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A Inconstitucionalidade da
Criminalização do
Usuário de Drogas
Vinicius Marcondes de Araujo1
2 Dois brasileiros (Marco Archer Cardoso Moreira e Rodrigo Gularte) encontram-se presos na Indonésia, aguar-
dando execução de pena de morte por tráfico de drogas. Mesmo ciente do risco extremo e fatal, assumiram o risco
do transporte da droga naquele canto do planeta.
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4 bvsms.saude.gov.br/publicações/pns_alcool_drogas.pdf
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5 Toledo, Francisco de Assis. Princípios Básicos de Direito Penal. 5ª edição. São Paulo. Saraiva. 1994, p. 19.
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6 Art. 28 – Quem adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoal, dro-
gas sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar será submetido às seguintes penas:
(...) parágrafo primeiro – Às medidas submete-se quem, para seu consumo pessoal, semeia, cultiva ou colhe plantas
destinadas à preparação de pequena quantidade de substância ou produto capaz de causar dependência química.
7 Grego, Rogério. Curso de Direito Penal, Parte Geral. 5ª edição. Belo Horizonte. Impetus. 2007, p. 55.
8 Apud Grego, Rogério. Curso de Direito Penal, Parte Geral. 5ª edição. Belo Horiszonte. Impetus. 2007, p. 55.
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9 Bizzoto, Alexandre, Rodrigues, Andréia de Brito e Queiroz, Paulo, Comentários Críticos à Lei de Drogas, 3ª
edição, Rio de Janeiro, Lumen Juris, 2010, p. 45/46.
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coerência entre o que era e o que não era proibido, vazada no seguinte
trecho:
“Na delegacia só tinha viciado e delinqüente
Cada um com um vício e um caso diferente
Um cachaceiro esfaqueou o dono do bar
Porque ele não vendia pinga fiado
E um senhor bebeu uísque demais
Acordou com um travesti e assassinou o coitado
Um viciado no jogo apostou a mulher
Perdeu a aposta e ela foi seqüestrada
Era tanta ocorrência, tanta violência
Que o índio não tava entendendo nada
Ele viu que o delegado fumava um charuto fedorento
E acendeu um “da paz” pra relaxar
Mas quando foi dar um tapinha
Levou um tapão e um chute naquele lugar
Foi mandado pro presídio e, no caminho
Assistiu um acidente provocado por excesso de cerveja
Uma jovem que bebeu demais
Atropelou um padre e os noivos na porta da igreja
E pro índio nada mais faz sentido
Com tantas drogas por que só o seu cachimbo é proibido?
Como já dito alhures, qual a razão para a maconha ser droga ilícita e
a bebida alcoólica não, sob o prisma da saúde pública, quando se sabe que
quase noventa por cento dos atendimentos no SUS em função das drogas
decorrem do consumo abusivo de álcool?
Fere a igualdade constitucional, ad colorandum, que o usuário de
maconha, cientificamente considerada como droga leve, seja submetido
à persecução penal, e o alcoólatra não, pois a conduta deste é bem mais
nociva, do ponto de vista médico, do que a daquele.
A ordem constitucional vigente expressa profundo compromisso
com a liberdade do indivíduo, seja no expressar, no ser, no agir e no consu-
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mir, desde que não afete a esfera jurídica de terceiros, como sói acontecer
com aquele que simplesmente se droga.
Extrai-se da leitura do art. 5º da Carta Magna que é livre a mani-
festação do pensamento (IV), é inviolável a liberdade de consciência e de
crença (VI) e que são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a
imagem das pessoas (X).
O indivíduo que resolve se drogar age no espaço aberto pela Consti-
tuição, tanto quanto aquele que senta no bar para beber cerveja, revelando-
se atentatória a criminalização de sua opção ínsita a sua liberdade, garan-
tida no texto maior.
Mariana de Assis Brasil e Weigert exprime com precisão o tema:
“Ao limitar a vida privada e a intimidade da pessoa, o proi-
bicionismo atua em esfera tutelada pela Constituição. Em
inúmeras disposições a Carta visou proteger os direitos de
personalidade dos cidadãos, informando existir parcela
de direitos de personalidade dos cidadãos que não pode
ser invadida pelo Estado. A personalidade e as opções que
dela exsurgem está inserida em tais direitos individuais
inacessíveis, devendo ser igualmente respeitadas “a esfera
do pensamento, das convicções, das paixões e emoções
como núcleo inviolável, como reserva de direito do cida-
dão na qual o Estado não pode interferir.
Em não se respeitando o direito de escolha do indivíduo,
nas diferentes expressões que possui, viola-se o princípio
da secularização, vislumbrado por Zaffaroni como prin-
cípio metajurídico, referencial de legitimidade externa
do direito penal. Entendido como o princípio dos quais
os demais princípios e valores são dedutíveis, este obje-
tiva exatamente a busca de limites do Estado perante as
liberdades dos cidadãos, como referido anteriormente.
Deste modo, não é constitucionalmente possível impor-se
a proibição (penal) de comportamentos unicamente imo-
rais, malvados ou hostis, pois é imprescindível a efetiva
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lesão a terceiros.
Esta é uma das razões pela qual a criminalização do con-
sumo não se justifica. A punição de atos autolesivos, que
causam dano somente ao indivíduo que os pratica, não
pode ser considerada nada além de resíduo pré-moderno,
baseado em concepções filosóficas e religiosas incapazes
de traçar diferenciação entre o Direito e a moral.10
10 Weigert, Mariana de Assis Brasil, Uso de Drogas e Sistema Penal – entre o proibicionismo e a redução de
danos. 1ª edição, Rio de Janeiro, Lumen Júris. 2010, p. 79/80.
11 Apelação Criminal 0011135633, 6ª Câmara Criminal, Relator José Henrique Rodrigues Torres, julgado em
31/03/2008.
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12 bvsms.saude.gov.br/publicações/pns_alcool_drogas.pdf.
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CONCLUSÃO
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Grego, Rogério. Curso de Direito Penal, Parte Geral. 5ª edição. Belo Ho-
rizonte. Impetus. 2007.