G3 - O Amor Romântico
G3 - O Amor Romântico
G3 - O Amor Romântico
responde com um beijo na testa. Esse passa a ser um segredo compartilhado pelos
amantes, que trocam olhares e se comunicam por gestos e sinais. O objetivo desse
jogo de conquista não é a consumação do contato carnal, pois o casamento não estava
ligado à paixão e ao sexo, e sim à imaginação e idealização. “Do amor fazem parte a
aventura e a liberdade, e não as obrigações e as dívidas” (LINS, 2007. p.74). Os
trovadores não desejavam possuir suas damas.
O nobre senhor e esposo da dama aceita as regras do jogo e dispõe da jovem como
numa aposta. Ela é uma “isca”. “O dever de um bom vassalo era servir, e isso o amor
cortês ensinava bem. Assim, praticavam a submissão, a fidelidade, o esquecimento de
si próprios. O que mais poderia desejar um senhor dos seus vassalos?” (LINS, 2007.
p.82).
teve auge entre 1650 e 1660. Mulheres reivindicavam igualdade nos papéis masculinos
e femininos e queriam se afastar das tarefas maternas. “A preciosa é uma mulher
independente, que propõe soluções feministas ao seu desejo de emancipação e inverte
totalmente os valores sociais tradicionais” (LINS, 2007. p.121). Ela é contra o
casamento, contra a autoridade masculina e luta pela melhoria da educação feminina.
Somente a partir do século XVIII que o amor virou um valor familiar ou social. Nesse
período, as mulheres passaram a ficar mais em casa cuidando do marido e dos filhos.
O grupo familiar se afasta da sociedade tornando o lar um lugar mais reservado.
divino. Hoje, devido ao desenvolvimento cultural das sociedades ocidentais, seria difícil
existir casamento sem amor, pois as sociedades já estão acostumadas com essa forma
de encarar os relacionamentos a dois.
O amor está ligado diretamente à felicidade. O homem moderno está sempre em
busca da felicidade que ainda não foi atingida, mas que faz parte dos planos para o
futuro. Sempre para o futuro, pois o passado já aconteceu meio a erros e a
insatisfações. O presente também não é o estado que atende as expectativas do que
seja felicidade para o indivíduo, sempre existe algo que pode ser mudado, por isso ele
faz planos e projeções de ideais futuros.
A mídia é responsável por grande parte dessa busca incontrolável pelo amor e pela
felicidade. De acordo com Edgar Morin, autor de Cultura de Massas no século XX:
neurose, o amor atingiu um aspecto obsessional ainda no amor cortês, passando por
outras fases até chegar nos tempos de hoje, em que a cultura de massa universaliza o
amor e o torna cada vez mais obsessivo. “O amor decantado, fotografado, filmado,
entrevistado, falsificado, desvendado, saciado parece natural, evidente. É porque ele é
o tema central da felicidade moderna” (MORIN, 1997. p.131).
A partir do surgimento da cultura de massa, o tema “amor” passou a ser mais
abordado. O discurso sobre a temática adquiriu um caráter liberal e conseguiu
convencer a todos de sua importância e necessidade. Na década de 30 já vigorava,
segundo Morin, o sentido do happy end, muito influenciado pelo cinema hollywoodiano.
O amor é retratado hoje na mídia contrapondo os tabus que existiam no passado e
como um jogo cria diversas situações que passaram a ser seguidas e imitadas pela
sociedade. E tudo isso porque a mídia é sedutora e foi capaz de proferir um discurso
vencedor que fez o amor assumir forma fundamental para a realização pessoal. O
teatro, o cinema, as novelas e os livros são alguns bons exemplos de fontes de
inspiração para cada indivíduo. Neles, o falso se mistura com o real, suas histórias
criativas se confundem com a vida autêntica.
O amor hoje, por causa da cultura de massa, ganhou novo significado. Para Morin, o
amor é mais amor quando o sentido principal da vida está no casal. Quando o amor
vence a destruição, desafia o fim dos tempos e a morte. Quando ele é um valor central
da existência.
26
O sociólogo Anthony Giddens ainda divide o amor em mais uma categoria, que
segundo ele cabe mais especificamente aos tempos modernos. Além do amor
romântico ele apresenta o conceito do amor apaixonado. Os dois, para Giddens, são
basicamente os mesmos, mas o apaixonado, como o próprio nome sugere, é mais
intenso e se refere diretamente ao desejo sexual ligado ao amor. Ele é um sentimento
mais emocional do que racional.
Agora, diferente do amor cortês, que nunca une o sexo com o amor, o romântico
cria o momento adequado para a relação sexual. Primeiro vem a paixão para depois vir
o sexo. Hoje há uma separação de significados para o ato sexual dentro do amor
romântico: quando o sexo é feito com amor fala-se “fazer amor”. Termos como “fazer
sexo” ou “transar” é para a falta do sentimento, para o sexo casual.
O amor romântico se transformou num sentimento de massa no Ocidente. As
pessoas passaram a acreditar que só seriam felizes ao lado de um grande amor.
Quando um pretendente ao grande amor é encontrado e há paixão envolvida, ambos
crêem que o romance será para a vida inteira. Na verdade, mais do que estar sempre à
procura do verdadeiro amor, o ser humano, especialmente a mulher, tende a estar
sempre em busca da encantada felicidade. Na cultura ocidental e moderna ter um
grande amor é o que complementa uma vida feliz, estar sozinho é sinal de infelicidade.
Ocorre que a sensação do “para sempre” tem prazo de duração. O ser humano
“ama o fato de amar, ama estar amando. Apaixona-se pela paixão” (LINS, 2007. p.91).
Julga o amor romântico como sendo o amor verdadeiro. Só que quando o
encantamento pelo outro acaba, a pessoa se sente frustrada e novamente surge a
noção de que seu mundo é infeliz e vazio. Até o momento em que ela se sente
preparada para encarar tudo outra vez e sai em busca de um novo amor. As pessoas
não entram num relacionamento achando que o amor acabará e que haverá tédio ao
dividi-lo com uma única pessoa, seja afetiva ou sexualmente.
Para compreender a raiz desse sentimento, o sociólogo Zygmunt Bauman diz que o
sentimento amoroso é socialmente construído. Ele acredita que a cultura começa a
partir do momento em que há o encontro dos sexos, quando o homem sente a
necessidade de se unir ao outro. E o sexo é um acontecimento natural, é “o primeiro
ingrediente” para que ocorra a união e que a cultura se desenvolva, ou seja, a partir daí
“distinções artificiais, convencionais e arbitrárias”, regras que cada cultura possui,
começam a surgir. “A proibição do incesto: a divisão das fêmeas em categorias
disponíveis e indisponíveis para a coabitação sexual” (BAUMAN, 2004. p.55).
Bauman mostra que o sexo não é por acaso. O homem se interessa pelo sexo por
ser um animal, afinal a espécie deve ser preservada. Qualquer animal possui esse
instinto. O que torna os seres humanos diferentes, avançados em relação a outras
espécies, é a capacidade de sentir desejo pelo outro. Este sim é “incontestavelmente
social”, termo usado pelo autor.
Trata-se de um acordo, pois não pode haver nem cultura nem sociedade sem a
união entre os sexos. Só a partir desse encontro que sociedade e cultura
28