— O que é intencional — diz ela, me colocando no centro da
conversa. Eu sabia que havia contado muito a essa mulher sobre mim
ontem à noite. Agora ela conhece todos os meus pontos fracos.
Eu cubro sua mão descansando no meu peito com a minha.
— Sim. É. — Faço uma pausa e ela apenas espera. — Depois de
basicamente criar a mim e ao meu irmão, quando saí de casa e
encontrei alguma liberdade, decidi que estava cansado de viver para
outras pessoas. Eu ia ser egoísta por um tempo e aproveitar isso para
caramba. Sem relacionamentos. Ninguém para colocar grandes
expectativas em mim, e eu nunca posso ser decepcionado por alguém
se eu nunca os deixar aproximar em primeiro lugar. Este trabalho me
deu a desculpa perfeita para me manter ocupado e feliz.
Annie franze o nariz.
— E agora aqui está você. Na minha cama.
Ela acrescenta essa última frase porque sabe que isso é um desvio
severo do meu plano. Intimidade desse tipo nunca foi algo que eu
quis... até agora.
Annie se afasta de mim e volta para seu travesseiro, e nós dois
olhamos para o teto.
— Annie, a verdade é que eu realmente quero me afastar de você.
Mas também sinto vontade de lhe contar tudo. Que feitiço você
lançou sobre mim?
Ela ri e desliza aqueles lindos olhos azuis sobre mim, me espiando.
— Você tem sentimentos por mim, Will?
Eu solto uma risada.
— Annie. Você não pode simplesmente perguntar isso a uma
pessoa. Isso é contra as regras.
— Por quê?
— Porque... devemos manter tudo escondido e viver em angústia.
Mantenha o outro sem respostas e miserável. É assim que funciona.
Seus lábios se curvam e ela desliza a mão sobre as cobertas para
unir delicadamente nossos dedos.
— Você gosta de mim, Will?
Eu seguro seu olhar e aperto seus dedos enquanto suas palavras
arrancam a verdade de mim como sempre fazem.
— Sim, eu gosto, Annie. Você gosta de mim?
— Sim. Indo contra o meu melhor julgamento.
Eu rio completamente com isso e, em seguida, passo minha mão
livre sobre meu rosto.
— É por isso que você precisa correr para longe de mim. Me
expulsar. Fechar suas janelas. Trancar suas portas. Tenho tanta
bagagem, Annie... não tenho certeza se seria bom para você. Ou que
algum dia serei do tipo que se casa.
Ela se ajusta, rolando para o lado, mas não soltando minha mão.
— Eu posso cuidar de mim mesma, obrigada. — Ela sorri
levemente e todo o meu peito dói. — Eu não estou vivendo em um
mundo de fantasia aqui. Você e eu somos duas pessoas que acabaram
tendo sentimentos, mas nunca deveriam. Nossas vidas estão em
caminhos diferentes que de alguma forma conseguiram se cruzar
acidentalmente ao longo do caminho.
— Então o que fazemos agora?
— Nós sofremos — diz ela dramaticamente, mas com uma pitada
de diversão tocando o canto da boca. — Continuamos amigos.
— Amigos.
— Essa é a única opção para quem quer coisas diferentes, não é?
Então, seremos amigos, e sentiremos saudades por um tempo, e então
um dia estarei velha e casada com um monte de netos aqui em
Kentucky e você será um pirata em um navio em algum lugar nas
Bahamas com um pequeno coque no cabelo.
— Oh, não — eu digo gravemente. — Você ama piratas. Você vai
sentir saudades de mim enquanto está deitada ao lado de seu velho e
bom marido?
Ela acena com a cabeça.
— Infelizmente, sim. Mas não tanto quanto você sentirá saudades
da mulher que deixou para trás.
Como a honestidade é tão fácil conosco? Fácil demais.
— De qualquer forma — Annie diz, se sentando e balançando as
pernas para fora da cama —, você está fora das garras do matrimônio,
Menino Lobo. E eu tenho que fazer xixi – não ouça — Annie diz
antes de desaparecer em seu banheiro e fechar a porta como se
tivéssemos acabado de discutir o que há para o jantar, em vez de
admitir sentimentos.
Tão bom. Sim. Eu estou livre. Eu deveria sentir um grande alívio.
A qualquer segundo, o Grande Alívio me inundará. Não me
inundou. Não sinto alívio, me sinto frustrado.
Estou pensando demais com minhas emoções, esse é o problema.
Eu preciso ser lógico. E logicamente, tenho uma carreira que me
afastará de Rome aconteça o que acontecer. Logicamente, estou feliz
vivendo assim desde os dezoito anos. Esses sentimentos estão apenas
passando por lombadas inesperadas em minha estrada cheia
liberdade. Então o que preciso fazer é ignorá-los e continuar com meu
plano. Me divertir com Annie e depois dizer adeus com um término
bom e sem ressentimentos quando eu for embora. Até ela acha que
esta é a melhor decisão.
Sim. É bom. Isso é bom.
Um minuto depois, Annie sai do banheiro e volta para a cama,
sem hesitar nem um segundo antes de se aconchegar ao meu lado.
— Você quer um pouco de café?
Eu observo seus longos cabelos loiros, seus suaves olhos azuis e a
curva de sua boca, e jogo todos os meus planos pela janela e considero
fazer a única coisa que me assusta como o inferno: ficar. Esquecer a
estrada aberta da liberdade. Acho que tenho tudo o que poderia
precisar em meus braços.
Mas então o telefone de Annie vibra na mesa de cabeceira. Pego
para ela, mas a tela acende e vejo o nome: “Brandon Larsdale (o cara
da floricultura)”.
Sem dizer nada, entrego para Annie, e nem percebo que espero
que esse cara não seja nada além de um fornecedor de flores até que
ela abre a mensagem, nem mesmo tentando esconder a tela de mim,
e vejo as palavras: “Ainda está de pé o nosso encontro esta tarde?”
Portanto, não é um fornecedor de flores.
— Você... tem um encontro? — Eu pergunto a ela, franzindo a
testa e odiando o quão patético eu pareço por estar perguntando isso.
— Sim. Mais ou menos. Eu queria te contar, mas... não consegui
achar o momento certo. — Ela olha para mim. — Desculpe. Eu
deveria ter te contado antes.
Meu estômago afunda. Annie tem um encontro.
— Não, isso é... totalmente bom... ótimo mesmo. — Me sento e
jogo as pernas para fora da cama.
— Will... — Annie diz em um tom terno.
Eu dou a ela um sorriso rápido por cima do ombro para tentar
impedi-la de sentir minha estranheza.
— Está tudo bem, Annie. De verdade. Esta é a coisa certa.
Acabamos de dizer que estamos em caminhos diferentes e este é o
curso exato que o seu deve seguir — eu digo, me concentrando ainda
mais em soar normal e não como se eu estivesse sentindo um ciúme
de mil sóis. Como se eu quisesse encontrar esse cara e empurrá-lo
contra a parede com meu punho e avisá-lo para não tocar em Annie
ou ele morrerá.
Eu vou para o banheiro e jogo água no meu rosto e me preparo
para escovar os dentes com os dedos apenas para que eu possa
controlar-me. Ela tem um encontro. Annie tem um encontro esta
tarde. Com um cara. Um cara chamado Brandon. Um cara chamado
Brandon vai levar Annie para um encontro.
Não sei por que estou listando todos esses fatos como se
pertencessem a uma parede com pequenos cordões vermelhos
conectando todas as pistas. Meu comportamento agora é ridículo.
Patético. Não é como se eu não previsse isso. É literalmente o que
estamos trabalhando.
Ela disse desde o início que seu objetivo era encontrar sua alma
gêmea. Oh Deus, e se esse Brandon for sua alma gêmea? Ele se torna
sua alma gêmea e eu sou apenas sua pessoa perfeita para praticar por
um tempo.
Aperto o tubo de pasta de dente com muita força e a pasta voa
pelo banheiro até a parede.
Annie entra no banheiro naquele exato momento e, sem dizer
nada, molha um pano e enxuga a pasta de dente colorida. Tenho que
passar as mãos no rosto porque ela parece tão autenticamente bonita
e calma, e isso só serve para deixar meus nervos ainda mais frenéticos.
Por que estou agindo assim? Eu nunca fico com ciúmes. Nunca me
importo se uma mulher com quem estou saindo sai com outro
homem.
Eu me importo se Annie sair.
— Wilton — ela diz suavemente, pegando meus ombros e me
puxando para ela. — Vamos conversar.
— Não precisamos. — Eu consigo não soar imaturo de alguma
forma. Mas quero que ela saiba que não me deve nenhum tipo de
explicação. Ela é dona de si e eu sou... apenas seu amigo.
— Você veio e fez sopa. E cuidou de mim. E me aconchegou. E
disse que gosta de mim. E então viu uma mensagem dizendo que
estou saindo com outro cara. Claro que preciso lhe contar o que está
acontecendo.
— Não estamos juntos de verdade, então... está tudo bem. Você
não me deve nada. — Viu? É por isso. Esta é uma das razões pelas
quais não quero casamento ou relacionamento. Você nunca pode
prever qual será o próximo passo de uma mulher ou quando ela fará
algo que dói demais.
Annie parece determinada a me fazer olhar para ela. Ela segura
meu maxilar em suas mãos.
— Mas você quer saber quem era?
— Ele é o seu encontro para hoje?
— Sim.
— Então eu acho que estou a par.
Ela deixa cair as mãos, mas continua a me encarar com seu olhar
implacável.
— Ele é um cara que entrou na floricultura na semana passada
enquanto você estava fora da cidade. Ele é veterinário e acabou de se
mudar para a cidade vizinha à nossa. — Ela faz uma pausa. — Nós
nos demos bem e ele pediu meu número. Eu disse a ele que não estava
procurando nada casual agora, e ele disse que também não, então eu
dei a ele meu número porque – esse não era o objetivo o tempo todo?
Eu quero me casar. Eu quero ter uma família. Eu preciso fazer isso,
Will. Você não entende, mas eu tenho que me casar. Eu tenho esse
buraco no meu coração, e não consigo fechá-lo. Essa é a única coisa
que resta para tentar fechá-lo, embora eu tenha certeza de que não vai
funcionar, e você vai embora, e eu vou me casar, e ainda vai estar lá
vazio e machucando. — Ela está começando a chorar.
Eu coloco minhas mãos na parte externa de seus braços com
ternura.
— Está tudo bem, Annie. Você não precisa se explicar. Eu
entendo. Você tem que fazer isso por você.
Ela continua, no entanto.
— Brandon e eu trocamos mensagens de texto esta semana, e ele
chamou para sair hoje. Eu não te contei, embora quisesse, porque
estava com medo de te afastar e, egoisticamente, não quero que você
vá embora ainda.
Eu expiro enquanto agarro suavemente seu bíceps e a puxo um
pouco mais para perto.
— Se há algo que entendo perfeitamente, Annie, é agir por
necessidade egoísta.
Ela dá um sorriso triste. Um sorriso corajoso.
— Ele parece legal, no entanto. Temos os mesmos objetivos. Eu
tinha que dizer sim, Will. Não havia razão para que eu não o fizesse.
Eu não posso nem ficar chateado com isso, porque ela está certa.
Eu não sou um motivo. Eu disse a ela de antemão que nunca seria um
motivo. Qualquer conexão estranha que tenhamos é um pontinho na
linha do tempo de nossas vidas. Um interlúdio que pensaremos com
carinho. E logo, espero, voltarei à vida real, e Rome e Annie e todos
nesta cidade absurda serão apenas lembranças.
Forço um sorriso que diz que não sinto nada.
— Estou feliz por você, Annie. Realmente. E este é um ótimo
momento, na verdade, porque tenho algo que preciso contar a você
também. — Eu paro. — Vou embora logo.
Ela franze a testa levemente.
— O que?
— Depois do casamento. — Tento dizer isso da forma mais casual
e desapegada possível. — Não se preocupe, você não está me
afastando. E não é por causa do seu encontro com Brandon. — A
mentira escapa facilmente. — Meu chefe aprovou minha
transferência para Washington, D.C., e eu aceitei.
Eu tenho que olhar para todos os lugares, menos para o rosto dela.
Se eu olhar em seus olhos, ela verá a verdade. Amelia ligou para minha
chefe ontem e disse que estava tudo bem em ser transferida para um
novo AEP (o que parece um momento suspeito), então a mensagem
que li esta manhã confirmou que fui liberado para me mudar para
um novo emprego após o casamento.
O problema é que ainda não disse sim. Eu tinha planejado
responder a Liv e perguntar se eu poderia ter alguns dias para pensar
sobre isso, porque eu poderia querer ficar em Rome, afinal. Mas este
encontro iminente de Annie é exatamente o chute na bunda que eu
precisava para lembrar que tudo o que está acontecendo entre nós é
passageiro. Eu não deveria mudar todos os meus planos de vida por
uma pessoa que conheci há apenas algumas semanas. Estou seguindo
meu próprio conselho para Ethan e pisando no freio. Ou... acho que
uma metáfora mais precisa seria pisar fundo no acelerador e sair
daqui.
— Mas... Amelia não quer um guarda-costas diferente.
— Agente de proteção executivo — eu digo fracamente. — E ela
disse a minha chefe que estava bem com isso. Vai ser difícil seguir em
frente sem... ela, mas está na hora. Eu preciso de uma vida mais
agitada. Não posso mais ficar aqui ou... — Ou vou começar a querer
coisas que me assustam. Ou vou pensar em fazer as coisas que prometi
que nunca faria. — Vou ficar entediado.
Nos filmes, é aqui que Annie se sentiria magoada. Era para ferir.
Para cortar nós dois para que eu pare de ter esses malditos
sentimentos e para mostrar a ela que não sou o mocinho que ela quer.
Eu tenho um passado confuso e um coração confuso que mantenho
cerrado com força em meu punho junto com uma série de mulheres
em todo o país que atestarão o fato de que nunca vou liberá-lo para
mais ninguém.
Mas esta é a Annie. E ela não faz nada como previsto.
Seu sorriso se inclina para um que está tão perto da pena que meus
dentes se apertam. Ninguém – e quero dizer ninguém – jamais foi
capaz de me ler tão bem. Mas Annie sim. É como se ela tivesse as
legendas ativadas para o meu cérebro e ela não se sente magoada. Ela
fica triste por eu estar aqui mentindo para ela.
Ela olha para baixo e limpa a garganta.
— Ok, bom. Estou feliz por você, Will.
— E eu estou feliz por você.
Estamos todos felizes, somos felizes!
Depois de um silêncio doloroso, finalmente pergunto:
— Então, onde você vai no seu encontro?
Ela estreita os olhos.
— Por que a pergunta?
Eu puxo um olhar ofendido.
— Como assim por quê? Eu sou seu treinador de encontro. É meu
trabalho saber tudo sobre sua vida amorosa. Isso não tem nada a ver
com os... — eu me inclino e abaixo minha voz como se estivesse
compartilhando um grande segredo — sentimentos sobre os quais
conversamos antes. Esses estão oficialmente voltando para a caixa
onde pertencem daqui em diante.
Ela ri baixinho.
— Bem, se você quer saber, vamos ao jogo da liga infantil do
sobrinho dele.
Minhas sobrancelhas sobem.
— Liga infantil? Para um primeiro encontro?
Ela dá de ombros.
— Ele é um homem de família, aparentemente.
Quando eu rio, pareço um vilão.
— Que perfeito. Acho que ele está procurando uma esposa para
fazer carne assada nos fins de semana também?
— Espero que não. Não sei fazer carne assada.
Eu o odeio. Quem quer que seja.
Mas você sabe o que? Brandon não está aqui com Annie agora. Eu
estou.
— Então... você acha que ele vai te beijar hoje?
Seus olhos se arregalam.
— Não sei. Talvez? Oh Deus. Você acha que ele vai tentar?
Cruzo os braços e dou de ombros.
— Eu te beijaria no primeiro encontro.
Seus olhos seguram os meus – e eles brilham. Ela está lendo minha
mente novamente. Ela sabe exatamente o que estou fazendo e aprova.
— Bem... talvez possamos praticar um beijo de primeiro
encontro? Você sabe, só para não ser pega desprevenida.
— Claro. Certo. — Eu aceno pensativamente. — Como seu
treinador de namoro, é minha responsabilidade garantir que você
esteja preparada para esse tipo de coisa.
— Isso é o que eu estava pensando.
Eu me aproximo.
— Então, como você quer fazer isso? Tipo... encenar?
— OK.
— Ok — repito enquanto meu coração bate forte. — Batendo o
ponto de entrada — eu digo, já pressionando em direção a ela.
Ela levanta seus dedos e os pressiona rapidamente em meus lábios
para me parar.
— Espere. Estou resfriada. Tive febre ontem. Não quero que você
pegue.
— Você se sente mal agora?
— Não, eu me sinto muito melhor hoje, mas...
— Então dê-me o maldito resfriado, Annie — eu digo baixinho
ao lado de seu ouvido. Eu a sinto tremer levemente, mas sei que não
é de febre.
Deslizo minhas mãos pela parte inferior de suas costas, avançando
ao longo do terreno que estou começando a me familiarizar. Eu
tenho esta pequena curva memorizada. Aquela logo acima de sua
bunda perfeita. Eu sei que se eu abrir minha mão contra ela e
pressioná-la contra mim, ela vai ofegar levemente e então se derreter
em meus braços. Eu faço isso agora, e depois de ouvir o suspiro suave
que eu gostaria de capturar em uma jarra e manter selado por toda a
eternidade para que ninguém mais tenha o prazer de ouvi-lo, eu
começo a falar.
— Imagine isto: seu encontro está chegando ao fim. Você está
queimada de sol por ficar sentada por horas nas arquibancadas e, ao
lado de sua caminhonete, ele lhe entrega um Capri Sun que roubou
do refrigerador de lanches pós-jogo de Pam...
Annie ri e empurra meu peito de brincadeira.
— Pare com isso! Não é assim que vai acontecer!
— Está bem. Vou falar sério. — Eu faço meu rosto sombrio. —
Annie... eu me diverti muito com você vendo as crianças nunca
acertarem uma bola de beisebol por cinco horas e meia...
— Inútil! Você é inútil!
Nós dois estamos rindo e Annie está tentando me fazer cócegas,
mas em vez disso, eu a pego e a carrego para seu quarto para jogá-la na
cama.
— Você acha que vai ter uma cama no jogo de beisebol?
— Absolutamente.
— Então... — Eu pairo sobre Annie e mergulho minha cabeça em
seu pescoço, correndo meus lábios em sua pele. — Annie, obrigada
pelo melhor primeiro encontro da minha vida. Podemos sair de
novo?
Ela suspira enquanto eu lambo levemente a pele macia atrás de sua
orelha.
— Eu acho que pode ser aceitável – sim.
— Maravilhoso. Que tal no próximo final de semana? Conheço
um castelo inflável sendo erguido para o aniversário de uma criança
de oito anos. — Eu inclino minha boca sobre a dela antes que ela
tenha tempo de dar-me qualquer resposta afiada, e ela me
corresponde beijo atrás de beijo. Sua língua desliza contra a minha, e
suas mãos escalam minhas costas. Estou tremendo com o quanto
estou me segurando. O quanto eu quero arrancar suas roupas de seu
corpo e consumi-la completamente. Seria tão bom. Nós seríamos tão
bons juntos.
Mas Annie não é minha.
Então eu me acalmo e de alguma forma consigo me afastar dela,
observando sua expressão triste quando afasto. Beijo sua bochecha,
sua têmpora e sua testa.
— Eu devo ir.
Annie acena com a cabeça me seguindo para fora de seu quarto e
parando na porta da frente aberta enquanto eu saio. Antes de ir, não
posso deixar de olhar para ela mais uma vez.
— Se divirta no seu encontro, Annie. — Eu paro. — Talvez ele
possa te levar para comer alguns nuggets de frango depois.
Ela geme e revira os olhos.
— Fechando a porta agora!
— Você quer um dólar emprestado para um refrigerante caso ele
esqueça sua carteira de couro?
Bam!
Annie
Não é meu dia de visitar minha avó, mas vou lá mesmo assim.
Logicamente, sei que ela não terá nenhuma das respostas de que
preciso – mas vou de qualquer maneira, com uma esperança
equivocada de que ela terá o dia mais incrível que teve em meses e será
minha avó novamente esta noite, cheia de sabedoria e graça e poderá
me dizer exatamente o que fazer.
Não vejo Will há alguns dias. Não desde a noite do meu encontro
com Brandon, para ser exata. Acho que ele pode estar se escondendo.
Tudo bem, no entanto. Eu tenho me escondido também. Somos
bons nisso.
Ele entrou no mercado ontem, e me escondi atrás de uma
prateleira, abandonei meu carrinho e me arrastei para fora. (Tudo
bem, eu me curvei e tropecei para sair.) No dia seguinte, eu o vi n’A
Loja das Tortas e, quando fizemos contato visual, pisquei e ele se foi.
Abaixado em um beco, provavelmente. Só para garantir, mandei uma
mensagem para ele mais tarde naquele dia.
Annie: Você está me evitando, certo?
—
Mabel estende o braço por cima da mesa e segura minha mão.
— Me diga por que você está chorando, Annabell.
— Não tenho certeza se há apenas um motivo.
— Me dê seus cinco primeiros, então.
Estamos sentadas na sala de jantar escura da casa de repouso. O
jantar acabou há cerca de duas horas, então Mabel e eu somos as
únicas aqui. O cômodo é decorado em tons de vinho escuro, dourado
e azul-marinho, e toda vez que trago minha avó para cá ela comenta
como o lugar é cafona. Eu tenho que concordar. É uma instalação
muito boa, mas algo nela parece uma casa funerária, o que é
inaceitável.
Faço uma anotação mental para trazer um buquê fresco e colorido
para colocar em cada mesa amanhã e conversar com o gerente das
instalações sobre pintar a sala com uma cor mais alegre.
— Eu não tenho mais certeza de quem eu sou, Mabel – e eu
realmente gostaria que minha mãe ajudasse a resolver isso, mas ela não
pode porque ela está morta. E nunca a conheci como meus irmãos, e
às vezes ressinto-me deles por isso. E não sei por que estou chorando
por meus pais mortos quando tenho quase trinta anos, quando acho
que não chorei por eles nem na infância. — Prendo a respiração. —
Ah, e eu me apaixonei por um guarda-costas que não acredita no
amor e está indo embora para sempre. Foram cinco? Não sei.
Mabel suspira.
— Bem merda, querida. Você está a dez passos à frente nesse seu
cérebro. — Ela aperta minha mão, incitando-me a olhar em seus
olhos gentis. — O que você precisa de mim, querida? Conselho? Ou
alguém para te ouvir?
— Conselho. Eu realmente preciso de conselhos.
— Bom, porque você ia conseguir de qualquer maneira. — Seu
sorriso puxa um de mim em troca. — Verdade seja dita, eu estava
esperando por este dia. Você está atrasada em um bom luto por seus
pais.
Eu balanço minha cabeça.
— Não é isso. Não estou de luto. — Faço uma pausa e Mabel
apenas me observa. — Eu não estou. Eles morreram há décadas,
Mabel. Eu vivi uma vida inteira sem eles. Quase não sei nada sobre
as pessoas que me deram a vida além das migalhas que meus irmãos
contam. E o resto de suas memórias estão engarrafadas em uma
mulher que não consegue me falar, e estou tão perto de perdê-la para
sempre — eu digo, levantando o polegar e o indicador para mostrar a
medida tão pequena e deprimente.
Não percebo que estou chorando durante tudo isso até que
Mabel me entrega um guardanapo de papel sobre a mesa. Eu enxugo
meus olhos e agradeço a minha estrela da sorte por não ter usado
rímel hoje.
— Isso é dor, Annie. E está tudo bem. O luto – aquele filho da
puta malvado – não tem uma linha do tempo ou regras. Ele bate
quando quer. Mesmo comigo – às vezes me sinto totalmente curada
e, aleatoriamente, sinto um perfume que cheira à colônia do meu
marido e o perco em um corredor do mercado. Não faz sentido, a dor.
E eu conheço você por tudo isso, e nunca vi você sofrer por causa de
seus pais. Por quê?
Meus lábios tremem e eu aponto meu olhar para o meu colo.
— Achei que não tinha permissão para isso.
— Mas, querida, por que você pensaria isso? — Sua voz terna
arranca meu coração do peito, e sinto como se estivesse sangrando em
forma de lágrimas.
— Porque eu não os conhecia o suficiente para chorar por eles.
Mas Noah, Emily e até Madison, sim. Eles têm memórias específicas
que eu não tenho. Eu só tenho um buraco no meu coração que não
consigo preencher totalmente, e não sei bem por que é que ele está lá.
Espere.
De repente, como um relâmpago, percebo que tenho ido atrás das
coisas erradas. Eu não precisava de um marido. Ou mesmo me
encontrar. Acho que esse vazio é resultado de me afastar
constantemente dos meus sentimentos. Eu sei quem sou e o que
quero da vida – apenas ignorei essas necessidades.
— Seus irmãos não falam muito sobre seus pais?
Mais uma vez, balanço a cabeça.
— Não. E fazer perguntas sobre mamãe e papai sempre fez com
que todos se fechassem. Parecia muito doloroso para eles falarem
comigo sobre suas memórias. Então parei de tentar – não queria
adicionar mais pesar à dor deles. Eu apenas parei de reconhecer minha
própria tristeza e me concentrei na de todos os outros. Funcionou.
Isso os fez se sentirem melhor e, em troca, me fez me sentir bem.
— Até que isso não funcionou mais.
Eu suspiro e aceno.
— Até que não funcionou mais. E agora vivi tanto da minha vida
sem compartilhar quem sou com eles, que não sei como começar.
Não sei como dizer a eles que essa versão de mim que eles viram por
tanto tempo não é mais necessariamente verdadeira para mim.
— Você diz isso. Exatamente assim.
— Eles vão se machucar, Mabel. Minha família me ama tanto que
descobrir que eu menti para eles todos esses anos...
— Exatamente, querida. Eles te amam muito. Honestidade é um
dom, Annie. E se você realmente os ama também, será honesta com
eles sobre quem você é. E quanto a William... — Ouvir seu nome
mencionado de repente nesta conversa me faz quase pular na cadeira.
— Não desista dele.
— Mas Mabel...
— Não me diga “mas Mabel...”, se você ama aquele garoto, não
desista dele, Annie. Ele precisa de alguém que lute por ele, como você
precisou de alguém que lutasse por você. E não estou dizendo que vai
parecer convencional, ou qualquer coisa como você sempre
imaginou, ou mesmo algo como o que seus pais tinham... — Ela sorri
e é um sorriso cheio de memórias. — Mas talvez seja algo ainda
melhor.
— Ou talvez acabe e queime e doa.
— Ou talvez isso.
Eu rio até que nós duas ficamos sérias novamente.
— O que minha mãe teria dito?
— Hmm — diz Mabel, franzindo os lábios e semicerrando os
olhos. — Charlotte queria viver o momento. Não lembro dela
pensando muito no futuro sobre as coisas – e às vezes isso a colocava
em muitos problemas. — Mabel sorri carinhosamente, e de repente
fico triste por não ter tentado falar com ela sobre meus pais antes. —
Sua avó costumava vir até mim reclamando de sua garota selvagem o
tempo todo, mas sempre havia um brilho nos olhos de sua avó como
se ela não pudesse deixar de se orgulhar de sua filha obstinada.
Portanto, não sei o que ela teria dito exatamente, mas tenho a
sensação de que seria algo como seguir seu coração ou seu instinto,
como diabos você queira chamar.
Duvido que Mabel saiba o quanto vou me apegar a essas palavras.
— Embora eu não seja sua mãe ou sua avó, mas alguém que viveu
muito tempo e amou mais profundamente do que eu poderia
descrever para você, eu diria que me arrependo das coisas que nunca
disse muito mais do que das coisas que disse... Se você o ama, seja
honesta. Com você e com ele. E então comece a partir daí. Não se
negue mais, Annie.
Eu olho para Mabel com um sorriso aguado.
— Eu te amo, Mabel.
Ela acena para mim como se não precisasse de palavras fofas como
essa, mas vejo como seus olhos se embaçam quando ela desvia o olhar.
— Também te amo, Annie-banana.
Will
Will cumpriu sua promessa e escalou minha janela uma hora atrás.
Agora, ele me segura contra ele na minha cama – meu pijama de
banana felizmente descartado no chão. É tarde, mas minhas irmãs
ainda não estão em casa, e presumo que estejam na casa de Noah e
Amelia ou talvez na casa de James para dar um pouco de privacidade
a mim e a Will. Sou grata. Houve tantas mudanças e tantas revelações
nos últimos dias que sinto como se tivesse corrido uma maratona. Ou
virado o homem de ferro. Ou concorrido contra Harriet para
vereadora.
Hoje à noite, Will e eu nunca chegamos a dizer adeus ou discutir
o que faremos depois que ele se for ou se haverá algo a ser feito,
porque toda vez que tento tocar no assunto, ele muda de assunto. Em
vez disso, fazemos amor e nos aconchegamos, e Will beija minha testa
mais vezes do que posso contar. E é isso. Na manhã seguinte, quando
acordo e o sol está aparecendo no horizonte, Will já se foi. E o último
romance de piratas que eu estava lendo e que estava na minha mesa
de cabeceira também se foi.
Ele tomou isso como uma lembrança minha?
Enquanto faço café, digo a mim mesma para não me preocupar.
Vou vê-lo no casamento. Não tem como ele perder isso. E não há
como ele ir embora sem se despedir.
Certo?
Mas então penso na noite passada e em como ele me segurou
como se estivesse com medo de que eu estivesse fugindo. Como ele
me beijou, mesmo depois de termos feito amor, até minha boca ficar
inchada. Como, à luz de sua ausência esta manhã, percebo que a noite
passada foi muito parecida com um adeus.
E é aí que percebo que ele não vai estar no casamento. Ele nem vai
despedir-se – e pretendia que fosse assim desde o início.
Como ele ousa?
Annie