A C Ó R D Ã O. Flexibilização Por Norma Coletiva

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Poder Judiciário

Justiça do Trabalho
Tribunal Superior do Trabalho

PROCESSO Nº TST-Ag-AIRR-10037-43.2016.5.03.0026

Este documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.tst.jus.br/validador sob código 10056624633835456C.
ACÓRDÃO
(6ª Turma)
GMKA/isr

JUÍZO DE RETRATAÇÃO. AGRAVO. AGRAVO


DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA.
RECLAMADA. ART. 1.030, II, DO CPC. TEMA
1.046 DA TABELA DE REPERCUSSÃO GERAL.
HORAS EXTRAS. TURNOS ININTERRUPTOS DE
REVEZAMENTO. NORMA COLETIVA
PREVENDO JORNADA DE 8 (OITO) HORAS E 48
(QUARENTA E OITO) MINUTOS.
COMPENSAÇÃO DO SÁBADO NÃO
TRABALHADO. EXTRAPOLAÇÃO DOS LIMITES
REFERIDOS NA SÚMULA 423 DO TST. TEMA
1.046 DO EMENTÁRIO DE REPERCUSSÃO
GERAL DO STF. RECONHECIMENTO DA
INVALIDADE DA NORMA COLETIVA.
Em ordem inicial, cumpre registrar que na atual
fase em que se encontra o processo (exame de
eventual juízo de retratação), o âmbito de
cognição deste Colegiado acha-se circunscrito à
verificação da contrariedade ou consonância
do acórdão alvo do recurso extraordinário com
tese proferida no STF no regime da
repercussão geral (art. 1.040, II, do CPC).
O Supremo Tribunal Federal, em acórdão
proferido nos autos do ARE 1.121.633/GO,
publicado em 28/4/2023, firmou a seguinte
tese, em repercussão geral: “São constitucionais
os acordos e as convenções coletivas que, ao
considerarem a adequação setorial negociada,
pactuem limitações ou afastamentos de direitos
trabalhistas, independentemente da explicitação
especificada de vantagens compensatórias, desde
que respeitados os direitos absolutamente
indisponíveis”.

Firmado por assinatura digital em 04/10/2023 pelo sistema AssineJus da Justiça do Trabalho, conforme MP 2.200-2/2001, que
instituiu a Infra-Estrutura de Chaves Públicas Brasileira.
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O STF considerou que são constitucionais as


matérias que envolvem a flexibilização de
direitos trabalhistas por norma coletiva,
superando o entendimento de que teria
natureza infraconstitucional a controvérsia
sobre a norma coletiva que trata da redução do
intervalo intrajornada e da majoração da
jornada em turnos ininterruptos de
revezamento (Tema 357) e a norma coletiva
que trata da redução do pagamento das horas
in itinere a tempo menor que metade do tempo
gasto (Tema 762).
Discorrendo sobre os direitos trabalhistas
absolutamente indisponíveis, o Ministro Gilmar
Mendes destacou que, “Em regra, as cláusulas
de convenção ou acordo coletivo não podem ferir
um patamar civilizatório mínimo, composto, em
linhas gerais, (i) pelas normas constitucionais, (ii)
pelas normas de tratados e convenções
internacionais incorporadas ao Direito Brasileiro
e (iii) pelas normas que, mesmo
infraconstitucionais, asseguram garantias
mínimas de cidadania aos
trabalhadores”. Comentando sobre as normas
constitucionais de indisponibilidade relativa,
registrou o Ministro Gilmar Mendes: “A
Constituição Federal faz três menções explícitas
aos direitos que podem ser reduzidos por meio de
negociação coletiva. O art. 7º, inciso VI, da
Constituição Federal dispõe ser direito dos
trabalhadores a “irredutibilidade do salário, salvo
o disposto em convenção ou acordo coletivo”. O
texto constitucional prevê, ainda, “duração do
trabalho normal não superior a oito horas diárias
e quarenta e quatro semanais, facultada a
compensação de horários e a redução da
jornada, mediante acordo ou convenção coletiva
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de trabalho” (art. 7º, XIII, CF), bem como “jornada


de seis horas para o trabalho realizado em turnos
ininterruptos de revezamento, salvo negociação
coletiva” (art. 7º, XIV, da CF)”.
Admitindo que “nem sempre é fácil delimitar ex
ante qual seria o patamar civilizatório mínimo
que escaparia do âmbito da negociabilidade
coletiva”, o Ministro Gilmar Mendes indicou que
a investigação sobre quais direitos são de
indisponibilidade relativa ou absoluta deve
ocorrer no campo da jurisprudência do STF e
do TST quando tratam de flexibilização por
meio de norma coletiva.
Importante identificar que o STF, no Tema
1.046, examinou o panorama jurisprudencial e
legislativo anterior à Lei 13.467/2017. O
Ministro Gilmar Mendes esclareceu que “na
presente ação, não estamos discutindo a
constitucionalidade dos arts. 611-A e 611-B da
CLT”. Tais dispositivos, quando definem o que
seriam direitos de indisponibilidade relativa e
absoluta, regras de direito material, não se
aplicam aos contratos de trabalho anteriores à
vigência da Lei 13.467/2017. E, para os
contratos de trabalho iniciados após a vigência
da Lei 13.467/2017, ficou para a jurisprudência
trabalhista examinar, caso a caso, a
aplicabilidade das hipóteses neles elencadas,
pois o STF não decidiu sobre sua
constitucionalidade ou não.
Ainda sobre o tema da admissibilidade ou não
da flexibilização de direitos trabalhistas, é
importante citar a decisão do STF na ADPF 381,
Relatora Ministra Rosa Weber, na qual esteve
em debate a validade da norma coletiva que
previu que os motoristas profissionais estariam
previamente enquadrados na hipótese de
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trabalhadores externos não passíveis de


controle de jornada. O STF indicou que: a) o
controle de jornada é direito de
indisponibilidade absoluta; b) para além da
controvérsia sobre a validade ou não da norma
coletiva, pode a Justiça do Trabalho decidir se o
caso concreto se enquadra ou não na hipótese
da norma coletiva, estando autorizada a afastar
a aplicação da norma coletiva quando as
premissas fáticas do caso sob exame sejam
distintas da previsão do ajuste coletivo.
Feitas as delimitações sobre a matéria,
passa-se ao exame do caso concreto.
Retomando a fundamentação assentada no
voto do Ministro Gilmar Mendes, relator no
Tema 1.046, “admite-se que acordo ou
convenção coletiva de trabalho estabeleça
fórmulas de compensação de jornada”; “Tais
compensações, no entanto, devem respeitar
balizas fixadas pela legislação e pela própria
jurisprudência trabalhista”.
As normas constitucionais sobre jornadas são
de indisponibilidade relativa, e não de
disponibilidade total. Ou seja, a norma coletiva
não pode tudo. A norma coletiva pode reduzir
a jornada ou prorrogar a jornada mediante
compensação desde que observe o patamar
civilizatório. A Constituição Federal não
autorizou a norma coletiva a estabelecer
jornada máxima de trabalho, mas sim a
disciplinar as hipóteses de prorrogação para o
fim de compensação (art. 7º, XIII e XIV, da CF). A
norma coletiva não pode se sobrepor ao
legislador constituinte originário quanto à
jornada máxima. Se assim fosse, estaria aberta
a porta para a volta aos patamares da
Revolução Industrial com trabalhadores
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ordinariamente cumprindo jornadas de 14h,


16h, 18h e até 22h. Não se pode perder de
vista que a fixação de jornada máxima resulta
da evolução civilizatória que compreende o
trabalhador em sua dimensão psicobiofísica e
em seu status de sujeito de direitos originados
do princípio da dignidade da pessoa humana,
entendido na teoria constitucional como regra
matriz dos direitos trabalhistas. O ser humano
é o centro da Constituição Federal – e aos
trabalhadores foram assegurados direitos
fundamentais ao longo do art. 7º da CF e
outros dispositivos da Carta Magna.
A previsão do art. 7º, XIV, da CF (jornada
normal de seis horas para o trabalho realizado
em turnos ininterruptos de revezamento, salvo
negociação coletiva) levou em conta a situação
especial dos trabalhadores submetidos a esse
tipo de jornada. No regime de turnos
ininterruptos de revezamento os empregados
trabalham em turnos contínuos (no sentido de
que uma turma sucede a outra no posto de
trabalho). Os turnos podem ser fixos ou
alternados. Os turnos podem abranger manhã,
tarde e/ou noite. No caso de turnos alternados
há variações diversas - semanais, quinzenais,
mensais etc. Historicamente, a Lei nº
5.811/1972 havia previsto o regime de
revezamento de oito horas e, em casos
excepcionais, de doze horas, para os
empregados nas atividades de exploração,
perfuração, produção e refinação de petróleo,
industrialização do xisto, indústria
petroquímica e transporte de petróleo e seus
derivados por meio de dutos. Porém, o regime
de revezamento passou a ser aplicado em
outras atividades profissionais. A experiência
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demonstrou que os trabalhadores em turnos


ininterruptos de revezamento estão sujeitos a
uma rotina desgastante que pode prejudicar o
relógio biológico e afetar sua saúde física e
mental. Além disso, para os trabalhadores que
se alternam em turnos distintos que abrangem
o dia e/ou a noite, por exemplo, pode ficar
comprometida a rotina familiar, pessoal e/ou
social e até mesmo a chance de estudar ou
frequentar cursos que tenham horários fixos.
Enfim, são várias as razões relevantes que
levaram o legislador constituinte originário a
fixar, como regra, a jornada máxima de seis
horas diárias.
Daí, no plano jurisprudencial, a Súmula 423 do
TST: “estabelecida jornada superior a seis horas e
limitada a oito horas por meio de regular
negociação coletiva, os empregados submetidos a
turnos ininterruptos de revezamento não têm
direito ao pagamento da 7ª e 8ª horas como
extras”.
A limitação da sobrejornada a no máximo duas
horas diárias em regime de compensação no
caso de turnos ininterruptos de revezamento
guarda simetria com o art. 7º, XIII, da CF (que
fixa a jornada máxima diária de oito horas para
as categorias profissionais em geral) e com a
hipótese do art. 59 da CLT (que admite a
sobrejornada de no máximo duas horas diárias
quando se trata de horas extras).
In casu, a premissa fática fixada na origem
aponta para a existência de norma coletiva
com indicação da jornada de 8 (oito) horas e 48
(quarenta e oito) minutos, de segunda a sexta
(compensação do trabalho aos sábados),
totalizando 44 horas semanais em turnos
ininterruptos de revezamento.
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Na linha do que foi ressaltando anteriormente,


se de um lado é admissível que acordos ou
convenções coletivas estabeleçam fórmulas de
compensação de jornada, não se pode olvidar
o alerta contido no voto condutor do Tema
1.046, de que “tais compensações, no entanto,
devem respeitar balizas fixadas pela legislação e
pela própria jurisprudência trabalhista”. Mesmo
num contexto de concessões recíprocas,
próprio dos ajustes sindicais, há de existir um
limite, ainda mais diante dos efeitos deletérios
que singularizam os turnos ininterruptos de
revezamento. No particular, o referencial eleito
pela Constituição para este regime de jornada
é o de seis horas (art. 7º, XIV). Fixar em tais
circunstâncias horário de trabalho regular em 8
(oito) horas e 48 (quarento e oito) minutos,
longe de evidenciar mera ampliação de
jornada, ameaça a própria garantia
constitucional da saúde e segurança dos
trabalhadores (arts. 6º, 7º, XXII, e 196), além de
infringir, em última análise, fundamento básico
da Constituição da República, consistente no
equilíbrio entre o valor social do trabalho e a
livre iniciativa (art. 1º, IV).
O Tribunal Superior do Trabalho, em questão
idêntica envolvendo a mesma reclamada,
possui decisão colegiada proferida no sentido
da invalidade de tal norma coletiva
(Ag-AIRR-10461-11.2018.5.03.0028, 2ª Turma,
Relatora Desembargadora Convocada
Margareth Rodrigues Costa, DEJT 30/06/2023).
Isso já no cenário pós-publicação do acórdão
do Tema 1.046 - ARE 1.121.633/GO, ou seja,
após a delimitação da matéria pelo STF em
sede de repercussão geral.

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De outro lado, não é demais registrar que a


Seção de Dissídios Coletivos do TST, em
decisão recente, se posicionou no sentido de
ser inválida norma coletiva que fixa jornada de
trabalho em patamares incompatíveis com as
normas constitucionais de saúde e segurança
do trabalho (RO-593-89.2017.5.08.0000, Seção
Especializada em Dissídios Coletivos, Relatora
Ministra Maria Cristina Irigoyen Peduzzi, DEJT
21/06/2023).
Por todo o exposto, não se divisa dissonância
do acórdão desta Sexta Turma com a tese
vinculante do STF, devendo, portanto, ser
mantida a condenação ao pagamento de horas
extras, a partir da 6ª diária, ante o
reconhecimento da invalidade da cláusula
normativa na qual foi fixada, em turnos
ininterruptos de revezamento, a jornada de 8
(oito) horas e 48 (quarenta e oito) minutos.
Juízo de retratação não exercido, com
devolução dos autos à Vice-Presidência do TST.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo em Agravo


de Instrumento em Recurso de Revista n° TST-Ag-AIRR-10037-43.2016.5.03.0026, em
que é Agravante FCA - FIAT CHRYSLER AUTOMÓVEIS BRASIL LTDA. e Agravado
ADILSON CARLOS DE CARVALHO.

Contra a decisão da 6ª Turma, na qual foi desprovido o agravo


interno da reclamada, foi interposto recurso extraordinário para o Supremo Tribunal
Federal.
O Ministro Vice-Presidente desta Corte, no exame de
admissibilidade do recurso extraordinário, com base no art. 1.030, II, do CPC,
determinou o retorno dos autos a esta Turma para submissão da matéria a um
eventual juízo de retratação, em razão da tese fixada pelo STF no julgamento do Tema

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1.046 da Tabela de Repercussão Geral, de que “são constitucionais os acordos e as


convenções coletivas que, ao considerarem a adequação setorial negociada, pactuem
limitações ou afastamentos de direitos trabalhistas, independentemente da explicitação
especificada de vantagens compensatórias, desde que respeitados os direitos absolutamente
indisponíveis”.
É o relatório.

VOTO

A Sexta Turma negou provimento ao agravo interno da


reclamada, adotando os fundamentos sintetizados na seguinte ementa:
AGRAVO. AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA
INTERPOSTO PELA RECLAMADA CONTRA ACÓRDÃO PROFERIDO NA VIGÊNCIA
DA LEI Nº 13.015/2014 E DA INSTRUÇÃO NORMATIVA Nº 40 DO TST. ANTERIOR
À LEI Nº 13.467/2017. HORAS EXTRAS. TURNOS ININTERRUPTOS DE
REVEZAMENTO SUPERIOR A OITO HORAS DIÁRIAS. PREVISÃO EM NORMA
COLETIVA. INVALIDADE. APLICAÇÃO DO ARTIGO 896, § 7º, DA CLT NA DECISÃO
MONOCRÁTICA. AGRAVO DESPROVIDO.
1 - O art. 7º, XIV, da Constituição Federal prevê jornada de seis horas
para o trabalho executado em turnos ininterruptos de revezamento, uma vez
que este sistema causa um maior desgaste ao trabalhador e dificulta seu
convívio social.
2 - Consta do acórdão do Regional que o sistema de compensação
adotado pela reclamada envolvia a prestação de serviços em dois turnos
alternados, caracterizando o trabalho em turno ininterrupto de revezamento.
Por conseguinte, a decisão do Regional está em consonância com o
entendimento desta Corte, preconizado na OJ nº 360 da SBDI-1 do TST.
3 - Ademais, ainda que o artigo 7º, XIV, da Constituição Federal preveja a
possibilidade de elastecimento da jornada praticada em turno ininterrupto de
revezamento, por meio de norma coletiva, esta não pode ultrapassar oito
horas diárias, em razão da prejudicialidade deste sistema ao trabalhador, nos
termos da Súmula nº 423 do TST.
4 - Assim sendo, é inválida norma coletiva que estabelece jornada de
trabalho superior a oito horas em turno ininterrupto, ainda que para fins de
compensação do sábado, como no caso dos autos. Julgados. O conhecimento
do recurso de revista encontra óbice no art. 896, § 7º, da CLT.
5 - Por fim, quanto à aplicação da Lei nº 13.467/17, esta não pode
retroagir para atingir fatos já consumados quando do início de sua vigência.
Uma vez que não estava em vigor na data dos fatos, não pode ser aplicada de
forma retroativa para prejudicar o reclamante, devendo ser garantida a

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segurança, a certeza e a estabilidade do ordenamento jurídico (princípio da


irretroatividade da lei, art. 6º da LINDB).
6 - Agravo a que se nega provimento, com aplicação de multa.

À análise.
Em ordem inicial, cumpre registrar que na atual fase em que se
encontra o processo (exame de eventual juízo de retratação), o âmbito de cognição
deste Colegiado acha-se circunscrito à verificação da contrariedade ou consonância do
acórdão alvo do recurso extraordinário com tese proferida no STF no regime da
repercussão geral (art. 1.040, II, do CPC).
O Supremo Tribunal Federal, em acórdão proferido nos autos do
ARE 1.121.633/GO, publicado em 28/4/2023, firmou a seguinte tese, em repercussão
geral: “São constitucionais os acordos e as convenções coletivas que, ao considerarem a
adequação setorial negociada, pactuem limitações ou afastamentos de direitos trabalhistas,
independentemente da explicitação especificada de vantagens compensatórias, desde que
respeitados os direitos absolutamente indisponíveis”.
A Suprema Corte considerou que são constitucionais as matérias
que envolvem a flexibilização de direitos trabalhistas por norma coletiva, superando o
entendimento de que teria natureza infraconstitucional a controvérsia sobre a norma
coletiva que trata da redução do intervalo intrajornada e da majoração da jornada em
turnos ininterruptos de revezamento (Tema 357) e a norma coletiva que trata da
redução do pagamento das horas in itinere a tempo menor que metade do tempo gasto
(Tema 762).
Discorrendo sobre os direitos trabalhistas absolutamente
indisponíveis, o Ministro Gilmar Mendes destacou que, “em regra, as cláusulas de
convenção ou acordo coletivo não podem ferir um patamar civilizatório mínimo, composto,
em linhas gerais, (i) pelas normas constitucionais, (ii) pelas normas de tratados e convenções
internacionais incorporadas ao Direito Brasileiro e (iii) pelas normas que, mesmo
infraconstitucionais, asseguram garantias mínimas de cidadania aos trabalhadores”.
As normas constitucionais que tratam de direitos absolutamente
indisponíveis são aquelas fechadas e/ou proibitivas, ou seja, são aquelas que não
autorizam elas próprias a sua flexibilização. A título de exemplo, citam-se as seguintes:
Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros
que visem à melhoria de sua condição social:

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I - relação de emprego protegida contra despedida arbitrária ou sem


justa causa, nos termos de lei complementar, que preverá indenização
compensatória, dentre outros direitos;
II - seguro-desemprego, em caso de desemprego involuntário;
III - fundo de garantia do tempo de serviço;
IV - salário mínimo, fixado em lei, nacionalmente unificado, capaz de
atender a suas necessidades vitais básicas e às de sua família com moradia,
alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e
previdência social, com reajustes periódicos que lhe preservem o poder
aquisitivo, sendo vedada sua vinculação para qualquer fim;
V - piso salarial proporcional à extensão e à complexidade do trabalho;
(...)
VII - garantia de salário, nunca inferior ao mínimo, para os que
percebem remuneração variável;
VIII - décimo terceiro salário com base na remuneração integral ou no
valor da aposentadoria;
IX - remuneração do trabalho noturno superior à do diurno;
X - proteção do salário na forma da lei, constituindo crime sua retenção
dolosa;
XI - participação nos lucros, ou resultados, desvinculada da
remuneração, e, excepcionalmente, participação na gestão da empresa,
conforme definido em lei;
XII - salário-família pago em razão do dependente do trabalhador de
baixa renda nos
termos da lei; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 20, de
1998)
(...)
XV - repouso semanal remunerado, preferencialmente aos domingos;
XVI - remuneração do serviço extraordinário superior, no mínimo, em
cinqüenta por cento à do normal; (Vide Del 5.452, art. 59 § 1º)
XVII - gozo de férias anuais remuneradas com, pelo menos, um terço a
mais do que o salário normal;
XVIII - licença à gestante, sem prejuízo do emprego e do salário, com a
duração de cento e vinte dias;
XIX - licença-paternidade, nos termos fixados em lei;
XX - proteção do mercado de trabalho da mulher, mediante incentivos
específicos, nos termos da lei;
XXI - aviso prévio proporcional ao tempo de serviço, sendo no mínimo
de trinta dias, nos termos da lei;
XXII - redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de
saúde, higiene e segurança;
XXIII - adicional de remuneração para as atividades penosas, insalubres
ou perigosas,na forma da lei;
XXIV - aposentadoria;

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XXV - assistência gratuita aos filhos e dependentes desde o nascimento


até 5 (cinco) anos de idade em creches e pré-escolas; (Redação dada pela
Emenda Constitucional nº 53, de 2006)
(...)
XXVII - proteção em face da automação, na forma da lei;
XXVIII - seguro contra acidentes de trabalho, a cargo do empregador,
sem excluir a indenização a que este está obrigado, quando incorrer em dolo
ou culpa;
XXIX - ação, quanto aos créditos resultantes das relações de trabalho,
com prazo prescricional de cinco anos para os trabalhadores urbanos e rurais,
até o limite de dois anos após a extinção do contrato de trabalho; (Redação
dada pela Emenda Constitucional nº 28, de 2000)
XXX - proibição de diferença de salários, de exercício de funções e de
critério de admissão por motivo de sexo, idade, cor ou estado civil;
XXXI - proibição de qualquer discriminação no tocante a salário e
critérios de admissão do trabalhador portador de deficiência;
XXXII - proibição de distinção entre trabalho manual, técnico e
intelectual ou entre os profiss;
XXXIII - proibição de trabalho noturno, perigoso ou insalubre a menores
de dezoito e de qualquer trabalho a menores de dezesseis anos, salvo na
condição de aprendiz, a partir de quatorze anos; (Redação dada pela
Emenda Constitucional nº 20, de 1998)
XXXIV - igualdade de direitos entre o trabalhador com vínculo
empregatício permanente e o trabalhador avulso
Parágrafo único. São assegurados à categoria dos trabalhadores
domésticos os direitos previstos nos incisos IV, VI, VII, VIII, X, XIII, XV, XVI, XVII,
XVIII, XIX, XXI, XXII, XXIV, XXVI, XXX, XXXI e XXXIII e, atendidas as condições
estabelecidas em lei e observada a simplificação do cumprimento das
obrigações tributárias, principais e acessórias, decorrentes da relação de
trabalho e suas peculiaridades, os previstos nos incisos I, II, III, IX, XII, XXV e
XXVIII, bem como a sua integração à previdência social. (Redação dada pela
Emenda Constitucional nº 72, de 2013)
Art. 8º É livre a associação profissional ou sindical, observado o
seguinte:
I - a lei não poderá exigir autorização do Estado para a fundação de
sindicato, ressalvado o registro no órgão competente, vedadas ao Poder
Público a interferência e a intervenção na organização sindical;
II - é vedada a criação de mais de uma organização sindical, em
qualquer grau, representativa de categoria profissional ou econômica, na
mesma base territorial, que será definida pelos trabalhadores ou
empregadores interessados, não podendo ser inferior à área de um
Município;
III - ao sindicato cabe a defesa dos direitos e interesses coletivos ou
individuais da categoria, inclusive em questões judiciais ou administrativas;

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IV - a assembléia geral fixará a contribuição que, em se tratando de


categoria profissional, será descontada em folha, para custeio do sistema
confederativo da representação sindical respectiva, independentemente da
contribuição prevista em lei;
V - ninguém será obrigado a filiar-se ou a manter-se filiado a sindicato;
VI - é obrigatória a participação dos sindicatos nas negociações coletivas
de trabalho;
VII - o aposentado filiado tem direito a votar e ser votado nas
organizações sindicais;
VIII - é vedada a dispensa do empregado sindicalizado a partir do
registro da candidatura a cargo de direção ou representação sindical e, se
eleito, ainda que suplente, até um ano após o final do mandato, salvo se
cometer falta grave nos termos da lei.
Parágrafo único. As disposições deste artigo aplicam-se à organização
de sindicatos rurais e de colônias de pescadores, atendidas as condições que
a lei estabelecer.
Art. 9º É assegurado o direito de greve, competindo aos trabalhadores
decidir sobre a oportunidade de exercê-lo e sobre os interesses que devam
por meio dele defender.
§ 1º A lei definirá os serviços ou atividades essenciais e disporá sobre o
atendimento das necessidades inadiáveis da comunidade.
§ 2º Os abusos cometidos sujeitam os responsáveis às penas da lei.
Art. 10. É assegurada a participação dos trabalhadores e empregadores
nos colegiados dos órgãos públicos em que seus interesses profissionais ou
previdenciários sejam objeto de discussão e deliberação.
Art. 11. Nas empresas de mais de duzentos empregados, é assegurada
a eleição de um representante destes com a finalidade exclusiva de
promover-lhes o entendimento direto com os empregadores.

Comentando sobre as normas constitucionais de


indisponibilidade relativa, registrou o Ministro Gilmar Mendes: “A Constituição
Federal faz três menções explícitas aos direitos que podem ser reduzidos por meio de
negociação coletiva. O art. 7º, inciso VI, da Constituição Federal dispõe ser direito dos
trabalhadores a “irredutibilidade do salário, salvo o disposto em convenção ou acordo
coletivo”. O texto constitucional prevê, ainda, “duração do trabalho normal não superior a
oito horas diárias e quarenta e quatro semanais, facultada a compensação de horários e a
redução da jornada, mediante acordo ou convenção coletiva de trabalho” (art. 7º, XIII, CF),
bem como “jornada de seis horas para o trabalho realizado em turnos ininterruptos de
revezamento, salvo negociação coletiva” (art. 7º, XIV, da CF)”.

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Cumpre notar que, paralelamente à tese vinculante do Tema


1.046, o STF decidiu na ADI 6363, especificamente quanto ao art. 7º, inciso VI, da
Constituição Federal, que é constitucional reduzir o salário sem a participação do
sindicato desde que em época de pandemia, inaugurando aquilo que o Ministro Gilmar
Mendes denominou de "jurisprudência de crise".
No que se refere às normas de tratados e convenções
internacionais incorporadas ao Direito Brasileiro, é importante lembrar da
relevância dos tratados de direitos humanos para as relações de trabalho,
especialmente o Pacto Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais
(PIDESC) e o Protocolo de San Salvador (que acrescentou à Convenção Americana de
Direitos Humanos normas de caráter social, cultural e ambiental). Devem-se também
observar as convenções da Organização Internacional do Trabalho, particularmente as
dez convenções fundamentais que tratam dos princípios aplicáveis independente de
ratificação no Brasil.
Ainda sobre a questão dos direitos trabalhistas
absolutamente indisponíveis, o Ministro Gilmar Mendes citou a exemplificação
constante no voto do Ministro Roberto Barroso como relator do Tema 152: “Embora, o
critério definidor de quais sejam as parcelas de indisponibilidade absoluta seja vago,
afirma-se que estão protegidos contra a negociação in pejus os direitos que correspondam a
um patamar civilizatório mínimo, como a anotação da CTPS, o pagamento do salário
mínimo, o repouso semanal remunerado as normas de saúde e segurança do trabalho,
dispositivos antidiscriminatórios, a liberdade de trabalho etc”.
Admitindo que “nem sempre é fácil delimitar ex ante qual seria o
patamar civilizatório mínimo que escaparia do âmbito da negociabilidade coletiva”, o
Ministro Gilmar Mendes indicou que a investigação sobre quais direitos são de
indisponibilidade relativa ou absoluta deve ocorrer no campo da jurisprudência
do STF e do TST quando tratam de flexibilização por meio de norma coletiva.
Assinalou que: “uma resposta mais efetiva sobre os limites da negociabilidade coletiva deve
ser buscada na própria jurisprudência consolidada do TST e do STF em torno do
tema. Assim, ainda que de forma não exaustiva, entendo que a jurisprudência do próprio
TST e do STF considera possível dispor, em acordo ou convenção coletiva, ainda que de
forma contrária a lei sobre aspectos relacionados a: (i) remuneração (redutibilidade de
salários, prêmios, gratificações, adicionais, férias) e (ii) jornada (compensações de jornadas

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de trabalho, turnos ininterruptos de revezamento, horas in itinere e jornadas superiores ao


limite de 10 horas diárias, excepcionalmente nos padrões de escala doze por trinta e seis ou
semana espanhola). Por outro lado, é entendimento assente do TST que as regras de
intervalos intrajornadas, bem como as que estabelecem o limite legal de 5 (cinco) minutos
que antecedem e sucedem a jornada de trabalho, não podem ser suprimidas ou alteradas
por convenções coletivas”. Afirmou que “De todo modo, deve-se também respeitar os
dispositivos constitucionais vigentes que garantem padrões mínimos de saúde, segurança e
higiene do trabalho, não sendo possível, por exemplo, que negociação coletiva suprima o
pagamento de adicional de insalubridade”. Exemplificou que “Também se deve ressaltar que
o artigo 623 da CLT, com a redação dada pelo Decreto-lei 229, de 28 de fevereiro de 1967,
impede que as convenções ou acordos coletivos sejam utilizados para burlar a política
econômico-financeira do Governo ou concernente à política salarial vigente” (Súmula 375 do
TST - “os reajustes salariais previstos em norma coletiva de trabalho não prevalecem
frente à legislação superveniente de política salarial”).
Relativamente ao artigo 7º, inciso XIII, da CF/88, o Ministro
Gilmar Mendes consignou que o dispositivo “estabeleceu a jornada regular de trabalho
em 8 (oito) horas diárias e 44 (quarenta e quatro) horas semanais, integralizando, portanto,
220 (duzentas e vinte) horas mensais. A despeito dessa regra geral, admite-se que acordo ou
convenção coletiva de trabalho estabeleça fórmulas de compensação de jornada, de sorte
que empregados trabalhem além do limite de 8 (oito) horas em um dia, com descansos em
outros. Assim, os regimes de compensação permitem a redistribuição das 44 (quarenta e
quatro) horas semanais, sem que seja necessário o pagamento de horas extras pelo
empregador. Tais compensações, no entanto, devem respeitar balizas fixadas pela legislação
e pela própria jurisprudência trabalhista. (...) Além disso, o art. 59 da CLT estabelece que, via
de regra, tais compensações não podem implicar trabalho superior a 10 (dez) horas diárias.
(art. 59 da CLT. “A duração normal do trabalho poderá ser acrescida de horas
suplementares, em número não excedente de 2 (duas), mediante acordo escrito entre
empregador e empregado, ou mediante contrato coletivo de trabalho.”) . Essa disposição
legal impediria de se cogitar, a priori, de uma jornada superior a esse limite. Contudo,
conforme se verá adiante, a jurisprudência excepcionalmente reconhece a validade das
chamadas jornadas 12 (doze) por 36 (trinta e seis). Respeitado o limite legal de 10 (dez)
horas diárias, a compensação de jornada pode até ultrapassar o limite de 220 (duzentos e
vinte) horas mensais. Isso se tornou possível com o advento da Lei 9.601/1998, que instituiu

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o chamado Banco de Horas Anual. De acordo com a jurisprudência do TST, as


compensações em banco de horas – diferente das compensações regulares – não podem ser
previstas em acordos individuais escritos, necessitando-se, portanto, de acordo ou
convenção coletiva de trabalho. (Súmula 85 do TST: “V – As disposições contidas nesta
súmula não se aplicam ao regime compensatório na modalidade ‘banco de horas’, que
somente pode ser instituído por negociação coletiva”).
Seguindo na indicação da jurisprudência do TST como campo
adequado para a investigação de quais direitos poderiam ou não se flexibilizados,
o Ministro Gilmar Mendes anotou: “destaca-se que o item VI da Súmula 85/TST prevê que,
quando o trabalhador exercer atividade insalubre, a compensação da sua jornada prevista
em acordo ou convenção coletiva só será válida se houver autorização prévia das
autoridades competentes em matéria de higiene do trabalho”. (Súmula 85 do TST: “VI – Não
é válido acordo de compensação de jornada em atividade insalubre, ainda que estipulado
em norma coletiva, sem a necessária inspeção prévia e permissão da autoridade
competente, na forma do art. 60 da CLT)”; “(...) as regras de intervalo intrajornada previstas
no art. 71 da CLT. Tal dispositivo estabelece que, nas jornadas contínuas superiores a 6 (seis)
horas, o empregado fará jus a intervalo de 1 (uma) a 2 (duas) horas. Já nas jornadas de 4
(quatro) e 6 (seis) horas, o intervalo previsto é de 15 (quinze) minutos. Ademais, observe-se
que, no tocante aos intervalos interjornadas (entre um dia e outro de labor), o parâmetro
numérico é de 11 horas, conforme estabelecido no art. 66 da CLT e no art. 5º da Lei
5.889/1973. Considerando tal quadro normativo, o TST tem entendido que as regras de
intervalo intrajornada previstas na legislação estatal constituem normas de ordem pública,
que não podem ser suprimidas ou alteradas por convenções coletivas. Nesse sentido, o item
II da Súmula 437/TST estabelece que: “é inválida cláusula de acordo ou convenção coletiva
de trabalho contemplando a supressão ou redução do intervalo intrajornada porque este
constitui medida de higiene, saúde e segurança do trabalho, garantido por norma de ordem
pública (art. 71 da CLT e art. 7º, XXII, da CF/1988), infenso à negociação coletiva”. Do mesmo
modo, tem sido decidido que as convenções coletivas não podem ampliar o limite legal de 5
(cinco) minutos que antecedem e sucedem a jornada de trabalho, para fins de apuração das
horas extras. Essa regra está prevista no art. 58, § 1º, da CLT, sendo também tratada como
norma de ordem pública pelo Judiciário, como na Súmula 449/TST”. Ainda sobre a
jurisprudência do TST como campo adequado para a investigação de quais direitos
poderiam ou não se flexibilizados, o Ministro Gilmar Mendes ressaltou: “A Constituição

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Federal de 1988 conferiu especial proteção aos trabalhadores submetidos a turnos


ininterruptos de revezamento – isto é, que alternam suas jornadas de trabalho em períodos
diurnos e noturnos. O inciso XIV do art. 7º da CF/88 previu como padrão de jornada para
esses trabalhadores o máximo de 6 (seis) horas diárias, possibilitando, no entanto, que
negociação coletiva dispusesse de forma contrária. Assim, a jurisprudência tem entendido
que as convenções coletivas podem estabelecer jornadas ininterruptas superiores a 6 (seis)
horas, contanto que sejam inferiores a 8 (oito). Nesses casos, não será devido pelo
empregador o pagamento de horas extras pela sétima e pela oitava hora trabalhada. Tal
entendimento encontra-se cristalizado na Súmula 423 do TST: “estabelecida jornada superior
a seis horas e limitada a oito horas por meio de regular negociação coletiva, os empregados
submetidos a turnos ininterruptos de revezamento não têm direito ao pagamento da 7ª e 8ª
horas como extras”; “Embora a CLT estabeleça que os regimes de compensação não podem
ultrapassar o limite máximo de 10 (dez) horas diárias de trabalho, a modalidade de
compensação de jornada mais comum na realidade brasileira é a escala de 12 (doze) por 36
(trinta e seis). A jurisprudência reconhece a licitude desse regime, entendendo que ele é
excepcional e que, para ser válido, deve estar previsto em lei ou em acordo ou convenção
coletiva de trabalho” (Súmula 444 do TST); “Mesmo entendimento encontra-se disposto no
art. 235-F da CLT para a categoria de motoristas profissionais. Convenção e acordo coletivo
poderão prever jornada especial de 12 (doze) horas de trabalho por 36 (trinta e seis) horas
de descanso para o trabalho do motorista profissional empregado em regime de
compensação; “Outra forma de flexibilização da jornada de trabalho que pode ser prevista
em acordo ou convenção coletiva é a chamada Semana Espanhola. Nessa modalidade,
considerada lícita pelo TST (Orientação Jurisprudencial 323 da SDI-I: 323), alterna-se a
prestação de 48 (quarenta e oito) horas em uma semana com 40 (quarenta) horas na outra.
Trata-se de compensação usualmente utilizada para se dispensar o empregado de trabalhar
nos finais de semana”; “ No ponto, anote-se que o art. 235-C, caput, da CLT passou a
estabelecer que a jornada diária de trabalho do motorista profissional será de 8 (oito) horas,
admitindo-se a sua prorrogação por até 2 (duas) horas extraordinárias ou, mediante
previsão em convenção ou acordo coletivo, por até 4 (quatro) horas extraordinárias”.
Importante identificar que o STF, no Tema 1.046, examinou o
panorama jurisprudencial e legislativo anterior à Lei 13.467/2017. O Ministro
Gilmar Mendes esclareceu que “na presente ação, não estamos discutindo a
constitucionalidade dos arts. 611-A e 611-B da CLT”. Tais dispositivos, quando

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definem o que seriam direitos de indisponibilidade relativa e absoluta, regras de


direito material, não se aplicam aos contratos de trabalho anteriores à vigência
da Lei 13.467/2017. E, para os contratos de trabalho iniciados após a vigência da
Lei 13.467/2017, ficou para a jurisprudência trabalhista examinar, caso a caso, a
aplicabilidade das hipóteses neles elencadas, pois o STF não decidiu sobre sua
constitucionalidade ou não.
Ainda sobre o tema da admissibilidade ou não da
flexibilização de direitos trabalhistas, é importante citar a decisão do STF na ADPF
381, Relatora Ministra Rosa Weber, na qual esteve em debate a validade da norma
coletiva que previu que os motoristas profissionais estariam previamente enquadrados
na hipótese de trabalhadores externos não passíveis de controle de jornada. O STF
indicou que: a) o controle de jornada é direito de indisponibilidade absoluta; b) para
além da controvérsia sobre a validade ou não da norma coletiva, pode a Justiça do
Trabalho decidir se o caso concreto se enquadra ou não na hipótese da norma
coletiva, estando autorizada a afastar a aplicação da norma coletiva quando as
premissas fáticas do caso sob exame sejam distintas da previsão do ajuste
coletivo. Constou no voto da Ministra Rosa Weber:
“A Constituição Federal de 1988, a seu turno, garante aos trabalhadores
brasileiros o direito fundamental à “duração do trabalho normal não superior
a oito horas diárias e quarenta e quatro semanais, facultada a compensação
de horários e a redução da jornada mediante acordo ou convenção coletiva
de trabalho.” (art. 7, XIII), bem como à “jornada de seis horas para o trabalho
realizado em turnos ininterruptos de revezamento, salvo negociação coletiva”
(art. 7º, XIV) . Nesse contexto, a efetividade do direito fundamental à duração
normal do trabalho pela fixação de limites à jornada do empregado sujeita-se
à autenticidade do sistema de controle pelo empregador, ou seja, da
veracidade da anotação da hora de entrada e saída do empregado por meio
de registro manual, mecânico ou eletrônico (CLT, art. 74, § 3º). (...) Nesse
contexto, consideradas tanto a norma heterônoma (art. 61, I, da CLT) quanto a
norma autônoma (cláusulas coletivas entabuladas pela categoria), a pretensão
reducionista de classificar a priori a atividade exercida pelo motorista de
transporte de cargas, peremptoriamente negada qualquer possibilidade de
subsunção dos fatos à norma, implica verdadeiro menoscabo dos direitos
fundamentais do trabalhador, notadamente do direito à limitação da jornada
e ao pagamento das horas extraordinárias, previstos no art. 7º da Constituição
Federal, com chancela de fraude à legislação trabalhista. Significa negar ao
trabalhador o direito de acesso ao Poder Judiciário para alcançar a definição
da realidade em que se deu a prestação dos serviços (CF, art. 5º, XXXV, e 114,
I). (...) Desse modo, fundamentado o conjunto de decisões impugnadas nos
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elementos probatórios (depoimentos testemunhais, sistemas de


rastreamento do veículo via satélite, aparelho celular, constantes contatos
telefônicos, rotas preestabelecidas ou roteiros de viagens, relatórios de
viagens com horários de saída da empresa, ficha de tráfego semanal), que
evidenciaram o efetivo controle da jornada pelo empregado em inobservância
do requisito previsto nas próprias normas coletivas para a configuração da
atividade externa (...).”

Cite-se ainda a relevante decisão do STF na ADPF 911, Relator


Ministro Roberto Barroso, na qual foi sinalizado que é direito absolutamente
indisponível o controle de jornada pelos meios idôneos:
“1. Arguições de descumprimento de preceito fundamental contra
dispositivos da Portaria/MTP nº 671, de 8 de novembro de 2021, editada pelo
Ministro de Estado do Trabalho e Previdência, que regulamentam nova
modalidade de registro da jornada de trabalho – o sistema de registro
eletrônico de ponto via programa (REP-P). 2. A ausência de controle da
jornada de trabalho implica na fragilização dos direitos à limitação da jornada,
às horas extras e ao repouso semanal, constitucionalmente assegurados (art.
7º, XIII, XIV, XVI e XV, CF/88), além de representar risco à saúde e segurança do
trabalhador (art. 7º, XXII, CF/88). Contudo, nem todo ato normativo que
regulamenta aspectos relacionado ao controle de jornada encontra
fundamento de validade direto na Constituição. 3. Na hipótese, a Portaria
impugnada encontra fundamento de validade no art. 74, § 2º, da CLT, que
expressamente determina ao Ministério do Trabalho a regulamentação da
matéria. O controle concentrado não constitui meio idôneo para impugnar a
validade de ato regulamentar e secundário. Precedentes. 4. Arguições de
descumprimento de preceito fundamental não conhecidas”.

Feitas estas ponderações sobre a matéria, passa-se ao


exame do caso concreto.
Retomando a fundamentação assentada no voto do Ministro
Gilmar Mendes, relator no Tema 1.046, “admite-se que acordo ou convenção coletiva de
trabalho estabeleça fórmulas de compensação de jornada”; “Tais compensações, no entanto,
devem respeitar balizas fixadas pela legislação e pela própria jurisprudência trabalhista”.
As normas constitucionais sobre jornadas são de
indisponibilidade relativa, e não de disponibilidade total. Ou seja, a norma coletiva não
pode tudo. A norma coletiva pode reduzir a jornada ou prorrogar a jornada mediante
compensação desde que observe o patamar civilizatório. A Constituição Federal não
autorizou a norma coletiva a estabelecer jornada máxima de trabalho, mas sim a

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disciplinar as hipóteses de prorrogação para o fim de compensação (art. 7º, XIII e XIV, da
CF). A norma coletiva não pode se sobrepor ao legislador constituinte originário quanto
à jornada máxima. Se assim fosse, estaria aberta a porta para a volta aos patamares da
Revolução Industrial com trabalhadores ordinariamente cumprindo jornadas de 14h,
16h, 18h e até 22h. Não se pode perder de vista que a fixação de jornada máxima
resulta da evolução civilizatória que compreende o trabalhador em sua dimensão
psicobiofísica e em seu status de sujeito de direitos originados do princípio da
dignidade da pessoa humana, entendido na teoria constitucional como regra matriz dos
direitos trabalhistas. O ser humano é o centro da Constituição Federal – e aos
trabalhadores foram assegurados direitos fundamentais ao longo do art. 7º da CF e
outros dispositivos da Carta Magna.
A previsão do art. 7º, XIV, da CF (jornada normal de seis horas
para o trabalho realizado em turnos ininterruptos de revezamento, salvo negociação
coletiva) levou em conta a situação especial dos trabalhadores submetidos a esse tipo
de jornada. No regime de turnos ininterruptos de revezamento os empregados
trabalham em turnos contínuos (no sentido de que uma turma sucede a outra no posto
de trabalho). Os turnos podem ser fixos ou alternados. Os turnos podem abranger
manhã, tarde e/ou noite. No caso de turnos alternados há variações diversas -
semanais, quinzenais, mensais, etc. Historicamente, a Lei nº 5.811/1972 havia previsto o
regime de revezamento de oito horas e, em casos excepcionais, de doze horas, para os
empregados nas atividades de exploração, perfuração, produção e refinação de
petróleo, industrialização do xisto, indústria petroquímica e transporte de petróleo e
seus derivados por meio de dutos. Porém, o regime de revezamento passou a ser
aplicado em outras atividades profissionais.
A experiência demonstrou que os trabalhadores em turnos
ininterruptos de revezamento estão sujeitos a uma rotina desgastante que pode
prejudicar o relógio biológico e afetar sua saúde física e mental. Além disso, para os
trabalhadores que se alternam em turnos distintos que abrangem o dia e/ou a noite,
por exemplo, pode ficar comprometida a rotina familiar, pessoal e/ou social e até
mesmo a chance de estudar ou frequentar cursos que tenham horários fixos. Enfim,
são várias as razões relevantes que levaram o legislador constituinte originário a fixar,
como regra, a jornada máxima de seis horas diárias.

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Daí, no plano jurisprudencial, a Súmula 423 do TST: “estabelecida


jornada superior a seis horas e limitada a oito horas por meio de regular negociação
coletiva, os empregados submetidos a turnos ininterruptos de revezamento não têm direito
ao pagamento da 7ª e 8ª horas como extras”.
A limitação da sobrejornada a no máximo duas horas diárias em
regime de compensação no caso de turnos ininterruptos de revezamento guarda
simetria com o art. 7º, XIII, da CF (que fixa a jornada máxima diária de oito horas para as
categorias profissionais em geral) e com a hipótese do art. 59 da CLT (que admite a
sobrejornada de no máximo duas horas diárias quando se trata de horas extras).
In casu, a premissa fática fixada na origem aponta para a
existência de norma coletiva com indicação da jornada de 8 (oito) horas e 48 (quarenta
e oito) minutos, de segunda a sexta (compensação do trabalho aos sábados),
totalizando 44 horas semanais em turnos ininterruptos de revezamento. É o que se
extrai do acórdão do TRT, in verbis:
[...] É incontroverso nos autos o fato de que o recorrido laborava em
dois turnos ininterruptos de revezamento, das 6h às 15:48h e das 15:48h às
1:09h, de segunda a sexta-feira, totalizando 8:48h diárias.
A jornada mencionada tem previsão nos instrumentos normativos e visa
a proporcionar aos obreiros folga no dia de sábado.
Registra-se que essas jornadas de trabalho, praticadas pela recorrente,
caracterizam turnos ininterruptos de revezamento, conforme disposto na
Súmula nº 64, deste Tribunal Regional, transcrita acima.
A Súmula nº 38, desta Corte, manifesta o seguinte entendimento:
TURNOS ININTERRUPTOS DE REVEZAMENTO. NEGOCIAÇÃO
COLETIVA. JORNADA SUPERIOR A OITO HORAS. INVALIDADE.
HORAS EXTRAS A PARTIR DA SEXTA DIÁRIA.
I - É inválida a negociação coletiva que estabelece jornada
superior a oito horas em turnos ininterruptos de revezamento,
ainda que o excesso de trabalho objetive a compensação da
ausência de trabalho em qualquer outro dia, inclusive aos
sábados, sendo devido o pagamento das horas laboradas acima
da sexta diária, acrescidas do respectivo adicional, com adoção do
divisor 180.
II - É cabível a dedução dos valores correspondentes às
horas extras já quitadas, relativas ao labor ocorrido após a oitava
hora.
(RA 106/2015, disponibilização: DEJT/TRT3/Cad.Jud.
21/05/2015, 22/05/2015 e 25/05/2015)
Pela Súmula Regional, restou pacificado que os instrumento normativos
que estabeleçam jornadas de trabalho, em turnos ininterruptos de
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revezamento, superior a 8 horas, ainda que para fins de compensação dos


sábados, serão considerados inválidos, devendo serem pagas como extras as
horas que extrapolarem a 6ª diária, adotando-se como divisor o 180. [...]

Na linha do que foi ressaltando anteriormente, se de um lado é


admissível que acordos ou convenções coletivas estabeleçam fórmulas de
compensação de jornada, não se pode olvidar o alerta contido no voto condutor do
Tema 1.046, de que “tais compensações, no entanto, devem respeitar balizas fixadas pela
legislação e pela própria jurisprudência trabalhista”. Mesmo num contexto de concessões
recíprocas, próprio dos ajustes sindicais, há de existir um limite, ainda mais diante dos
efeitos deletérios que singularizam os turnos ininterruptos de revezamento. No
particular, o referencial eleito pela Constituição para este regime de jornada é o de seis
horas (art. 7º, XIV). Fixar em tais circunstâncias horário de trabalho regular em 8 (oito)
horas e 48 (quarento e oito) minutos, longe de evidenciar mera ampliação de jornada,
ameaça a própria garantia constitucional da saúde e segurança dos trabalhadores (arts.
6º, 7º, XXII, e 196), além de infringir, em última análise, fundamento básico da
Constituição da República, consistente no equilíbrio entre o valor social do trabalho e a
livre iniciativa (art. 1º, IV).
O Tribunal Superior do Trabalho, em questão idêntica
envolvendo a mesma reclamada, possui decisão colegiada proferida já no cenário
pós-publicação do acórdão do Tema 1.046 (ARE 1.121.633/GO), ou seja, após a
delimitação da matéria pelo STF em sede de repercussão geral. In verbis:

"AGRAVO INTERNO EM AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE


REVISTA DA RECLAMADA - TURNOS ININTERRUPTOS DE REVEZAMENTO -
NORMA COLETIVA - EXTENSÃO DA JORNADA PARA ALÉM DE 8 HORAS DIÁRIAS
- PARÂMETROS DA SÚMULA Nº 423 DO TST - INVALIDADE DA NORMA À LUZ
DOS PRESSUPOSTOS DA TESE DE REPERCUSSÃO GERAL PROFERIDA PELO STF
NO EXAME DO TEMA 1046. 1. A discussão reverbera nos limites da negociação
coletiva e nas relações estabelecidas entre as normas produzidas
coletivamente e aquelas decorrentes da legislação estatal heterônoma. 2.
Dentro de um marco constitucional, como o inaugurado e conservado pela
Constituição Federal de 1988, alterações na arquitetura da regulação do
trabalho devem passar, necessariamente , pela avaliação da possibilidade de
preservação e incremento dos direitos sociais arrolados no art. 7º, e da
proteção integral à pessoa humana. Assim é que o próprio texto
constitucional, atento às transformações no mundo do trabalho e às
demandas por constante adaptação da regulação do trabalho às modificações
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na esfera produtiva, admitiu de forma expressa, em três dos seus incisos, que
a negociação coletiva pudesse flexibilizar garantias fundamentais, entre as
quais estão aquelas relacionadas à jornada de trabalho ordinária, à jornada
dos turnos de revezamento e, ainda, à irredutibilidade salarial (art. 7º, VI, XIII e
XIV, da CF/88). 3. A análise dessas possibilidades abertas pelo constituinte se
dá de modo a observar o caráter sistêmico da normatização constitucional do
trabalho, que admite a possibilidade negocial, ainda que in pejus , sem
descurar de assegurar, nos seus outros trinta e um incisos, direitos
fundamentais em relação aos quais, a priori , não admite flexibilização. 4.
Nesse sentido, abriu-se margem para a construção do princípio da adequação
setorial negociada, à luz do qual a possibilidade de flexibilização em sentido
desprotetivo, ou seja, in pejus dos trabalhadores, somente seria válida diante
de dois vetores: o caráter de transação (mediante concessões recíprocas do
modelo negocial coletivo, que não admitiria renúncia de direitos) e a
incidência dessa transação sobre direitos não afetos ao núcleo de
indisponibilidade absoluta. 5. Os direitos de indisponibilidade absoluta são
enunciados por Maurício Godinho Delgado como sendo " As normas
constitucionais em geral (respeitadas, é claro, as ressalvas parciais
expressamente feitas pela própria Constituição: art. 7º, VI, XIII, XIV, por
exemplo); as normas de tratados e convenções internacionais vigorantes no
plano interno brasileiro (referidas no art. 5º, § 2º, CF/88, já expressando um
patamar civilizatório no próprio mundo ocidental em que se integra o Brasil);
as normas legais infraconstitucionais que asseguram patamares de cidadania
ao indivíduo que labora (preceitos relativos a saúde e segurança no trabalho,
normas concernentes a bases salariais mínimas, normas de identificação
profissional, dispositivos antidiscriminatórios, etc. )". 6. É certo, portanto, que
a esfera de indisponibilidade absoluta delineada pela doutrina não se
restringe estritamente ao rol dos direitos do art. 7º da Constituição da
República, mas alcança aquilo que se entende como bloco de
constitucionalidade, assim compreendido o conjunto de normas que
implementa direitos fundamentais em uma perspectiva multinível e que são
especialmente alargados na esfera justrabalhista, em face da tutela
amplamente difundida na ordem jurídica de direitos dotados de
fundamentalidade, com plasticidade de sua hierarquia, manifestada pelo
princípio da norma mais favorável, expressamente previsto no caput do art. 7º
da Constituição Federal. 7. O STF, em sede de Repercussão Geral, por meio da
tese proferida no julgamento do Tema 1046, firmou entendimento vinculante
no sentido de que seria infenso à negociação coletiva rebaixar o patamar de
direitos absolutamente indisponíveis assegurados pelas normas jurídicas
heterônomas: "São constitucionais os acordos e as convenções coletivos que,
ao considerarem a adequação setorial negociada, pactuam limitações ou
afastamentos de direitos trabalhistas, independentemente da explicitação
especificada de vantagens compensatórias, desde que respeitados os direitos
absolutamente indisponíveis" (ARE 1.121.633, Supremo Tribunal Federal,

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Tribunal Pleno, Rel. Min. Gilmar Mendes, DJe de 28/4/2023). 8. Os parâmetros


que orientam a decisão da Corte Constitucional denotam que há inflexão em
relação à exigência do caráter expresso das concessões recíprocas, de modo a
fragilizar os contornos da transação, tal como moldada pelo princípio da
adequação setorial negociada. Entretanto, há expressa manifestação quanto à
preservação da esfera de indisponibilidade absoluta dos direitos trabalhistas,
que é referida pelo STF nos exatos termos emanados da doutrina
justrabalhista . 9. Esta Corte Superior, com respaldo no permissivo contido no
art. 7º, XIV, e tendo em conta a valorização e reconhecimento constitucional
dos acordos e convenções coletivas de trabalho (art. 7º, XXVI, da CF/88), em
entendimento consignado na Súmula nº 423, afirma possível a prorrogação da
jornada dos turnos ininterruptos de revezamento por meio das negociações
coletivas, observado o limite de oito horas diárias. 10. A questão
controvertida, todavia, remete à extensão dessa prorrogação.
Evidentemente, se se admite que a jornada reduzida de seis horas seja
flexibilizada, há que se enfrentar quais os limites dessa flexibilização, à
luz dos marcos protetivos constitucionais, sob pena de relegar-se à
negociação coletiva a prorrogação exaustiva ou irrazoável das jornadas
especiais. 11. No caso do labor submetido ao regime de turnos
ininterruptos de revezamento, houve expressa e taxativa diferenciação
constitucional em relação às jornadas ordinárias. Isso porque, nas
jornadas nas quais não há alteração habitual dos horários e, por
conseguinte, afetação do biorritmo e da sociabilidade do trabalhador
ante a imprevisibilidade da alternância dos momentos de trabalho e de
não trabalho, considera-se admissível a duração de oito horas diárias e
44 horas semanais e, ainda, admite-se a possibilidade de flexibilização
negociada desses limites. Já com relação ao labor em turnos de
revezamento, a exposição especial da saúde obreira nesse regime fez
com que o constituinte adotasse como referência a jornada de seis horas
diárias e 36 semanais. Ao tratar as referidas jornadas de modo
diferenciado, nos incisos XIII e XIV, inclusive admitindo a flexibilização
para cada uma delas de modo especificado, a Constituição Federal deixa
clara a necessidade de preservar a diferenciação entre a extensão de
cada uma dessas jornadas , assegurando o vetor de prevenção da saúde
dos trabalhadores submetidos ao revezamento de horários. 12. Entendo
óbvio, nesse sentido, que as permissividades constitucionais em relação
à flexibilização negociada de cada uma dessas jornadas não tenham o
condão de anular a distinção constitucional estabelecida entre elas, de
modo que, se para a jornada de oito horas são admissíveis negociações
em que, respeitadas as normas imperativas de saúde e segurança,
elevem razoavelmente esse patamar, com posterior compensação, deve
haver limitação da possiblidade de flexibilização da jornada de seis horas
dos turnos de revezamento, até o limite de oito horas, respeitando a
diferenciação constitucional entre os dois tipos de jornada. 13.

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Assinale-se que o art. 7º da Constituição Federal, cujo caput se reporta a


"direitos dos trabalhadores urbanos e rurais", sem a limitação da extensão
desses direitos a uma relação jurídica tipificada, prevê a redução dos riscos
inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança
(XXII) e o pagamento dos adicionais de penosidade, insalubridade e
periculosidade, na forma da lei (XXIII). Também consta do dispositivo
constitucional a prescrição dos limites para as jornadas diária, semanal e
anual de trabalho (incisos XIII, XIV, XV, XVI e XXVII), numa clara tutela do direito
fundamental à saúde dos trabalhadores. 14. Assim, a decisão regional que
refuta a validade da cláusula normativa que elasteceu para além de oito horas
a jornada dos turnos de revezamento não ofende o disposto nos arts. 7º, XXVI,
e 8º, III e IV, da CF/88, mas lhes confere aplicação no caso concreto. Tampouco
habilita o recurso de revista ao conhecimento por divergência jurisprudencial,
uma vez que adequado o entendimento contido na decisão regional ao
comando vinculante do STF. Agravo interno desprovido"
(Ag-AIRR-10461-11.2018.5.03.0028, 2ª Turma, Relatora Desembargadora
Convocada Margareth Rodrigues Costa, DEJT 30/06/2023). (g.n.)

Também sobre a mesma questão jurídica vem a calhar


fundamentação exposta por Sua Excelência o Ministro Maurício Godinho Delgado em
decisão proferida recentemente nos autos do AIRR - 12281-87.2015.5.03.0087 (DEJT
07/08/2023). Leia-se a fração de interesse:
“[...] O princípio da criatividade jurídica da negociação coletiva traduz a
noção de que os processos negociais coletivos e seus instrumentos têm real
poder de criar norma jurídica (com qualidades, prerrogativas e efeitos
próprios a estas), em harmonia com a normatividade heterônoma estatal. Tal
poder excepcional conferido pela ordem jurídica aos sujeitos coletivos
trabalhistas (art. 7º, XXVI, da CF) desponta, certamente, como a mais notável
característica do Direito Coletivo do Trabalho - circunstância que, além de
tudo, influencia a estruturação mais democrática e inclusiva do conjunto da
sociedade, tal como objetivado pela Constituição (art. 1º, II e III, 3º, I e IV, da
CF).
De outro lado, não obstante a Constituição da República confira à
negociação coletiva amplos poderes, não se trata jamais de um superpoder
da sociedade civil, apto a desconsiderar, objetivamente, os princípios
humanísticos e sociais da própria Constituição Federal, ou de, inusitadamente,
rebaixar ou negligenciar o patamar de direitos individuais e sociais
fundamentais dos direitos trabalhistas que sejam imperativamente fixados
pela ordem jurídica do País.
Desse modo, embora extensas as perspectivas de validade e eficácia
jurídicas das normas autônomas coletivas em face das normas heterônomas
imperativas, tais possiblidades não são plenas e irrefreáveis. Há limites
objetivos à criatividade jurídica na negociação coletiva trabalhista.
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Neste ponto, desponta como instrumento imprescindível para avaliação


das possibilidades e limites jurídicos da negociação coletiva o princípio da
adequação setorial negociada, por meio do qual as normas autônomas
juscoletivas, construídas para incidirem sobre certa comunidade
econômico-profissional, não podem prevalecer se concretizada mediante ato
estrito de renúncia (e não transação), bem como se concernentes a direitos
revestidos de indisponibilidade absoluta (e não indisponibilidade relativa),
imantadas por uma tutela de interesse público, por constituírem um patamar
civilizatório mínimo que a sociedade democrática não concebe ver reduzido
em qualquer segmento econômico-profissional, sob pena de se afrontarem a
própria dignidade da pessoa humana e a valorização mínima deferível ao
trabalho (arts. 1º, III, e 170, caput , CF/88).
No caso brasileiro, esse patamar civilizatório mínimo está dado,
essencialmente, por três grupos convergentes de normas trabalhistas
heterônomas: as normas constitucionais em geral (respeitadas, é claro, as
ressalvas parciais expressamente feitas pela própria Constituição: art. 7º, VI,
XIII e XIV, por exemplo); as normas de tratados e convenções internacionais
vigorantes no plano interno brasileiro (referidas pelo art. 5º, § 2º, CF/88, já
expressando um patamar civilizatório no próprio mundo ocidental em que se
integra o Brasil); as normas legais infraconstitucionais que asseguram
patamares de cidadania ao indivíduo que labora (preceitos relativos à saúde e
segurança no trabalho, normas concernentes a bases salariais mínimas,
normas de identificação profissional, dispositivos antidiscriminatórios, etc.).
Registre-se que, embora a Lei n. 13.467/2017 tenha alargado o elenco
de parcelas de indisponibilidade apenas relativa - inclusive, em muitos casos,
em arrepio e desprezo ao estuário normativo da Constituição de 1988 (vide o
amplo rol de temas constantes no art. 611-A da CLT) -, ela não buscou eliminar
a fundamental distinção entre direitos de indisponibilidade absoluta e direitos
de indisponibilidade relativa. Tanto é assim que o art. 611-B, em seus incisos I
a XXX, projeta o princípio da adequação setorial negociada, ao estabelecer
limites jurídicos objetivos à criatividade jurídica da negociação coletiva
trabalhista, proibindo a supressão ou a redução dos direitos trabalhistas de
indisponibilidade absoluta ali elencados.
Em verdade, a doutrina e a jurisprudência deverão cotejar os objetivos
precarizadores dos novos preceitos, onde couber, com o conjunto dos
princípios e regras do próprio Direito do Trabalho, a par do conjunto dos
princípios e regras da Constituição da República, no sentido de ajustar, pelo
processo interpretativo e /ou pelo processo hierárquico, a natureza e o
sentido do diploma legal novo à matriz civilizatória da Constituição de 1988,
além do conjunto geral do Direito do Trabalho.
A propósito, o Supremo Tribunal Federal, ao julgar o ARE 1.121.633/GO -
leading case do Tema 1046 de Repercussão Geral cujo título é "Validade de
norma coletiva de trabalho que limita ou restringe direito trabalhista não
assegurado constitucionalmente" -, em decisão plenária concluída no dia

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14/6/2022, fixou tese jurídica que reitera a compreensão de que existem


limites objetivos à negociação coletiva, delineados a partir da aplicação dos
critérios informados pelo princípio da adequação setorial negociada e pela
percepção de que determinados direitos são revestidos de indisponibilidade
absoluta.
Eis a tese: "São constitucionais os acordos e as convenções coletivos
que, ao considerarem a adequação setorial negociada, pactuam limitações ou
afastamentos de direitos trabalhistas, independentemente da explicitação
especificada de vantagens compensatórias, desde que respeitados os direitos
absolutamente indisponíveis ".
Cumpre salientar que, passadas mais de três décadas de experiência
jurídica e cultural intensa desde o advento da Constituição (de 1988 a 2023), a
jurisprudência trabalhista já tem, contemporaneamente, aferido de modo
bastante objetivo e transparente a adequação setorial negociada. Nessa linha,
de maneira geral, tem considerado que, estando a parcela assegurada por
regra estatal imperativa, ela prevalece soberanamente, sem possibilidade
jurídica de supressão ou restrição pela negociação coletiva trabalhista, salvo
se a própria regra heterônoma estatal abrir espaço à interveniência da regra
coletiva negociada.
No caso concreto, examinam-se normas coletivas que transacionaram a
jornada diária em turnos ininterruptos de revezamento (art. 7º, XIV, da CF),
bem como alargaram o limite de minutos residuais previstos no art. 58, § 1º,
da CLT.
Quanto ao tema "turnos ininterruptos de revezamento – norma
coletiva que fixa jornada diária que ultrapassa 8 horas – invalidade",
para avaliar a questão, primeiramente é preciso atentar que as normas
jurídicas estatais que regem a estrutura e dinâmica da jornada e duração
do trabalho são, de maneira geral, no Direito Brasileiro, normas
imperativas. Embora exista um significativo espaço à criatividade
autônoma coletiva privada, hábil a tecer regras específicas aplicáveis em
contraponto ao quadro normativo heterônomo, há claros limites.
Assim, a partir dos critérios informados pelo princípio da
adequação setorial negociada, aplicados à duração do trabalho, é válida,
por exemplo, a ampliação da jornada especial em turnos ininterruptos
de revezamento (jornada especial de 6 horas, com semana laborativa de
36 horas de duração, conforme instituído pela Constituição). Esta,
porém, ampliação pode fazer-se até o limite padrão constitucional (8
horas diárias e 44 horas na semana), desde que a transação ampliativa
se faça por negociação coletiva (art. 7º, XIV, CF/88).
Essa hipótese ampliativa da duração do trabalho não traduz real
exceção ao critério acima enunciado, dado que se trata, no presente
caso, de ampliação de jornada especial reduzida (6 horas), até atingir-se
o montante padrão estabelecido no art. 7º, XIII, da Constituição de 1988,

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de 8 horas diárias, que não pode ser alargado, regra geral, conforme
Súmula 423/TST. [...] (g.n)

A propósito, não é demais registrar que a Seção de Dissídios


Coletivos do TST, em decisão recente de relatoria de Sua Excelência a Ministra Maria
Cristina Irigoyen Peduzzi, se posicionou no sentido de ser inválida norma coletiva que
fixa jornada de trabalho em patamares incompatíveis com as normas constitucionais de
saúde e segurança do trabalho. Leia-se:
"RECURSO ORDINÁRIO - DISSÍDIO COLETIVO DE NATUREZA ECONÔMICA
- ACORDO COLETIVO DE TRABALHO PARCIALMENTE HOMOLOGADO PELO TRT
- CLÁUSULA 30ª - "VIRADA DE PLANTÃO" PARA PROFISSIONAIS DE SAÚDE 1. É
inválida cláusula coletiva com autorização genérica para que profissional da
saúde, após jornada de 12 (doze) horas, permaneça em serviço para substituir
trabalhador que não compareceu ao plantão seguinte, o que poderia resultar
em jornada de 24 (vinte e quatro) horas, incompatível com as normas
constitucionais relativas à garantia da saúde e segurança no trabalho. Incide,
na hipótese, o art. 611-B, XVII, da CLT. 2. O parágrafo único do art. 611-B da
CLT não torna válida a cláusula coletiva, pois o direito transacionado não se
restringe à mera ampliação da jornada em patamar que não coloca os
trabalhadores em situação de risco, mas à própria garantia constitucional da
saúde e segurança dos trabalhadores. 3. Deve ser mantido o acórdão
regional, que não homologou a cláusula pactuada pelas partes. Recurso
Ordinário conhecido e desprovido" (RO-593-89.2017.5.08.0000, Seção
Especializada em Dissídios Coletivos, Relatora Ministra Maria Cristina Irigoyen
Peduzzi, DEJT 21/06/2023).

Por todo o exposto, não se divisa dissonância do acórdão


desta Sexta Turma com a tese vinculante do STF, devendo, portanto, ser mantida
a condenação ao pagamento de horas extras, a partir da 6ª diária, ante o
reconhecimento da invalidade da cláusula normativa na qual foi fixada, em
turnos ininterruptos de revezamento, a jornada de 8 (oito) horas e 48 (quarenta e
oito) minutos.
Juízo de retratação não exercido, com devolução dos autos à
Vice-Presidência do TST.

ISTO POSTO

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ACORDAM os Ministros da Sexta Turma do Tribunal Superior do


Trabalho, por unanimidade, manter o acórdão no qual foi desprovido o agravo interno
da reclamada, não efetuando o juízo de retratação de que trata art. 1.030, II, do CPC. Os
autos devem retornar à Vice-Presidência desta Corte para que prossiga no exame da
admissibilidade do recurso extraordinário.
Brasília, 4 de outubro de 2023.

Firmado por assinatura digital (MP 2.200-2/2001)


KÁTIA MAGALHÃES ARRUDA
Ministra Relatora

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