Interpr - 4
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Meu ideal seria escrever uma história tão engraçada que aquela moça que está naquela casa cinzenta
quando lesse minha história no jornal risse, risse tanto que chegasse a chorar e dissesse – “ai meu Deus, que
história mais engraçada!” E então a contasse para a cozinheira e telefonasse para duas ou três amigas para
contar a história; e todos a quem ela contasse rissem muito e ficassem alegremente espantados de vê-la tão
alegre. Ah, que minha história fosse como um raio de sol, irresistivelmente louro, quente, vivo, em sua vida
de moça reclusa (que não sai de casa), enlutada (profundamente triste), doente. Que ela mesma ficasse
admirada ouvindo o próprio riso, e depois repetisse para si própria – “mas essa história é mesmo muito
engraçada!”.
Que um casal que estivesse em casa mal-humorado, o marido bastante aborrecido com a mulher, a
mulher bastante irritada como o marido, que esse casal também fosse atingido pela minha história. O marido
a leria e começaria a rir, o que aumentaria a irritação da mulher. Mas depois que esta, apesar de sua má-
vontade, tomasse conhecimento da história, ela também risse muito, e ficassem os dois rindo sem poder
olhar um para o outro sem rir mais; e que um, ouvindo aquele riso do outro, se lembrasse do alegre tempo de
namoro, e reencontrassem os dois a alegria perdida de estarem juntos.
Que nas cadeias, nos hospitais, em todas as salas de espera, a minha história chegasse – e tão
fascinante de graça, tão irresistível, tão colorida e tão pura que todos limpassem seu coração com lágrimas
de alegria; que o comissário (autoridade policial) do distrito (divisão territorial em que se exerce autoridade
administrativa, judicial, fiscal ou policial), depois de ler minha história, mandasse soltar aqueles bêbados e
também aquelas pobres mulheres colhidas na calçada e lhes dissesse – “por favor, se comportem, que diabo!
Eu não gosto de prender ninguém!” E que assim todos tratassem melhor seus empregados, seus dependentes
e seus semelhantes em alegre e espontânea homenagem à minha história.
E que ela aos poucos se espalhasse pelo mundo e fosse contada de mil maneiras, e fosse atribuída a
um persa (habitante da antiga Pérsia, atual Irã), na Nigéria (país da África), a um australiano, em Dublin
(capital da Irlanda), a um japonês, em Chicago – mas que em todas as línguas ela guardasse a sua frescura, a
sua pureza, o seu encanto surpreendente; e que no fundo de uma aldeia da China, um chinês muito pobre,
muito sábio e muito velho dissesse: “Nunca ouvi uma história assim tão engraçada e tão boa em toda a
minha vida; valeu a pena ter vivido até hoje para ouvi-la; essa história não pode ter sido inventada por
nenhum homem, foi com certeza algum anjo tagarela que a contou aos ouvidos de um santo que dormia, e
que ele pensou que já estivesse morto; sim, deve ser uma história do céu que se filtrou (introduziu-se
lentamente em) por acaso até nosso conhecimento; é divina.”
E quando todos me perguntassem – “mas de onde é que você tirou essa história?” – eu responderia que
ela não é minha, que eu a ouvi por acaso na rua, de um desconhecido que a contava a outro desconhecido, e
que por sinal começara a contar assim: “Ontem ouvi um sujeito contar uma história…”
E eu esconderia completamente a humilde verdade: que eu inventei toda a minha história em um só
segundo, quando pensei na tristeza daquela moça que está doente, que sempre está doente e sempre está de
luto e sozinha naquela pequena casa cinzenta de meu bairro.
1) Por que o autor deseja escrever uma história engraçada?
2) Por que ele diz que a moça tem uma casa cinzenta, e não verde, azul ou amarela?
3) Ao descrever um raio de sol, o autor lhe atribui características que, de certa forma, se opõem às da
moça. Cite algumas dessas características opostas.
4) Como você interpretaria a oração “que todos limpassem seu coração com lágrimas de alegria”?
5) O autor sonha em tornar mais felizes e sensíveis apenas as pessoas de seu país? Justifique.
(a) moça triste ( ) libertaria os detentos, dizendo-lhes para se comportarem, pois não
gostava de prender ninguém
(b) amigas da moça triste ( ) sentir-se-ia tão feliz que se lembraria do alegre tempo de namoro
(d) comissário do distrito ( ) concluiria que teria valido a pena viver tanto, só para ouvir uma história
tão engraçada
(e) sábio chinês ( ) ficaria feliz e contaria a história para a cozinheira e as amigas
7) Por que o autor não contaria aos outros que havia inventado a história?
8) Na sua opinião, o que mais sensibiliza as pessoas: histórias engraçadas ou dramáticas? Justifique.