A Abordagem Histórica Do Experimento Da Dispersão Da Luz Branca em Livros Didáticos
A Abordagem Histórica Do Experimento Da Dispersão Da Luz Branca em Livros Didáticos
A Abordagem Histórica Do Experimento Da Dispersão Da Luz Branca em Livros Didáticos
Ciências
Abstract
This paper analyzes the inserts of textbooks of History and Science Philosophy (listed in the
National Program of Textbooks, 2009), during the approach of the white light dispersion
experiment held by Isaac Newton. Attempt to evidence, for the division and analysis
themes in categories and dimensions, that conceptions about the production of scientific
knowledge propagated by these materials adapted to an empiricist – inductive science point of
being unique the materials to show a human conception of the subject. However, it
develops in students a inferiority sens, once they feel completely far away from the
production knowledge process.
Fundamentação Teórica
[...] O que há de eterno nas ideias é serem todas perecíveis mas não inúteis
ou infecundas. Exatamente o oposto é que se dá. A ideia, ao perder a validade, por
força da própria transformação da realidade, que suscita, condiciona o surgimento de
outra, transmuta-se nesta, e de alguma forma nela se conserva, e assim a sua
caducidade equivale ao mesmo tempo à sua perenidade. Em essência a ideia
superada ingressa como elemento na composição daquela que a substitui. Por isso, o
progresso do conhecimento, que se faz pela morte e criação das ideias, representa o
único aspecto eterno do saber. (PINTO, 1979, p.90)
Metodologia
Resultados e discussões
• menção à descoberta de ☺ ☺ ☺
Newton
× × × ×
Fenômeno da
• descrição de algum
decomposição experimento realizado por
Newton ao estudar o
da luz branca e fenômeno da decomposição
a conclusão de ⇒ enfoque apenas na
passagem da luz solar por × × × ☺ ☺ × ☺
que a luz solar é um prisma
⇒ emprego de outros
uma mistura de experimentos realizados × × × ☺ ☺ ×
cores com por Newton ×
refrangibilidades
• menção e/ou descrição de
diferentes experimentos que ☺ ☺ ×
evidenciem o fenômeno da × × × ×
composição da luz branca
Além disso, essa maneira de abordar o assunto, definindo a dispersão logo no início,
embora possa parecer para alguns didática, contribui para distorcer a lógica existente no
processo de produção do conhecimento científico, já que anula os papéis importantes das
contradições e das divergências teóricas – experimentais na evolução do conhecimento,
colocando a descoberta científica em um patamar meio obscuro e misterioso.
Dos três livros que efetivamente mencionam influências históricas no episódio da
decomposição da luz branca, dois (E e F) conduzem a análise do fenômeno de uma forma
mais próxima e condizente com o que de fato aconteceu, isto é, não concluem que a luz
branca é uma mistura apenas baseados na realização de um experimento. Mencionam a
possibilidade de o prisma ter criado essas cores e discutem, portanto, a necessidade de se
realizar um novo experimento (experimento 6 da parte I do livro I de Ótica do próprio
Newton). Nessa discussão, o livro E apresenta alguns trechos de Ótica, nos quais Newton
explica e evidencia o seu raciocínio ao realizar determinada ação, o que torna essa descoberta
mais humana e menos fruto de “uma iluminação celestial”. O outro (H), por sua vez, introduz
alguma referência histórica apenas na legenda de uma figura, que mostra Newton segurando o
prisma para que a luz solar, oriunda de um orifício na janela, o atravesse. Aqui, temos
reforçada a concepção de que apenas este único experimento (com um posicionamento
aleatório do prisma frente ao feixe luminoso) serviu para que Newton formulasse toda a sua
teoria a respeito da composição da luz branca.
Por fim, no que diz respeito a essa composição da luz branca, apenas E e F citam a
realização da passagem da luz solar por dois prismas como meio de obter uma luz branca. No
entanto, nenhum deles aborda a dificuldade de se comprovar experimentalmente que essas
duas luzes brancas, ainda que tivessem propriedades semelhantes, eram, de fato, iguais. Isso
significa que o argumento epistemológico de Newton, baseado em suas regras do filosofar
(regras da simplicidade e uniformidade da natureza) não é evidenciado em nenhuma das obras
didáticas.
Percebe-se, dessa forma que, apesar de ser comentado e explorado (na maior parte das
vezes por meio da utilização de imagens coloridas) em todos os livros didáticos, o episódio da
decomposição da luz branca recebe uma abordagem histórica que deixa a desejar, não
podendo ser considerada nem totalmente empirista-indutivista e, tampouco, baseada em uma
concepção mais humana da ciência. Quando presente, enfoca o fenômeno como fruto de um
único experimento e, na melhor das hipóteses como fruto da realização de dois experimentos.
A importância e as dificuldades com o correto posicionamento do prisma (que na verdade
constitui o elemento desencadeador de todas as contradições entre a teoria prevista por
Newton e os resultados observados), bem como a necessidade de se formular novos conceitos
(cores e luzes homogênea e heterogênea) e de se empregar argumentos filosóficos na
comprovação de sua teoria são totalmente desconsideradas.
Considerações Finais
Uma leitura atenta do artigo escrito por Newton em 1672 e publicado nas
Philosophical Transactions e da proposição 2 da parte I, livro I do seu Ótica(1704), nos
mostra que o caminho seguido pelo cientista não foi tão simples como sugerem os livros
didáticos. Vários experimentos precisaram ser realizados, bases teóricas (diferenciação entre
cores simples e compostas) precisaram ser desenvolvidas e argumentos epistemológicos,
condizentes com a maneira newtoniana de pensar e conceber o universo (muitos dos quais
resultantes de um processo de construção e para o qual contribuíram o contexto histórico e
filosófico) foram empregados para que a proposição pudesse ser comprovada. Assim, o
procedimento adotado por Newton, que não apenas emprega experimentos, mas faz uso de
teoria e outros argumentos, não pode ser classificado como empirista –indutivista e nem
tampouco ensinado como tal.
Infelizmente, o que se observa nesses materiais é exatamente uma disseminação de
aspectos condizentes com essa concepção, o que certamente favorece o desenvolvimento de
uma pseudo-história e de uma idéia equivocada sobre ciência, que passa a ser considerada
como um “conjunto de verdades dogmáticas resultantes da observação pura e divorciada do
contexto social; como uma atividade superior e, como tal, praticada somente por seres
intelectualmente superiores” (SILVA et al., 2008, p.500).
Nesse processo, os alunos são praticamente “forçados” a aceitar e acreditar que foi
assim mesmo que as coisas aconteceram, já que tudo parece ser resultado de uma mente
brilhante e também do acaso: Newton coloca o prisma de qualquer modo diante da luz solar e
conclui, como se fosse óbvio e muito fácil, que as cores que aparecem após a refração são, na
verdade, elementos constituintes da luz solar branca, e que elas sofreram desvios diferentes
em razão de uma diferença de refrangibilidade.
Na verdade, segundo os pesquisadores e historiadores da ciência, a utilização da
pseudo-história em sido uma característica marcante quando se trata da inserção da História e
Filosofia da Ciência nos materiais didáticos. De um modo geral, tal prática caracteriza-se pela
citação de datas e nomes de personagens da ciência, pela apresentação de biografias curtas
dos autores das leis estudadas (geralmente no final dos capítulos), ou por relatos folclóricos e
mitificados de acontecimentos históricos (como, por exemplo, a história de que Newton teria
descoberto a lei da Gravitação Universal depois de ter a sua cabeça atingida por uma maçã
que se desprendeu de uma árvore, sob a qual ele se encontrava) nos quais o cientista
desempenha um papel similar aos dos heróis das grandes epopéias.
Atitudes como estas contribuem para desenvolver um sentimento de inferioridade nos
discentes, uma vez que se sentem completamente distanciados e incapazes de participar do
processo de produção do conhecimento. Em um contexto um pouco mais amplo, que
extrapole as práticas estabelecidas dentro dos muros da escola, tal sentimento de inferioridade
pode se estender e se refletir na participação desse aluno em questões relacionadas à produção
das ideias na sociedade na qual ele esteja inserido.
Por esta razão, é extremamente importante que nós, professores, estejamos atentos à
maneira como transmitimos o conhecimento aos nossos alunos e também aos materiais
didáticos que utilizamos porque, implícitas a cada uma dessas práticas, estão concepções de
formação de indivíduos e do papel que eles podem vir a desempenhar na sociedade de seu
tempo.
Referências bibliográficas
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SILVA, Clarete Paranhos. et al. Subsídios para o uso da história das ciências no ensino:
exemplos extraídos da geociências. Ciência e Educação, Campinas, v. 14, n. 3, p. 497-517,
2008.