Supervisão Na Formação em Serviço Social - Dorita Anjo
Supervisão Na Formação em Serviço Social - Dorita Anjo
Supervisão Na Formação em Serviço Social - Dorita Anjo
Por
Junho 2013
UNIVERSIDADE CATÓLICA PORTUGUESA
Por
Sob Orientação da
Professora Doutora Fernanda Rodrigues
Junho 2013
RESUMO
1
ABSTRACT
The central problem of the present thesis is the process of teaching and learning in the
domain of experiential education, analyzing the pedagogical supervision of the training
practice and, through it, the training of the knowledge/power for/through autonomy and
emancipation (at the 1st cycle of the Social Work course). The context of the study refers
to the course of Social Work between 2005 and 2011 at the University of Madeira (UMa).
It started with the question of how the Social Work professionals are educated today in
order to face the challenges coming from deep societal changes and at the welfare state
level. The general objective of this work is to contribute to the strengthening of the Social
Work educational process. As specific objectives the aim was to know, to analyze and to
think about the evolution, the nature, the direction, the structure, the model, the
potentialities and the limits of the training process and the pedagogical supervision in
student’s education. In this same context it was sought to understand the articulation
between theory and practice, research and action, the connection between academy and
community and the cooperation between teachers, students, practice supervisors and
citizens.
In terms of Methodology, it relies on qualitative research for case study that was based on
different levels of sensory /sensitizers’ concepts which may engage and express the
meanings and motivations that the subjects of experiential training (graduate students,
teachers and local supervisors) have about the training model, supervision and respective
coordination with social reality. The collected information, through the use of focus group,
documental sources and interviews, allowed anchoring the work in the triple dialectical
movement of critical thinking, knowledge construction and new synthesis.
The analysis of results about the training and supervision in Social Work education,
emphasizes that these constituted inseparable dimensions in the teaching-learning process,
supported by the alliance between student-teacher-supervisor-citizen. The supervision
sustained by a collaborative and participatory pedagogy with a central role in research and
in the articulation between knowledge-action/theory-practice has highlighted creativity and
innovation in pedagogical training, which is the condition for future inventive practices.
2
“Sou, em grande parte, a mesma prosa que escrevo”.
Fernando Pessoa,
Livro do Desassossego,
1999
3
IN MEMORIAM
4
AGRADECIMENTOS
5
Ao Zé que paciente e solidariamente acompanhou este processo e à Sara que soube segurar com o
seu fraterno abraço as duras batalhas vividas.
Às amigas Mirene pela persistente amizade e companheirismo para prosseguir nos momentos mais
difíceis, à Fátima e à Brisa que aceitaram colaborar na revisão da tese, à Isabel que, sempre que foi
necessário, esteve disponível no apoio logístico do focus group e na transcrição e à Catarina que
paciente e generosamente colaborou na logística final.
À Professora Doutora Fernanda Rodrigues pela confiança, apoio e crédito depositado ao ter aceite
ser minha orientadora.
Ao Professor Doutor José Paulo Netto, tão longe e tão perto, uma presença intelectualmente
orientadora e instigante na licenciatura, um pronto acolhimento e o maior estímulo ao percurso no
mestrado, uma permanente inspiração à reflexão teórica no percurso da profissão.
À Professora Doutora Glória Franco que teve a capacidade de acolher o curso de Serviço Social na
UMa e a perseverança de melhor o adaptar aos objetivos da formação, conforme esta tese expõe.
Aos colegas do curso de doutoramento pela convivência académica, a partilha e o debate em aulas.
6
ÍNDICE
Índice de Quadros................................................................................................................ 9
Índice de Figuras ............................................................................................................... 10
Siglas ou Acrónimos .......................................................................................................... 11
Introdução .......................................................................................................................... 13
Capítulo 1– Racionalidade Moderna, Conhecimento e Formação no Serviço Social em
Tempos de Crise ................................................................................................................ 22
1.1 – Desafios e Compromissos na Sociedade Complexa: Mediação e Regulação na
Proteção Social ................................................................................................................... 24
1.1.1- Desequilíbrio, Instabilidade e Desvalorização dos Direitos Sociais ..................... 25
1.1.2- Padrão Societário de Civilidade: uma Miragem na Crescente Desigualdade e
Exclusão Social ............................................................................................................... 30
1.2- Conhecimento, Autonomia e Emancipação – Espaço de Poder, Saber, Ética e
Expertise.............................................................................................................................. 36
1.2.1- Locus de Identidade do Serviço Social: a Ética do Poder Profissional na Força da
Razão Comunicacional do Mundo da Vida ..................................................................... 37
1.2.2- Ajuda e Proteção na Perícia do Saber ................................................................... 49
1.3- Universidade, Ensino Superior e Formação: Quando o Serviço Social se Expande
............................................................................................................................................. 56
1.3.1 – A Universidade em Transição: Ensino e Aprendizagem ..................................... 57
1.3.2 – A Integração do Curso de Serviço Social no Ensino Universitário ..................... 62
1.4 – Lugar da Supervisão no Estágio: Pedagogia para a Transformação e Autonomia
............................................................................................................................................. 66
1.4.1 – Transformação e Autonomia na Pedagogia ......................................................... 66
1.4.2 - O Estágio Curricular em Serviço Social .............................................................. 74
1.4.3– Supervisão: Indivisibilidade Pedagógica no Modelo Reflexivo e Transformativo
......................................................................................................................................... 80
1.4.3.1 – Supervisão Académica ................................................................................. 81
1.4.3.2 – Supervisão Local .......................................................................................... 85
1.4.3.3 – Fórum de Reflexão Crítica de Identidade Profissional ................................ 92
Capítulo 2 – Estratégia Metodológica e Técnicas, Ética e Validade da Pesquisa ........ 94
2.1- Enfoque e Metodologia da Pesquisa: Justificação ................................................... 94
2.2- Técnicas de Recolha de Dados, Participantes e Procedimentos ............................. 98
2.3- Tratamento e Análise de Dados .............................................................................. 107
Capítulo 3 - Emergência e Plano do Curso em Serviço Social numa Universidade
Pública .............................................................................................................................. 112
3.1- Condições de Surgimento do Curso: sob a Promessa do Mercado de Trabalho e o
Lugar das Ciências Sociais.............................................................................................. 113
3.2- Descentralizar a Gestão Organizacional pela Cultura Construtiva .................... 119
3.3- Projeto de Serviço Social e Plano Curricular no Curso: um “Tripé” de
Conhecimentos e Competências ..................................................................................... 123
3.3.1- Projeto de Serviço Social na Formação do Curso ............................................... 123
3.3.2- Estrutura do Plano Curricular .............................................................................. 133
Capítulo 4- Estágio Curricular e Supervisão: Refundar a Pedagogia........................ 144
4.1- Estrutura Organizativa e Objetivos do Plano de Estágio..................................... 145
4.2- Processo de Ensino-Aprendizagem e Pedagogia Participativa no Estágio ......... 159
4.2.1- Etapas de Estágio e Dinâmicas na Metodologia de Projeto ................................ 159
7
4.2.2- Relação Estudante-Cidadão ................................................................................ 176
4.3- Desafios à Formação em Serviço Social: a Investigação como Aliada nos
Contributos do Estágio.................................................................................................... 178
4.4 – Supervisão e Aprendizagem Colaborativa ........................................................... 194
4.4.1- Singularidades de um Processo de Supervisão Pedagógica: Saberes Integrados 195
4.4.1.1- Perspetiva de um Modelo Pedagógico em Quatro Andamentos .................. 195
4.4.1.2- Potencialidades e Limites na Perspetiva de um Modelo Académico de
Ensino-Aprendizagem na Supervisão ........................................................................ 215
4.4.2- Orientador e Orientação: Prática Profissional ao Serviço da Formação ............. 222
4.5- Supervisão, Autonomia e Emancipação: Resultados ............................................ 227
Palavras e Perspetivas para uma Conclusão ................................................................. 233
Bibliografia ....................................................................................................................... 256
Anexo A ............................................................................................................................ 271
Guião das Técnicas: Focus Group e Entrevista ............................................................ 271
Anexo B............................................................................................................................. 273
Termo de Consentimento Informado, Livre e Declarado ............................................ 273
Anexo C: Transcrições do Material Empírico (CD-ROM)
Anexo D: Memorandos e Análise de Conteúdo (CD-ROM)
8
ÍNDICE DE QUADROS
Quadro n.º 1
Informantes nas Técnicas de Recolha Empírica: Estudantes, Orientadores Cooperantes e
Docentes ............................................................................................................................ 103
Quadro n.º 2
Informantes Finais segundo as Técnicas – Focus Group e Entrevista .............................. 104
Quadro n.º 3
Definição de Serviço Social – Estudantes ......................................................................... 128
Quadro n.º 4
Definição de Serviço Social – Docentes e Orientadores Cooperantes .............................. 130
Quadro n.º 5
Áreas Científicas e Distribuição de ECTS - Licenciatura em Serviço Social ................... 135
Quadro n.º 6
Área Científica de Serviço Social: Distribuição e Créditos .............................................. 137
Quadro n.º 7
Taxa de Aprovação Comparada ........................................................................................ 140
Quadro n.º 8
Curso de Serviço Social nas Universidades Públicas em Portugal (2010) ........................ 146
Quadro n.º 9
Estudantes Estagiários e Grandes Setores de Atividade com Estágio ............................... 151
Quadro n.º 10
Estudantes Estagiários por Ano Letivo e Áreas Setoriais ................................................. 151
Quadro n.º 11
As Problemáticas/Campos Temáticos Trabalhados no Estágio ........................................ 152
Quadro n.º 12
Evolução nos Orientadores Cooperantes em Estágio ........................................................ 155
Quadro n.º 13
Estágio: Contributos para a População .............................................................................. 183
Quadro n.º 14
Estágio: Contributos para a Equipa Institucional .............................................................. 185
Quadro n.º 15
Estágio: Contributos para a Instituição de Acolhimento ................................................... 186
Quadro n.º 16
Estágio: Contributos para o Serviço Social ....................................................................... 189
Quadro n.º 17
Estágio Curricular: Contributos segundo os Docentes SupervisoresErro! Marcador não
definido.
9
ÍNDICE DE FIGURAS
Figura n.º 1
Atributos de Cultura de Gestão ......................................................................................... 120
Figura n.º 2
Princípios e Valores ........................................................................................................... 124
Figura n.º 3
Diagnóstico-Planeamento-Execução-Avaliação: Estágio e Práxis Auto-criativa ............. 163
Figura n.º 4
Estágio Curricular: Processo ............................................................................................. 177
Figura n.º 5
Estágio: Contributos para a Formação do Estudante ......................................................... 179
Figura n.º 6
Estágio segundo o Projeto de Serviço Social – Contributos apontados pelos Estudantes 182
Figura n.º 7
Estágio Curricular: Contributos Globais segundo os Estudantes ...................................... 190
Figura n.º 8
Estágio Curricular: Contributos segundo os Docentes Supervisores ................................ 192
Figura n.º 9
Estágio Curricular: Contributos segundo os Orientadores Cooperantes ........................... 192
Figura n.º 10
Desafios do Estágio à Profissão de Serviço Social Hoje ................................................... 193
Figura n.º 11
Supervisão em Quatro Andamentos .................................................................................. 196
Figura n.º 12
Supervisão na Perspetiva dos Estudantes .......................................................................... 205
Figura n.º 13
Outputs da Supervisão: Perspetivas dos Estudantes ......................................................... 220
Figura n.º 14
Supervisão e Autonomia .................................................................................................... 229
10
SIGLAS OU ACRÓNIMOS
11
Lisboa
ISCTE-IUL – Instituto Superior das Ciências do Trabalho e da Empresa- Instituto
Universitário de Lisboa
ISEG – Instituto de Economia e Gestão
ISPG – Instituto Superior Politécnico de Gaia
ISS – Instituto da Segurança Social
ISSSL – Instituto Superior de Serviço Social de Lisboa
MUE – Modelo Unificado Europeu
NASW – Associação Norte-Americana de Assistentes Sociais
OCDE – Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico
PUC-SP – Pontifícia Universidade Católica- São Paulo
RAM – Região Autónoma da Madeira
RSI – Rendimento Social de Inserção
SESARAM – Serviço de Saúde da Região Autónoma da Madeira
SNPSS – Sindicato Nacional dos Profissionais de Serviço Social
SRAS – Secretaria Regional dos Assuntos Sociais
SWOT - Strengths, Weaknesses, Opportunities e Threats
UA – Universidade dos Açores
UC – Universidade de Coimbra
UCP – Universidade Católica Portuguesa
UE – União Europeia
UFP – Universidade Fernando Pessoa
UL – Universidade Lusíada
UMa – Universidade da Madeira
UNESCO – Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura
UTAD – Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro
12
INTRODUÇÃO
A presente tese enquadra-se no programa de doutoramento da Universidade Católica
Portuguesa, Lisboa, terceiro curso.
1
As funções de docente, de coordenadora de estágio e de diretora de curso, desenvolvidas pela autora desta
tese no curso do 1.º ciclo de Serviço Social na Universidade da Madeira (universidade pública), entre 2005 e
início de 2012, proporcionaram uma importante experiência, traduzida aqui em objeto de estudo.
13
O projeto profissional defendido apoia-se num “novo contrato social” e é orientado pelo
princípio da inclusão social e da autonomia individual e coletiva em contexto de
globalização e crise societal2. Pretende defender, conforme Helena Nunes (2004), um
conhecimento-emancipação heterogéneo, de abertura e de participação do sujeito num
exercício de diálogo intersubjetivo e de cognição mediante uma prática de estágio de
natureza “inventiva”, com interação humana entre estudantes, docentes e orientadores
cooperantes. A formação em Serviço Social promove o desenvolvimento das competências
através da convocação à reflexão, à racionalidade intersubjetiva, comunicacional e de
cognição; enfatiza um modelo inventivo baseado numa prática de interação humana, de
conhecimento de si e do outro, de mobilização de recursos e de potencialidades inerentes
aos sujeitos sociais, com vista à conceção de saberes cooperantes e emancipadores. Em
suma, procura-se superar a racionalidade instrumental. Rompe-se com as estratégias do
imediatismo da prática e da dependência do sujeito, estratégias estas assentes no paradigma
normativo/burocrático da intervenção em Serviço Social, traduzido por um conhecimento
homogéneo, de ocultação e de negação do sujeito, centrado na hierarquia e apoiado na
individualização socialmente redutora.
A coexistência, durante um certo período, da investigação no âmbito desta tese com a ação
docente no curso em estudo −, designadamente nas funções de supervisão assumidas pela
autora, que implicaram naturalmente o acompanhamento direto do estágio curricular −
2
Teve relevo na presente tese, e foi elemento de inspiração, a obra de Helena Nunes (2004). Esta obra foi
estudada na unidade curricular de Estudos Aprofundados de Serviço Social, em 2008, no III curso de
doutoramento da Universidade Católica de Lisboa, lecionada por Fernanda Rodrigues, orientadora da
presente tese. Foi um importante contributo desde a fase exploratória do projeto de tese.
3
Sobre a pesquisa qualitativa, Blackie (2000) defende a estratégia abdutiva, que se carateriza por ter como
ponto de partida, ao invés de teorias, a descoberta dos diferentes níveis de conceitos, significados e
motivações dos sujeitos e, como ponto de chegada, a aproximação ao desenvolvimento de alguns contributos
para a construção de uma teoria interativamente assente na realidade social (conforme texto de apoio cedido
por Francisco Branco, docente no Seminário de Investigação, III Curso de Doutoramento, UCP, 2008, com
particular atenção ao capítulo 4, “Estratégias para responder a questões de investigação”, versão traduzida).
4
Na pista do “desejo de solidariedade” por oposição ao “desejo de objetividade”, nas palavras de Rorty
(1994, cf. Pires, 2010: 43).
14
permite fazer um paralelo com Groulx (1994) no que respeita ao estímulo à aliança entre
conhecimento e ação (cf. Branco, 2008) ou Baptista (2001), ao fazer a defesa do tríplice
movimento dialético: de crítica, de construção de conhecimento novo e de nova síntese,
num movimento em espiral, na relação ação-conhecimento-ação.
A referida coexistência pode ser também associada a Schwandt (2006) quando este
defende que a ação e o pensamento, a prática e a teoria estão ligados a um processo
contínuo de reflexão crítica e de transformação. De modo semelhante, aproxima-se da
proposta de Santos quanto à necessidade emergente de um novo paradigma associado a um
discurso cívico que perspetive a análise social como hermenêutica do concreto e ética da
modernidade, em cuja base está a tese da complementaridade e interdependência entre
reflexão epistemológica, ética, moral e política, sustentando a ideia de uma sociedade justa
(Santos, 1994; 1996a; Nunes, 1996; Ferreira, 2008). Significa que este projeto partiu da
ação docente da autora sobre a formação dos estudantes até à produção/síntese de
conhecimento, para uma possível retroalimentação da ação, passando necessariamente por
recolha empírica de informação.
15
O exercício da função de supervisão, associado à formação em Serviço Social, torna-se
uma questão desafiadora. Para Buriolla (1996) a supervisão é um processo de formação da
matriz de identidade profissional (1996: 30). Para Lewgoy (2007), é um processo
complexo de mediações que convoca à apreensão da realidade concreta da sociedade, da
profissão, da universidade, do processo de ensino-aprendizagem, dos campos de estágio e
dos cidadãos, sujeitos da ação do assistente social. Constitui-se como espaço afirmativo de
uma formação orientada para a garantia de um espaço efetivo de autonomia, ou não-tutela,
de criatividade, de ensino-aprendizagem e de ancoragem para enfrentar a realidade social5.
5
A autora Alzira Lewgoy foi muito importante no presente projeto sobre supervisão curricular. Os
contributos dados pela sua tese, de 2007, acedida pela internet em 2008, foram ainda complementados
através de contactos diretos com a autora, também via internet. Teve igualmente grande importância o
Comparative European Social Research and Theory (CESRT), 2007, acedido em 2009. Em julho de 2012,
vários artigos foram consultados, bem como algumas outras teses, de mestrado e doutoramento. Foi também
significativo o consistente trabalho publicado no Brasil por Marta Buriolla (1996), que dedicou dois livros ao
tema, especificamente um ao estágio, outro à supervisão de estágio e que, desde logo, traçou o panorama
sobre o reduzido destaque dedicado até então à matéria, situação essa pouco alterada até hoje.
16
processo de ensino-aprendizagem, no âmbito do plano de estudos em Serviço Social, na
UMa, entre 2005 e 2011, se direciona para a autonomia individual e coletiva, pretendendo
criar bases para superar o imediatismo e combater a normalização e a burocracia na
regulação da proteção social. Parte do pressuposto de que, em contexto da sociedade
portuguesa, a supervisão na agência do Serviço Social é um apoio profissional quase
inexistente, tendo um baixo reconhecimento, e de que quando existe tem uma prevalência
na dimensão técnico-operativa, ou instrumental, centrada no foco hierárquico. Outras duas
hipóteses exploratórias podem ser enunciadas assim: em contexto da prática de estágio, a
supervisão na formação interpõe-se no combate à dicotomia entre teoria e prática,
investigação e ação, autonomia e dependência, subjetividade e racionalidade instrumental;
o estudante formado no processo de ensino-aprendizagem para a autonomia e emancipação
desenvolve a compreensão e reflexividade para poder replicar essa estratégia junto dos
cidadãos na sua condição de sujeitos da ação.
17
profissional, analisando as mudanças no tempo, junto de estudantes com processo de
supervisão nas três primeiras turmas formadas na UMa pelo respetivo plano de estudos, ou
seja, junto da primeira turma, que concluiu o curso em 2008-09, da segunda, em 2009-10, e
da terceira, em 2010-11.
A tese em curso tem a sua atenção repartida por cinco capítulos. Depois da presente
introdução, segue-se a exploração de conceitos sensitivos/sensibilizadores em resultado da
revisão da bibliografia, conceitos esses que inspirarão/guiarão a investigação. Abrange o
primeiro capítulo, subdividido em dois eixos, o eixo societal, ou o macrocontexto, e o eixo
de ensino-aprendizagem, subdivididos em quatro linhas de orientação. No primeiro eixo, a
primeira linha situa as bases societais na ideia de que o defendido projeto da profissão de
Serviço Social se apoia, através do compromisso ético da profissão de assistente social,
num estatuto profissional público inscrito na satisfação das necessidades sociais de bem-
estar, locus da identidade profissional situado na modernidade reflexiva de um mundo
complexo, de riscos e incertezas.
8
Esta metodologia, aplicada na formação do curso da Universidade da Madeira, foi objeto de intensos
contactos com vários docentes envolvidos em cursos de formação na licenciatura em Serviço Social, tendo no
curso da Universidade Católica Portuguesa de Lisboa um importante contributo, com a disponibilização de
documentos de apoio à unidade curricular de estágio. Foi apoio fundamental também o manual de Guerra
(2000), Fundamentos e Processos de uma Sociologia de Ação, Estoril: Principia.
18
A segunda linha, ainda no mesmo eixo, analisa, mais especificamente, o campo do
conhecimento do Serviço Social, numa perspetiva multidisciplinar quanto à compreensão e
análise da autonomia e emancipação em sociedade, e defende o saber e o poder na
jurisdição do exercício profissional. Equivale a aprofundar o compromisso desenvolvido,
por via da proposta educativa da formação, sondando os alicerces éticos, mas também
teóricos e teórico-metodológicos preconizados pelo projeto em Serviço Social.
19
apontar pistas para a (re)construção da teoria sobre estágio e supervisão, pistas essas
passíveis de servir de base para uma prática reflexiva e transformadora na formação
experiencial em Serviço Social9.
20
À conclusão, seguem-se a bibliografia pesquisada e os anexos de apoio ao estudo, a saber:
anexo A- guião das técnicas; anexo B- termo de consentimento informado; anexo C-
transcrição do material empírico (CD-ROM); anexo D- memorandos e análise de conteúdo
(CD-ROM).
Para resumir, e pelo que foi defendido anteriormente, na base da escolha do tema está
acima de tudo a necessidade de um sustentado e alargado debate acerca da categoria
profissional, em todas as dimensões da aplicação da supervisão pedagógica e dos impactos
face à real ausência de pensamento próprio na produção científica e académica na
profissão, quer a nível global da mesma, quer em desenvolvimento de competências e
habilidades nas questões da pedagogia e da aprendizagem, nomeadamente através de
estratégias de articulação entre teoria e prática, investigação, aliança e rede no espaço da
formação em Serviço Social.
O caminho percorrido por esta tese representa um pequeno contributo face ao muito que
poderá fazer-se, em termos de compreensão e explicação sobre a estrutura e consolidação
do projeto educativo e pedagógico na formação em Serviço Social, hoje inscrito em todo o
país e com alguma expressão na universidade pública desde o século XXI e, por isso,
também urge pesquisar, compreender e analisar este mais recente contexto do processo.
21
CAPÍTULO 1– RACIONALIDADE MODERNA, CONHECIMENTO E FORMAÇÃO NO SERVIÇO
SOCIAL EM TEMPOS DE CRISE
“A nossa razão que nos parecia o mais seguro meio de conhecimento, descobre nela uma
mancha cega” (Morin, 1987).
Pensar a profissão exige desconstruir as manchas cegas da sua razão, transpor as fronteiras
do seu universo, olhar para as transformações da sociedade e perceber como influenciam a
direção, o conteúdo e as condições em que a profissão forma e desenvolve a sua atividade.
Partindo de uma visão exógena ao Serviço Social acerca dos desafios que lhe são
colocados, e tendo em consideração o quadro histórico da sua emergência em situação de
modernidade societal, a presente tese pretende revelar mudanças assumidamente
complexas, a partir da matriz de solidariedade e democracia em que se afirmou no
Ocidente, ou seja, através de um sistema social de direitos de proteção na regulação da
cidadania, hoje em contexto de paradoxos, riscos e incertezas com que se confronta.
Significa que pensar a formação em Serviço Social não pode apenas contemplar valores,
instituições pedagógicas e de agência stricto senso, mas inseri-la na dinâmica dos direitos
sociais e da justiça social, no aprofundamento democrático em que se sustenta a profissão.
Consequentemente, torna-se necessário contextualizá-la no marco das relações sociais
historicamente situadas na nossa sociedade, ou seja, no marco das relações
Estado/sociedade civil, distribuição económica e redistribuição de serviços e bens, cujo
grau de acessibilidade nos conduz à dialética inclusão/exclusão no Estado de Bem-
Estar/Estado de Providência. Os parâmetros dessa dialética circunscrevem-se nos
movimentos históricos da democratização e do progresso, mas também nos movimentos do
presente com a globalização e as mudanças de conceção de risco social e individualização
na modernidade reflexiva. Vale dizer e pensar que o Serviço Social, desde a formação
académica, requer atenção às mudanças societais e à conceção de risco, solidariedade e
responsabilidade nas políticas sociais, cidadania e conceção dos direitos civis e sociais.
Como tão bem destacam Iamamoto (1992) e Sposati (1992), a vocação sócio histórica do
Serviço Social acompanha o movimento social, as transformações e permanências das
relações entre o Estado e a sociedade. Compreender as mudanças conduz também ao
conhecimento sobre a mediação em Serviço Social, defendida por uma atividade
22
profissional comprometida publicamente com a satisfação das necessidades de bem-estar
social e num quadro de regulação das políticas públicas. Preconiza uma sociedade justa e
equitativa, com aprofundamento da democracia, para uma cidadania ativa de direitos,
regulação estatal de despesas em bens e serviços nas infraestruturas coletivas, o que
significa sustentar o debate sobre a autodeterminação, autonomia e emancipação do
sujeito, confrontando, questionando e dialogando com as matrizes do fazer profissional.
Essa perspetiva traduz-se pela direção política do projeto profissional em Serviço Social e,
de acordo com Netto, significa convergir para apoiar-se na equidade e na justiça social,
através de um projeto radicalmente democrático, “considerada a democratização com
socialização da participação política e da riqueza socialmente produzida” (2010: 16).
23
e significados, tais como conhecimento, autonomia e emancipação, cuja reflexão faz-se a
partir da teoria da razão comunicacional e a não linearidade do conhecimento.
O terceiro e o quarto subcapítulo sensibilizam para uma maior aproximação aos conceitos
sobre o quadro de referência sensibilizador para o projeto da formação, a dimensão por
excelência desta tese, situando o ensino na formação superior e na universidade, dando
ênfase à educação e à pedagogia requeridas no processo de estágio e na supervisão. Por
conseguinte, os contributos para a análise neste capítulo têm origem em diferentes
disciplinas da área científica das ciências sociais, abrangendo a multidisciplinaridade e
complexidade do conhecimento sobre os fenómenos sociais. Assim sendo, e para além do
Serviço Social, contribuem as Ciências da Educação, a Economia, a Filosofia, a
Sociologia, a Pedagogia e a Psicologia, pois, conforme Deslauriers & Kérisit “é necessário
ler o que se escreve sobre o tema e sondar os domínios que podem esclarecer a questão”
(2008: 135). Portanto, o subcapítulo sobre universalidade, ensino superior e formação
antecederá o do estágio e o da supervisão.
10
Santos usa a expressão pós-modernidade enquadrando-a num contexto de debate epistemológico,
questionando o paradigma dominante na sua versão positivista que separa o sujeito do objeto, natureza e
sociedade/cultura, conhecimento científico e senso comum, ou seja, que reduz a complexidade do mundo a
leis matemáticas. Trata-se para Giddens de um conhecimento reflexivo, de que as ciências sociais são a
versão formalizada (um género específico de conhecimento pericial), considerando verdadeiramente
fundamental a reflexividade sobre a modernidade como um todo (2002: 28).
24
de análise que se seguem na reflexão deste subcapítulo, procurando distingui-las pelo
contraste entre a promessa do progresso e as desigualdades sociais que se revelam no
espaço da sociedade portuguesa.
Neste âmbito, Scott Lash adverte para a necessidade de que na modernização reflexiva, a
capacitação dos sujeitos possa abrir caminho à individualização, o que requer
possibilidades de afirmação da subjetividade autónoma em relação ao ambiente natural,
social e psíquico (Beck, Giddens & Lash, 2000)11. Muito particularmente, vencer na
reflexividade depende da posição ocupada no modo de informação, na medida em que “as
oportunidades de vida na modernidade reflexiva não são uma questão de acesso ao capital
produtivo ou às estruturas de produção, mas de posição [e de acesso] nas novas estruturas
de informação e comunicação” (Beck, Giddens & Lash, 2000: 116). Anteriormente, já
Castel falava acerca do homem “hipermoderno por diferença”, situando-o nesta nova era
em que se assiste à degradação da condição salarial (Castel, 1998: 534).
11
A partir da obra de Beck, sobre o choque antropológico e o sujeito contemporâneo, face à conformação das
políticas nas sociedades contemporâneas, Ianni (2012) sublinha a perceção da fragilidade do indivíduo no
bojo da insegurança sobre o perigo e simultaneamente a profunda fragilidade das instituições modernas. Para
Lasch (2000) enquanto que no capitalismo industrial as oportunidades de vida e as desigualdades de classe
dependiam da posição do agente no modo de produção e do acesso ao mesmo, na modernidade reflexiva as
oportunidades de vida, ou seja, os que serão vencedores da reflexividade e perdedores, dependem da posição
ocupada no modo de informação.
25
Perante as novas dificuldades e riscos, os autores propõem a interceção entre processos
societais, sistemas, instituições e organizações, configurações comunitárias, grupos, redes e
biografia, assente em quatro parâmetros: i) acesso a um nível mínimo de segurança
económica; ii) comunidade com coesão social; iii) empowerment e capacitação para o
desenvolvimento de competências; iv) experiência de um nível básico de inclusão e
igualdade de oportunidades (Beck et al., 2001, cf. Capucha, 2005).
Coloca-se, então, o desafio ao nível dos direitos sociais, instrumento essencial da cidadania
e uma das marcas de sucesso das sociedades de capitalismo avançado12. Estas conquistas
associam-se ao Estado-Providência, ou de Bem-Estar, que é um Estado onde o poder
organizado é deliberadamente usado, através da atuação política e da administração, para
alterar o funcionamento dos mercados em três dimensões: rendimento; segurança na
doença e no desemprego e acesso aos serviços sociais (Briggs, 1961, cf. Pereirinha, 2008).
Esta definição coloca-se no âmbito das funções sociais do Estado, conforme se
apresentavam os Estados-Providência mais desenvolvidos na Europa nos anos 60,
identificados com objetivos de política social, através da gestão de riscos sociais e sob a
forma de direitos sociais na doença, desemprego, ou velhice, ou ainda na redistribuição de
recursos, assegurando um rendimento mínimo a todos os cidadãos, independente do valor
mercantil da sua riqueza ou de fornecimento de serviços sociais, cuja provisão tinha como
pressuposto responder a razões de equidade e/ou de eficiência13.
12
São instrumentos desse progresso a Carta das Nações Unidas (1945), a Declaração Universal dos Direitos
Humanos (1948), o Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos (1966), Pacto Internacional sobre os
Direitos Económicos, Sociais e Culturais (1966), para além de outros instrumentos específicos de proteção.
13
Pereirinha sublinha a origem do termo de Estado-Providência pela tradução do termo “Welfare State”, com
lugar na Inglaterra em 1941, cujo modelo foi implantado na sequência da publicação do Relatório Beveridge
26
Diversa nos vários países em % do PIB, a proteção social teve tendência decrescente a
partir da década de 80, por várias razões, mas aonde influiu, com peso, a afirmação do
modelo neoliberal. Para o último ano disponível, 2009, segundo dados da Eurostat, a média
da UE é de 29,5% do PIB, estando Portugal com 27%, a par da Grécia, mas acima da
Espanha (25%) e abaixo da Itália (29%). Nos países escandinavos, a Dinamarca atinge
33%, a Suécia 32%, a Finlândia, 30% e a Noruega 26%. Nos continentais, a França atinge
33%, a Alemanha 31% e a Inglaterra 29% do PIB. Para Pedro Hespanha (2001) os direitos
sociais vêm perdendo sustentabilidade, com desvalorização deslizante nos países
consolidados e com adiamento da sua institucionalização nos países em expansão.
Na crise atual do capitalismo democrático, a tensão tem sido crescente, como atestam
estudos mais recentes. Para Streeck, a crise desloca-se ora nas exigências democráticas por
justiça social, ora na justiça económica. O recente colapso do sistema financeiro resultou
em crise económica e política com dimensões globais, designadamente nas finanças
públicas, um distúrbio que não está isolado, mas que para aquele autor, é parte da tensão
nas sociedades capitalistas avançadas, “uma tensão que faz do desequilíbrio e da
instabilidade regra” (Streeck, 2011: 35).
em 1942. É pertinente o quadro apresentado pelo autor, apoiado em Kudrle & Marmor (1984), sobre as datas
de introdução das primeiras medidas sociais que constituem o atual sistema de Segurança Social: seguro de
doença, de acidentes de trabalho, de velhice, de desemprego, de saúde e prestações familiares, a primeira das
quais, o seguro de doença, remonta a 1883, na Alemanha (2008: 18).
27
por um Estado centralizador, com excesso de burocracia, oscilando entre extrema rigidez e
flexibilidade, baixa cobertura estatal em despesas e serviços. Além disso, combina
corporativismo, universalismo e liberalismo, tolerância a atividades paralelas, informais e
ilegais e fraca capacidade reguladora, permeável à instrumentalização por grupos de
interesses que, neste modelo, têm um lugar e papel de relevo.
Para Santos (1985), Portugal como uma sociedade de semiperiferia, em contexto europeu,
ou de desenvolvimento intermédio, apresenta algumas caraterísticas sociais que o
aproximam das sociedades desenvolvidas, como por exemplo, a taxa de crescimento
populacional, leis, instituições e práticas de consumo, enquanto outras caraterísticas, como
as infraestruturas coletivas, políticas culturais, tipo de desenvolvimento industrial, entre
outras, aproximam-no de sociedades menos desenvolvidas. O seu caráter de país
semiperiférico revela-se através da sua posição, mais contingente e vulnerável, ocupada no
sistema mundial, expresso através do caráter heterogéneo do Estado e da descontinuidade
da sua estrutura social. A posição de semiperiferia de Portugal assenta nos seus papéis de
intermediação entre o centro e a periferia, com descoincidência entre a estrutura social e as
relações de produção, de reprodução social e desarticulação interna entre elas (Santos,
1985).
O país carateriza-se também por falta de capacidade para gerar parceiros sociais, com
consequente hipertrofia da regulação estatal, por não ser um Estado-Providência em
sentido técnico, sem adequação das políticas sociais, com distribuição seletiva e autoritária
de benefícios, sujeita a critérios subjetivos de agentes e serviços que criam nos clientes, ou
destinatários, situações de dependência e de sujeição, de punição ou de recompensa
(Santos, 1996)14. Portanto, um Estado centralizador e autoritário, mas que não corresponde
a um Estado forte, cuja burocracia oscila entre a extrema rigidez, distância e formalismo
com que trata o cidadão anónimo e a extrema flexibilidade, intimidade e informalidade
com que trata o cidadão conhecido e com boas referências.
14
Portugal como sociedade semiperiférica renegoceia a sua posição no sistema mundial, findo o ciclo do
império, com sinais de despromoção. Para Santos (1996), Portugal apresenta um modo específico de
formação de rendimentos, em particular o peso de rendimentos não-salariais das famílias, o trabalho infantil,
ao lado de salários em atraso, umas e outras práticas e representações sociais típicas de sociedades centrais ao
lado de representações típicas de sociedades periféricas. Portugal tem uma sociedade civil desorganizada e
fraca e um poder público com desenvolvimento exagerado do regime administrativo.
28
Estado Democrático com efeitos duradouros, ao nível da relação entre as agências estatais
e os cidadãos e na própria perceção das prestações sociais, não como direitos, mas como
benefícios15. Conhecendo as suas práticas, trata-se de um Estado paralelo com maciça
discrepância entre os quadros legais e as práticas com consequências para a área da
Assistência Social, caraterizada pela manutenção de não direitos, desconhecimento dos
direitos, estigmatização no acesso, pautada pela arbitrariedade dos serviços, escassez de
recursos, atribuição diferenciada de apoios para situações idênticas, culminando com
práticas discricionárias de comprovação da situação de carência (Hespanha et al., 2000:
102, cf. Santos, 2002)16.
Hespanha (2001) carateriza o modelo social português da seguinte forma: i) uma menor
cobertura estatal, quer em despesas, quer em bens e serviços; ii) diversidade de fontes de
assistência, com significativo peso de instituições ligadas à Igreja Católica; iii) importância
da solidariedade familiar na segurança dos seus membros em face do défice de proteção
social estatal; iv) ambiguidade na delimitação das fronteiras e responsabilidades sociais
entre o setor público e privado, com presença de práticas de tipo clientelar e paternalista.
Neste âmbito, o Estado-Providência apresenta natureza híbrida, combinando
corporativismo, universalismo, liberalismo com uma sociedade corporativa, solidária e de
mercado. Segundo este autor, o modelo social traduz-se ainda por: i) picos de generosidade
e défices de proteção; ii) institucionalização universal a partir do corporativismo (saúde);
iii) baixo grau de participação do Estado na proteção social (complementado com atores e
instituições públicas e privadas); iv) persistência de clientelismo e apropriação
particularista dos recursos de proteção social. Em suma, verifica-se um baixo nível de
despesa pública, curtas medidas e de alcance ineficiente, (des)empregados e reformados
abaixo da linha de pobreza, com limitado grau de desmercadorização.
Não obstante a sua sujeição a um acordo inter-estados no espaço europeu, com tendencial
convergência das políticas sob regulação supranacional da UE, Portugal apresenta um
15
Para Santos (2002), as caraterísticas centrais de um Estado-Providência são um pacto social entre capital e
trabalho sob a égide do Estado, com o objetivo de compatibilizar democracia e capitalismo; relação
sustentada entre a promoção da acumulação capitalista, crescimento económico e salvaguarda da
legitimação; elevado nível de despesas no consumo social; e burocracia estatal que internalizou os direitos
sociais como direitos de cidadania.
16
O início do declínio do Estado paralelo fez-se sentir desde a entrada de Portugal na UE (Santos, 1990). Nas
hipóteses tecidas sobre o Estado e o poder social em Portugal, o autor defende que ao nível da sociedade civil
o espaço doméstico é mais forte em Portugal, preenchendo algumas lacunas da providência estatal.
29
Estado-Providência não completo, em fase de globalização e crise, com crescentes riscos
vivenciados por vários grupos sociais, persistência de pobreza e exclusão social17. Esta
situação manter-se-á em crescendo face ao endividamento e consequente resgate financeiro
sustentado pelo processo de imposição dos agentes internacionais a quem Portugal fez
recurso para o respetivo empréstimo, vulgarmente designada no seu conjunto por Troika,
constituída pelo Fundo Monetário Internacional, Banco Central Europeu e Banco Mundial.
Como consequência de todo este processo, tem-se revelado a intensificação de programas e
de medidas, nomeadamente a alteração ao Código do Trabalho, crescentes custos na saúde
(com taxas mais elevadas e menos comparticipação) e abaixamento no valor pecuniário das
reformas e outras prestações sociais (subsídio de desemprego, abono de família,
rendimento social de inserção) a par de um crescente aumento de impostos com
acumulação de sucessivas desvantagens, designadamente na desvalorização do nível dos
salários, com crescente desigualdade e injustiça social, fortemente influenciadas nos
orçamentos anuais do Estado, com sequelas no aprofundamento da desigualdade social.
17
A estratégia da UE é tornar-se a região mais competitiva do mundo com base na inovação e no
conhecimento. A Cimeira de Luxemburgo, 1999, e a Estratégia de Lisboa, 2000, apoiaram-se em mais e
melhor empregabilidade e mais coesão social – políticas sociais ativas centradas na formação e qualificação
profissional – mito do pleno emprego como fator de integração social. As orientações centrais nas políticas
assentam em: i) ajustamentos estruturais em resposta à evolução sociodemográfica nas pensões, saúde,
contratualização do emprego; ii) direcionamento dos recursos para as pessoas mais vulneráveis; iii) passagem
da abordagem passiva para a ativa na gestão do regime relativo à incapacidade de trabalho pela reabilitação e
inserção social; iv) redução da tributação do trabalho; v) tensão no aprofundamento do modelo social ou na
restrição em matéria de proteção social.
30
pelo menos um dos seis anos; 6,5% persistentemente na pobreza (Costa et al., 2008:
103)18. Conforme os mesmos autores, se o risco de pobreza é passar pelo menos um ano na
pobreza, o facto de 54% ter passado durante três ou mais anos e 72% em pelo menos dois
anos, significa que o risco de pobreza está mais próximo da situação de pobreza efetiva;
dois anos de pobreza, num período de seis anos, refletem persistência de pobreza,
definindo a situação como pobreza em sentido lato (Costa et al., 2008: 105). Caraterizando
a pobreza como um fenómeno insuspeitamente extenso, as taxas, em sentido lato, foram de
48% na Madeira, 53% nos Açores e 51% no Algarve, as regiões mais destacadas (Costa et
al., 2008: 107, gráfico 2.2)19. São 38% os agregados alguma vez pobres, que têm as
pensões como única fonte de rendimento e, mais de metade desses têm como principal
fonte o rendimento de trabalho. Assim sendo, o autor exige, não só a atenção às políticas
sociais, mas também a revisão da repartição primária do rendimento, ou seja, ao nível dos
salários (Costa et al., 2008: 186).
18
Na definição da linha da pobreza, Bruto da Costa situa-a em 60% do rendimento mediano, escala da OCDE
(ou de Oxford) modificada. Afirma que todos os que se encontram abaixo desse limiar são considerados
pobres (Costa et al., 2008: 98-101).
19
Em 2008, os beneficiários do RSI representavam 3,4 % da população total do país (ISS-GP, 2009: 26).
20
Este estudo, que abrangeu doze concelhos do continente do país, centra-se na ação local e inclui a
dinamização de parcerias, metodologias e estratégias de intervenção, a relação entre o local e o central, novos
problemas sociais e áreas prioritárias de intervenção, bem como a avaliação da ação social.
21
Estudo do Instituto Superior de Economia e Gestão, ISEG, referido em notícia do Jornal Público, 30 de
maio, de 2011.
31
Desigualdades). O relatório da OCDE, 2012, sublinha a desigualdade com os 20% mais
ricos a receberem um rendimento superior, equivalente a 6 vezes mais do que os 20% mais
pobres em Portugal.
32
(Anjo, 2012)22. Entretanto, quanto à proteção no desemprego, o Observatório das
Desigualdades revela, em 2012, que a evolução do número de beneficiários do subsídio de
desemprego se contraiu em 5,7% desde 2010 (Observatório das Desigualdades, 2012).
Neste mesmo âmbito, Manuela Silva (1999) sugere uma cultura de valores fundada numa
nova ética de relação entre os indivíduos, o uso contido dos recursos, assim como a
reforma do Estado para um novo contrato social. Sposati tem vindo a defender (desde
1994) um novo contrato social que compatibilize redistribuição da riqueza social e
democracia, que coloque os excluídos no campo da representação política (Sposati, 1994:
6, cf. Nunes, H., 2004).
22
Estudo apresentado em comunicação no V Seminário Internacional do Centro de Investigação em Serviço
Social e Sociologia (CESSS) da Universidade Católica Portuguesa, sobre “Crise Social & Crise das Políticas
Sociais”, em Lisboa, 1 de junho de 2012.
33
das políticas de assistência social (Rodrigues, 1999)23.
Fernanda Rodrigues desafia o assistente social, no âmbito das políticas sociais e da sua
agência, para ter em atenção a vivência subjetiva da pobreza, dando visibilidade aos seus
efeitos corrosivos no médio e longo prazo, bem como ao crescente processo de
empobrecimento. Identifica os seus impactos no corpo, trabalho, cidadania, identidade e
território, bem como as suas consequências nos lugares estruturais correspondentes
(Rodrigues, 2009).
A agudização da crise exige forte ponderação nas políticas, nas medidas e no sentido da
sua regulação. Atualmente, verifica-se um crescendo de solicitações, cada vez mais
centradas nas necessidades locais e de sobrevivência. A crise, em simultâneo com formas
de retração associadas à pobreza instalada na sociedade portuguesa, converge para a
transformação de políticas sociais em políticas de combate à pobreza ou, conforme Sposati,
faz deslizar a cidadania e os direitos sociais para “boas ações” aos mais frágeis (2011:
108)24.
23
Sobre a assistência social, Fernanda Rodrigues dá conta, em análise feita à época, da coexistência da
institucionalização e progressivo alargamento do campo da provisão social garantida como direito de
cidadania e reconceção do papel provedor do Estado, assim como da revalorização das iniciativas privadas
(Rodrigues, 1999).
24
Considera-se a expansão do Banco Alimentar Contra a Fome nesta situação de deslizamento dos direitos
sociais para as boas ações. A sua atividade já levou à abertura de 19 bancos no país, com alargamento à
34
Em síntese, os níveis de pobreza e exclusão colocam cada vez mais em risco a valorização
dos direitos sociais e, consequentemente, crescentes exigências e desafios à agência do
Serviço Social face às crescentes indeterminações e paradoxos presentes na sociedade
moderna e no espaço ocupado pela sociedade portuguesa na semiperiferia, com
peculiaridades no seu modelo social que não acompanharam as exigências societais
reveladas por persistente desigualdade. Perante tudo isto, vale dizer que o assistente social
poderá ter entre os seus desafios profissionais:
Madeira em 2012. Apoia 2116 IPSS e 337694 pessoas e viu aumentar no ano passado em mais 178 IPSS e 18
436 pessoas (Jornal Expresso, 26/05/2012).
35
- Comprometer a intervenção social com a população em privação, combatendo as
normas para a homogeneização, fragmentação e instrumentalização dos processos sociais.
Será, portanto, a partir deste contexto societal, complexo, de incerteza e risco, que se
seguirá um aprofundamento concetualmente sensibilizador sobre o saber profissional e o
conhecimento em Serviço Social, numa perspetiva multidimensional e transdisciplinar do
mesmo.
Falar de conhecimento em Serviço Social é situar o espaço ocupado pelo assistente social
na divisão sociotécnica do trabalho na mediação e interface entre a agência e o Estado no
espaço das políticas sociais, sem excluir o contexto histórico em que se desenvolve25.
Significa identificar conceitos, dimensões e variáveis, apoiando-se na visão endógena à
profissão.
Para dar base e fundamento ao locus de identidade do Serviço Social, à ética no seu
estatuto de poder, com princípios e valores e à expertise no saber, a partir da metodologia,
das técnicas e dos seus procedimentos, convocamos vários autores no campo do Serviço
Social. Ao paradigma da correlação de forças de Faleiros (1999) associamos as formas de
conhecimento propostas por Santos (1996), com enfoque no paradigma do conhecimento-
emancipação, conforme anteriormente referido, complementado pela teoria da razão
comunicacional de Habermas (1990) e pelo conhecimento complexo proposto por Morin
(1987; 2000)26.
25
Segundo a Classificação Portuguesa das Profissões, o assistente social situa-se no grande subgrupo de
especialistas em assuntos sociais, a par dos especialistas em assuntos jurídicos, artísticos e culturais e no
subgrupo de especialistas do trabalho social (INE, 2010: 179).
26
Na base de todo o capítulo está presente a proposta de Vicente Faleiros através do paradigma da correlação
de forças que, por sua vez, associa outros paradigmas a partir da produção do Serviço Social português,
particularmente inspiradores desta pesquisa, como é o caso de Helena Nunes (2004), Berta Granja (2005) e,
mais recentemente, de Inês Amaro (2012). O Serviço Social brasileiro foi e será uma importante referência,
quer desde a base da nossa formação pela licenciatura com Paulo Netto, na dupla qualidade de docente e
supervisor no estágio curricular final do curso, quer pela dimensão da formação no mestrado, em protocolo
entre Portugal e o Brasil (ISSSL e PUC-SP), quer ainda pela oportunidade de acesso à produção académica
36
Mais especificamente, o conhecimento analisado estrutura-se à volta das questões do
conhecimento base do Serviço Social, enquadrado no eixo ético-político da profissão,
através da ampliação e consolidação do conceito de poder e saber, cidadania, autonomia e
emancipação, no compromisso com os direitos sociais, mas também com a ética
profissional, identidade, paradigmas/modelos, competências profissionais e estratégias27.
Aprofunda, portanto, o eixo societal, anteriormente colocado em análise, para se aproximar
do campo mais específico do Serviço Social e da sua jurisdição profissional.
O foco central deste subcapítulo assenta, assim, sob a perspetiva do Serviço Social crítico e
da teoria da correlação de forças, segundo Faleiros (1999), auxiliada pelas perspetivas das
teorias da razão comunicacional e do pensamento complexo.
do Serviço Social brasileiro e do debate oferecido pelos seus organismos, CFESS-CRESS-ABEPSS, com
acessibilidade via internet.
27
Para Branco o conhecimento constitui o elemento fundamental na construção do poder/influência
profissional, base da perícia de suporte à jurisdição da profissão (Branco, 2009a: 8).
37
possibilita as identidades e as biografias de grupos e indivíduos.
É com base neste consenso, a partir da teoria da razão comunicacional, que sustentamos a
compreensão de interesses mútuos e o princípio da participação com manifestação de
opinião e de vontade, a a patir desse mesmo consenso chegamos à autonomia e à
emancipação como conceitos fundamentais para o desenvolvimento da cidadania e da
democracia28. Habermas, apoiado em Castoriadis, 1975, associa autonomia e práxis, onde
as ações desta promovem aquela, através da rede de relações. Por sua vez, a auto-
organização suporta a questão democrática, na base do pensamento emancipatório.
Associando-se aos valores da democracia, abre espaço de reflexão aos novos movimentos
sociais ou novos movimentos democráticos. A práxis auto-criativa conduz à autonomia de
todos e, consequentemente, à transformação da sociedade, segundo o agir autónomo de
todos (Castoriadis, 1975: 134, cf. Habermas, 1990)29. Assim, a emancipação humana
remete para a auto-organização, assumida como cidadania.
28
Para Habermas (1997), na decorrência da institucionalização do princípio do discurso, chega-se ao direito e
ao princípio da democracia.
29
Habermas compreende o mundo dividido em cultura, sociedade e personalidade, sendo a cultura o
conjunto de saberes com os quais os agentes se comunicam, se entendem mutuamente e reunem
interpretações potencialmente consensuais; a sociedade corresponde a ordens legítimas de solidariedade
fundada na pertença a grupos; a personalidade corresponde às competências que tornam o sujeito capaz de
agir, falar e tomar parte nos contextos, processos de compreensão e afirmação da sua identidade; a
socialização assegura a aquisição de capacidades de ação e zela pela concatenação entre as histórias de vida
individuais e coletivas (1990: 315). A sociedade moderna dissocia a socialização dos saberes culturais.
38
aqui defendido.
Tal como foi explicitado, os autores convocados elucidam sobre a teoria emancipatória, ou
uma nova cultura política emancipatória, como é proposta por Santos (2006), segundo o
qual há dois modelos ou tipos de conhecimento e a tensão política que deles resulta é
também epistemológica. Tanto o conhecimento-regulação como o conhecimento-
emancipação têm dois pontos, A e B. No primeiro, em A, está a ignorância ou o caos e em
B o saber. Na matriz da sociedade ocidental, conhecer/saber é então ordem no
conhecimento-regulação e significa pôr ordem nas coisas, na realidade, na sociedade.
O agir do assistente social é, com efeito, o da consciência social das democracias sociais.
30
Democracia deliberativa foi o conceito alternativo encontrado entre democracia liberal e republicana
(tipologia corrente nos EUA) caraterizada por Habermas como procedimentalista, cujo método assenta no
reconhecimento linguístico, ou seja, nas etapas comunicativas envolvidas num consenso por todos os
envolvidos no mundo da vida. O conceito de política deliberativa ganha referência empírica quando, fazendo
jus à diversidade das formas comunicativas, se constitui em vontade comum, não apenas por um
autoentendimento mútuo de caráter ético, mas também pela busca de equilíbrio entre interesses divergentes e
o estabelecimento de acordos (Habermas, 2002: 277, cf. Leite da Silva, 2011).
39
Neste contexto, Josefina McDonough, apoiada em Wakefield (1988), defende que a
identidade profissional depende mais dos seus objetivos, concebidos dentro dos parâmetros
do bem-estar social, do que da tecnologia em que se suporta31. Esses objetivos são, então,
definidos em termos de valores, como a justiça social e a autodeterminação. Ora, a
finalidade da prática do assistente social é o progresso para a justiça social, o que exige um
envolvimento direto na formação e melhoria/modificação da política social. Significa, pois,
desenvolver um método de ação política através da advocacia legislativa e da reforma por
litigação, no sentido de promover e influenciar a legislação de modo a beneficiar as
populações carenciadas representadas pelo Serviço Social, aumentando e facilitando o
acesso aos bens sociais básicos, através de lobbying (McDonough, 1999: 101)32. Na
mesma perspetiva, Reamer defende a expansão do Serviço Social para a advocacia social,
cujo foco é o da justiça, contra a opressão que afeta os mais vulneráveis e em situação
social de desvantagem (1994)33.
Compromisso público e ético na profissão é também apoiado por Megales (2003). Assim,
31
Não há aqui a pretensão de negar outros contributos históricos que permitiram afirmar a profissão, desde as
suas pioneiras, como Jane Adams com uma perspetiva progressivamente política que alcançou o prémio
Nobel da Paz (1931), ou Mary Richmond cujas obras, dedicadas à metodologia, trouxeram afirmação
profissional ao Serviço Social, passando por muitos outros contributos de diferentes autores, alguns dos quais
já testemunhados, quer a nível do país, quer fora, mas que não cabem neste trabalho.
32
Josefina McDonough (1999), lembra que Rawls (1971), propôs alguns bens sociais como necessários e
essenciais para alcançar metas, garantir a liberdade individual e igualdade de distribuição dos bens sociais
básicos (alimentação, habitação, educação, saúde e trabalho) e participação social. O seu acesso conduz à
operacionalização da igualdade de oportunidades, o lado democrático da equação liberal-democrática. Para
Rawls, só sob condições de igualdade de oportunidades é que a escolha individual pode ser considerada um
exercício de liberdade. Apoia-se, ainda, em Marshall, 1965 e Jones, 1985, na defesa do sistema de bem-estar
social nas democracias liberais e do equilíbrio entre forças da liberdade e da igualdade. Assim, para Josefina
McDonough, o Serviço Social concebido dentro dos parâmetros do bem-estar social define os seus objetivos
em termos de valores, de justiça social e autodeterminação. É no Serviço Social progressista dos EUA que
Faleiros enquadra a autora (McDonough, 2007, cf. Faleiros, 2011: 755).
33
Reamer distingue, na evolução do Serviço social e no âmbito do código de ética, diferentes períodos a que
não são alheias as diferentes orientações que vêm influenciando a direção social, as teorias, os princípios e
valores na profissão, tais como: período da moralidade; período dos valores; período da teoria ética e período
dos padrões éticos e da gestão do risco, que se estende desde a atenção à moralidade, à justiça social, à
posição social e política da capacitação e ao trabalho centrado em tarefas (2001: 63).
40
advogando que as profissões são instituições com autoridade na produção de um bem
social específico, o Serviço Social tem, a par da sua autoridade, o compromisso de
responder às necessidades de bem-estar social. Tem, por isso, um compromisso público e
dele advém a confiança e a autoridade para providenciar o bem-estar social, atribuído ao
papel da profissão. Significa, portanto, falar “da satisfação das necessidades sociais pelo
Serviço Social, tal como a saúde pela medicina, ou a justiça pela advocacia” (2003: 315)34.
A profissão aparece, assim, com um triplo papel: i) é uma instituição intermédia que
providencia aos cidadãos um certo bem que não pode obter sem essa profissão; ii) é uma
estrutura de acesso a um bem; iii) tem a autoridade de produzir esse bem.
Consequentemente, o Serviço Social interatua numa rede fina de relações, sistemas, signos
e símbolos compostos por uma estrutura particular de significados, formas
institucionalizadas de organização social, sistemas de status, correspondente ao grau de
desenvolvimento da estrutura mais ampla. Através das respostas específicas construídas
pelo grupo de profissionais, é construída uma identidade, uma representação que se
legitima, legaliza e se assume como profissão. Graças à profissão, desenvolve-se uma
ciência através do acúmulo de conhecimentos próprios: técnicos, teórico/científicos, modos
específicos de saber-fazer socialmente produzidos e objetivados, sustentando-se através de
34
Esta declaração e posição do autor, levada ao debate em sessão de doutoramento, recebeu algumas críticas
por atribuir um peso corporativo à profissão, negligenciando o papel de equipa na produção do referido bem.
41
um complexo conjunto de mecanismos, constituído entre outros, por leis, currículo, normas
e código de ética (Baptista, 2001).
35
Confiança antropológica significa reconhecimento e valorização da perfetibilidade de todos os seres
humanos; a crença na educabilidade implica confiança e crença na possibilidade de aperfeiçoamento e
mudança positiva; a sensibilidade relacional significa escuta ativa e atitude de acolhimento do outro na sua
condição de outro; a distância crítica implica laços de proximidade e cumplicidade, sem perder a capacidade
de distanciamento analítico necessário à autoridade pedagógica; a aceitação da vontade requer aceitação do
negativo da educabilidade; a perseverança profissional significa não desistir, demitir-se, ou ser negligente
profissionalmente face às dificuldades profissionais (Banks e Nöhr, 2008).
42
Ao defender o paradigma da emancipação, Helena Nunes (2004) chega a dois conceitos
centrais da intervenção social para a autonomia e emancipação, nomeadamente o de
participação e de empowerment. O processo de empowerment, democrático, implica uma
ação coletiva associada à dimensão ética e comprometida com os grupos sociais mais
vulneráveis, politicamente direcionada em termos de projeto de mudança social.
Entretanto, a teoria da emancipação conjuga autonomia, participação, autodeterminação,
identidade ou diferença e organização em forma de redes, traduzindo-se numa nova forma
de cooperação na ação, uma estratégia inscrita na criatividade social e em novos valores36.
Do que foi dito releva o papel de mediação assumido pelo assistente social, ao (re)criar o
campo de interface entre o Estado e o cidadão, fazendo o reconhecimento das necessidades
sociais da população e o encaminhamento para junto de vários interlocutores. Individual e
36
Helena Nunes, a autora em que nos apoiamos, trabalha a teoria de emancipação a partir de Nederveen
(1992), o qual funda o conceito numa perspetiva crítica problematizando a questão do poder (Nederveen,
1992, cf Nunes, 2004: 54).
37
Serge Paugam reflete sobre o processo em que ocorre esse acantonamento na escalada para a exclusão e
rutura do laço social. Para o autor, nas dimensões da desqualificação estão uma sucessão de tentativas
falhadas de inserção profissional, crise identitária, sentimento de inferioridade, perda da autoconfiança,
sentimento profundo de humilhação, perda da esperança na reentrada no mundo do emprego, muitas vezes
concomitante com a aceitação da assistência, na procura de compensações face à ausência de projetos
profissionais. Na acumulação de desvantagens durante muitos anos, na rutura com o mundo do emprego e
dos laços com a família, surgem problemas de saúde, como alcoolismo e a droga, com consequente
isolamento e dessocialização (Paugam, 2003).
43
coletivamente, o assistente social possui poder institucional e saber profissional que lhe
permitem, no espaço de uma autonomia relativa, encaminhar, com vários interlocutores, o
reconhecimento mais ou menos alargado, as necessidades sociais da população (Nunes, H.,
2004). Dependerá, segundo a autora, da representação feita sobre a sua própria ação e da
reflexividade desenvolvida sobre a prática, condição necessária a uma permanente
vigilância crítica sobre o seu agir profissional.
Mediação é uma estratégia atribuída ao assistente social por Faleiros (1985). Na teoria da
correlação de forças saber e poder fazem a afirmação profissional. Estrategicamente, o
assistente social necessita situar-se no espaço de mediação entre o contexto político global
e o contexto particular institucional, visualizando relações de saber e de poder da e com a
própria população, traduzido num saber teórico-prático. É através da teoria da correlação
de forças que Faleiros (1999) toma o Serviço Social como mediação entre atores e
estruturas num jogo de força e de poder.
Sobre a mediação assumida pelo assistente social, Almeida (2002) atribui-lhe caraterísticas
especiais face à posição, às competências, ao papel que lhe é reconhecido e, ainda, às
caraterísticas da ação profissional na regulação social38.
38
Almeida faz a retrospetiva sobre a origem da mediação sob duas perspetiva. Uma delas está associada à
cultura americana e apareceu nos anos 70, nos EUA, para a regulação de litígios sem recurso a instâncias
jurídicas. Trata-se de um processo alternativo à resolução de conflitos face à lentidão dos processos judiciais,
aos seus custos e à falta de aplicação das decisões judiciais. A outra perspetiva tem uma origem mais
universalista, europeia, herdeira da Declaração dos Direitos do Homem e da Cidadania, 1789, e reconhece «o
outro» como um ser diferente mas igual, cujas semelhanças são mais importantes do que as diferenças,
atribuindo à mediação um modo de regulação social, aonde a mediação opera novos laços, renova-os e gere a
sua rutura (2002: 76).
44
A intervenção a nível individual, ou conforme terminologia da autora, a individualização
de abertura, apoiada no paradigma da emancipação, consubstancia-se na estratégia
anteriormente refletida, acolhendo a relação de poder partilhado intersubjetivamente entre
o assistente social, o indivíduo, assim como com os grupos de indivíduos reunidos por
necessidades, riscos coletivos e interesses comuns39. Neste caso, trata-se de defender o
reconhecimento de direitos sociais individuais e coletivos, questionar a desigualdade social
e a hierarquia do seu estatuto profissional e o do sujeito da ação, como meio de reforçar o
poder e autonomia do sujeito individual e coletivo. Ao representá-lo, coloca-se na ótica de
um novo contrato social e de justiça social, que faz a ligação entre a dimensão da
distribuição e a do reconhecimento social (Fraser, 2002, cf. Nunes, H., 2004). A
comunidade/território local tem, assim, expressão plural, heterogeneidade de
subjetividades e interesses, na perspetiva do reconhecimento da participação e da sua
socialização. Portanto, responsabilização e advocacia do assistente social, a par da
participação e empowerment, convergem para esta estratégia ou paradigma. Paradigma
este, que é apoiado na scienza nuova, conforme Morin, ou na razão comunicacional do
mundo da vida social, conforme Habermas.
Com efeito, na sociedade contemporânea, confrontada com culturas e modos de vida, que
em muitos casos produzem riscos pessoais e coletivos de (re)estruturação das identidades
e do eu, os indivíduos estão perante a incerteza produzida em todos os planos da vida
social, relacional e afetiva que não controlam. A sociedade de risco traz, assim, a
importância do eu nos laços de proximidade, no controlo da sua narrativa biográfica e, com
isso, as possibilidades da agência no seio das suas estruturas. Pela narrativa, a experiência
individual é olhada através do tempo, é reflexiva no sentido de gerar empowerment das
pessoas, um convite à ponderação e ao reexame. O paradigma emergente associa-se ao
discurso cívico e à hermenêutica do concreto.
39
Distinto é o outro paradigma, normalizador, burocrático, ou regulador, através do qual o assistente social,
enquanto agente de normalização, intervém pela individualização de redução, cuja estratégia é baseada no
indivíduo como consumidor, dissociado do seu contexto identitário, dos seus laços sociais e dos lugares
estruturais que marcam o seu estar e o seu modo de pertencer à sociedade, reforçando a sua apartação e
responsabilizando-o pela sua própria biografia, resolução dos problemas e integração social. A resolução é
feita caso a caso, negando o direito de participar na definição e resolução das necessidades sociais que o
atingem, através da imposição de normas e burocracia institucional, independentemente dos seus efeitos na
sua vida real.
45
pesquisa, encoraja a construção de sentidos pelos cidadãos/utentes/clientes às suas
experiências através do diálogo (Nunes, H., 2004). Temos, novamente, em foco a
afirmação de Habermas sobre a transformação da vivência no tempo, ou vida social, a
partir das narrativas, em razão comunicacional ou em atos de compreensão na mediação do
assistente social. Dessa mediação, chegamos a padrões e valores com sentido, identidades
e biografias de grupos e indivíduos, ou seja, ao conhecimento em Serviço Social.
46
(2007: 18).
Iamamoto (2010) faz a afirmação da profissão suportada no Código de Ética, com direitos,
deveres, princípios e valores humanistas, em legislação que regulamenta a profissão,
diretrizes curriculares para a formação e guias para o exercício quotidiano. Assim, toma,
entre outros, os seguintes princípios consagrados na profissão: i) o reconhecimento da
liberdade como valor ético, associado ao princípio da autonomia, emancipação na plena
expansão dos indivíduos sociais e dos seus direitos; ii) a defesa intransigente dos direitos
humanos, contra qualquer tipo de arbítrio e autoritarismo; iii) a defesa, aprofundamento e
consolidação da cidadania e da democracia, com a socialização da participação política e
da riqueza produzida; iv) defesa da equidade e justiça social expressa pela universalidade
no acesso a bens e serviços e gestão democrática; v) compromisso com a qualidade dos
serviços prestados e a articulação com outros profissionais e setores.
Com um perfil profissional culto, crítico, capaz de formular, recriar e avaliar, o assistente
social alia-se à pesquisa sobre a realidade, para interpretar as situações particulares da
expressão da questão social em que intervém no seu trabalho, conecta os processos sociais
macroscópicos que a gera e transforma. Igualmente se revela no domínio técnico-operativo
na assessoria, planeamento, negociação e ação direta, estimuladora da participação dos
40
Segundo a autora, o conhecimento dos assistentes sociais sobre as suas próprias observações no exercício
da prática procura alcançar novos e consistentes elementos para a comunicação com outros atores, com o
objetivo de influenciar e resolver questões (Nahri, 2002: 19).
41
Sob uma outra perspetiva, St-Amand define especialista como aquele que viveu uma situação e que,
através dessa aprendizagem, partilha com outros. É alguém que experimentou uma situação de trauma e que,
graças à sua aprendizagem, partilha com outros o seu percurso e experiências. Assim, grupos de autoajuda,
particularmente aqueles baseados no modelo dos alcoólicos anónimos, contam com outros poderes que não
os científicos para chegar a uma relação diferente entre as pessoas. “Para as terapias baseadas em
experiências, a pessoa é um sujeito, portador de história, não um objeto que convida à narração” (2001: 64).
47
sujeitos sociais, na defesa dos seus direitos e no acesso aos meios para exercê-los
(Iamamoto, 2010).
Na sua análise a mesma autora sublinha as mudanças em curso, sobre as quais a profissão
deve estar atenta, designadamente às novas relações entre o Estado e a sociedade, sob a
influência da “financeirização” da economia, em oposição aos fundamentos do seu
processo de institucionalização, entre o pós-guerra e meados dos anos 70 do século 20, em
fase de expansão industrial e voltada para a produção em série, de inspiração fordista-
taylorista, sustentada pela política keynesiana de pleno emprego e estímulo à prestação de
serviços sociais públicos. Atribuída ao Estado a responsabilidade pela crise e o
endividamento interno e externo, a oferta de serviços passa a ser delegada ao mercado e à
iniciativa privada sob o dogma da racionalidade do mercado, ou seja, sob uma lógica
pragmática, produtivista, de competitividade, eficácia e eficiência42.
42
Iamamoto (2010) sublinha, ainda, que nas novas relações entre o Estado e a sociedade subjaz uma
mentalidade utilitária, o reforço do individualismo e enfraquecimento das redes que transporta para o
mercado a satisfação das necessidades, naturalizando-se a sociedade. Nestas alterações, faz-se o apelo à
solidariedade em face da crescente degradação das condições sociais de boa parte da população, oferecendo
programas e projetos focalizados e seletivos, crescentemente de caráter transitório, impedindo a sua
continuidade no espaço e no tempo, com estímulo ao autofinanciamento, substituição de agentes públicos
estatais, cuja gestão empresarial submete os trabalhadores à precarização.
48
Em suma, o modelo de autonomia e emancipação − considerado central na defesa do
posicionamento tomado nesta tese, na afirmação de poder e de saber na profissão, de
acordo com as teorias alimentadas − põe em relevo o “mapeamento” da agência, ou seja,
direitos sociais em oposição a benefícios; conhecimento do mundo da vida em vez de
conhecimento de ocultação e negação; individualização de abertura em alternativa à
redução, burocracia ou controlo; cultura de ação de oposição crítica em vez de ação
conformista e tecnocrática.
Esse saber, requerido pelo assistente social, tem diferentes competências designadas por
saberes de ação, tais como: i) saber ético-político; ii) teórico; iii) saber sobre o meio; iv)
processual metodológico; v) comunicacional; vi) relacional; vii) empírico (Granja, 2005).
Com base nestas competências, a afirmação da jurisdição profissional elege três campos
em que o poder da profissão se exerce: i) jurisdição legal face ao Estado; ii) campo público
49
através da comunicação social; iii) e trabalho (Branco, 2009a: 9)43. A existência de uma
frágil jurisdição da profissão em Portugal decorre da dificuldade de afirmação da sua
perícia técnica perante o Estado, designadamente em termos comparativos com outras
profissões sociais com as quais o Serviço Social partilha o espaço sócio-institucional44.
Num roteiro analítico mais específico e através de proposta heuristicamente sustentada por
Abbot (1988), Francisco Branco suporta a disputa jurisdicional sobre as caraterísticas que
melhor definem a profissão, mediante o conhecimento abstrato controlado pelos grupos
ocupacionais e com base nos atos da prática profissional. Assim, o estatuto de perito
assenta no diagnóstico, inferência e tratamento, sendo o primeiro e o último, associados a
atos de mediação e de gestão de informação, cujo sistema de classificação ajuda a clarificar
e a simplificar o trabalho profissional (Branco, 2009a: 12)45.
Desde Mary Richmond até próximo da Segunda Guerra Mundial, o discurso fundador
acerca do objeto da profissão alicerçou-se no ajustamento social e no valor da justiça social
segundo os parâmetros das encíclicas Rerum Novarum (1983) e Quadragesimo Anno
1933). Discurso, esse, ancorado no funcionalismo dominante nos EUA e expresso nas
teorias de Parsons (1902-1979). Essa visão normativa é quebrada pelo discurso de Bertha
Reynolds em 1942. O Serviço Social passa, então, a enquadrar-se na dinâmica da estrutura
social, articulando as dimensões, económica, política, social e psicológica, através de uma
orientação de diagnóstico mais complexo e apoiado nas forças e nas potencialidades da
43
Branco revela as fragilidades da fixação da jurisdição na arena legal da profissão em quatro vertentes:
formação pública; regulação da formação; creditação profissional e regulação ética da profissão (2009a).
44
Todavia, Flexner (1915), já defendia que constituir uma profissão é possuir auto-organização e
legitimidade de uma disciplina universitária (Flexner, 2001, cf. Branco, 2009a).
45
O autor, seguido por Branco (2009a) afeta, assim, a jurisdição a algumas caraterísticas do sistema de
classificação, neste caso ao diagnóstico e tratamento. Baseado no conceito de care professions na visão
anglo-saxónica de profissão social, o autor ensaia uma análise exploratória sobre o estado da jurisdição do
Serviço Social em Portugal, guiado pela sociologia das profissões e pela perspetiva apreendida nas dinâmicas
e mutações em curso no contexto das alterações do Estado Social e das políticas sociais em “resposta à nova
questão social” (2009a: 8).
50
população. Perspetiva-se, assim, a protecting society contra a original helping profession,
assente na relação entre quem ajuda e quem é ajudado, uma relação superior, autoritária e
moralista (Faleiros, 2011: 752).
Foi com o contributo de Foucault, nos anos 70, sobre a teoria crítica que foi interpretada a
perspetiva do Serviço Social como uma forma de controlo social na defesa do status quo.
Nesta linha de questionamento, o Serviço Social vai debater-se pela voz de vários autores
(tais como Faleiros, 1972, Iamamoto, 1982, Netto, 1991 e Raichelis, 2009, cf. Faleiros,
2011) sobre a protecting society, ou seja, a articulação entre Serviço Social e estrutura
económica. Deste modo, tem lugar o movimento de reconcetualização, fundamentado na
crítica ao capitalismo, ao positivismo e ao indivíduo-problema e toma, como referência da
ação, a fundamentação dialética em rutura com o planeamento, ou seja, faz a rutura com a
ideologia da adaptação, ao tecnicismo e ao metodologismo. O planeamento enfatizou o
processo de participação e democracia, mas também, serviu de suporte ao metodologismo
próprio da racionalidade ténico-burocrática, ou ao finalismo metodológico (Faleiros,
2011).
51
mantêm-se como propósitos do Conselho Federal de Serviço Social, CFESS, defendidos
no Congresso de Bem-Estar Social de Hong Kong, em 2010. Porém, Faleiros reafirma-se
sobre o papel da profissão nas relações de poder e correlações de forças, através de um
processo de intervenção profissional implicado na descodificação analítica da estrutura,
conjuntura e situação e numa perspetiva relacional e de articulação entre a participação do
sujeito e as redes e vínculos que conduzem a mediações gerais e particulares, para
assegurar os direitos e se transformar em estratégias de ação (Faleiros, 2011: 756)46.
52
individual e a coletiva. Nas finalidades identifica: i) interpessoais, apoiadas nos processos
de ajuda e reconstrução identitária junto dos indivíduos e das famílias; e, ii) sociais,
apoiadas na consecução dos direitos e de acesso aos recursos e às políticas, face às quais o
assistente social se assume como um agente de mudança em prol do projeto da profissão47.
Por outro lado, o Serviço Social vanguardista, preocupado com a mudança individual e
societal, é promotor da autodeterminação. Em ambas as visões, é limitada a sua inscrição
47
A autora identifica como questões emergentes no Serviço Social: a persistência da crise interna do Serviço
Social; a grande ambiguidade e as zonas de silêncio na profissão; a tensão permanente entre real e ideal; a
visão voluntarista sobre o objeto da profissão; a irresistibilidade do discurso pós-moderno, em resultado do
qual propõe como agenda para o século XXI as seguintes propostas/urgências: aprofundamento do debate
interno sobre a profissão e a sua posição no mundo; desenvolvimento de maior consistência científica;
fortalecimento da assertividade profissional; resistência às tendências ultramodernas e pós-modernas;
convivência tranquila com o caráter camaleónico da profissão; rutura com o ciclo do eterno retorno (Amaro,
2012).
48
Para Amaro é necessário desenvolver uma comunidade científica, influente e consolidada, através de um
projeto de construção de pensamento, sublinhando que “sem corpo de saberes e sem atores referenciais, o
processo identitário das profissões perde as suas âncoras” (Payne, 1998; Almeida, 2002; Faleiros, 2006;
Amaro, 2008; Fargion, 2008, cf. Amaro, 2009: 41).
53
na história do Serviço Social, correntes de pensamento e consequentes implicações
ontológicas e praxeológicas, o que resulta em fraco sentimento de pertença à classe
profissional, baixa autoestima, hipercriticismo, ideia preconcebida sobre a má imagem dos
assistentes sociais por outros atores, sentimento de insegurança e desamparo profissional
(Amaro, 2012).
Trata-se daquilo a que a autora chama de dois ideais-tipo na profissão: i) técnico superior
de Serviço Social, circunscrito à vertente tecnicista que confunde cientificidade e método
com burocracia procedimentalista e ii) assistente social focalizado nos aspetos relacionais,
compreensivos e humanistas, voltado para a vontade de mudança, mas que pode resvalar
para o militantismo ideológico, mais do que para uma atitude profissional (Amaro, 2012:
264). Mais especificamente, significa que, em Portugal, as tendências do Serviço Social
situam-se no empiricismo, na resistência dos assistentes sociais à abstração teórica e
produção científica e na convicção de que a sabedoria da sua prática dá conta da qualidade
da intervenção. Pelo finalismo metodológico ou tecnicismo burocrático, a prática é
limitada ao seguimento dos passos metodológicos, receita para todos os problemas, tábua
49
Inês Amaro destaca neste processo “a tendência para atribuir aos meios o estatuto de fins. Assim, a
metodologia, o procedimento, o indicador de avaliação, mais do que o Outro enquanto pessoa, as suas
necessidades e os seus particularismos, passam a pautar os passos e a direção da intervenção, transformando-
se na sua finalidade. A esta inversão de meios em fins atribuiu-se a designação de «finalismo metodológico»”
(Amaro, 2009: 42).
54
de salvação ou falsa segurança, favorecida pela complexidade das situações, escassez de
recursos disponíveis e redução das políticas sociais (Amaro, 2012)50. Resulta, assim, num
pragmatismo responsável pela falta de reconhecimento académico do Serviço Social, como
disciplina no âmbito das ciências sociais.
Apoiada na teoria da correlação de forças, Amaro (2008), salienta que o assistente social
toma partido pelo lado mais fraco, mais vulnerável, mais oprimido, pelo ideal de equidade
e justiça, com um papel de protagonista político na ação, sustentando um processo de
fortalecimento e empowerment em torno da identidade, autonomia e cidadania da
população utente51. Mantém presente o caráter estrutural dos problemas sociais, cuja
capacitação individual dos sujeitos deve compreender a relação com as estruturas sociais
opressoras, colocando o papel do Serviço Social na mediação do processo de fragilização,
pelo fortalecimento do cliente face às mesmas. A teoria da correlação de forças olha para
os indivíduos e não para os problemas52. Sobre os fundamentos do Serviço Social, a
dimensão política confere a rejeição da ideia de neutralidade na prática profissional,
assente no entendimento de que o agir profissional é necessariamente político53. O projeto
profissional inscreve-se na versatilidade em assentar, ou não, num projeto societário,
referentes de justiça social, direitos humanos, democracia, cidadania, equidade, qualidade,
solidariedade e bem-estar social, cujo resultado se traduz por três universos de prática
profissional: universo axiológico-político; universo funcional e universo interacional.
50
Amaro (2012) sustenta que a tendência pós-moderna é uma armadilha para o Serviço Social pelo seu
confinamento ao local, ao micro, à pequena escala, focalização da intervenção, das políticas e da
compreensão da realidade. É uma forma pragmática de responder à complexidade do real. O localismo tende
para o relativismo, sem estabelecer hierarquias de valores.
51
A autora sublinha que a análise sobre as teorias em Serviço Social refletem mais do que a prática muitas
vezes é, ou seja, abordam o paradigma vigente, em vez daquilo que deveria ser, o paradigma alternativo,
ficando muito longe de trazer um contributo substantivo e clarificador sobre quais são essas teorias. Para
fazer uma análise sobre diferentes paradigmas apoia-se ainda em Howe, Parton, Mullaly, Healy e Fook
(Amaro, 2008: 67)
52
As relações interpessoais implicadas nas relações sociais globais situam-se num processo complexo de
mediações sujeito-estrutura, numa visão relacional da estrutura da produção da sociedade e dos indivíduos
(Faleiros, 1996: 21, cf. Amaro, 2012).
53
A prática profissional como missão, ou militância, é tomada por alguns como de contaminação ideológica
desprestigiante para a profissão enquanto tal (Amaro, 2012).
55
dando lugar ao aprofundamento da crise do laço social (Amaro, 2012: 148). Situa a nova
questão social no enfraquecimento das estruturas de proteção social, na redução da
intervenção do Estado e na universalidade dos direitos e, ainda, nas transformações da
esfera do trabalho, que deixou de ser fonte de integração social54. Tem por hipótese de
trabalho que a plenitude do campo do Serviço Social se desenvolve na interseção entre a
direção dos direitos humanos e da justiça social, dimensão individual e coletiva, situando-
se no local, entre ator e estrutura como fortalecimento da correlação de forças,
contrariando os desequilíbrios do poder e considerando os diferentes interesses em
presença (Amaro, 2012).
Estes são desafios na perícia ou expertise da profissão que requerem largo espaço de
preparação e maturação no processo de ensino na formação do estudante, através de um
modelo pedagógico de ensino-aprendizagem reflexivo e crítico.
54
A par destas, está também a questão ecológica e de sustentabilidade como preocupações acrescidas de
cidadania ativa e de formação da consciência social. Questões crescentemente complexificadas em resultado
da mutabilidade e interpenetrabilidade das problemáticas (Amaro, 2012).
55
Os autores em referência, neste e no próximo subcapítulo, são: Branco (2009a); Brown & Bourne (1996),
Harmse (1999), Caíres & Almeida (2000); Davys & Beddoe (2000 e 2009); IASSW-FIAS (2004); Viveiros
56
Sustenta-se que o Serviço Social se alicerça na ciência inspirada pela inteligência
intersubjetiva e esta na sociedade e a formação está ancorada na universidade em paridade
com as restantes disciplinas do conhecimento. Desta forma, melhor se aprofunda e afirma a
profissão.
Convocar a universidade, como uma das dimensões deste capítulo, assume uma dupla
importância, devido ao lugar que ocupa no ensino superior e à particularidade de se
constituir num dado novo quanto à integração da formação em Serviço Social, realidade
ocorrida só em pleno século XXI, rompendo com uma das grandes fragilidades na
afirmação pública da profissão, ou seja, a longa barreira no seu acesso à universidade
pública (Branco, 2009a)56. A perspetiva revelada por alguns autores traz contributos à sua
compreensão e a reflexão e encaminha-se para esperançosa evolução, na lenta integração
da formação em Serviço Social na universidade.
& Medeiros (2005); Y. Guerra (2005); Flávia et al. (2006); Paulo Freire (2007); Alzira Lewgoy (2007);
Sidambarompoullé (2007); Santos & Fernandez (2008); Vieira (2009); Martha Wiebe (2010); Correia (2010).
56
Para Branco, que vem refletindo sobre a jurisdição da profissão em Serviço Social, a ausência de oferta
pública de formação em Serviço Social até um período muito recente, constitui uma das fragilidades de
Serviço Social em Portugal, situando-o no complexo processo sócio histórico na construção do
conhecimento, a par do seu caráter tardio (2009a: 10).
57
divisão disciplinar, entre as chamadas ciências duras ou naturais (Física, Química, Biologia
e Zoologia) e as ciências sociais (Sociologia, Psicologia e Antropologia).
Por sua vez, esta singularidade poderá relacionar-se também com o estadio do
conhecimento e a capacidade da universidade portuguesa responder aos desafios da
sociedade atual, caraterizada pelo seu tradicional desfasamento da realidade durante longo
tempo. A universidade portuguesa passou pela reforma joanina, pombalina, republicana
(anos setenta) e a que agora está a ocorrer, caraterizada por falta de autonomia em relação
ao poder político, na passagem de escola de elites para a de massas. Para Olga Pombo
(2004) as universidades portuguesas são do tipo napoleónico, com tradição altamente
centralizadora, quer do ponto de vista administrativo quer curricular, razão pela qual se
subdividem em faculdades e departamentos. A universidade está hoje transformada “numa
espécie de escola superior de ensino profissional especializado, promovendo um saber
fragmentado, assente na proliferação de áreas afins” (Manso, 2010: 522).
Teodoro & Aníbal convergem para idêntica leitura, ao sublinhar o referido caráter da
educação em Portugal a partir da década de 80, através do discurso que, com um “caráter
híbrido, associa uma orientação construtivista numa perspetiva crítica [da educação] com a
apologia da eficácia do sistema, entendida como necessária à produtividade económica”
(2008: 73).
58
legitimidade e institucional. A primeira, a crise de hegemonia, é atribuída às contradições
entre as funções tradicionais e as atuais. A segunda, a crise de legitimidade, corresponde à
incapacidade da universidade dar conta dos desafios da época moderna, cujas
consequências se traduzem em procurar resposta fora da universidade, na credenciação de
competências pelo Estado e agentes económicos. A terceira, a crise institucional -
notoriamente convergente com Manso - resulta da contradição entre a reivindicação da
autonomia na definição de valores e objetivos da universidade e a pressão crescente para se
submeter a critérios de eficácia e de produtividade de natureza empresarial (Santos,
2004a).
Esta crise, porém, vai para além da universidade portuguesa. Com efeito, não têm sido
reconhecidas às universidades da UE condições de competitividade no mercado
transnacional. As declarações, em Sorbonne e em Bolonha, tal como em reuniões no seu
seguimento, têm como primeiro objetivo a criação de regras comuns nas estruturas
curriculares, sistemas de certificação e avaliação, de forma a preparar e facilitar a
mobilidade no seu interior e conferir coerência à oferta europeia. Para Santos (2006), está
ainda por definir o modelo europeu de universidade, cujo impulso reformador se concentra
no Estado, com pouca participação da sociedade civil, ou até da própria comunidade
universitária. A proposta do autor é que a crise de legitimidade da universidade seja
ultrapassada como uma universidade de proximidade relacionada com os problemas da
sociedade aonde está integrada, como um bem público, acessível e com qualidade57.
Todavia, a reforma em curso não se verificou na direção apontada pelos autores. De facto,
a Declaração de Bolonha, em 1999, − que compromete os 29 países da Europa na
compatibilização entre os sistemas universitários europeus − antes converge para a adoção
57
Para Santos, falta à universidade da UE a excelência para atrair estudantes estrangeiros. As associações de
universidades sugerem redução de obstáculos à transnacionalização, através de convenções e agentes
bilaterais, ou multilaterais, mas fora do regime de política comercial (Santos, 2004a: 26). A transformação da
educação superior em mercadoria compreende a intensificação da transnacionalização, sob a égide da
Organização Mundial do Comércio no âmbito do Acordo Geral sobre o Comércio de Serviços (GATS). A
OCDE calcula que este comércio envolveu, em 1999, 30 biliões de dólares. No início de 2000, eram 514 mil
os estrangeiros a estudar nos EUA, 54% dos quais oriundos da Ásia (2005: 23).
59
de princípios e critérios comuns de creditação, avaliação, estruturas curriculares e
mobilidade estudantil na esfera da educação superior. Com efeito, a referida Declaração,
que deu origem ao processo com o mesmo nome e foi assinada pelos Ministros da
Educação dos 29 países, reunidos na cidade italiana de Bolonha em 19 de junho de 1999
visou a constituição, até 2010, no Espaço Europeu de Ensino Superior (EEES), de um
sistema de graus académicos comparável e compatível, designado por Modelo Unificado
Europeu (MUE), com os três ciclos de estudo (licenciatura, mestrado e doutoramento),
sistema de créditos e suplemento ao diploma. Visa promover a mobilidade e a cooperação,
a avaliação e a qualidade, e tornar o ensino superior mais competitivo (Almeida Filho,
2008: 149).
Este novo paradigma formativo foi aplicado em Portugal a partir do Decreto-Lei n.º
74/2005 de 22 de fevereiro, cujos princípios reguladores são: i) estrutura de três ciclos no
ensino superior; ii) instituição de graus académicos “intercompreensíveis e comparáveis”;
iii) organização curricular por unidades de crédito “acumuláveis e transferíveis no âmbito
nacional e internacional”; iv) instrumentos de mobilidade estudantil no espaço europeu de
ensino superior durante e após a formação.
O primeiro ciclo é considerado um ciclo introdutório de três anos, com conteúdos gerais e
básicos, sem caráter profissional, como etapa prévia ao prosseguimento da formação
profissional, ou académica, ao ciclo seguinte. O segundo ciclo, curso profissional, que
preserva a tradição secular dos sistemas europeus de formação profissional superior,
introduz o conceito norte-americano de mestrado profissional, particularmente dirigido às
novas profissões tecnológicas e de serviços, com duração de um a dois anos, tomados
como etapa prévia à formação de pesquisador e docente de nível superior. O terceiro ciclo,
curso de doutoramento, com duração curta de três anos, ou longa com duração de quatro
anos58.
58
Sobre o modelo de universidade na União Europeia, Santos & Almeida Filho defendem um paradigma
renovado de universidade, que reconcilie a antinomia local versus global, comprometido com um ideário de
paz, justiça e equidade. Para ajudar a compreender as mudanças em curso, Filho recua ao contributo de Kant
com o livro “O Conflito das Faculdades”, 1795, século XVII, propondo a autonomia universitária. Alude
também ao relatório Humboldt, de 1810, que levou a proposta de Kant à prática, pela defesa da pesquisa,
como primado da universidade (Santos & Almeida Filho, 2008).
60
universitária prevalecente nos países latinos, dirigida aos objetivos profissionais e
subordinando-se à ideologia neoliberal e à lógica do mercado, pondo em causa os critérios
científicos, o sentido humanista e de cidadania da investigação, da formação, bem como os
objetivos de vocação e realização pessoal. Porém, são igualmente reconhecidas diversas
vantagens no sentido de ultrapassar práticas universitárias esclerosantes, segundo Moita,
cujo traço mais forte foi a mudança do processo de ensino para o de aprendizagem, pela
reconversão das metodologias e autonomia do estudante nos objetivos a atingir no estudo,
na investigação e na aquisição de competências (2009: 5)59.
59
Moita foi vice-reitor entre 1992 e 2009 na Universidade Autónoma de Lisboa, criada em 1986 e gerida por
uma cooperativa que, segundo refere, foi constituída maioritariamente por professores da mesma instituição.
60
Nos estados membros da OCDE, somente a Itália e a Turquia estão em situação abaixo de Portugal em
população com ensino superior, enquanto países como o México e a Eslováquia situam-se acima (OCDE,
Factbook, 2009). Segundo dados oficiais, houve um aumento de 50% no número de inscritos desde 2005 na
universidade, sendo de 35 % os jovens matriculados no ensino superior, situando-se Portugal, no presente
milénio, com as mais baixas taxas de ensino superior da OCDE, com 13,5% para uma média de 26,8%, num
conjunto de 32 países (cuja meta é subi-las para se ajustar aos desafios da sociedade global, apostada na
informação e qualificação da mão de obra). A meta governamental até 2020 é atingir 40% de diplomados
com ensino superior, entre os 30-34 anos. Significa que o ensino superior precisa atrair mais 60 mil
portugueses às universidades na próxima década. Esta meta foi assumida pelo então Primeiro-ministro
português, José Sócrates, pela abertura do ano letivo 2010-2011, em discurso apresentado na Sessão
Inaugural do Ano Letivo na Universidade da Madeira, em 13 de setembro de 2010. Em Portugal, somente
28,2% da população com idade entre os 25-64 tinha concluído, em 2008, pelo menos o ensino secundário (in
Observatório das Desigualdades, 6 de dezembro de 2010, em http://observatorio-das-
desigualdades.cies.iscte.pt/index.jsp?page=indicators&id=36&lang=pt).
61
É, todavia, graças à expansão do setor privado que ocorre a ampliação acelerada do ensino
superior em Portugal. Com efeito, até finais dos anos 70, todas as universidades em
Portugal eram estatais, à exceção da Universidade Católica Portuguesa, criada em 1968, já
nos últimos anos da ditadura. Barrada pelo numerus clausus imposto às universidades
públicas, a intensa procura para formação universitária, com a força social do movimento
ascendente revelada pelo crescente número de jovens no acesso ao ensino superior a partir
dos anos 80, recorreu à abertura de universidades privadas61.
A atividade no ensino superior privado concentra-se, poém, num número restrito de áreas
científicas e disciplinas, naquelas que requerem um menor investimento em estruturas
educativas e de investigação, como é o caso das ciências sociais e as humanidades,
concentrando-se 60% dos estudantes nas áreas das ciências sociais e do comportamento,
direito e gestão, contra 25% no setor público (Magalhães, 2004: 310, cf. Martins & Tomé,
2008a: 9). A opção pelo ensino no setor privado, com cerca de 1/3 dos estudantes do
ensino superior, até 2003, era considerada uma segunda escolha.
61
Para Moita, na origem da criação das universidades privadas está a vaga de doutores vinculados ao regime
da ditadura saídos compulsivamente da Universidade com a revolução do 25 de Abril de 1974 (2009: 2).
62
pública, mais exatamente aos 65 anos de existência62.
Presentemente, os planos de estudo em Portugal tendem a uma duração entre 3 e 3,5 anos,
cujo currículo resulta significativamente da racionalização dos recursos das instituições de
ensino superior, pese embora outros fatores presentes. Da reflexão feita, as áreas
estruturantes da formação em Serviço Social incluem a Teoria, a Metodologia, a Política
Social, a Ética e a Deontologia, a Investigação e o Estágio, complementadas por outras
62
A evolução da formação dos assistentes sociais nas tradicionais escolas tem destaque, com ilustração de
todos os seus planos curriculares, na revista de Intervenção Social, nas comemorações dos 50 anos da
formação.
63
A estrutura do plano de estudos de 5 anos foi reconhecida como muito sólida e proveitosa, segundo
McDonough, explicitando que, numa perspetiva de intercâmbio e equivalência de graus na Comunidade
Europeia, o plano proposto colocaria os assistentes sociais portugueses numa posição vantajosa
(McDonough, 1989, cf. Negreiros, 1991: 120).
63
áreas das ciências sociais como a Economia, a Sociologia, a Psicologia e o Direito. Há, no
entanto, que sublinhar o facto da formação profissional exigida limitar-se apenas ao 1.º
ciclo, contrariando o espírito de Bolonha.
A posição da APSS para o 1.º ciclo centrou-se na defesa de 4 anos e 240 ECTS, de acordo
com o processo de Bolonha e a formação em Serviço Social, em 2006, subscrita por
algumas organizações da categoria, com influência junto do ensino privado e público
universitário, recomendações não adotados pelos Institutos Politécnicos que se situaram
apenas nos 3 anos64. Teve igual influência na uniformização da designação do curso,
Serviço Social, caindo a de Trabalho Social, Política Social, Intervenção Social e
Comunitária nos cursos da UTAD, UFP, ISCSP-UTL e ISPG (Martins, 2008)65. Porém, a
regulação da formação nos dias de hoje continua ausente. Assumida exclusivamente pelo
Estado, através da tutela do ensino superior, a regulação baseia-se apenas na homologação
dos curricula de formação e atribuição do grau. Falta-lhe, ainda, dispositivos de peritagem,
acreditação por conselhos especiais com pré-requisitos e critérios para os cursos, exames,
validação e reconhecimento de graus e licenças profissionais (Branco, 2009b).
64
Ao lado da APSS, subscreveram o documento o Centro Português de Investigação em História e Trabalho
Social (CPIHTS), o Centro de Investigação em Serviço Social e Estudos Interdisciplinares (CISSEI), a
Associação de Investigação e Debate em Serviço Social (AIDSS) e o Sindicato Nacional dos Profissionais de
Serviço Social (SNPSS).
65
É também identificada pela autora a nomeação de uma Comissão de Especialistas em Serviço Social, em
2006, para dar parecer junto da DGES sobre novos pedidos de autorização de cursos de 1.º, 2.º e 3.º ciclos, na
área.
64
Longo e intenso foi o processo de esforços e diligências desenvolvido pelo Instituto
Superior de Serviço Social de Lisboa (ISSSL), tendente à implementação da formação pós-
graduada, pelo mestrado e doutoramento, em Portugal, como requisitos à qualificação dos
docentes, investigadores, produção de conhecimento e desenvolvimento científico,
convergentes à afirmação académica em Serviço Social66. Para Branco, a formação longa
no quadro do ensino superior é o que contribui para um saber sistemático, domínio
científico e técnico determinado, como também promove a socialização necessária à
construção identitária como grupo profissional (2009b: 72).
66
É justo enaltecer o papel de Augusta Negreiros, docente do Instituto Superior de Serviço Social de Lisboa,
e honrar a sua memória em todo esse processo.
67
O curso de doutoramento na Universidade do Porto foi efémero, sem continuidade até ao momento.
65
Social acedeu à universidade e caraterizadamente com largas limitações68.
68
Significa que este fenómeno pode ser atribuído à baixa permeabilidade das ciências sociais ao Serviço
Social, naquilo que às dinâmicas de afirmação disciplinar diz respeito na universidade portuguesa, mas outros
fatores poderão influenciar, designadamente políticos, na relação entre Estado e Políticas Públicas, tais como
a implementação tardia do Rendimento Mínimo Garantido/Rendimento Social de Inserção, implementado em
Portugal em 1996 (por recomendação da UE desde 1992).
66
construção de saberes mediatizados pela prática social, aonde se insere a prática
profissional (Pinto, 1997: 46, cf. Oliveira, 2004: 3).
A definição sobre formação retoma, assim, a ideia de saber e ética de saber. Recorrendo às
lições de Jacotot, é o saber que se faz instrumento de igualdade, pela reafirmação da
relação emancipadora que parte da igualdade e daquilo que se sabe e não daquilo que se
desconhece, contrariando a relação pedagógica normal que parte da hipótese da
desigualdade. A questão está, portanto, naquilo de que se parte: da igualdade ou da
desigualdade. Normalmente, a relação pedagógica parte da hipótese da desigualdade,
mesmo sendo para chegar à igualdade. A relação emancipadora parte da igualdade, ou seja,
exige que se parta, não do que o ignorante desconhece, mas daquilo que sabe. “O ignorante
sempre sabe alguma coisa e sempre pode relacionar o que ignora ao que já sabe”
(Rancière, cf. Vermeren et al., 2003: 191)69.
67
transformar essa perceção, consequentemente, ela é uma reconstrução (2000: 1)70.
Para Tochon, a formação nestes pressupostos convoca à relação teoria-prática, pela qual
não mais a prática se concebe aplicando a teoria, mas ao contrário, é a teoria que emerge
do saber-fazer, ou seja, não há mais os especialistas e os aprendizes, mas uns e outros estão
num continuum de percursos e apropriações próprias (Tochon, 1996, cf.
Sidambarompoullé, 2007: 121). Assim, não existe uma gramática universal de saberes,
mas de diferentes visões, igualmente válidas, umas mais particulares e individuais,
culturais e locais. É neste sentido que as gramáticas da experiência pelo estágio são teorias
práticas que se aplicam particularmente ao ensino e ao ato educativo em geral, pertinente à
proposta de formação em Serviço Social.
70
A educação defendida pela UNESCO para o século XXI, segundo o relatório coordenado por Jacques
Delors, 1998, é dirigida à totalidade aberta ao ser humano, a todos os seus componentes, uma educação
integral, através de quatro pilares: aprender a ser, a fazer, a viver juntos e a conhecer (Werthein, 2000: 11, cf.
Morin, 2000). Esta referência é feita na apresentação sobre Morin, em “Os Sete Saberes Necessários à
Educação do Futuro”, Cortez (2000). Werthein é o representante da UNESCO no Brasil, coordenador do
Programa UNESCO/Mercosul.
68
termos que são funcionais para si (Sidambarompoullé, 2007)71.
Caires & Almeida (2000), autoras situadas nas Ciências da Educação, analisam a
importância atribuída ao processo de estágio, tipologia e dimensões, como formação
estruturada na preparação dos estudantes para o mundo do trabalho, suas potencialidades e
dilemas no mesmo processo. Distinguem diferentes tipologias de estágios curriculares, tais
como: i) estágio como capacitação do aprendiz; ii) estágio orientado por objetivos
académicos; iii) estágio com preocupações desenvolvimentistas; iv) estágio como
articulação entre conhecimentos e competências.
71
Dolize Sidambarompoullé (2007), que suporta uma análise abrangente sobre o estágio, procura superar as
limitações encontradas na formação em Serviço Social reveladas em França e em particular na ilha de
Reunião, adaptando o modelo reflexivo a uma estratégia que designa por comunidade de prática, sustentada
por instrumentos e pedagogias de alternância.
69
universidade e instituição72.
Trata-se de uma formação orientada pelos seguintes pressupostos: professor como prático
72
Vale a pena ter em atenção a avaliação de estágios curriculares cujas manifestações de insatisfação são
sublinhadas por Briggs (1984), através da revelada relutância, por parte de alguns orientadores de campo, em
fazer qualquer tipo de apreciação negativa ao trabalho do aluno ou de classificar a sua prestação como
insatisfatória, mas contraditoriamente queixam-se que a universidade não selecionou ou pôs de parte os
alunos mais fracos (Caires & Almeida, 2000: 233).
73
O estudo, situado em 2006, junta ainda outras autoras tais como: Maria Moreira, Isabel Barbosa, Madalena
Paiva e Isabel Fernandes, na área das Ciências da Educação.
70
reflexivo e autónomo que forma sujeitos autónomos; facilitador da aprendizagem,
mediador na relação aluno-saber, parceiro da negociação pedagógica; aluno como sujeito
crítico e produtor do saber; formação como processo dinâmico e evolutivo; prática
geradora de teoria; saber dinâmico, transitório e diferenciado de sujeito para sujeito.
Reportada a Stone, as autoras identificam ainda, como pressuposto do modelo, o sentido da
visão e a visão do sentido, segundo o qual a direção da supervisão deve conferir às práticas
educativas a transformação pessoal e social inscrita nos valores da democracia, onde
supervisores, professores e alunos são parceiros de aprendizagem e de transformação das
condições de qualidade da educação (Stone, 1984: vii, cf. Vieira, 2006 et al.: 8). O modelo
de autonomia tem como finalidades: aproximar o aluno do saber e do processo de
aprendizagem; ajudar a aprender a aprender e a desenvolver a capacidade de gerir a própria
aprendizagem; encorajar a responsabilidade e a assunção de uma postura pró-ativa no
processo de aprendizagem; desenvolver uma perspetiva crítica da escola, do saber e da
aprendizagem; promover a relação entre a escola e a vida.
74
Trata-se de um modelo que se opõe à pedagogia da dependência, contrapondo, assim, transformação a
dependência. Os principais pressupostos do modelo de reprodução/dependência são os seguintes: aluno como
sujeito consumidor passivo do saber; professor como figura de autoridade social, científica e pedagógica,
única fonte de saber, assumindo o papel de transmissor, e o saber estático e absoluto. Os seus traços
processuais revelam-se através da focalização nos processos de transmissão e nos conteúdos de
aprendizagem, no clima potencialmente autoritário e formal, nos processos dominados pelo professor, único
decisor e avaliador, e do aluno dependente do discurso do professor e nas tarefas e, ainda, pela ênfase na
competição e no individualismo. A sublinhar, quanto às suas finalidades, o modelo de dependência visa
desenvolver, basicamente, a competência académica do aluno, traduzida pela aquisição de conhecimentos e
domínio de capacidades cognitivas (Vieira et al., 2006: 28).
71
adequação às expetativas, interesses e necessidades dos formandos, pela informatividade
face ao seu conhecimento prévio ou aos desenvolvimentos teóricos do domínio em estudo,
pela inovação no âmbito do seu contributo para a transformação das práticas, assente na
autonomização do professor e dos alunos, pela negociação e emergência, assentes na
mundividência do formador e dos formandos e supondo processos de construção
colaborativa do saber educacional (Vieira et al., 2006).
Este modelo da transformação, segundo Caires & Almeida (2000), apoia-se no modelo
reflexivo proposto por Schön (1983; 2000), cuja tarefa central é desenvolver relações entre
a aprendizagem cognitiva e experiencial e entre a teoria e a prática. Permite ao estudante
analisar criticamente as práticas, à luz dos seus conhecimentos teóricos e empíricos e o
desenvolvimento da capacidade de autoanálise e reflexão. O estágio proporciona o
estabelecimento de relações com outros profissionais, a resolução de problemas, a tomada
de decisões e o desenvolvimento de perspetivas críticas relativamente à sua profissão, ao
sistema e mudanças pessoais, em respetiva consonância.
Subjacente a este modelo, está a pedagogia para a autonomia defendida por Freire, o qual
tem no seu centro a liberdade, a postura dialógica e de escuta do professor, a ética e a
72
comunicabilidade. Sobre a autonomia, o autor sustenta que “ninguém é sujeito da
autonomia de ninguém. (...) Uma pedagogia da autonomia tem de estar centrada em
experiências estimuladoras da decisão e da responsabilidade, vale dizer, em experiências
respeitosas da liberdade” (Freire, 2007:107)75.
Associando pedagogia à liberdade, defende que “o erro na verdade não é ter um certo
ponto de vista, mas absolutizá-lo e desconhecer que, mesmo do acerto de seu ponto de
vista é possível que a razão ética nem sempre esteja com ele” (Freire, 2007:23).
Pela postura dialógica entre professor e estudante, aberta, curiosa, indagadora e não
passiva, enquanto fala ou enquanto ouve, o professor traz o estudante até à intimidade do
movimento do seu pensamento76. Igualmente, combate a incompetência que desqualifica a
autoridade do professor e apela à sua generosidade e humildade. O clima de respeito que
nasce das relações justas, sérias, humildes, generosas, em que a autoridade docente e as
liberdades do estudante se assumem eticamente, autentica o caráter formador do espaço
pedagógico (Freire, 2007). Ensinar exige segurança, competência profissional e
generosidade, mas também saber rever-se, aceitar e escutar, na seguinte perspetiva:
“não é falando aos outros, de cima para baixo, sobretudo, como se fôssemos os
portadores da verdade a ser transmitida aos demais, que aprendemos a escutar, mas é
escutando que aprendemos a falar com eles. Somente quem escuta paciente e
criticamente o outro, fala com ele (...). É preciso que quem tem o que dizer saiba, que
sem escutar o que quem escuta tem igualmente a dizer, termina por esgotar a sua
capacidade de dizer, por muito ter dito sem nada ou quase nada ter escutado” (Freire,
2007: 113)77.
Saber escutar está também associado à ética na pedagogia. Permite que o educador respeite
a leitura do mundo do educando, que reconheça a historicidade do saber e recuse a
arrogância científica. A inteligibilidade do mundo é histórica e dá-se na história. A leitura
do mundo revela a inteligência do mundo, cultural e socialmente constituída, revela o
trabalho individual de cada sujeito no próprio processo de assimilação da inteligência do
mundo (Freire, 2007).
75
À liberdade e autonomia, poderia associar-se a criatividade no processo pedagógico, trazendo à reflexão
contributos do autor Ken Robinson (2009), The Element: How Finding Your Passion Changes Everything,
Penguin e 2001, Out of Our Minds: Learning a Creative, London: Wiley-Capstone.
76
A realização de um seminário semanal é uma estratégia proposta por Freire para o debate das várias
curiosidades, convocando os estudantes à imaginação e passando da curiosidade espontânea à epistemologia
(Freire, 2007: 88).
77
Por isso, o autor acrescenta que “quem tem o que dizer deve assumir o dever de motivar, de desafiar quem
escuta, no sentido de que, quem escuta diga, fale, responda” (Freire, 2007: 117).
73
As ciências permitiram a compreensão de muitas certezas, mas ajudaram a revelar zonas de
incerteza. A pedagogia deverá traduzir-se num instrumento que conduza o estudante ao
diálogo criativo sobre as dúvidas e interrogações do nosso tempo, condição necessária para
uma formação cidadã. A urgência de universalização da cidadania requer uma nova ética e,
consequentemente, uma escola de educação e cidadania para todos.
“Seria impossível saber-se inacabado e não se abrir ao mundo e aos outros à procura de
explicação. (…) O sujeito que se abre ao mundo e aos outros inaugura com seu gesto a
relação dialógica em que se confirma como inquietação e curiosidade, como
inconclusão em permanente movimento na História” (Freire, 2007: 136).
78
Para Paulo Freire, “é imprescindível instigar constantemente a curiosidade do educando em vez de
‘domesticá-la’. (...) Quanto mais me torno capaz de me afirmar como sujeito que pode conhecer, tanto
melhor desempenho minha aptidão para fazê-lo” (2007: 124).
74
Algumas recomendações sobre o estágio da AIETS/IASSW e da FITS/ IFSW, 2004,
aprovadas em Adelaide, Austrália são, entre outras: i) estágio com duração e complexidade
suficiente para garantir oportunidades de aprendizagem aos estudantes na sua preparação
para a prática profissional; ii) coordenação do planeamento e da articulação entre a
instituição de ensino e a agência; iii) nomeação de orientadores cooperantes qualificados
na profissão; iv) disponibilizar manuais de estágio aos orientadores cooperantes e
assegurar o seu acompanhamento; v) participação dos orientadores cooperantes no
desenvolvimento dos curricula; vi) parceria entre a instituição de ensino e a agência; vii)
garantir os recursos no apoio às necessidades do estágio (IASSW/IFSW, 2004).
Apesar de distintas caraterísticas, estrutura e duração, o estágio curricular está presente nos
planos de estudo do curso de Serviço Social, constituindo-se importante componente dos
mesmos, com vinculação entre a educação formal, o mundo do trabalho e a prática
profissional79. Simultaneamente, tem a função de contribuir para a apropriação do
significado social da profissão, da sua identidade individual e coletiva (Souza et al., 2010).
O estágio define-se como o processo de aprendizagem do saber agir e constitui-se como
um dispositivo pedagógico fundamental para as aprendizagens das práticas profissionais
(Granja, 2005). Dito de outro modo, o estágio é o espaço de formação do fazer concreto do
Serviço Social (Buriolla, 1996).
75
saber legitimado como saber científico, demonstrando a capacidade de articular o saber
teórico e prático, cuja teoria orienta a prática e esta retroalimenta a teoria, reorganizando os
saberes em função dos limites das exigências da prática (Granja, 2005). Ligar os saberes, e
dar-lhe sentido, é um processo pedagógico associado ao estágio – negociação de sentido. O
estágio, organizado como processo de aprendizagem para construir o saber da ação, resulta
para o estudante um espaço de aprendizagem da vida e da compreensão humana.
Permitindo-lhe confrontar a realidade e desenvolver um tipo de inteligência geral que é a
base dessa construção, competências particulares, especializadas, nomeadamente as
profissionais (Granja, 2005)80.
80
A relação teoria-prática, o binómio investigação-ação, a aprendizagem humana do estagiário situando-se
enquanto pessoa, perante o mundo e a vida, a reflexão-ação, a reflexão crítica, constituem-se componentes
fundamentais do projeto pedagógico nas bases do plano de formação desde os anos 80 no Instituto Superior
de Serviço Social de Lisboa, dimensões fortemente reconhecidas por membros do seu corpo docente
(Ferreira, 1985: 64).
81
Estes princípios resultam de um longo programa de debate junto da categoria profissional no Brasil, bem
como de algumas comunicações apresentadas à 19ª Conferência Mundial de Serviço Social em 2008.
76
autoconfiança e de maturidade dos estagiários; desenvolver o raciocínio prático e a
capacidade de resolução de problemas.
82
Um estudo identificado sobre “a Prática de Aprendizagem no Primeiro Ano do Novo Serviço Social”, na
Inglaterra, situa as normas de estágio que recomendam 200 dias, nos três anos de formação, fazendo também
a crítica às mesmas, designadamente à existência de uma manta de retalhos (patchwork) dos modelos
praticados, aos seus padrões dificilmente percebidos, às instituições pagas pelo trabalho desenvolvido com os
estudantes durante o estágio, à controvérsia sobre o facto de profissionais supervisores de campo
desconhecerem os objetivos do estágio e à baixa participação dos cidadãos (Doel & Sawdon, 2007).
83
Ainda sobre a formação de Serviço Social na Inglaterra, O’Connor et al. (2009), referem-se à necessidade
de atividades de preparação para a prática de estágio, designadamente, consulta de arquivo/dossier sobre
trabalho, frequência de laboratórios sobre habilidades e realização de treino de observação, programas
interativos, criando situações em ambiente virtual. Uma proposta mais pragmática, sobre um módulo
específico apresentado pela sigla PREPARES, propõe matérias de preparação, tais como: prática reflexiva;
inteligência emocional; utilizador do serviço e perspetivas sobre o cuidar. (O’Connor, Louise; Cecil, Bob &
Boudioni, Markella, estão ligados à London South Bank University, UK, e a Canterbury Chist Church
University, Kent, UK).
77
na orientação e acompanhamento de estágio curricular no âmbito da formação em Serviço
Social.
Salienta aquele autor, perante a impossibilidade de assegurar uma relação estável entre a
saída da formação e a entrada no trabalho, que se verifica uma revalorização do local como
instância de gestão das relações entre a formação e o trabalho, sem resultar na revitalização
das redes locais de sociabilidade e, portanto, da experiência prática85. Com efeito, a
tendencial revalorização do mundo do trabalho sobre a formação revela uma persistente
dicotomia na relação teoria e prática, que a incontrolável promoção da formação reforça,
apesar de abertura à criação de espaços de experimentação social e, por isso, ao potencial
exercício de uma cidadania participativa no trabalho. O diálogo, a aliança e rede
constituem importantes estratégias, que devem aproximar-se mutuamente.
84
Correia sublinha que as relações entre educação e trabalho e entre educação e cidadania foram marcadas
por forte ambiguidade com dissociação entre educação para a cidadania e educação para o trabalho, sendo
que, atualmente, se assiste a uma subordinação simbólica e institucional da educação para a cidadania,
relativamente às lógicas instrumentais de educação para o trabalho (2010: 26).
85
Correia (2010) denuncia formas híbridas e trans-estatais na promoção da formação articulada ao trabalho e
na promoção incontrolada da flexibilidade, com incomunicabilidade entre os mundos do trabalho e da
formação e a subordinação deste àquele com lugar à perturbação, incerteza e promiscuidade. Realça,
contudo, que estas transformações possibilitam também a criação de espaços de experimentação social, o que
permite pensar teoricamente o mundo do trabalho como o espaço de exercício de uma cidadania participativa
e olhar para o mundo da formação como um dispositivo de qualificação e de promoção de coletivos de
trabalho, promotores de uma cidadania no trabalho.
78
Fica compreendida, portanto, a subscrição do autor a um paradigma alternativo vinculado à
epistemologia da controvérsia, cuja postura ética e política se define por uma cientificidade
do agir comunicacional, não em torno de uma epistemologia de observação, do olhar
distante ou neutro, próximo ou implicado, mas uma epistemologia de escuta subordinada à
problemática da argumentação e da objeção. Constrói os sujeitos/objetos de investigação
nos espaços e tempos sociais estruturados à volta da produção discursiva da realidade. A
epistemologia da escuta favorece a aplicação hermenêutica das narrativas científicas, uma
aplicação em que as mesmas não se sobrepõem às narrativas profanas, mas antes
desempenham um papel mediador indispensável à autorreflexividade partilhada. A
investigação apenas oferece o fio condutor para a ação e não a teoria normativa para a ação
(Correia, 2010). Este posicionamento permite fazer a ponte com a teoria comunicativa de
Habermas, a que já se aludiu anteriormente.
Tendo presente que o contacto do estudante com a prática profissional se traduz num
momento carregado de expetativas e ansiedades diversas, o compromisso da formação
deverá ser assumido de forma responsável, possibilitando ao estudante o apanhado crítico
da realidade, não só da instituição, mas também alternativas que juntos podem propor.
Significa, assim, um espaço de construção da profissão partilhado pelo profissional que
atua e pelo discente que necessita de ter contacto com a realidade para a sua formação.
79
Em síntese, relação teoria e prática, formação e trabalho requer maior incorporação entre
ambos e o fortalecimento dos profissionais com partilha do espaço de construção da
profissão e dos curricula do estágio. Este como prática situada numa realidade social
experienciada pelos atores sociais e os estudantes em formação, conjuga essa relação
dialógica. Flávia Vieira (2009) explora essa relação consubstanciada na indivisibilidade
entre estágio e supervisão académica, remetendo para esse processo o papel de regulação
da qualidade da pedagogia. É o que se seguirá na análise de leituras e pressupostos
concetuais prévios à pesquisa empírica que vem auxiliando o referencial sensibilizador
sobre o objeto em estudo.
86
O estágio continua a ser o parente pobre de todas as disciplinas. Alarcão refere-se a imediatas reações na
Universidade à integração de cursos profissionalizantes, nos anos 70, cujas reações manifestavam-se no
80
marcada pela transmissão de conhecimentos e menos na articulação teoria-prática. Jogam,
portanto, na articulação entre o saber e o fazer as diferentes propostas ao nível do
desenvolvimento cognitivo e dos processos pedagógicos, conforme se analisa no presente
capítulo, o qual se subdivide em três partes: a primeira centrada na supervisão no espaço
académico, a segunda na supervisão local e, por fim, no fórum de reflexão crítica de
identidade profissional juntando ambas as dimensões da supervisão.
sentido de que não cabia à universidade profissionalizar os alunos, mas apenas transmitir conhecimentos
(Alarcão, 1996 cf. Caires & Almeida, 2000: 220).
87
Sobre os modelos absolutista e relativista, Helena Viveiros & Teresa Medeiros apoiam-se nos seguintes
autores: Perry (1970, 1981 e 1984); Dewey (1974); Schon (1987); e Bastos (1998). Sobre o modelo reflexivo,
apoiam-se em Schon (1987), Alarcão (1996) e Sá-Chaves (2000).
81
experimentação e em que o supervisor se assume como orientador que ajuda a encontrar a
melhor teoria. Tem um forte apoio nos alunos com pensamento e desenvolvimento
relativista (Viveiros H. & Medeiros, 2005).
A supervisão pode ser tomada com importante função reguladora na qualidade pedagógica
da educação, designadamente, no âmbito do estágio, com o objetivo de problematizar a
realidade social e a teoria e, simultaneamente, imaginar possibilidades para o estudante em
formação. Integrada nessa sua função, a supervisão define-se como teoria e prática de
regulação de processos de ensino e de aprendizagem em contexto educativo formal (Vieira,
2009)88. As atividades pedagógica e supervisiva fazem parte de um só projeto que
pressupõe indagar e melhorar a qualidade educativa da formação, através de quatro
estruturas denominadas por visão-ação-reflexão-contexto e cujas forças, articuladas entre
si, conduzem à transformação de teorias e práticas pedagógicas.
Assumindo Vieira (2009), o processo como “super Visão”, nele destaca os seguintes
elementos: i) a teoria e prática constituem-se como construção pessoal e social do
conhecimento teórico e prático; ii) a orientação assume-se como transformadora e
emancipatória da formação e da pedagogia escolar; iii) os valores de uma sociedade
democrática assentam na liberdade e responsabilidade; iv) a indagação e intervenção
crítica estão presentes; v) a democraticidade, dialogicidade, participação e emancipação
são elementos fundamentais do processo. Assim, um modelo tendencialmente democrático
e informal de supervisão centra-se na participação do aluno, na tomada de decisões e
elaboração de projetos e contratos, nas tarefas de tipo reflexivo e experimental, no
88
Mostram-se fecundas as bases de uma teoria em construção, defendida por Vieira (2009), apoiada num
projeto de equipa com mais de uma década, no campo da formação de professores. Revendo e refletindo a
gradual experiência feita ao longo dos anos em que a autora tem vindo a desenvolver a supervisão com
estudantes em estágio na área das ciências da educação, na Universidade do Minho, assume o processo como
“super Visão”.
82
desenvolvimento da capacidade de planificação, regulação e (auto) avaliação da
aprendizagem, na gestão colaborativa da informação e da palavra, na construção
colaborativa de saberes académicos, sociais e de aprendizagem e na valoração da função
formativa das práticas de (auto) avaliação integradoras (Vieira, 2009).
É no modelo reflexivo que também se situa Alzira Lewgoy (2007) na área do Serviço
Social. Espaço de desenvolvimento de habilidades e de articulação no “trinómio prática-
teoria-investigação”89. Define supervisão como mediação entre formação e exercício
profissional, suportada por categorias e correntes de pensamento90.
Na evolução da supervisão a autora começa por referir o período doutrinário entre 1900-
1930, que visava a competência da eficácia do fazer bem. Segue-se, nos anos 30, a
conceção de supervisão apoiada na metodologia de estudo-diagnóstico-tratamento,
preconizando uma formação generalista e de vocação para o fazer bem. Nos anos 40, o
processo pedagógico global de ajuda combina com a doutrina moral e a eficácia do como
fazer. Nos anos 50-60, a supervisão educativa e pedagógica centra-se no supervisado,
assim como na técnica de como fazer. Nos anos 70-80, a conceção de supervisão faz
prescrever a eficácia e a eficiência, para tomar um caráter administrativo e didático,
combinando o processo educativo, de aprendizagem e de capacitação, numa conceção de
formação que passa de generalista a especialista, cujas competências se revelam pelo zelo
89
Voltamos a sublinhar, que a autora Alzira Lewgoy (2007), foi um importante estímulo à consolidação da
escolha do tema e um guia inicial à elaboração do pré-projeto. É sobre a tese que nos reportamos, mas
constitui obra publicada pela mesma autora (2009), Supervisão de estágio em serviço social: desafios para a
formação e exercício profissional, São Paulo: Cortez.
90
Lewgoy (2007) fez uma retrospetiva histórica onde articula a supervisão com a história do Serviço Social
e, partindo do entendimento sensível sobre o Serviço Social como vocação ou trabalho (trabalho
filantrópico), sublinha que o estágio se concretizava pelo treino prático vocacional. A aprendizagem tinha
lugar pela ação e no trabalho de campo, no aprender fazendo, segundo Mary Richmond e John Dewey. A
supervisão, assumidamente mais de tipo administrativo do que pedagógico e situada no “como fazer”, passou
a uma visão de controlo.
83
da técnica, pela dimensão técnico-política, que vai do como fazer ao saber fazer. Nos anos
90, a conceção de supervisão aposta na identidade profissional, no ensino-aprendizagem e
na terapia profissional, na indissociabilidade entre estágio e supervisão.
Nas categorias de análise da supervisão estão: i) aprendizagem; ii) apoio; iii) autonomia;
iv) criatividade; v) agenda comum entre alunos, docente e profissionais supervisores
91
Em contexto da Conferência Mundial de Serviço Social (2008), Lewgoy retoma a supervisão inscrita nos
desafios e reafirmação de compromissos, conferidos pelas exigências do contexto, político, económico e
educacional, processo suportado por transformações na conjuntura. Consequentemente exige um profissional
com competência crítica e criativa (Lewgoy, 2008: 9).
84
locais, preconizando a tríade entre supervisor académico, de campo e estagiário e o
“trinómio entre prática-teoria-investigação”. O trinómio proposto deverá pressupor um
trabalho coletivo e articulado entre a supervisão docente e supervisão de campo, que
necessariamente envolve as organizações vinculadas e os seus atores em rede.
85
Davys & Beddoe vêm defendendo, porém, uma proposta de modelo, com divulgação de
um primeiro estudo, em 2000, e o seu aprofundamento em 2009, trazendo contributos à
supervisão local, mas destacando algumas complexidades do processo, tais como, ao nível
da parceria com o estudante, das suas necessidades e das diferenças de poder (Davys &
Beddoe, 2000: 438). Apoiadas em Ford & Jones para atestar que a função da supervisão é
ajudar o estagiário a tornar-se consciente da natureza do trabalho, apreender e adquirir
conhecimento e competências para responder de forma útil às necessidades sociais, o
modelo proposto compõe-se de quatro fases: 1) descrição; 2) exploração/planeamento; 3)
execução/experimentação; 4) conclusão/ avaliação (Davys & Beddoe, 2000)93.
Este modelo representa, com efeito, um desafio para o supervisor do estudante, que deve
avaliá-lo na sua experiência e, no sentido mais amplo, de como essa experiência pode
transformar-se em aprendizagem, no equilíbrio entre o processo didático de ensino (dando
informações e instruções) e de facilitação da aprendizagem do aluno através da reflexão.
As autoras fazem notar que a reflexão em situações onde há pouca experiência, acumula
enorme ansiedade, aonde interfere a natureza do trabalho e, simultaneamente, o processo
de avaliação dos alunos (Ruch, 2002, cf. Davys & Beddoe, 2009). Por último, há a
considerar a gestão da continuidade da autonomia-dependência que os alunos testam face
93
No quadro comparativo traçado entre a supervisão centrada no estudante e a centrada no profissional,
Davys & Beddoe (2000) alertam para as suas semelhanças e também as diferenças entre os dois processos,
distinguindo-se principalmente na supervisão centrada no estudante o foco centrado no trabalho realizado,
articulado com o processo educativo subjacente, ou de aprendizagem do aluno.
86
aos seus conhecimentos e competências no trabalho real.
Altos níveis de formação e informação (didática) são necessários para que os alunos
tenham um contexto e orientações básicas para as tarefas da prática, sustentada por altos
níveis de apoio e retorno positivo e facilitador para que possam aceitar o desafio de refletir
sobre as medidas tomadas e as consequências dessa ação94. O modelo reflexivo de
aprendizagem proposto assenta na compreensão dos princípios da aprendizagem do adulto,
sob duas premissas: a primeira tem por objetivo principal facilitar ao supervisando a
reflexão sobre aprendizagem e desenvolvimento; a segunda apela à aprendizagem pela
reflexão e para a transformação95. Sendo ambas as premissas complementares, a segunda
vem na convergência das propostas já anteriormente refletidas.
As fases do modelo proposto por Davys & Beddoe são consubstanciadas no compromisso
e no clima de confiança estabelecido, previamente, entre estudante e profissional, assim
como na diretriz da proposta de agenda feita pelo aluno. Assim, distintas as quatro fases já
reveladas – a descrição, a exploração ou planeamento, a experimentação ou execução e a
avaliação ou conclusão - a agenda antecede e marca a entrada no processo de supervisão,
cujo primeiro passo é ocupado pela descrição do evento/situação pelo estudante96. A tarefa
do supervisor é explorar suficientemente o que é que o estagiário solicita a partir da sessão
de supervisão, qual é a questão, ou questões que o estagiário/supervisando traz à
supervisão e o que deseja levar da sessão para o estágio.
94
Para as autoras, apesar da diversidade de modelos teóricos de supervisão (a saber: Loganbill et al., 1982;
Brown e Bourne, 1996; Shohet Hawkins, 2006; Juhnke, 1996; Bond e Holland, 1998 e Tsui, 2005), poucos
fornecem uma estrutura orientadora sobre o processo.
95
Como observa Morrison, não é suficiente ter uma experiência para aprender, sem refletir sobre a mesma
(Morrison, 1993: 45, cf. Davys & Beddoe, 2009).
96
Ford & Jones, 1987, enfatizam que o estudante seja motivado a fazê-lo com o mínimo de interrupção ou
questionamento do supervisor, importante para incentivar e apoiar a apropriação da situação pelo aluno e
evitar o “nós-ismo” (Ford & Jones, 1987, cf. Davys & Beddoe, 2000).
87
“Que sentimentos surgiram? Como reconhece o aluno, trata, acomoda
e expressa esses sentimentos? Qual foi a sua reação intuitiva à situação? Que
decisões toma? Que pensamentos surgiram a partir da experiência? O que aprendeu
sobre as suas próprias respostas? O que gostaria de experimentar numa situação
similar? Como é que respondem ao impacto da política social, aos constrangimentos
estruturais e culturais e às questões de género? Como é que reconhecem e respondem
às questões de poder e opressão? Quais são as semelhanças e diferenças entre o cliente
e as suas próprias experiências e reações, tanto passadas como presentes?” (Davys &
Beddoe, 2000: 447).
Esta fase de exploração apela ainda à avaliação sobre as medidas a tomar (as iniciativas, o
seu processo e estratégias), consideradas em termos de teoria e opções, articulando
conhecimento, habilidades e valores específicos para a situação em apreço. A vertente mais
deficitária, no planeamento feito, poderá ser examinada em termos de consequências
imediatas ou a longo prazo, sendo as alternativas identificadas e as lacunas de
aprendizagem registadas. A exploração/planeamento constitui-se, portanto, num fórum
pronto para o retorno/retroalimentação. À semelhança de um exame, esta etapa permite que
o aluno concetualize a situação e considere o trabalho no mais amplo contexto social,
político e cultural. O momento apela às implicações, ou seja, ao contexto do evento ou
problema. A questão trazida à supervisão é, então, enquadrada não só em termos de teoria,
política(s), legislação, protocolos de intervenção (tratamento), e ética profissional. A tarefa
da fase de exploração é chegar a alguma decisão ou entendimento conclusivo sobre o
assunto97. A teoria sustentada apoia-se também na experiência e nas opções a tomar, de
acordo com os resultados a alcançar. Neste ponto, o supervisor pode recomendar novas
leituras ou outro tipo de recursos. A tarefa do supervisor de campo é ajudar o estudante a
apropriar-se da situação, compreender a reação e adesão dos envolvidos e o seu
significado.
97
A fase permite, segundo Ford & Jones (1987), que o supervisor de campo avalie o conhecimento do
estudante. Esta é a fase mais ativa do supervisor e onde tem a oportunidade de ensinar, informar, exigir e,
eventualmente, até mesmo proibir. Em suma, é o lugar para intervenções didáticas. É também um lugar para
o feedback, confiança e afirmação. Durante esta fase o supervisor pode movimentar-se entre as etapas de
impacto e de implicação, sobre a exploração e a descoberta do tema. A reflexão pode levantar questões de
natureza mais concetual e teórica, a serem exploradas, e pode ocorrer avanços e recuos na discussão e
aprofundamento (Ford & Jones, 1987, cf. Davys & Beddoe, 2000).
88
aprendizagem reflexiva, a fase de experimentação atende explicitamente à forma como o
estudante deve avançar sobre a situação. Nesta fase de experimentação do modelo, o plano
é testado. O supervisor de campo deve considerar as exigências da tarefa em termos dos
conhecimentos, habilidades, atitudes e recursos necessários para o estudante agir com
sucesso. Com efeito, a fase de execução/experimentação incide sobre os planos de ação e
possíveis alternativas a introduzir98.
As autoras sublinham que esta prática reflexiva tem tido um apoio com considerável
impacto na literatura sobre a formação de assistentes sociais durante a última década,
apoiando-se em Ingamells (1994); Yelloly & Henkel (1995) e Gould & Taylor (1996), ou
98
Durante esta aprendizagem e pelo tempo que for necessário, serão analisadas as situações, as
consequências e os planos de contingência. O supervisor deve também considerar a capacidade de
aprendizagem, tendo em conta que os estudantes variam na sua capacidade de internalizar, sustentando como
finalidade o estímulo do desenvolvimento dos estudantes pelo trabalho de campo.
99
Na conclusão desta etapa, o supervisor de campo centra-se num tema, evento, problema seguinte e começa
o ciclo uma vez mais. É útil ao estudante e ao supervisor passarem por momentos de reflexão conjunta sobre
os temas, o seu progresso, os desafios e as conquistas sobre o trabalho desenvolvido. É um momento em que
comentários gerais podem ser feitos para auxiliar o estagiário na análise ou na aprendizagem da prática. Os
autores sublinham que a tensão sobre a apreciação do estágio de estudantes é real e que um regular feedback,
dado sobre o progresso do estudante, pode ser reconfortante, ajudando-o a reconhecer as áreas em que mais
deverá investir para melhores resultados.
100
É relevante ter aqui presente o contributo de Sam Tsui (2005). O autor, que se tem ocupado do estudo dos
modelos de supervisão na profissão, defende que a mesma só pode ser entendida como parte do contexto
cultural dos participantes, cujos papéis de supervisão, modelos e competências são todos muito influenciados
pela cultura que significa o maior contexto para a supervisão (Tsui, 2005: 46-47).
89
no trabalho de Schön (1987), sobre os processos de aprendizagem em educação
profissional.
Como concluem as autoras, o modelo foi projetado para atender às demandas do trabalho
social no mundo contemporâneo, onde mudanças sociais, políticas e culturais ocorrem. A
proposta visa ultrapassar o modelo redutor de listagem de tarefas, caraterístico das últimas
décadas. Em vez disso, é sugerido que cada sessão seja um percurso de aprendizagem em
si, pela defesa do processo de supervisão em foco, centrado nas próprias práticas
emergentes e necessidades do estudante como aprendiz. Através da facilitação cuidadosa
de um processo reflexivo, utilizando o “ciclo de aprendizagem”, cada sessão de supervisão
pode construir as habilidades de auto supervisão do estudante. Pois é essa a capacidade de
fazer, de saber e de saber estar com os clientes, ao mesmo tempo refletindo sobre o
processo e futuro da intervenção, que está no centro de excelência profissional. O modelo
apresentado sugere uma mudança de paradigma, baseado na compreensão da educação de
adultos com ênfase em estratégias de aprendizagem para a prática reflexiva, como
metodologia a seguir.
Este modelo reflexivo, centrado não no supervisor docente, mas no de campo e na relação
centrada no estudante, leva a outro tópico a reter, ou seja, perceber qual o perfil do
assistente social/orientador cooperante no estágio. Oliveira (2008), trouxe à 19ª
Conferência Mundial de Serviço Social, o resultado de uma auscultação feita sobre o perfil
do orientador de campo (supervisor de campo, local ou profissional de apoio ao estudante
na instituição), manifestada pela maioria dos informantes.
Na mesma auscultação sobre as carências para o exercício dessa atividade, 60% respondem
que a universidade não investe nos profissionais que legitimam o seu produto, isto é, no
processo teórico formativo (Oliveira, 2008). Em suma, há necessidade de capacitação e
atualização, sublinha a autora, assim como de reflexão sobre a prática, na perspetiva da
articulação teórica e prática no quotidiano, procurando o nexo entre o fazer e o pensar a
profissão, conjeturar sobre a ação profissional e analisar criticamente as situações
vivenciadas na instituição. A orientação proporcionada ao estudante na supervisão de
90
estágio é uma componente importante para a própria atualização dos profissionais, bem
como para a vinculação com a produção científica realizada pelo próprio estudante com a
cooperação desses profissionais, sendo que a análise da teoria e da prática, originária da
formação académica, levam a um retorno da vivência profissional101.
A proposta da autora converge para a de Brown & Bourne (1996) sobre a supervisão na
profissão103. O modelo de supervisão proposto baseia-se em valores centrados no contexto
geral e local, forças políticas, intervenção comunitária, interdependência da equipa e
orientada segundo um modelo antiopressivo e antidiscriminatório, com o compromisso na
estratégia de empowerment para os utilizadores e equipa, assente em três grandes
dimensões: i) modelo de ensino-aprendizagem; ii) modo de comunicação; iii) orientação
do processo (Brown & Bourne, 1996: 23). Portanto, o orientador cooperante (supervisor de
campo) aplica ao estágio um modelo semelhante à supervisão proposta a nível profissional.
101
As assistentes sociais assumem-se como colaboradoras da formação profissional, sendo que 80% definem
como fundamental essa função, pois através de seu exercício profissional promovem uma leitura mais
apurada da realidade (Oliveira, 2008).
102
Martha Wiebe, com quem também foi estabelecido contacto no âmbito do presente projeto, é diretora e
coordenadora de estágio na Universidade de Carleton, Canadá.
103
Colocando a ênfase nos valores e princípios preconizados para o Serviço Social, os autores trabalham,
designadamente, a estratégia de empowerment e sublinham que a necessidade de uma boa supervisão é agora
maior que nunca, para deter a crescente ansiedade sentida a todos os níveis, em tempos de grandes mudanças.
91
1.4.3.3 – Fórum de Reflexão Crítica de Identidade Profissional
Percorridos vários autores que se debruçam sobre a supervisão de estágio, não estão
encontradas perspetivas amplas e consistentes no Serviço Social, ou pelo menos não é
conhecido, ainda, um modelo sólido e substantivo com sustentação na articulação teoria-
prática, na autonomia, reflexão e experimentação em contexto de estágio. Com efeito, num
fórum europeu, decorrido na Universidade de Zuyd, em Maastricht na Holanda, em maio
de 2007, reuniram-se especialistas de supervisão na qualidade de docentes na formação em
Serviço Social, de sete países, e igual número de universidades, para refletir sobre o estado
da arte na Europa. Confirmando a carência de refletir sobre um modelo de supervisão
pedagógica, na ausência do mesmo, as conclusões apontaram para a necessidade de reunir
esforços no sentido de criar uma rede europeia, para a troca de experiências e contribuição
com pesquisa para o desenvolvimento de uma teoria sobre supervisão, como método de
ensino e formação para a prática104.
104
Uma teoria sobre supervisão pedagógica será difícil de definir por serem reconhecidas diferenças entre os
países anglo-saxónicos (Reino Unido e Irlanda) e os países do continente (Ford e Jones, 1987: 7, cf. Hees,
2007: 2).
105
A autora da presente tese foi convidada, a participar neste evento pelo coordenador do estudo, ao qual não
foi possível corresponder. Este convite surgiu na sequência de contactos feitos sobre a referida rede de
universidades e o objeto em estudo.
92
também definida como articulação entre conhecimento, metodologia e processo criativo de
cada estudante. Por sua vez o conceito de aprendizagem compreensiva é também
desenvolvido associado à dimensão biopsicossocial, que inclui o contexto e a pessoa, com
todos os seus sentidos, emoções e cognição (subsidiado pela corrente neurobiológica).
Esta tese é um contributo para trazer competências à formação em Serviço Social. Todo
este capítulo se consituíu como referência concetual de sensibilização sobre a formação,
cuja estratégia metodológica se traça a seguir.
93
CAPÍTULO 2 – ESTRATÉGIA METODOLÓGICA E TÉCNICAS, ÉTICA E VALIDADE DA
PESQUISA
“Ao nível do objeto somos constantemente postos diante da alternativa entre, por um lado
a clausura do objeto do conhecimento, que mutila as suas solidariedades com os outros
objetos, assim como com o seu próprio meio (e que, com isso, exclui os problemas
globais e fundamentais), e, por outro lado, a dissolução dos contornos e fronteiras que
afoga todo o objeto e nos condena à superficialidade” (Morin, 1987).
Sobre a emergência da investigação qualitativa, nas ciências sociais e nas suas estratégias,
Schwant distingue diferentes epistemologias, tais como: o interpretativismo, a
hermenêutica e o construcionismo social, com diferentes perspetivas quanto ao objetivo e à
prática da ação humana, ao compromisso ontológico e epistemológico e à postura
metodológica. Portanto, na perspetiva de admitir a existência de múltiplas realidades
106
De entre os autores consultados, destacaram-se: Grinnell (1994); Nunes (1996); Santos (1999); Krueger
(2000); Baptista (2001); Valles (2003); Flick (2005); Denzin & Lincoln (2006); Schwant (2006); Blaikie
(2007); Branco (2008); Corbin & Strauss (2008); Strauss & Corbin (2008); Ferreira (2008); Boeije (2010);
Poupart et al. (2010). O suporte destes autores fundamentará a proposta metodológica defendida, de enfoque
qualitativo. Sendo muito recentemente desenvolvida no Serviço Social, além de escassa toda a atividade de
investigação na profissão, a presente proposta revela limites na sua maturação.
94
construídas, situou-se no quadro de ontologias relativistas, na epistemologia interpretativa,
ou subjetiva, pela qual o investigador e o investigado interagem e se influenciam, ou seja,
“o conhecedor e o entrevistado trabalham juntos na criação de compreensões” (Denzin &
Lincoln, 2006: 35)107.. Estes mesmos autores vêm o pesquisador qualitativo como um
bricoleur, uma vez que utiliza várias ferramentas, métodos ou materiais empíricos ao seu
alcance (Becker, 1992: 2, cf. Denzin & Lincoln, 2006: 18)108. Não condicionado ao teste
de hipóteses prévias e herméticas, sustentou no seu dinamismo um caráter amplo, holístico
e flexível, na expectativa em relação aos dados da validação, riqueza, realidade e
profundidade no contexto em que se enquadram109.
Neste enfoque, o objeto foi fator determinante na escolha do método, não reduzido a
simples variáveis, mas à sua complexidade, totalidade e contexto. O campo de estudo não é
uma situação superficial e muito menos artificial e a interação dos sujeitos foi central no
processo. O objetivo, portanto, não é testar teorias, mas descobrir “contornos emergentes”
para perspetivar novas teorias empiricamente enraizadas ou locais, a partir dos dados. Flick
associa a emergência deste novo paradigma à aceleração da mudança social e consequente
diversidade dos modos de vida, novos contextos sociais e perspetivas. Portanto, em vez de
metodologias dedutivas, derivadas dos modelos teóricos e do teste empírico aos mesmos,
exige “conceitos sensíveis” para abordar e compreender os contextos sociais.
Para Blaikie, a pesquisa qualitativa carateriza-se por um contacto intenso com a realidade
social em estudo, aonde o pesquisador deve imergir-se totalmente no mundo dos atores
sociais, em todos os níveis de envolvimento pessoal que isso implica. Tais métodos
qualitativos permitem ao investigador tornar-se um insider e desocultar a cultura e
significados dos atores em presença, através de contactos e técnicas em profundidade, que
permite informações diversas ao pesquisador (2007: 242). Este autor, tal como outros já
referidos, persiste na ideia de que a interatividade é a caraterística central do processo
107
Flick enfatiza também que, nas caraterísticas da investigação qualitativa, a subjetividade do investigador é
parte do processo de investigação, bem como a interação do mesmo com o campo e os seus membros, como
parte explícita da produção do saber (Flick, 2005). São várias as recomendações vindas da área do Serviço
Social sobre a importância da relação entre a ação e a investigação (Faleiros, 1999; Nahri, 2002; Baptista,
2001; Sposati, 2007; Lewgoy, 2007; Branco, 2008 e Martins & Tomé, 2008).
108
O seu foco recai numa multiplicidade de métodos, processo denominado de triangulação, fundamental à
sua validação. Flick (2005), refere-se à triangulação intermétodos que combina diferentes técnicas.
109
Traduzindo a amplitude deste enfoque, Isabel Guerra (2006), afirma que a pesquisa qualitativa, ou
compreensiva, subentende universos sistémicos e complexos, cujos conceitos são, simultaneamente, causa e
consequência. Trata-se de uma pesquisa que convoca um conjunto de técnicas interpretativas para descrever,
descodificar e traduzir os fenómenos sociais, mais ou menos, naturalmente.
95
qualitativo de investigação.
Este trabalho que se reportou ao curso de Serviço Social da Universidade da Madeira, sob
o paradigma exposto, assumiu a forma de um estudo de caso. De acordo com Pires, a
pesquisa, por caso único, baseia-se num corpus empírico, representado no singular e num
estudo em profundidade (2010: 180). No mesmo sentido, Coutinho & Chaves (2002),
atestam que um estudo de caso implica conhecer em detalhe e em profundidade, cuja
finalidade é sempre holística (sistémica, ampla, integrada).
“Visa preservar e compreender o “caso” no seu todo e na sua unicidade, razão porque
vários autores (...) preferem a expressão estratégia à de metodologia de investigação:
«o estudo de caso não é uma metodologia específica, mas uma forma de organizar
dados preservando o caráter único do objeto social em estudo»” (Goode & Hatt, 1952;
Punch, 1998: 150, cf. Coutinho & Chaves, 2002: 224)110.
110
Os autores em análise recorrem a um vasto número de outros autores para definir e analisar o estudo de
caso, dando relevo ao facto de ser, atualmente, uma estratégia recorrente. Assim, vários são os autores
convocados: Bravo (1998); Creswell (1994); Yin (1994); Punch (1998); Gomez, Flores & Jimenez (1996).
Em síntese, o estudo de caso é uma investigação empírica “que se baseia no raciocínio indutivo (...) que
depende fortemente do trabalho de campo (...) que não é experimental (...) que se baseia em fontes de dados
múltiplas e variadas (...). Tem sempre forte cariz descritivo apoiando-se em “descrições compactas” (thick
description) do caso (...) o que não impede, todavia, que possam ter “um profundo alcance analítico (...)
ajudando a gerar novas teorias e novas questões para futura investigação» (Ponte, 1994: 4, cf. Coutinho &
Chaves, 2002: 224).
96
generalizar. Trata-se de um problema de escala e de projeção, indicando que os processos
de aprofundamento e de generalização são orientados em direções opostas. Seria reduzir
aquilo que a generalização oferece como vantagem no seu alcance heurístico (Pires, 2010).
Reafirmando, não existe apenas uma, mas múltiplas realidades sociais, nem uma forma
independente ou neutra de estabelecer a verdade sobre qualquer uma delas, ou seja,
“qualquer realidade social pode ser ‘verdadeira’ para os seus habitantes” (Blaikie, 2007:
116). Logo, a realidade do estágio curricular e supervisão na formação, em nível de 1.º
ciclo, na UMa, é verdadeira entre as demais.
111
Schutz usa a designação de conhecimento indireto, ou seja, os ideais sociais tipo dos cientistas sociais são
construções de segunda ordem, derivadas de tipificações quotidianas de primeira ordem, e constituem a
realidade social dos atores sociais, construídas pelo pensamento do senso comum e a partir da sua vida diária
dentro do seu mundo social. Significa que as construções das ciências sociais são construções de segundo
grau, construções de construções feitas pelos atores sociais no seu meio, cujo comportamento tem de ser
observado e explicado pelo cientista social (Schutz, 1963: 242, cf. Blaikie, 2007).
97
caraterísticas para a construção de um novo e emergente modelo de supervisão112.
Strauss & Corbin (2008), definem a análise qualitativa como ciência e arte. Ciência por
manter rigor e basear a análise em dados e arte pela capacidade do pesquisador nomear
categorias, fazer perguntas estimulantes, comparações e extrair um esquema inovador,
integrado e realista, a partir dos dados brutos e desorganizados. Contudo, estes dois autores
sublinham que a preponderância do enfoque qualitativo não exclui espaço à presença do
tratamento quantitativo de alguns dados que aqui nesta pesquisa não teve expressão, exceto
para alguns quadros de frequências. Segundo Strauss & Corbin (2008), o método
quantitativo e qualitativo não devem ser complementares, ou suplementares, mas um
processo circular, interativo e evolutivo.
112
Mais adequado à construção de teoria (ou teoria enraizada para alguns autores), vários autores advogam o
estudo multicasos, permitindo a comparação de diferentes estudos de caso.
98
comparativa e a de contraste, ou de diferença, considerando que entram no grupo de
informantes, não só os estudantes, mas também os docentes e os orientadores de campo.
Assim, a presente tese admitiu a construção do processo de supervisão pelos vários atores,
ou seja, estudantes finalistas, diferentes orientadores cooperantes e docentes supervisores,
todos com estatuto de especialistas ou de informantes privilegiados. A ideia de seleção dos
casos é absorvida pela ideia do conceito de estudo de caso, ou objeto, ou “neutralizada pela
ideia de completude” (Pires, 2010: 162)113. O curso de Serviço Social da UMa assume uma
totalidade particular. Já quanto aos orientadores cooperantes, atores envolvidos no mesmo
processo, foram convocados, em resultado da elaboração de uma amostra não
probabilística de indivíduos tipo, neste caso, selecionados segundo o seu tempo de
experiência em orientação de estágio curricular no curso da UMa.
Morgan define focus group “como uma investigação técnica que recolhe dados através da
interação grupal sobre um tema determinado pelo investigador” (1996: 130). O autor
apoia-se em três componentes essenciais. Em primeiro lugar, que o focus group é um
método de pesquisa dedicado à recolha de dados, em segundo lugar, que a interação na
discussão de grupo se constitui como a fonte dos dados e, em terceiro lugar, reconhece o
113
Pires (2010), carateriza a amostra por caso único, ou a variante convencional de estudo de caso, como um
universo de análise fechada, de contornos “naturalmente determinados”, com a forma de um “sistema
integrado”, apreensível como um todo. Assim, quanto menor, ou mais restrita, for a unidade, mais profunda e
completa é a análise.
114
Entre as várias designações, é utilizada a expressão original focus group, em vez da tradução literal, grupo
focal, ou grupo de discussão focalizada, sendo traduzida também por alguns investigadores como entrevista
focalizada. Para outros, a expressão de grupo de discussão e painel de sensibilização, estão a par de entrevista
focalizada em pequenos grupos. Ferreira (2004), opta pela expressão entrevista focalizada de grupo.
115
Contando que já passaram na docência da supervisão pedagógica no curso, até ao momento, 4 docentes,
inculindo a investigadora, autora desta tese.
99
papel ativo do pesquisador para a motivação da discussão na recolha dos dados.
Com desenvolvimento de pesquisa apoiada na mesma técnica, Ferreira releva que a técnica
congrega algumas das vantagens dos métodos etnográficos, como a profundidade e a
observação da interação, sem a morosidade dos mesmos, proporcionando melhor
conhecimento sobre as atitudes, as crenças e os sentimentos das pessoas em interação,
porque em grupo “faz surgir uma muito maior multiplicidade de opiniões e de processos
emocionais, muito mais limitados em situação de entrevista individual” (2004: 103)116.
Com efeito, Galego & Gomes (2005) (apoiados em Morgan,1997 e Saumure (2001),
entendem que o focus group, para além de conjugar a entrevista não diretiva e a
observação, apresenta inovação por superar os dualismos redutores que opõem sujeito-
objeto, uma vez que o processo permite transformar as estruturas cognitivas do
investigado, como resultado das relações recíprocas estabelecidas no decorrer da
operacionalização da técnica, autodescobrindo-se e, por isso, emancipando-se. Cria um
espaço de debate em torno do assunto, comum a todos os intervenientes, que permite
(re)construir os seus posicionamentos ao nível da sua representação e atuação futuras.
Simultaneamente, essa situação de real dinâmica de grupo permite ao investigador
observar a construção de conhecimento com valor crítico e reflexivo, com caráter dinâmico
116
Ferreira lembra, contudo, que a entrevista focalizada de grupo no processo de pesquisa dá-nos acesso,
através da observação da interação, à visão do mundo, à linguagem usada e aos valores acerca de
determinada temática das pessoas que participam, mas de modo nenhum nos possibilita o acesso aos seus
processos psicológicos e aos seus conflitos interiores (Blanchet, 1985; Morgan, 1988; Gibbs, 1997 e
Callaghan, 1998, cf. Ferreira, 2004). Daí a importância dada à complementaridade entre focus group e
entrevista individual, sendo que nesta o acesso é ao nível intrapessoal, enquanto que no focus group é mais
pertinente a dedução de hipóteses ao nível interpessoal.
100
e operativo, proporcionando contributos para a evolução da pessoa, da sociedade e de
mudança social117.
Foram objetivos da técnica focus group aplicada aos estudantes: i) proporcionar discussão,
com partilha, interação e estímulo à reflexão sobre as dinâmicas de gestão no curso e o
projeto de Serviço Social na formação do mesmo; ii) identificar as suas narrativas sobre o
estágio e a supervisão, perspetiva de modelo e impacto experienciado; iii) proporcionar
contributos à (re)construção dos posicionamentos sobre o estágio e a supervisão, com
reciprocidade entre investigador/docente e investigado/estudante; iv) conhecer a relação
estudante-sujeito da ação do estágio, conferindo maior profundidade à metodologia e ao
processo do estágio; v) trazer sugestões contributivas ao plano de formação. Assim, o
guião do focus group foi orientado por cinco grandes tópicos: 1) modelo de
administração/cultura de gestão; 2) projeto de Serviço Social na formação; 3) estágio; 4)
supervisão, incluindo os desafios da mesma à autonomia na profissão; 5)
contributos/sugestões para o plano de formação. Cada tópico foi desdobrado em alguns
subtópicos (conforme anexo A sobre o guião do focus group ao estudante).
101
dizer o que pensa ou vivenciou, ou testemunhou, na convicção de que descreve uma
história verdadeira, ou reconstrói a realidade em colaboração com o entrevistador. A par da
profundidade da vivência dos participantes, as caraterísticas do entrevistador, quando
situado demasiado próximo do campo de pesquisa, podem resultar, porém, em
favorecimento do grupo pesquisado, cuja familiaridade pode comprometer a racionalização
dos dados (Poupart, 2010)118. Este alerta foi tomado em consideração, procurando trazer o
contributo de um dos docentes que, no passado recente, foi membro da equipa e
presentemente se encontra fora dela, ligado a outro curso de Serviço Social e
Universidade119.
O guião da entrevista aos docentes seguiu de perto a estrutura do guião do focus group aos
estudantes e aos orientadores cooperantes, embora com pequenas alterações/adaptações na
ordem dos subtópicos. É exemplo disso no tópico sobre a supervisão ter sido incluído um
sub-tópico sobre a articulação e complementaridade entre a mesma atividade e a orientação
118
Acerca da entrevista, Poupart (2010), alerta para possíveis vieses, revelados pela maneira de indagar sobre
o conteúdo e a forma das questões, pelas técnicas de registo dos dados e pelas circunstâncias de tempo e
lugar, considerando-os elementos de encenação da entrevista.
119
Foi pertinente a deslocação do Funchal à cidade do Porto para a entrevista ao docente agora lá residente e
ligado a uma outra universidade pública, também a lecionar em curso de Serviço Social. De facto, esta
entrevista teve também presente a estratégia de tipo retrospetivo, permitindo retraçar no tempo a experiência
desenvolvida na sua atividade enquanto docente no curso de Serviço Social na UMa.
120
Chegaram a ser perspetivadas, inicialmente, entrevistas a especialistas, autores de alguns dos estudos
consultados sobre supervisão, docentes de supervisão na formação de universidades estrangeiras,
designadamente, do Brasil (Alzira Lewgoy), Canadá (Martha Wiebe) e Holanda (Godelieve van Hees),
suscetíveis de trazer informação comparativa. A rejeição destas entrevistas deveu-se à opção de limitar a
pesquisa ao estudo de caso e evitar introduzir maior complexidade ao tratamento e análise dos dados.
102
(constante do anexo A). Sobre a evolução verificada somente aos docentes supervisores e
aos orientadores cooperantes se pôde aplicar.
Na sua orientação geral, qualquer um dos guiões começou por questões introdutórias,
encorajando a interação e o diálogo entre os participantes, passando a questões de
transição, em direção ao foco central ou questões chave e, finalmente, para questões de
tendência e avaliativas. Segundo Krueger & Casey (2000) as questões finais servem para
determinar a posição final dos participantes, ou as suas respetivas áreas críticas.
Quadro n.º 1
Informantes nas Técnicas de Recolha Empírica:
Estudantes, Orientadores Cooperantes e Docentes
2008-09 2009-10 2010-11
Estudantes 18 22 21
7 12 6
Informantes
25
Orientadores Cooperantes 18 20 20
Convocados 7 3
Informantes 5
Docentes Supervisores 3 3 3
Informantes 2
103
estudantes a participação foi no primeiro grupo de 39% (7 de 18 estudantes), no segundo
de 54% (12 de 22 estudantes) e no terceiro de 29 % (6 de 21 estudantes)121.
No grupo dos docentes, um já se encontra ligado ao curso desde o terceiro ano da sua
implementação, outro teve ligação ao curso exclusivamente no quarto ano de
implementação e primeiro ano do estágio curricular, deixando a Universidade da Madeira
no final do mesmo ano letivo. Os estudantes informantes situam-se maioritariamente na
faixa etária entre os 20 e os 30 anos, destacando-se 6 com idade superior aos 30, um dos
quais acima dos 45 anos. Neste grupo, destaca-se um aluno com outra licenciatura e ainda
outro que fez transferência de um outro curso e Universidade para a da Madeira. A taxa de
participação de estudantes por docente supervisor não teve intencionalidade, uma vez que
foi todo o universo convocado.
Quadro n.º 2
Informantes Finais segundo as Técnicas – Focus Group e Entrevista
Técnicas Informantes Total
Estudantes 25
Focus Group Orientadores
5
Cooperantes
Docentes
Entrevista 2
Supervisores
Total 32
121
De entre os orientadores cooperantes contactados e convidados, 2 encontravam-se ausentes da atividade
profissional por motivo de férias, outros 2 tinham compromissos na data da sessão e 1 declinou o referido
convite. Os 5 participantes estiveram envolvidos na orientação de estágio dos estudantes da UMa no ano
letivo 2009-10, mas desses só 3 em 2010-11. Os 2 restantes haviam participado em 2008-09. Dos três
docentes já envolvidos, 2 aceitaram participar e um declinou o convite.
104
ou de atividade, com justificação expressa da sua ausência, respetivamente 2 da primeira
turma, 2 da segunda e 1 da terceira122.
As sessões realizadas entre Abril e Maio (2011) foram antecedidas por um pequeno lanche
que possibilitou a receção personalizada de todos, garantindo a sua participação no
decorrer de toda a sessão sem qualquer interrupção. Tal participação foi considerada
gratificante devido ao seu conteúdo, assumido por interesse profissional e como reencontro
com os colegas do seu ano de curso. O local do focus group direcionado aos estudantes foi
um espaço privado, adequado relativamente ao acesso, ao espaço e à recolha de som. O
focus group dirigido aos orientadores teve lugar em sala de aula na Universidade, local de
preferência dos mesmos face à sua localização central a todos os participantes. Houve um
orientador que, por razões de compromisso de horário de trabalho, se ausentou a meio da
sessão. Há que realçar a manifesta satisfação na adesão à sessão, não obstante ter lugar em
horário de trabalho, conforme a sua própria preferência.
122
Alguns dos participantes já se encontravam, à época, a realizar o estágio profissional.
123
Inicialmente, o receio de baixa adesão ao focus group fez perspetivar uma única sessão. Todavia, a
extensão do guião conduziu ao planeamento de duas sessões por cada grupo de finalistas do curso. A sua
realização não confirmou tal receio.
124
O registo vídeo, inicialmente integrado para captar a comunicação não-verbal, a qual se repercutiria nos
dados de observação sobre a interação durante a técnica, foi abandonado, considerando-se não ser pertinente
acrescentar a informação proporcionada por esse registo de imagem.
105
A fonte documental constituiu-se uma técnica central para compreender o contexto da
Universidade, bem como a organização, estrutura e funcionamento do curso e, de modo
particular, o projeto em Serviço Social. Os documentos consultados incidiram na proposta
da implementação do curso, no plano de estudos, no regulamento de estágio e no dossier
de coordenação e docência de estágio e, ainda, com recurso à página Web da
Universidade125. O documento é definido como uma fonte de informação que permite
acrescentar à compreensão social a dimensão temporal para, através da sua análise,
compreender a evolução do processo em estudo e a sua maturação. Para Cellard (2010), a
fonte documental toma o texto escrito, manuscrito, ou impresso, registado em papel, cuja
vantagem é minimizar as influências da presença, ou intervenção do pesquisador, a par da
diversidade e abrangência da informação. Assim, a análise documental recorre a dados
numéricos de natureza estatística, incluindo frequências relativas ou taxas, no
reconhecimento das áreas científicas constitutivas do plano de estudos, à distribuição de
créditos atribuídos às unidades curriculares em Serviço Social. Estes dados permitem,
ainda, fazer a comparação entre o peso da formação na investigação, em diferentes
universidades, ilustrar as áreas setoriais de estágio, problemática de enquadramento,
expressão local da questão social no agir da prática de estágio, bem como evocar as taxas
de aprovação no curso.
125
Inicialmente, a análise documental abrangia a produção dos estudantes, através dos seus relatórios finais
de estágio. O objetivo de recorrer a esta fonte primária de informação escrita, como unidade de registo, era
aferir, segundo a sua unidade de significado, qual o processo metodológico da prática de estágio curricular, a
direção social, modelo e estratégias da mesma. Foi abandonada pela abrangência da técnica do focus group
aplicada às três turmas, proporcionando informação vasta.
106
Mercê das diferentes técnicas e atores, foi possível estabelecer entre os dados e categorias
diálogo comparativo, reflexivo e interativo, face aos significados atribuídos aos mesmos,
de acordo com os objetivos, na aproximação ao núcleo, ou foco da pesquisa,
designadamente no processo de ensino-aprendizagem, na perspetiva inscrita no estágio
curricular e na supervisão, no saber/poder, na autonomia e emancipação.
Está assegurada a proteção da informação nas referências aos participantes. Assim, pela
participação no focus group, os participantes serão indicados pela sigla F, com FE para o
estudante, FO para o orientador cooperante e na entrevista pela sigla E, com ED para o
docente participante. A sigla será seguida do número atribuído a cada um, iniciada
aleatoriamente à lista de participantes, contados a partir da turma de estudantes com a
primeira sessão do focus group. Deste modo, o número de participantes é reportado ao
somatório de interlocutores auscultados, ou seja, 32, resultado obtido pelo somatório dos
participantes no focus group, com os 25 estudantes, os 5 orientadores e na entrevista, aos 2
docentes supervisores entrevistados.
126
O tratamento e análise dos dados qualitativos apoiaram-se, especialmente, em Hennie Boeije, 2010;
Deslauriers, Laparrière & Pires (2010); Corbin & Strauss (2008); Strauss & Corbin (2009); Sampieri et al.
(2006); Isabel Guerra (2006); Coleman & Unrau (2005); Krueger & Casey (2000).
107
A análise pode ser definida como o ato de dar significado aos dados, desde o seu exame
detalhado, ou microscópico, até ao mais geral, com vista ao seu pleno desenvolvimento e
validade na interpretação. As ferramentas analíticas básicas para facilitar o processo de
codificação são a formulação de questões e de comparações, cujos dispositivos heurísticos
se apoiam na compreensão do significado possível para promover a interação entre a
análise e os dados, estimular o pensamento concetual e gerar o livre fluxo de ideias. É,
pois, o uso reflexivo das ferramentas que promove a consciência de como as premissas e os
preconceitos influenciam a direção da análise (Corbin & Strauss, 2008).
Portanto, a análise dos dados implicou tomá-los, concetualizá-los, em termos das suas
propriedades e dimensões, ou variações dessas mesmas propriedades, para determinar o
que dizem as partes sobre o todo. Deste modo, os conceitos formaram a base da análise.
Ordenar concetualmente significa classificar os eventos e os objetos nas suas diferentes
dimensões e propriedades. Assim, a análise começou por fazer a concetualização ou a
identificação de conceitos, que segundo Strauss & Corbin (2009) não é mais do que um
fenómeno rotulado ou a representação abstrata de um facto, objeto, ou ação que o
pesquisador identifica como importante nos dados e tem por objetivo agrupar factos,
127
Isabel Guerra sugere sublinhar com diferentes cores as partes do texto, segundo os factos, frases
ilustrativas do discurso, sequências sem significado imediato, para tratamento posterior e para as surpresas do
discurso, ou temas inesperados e novas articulações sobre a problemática. Concomitantemente, é realizado o
resumo ou análise temática à esquerda e, para a análise da problemática, à direita, seguindo o guião,
procurando identificar temáticas e problemáticas emergentes do discurso (2006: 70).
108
acontecimentos, objetos semelhantes, sob um tópico ou classificação comum. Mais
especificamente, a abstração partiu dos dados, divididos por incidentes, ideais, eventos, ou
atos distintos que receberam o nome que os representa128. O rótulo concetual é sugerido
pelo contexto ou situação, em que o facto está localizado ou incorporado (Strauss &
Corbin, 2009).
128
Para a análise, Coleman & Unrau (2005), recomendam visionar os dados e familiarizar-se com a sua
totalidade, fazer cópias da mesma e lê-las gradualmente, questionando os dados. Sugerem a elaboração de um
diário, com registo de questões e reações, dando maior credibilidade ao método, fazendo recordar
pensamentos, ações e sentimentos (2005: 408).
109
Pela redefinição das categorias e do processo de saturação dos dados, em que já nenhuma
propriedade ou dimensão surge de novo, houve lugar, em alguns casos à codificação
seletiva, elegendo uma categoria central. Os critérios de escolha da categoria central
resultam da relação entre as categorias. Esta operação deu lugar à construção de figuras, ou
diagramas, que são representações abstratas e gráficas dos dados, através de conceitos com
relação lógica entre si. Também podem ser definidos como representações visuais entre
conceitos. Deste modo, a sucessão de diagramas dá uma história integrada da
concetualização dos resultados (figuras constantes do anexo D).
110
diferentes perspetivas e pontos de vista?; houve cuidados na aplicação rigorosa dos
procedimentos?; f) foram colocadas questões pertinentes e adequadas, de acordo com os
objetivos do estudo?; g) foram revistos os materiais e dados? (2006: 398).
Depois de completa e avaliada a análise, teve lugar a verificação, no sentido dos objetivos
e as expetativas colocadas sobre o estudo, mais concretamente, se as conclusões
respondem à formulação do problema, se ajudam à introdução de contributos à perspetiva
de supervisão na formação do curso de Serviço Social, como resultado desejado ao avanço
do conhecimento sobre o modelo de ensino-aprendizagem.
111
CAPÍTULO 3 - EMERGÊNCIA E PLANO DO CURSO EM SERVIÇO SOCIAL NUMA
UNIVERSIDADE PÚBLICA
“Quem teve um fenómeno perante si, pensa frequentemente sobre ele; quem apenas ouve
falar acerca disso, não pensa nada” (Goethe, 1997).
112
Segue-se com outras duas secções de análise, o projeto de Serviço Social na formação e o
plano de estudos do curso que ajudaram a compreender os alicerces em que assenta a
convergência dos três núcleos ou áreas de fundamentação − o “tripé” de conhecimentos e
competências como é designado pela ABEPSS (1999).
129
A Universidade da Madeira foi criada por Despacho conjunto de 1983 da Secretaria de Estado do Ensino
Superior e da Secretaria Regional da Educação. Nos seus estatutos, propostos pela primeira Comissão
Instaladora, previa a existência de Unidades Orgânicas de Ciências Exatas e Naturais, Letras, Engenharia e
Educação Física, agregando a Escola Superior de Educação (em http://dme.uma.pt/pt/about/history.html). O
primeiro curso começa a funcionar em 1989/90, Educação Física e Desporto e, em seguida, a formação
inicial dos Educadores de Infância e de Professores do Ensino Básico (1.º e 2.º ciclos). Em 1992/93,
começam a funcionar os cursos de Gestão e de Engenharia de Sistemas e Computadores. Em 1992, foi
integrado o Instituto Superior de Artes Plásticas da Madeira (ISAPM) sob a denominação de Instituto
Superior de Arte e Design, da Universidade da Madeira (ISAD/UMa).
130
A partir dos anos 90, vários cursos são implementados, tais como: Biologia, Física, Matemática, Química
e Línguas e Literaturas Modernas, Variantes de Estudos Portugueses, Estudos Portugueses e Franceses,
Estudos Portugueses e Ingleses, Estudos Portugueses e Alemães, Estudos Portugueses e Espanhóis, Estudos
Ingleses e Alemães e Estudos Franceses e Ingleses (todos com o ramo científico e de ensino). Em 2005,
totalizavam 30 cursos, de 1.º e 14 do 2.º ciclo.
113
necessidade desta formação em resposta ao mercado de trabalho, sendo nele explicitado
um total de 113 assistentes sociais em falta na Secretaria Regional dos Assuntos Sociais, a
par de outras necessidades nas Instituições Particulares de Solidariedade Social. A criação
do curso surge, portanto, ligada ao mercado, não sendo no documento explanadas razões
de alargamento na área das ciências sociais dentro da UMa.
O curso foi, então, criado sob o referido protocolo e sob proposta do Departamento de
Psicologia e Estudos Humanísticos (DPEH), conjuntamente com o de Economia e Gestão,
posteriormente aprovada pelo Senado da UMa (deliberação n.º 596/2005, com publicação
no Diário da República, II Série, em 26 de abril de 2005)131. Enquadrado no então DPEH,
o curso de Serviço Social reuniu-se aos outros dois cursos, o de Ciências da Cultura e das
Organizações e o de Psicologia, implementados pelo Departamento no ano anterior.
Organizacionalmente, o curso do 1.º ciclo de Serviço Social, na UMa, foi dirigido por um
Conselho de Curso constituído pela diretora, por um estudante de cada ano curricular,
eleito pelos pares, e por outros dois docentes indicados pelas duas áreas científicas com
maior peso no plano do curso (área do Serviço Social e da Economia). As competências
deste Conselho eram, designadamente, a gestão corrente do curso, a promoção
interdisciplinar e a definição de ações científico-pedagógicas para a valorização da
formação.
À semelhança do país, esta Universidade foi alvo de mudanças. Assim, à reforma de 2005,
seguiu-se a de 2008 com o processo de Bolonha e uma significativa reestruturação no
modelo de organização proporcionou a interação entre unidades orgânicas ou centros de
competência e estruturas centradas na investigação, colégios e institutos como estruturas
horizontais de inovação e de prestação de serviços direcionados para o ensino (UMa,
2008). Os centros de competência integraram as seguintes áreas: as Artes e Humanidades;
as Ciências Exatas e de Engenharia; as Ciências Sociais; as Ciências da Vida; as
Tecnologias da Saúde. Nas estruturas horizontais inscrevem-se o Colégio Universitário, o
Colégio Politécnico, os Institutos de Inovação e os Projetos.
131
Foi no Senado Universitário que, em sessão plenária de 26 de janeiro de 2005, pela deliberação n.º
10/SU/2005, submetida a registo nos termos legais (R/99/05), teve lugar a aprovação do curso de Serviço
Social. Com efeito, no preâmbulo é referido que a Universidade da Madeira identificou a necessidade de um
curso nas áreas sociais, detetada também pelas instituições da RAM.
114
Como consequência desta reforma, o Departamento de Psicologia e Estudos Humanísticos
passou a designar-se Centro de Competências de Artes e Humanidades, e com as mudanças
ocorridas, abrangeu diversificado número de outros cursos existentes na UMa, incluindo
cursos de Cultura, Artes & Design e o curso de Serviço Social passou a integrá-lo. Esta
reforma, a par da reestruturação da carreira docente, refletiu-se na estrutura do Conselho
Científico onde passaram a ter assento apenas professores com doutoramento, o que levou
à não inclusão da área de Serviço Social132.
Esta medida, porém, não foi extensiva ao Conselho Pedagógico onde se manteve a
participação do Serviço Social. Este órgão ocupa-se das orientações pedagógicas, métodos
de ensino e de avaliação dos estudantes e faz recomendações quanto aos planos
curriculares, enquanto ao Conselho Científico compete, entre outras funções, apreciar o
plano de atividades científicas, deliberar sobre a criação de cursos e aprovar os planos
curriculares, deliberar sobre a afetação de docentes, a responsabilidade sobre as unidades
curriculares e a distribuição de serviço docente, propor a composição de júris de provas e
de concursos académicos (UMa, 2009). Daqui se conclui que o Serviço Social se
encontrava excluído de diversas funções científicas, indispensáveis à gestão do processo de
formação no curso e, por isso, exposto a um significativo grau de obscurantismo científico
dentro da academia, limitando a afirmação e consolidação da área.
132
A participação da área de Serviço Social no Conselho Científico proporcionada só em 2008, na pessoa da
diretora de curso, teve a curta duração de escassos meses.
115
representantes dos estudantes e 5 entidades externas) definir o desenvolvimento estratégico
e a supervisão da Universidade.
O corpo docente na área de Serviço Social para a equipa do curso na UMa consistiu no
destacamento de assistentes sociais pela SRAS, por via do protocolo estabelecido para a
implementação do curso. Assim, a UMa não preparou nem apoiou a qualificação, com o
requisito de título de doutoramento, de nenhum dos referidos docentes133.
Sem pessoal docente efetivo na área de Serviço Social, pese embora ter havido lugar à
contratação, a termo e anualmente renovável, de um docente a partir do terceiro ano da
implementação do curso, a par de outros dois docentes destacados da SRAS, a ausência de
um corpo docente consolidado e qualificado em Serviço Social no curso da UMa denuncia
fragilidades na área específica do Serviço Social. Consequentemente, a área das ciências
sociais desta Universidade carece de reconfiguração nesse domínio, considerando-se uma
133
A qualificação dos docentes da área do Serviço Social, não só não foi apoiada, como foi impelida, não
obstante a natureza do seu vínculo, para responder às exigências da Agência de Avaliação e Acreditação do
Ensino Superior, sem quaisquer contributos logísticos ou financeiros, nem pela UMa, nem pela SRAS. Esta
secretaria, sob distinta liderança, em resultado do processo de eleições legislativas, revelou desigual visão ao
longo do processo do curso sobre a necessidade de formação em Serviço Social na RAM.
116
região, a par do país, com persistentes desigualdades sociais na sua população, para cuja
intervenção o assistente social se apresenta com competências, estatuto e jurisdição
profissional.
Em janeiro de 2011, com duas turmas formada e uma terceira em fase de conclusão, a
Reitoria tomou a decisão de interromper o curso, centrada exclusivamente na sua
hierarquia, sem qualquer debate interno no curso, nas ciências sociais, ou nas demais áreas
académicas, desconsiderando a etapa de final de curso da turma, a crescente procura do
curso pelos estudantes madeirenses e o exigente percurso académico feito para implantar a
área de Serviço Social na Universidade134. Perante essa decisão, também não houve
nenhuma tomada de posição da SRAS, parceira de protocolo de cooperação na formação
do curso135.
A decisão sobre o seu encerramento não foi compreendida também à luz do esforço
despendido por parte dos docentes com responsabilidades pelos conteúdos programáticos,
pela dinâmica pedagógica nas unidades curriculares em Serviço Social, dentro de cada ano
curricular na condução do plano global do curso, nem as responsabilidades assumidas na
direção do curso em fase de significativas mudanças no ensino universitário público e num
contexto académico aonde nada existia até então sobre a área científica de Serviço Social
dentro da Universidade da Madeira. Torna-se, pois, pertinente colocar a seguinte questão:
por que razão não foi criada uma assessoria científica, ou uma extensão na Universidade da
Madeira, a partir de um dos cursos já existentes no país?136.
134
Para além dos cursos na área das ciências de educação (em educação social, 1º e 2ºs ciclos existentes) à
época na UMa, contava também com o 2º ciclo de gerontologia (especialidade de gerontologia social),
incluído na área das ciências de enfermagem, mais especificamente na Escola Superior de Enfermagem da
Universidade da Madeira.
135
Foi uma decisão veiculada pelos Órgãos de Gestão aos órgãos gerais internos da Universidade e só na
consequente divulgação por membros daqueles mesmos órgãos chegou, informalmente e fora da hierarquia
interna à Universidade, aos membros do Conselho de Curso e a todos os intervenientes no curso.
136
A sugestão indicada de uma assessoria ou consultadoria ao curso, a negociar entre a Universidade da
Madeira e uma outra universidade com licenciatura consolidada na área, não foi acolhida pela gestão e
coordenação do Departamento, considerando não ser essa a orientação da então Reitoria. Essa estratégia, para
além de trazer doutores em Serviço Social, colmatando o perfil da equipa docente, com baixa qualificação
pedagógica e sem título de doutoramento, pese embora a sua experiência da prática profissional, teria como
objetivo, ainda, fazer aconselhamento sobre a adequação ao plano de estudos e aos conteúdos programáticos
na área do Serviço Social, incluindo o estágio curricular e a supervisão pedagógica.
117
seguiu-se à suspensão da apresentação do relatório do curso junto da Agência de Avaliação
e Acreditação do Ensino Superior (A3ES), relatório realizado detalhadamente pelo
Conselho de Curso, nos primeiros meses de 2010, seguindo as exigências formais da
referida agência.
Como se revela nesta experiência, tratou-se de uma oferta em contra mão com a afirmação
de Isabel Guerra (2000), segundo a qual foi a evidência dos “problemas sociais”, a sua
diversidade e a mudança rápida, que deu lugar à intervenção profissional e,
consequentemente, à reivindicação do reconhecimento da atividade profissional nas
ciências sociais enquanto área com reconhecimento científico integrada na academia. Na
formação em Serviço Social, esta evidência está longe de se instituir no país no ensino
público universitário.
118
Nesta perspetiva, o Serviço Social deverá participar legitimamente nesse processo, ou seja
no “salto heurístico”, dentro da própria universidade, incluindo a universidade pública,
aonde dificilmente tem tido espaço, como se verificou sobre a duração da experiência do
curso na Universidade da Madeira.
Na cultura de gestão refletida pela comunidade mais próxima de atores no curso de Serviço
Social, nomeadamente constituída pelos docentes supervisores, os estudantes e os
orientadores cooperantes, a relação de comunicação e de poder afirmou-se por aliança,
aprendizagem mútua, partilha e proximidade, conforme a narrativa dos estudantes
informantes das três turmas que, uma vez questionados no focus group sobre a mesma,
afirmaram:
“… Foi uma relação de proximidade, foi muito importante ao longo dos quatro anos
[de acompanhamento] (…)” (FE7).
“... Acho que é uma relação de muita disponibilidade e de … não sei se posso usar
bem este termo mas se calhar é o que mais se adequa… de uma luta constante, em dois
níveis: tanto a nível do curso, de lutar para que o nosso curso fosse consolidado e tanto
a nível de qualificação” (FE11).
“... Eu acho que o curso tem sido possível até aqui talvez por essa gestão…Eu acho
que sempre houve uma ponte (...) nos momentos menos bons, nos momentos bons
(...)” (FE20).
119
tais como o trabalho de equipa potencialmente encorajador de conquistas e atualizações
entre docentes, estudantes e orientadores, o apoio aos estudantes e a experimentação na
formação. Estes são gradientes para a inovação e a mudança no ensino-aprendizagem.
Diretora
Relação Relação
Fonte: Focus group com estudantes e orientadores e entrevista aos docentes, 2011
A figura n.º 1 ilustra, no seu conjunto, aquilo que é possível sistematizar na análise das
respostas dos estudantes, dos orientadores e dos docentes137. Os diferentes grupos de
estudantes não revelam alterações nos três anos de frequência em análise, revelam sim
elementos comparativos com outros cursos por parte dos que conheceram outra
experiência na formação (antes do seu acesso à UMa, quer em cursos técnicos, quer
superiores), conforme abaixo indicado.
“Eu tive [noutro estabelecimento de ensino superior] (...) em que eu nunca cheguei a
conhecer o diretor do meu curso (...). [Neste] sabia que estava presente e sabia
que…que qualquer dúvida, qualquer problema que nós tivéssemos, [orientaria]
quando fossemos falar (...)” (FE21).
“Eu vim de um curso em que eu tive também uma extrema relação com o meu antigo
diretor de curso [curso técnico] (...) e eu pensava que ia chegar à Universidade e a
coisa ia ser diferente (...), mas não, foi totalmente ao contrário. Senti a relação (...),
uma relação de confiança (...) também o pensar, ter outras perspetivas, outros olhares
137
A convocação à proximidade, à construção de pontes e à auto-organização refletiu-se pela participação
dos estudantes na Associação Académica, junto da qual um significativo número de estudantes aderiu a
diversas atividades sociais e culturais, incluindo a Tuna Académica (Tuna d’Elas).
120
(...). Fez-me ver outros horizontes e para mim foi positivo, cresci e também cresci
acima de tudo enquanto pessoa. (...) E acho que é um exemplo tanto p’ra mim, se
algum dia eu também puder dirigir alguma instituição ou dirigir alguma área (...)”
(FE25).
“Realmente tem estado sempre connosco para tentar esclarecer ao máximo todos os
objetivos do curso e das nossas dúvidas em relação ao estágio dos alunos. (...) A
comunicação aberta que sempre teve connosco facilita de certa forma todo o processo”
(FO28).
“Considero que foi e tem sido uma relação que sempre foi facilitada (...) pela
proximidade e, pronto, pelos meios não formais ou formalidade mas uma certa
proximidade e abertura, não só da parte, de ambas as partes, quer a instituição no
mundo do trabalho, quer a Universidade. No meu caso concreto, também de
aprendizagem” (FO30).
Com os docentes, a fala traz algum acréscimo ao processo em cuja práxis, conjuntamente
com os estudantes, foram atores privilegiados na dinâmica interna à Academia.
Para que a aprendizagem desenvolva um olhar amplo e uma visão de globalidade sobre a
compreensão dos fenómenos e dos factos sociais, exige-se uma persistente preparação,
preferencialmente a partir do Conselho de Curso e em forma de equipa, entre docentes e
estudantes, desde os primeiros anos da formação.
121
Conselho de Curso sustentou-se através de reuniões de natureza alargada e aberta a todos
os estudantes representantes de cada ano curricular, aos alunos responsáveis por atividades
de formação complementar ao curso, bem como a outros docentes138. A participação dos
estudantes no Conselho incidiu ainda na elaboração do plano de atividades anuais,
complementares ao plano curricular de 2008, avaliação semestral, relatório anual de
atividades, na apresentação de propostas e sugestões de aquisição de recursos e
equipamentos de uso coletivo. Consequentemente, contrariou um tipo de cultura defensiva
associada a administrações autoritárias que se protegem a si próprias, o seu estatuto e
segurança, juntamente com concorrência e perfecionismo.
Assim, tendo em conta que a rede de relações e as ações da práxis já descritas e analisadas
promovem o agir autónomo e o poder da comunicação na gestão do curso, conclui-se que a
mesma estimula a emancipação humana pelo exercício da cidadania (evocando
Castoriadis, 1975 e Habermas, 1990). A esta orientação, associa-se Morin (1987) quando
138
Foi no âmbito da gestão do curso de Serviço Social que esteve aberto aos estudantes a responsabilidade
pela criação de um Observatório Social, lançado em 2008 e em atividade até finais de 2011, constituído por
vários núcleos, objeto de ação: investigação, reflexão; eventos; informação; voluntariado; e saídas
profissionais. Foi neste espaço que funcionaram as 6ªs Feiras sociais aonde cada núcelo se mobilizava à volta
de temas e acontecimentos sociais, convocando os estudantes do curso ao debate, alargado a convidados
preletores externos. Esta proposta mobilizou e agregou vários estudantes dos diferentes anos do curso e
docentes. Foi superiormente informado, a nível do Departamento e do Conselho Pedagógico, não chegou,
porém, a atingir um grau de consolidação suficientemente estável, quer por parte de estudantes, quer por
parte dos seus docentes, em resultado da sua própria mobilidade, para passar à fase de formalização junto das
instâncias superiores da Universidade.
122
fala da inseparabilidade dos diferentes elementos constitutivos de um todo e da
complexidade da realidade presentes no exercício de participação e que este curso
sustentou na sua gestão e administração.
Entendendo que o plano de estudos, através da estrutura curricular que o suporta, constitui
o pano de fundo da formação, haverá ainda espaço para a análise acerca da sua adequação
hoje, com inovação para os desafios contemporâneos à profissão e abrindo lugar também à
indicação de sugestões para a melhoria do respetivo plano.
123
sistematizar algumas categorias, criadas através das narrativas recolhidas.
124
Abaixo se transcreve, com extensão, várias das vozes dos estudantes por relação às
categorias construídas sobre os princípios e valores e o como fazer na profissão:
“Acho que, desde o início foi-nos ensinado que devemos respeitar o outro, seja ele
sujeito, grupo ou comunidade. Lembro-me sempre daquela… daquela célebre frase
(…) principalmente na altura do projeto, que um projeto deve ser para e com o …
outro ou grupo e nunca só para … devemos fazer as coisas com as pessoas, não só
para as pessoas. Devemos ouvir o que eles têm para nos dizer, porque eles é que estão
a passar pela situação (…). Os valores da justiça foram-nos sempre ensinados e
passados, da justiça, da equidade, do respeito, do… tudo isso foi-nos, foi-nos ensinado
desde o início e acho que isso temos sempre em conta, e devemos ter no nosso dia-a-
dia, no nosso desempenho, no nosso trabalho e até na nossa vida pessoal” (FE2).
“… Não ser neutra no, no sentido da não discriminação. Todas as pessoas têm um
valor único em si mesmas, portanto… todas as pessoas merecem ser tratadas com
respeito. E lutar por uma igualdade para que haja mais igualdade no sentido de haver
mais oportunidades para todas as pessoas, porque na verdade, igualdade para todos é
utópico. E também, há um … o assistente social deve ter o compromisso de ser
competente. Deve ter o compromisso de ser competente no sentido de que esta
competência vá de encontro a ajudar todas as pessoas e para isso ele tem que ter a
responsabilidade de pesquisar, de investigar, de se formar para poder também dar
informação às outras pessoas e poder apoiar ou ajudar. Porque ele só vai ajudar se ele
tiver competência para isso”. (FE10).
139
Trata-se do poema Eleição de Miguel Torga (1943), “Não era terra que a poesia olhasse O lodo de que é
feita e de que sou Mas a semente nasce Onde o vento a deixou (...)”.
125
“…Eu falaria da inovação, ou capacidade de a ter, a exigência, a compreensão pela
pessoa humana (…)” (FE18).
“… Acho que realmente esta profissão rege-se também pelo, pela responsabilidade
social que deve de manter ao longo do tempo e que nunca se desgaste porque
realmente um dos…às vezes observamos que os profissionais vão mudando de opinião
ao longo do tempo e espero que isso não aconteça connosco, que ao longo da profissão
realmente consigamos defender ao máximo estes princípios. (FE22).
Pela parte dos docentes entrevistados, é pela igualdade, justiça social e direitos sociais que
os princípios e os valores no curso mais se destacam, embora se associe, também, ao como
fazer:
“Aqueles dois que eu considero (...) são exatamente o da igualdade e a par dele o da
justiça social, e a forma como procuro transportá-los e relacioná-los naquilo que
depois é o exercício da docência, é (...) a desconstrução do que é que isso implica em
termos de justiça social. Nós estamos a falar de direitos humanos, e a questão da
igualdade, desconstruí-la no sentido do que é que é a verdadeira igualdade, porque não
são raras as exceções e que muitas vezes ouvimos (...) dos próprios profissionais,
colegas nas instituições, bom, as condições foram dadas, estava aí, a população é que
não agarrou. Ora essa questão parece-me que, muitas das vezes, essa questão é
erroneamente colocada, porque não importa apenas colocar, (...), importa aquilo que é
o exercício da efetivação dos mesmos direitos. E sabemos que entre aquilo que é o
direito de estar plasmado, em termos por lei mas depois aquilo que é, enfim, o acesso,
o processo da democratização dos direitos por via daquilo que é de se conquistar a
igualdade social, há um trabalho intenso que tem de ser feito” (ED31).
140
O tópico no guião do focus group aplicado aos orientadores sobre o projeto de Serviço Social e da
profissão no plano de formação, ou a forma de colocar a referida questão, não estava suficientemente
adequado ao grupo, todavia, houve um esforço para responder.
126
“Acho que também o empowerment e a capacitação dos próprios clientes” (FO27).
“Nós partilhamos mas acho que deveria ser feito a tal situação dos gestores de caso”
(FO28).
127
Quadro n.º 3
Definição de Serviço Social – Estudantes
1ª Turma 2ª Turma 3ª Turma
2008-09 2009-10 2010-11
“Definir o “Além de ser uma ciência, uma “O Serviço Social é…é realmente uma ciência
Serviço Social, ciência social é uma disciplina que vai de encontro à defesa dos direitos
realmente é que promove a mudança social. humanos (...) E é o assistente social…e cabe
muito (...) Acho que procura sempre a ao assistente social realmente…através da
complexo” emancipação, procura apoiar, elaboração de projetos que têm caráter, o
(FE7). defender os direitos, sempre em caráter participativo da população utente,
prol de uma sociedade mais todos os envolvidos, promover
“Vou na linha inclusiva e não-discriminatória” realmente…uma mudança e esta mudança é
que deve ser (FE12). realmente fruto de uma mediação entre as
uma área populações vulneráveis e as estruturas
científica “Disciplina científica voltada existentes” (FE22).
porque nós essencialmente para o sujeito e
temos os para a sua emancipação social, “É realmente uma ciência (...) tem os seus
métodos, os ou seja, o sujeito como ator métodos, os seus processos eh…tem no
modelos social e a busca da sua própria entanto de ser contextualizada porque não tem
teóricos, as mudança e como sujeito ativo na uma receita própria, não é…não é uma gripe
técnicas que sociedade” (FE13). que se dá uma aspirina e que…porque é uma
adotámos” pessoa, (...) tem de ser sempre contextualizado
(FE3). “O Serviço Social (...) é o ser porque há sempre uma razão para um
capaz de ter uma análise crítica indivíduo proceder assim e há sempre uma
“O Serviço sobre a realidade, do pensar e do razão para nós tomarmos este caminho e não
Social é uma refletir (...). Há uma dimensão aquele…e…é por isso que é tão importante
disciplina (...) associada ao Serviço Social também a investigação e a…se basear
científica na que é para mim uma metodologia especialmente na, na prática” (FE21).
área das de investigação-ação. (...) É
ciências sociais muito importante (...) estarmos “O Serviço Social existe para provocar
e que tende a sempre abertos para pensar que é mudança (...) procura metodologias…para
promover importante saber para então poder ir ao encontro das necessidades e até
essencialmente saber-fazer. (...) importante para também ao encontro das potencialidades…usa
o bem-estar termos qualidade” (FE11). também os recursos existentes, quer parcerias,
social” (FE6). quer organismos governamentais, não
“Exatamente. (...) E é trabalhar governamentais (...). O Serviço Social usa (...)
“Acho que a com o sujeito, para isso é preciso metodologias (...) a investigação – ação (...), a
nossa sociedade investigar para agir e daí ter o metodologia participativa (...) importante
ainda não conhecimento sobre a realidade porque (...) deve envolver o utente também,
reconhece o que contextual, mas a realidade do levá-lo a responsabilizá-lo também e a
é o Serviço próprio sujeito. (...) É importante acreditar que também é capaz de participar na
Social” (FE1). trabalhar em parceria (...) ter em própria mudança” (FE20).
conta o contexto” (FE10).
128
em que se deve apoiar. Ao mesmo tempo sustentam o conteúdo substantivamente relevante
do Serviço Social sobre a defesa dos direitos e da emancipação social numa sociedade
aberta à mudança, não-discriminatória e inclusiva, com o sujeito participante ativo nesse
processo.
129
Quadro n.º 4
Definição de Serviço Social – Docentes e Orientadores Cooperantes
Orientadores Docentes
“Uma disciplina vá lá, um campo de ação bastante alargado e por “Profissão que tem um
isso, muitas das vezes… Vai parar até outras áreas (...) e então a constructo dentro da área das
equipa de Enfermagem achava que podia fazer o que competia à ciências sociais, tem um
área do Serviço Social” (FO27). conjunto de princípios
filosóficos, (…), (...) passíveis
“Uma disciplina da área das ciências sociais, vejo-a sempre como de serem objetivados e
uma prática do profissional desta mesma área com valores, concretizados e sublinharia
princípios próprios, que são específicos e que (...) intervém aquilo que são os direitos
enquanto profissional em vários domínios (...) que procura observar humanos e (...) a questão da
não só (...) princípios (...) da formação mas também depois absorve justiça social. E, portanto, o
outros (...) que estão formalmente instituídos (…) que decorrem Serviço Social surge como
daqueles que estão estipulados para um funcionário público. profissão no sentido de
Portanto, eu vejo como resposta necessária, fundamental numa respeitar a própria declaração
sociedade que se quer desenvolvida” (FO29). dos direitos humanos, a
observância desses mesmos
“É uma disciplina profissional, procura acima de tudo o alcance do princípios e desenvolver um
bem comum (não é?) e a potenciação, a capacitação da pessoa conjunto de estratégias que
humana nas mais variadas dimensões, pessoal, social, profissional. assegurem a promoção da
No fundo é daquelas,.. é uma disciplina profissional muitas vezes qualidade de vida e o bem-
conotada mais ao pragmatismo do que à cientificidade mas isso é estar das populações com quem
uma conquista que tem de ser de todos nós, assistentes sociais o Assistente Social trabalha e
unidos. Falta, de facto, trabalhar o caráter de cientificidade (...) se relaciona no contexto da
temos a possibilidade de desenvolver mais do que qualquer outra instituição e no setor aonde
profissão a investigação-ação, estamos no terreno ao mesmo tempo trabalha” (ED31).
deveríamos poder investigar mas o facto é que as entidades ainda
não estão muito abertas” (FO30). “Eu acho que é difícil. Eu acho
que (...) em nenhum [curso] se
“O serviço social procura a mudança acima de tudo, quer seja a pode definir o que é o Serviço
nível individual, quer seja a nível do grupo, mobilizando diferentes Social” (ED32).
recursos que estão… ao nosso dispor para tentar então de certa
forma alterar, não digo alterar… Portanto, que seja o próprio
indivíduo, o locutor da sua própria mudança” (FO28).
130
abrangente de ação; v) a relação de ajuda.
“Penso que uma das dimensões muito importantes é esta do saber, do conhecimento,
porque é a partir do conhecimento que depois vai surgir a mudança, que vai surgir as
outras… as outras consequências. Tudo aquilo porque se se desconhece não se age,
não se faz, não se muda” (FO26).
131
Social, as respostas vêm reforçar menos essa relação e mais a jurisdição da profissão já
apresentada. As falas dos orientadores equacionam a baixa identidade profissional, com
subvalorização do “social”, comparativamente a outras áreas específicas de intervenção
com superior poder institucional (FO29), evocando também que, no fazer profissional, não
há espaço para ser ouvida a sua voz junto dos decisores das políticas sociais (FO30), ou
seja, os profissionais limitam-se à execução das políticas sociais no terreno, excluídos da
sua conceção (FO26), por falta de poder reivindicativo da profissão e por medo, sob ordens
superiores para não ser dada opinião (FO28). Daqui resultam políticas com grande
discrepância entre o conhecimento da/o assistente social e o conhecimento político dos
seus decisores, realidade não só da região mas do país (FO27). Abaixo transcrevem-se
algumas falas:
“Eu acho que é uma relação muito difusa, é uma relação em que nós, nós Serviço
Social limitamos a ser executores de políticas sociais já definidas, onde nós não
tivemos nenhuma intervenção e um papel ativo que eu acho que até as medidas de
política social legisladas deveriam ter a colaboração ativa ou ativíssima de quem está
no terreno, de quem conhece as situações como é o assistente social (…).Desde o
início o assistente social era visto naquela moldura cristã, caridadezinha, se calhar
ainda não nos libertamos dessa identidade original e não atravessamos para o lado, ou
não trouxemos a parte científica que o curso tem e demonstrarmos [que] nós temos
uma metodologia, temos uma estrutura, temos princípios, temos valores, somos uma
profissão que também sabe se pronunciar sobre as coisas” (FO26).
“… Nós também estamos de certa forma com receio e medos de poder também dizer
seja o que for. Porque existe…Exatamente, porque existem hierarquias, existem
ordens superiores para nós não nos pronunciarmos sobre determinadas coisas, não é?
E isso acaba por anular a nossa posição… Nós não somos reivindicativos. “ (FO28).
E o facto de não fazermos parte desses tais decisores políticos muitas vezes torna
inexequível a aplicação dessas mesmas políticas sociais porque se nós é que
trabalhamos no terreno e nós é que estamos lá a dar o nosso contributo, a discrepância
entre o nosso conhecimento e o conhecimento meramente político é muito grande
(FO27).
… Não é uma realidade regional (…) porque nós olhamos também para aquilo que é
feito… e que é praticado no continente e que há políticas que são (…) que às vezes
não dão (…) minimamente resposta aos problemas reais e portanto aí há um défice
claro (…) de auscultar quem está no terreno e percebe, e que percebe os problemas.
(FO29).
132
desigualdade e o deslizamento dos direitos e das políticas sociais. Não sendo exclusiva
destes participantes, esta tendência na profissão conduz frequentemente a intervenções
focalizadoras que comprometem os valores da profissão, segundo os parâmetros do bem-
estar social, como a justiça social e a autodeterminação dos sujeitos envolvidos. Com
efeito, de acordo com McDonough (1999), compreender as problemáticas sociais e intervir
sobre elas exige um envolvimento direto na conceção da política social e,
consequentemente, a adoção de estratégias de ação política de litigação. Só a partir dessa
relação deverá ter lugar o poder da sua voz junto dos decisores, nunca antes.
Neste contexto, podemos ainda referir Myrian Batista (2001) sobre a necessidade de
desocultar as relações que determinam a estrutura das situações-problema na profissão pela
perspetiva de que o saber ético-político constitui uma das competências do assistente
social, como afirma também Berta Granja (2005) sobre o papel central da ética.
As falas dos orientadores remetem também para o saber comunicacional e relacional por
parte do assistente social, na afirmação da sua perícia técnica e jurisdição da profissão,
designadamente em termos comparativos com outras profissões sociais com as quais o
Serviço Social partilha o espaço socioinstitucional, tal como assinala Francisco Branco
(2008). Conflui para a afirmação da natureza científica da disciplina de Serviço Social
pelas competências na investigação, ultrapassando o pragmatismo.
É para esta análise que se convoca o olhar sobre as bases da estrutura do plano de
formação do curso a apresentar a seguir.
141
Para análise sobre a estrutura curricular recorremos aos registos documentais, tais como, a proposta de
adequação ao processo de Bolonha, os planos de estudos e os relatórios de atividades e planos anuais do
curso de Serviço Social na UMa e alguns dados da pesquisa empírica.
133
4462/2005 (2ª série) de 26 de abril. Carateriza-se por um total de 120 créditos, com a
duração de 4 anos (8 semestres), distribuindo-se por onze áreas científicas, com 28% dos
créditos atribuídos ao Serviço Social, 22,5% à Psicologia e os créditos restantes repartidos
pela Sociologia, Gestão, Economia, Direito, Cultura, Comunicação, Expressão, Língua e
Informática. Neste plano, há que realçar a sua duração, semelhante à maioria das
licenciaturas à época, porém com um reduzido espaço ocupado pela área científica central
− Serviço Social, a área de construção do seu locus de identidade.
142
Como breve glossário, um crédito define-se como unidade de medida do trabalho do estudante, sob todas
as suas formas, designadamente, sessões de ensino de natureza coletiva, sessões de orientação pessoal de tipo
tutorial, estágios, projetos, trabalhos no terreno, estudo e avaliação. European Credit Transfer System
(ECTS) é o sistema europeu de acumulação e transferência de créditos. É um sistema que mede as horas que
o estudante tem que trabalhar para alcançar os objetivos do programa de estudos. Estas horas incluem: as
horas letivas (aulas teóricas, aulas práticas/laboratoriais, aulas teórico-práticas, seminários); as eventuais
horas de estágio; as horas dedicadas ao estudo; as horas dedicadas à realização de trabalhos; as horas de
realização da avaliação (testes, exames escritos/orais e apresentações de trabalhos). Foi definido que 1 ano
letivo de estudo, a tempo inteiro, corresponde a 60 créditos, ECTS. Unidade curricular é a unidade de ensino
com objetivos de formação próprios que é o objeto de inscrição administrativa e de avaliação traduzida numa
classificação final. É também conhecida por disciplina ou cadeira (Guia do Estudante, AAUMa, 2009).
143
É de sublinhar que o plano de estudos adequado a Bolonha, não obstante as condições restritas de debate
dentro da área do Serviço Social e da Universidade, contou com influências do plano de estudos do Instituto
Superior de Serviço Social de Lisboa (instituição de ensino superior cooperativo com mais longa experiência
na formação) e com a colaboração informal solicitada ao então diretor do curso.
134
Quadro n.º 5
Áreas Científicas e Distribuição de ECTS - Licenciatura em Serviço Social
144
Os objetivos do curso estão apresentados na página Web da UMa, em http://www.uma.pt e disponível em
http://www.uma.pt/portal/modulos/curso/index.php?T=1359127270&TPESQ=PESQ_CURSO_DADOSGER
AIS&TPESQANT=PESQ_ENSINOLST_LIC&IDM=PT&IdCurso=286&Cod_Especialidade_Cx=0&NPAG
=&IdLingua=1&TORDANT=&CORDANT=&SCRANT=/portal/modulos/curso/index.php&NV_MOD=MO
DCURSO&NV_EAGR=EAGR_CURSOLICENC&NV_MOD_ANT=MODCURSO&NV_EAGR_ANT=E
AGR_ENSINOLST&NV_TAB=&NV_TAB_ANT=.
135
prática; iv) a investigação (UMa, 2007a).
Três núcleos indissociáveis do projeto formam aquilo a que a ABEPSS, 1999, classifica
como “tripé de conhecimentos e habilidades”, tomando em linha de conta que o plano do
curso trabalha as componentes/alicerces da formação, através de três áreas de
fundamentação: os fundamentos teóricos do pensamento e da vida social, os fundamentos
da formação social da sociedade portuguesa e os fundamentos da ação profissional, cujas
diretrizes estão relacionadas com as diferentes disciplinas do conhecimento145. Significa
que os conteúdos particulares das disciplinas, requisitos curriculares essenciais, se devem
articular entre si, orientando-se para a complexidade do conhecimento social, sem
dissolver as responsabilidades próprias de cada disciplina, mas evitando a mecanização e a
burocratização do plano (UMa, 2007a: 2). Este é um caminho longo e difícil, mas
alcançável com tempo de maturação, perfilhado como um grande desafio estratégico.
145
Conforme a ABEPSS, são estes três núcleos de fundamentação da formação em Serviço Social,
constituídos como um conjunto indissociável do projeto, um “tripé de conhecimentos e habilidades”, que se
especificam, por sua vez, em matérias, enquanto áreas de conhecimento necessárias à mesma formação e as
matérias desdobram-se em disciplinas, seminários, atividades complementares e outras componentes
curriculares (ABEPSS, 1999).
136
Conselhos Científicos, fora do âmbito do Centro de Competências aonde se integra o curso
de Serviço Social, agravado com a própria exclusão do Serviço Social desse espaço
científico.
A área científica do Serviço Social atravessa toda a estrutura do plano ao longo do seu
quadro temporal e nas competências desenvolvidas pela formação em todos os semestres,
integrando vários tópicos de estudo, distribuídos pelos fundamentos teóricos, éticos,
históricos, teórico-metodológicos e técnicos do Serviço Social, administração e
planeamento em Serviço Social, pesquisa e estágio supervisionado. No quadro n.º 6
referem-se as várias unidades curriculares em que se desdobra a formação específica na
área científica principal.
Quadro n.º 6
Área Científica de Serviço Social: Distribuição e Créditos
Créditos/Semestre
Unidades Curriculares
Créditos Semestre/ Ano
Serviço Social I 7,5 ECTS I Sem/1.º Ano
Política Social 7,5 ECTS I Sem/1.º Ano
Serviço Social II 7,5 ECTS II Sem/1.º Ano
Serviço Social III 7,5 ECTS III Sem/2.º Ano
Serviço Social IV 7,5 ECTS IV Sem/2.º Ano
Serviço Social V 7,5 ECTS V Sem/3.º Ano
Contextos Setoriais de Serviço Social 7,5 ECTS V Sem/3.º Ano
Seminário de Investigação I 7,5 ECTS V Sem/3.º Ano
Serviço Social VI 7,5 ECTS VI Sem/3.º Ano
Seminário de Investigação II 7,5 ECTS VI Sem/3.º Ano
Estágio I 15 ECTS VI Sem/3.º Ano
Serviço Social VII 7,5 ECTS VII Sem/4.º Ano
Estágio II 22,5 ECTS VII Sem/4.º Ano
Total 120 ECTS
137
ECTS e são unidades curriculares semestrais, com uma carga horária semanal de 4 horas.
Abarcam a história, a teoria, metodologia, modelos/paradigmas, ética e deontologia, sob
perspetivas diferentes e plurais em Serviço Social. A unidade curricular de Serviço Social
VII corresponde ao Serviço Social Contemporâneo, proporcionando uma aprendizagem
atualizada na produção científica da área. A Política Social apresenta-se sob duas unidades,
com 15 ECTS, sendo a primeira, Política Social integrada no I semestre do 1.º ano e a
segunda integrada no v semestre, neste sob a designação de Contextos Setoriais de Serviço
Social. Esta, também com natureza teórico-prática com 4 horas semanais, subdivide-se em
2 horas teórico-práticas em sala de aula e outras duas horas de prática em instituição local,
ou pré-estágio em preparação do futuro contexto de estágio, prática caraterizada pela
observação do agir profissional146. As unidades de investigação em Serviço Social, com 15
ECTS, sob a forma de Seminário de Investigação I e II, distribuem-se entre o I e II
semestre do 3.º ano147. O Estágio I integra-se no VI semestre do 3.º Ano, com 15 ECTS e o
Estágio II no VII semestre do 4.º Ano, último do curso com 22,5 ECTS.
146
Dentro do plano de estudos, a unidade curricular de Contextos Setoriais de Serviço Social oferece um
planeamento e uma administração do processo de ensino-aprendizagem com exigência acrescida, porquanto,
não tendo ainda a natureza de estágio, respeita um conjunto de tarefas logísticas, por respeitar a logística da
atividade de protocolo entre a academia e as instituições locais, com vista à convenção de estágio, gerindo os
interesses dos estudantes, a bolsa de instituições de estágio, sempre escassa, conciliando a abertura das
entidades que oferecem estágio curricular e a disponibilidade dos orientadores cooperantes para orientar/
supervisionar localmente os estudantes em estágio curricular, desde o momento da referida prática de pré-
estágio. Portanto, esta unidade pode “comprometer” os 3 semestres letivos quanto à área de Serviço Social. A
atribuição desta unidade incidiu, preferencialmente, no docente coordenador de estágio, obviando
necessariamente toda a programação exigida ao processo de estágio.
147
A importância da investigação em Serviço Social, desenvolve-se, ainda, por outras duas unidades
curriculares: Estatística para as Ciências Sociais (integrada no Departamento de Matemática) e Métodos e
Técnicas de Investigação (unidade integrada na área da Psicologia, no mesmo Departamento do curso de
Serviço Social), perfazendo mais 15 ECTS na investigação. Por sua vez, o Estágio também forma para a
investigação, no âmbito da construção do diagnóstico social, uma vez que este também se apoia, entre outras
estratégias, na investigação-ação.
138
investigação, permitindo prosseguir com a capacitação na produção de conhecimento, bem
como em tempo dedicado ao estágio curricular (APSS, 2006).
148
Todas as atividades extracurriculares foram alargadas aos profissionais da região, com direito a convite
aos orientadores cooperantes, oferta do curso pela cooperação profissional oferecida à UMa na formação dos
seus estudantes.
139
Quadro n.º 7
Taxa de Aprovação Comparada
Na análise por anos curriculares, as taxas de aprovação do curso apontaram, contudo, para
uma taxa média bastante mais baixa no 1.º Ano, numa proporção de 58% entre alunos
avaliados e aprovados nesse ano. Comparado com os 98% obtidos no 4.º Ano, revela assim
uma diferença de 40%. Olhando às taxas mínimas no 1.º ano curricular, 24 e 44% são taxas
que revelam um impacto nos resultados dos estudantes a merecer a devida atenção,
reflexão e intervenção, designadamente em unidades curriculares fora da área do Serviço
Social e do Centro de Competências aonde o curso se integra. Trata-se de Estatística e
Economia, pertencentes a distintos Centros de Competência, respetivamente o de
Matemática e o de Economia e Gestão. Estas matérias apresentam geralmente resultados
baixos, se olharmos ao global dos cursos da UMa, ultrapassando o curso de Serviço Social.
Em particular, na unidade curricular de Economia, os estudantes consideram a globalidade
do seu programa curricular com matérias menos adequadas ao curso de Serviço Social.
Aos informantes foram ainda pedidos contributos/sugestões para o plano de estudos e sua
adequação à formação em Serviço Social face aos desafios da sociedade atual. Os
estudantes apontaram as seguintes sugestões: i) necessidade de limitar o número de alunos
por unidade curricular (considerando que numa das UC se chegou a atingir 150 alunos,
com perda para a qualidade da formação); ii) revisão e adequação de algumas unidades
curriculares; iii) mais estreita articulação entre as diferentes matérias de Serviço Social e o
estágio; iv) tempo acrescido para debates e reflexão no curso; v) reforço de atividades
140
extracurriculares.
Por parte dos docentes, as sugestões indicadas foram as seguintes: i) reforço das matérias,
designadamente, acrescentando a antropologia como componente cultural, e através dessa
mesma disciplina o combate ao conhecimento homogéneo; ii) intercâmbio de estudantes e
docentes externos, vindos de outras universidades, cuja formação tenha particular
incidência sobre práticas na comunidade; iii) formação sobre os modelos de intervenção e
questões emergentes, tais como a ligação ao ambiente, às questões de género e de grupos
minoritários, evitando a formatação sobre um modelo hegemónico; iv) integração de
dimensões laboratoriais, os designados laboratórios sociais, “como espaços de construção
prática de saberes profissionais” (que inclui visitas domiciliárias, mediadas em
consonância com as instituições locais, para melhor perceção dos próprios estagiários
sobre a articulação entre a teoria e a prática, com desocultação de “atitudes não
teatralizadas”, evitando a sua instrumentalização). Segundo esta proposta os laboratórios
funcionariam:
Ainda pelos docentes, foi contrariada uma das dimensões centrais defendidas na estrutura
do plano curricular, ou seja, o espaço ocupado pela investigação, considerando-a mais
adequada a um nível de estudos do 2.º ciclo. As sugestões dos docentes apontam ainda
para: i) criação de uma bolsa de orientadores; ii) criação de formação adequada às funções
de orientação; iii) alargamento das visitas de estudo por parte dos estudantes a todas as
instituições de natureza social.
141
matéria da supervisão.
“Acho que não se adequa ou a forma como é ministrada, porque os alunos dizem
estudar os gregos e os romanos. [E ao] atualizar o plano de estudos, se há uma
periodicidade para o fazer, faltava, atendendo às dificuldades atuais, (...)
empreendedorismo, pela importância para o assistente social no século XXI (...)”
(FO30).
“A questão do curso ter uma componente mais prática (…) eu não sei se é suficiente.
Desta forma acho que deviam investir mais em contexto de discussão, de
argumentação, de apresentação, de resolução de casos (...)” (FO29).
Em síntese, e conforme a análise dos dados evidencia ao longo deste terceiro capítulo, os
jovens licenciados em Serviço Social integraram o debate sobre a formação e a profissão,
refletiram e foram participantes nos espaços e processos de ensino-aprendizagem, ou seja,
na gestão e administração do curso e na estrutura do plano curricular. Os docentes e
orientadores cooperantes também tomaram parte e os resultados apontaram que a
orientação da formação sustentou algumas conquistas em direção a um projeto adequado a
enfrentar os atuais desafios de uma sociedade de risco, paradoxos e incerteza.
Foi sublinhado que o surgimento do curso não resultou da dinâmica interna de alargamento
de novos cursos e graus na Universidade da Madeira, mas da sinalização do mercado de
trabalho através da SRAS. Sem correspondência com o alargamento das ciências sociais, o
142
seu percurso foi efémero nesta universidade pública, não tendo contribuído para alterar o
panorama nacional quanto ao reforço da formação de Serviço Social no ensino superior
público universitário, nem se refletiu no salto heurístico para a aproximação da área e
proporcionar a inteligência inter e transdisciplinar dentro do espaço académico aonde a
formação emergiu.
Destacou-se também o peso da investigação e estágio curricular deste plano. Significa que
nos alicerces/foco estruturador do curso se procurou afirmar a natureza científica do
Serviço Social na importância de conhecer/pesquisar as necessidades sociais,
potencialidades e recursos da população em contexto da ação tal como defendem os
informantes desta pesquisa, para alicerçar uma mediação na profissão com saber e poder.
143
CAPÍTULO 4- ESTÁGIO CURRICULAR E SUPERVISÃO: REFUNDAR A PEDAGOGIA
“Ensinar exige compreender que a educação é uma forma de intervenção no mundo”
(Freire, 2007).
No capítulo anterior já foi respondido, entre outras questões, como se alicerçou a gestão no
curso, assim como os princípios e valores do projeto de Serviço Social na formação e a
estrutura do plano de estudos no curso, quanto aos seus núcleos e pilares de
fundamentação.
Agora pretendemos responder a outras questões que nos interrogamos, ou seja, como é que
os alicerces/fundamentos traçados respondem aos desafios da sociedade de hoje na sua
vertente de formação experiencial? Como articula a relação teoria-prática? Como articula a
relação academia-instituições enquadradoras de estágio? Qual a relação estudante-cidadão?
Como se carateriza o processo de ensino-aprendizagem na supervisão? Como se articulam
e complementam estágio e supervisão? Como se afirma o saber/poder para a autonomia e
emancipação na supervisão?
O lugar deste capítulo vai para o estágio, a supervisão e a relação com o saber/poder para a
autonomia e a emancipação, constituindo-se em três principais eixos de análise. O estágio,
como primeiro eixo, é analisado em três secções. A primeira secção pretende trazer à
compreensão e análise a estrutura de apoio e o conteúdo programático do estágio, a
organização e o funcionamento, indagando sobre a coerência dos seus objetivos no
percurso experimentado na formação. Nessa relação são também visados os setores de
estágio e as problemáticas em que o estágio incide.
144
O segundo eixo ocupa-se e desenvolve a perspetiva de um modelo de supervisão
pedagógica em construção no curso. Reparte-se por duas grandes linhas ou secções de
análise, uma sobre a estrutura da supervisão (nas suas particularidades, quanto às
competências, potencialidades e limites, com lugar à sua definição, atos, papéis e
perspetiva de modelo) e a outra linha de análise sobre o orientador cooperante e a sua
orientação colocada ao serviço da formação dos estudantes.
O terceiro eixo incide nos resultados da supervisão indagando sobre a relação sustentada
no processo de ensino-aprendizagem como saber/poder para a construção da autonomia e
emancipação, conforme foco central desta tese.
Pelo quadro n.º 8, aonde estão ilustrados alguns dados da formação no curso de Serviço
Social em quatro universidades públicas portuguesas, em 2010, é possível comparar o
lugar ocupado pelo curso da Madeira quanto à importância atribuída ao estágio e
complementarmente à pesquisa. Com efeito, os dados revelam que o curso da UMa tem um
145
peso superior, quer no estágio, quer na investigação. O estágio e a investigação são
considerados profundamente decisivos à qualidade da formação profissional, quer pelas
recomendações nacionais e internacionais, quer pelos autores convocados.
Quadro n.º 8
Curso de Serviço Social nas Universidades Públicas em Portugal (2010)
Avaliado o estágio pela sua carga horária total, representa, conforme exposto, 45% da
carga horária letiva teórico-prática do plano curricular, distribuída entre o Estágio I com
270 horas e o Estágio II com 405 horas. Corresponde respetivamente a 17 e a 25 horas em
horário semanal. Cruzando com o peso em ECTS atribuídos ao estágio, é a Universidade
dos Açores a que se apresenta com o valor mais elevado, pese embora integrar 12 ECTS
para o Seminário e o Relatório149.
149
No conjunto dos planos o da UMa é, porém, aquele com menor número de unidades curriculares
(obrigatórias e opcionais).
146
Participativo), Serviço Social VI (que incide sobre Ética e Deontologia do Serviço Social)
e Serviço Social VII (sobre Serviço Social Contemporâneo), cujo objetivo, conforme já
anteriormente afirmado, é o de assegurar aos estudantes o conhecimento, o debate e a
reflexão sobre as propostas mais atuais no Serviço Social. À semelhança das restantes
unidades curriculares teórico-práticas, cada uma das referidas apresenta uma carga horária
de 72 horas teórico-práticas e 10 de orientação tutorial. Os Seminários de Investigação I e
II têm a carga horária de 36 horas de seminário e outras 36 de supervisão, mais 10 de
orientação tutorial. Esta constitui-se como carga horária mínima, porque a necessidade do
debate e reflexão do estagiário para articular a investigação com a prática de estágio e fazer
o exercício de retroalimentação da investigação-ação, vai para além do formalmente
estipulado150.
150
A articulação entre estágio e investigação encontra, não raramente, barreiras nas instituições locais
enquadradoras de estágio, sempre que as técnicas de recolha de informação e pesquisa saem do seu
quotidiano.
151
É importante sublinhar que, à falta de regulamentação na formação em Serviço Social, conforme já
reafirmado, este curso contactou outras estruturas de formação, designadamente sobre a organização e a
estrutura do estágio. Especificamente, beneficiou de intercâmbio informal junto de docentes envolvidos nas
referidas unidades curriculares do curso de Serviço Social na Universidade Católica Portuguesa. Este
intercâmbio foi decorrente da participação da autora (da presente tese) em atividades extra curriculares,
designadamente nos Seminários do CESSS. O processo de estágio foi, também, beneficiário da reflexão
promovida pela coordenação do estágio e do curso para aferir conclusões reflexivas e propositivas, a partir
dos contributos dos estudantes finalistas e dos seus docentes.
147
situações reais; iv) o início de um longo caminho, de crescimento e de reflexão para a
autonomia, na vida profissional, no agir; v) um “aprender a prática, complementar a todo o
conhecimento preparado na formação” (FE11); vi) a “vivência do processo de trabalho do
assistente social numa realidade/problemática social, promovendo a articulação teoria-
prática” (FE6); vii) “um conhecer para agir e um agir para conhecer” (FE15); viii) “a
prática a refletir sobre a teoria” (FE10); ix) a “aplicação na prática dos conhecimentos
teóricos adquiridos na formação” (FE4); x) “o espaço de cimentar os conhecimentos, de
análise crítica reflexiva/construção do conhecimento individual, aplicados à realidade
concreta”; xi) “a análise crítica reflexiva de construção individual de conhecimento”
(FE18); e, ainda,
“[A] fonte de conhecimento obtida a partir de uma realidade local. Etapa de condução
à realidade, com prévio conhecimento sobre a população, seus problemas,
necessidades, forças, fraquezas, pela realização de um diagnóstico social, planeamento
participativo e avaliação” (FE22).
148
A prática de estágio tem lugar em instituições que desenvolvem programas e/ou ações na
área da intervenção social. O processo de colocação do aluno estagiário assenta num
processo preparado com escolha optativa pelo estudante, de entre três áreas indicadas pela
coordenação do estágio152. A atribuição do local de estágio compreende os seguintes
elementos: i) o perfil do estudante; ii) a oferta disponível; iii) a opção do próprio
estudante153.
152
As reuniões de negociação, de integração e de acompanhamento e apoio ao estudante, ao longo do período
letivo no âmbito da unidade curricular de Contextos Setoriais de Serviço Social, ultrapassam largamente a
carga horária letiva da mesma e o docente, conjuntamente com os restantes docentes supervisores, «não olha
a meios» para colocar os estudantes nos seus locais de estágio.
153
A conveniência do estudante está mais associada com a eventualidade do seu estatuto, ou seja, ser
estudante regular ou trabalhador-estudante, cujos horários devem ser cuidadosamente negociados.
154
Significa que sem comparticipação nas despesas de deslocação, por parte da Universidade ou das
instituições, os estudantes com estágio fora da área urbana, ficam com encargos financeiros elevados.
149
As normas/padrões da IASSW e IFSW recomendam o recrutamento de orientadores
cooperantes (formadores de campo) de entre os profissionais mais qualificados e
experientes e formação por instituições de ensino para ministrar as funções de orientação,
bem como, a elaboração de um manual de procedimentos, normas/critérios e expetativas
sobre a orientação (2004: 6). Trata-se de recomendações que foram orientadoras do
estágio, estão porém ainda longe da sua cabal aplicação.
155
Os 23 estudantes da terceira turma, apesar de colocados em processo de estágio, desceram para 21, um por
falecimento, outro por desistência.
150
Quadro n.º 9
Estudantes Estagiários e Grandes Setores de Atividade com Estágio
Áreas de Estágio 2008-09 2009-10 2010-11 Total %
Público 11 9 9 29 46
Autárquico 1 1 1 3 5
Empresa Autárquica 1 1 2 4 6
Terceiro Setor 5 11 11 27 43
Total 18 22 23 63 100
A distribuição por áreas setoriais de atividade, representa, conforme o quadro n.º 10, uma
maior concentração no setor das IPSS, seguindo-se o setor da saúde com 22% e o da
segurança social com 18% do global156.
Quadro n.º 10
Estudantes Estagiários por Ano Letivo e Áreas Setoriais
Saúde 6 3 5 14 22
Segurança Social 5 4 2 11 18
Educação 0 1 0 1 1,5
Justiça 0 0 1 1 1,5 57
Público Autarquia 1 1 1 3 5
Habitação 0 1 1 2 3
Empresa Autárquica 1 1 2 4 6
Privado IPSS 5 11 11 27 43
Total 18 22 23 63 100
156
Dois dos docentes do estágio, sendo oriundos da área da saúde, conforme já referido, ofereceu alguma
vantajem na negociação e concretização do protocolo de estágio neste setor.
151
As problemáticas sociais priorizadas no foco de intervenção do estágio nos 63 estudantes
do curso (conforme ilustra o quadro n.º 11), são segundo a ordem de frequência:
comportamento de risco de crianças/jovens, envelhecimento; saúde mental; habitação e
realojamento; dependência e doença crónica; pobreza/ exclusão157.
Quadro n.º 11
As Problemáticas/Campos Temáticos Trabalhados no Estágio
Comportamentos de Risco 5 6 3 14 22
Envelhecimento 3 2 5 10 16
Saúde Mental 2 3 2 7 11
Habitação e Realojamento 2 2 3 7 11
Dependência e Doença Crónica 3 0 3 6 10
Pobreza/Exclusão 1 3 2 6 10
Toxicodependência 2 2 1 5 8
Prevenção em saúde 0 3 0 3 4,5
Deficiência 0 1 2 3 4,5
Desemprego e Criminalidade 0 0 2 2 3
Total 18 22 23 63 100
157
É importante frisar que são os responsáveis e os orientadores cooperantes das instituições que
identificam/sinalizam a área prioritária em que os alunos deverão desenvolver o seu estágio e a possibilidade
de opção é-lhes colocada com base nessa proposta. Portanto, considerando que é o objeto de atenção
prioritária da instituição que se propõe à oferta de estágio, o estudante respeita essa sinalização aferida
posteriormente no diagnóstico social desenvolvido pelo estagiário.
152
em resultado do envelhecimento demográfico, com rápido crescimento na região (e no
país)158.
“Tem objetivos gerais, tem objetivos específicos e é dentro desses objetivos que nós
planeamos e que nós trabalhamos ao longo do estágio, desde o primeiro ao último
estágio (...), é importante para nós sabermos situar-nos no tempo, como também
sabermos o que é que nós temos de fazer primeiro, saber respeitar todo o processo
metodológico–social. (...) Na questão do programa de estágio, senti alguma…senti
alguma, inicialmente fazer o diagnóstico e depois fazer o…o projeto de estágio, senti
(...) um pedacinho, uma certa pressão, mas foi uma pressão positiva” (FE25).
“A instituição recebeu-nos sem perceber afinal o que é que nós vamos fazer (...) e isso
muitas vezes dificultava e tornou o processo e o funcionamento do estágio, para mim,
um bocadinho complicado. Avaliando o produto final, foi bom, mas o processo foi
difícil, deve haver este entendimento e fazer corresponder a ideia que a instituição tem
de um estagiário aquilo que nós poderíamos levar. Mas essencialmente acho que no
fim a instituição, passe a expressão, «ficou bem servida»”(FE8).
“A nível de funcionalidade (...) a sensação que eu fiquei foi que realmente nós
chegamos à instituição e muitas das vezes ninguém sabe o que é que nós estamos ali a
fazer ou se calhar o que pensaram é que nós, talvez, como outras universidades têm
um estágio apenas só de observação e de pouco ou nenhum trabalho (...). Eu acho que,
realmente, as instituições ficaram bastante beneficiadas, mas nós podíamos se calhar
ter aprendido e contribuído muito mais. Por exemplo, eu sentia que precisava de
alguma informação, «ah, depois dou-te, depois dou-te», passavam meses e meses,
onde é que anda a informação? (...) Talvez pode/podia ser também o excesso de
158
A atenção focalizada na problemática do insucesso escolar teve particular acuidade nos estágios do setor
da segurança social, o que trouxe alguma tensão naquilo que constituía a questão em prioridade na ação
dentro do referido setor, portanto, fora do contexto de integração, e por isso, com baixo, ou nulo poder de
negociação. Ao estudante, foi apresentado aquilo que constituía matéria de contrato assinado em contexto do
Rendimento Social de Inserção, ao qual o estudante não teve acesso. Por outro lado, a escola e a educação
deslocam o foco da sua intervenção para outro setor, à falta de profissionais de Serviço Social no setor
(contrariamente ao reconhecimento atribuído na legislação e que tem aplicação na área da Psicologia).
Consequentemente, os profissionais da segurança social são remetidos para essa atribuição.
153
trabalho da instituição, que não permitisse que eles pudessem ter um bocadinho de
tempo para avaliar e aprofundar e saber o que realmente nós estávamos a fazer ali.
Mas eu também senti muito isso…” (FE17).
“Os conteúdos programáticos têm uma sequência (...).É importante garantir que o
aluno, esteja bem orientado ao nível do campo. Senti alguma dificuldade (...) [na]
indisponibilidade do orientador (...), eu compreendi desde o primeiro momento mas
realmente esta lacuna, devia de haver uma outra forma de gerir” (FE22).
Nas razões do alargamento das práticas de estágio às instituições sem Serviço Social, está a
necessidade de profissionais da área e de promover a interação da Universidade junto das
diversas respostas sociais da comunidade, potenciando a criação de novas saídas
profissionais em estruturas sociais a descoberto de assistentes sociais. Concomitantemente,
deve-se à dificuldade de assegurar locais de estágio e/ou a continuidade dos estágios a
novos estagiários, levando-os a recorrer às instituições que se oferecem, ou mais
facilmente se abrem à realização de estágio (às vezes sem a necessária exigência sobre o
mais adequado perfil). Daqui ressalta a necessidade de identificar a oferta de locais de
159
Os novos orientadores são por relação ao ano anterior.
154
estágio e de assistentes sociais disponíveis a cooperar com a formação, através da criação
de uma bolsa de instituições que ofereçam estágio e profissionais com o necessário perfil.
Quadro n.º 12
Evolução nos Orientadores Cooperantes em Estágio
Estudantes 18 22 23 63
Orientadores 18 20 22 60
Novos orientadores 18 15 18 51
Assistentes Sociais 17 16 17 50
Outros 1 4 5 10
Por outro lado os depoimentos atrás explicitados revelam a necessidade de aferição de boas
práticas, ou práticas com qualidade e relevância social, convergente para a criação de uma
bolsa de estágios no curso de Serviço Social, conforme já mencionado, problema não
superado no período em apreço. Aludem, ainda, à ausência de regulamentação da formação
em Serviço Social e, nela, a regulação da atividade de orientação de estágio como atividade
do assistente social, seja qual for a instituição em que trabalhe, haja em vista as já expostas
normas/recomendações pela IASSW e IFSW (2004). Como sublinham Santos & Fernandes
(2008), assim como Lewgoy (2007), são de facto várias as dificuldades na qualidade e
consolidação de estruturas de apoio ao estágio.
155
anteriormente referido160. O processo de pré-estágio, suportado na referida unidade no I
Semestre do 3.º Ano, teve então início no ano letivo 2009-10, com a segunda turma.
160
Esta unidade curricular aprofunda os diferentes setores de política social para dar respaldo ao estágio do
estudante. Apoia-se em painéis, trazendo à Universidade profissionais de todos os setores empregadores e
assistentes sociais que comunicam aos estudantes sobre o seu setor e a intervenção desenvolvida. O “guião”
da comunicação confina com o programa da unidade curricular centrando-se preferencialmente nas seguintes
dimensões: projeto em Serviço Social, eixo temático da sua problemática de intervenção, objetivos,
metodologia, estratégias e resultados até então atingidos. Tem por objetivo comunicar ao estudante a
realidade social em que se integra para melhor prepará-lo no seu enquadramento institucional e a sua
integração na prática, articulando problemáticas, políticas sociais e Serviço Social.
156
esforço por parte de todos os estudantes. Segundo o programa, nas competências treinadas
relevam-se as seguintes:
“Assunção dos valores éticos; gestão da relação complexa entre a justiça social e a
intervenção social; respeito pela igualdade social da pessoa; estabelecimento de
relações de interajuda, de cooperação e de solidariedade de atitudes; intervir sem
preconceitos; competências de planeamento, gestão, execução e avaliação; intervenção
situada no domínio concetual, metodológico, na conjuntura e na estrutura
socioinstitucional; visualização das condicionantes, limites, e potencialidades da
intervenção” (UMa, Dossier de Estágio, 2011).
“Acho que a estrutura do estágio e da preparação para o estágio até tem, acho que o
jovem tem tempo para, pelo menos, ter uma aproximação àquilo que é a intervenção, à
nossa intervenção de Serviço Social. A tal caraterização institucional era feita só no
estágio I, agora já é feita na cadeira de Contextos, penso que veio a facilitar” (FO30).
“O tempo que medeia a ter pronto o que lhes é pedido, às vezes é muito curto para eles
conseguirem dar resposta a tanta coisa que é exigida (...) O processo de Bolonha acho
que também não faz qualquer sentido em especial porque os torna imaturos quando
passam ao seu exercício profissional, se o curso fosse quatro ou cinco anos, a
maturidade era outra” (FO27).
“As pessoas fazem uma coisa (...) que se assimila a uma qualquer coisa de
investigação-ação e qualquer coisa que se assimila também um pouco a um estágio
tradicional. E portanto como as pessoas já ficam condicionadas pelo tempo (...). Há
também obstáculos que dizem respeito às instituições” (FO29).
157
“Eu acho que (...) três momentos (...), do meu ponto de vista, são o modelo ideal. (...).
Eu acho que se o estágio for bem concebido, com esta ótica, é digamos, formativo
para o aluno, é autotransformativo para as organizações, porque elas ganham,
consequentemente com isto e elas têm possibilidades de se autotransformar através
deste processo. (...) Trazer, inclusivamente, os orientadores institucionais para a
Universidade no sentido deles perceberem a natureza do próprio estágio, acho que é
uma tentativa excelente. Dá-me a sensação [porém] que depois o modo de
operacionalização dela, pode, eventualmente, não ser o mais eficaz” (ED32).
158
recetividade dos orientadores cooperantes, assim como a sua preparação, formação e
estreita articulação com o docente supervisor. Portanto, a formação e documentos
orientadores do estágio (manuais, conforme recomendações da IASSW e IFSW, 2004), são
medidas que cabem nesta preocupação.
161
Vamos encontrar estas etapas sistematizadas nas siglas C-D-P-A, D-P-E-A, ou ainda referenciadas pelos
estudantes como C-D-P-A-A, reportando-se: C a contexto institucional; D a diagnóstico social; P a plano e
planeamento; E a execução; A a acço e a avaliação.
159
identificação e desenvolvimento sobre o posicionamento, perspetivas e estratégias em
Serviço Social; x) análise SWOT sobre forças, oportunidades, fraquezas e ameaças à volta
da instituição, da equipa, da população e do contexto social; ix) elaboração do diagnóstico
social integrado e participado, sustentado pela investigação-ação (na articulação com a
unidade curricular do Seminário de Investigação); x) planeamento da intervenção por
objetivos, com base no diagnóstico social realizado; xi) apresentação e defesa do projeto
junto da Universidade e da instituição, considerando a respetiva aprovação para prosseguir
com a execução do plano (UMa, 2007-2011)162.
162
O projeto de intervenção é construído pelo estudante, equipa e população, sob a orientação do orientador
cooperante e do docente supervisor.
163
O responsável hierárquico da instituição é também convidado a estar presente na defesa do relatório final
de estágio.
160
pode representar uma contribuição para a democracia, através de um processo participativo
e coletivo e, vi) a grande finalidade é a transformação da prática (UMa, 2007-2011)164.
164
Alguns conceitos trabalhados na metodologia do estágio, incluindo a de projeto, têm origem em ampla
bibliografia trabalhada nas várias UC de Serviço Social do curso, como é o caso do conceito de participação
nos manuais de Ander-Egg introduzidos logo de início, nas disciplinas de metodologia de Serviço Social -
Ander-Egg (1992) “Reflexões sobre os Métodos de Serviço Social”, El Ateneo; do mesmo autor (1994),
“Metodologia del Trabajo Social”, El Ateneo. É de reafirmar, que um dos manuais de base no estágio é de
Isabel Guerra (2000) sobre “Fundamentos e Processos de uma Sociologia de Ação”, Estoril: Editora
Principia, mas também inclui da mesma autora (2006), “Participação e Ação Colectiva”, Estoril: Editora
Principia. Outros autores seguidos no estágio da UMa, são: Medina Carreira (1996), As Políticas Sociais em
Portugal, Gradiva; António Barreto e Joana Pontes (2007), “Direitos Políticos e Sociais”, Público; Aldaíza
Sposati (1998), “Mínimos Sociais e Seguridade Social: Uma Revolução da Consciência da Cidadania”,
Revista Intervenção Social, n..º 17 e 18; da mesma autora (2007), “Pesquisa e produção de conhecimento no
campo do Serviço Social”, Katálysis, v.10, n..º especial, pp. 15-35; Alain Euzeby (2004), “Proteção Social,
Pilar da Justiça Social”; Myrian Baptista (2001), “A Investigação em Serviço Social”. S. Paulo: Veras e
CTIHTS; Francisco Branco (2008), “A Investigação em Serviço Social em Portugal: Trajetórias e
Perspetivas”, Locus Soci@l, CESSS, n..º 1/2008, pp. 48-63; Marques e Sarmento (2007), “Investigação-ação
e construção da cidadania”, in Revista Lusófona da Educação, n..º 9, pp. -102; Isabel Sanches (2005), “Da
Investigação-ação à educação inclusiva”, Revista Lusófona da Educação, n..º 5, pp. 127-14.
165
O primeiro exercício sobre a técnica fórum comunitário contou, em espaço de Workshop, com especialista
de Serviço Social com larga experiência em poder local, uma importante formação extra-curricular, no ano
letivo de 2006-07, que abrangeu a primeira e a segunda turma. Eventos extra-curriculares, como os já
referidos, foram fundamentais na consolidação da matéria desenvolvida pelos programas das unidades
curriculares do curso, mas tiveram também uma particular incidência na preparação do estágio. Este foi
fundamentalmente incisivo nas metodologias sobre a construção do diagnóstico social local integrado e
participado, desenvolvendo várias técnicas e incluindo a estratégia sobre a dinamização de parcerias locais.
161
Ao mesmo tempo, esta fala indica também que o processo metodológico atribui importante
significado à singularidade e à heterogeneidade local, ou seja, à subjetividade do sujeito e à
relação investigador-investigado em interação para o desenvolvimento de um
conhecimento intersubjetivo local e contextual. Pretende-se, conforme refletido no
programa do estágio, e segundo Nahri, que o conhecimento e o sujeito não estejam
divorciados um do outro, que a realidade seja reconhecida como um contexto-relação e o
conhecimento um fenómeno socialmente construído (2002: 19).
É com base neste processo e estratégia metodológica que os estudantes são formados,
conforme revela o dossier de estágio, fonte da informação agora apresentada.
A figura n.º 3 ilustra, sucintamente, as várias etapas do processo de estágio, desde a etapa
de observação que começa no contexto institucional, mas alargada também à equipa e à
comunidade, e vai até à elaboração do relatório final. É uma prática cujos principais inputs
sustentadores da formação se situam no seminário de estágio, de investigação e de
supervisão.
166
O primeiro estágio do curso incluiu no espaço da unidade curricular do Estágio II o relatório de progresso,
todavia, o processo foi avaliado como muito exigente e demasiado intenso nos produtos a apresentar pelo
aluno, como trabalho académico. Haja em atenção as circunstâncias de funcionamento e de apoio reveladas
por algumas instituições, incluindo, dificuldades de integração do estudante, bem como de acompanhamento
por parte do orientador cooperante, assim como o tempo de aprovação do projeto que, uma vez levado à
direção da instituição, e dependendo da forma como o profissional se posiciona na respetiva hierarquia, pode
levar largo tempo para a sua aprovação. Por sua vez, o timing de execução das ações e atividades sofrem
alterações que o tempo de redação a dispensar a um relatório intermédio não favorece a aprendizagem num
processo demasiado curto, como o Estágio II, que dura entre meados de setembro a janeiro, semestre
atravessado pela quadra de festas de Natal e Ano Novo e aonde as instituições ocupam frequentemente a sua
162
Figura n.º 3
Diagnóstico-Planeamento-Execução-Avaliação: Estágio e Práxis Auto-criativa
Fase de Implementação
Estágio II
Inputs Output
Contributos (Formação do
Seminário de Estágio Estudante, Instituição e
Investigação-ação População)
Seminário de Investigação e
Relatórios
Supervisão (Investigação e Prática de
Estágio)
Fase Diagnóstica
Estágio I
Fonte: Programa de Estágio, Curso de Serviço Social da UMa, 2010 (figura adaptada)
O relatório final de estágio é estruturado na sua redação segundo um guião que respeita as
seguintes dimensões: i) contexto; ii) prioridade indicada pela instituição e reinterpretação
da mesma pelo aluno; iii) perfil social da população; intervenção desenvolvida pela
instituição; iv) diagnóstico social sustentado pela metodologia de investigação-ação, aonde
os estudantes privilegiam técnicas tais como a análise documental, contactos, diário de
campo, observação e entrevista; v) aprofundamento da problemática e sua relação com as
políticas sociais, o posicionamento e estratégias de Serviço Social; vi) planeamento feito
população com as suas próprias e tradicionais iniciativas alusivas à referida quadra festiva, nem sempre
suscetíveis de complementação com as atividades de estágio.
163
para a intervenção por objetivos, apresentando a ocorrência, ou não, de desvios e a sua
justificação e, vii) avaliação dos resultados com as conclusões sobre as mudanças
ocorridas, na instituição, na população, nas políticas sociais e no Serviço Social, apontando
futuras perspetivas.
Várias das narrativas desta primeira turma poderiam vir refutar o finalismo metodológico,
mas é possível dar agora espaço a outras componentes na metodologia de projeto de
intervenção e da metodologia de investigação, com realce para técnicas e procedimentos,
164
articulação, trabalho de equipa, inter e multidisciplinaridade e ampla reflexão167. Portanto,
outras componentes merecem destaque, situando modelos de Serviço Social, estratégias e
mediações do locus profissional, tais como:
As respostas por parte dos estudantes participantes, das duas restantes turmas, sobre a
metodologia do estágio, revelam-se de modo semelhante às da primeira. São elucidativos
os quatro excertos seguintes: i) “a organização do curso estava preparada e estava assente
nesta metodologia. Fazendo sempre… a ponte e uma ligação entre seminário de
investigação e o próprio estágio…” (FE8); ii) “o estágio inclui 4 fases fundamentais:
diagnóstico, planeamento, execução e avaliação. Esta metodologia quebra a tendência
profissional para direcionar-se para o processo de execução, relegando para 2.º plano os
outros procedimentos” (FE11); iii) “conhecer pela investigação-ação, para atuar (...) até à
realização, execução de um projeto e avaliação” (FE14); iv) são etapas do processo
“observação, pré-diagnóstico, diagnóstico, projeto de intervenção e (...) avaliação” (FE15).
“Bom, atendendo ao programa que nós tivemos de estágio e atendendo a toda a fase de
estágio nós respeitamos certamente o processo metodológico de Serviço Social e tendo
em conta que é uma metodologia de investigação-ação. Nós iniciamos o estágio com o
simples facto de conhecer a instituição, a fim depois, de respeitarmos e fazermos o
diagnóstico social, depois nós tivemos, nós projetamos um…ações e atividades
atendendo ao que nós diagnosticamos, nós executamos e nós, e … finalizamos com a
avaliação do projeto que nós realizamos. (...) Eu baseei-me sobre uma metodologia de
investigação-ação, foi…atendendo aos problemas e necessidades (...)” (FE25).
167
A construção de grelhas de observação em suporte ao (pré)estágio foi exercício recorrente, individual e de
grupo, em sala de aula, para apetrechar a prática de estágio.
165
as etapas que gradualmente levam à intervenção e como delas os estudantes se apropriam.
Reconhecem claramente também que não é seguida, ainda, pelos profissionais da prática,
ou seja, os orientadores cooperantes com quem estabeleceram contactos, quer no âmbito da
atividade de estágio, quer noutros momentos de socialização e debate sobre o estágio. Esta
idiossincrasia fragilizou o estágio algumas vezes, outras, porém, deixou aos estudantes
maior liberdade para seguir a orientação académica. Deixou, contudo, algumas
interrogações, inquietações e fragilidades sobre a afirmação da jurisdição profissional,
quanto ao seu saber, poder ou expertise.
Dando espaço a uma das vozes que verbalizou constrangimentos, conclui que eles foram
ultrapassados por via do processo metodológico e da alargada parceria que mobilizou:
“Eu por acaso tive (...) autonomia para interagir com as pessoas, com as quais
trabalhei e fiz, e fizemos o projeto de intervenção. Não me senti condicionada, de
forma alguma, mas também por outro lado, por vezes, senti-me, se calhar, só, porque
tinha dúvidas e tive que tomar as decisões quase, quase sozinha. Se por um lado tive
autonomia para agir, para investigar e agir, também (...) senti-me um bocado só e o
facto de trabalhar, que tive que trabalhar em parceria com várias pessoas
[representantes de instituições], isso, isso dá, deu-me bastante força. O projeto foi a
bom porto precisamente por causa disso. Acho que a instituição não estava preparada
para trabalhar, para trabalhar com os utentes como, como pessoas autónomas e livres,
livres para agir. As pessoas quase que se sentiam pressionadas e isso foi preciso
desmistificar” (FE10).
Por outro lado, nesta mesma narrativa, sobre a estratégia da metodologia de investigação-
ação, a natureza da instituição e o próprio contexto setorial fizeram a diferença, isto é,
dando autonomia e iniciativa ao estagiário e liberdade de expressão à população, o
processo de estágio logrou atingir os seus objetivos.
É de destacar que a terceira turma de estudantes foi dupla, ou triplamente herdeira dos dois
anos de avaliação do estágio curricular no curso, graças aos contributos dos finalistas
166
anteriores e da experiência adquirida pela própria equipa de docentes supervisores (os que
deram continuidade à sua docência no curso), conjuntamente com os orientadores que
estiveram empenhados e mobilizados, se mantiveram e persistiram na sua cooperação com
a Universidade. Foi possível trazer alguma consolidação à metodologia de investigação-
ação beneficiária da sua continuada aplicação no terreno pelo projeto de estágio, bem como
pelo reforço na dinâmica interna do curso através de algumas atividades pedagógicas,
designadamente os seminários académicos relativos à unidade curricular de estágio e da
unidade curricular do seminário de investigação168.
168
Entre o estágio curricular do primeiro e do segundo ano do curso ocorreram mudanças na equipa docente
envolvida na referida unidade curricular, porém, sempre com baixa experiência na formação de cada novo
docente integrado.
167
socioeconómico e cultural tal como se manifestam na sociedade. Sobre a metodologia e o
processo de estágio, é de realçar que toda a sua estratégia vem na perspetiva de reforçar a
imersão no campo de estudo e prática, direcionando o estudante na sua formação, para a
relação e articulação teoria-investigação-ação, ou investigação-ação-conhecimento, com o
objetivo de uma metodologia de intervenção transformadora (Guerra, 2000).
169
Outros manuais foram também trabalhados no estágio curricular. Sobre a problemática da pobreza foram:
Alfredo Bruto da Costa et al. (2008), “Um olhar sobre a pobreza”, Lisboa, Gradiva e de Luís Capucha
(2005), “Desafios da Pobreza”, Oeiras, Celta. Sobre empowerment, John Friedmann (1996) “Empowerment.
Uma política de desenvolvimento alternativo”, Oeiras, Celta.
168
problema. Pede contínuo debate em direção a um novo conceito de cidadania, com a
capacidade de participação de todos na apropriação dos bens socialmente produzidos e
potenciar a sua emancipação historicamente determinada e potenciada no contexto
(conforme Iamamoto: 2010).
170
Os Seminários de Investigação I e II, bem como o Estágio I e II, foram beneficiários de uma comunicação
preparada pela autora desta tese sobre “A Metodologia de Investigação na Intervenção do Assistente Social”,
apresentada em Conferência às III Jornadas de Serviço Social, “Pensar o Serviço Social na
Contemporaneidade”, em 20 e 21 de maio de 2010, no âmbito da Delegação da Região Autónoma da
Madeira - Associação de Profissionais de Serviço Social, que teve lugar na Escola Profissional de Hotelaria e
Turismo da Madeira, Funchal. Pela pertinência, foi secundada a sua apresentação na Universidade Lusófona,
no “I Seminário Internacional de Serviço Social da ULHT - Serviço Social Entre o Passado e o Futuro, as
Exigências do Presente”, a 31 de maio, 1 e 2 de junho, 2010, Lisboa. Foi o culminar da sistematização da
matéria dada em ambas as disciplinas suportadas em vários autores. A comunicação trouxe, assim, algum
saber acumulado sobre a matéria, proporcionando a sua socialização na profissão e junto dos estudantes
finalistas do curso, mas o seu conteúdo susbstantivo revela também a estratégia de retroalimentação
imprimida na formação do curso.
169
planificação, ação, observação sistemática e reflexão, que combina a investigação com a
prática, tornando esta mais informada, mais sistemática e mais rigorosa, tornando o
profissional mais autónomo pelo estudo da sua própria prática. Pela pesquisa qualitativa,
desencadeia-se, assim, um processo dinâmico, motivador, inovador, responsável e
responsabilizante de todos os intervenientes no processo. Cria-se, simultaneamente, as
condições para o desejado conhecimento-sujeito-contexto-realidade, conforme Sposati
(2007), ou conhecimento-movimento desenvolvendo a expertise da profissão, conforme
Nahri (2012), ou ainda reconstruindo o conhecimento, conforme Morin (2000).
“Eu já estava a pensar nestas várias etapas metodológicas que o aluno segue: pré-
diagnóstico, diagnóstico, delinear o plano de intervenção, implementá-lo e depois
avaliá-lo (...). (...) No diagnóstico já avançam para outras estratégias (...), na
comunidade (...). Nós suportamos não só o modelo psicossocial, mas também o da
intervenção comunitária” (FO30).
“O aluno quando vem para a nossa instituição procura dar sempre um contributo
diferente ou inovador” (FO28).
Numa das narrativas a comparação feita com o seu tempo de formação não revela,
contudo, evolução significativa:
“A ideia que eu tenho, hoje, também de alguma forma se calhar a tinha quando fiz o
meu estágio, embora tivesse tido mais tempo para realizar esse mesmo estágio, depois
tive aquele ano que nós fazíamos a tal investigação, era um ano no trabalho de
170
investigação. (...)” (FO29).
Pelo lado dos docentes, encontramos posições igualmente distintas. Temos primeiro uma
voz totalmente concordante, cujo foco se coloca na importância da investigação-ação e na
sua relação teoria-prática, considerada fundamental para a apropriação por parte dos
próprios profissionais, orientadores cooperantes:
171
seguida, perspetivando-se na direção da mesma, porém, confessa descrença de que tenha
suficiente consistência prática, não indo além de um mero exercício académico e, portanto,
sugerindo algo semelhante ao finalismo metodológico.
“Eu acho que a metodologia do estágio deveria passar por uma construção conjunta a
três. Eu sei que isto do ponto de vista da operacionalização é extremamente difícil
fazer - pelo orientador, pelo estagiário e pelo orientador institucional. Agora mercê de
dificuldades, isto é, de ambas as partes, isto é muito difícil de operacionalizar. O tal
processo de construção que acaba por ser uma espécie de fazer, porque (...) [tem]
efetivamente o fazer, e depois, porque os planos de ação, quando a gente os solicita,
(...) já teriam sido estruturados com base na deteção de uma eventual necessidade, ou
na formulação de um eventual pedido, e o aluno iria, no fundo, operacionalizar esse
plano de ação. Creio que o que acontece, porém, é totalmente diferente, os planos têm
somente uma dimensão académica, e não têm repercussões quase nenhumas, do meu
ponto de vista, na intervenção” (ED32).
Este posicionamento crítico convida a uma séria reflexão e acrescenta um novo elemento,
ou seja, a metodologia de estágio não revela, ainda, a consistência desejada no trinómio
estudante-docente-orientador, uma construção que deve ser conjunta. Adiante, este assunto
será retomado ao refletir sobre a supervisão, inseparável do processo pedagógico de
estágio.
Simultaneamente, sugere-nos evocar outros elementos críticos, tal como refere Santos &
Fernandes (2008), designadamente, a necessidade da consolidação dos campos de estágio
para maior garantia nas ações articuladas entre a academia e as instituições, bem como o
fortalecimento dos profissionais com boas práticas, como refereWiebe (2010), baseadas em
valores, centradas no contexto geral e local, forças políticas, interesses comunitários,
interdependência da equipa e na estratégia de empowerment. Acima de tudo, defendendo
uma epistemologia de escuta e de argumentação (na análise de Correia, 2010), requer
partilha entre narrativas científicas e as do mundo da vida, para que a investigação ofereça
o fio condutor para a ação, e não a teoria para a ação. Este é um debate que as narrativas
agora analisadas encaminham para um maior espaço de reflexão e posterior
aprofundamento.
172
Esta questão foi dirigida aos orientadores cooperantes em dois tópicos distintos, o primeiro
dos quais no tópico sobre o projeto de Serviço Social e da profissão, na formação do curso
na UMa e o segundo no tópico do estágio, sobre essa relação desenvolvida na metodologia
do projeto de estágio171. As narrativas intercetam diferentes pontos de vista:
“Levam teoricamente a problemática mais ou menos bem (…). Acho que têm noção
da problemática para onde vão estagiar, mas depois a articulação entre as políticas e o
próprio posicionamento ao nível da profissão, acho que ainda é um bocadinho ingénua
(...). Pois eu penso que isso é ainda muito pouco trabalhado (...) ainda não têm a tal
maturidade mesmo intelectual, para conseguirem [articular] teoria, políticas [e] prática
(…)” (FO26).
“Muitas vezes aquilo que nós transmitimos é aquilo que nós aprendemos com a nossa
experiência que foi transmitida por outros e há determinados procedimentos (...),
determinada atuação que é quotidiana, que tem os seus vícios (...). Também não
temos… aquele tempo, aquela capacidade, não digo capacidade, mas é um certo
laxismo em pensar sobre toda a nossa prática” (FO28).
171
A repetição desta questão remete para dois momentos distintos do guião aplicado ao focus group com os
orinetadores cooperantes, a primeira enquadrada no tópico sobre o projeto de Serviço Social e da profissão na
formação, como questão de transição, a segunda para compreender como foi consubstanciada no projeto de
estágio pelos estudantes.
173
políticas sociais, designadamente os grandes desafios em que problemáticas como as do
envelhecimento nos colocam hoje e que os dados empíricos não negligenciam. Ao fazerem
um frágil pronunciamento sobre essa relação, não só projetam a dificuldade em assumir
junto dos estagiários esses pressupostos, como em contribuir para uma formação exigente
de acordo com os desafios colocados hoje pela crescente complexidade dos fenómenos
sociais, bem como na afirmação da identidade e locus da profissão.
172
Estas ocasiões contaram sempre com a presidente da Associação dos Profissionais de Serviço Social como
conferencista convidada. Revela que o curso esteve também articulado ao movimento associativo da
profissão. Aos estudantes chegados ao curso em cada ano letivo, deslocava-se também, a convite do
Conselho de Curso, o presidente da Delegação da RAM para apresentar e informar sobre a APSS.
174
públicas de entrega simbólica de diplomas, houve lugar também a conferência, onde se
abordaram as problemáticas sociais, as políticas e as estratégias profissionais173. Nas duas
últimas sessões, foram apresentados painéis temáticos suportados na investigação e prática
de estágio, revelando a sua articulação e a metodologia do processo, bem como a relação
no trinómio problemáticas-políticas sociais-Serviço Social, dialogando com o micro e o
macro contexto e, conjuntamente, com o projeto profissional, designadamente, direção e
perspetiva do Serviço Social, tendências do nosso Estado-Providência nas políticas e
direitos sociais, perspetivas metodológicas, estratégicas e técnicas.
É com base neste processo e estratégia metodológica que os estudantes foram formados
pelo estágio, conforme sustentam os resultados dos dados, a partir dos informantes e do
dossier de estágio. Um percurso e uma estratégia, cuja durabilidade a interrupção da
formação deixou inacabados.
173
A última conferência, que teve lugar em junho de 2011, teve como objetivos: integrar e debater os
sentidos da participação social e exclusão social enquanto problemas da contemporaneidade que envolvem
diversos agentes e escalas de intervenção; identificar e refletir sobre o lugar e os mandatos para o Serviço
Social em contextos de severidade.
174
Nos objetivos dos painéis contam-se: promover a reflexão e o debate sobre o contributo do Serviço Social
no exercício da cidadania e participação social; consciencializar para a importância do exercício profissional
dos assistentes sociais ao nível da territorialização das políticas sociais; compreender o fenómeno do
envelhecimento, conhecer e refletir sobre as respostas sociais existentes face à problemática em debate;
divulgar a produção dos alunos nas unidades curriculares de investigação e estágio.
175
Em síntese, as etapas que agora apresentamos dão indicação das dinâmicas imprimidas
pelos estudantes no projeto de estágio. Antecedidas pelas dimensões programáticas,
organização e funcionamento concorrem para avaliar a tendência da sua coerência
consecutivamente desenvolvida na formação do curso. Auscultadas as três turmas,
docentes e orientadores, as evidências centraram-se nas etapas de um projeto de
metodologia participativa escorado na investigação-ação.
“Não chegamos e estabelecemos logo uma relação de confiança, essa confiança vai-se
adquirindo e leva algum tempo (...) e…era uma relação horizontal, ou seja, havia uma
aprendizagem ali mútua, não era eu que estava ali para ensinar alguma coisa eu estava
ali para aprender e baseou-se muito na escuta e depois aí com estes elementos é que se
foi criando, e com o passar de algum tempo, é que se foi criando uma relação de
confiança. Havia sempre um apelo à participação e à valorização de… das suas ideias,
das suas decisões, as decisões eram partilhadas, valorizava muito os seus saberes, ou
seja eu como trabalhava e tentava trabalhar o empowerment e a capacitação, eu tinha
que ter logo, eu tinha que ter esta valorização pelo utente e acho que foi uma…houve
uma distribuição de poder, (...) acho que o poder estava mais do lado deles (...). Eu
aprendi muito e tudo aquilo que eu tinha aprendido teoricamente fazia sentido na
minha observação com os utentes, na pesquisa que eu fazia (…)” (FE10).
“Uma das bibliografias (...) fala muito da sociedade de fora para dentro…e realmente
a sociedade de fora para dentro tem uma visão completamente distorcida, ofusca o que
há de bom e eu já sabia que para conseguir entrar [no bairro] (...) tinha mesmo de criar
um grau de proximidade bastante íntegro, bastante honesto (...). E inicialmente,
recordo-me, nas primeiras vezes não foi fácil, eu ia assim um bocadinho insegura, um
bocadinho a medo, mas não há de ser nada, eu vou respeitar as pessoas e as pessoas
vão aprender a respeitar-me, era isto que eu pensava. Vou respeitar as pessoas como
elas são e as suas vivências e com certeza que vai ser recíproco e…avançava e foi
interessante (...). (...) Eu apresentava-me, dizia o que estava ali a fazer (…)” (FE20).
176
“Eu acho que há três aspetos que são importantes para estabelecer esta tal relação de
proximidade que é determinar logo de início quem é que somos, de onde vimos e
quais são os nossos propósitos, isso é importante que fique claro desde início” (FE22).
Organização/
Funcionamento
Processo de
Comunidade
Aprendizagem
Metodologia/ Processo
Estratégias
177
A partir das várias falas infere-se que a organização e funcionamento do estágio estão
basicamente bem estruturados pela universidade, mas, no que se refere às instituições, o
modelo oscila entre a burocracia, quanto por exemplo ao acesso do estudante à informação
e à sua abertura, comprometendo a cultura construtiva e colaborativa desenvolvida pelo
projeto de estágio, a interação com a realidade social e a interação com o sujeito centrada
na participação. As estratégias no processo metodológico do estágio apoiam-se na
investigação, investigação-ação, com sustentação teórica e através de etapas sequentes
entre observação-diagnóstico-planeamento-participação-avaliação. A prestação de ajuda na
mediação profissional sustenta-se nas instituições entre o atendimento individual, caso a
caso, pelo assistente social e o trabalho de equipa, com algumas restrições ao trabalho na
comunidade.
178
aos contributos/resultados do estágio com todos os informantes nesta pesquisa. Organiza-
se em seis dimensões: i) na formação do estudante; ii) na população; iii) na equipa; iv) na
instituição; v) nas políticas sociais e, vi) no Serviço Social175. Complementa-se com os
contributos/desafios do estágio à profissão hoje, questão apenas colocada, particularmente,
aos estudantes e aos docentes176.
Estudantes – 2ª Turma
Conhecimento dos problemas, necessidades e potencialidades
Prática refletida e pensada
Adequação da teoria à prática
Real refletido, ao lado da dimensão ético-política e teórico-metodológica
Conhecimento das dificuldades pessoais face à realidade específica
Acrescenta aquilo que falta na formação em sala de aula
Conhecimento das políticas, execução e avaliação
Ir além daquilo que se vê
Formação pela prática e ir para além do que se estuda
Especialização nas problemáticas
Saber ser e estar com a população
Conhecimento do funcionamento de uma instituição
Relação teoria-prática e retroalimentação (desmitifica a perspetiva de que na prática a teoria é outra)
Estudantes – 3ª Turma
Conhecimento da pobreza pela voz da população Orientadores
Treino de modelos e técnicas Aproximação à realidade
Conhecimento da realidade sectorial Crescimento pessoal e profissional (óbvios)
Consolidação «do guião aprendido»
Fonte: Focus group com estudantes e orientadores e entrevista aos docentes, 2011
175
Esta é uma questão avaliativa que se reporta aos contributos e que ajuda a compreender a posição do
estudante sobre o projeto de Serviço Social para a profissão na formação do curso. A questão colocada no
guião da técnica aludiu à palavra resultados em vez de contributos, mas foi esta palavra que muitas vezes se
mencionou durante a própria sessão do focus group.
176
Aos orientadores cooperantes esta questão foi enquadrada no último tópico, ou seja sobre o plano de
formação, e por isso reportada à sua adequação aos desafios para a profissão na sociedade atual (e não apenas
ao estágio).
179
No seu conjunto, os contributos do estágio na formação dos estudantes surgem de modo
recorrente quanto à articulação teoria-prática e à sua retroalimentação, afirmando o lugar
do conhecimento na intervenção social, combatendo ou desmistificando “a ideia de que na
prática a teoria é outra”. Nesse diálogo narrativo sobre os contributos do estágio há lugar
para destacar o envolvimento do conhecimento com as problemáticas sociais (objeto de
intervenção) em articulação com as necessidades, potencialidades, sonhos e desejos da
população, a relação com esta estabelecida, mas ainda as etapas metodológicas, as
estratégias e as técnicas em que se desenvolve o processo. Sobre o modelo de ensino-
aprendizagem a primeira e a segunda turmas apontam mais para a centralidade da
autonomia, enquanto que a terceira turma converge mais para um modelo de dependência.
Por conseguinte, a perspetiva na intervenção social, das duas primeiras turmas, estará mais
próxima de um modelo de emancipação e a terceira na transição entre este modelo e o de
regulação, normativo, ou de controlo. Traduzindo esta análise em termos de objeto do
Serviço Social, segundo a proposta de Faleiros (na perspetiva do objeto), a narrativa da
terceira turma estará mais próxima da perspetiva de ajuda (helping profession, pela qual o
Serviço Social assenta numa relação entre quem ajuda e é ajudado, uma relação superior,
autoritária e moralista) do que da proteção (protecting society, pela qual o Serviço Social
se enquadra na dinâmica da estrutura social articulando as dimensões económica, política,
social e psicológica através de um diagnóstico social mais complexo e apoiado nas forças e
potencialidades da população).
180
A figura n.º 6 (que restitui o conjunto dos significados expressos pelos estudantes), traduz
os contributos do estágio na formação dos estudantes segundo as dimensões do projeto de
Serviço Social no curso. Revela que a formação tende ao desejado equilíbrio entre as suas
grandes dimensões, ético-política, teórico-metodológica e técnico-operativa. Não obstante
a interatividade entre as diferentes dimensões, é dado relevo, para esta análise, à primeira
dimensão (ético-política) ao sublinhar o cuidado dos estudantes no seu propósito de
conhecer o problema pela voz da população, ou de ter em atenção o questionamento da
realidade social, articulando políticas sociais e cidadania. Nestas suas falas poderá reiterar-
se que a formação os preparou para os princípios e desafios na profissão de Serviço Social,
a assunção do seu estatuto e compromisso público, o seu locus e identidade na sua
preparação para a jurisdição da profissão e suas mutações (conforme Branco, 2009a).
181
Figura n.º 6
Estágio segundo o Projeto de ServiçoFigura nº–6 Contributos apontados pelos
Social
O Estágio segundo o Projeto de Serviço Social – Contributos
Estudantes
Apontados pelos Estudantes
Ético-política
Conhecer o problema pela voz da população
Questões de cidadania
Políticas sociais
Saber ser, saber estar
Reafirmação do Serviço Social
Refletir e pensar
Questionar a realidade social
Teórico-metodológica
Conhecer a problemática
Investigação-ação
Articular conhecimento teórico-prático
Modelos, métodos e técnicas Técnico-operativa
Retroalimentação Aprendizagem da intervenção
Modelo integrado Como operacionalizar
Intervenção no indivíduo, grupo, comunidade Saber lidar com as pessoas
Contexto-Diagnóstico-Plano-Ação-Avaliação Guião aprendido
Crescimento pessoal e profissional
Conhecimento prático
Recurso das técnicas
Conhecer o local
Um outro aspeto analisado diz respeito aos contributos do estágio para a população
(quadro n.º 13). Apesar da execução do projeto de estágio ser limitada a um semestre,
aponta-se a melhoria do bem-estar da população, como sendo o grande objetivo do Serviço
Social. A este objetivo são acrescentados outros contributos, tais como: i) participação/ter
voz, como uma das estratégias para sair da exclusão, seja mesmo em tarefas e atividades
simples, planeadas e executadas pelo projeto; ii) autoconhecimento e valorização como
cidadão; iii) acesso à informação sobre políticas setoriais, desocultando o processo sobre as
suas alterações e mudança e, iv) autonomia e fortalecimento das redes, desde as familiares
às de vizinhança e associativas.
182
Quadro n.º 13
Estágio: Contributos para a População
1ª Turma 2ª Turma 3ª Turma Orientador Docente
Fonte: Focus group com estudantes e orientadores e entrevista aos docentes, 2011
183
Sucede-se uma outra síntese, agora sobre os contributos do estágio para a equipa da
instituição de enquadramento do estagiário. E, se o tempo de estágio é curto demais para
identificar resultados na população, facilmente se reportam aos contributos reconhecidos
na equipa institucional177. Alguns estudantes diagnosticaram o quanto aprenderam com o
trabalho multidisciplinar adotado pela equipa com quem estagiaram, e que é chamado
como modelo integrado por uma estudante, mas igualmente reconhecem que o seu estágio
levou à equipa novas metodologias e técnicas, reflexões sobre novas ideias, aceitação da
partilha, da complementaridade, crescimento, coesão, mais vontade, paixão e
multidisciplinaridade no trabalho e alargamento de parcerias. Outros estudantes dão conta
de contributos na abertura (face ao que designam por “frieza” revelada na sua chegada à
equipa), comparativamente à fase em que a conheceram no início do estágio, mas também
pelo reconhecimento expresso pelo trabalho de estágio realizado. Outros, ainda, apontam
que, em algumas das equipas, prevalece significativa desvalorização pelo trabalho do
assistente social, em áreas e setores aonde outros profissionais suscitam um forte
protagonismo, reconhecendo o esforço necessário a dedicar à identidade profissional e na
sua afirmação jurisdicional.
Pela parte dos docentes, as suas falas ilustram um reconhecimento da atualização de obras
e autores proporcionados pelos estudantes à equipa na instituição de estágio, bem como o
espaço de reflexão e o cruzamento e desocultação de saberes extraídos da prática. Pela
parte dos orientadores cooperantes, é sobretudo referida a articulação interprofissional, mas
igualmente indicam a actualização de obras e autores.
Fica patente, conforme Mioto e Nogueira (2009) que o trabalho em equipa se constitui
como uma das formas de trazer um olhar ampliado às especificidades das profissões,
integrando saberes e práticas na contrução do pensar e do agir, dando maior rentabilidade
às atividades, superando ações fragmentadas e trazendo uma visão global, “atributo dos
fenómenos e dos factos sociais” (2009: 229). Quando realizado e legitimado
profissionalmente o trabalho de equipa conduz mais facilmente ao sucesso do trabalho
conjunto.
177
Os estudantes exercitam, desde o 1.º Ano de curso, o trabalho em grupos entre estudantes com diferentes
perfis, ritmos e metodologias de trabalho, fazendo com isso uma apreciável preparação para o trabalho em
equipa.
184
Quadro n.º 14
Estágio: Contributos para a Equipa Institucional
1ª Turma 2ª Turma 3ª Turma Orientador Docente
Trouxe/proporcion
ou novos dados de
pesquisa;
Mútua
aprendizagem com
modelo integrado
na equipa;
Aceitação da
complementaridad
e partilha (com
humildade).
Fonte: Focus group com estudantes e orientadores e entrevista aos docentes, 2011
Sobre os contributos possibilitados pelo estágio à instituição, nele se incluem contributos
diretos e indiretos à população, ao orientador e à equipa, alguns dos quais já explicitados.
Porém, a tónica aqui incide na questão da implementação do projeto de estágio,
mencionando que alguns dos projetos mereceram continuidade, com reconhecimento pela
sua inovação, mas há o reconhecimento da atividade desenvolvida, ter constituído o
reforço na oferta da instituição à população, apresentando-se essas atividades com “novas
dinâmicas e novas ideias”. Isto pode ser traduzido com o exemplo de “uma candidatura ao
programa Rumos para criar ali [na instituição] uma resposta concreta (...) [que] resultou de
185
uma proposta do estagiário” (FO30). É igualmente reconhecida a apresentação de
sugestões e de propostas pelos projetos de estágio, maior abertura da instituição à
população, família e grupos, mas também a disponibilidade de dados de levantamento
estatístico, e outros, sobre as problemáticas em intervenção, que graças aos projetos de
estágio, enriqueceram a informação e o acervo da instituição.
Quadro n.º 15
Estágio: Contributos para a Instituição de Acolhimento
1ª Turma 2ª Turma 3ª Turma Orientador Docente
Fonte: Focus group com estudantes e orientadores e entrevista aos docentes, 2011
Sobre os contributos do estágio para as políticas sociais, encontram-se escassos dados,
havendo quem afirme, do lado dos estudantes, que o estágio tem como contributo a
construção de uma atitude crítica sobre as mesmas, recusando a posição dos assistentes
sociais de meros executores (FE6). Já os orientadores assumem para as políticas sociais
aquilo que foi para a instituição, ou seja, a criação de cursos e candidatura a programa
nacional (anteriormente já assinalado), graças ao trabalho de diagnóstico social feito sobre
a realidade local. Para os docentes, o estágio tem trazido os seguintes contributos às
políticas sociais: i) análise sobre a concetualização do modelo de bem-estar e políticas do
186
setor; ii) reflexão sobre a sua insuficiência na cobertura de respostas sociais face às
necessidades da população; iii) apresentação de propostas/sugestões com base no trabalho
de estágio; iv) aprofundamento de novas respostas sociais. Um dos docentes chama a
atenção para a difícil tarefa de contribuições, a partir dos estágios, dado que as políticas
sociais são tradicionalmente “políticas emanadas de cima, distantes dos práticos” (ED32).
Das falas recolhidas constata-se que o estágio se revela com menor efeito na alteração das
políticas sociais, limitando-se à sua caraterização e a atividades de execução através de
projetos de curto tempo. Porém foram enunciados contributos pelos estudantes, tais como:
i) inventariação de medidas e programas disponíveis; ii) reconhecimento da preparação dos
estudantes para uma atitude crítica sobre as mesmas políticas, em resultado dos estudos e
das práticas realizadas no âmbito do estágio; iii) atitude crítica quanto à escassez no apoio
aos cidadãos (caso, por exemplo, do doente oncológico, doente mental, às famílias, ou
outro); iv) levantamento de respostas sociais com a participação de moradores de bairros
sociais, com escassez de recursos territorialmente oferecidos, e desse levantamento e
apresentação de propostas, resultou na promoção de algumas respostas locais, conduzindo
a maior satisfação da população.
Tal como foi contributivo para a instituição, os projetos de estágio foram potenciados na
fundamentação de propostas de candidatura a programa nacional (referido atrás),
recebendo acolhimento e posterior aprovação. Trouxeram, por isso, contributos de reforço
às políticas/programas sociais, assim como contributos à população e à equipa. Abaixo se
transcrevem excertos das falas dos estudantes realçando os contributos:
“Os assistentes sociais não devem ser os tais meros executores das políticas sociais,
não! Acho que foi importante fazer esse tal estudo para termos então uma atitude mais
crítica, mas realmente em relação ao meu estágio, acho que considero que não tive
assim tanto resultado quanto isso, quanto eu esperava” (FE6).
“Acima de tudo…foi perceber que as políticas sociais não são só o estudar o que é
uma política social numa unidade curricular, mas acima de tudo é colocá-las na prática
e colocá-las na prática no sentido de…fazer com que a população tenha acesso e
beneficie dessa mesma política social, portanto não é só, uma nuvem que paira no ar.
A ideia é que ela chegue cá abaixo” (FE8).
187
uma relação de confiança, porque muitas vezes eles desabafavam e sentiam que
parecia que estavam a pedir esmola e…isto não é correto, tendo em conta que a
política social estava concebida precisamente como um direito que eles têm” (FE10).
“Bem, falar de políticas sociais agora (...) é complicado, pra mim foi extremamente
difícil dizer a uma família «vá buscar um extrato bancário pa pedir (... [apoio à]
Segurança Social», é complicado. Mas…posso dizer que a relação com as políticas,
com todas as medidas sociais que existem para atender às necessidades [imediatas]
que encontrei no [utente] (...), foi positivo” (FE25).
Vários são os autores de Serviço Social que defendem a participação do assistente social na
conceção das políticas sociais, mas esta continua sendo uma miragem no quotidiano da
prática profissional, e a que se refere Josefina McDonough (1999) ao considerar a prática
política como a face negligenciada da intervenção em Serviço Social. Com efeito, as
políticas sociais são mais frequentemente discutidas na perspetiva do seu acesso como
direito, como se conclui pelas falas dos informantes, ou seja, que o debate se coloca mais
no patamar da excução das políticas sociais no acesso aos direitos do que no princípio da
conceção das mesmas. Compreendemos que o caminho para a participação nas políticas
seja muito difícil tendo por referência a perspetiva de Boaventura Santos (2002) que
carateriza Portugal com um Estado-Providência tardio, com persistência na conceção das
prestações sociais como benefício e não como direitos.
Olhando para a síntese dos contributos para a profissão de assistente social, são imensos,
comprovados pelos estudantes e corroborados na formação experiencial com o estágio.
Assim, o estágio permite a reafirmação de todo o património acumulado na área, quer ao
nível do conhecimento do Serviço Social, quer na afirmação da jurisdição do assistente
social. Entre os estudantes regista-se uma forte aposta na afirmação do Serviço Social, nos
seus princípios e na capacidade de inovação e criatividade, imprescindível à intervenção
social junto da população.
188
Quadro n.º 16
Estágio: Contributos para o Serviço Social
1ª Turma 2ª Turma 3ª Turma Orientador Docente
Fonte: Focus group com estudantes e orientadores e entrevista aos docentes, 2011
A figura n.º 7, abaixo inserida, e complementar ao quadro n.º 16, apresenta a síntese dos
contributos do estágio, segundo os estudantes. Sob a forma de hexágono, os seis ângulos
que constituem as grandes categorias, ilustra que o estágio curricular reflete a profissão
junto do estagiário, da equipa, da população, da instituição, nas políticas sociais e no
Serviço Social de forma complementar. Fazendo a ponte entre a figura n.º 7 e a matriz
aferida no quadro n.º 16, fica sublinhado aquilo que, de forma mais aprofundada, foram os
contributos do estágio para o Serviço Social: i) atitude investigativa; ii) articulação teoria-
prática; iii) ética profissional; iv) eixo emancipatório; v) criatividade; vi) inovação.
Quaisquer destes contributos estão em consonância com aquilo que pode fortalecer e
atestar a formação e a identidade profissional.
189
Figura nº 7
Estágio Curricular: Contributos Globais segundo os Estudantes
Estagiário
Dimensões do projeto
profissional: ético-política,
teórico-metodológica e
técnico-operativa
Eq
ial
ui
Soc
Conhecimento académico
pa
Atitude investigativa
o
com teorias, metodologias,
vi ç
Ser Articulação teoria – prática estratégias
Ética profissional Abertura da equipa e
Eixo emancipatório, aprendizagem mútua;
criatividade e inovação Evolução na abertura e
cooperação
com conhecimento
sti
pertença;
ão
t
Abertura e partilha
laç
ui
Alargamento de redes
çã
pu
na equipa
o
Resposta sociais
Po
e família
Atitude crítica
Execução
Política Social
Por sua vez, o conjunto de categorias identificadas a partir dos contributos do estágio
segundo os docentes, traz complementaridade e reforça a anterior reflexão, como se
sintetiza: i) afirmação do Serviço Social; ii) capacidade inventiva e criativa; iii)
modernização; iv) desconstrução da realidade social; v) afirmação da sua capacidade
interventiva, propositiva e de construção da mudança social.
O quadro n.º 17, que sintetiza os contributos do estágio, quer para os estudantes, quer para
a profissão, segundo os docentes, recaem novamente na complementaridade e articulação
teoria-prática no processo de estágio, sustentado em conhecimento sólido e construído com
sustentabilidade teórica e retroalimentação, na confrontação, ou enfrentamento das
problemáticas na sua complexidade em face da vivência das realidades sociais concretas.
Como exemplo sobre a capacidade inventiva e criativa do estágio para a profissão
transcrevemos um excerto elucidativo de um docente:
“... Do ponto de vista da própria profissão configura-se como duas coisas: por um lado
um momento de afirmação do Serviço Social de demonstração da sua capacidade de
inventiva e recreativa e por outro de modernização, porque o Serviço Social não se
esgota, nesta sua capacidade de leitura, de interpretação de desconstrução da realidade
social, afirma aquilo que é a sua capacidade interventiva, propositiva e de construção
da mudança social” (ED31).
190
Quadro nº17
Estágio Curricular: Contributos segundo os Docentes Supervisores
Estudante População Instituição e Políticas Serviço Profissão
Equipa Sociais Social
Compreensão dos Capacitação/ Atualizar autores Caraterização da Afirmação do Complementarida
eixos da formação; empoderamento. e obras. (in) suficiência na Serviço Social de e articulação
diálogo teoria-prática; Agente co- Suspensão do cobertura das na sua teoria-prática,
construção de relação responsável pelo quotidiano para políticas nas capacidade com retro-
igualitária, rompendo processo de refletir necessidades propositiva alimentação de
a lógica do assistente mudança para sociais. conhecimento
social, técnico/ melhor qualidade Identificação de sólido construído
profissional. social, com propostas/ na confrontação
envolvimento nas sugestões de das exigências
próprias aprofundamento pelo
respostas sociais. das respetivas enfrentamento das
respostas sociais. temáticas
colocadas à
profissão
Na figura n.º 8 ilustram-se as categorias a partir dos achados reportados à entrevista aos
docentes e que são os seguintes: i) legitimação do Serviço Social; ii) aprofundamento da
democracia, com construção de relação igualitária na agência do assistente social; iii)
sustentabilidade teórica, a partir da prática em retroalimentação; iv) consolidação da
formação teórico-prática.
191
Figura nº 8
Estágio Curricular: Contributos segundo os Docentes
Figura n.º 8
Estágio Curricular: Contributos segundo os Docentes Supervisores
Pela parte dos orientadores cooperantes (figura n.º 9), os contributos do estágio
sistematizam-se pelas seguintes categorias: i) inovação/novidade; ii) alargamento e
adaptação das atividades da instituição; iii) articulação entre a Universidade e a instituição;
v) e atualização de conhecimentos.
Figura
Figuranº n.º
9 9
Estágio Curricular: Contributos segundo o Orientador Cooperante
Estágio Curricular: Contributos segundo os Orientadores Cooperantes
Inovação/ Novidade
Alargamento e Adaptação das Atividades na Instituição
Para concluir este subcapítulo, ficou o compromisso de reunir os desafios colocados pelo
estágio para a profissão hoje, segundo os estudantes. Assim a figura n.º 10 identifica aquilo
que são os desafios do estágio à profissão: i) atitude investigativa na profissão; ii)
articulação teoria-prática; iii) aliança entre políticas e ética profissional; iv) eixo
emancipatório; v) criatividade e inovação na prática. Estes são, indubitavelmente,
importantes achados do estágio com grande significado para a profissão, promissor para
uma prática não só inovadora, mas inventiva, ou seja, fazer emergir conhecimento.
192
Figura n.ºnº1010
Figura
Desafiosdodo
Desafios Es tágio
Estágio à Profissão
à Profissão de de Serviço
Serviço Social
Social Hoje
Hoje
Atitude Investigativa
Articulação: teoria-prática, políticas e é tica profissional
Eixo emancipatório
Criatividade e inovação
Depois deste longo eixo de análise sobre o estágio, podemos sintetizar com base nos
achados e na análise feita, que o estágio consolidou a formação, através de um processo de
ensino-aprendizagem aliado à estratégia da investigação, da participação e da rede
construída, colaborativa, cooperativa e transformativamente, associando o docente, o
estudante, o orientador cooperante e a população. Diversas foram as categorias construídas,
suscetíveis de trazer contributos à elaboração de teoria sobre o processo de estágio, entre as
quais, se destacam: i) intervenção com a realidade social e o sujeito; ii) reforço do
empowerment, fortalecimento da identidade, autonomia e cidadania, para proteção com
responsabilidade social; iii) investigação e investigação-ação percorrendo as etapas do
projeto e a articulação teoria-prática, conjugando observação-diagnóstico-planeamento-
ação-avaliação, fortalecendo os saberes da ação, a experimentação, o fazer-conhecer; iv)
combate à burocracia das instituições, ao finalismo metodológico e à dependência do
sujeito pelo controlo da ajuda na intervenção.
Ficou claro que o estágio pôs à prova os esquemas operatórios desenvolvidos na formação
(Granja, 2005). Reforçando esta perspetiva, podemos sublinhar que o estágio se alicerçou
num quadro de fundamentação integrado e integrador, criando as condições, conforme
proposta por Banks e Nöhr (2008), de propiciar a (re)construção de saber/conhecimento
(Morin, 2001), alicerçado na articulação teoria e ação, ou conforme Sidambarompoullé
(2007), dando lugar a um saber comunicável na e pela experiência do ator.
193
A análise aponta para a formação no curso da UMa que conjuga uma política de educação
de cognição com produção de subjetividade (conforme Dias, 2009). Falamos da formação
experiencial na perspetiva inventiva de pensar e conhecer enativo, de fazer-emergir, ou
fazer de novo pela investigação-ação, aberta à imprevisibilidade e às pequenas invenções
que surgem dos contextos de formação, da investigação e da ação através de práticas que
fazem emergir plasticidade encaminhada pelo processo de produção de sentido. Significa
problematizar o aprender co-formando.
Quando se conclui sobre a consolidação da formação pelo estágio esta afirmação não
ignora vários constrangimentos a superar no seu processo, quer do lado da universidade,
quer das instituições locais. Pela parte da universidade impõe-se a responsabilidade pela
criação de uma bolsa de instituições de estágio com perfil de boas práticas, qualificação
dos docentes e dos orientadores cooperantes com formação adequada para as respetivas
funções de orientação de estágio e, ainda pela elaboração de um guia/manual de apoio ao
estágio. Por parte das instituições, disponibilizando-se e abrindo-se mais facilmente ao
estágio conjuntamente com os seus quadros profissionais para a referida formação, sendo
necessário apoiar as metodologias/estratégias inovadoras, resistindo à reprodução de
práticas fragmentadas e à angariação de estudantes como mão de obra barata.
194
Para tanto, a análise divide-se em três secções: a primeira versa as caraterísticas do
processo de supervisão pedagógica e, nelas, os saberes integrados do Serviço Social,
através da relação entre o saber académico e o saber da prática. Nesse sentido passa-se pela
organização, funcionamento e definição de supervisão, objeto, ou atos, perspetiva de
modelo de aprendizagem, competências desenvolvidas, potencialidades e limites; a
segunda secção analisa o papel do orientador cooperante na orientação que desenvolve
complementarmente à supervisão docente, sem o qual o estágio, não atingiria a sua
concretude; a terceira secção incide nos resultados da supervisão na formação do curso. Os
resultados sobre a supervisão concluem o percurso de pesquisa desta tese indagando sobre
o saber/poder pela autonomia e a emancipação do estudante, dimensões tomadas como
pedagogicamente centrais na perspetiva de um modelo de estágio e supervisão em
construção pelo processo de ensino-aprendizagem no Serviço Social.
195
(Regulamento de Estágio, UMa, 2007). O processo pedagógico de acompanhamento de
estágio perfaz, portanto, 36 horas, e tem lugar predominantemente no espaço académico.
Estas 36 horas de supervisão comportam quatro modalidades: a supervisão individual, a
articulada e a coletiva, esta de grupo e de seminário de turma.
Estudante
Articulada Docente
Orientador
Coletiva Estudantes
Seminário de Turma Docente
Supervisão
Individual Estudante
Docente
178
Durante o período de integração a frequência de supervisão individual pesa com relação à formação do
orientador cooperante fora da área do Serviço Social, mas deverá respeitar também a disponibilidade e
abertura do docente supervisor. Haja em vista o limite de carga lectiva semestral de 18 horas prevista no
regulamento, largamento ultrapassado, quando dividido pelas diferentes modalidades de supervisão e
nultiplicado confrome a totalidade dos estudantes atribuídos ao docente supervisor.
196
cooperante. Tem periodicidade mensal e realiza-se preferencialmente na instituição onde
decorre o estágio179. Salvo exceções colocadas às limitações do seu espaço físico, a
supervisão pode ter lugar na universidade. Esta supervisão segue os conteúdos da
supervisão individual (etapas, problemas, necessidades e desafios) de forma articulada com
o orientador cooperante e reflexão conjunta.
179
A natureza individual desta supervisão no apoio ao estudante não se altera mesmo em caso de haver mais
do que um estagiário numa mesma instituição.
180
Esta supervisão quinzenal, concomitante com a supervisão individual, foi planeada alternadamente, ou
seja, à semana de supervisão individual sucedia a semana de supervisão de grupo.
181
A periodicidade do seminário de estágio sofreu algumas adaptações, consoante a extensão da turma e
algumas singularidades experimentadas na gestão do plano da unidade curricular, mas respeitando as etapas
(no Estágio I), ou as grandes temáticas/problemáticas envolvidas, por setores de intervenção,
responsabilizando os respetivos estagiários e docente, ou docentes envolvidos nos mesmos, aberto à
participação dos orientadores cooperantes e posteriormente também aberto à população.
197
Regra geral, no Estágio I, conforme já atrás indicado, sucedem-se as etapas seguintes: i)
contexto institucional e pré-diagnóstico social; ii) diagnóstico social; III) planeamento da
intervenção, sob a forma de proposta de projeto. Já no Estágio II, os seminários centram-se
na execução e avaliação do projeto de estágio.
182
Nas novas respostas criadas pelo projeto de estágio, um exemplo dado em seminário pelo testemunho de
jovens e famílias correspondeu ao espaço criado para atividades com as crianças/jovens (incluindo a
dinamização da iniciação ao teatro e à dança). Junto da população mais velha, e a exemplo de novas
atividades em respostas sociais já existentes, foram testemunhos espaços para novas atividades (informática,
dança e atividade física, ou movimento e expressão corporal), muitas delas através de parceria local.
198
avaliação respeita os objetivos e metas do projeto de cada estagiário.
183
A participação da população é devidamente ponderada entre estagiário, docente e orientador, mas é da
responsabilidade do estudante a convocação e preparação da apresentação a realizar, embora haja orientação
para que a mesma se caraterize por um testemunho espontâneo preservando a autenticidade desejável. O
número de participantes é limitado entre 3 a 4 pessoas para obviar as dinâmicas pedagógicas do seminário em
espaço académico.
199
com conexão com o projeto, com os contributos e os resultados alcançados.
200
recomendações feitas por cada um dos docentes supervisores. A supervisão de articulação
(ou reunião, conforme designada por alguns estudantes), em contexto de estágio entre
estagiário, supervisor e orientador, carateriza-se por partilha e real articulação, contexto
local e Universidade, orientador-estudante-docente supervisor e teoria-prática em diálogo.
A segunda turma identifica a supervisão individual, a coletiva por pequeno grupo com
supervisor, o seminário e a supervisão articulada, como as quatro modalidades na
organização e funcionamento. A supervisão individual é vista como mais centrada nas
dificuldades do estagiário; a coletiva com o docente situa-se na interação e na troca de
ideias, processos e metodologias, aberta à participação e partilha da experiência de estágio,
às dúvidas e receios de todos os estudantes do próprio grupo, oferecendo espaço ao
diálogo. É onde se prepara a matéria dos seminários de turma (confirmando, portanto o
anteriormente apresentado). Sublinha a prevalência da supervisão coletiva sobre a
individual por esta admitir abertura à solicitação de cada estagiário. O respeito pela carga
horária, formalmente instituída (ou as necessidades da sua extensão), deixa a cada docente,
supervisor margem de liberdade, para orientar-se com autonomia. Dada a caraterística do
funcionamento implementado na supervisão individual, ou seja, realizada por necessidade
do estudante, a sua apreciação refere ter oferecido vantagens e desvantagens, conforme
apreciação de alguns estudantes. A supervisão de articulação entre o estudante, o
supervisor e o orientador é tida como complementar à supervisão individual. Os
seminários, com troca na reflexão e debate entre todos os estagiários da turma sobre os
projetos de estágio, são considerados enriquecedores, embora extensos (à semelhança da
primeira turma).
Por último, a terceira turma centra-se menos na sua organização e mais sobre as questões
da conceção e organização da supervisão geridas de modo distinto por parte de cada
docente supervisor, retornando frequentemente às mesmas críticas e apontando importantes
consequências. Seguem-se algumas falas:
“… A supervisão como tive foi periódica, por muito que as supervisões individuais
pudessem…serem marcadas pelo supervisando, consoante as suas dúvidas, haviam
também supervisões individuais que já estavam no cronograma e que
eram…necessárias de cumprir. E eu acho que isso é importante porque (…) faziam-
nos parar para refletir. (…) Ao mesmo tempo que pré-preparavamos aquilo que ia ser
discutido na supervisão, havia uma dinâmica na altura da supervisão que permitia
colocar novas dúvidas, apesar de ser também personalizada a cada estágio em
específico, o caso das supervisões individuais, havia um tema que tava sendo
201
acompanhado em conjunto por todos os colegas e que depois era, portanto, refletido na
supervisão coletiva [em grupo e em seminário]. (…)” (FE19).
“… A supervisão, independente de individual e coletiva, todas as supervisões
seguiram um caminho, portanto, nós não andávamos perdidos. Fazíamos uma
apresentação e o debate de acordo com cada etapa do trabalho que nós távamos e eu
acho que isso a nível de funcionamento foi bom, porque não foi hoje chegar e vamos
falar disto e…não, foi todo um caminho, hoje vamos começar pela fase do pré-
diagnóstico, vamos seguir com o diagnóstico e depois dentro de cada um tinha sempre
pontos e temas específicos, que era portanto, no fundo permitiu-nos construir uma
base para depois crescendo e crescendo por várias etapas, não andamos ali a
ultrapassar etapas em cima de etapas e acho que a nível de funcionamento e de
conteúdo foi uma das mais valias” (FE11).
“Bem, sobre a minha experiência em supervisão, destaco que realmente a supervisão
foi organizada numa base de, tendo como base valores democráticos, envolvendo
sempre a participação (…). O supervisor nunca tomou uma posição de “laisse-faire”
deixando os alunos entregues a si próprios, o que foi extremamente importante. Logo
no primeiro dia foi apresentado aos alunos um plano com a respectiva agenda em que
as supervisões estavam, realmente agendadas, portanto, a nível semanal, todas as
semanas concretizava-se uma supervisão pelo menos coletiva e depois a individual era
agendada consoante também a disponibilidade, as dificuldades do próprio aluno”
(FE22).
“Eu acho que era mais um bocado ao acaso” (FE20).
“… Eu acho que a nossa supervisão… Eu ainda não percebi como é que estava
organizada…Perceber como funcionou, percebi. Funcionava assim um bocadinho…
(…) Eu falo por mim, eu tive muitas dificuldades na supervisão. Eu acho que nós
tivemos muito poucas supervisões, muito poucas (…)” (FE21).
Assim, esta terceira turma enuncia nos aspetos a melhorar os seguintes: i) metodologias
mais próximas da realidade social em contexto de estágio de cada estudante; ii) orientação
de conteúdos programáticos na supervisão, sem espaço a sentimentos e emoções do
docente supervisor, como foco central da mesma; iii) maior equidade no tempo
disponibilizado a todos os estudantes, ultrapassando a tendência de seguir a vontade ou a
pré-disposição de cada docente supervisor, mais do que a orientação prevista no programa
com revisão sobre a frequência da supervisão individual e articulação com o orientador; iv)
202
organização dos seminários revendo as distintas perspetivas de cada supervisor reveladas
inclusive na sua apreciação crítica sobre cada estagiário; v) reforço no acompanhamento do
estagiário pelo docente supervisor através de visitas às atividades de estágio. São
constrangimentos que não observados pelas turmas anteriores mas experimentados pela
terceira turma, equacionam a coesão dentro da equipa docente de supervisores.
Da parte dos docentes, são trazidos aqui alguns dos seus contributos:
“O facto de haver um programa com objetivos delineados permite construir aquilo que
é uma unidade na formação e nas orientações que são dadas aos alunos. Em termos de
funcionamento, o facto de nós termos a supervisão construída, em termos coletivos e
em termos individuais, complementada com os próprios seminários, permite também
esta interação entre os diferentes professores e a interação também entre os diferentes
alunos que estão distribuídos por grupos dos diferentes professores” (ED31).
Este extrato destaca a unidade em torno do programa no estágio (I e II) e das orientações
gerais imprimidas à formação do curso, mas refere três modalidades da supervisão, apenas.
Deixando de fora a supervisão articulada. Com efeito, as supervisões articuladas não
tiveram regularidade mensal por parte de todos os docentes, designadamente em resultado
do número de estudantes atribuído, da distância entre a universidade e a instituição e,
ainda, pelo tipo de disponibilidade do orientador cooperante e da sensibilidade do próprio
docente supervisor que dispõe de liberdade e autonomia para gerir o horário que lhe é
atribuído184. Esta assertiva encontra algum eco nos orientadores, conforme se constata:
“Quando eu digo…. que era conveniente haver um contacto e uma relação mais
sistemática, uns contactos mais regulares entre o supervisor e o orientador, eu acho que
muitas vezes, e porque é humano, ninguém neste mundo pode ter, ousar querer dominar
as várias áreas e conhecer a fundo as várias áreas, portanto, não havendo essa
proximidade, não havendo depois essa proximidade, corre-se o risco de haver um
desfasamento claro entre aquilo que o supervisor entende que deve ser feito num
processo de negociação com o aluno e aquilo que pode ser feito na prática, na
realidade” (FO29).
Decorre desta análise que na organização dos diferentes momentos de supervisão na UMa,
é a supervisão académica (individual e coletiva) a que se revela com maior expressão. A
supervisão de articulação tem menor consenso, quer pelo coletivo dos docentes
supervisores sobre a sua disponibilidade e abertura para a mesma, quer por parte dos
orientadores cooperantes. A expressão desta modalidade fragiliza a articulação entre a
184
A deslocação do docente supervisor ao local de estágio é feita a expensas próprias, tal como nenhum
apoio beneficiou o estudante estagiário, mesmo a distâncias consideráveis, não obstante o assunto ter sido
exposto nas devidas instâncias da UMa.
203
supervisão académica e a local, que aqui designamos por orientação e à frente analisada.
Começando pela sua definição, analisadas as falas dos vários informantes sobre a
supervisão, ressaltam com maior relevo as seguintes componentes: apoio,
acompanhamento e orientação. Quanto à definição o processo de aprendizagem na
supervisão é definido como: i) espaço de reflexão; ii) chão essencial para abertura dos
vários caminhos possíveis no exercício da autonomia profissional; iii) ponte e articulação
entre o ensino e a prática; iv) atribuição socioprofissional e uma mediação; v) espaço que
permite levar mais longe o conhecimento teórico, graças à prática, à sistematização e ao
debate proporcionado, ou seja, pela visão alargada e abrangente do processo (e que a
própria palavra supervisão significa, quando decomposta em super e visão).
Estas quatro falas abaixo transcritas, são ilustrativas de definição de supervisão, uma de
um estudante, outra de um orientador cooperante e a dos dois docentes supervisores,
começando pela do estudante:
“Quando eu pensei em supervisão, pensei (...) na palavra, mas separando super e visão.
É sempre uma visão muito alargada e abrangente que é coisa que nos falta
normalmente. Muitas vezes das duas uma, ou não vemos caminho nenhum, ou só
vemos um caminho e é, foi esse o olhar do supervisor, que nos permitiu ver vários
caminhos, independentemente das opções. No fim de contas eram sempre nossas, pelo
menos no estágio, na minha supervisão sempre senti isso, mas acima de tudo permitia-
nos ver coisas que no momento nós estamos tão empenhados naquela situação, e tão
envolvidos no meio, que se calhar não conseguiríamos perceber, sem falar que era um
primeiro contacto ou uma primeira experiência e acho que acima de tudo, menos ou
mais direcionada, foi aquilo que nos permitiu aprender a escolher e depois saber lidar
com as consequências que advêm disso” (FE8).
Os orientadores dizem:
“... a supervisão é esta mediação feita ou facilitada por alguém especialista, neste caso o
supervisor” (FO30).
“As sessões estão estruturadas de forma a haver uma correspondência entre aquilo que
é o trabalho que o aluno no momento está a desenvolver e a supervisão coadjuvada
204
nesse mesmo trabalho. (...) Momentos de reflexão e de aprendizagem, e sobretudo
como momentos de aprendizagem em que o próprio aluno estando no processo pode
criar ali também um momento de distanciamento e que se consiga abstrair do que está
a fazer e olhar para o seu próprio trabalho” (ED31).
“As pessoas para terem autonomia têm que também ter as condições para gerir esse
processo de autonomia, e muitos desses estagiários, no caso concreto não tinham. (...)
A questão é esta, para haver algum grau de autonomia é preciso criar. [Para] o
indivíduo estar na posse de uma série de condições para gerir esse próprio processo de
autonomia, para ele próprio se autogerir, autonomamente, e muitos alunos chegam a
esta fase e não estão capacitados para gerir estes processos, portanto, a supervisão
anda aqui numa situação entre supervisão e condução. É evidente que, a partir do
momento que ela joga com um processo de condução, está a criar condições para o
próprio processo de autonomização do estagiário, quer dizer, não é, ou seja, se eu no
decurso, no caminho que vou fazendo com o estagiário lhe crio uma série de
condições para ele se autonomizar, isto não deixa de ter alguma margem condutiva,
mas também estou-lhe a criar, em simultâneo, uma série de condições para ele se
autonomizar. (...) É uma situação relacional” (ED32).
Com base no material empírico recolhido junto dos estudantes, sintetizamos (na figura n.º
12) as principais caraterísticas e dimensões na perspetiva do modelo desenvolvido na
formação do curso sobre a supervisão realizada, fazendo a conexão entre as mesmas.
Figura n.º 12
Supervisão na Perspetiva dos Estudantes
Podemos traduzir, e em resumo, que a supervisão no curso aparece definida como espaço
205
pedagógico de reflexão, consubstanciado na indivisibilidade entre estágio e supervisão que
permite levar mais longe a articulação teoria e prática, através de uma visão alargada,
abrangente e criativa. É também um processo marcado pela relação entre docente
supervisor e estagiário e que potencia a autonomia.
A perspetiva do seu modelo é descrito pelos estudantes como o que: i) aponta caminhos
co-construídos e participados; ii) centrado no estudante como sujeito ativo; iii) sustentado
pelo debate, reflexão, liberdade na escolha, para treino de autonomia; iv) modelo de
construção da aprendizagem, gradual e contínuo, que conjuga prática e teoria, teoria e
prática, em direção à autonomia. Abaixo se transcreve alguns extratos:
“… Fomos construindo na prática aquilo que tínhamos já aprendido na teoria, daí que
eu acho que é sobretudo um método de construção, de aprendizagem, ou seja, é um
método sistemático que nos conduz (...) para uma maior autonomia (…)” (FE10).
“Eu acho que foi um processo bastante…gradual…as etapas estavam bem demarcadas
(...) no fim é que se consegue perceber p’ra trás como é que foi o processo e acabei
por perceber que foi gradual e foi contínuo. (...) Não saltei fases…porque acima de
tudo com maior ou menor sistematização…foi bastante consistente” (FE8).
“… No fundo é o aluno que vai construindo e trilhando o seu caminho (...) nós vamos
construindo o nosso processo e portanto, (...) fomos aprendendo ou reaprendendo
determinados conceitos que nos foram cimentando. Pedagogia exatamente” (FE18).
“… Nós sempre tivemos a liberdade de escolher mais ou menos para onde iam as
atividades (…)” (FE19).
“…Chegávamos lá e “vamos ver como a coisa sai” e era mais ou menos dentro deste
género. Não sentimos que fosse preparada… (…) não sentíamos que era seguido [o
programa], ou que era dada importância. Era muito dado importância a sentimentos.
(...) Se não havia assim uma grande organização, é difícil distinguirmos o processo. O
que eu senti até, não consegui observar qual era realmente o meio de aprendizagem e o
modelo (…)” (FE20).
206
“É de responsabilização do aluno, é de acompanhamento, é de treino, com vista ao seu
amadurecimento, à sua autonomização e de enriquecimento. (...) Obriga-o, em termos
de aprendizagem a uma reflexão e coloca nas próprias supervisões aquilo que são, ou
melhor, aquilo que é o seu caminho e o seu processo de aprendizagem e de confronto
com a própria exigência, não só da supervisão, mas do estágio e do próprio curso, que
tem exatamente a ver com aquilo que é exigência que a própria profissão nos coloca”
(ED31).
“Do ponto de vista da conceção, eu acho que havia ali algumas preocupações
interessantíssimas (...) que era ter trazido o pessoal dos contextos” (ED32).
“Eu também percebo do lado do supervisor, tem que haver este rigor pedagógico,
metodológico, a exigência do como fazer bem feito porque se calhar os alunos ainda
não atingiram o nível do entendimento como deve ser feito mas há essa visão do
supervisor como o mau da fita (FO26).
Se nos reportarmos aos modelos sugeridos por Viveiros & Medeiros (2005) é um modelo
reflexivo que prevalece no processo pedagógico de supervisão, uma vez que no mesmo o
processo de desenvolvimento de competências profissionais se baseia no diálogo entre a
teoria e a prática (esta como campo de produção de saber estruturador da ação) e em
207
aliança ou parceria entre o estudante e o docente supervisor185.
Os atos são toda a matéria de que se ocupa a supervisão e que fundamenta a perspetiva
desenvolvida. Todos se consubstanciam nos verbos: refletir, pensar, debater, apresentar,
discutir, recomendar, orientar, apoiar, construir, supervisionar.
“No próprio projeto se calhar, atividades que nós tínhamos que…não estavam bem
fundamentadas ou que os objetivos se calhar não… p’aquela população não seria bem
assim e era um momento que nós tínhamos de…de ver esses aspetos, esses pontos e
reflectir e depois então melhorar e…e numa outra supervisão revermos novamente
(...)” (FE7).
185
Viveiros & Medeiros (2005) analisam modelos de supervisão na relação entre o desenvolvimento
cognitivo e modelos de supervisão (dualista, relativista e reflexivo).
208
(FE19).
“… Aquilo que se está a passar no estágio, seja a primeira fase do pré-diagnóstico, de
um diagnóstico social, de um projeto…uma fase posterior de avaliação mas depois não
é assim tão linear e tão rígido e tão estático porque depois vem as dúvidas do
supervisando, vem os dilemas que surgem na instituição, vem esses desafios todos e
isso acaba por enriquecer todo o conteúdo do…da supervisão e do estágio” (FE8).
“… A partilha do saber e a troca de experiências entre a supervisora e a aluna, porque
muitas vezes a supervisora tem mais experiência a nível profissional e pode transmitir
essa mesma experiência, daí essa troca e essa partilha. Depois fiz o acompanhamento,
o apoio que é necessário e acho que faz parte também da supervisão, o intercâmbio e
depois há a troca de saberes entre a supervisora, a aluna e a própria orientadora de
estágio que é vantajoso também. E mais…e o aprofundamento do saber que é a
questão de que nós ficamos a conhecer os vários campos de atuação dos colegas, não
só o nosso mas temos a oportunidade de conhecer também os dos nossos colegas, que
é fundamental, é imprescindível, considero imprescindível” (FE13).
“Na minha opinião o momento de supervisão privilegiou realmente uma maior
incidência sobre os conteúdos que eram pertinentes na prática (…)” (FE22).
Analisando desagregadamente cada uma das três turmas sobre os atos da supervisão, para
dar enfoque à evolução ocorrida na formação do curso, nos três anos em análise, emerge a
matriz pretendida no processo de formação do curso traduzida pelo espaço atribuído às
várias etapas desde a imersão e integração no território, realidade social da prática à
avaliação, à ética, à participação da população para a sua autonomia e à articulação
intersetorial com parcerias, através de dinâmica desenvolvida pelo próprio estagiário e com
o apoio dos orientadores cooperantes, em vez de basear-se no saber e conhecimento do
supervisor. A estratégia da reflexão é a matriz nesse processo pedagógico.
Pelo exposto sobre os atos em reflexão na supervisão, na primeira turma são todos os
trabalhos de estágio: i) enquadramento e contextualização da instituição, da população e a
sua integração; ii) diagnóstico; iii) projeto de intervenção; iv) reflexão sobre políticas
setoriais, construção de opinião crítica e contributos para o seu desenvolvimento; v)
relatório de progresso sobre o processo de intervenção; vi) relatório final. Podemos eleger
como foco central da supervisão a primeira fala dos estudantes: as dúvidas e a reflexão
sobre “como dar a volta à situação” (FE2), ou seja a reflexão da teoria a partir da prática,
exercício de resistir à representação simbólica na reprodução de práticas.
A segunda turma enuncia os seguintes atos: i) conteúdos substantivos das fases do estágio -
enquadramento da instituição, caraterização da população, metodologia aplicada, teoria
que orienta a ação, sua operacionalidade, estratégias e técnicas, ou “as técnicas a trabalhar
209
essas estratégias”, teorias e metodologia que sustentam e que vão de encontro à
problemática, considerando a coerência entre as ações; ii) necessidades e prioridades da
população, ações e atividades que podem satisfazer as necessidades levantadas, teoria,
método e técnicas, ou instrumentos técnicos que sustentam um modelo de trabalho e
aprofundamento da prática, desde a sua execução aos resultados, ou seja todo o processo
de intervenção; iv) princípios éticos no projeto em Serviço Social, como questão
fundamental; v) participação dos cidadãos, desde a conceção do projeto aos benefícios
efetivamente atingidos, como conduzir essa participação para a autonomia e a questão da
relação com os cidadãos; vii) “o pensar global e o agir local”, interiorizando, e
construindo, apesar da dificuldade de pensar o local, regional, nacional e global. A
dimensão ético-política tem aqui uma predominância sobre as restantes dimensões do
projeto da profissão, a dimensão teórico-metodológica e técnico-prtática.
Não obstante a sua extensão, o seguinte excerto ilustra aquilo que a supervisão pretende
alicerçar, ou seja, possibilitando compreender a coerência entre os objetivos e os atos,
assim como a própria dinâmica das etapas do estágio, o desenvolvimento da estratégia de
empowerment da população, a prática a dialogar com a teoria bem como a interação entre
os estudantes e entre estes e o supervisor:
“Bem, realmente os objetivos do Estágio I e do Estágio II, eram diferentes. (...) Houve
210
um momento de observação [pré-estágio] mas, chegado ao Estágio I o aluno sente
outra responsabilidade (...) surgem outras dúvidas, começando também por surgir
questões relacionadas com o tipo de relação a estabelecer com a população e outras
como por exemplo, a forma como era abordado, no meu caso, como eram abordadas
as famílias a nível das entrevistas. A forma como nós devíamos de destacar os
problemas, necessidades, potencialidades da própria população, e de que forma é que
podíamos pôr as próprias potencialidades para realmente combater ali aqueles
problemas e necessidades. No início não fazia sentido, mas depois no decorrer da
nossa ação foi importante refletirmos a cada semana todas as situações novas que
surgiam. Depois, realmente foi-nos sempre incutido esta forma de colocar as
potencialidades a favor da população e daí foi surgindo as ideias para as nossas
atividades que depois constituíram o plano de ação. (...). Depois, a nível da
avaliação… A avaliação nem sempre foi clara, esta é uma verdade, mas depois
chegado ao próprio momento, já fazia sentido, porque se a nossa metodologia tinha
seguido um fio condutor, a nossa avaliação seguia o mesmo, o mesmo fio que era
realmente envolver outra vez a população nesta avaliação: será que resultou? Que
impactos é que teve? O que poderíamos ter melhorado? (...) Por exemplo, voltando
agora ao plano, até porque isto tem tudo um seguimento, havia atividades que depois
foram enriquecidas mas na execução, por exemplo, a nível de parcerias foi colocado
junto do supervisor alterar ou até estabelecer outras [novas] parcerias que vieram a
enriquecer o próprio projeto. (...) Há situações que vão surgindo a partir do nosso
conhecimento. Quanto mais profundo é, novas situações surgem. E acho que isto foi
importante também [sobre] o conhecimento da população (...). (FE22).
Pela parte dos docentes, os atos da supervisão colocam-se no seguimento das etapas do
estágio e da estrutura metodológica, assim indicadas: i) fase preparatória do diagnóstico e
metodologias participativas de diagnóstico; ii) metodologia de projeto e aquilo que são as
etapas; iii) condução das entrevistas desde a fase de acolhimento ao sujeito/ cidadão e a
importância de o ouvir naquilo que são as suas manifestações, o saber ler os sinais que os
utentes apresentam e a importância a atribuir à comunicação, desde o primeiro
atendimento, o saber receber, o que é isso de empatia, como se manifesta e como nela se
constrói a relação de ajuda; iii) os laços de cooperação a ativar naquilo que é a conquista e
211
apoios a favor do sujeito. Os docentes dividem-se sobre os atos ou conteúdos do objeto da
supervisão, colocando-o entre a realidade social e a aproximação à ação, entre o espaço
académico e a instituição, a relação entre estudante e docente supervisor e os instrumentos
de avaliação, assim colocado:
“… O espaço da supervisão acaba por rebater naquilo que é esta estreita articulação
entre a teoria e a prática e aquilo que o aluno não só leva a orientações, mas também
nos traz a reflexão e nos traz dados e nos traz informação sobre aquilo que está a
desenvolver e aquilo que são as dúvidas e fragilidades que sente no enfrentamento da
realidade social, naquilo que são as exigências que a instituição traz reflete também
uma outra coisa, que é porventura, a necessidade de uma maior aproximação e maior
interação, entre aquilo que é o espaço académico e o espaço das instituições, portanto,
de maior, isto é de limar as arestas, de criar pontes entre estas duas realidades, entre o
meio académico e a própria prática profissional” (ED31).
“Eu acho que o conteúdo da supervisão, para mim, tem a ver essencialmente com
relação. (...). Porquê? Porque se não houver essa questão (...), dificilmente se consegue
obter qualquer tipo de supervisão, isto é, como é que eu posso supervisionar, ou
encetar um processo de supervisão com alguém, ou com algo, na qual o meu processo
de relação é completamente meu? É quase uma espécie de relação militante” (ED32).
Davys e Beddoe (2000; 2009) enfatizam sobre o lugar ocupado na supervisão do estudante
estagiário quanto à fase de planeamento e exploração dedicados à concetualização situando
o estágio no mais amplo contexto social, político e cultural, associando ainda os
constrangimentos, as questões de poder e opressão na realidade social presente. A fala
abaixo indicada revela alguma dessa intencionalidade:
“Há outra questão que eu também acho que é importante, que é uma questão de ver o
referencial comum (...) no sentido de ser do ponto de vista do Serviço Social e não
outra coisa qualquer (...)” (ED32).
212
assistencialistas; vii) avaliar o trabalho como preparação para a autonomia profissional;
viii) assumir o papel de diplomata principalmente no tratamento com a instituição; ix)
fazer com que o estudante adquira as competências de maneira a construir o seu próprio
saber; x) assegurar a interligação entre supervisor, estudante e orientador, derrubando
barreiras, ou seja, dando espaço à triangulação entre as três partes, para troca de saberes e
feedback entre supervisor, aluno e orientador; xi) conduzir a reflexão de forma a construir
um modelo de ensino-aprendizagem em que o estudante seja parte do processo da sua
formação para ir para além daquilo que vê, ou seja, para além das coisas (FE13).
Por parte do docente supervisor o seu papel consiste em: i) responsabilidade por orientar,
estruturar as sessões e planear o seu conjunto, os conteúdos que vão ser trabalhados em
cada uma delas e envolver o próprio aluno no processo; ii) enquadrar e valorizar
referenciais, ou as premissas em que o estágio vai ser desenvolvido; iii) pensar
cognitivamente, a dois, com papel na criação de “algum grau de sentido no próprio
estagiário” (D32).
Para os orientadores cooperantes, o papel do docente está em: i) marcar o ritmo com
exigência; ii) avaliar; iii) mediar como especialista, em termos académicos no suporte do
referencial teórico, ligado ao conhecimento; iv) “punir” na posição de superioridade como
docente (de acordo com a representação trazida do seu próprio curso de formação).
Do exposto pela tríade das três turmas de estudantes, docentes supervisores e orientadores
cooperantes, há uma forte convergência quanto ao papel do supervisor docente.
213
A segunda turma identifica como papéis do estudante: i) “filtrar” e articular teoria e prática
com valor acrescentado a partir da observação e reflexão, para a mudança, superação da
inibição com espírito crítico; ii) mediar entre as exigências institucionais e as académicas
com reflexão, autonomia, poder de decisão, pautada na aprendizagem com
responsabilidade “e não numa autonomia irrefletida” (FE19); iii) desempenhar um papel de
equilíbrio entre as três partes, no pressuposto de que essa aliança, ou triangulação entre
supervisor, estudante e orientador, se sustenta na centralidade do estudante (FE8); iv)
receber e dar, como “elo de ligação” entre supervisor e orientador (FE15).
É no exercício da autonomia que das três turmas a segunda mais se revê, graças à reflexão
no espaço da supervisão. O excerto abaixo de um estudante da segunda turma ilustra a
perspetiva pedagógica da autonomia imprimida ao processo de supervisão:
214
(FO26) e o equilíbrio pelos seus princípios e valores e “a sua própria maneira de estar e
que deve ser respeitado”(FO30).
215
modelo confere maior veracidade à anterior análise aonde se enquadra uma das grandes
questões desta tese sobre o modelo de supervisão, desafios, riscos, oportunidades e
impactos. Adaptadas ao guião das técnicas, essas questões, colocadas aos estudantes e
docentes supervisores participantes, foram traduzidas por competências desenvolvidas, por
potencialidades e por pontos críticos, ou constrangimentos vivenciados186.
A segunda turma não se desvia, mas reforça, precisa e acrescenta, assim: i) reflexão e
análise crítica que proporcionam o confronto com a realidade, a capacidade organizativa,
reflexiva, autonomia na articulação e consolidação entre conhecimento académico e
prático; ii) associação de análise reflexiva e crítica, investigação-ação e relação teoria-
prática, autonomizando “na prática essa articulação” (FE19); iii) resiliência e maturidade
(FE8); iv) autoavaliação (FE9); v) desenvolvimento de uma linha orientadora” na
elaboração de projetos com base nas necessidades da população, na modalidade de
primeiro a conhecer para então intervir e avaliar, orientando o projeto pela teoria e
conhecimento metodológico, ambas as dimensões “orientam na prática profissional”
(FE12). Esta turma, sem deixar de colocar a tónica na reflexão, atitude crítica e autonomia,
persiste nas competências da relação teoria e prática, ou seja, fazer conhecer no contexto
186
Podemos classificar (conforme Krueger & Casey, 2000) questões de tendência ou avaliativas para
determinar a posição final e respetivas áreas críticas dos informantes a respeito da supervisão.
216
local.
Reveladas pelos docentes, as competências dos alunos ganhas pelo processo de supervisão
foram: i) reflexão com autoanálise e autocrítica e, ii) operacionalização de metodologias.
217
institucional particular, traduzindo-se em saber teórico-prático (conforme Faleiros, 1985).
Pode, ainda, ser evocada a competência para desenvolver um modelo de Serviço Social
integrado e participado, sustentado pela pesquisa, reflexão e crítica, cuja prática se concebe
como um ato criativo e de escolha planeada, entre possibilidades distintas face à
singularidade dos sujeitos da acão que têm direitos e opressões (Adams, Dominelli e
Payne, 2009).
Pela extensão, natureza e pertinência dos constrangimentos apresentados por esta turma
incluem-se seguidamente alguns excertos:
218
tanto de um lado quanto do outro” (FE19).
“Muitas vezes eu sentia é que havia uma falta de crítica construtiva em relação ao
trabalho que eu ia desenvolvendo, até mesmo nos seminários de estágio (...). Outra
coisa que eu acho que foi um constrangimento, (...) eu muitas vezes não cheguei a
perceber os critérios que eram usados na avaliação” (FE8).
“A partir da avaliação que eu faço, consigo perceber que o aluno neste percurso que
faz de elaboração do diagnóstico, da proposta de ação, execução e avaliação, treina
aquilo que são as competências, do assistente social, desenvolve a sua autonomia e a
sua capacitação profissional, portanto só posso estar de acordo naquilo que é o modelo
e o que são as orientações pelas quais estruturamos o estágio. No funcionamento dos
três anos aquilo que se verifica é uma maior consolidação” (ED31).
219
longo dos três anos a lógica da responsabilização e a crescente autonomização, na
afirmação das competências e capacidades desenvolvidas pelos estudantes.
Em Competências
Atitude reflexiva e crítica, pensamento aberto a ciência nova/teoria
emancipatória
Modo de ser sem preconceitos e inseguranças na razão comunicacional
Autonomia com liberdade de escolha para emancipação
Projetos baseados em ações com sentido na práxis
Input Investigação-ação para fazer conhecer
Criatividade com subjetividade problematizando para deslocar e
transformar
Supervisão
Em Potencialidades
Como competências, a figura faz dialogar as várias categorias destacadas: i) a relação entre
a atitude reflexiva e crítica com o pensamento aberto à construção de ciência nova/teoria
emancipatória; ii) o modo de ser sem preconceitos e inseguranças com a razão
comunicacional; iii) a autonomia com liberdade de escolha para emancipação; iv) projetos
baseados em ações na intervenção com sentido na práxis; v) investigação-ação para fazer
conhecer; vi) criatividade com subjetividade, problematizando para deslocar, transformar e
dar lugar à mudança social.
220
experimentação e movimento de invenção; iv) conhecimento e emancipação articulados;
vi) supervisão individual e coletiva em articulação.
187
Para que esta diretriz possa ter maior consequência na aplicação dos parâmetros do plano de estudos e de
todo o processo de ensino-aprendizagem, é fundamental estar associada à integração da área científica de
Serviço Social no Conselho Científico. Ocorrências não consentâneas e geradoras de constrangimentos, face
ao cumprimento do plano e do processo pedagógico do curso devem contar com o acesso a esse órgão, para
reconhecimento de autoridade científica e pedagógica dentro do curso.
221
4.4.2- Orientador e Orientação: Prática Profissional ao Serviço da Formação
A orientação do estagiário pelo orientador cooperante (designação que relembramos, foi
atribuída nesta tese ao profissional da instituição que oferece o estágio), coloca-se a par do
estágio e da supervisão como dimensão complementar no processo de ensino-
aprendizagem em análise, corresponde, conforme alguns autores, à supervisão local.
Segundo o Regulamento de Estágio (artigo 5.º, parágrafo n.º 5), o orientador da instituição
de estágio deverá dispor de um mínimo de 2 horas para apoio semanal ao estagiário (UMa,
2007b). Compete-lhe as seguintes atribuições:
Não tendo constituído foco relevante nesta pesquisa, a orientação foi reportada ao guião
através de algumas questões, assim indicadas: i) definição de orientação; ii) papel do
orientador; iii) complementaridade entre supervisão e orientação iv) exigências na
formação para a função de orientador; v) impacto da orientação no exercício profissional
do orientador, pela metodologia e relação teoria-prática. A primeira questão foi colocada
aos docentes supervisores, a segunda foi colocada transversalmente a todos os informantes
(incluindo os estudantes), a terceira aos orientadores e docentes supervisores, a quarta e a
quinta foram dirigidas apenas aos orientadores188.
188
A distribuição desigual das questões relativas ao tópico sobre a orientação revela que se constitiu um
tópico com menor relevância nesta pesquisa.
222
estagiário e orientador; ii) propiciador da sua vivência e experiência no processo de
trabalho do assistente social, no agir e saber da prática, no acompanhamento e apoio ao
processo, pondo à prova os seus conhecimentos na prática; iii) facilitador da integração na
instituição; iv) facilitador no acesso à legislação que rege as políticas do setor; v)
mobilizador da reflexão sobre a relação com a população e apoio na caraterização da
mesma; vi) mediador na articulação com o diretor da instituição; vii) avaliador da prática.
Para os próprios orientadores, o seu papel é: i) ensinar sobre a profissão; ii) facilitador e
confidente; iii) colaborador ao lado do estudante; iv) balizador daquilo que é o terreno da
prática, o que se faz na prática, as dificuldades da prática; v) avaliador como “escudo
protetor” do estudante, sublinhando que “o estudante socorre-se do orientador para ter mais
tranquilidade e maior estabilidade emocional. O orientador de “certa forma é o coadjuvante
[do estagiário], um colaborador mas também deverá primar pelo rigor” (FO30), ou dito de
outro modo “é o amortecedor no embate entre o mundo académico e o mundo da prática”
(FO29).
Fazendo uma forte convergência ao papel atribuído pelo estudante, o orientador cooperante
acrescenta ter responsabilidade na orientação sobre a relação entre estudante-sujeito,
conforme o próprio olhar de cada profissional e especificidade do seu setor, ou área de
intervenção, porque essa relação é determinada pela própria problemática, ou ainda como
refere:
“A relação [entre] estagiário e utente, nós também trabalhamos (...). Não deixar que
tratem o utente por tu, respeitar a individualidade (...) portanto, coisas práticas mas
que acho que fazem parte da própria identidade do profissional e da própria distância
profissional - não distância do importante e do coitadinho, mas a tal distância
profissional que deve ser mantida entre um e outro” (FO26).
223
importante que haja alguma formalidade e aproveitar os momentos informais para
estabelecer alguns limites, lá está” (FO30).
Aqui podemos evocar Davys & Beddoe (2009) que identificam dois modelos de supervisão
local, uma centrada no estudante em articulação estreita com o docente supervisor e o
orientador cooperante, o outro centrado apenas neste, ou seja, baseado no saber e
conhecimento do orientador cooperante. Outro autor a evocar é Correia (2010) que propõe
diálogo, aliança e rede entre o mundo do trabalho e o da formação, uma perspetiva sempre
a aprofundar.
Através das falas, quanto à exigência na formação para a função de orientador, foi
sublinhado haver necessidade de formação e à falta dela, fazer recurso à memória guardada
sobre o seu supervisor, aquando da formação do próprio, assim ilustrada: “a forma como
agiram comigo, mesmo em termos de conteúdos teóricos ou exigências de prática, é isso
que eu tento aplicar com os alunos” (FO26). Fica, assim, claramente reconhecido que a
formação constitui um requisito para encaminhar o processo pedagógico na formação do
orientador cooperante.
O arquivo/dossier de estágio subsidia com alguns dados, uma vez que ao longo do
processo pedagógico era prática proceder à auscultação dos orientadores cooperantes, no
final de cada ano letivo, incluindo a articulação entre a academia e a instituição, e as
necessidades, designadamente de formação dos referidos orientadores de estágio. A
formação acrescida, ou específica para a função de orientador cooperante raramente foi
224
assinalada, dando lugar ao tempo de horário acrescido exigido na orientação dos
estagiários, que ia para além do formalmente previsto. Donde, a pertinência da centralidade
da técnica focus group desenvolvida nesta tese, proporcionando ampla e profunda
interatividade na discussão de grupo, com multiplicidade de opiniões.
225
complexidade da questão social e pelos desafios a uma profissão que se pretende mais
competente e juridicamente mais afirmada.
Resumindo, a análise sobre a orientação revelou que o seu conteúdo ganha fundamental
importância na formação, articulação estreita entre formação académica e prática, entre a
universidade e as instituições da comunidade local, parceria e aliança entre docente
supervisor-estudante-orientador-cooperante. Uma experiência, intensa e absorvente, exige
tempo de dedicação, requer qualificação adequada para as exigências da formação aos
desafios contemporâneos. Torna-se necessário trabalhar a abertura, a recetividade e a
disponibilidade dos assistentes sociais da prática para integrar a orientação de estágio como
mais uma função, ou atribuição profissional a par das demais.
226
4.5- Supervisão, Autonomia e Emancipação: Resultados
A relação entre o saber/poder no estágio e na supervisão, para a construção da autonomia e
emancipação do estudante tem sido compreendida e analisada, direta ou indiretamente, ao
longo dos vários eixos, linhas e dimensões, orientada pelo foco central desta tese, através
do processo de ensino-aprendizagem na formação do curso em estudo. Defendemos que o
estudante formado nesse processo desenvolverá a compreensão e reflexividade para
replicar essa estratégia junto dos cidadãos, sujeitos da ação e melhor afirmar e defender a
área do Serviço Social na jurisdição da profissão.
Compreender a relação entre supervisão e autonomia profissional foi uma das últimas
questões colocadas aos estudantes participantes nesta tese, dados que começaremos por
analisar seguindo a sua evolução pelas três turmas formadas. A primeira turma defendeu
que: i) a atitude de pensar, de refletir e de analisar criticamente, proporcionada pela
supervisão, conduz à autonomia profissional; ii) a supervisão permite “ganhar asas para
voar” (FE1); iii) a supervisão e a autonomia não se contradizem porque a capacidade de
reflexão e a liberdade de opção e de decisão estão no centro do processo pedagógico.
227
excessivamente insuficiente para a consolidação da autonomia na profissão devendo ter
expressão ao longo da profissão.
Estas categorias e linhas de pensamento podem ser ilustradas pelos seguintes excertos:
“Eu acho que a supervisão é sempre, tem sempre este ideal, trabalha para isso, mas
para se atingir este ideal de autonomia acho que, que vai uma grande distância, foi
trabalhada ao longo da supervisão e sem a supervisão também não se conseguiria
atingir…mais maturidade em termos profissionais, mas a questão da autonomia…acho
que, como já foi dito, tem que ser…tem que ser num prazo mais longo (...), nem
mesmo nos primeiros anos de exercício profissional” (FE8).
“Eu acho que… a supervisão que nós tivemos foi no âmbito da nossa formação
profissional a nível académico, e nós tivemos praticamente um ano de supervisão, se
não estou em erro, um ano e meio que…portanto, tendo em conta a dimensão do curso
no geral, eu sinceramente acho o tempo de supervisão bem positivo, eu acho [que] nós
até podemos nos dar ao luxo de dizer que fomos privilegiados por termos tido um
grande tempo de supervisão, o que eu acho é que…essa supervisão, (...) sem dúvida
contribui para o nosso processo de autonomia, (...) [mas] a partir do momento que nós
saímos do âmbito da formação académica a supervisão deve ser continuada nos nossos
locais de trabalho, de exercício profissional que eu, e aí sim, há o restante processo de,
de crescimento para essa autonomia. Acho que a supervisão está muito vinculado ao
meio académico e…acho que três anos, claro, que em um ano a supervisão, apesar de
achar que já é bom, nunca será suficiente, por isso é que deve sempre haver.
Infelizmente em muitos espaços institucionais não há, mas acho que deveria existir
depois essa continuidade no âmbito mesmo do exercício profissional” (FE11).
“Eu acho que… sim, que prepara para a dimensão profissional, se bem que eu acho
que a supervisão está muito direcionada ao âmbito do estágio, eu não sei até que
ponto, não seria viável uma supervisão mais abrangente, porque…,pelo menos fico
com essa ideia, que a nossa supervisão é direcionada para o estágio aqui” (FE18).
“Acho que nesse sentido o curso está, e mesmo o programa, os itens, os objetivos,
acho que está tudo, está tudo junto, acho que encadeia tudo mesmo para nós sermos
autónomos (...) com o apoio do supervisor. É uma autonomia «saudável»” (FE24).
Podemos, então, enunciar, a partir daquilo que são as grandes categorias encontradas sobre
a relação entre a supervisão e a autonomia (figura n.º 14), uma linha de pensamento
central, ou seja, a supervisão tem potencial de construção de autonomia na formação para a
profissão, cujo conteúdo é compatível com liberdade de decisão, base/ideal na profissão,
tem condições de proporcionar evolução e progresso, exigência e maturidade ao estudante
e ao profissional, alimenta o caminho da emancipação. Construída pela supervisão, a força
da autonomia reforça a emancipação, ou como se refere Habermas a Castoriadis, a auto-
228
organização suporta a questão democrática na base do pensamento emancipatório
(Castoriadis, 1975, cf. Habermas, 1990).
Figura n.º 14
Supervisão e nºAutonomia
Figura 14
Lugar da Supervisão: Construção de Autonomia na
Formação e na Profissão
Liberdade de decisão
Base/Ideal na profissão
Reflexão
Exigência e maturidade
Estudante
Evolução e progresso
Caminho da emancipação
229
No espaço de agência o estudante granjeou o fluxo contínuo da experiência humana pela
recuperação da importância do eu nos laços de proximidade, a narrativa biográfica do
sujeito, a experiência olhada através do tempo e reflexiva no sentido de gerar
empowerment das pessoas, convidando à ponderação e ao reexame. Aqui o paradigma da
emancipação conjugou-se com o Serviço Social crítico (proposto por Fook, 2002). Para a
autora o assistente social ao intervir em diferentes e severos contextos, baseado no
conhecimento da pessoa em situação, que tem capacidade ilimitada, comunica valores e
objetivos de justiça social. Ganha poder com capacidade de transformação e de
emancipação através do seu campo de intervenção social.
Nas três turmas a formação experiencial conjugou cognição com subjetividade para uma
práxis direcionada para a renovação, para um fazer emergir criativo. Construir o
conhecimento pela investigação e investigação-ação, permitiu combater a representação e a
padronização das práticas, proporcionar a emergência de práticas inventivas com
plasticidade e procura de sentido, na invenção de si e do mundo (Kastrup, 1999, cf Dias,
2009: 170). A cognição como ação inventiva de conhecer apoia-se num processo de
transformação permanente pela ação de renovar, reinventar e recomeçar (Kastrup, 2005 cf
Dias: 2009: 171).
230
que o estudante interveio, com articulação entre unidade e multiplicidade, no saber
concebido cooperativamente. Nas lições de Jacotot é o saber que se faz instrumento de
igualdade, pela relação de emancipação que parte da igualdade e daquilo que se sabe e não
daquilo que se desconhece, ou da desigualdade (Rancière, cf Vermeren et al., 2003).
231
perspetivas e a possibilidade de introduzir mudanças na articulação entre conhecimento,
metodologia e processo criativo.
232
PALAVRAS E PERSPETIVAS PARA UMA CONCLUSÃO
Para início da conclusão cabe identificar algumas considerações prévias. Num estudo de
caso sobre o curso do 1.º ciclo de Serviço Social na Universidade da Madeira, lançado em
Setembro de 2005, e no qual se situou a nossa própria experiência na docência académica,
com inesperada interrupção por encerramento do curso, não é fácil empreender uma
análise desapaixonada. Ela é tanto maior quanto mais foi exigente nos desafios colocados
dentro de uma universidade sem antecedentes na área da formação em Serviço Social e
sem regulação no país sobre a mesma. A exigência da pesquisa torna-se ainda maior
perante um objeto com escassa produção teórica e enquanto pertença a uma categoria
profissional cujos caminhos na investigação são ainda muito ténues e sem rede para quem
nela se aventura na elaboração de uma tese.
Apesar desta fragilidade, houve um importante diálogo com aquilo que esteve
disponibilizado sobre estágio e supervisão em educação e psicologia, mas particularmente
233
dentro da área do Serviço Social e na língua materna, sendo também trabalhada alguma
produção publicada em língua estrangeira.
O tema eleito para esta tese foi a supervisão na formação do curso de Serviço Social e a
sua relação, no processo pedagógico, com o saber/poder com a finalidade da construção da
autonomia e emancipação do estudante. Estágio e supervisão estão indissociavelmente
aliados no processo de ensino-aprendizagem e por isso ambas as dimensões da formação
tiveram igual destaque na compreensão e análise da formação no curso. Em foco esteve a
experiência feita no 1.º curso de Serviço Social na Universidade da Madeira.
O interesse pelo tema partiu de três ordens de questões justificativas: i) desafio, enquanto
docente nas funções letivas de estágio e supervisão curricular na formação do curso de
Serviço Social, 1.º ciclo, um curso implementado numa universidade sem antecedentes na
área disciplinar; ii) escassa produção no conhecimento sobre o processo de ensino-
aprendizagem na formação e de respetiva articulação entre teoria e prática; iii) fraca
existência de supervisão no exercício da profissão e ausência de um debate apoiado nas
várias dimensões e impactos da sua aplicação, com produção teórica quase inexistente.
Elegeram-se duas grandes questões gerais que orientaram este trabalho de tese, ambas
colocadas nos pressupostos e conteúdo da formação. A primeira prendeu-se com as
condições de emergência do curso, cujo plano de estudo foi alheio ao contributo e à
participação da própria categoria profissional, e a segunda visou saber como são formados,
hoje, os estudantes de Serviço Social para enfrentarem os desafios contemporâneos,
designadamente as alterações ao Estado Social.
Metodologia da pesquisa
234
curso. Perspetivou-se a análise social como hermenêutica do concreto na
complementaridade e interdependência entre a reflexão epistemológica, ética, moral e
política, a fim de trazer à formação de Serviço Social contributos para a construção de uma
nova teoria de subjetividade, de emancipação e de transformação da prática (Ferreira,
2008).
Assumido como estudo de caso, baseou-se num corpus empírico sobre a singularidade da
formação no curso, um estudo em detalhe e em profundidade, como experiência única e
com natureza exploratória. A escala desta abordagem na pesquisa trouxe limitações à sua
projeção, tratando-se de uma individualização impossível de generalizar. Significa que o
curso se constituiu como totalidade particular e por isso o conhecimento em foco é de tipo
particularista, procurando encontrar algo de universal no particular, do qual resultam
conclusões necessariamente parciais (Laperrière, 2010: 420).
A adesão verificada foi significativa, quer no focus group (25 estudantes – 41%, e 5
orientadores cooperantes – 50%) quer na entrevista (2 dos 3 docentes supervisores),
perfazendo um total de 32 sujeitos/atores informantes.
235
O guião das questões mostrou-se pertinente ao abordar os principais tópicos e questões,
designadamente sobre a relação entre gestão do curso, projeto de Serviço Social na
formação, estágio e supervisão. O tópico sobre o desempenho do orientador cooperante
não seguiu os demais tópicos, não tendo beneficiado de uma melhor e mais completa
caraterização dirigida a todos os informantes.
Nos procedimentos de aplicação das técnicas, os espaços onde estes tiveram lugar
proporcionaram um clima de confiança, tendo os participantes revelado colaboração e
abertura.
236
Nos achados da pesquisa destacou-se que os princípios e valores do projeto de Serviço
Social no curso se articularam entre o espaço macro e micro, o bem-estar social, direitos
humanos, igualdade e justiça social. As mediações do assistente social situam-se na
totalidade humana, articulando as relações indivíduo/família, organização/instituição,
grupo e comunidade para a mudança social. Estas categorias significam que, pelo estatuto
profissional, o assistente social se compromete, com poder, com a responsabilidade
profissional na mediação entre a população e as estruturas e, com saber, compromete-se
com a ação, apoiado na relação com o cidadão, relação esta que compreende espaço de
subjetividade, aprendizagem mútua e laços de proximidade. O ator está envolvido numa
trajetória com vista à sua autonomia, autodeterminação e emancipação, com base nas suas
capacidades e potencialidades, através do seu fortalecimento, identidade e empowerment,
integração na comunidade que acolhe a igualdade, não-discriminação e inclusão.
237
social, com mais justiça e mais equidade.
Globalmente, é pertinente evocar, na análise feita e nos resultados atingidos, que o projeto
de formação no curso se reviu na teoria da correlação de forças (conforme Faleiros, 1999),
atribuindo ao assistente social a mediação entre atores e estruturas, mediação essa
estrategicamente colocada entre o contexto institucional e o político, visualizando relações
de saber e poder. Tratando-se de um estudo de caso, os alicerces deste projeto profissional
influenciaram a direção social assumida na presente tese, porque houve uma forte aliança
entre conhecimento e ação e esta relação deu lugar a um movimento de crítica, de
construção de conhecimento e de nova síntese, tal como propõe Baptista (2001) ou como
defende Schwandt (2006) no que se refere à associação entre a ação e o pensamento,
prática e teoria, num processo contínuo de reflexão, crítica e transformação.
238
Os desafios do plano de formação do curso numa universidade sem antecedentes de
Serviço Social colocaram-se num contexto e em condições singulares de surgimento e de
cultura de gestão próprias.
Consumado o encerramento do curso constata-se ainda que não há estratégia (em quaisquer
239
das suas políticas ou programas) para a inserção dos licenciados (designadamente pela
SRAS, parceira neste projeto), contrariamente à razão invocada para a criação da
formação. Assim, poderá resumir-se este acúmulo de impossibilidades: nem os serviços
querem a formação, nem ela é aceite pela academia.
Foi possível evidenciar nos dados e resultados da pesquisa que a gestão do curso se
desenvolveu na perspetiva de uma cultura de cooperação, apoiada nas seguintes
caraterísticas: i) capacitação para o exercício de ação consciente; ii) processo evolutivo
para a construção do saber, aberto a diferentes pontos de vista; iii) interação humana de
mobilização de recursos e potencialidades; iv) conhecimento de si e do outro na construção
de saberes cooperantes; v) emancipação humana dando espaço ao desenvolvimento de
competências, de reflexão, de racionalidade comunicacional e de cognição; vi) auto-
organização dos estudantes.
240
Menezes et al. 2012). Foi também uma prática que convergiu para uma pedagogia da
autonomia centrada em experiências estimuladoras de decisão e de responsabilidade ou,
conforme Freire, para “experiências respeitosas da liberdade” (2007:107).
Plano de estudos
A estrutura curricular do plano de estudos do curso que foi abarcada na recolha e análise
dos dados (quanto à duração do plano, às unidades curriculares, à sua sequência, à relação
e ao peso da matéria de Serviço Social, em carga horária e respetivos créditos) permite
indagar sobre os seus pressupostos e fundamentos.
Entendendo que o plano de estudos, através da estrutura curricular que o suporta, constitui
o pano de fundo do curso no desenvolvimento da formação para o exercício da profissão,
os resultados desta investigação deram conta da efetiva adequação aos desafios
contemporâneos da profissão.
O curso conheceu dois planos de estudo, mas foi no segundo plano, em resultado da
adequação à Declaração de Bolonha, que se expandiu a área de Serviço Social, tendo-se
ultrapassado a sua presença modesta no primeiro plano, o que levou a que a área do
Serviço Social tenha passado de 28% para 57% do peso curricular no curso.
241
plano de estudos, caminhos fundamentais para afirmar a importância da natureza científica
do Serviço Social no que diz respeito ao conhecimento/pesquisa das necessidades sociais,
potencialidades e recursos da população em contexto da ação tal como defenderam os
informantes desta pesquisa. De igual modo, iniciativas diversas de formação complementar
e extracurriculares, formações conduzidas por docentes e especialistas de reconhecido
prestígio (uma das quais teve o aval da Fundação para a Ciência e Tecnologia com
comparticipação financeira), trouxeram ao curso reforço na sua qualidade e credibilidade
académicas.
A análise dos resultados da formação potenciada pelo estágio destacou a relação teoria-
prática e a retroalimentação do conhecimento, no amplo espaço dedicado à fundamentação
da pesquisa/investigação-ação, à aliança estudante-cidadão, à capacidade interventiva,
242
criativa e propositiva desenvolvidas nesse mesmo processo.
A definição de estágio foi sublinhada sob diferentes perspetivas, tais como: i) fonte de
conhecimento obtido a partir de uma realidade local; ii) relação teoria-prática; iii) início de
um longo caminho de crescimento no agir e de reflexão com vista à autonomia na vida
profissional; iv) conhecimento para agir e um agir para conhecer; v) prática a refletir sobre
a teoria; vi) espaço para cimentar os conhecimentos aplicados à realidade concreta, em
conjunto com uma análise crítica reflexiva (na construção individual e coletiva do
conhecimento).
Assim, podemos concluir, e invocando Helena Nunes (2004), que a formação potenciou
nos estudantes competências para o desenvolvimento de um conhecimento-emancipação,
heterogéneo e de abertura, num exercício de diálogo intersubjetivo e de cognição. A
formação superou ainda a racionalidade instrumental, o imediatismo da prática e a
dependência do sujeito na perspetiva normativo-burocrática da intervenção, de
conhecimento homogéneo, de ocultação e de negação do sujeito, centrada na hierarquia e
apoiada na individualização socialmente redutora.
243
Foi evidenciado que a participação central no processo de estágio deu voz à população e
potenciou a sua autonomia e auto-determinação, como sujeito autor, para desenvolver a sua
cidadania e ser parte da mudança social. A natureza da instituição que ofereceu o estágio e
o próprio contexto setorial fizeram a diferença, no sentido de potenciar mais ou menos a
liberdade de expressão à população e a iniciativa às estratégias do estagiário.
244
ainda, as competências no manuseio dos instrumentos e das técnicas operativas, de
proximidade, tais como a observação, o diário de campo e as dinâmicas de grupo
permitiram derrubar os mitos e dilemas à volta da expressão “na prática a teoria é outra”
(conforme Mónica Santos 2006: 21).
O processo de estágio caraterizou-se, ainda, por ser uma espiral introspetiva com ciclos de
planificação, ação, observação sistemática e reflexão que, ao combinar-se a investigação
com a prática, tornou esta mais informada, mais sistemática e mais rigorosa, promotora de
uma maior autonomia por parte do estagiário no estudo da sua própria prática. Pelas etapas
sequentes, situadas entre observação-diagnóstico-planeamento-participação-avaliação,
desencadeou-se um processo dinâmico, responsável e responsabilizante de todos os
intervenientes, propiciando o tríplice movimento dialético de crítica, de construção de
conhecimento e de nova síntese, movimento em espiral na relação ação-conhecimento-
ação (conforme Baptista, 2001), ou na aliança entre conhecimento e ação (Groulx, 1994,
cf. Branco, 2008).
Deste modo, a elaboração do diagnóstico social teve como ponto de partida o levantamento
das necessidades e dos problemas, forças e fraquezas, sonhos e desejos, centrou-se na
questão de por onde passa a satisfação das necessidades sociais para atingir o bem-estar
social, património sensível do locus profissional do assistente social.
No conjunto das problemáticas sobre as quais o estágio incidiu, o destaque foi para o
comportamento de risco de crianças/jovens, incluindo o insucesso escolar, assim como
para o envelhecimento, a par da saúde mental, a habitação e o realojamento,
correspondendo ao que são algumas das expressões locais da questão social.
245
vantagens de desocultar as relações que determinam a estrutura das situações-problema, ou
apoiar-nos na perspetiva de que o saber ético-político constitui uma das competências do
assistente social (como afirma também Berta Granja, 2005).
Significa que pela ação em estágio os estudantes reconheceram como contributos à sua
formação o desenvolvimento das competências para um saber comprometido com o código
de ética, a descodificação das estruturas, a conjuntura em contexto territorial, a perspetiva
relacional e de articulação entre a participação do sujeito, os seus vínculos e as suas redes,
apoiando-se em medidas gerais e particulares para transformar as estratégias de ação local
com vista a assegurar os direitos sociais.
A par da qualidade revelada pelos resultados já indicados, ficou patente, também, que
carece de importante investimento a criação de uma bolsa de instituições locais para campo
de estágio e dispor de profissionais, candidatos a orientadores-cooperantes preparados,
abertos e disponíveis para acompanhar, orientar e dialogar sobre os objetivos da formação
no curso, da profissão e do bem-estar.
A exigência atribuída aos objetivos do estágio reforçou a sugestão por parte dos estudantes
informantes quanto ao alargamento a mais um semestre de estágio a fim de trazer mais
246
tempo na execução do projeto. Isso permite prevenir aquilo que para alguns profissionais
pode dar lugar ao finalismo metodológico, isto é, à racionalidade técnico-burocrática
(Faleiros, 2011), prevenindo assim a intervenção mais focada nos resultados, quantificação
e procedimentalização (Amaro, 2009).
247
A supervisão foi assim empreendida na formação do curso pela perspetiva da
aprendizagem colaborativa. Manifestou-se nas singularidades de um processo pedagógico,
através de saberes integrados, construídos na diversidade dos espaços criados.
248
um processo de construção da autonomia profissional e pessoal.
Constatou-se, dos resultados da análise aos três anos em questão, que a pretendida matriz
da supervisão empreendida no processo de formação do curso, traduzida pelo espaço
dedicado às várias etapas do estágio – desde a imersão e integração no território ou
realidade social da prática até à avaliação – potenciou a ética, a participação da população
e o diálogo intersetorial com parcerias, cuja dinâmica, nesse processo, se centrou no
próprio estagiário e no apoio dos orientadores cooperantes, em vez do saber e do
conhecimento baseado no docente supervisor.
249
O papel dos docentes no processo de supervisão desenvolvido evidenciou-se pelas
seguintes componentes: i) responsabilidade no planeamento, orientação e estruturação das
sessões e dos seus conteúdos; ii) enquadramento e valorização de referenciais ou premissas
a sustentar no âmbito da área de estágio; iii) mediação entre a academia e a instituição; iv)
pensar cognitivo e em coletivo, com papel importante na criação de grau de sentido no
estagiário, indo para além do imediato; v) reflexão e análise de carácter crítico de modo a
evitar práticas assistencialistas.
Finalmente, o papel do orientador cooperante foi visto como o de: i) responsável por
ensinar/aconselhar sobre a profissão; ii) facilitador e confidente; iii) colaborador ao lado do
estudante; iv) balizador daquilo que é o terreno da prática, do que nela se faz, apoiando o
estudante nas dificuldades do estágio; iv) avaliador, ou alguém que no processo de
avaliação é o “escudo protetor” do estudante. É a extensão do supervisor académico na
instituição com premissas idênticas sobre a prática.
250
com o «fazismo», que significa rutura com o pragmatismo; iii) construção de redes; iv)
experimentação e movimento de invenção através da investigação e investigação-ação; iv)
conhecimento e emancipação articulados; vi) supervisão individual e coletiva em
articulação.
Nesta tese procurou-se centrar o estágio e a supervisão na relação com o saber e poder com
a finalidade da construção da autonomia e emancipação do estudante, na perspetiva de que
o estudante formado nesse processo esteja preparado para replicar essa estratégia na
profissão, junto das instituições, serviços e cidadãos/sujeitos da ação.
Os resultados demonstraram que a supervisão, sob certas condições, tem potencial para
construção de autonomia na formação para a profissão, cujo conteúdo é compatível com
liberdade de decisão, base/ideal na profissão, podendo proporcionar evolução e progresso,
251
exigência e maturidade ao estudante e ao profissional e sustentar o seu caminho de
emancipação. A força da autonomia exercida na supervisão reforça a emancipação, ou,
como se refere Habermas a Castoriadis, a auto-organização suporta a questão democrática
na base do pensamento emancipatório (Castoriadis, 1975, cf. Habermas, 1990).
Pedagogicamente, a par da reflexão situada no centro da supervisão, esteve a liberdade, um
dos postulados defendidos por Freire (2007) através da qual a pedagogia, associada à
autonomia, dá espaço a experiências pedagógicas estimuladoras da decisão, da
responsabilidade e do respeito por diferentes pontos de vista, sem idolatrar ou absolutizar a
verdade, conduzindo à emancipação.
252
sobre o meio, processo metodológico, comunicacional, relacional e empírico (conforme
Granja, 2005), o que prenuncia a capacidade para uma prática inventiva e de cognição,
transformadora para a mudança social, aberta à participação do sujeito.
Nas três turmas a formação experiencial conjugou cognição com subjetividade a fim de
uma práxis direcionada para a renovação, para um fazer emergir criativo. Construir o
conhecimento através da investigação e investigação-ação permitiu combater a
representação e a padronização das práticas, proporcionar a emergência de práticas
criativas com plasticidade e procura de sentido, na invenção de si e do mundo (Kastrup,
1999, cf Dias, 2009: 170). A cognição como ação inventiva de conhecer (mais do que
criar) apoia-se num processo de transformação permanente por meio da ação de renovar,
reinventar e recomeçar (Kastrup, 2005 cf Dias: 2009: 171).
253
Pistas para outros e futuros aprofundamentos do objeto analisado
Faz falta ao projeto de formação do Serviço Social no país aprofundar, pela investigação, o
conceito de aprendizagem no plano curricular da formação em Serviço Social.
254
Uma outra perspetiva com potencial instigante de pesquisa decorre da relação do Serviço
Social com o lugar ocupado pelas ciências sociais, dentro da academia, no ensino superior
público e privado e, complementarmente, da inteligência interdisciplinar do conhecimento
na ciência contemporânea. Conhecer essa relação tem consequências no seu campo de
trabalho e no espaço de alargamento da participação do assistente social na pesquisa
científica (defendendo a sua legitimidade como disciplina universitária).
A proposta defendida por Davys & Beddoe (2000) instiga a encaminhar a pesquisa a fim
de aprofundar novos alicerces sobre supervisão local no estágio curricular de Serviço
Social, e sobre eles, compreender e analisar a identidade cultural das comunidades onde se
integram, através do estudante enquanto pesquisador ativo e participante na
experimentação e reflexão sobre novas práticas e novas configurações exigidas para a
assistência social.
255
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270
ANEXO A
271
g) Competências treinadas a) Complementaridade entre g) Competências treinadas na
na supervisão supervisão e orientação supervisão
h) Relação entre supervisão b) Impacto do estágio na h) Potencialidades e pontos
e autonomia profissional metodologia e relação teoria- críticos/constrangimentos da
i) Potencialidades e pontos prática no orientador supervisão
críticos/constrangimentos c) Exigência na formação em i) Alterações introduzidas ao
da supervisão Serviço Social para as funções longo dos anos
5- Contributos/Sugestões de orientador 5- Contributos/Sugestões
- Formação no 1.º ciclo 6-Plano de Formação do 1º a) Formação no 1.º ciclo
ciclo na UMa b) Estágio e orientador
a) Adequação da formação aos c) Supervisão
desafios da sociedade atual
b) Estratégias de inovação
c) Contributos/sugestões
272
ANEXO B
CURSO DE DOUTORAMENTO
273
274