Cidade Oculta - A Vila Operária, Ana Tomas
Cidade Oculta - A Vila Operária, Ana Tomas
Cidade Oculta - A Vila Operária, Ana Tomas
Pretende-se por um lado aprofundar os meios e modos da sua génese, o entendimento das suas
relações tipo-morfológicas e a sistematização das suas características tipológicas. Da leitura
tipo-morfológica sobre o objecto em questão, ressalta a especificidade do seu enquadramento,
sendo no seu carácter marginal e por vezes oculto relativamente à estrutura urbana em que se
insere, que parcialmente reside a sua singularidade.
O reconhecimento de uma estrutura compositiva específica induz uma reflexão mais ampla
baseada no intercâmbio entre as práticas vernaculares e eruditas da arquitectura e o modo como
estes dois campos se influenciaram mutuamente ao longo de vários séculos, no universo
específico da arquitectura portuguesa.
1
organismo vivo, capaz de sobreviver adaptando-se a todas as mudanças que lhe são
exteriores, que em cada passo ou tipologia concreta, respondem a uma informação genética de
ordem interna superior. A sua realidade é o devir que a faz ressurgir sucessivamente.
“Los primeros estudios científicos sobre las ciudades surgieron en la segunda mitad del siglo
pasado, frutos del pensamiento higienista, precedente directo de las teorías urbanísticas
contemporáneas. Nacidos como reacción al entorno social e cívico creado por la Revolución
Industrial, se hallan impregnados desde su origen de un cierto carácter de conocimiento para
la acción que transmitirán al urbanismo posterior, conformador de la ciudad actual”(Pozo y
Barajas, 1996).
A falta de condições mínimas de higiene que de um modo geral caracterizou toda a cidade
oitocentista, resultou em fortes surtos epidémicos, sentidos particularmente nas zonas
ocupadas pelas classes laboriosas. As designadas doenças da habitação atingiram
preferencialmente as classes mais desfavorecidas que oriundas do meio rural não possuíam
em relação à cidade, as necessárias defesas. As elevadas taxas de mortalidade constituíram o
argumento do discurso de higienistas e reformadores sociais, que ao longo do século XIX
defenderam o combate à chaga da habitação operária, implementando o debate da casa
barata e salubre.
O levantamento da situação foi feito através de Inquéritos à habitação, destacando-se o
Inquérito Industrial de 1881 e o Inquérito aos Pateos de Lisboa, elaborado em duas partes
(Prado e Ruiz, 1902;1905).
A escassez ou pouca objectividade do enquadramento legal elege o Regulamento de
Salubridade das Edificações Urbanas1, como uma das principais normativas. O discurso
higienista estende-se igualmente à cidade através das orientações que em termos urbanísticos
acompanham a legislação que serve de enquadramento aos Planos Gerais de Melhoramentos
da Capital2, ecoando as preocupações que se fazem sentir por toda a Europa.
1
Regulamento Geral de Salubridade das Edificações Urbanas (Condições Higiénicas a adoptar nas construções
dos prédios), aprovado por decreto de 14 de Fev. de 1903.
2
“No decurso do ultimo quartel do século XIX, Lisboa tinha desenvolvido um conjunto de estudos sob a
orientação de Frederico Ressano Garcia, que vêm a integrar o Plano Geral de Melhoramentos de 1904. Em
1927, J.C. Forestier desloca-se à capital como consultor do Município, para colaborar na elaboração de um novo
2
Estrutura urbana
Entendida numa vertente abstracta enquanto cidade industrial, Lisboa organiza-se de acordo
com parâmetros de funcionalidade. As obras do porto de Lisboa, o estabelecimento de vias
férreas urbanas e suburbanas, em particular a Via de Cintura, juntamente com a definição do
novo perímetro urbano através do traçado da 1.ª Estrada de Circunvalação (1852), serão as
principais condicionantes de todo o processo de urbanização e industrialização da cidade; o
estabelecimento da rede de transportes acentua a relação com o rio, pois a área vocacionada
ao comércio desenvolve-se na zona próxima ribeirinha dependente do tráfego fluvial,
sobretudo o tráfego marítimo além Atlântico.
Neste contexto é necessário atender às transformações sociais, culturais e económicas que
desencadearam os diferentes processos de formação/transformação sobre o tecido urbano.
Profundamente classista, Lisboa vive nesta época, uma “dupla realidade” (Madeira
Rodrigues, 1979). A cidade laboriosa cresce sobre si própria, num processo de densificação
das áreas mais antigas, ou estende-se às periferias pouco valorizadas subordinada à
proximidade das áreas industriais. Paralelamente, em resposta aos preceitos urbanísticos
higienistas e à vontade de uma classe social emergente, a cidade cresce para Norte, originando
novos bairros residenciais, baseados numa prática comum que elege o quarteirão oitocentista,
resultante do traçado ortogonal e do loteamento informado pela referência normativa que
corresponde à implementação de uma nova tipologia arquitectónica (o edifício residencial de
rendimento), introduzindo no tecido urbano, profundas transformações tipo-morfológicas.
A um modo empírico de fazer cidade, associado aos problemas de habitação das designadas
classes laboriosas, corresponde uma forma racional e planificada, orientada pelos poderes
públicos e dirigida às classes dominantes. As classes menos favorecidas, não vão ser alvo de
qualquer política concertada por parte da administração central ou municipal. A resposta a
este problema surge no sector privado, como uma possibilidade de rentabilização dos terrenos
pouco valorizados, através do investimento de pequenos capitais na construção de
alojamentos precários.
Apesar dos inúmeros projectos lei que se sucederam ao primeiro Inquérito Industrial (1881),
a que vem somar-se a esperança nascida da implantação da República, a instabilidade sócio-
política foi adiando progressivamente a intervenção do Estado neste domínio. O problema da
habitação para as classes mais desfavorecidas vai ser resolvido por construtores privados e em
menor escala por industriais, sociedades filantrópicas e cooperativas prediais.
Plano Geral de Melhoramentos, concebendo uma nova expansão da cidade para norte, numa linguagem que
Lisboa não conhecia” in Lôbo, M. S. (1972) Planos de Urbanização – A Época de Duarte Pacheco,
(DGOTDU/FAUP Publicações) 13.
3
Promoção do alojamento operário
Como expressão das motivações e filosofias filantrópicas dos seus promotores, destacamos o
exemplo paradigmático do Bairro/Vila Grandella, reflectindo na habitação, a hierarquia do
local de trabalho. Cada tipologia era destinada a um estatuto específico dentro da
“Organização Grandella”. A fábrica e o Bairro Operário de Benfica /Vila Grandella, integram
o complexo industrial e comercial monopolista, associando unidades fabris (que abastecem os
armazéns comerciais da Rua do Carmo) à habitação para os trabalhadores. O Bairro recriava
um mundo de ordem, vacilando entre a casa e a fábrica, perseguindo a pacificação de uma
classe que se sentia explorada e que emergia para a realidade da sua força económica.
As Companhias e Sociedades Construtoras constituem-se em sociedades anónimas de
accionistas, visando a obtenção de lucros com os empreendimentos imobiliários. Destacam-se
neste universo, a Cooperativa Popular de Construção Predial (1893), a Cooperativa e
Instrução (1898) e a Ocidental 1.º de Janeiro (1901). No quadro associativista, evidencia-se o
papel da Companhia Comercial Construtora, criada em 1890, que irá levar a cabo a
construção do Bairro Operário dos Barbadinhos concluído em 1892.
A vila Operária
Refere Maria João Madeira Rodrigues, centrando-se no caso de Lisboa, que “A vila, na
ausência de um programa de habitação social, deve ser vista como um ensaio de solução,
cristalizada num tempo e conservando o seu sentido nesse tempo. (...) A vila pode ser
considerada, a partir dos últimos anos da década de 70, como uma forma de colonização
interna, ocupando novos espaços, operando a transformação de áreas rústicas e levando mais
tarde a sua influência, a áreas cuja carga histórica anterior é exemplar” (Madeira Rodrigues,
1979).
3
Inquérito Industrial de 1881, 2.ª parte, Livro 1.º, 1881-1883, 19-20.
4
A Vila operária surge como modelo de habitação multifamiliar intensiva para famílias de
baixos rendimentos, racionalizada de raíz, numa resposta clara aos problemas de saúde
pública, associados à falta de salubridade das habitações.
Pretende ser útil, económica e simples, fornecendo um espaço salubre e habitável.
Situada à margem da estrutura urbana em que se insere, surge frequentemente implantada no
interior do quarteirão, dado que o “negócio consistia em rentabilizar espaços no interior dos
quarteirões, os quais, segundo critérios do urbanismo convencional, não são edificáveis”
(Madeira Rodrigues, 1979).
4
Regulamento Geral da Construção Urbana para a Cidade de Lisboa – Disposição aprova em 28 de Agosto de
1930 (Edicto de 6 de Dez. de 1930), in Nobre, S.M.P., (1972)Legislação Camarária de Lisboa , (Imprensa
Nacional, Lisboa) 282.
5
Módulo bifamiliar (pré-existência) Vila Mendonça (1912) - pormenor de vãos e divisão do módulo
6
Conjunto de casas para trabajadores
agrícolas – (Herdade da Picanceira),
in Arquitectura Popular, 1980, p. 414.
7
Ao entendimento das suas relações tipo-morfológicas e sistematização das suas características
tipológicas, acresce o reconhecimento de uma estrutura compositiva específica, introduzindo
uma reflexão mais ampla sobre as práticas arquitectónicas eruditas e vernaculares e o modo
como estas se interpenetram no campo específico da arquitectura portuguesa.
A racionalização do espaço e dos processos construtivos, directamente associada ao tipo de
promotores envolvidos, assim como a procura de resposta a condições mínimas de
salubridade, condicionaram um modelo de habitação, cujas características nos remetem numa
primeira leitura para um universo de cariz ruralizante, adequado à origem dos seus potenciais
destinatários. Exprime-se aparentemente numa expressão vernacular, cujos valores formais
dominantes são a clareza, ordem, proporção e simplicidade, entendidos como específicos e
correspondendo a uma visão da arquitectura portuguesa, base dos argumentos que conduziram
Kubler ao conceito de arquitectura chã5(Kubler, 1972).
5
“As alterações ocorridas em Portugal no período 1520-1580 são pois do mesmo nível da que se operou na
presente centúria, quando o gosto decorado e ecléctico sobrevivente dos fins do século XIX cedeu ao
racionalismo e à necessidade económica mediante o abandono da superfície superdecorada. (...) Aproveitando a
idéia de Júlio de Castilho do «estilo chão» designei-a por arquitectura «chã»”, in Kubler, G. (1972), Entre as
Especiarias e os Diamantes 1521-1706, (Veja, Lisboa) 3.
8
gerações de construtores e pedreiros e por via escolar, através de gerações de engenheiros
militares e arquitectos.
A esta constatação, não são alheios factores como a dinâmica corporativa, registada desde
muito cedo, através da organização dos mesteirais; a existência de normativas referentes à
estandardização de materiais e elementos construtivos; e o modo fortemente centralizado
como foram enunciados os princípios que aplicados à arquitectura erudita, através de uma
arquitectura serial ou de programa, terão posteriormente sido estendidos à arquitectura
corrente. Ainda a influencia da arquitectura militar e a presença do engenheiro militar,
poderão explicar parcialmente o forte pendor pragmático e despojado da arquitectura
portuguesa.
As grandes reformas Manuelinas entendem pela primeira vez a cidade enquanto organismo
global, implementando as bases de uma praxis arquitectónica e urbanística, a partir do
estabelecimento de uma arquitectura de programa, baseada em relações métricas de base
proporcional. São enviadas para todo o país normas arquitectónicas e urbanísticas sob a forma
de regimentos, contratos de obras e cartas régias, que emitidas a partir de um núcleo central,
diluem progressivamente as autonomias estéticas e as práticas construtivas de tradição
medieval por que se regiam os diferentes estaleiros e obras régias.
É assim divulgada uma praxis arquitectónica e urbana de programa, cujos conteúdos estéticos
manifestam uma teorização de inspiração aritmética com aplicação de séries numéricas –
6,12,15,24 e 30 – de base proporcional. Pela primeira vez nestes regimentos e contratos de
obra é proposta a sistematização da largura do nembo e a determinação de vãos rectos,
quadrados por cima, em métricas de quadrado, duplo quadrado e rectângulos proporcionais.
Com uma forte insistência, os vãos de sacada são definidos nas medidas de 6x12 ou 5x10 (o
duplo quadrado), medidas estas que se perpetuam ao longo de todo o período moderno.
Igualmente são propostas séries numéricas para vários blocos de arquitectura de programa,
estabelecendo relações geométricas entre o alçado e a planta (altura, largura e profundidade
do lote).
Dos finais do século XVI, resulta a definição de uma arquitectura de fachadas iguais, com
volumetrias simples, vãos normalizados, sacadas com dois palmos, afirmando-se uma
tipologia teorizada em métricas proporcionais e elementos construtivos estandardizados.
É ainda elaborado um Regimento “...dos carpenteiros e pedreiros e braceiros e aprendizes e
call e tijolo e madeira e pregadura...” que regula a qualidade, preço e medida dos materiais
de construção, determinando a estandardização de elementos construtivos. (Carita, 1999).
No período Pombalino, novamente um poder fortemente centralizado condicionou a aplicação
de uma normatividade, veiculada através de uma arquitectura de programa imposta através do
“prédio de rendimento”, motivando o aparecimento de um novo sistema de produção serial,
ainda que sob influência dos valores estéticos iluministas; as zonas atingidas pelo terramoto
constituíram a prioridade das acções desenvolvidas pelo governo de Pombal, destacando-se
no conjunto de planos elaborados para diferentes zonas da cidade, o emblemático plano da
Baixa.
Trata-se de um traçado ortogonal regular, simétrico, com uma praça central quadrada
funcionando como elemento gerador do plano, construída com edifícios que obedecem ao
mesmo programa. Decorrente do sistema de uniformização estandardizada, a arquitectura
sintetiza-se em quatro grandes tipos de fachadas uniformizadas.
9
“Toda a pedra de cantaria oriunda das pedreiras que forneciam as obras de reedificação de
Lisboa, veio da Corte já talhada e aparelhada, pronta para ser aplicada. (...) os cunhais, socos e
degraus de todas as casas de 1.º andar, as pilastras da Alfândega, as pilastras, socos e frontão
da Igreja. Também os guarnecimentos dos vãos, com um palmo de espessura como os de
Lisboa, chegaram já talhados e aparelhados, prontos para serem colocados nos locais
previstos nos projectos. Iriam guarnecer vãos que na sua totalidade formam um pequeno
número de modelos: vãos de 12/6 palmos (portas da Praça e da Baixa-Mar e janelas de
sacada); de 8/6 palmos (janelas do 1.º andar da Praça); de 7/6 palmos (janelas do rés-do-chão
da Praça); de 5/6 (janelas das casas térreas); de 5/8 (janelas laterais e traseiras do primeiro
andar da Baixa-Mar e traseiras do 1.º andar da Praça); 5/10 (portas das casas térreas); de
12/10 (portões de salgas, armazéns e similares). Para além destes modelos de forma
rectangular ficam apenas os dois tipos de portais barrocos da Baixa-Mar e da Praça.
Por exemplo, uma pedra de 8 palmos tanto servia para verga de porta de Praça e Baixa-Mar,
como de peitoril de janela de rés-do-chão ou peitoril, verga e ombreira de janelas do 1.º andar
da Praça. E as pedras de 7 palmos, além de servirem de verga de porta e peitoril de janelas das
casas térreas, serviam ainda para ombreira das janelas do rés-do-chão da Praça e de alizares,
vergas e ombreiras das janelas laterais e traseiras da Baixa-Mar e trapeiras da Praça” (Correia,
1984).
Cabe ainda referir o sistema de composição arquitectónica utilizado nos blocos de edifícios
que integram o plano do Bairro Fabril das Amoreiras, com base na leitura de Walter Rossa.
O esquema do alçado resume-se a um par de janelas em rectângulos de !2 no piso superior;
uma janela próxima do quadrado e uma porta em duplo quadrado no rés-do-chão. Um
quadrado de cerca de trinta e dois palmos, define o alçado de uma casa, estando a cumeeira a
uma altura, que com o plano da fachada, completa mais uma vez um rectângulo !2. Os trinta
e dois palmos exactos relativos às oito casas que constituem a frente de cada quarteirão,
dariam duzentos e cinquenta e seis palmos, valor próximo dos duzentos e sessenta cotados na
planta. Seiscentos e quarenta (para o comprimento da praça) divididos pelos quarenta da
largura das ruas dão dezasseis; dezasseis é o número de lotes por quarteirão tipo, dezasseis
palmos é o lado de cada quadrado onde se insere um vão da fachada que por sua vez se
compõe (incluindo as guarnições de cantaria) a partir de um quadrado com oito palmos de
lado; a largura das ruas é cinco vezes oito palmos.
Em planta, cada lote ocupa na profundidade !2 da largura, o que faz com que o corte em
profundidade do edifício nos dê também um rectângulo !2, que ao nível do topo da cumeeira
é também um quadrado.
Bairro das Águas Livres – Casas do projecto Pombalino Praça das Amoreiras, N.ºs 25 a 32.
in Rossa, W. (1998) 125.
A Vila operária constitui a génese do percurso estabelecido em torno das questões ligadas à
prática da habitação social, iniciando em Lisboa por intermédio da iniciativa privada uma
primeira actuação neste domínio, seguida pelas designadas “vilas à escala urbana” que “(...)
pelo volume de edificação, ou pela complexidade da sua estrutura, atingem uma escala que as
impõe ao nível do espaço da cidade, constituindo neste último caso um sistema viário que,
sem perder o carácter segregado, ganha uma dimensão urbana. É assim que surgem
verdadeiras unidades de habitação horizontal, como o Bairro Estrela D`Ouro, ou conjuntos
massivos de blocos em altura, como o Bairro Clemente Vicente”(Pereira, 1999).
Depois de 1910, os republicanos, fazendo valer a sua dedicação à causa operária sob a
designação de bairros sociais, desencadeiam uma intervenção pública sistematizada neste
domínio, pondo em andamento uma máquina administrativa reguladora da produção
habitacional; surgem assim os bairros sociais da Ajuda e Arco do Cego, que acabam por ser
concluídos no contexto das Casas Económicas criado pelo Estado Novo, inaugurando a
intervenção directa do Estado em colaboração com as Câmaras Municipais, os corpos
administrativos e os organismos corporativos. Nesta sequência surge a Federação de Caixas
de Previdência – Habitações Económicas, que entre os anos 40 e 60 se constitui como
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principal promotor de habitação social, estreando-se com a construção do Bairro de Alvalade.
Paralelamente ao seu funcionamento, estabelece-se na Câmara Municipal o GTH – Gabinete
Técnico de Habitação, responsável pelo lançamento das grandes operações urbanísticas de
Olivais e Chelas. A continuidade destas operações poderá ser avaliada através do Fundo de
Fomento da Habitação, por via dos Planos Integrados. O SAAL, pelas suas características,
desde o contexto político à relação estabelecida entre projectista e destinatário, constitui-se
como excepção, constituindo as cooperativas e as grandes operações de realojamento os elos
mais recentes neste percurso centenário.
Na sua dimensão de tipo arquitectónico e admitindo com Caniggia que “un determinado
entorno cívico que tenga caracteres de unidad cultural, tiende a realizar homogéneamente las
estruturas edilícias de las que se sirve; queremos decir que en una misma época y en un
mismo lugar las estruturas realizadas, sí actúan para resolver exigencias similares, tienden a
ser idénticas; y en un mismo lugar las estructuras que se suceden en el tiempo tienden a
modificarse unitariamente, a excepción de traumas o intervenciones externas, y a conformar
lo que denominamos processo tipológico” (Caniggia, 1973), verificamos que a Vila operária
sobrevive nas experiências que imediatamente lhe sucederam e das quais destacamos o Bairro
Estrela D`Ouro; na sua adaptação morfológica aos bairros periféricos do pós-guerra e ainda
através da persistência de elementos formalizadores tais como a galeria, largamente divulgada
nas propostas desenvolvidas entre 1947 e 1972 no contexto específico do movimento
moderno.
Bairro Clemente Vicente – Sistema distributivo Pantera-cor-de-rosa in Revista Arquitectura, N.º 141(III)1981.
A tipologia é abordada como uma ferramenta precisa e analítica, proporcionando uma base
racional no processo de concepção, enquanto que a ideia de tipo se prende com uma procura
de sentido mais lacta, estabelecendo uma ideia de continuidade histórica, tida como necessária
ao conferir à arquitectura um sentido dentro de uma determinada cultura.
O tipo surge “(...)mas que como un recuento a posteriori de semejanzas en objectos de un
conjunto, como aquél sistema de nociones correlativas (dimensiones, materiales, forma, usos,
etc.) que son el bagage de la experiencia antecedente en la actuación de cada individuo, y que
constiuyen su patrimonio cultural, la base de cada formulación específica, el proyecto no
debujado pero mentalmente existente, que atenderá a la creación de cada objecto futuro. El
tipo puede considerarse así una prefiguración sintética del objecto, una síntesis a priori. Bajo
estas premissas podemos aislar comportamientos tipificados, codificados y por tanto
reconocibles para nosotros, en un cierto intervalo espacial y temporal. También podemos
verificar la variación de esos comportamientos al cambiar tal intervalo. Podremos, por tanto,
reconstruir una serie de procesos tipológicos que conectan objectos análogos de diversas
épocas, rastreando las mutaciones en la codificación espontánea de los tipos”.(Pozo y Barajas,
1996).
Referências:
Goethe, J.W. (1992) La Métamorphose des plantes et autres écrits botaniques (Triades, 3º Ed.,
Paris).
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Kubler, G. (1972) A Arquitectura Portuguesa Chã – entre as Especiarias e os diamantes 1521-
1706 (Col. Artes/História, Ed. Vega, Lisboa).
Pereira, N. T. e Buarque, I. (1995) Prédios e Vilas de Lisboa (Livros Horizonte, Lisboa) 348.
Pereira, N. T. (2002) ´Pátios e Vilas de Lisboa, 1870-1930`, Jornal Arquitectos N.º 204, 38.
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