Manual de Directrizes de Prevencao Da Criminalidade

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Manual de diretrizes

de prevenção à criminalidade
Aplicação Prática

SÉRIE DE MANUAIS DE JUSTIÇA CRIMINAL


Fotografia no centro da capa: © Emily Chastain
ESCRITÓRIO DAS NAÇÕES UNIDAS DA DROGA E O CRIME
Viena

Manual de Diretrizes
de Prevenção à Criminalidade

Aplicação Prática
SÉRIE DE MANUAIS DE JUSTIÇA CRIMINAL

NAÇÕES UNIDAS
Nova Iorque, 2010
PUBLICAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS
Vendas No. E.10.IV.9
ISBN 978-92-1-130300-1

© Escritório das Nações Unidas da Droga e o Crime, Agosto de 2010. Todos os direitos são reservados.

As designações aqui empregues, bem como a matéria apresentada na publicação actual, não implicam
a expressão de qualquer opinião, seja ela a que for, por parte do Secretariado das Nações Unidas, no
que se refere à situação jurídica de qualquer país, território, cidade ou zona, ou as suas autoridades,
nem em relação à sua definição de fronteiras ou limites nacionais.

São providenciadas informações sobre os localizadores uniformes de recursos (URL) e as ligações aos
sítios Internet contidos na publicação actual, para a conveniência do leitor, e cabe ressaltar que as mes-
mas se encontravam correctas à data de publicação. As Nações Unidas não assumem a responsabilidade
pela continuação da precisão dessas informações, ou pelo conteúdo de qualquer sítio Web externo.

Produção editorial: Inglês, Secção de Publicação e Biblioteca, Escritório das Nações Unidas em Viena.
Reconhecimentos
O Manual de Diretrizes de Prevenção à Criminalidade: Aplicação Prática, foi preparado para o
Escritórios das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC) por Margaret Shaw, Directora
de Análise e Intercâmbio do Centro de Prevenção Internacional do Crime, em Montreal, no
Canadá. Recorreu ao esboço do conceito desenvolvido por Valerie Sagant, Director-Geral, e
Vivien Carli, Analista, do Centro de Prevenção Internacional do Crime.

O Manual foi analisado por um grupo de especialistas durante reuniões no Ministério Federal da
Justiça, em Berlin, de 2 a 4 de Julho de 2008, e, em Montreal, a 26 de Junho de 2009. A UNODC
gostaria de agradecer as valiosas contribuições feitas por Kauko Aromaa, Alioune Badiane,
Rosemary Barbaret, Claudio Beato, Oscar Bonilla, Elias Carranza, Benoit Dupont, Barbara
Holtmann, Peter Homel, Mary-Anne Kirvan, Erich Marks, Albert Alvarado Mendoza, Laura
Petrella, Valerie Sagant, Benjamin Santa Maria, Masamba Sita, Cindy Smith, Elrena Van der
Spuy e Jennifer Wood.

Também gostaria de agradecer ao pessoal da UNODC mencionado abaixo, pela sua contribuição
no desenvolvimento do relatório: Estela-Maris Deon, Slawomir Redo, Anna Giudice Saget e Oliver
Stolpe, bem como Julien Piednoire (estagiário).

O Centro de Prevenção Internacional do Crime agradece ainda o apoio do Governo do Canadá


no desenvolvimento do Manual. A UNODC também reconhece com gratidão o financiamento
providenciado pelo Departamento de Assuntos Estrangeiros e o Comércio Internacional do
Canadá para a impressão e distribuição do Manual, bem como a sua tradução para francês,
português e espanhol.

iii
Índice
Introdução............................................................................................................. 1
A. Introdução ao Manual............................................................................................................................. 1
B. Público-Alvo do Manual.......................................................................................................................... 3
C. A importância do contexto na prevenção da criminalidade:
países de rendimento elevado, médio ou baixo . ......................................................................... 4
D. Ajuda dos doadores, eficácia e sustentabilidade.......................................................................... 5
E. Experiência ampla..................................................................................................................................... 7

I. A prevenção à criminalidade: uma introdução...................................... 9


A. Conceitos sobre a prevenção da criminalidade............................................................................ 9
B. Abordagens colectivas de prevenção da criminalidade
e o papél importante dos Governos................................................................................................ 18
C. Os princípios básicos subjacentes às Diretrizes de Prevenção da Criminalidade......... 22
D. Apoio internacional para as diretrizes de prevençãon da criminalidade
adoptadas pelas Nações Unidas...................................................................................................... 25
E. Acionamento de Diretrizes de Prevenção da Criminalidade: componentes
principais para desenvolver estratégias de prevenção abrangentes e efectivas.......... 27

II. O contributo fundamental dos Governos............................................29


A. A prevenção da criminalidade enquanto características permanente do governo..... 29
B. Uma autoridade central permanente............................................................................................. 30
C. Um plano com prioridades e metas claras................................................................................... 33
D. A coordenação e as parcerias multissectoriais........................................................................... 34
E. A educação pública e os meios de comunicação social......................................................... 37
F. A sustentabilidade e o controlo da execução dos programas.............................................. 39
G. Formação e capacitação de Governos e outros órgãos.......................................................... 41

III. A prevenção à criminalidade baseada no conhecimento................47


A. A base de uma prevenção proactiva e eficaz.............................................................................. 47
B. O conhecimento mais amplo e inclusivo...................................................................................... 48
C. Tipos de conhecimento necessários.............................................................................................. 50
D. Desenvolver o conhecimento baseado em provas factuais.................................................. 54
E. Fontes de dados e instrumentos para aplicar o conhecimento
baseado em provas factuais.............................................................................................................. 56

v
IV. Planificação, monitoria e avaliação.........................................................65
A. O processo de planificação................................................................................................................. 65
B. Articulação de estratégias sobre o crime organizado transnacional e as
estratégias nacional e local................................................................................................................ 67
C. Planificar e aplicar a política nacional............................................................................................. 69
D. Planificar a nível do governo local.................................................................................................... 73
E. Aplicação e avaliação........................................................................................................................... 81

V. A abordagem multidisciplinar e o trabalho em parceria..................89


A. As parcerias: uma componente desafiadora mas importante.............................................. 89
B. Um parceiro chave: a polícia.............................................................................................................. 92
C. Vários parceiros chave: os sectores de planificação urbana e meio-ambiente........... 100
D. Vários parceiros chave: o sector da justiça e os serviços de reinserção.........................101

VI. Trabalhar com comunidades e a sociedade civil.............................105


A. Melhoramentos resultantes da prevenção à criminalidade............................................... 105
B. A mobilização da sociedade civil.................................................................................................. 106
C. A contribuição das organizações não-governamentais....................................................... 108
D. O envolvimento do sector privado.................................................................................................111

VII. Conclusão..................................................................................................115

vi
CHAPTER IV

Introdução

A. Introdução ao Manual

Todos os países experimentam o crime, a violência e a vitimização. Isto pode conduzir a deter-
minadas situações, conforme descrito a seguir: países com uma elevada percentagem de rapazes
que perdem a vida antes de atingirem a idade adulta; sociedades com famílias que perderam
o pai ou cujos membros da família se encontram presos, a viverem na pobreza e sem acesso a
qualquer meio de sustento ou fontes de rendimento legítimas; vizinhanças que experimentam
lutas entre bandos armados ou onde parece haver pouca proteção e segurança públicas; mul-
heres sujeitadas a violência nos seus próprios lares, ou que correm o risco de sofrer a agressão
sexual em espaços públicos; bairros onde os níveis de crime e de insegurança levaram a que os
negócios e as famílias se sentissem isolados dos outros cidadãos e do âmbito público, refugian-
do-se atrás de portas, obrigados a empregar meios de segurança privados; e emigrantes e grupos
minoritários a residirem em áreas dilapidadas e isoladas, ou em favelas, sujeitos a perseguições
e a vitimização raciais.

Todos os países se esforçam para garantir a segurança dos seus cidadãos e para aumentar a quali-
dade das suas vidas. As directrizes de prevenção da criminalidade desenvolvidas pelas Nações
Unidas vêm englobar e edificar sobre os largos anos de experiência e tentativas de esforço en-
vidados, no sentido de responder a estes desafios. A dita experiência mostra que os países po-
dem construir comunidades mais seguras ao empregarem abordagens mais práticas e concretas,
muito diferentes, e menos caras, do que as reações e respostas repressivas de dissuação.

O Manual actual é um dos instrumentos práticos desenvolvidos pelo Escritórios das Nações
Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC), como forma de apoio aos países na articulação de
padrões e normas aplicáveis tanto na prevenção da criminalidade e a justiça criminal. Tais pa-
drões e normas destinam-se a promover o Estado de Direito, os direitos humanos e uma cultura
de legalidade, através de se desenvolverem reformas no sentido da prevenção da criminalidade
e o apoio à justiça criminal. O Manual pode ser aplicado a uma grande variedade de contextos
diferentes, incluindo como parte dos projectos da UNODC sobre a assistência técnica e capaci-
tação, quer como documento de referência ou ferramenta de formação. Até já existe um número

1
2 MANUAL DE DIRETRIZES DE PREVENÇÃO À CRIMINALIDADE: APLICAÇÃO PRÁTICA

de projectos afins, incluindo a Ferramenta de Avaliação sobre Prevenção ao Crime1 e o Manual de


Planejamento e Ação para a prevenção ao crime nas regiões do Sul de África e do Caribe.2

O Manual oferece uma síntese das considerações principais a ter em conta em ações de plane-
jamento e na articulação de estratégias e intervenções de prevenção ao crime. Também recon-
hece a existência de diferenças de maior entre as regiões e os países, em termos de desafios
colocados pela criminalidade e a vitimização, bem como a importância de se adaptarem os pro-
gramas aos contextos locais. A ênfase principal recai sobre a forma como as estratégias de pre-
venção da criminalidade com base em diretrizes desenvolvidas pelas Nações Unidas, podem ser
enraizadas e sustentadas ao longo do tempo.

Dois grupos de diretrizes de prevenção à criminalidade foram adoptados pelo Conselho


Económico e Social, em 1995 e 2002. Estas são, respectivamente, Diretrizes para Cooperação
e Assistência Técnica no Campo da Prevenção à Criminalidade Urbana (Resolução 1995/9 do
Conselho Económico e Social, em anexo) e Diretrizes para a Prevenção ao Crime (Resolução
2002/13 do Conselho, anexo). Em conjunto com as resoluções tomadas mais recentemente, es-
tas vão enfatizar a necessidade de se montarem estratégias de prevenção à criminalidade lado
a lado com a reforma da justiça criminal. Em 2002, por exemplo, a Assembleia Geral, na sua
resolução 56/261, convidou os Estados, entre outras coisas, a prestarem apoio no sentido de pro-
moverem uma colaboração estreita entre os sectores da justiça, saúde, educação e habitação, de
forma a ajudarem na prevenção mais eficaz da criminalidade, e para poderem efectuar trabalhos
em conjunto com a sociedade civil. A sua resolução de 2005/22, resolução esta do Conselho
Económico e Social, instou com a UNODC para que esta última prestasse devida atenção à
prevenção ao crime com vista a atingir a abordagem equilibrada da prevenção à criminalidade
e resposta da justiça criminal.

Dada a crescente concentração de crime e vitimização nas cidades, as Diretrizes para Cooper-
ação e Assistência Técnica no Campo da Prevenção à Criminalidade Urbana centram-se numa
forma melhor de projectar e articular a prevenção à criminalidade nas zonas urbanas. Reco-
mendam que os projectos de cooperação para prevenção à criminalidade urbana sejam apoiadas
numa abordagem local dos problemas da criminalidade e no uso de um plano de ação integrado
de prevenção da criminalidade com base num diagnóstico local dos problemas, sugerindo ainda
que fosse envolvida toda uma gama de actores, levando em conta a importância de fatores como
o alojamento, a saúde e a educação, e considerassem a previsão de uma ação que pudesse ir
desde a prevenção preliminar até à prevenção da reincidência.

As Diretrizes também identificam claramente certas obrigações das autoridades a todos os


níveis, no sentido de se articular o plano de ação, inclusivamente o respeito pelos próprios di-
reitos humanos, encorajando ou implementando a formação e informação mais adequadas e
proporcionando uma avaliação regular das estratégias executadas, de modo a averiguar o seu
grau de eficácia e efectuar a análise das mesmas sempre que for preciso.

As Diretrizes para a Prevenção ao Crime estão baseadas nas diretrizes adoptadas em 1995. De-
screvem os benefícios consideráveis que uma boa prevenção ao crime pode trazer às cidades

1 Escritórios das Nações Unidas sobre Drogas e Crime e o Programa das Nações Unidas para os Assentamentos
Humanos, Assuntos Transversais : Ferramenta de Avaliação sobre Prevenção ao Crime (HS/1232/09 E), Estojo de Ferramentas
de Avaliação de Justiça Criminal, No. 5 (Nova Iorque, 2009).

2 Publicação das Nações Unidas, Vendas No. E.10.IV.9


INTRODUÇÃO  3

e as zonas urbanas, desde realçar a qualidade de vida social e económica das cidades e os seus
habitantes, até a ajuda na redução das despesas a longo prazo acarretadas pela justiça criminal,
a saúde e outros serviços:

Há evidência clara de que estratégias bem programadas de prevenção ao crime não só


previnem contra a criminalidade e a vitimização, como também promovem a segurança
da comunidade e contribuem para o desenvolvimento sustentável dos países. Uma pre-
venção à criminalidade que seja, ao mesmo tempo, efectiva e responsável, irá realçar a
qualidade de vida de todos os cidadãos. Terá benefícios duradouros quanto à redução
de custos afectos ao sistema judicial criminal formal, bem como no que se refere a out-
ros custos resultantes do crime. A prevenção ao crime oferece oportunidades para uma
abordagem mais humana e com melhor custo-benefício dos problemas do crime. (pará-
grafo 1 das Diretrizes).

Desde que estas diretrizes foram adoptadas, houve novamente atenção para o impacto que têm
a globalização e o crescimento urbano rápido sobre os níveis de crime e vitimização, mais espe-
cialmente nas zonas urbanas sobrelotadas. A recessão económica veio reforçar as preocupações
com o impacto da globalização e urbanização sobre a segurança e a protecção. A importância
de se desenvolverem intervenções de planejamento em resposta a mudanças mais alargadas,
torna-se cada vez mais evidente. Na sua resolução 2008/24, o Conselho Económico e Social ape-
lou mais uma vez para que fosse prestada mais atenção para a prevenção ao crime urbano, res-
saltando a importância duma abordagem integrada dos aspectos de prevenção à criminalidade
em políticas e programas relevantes.

Nos anos recentes, a comunidade internacional tem vindo a reconhecer que o desenvolvimento
em geral, e a consecução dos Objectivos de Desenvolvimento para o Milénio em particular,
estão condicionados ao estabelecimento de segurança e protecção nas sociedades. Os elevados
níveis de criminalidade nas cidades e comunidades são detrimentais para a sociedade e o pro-
gresso económico, bem como para o moral e o bem-estar dos cidadãos. Tal como referido no
relatório do Secretário Geral sobre o estado de lei e a justiça de transição em sociedades pós-
conflito (S/2004/616): “a prevenção é o primeiro imperativo da justiça criminal”.

B. Populações-alvo do Manual
Este Manual foi escrito com um público-alvo muito diversificado em mente. Sendo o principal
dentre eles os Governos, já que, como ressaltam as Diretrizes de Prevenção à Criminalidade, os
Governos desempenham um papél preponderante no desenvolvimento das políticas gerais, e na
promoção, coordenação e apoio à prevenção do crime. Os princípios em que assentam as Di-
retrizes são relevantes para todos os países e todos os escalões de governo, independentemente
das suas estruturas políticas ou administrativas ou a sua fase de desenvolvimento. Portanto, os
governos nacional, regional e local terão toda a oportunidade e um papél significativo a desem-
penhar. Este Manual apresenta exemplos de estratégias e desenvolvimento de programas que
podem ser de grande valor para os decisores e praticantes profissionais a todos os escalões de
governo, e nos âmbitos de rendimento baixo, médio e alto. Um dos aspectos de maior relevância
para o investimento em políticas de prevenção à criminalidade, passa pela redução significativa
dos custos associados à justiça criminal e outros serviços públicos, o que, por sua vez, se traduz
em benefícios consideráveis para a sociedade.
4 MANUAL DE DIRETRIZES DE PREVENÇÃO À CRIMINALIDADE: APLICAÇÃO PRÁTICA

A segunda população-alvo inclue os doadores e as agências de cooperação, quer ao nível na-


cional, regional ou internacional. A prevenção à criminalidade e a redução da violência desem-
penham um papél de crescente importância em programas de desenvolvimento destes órgãos.
O presente Manual fornece orientações sobre os instrumentos determinantes das componentes
principais de programas e trabalhos de assistência técnica, a que os mesmos vêm prestar apoio.

Por fim, o pessoal com aptidões e papéis diferentes na prevenção à criminalidade, quer sejam
os decisores, oficiais da polícia, juízes e advogados, funcionários de reinserção social, assistentes
sociais, profissionais de saúde e outros, pesquisadores, organizações da sociedade civil ou comu-
nidade, encontrarão exemplos, referências e recursos aqui que lhes irão ajudar a desenvolver e
implementar os projectos.

O presente Manual visa atingir todas estas populações-alvo. Abrange os princípios básicos das
Diretrizes de Prevenção à Criminalidade e explora a gama já existente de abordagens que tratem
a prevenção à criminalidade, e as recomendações principais sobre como elaborar uma estratégia
ou programa de prevenção à criminalidade com base nestes princípios. Inclue informação sobre
os tipos de método e ferramentas necessários para que os mesmos possam ser empregues e se
tornem cada vez mais acessíveis.

Os capítulos I, II e III apresentam uma síntese sobre as abordagens diferentes de prevenção à


criminalidade, a importância da liderança do governo ao desenvolver a política estratégica e
para facilitar a sua implementação, e os tipos de informação e recursos necessários para que
possam ser produzidos programas eficazes. Os altos funcionários do governo, responsáveis por
aspectos relacionados com a segurança e a proteção aos níveis nacional ou local, irão encontrar
relevância específica nestas seções.

Os capítulos IV, V e VI analizam pormenorizadamente o planejamento e a implementação, os


desafios do trabalho em parcerias multissectoriais, e o papél da sociedade civil rico em possibi-
lidades. Os praticantes profissionais, administradores de política e directores e os pesquisadores
que trabalham mais directamente com as pessoas, bem como as organizações da sociedade civil,
irão achar utilidade nestas seções.

São incluídos exemplos de técnicas, projectos e ferramentas. Também há informação sobre


fontes e recursos úteis.

C. A importância do contexto local na prevenção à


criminalidade: países de rendimento alto, médio
ou baixo3
Muitos programas de prevenção à criminalidade foram inicialmente desenvolvidos e avaliados
em países de rendimento elevado com recursos elevados, mas a experiência de países como es-
ses nem sempre é directamente aplicável ou adequado aos contextos menos desenvolvidos. A

3 A definição de rendimento alto, médio e baixo está baseada no Índice de Desenvolvimento Humano utilizado pelo
Programa de Desenvolvimento das Nações Unidas. Reune medidas de expectativa de vida, alfabetização e matrícula escolar,
e o produto interno bruto por capita. Em 2009 foi criada uma quarta categoria, a de ªrendimento muito elevadoª, embora
para os efeitos do presente Manual só se utilizarem as três categorias originais.
INTRODUÇÃO  5

discussão em torno de que tipos de programa e intervenções é que são eficazes, tem sido infor-
mada disproporcionadamente por pesquisas nos países mais desenvolvidos. Afirmações sobre a
eficácia das intervenções levaram diversos países a experimentarem duplicar programas já im-
plementados noutros países. Por exemplo, nos anos ’90, a África do Sul experimentou duplicar
uma série de abordagens de policiamento e prevenção que tinha granjeado bons resultados no
Reino Unido e os Estados Unidos.4

Esse tipo de duplicação não tem tido muito sucesso devido a constrangimentos diferentes em
situações distintas, e também devido ao facto do sucesso de um programa depender em larga
medida da forma como o mesmo é adaptado e articulado em relação às necessidades locais.

Felizmente, em anos recentes, este problema tem sido reconhecido e o enfoque desviado da
decisão sobre o que funciona, para o entendimento sobre o funcionamento dum projecto. Isto
resulta numa maior conscientização sobre a necessidade de se adequarem e adaptarem estraté-
gias de prevenção à criminalidade ao contexto de países e regiões individuais. A conjuntura dum
país económica e social de um país, os seus níveis de desenvolvimento e capacidade, bem como
a sua história política, são todos eles factores com influência sobre as necessidades desse país,
os problemas de criminalidade que enfrenta, e a viabilidade e pertinência das intervenções. As
Diretrizes de Prevenção à Criminalidade reconhecem isto e realçam a importância de se adap-
tarem as boas práticas aos contextos locais.

D. Ajuda dos doadores, eficácia e sustentabilidade


Os países em desenvolvimento muitas das vezes têm uma história recente de guerra e conflito,
o que cria constrangimentos consideráveis. Frequentemente, há falta acentuada de pessoal com
educação e treino, enquanto que infra-estruturas e serviços básicos fracos e taxas de desemprego
elevadas criam desafios enormes, para não falar dos altos índices de violência e vitimização.
No entanto, a experiência está a aumentar nos países de rendimento médio e baixo, e existem
algumas práticas eficazes bem avaliadas. Os intercâmbios sul-sul entre os países que enfrentam
desafios semelhantes em termos económicos e sociais, também estão em crescimento. Em vez
de se transplantarem programas de países de rendimento alto, os países de rendimento médio e
baixo estão a tornar-se cada vez mais inovadores na formulação de projectos em resposta às suas
circunstâncias, inspirando-se nos seus pontos fortes.

Nalguns destes países, todavia, a pressão do público tem sido enorme no sentido de haver uma
resposta mais dura e forte por parte da justiça criminal face a níveis de crime e violência grave-
mente elevados, daí resultando que a prevenção nunca chegou a ser inteiramente financiada ou
implementada.

Outra preocupação é que a ajuda dos doadores aos países em desenvolvimento na área da pre-
venção à criminalidade e justiça criminal, muitas das vezes revela-se ineficaz ou insustentável o
momento que os programas cheguem ao fim. Isto em parte devido às tendências dos países ou
organizações doadores de imporem os seus próprios calendários de financiamento e reporta-
gem, em vez de trabalharem juntos com os países parceiros para alcançar o desenvolvimento.
Mas tem havido mais atenção prestada para estes problemas. A Declaração de Paris sobre a

4 Erich Pelser, ed., Parcerias de Prevenção ao Crime: Lições da Prática (Pretória, Instituto de Estudos de Segurança, 2002)
6 MANUAL DE DIRETRIZES DE PREVENÇÃO À CRIMINALIDADE: APLICAÇÃO PRÁTICA

Eficácia da Ajuda ao Desenvolvimento: Apropriação, Harmonização, Alinhamento, Resultados


e Responsabilidade Mútua, por exemplo, salienta, entre outros factores, que é necessário envolv-
erem-se os países parceiros logo de início, na definição dos problemas e as soluções.5

A Declaração de Paris preocupa-se em realizar os Objectivos de Desenvolvimento do Milénio,


indicando maneiras em que os países doadores deveriam fazer a entrega e gestão da ajuda de
modo a aumentar o seu impacto sobre a redução da pobreza e a desigualdade, incrementar o
crescimento, edificar competências e acelerar a realização dos Objectivos.

A Declaração estabelece cinco comprometimentos sobre parcerias, com base em lições derivadas
da experiência, no que se refere a apropriação, alinhamento, harmonização, resultados e respon-
sabilidade mútua. Os mesmos foram desenvolvidos pensando no aumento da eficiência de ajuda
através da adaptação às diferenças contextuais dos países, e incluindo 12 indicadores específicos
para incentivar os progressos, com calendário e balizas. Também sublinham a importância de
se fazer a monitoria e avaliação da implementação. O desenvolvimento de competências é con-
siderado um objectivo principal do desenvolvimento e a redução da pobreza ao nível nacional.6

Os comprometimentos sobre as parcerias contidos na Declaração de Paris, são conforme se segue:

Apropriação Os países parceiros exercem uma liderança eficaz em relação


às políticas e estratégias de desenvolvimento e asseguram a co-
ordenação das suas ações de desenvolvimento

Alinhamento Os doadores baseiam todo o seu apoio em estratégias nacionais


de desenvolvimento, procedimentos e instituições dos países
parceiros

Harmonização As ações dos doadores são mais harmonizadas, transparentes e


colectivamente eficazes

Gestão centrada nos Gerir os recursos e melhorar a tomada de decisões centrada


resultados nos resultados

Responsabilidade Os doadores e os parceiros são responsáveis pelos resultados


mútua obtidos em matéria de desenvolvimento

Mais recentemente, houve um reforço do enfoque sobre a redução da violência armada, dado o
enorme custo que a violência acarreta para os países e os povos, e o impacto negativo que tem

5 Margaret Shaw e Yvon Dandurand, eds., Optimização de Eficácia da Ajuda Técnica Providenciada nos Campos de
Prevenção à Criminalidade e Justiça Criminal, HE UN1 Série de Publicações, N.º 49 (Helsínquia, Instituto Europeu para a
Prevenção e Controle à Criminalidade, afiliado às Nações Unidas, 2006).

6 Organização de Cooperação e de Desenvolvimento Económicos, O Desafio de Desenvolvimento de Competências:


Trabalhando No Sentido de Boas Práticas, Série de Directivas e de Referência DAC (Paris, 2006). Ver também Organização
Mundial de Saúde, Prevenir a Violência e Reduzir o seu Impacto: Como é que as Agências de Desenvolvimento podem ajudar
(Genebra, 2008) e a Organização de Cooperação e Desenvolvimento Económicos, A Redução da Violência Armada: Capaci-
tação de Desenvolvimento, Série sobre Conflito e Fragilidade (Paris, 2009).
INTRODUÇÃO  7

sobre o desenvolvimento, os direitos humanos e a realização dos Objectivos de Desenvolvimen-


to do Milénio. A importância da prevenção e a redução é claramente reconhecida. A Declaração
de Genebra sobre a Violência Armada e o Desenvolvimento (A/63/494, anexo I), o trabalho do
Programa multi-agêncial de Prevenção à Violência Armada e uma análise das abordagens ex-
istentes e prometidas por parte do Comité de Assistência ao Desenvolvimento, da Organização
de Cooperação e de Desenvolvimento Económicos (OCDE), em 2009, são todos exemplos de
um comprometimento concertado ao nível internacional no sentido de se desenvolver uma es-
tratégia viável de prevenção à violência armada.7

E. Experiência Ampla
A prevenção ao crime requer uma forma diferente de trabalhar por parte dos Governos, as insti-
tuições e as organizações, e os países em todas as regiões já tiveram que enfrentar uma variedade
de desafios na implementação da prevenção. Há muito que aprender com as experiências, quer
sejam bem sucedidas ou não, de Norte a Sul. Por isso, o presente Manual recorre a experiências
recentes numa gama de países por todas as regiões, de modo a ilustrar não só as boas práticas,
mas também as iniciativas que, embora bem planejadas e implementadas, tiveram algumas con-
sequências não intencionais, ou que, em certos casos, não cumpriram mesmo ao todo com os
seus objectivos. É vital aprender-se com essas experiências ao mesmo tempo que se continua a
fazer aplicação dos padrões e as normas adoptados pelas Nações Unidas.

O próximo capítulo do presente Manual oferece uma introdução aos conceitos da prevenção à
criminalidade e benefícios da sua aplicação por parte dos Governos, bem como uma síntese das
Diretrizes para a Cooperação e Assistência Técnica no Campo da Prevenção à Criminalidade
Urbana, as Diretrizes para a Prevenção ao Crime e outros padrões e normas internacionais em
apoio dos mesmos.

7 Organização de Cooperação e de Desenvolvimento Económicos, Redução da Violência Armada: Capacitando o


Desenvolvimento, Série sobre o Conflito e a Fragilidade (Paris, 2009).
CHAPTER IV

I. A Prevenção à
Criminalidade: uma
introdução

Este capítulo tem dois objectivos principais. Em primeiro lugar, pretende introduzir alguns dos
conceitos e termos usados com maior frequência que são comumente empregues na prevenção à
criminalidade (secção A) e, em segundo lugar, pretende rever a estrutura conceitual de referên-
cia da prevenção à criminalidade estabelecida nas Diretrizes de Prevenção ao Crime, incluindo
a importância central das abordagens colectivas e o papél dos Governos, os benefícios que as
estratégias e os programas de prevenção sustentados podem oferecer, os princípios em que tais
estratégias devem assentar, e outros instrumentos internacionais em apoio às abordagens pre-
ventivas (secção B).

As diretrizes de prevenção ao crime adoptadas pelo Conselho Económico e Social em 1995 e


2002, reflectem a evolução do conhecimento e a experiência sobre a prevenção que têm ocor-
rido, aproximadamente, ao longo das duas últimas décadas. Com base na experiência prática,
a pesquisa e a avaliação em numerosos países e regiões diferentes, a prevenção estendeu-se a
partir de um campo de trabalho restrito, empreendido principalmente pela polícia, até atingir
uma gama de actividades muito mais desenvolvida, envolvendo mútiplas instituições e sectores
da sociedade.

A definição da prevenção à criminalidade encontra-se no parágrafo 3 das Diretrizes para a


Prevenção ao Crime, abrangendo:

estratégias e medidas que buscam reduzir o risco da ocorrência de crimes, e os seus efei-
tos potencialmente nocivos sobre os indivíduos e a socieadade, incluindo o medo da
criminalidade, intervindo no sentido de influenciar as suas causas mútiplas.

A. Conceitos de prevenção ao crime


Factores motrizes subjacentes ao crime e a vitimização

A prevenção à criminalidade tem estado a ganhar importância enquanto componente de muitas


das estratégias nacionais sobre a segurança e a protecção públicas. O conceito de prevenção é
fundamentado no princípio que o crime e a vitimização são conduzidos por muitos factores
causais ou subjacentes.
9
10 MANUAL DE DIRETRIZES DE PREVENÇÃO À CRIMINALIDADE: APLICAÇÃO PRÁTICA

São estes os resultados duma alargada gama de factores e circunstâncias que exercem influência
sobre as vidas dos indivíduos e as famílias durante a fase do crescimento, os ambientes locais, e
as situações e oportunidades que facilitam a vitimização e as ofensas.

Determinar os factores associados aos tipos de crime diferentes, pode levar ao desenvolvimento
duma gama de estratégias e programas para alterar esses factores, e impedir ou reduzir a in-
cidência de crimes desse género.

Estes factores subjacentes ou causais muitas das vezes são denominados factores de risco. In-
cluem mudanças globais e tendências que afectam as condições sociais e económicas das regiões
e os países; os factores que afectam os países individulmente e os ambientes e as comunidades
locais; aqueles que se referem à família e as relações chegadas; e os afectando os indivíduos. A
Figura I ilustra a natureza multi-facetada dos factores que influenciam o crime e a violência:8

Figura I. Factores que infuenciam os riscos do crime e a violênciaa

Sociedade global

nacional mais alarg


edade
Soci ada
a comunidade
cola e loca
A es l
ção familiar
INF IAS
A rela
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s, po o
lít ic a s e s c o l a r e s , d i s p
C ultu .
ra, m eio , etc
s d e im prensa
P o lít .
ica m u , etc
n d i a l, ec o n o m i a gl o b a l

a Adaptado de Ann Masten e Jennifer Powell, “Um marco de resiliência para a pesquisa, a política e a prática:” em
Resiliência e Vulnerabilidade: Uma Adaptação no Contexo das Adversidades de Infância, Suniya Luthar, ed. (Cambridge,
Cambridge University Press, 2003), pp. 1-29. O modelo ecológico da Organização Mundial de Saúde para compreender a vi-
olência insiste, igualmente, em factores societais, da comunidade, das relações e do indivíduo (ver Etienne G. Krug e outros,
eds., Relatório Mundial sobre Violência e Saúde (Genebra, Organização Mundial de Saúde, 2002), p. 12).

8 “Factores de risco” é um termo usado principalmente na área do desenvolvimento da prevenção, para se referir a
características que afectam os indivíduos ou padrões da criminalidade. É aqui empregue num sentido mais amplo.
CAPÍTULO I  A PREVENÇÃO À CRIMINALIDADE: UMA INTRODUÇÃO 11

Ao nível mundial, as grandes deslocações populacionais, a urbanização rápida, os desastres am-


bientais, as recessões económicas e mudanças de padrões comerciais, as comunicações ou o
crime organizado, são todos factores que podem trazer consequências graves para as regiões
e os países. Estes acontecimentos são passíveis de influenciar o estado de uma região ou a eco-
nomia política de um país, capazes de provocar danos tanto à infra-estrutura e a capacidade de
governação. O crime internacional organizado frequentemente tira proveito de estruturas fracas
dos governos e as instituições, e o aumento do tráfego de drogas, armas ou seres humanos pode
exacerbar grandemente os níveis de crime e violência. Os impactos de estes padrões globais tam-
bém são afectados pelas políticas regionais ou nacionais, que conseguem piorar ou melhorá-los.
As políticas de migração, por exemplo, podem afectar a extensão do tráfego de seres humanos,
bem como o número de vítimas e os autores do crime.

Ao nível nacional, a extensão da disparidade nos rendimentos domésticos entre as populações


mais pobres e as mais ricas de um país, os níveis de corrupção, a qualidade das infra-estruturas
e instituições, e os padrões sociais e culturais, criam situações de agravação dos riscos do crime
e da vitimização. O coeficiente de Gini mede a igualdade de rendimentos dentro dum país e é
uma ferramenta útil para comparar níveis de disparidade entre países.9

Ao nível local, a infra-estrutura e os poderes fiscais e administrativos inadequados, as con-


dições de alojamento e de vizinhança pobres, a falta de facilidades tais como uma boa educação
e serviços sanitários adequados, o desemprego elevado e o acesso fácil às drogas ou às armas
ligeiras podem todos aumentar os riscos. Dentro das cidades, há frequentemente discrepâncias
e desigualdades marcadas entre sectores geográficos diferentes. As escolas pobres ou desorgani-
zadas podem conduzir a um aproveitamento também ele muito pobre, o abandono escolar, com-
portamentos de coação física e a exclusão da escola, todos estes identificados como factores de
risco passíveis de provocar ofensas e vitimização entre as crianças e os jovens.

Ao nível individual, os factores de risco que provocam a ofensa e a vitimização incluem os fac-
tores biológicos e pessoais que podem conduzir ao um comportamento agressivo agravado ou
o abuso de substâncias grave, por exemplo. Os factores de risco afectos aos relacionamentos
incluem características de família tais como a parentalidade agressiva ou irregular, os conflitos
familiares, a violência e o abuso, circunstâncias familiares tais como a pobreza e o isolamento, e
os relacionamentos com os amigos e pares que podem levar a que se assumem comportamentos
de risco e transgressão da lei.

Conhecimentos sobre os factores que colocam as populações, as comunidades e os indivíduos


em risco, permitem aos programas de prevenção objectivarem as áreas e vizinhanças de alto
risco, ou os grupos de indivíduos já envolvidos, ou em risco de se envolverem, em actividades
criminosas. Ao nível nacional, isto ajuda os governos a priorizarem os problemas do crime, e
a projectarem a escolha de objectivos para programas almejando as regiões, cidades ou setores
que parecem mais vulneráveis. Tal escolha de objectivos de programas e de fundos para abordar
as grandes necessidades, revelou ser uma maneira eficaz e económica de se reduzir em os níveis
de crime e de vitimização.

9 Ver Programa das Nações Unidas para os Assentamentos Humanos (UN-Habitat), O Estado das Cidades do Mundo
2008/2009: Cidades Harmoniosas (Londres, Earthscan, 2008) para a discussão sobre o coeficiente de Gini e as ligações entre
desigualdade e o crime e a vitimização, principalmente nas zonas urbanas.
12 MANUAL DE DIRETRIZES DE PREVENÇÃO À CRIMINALIDADE: APLICAÇÃO PRÁTICA

Todavia, há sempre a tendência de enfatizar demasiadamente o papel de fatores individuais em


programas de prevenção, focando os comportamentos disruptivos ou ofensivos dos jovens, quer
de uma forma individual ou, por exemplo, em grupos. Isto conduz à negligência de factores
sociais e económicos mais amplos que possam aparentar serem de mais difícil abordagem. Uma
estratégia bem planeada de prevenção esforça-se no sentido de abordar tanto os aspectos indi-
viduais, como os sociais e económicos.

O conceito do risco destaca os factores negativos que possam servir como a base do crime. Uma
aproximação mais positiva envolve examinar a qualidade mais bem conhecida como a resiliên-
cia (superação), e a capacidade que as cidades, as comunidades e os indivíduos têm para evitar
o crime e a vitimização, apesar das circunstâncias. Os chamados factores protectivos ajudam
a construir ou a reforçar a resiliência das comunidades e os indivíduos, face a riscos. Incluem
factores tais como cidades bem-governadas com baixos índices de desigualdade, uma liderança
justa e eficaz, sistemas judiciais penais eficazes e transparentes, um financiamento adequado
para os programas sociais, ambientais e económicos e a participação da cidadania.

Para as comunidades locais, a disponibilidade de educação e emprego apropriados, os relaciona-


mentos e as ligações fortes com a comunidade, incluindo associações com os grupos com base
na fé ou pessoas idosas respeitadas e uma boa recreação, transporte e outras facilidades, são
muito importantes. Para as crianças e a juventude, a parentalidade carinhosa e consistente, os
bons modelos e a permanência na escola, são da mais elevada importância. Assim, as melhorias
dos serviços e as facilidades dos bairros, com o aumento consequente do capital social e o forne-
cimento de oportunidades de educação e formação às zonas, podem todos ajudar a proteger os
bairros ou indivíduos, desenvolvendo a sua capacidade de superação ao crime e a vitimização.

Tipos de prevenção ao crime

As diversas abordagens de prevenção ao crime foram desenvolvidas durante aproximadamente


as duas décadas passadas, com base numa quantidade considerável de pesquisa e avaliação. Os
campos principais de prevenção à criminalidade incluem uma escala das respostas desenvolvi-
das ao longo de uma multiplicidade de anos, incluindo a prevenção ao crime em termos de
desenvolvimento, ambiente, situacional, social e com base na comunidade, e as intervenções
podem-se classificar m determinados grupos. Um dos sistemas faz menção de mecanismos de
intervenção social, mecanismos de tratamento individual, mecanismos situacionais e mecanis-
mos de policiamento e justiça penal, por exemplo.10

As diversas abordagens e programas são agrupados em quatro categorias principais, sob Direc-
trizes de Prevenção à Criminalidade:

1. A prevenção à criminalidade através do desenvolvimento social inclue uma gama de progra-


mas sociais, educacionais, de saúde e de formação, tais como aqueles que visam as crianças ou as
famílias com crianças muito pequenas, em situação de risco, de forma a providenciar competên-
cias para o sustento e a educação dos filhos. Alguns programas de intervenção precoce também
são chamados desenvolvimento da prevenção à criminalidade, já que procuram intervir no sen-
tido de desenvolver a resiliência e as competências sociais entre as crianças e as suas famílias.

10 Nick Tilley e outros, Resolver o Problema da Criminalidade das Ruas: Lições Práticas da Iniciativa Contra a Crimi-
nalidade das Ruas (Londres, Ministério do Interior, 2004).
CAPÍTULO I  A PREVENÇÃO À CRIMINALIDADE: UMA INTRODUÇÃO 13

Os programas podem igualmente almejar as crianças em zonas onde crianças e jovens estão
especialmente expostos aos riscos; as ditas crianças da rua ou crianças que vivem em assenta-
mentos informais ou em áreas desfavorecidas. Outros exemplos incluem projetos de educação
das escolas, ou projetos de treinamento de recreação e competências para crianças e jovens da
comunidade, numa tentativa de aumento da sensibilização e resistência, à medida que as mes-
mas vão crescendo e se desenvolvendo.

Segundo o parágrafo 6 (a) das Diretrizes de Prevenção à Criminalidade, os programas de pre-


venção deste tipo: “Promovem o bem-estar das pessoas e encorajam a comportamentos em prol
do bem da sociedade através de medidas sociais, económicas, de saúde e educação, com realce
especial para as crianças e os jovens, focando factores de risco e protectores associados ao crime
e a vitimização.”

2. A prevenção à criminalidade com base comunitária ou local, em vez de alvejar os indivíduos,


visa atingir áreas onde os riscos de envolvimento em actividades criminosas, ou vitimização, são
elevados. Isto inclue áreas com níveis de privação elevada, tanto em termos de infra-estrutura,
serviços e riqueza, ou com falta de coesão comunitária. Entre estas se podem incluir os bair-
ros de lata e assentamentos informais, ou projectos de habitação de cidades interiores ou zonas
suburbanas, muitas das vezes em vizinhanças onde se verifica uma concentração de problemas
económicos e sociais.

Programas tais como estes trabalham para aumentar o sentido de segurança e a proteção dos
residentes de determinadas comunidades, em resposta a preocupações comunitárias e a proble-
mas da criminalidade que afectam a população, e para aumentar também os serviços e o capital
social ou a coesão social, ao nível da comunidade. O “capital social”, normalmente, refere-se à
rede de relações sociais, a confiança e os valores partilhados, o envolvimento comunitário ou o
sentido de identidade cívica, que possam subsistir ao nível de um bairro.11

A prevenção à criminalidade na comunidade frequentemente envolve a participação activa de


residentes locais e as organizações dessas comunidades e bairros. Podem estar envolvidos em
identificar prioridades locais, assim como em aplicar respostas adequadas. O termo “comuni-
dade” pode referir-se às pequenas vizinhanças, áreas no interior de uma cidade, ou vilas ou
cidades pequenas, ou mesmo, em certos casos, grupos de cidadãos com preocupações especiais.

Em função do parágrafo 6 (b) das Directrizes de Prevenção à Criminalidade, programas deste


tipo visam “mudar as condições que incitam a ofensas, vitimização e insegurança, resultando
na criminalidade ao nível das vizinhanças, com base nas iniciativas, perícias e dedicação dos
membros da Comunidade.”

11 O capital social é um termo empregue com grande frequência na actualidade, e que já foi definido de várias ma-
neiras, mas que procura descrever as relações e ligações sociais entre as pessoas, de modo a contribuir para sociedades
saudáveis. Por exemplo, a Organização de Cooperação e de Desenvolvimento Económicos define-o como sendo “as redes
que, em conjunto com as normas, valores e compreensões mútuas facilitam a cooperação em e entre os grupos”, O Bem-Estar
de Nações: O Papél do Capital Humano e Social (Paris, OCDE, 2001). Por vezes, são distinguidos três tipos de capital social:
vínculo, ponte e ligação, referindo aos elos entre os indivíduos do mesmo grupo; os laços com os diferentes grupos sociais,
étnicos ou etários; e as ligações aos serviços locais. Os laços de ponte e ligação costumam ser os mais fracos em comunidades
e capital social fraco. (Ver Michael Woolcock, “O lugar do capital social reside na compreensão dos resultados sociais e
económicos”, Revista de Investigação Política Canadiana Isuma, vol. 2, N.º 1 (2001), pp. 1-7.)
14 MANUAL DE DIRETRIZES DE PREVENÇÃO À CRIMINALIDADE: APLICAÇÃO PRÁTICA

3. A prevenção situacional do crime cobre as abordagens que tentam como objectivo princi-
pal reduzir as oportunidades aos perpetradores para cometerem crimes, intensificar os riscos
e custo para aqueles que forem apanhados e minimizar os benefícios advindos da prática das
actividades criminosas.

Em função do parágrafo 6 (c) das Diretrizes de Prevenção à Criminalidade, essas abordagens


ajudam “a evitar a ocorrência de crimes através de reduzir as oportunidades, aumentar os riscos
de apreensão e minimizar os benefícios do crime, incluindo por intermédio de desenhos ambi-
entais, e providenciar assistência e informação às vítimas, tanto potenciais como atuais.”

Foram identificadas cinco categorias específicas de estratégia situacional sobre a prevenção:

• As que aumentam o esforço dos infractores


• As que aumentam os riscos para os infractores
• As que reduzem as recompensas para os infractores
• As que reduzem o incitamento a ofensa
• As que retiram qualquer desculpa pela ofensa12

As técnicas situacionais são projetadas para confrontar formas altamente específicas do crime,
e supõem que os aspirantes delinquentes tomam decisões racionais sobre os potenciais riscos
e recompensas decorrentes de quebrar a lei. As mesmas passam pelo envolvimento da gestão,
projecto ou manipulação do ambiente circundante ou imediato de uma forma sistemática e
permanente.

Por exemplo, essas técnicas podem incluir o desenho de espaços públicos ou habitações que im-
peçam a quebra de equipamentos ou que proibam o ingresso em edifícios sem autorização, ou,
por outro lado, onde possam ser marcados os itens para facilitar a sua identificação em caso de
roubo. Outros exemplos incluem o uso da televisão de circuito fechado para estacionamentos de
automóveis, ou o desenvolvimento de passeios para peões, jardins e assentos em espaços públi-
cos, de modo a encorajar as pessoas a fazerem maior uso dos mesmos, com o reforço da vigilân-
cia desses espaços. A prevenção situacional ao crime está associada de perto com a prevenção
ambiental ao crime e a prevenção ao crime por via do desenho ambiental, o que é vinculado
especificamente às alterações do ambiente construído ou paisagístico.

4. Os programas de reintegração. A prevenção ao crime através da reintegração refere-se a


todos os programas que trabalham com crianças, jovens ou adultos apanhados nos trâmites do
sistema de justiça criminal, incluindo todos os que estiverem presos ou que regressarem à s suas
comunidades.

Em função do parágrafo 6 (d) das Diretrizes de Prevenção à Criminalidade, é importante que se


“Evite a reincidência através de assistir na reintegração social dos ofensores e nos outros mecan-
ismos preventivos.”

Aqueles que anteriormente foram condenados por crimes são os que correm maior risco de re-
incidência, dado que já quebraram a lei, gozam de muito poucas oportunidades e competências
para realizar um estilo de vida legítimo e livre de criminalidade, e são passíveis de ter ligações

12 Ver Ronald Clarke e John Eck, Como Tornar-se Analista de Resoluções dos Problemas da Criminalidade em 55 Peque-
nos Passos (Londres, Instituto de Ciência Criminal Jill Dando, 2003).
CAPÍTULO I  A PREVENÇÃO À CRIMINALIDADE: UMA INTRODUÇÃO 15

fortes com outros ofensores e estilos de vida incriminadores. Fornecer-lhes competências para
a vida e trabalho, treino, educação, modos de viver diferentes e modelos positivos, bons apoios
e habitação, ao nível da comunidade, são todas formas de os tentar reintegrar. Os programas na
prisão podem ajudar a prepará-los para a libertação, facultando-lhes novas habilidades profissio-
nais, por exemplo, ou aumentando os seus níveis de instrução e competência social, incluindo a
sua capacidade de mediar situações de conflito, e através do uso de outras abordagens remediais.13

Os programas podem ter lugar a nível da comunidade, ou em casas transitórias ou casas de


abrigo ou acolhimento, que forneçam o alojamento seguro e serviços de apoio e aconselha-
mento internos, podendo incluir aqui os programas de aprendizado, esquemas de criação de
emprego, formação em aptidões para a vida, facilidades de micro-crédito e sustentos a longo
prazo. Programas que nos ensinam habilidades para a resolução de conflitos ou que utilizem
abordagens de justiça remedial, tais como as mediações entre a vítima e o ofensor, ou as con-
ferências entre famílias ou grupos comunitários, são só alguns dos exemplos das formas em
que os ofensores podem ser ajudados a reintegrar-se na sociedade civil. São todos exemplos de
prevenção à criminalidade com o enfoque na reintegração, e cujo objectivo geral é de precaver
contra a reincidência.14

Combinar as abordagens de prevenção à criminalidade

Não existe sómente uma abordagem (nem uma teoria única subjacente de intervenção) que seja
inerentemente superior às demais. Qualquer teoria que for irá ter as suas vantagens e desvanta-
gens. Algumas abordagens de desenvolvimento social poderão ser a mais longo prazo e requerer
um compromisso e investimento sustentados durante um período prolongado de vários anos.
As abordagens com base na comunidade ou local poderão exigir uma paciência considerável
quando se trata de envolver os cidadãos de uma forma positiva, ou de manter a dinâmica. São
mais difíceis de avaliar, assim, os resultados muito claros e rápidos a partir das intervenções
podem ser difíceis de identificar.

A prevenção situacional tem frequentemente sido criticada por focar em demasia o crime opor-
tunista e as técnicas ou fiscalização que dificultam o alvo (porque podem fazer deslocar o crime
e a desordem para outras áreas); pelo acesso à segurança desigual que encoraja (por exemplo,
com o desenvolvimento do espaço privado e os condomínios fechados); e por não abordar as
causas sociais ou económicas no problema do crime. Alguns desenvolvimentos recentes na pre-
venção situacional estão centrados no uso melhorado dos regulamentos, tais como as leis inter-
nas municipais e locais, bem como na sua aplicação, o que é considerado uma ferramenta vali-
osa, incentivando os negócios ou os residentes locais a mudar e a regulamentar os seus próprios
comportamentos.15

13 Para mais informação sobre as abordagens remediais, ver o Manual sobre Programas de Justiça Remedial, Série de
Manual de Justiça Criminal (publicação das Nações Unidas No. E.06.V.15).

14 Para mais informação sobre programas de reintegração ver Assuntos Transversais: Ferramenta de Avaliação de Pre-
venção à Criminalidade (ver a nota de rodapé 1).

15 A.Crawford, “A prevenção à criminalidade e a segurança da comunidade”, no Manual Oxford de Criminologia, 4ª


ed., Mike Maguire, Rod Morgan, e Robert Reiner, eds. (Oxford, Oxford University Press, 2007); Derek Cornish e Ronald
Clarke, “Oportunidades, precipitadores e decisões criminais: uma resposta à crítica de Worthy sobre a prevenção situacional
à criminalidade”, em Estudos de Prevenção à Criminalidade, vol. 16, Teoria para a Prática de Prevenção Situacional à Crimi-
nalidade, Martha J. Smith e Derek B. Cornish, eds. (Monsey, Nova Iorque, Imprensa da Justiça Criminal, 2003), pp. 41-96.
16 MANUAL DE DIRETRIZES DE PREVENÇÃO À CRIMINALIDADE: APLICAÇÃO PRÁTICA

Nenhuma abordagem específica de prevenção à criminalidade pode ser considerada superior a


qualquer outra. Mas sim, qualquer abordagem selecionada deve fazer parte de um plano equili-
brado e estratégico, e todas as vantagens e desvantagens de cada uma das abordagens num con-
texto específico, devem ser contempladas cuidadosamente.

Assim, um projecto numa vizinhança da cidade, por exemplo, pode combinar uma gama de
iniciativas, tais como as mudanças à disposição do trânsito, uma iluminação melhor, a emprega
e a formação de jovens para trabalharem como tutores e mediadores locais, providenciar apoio
a famílias com rendimentos baixos, e outras práticas recreativas e oportunidades para residentes
dos edifícios económicos.

Na totalidade, conforme ilustrado na figura II, estas quatro categorias grandes são todas elas um
reflexo dos aspectos da prática geral de prevenção à criminalidade, providenciando um menu
de abordagens donde se fazer a escolha da melhor forma de desenvolvimento duma estratégia
geral. Oferecem uma gama de respostas a curto e a longo prazo para os problemas do crime.
Todas estas providenciam opções valiosas, e têm vantagens e desvantagens diferentes.

Figura II. Abordagens diferentes de prevenção à criminalidade

Conceitos de prevenção
à criminalidade

(a) A prevenção através


do desenvolvimento
social

(b) A prevenção à
criminalidade com
base local

(c) A prevenção
situacional do crime

(d) Programas de
reintegração

A calendarização das estratégias de prevenção à criminalidade

Por vezes, são usados termos específicos para se referir a etapas onde os programas de prevenção
à criminalidade podem ser aplicados, independentemente da abordagem que se emprega. Ainda
é comumemente usada uma tipologia inspirada pela saúde pública, i.e. os termos prevenção
primária, secundária e terciária, para reflectir as etapas de (possível) entrada para o sistema da
justiça criminal, embora esta não reflicta inteiramente a gama de assuntos envolvidos na preven-
ção à criminalidade e no desenvolvimento de comunidades seguras:
CAPÍTULO I  A PREVENÇÃO À CRIMINALIDADE: UMA INTRODUÇÃO 17

• A prevenção primária refere-se a programas ou iniciativas que almejam todas essas pes-
soas que nunca antes tiveram envolvidas com o sistema judicial criminal, tais como os
programas de educação ou alerta do público geral ou os jovens, sobre a violência domé-
stica ou a tiranização nas escolas.

•  prevenção secundária refere-se a programas que almejam especificamente crianças


A
e jovens identificados pelos serviços sociais, educacionais ou sistemas judiciais como
estando em situação de risco no que se refere ao seu potencial envolvimento no crime.

•  prevenção terciária refere-se a programas que visam todas essas pessoas que se en-
A
contram envolvidas com o sistema de justiça criminal ou/e que voltaram para as suas
comunidades, com o objectivo de evitar o recidivismo.

A prevenção à criminalidade e a segurança comunitária

Uma das suposições as mais comuns sobre a prevenção à criminalidade é que a mesma pode ser
claramente separada dos outros sectores de actividade, e que é limitada a aspectos académicos,
ou que é unicamente do domínio dos sistemas policiais e jurídicos. De facto, como os observa-
dores indicaram frequentemente, muitas das intervenções que ajudam a impedir o crime, têm
outra designação, se intervenção da primeira infância, apoio educacional e profissional, trata-
mento da droga ou reabilitação urbana.16

A prevenção da criminalidade não é o único termo geralmente usado ao nível internacional. Em


contextos e países diferentes, outros termos tais como segurança e protecção, redução do crime
e protecção da comunidade, são frequentemente aplicados. O termo ‘proteção da comunidade’ é
geralmente usado para se referir à escala mais ampla dos assuntos que deveriam ser abordados
de modo a promover as cidades ou comunidades mais seguras, e isso com resultados passíveis
de acarretarem benefícios que vão para além da ausência de crime:17

A prevenção à criminalidade esteve considerada um termo da polícia, enquanto o ter-


mo segurança da comunidade foi preferioa entre as autoridades locais da Grâ Bretanha
como modo de se referirem a um grupo mais alargado de interesses nas consequências
do crime.

Assim, o importante, não obstante a terminologia preferida, é o uso de uma aproximação es-
tratégica que permita aos decisores e praticantes talhar intervenções para os problemas que
confrontam, escolhendo de entre uma vasta gama de intervenções, encontrando um equilíbrio
entre a necessidade dos resultados, tanto a curto e a mais longo prazo, e a protecção dos direitos
humanos.

16 Janet Foster, “‘Partes dos Povos’: os elementos negligenciados mas essenciais da prevenção comunitária ao crime”,
em Controlo à Criminalidade e a Comunidade: A Nova Política sobre a Segurança Pública, Gordon Hughes e Adam Edwards,
eds. (Cullompton, Publicação Devon, Willan, 2002), pp. 167-196.

17 Ver Nick Tilley, ed., Manual de Prevenção à Criminalidade e a Segurança Comunitária (Publicação Collumpton,
Devon, Willan, 2005); e Margaret Shaw, “ Acção comunitária para a prevenção à criminalidade”, documento de base pre-
parado para o 6º Colóquio Anual sobre a Prevenção à Criminalidade, Canberra, 2006.
18 MANUAL DE DIRETRIZES DE PREVENÇÃO À CRIMINALIDADE: APLICAÇÃO PRÁTICA

A prevenção sustentável à criminalidade

A prevenção à criminalidade também pode ser ligada a noções de desenvolvimento e meios de


vida sustentáveis, no sentido de satisfazer as necessidades da actualidade sem comprometer as
de gerações futuras. Isto é especialmente relevante em países de rendimento médio e baixo. Os
esforços devem visar o aumento dos recursos e a capacitação das populações, fornecendo opor-
tunidades à próxima geração e ajudando a aumentar o capital entre as gerações.18 O sustento das
estratégias de prevenção à criminalidade para além da vida de um Governo, é parte importante
deste processo. A Figura III ilustra as estratégias de prevenção à criminalidade passíveis de con-
tribuir para o desenvolvimento sustentável.

Figura III A prevenção à criminalidade e o desenvolvimento sustentável a

Supervisão transectorial

Comunicação—Base nas evidências—Medindo o impacto


Empoderar as vítimas

Proteger os recursos
do meio-ambiente e
Reduzir a violência
Melhor Prática

inclusão social
Engendrar a

económicos
Promover a
integração

O desenvolvimento sustentável

a Adaptado do projecto do plano de acção social e de desenvolvimento para a prevenção à criminalidade da Comu-
nidade do Caribe.

Actualmente, existem diversos instrumentos e técnicas que prestam orientação sobre o modo
como desenvolver uma estratégia de prevenção e apoio ao desenvolvimento para a prevenção
sustentável ao crime, como será discutido mais adiante nos capítulos deste Manual.

A secção a seguir do presente capítulo irá analisar aquilo que os Governos poderão fazer através
das abordagens colectivas e proactivas sobre a prevenção à criminalidade recomendadas pelas
Diretrizes de Prevenção à Criminalidade e princípios básicos subjacentes a uma prevenção efec-
tiva e sustentável.

B. Abordagens colectivas de prevenção à


criminalidade e o papél importante dos Governos
O Capítulo II das Diretrizes de Prevenção à Criminalidade, entitulado “Quadro conceitual de
referência”, declara no parágrafo 2:

18 A noção do desenvolvimento sustentável originou durante a Comissão Mundial para o Ambiente e o Desenvolvi-
mento em 1987; o conceito de meio de vida sustentável foi avançado durante a Conferência das Nações Unidas sobre o
Ambiente e o Desenvolvimento em 1992, relativamente ao objectivo mais amplo de reduzir a pobreza.
CAPÍTULO I  A PREVENÇÃO À CRIMINALIDADE: UMA INTRODUÇÃO 19

“É de responsabilidade do governo, criar, manter e estimular um contexto no qual insti-


tuições governamentais relevantes e todos os segmentos da sociedade civil, incluindo o
sector empresarial, possam desempenhar melhor o seu papel na prevenção ao crime.”

Ao longo das últimas décadas, tem-se verificado um desvio enorme da perspectiva tradicional,
onde a prevenção à criminalidade é a responsabilidade da polícia, para o ponto de vista que
considera a prevenção como responsabilidade colectiva da comunidade. Desde os anos ’80, que
se tem vindo a afirmar que é mais eficaz, traz melhor custo-benefício e é muito mais positivo
tomar-se uma abordagem colectiva e proactiva em relação à prevenção à criminalidade.19 O
significado da acção colectiva é reconhecido tanto nas Diretrizes para Cooperação e Assistência
Técnica no Campo da Prevenção à Criminalidade Urbana e as Diretrizes de Prevenção à Crimi-
nalidade.

Há um número de argumentos convincentes. Primeiro, já que os factores que facilitam o au-


mento ou a diminuição do crime e a violência se encontram estreitamente ligados a muitos dos
aspectos sociais, económicos e ambientais, os escalões de governo não podem confiar unica-
mente num sistema de lei e justiça criminal para garantir a segurança dos cidadãos. As parcerias
multissectoriais entre os ministérios, tais como as responsáveis pela habitação, saúde, educação
e emprego, recreação, serviços sociais e o meio-ambiente, assim como o sector da polícia e a
justiça, podem fazer uma diferença significativa nos níveis de crime, através de estabelecerem
estratégias de dinâmica proactiva em vez de reactiva, de modo a impedir o crime e a vitimização.

Em segundo lugar, o valor das abordagens colectivas tem-se vindo a tornar aparente a partir
de avaliações dos programaos sobre a prevenção à criminalidade, principalmente nos países
de rendimentos elevados, que têm evidenciado limitações no papél da polícia. Em quase todos
os países, por exemplo, a grande maioria dos crimes nunca é participada à polícia. Também
ficou claro que a prevenção ajuda a reduzir os custos associados com as intervenções da justiça
criminal.20 O sistema de justiça criminal, acima de tudo, é reactivo, isto é, age após a infração. A
prevenção à criminalidade toma uma abordagem muito mais proactiva. Acresce ainda, poderão
advir outras vantagens dos programas de prevenção tempestivos, tais como melhorar o funcion-
amento social, e reconstruir as comunidades, todos os quais têm potencial para ajudar a reduzir
os custos sociais e económicos para uma cidade ou um país.

Os custos da criminalidade e os benefícios da prevenção ao crime

Tal como é explicado mais acima, o investimento em programas de prevenção tem melhor cus-
to-benefício. Por exemplo, custos associados a programas de prevenção, segundo as indicações,
são mais baixos a longo prazo do que intervenções ao nível da justiça criminal. A Caixa 1 ilustra
os custos das intervenções da justiça criminal no Canadá.

19 Ver, por exemplo, o Centro para Prevenção Internacional do Crime, Relatório Internacional sobre Prevenção à
Criminalidade e Segurança Comunitária: Tendências e Perspectivas (Montreal, 2008); D. Sansfaçon e B. Welsh, Crime Pre-
vention Digest II: Análise Comparativa sobre a Segurança Comunitária Bem-Sucedida (Montreal, Centro para Prevenção
Internacional do Crime, 1999); Irvin Waller, Menos Lei, Mais Ordem: A Verdade sobre a Redução à Criminalidade (Westport,
Connecticut, Editora Praeger, 2006).

20 Steve Aos e outros, Os Benefícios e Custos dos Programas de Prevenção e Intervenção Precoce para os Jovens
(Olympia Washington, Instituto de Ordem Pública do Estado de Washington, 2004); Irvin Waller e Daniel Sansfaçon,
Investindo Sabiamente na Prevenção à Criminalidade: Experiências Internacionais (Montreal, Centro de Prevenção
Internacional do Crime, 2000).
20 MANUAL DE DIRETRIZES DE PREVENÇÃO À CRIMINALIDADE: APLICAÇÃO PRÁTICA

Caixa 1. Despesa com a Justiça no Canadá

No Canadá, custa mais de Can$ 11.1 bilhões todos os anos para financiar a polícia, os tribunais e o
sistema remedial.* Isto significa que cerca de Can$ 360 por Canadiano é usado todos os anos para
aplicação da lei e o sistema de justiça criminal.

* Andrea Taylor-Butts, “Despesa com a Justiça no Canadá, 2000/01”, Juristat, vol.22, No. 11 (2002) aceder ao www.
statcan.gc.ca.

Em todos os países, o sistema de justiça criminal é muito dispendioso de se manter, por isso,
qualquer redução nas taxas de criminalidade e os números de pessoas processadas através dos
tribunais e as prisões provavelmente iria poupar nos custos de policiamento, processos penais,
defesa e tribunal, bem como nas consideráveis despesas afectas à condução dos sistemas pri-
sionais e de liberdade condicional. Para além dos custos que o crime acarreta para a justiça
criminal, existem muitos outros custos sociais e económicos a longo prazo, associados à perda
de produtividade, bem como serviços sociais e de bem-estar em que incorrem os ofensores e
as suas famílias, por exemplo, quando o / a ganha-pão da família é preso/a ou as crianças são
acolhidas pela assistência social.

Os custos do crime também incluem custos para as vítimas no que se refere a questões de saúde
e capacidade de trabalho ou a ida à escola ou a capacidade de cuidar das suas próprias famílias.
As estimativas do custo do crime para as vítimas e a sociedade em termos de saúde, receitas per-
didas e produtividade, sugerem que este pode ser até mais alto do que as despesas com a justiça
criminal.

Por fim, todas as despesas havidas com a segurança para protecção, tal como os sistemas tec-
nológicos, o policiamento privado ou as vedações e barreiras devem ser incluídos nos custos
com a criminalidade.

Figura IV. O custo do crime no Canadá em bilhões de dólares (2003)

Justiça criminal
19%

$13 bilhões

$10 bilhões Medidas de Defesa


$47 bilhões 14%
Custos para
as vítimas
67%

Fonte: “Custos do Crime no Canadá”, JustResearch No.12, Departamento de Justiça do Canadá, 2003.
CAPÍTULO I  A PREVENÇÃO À CRIMINALIDADE: UMA INTRODUÇÃO 21

A Figura IV ilustra as estimativas de custo no Canadá em 2003, uns Can$ 70 bilhões. Isto é
repartido em despesas com a justiça criminal oriundas da criminalidade (polícia, tribunais, pro-
cessos penais e medidas remediais — Can$ 13 bilhões), em medidas de defesa, tais como fechos
de segurança ou cameras de televisão de circuito fechado (Can$ 10 bilhões), e custos económi-
cos, sociais e de saúde para as vítimas do crime (Can$ 40 bilhões). Assim, as vítimas são quem
acarretam com os custos maiores do crime.

Ao longo da década passada, foi conduzido um grande número de estudos sobre custos e benefí-
cios dos programas de prevenção à criminalidade. Estes mostram, por exemplo, que os progra-
mas de intervenção precoce que fornecem apoio a crianças e famílias em risco, ou que trabalham
juntamente com as pessoas jovens para encorajá-los a permanecer na escola e completar a sua
educação, levam a reduções consideráveis nos custos criminais, sociais e económicos a longo
prazo em excesso dos montantes investidos nesses programas.21

Como um retorno sobre o dinheiro investido, os programas de prevenção não sómente reduzem
a despesa do sector da justiça penal, como também as intervenções do serviço social. Também
trazem outros benefícios sociais e económicos adicionais, tais como o aumento nos rendimentos
profissionais ou custos de saúde mais baixos, conforme o exemplo dado na caixa 2.

Caixa 2 O Centro Pai/Mãe-Filho

O Programa do Centro Pai/Mãe-Filho em Chicago, Estados Unidos da América, inicou o forneci-


mento de serviços de apoio à pré-escola e educacionais e familiares, a famílias desfavorecidas, em
1967. Isto incluiu programas da pré-escola e suportes à parentalidade. Houve seguimento de cri-
anças durante vários anos, e o seu progresso foi comparado com um grupo de controlo de crianças
oriundas de contextos parecidos. Antes de atingirem os vinte anos, os jovens do Centro tinham
menos probabilidades de irem para a prisão e mais probabilidades de completarem a escola e en-
contrarem emprego do que os seus pares.

O programa custou na media $6,730 por criança por ano, mas mostrou que o custo-benefício
era de $47,759 — isto é, uma poupança de $7 por criança ou família. Isto inclue um aumento em
rendimentos ao longo da vida, poupanças ao serviço de justiça social, serviços da vítima e a edu-
cação especial.

Fonte: Irvin Waller, Menos Leis, Mais Ordem: A Verdade sobre a Redução do Crime (Westport, Connecticut, Editora Praeger,
2006), p. 24 ff.

Todos estes factores permitem demonstrar o tipo de benefícios para os Governos que advêm de
trabalhar colectivamente. Por isso, os Governos nacionais que desenvolverem uma estratégia na-
cional sobre a prevenção à criminalidade por intermédio de parcerias multissectoriais atuando
em todos os Ministérios, podem ajudar a facilitar e apoiar o desenvolvimento de respostas estra-
tégicas e planejadas ao nível subregional, e em conjunto com governos locais e a sociedade civil.

21 Peter Greenwood e outros, Desviando as Crianças duma Vida de Crime: Medindo os Custos e Benefícios (Santa
Monica, California, Rand, 1998); Irvin Waller e Daniel Sansfaçon, Investindo Sabiamente na Prevenção à Criminalidade: Ex-
periências Internacionais (Montreal, Centro de Prevenção Internacional do Crime, 2000); P. Homel e A. Morgan, Avaliando
Caminhos de Prevenção à Criminalidade para a Austrália e a Ásia (Canberra, Instituto Australiano de Criminologia, 2008).
22 MANUAL DE DIRETRIZES DE PREVENÇÃO À CRIMINALIDADE: APLICAÇÃO PRÁTICA

Os governos locais estão mais bem situados para entender as suas próprias necessidades e pontos
fortes, bem como as preocupações dos cidadãos. O trabalho em parceria com os sectores locais
de serviços, cidadãos e partes interessadas pode ser um processo difícil, mas essas parcerias pro-
vavelmente serão mais eficazes do que se impor uma estratégia. As Diretrizes para Cooperação
e Assistência Técnica no Campo da Prevenção à Criminalidade Urbana colocam ênfase especial
sobre a importância de haver uma abordagem local ao crime.

Não são só as autoridades nacionais ou locais e os sectores de serviços, todavia, que podem
ajudar a prevenir à criminalidade; o papél das comunidades é vital. O envolvimento e a cooper-
ação da sociedade civil local demonstra que a acção do governo por si só não consegue engend-
rar comunidades saudáveis e protegidas. Os governos precisam de trabalhar em parceria com as
comunidades e as organizações da sociedade civil.

Assim, a prevenção contemporânea à criminalidade é um processo e metodologia estratégicos


de resposta aos assuntos do crime e a protecção. Reconhece que o crime afecta as pessoas na sua
vida do dia-à-dia, ao nível local, sendo um dos factores principais com impacto na sua qualidade
de vida.

C. Os princípios fundamentais subjacentes às


Diretrizes de Prevenção à Criminalidade
As Diretrizes de Prevenção à Criminalidade estabelecem oito princípios básicos subjacentes
ao desenvolvimento das estratégias de prevenção à criminalidade no capítulo III, conforme
se segue:

Liderança governamental
7. Todos os escalões de governo devem desempenhar um papel de liderança no desenvolvi-
mento de estratégias eficazes e humanitárias de prevenção à criminalidade, e em criarem e man-
terem estruturas institucionais para a sua implementação e análise.

Desenvolvimento e inclusão sócio-económicos


8. Considerações sobre prevenção à criminalidade devem ser integradas em todas as políti-
cas e programas sociais e económicas relevantes, incluindo os que se referem a emprego, edu-
cação, saúde, habitação e planeamento urbano, pobreza, a marginalização social e a exclusão. At-
enção especial deve ser prestada a comunidades, famílias, crianças e jovens em situação de risco.

Cooperação/parcerias
9. A cooperação/parcerias devem fazer parte integrante duma prevenção efectiva à crimi-
nalidade, dada a natureza alargada das causas do crime e as competências e responsabilidades
requeridas para as abordar. Isso inclui parcerias que actuem ao nível de todos os departamentos
de estado, e entre as autoridades, as organizações comunitárias, as organizações não governa-
mentais, o sector dos negócios e cidadãos privados.

Sustentabilidade/responsabilização
10. De forma a poder ser sustentável, a prevenção à criminalidade requer meios adequados,
incluindo o financiamento de estruturas e actividades, para garantir a sua sustentabilidade. Deve
CAPÍTULO I  A PREVENÇÃO À CRIMINALIDADE: UMA INTRODUÇÃO 23

haver responsabilização clara pelos fundos, a implementação e avaliação, para a realização dos
resultados planejados.

Base de conhecimento
11. Estratégias, políticas, programas e acções de prevenção à criminalidade devem ser basea-
das num fundamento amplo e multidisciplinar de conhecimento sobre problemas do crime, as
suas causas múltiplas e práticas comprovadas prometedoras.

Direitos humanos/estado de direito/cultura da legalidade


12. O estado de lei e os direitos humanos reconhecidos pelos instrumentos internacionais
dos quais são signatários os Estados Parte, devem ser respeitados em todas as facetas da preven-
ção à criminalidade. A cultura da legalidade deve ser activamente promovida na prevenção à
criminalidade.

Interdependência
13. Diagnósticos e estratégias de prevenção nacional à criminalidade deverão tomar em con-
ta, sempre que for o caso, as ligações entre os problemas criminais locais e o crime organizado
internacional.

Diferenciação
14. As estratégias de prevenção à criminalidade deverão tomar em conta, também quando
for o caso, as diferentes necessidades de homens e mulheres, bem como as necessidades especiais
dos membros mais vulneráveis da sociedade.

Essencialmente, os princípios estabelecidos pelas Diretrizes de Prevenção à Criminalidade e


as Diretrizes para Cooperação e Assistência Técnica no Campo da Prevenção à Criminalidade
Urbana, montam a base normativa, salientando a importância do estado de lei e o respeito pelos
direitos humanos, para a inclusão social e económica das populações, qualquer que seja o seu
estatuto e antecedentes, e a importância de se assegurar que as necessidades específicas das mi-
norias mais vulneráveis, bem como as diferenças de géneros, serão tomadas em consideração.

Além disso, salientam que a acção de prevenção à criminalidade deveria centrar-se nas comuni-
dades locais e ser conduzida por intermédio de parcerias e juntamente com todos os sectores de
governo, a sociedade civil e participantes comunitários. Também é importante que seja susten-
tável e que preste contas, não só a curto prazo, apoiado em práticas com base no conhecimento.22

A prevenção à criminalidade enquanto processo em evolução contínuo,


e não uma bala mágica

A prevenção à criminalidade não deve ser vista como uma ciência exacta que produza inevitav-
elmente bons resultados. Em muitos países, os recursos são limitados e as dificuldades sociais
e económicas e, por vezes, também as políticas, são crónicas. Isto torna difícil adaptarem-se
programas que tiveram sucesso noutras partes do mundo, esperando que os mesmos resultem
ou que sejam, pelo menos, sustentáveis, em contextos com desafios muito maiores. Certas so-

22 Ver Slawomir Redo (2008), “Seis diretrizes orientadoras das Nações Unidas para a aplicação prática de prevenção
à criminalidade”, na Perspectiva Internacional de Prevenção à Criminalidade: Contribuições do 1º Fórum Internacional Anual,
Marc Coester e Erich Marks, eds. (Mönchengladbach, Fórum Verlag Godesburg, 2008).
24 MANUAL DE DIRETRIZES DE PREVENÇÃO À CRIMINALIDADE: APLICAÇÃO PRÁTICA

ciedades podem-se considerar caótics mais do que ordeiras, com níveis elevados de corrupção
endémica, e onde as instituições chave, tais como a polícia ou os departamentos de estado, são
fracas, sofrendo de uma escassez de recursos ou resistentes a mudança.

A África do Sul é um exemplo de um país que desenvolveu uma estratégia nacional detalhada
para a prevenção da criminalidade; fê-lo em seguimento à adopção do seu Livro Branco sobre a
Segurança e Protecção, em 1998. Contudo, experimentou múltiplos reveses nas suas tentativas
de executar a estratégia nacional. Em parte, isto foi devido ao optimismo do Norte, que acredi-
tou que os programas poderiam facilmente ser transpostos para os países do Sul, mas também à
falta de capacidade local, os níveis crescentes de crime violento que seguiram o implantação da
nova Constituição, e determinados desafios de natureza extraordinária com quais o país se viu a
braços desde o fim do Apartheid.23

O crime organizado transnacional pode sobrecarregar tentativas proactivas nacionais ou locais.


Esta foi a experiência recente de muitos dos Estados da América Central e as Caraíbas, afecta-
dos por deslocamentos nas rotas e padrões do tráfico da droga. Desde 2000, que os níveis de
violência em países tal como Trindade e Tobago têm vindo a aumentar de uma forma drástica.
El Salvador, Guatemala e Nicarágua e os pequenos países das Caraíbas, tais como St Lucia, foram
igualmente afectados por acontecimentos que ultrapassavam as fronteiras, além dos eventos in-
ternos. Nesses casos, as estratégias regionais coordenadas de prevenção à criminalidade são um
complemento importante às estratégias nacionais de prevenção à criminalidade.

Estes problemas não se limitam aos países de rendimentos médios ou baixos. Em países de
rendimentos elevados, o progresso na prevenção à criminalidade durante os últimos 20 anos
tem sido desigual e, às vezes, até circular. Por vezes, a expectativa de que a prevenção da crimi-
nalidade irá trazer resultados rápidos, é demasiado ambiciosa. Pode haver forte resistência à
mudança entre os sectores da polícia e a justiça criminal, e a falta de capacidade de se trabalhar
em parcerias ao nível local, enquanto as exigências do público para que se verifique o aumento
das respostas reactivas aos eventos violentos, colocam uma pressão enorme sobre os Governos,
obrigando-os a deslocar o enfoque para longe da prevenção.

Desde 1997 que a Inglaterra e o País de Gales, por exemplo, têm vindo a montar políticas nacio-
nais fortes em matéria de redução da criminalidade, com exigências imperativas para as autori-
dades locais no sentido de incluir o desenvolvimento de parcerias para a redução do crime em
conjunto com a polícia local e os outros sectores, numa base regular. Igualmente, foi instituído
um programa nacional, com avaliação de financiamentos, que se concentrava em tipos especí-
ficos de problemas de crime, tais como o roubo residencial, os crimes de rua e a violência nas
escolas. O seu sucesso foi impedido por um número de factores, incluindo a falta de capacidade
local e a imposição duma fixação de metas a nível nacional. A fixação de metas exigia às autori-
dades a redução de determinados tipos de crime em quantidades específicas, e militava contra
os interesses e as respostas, por parte da comunidade local, aos padrões locais de crime identi-
ficados.24 Desde 2007, todavia, que as exigências impostas às autoridades locais e a polícia para

23 Pelser, Parcerias de Prevenção à Criminalidade (ver nota de rodapé 4).

24 Mike Maguire, “O pragama de redução da criminalidade na Inglaterra e o País de Gales: aspectos a ponderar sobre
a visão e a realidade”, A Criminologia e a Justiça Criminal, vol. 4, No. 3 (2004), pp. 213-237; Peter Homel e outros, Investir
para a Entrega: Revisão da Implementação do Programa de Redução à Criminalidade noRU, Estudo da Investigação No. 281
(Londres, Ministério do Interior, 2004); A. Morgan e P. Homel, Avaliando o Impacto da Protecção Comunitária e os Planos
de Prevenção à Criminalidade (Canberra, Instituto Australiano de Criminologia, 2009); Enver Solomon, “Novo Trabalhista e
CAPÍTULO I  A PREVENÇÃO À CRIMINALIDADE: UMA INTRODUÇÃO 25

satisfazerem metas nacionais, foram retiradas a favor de lhes permitir concentrarem os esforços
em problemas locais mais relevantes.

D. Apoio internacional para as diretrizes de prevenção


à criminalidade adoptadas pelas Nações Unidas
As diretrizes de prevenção à criminalidade estão apoiadas e fundamentadas em diversas outras
normas e padrões adoptados pelas Nações Unidas. Estes incluem resoluções respeitantes aos
direitos das crianças, as mulheres e as vítimas. Por exemplo:

• A Convenção sobre os Direitos da Criança25


• As Diretrizes das Nações Unidas para a Prevenção da Delinquência Juvenil (as Diretrizes
Riyadh)26
• A Declaração sobre a Eliminação da Violência contra Mulheres27
• A Declaração dos Princípios Básicos de Justiça para Vítimas de Crime e de Abuso de Poder28

No que se refere ao crime transnacional, a Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção,29
a Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional,30 e seus respectivos
Protocolos para a Prevenção, Supressão e Punição do Tráfico de Seres Humanos, principalmente
Mulheres e Crianças, suplementando a Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organi-
zado Transnacional,31 oferecem igualmente um contexto importante de apoio na implementação
das diretrizes de prevenção à criminalidade aos níveis nacional e local.

As trabalhadoras emigrantes, outro dos grupos que é especialmente vulnerável à vitimização,


são o objecto da recomendação geral N.º 26, adoptada pela Comissão de Eliminação de Dis-
criminação contra Mulheres, na altura da sua quadragésima segunda sessão, em 2008. Mais, as
Estratégias-Modelo e Medidas Práticas para a Eliminação de Violência contra Mulheres na Área
de Prevenção ao Crime e Justiça Criminal,32 foram recentemente revistas e actualizadas.33

Estreitamente ligado à prevenção à criminalidade e a vitimização, está a realização dos Objec-


tivos de Desenvolvimento do Milénio. Adoptados em 2000, os Objectivos até 2015, são:
• Erradicar a pobreza extrema e a fome

a prevenção à criminalidade na Inglaterra & o País de Gales: o que funcionou?”, Revisão IPC, vol. 3, 2009, pp. 41-67; Adam
Crawford, ed., Políticas de Prevenção à Criminalidade numa Perspectiva Comparativa (Cullompton, Devon, Willan Editora,
2009).

25 Nações Unidas, Série de Tratados, vol. 1577, No. 27531.

26 Resolução da Assembleia Geral 45/112, apêndice.

27 Resolução da Assembleia Geral 48/104.

28 Resolução da Assembleia Geral 40/34, apêndice.

29 Nações Unidas, Série de Tratados, vol. 2349, No. 42146.

30 Ibid., vol. 2225, No. 39574.

31 Ibid., vol. 2237, No. 39574.

32 Resolução da Assembleia Geral

33 52/86. E/CN.15/2010/2.
26 MANUAL DE DIRETRIZES DE PREVENÇÃO À CRIMINALIDADE: APLICAÇÃO PRÁTICA

• Alcançar o ensino primário universal


• Promover a igualdade de género e a autonomização da mulher
• Reduzir a mortalidade de crianças
• Melhorar a saúde materna
• Combater o VIH/SIDA, malaria e outras doenças
• Garantir a sustentabilidade ambiental
• Criar uma parceria global para o desenvolvimento. (Ver www.un.org/millenniumgoals.)

Muito embora os Objectivos não façam menção específica de prevenção à criminalidade, a sua
realização não deixa de ser crucial na assistência à redução de crimes e vitimização, para o fu-
turo. Mais significativamente, é muito pouco provável que os Objectivos sejam conseguidos se
a segurança e a protecção não estiverem devidamente asseguradas ao nível de regiões ou países.

Em África, por exemplo, o impacto do crime sobre o desenvolvimento está claramente indicado.
Todos os dias, o crime destrói a confiança entre cidadãos, bem como nos negócios, afectando a
qualidade de vida, influenciando de uma forma adversa o emprego e a produtividade, destru-
indo o capital humano e social, e desencorajando o investimento, ao mesmo tempo que mina as
relações entre cidadãos e os Governos. Segundo o Crime e Desenvolvimento em África, publi-
cado pela UNODC em 2005:

•  crime destrói o capital social e humano de África: O crime degrada a qualidade de vida e
O
pode obrigar os trabalhadores qualificados a emigrar; a vitimização, assim como o medo
do crime, interferem com o desenvolvimento das pessoas que ficam no país. O crime
impede o acesso a possíveis empregos e oportunidades de educação, e desincentiva a
angariação de recursos.

•  crime afuguenta o negócio de África: Os accionistas vêem o crime em África como


O
assinalando uma instabilidade social agravada, elevando o custo de se fazer negócio. A
corrupção é ainda mais prejudicial, talvez a grande barreira ao desenvolvimento. Além
disso, o turismo, de enorme importância crescente para África, é uma indústria que é
especialmente sensível ao crime.

•  crime mina o Estado: O crime e a corrupção destroem o relacionamento de confiança


O
entre os povos e o estado, minando a democracia. Com excepção das perdas directas
de fundos nacionais devido à corrupção, o crime pode corroer a base fiscal, porque os
oficiais do imposto são subornados pelos ricos, e os pobres recuam para a economia pa-
ralela. A corrupção desvia recursos em projetos enxerto-ricos das obras públicas, a custo
à educação e aos serviços sanitários.

Um dos princípios fundamentais das Directrizes para a Prevenção à Criminalidade é a im-


portância do estado de direito e o respeito pelos direitos humanos. O Secretário Geral lançou
uma definição funcional internacional sobre este princípio num relatório sobre o estado de di-
reito e a justiça transicional nas sociedades em conflito e as fases do pós-conflito:

Um princípio de governação em que todas as pessoas, instituições e entidades, públicas


e privadas, incluindo o próprio estado, se possam responsabilizar perante as leis promul-
gadas publicamente, executadas e adjudicadas de uma forma justa, e que sejam consist-
entes com as normas internacionais e os padrões sobre os direitos humanos. Além disso,
CAPÍTULO I  A PREVENÇÃO À CRIMINALIDADE: UMA INTRODUÇÃO 27

exige medidas que assegurem a aderência aos princípios de supremacia da lei, igualdade
perante a lei, responsabilização na lei, equidade na aplicação da lei, separação de po-
deres, participação na tomada de decisões, segurança jurídica, evitação de arbitrariedade
e transparência de processos e judicial.34

A prevenção à criminalidade é considerada um aspecto integrante do estado de lei. Conforme


referiu o Secretário-Geral:

em questões de justiça e o estado de lei, uma grama de prevenção vale mais do que um
quilo de cura... a prevenção é o primeiro imperativo da justiça.35

Mais recentemente também foi reiterado o significado que o estado de lei tem para o desenvolvi-
mento, por parte do Director Executivo do Escritórios das Nações Unidas sobre Drogas e Crime:

O estado de lei não constitue um dos Objectivos de Desenvolvimento do Milénio, mas


é a chave da realização de todos eles... Onde o estado de lei é fraco ou ausente, o crime e
a corrupção impedem o desenvolvimento e a democracia. Isto pode provocar conflitos,
a pobreza em massa e a degradação do meio-ambiente, o que cria ainda maior instabili-
dade. (www.unodc.org/unodc/en/press/releases/2008-04-14.html)

E. Por em prática as Diretrizes de Prevenção à Crimi-


nalidade: componentes chave para desenvolver
estratégias abrangentes e efectivas de prevenção
à criminalidade
As seguintes secções do presente Manual fazem a avaliação aprofundada da aplicação prática
destes princípios, e os tipos de organização, métodos e abordagens que se encontram delineados
nas Diretrizes, para a aplicação dos mesmos.

As componentes chave incluem:


• O papél dos governos a todos os níveis, e o que isto implica
• A prevenção à criminalidade com base no conhecimento, e o que isto envolve
• A planificação, monitoria e avaliação estratégicas
• As abordagens multissectoriais e o trabalho em parcerias
• Inclusão da participação comunitária e a sociedade civil, incluindo o sector privado

Cada uma destas componentes é discutida em mais pormenor a seguir.

34 S/2004/616, para. 6.

35 Ibid., para. 4.
CHAPTER IV

II. O Contributo
Fundamental
dos Governos

A. A prevenção à criminalidade enquanto


característica permanente dum governo
O parágrafo 2 das Diretrizes de Prevenção à Criminalidade afirma que:

“É de responsabilidade do governo, em todos os seus escalões, criar, manter e promover


um contexto no qual instituições governamentais relevantes e todos os segmentos da so-
ciedade civil, incluindo o sector dos negócios, possam desempenhar melhor o seu papél
na prevenção à criminalidade.”

As Diretrizes salientam a necessidade dos Governos de assegurarem um lugar permanente para


a prevenção à criminalidade nas suas estruturas e programas. O papél do Governo é de fornecer
liderança, coordenação e financiamento e recursos adequados. Como é que este papél pode ser
desempenhado pelos governos nacional, regional ou local? As recomendações incluem o esta-
belecimento de:

• Uma autoridade permanente central


• Um plano de prevenção à criminalidade com prioridades e balizas
nitidamente estabelecidas
• A coordenação e as parcerias entre agências do governo e a sociedade civil
• A educação pública e o trabalho com os meios de imprensa
• Programas sustentáveis e com a devida responsabilização
• A formação e a capacitação do governo e outros órgãos

Este capítulo irá examinar as recomendações dos tipos de estrutura governamental, e fornecer
determinados exemplos de estratégia aos níveis nacional, regional e local, mostrando as difer-
entes formas em que as mesmas foram desenvolvidas e o modo como as suas capacidades de
combate ao crime foram organizadas. Além disso, também fala de alguns possíveis desafios.

Extraído das Diretrizes para a Prevenção à Criminalidade, parágrafo 17:

29
30 MANUAL DE DIRETRIZES DE PREVENÇÃO À CRIMINALIDADE: APLICAÇÃO PRÁTICA

Estruturas governamentais
Os Governos devem incluir a prevenção como parte permanente das suas estruturas e
programas para o controlo da criminalidade, garantindo que, nas suas fileiras, existam
balizas para a organização da prevenção à criminalidade, através de, entre outras acções:

(a) Estabelecer centros ou pontos focais experientes e com recursos;

(b) Elaborar um plano de prevenção à criminalidade com prioridades e objectivos bem


definidos;

(c) Criar elos e coordenação entre instituições ou departamentos governamentais afins;

(d) Engendrar parcerias entre organizações não-governamentais, empresas comerciais,


o sector privado, profissionais liberais e a comunidade em geral;

(e) Procurar a participação activa do público na prevenção à criminalidade, através de


mantê-lo informado sobre a necessidade e meios de acção e qual o seu papél.

B. Uma autoridade central permanente


Uma das primeiras recomendações nas Directrizes é o estabelecimento de uma autoridade cen-
tral permanente a nível do governo, responsável pela aplicação de uma política de prevenção
da criminalidade. Isto foi empreendido em países centralizados tais como a França, e em países
federais tais como o Canadá, o Chile e a África do Sul.

Ao nível nacional, os países podem escolher colocar a responsabilidade pela prevenção à


criminalidade sobre um dos ministérios, tal como o responsável pela justiça ou a segurança
pública, ou com um grupo de ministérios, ou podem optar por estabelecer um órgão separado
de alto nível. O papel da autoridade central permanente é para fornecer liderança, trabalhar
com outros setores do governo e outros níveis do governo ou a sociedade civil, e desenvolver
um plano nacional e executar e monitorá-lo. A autoridade central facilita a acção nos es-
calões inferiores do governo. Em certos casos, os países escolheram decretar uma legislação
em apoio de um plano nacional e para exigir a outros sectores o trabalho em conjunto com
a autoridade central. Em todos os casos, seria necessário haver recursos para a execução dos
planos. A seguir são indicados alguns exemplos de programas nacionais sobre a prevenção à
criminalidade:

• Desde 1994 que o Canadá tem montada uma Estratégia de Prevenção à Criminalidade,
que faz parte do seu programa de segurança pública. O seu Centro de Prevenção do
Crime encontra-se localizado no Ministério de Segurança Pública e apoia toda uma
gama de programas ao nível local, através de correntes de financiamento que visam al-
cançar temas e problemas específicos. Actualmente, o enfoque recai sobre a juventude
e os bandos juvenis, entre outros grupos, bem como a avaliação de programas (www.
publicsafety.gc.ca).

•  Chile estabeleceu a sua estratégia nacional de segurança pública, em 2006, sob a égide
O
do Ministério do Interior, que passou pelo trabalho em parceria, em conjunto com outros
CAPÍTULO II  O CONTRIBUTO FUNDAMENTAL DOS GOVERNOS 31

departamentos principais, incluindo a justiça, educação, mão-de-obra, saúde, urbani-


zação, defesa, planeamento e mulheres e serviços nacionais de juventude. A mesma vai
prestar ajuda a toda uma gama de programas em parceria com estes departamentos. O
trabalho é coordenado pela Subsecretaria do Interior e a Divisão da Segurança Pública.
(www.seguridadciudadana.gob.cl)

•  suécia instituiu um Conselho Nacional permanente para a Prevenção à Criminalidade


A
em 1974, reforçado em 1996. O seu papél é executar estratégias de prevenção à criminali-
dade aos níveis nacional e local. Trata-se duma estrutura permanente que recebe finan-
ciamento para programas e para a averiguação completa dos seus resultados e impactos
(www.bra.se).

Em alguns países, tanto o estado ou os governos provinciais podem ter igualmente responsabili-
dades na prevenção à criminalidade, frequentemente em parceria com governos nacionais e/ou
locais. Muitos dos governos subregionais ao nível do estado ou província estabeleceram as suas
próprias estruturas centrais que assumiram a responsabilidade pela promoção e a coordenação
dos planos de prevenção:

• Na Austrália, desde 1999 que o Estado de Victória tem vindo a ensaiar uma série de
estratégias de prevenção envolvendo os diferentes ministérios. Por exemplo, foi estabel-
ecido o programa de Prevenção à Criminalidade de Victória, ao nível do Departamento
de Justiça, para tomar conta da elaboração da “estratégia de 2002-2005 para uma maior
protecção nas ruas e as casas”. Estas estratégias eram multissectoriais e envolveriam a
justiça, saúde, serviços escolares e policiais, e autoridades locais, bem como as comuni-
dades locais. À semelhança, outros estados, tais como Nova Gales do Sul, Austrália do Sul
e Austrália Ocidental, passaram a desenvolver as suas próprias estratégias.

•  a Alemanha, o Conselho de Prevenção à Criminalidade da Baixa Saxónia foi estabel-


N
ecido em 1995 através de uma resolução do governo estadual para a redução do crime
no estado e uma melhoria no sentido de protecção dos cidadãos. Actualmente, inclue
250 organizações filiadas (departamentos de estado, as autoridades, as associações) e 200
órgãos e associações municipais de prevenção à criminalidade. O Conselho empreende
projectos em apoio à política do estado. O seu trabalho teve como enfoque a segurança
da comunidade, o estabelecimento de normas para a gestão de projectos de prevenção à
criminalidade (as Normas de Beccaria), crimes de ódio e a implementação de um plano
de ação do estado sobre a violência contra mulheres. Desenvolveu as Normas de Becca-
ria para o gerenciamento de qualidade para conduzir a implementação e a avaliação dos
programas e projectos locais (www.lpr.niedersachsen.de; www.beccaria.de).

•  o México, o Estado de Querétaro colocou a responsabilidade principal pela prevenção


N
à criminalidade sob o Ministério de Segurança Pública, o qual, em 2004, estabeleceu o
seu plano de cinco anos para a protecção da província, entitulado “Ordem, protecção e
justiça 2004-2009”. Já trabalhou em estreita colaboração com os outros ministérios. A
estratégia foi inspirada nas Diretrizes de Prevenção à Criminalidade.

•  a Nigéria, no Estado de Lagos, foi estabelecida, por lei, uma Sociedade Fiduciária
N
para a Segurança do Estado de Lagos, em 2007, como parceria público-privada, para
assistir o estado a engendrar parcerias de prevenção à criminalidade em conjunto com
32 MANUAL DE DIRETRIZES DE PREVENÇÃO À CRIMINALIDADE: APLICAÇÃO PRÁTICA

a sociedade civil, através de avaliar e rever os projectos e as necessidades, e providen-


ciar formação e a angariação de fundos em apoio das iniciativas de prevenção (www.
lagosstatesecuritytrustfund.org).

O exemplo a seguir vem ilustrar as responsabilidades de prevenção à criminalidade dos três


níveis de governo na África do Sul, a seguir à adopção duma política nacional de prevenção à
criminalidade, o Papel Branco sobre a Segurança e Protecção, em 1998:

Como é que as características institucionais influenciam e determinam a


abordagen local de prevenção à criminalidade

A África do Sul tem três níveis distintos, interdependentes de governo: o nacional, provincial e local.

Os papeis de prevenção à criminalidade do Governo nacional

O Concelho de Ministros da África do Sul aprovou a Estratégia Nacional de Prevenção à Crimi-


nalidade (ENPC) em 1996, que descrevia o enfoque estratégico da África do Sul em termos de
prevenção à criminalidade. A ENPC adoptou dois princípios chave reconhecendo o crime como
um fenómeno social e o significado das parcerias multissectoriais na luta contra o mesmo. Em
1998, o Governo adoptou o Papel Branco sobre a Segurança e a Protecção. Este documento
de política veio apoiar a implementação da ENPC ao especificar os papeis das diferentes es-
feras de governo. A Secretaria Nacional de Segurança e Protecção tem a tarefa de monitorar
os Serviços Policiais Sul Africanos, bem como a implementação dos princípios de prevenção à
criminalidade, conforme estabelecido na ENPC. O agrupamento de Prevenção à Criminalidade,
da Justiça e a Segurança, informa os esforços de prevenção ao nível da África do Sul, sendo
composto pelas direcções nacional e provincial responsáveis pela protecção, execução da lei e
prevenção à criminalidade.

Os papeis de prevenção à criminalidade das províncias

Os departamentos provinciais e as secretarias de segurança e protecção coordenam iniciativas


de prevenção à criminalidade ao nível das províncias. O Papel Branco sobre a Segurança e Pro-
tecção criou um mandato de prevenção à criminalidade para as províncias. A responsabilidade
da prevenção à criminalidade por parte das províncias inclui a iniciação, a coordenação e a
mobilização de recursos para os programas, avaliação e assistência para programas sociais de
prevenção à criminalidade ao nível do governo local e o estabelecimento de parcerias público-
privados que prestam apoio à prevenção da criminalidade.

Os papeis de prevenção à criminalidade das autoridades locais

Os municípios da África do Sul são obrigados a compilar Planos de Desenvolvimento Integrado,


compreendendo os planos sectoriais para abordagem das prioridades sócio-económicas dos
residentes. No mesmo contexto, os municípios da África do Sul, em articulação com a polícia
local e o departamento provincial de segurança e protecção, são obrigados a desenvolver planos
CAPÍTULO II  O CONTRIBUTO FUNDAMENTAL DOS GOVERNOS 33

específicos do sector para execução da lei e a prevenção à criminalidade, com o intuito de sat-
isfazerem as necessidades das suas comunidades. Foi iniciado o processo de desenvolvimento
de uma política sobre os fóruns de protecção comunitária que abrangesse ao mesmo tempo as
parcerias locais de coordenação e a liderança de iniciativas de prevenção à criminalidade ao
nível municipal.36

C. Um plano com prioridades e balizas claras


Um plano ou estratégia do governo nacional exige uma base de consultas com uma vasta gama
de sectores, incluindo o público, assim como resultados de pesquisa e levantamento de dados e
análise. (Ver o capítulo III para mais detalhes sobre os dados e a pesquisa.) Isso ajudará a iden-
tificar as maiores preocupações acerca do crime, a vitimização e a segurança, por todo o país,
incluindo nas cidades, e, possivelmente, as áreas rurais. O exame de algumas das causas, e as
intervenções possíveis a prazo curto, médio ou mais longo, ajudarão a estabelecer prioridades
para a acção. Tais planos terão de indicar os seus objectivos principais, que financiamento e
recursos é que virão a ser necessários ou disponíveis, durante qual período de tempo, e quem é
que deverá ser envolvido em executar o plano. É importante que se estabeleçam pontos chave de
enfoque de acção, e que sejam escolhidos os tipos principais de ofensa ou de grupos em risco.
Contudo, ajustar as balizas nacionais limitadas para se conseguir a redução dos problemas do
crime ao nível local foi considerado uma abordagem demasiado inflexível, já que não permite às
comunidades locais e os serviços responder aos interesses locais.

•  Austrália é um país federal, e embora os estados e os territórios sejam os principais re-


A
sponsáveis pela justiça penal e prevenção à criminalidade, o governo nacional desempen-
ha um papel chave de liderança, incluindo na prevenção do crime e a violência. Lançou o
seu programa nacional de prevenção à criminalidade em 1997, com o financiamento de
A$ 38 milhões para políticas, pesquisa e projectos práticos, em duas fases. O programa
mais recente sob o Gabinete do Procurador Geral da República foi o Programa Nacional
de Prevenção à Criminalidade por parte da Comunidade, lançado pelo Primeiro Minis-
tro em 2004. Forneceu uma totalidade de A$ 65,5 milhões para projectos, ao nível local,
que afectam a segurança das bases, ao longo de um período de quatro anos.

•  Japão adoptou o seu plano de acção de cinco anos para a criação de uma sociedade
O
resistente ao crime, em 2003. O plano incluiu 5 objectivos principais, com 148 acções
afins que visavam o apoio do mesmo. Incluindo medidas sociais, com base comunitária
e situacional, em apoio das famílias e as comunidades e com o objectivo de reduzir a
ofensa juvenil, encorajar a uma maior participação na prevenção por parte da cidadania,
e iniciativas alvejando a droga e o cíber-crime, e para reforçar os controles contra o crime
organizado. O Plano de Acção encontrava-se sob a tutela da Agência da Polícia Nacion-
al, em parceria com os ministérios, e foram estabelecidos dois grupos inter-ministeriais
para o executar. Um Plano Nacional associado para a Edificação de Comunidades Segu-
ras e Tranquilas envolveu um número de ministérios, assim como a polícia. Um plano
de acção revisado foi adoptado em 2008 com novas balizas em mente (www.npa.go.jp/
english/seisaku2/crime_reduction.pdf).

36 Fonte: UN-Habitat, Fortificando as cidades contra o crime – Um Estojo de Ferramentas (Nairobi, 2007), p. 23.
34 MANUAL DE DIRETRIZES DE PREVENÇÃO À CRIMINALIDADE: APLICAÇÃO PRÁTICA

•  arrocos adotou um plano de acção da segurança, de quatro anos, de 2008-2012, que


M
incluiu iniciativas nacionais e locais. Visa reforçar a capacidade da polícia com a mod-
ernização e o treinamento, assim como devolver a autoridade e os recursos às autori-
dades provinciais e locais, dando-lhes uma capacidade maior de resposta às necessidades
locais. Serão desenvolvidas esquadras de polícia locais nas zonas urbanas onde os níveis
de crime são mais elevados. O plano inclui o estabelecimento de parcerias entre os minis-
térios relevantes e os sectores públicos e privados de forma a assistir com a melhoria da
segurança.

•  o Reino Unido, a Escócia tem um Plano Estratégico de Redução da Violência, de 10


N
anos. O plano foi lançado pela Unidade Escocesa de Redução da Violência, em Dezem-
bro de 2007. O plano, sob a autoridade do Ministério da Justiça e a Polícia, almeja a
entrega de uma redução permanente e sustentável na violência, tendo sido lançado pela
Secretaria de Estado da Justiça, e o Chefe da Polícia de Strathclyde. Foi circulado às au-
toridades locais e a direcção dos serviços sanitários, a gerentes de parceria da segurança
comunitária, às principais organizações não governamentais e a outros grupos na Escó-
cia. O plano é projectado iniciar a discussão, informar o planeamento local e incentivar e
reforçar os elos locais em torno de uma agenda conjunta de prevenção à violência. Define
seis objetivos chaves, os quais incluem a alteração da tolerância e os níveis de violência, e
uma série de medidas a alcançar entre 2010 e 2017. Espera-se que venha a ser modificado
com base na experiência e o progresso (www.actiononviolence.com).

Dependendo do país, o financiamento pode ser dirigido às áreas ou regiões visadas, ou problemas
específicos, tais como a violência entre a juventude, a segurança das mulheres, o abuso ou o tráfi-
co de drogas. Os fundos nacionais podem ser combinados com o financiamento do estado ou os
governos locais, universidades, países doadores e/ou organizações, bem como o sector privado:

•  urkina Faso estabeleceu um Plano Nacional de Acção contra o Tráfico Interno e Trans-
B
fronteiriço de Crianças (2004-2008). O país também tem vindo a implementar uma es-
tratégia nacional que se concentra na juventude em risco.

•  Estratégia de Assistência ao País, de 2010-2014, desenvolvida pela Agência dos Estados


A
Unidos para o Desenvolvimento Internacional, e a Jamaica, tem estado a tratar os assun-
tos sociais e económicos que mais directamente têm contribuído para o crime violento e
a vulnerabilidade às actividades criminosas transnacionais. A primeira meta objectivada
é o aumento da paz e a segurança através da redução do crime e a corrupção. Isto incluirá
o reforço do policiamento da comunidade e a capacidade da sociedade civil de trabalhar
em parcerias. (http://jamaica.usaid.gov/en/Article.1193.aspx).

D. Coordenação e parcerias multissectoriais


Um dos maiores desafios para os governos frequentemente consiste em convencer as direcções
e outros sectores a operarem parcerias multissectoriais em vez de limitar as suas actividades a
áreas de responsabilidade discretas. Nem sempre é fácil persuadir os departamentos de saúde,
desenvolvimento urbano ou trabalho que podem fazer uma contribuição importante para
a prevenção à criminalidade e a segurança da comunidade. Muitas direcções consideram o
crime como fazendo parte do âmbito policial ou a responsabilidade jurídica, e têm tendência
CAPÍTULO II  O CONTRIBUTO FUNDAMENTAL DOS GOVERNOS 35

a ceder o poder a esses sectores. Muitas vezes, há falta de vontade em compartilhar dados e
informação com os demais departamentos ou actores não governamentais, bem como re-
lutância em dirigir recursos do departamento para projectos de prevenção conjunta.

São frequentemente criadas comissões consultivas e de coordenação ao abrigo do serviço


principal ou a autoridade central, com representantes chave das partes interessadas dos outros
sectores:

•  a província do Quebeque, no Canadá, foi estabelecido um comitê consultivo em 2000,


N
a seguir ao lançamento da sua Política provincial de Prevenção à Criminalidade sob a
égide do Ministério de Segurança Pública. O comité consultivo inclui representantes dos
outros ministérios, a polícia, as cidades e a sociedade civil.

•  Hungria adoptou a sua Estratégia Nacional em 2003 para a Prevenção Social do Crime,
A
e apontou um Concelho Nacional de Prevenção à Criminalidade para executar a estra-
tégia, sob a égide da Unidade de Prevenção à Criminalidade do Ministério de Justiça.
As cinco prioridades de prevenção visaram a delinquência juvenil, o crime urbano, a
violência doméstica, a vitimização e a reincidência. O Concelho inclue representantes de
departamentos chaves como a saúde, a habitação e a educação, a polícia, o sistema peni-
tenciário, os governos locais, as instituições académicas, as igrejas e as organizações não
governamentais

•  a Indonésia, a Fundação Indonésia de Prevenção à Criminalidade empreende a coorde-


N
nação nacional das iniciativas de prevenção à criminalidade juntamente com o Ministé-
rio de Justiça e dos Direitos Humanos, o Ministério dos Assuntos Sociais, o Ministério
dos Assuntos Externos e o Ministério do Interior.

•  a Noruega, embora a Direcção Geral da Polícia ocupe o papél central na prevenção


N
à criminalidade, o Concelho Nacional de Prevenção à Criminalidade estabelecido pelo
Governo, providencia aconselhamentos à mesma e aos demais departamentos de estado,
empreendendo a implementação do projecto em seu nome.

•  s Filipinas estabeleceram o seu plano Nacional anual de Prevenção à Criminalidade


A
em 2004 sob a responsabilidade da Polícia Nacional das Filipinas. É uma combinação de
programas e estratégias de acção para aplicação por parte dos sectores do sistema judicial
penal, os organismos governamentais e todos os sectores do governo local. Um comité
técnico e um comité ad hoc de peritos agrupam todos os sectores relevantes para a ex-
ecução do plano.

Normalmente, os sectores e as partes interessadas são convidados a uma escala mais ampla para
se juntarem aos representantes oficiais no desenvolvimento de projectos e planos específicos.
Isto inclui as partes interessadas da sociedade civil — representantes da comunidade, organi-
zações não governamentais e aqueles que representam grupos de interesse específico tais como
a juventude, as mulheres e as comunidades minoritárias culturais e étnicas — assim como os
sectores privado e de negócios.

O Brasil encontra-se no processo de desenvolver uma estratégia nacional de prevenção, con-


duzida em parte pela experiência do seu programa nacional abrangente sobre a prevenção
à criminalidade, o Programa Nacional de Proteção Pública com Cidadania (PRONASCI)
36 MANUAL DE DIRETRIZES DE PREVENÇÃO À CRIMINALIDADE: APLICAÇÃO PRÁTICA

(www.mj.gov.br/pronasci). Este programa envolve uma série de mudanças estruturais às


instituições chave bem como programas locais indicados. Baseia-se em parcerias multis-
sectoriais ao nível do governo, marca objectivos e direciona as intervenções para as áreas
metropolitanas prioritárias. O programa designa uma série de intervenções prioritárias para
oa quais existe o financiamento. É importante assinalar que uma pré-condição do financia-
mento é que os municípios locais deverão mostrar a sua disponibilidade para estabelecer,
eles próprios, escritórios de gerenciamento integrado. Actualmente, os 112 municípios, 21
estados e o Distrito Federal estão todos envolvidos no PRONASCI. O programa é descrito
em mais pormenor na caixa 3.

Caixa 3 O programa de proteção pública no Brasil

O Brasil lançou seu novo programa de segurança pública, o Programa Nacional de Proteção
Pública com Cidadania (PRONASCI), em 2007. É baseado no Ministério de Justiça, e envolve 94
acções estruturais e programas locais. Todos estes incluem parcerias com outros ministérios relati-
vamente a assuntos específicos. As ações estruturais cobrem a reestruturação das forças policiais e
o sistema penitenciário, bem como a formação de profissionais. O programa tem como objectivos
completos beneficiar directamente cerca de 3,5 milhões de profissionais de segurança pública,
jovens e suas famílias, e reduzir a taxa de homicídio de 29 em cada 100,000 pessoas, para 12 em
cada 100,000 pessoas, durante os próximos quatro anos.

Os programas locais visam as regiões metropolitanas de prioridade elevada e envolvem três cor-
rentes de financiamento:

( a) Os programas entitulados “Território de Paz” destinam-se a: ajudar a estabelecer a gestão


municipal e parcerias integradas entre os serviços locais, incluindo a polícia e a sociedade civil
(Gabinetes de Gestão Integrada Municipal); estabelecer Concelhos Comunitários de Proteção
Pública—fóruns de discussão em torno de proteção pública; estabelecer mecanismos que
visam aumentar o conhecimento do público sobre os papéis e os direitos dos cidadãos; provi-
denciar incentivos financeiros para jovens em situação de risco, no que se refere a projectos
de índole cultural; fornecer serviços a vítimas femininas da violência; oferecer formação sobre
direitos humanos a juízes, delegados do Ministério Público e defensores públicos; e montar 10
centros de acesso à justiça e resolução de conflitos;

( b) As áreas cobertas pelo programa “Inserção de Família e Juventude” são: assistência e for-
mação para jovens expostos à violência urbana e doméstica, com actividades cívicas, de lider-
ança, resolução de conflitos, desporto e culturais; projecto “ Reserva do cidadão” para jovens
que saiam do serviço militar obrigatório, com o intuito de prevenir a sua entrada para uma vida
de crime; projecto “mulheres de paz”, fornecendo treinamento em civismo, direitos humanos e
aptidões de liderança a mulheres residentes em áreas cujo risco de envolvimento em tráfico de
seres humanos e a violência é elevado; uma série de projectos educacionais que visam elevar
os níveis de instrução de todos esses que se encontram em risco de serem engolidos pelo sis-
tema judiciário e a prisão; o projecto “Pintar a liberdade, pintar a cidadania” para os presidiários,
através do qual são fabricados equipamentos de desporto para as escolas e providenciadas
habilidades práticas para o emprego depois de sair da cadeia;
CAPÍTULO II  O CONTRIBUTO FUNDAMENTAL DOS GOVERNOS 37

( c) O programa “proteção e socialização” debruça-se sobre: a recuperação de espaços urba-


nos e áreas para as comunidades mais pobres, em articulação com o Ministério dos Municí-
pios; projectos intensivos de instrução para comunidades selecionadas, de mãos dadas com o
Ministério de Educação; uma série de projectos culturais sobre bibliotecas, museus e espaços
jovens em zonas identificadas como desfavorecidas.

Os estados e municípios são convidados a candidatar-se a financiamento para projectos especí-


ficos, devendo satisfazer determinadas condições, entre as quais a vontade de estabelecer gabi-
netes de gestão integrada. Os estados e municípios que conduzirem projectos existentes fora de
zonas designadas, podem igualmente candidatar-se ao financiamento. Foram afectados na totali-
dade R$ 6.707 bilhões (equivalente a aproximadamente 3.780 bilhões de US$) para o período
de 2007-2011.

A Estratégia Nacional de Proteção Pública do Brasil tem vindo a ser montada, em seguimento
a uma série abrangente de negociações participatórias havidas com os principais interessados
em todas as regiões do país. Teve lugar a primeira Conferência Nacional de Proteção Pública
em Agosto de 2009, com representantes de todos os sectores de governo, o estado e os departa-
mentos locais, bem como a sociedade civil, para modelar e prestar apoio ao desenvolvimento da
estratégia.

Ver o capítulo V para uma discussão mais pormenorizada sobre as abordagens multissectoriais
e de parceria, e o capítulo VI sobre o envolvimento da sociedade civil.

E. A educação pública e os meios de comunicação


social
Existem algumas razões importantes que justificam envolver o público e os meios de imprensa,
por parte do Governo, em assuntos de prevenção à criminalidade e a sua estratégia. A política
pública facilmente se pode deixar levar pela ansiedade do público ou por apelos a medidas mais
severas, na ausência de uma compreensão clara das alternativas. Em praticamente todos os país-
es, os meios de imprensa têm tendência a focar as ofensas e as ocorrências mais violentas, com
poderosa influência sobre a opinião pública no que toca à questão da criminalidade. Contudo,
o que se tem tornado claro é que se as pessoas receberem as informações de uma forma mais
equilibrada, terão muito mais vontade de apoiar a prevenção à criminalidade.

No Canadá, por exemplo, embora a cobertura por parte da imprensa por vezes até pareça sugerir
que o público gostava de ver mais policiamento e penas mais duras para os ofensores, quando
se procura obter o parecer do público, verifica-se que, muitas das vezes, existe um forte apoio
em prol da abordagem preventiva. Houve indícios numa série de sondagens junto da opinião
pública de uma reacção positiva em relação ao investimento em programas de prevenção.37

• 73 por cento dos Canadianos acreditam que dar oportunidade à juventude de se envolver

37 J. V. Roberts e M. Grossman, “A prevenção à criminalidade e a opinião pública”, Jornal Canadiano de Criminologia,


vol. 32, 1990, pp. 75-90. Resultados parecidos foram encontrados em diversas sondagens, como as que foram conduzidas
pelo Environics Research Grouping, 1997; e Ekos Research & Associates, em 2002 em 2004.
38 MANUAL DE DIRETRIZES DE PREVENÇÃO À CRIMINALIDADE: APLICAÇÃO PRÁTICA

em ações positivas é a melhor forma de se evitar a criminalidade juvenil, comparado com


25 por cento dos inquiridos que achavam que penas mais duras eram a melhor solução.

• 6 7 por cento dos Canadianos acreditam que a prevenção à criminalidade é mais eficaz
em termos de custo do que a execução da lei, no que se refere à redução de custos tanto
económicos e sociais que o crime acarreta para uma sociedade.

Em El Salvador, um estudo sobre a forma como o público entende o crime e a insegurança,


revela que, embora muitos dos inqueridos considerassem importante, sem dúvida, haver mais
policiamento e leis fortes, muitos mais achavam que desenvolver programas de prevenção e sen-
sibilização dos cidadãos constituía a melhor maneira de combater o crime.38

• 9 7 por cento do público de El Salvador achou que aumentar a consciência pública na


responsabilidade de prevenir à criminalidade era a resposta mais importante.

• 9 6 por cento do público de El Salvador achou que os programas de prevenção à crimi-


nalidade eram uma forma efectiva de responder à criminalidade.

Em muitos países, o público geral ainda supoem que é da responsabilidade única da polícia as-
segurar a protecção. Por consequência, os governos precisam de contratar diálogo junto dos ci-
dadãos e desenvolver campanhas concertados para os educar sobre a melhor forma de encorajar
os outros sectores a contribuir para a prevenção, e em relação a programas inovadores e sobre
o modo como os cidadãos podem ajudar pessoalmente a garantir comunidades mais seguras,
minimizando a sua vulnerabilidade.

Ao desenvolverem-se estratégias, é importante que todos os níveis de governo interagem com


o público na recolha de experiências e o relato dos problemas e as prioridades que considera
importantes. Mantendo o público informado sobre os resultados positivos dos programas, ou
os desafios enfrentados, e trabalhando com os meios de imprensa para gerar um relatório mais
detalhado e de maior equilíbrio na prevenção, são maneiras importantes de ajudar a garantir
uma maior compreensão dos programas.

A educação do público é a ferramenta mais óbvia para alertar o público para crimes novos e em
expansão, tais como o tráfico de pessoas, o tráfico de órgãos humanos, o tráfico de propriedade
ou o cibercrime cultural, e o roubo de identidade, a fraude económica ou a exploração sexual as-
sociados. Contudo, também terá que ser usado com o devido cuidado de forma a evitar aumen-
tar os níveis de medo e insegurança ao nível da população. Na Inglaterra e o País de Gales, por
exemplo, embora tivesse havido uma queda acentuada de incidência de muitos crimes durante
aproximadamente os 10 anos passados, os níveis de medo do crime estão inalterados ou mesmo
a subir.

Por fim, a educação pública sobre os tipos de serviço de apoio existentes, é um recurso principal
no trabalho de mudar as atitudes do público em geral, ou a atitude das pessoas que se encontrem
em situação de risco ou que sejam vítimas de crimes específicos. Por exemplo:

• Como parte da sua estratégia para impedir a violência contra as mulheres, o Governo

38 José Simeón Cañas, “La victimización y la percepción de inseguridad en El Salvador en 2009”, Instituto Universi-
tario de Opinión Pública (IUDOP), Boletín de Prensa, año XXIV, No. 5, 2009.
CAPÍTULO II  O CONTRIBUTO FUNDAMENTAL DOS GOVERNOS 39

Federal do Brasil lançou uma campanha de educação pública que visou uma mudança
de atitudes em relação a este crime. Isto incluiu o fornecimento de informação sobre os
serviços, uma linha de atendimento telefónico de 24 horas para as vítimas e uma série de
fóruns públicos sobre a segurança de mulheres, a fim de aumentar o debate e a consciên-
cia em relação a este tema.

Assim, a educação pública e as comunicações são importantes para:

•  nvolver o público em programas locais


E
• Alertar o público para problemas do crime emergente
• Mudar as atitudes em relação a, e a sensibilização em torno de, tipos específicos de crime
• Fornecer informação sobre os serviços e recursos
• Avaliar o ponto de vista do público em relação a problemas locais
• Avaliar o ponto de vista do público em relação a assuntos de prioridade
• Avaliar a opinião pública sobre soluções possíveis

Para mais informação detalhada sobre a comunicação com o público, ver o capítulo VI.

F. A sustentabilidade e a responsabilização dos


programas
O parágrafo 10 das Diretrizes de Prevenção à Criminalidade afirma:

Para que se possa sustentar, a prevenção à criminalidade requer recursos adequados,


entre os quais, fundos para estruturas e actividades. Deve haver uma clara prestação de
contas desses fundos, da sua implementação e avaliação, para que se possam alcançar os
resultados desejados.

O parágrafo 20 diz:

Sustentabilidade
Os governos e outras instituições de financiamento devem esforçar-se por alcançar a sus-
tentabilidade dos programas e iniciativas de prevenção à criminalidade de eficácia com-
provada, mediante as seguintes acções, entre outras:

(a) Revisão da atribuição de recursos de modo a estabelecer e manter o equilíbrio ad-


equado entre a prevenção à criminalidade e o sistema de justiça criminal e outros siste-
mas, para melhor eficácia na prevenção ao crime e a vitimização;

(b) Estabelecimento de condições para uma clara prestação de contas da atribuição de


recursos, da programação e da coordenação de iniciativas de prevenção à criminalidade;

(c) Incentivo ao desenvolvimento da comunidade nessa sustentabilidade.

As estratégias e os programas nacionais muitas das vezes são estabelecidos por um determinado
número de anos. Os problemas do crime, os Governos e as prioridades de governo e o público
40 MANUAL DE DIRETRIZES DE PREVENÇÃO À CRIMINALIDADE: APLICAÇÃO PRÁTICA

geral podem mudar. As directrizes prestam atenção especial para a importância de se estabelecer
e sustentar a prevenção à criminalidade como parte permanente da actividade do governo -
como parte de um tratamento equilibrado em relação à segurança e protecção, em conjunto com
o policiamento e os sistemas judiciais penais.

Existem diversas formas de apoiar, se não mesmo garantir, o mesmo. Um dos principais mecan-
ismos é o comprometimento financeiro e de recursos ao nível dos orçamentos nacional, estadual
e local. Isto pode incluir:

•  apoio financeiro contínuo para centros responsáveis pela prevenção à criminalidade


O
• Melhoramentos nos sistemas de recolha de dados
• Investimento em pesquisas sobre vitimização
• Formação e capacitação
• Mecanismos de financiamento que encorajam o desenvolvimento e a inovação dos pro-
gramas locais

Outra das abordagens requer o estabelecimento de mecanismos claros de prestação de contas


no que toca a saída de fundos e a integridade e conclusão de programas, e para conduzir as ini-
ciativas de futuro. Deveria ser um procedimento normal para os Governos fazer a avaliação da
viabilidade dos programas e a responsabilização pelos fundos. Por exemplo:

•  Governo da Austrália encomendou uma revisão independente do seu Programa Na-


O
cional de Prevenção à Criminalidade da Comunidade. Foi encomendado pelo Ministério
responsável pela administração do programa, para averiguar a afectação de dinheiros,
o tipo de projecto que requer o financiamento e os resultados alcançados em relação a
objectivos e balizas do programa na totalidade. O relatório faz recomendações no sentido
de haver mais desenvolvimento do programa de futuro, com base na identificação de
pontos fortes e fracos na sua aplicação.39

A sustentabilidade pode igualmente ser assegurada com a adopção de estratégias a longo prazo:

•  cidade de Bogotá, Colômbia, publicou o seu “Libro blanco” em 2007, onde aparece
A
um esboço dos seus objectivos a longo prazo, para a melhoria da segurança e qualidade
de vida dos cidadãos. Expõe os mecanismos de financiamento em curso, convidando
freguesias locais a candidatar-se a financiamento de modo a poderem empreender ini-
ciativas sobre a prevenção.

Por fim, a sustentabilidade pode ser realçada através do envolvimento da sociedade civil, pas-
sando pela promoção de uma compreensão mais nítida sobre a forma como a prevenção pode
melhorar as vizinhanças e reduzir a vitimização, com o intuito de preconizar o interesse e a par-
ticipação contínuos ao nível dos programas. As comunidades que se tornaram cientes das suas
necessidades e as capacidades de actuação em parceria com o governo, são as mais prováveis de
dar o seu apoio à continuação das políticas de prevenção.

No entanto, sustentar uma estratégia nem sempre é fácil. Alguns Governos talvez colocaram
demasiada ênfase nos aspectos de responsabilização financeira, tais como os que são eviden-

39 P. Homel e outros, A Revisão do Programa Nacional de Prevenção à Criminalidade da Comunidade : Estabelecendo


uma Nova Direção Estratégica (Canberra, Instituto Australiano de Criminologia, 2007).
CAPÍTULO II  O CONTRIBUTO FUNDAMENTAL DOS GOVERNOS 41

ciados através de resultados claros e eficazes dos programas. Na Nova Zelândia, por exemplo,
uma avaliação externa da estratégia nacional de prevenção à criminalidade apontou para uma
série de aspectos menos bem sucedidos da estratégia que careciam de alteração. No entanto, a
resposta do Governo foi encerrar a iniciativa. Isto levanta a questão mais ampla da boa admin-
istração. Pode levar tempo para que se estabeleça a prevenção à criminalidade como uma das
características de uma boa administração. A sustentabilidade confia, em parte, na retirada da
prevenção da agenda política, o que não irá ser fácil, de modo a que todos os potenciais gover-
nos possam compreender o seu valor. Isto é algo que a cidade de Bogotá e algumas das outras
cidades parecem ter conseguido.

Actualmente, existe um número de ferramentas e mecanismos práticos que se podem utilizar


em apoio da prevenção sustentável, conforme referido nos capítulos III-IV, inclusivamente:

• 
Ferramentas em apoio da recolha rotineira de informação; o diagnóstico dos problemas
da criminalidade a nível de uma cidade ou uma área local; e o desenvolvimento, a apli-
cação e a avaliação de estratégias;

•  formação em técnicas e abordagens de prevenção à criminalidade, a aplicação de pro-


A
jectos, a monitoria e avaliação, para praticantes e profissionais, assim como a sociedade
civil, incluindo organizações da comunidade local, grupos juvenis, grupos das mulheres,
minorias culturais ou emigrantes novos;

•  ublicações, recursos e redes de disseminação de práticas bem planejadas ou avaliadas


P
que abordem assuntos específicos, tais como projectos de participação e emprego ju-
venís, projectos bem-sucedidos com crianças da rua, a prevenção de roubo residencial
ou de lutas entre bandos armados;

•  ublicações e recursos para a prestação de informação sobre fundos e a institucionali-


P
zação de abordagens estratégicas, de modo a assegurar a sua sustentabilidade.

G. Formação e capacitação de Governos e outros


órgãos
O parágrafo 18 das Diretrizes de Prevenção à Criminalidade ressalta:

Treinamento e fortalecimento institucional


Os Governos devem apoiar o desenvolvimento de capacidade de prevenção à criminali-
dade, através de:

(a) Proporcionar a formação profissional às autoridades que actuam em instituições


pertinentes;

(b) Encorajar as universidades, faculdades e outras instituições educacionais a


oferecer cursos básicos e avançados, incluindo em colaboração com praticantes de
profissões liberais;
42 MANUAL DE DIRETRIZES DE PREVENÇÃO À CRIMINALIDADE: APLICAÇÃO PRÁTICA

(c) Trabalhar com os sectores de educação e profissionais no sentido de conferir certifi-


cação e desenvolver qualificações profissionais;

(d) Estimular a capacidade das comunidades para desenvolver e responder às suas


próprias necessidades.

O último papel chave para os governos a todos os níveis, consiste em dar apoio à formação e a
capacitação, para poderem empreender a prevenção à criminalidade. O trabalho em parcerias
multissectoriais, desenvolvendo sistemas de informação detalhados, analisando dados dos difer-
entes sectores, envolver as comunidades, desenvolver uma comunicação eficaz com o público e
aplicar e avaliar programas, todos exigem habilidades específcas e, frequentemente, novas. Os
governos não podem supor que os decisores de política e os profissionais liberais terão neces-
sariamente as habilidades necessárias, o que resulta uma necessidade de investimento na for-
mação e a capacitação. Do mesmo modo, as comunidades locais terão que aprender como usar
e desenvolver plenamente as suas habilidades.

Em muitos países, foram empreendidas a formação e capacitação através do estabelecimento


de estreitos laços entre os Governos e as instituições universitárias e de investigação. Podem
desempenhar diversos papeis, como:

• Oferecer aconselhamentos para a pesquisa


• Ajudar a desenvolver opções de política
• Assistir na escolha de projectos para o financiamento
• Avaliar as políticas ou os programas implementados
• Empreender estudos de pesquisa sobre problemas de crime especiais
• Ajudar a desenvolver sistemas de recolha de dados
• Desenvolvimento e concretização de programas e currículos sobre a formação e a capaci-
tação para profissionais, representantes eleitos e os grupos da sociedade civil

Os exemplos a seguir são ilustrativos de algumas das relações de trabalho estreitadas entre o
governo nacional e o Poder Estadual, e as universidades ou os centros de pesquisa especializada
estabelecidos em tempos recentes:

•  Governo da Austrália trabalhou de perto com o Instituto Australiano de Criminolo-


O
gia, um instituto de investigação especializada financiado pelo governo, para desenvolver
programas de prevenção à criminalidade e a monitorização e avaliação dos mesmos.
Também financiou projectos significativos de investigação universitária em assuntos
como a intervenção precoce, o policiamento, a violência contra mulheres e a prevenção
à criminalidade e as comunidades aborígenes. A Procuradoria Geral da República, por
exemplo, encomendou um importante estudo sobre estratégias preventivas entitulado
Caminhos da Prevenção, o que gerou programas de acção social iniciados pelo Estado e
os governos locais.

•  Estado de Minas Gerais e a cidade de Belo Horizonte no Brasil trabalham de perto com
O
o Centro de Estudo do Crime e a Protecção Pública (CRISP) da Universidade Federal de
Minas Gerais. Independentemente de desenvolver sistemas de análise de dados e progra-
mas de formação fortes, o centro colaborou no desenvolvimento e a avaliação de um pro-
grama eficaz de prevenção do homicídio da juventude, entitulado Fica Vivo (“Stay alive”).
CAPÍTULO II  O CONTRIBUTO FUNDAMENTAL DOS GOVERNOS 43

• No Chile, o Ministério da Justiça colabora com os centros especializados das univer-
sidade tais como o Programa de Seguridad Urbana da universidade de Hurtado, para
empreender a avaliação dos programas nacionais. A universidade também oferece um
programa de diploma sobre a protecção urbana. O Centro de Estudo de Protecção do
Cidadão da universidade do Chile dirige uma série programas de diploma e mestrado
sobre a formação profissional e a capacitação em áreas de ofensa juvenil, a intervenção e
prevenção, e a prevenção local e comunitária. (www.cesc.uchile.cl).

•  a África do Sul, o Centro de Investigação Científico e Industrial colabora extensiva-


N
mente com os departamentos nacional e do governo Estadual e com os Serviços Policiais
da África do Sul. Ajudou a desenvolver guias e conjuntos de ferramentas de prevenção à
criminalidade, assistiu à projecção e a execução dos programas no terreno, e tem vindo
a apoiar os municípios locais no desenvolvimento das suas próprias estratégias de pre-
venção, organizando conferências para facilitar a troca e a disseminação de boas práticas,
e empreendendo programas de formação para a autoridade local e pessoal do governo
Estadual.

Muitos dos Governos já estabeleceram centros de informação de recursos na Internet para prov-
idenciar orientação e apoio prático a decisores, profissionais liberais e investigadores, que trabal-
ham a todos os escalões de governo.

No Reino Unido, o Ministério do Interior estabeleceu um sítio web dedicado à redução da


criminalidade, em apoio das Parcerias estatutárias de Redução à Criminalidade e a Desordem
(Inglaterra) ou Parcerias de Proteção Comunitária (País de Gales). Estas parcerias devem ser
sustentadas por cada um dos municípios governamentais locais. Entre outras coisas, os sítios
web providenciam:

º Informação sobre a legislação e novas iniciativas de âmbito nacional


º Uma base de dados efectiva de boas práticas
º Estojos de ferramentas
º Publicações que se podem baixar da Internet, e informação sobre jornais
º Ligações para informação sobre prémios de prevenção à criminalidade e iniciativas Gov-
ernamentais afins
º Informação sobre recursos de financiamento e como se candidatar aos mesmos
º Recursos em linha para o ensino e aprendizagem e uma avaliação técnica das necessidades
º Relatórios de investigação sobre uma gama de temas locais de proteção comunitária
º Um fórum de discussão
º Mini-sítios com informação e recursos com 25 temas específicos sobre crimes ou pro-
teção local
º Ligações a sítios web das instituições académicas, o governo central, grupos locais, a polí-
cia, associações profissionais e grupos de voluntários (www.crimereduction.homeoffice.
gov.uk)
º No Estado de Nova Gales do Sul, na Austrália, o governo criou um portal em apoio à
construção das comunidades, incluindo a área de acção para a prevenção à criminalidade
ao nível local. Trata-se duma câmara de compensação electrónica, que providencia toda
uma gama de ferramentas e recursos e informações sobre fontes de financiamento (www.
communitybuilders.nsw.gov.au).
44 MANUAL DE DIRETRIZES DE PREVENÇÃO À CRIMINALIDADE: APLICAÇÃO PRÁTICA

Há agora um número crescente de cursos educacionais e profissionais e de qualificações, sobre


aspectos da prevenção à criminalidade, em resposta à procura de, e interesse crescente neste
campo. Muitos são ensinados em centros especializados da universidade, outros por faculdades
da polícia.40 Os cursos em linha de rede, as visitas de estudo e os cursos graduados estão agora
disponíveis em muitas regiões. As organizações de investigação regional incluem a Faculdade
Latino-Americana de Ciências Sociais (FLACSO), que reune centros universitários e de pes-
quisa na América Latina para trabalharem sobre aspectos da proteção e prevenção.

As organizações não governamentais e internacionais são outra fonte valiosa de formação e


habilidade especializadas. Organizações tais como o Instituto para a Proteção e a Democracia
(INSYDE) (ver a caixa 4 abaixo) e Democracia, Derechos Humanos y Seguridad (DHSS), am-
bas baseadas no México, trabalham em apoio do desenvolvimento de estratégias de prevenção,
incluindo o treinamento da força policial. No Brasil, o Fórum Brasileiro de Proteção Pública e
o Instituto “Sou da Paz” são exemplos de organizações não governamentais que empreendem a
formação junto da polícia e de outros sectores públicos, no que se refere aos aspectos da preven-
ção. O Centro para a Justiça e a Prevenção à Criminalidade na África do Sul é especializado em
assuntos que afectam as crianças e a juventude. Desenvolve ferramentas e formação, empreen-
dendo, além disso, a pesquisa e o desenvolvimento e a aplicação de projectos.

Caixa 4. O Instituto para a Proteção e a Democracia, México

O Instituto para a Proteção e a Democracia (INSyDE) no México estimula um policiamento que é,


ao mesmo tempo, eficaz e respeitador dos direitos cotidianos, usando modelos de prestação de
contas e de policiamento democrático. A fim de reforçar a capacidade de resposta por parte da
polícia frente ao crime violento, o Instituto promove uma formação de ajuda à polícia na monta-
gem de novos processos que desencorajem a corrupção, responsabilizando os agentes policiais
por quaisquer abusos, ao mesmo tempo que promovem as práticas democráticas em resposta às
necessidades dos cidadãos. Tem vindo a desenvolver manuais e a fornecer programas de solidar-
iedade e apoio técnico para ajudar a polícia a melhorar a sua actuação e sistemas de vigilância.

À semelhança, diversas organizações não governamentais, tanto internacionais e regionais, tor-


nam disponível acções de apoio a Governos e cidades, facultando a assistência técnica, formação
e capacitação à prevenção do crime e a justiça criminal. O Escritório de Washington na América
Latina, com a sua sede nos Estados Unidos, realiza formações de investigação, treino e capaci-
tação de modo a encorajar os Governos, as organizações não governamentais e a sociedade civil
a unirem esforços contra a violência e a favor da segurança na América Latina. Grande parte do
trabalho empreendido ao nível do Escritório tem como enfoque os bandos armados e a preven-
ção da violência juvenil. O Fórum Europeu para a Segurança Urbana, com a sua sede na França,
trabalha estreitamente com as cidades europeias, bem como com as cidades na América Latina e
em África, no sentido de prestar apoio no desenvolvimento das iniciativas de prevenção. Muitas
das organizações internacionais e regionais têm aderência à rede do programa das Nações Uni-
das sobre a prevenção da criminalidade e justiça criminal, incluindo:41

40 Centro Internacional Para a Prevenção da Criminalidade, Relatório Internacional sobre Prevenção da Criminalidade
e Segurança Cotidiana: Tendências e Perspectivas, 2010 (Montreal, 2010); Projecto Beccaria (www.beccaria.de).

41 Para uma lista abrangedora dos institutos da rede do programa das Nações Unidas para a prevenção ao crime e a
CAPÍTULO II  O CONTRIBUTO FUNDAMENTAL DOS GOVERNOS 45

•  entro Internacional de Prevenção à Criminalidade (ICPC), com sede no Canadá


C
• Universidade Naif Árabe para as Ciências de Segurança, na Arábia Saudita
• Instituto de América Latina para a Prevenção à Criminalidade e o Tratamento de Ofen-
sores, com sede em Costa Rica, e o escritório do Instituto no Brasil
• Instituto Europeu para a Prevenção e Controlo do Crime, sob a égide das Nações Unidas,
com sede na Finlândia.
• Instituto Inter-Regional das Nações Unidas de Investigação sobre o Crime e a Justiça,
com sede na Itália.
• Instituto Coreano de Criminologia
• Instituto Africano para a Prevenção do Crime e o Tratamento de Ofensores, com sede no
Uganda
• Instituto de Ásia e o Extremo Oriente para a Prevenção do Crime e o Tratamento de
Ofensores, no Japão.

Um método de capacitação utilizado com mais e mais frequência, é a partilha de informação


e experiências entre os países e as cidades. Aprender directamente com as pessoas que têm ex-
periência no lidar com projectos, revela-se frequentemente um método muito mais eficiente do
que aprender à distância. Redes tais como a Faculdade de Ciências Sociais da América Latina,
o ICPC e o Fórum Europeu para a Segurança Urbana, o programa europeu de troca e aprendi-
zagem que promove o desenvolvimento urbano sustentável (URBACT), e o Programa Cidades
Mais Seguras do Programa das Nações Unidas para Assentamentos Humanos (UN-HABITAT),
gozam de experiência considerável no tocante à facilitação desse tipo de partilha. Seguem-se
alguns exemplos:

• O Programa Cidades Mais Seguras do UN-Habitat foi montado em 1998, a pedido dos
presidentes da câmara africanos. Para além do seu trabalho de apoio às cidades no desen-
volvimento de estratégias abrangentes de prevenção, ao longo dos últimos doze anos, tem
organizado uma série de conferências internacionais e regionais em África e América
Latina. As mesmas têm reunido presidentes da câmara e outras partes interessadas na
promoção de partilhas sobre temas tais como a prevenção à criminalidade por parte de
governos locais, a segurança das mulheres, a juventude em risco e os programas e projec-
tos de participação juvenil (www.unhabitat.org).

•  projecto Sul-Sul do UNODC sobre a cooperação regional para determinar melhores


O
práticas de prevenção à criminalidade no mundo em vias de desenvolvimento, ligou os
decisores da política e os investigadores da África Austral com os seus homólogos das
Caraíbas com o intuito de providenciar-lhes assistência técnica e para construir capaci-
dades entre regiões que experimentavam níveis extremamente elevados de violência.
Houve intercâmbios, foram identificadas boas práticas e verificou-se a publicação de um
Manual.42

• S eminários de trabalho internacionais sobre a prevenção à criminalidade, convocados


durante os Congressos das Nações Unidas de Prevenção à Criminalidade e Justiça Crimi-
nal, em Viena, 2000, em Banguecoque, 2005 e em Salvador, no Brasil, 2010, forneceram

Justiça Criminal, ver www.unodc.org/unodc/en/commissions/CCPCJ/institutes.html.

42 Manual de Planejamento e Ação para a prevenção ao crime nas regiões do Sul de África e do Caribe, Série de Manuais
de Justiça Criminal (Publicação das Nações Unidas, Venda No. E.09.IV.1).
46 MANUAL DE DIRETRIZES DE PREVENÇÃO À CRIMINALIDADE: APLICAÇÃO PRÁTICA

oportunidades para a partilha de experiências um pouco por todas as regiões, sobre


políticas e projectos específicos.

•  ICPC apoiou um programa de “twinning” (intercâmbio de cidades) de três anos, entre


O
as cidades francófonas de Montreal, Liège e Bordeux. Isto permitiu às cidades trabal-
harem em conjunto para o desenvolvimento de uma análise de problemas relacionados
com a prostituição e a droga, e desenvolver, executar e averiguar um determinado plano.
O resultado foi um manual de orientação pormenorizado para ajuda às outras cidades
preocupadas com questões semelhantes.43

Por fim, as principais instituições financeiras, tais como o Banco Mundial e o Banco de De-
senvolvimento Inter-Americano, apoiam projectos de formação e capacitação. À semelhança,
muitos dos países designados de rendimento elevado, tais como a Austrália, Canadá, Dinamar-
ca, França, Alemanha, Japão, Noruega, Suécia, o Reino Unido e os Estados Unidos, facilitam
encontros bilaterais e visitas de estudo ou de estágio em parceria com os ditos países de rendi-
mento médio e baixo. A Noruega e a Sérbia, por exemplo, trabalharam juntos num programa
de assistência técnica para a Sérbia. Isto incluiu uma série de programas de formação da polícia
da Sérbia, na Noruega e na Sérbia, com visitas de intercâmbio à Noruega. O programa incluiiu
o acompanhamento constante da polícia da Sérbia por parte da polícia da Noruega e as autori-
dades do governo local, por exemplo, no desenvolvimento de boas práticas e as relações ao nível
da comunidade.

Ferramentas e recursos

Para mais informação e exemplos de estratégias nacionais, subregionais e locais sobre a preven-
ção à criminalidade, ver:

• elatório Internacional sobre Prevenção da Criminalidade e Segurança Cotidiana:


R
Tendências e Perspectivas (Montreal, ICPC, 2008).
• Relatório Internacional sobre Prevenção da Criminalidade e Segurança Cotidiana:

Tendências e Perspectivas (Montreal, ICPC, 2010).
• UN-Habitat, Programa das Nações Unidas para Assentamentos Humanos – Programa
Cidades Mais Seguras (Nairobi, 2007.)44

43 Julie Savignac, Isabelle Lelandais e Valérie Sagant, Nuisance publiques liées aux drogues et à la prostitution: Manuel
pratique pour l’action locale (Montreal, Centro para Prevenção Internacional do Crime, 2007).

44 Ver www.unhabitat.com e selecionar Programa e Publicações sobre Cidades Mais Seguras.


CHAPTER IV

III. A prevenção à
criminalidade baseada
no conhecimento

A. A base de uma prevenção proactiva e eficaz

O parágrafo 11 das Diretrizes de Prevenção à Criminalidade destaca o uso da base de conheci-


mento enquanto princípio básico:

Estratégias, políticas, programas e ações de prevenção à criminalidade devem estar


baseadas numa ampla e multidisciplinar gama de conhecimento sobre os problemas do
crime, as suas causas múltiplas e as práticas prometedoras e comprovadas.

No que se refere aos métodos de implementação deste princípio, o parágrafo 21 ressalta que:

Sempre que for necessário, os Governos e/ou a sociedade civil devem facultar a prevenção
à criminalidade com uma base sólida de conhecimentos através das seguintes ações, entre
outras:

(a) Fornecer as informações necessárias às comunidades para as permitir lidar com


problemas relacionados ao crime;

(b) Apoiar a produção de conhecimentos úteis e aplicáveis que sejam, ao mesmo tempo,
cientificamente confiáveis e válidos;

(c) Suportar a organização e a síntese do conhecimento e identificar e procurar reparar


lacunas na base do conhecimento;

(d) Partilhar esse conhecimento, sempre que for necessário, com os investigadores, os
formuladores das políticas, educadores, profissionais liberais de outros sectores afins e a
comunidade alargada;

(e) Aplicar este conhecimento para replicar as intervenções bem-sucedidas, desenvolver


novas iniciativas e fazer um prognóstico de prováveis problemas resultantes dos crimes,
assim como as novas oportunidades de prevenção que possam vir a surgir;

47
48 MANUAL DE DIRETRIZES DE PREVENÇÃO À CRIMINALIDADE: APLICAÇÃO PRÁTICA

(f) Criar sistemas de dados para auxiliar com maior eficácia em termos de custo, as
actividades de prevenção à criminalidade, com a realização de levantamentos regulares
sobre a vitimização nas transgressões;

(g) Promover a aplicação desses dados para reduzir a repetida vitimização, os delitos
contínuos e as áreas com altos índices de criminalidade.

As Diretrizes de Prevenção à Criminalidade, colocam uma forte ênfase sobre a importância de


se utilizarem os conhecimentos e a informação mais adequados no sentido de encorajar o con-
hecimento bem-fundamentado sobre a situação do crime actual, as causas subajcentes do crime
e potenciais estratégias de prevenção. É usada uma grande variedade de terminologia por parte
dos formuladores de políticas e pesquisadores que trabalham nesta área de prevenção, para se
referirem a este conhecimento, incluindo os termos base de provas e prevenção conduzida pelas
evidêncisa. Seja qual for o termo usado, entende-se que tem que haver a recolha de dados de
uma forma sistemática, a partir de uma variedade de fontes confiáveis, e que será empregue a
informação ciêntífica válida, derivada das pesquisas e avaliações de projectos na prática.

Tal como já foi falado nos capítulos anteriores, porque existem muitos tipos diferentes de crime
e vitimização e muitos factores causais, é importante que seja efectuada a recolha de informação
a partir de uma vasta gama de sectores de serviços e fontes. Em quase todos os países, grande
parte dos crimes que acontecem nunca são participados à polícia, de modo que a informação da
polícia sobre o local e as vítimas do crime é menos precisa ou detalhada do que deveria ser. Os
registos da polícia sobre os crimes que são de facto participados, podem ser suplementados por
dados quantitativos de avaliação de vitimização, registos dos hospitais no que se refere a feri-
mentos sustentados, registos escolares, dados dos serviços de justiça e sociais, assim como dados
qualitativos tais como a informação de entrevistas com os grupos chave das partes interessadas.
É essencial haver uma boa base de conhecimento de forma a conseguir fazer-se a avaliação da
eficácia e a sustentabilidade da política, e para ajudar a modificar os programas de modo a que
possam ir de encontro aos seus objectivos.

As Diretrizes de Prevenção à Criminalidade esboçam algumas formas em que os Governos po-


dem propiciar o desenvolvimento de uma base de conhecimento bem-fundamentada, e susten-
tá-la. Este capítulo irá rever:

• Porque é que a base de informação sobre a prevenção à criminalidade precisa de ser mais
ampla e inclusiva
• Os principais tipos de informação necessária – sobre a extensão do crime, os factores
casuais, políticas e práticas efectivas existentes, e a implementação e a avaliação de pro-
gramas
• Como é que se pode desenvolver uma base de conhecimento
• Algumas fontes de dados e ferramentas chave que podem assistir com o desenvolvimento
e a articulação de estratégias de prevenção

B. Conhecimento mais amplo e inclusivo


O Parágrafo 8 das Diretrizes de Prevenção à Criminalidade, sobre o desenvolvimento e a inser-
ção sócio-económica, afirma:
CAPÍTULO III  A PREVENÇÃO À CRIMINALIDADE BASEADA NO CONHECIMENTO 49

As considerações sobre a prevenção à criminalidade devem ser integradas em todas as


políticas e os programas sociais e económicos, incluindo aqueles que abordem questões
de emprego, educação, habitação e planificação urbana, a pobreza, a marginalização so-
cial e a exclusão. Dever-se-á acentuar especialmente as comunidades, as famílias, as cri-
anças e a juventude em risco.

O parágrafo 14, que fala sobre a diferenciação, tem a seguinte leitura:

As estratégias de prevenção à criminalidade deverão tomar em conta, também quando


for o caso, as diferentes necessidades de homens e mulheres, assim como as necessidades
especiais de membros vulneráveis da sociedade.

As Directrizes, nos seus princípios básicos, colocam uma ênfase muito forte sobre o desenvolvi-
mento, a inclusão e a diferenciação sócio-económicos. A inclusão social refere a importância
de se ter em conta as necessidades e experiências de todos os sectores da sociedade. Isto inclue
os mais pobres e desapossados, mulheres e grupos minoritários tais como as populações ou
emigrantes etno-culturais. A experiência do crime e o cotidiano destes grupos é frequentemente
muito diferente do resto da população, sendo que estes grupos, muitas das vezes, são submetidos
a exclusão social, económica e até cultural.

A diferenciação é um meio de garantir a abordagem deste tratamento diferente. Ao conduzir-


se uma pesquisa sobre o crime e as suas causas, e ao executar e efectuar-se uma avaliação dos
programas, os Governos deveriam levar sempre em conta os efeitos do crime sobre estes grupos
e as possíveis formas de atender as suas necessidades.

Por exemplo, os Governos deveriam prestar atenção mais cuidadosa à questão de géneros, e os
diferentes impactos e experiências do crime nas meninas e os rapazes, bem como em mulheres
e homens.

As mulheres são menos propensas a participar em crimes violentos, mas são mais vulneráveis do
que os homens à agressão sexual, a perseguição, a violência doméstica e o tráfico de pessoas, as-
sim como ao estupro em situações de conflito. As taxas de relato desses crimes também tendem
a ser muito baixas. As mulheres experimentam níveis mais elevados de medo e insegurança em
espaços públicos do que os homens.

Para garantir que tais diferenças possam ser compreendidas e incluídas sistematicamente em
todo o processo de recolha de conhecimentos, é importante desagregar os dados recolhidos
em dois grupos, homens e mulheres, e procurar obter informações específicas sobre ambos os
géneros. Isto é possível, por exemplo, através de inquéritos relacionados com a vitimização,
projectados especificamente para inquirir das mulheres acerca das suas experiências de crime.
Assim, uma das principais formas de assegurar que as necessidades diferentes dos homens e
as mulheres serão tomadas em conta nas estratégias de prevenção, é através da integração de
géneros.

A integração da dimensão do género foi definida pelo Concelho Económico e Social conforme
se segue:
50 MANUAL DE DIRETRIZES DE PREVENÇÃO À CRIMINALIDADE: APLICAÇÃO PRÁTICA

Definição do conceito de integração de género


A integração da dimensão de género é o processo através do qual é possível fazer-se a
avaliação das implicações tanto para mulheres e homens, de qualquer ação planificada,
incluindo a legislação, as políticas e os programas, em todas as áreas e a todos os níveis.
Trata-se da estratégia que vem transformar as preocupações e experiências das mulheres
e os homens numa parte integrante do projecto, a implementação, a monitoria e a aval-
iação de políticas e programas, ao nível de todas as esferas políticas, económicas e soci-
etais, para que mulheres e homens possam sentir-se beneficiados de uma forma equita-
tiva, e também para que a desigualdade não seja perpetuada. O objectivo final consiste na
realização da equidade de géneros.45

Muito provavelmente, irá ser necessário fazer aplicação da mesma abordagem aos grupos
minoritários ou aos sectores da população que se encontrarem excluídos dos estudos do gov-
erno ou os exercícios de levantamento de dados com base, muitas das vezes, em agregados
familiares. Os residentes de assentamentos informais, as pessoas sem posses, crianças da rua
e outras crianças e jovens, as comunidades de emigrantes e os refugiados e grupos minori-
tários em geral, provavelmente terão todos experiências da criminalidade e a vitimização que
nunca foram capturadas quer através de avaliações ou nos registos oficiais da polícia. As suas
necessidades e experiências podem exigir uma investigação especial adequada de avaliação
dos problemas do crime e os seus factores causais, bem como no sentido do desenvolvimento
de intervenções.

C. Tipos de conhecimento necessários


Os tipos diferentes de conhecimento com base em provas são exigidos por esses Governos e
profissionais liberais que se encontrem envolvidos em desenvolver estratégias nacionais, region-
ais ou urbanas, ou a planificar a intervenção de um programa específico. Em cada fase do desen-
volvimento de uma estratégia ou um programa de prevenção à criminalidade, o conhecimento
com base em provas é necessário para que se possa efectuar uma avaliação do tamanho e a
abrangência dos problemas do crime, e para a análise de suas causas, a identificação de soluções
possíveis para os mesmos, e a escolha e a avaliação de programas. Esta informação pode ser
agrupada sob quatro títulos principais:

Conhecimento sobre a incidência e prevalência de problemas relaciona-


dos com o crime

Isto exige a recolha de informações quantitativas e qualitativas de uma gama de sectores, não
confiando unicamente em informação do crime relatada por sectores da polícia ou outros sec-
tores de segurança. Pode haver a recolha de informação e um estudo sobre a predominância e
incidência de crimes não-relatados e medo do crime, através de pesquisas sobre a vitimização.
A informação relevante e segura sobre o crime e os problemas sociais pode ser cotejada a partir
de uma variedade de fontes, tais como os departamentos de acidentes e emergências do hospi-

45 Conclusões acordadas pelo Conselho Económico e Social 1997/2 sobre a integração da dimensão de géneros em
todas as políticas e programas no sistema das Nações Unidas (ver Relaórios Oficiais da Assembleia Geral, Quinquagésima
segunda sessão, Suplemento No. 3 (A/52/Rev.1), cap. IV, para. 4).
CAPÍTULO III  A PREVENÇÃO À CRIMINALIDADE BASEADA NO CONHECIMENTO 51

tal, escolas, a habitação, os transportes, a recreação e os departamentos ambientais, a família, a


juventude e serviços sociais.

As organizações da sociedade civil e comunidades locais são um recurso importante. Estas


entidades são quem, provavelmente, têm a experiência e o conhecimento mais pormenoriza-
dos acerca dos grupos específicos que se encontram em situação de risco e são muito difíceis
de alcançar, tais como as crianças da rua, jovens em risco ou pertencentes a bandos juvenis
armados, mulheres vítimas da violência, e populações socialmente marginalizadas. Organi-
zações que trabalham com grupos tais como estes podem server de utilidade em termos do
acesso que gozam em relação aos mesmos e de molde a auscultar as suas opiniões. A in-
formação qualitativa sobre as entrevistas e as observações ajudarão a suplementar os dados
quantitativos.

Os governos a nível nacional, Estadual ou provincial irão querer investigar a ocorrência do


crime numa conjuntura urbana e rural. Os governos locais terão que examinar os padrões da
criminalidade emergente e problemas afins na sua área de jurisdição, e em relação à sua região
ou a outras cidades do país.

Conhecimento sobre a causalidade do crime e a vitimização

Uma vez identificada a informação sobre o crime e os problemas sociais e económicos daí
surgidos, a informação sobre quando e onde tais problemas surgiram, e quem são os inter-
venientes, irá ajudar a elaborar uma imagem sobre os padrões e as tendências principais, e
quais são os factores causais mais prováveis. Isso facilitará a identificação das populações mais
vulneráveis, bem como as metas ou os locais geralmente mais ligados a determinados tipos
de crime.

Tal como foi referido anteriormente, este tipo de informação carece de análise por uma varie-
dade de sectores e disciplinas, envolvendo insumos de uma larga gama de serviços, incluindo
projectistas urbanos, as direções sobre a habitação, os serviços de juventude, a polícia e a
justiça, e a sociedade civil, bem como os peritos de investigação. Um padrão claro de crimes
violentos por jovens pode ser identificado em determinadas áreas, por exemplo, mas poderá
haver um número de factores preponderantes, tais como a falta de iluminação nas ruas, o que
reduz os riscos para os delinquentes, a ausência de facilidades e recursos recreacionais, ou o
aumento no tráfico de droga, aspectos passíveis de abordagem através de diferentes tipos de
intervenção.

É importante examinarem-se a estrutura da criminalidade e os problemas sociais no contexto


especial de cada país ou cidade. Na generalidade, os factores afectando o crime e a vitimização
são muito semelhantes uns aos outros em todas as regiões e os países. A diferença, normal-
mente, está na escala dos problemas. É provável que existam factores específicos que afectem
os países individuais de rendimentos médios ou baixos, tais como níveis de corrupção ou
a confiança na polícia, ou taxas de pobreza e problemas sociais e económicos, que atraem
o crime transnacional. Factores de risco tais como níveis elevados de desemprego entre os
jovens, a situação de ingresso na escola e a educação, ou o acesso a armas ligeiras, variam de
uma forma acentuada.
52 MANUAL DE DIRETRIZES DE PREVENÇÃO À CRIMINALIDADE: APLICAÇÃO PRÁTICA

Conhecimento sobre políticas e boas práticas existentes

A fim de selecionar as intervenções aparentemente mais prováveis de responder ao crime e os


problemas sociais identificados, é importante que se olhe para o que já existe ao nível dum país
ou uma cidade, em termos de programas e serviços, e a forma como os mesmos podem ser
melhorados. Também seria de valor tomar-se em conta a experiência das práticas eficazes de
prevenção à criminalidade noutros países, aos níveis local, regional e internacional. Isto inclui
as intervenções com resultados a curto, médio e mais longo prazos.

A pesquisa sobre a eficácia das intervenções de prevenção à criminalidade tem vindo a demon-
strar um enorme crescimento nos últimos anos, devido ao facto de governos e pesquisadores
terem apostado na prevenção. É importante identificarem-se programas que correram bem e
atingiram os seus objectivos, e que, aparentemente, apresentaram resultados prometedores, para
ajudar na informação aos decisores sobre quais os projectos que deverão empreender.

Estes dispõem de recursos e meios amplos de recolha de dados e pesquisadores competentes,


presumindo-se que as instituições e os sectores de serviço se mantêm relativamente fortes.

Os programas de prevenção avaliados pela rede de pesquisa internacional, a Colaboração Camp-


bell (www.campbellcollaboration.org), por exemplo, só envolveram programas que satisfaziam
uma série de padrões ciêntíficos, tais como a utilização dum grupo de controlo e um tipo de in-
tervenção claramente identificada. Através de estudar programas semelhantes em configurações
distintas, a Colaboração Campbell conseguiu identificar a eficácia desses tipos de programa.46
Esta abordagem adapta-se particularmente bem à avaliação de certos tipos de prevenção à crimi-
nalidade, tal como a intervenção situacional e durante a mais tenra infância. Torna-se muito mais
difícil a aplicação de estratégias ou intervenções comunitárias que envolvam uma gama de ac-
tividades diferentes. Mais, grande parte deste trabalho foi conduzido ao nível de países de rendi-
mentos elevados, não sendo, por isso, necessariamente transferível, mesmo dentro de uma região.

É possível encontrar-se informação sobre políticas e práticas desenvolvidas por países, cidades
e organizações locais, nos inventários e coleções, sobre estratégias e programas, sendo que a
maior parte dos mesmos se encontra plenamente difundida em diversos idiomas. Incluem pro-
jectos de prevenção galardoados de regiões e países diferentes, tais como a Rede Europeia de
Prevenção da Criminalidade, ou o “esquema de prémios para inovações locais”, da Inglaterra e
o País de Gales (www.npia.org); inventários e relatórios sobre práticas eficazes, tal como os que
foram cotejados pela Colaboração Campbell; ou programas modelo avaliados e reproduzidos,
tais como os programas ‘Blueprint’ (Lit. Cópia Heliográfica) desenvolvidos nos Estados Unidos;
e compilações de programas sobre os diferentes temas, tais como a prevenção à criminalidade
urbana, a juventude em situação de risco, a segurança da mulher, intervenções junto de bandos
juvenis armados, escolas seguras, e o gerenciamento dos espaços públicos. É fornecida mais
informação nas publicações do Centro para Prevenção Internacional do Crime (www.crime-
prevention-intl.org).

Na Europa, a rede Europeia de Prevenção da Criminalidade e os projectos Beccaria e CRIM-


PREV geraram estudos úteis sobre a prevenção com base em provas. Redes regionais como

46 Ver Lawrence Sherman e outros, Prevenir ao Crime: O Que Funciona, O Que Não Funciona, O Que é Prometedor,
relatório ao Congresso dos Estados Unidos, preparado para o Instituto Nacional da Justiça (Washington, D.C., 1997).
CAPÍTULO III  A PREVENÇÃO À CRIMINALIDADE BASEADA NO CONHECIMENTO 53

o Fórum Europeu para a Segurança Urbana, e redes internacionais como o ICPC fornecem,
à semelhança, informações sobre práticas comparativas de pesquisa e prevenção que parecem
prometedoras ou que já se revelaram eficazes em configurações específicas.

Estudos de base ciêntífica em regiões como América Latina e as Caraíbas, e África estão a tornar-
se cada vez mais disponíveis, constituindo um recurso importante para os Governos poderem
fazer a avaliação da sua própria situação. O Programa Cidades Mais Seguras do UN-Habitat, por
exemplo, empreendeu um número de estudos sobre o crime e a vitimização através das cidades
africanas. Na América Latina, as organizações de investigação regionais tais como a Faculdade
Latino-Americana de Ciências Sociais (FLACSO), os centros universitários com base no país,
tal como o Centro de Estudos sobre o Crime e a Proteção Pública (CRISP) em Minas Gerais, o
Centro de Estudos de Segurança e Cidadania (CeSeC) no Rio de Janiero, Brasil, e o Programa
de Seguridad na Universidade de Hurtado no Chile, são recursos importantes. As fontes regio-
nais podem ser de valor para a identificação de projectos em países vizinhos com experiências
e contextos parecidos. As trocas Sul-Sul tais como o projecto regional do UNODC, que liga os
países de África Austral e as Caraíbas, têm todos ajudado a identificar as boas práticas e ideias
de projectos em países que enfrentam desafios parecidos.

Alguns exemplos de compêndios e relatórios sobre determinados temas específicos de preven-


ção, incluem:

•  revenir a Violência Contras as Mulheres no Corno de África e a África Oriental e Austral:


P
Um Diálogo Regional (UN-Habitat, 2004) é uma análise de boas práticas para o aumento
da segurança de mulheres através de uma gama de programas ao nível da comunidade e
em parceria com as autoridades. O relatório foi desenvolvido em três fases: uma análise
de campo abrangente, que passou em revista cerca de 400 organizações, indivíduos e
autoridades locais, inquirindo-os sobre os seus objectivos e programas principais, bem
como sobre as lições tiradas em relação à violência com base no género; um diálogo
regional que reuniu os profissionais responsáveis pelos programas mais prometedores; a
publicação de resultados e recomendações.

•  Ousadia do Desvelo: Respostas com Base Comunitária à Violência dos Bandos Juvenis
A
na América Central e as Comunidades Imigrantes de América Central nos Estados Unidos
(Washington, D.C., Escritório de Washington na América Latina, 2008) é uma revisão
dos elementos bem-sucedidos das estratégias e os programas anti-gangues na região da
América Central e os Estados Unidos. Está baseada numa análise pormenorizada de seis
programas.

•  Prevenção do Crime Urbano e a Juventude em Situação de Risco: Coleção de Estratégias


A
e Programas Prometedores de Todo o Mundo (Montreal, ICPC, 2005) é uma coleção de
iniciativas do governo local e as cidades, e as que visam homens e mulheres jovens em
situação de risco de vitimização ou delitos, providenciando um breve resumo dos objec-
tivos e resultados de projectos e informação de contacto. Foi preparado para a décima
primeira sessão do Congresso das Nações Unidas sobre a Prevenção ao Crime e a Justiça
Criminal.
54 MANUAL DE DIRETRIZES DE PREVENÇÃO À CRIMINALIDADE: APLICAÇÃO PRÁTICA

Conhecimento do processo de implementação dos programas e a men-


suração dos seus resultados e impactos

Talvez as áreas mais negligenciadas do conhecimento sobre a prevenção à criminalidade sejam


a aplicação prática dos programas e políticas e os métodos de avaliação dos mesmos. Trata-se
de um aspecto integrante da prevenção eficaz, onde os governos precisam de investir tempo e
meios.

Conforme foi discutido na introdução, tem-se aprendido muito em anos recentes sobre a ne-
cessidade de prestar atenção à forma como as políticas e os programas são executados e avali-
ados. Muitos dos programas arriscam-se a fracassar devido à falta de habilidades necessárias
ou a falta de compreensão entre as pessoas que os executam, ou porque os seus objectivos eram
obscuros demais ou pouco realistas. Poder demonstrar quais são os aspectos de um programa
que mais ajudaram a efectuar a redução no nível da criminalidade, e quais as características que
aparentemente foram menos eficazes ou que produziram resultados inesperados, pode prefazer
uma das facetas mais importantes da prevenção com base na evidência. À semelhança, poder
mostrar que uma política, de facto, ajudou a reduzir os problemas através da sensibilização e a
previsão de serviços e conselhos, é importante para a orientação do desenvolvimento futuro da
política.

A monitoração e avaliação de programas dependem do desenvolvimento de estruturas lógicas


e detalhadas para cada intervenção, com um grupo claro de objectivos, populações e áreas alvo,
resultados previstos e a repartição das responsabilidades. Estabelece-se assim a base da gestão
e monitoração para os programas após a implementação e avaliação do progresso de um pro-
jecto, e a medida em que este cumpriu com determinados objectivos. Medir os resultados e os
impactos de programas sobre os problemas da criminalidade e sociais identificados exige um
conjunto muito especial de habilidades e conhecimentos, e os governos frequentemente optam
por trabalhar com as universidades e os centros de pesquisa que são os quem podem fornecer o
apoio necessário.

Tal como acontece com práticas encorajadoras ou efectivas de prevenção ao crime, as infor-
mações e orientações sobre a aplicação de programas, bem como a sua monitoração e avaliação,
estão agora disponíveis em centros do governo, académicos e especializados sobre a prevenção
à criminalidade, mencionados no documento actual. Há ainda informação adicional sobre os
problemas mais comumente encontrados.

São exploradas também mais a fundo as abordagens referentes à implementação e a avaliação,


no capítulo IV.

D. Desenvolver o conhecimento baseado em provas


Foi levado a cabo um trabalho considerável pelos Governos a todos os níveis no sentido de
desenvolver e apoiar uma boa base de conhecimentos sobre a prevenção à criminalidade. Nos
Estados Unidos, por exemplo, o Departamento de Justiça financia a título regular, a pesqui-
sa e avaliação de programas de prevenção à criminalidade, através do seu Instituto Nacional
CAPÍTULO III  A PREVENÇÃO À CRIMINALIDADE BASEADA NO CONHECIMENTO 55

de Justiça. Por exemplo, financiou uma avaliação de cinco anos sobre a aplicação de uma sé-
rie de programas baseado em processos judiciais para impedir a violência doméstica contra
mulheres.47Apoiou um número de programas cujo objectivo foi tornar as comunidades mais
seguras, e em prol de intervenções que focalizassem os bandos juvenis e as armas de fogo, tais
como os “Projectos vizinhanças seguras”, tratando-se de programas de âmbito nacional eficazes
para reduzir a violência à mão armada.

No Programa de Redução do Crime introduzido pelo Governo da Inglaterra e o País de Gales,


em 1997, 10 por cento dos fundos foram atribuídos à avaliação do programa, e convidaram-
se as universidades a candidatar-se a financiamentos para a avaliação de projectos específicos
financiados pelo programa, tais como os que se referem aos crimes praticados nas escolas, o
roubo residencial ou a violência contra mulheres. A Procuradoria Geral da Austrália financiou
um programa de pesquisa a longo prazo designado “Caminhos para a prevenção”, que procurava
identificar os factores chave subjacentes aos hábitos de delinquência. Subsequentemente, adi-
antou algum financiamento para a aplicação das conclusões obtidas a partir desse estudo, no
âmbito de um projecto de investigação de ação.48 Muitos dos Governos fazem agora da inclusão
de aspectos de monitoria e avaliação uma condição sine qua non para a concessão de financia-
mento.

Os Governos podem contribuir apoio ao desenvolvimento de novos ou renovados conjuntos


de dados. O Governo do Canadá, por exemplo, patrocinou o desenvolvimento de bases de da-
dos detalhadas que reunem dados policiais e locais de categorização, para efeitos de prevenção
à criminalidade. Estes resultados foram tornados do âmbito público.49 Um número de países
conduzem sondagens regulares sobre os agregados familiares ou a vitimização, que passam a
constituir fontes sustentadas de informação sobre as tendências do crime, o medo do crime, as
atitudes do público, todos os quais são geradores de informações valiosas para o desenvolvi-
mento de estratégias de prevenção.

A facilitação de seminários de trabalho e fóruns de discussão sobre os resultados, e a publicação


das conclusões referentes a meios e pesquisa, são formas muito eficazes de se divulgar infor-
mação a parceiros chave tais como a polícia e os projectistas urbanos, bem como às organizações
da sociedade civil. Alguns países ou regiões já instituiram um sistema de galardões que recon-
hece as boas práticas de prevenção no terreno. Outros estabeleceram mecanismos específicos
para a recolha de informação sobre as boas práticas e políticas bem-sucedidas, e para a dissemi-
nação desse tipo de conhecimento. Entre eles estão incluídos a Rede Europeia de Prevenção da
Criminalidade, montada em 2001 pelos Governos da Europa, a Procuradoria Geral da Austrália
e o Ministério do Interior de Inglaterra e o País de Gales.

47 Adele Harrell e outros, Demonstração de Vigilância Jurídica: Relatório Culminante sobre a Avaliação (Washington,
D.C., Departamento de Justiça dos Estados Unidos, Instituto Nacional de Justiça, 2009). Disponível a partir de: www.ojp.
usgov/nij/pubs.

48 R. Homel e outros, Caminhos para a Prevenção (Canberra, Serviços de Publicação do Governo da Austrália, 1999);
Ross Homel e outros, O Projecto Caminhos para a Prevenção: Os Primeiros Cinco Anos 1999-2004 (Sydney, Universidade e
Missão Griffth, 2006).

49 Josée Savoie, Análise da Distribuição Territorial do Crime no Canadá: Resumo de Tendências Importantes, Canadá,
Estatística Canadá, Série de Documentos de Investigação sobre o Crime e a Justiça, No. 15 (Ottawa, 2008).
56 MANUAL DE DIRETRIZES DE PREVENÇÃO À CRIMINALIDADE: APLICAÇÃO PRÁTICA

E. Fontes de dados e instrumentos para aplicar o con-


hecimento
Dados sobre o crime e problemas afins

Estatísticas sobre a criminalidade

Os relatórios policiais sobre a criminalidade têm uma contribuição significativa a fazer para a
análise completa da incidência e a prevalência de um crime, o local e os envolvidos. Dados es-
tatísticos seguros sobre os índices e as tendências da criminalidade constituem uma componente
central da prevenção, com base no conhecimento, mas nem sempre são facilmente obteníveis,
ou suficientes para oferecer uma compreensão bem-fundamentada em relação aos problemas
do crime. Todos reconhecem que as estatísticas da polícia não fornecem um relato preciso da
experiência que as pessoas têm do crime.50 As taxas de criminalidade relatadas à polícia são al-
tamente dependentes da vontade das pessoas de participarem a sua experiência e da capacidade
da polícia de registá-la, além dos próprios sistemas de levantamento de dados.

Em todos os países, não obstante o nível de rendimentos, a maioria dos crimes não são partici-
pados à polícia por vários motivos, incluindo o medo das conseqüências, ou a desconfiança da
polícia. Noutros casos, algumas forças policiais não podem manter estatísticas seguras e rotinei-
ras, e até pode haver problemas com a sobreposição de jurisdições quando a polícia do estado e a
polícia da cidade, por exemplo, recolhem a informação de maneiras diferentes. Também é muito
comum verificarem-se dificuldades no acesso aos dados policiais.

Outrossim, é bem provável que certos crimes sejam mais subdeclarados do que outros, incluin-
do a violência contra mulheres, os crimes contra as crianças e jovens, as ofensas relacionadas
com a droga, o crime e a fraude de “colarinho branco”, e o crime organizado, incluindo o tráfico
de seres humanos, de droga ou de armas.

Em parte para tentar sobrepor-se a estes problemas, as pesquisas sobre a vitimização com base
populacional tornaram-se uma fonte principal de suplemento às estatísticas policiais sobre o
crime registado, providenciando os países com formas de identificar o local dos crimes e as
tendências de mensuração do crime ao longo do tempo.

Pesquisas sobre a vitimização

As avaliações da vitimização são um recurso importante para a recolha de informação sobre


a extensão do crime e a vitimização experimentadas pelos cidadãos individuais de um país ou
uma cidade. Geralmente, com base em agregados familiares, estes também podem ser uma
fonte de informação sobre os motivos que levam as pessoas a relatar uma transgressão sofrida,
o porquê ou porque não, as percepções sobre a insegurança e os assuntos de prioridade numa
determinada área.

50 Jan Van Dijk, O Mundo do Crime: Quebrando o Silêncio sobre os Problemas da Segurança, a Justiça e o Desenvolvi-
mento no Mundo Inteiro (Thousand Oaks, Califórnia, Sage Editora, 2008); Estojo de Ferramentas de Avaliação da Justiça
Criminal (Nova Iorque, UNODC, 2006).
CAPÍTULO III  A PREVENÇÃO À CRIMINALIDADE BASEADA NO CONHECIMENTO 57

As avaliações da vitimização foram utilizadas extensivamente pelo UNODC e UN-Habitat ao


abrigo do Programa Cidades Mais Seguras, por países e cidades individuais de África, e em
Papua Nova Guiné, por exemplo, onde as estatísticas representativas da polícia não são facil-
mente acessíveis aos cidadãos comuns. (Ver www.unodc.org/unodc/en/data-and-analysis/Data-
for-Africa-publications.html.)

Foi empreendido um trabalho considerável de normalização das avaliações da vitimização e


para fornecer assistência aos países e as cidades sobre o seu desenvolvimento e utilização. O In-
quérito Internacional sobre as Vítimas da Criminalidade, que usa um questionário normalizado
para permitir a comparação entre os países, foi conduzido várias vezes num número cada vez
maior de países. Em 2005, isto incluia mais de 30 países na maioria das regiões do mundo. Para
mais informação, ver www.unicri.it/wwd/analysis/icvs/index/php.

O UNODC e a Comissão Económica Europeia desenvolveram um Manual de Inquéritos sobre a


Vitimização, publicado em 2009, que foi pilotado num número de países incluindo a República
Unida da Tanzânia, o Ruanda e o Uganda.51 Este fornece orientações aos Governos sobre os pa-
drões e formas de lidar com problemas de metodologia. Abaixo encontram-se alguns exemplos
de inquéritos sobre a vitimização encomendados pelas autoridades locais:

•  Vitimização na Tanzânia: Inquéritos sobre a Criminalidade em Arusha, Dar es Salaam


A
e Mtwara (UN-Habitat, 2007), relatórios sobre um inquérito encomendado por três
municípios na República Unida da Tanzânia. Uma totalidade de 3,350 pessoas foram
entrevistadas a propósito das suas percepções sobre o crime e a segurança, as opiniões
sobre a polícia e os tribunais, a corrupção e a sua experiência com o crime. Foram
recolhidos dados demográficos para 13,373 agregados familiares das mesmas três áre-
as. O estudo levantou várias questões sobre o crime e a sua prevenção: os agentes da lei
precisavam de aumentar a sua visibilidade e presença, e ampliar a sua interação com
o público nos três municípios; as relações entre a polícia e as forças de segurança pri-
vada (Sungusungu) precisavam de ser formalizadas e melhoradas, com papeis, direitos
e obrigações mais nítidamente discriminados; a corrupção era uma área prioritária
para as forças policiais e autoridades locais; e a corrupção e o crime deveriam ser con-
sideradas prioridades para a agenda de desenvolvimento social e económico dos três
municípios.52

•  a ausência de quaisquer dados com base no censo, foi utilizada uma série de análises
N
sobre a vitimização no Sul do Sudão, de forma a averiguar a escala e a distribuição da
violência armada na região. Através do trabalho em estreita colaboração com as comu-
nidades locais, as análises forneceram informação crucial sobre as exigências da saúde,
educação e prevenção. Ajudaram a (a) identificar as prioridades para futuras interven-
ções; (b) medir os resultados das intervenções ao longo do tempo; e (c) agir no reforço de
capacidades para as comunidades locais envolvidas.53

51 ECE/CES/4.

52 UN-Habitat, Programa Cidades Mais Seguras, Vitimização na Tanzânia: Avaliação do Crime em Arusha, Dar es
Salaam e Mtwara (2007).

53 Robert Muggah e outros, “Analisar a violência armada, as armas e a vitimização no Sul do Sudão: resultados e desa-
fios”, em Redução da Violência Armada: Potenciar o Desenvolvimento, Série sobre Conflito e Fragilidade (Paris, Organização
de Cooperação e de Desenvolvimento Económicos, 2009).
58 MANUAL DE DIRETRIZES DE PREVENÇÃO À CRIMINALIDADE: APLICAÇÃO PRÁTICA

•  a Nigéria, a Pesquisa sobre o Crime e a Segurança no Estado de Lagos foi completada


N
em 2009. A pesquisa foi conduzida ao nível de 20 áreas do governo em todo o Estado,
pela Fiduciária de Segurança do Estado de Lagos e a Fundação CLEEN. Analisou os
níveis de vitimização, a experiência da corrupção das autoridades, o medo do crime e as
percepções que o público têm em relação à governação e o desempenho. (www.lagossta-
tesecurity-trustfund.org e www.cleen.org)

Também são utilizadas análises sobre a vitimização em pesquisas sobre problemas da criminali-
dade ou em relação a populações específicas, tais como a violência doméstica ou em público
contra mulheres, a vitimização dos jovens, ou a segurança escolar. A violência contra mulheres
é uma das principais categorias sub-reportadas do crime.

A Pesquisa Internacional de Violência Contra Mulheres é um exemplo de um instrumento e


recurso internacionais adaptados para serem usados num certo número de países. Um relatório
recente com resultados de 11 países, fornece informação valiosa sobre a dimensão deste prob-
lema, onde ocorre e quem está envolvido, as características das vítimas, e os motivos da falta de
registo dos incidentes junto das autoridades.54 De igual modo, a Organização Mundial de Saúde
(OMS) aproveitou as pesquisas sobre a vitimização com entrevistadores treinados, efectuadas ao
nível de 10 países, no seu Estudo Plurinacional sobre a Saúde das Mulheres e a Violência Domés-
tica Contra Mulheres, de 2005.55

Outras fontes de informação

Os recenseamentos da população e as avaliações do agregado familiar fornecem informações


valiosas, por exemplo, sobre o tamanho da população, a idade, a origem étnica e o género, assim
como a distribuição demográfica; e sobre factores do tamanho da família ou rendimentos do
agregado familiar. As avaliações especializadas contínuas podem fornecer informações ao longo
do tempo sobre a família e o desenvolvimento infantil. Tais avaliações longitudinais seguem as
crianças e os jovens durante a fase do crescimento. A Pesquisa Longitudinal Nacional das Crian-
ças e os Jovens no Canadá é um exemplo.

A informação sobre a saúde pública é uma fonte de informação importante sobre ferimentos,
acidentes e mortes violentas. O Relatório Mundial sobre Violência e Saúde, publicado pela Or-
ganização Mundial de Saúde, em 2004, discute uma tomado de posição em relação à abordagem
de todas as formas de violência, com base na saúde pública em vez de se debruçar exclusiva-
mente sobre a justiça criminal. Uma larga gama de dados sobre o uso da droga e o álcool, os
acidentes e agressões ou a mortalidade infantil, pode fornecer informações valiosas que vêm
ampliar a compreensão sobre padrões do crime e a vitimização.

Dados sobre a saúde foram usados extensivamente na América Latina e as Caraíbas, na aus-
ência de dados rotineiros de análise de vitimização, mais notavelmente, através do trabalho da
Organização Pan-Americana de Saúde (www.paho.org). A Organização Mundial de Saúde, a

54 Holly Johnson, Natalie Ollus e Sami Nevala, Violência Contra Mulheres: Uma Perspectiva Internacional (Nova
Iorque, Springer, 2008).

55 Claudia García-Moreno e outros, Estudo Plurinacional sobre a Saúde das Mulheres e a Violência Doméstica Contra
as Mulheres: Resultados Iniciais sobre a Prevalência, Resultados de Saúde e Respostas das Mulheres (Genebra, Organização
Mundial de Saúde, 2005).
CAPÍTULO III  A PREVENÇÃO À CRIMINALIDADE BASEADA NO CONHECIMENTO 59

Organização Pan-Americana de Saúde, a Aliança Contra a Violência, uma rede composta por
Estados membros da Organização Mundial de Saúde, agências internacionais e organizações
da sociedade civil, bem como a Coligação Inter-Americana para a Prevenção da Violência, são
todas fontes e recursos valiosos sobre a prevenção à violência (www.who.int/violencepreven-
tion). O relatório da Organização de Cooperação e Desenvolvimento Económicos, A Redução
da Violência Armada: Potenciar o Desenvolvimento, publicado em 2009, ilustra o modo como
uma abordagem de saúde pública pode ser aplicável em situações frágeis e de pós-conflito, mais
especialmente em África Subsareana e na América Latina, para ajudar a reduzir a violência ar-
mada entre os jovens e adultos (www.who.int/violenceprevention).56

Os departamentos de habitação e do meio-ambiente podem fornecer informações sobre o uso


da terra, a propriedade, as circunstâncias do meio-ambiente e os serviços, e sobre a disponibili-
dade e a condição de instalações públicas tais como os centros de recreação e os parques. Podem
igualmente fornecer dados sobre os locais de problemas surgidos a partir do vandalismo ou o
abuso da droga, por exemplo.

Os serviços de justiça e prisionais estão incluídos entre os principais recursos para a obtenção de
informações sobre características dos delinquentes e os padrões da sentença; características das
populações carcerárias e a juventude sob custódia, tipos de tratamento e serviços de formação
oferecidos, e taxas de reincidência. Esta informação pode ser suplementada por informação
acerca dos prisioneiros e os que são postos em liberdade, no que se refere ao que seria necessário
para evitar a sua re-encarceração.

Outras fontes de dados incluem as escolas e os serviços educacionais, a família e os serviços


sociais, os serviços às vítimas e departamentos de bombeiros, bem como organizações da socie-
dade civil e o sector privado.

As pesquisas de auto-avaliação oferecem uma fonte de informação adicional para medir a exten-
são de infracções menores. Grupos de respondentes, frequentemente as crianças ou os jovens,
são inqueridos sobre se alguma vez praticaram determinados tipos de crime. O relatório anual
de auto-avaliação sobre a investigação de ofensas cometidas foi iniciado na Inglaterra e no País
de Gales, em 2003, com o intuito de recolher informações sobre uma vida inteira passada a
cometer infracções criminais, incluindo atitudes em relação ao sistema de justiça e experiências
com a vitimização.57

As fontes qualitativas incluem uma gama de métodos para a transmissão de informação detal-
hada sobre grupos ou vizinhanças específicas, ou em relação a populações de difícil alcance, tais
como as crianças da rua. Alguns exemplos são entrevistas com a comunidade, grupos de enfoque
especial, tomadas de decisão participativa e mecanismos de avaliação de participação, tais como
as caminhadas seguras para jovens ou mulheres, bem como auditorias dos espaços públicos.

Alguns governos desenvolveram protocolos para a partilha de dados que auxiliam à associação
da informação para fins de analisar os problemas do crime e desenvolver planos de prevenção
(ver o capítulo V).

56 A Redução da Violência Armada: Potenciar o Desenvolvimento (Paris, Organização de Cooperação e Desenvolvi-


mento Económicos, 2009).

57 Guia de Auditorias sobre a Segurança Local: Uma Coleção da Prática Internacional (Paris, Fórum Europeu para a
Segurança Urbana, 2007); e o Ministério do Interior (www.homeoffce.gov.uk/rds/index.html).
60 MANUAL DE DIRETRIZES DE PREVENÇÃO À CRIMINALIDADE: APLICAÇÃO PRÁTICA

Ferramentas para a análise de dados e a avaliação de opções

Observatórios

Um número de regiões, países e cidades estabeleceram mecanismos permanentes para ordenar e


avaliar a informação sobre o crime e problemas afins. Frequentemente designados observatóri-
os, ou centros de monitoração (ver a caixa 5), estes são centros especializados que reunem dados
e informação sobre múltiplos sectores, assim como as agências e o pessoal que trabalha nos
diferentes sectores. Portanto, os obervatórios, por definição, devem envolvem a coordenação e
a colaboração multidisciplinares e multissectoriais. Através do estabelecimento de centros tais
como estes, os governos podem facilitar a análise da incidência, causas e tendências do crime
e a violência, e seus problemas afins, bem como monitorar o progresso em relação aos planos
estratégicos com a passagem de tempo.

Caixa 5. Observatórios do crime e problemas de ordem social

Numerosos países, regiões e cidades desenvolveram observatórios sobre tendências do crime, de


modo a melhorar a informação e a compreensão em relação ao crime e os problemas sociais e
económicos a ele associados. Isto permitiu-lhes alavancar com maior eficácia os recursos desig-
nados para a redução do crime e a insegurança, e edificar a proteção da comunidade. O território
coberto pelos observatórios varia. Os observatórios podem ser ao nível local – por exemplo, tanto
Madrid e Bogotá têm observatórios na cidade – subregional (Observatório Regional sobre as Políti-
cas de Segurança, Itália), nacional (l’Observatoire national de la délinquence, França), ou regional
(Observatório Centroamericano sobre violência (OCAvl)). Muitos dos observatórios focam aspec-
tos de segurança geral (Observatório de Crime de Trinidad e Tobago), enquanto que outros estão
preocupados com temas específicos (Observatório Canadiano de Violência Escolar e l’Observatoire
français des drogues et des toxicomanies (OFDT), França).

Os obervatórios do crime visam, acima de tudo, informar decisões políticas com base em infor-
mação que ultrapasse os dados policiais. Edificam sobre parcerias entre actores públicos, quasi-
públicos e/ou privados (serviços municipais, serviços de transporte, alojamento social, os senho-
rios, o negócio, os comerciantes e assim por diante) para poderem aceder aos dados de cada um
dos sectores. Frequentemente, desenvolvem e empregam sistemas de informação geográfica, e
pesquisas sobre a vitimização e o medo do crime, e investigações auto-avaliadoras sobre a delin-
quência, assim como informação a partir de entrevistas qualitativas e de grupos de reflexão, a fim
de desenvolverem a compreensão mais diferenciada e pragmática sobre assuntos relacionados
com o crime e a violência localizados.*

A cidade de Bogotá desde 1995 que tem vindo a estabelecer uma série de observatórias como
parte da sua estratégia para reduzir as mortes violentas e promover a segurança dos seus cidadãos.
Isto inclue um Observatório sobre a violência e o crime (SUIvD), um observatório de parques, e
outros sobre transportes integrados. Todos eles permitem à cidade fortalecer o seu conhecimento
e vigilância através de monitoria e avaliação constantes das políticas, e uma análise sistemática de
tendências.

* Ver os processos de duas reuniões internacionais sobre os observatórios organizadas pelo ICPC, 2007 e 2009, dis-
poníveis em www.crime-prevention-intl.org/menu_item.php?code=other_icpc_events.
CAPÍTULO III  A PREVENÇÃO À CRIMINALIDADE BASEADA NO CONHECIMENTO 61

Sistemas de informação geográfica

Sistemas de informação geográfica (GIS) são outras das ferramentas usadas de uma forma ampla
para prestar assistência no policiamento e a prevenção à criminalidade. Trata-se de sistemas in-
formatizados que combinam dados policiais sobre o crime com informação sobre a localização
espacial. Um exemplo bem conhecido foi a introdução do sistema de GIS COMPSAT na Cidade
de Nova Iorque, durante os anos ’90, juntamente com uma análise diária de ocorrências de crime
e reações rápidas por parte da polícia, na tentativa de evitar incidentes futuros.

No caso da polícia, o GIS pode ser usado para efeitos das operações, tácticas e estratégias. Isto
inclue padrões de categorização dos diferentes tipos de ofensa (tais como o assalto ao dom-
icílio, o roubo e o furto), identificando as áreas de mais elevada frequência dos mesmos (pontos
quentes), e identificando também alguns dos factores causais. Podem ser ainda acrescentadas
as informações sobre registos hospitalares, informação escolar e outros dados. Esta análise pos-
sibilita a implementação de medidas pro-activas, tais como as alterações aos fluxos de trânsito,
a introdução de iluminação nas ruas, ou o patrulhamento. Tal categorização pode ser usada,
inclusivamente, pelos parcerias de prevenção à criminalidade, na planificação tanto a curto e a
longo prazo dos programas de prevenção.

Um dos insumos principais para o GIS são os dados geo-codificados. Trata-se de informação ge-
ográfica precisa sobre as ruas e moradias dos bairros. Exige às cidades que forneçam dados pre-
cisos sobre endereços e os bons modelos analíticos. É menos provável que estejam disponíveis
dados precisos para cidades superpovoadas, contudo, mais especialmente no caso de cidades
com assentamentos informais, em países de rendimentos médios e baixos. O uso deste tipo de
dados levanta igualmente questões de confidencialidade e sobre a partilha de dados, e porque
os registos policiais são dependentes da vontade pública de confiar na polícia e participar os
incidentes, sistemas como estes nunca poderão transmitir indicações com a precisão necessária
sobre a incidência de crimes cometidos.

Podem-se citar os seguintes exemplos:

•  cidade de Diadema, São Paulo, Brasil, introduziu um sistema de GIS em 2000, como
A
parte da sua política sobre a proteção pública e a prevenção à criminalidade. Foi em-
pregue pela recém-criada Secretaria Municipal de Segurança Pública e Proteção Social,
para assistir com o diagnóstico, a monitoria e o planejamento estratégico de medidas de
prevenção.58

•  Centro de Estudo do Crime e a Proteção Pública (CRISP), da Universidade Feder-


O
al de Minas Gerais, no Brasil, criou um Atlas da Criminalidade para a Cidade de Belo
Horizonte, bem como para o Estado de Minas Gerais. O mesmo usa dados dos anos ’80
até 2000, da polícia militar e civil, o Ministério da Saúde, informação de ordem sócio-
económica e dados do censo. Um trabalho parecido foi empreendido por CRISP noutras
cidades brasileiras e o Estado de Minas Gerais, sobre temas específicos tais como o hom-
icídio, ofensas relacionadas com a droga, a violência doméstica e o roubo (www.crisp.
ufmg.br).

58 Ver José de Filippi Jr., “A experiência de Diadema, São Paulo, Brasil”, Estratégias e Melhores Práticas na Prevenção
à Criminalidade, principalmente em Relação às Zonas Urbanas e Juventude em risco, Margaret Shaw e Kathryn Travers, eds.
(Montreal, Centro para Prevenção Internacional do Crime, 2007).
62 MANUAL DE DIRETRIZES DE PREVENÇÃO À CRIMINALIDADE: APLICAÇÃO PRÁTICA

•  o Canadá, o Governo Federal pilotou uma análise sobre o crime em bairros de seis ci-
N
dades. Esta análise veio juntar as informações geo-codificadas e dados sobre estatísticas
uniformes da criminalidade fornecidos pela polícia. Ajudou a identificar os bairros com
a criminalidade elevada e baixa, o crime juvenil, padrões de viagem para cometer crimes,
e as tendências ao longo do tempo nessas cidades. O estudo foi empreendido pelos Es-
tatísticas Canadá e Centro Nacional de Prevenção ao Crime.59

Auditorias de Segurança e Governos Locais

Entre os principais instrumentos de assistência à análise sistemática do problema do crime lo-


calizado e o desenvolvimento de um plano detalhado, está a auditoria de segurança ou o di-
agnóstico de segurança. Este instrumento oferece um guia prático e detalhado e uma lista de
verificação sobre quem deveria participar, o tipo de dados a recolher e como é que se deveria
avaliar a informação.

Auditorias de segurança, tais como os observatórios, fomentam o comprometimento e a apro-


priação em relação a planos de prevenção à criminalidade, entre os parceiros cuja colaboração
é necessária. As auditorias de segurança, por vezes, são designadas diagnósticos de segurança,
podendo incluir perfis de crime e varrimentos ambientais. O importante é que a auditoria de se-
gurança examine não só a criminalidade e a vitimização, mas também as suas ligações a factores
sociais e económicos, e aos serviços existentes, bem como contextos políticos e institucionais
mais alargados donde possam surgir os problemas.

Existe actualmente um grande número de exemplos adaptados às situações diferentes nos di-
versos países. Um dos recursos principais é o Guia de Auditorias sobre a Segurança Local: Uma
Coleção da Prática Internacional,60 que providencia orientações detalhadas e exemplos relevantes
para países de rendimento elevado, médio e baixo.

Escrito principalmente para todas aquelas que trabalham ao nível urbano, o Guia cobre o pro-
cesso seguido durante a totalidade da auditoria de segurança, incluindo porque é que este tipo
de auditoria é importante, quais são as etapas de preparação da mesma, e o modo como se
implementa e como consegue envolver a comunidade; dentre os assuntos específicos passíveis
de contemplação numa auditoria, estão incluídos: as crianças e jovens em risco, a violência in-
terpessoal incluindo a violência com base em géneros, a reintegração de ofensores, o tráfico de
seres humanos, o alcoól e a droga, negócios e crime, e vizinhanças com altos índices de crimi-
nalidade. O Guia também fornece informações sobre as fontes, técnicas e ferramentas, incluindo
o uso das fontes secundárias, a recolha de dados para análise e a informação qualitativa.

As três secções do Guia providenciam níveis de detalhe crescentes, procurando informar o pes-
soal que se encontra aos três níveis de responsabilidade: os formuladores de políticas aos níveis
nacional e de governo local; os responsáveis pela supervisão do processo da auditoria de segu-
rança (um comité consultivo ou técnico local); e praticantes profissionais encarregues de realizar
os trabalhos de auditoria.

59 Savoie, Análise de distribuição espacial do crime no Canadá (ver nota de rodapé 49).

60 Guia de Auditorias sobre a Segurança Local (ver nota de rodapé 57). Disponível em árabe, chinês, inglês, francês e
alemão. Russo e espanhol no www.fesu.org.
CAPÍTULO III  A PREVENÇÃO À CRIMINALIDADE BASEADA NO CONHECIMENTO 63

As auditorias de segurança são discutidas em mais pormenor no capítulo IV.

Este capítulo analisa os tipos e as fontes principais de conhecimento necessários para se desen-
volverem estratégias de prevenção à criminalidade, revendo também formas de desenvolvimen-
to dos próprios recursos por parte dos Governos. O capítulo a seguir analisa em mais pormenor
o processo de planificação, a monitoria e a avaliação.
64 MANUAL DE DIRETRIZES DE PREVENÇÃO À CRIMINALIDADE: APLICAÇÃO PRÁTICA
CHAPTER IV

IV. Planificação,
monitoria
e avaliação

A. O processo de planificação
Os capítulos anteriores apresentam o papel dos Governos em matéria de liderança e facilitação
do desenvolvimento de políticas e programas gerais sobre a prevenção à criminalidade, e a im-
portância de se usar uma abordagem baseada em provas ou conhecimentos. Também aparece a
descrição de determinadas ferramentas que podem ser utilizadas.

O capítulo actual vai aprofundar a forma como uma política ou um programa pode ser desen-
volvido, e os tipos de monitoria e avaliação passíveis de se usarem.

Tal como salientam as Diretrizes de Prevenção à Criminalidade, é necessário haver um processo


sistemático de desenvolvimento e gerenciamento, quer para a planificação ao nível nacional ou
local:

Planejar as intervenções
22. As intervenções de planejamento devem promover um processo que inclue:

(a) Uma análise sistemática dos problemas de crime, as suas causas, os factores de
risco e as consequências, mais especialmente ao nível local;

(b) Um plano que recorra à abordagem mais adequada e que adapte as intervenções
ao problema e o contexto específicos;

(c) Um plano de implementação para conduzir intervenções adequadas que sejam,


ao mesmo tempo, eficientes, eficazes e sustentáveis;

(d) Mobilizar as entidades mais capazes de lidar com as causas;

(e) A monitoria e a avaliação.

Apoiar a avaliação
23. Os governos, outros órgãos de financiamento e todos aqueles envolvidos no desen-
volvimento e entrega de programas devem:

65
66 MANUAL DE DIRETRIZES DE PREVENÇÃO À CRIMINALIDADE: APLICAÇÃO PRÁTICA

(a) Acometer a uma avaliação a curto e longo prazo de forma a ensaiar rigorosa-
mente o que funciona, onde e porquê;

(b) Efectuar uma análise de custo-benefício;

(c) Averiguar até que ponto é que a acção pode originar uma redução nos níveis de
crime e vitimização, na gravidade do crime e o medo do crime;

(d) Avaliar, de uma forma sistemática, os resultados e as consequências não-inten-


cionais, tanto positivas e negativas, dessa acção, tal como o decréscimo nas taxas de
criminalidade ou a estigmatização de indivíduos e/ou comunidades.

Garantir padrões de planificação e implementação de projectos

Com a passagem dos anos, foram desenvolvidos um grande número de guias sobre a planifi-
cação de projectos de prevenção à criminalidade. Tais guias, na sua essência, estabelecem uma
série de etapas que, se forem seguidas, irão ajudar:

•  a tomada de decisões
N
• A melhorar a qualidade de informação conseguida
• A garantir intervenções e resultados aceitáveis
• A conduzir futuras intervenções através de ilustrar os problemas encontrados e que in-
tervenções é que podem ser melhoradas

São usados vários termos diferentes em relação à planificação de projectos, para este tipo de
abordagem com base nas evidências e os processos. A sigla SARA, por exemplo, significa digital-
ização, análise, respostas e avaliação, e é usada extensivamente pelas forças policiais que adopta-
ram uma abordagem progressista de resolução de problemas. A Rede Europeia de Prevenção da
Criminalidade utiliza os “Cinco I’s”:

Os “Cinco I’s”—uma série de títulos que capturam os elementos essenciais duma inicia-
tiva de prevenção ou redução de criminalidade, para que as lições aprendidas possam
estar claras e para que se possa tomar uma decisão sobre a replicação. Constituem: a
inteligência, a intervenção, a implementação, a inclusão e o impacto.

As Normas Europeias de Beccaria (disponíveis a partir do www.beccaria-standards.net) para


a61 garantia de um gerenciamento de qualidade em projectos de prevenção à criminalidade,
fornecem um resumo mais pormenorizado sobre os diversos passos envolvidos em cada uma
das principais etapas de planificação e gestão.62 Foram desenvolvidas como parte de um projecto
de parceria entre os países da União Europeia. O objectivo do projecto é para aumentar a sensi-
bilização relativamente à importância da prevenção com base nas provas, de forma a melhorar
as práticas através do desenvolvimento de Padrões, e para promover a formação em matéria de
prevenção à criminalidade.

61 Tilley, Handbook of Crime Prevention and Community Safety (ver rodapé 17), p. 762.

62 Ver tambem Erich Marks, Anja Meyer e Ruth Linssen, eds., A Qualidade na Prevenção à Criminalidade (Norder-
stedt, Books on Demand, 2005)
CAPÍTULO IV  PLANIFICAÇÃO, MONITORIA E AVALIAÇÃO 67

As Normas de Beccaria estabelecem medidas e passos a tomar na planificação, a execução e a


avaliação de programas e projectos de prevenção à criminalidade.

Contêm um conjunto de requisitos detalhados para cada um dos sete passos principais:
1. Descrição do problema
2. Análise das condições que levaram ao aparecimento do problema
3. Indicação de alvos anteriores, projecção de metas e grupos visados
4. A realização de intervenções destinadas a atingir as metas pretendidas
5. Desenho e execução do projecto
6. Revisão da implementação e realização dos objectivos (avaliação)
7. Conclusão e documentação.

B. Articulação das estratégias sobre o crime organi-


zado transnacional e estratégias nacional e local
O Parágrafo 13 das Diretrizes de Prevenção à Criminalidade reza:

A Interdependência
Diagnósticos e estratégias de prevenção à criminalidade deverão levar em consideração,
quando for o caso, as ligações entre os problemas criminais locais e o crime organizado
internacional.

O Parágrafo 27 diz:

A prevenção ao crime organizado


Os governos e a sociedade civil devem procurar analisar as ligações entre o crime organi-
zado transnacional e os problemas criminais nacionais e locais, bem como lidar com elas,
mediante:

(a) Reduzir, através de adequadas medidas legislativas, administrativas ou outras,


as oportunidades existentes e futuras para grupos criminosos organizados partici-
parem de mercados legais com os lucros do crime;

(b) O desenvolvimento de medidas que impeçam o uso undevido, por grupos


criminosos organizados, de concursos conduzidos pelas autoridades públicas e de
concessões de subsídio e licença por parte das autoridades públicas para as activi-
dades comerciais;

(c) A elaboração de estratégias de prevenção à criminalidade, quando for o caso,


para a proteção dos grupos socialmente marginalizados, mais especialmente as mul-
heres e as crianças, que são vulneráveis à ação de grupos criminosos organizados,
incluindo o tráfico de seres humanos e a migração ilegal.

Embora a Convenção sobre o Crime Organizado e os Protocolos providenciem considerável


orientação aos Governos nacionais, o crime transnacional organizado também afecta a segu-
68 MANUAL DE DIRETRIZES DE PREVENÇÃO À CRIMINALIDADE: APLICAÇÃO PRÁTICA

rança e proteção ao nível local, não sendo possível combatê-lo unicamente através do reforço da
segurança fronteiriça ou a tomada de medidas mais severas contra os traficantes internacionais.

Todo o crime transnacional confia em redes de indivíduos com vontade de tomar riscos e
para quem parece que existem consideráveis benefícios a extrair das práticas do crime. Os que
vivem em comunidades empobrecidas e desfavorecidas podem sentir que têm poucas opções
além do envolvimento em actividades criminosas, e o crime organizado é frequentemente
predador de famílias e jovens de comunidades desse tipo, não lhes permitindo a hipótese
de recusarem o envolvimento. Isto inclue a juventude forçada ou recrutada para o tráfico de
drogas ou prostituição organizada, ou o tráfico de crianças para a exploração sexual ou tra-
balhos forçados.

O Relatório Mundial sobre Drogas 200963, da UNODC, realça a ligação entre a droga e o crime
e, consequentemente, a importância de acção ao nível urbano, onde os negócios da droga têm
lugar e onde se verificam também os crimes relacionados à droga, como os roubos e os hom-
icídios. Salienta a importância de se adoptarem medidas preventivas para reduzir a procura e
equilibrar o controlo da oferta. No passado, a educação, a prevenção e o tratamento do uso ilícito
da droga eram menos praticados do que a execução da lei. Este relatório sublinha a importância
das abordagens de prevenção estratégica, mais especialmente ao nível dos municípios: “A hab-
itação, o emprego, a educação, os serviços públicos, e a recreação podem tornar as comunidades
menos vulneráveis à droga e o crime”, (“O Relatório Mundial sobre a Droga 2009 sublinha as
ligações existentes entre a droga e o crime”, comunicado de imprensa No. UNIS/NAR/R059, 24
de Junho de 2009. Disponível em www.unis.unvienna.org.)

Nas Diretrizes de Prevenção à Criminalidade, os Governos nacionais são convidados a lidar com
as situações que promovam e favoreçam o crime organizado. O crime organizado tem tendência
a prosperar sempre que existe uma fraca cultura de legalidade, com uma governação ineficaz e
onde os níveis de corrupção são elevados e os sistemas regulamentares são frouxos, deixando a
propriedade, os negócios e as instituições financeiras expostos à exploração.

As Diretrizes apresentam algumas medidas que os Governos podem tomar no sentido de ajudar
a reduzir as oportunidades, tais como os programas de educação pública, a prevenção de recru-
tamento, ou a melhoria de regulamentos sobre o uso da propriedade comercial e o fortaleci-
mento de controlos administrativos e legislativos.

Como um exemplo, o Governo da República Checa adotou uma política nacional contra o
tráfico de pessoas a fim de responder ao aumento nos índices de tal delito registrados durante
a década de 1990. Seu propósito era evitar o tráfico de pessoas, principalmente de jovens e
meninas que entravam e saíam do país. Apesar de se introduzirem mudanças legislativas e na
justiça criminal para reforçar as medidas de resposta, ficou evidente que a prevenção eficaz e
o apoio às vítimas deveriam ser elementos centrais da estratégia. A estratégia incluiu a organi-
zação de uma campanha de sensibilização do público em geral, campanhas dirigidas a consu-
midores de drogas e grupos em situação de risco, e a elaboração de materiais pedagógicos e
de conscientização para professores e profissionais de outros setores; a criação de uma aliança
entre a polícia e organizações não governamentais; capacitação para todos os participantes,
principalmente guardas de fronteira e unidades especiais da polícia, autoridades regionais, or-

63 Publicações das Nações Unidas, Vendas No. E.09.XI.12.


CAPÍTULO IV  PLANIFICAÇÃO, MONITORIA E AVALIAÇÃO 69

ganizações não governamentais e outras organizações que prestam serviços de apoio a vítimas
do tráfico de pessoas; e o desenvolvimento de atividades com fins específicos a nível local.64

Outro exemplo, na Itália, descreve a forma como organizações não-governamentais como ‘Na
Estrada’, empreenderam uma série de iniciativas de colaboração em conjunto com as autori-
dades locais e a nível nacional, para ajudar a prevenir contra a exploração sexual de jovens
mulheres e raparigas, muitas delas imigrantes sem a sua situação regularizada, ou que eram
vítimas do tráfico. Além do mais, a organização providenciou serviços de assistência (www.
ontheroadonlus.it). Na Sicília, há vários anos a esta parte que se tem vindo a desenvolver e a usar
um programa que procura sensibilizar as crianças em termos do que é que se entende por Mafia
e crime organizado.

A Iniciativa Global contra o Tráfico de Seres Humanos das Nações Unidas é uma fonte valiosa
de informações sobre medidas de planificação sobre a prevenção, incluindo o desenvolvimento
de serviços às vítimas (un.gift@unvienna.org).65

C. Planificação e implementação de políticas nacionais


Conforme foi discutido no capítulo II, os planos nacionais precisam de ser baseados em consul-
tas transversais aos sectores e os parceiros da sociedade civil, bem como em resultados de pes-
quisa e a recolha e análise de dados. Este processo ajudará a indiciar os crimes de várias ordens,
os níveis de insegurança e preocupações públicas, e os problemas sociais e económicos afins,
identificados através de todo o país. Um plano nacional deve reflectir:

•  s principais desafios sobre a segurança e o crime e a vitimização que enfrentam o país,


O
os seus municípios e as suas zonas rurais
• As causas prováveis destes desafios
• Prioridades de intervenção a curto, médio e a longo prazo
• Um conjunto de propostas de iniciativas que lidarem com essas prioridades
• Os actores envolvidos na implementação do plano
• O financiamento e meios a disponibilizar ou a compatibilizar

Fixar prioridades irá depender em parte da extensão e a gravidade dos problemas, onde ocor-
rem, a taxa aparente de aumento dos mesmos, o nível de danos e o medo que com eles se associa,
e os custos sociais e económicos que trazem consigo. Irão incluir locais e vizinhanças e zonas
urbanas prioritários onde se verifiquem ofensas, e grupos prioritários que pratiquem o delito ou
sofram a vitimização, ou ambos.

Pode até haver preocupações em muitas zonas urbanas com a segurança nos espaços públicos,
o trânsito público, os taxis e os automóveis. Os roubos residenciais e comerciais podem estar

64 Radim Bures, “A exploração sexual da juventude: uma abordagem estratégica do combate ao tráfico de jovens na
República Checa”, em Estratégias e Melhores Práticas de Prevenção à Criminalidade, mais Especialmente em Relação às Zonas
Urbanas e Juventude em Risco, Margaret Shaw e Kathryn Travers, eds. (Montreal, Centro para Prevenção Internacional do
Crime, 2007).

65 Um exemplo de uma publicação é: A Organização Internacional de Migração, Iniciativa Global contra o Tráfico de
Seres Humanos das Nações Unidas e a Escola de Higiéne e Medicina Tropical de Londres, Cuidando de Pessoas Traficadas:
Guia para os Provedores de Saúde (Genebra, Organização Internacional de Migração, 2009). Disponível em www.ungift.org.
70 MANUAL DE DIRETRIZES DE PREVENÇÃO À CRIMINALIDADE: APLICAÇÃO PRÁTICA

a aumentar em certas zonas e municípios, mas há falta de informação sobre a sua incidência
ao nível das favelas e em áreas mais desfavorecidas. Pode até haver problemas colocados pelos
distúrbios e a violência associados às boates e os bares, sugerindo que existe a necessidade
de se estabelecer um conjunto específico de políticas que controlem o acesso ao alcoól, ou
a egulamentação das licenças. Pode haver o aumento das mortes por armas nas vizinhanças
mais desfavorecidas. Pode ser que esteja a emergir o tráfico e a exploração de seres humanos.

No que se refere aos grupos mais vulneráveis, pode haver problemas extremamente graves que
vão desde crianças e jovens sem abrigo, até à vulnerabilidade a vitimização. A violência e a in-
timidação na escola e em torno da mesma pode constituir uma preocupação séria. As raparigas e
mulheres jovens podem-se encontrar em alto risco de sofrer agressões sexuais e violações à saída
de suas casas ou estar expostas à violência nos seus próprios lares. Os bandos adultos violentos
podem estar a recrutar adolescentes para uma vida de crime organizado e violência armada. As
comunidades de imigrantes e refugiados podem ser alvejados e vitimizados. É provável que ha-
jam poucos ou nenhuns programas ou facilidades para aqueles que saírem das cadeias.

A Ferramenta de Avaliação da Prevenção à Criminalidade da UNODC esboça algumas per-


guntas que precisam de ser tomadas em consideração em termos de tipos específicos de crime e
assuntos de vitimização, bem como de grupos específicos que possam estar a sofrer devido a is-
so.66 Traçar uma imagem dos locais e as populações mais vulneráveis ajuda a estabelecer as áreas,
ofensas e grupos prioritários capazes de beneficiar da estratégia sobre a prevenção. O Chile, por
exemplo, desenvolveu um Índice de Vulnerabilidade ao Crime para ajudar a conduzir progra-
mas virados para os municípios com os mais elevados riscos de criminalidade e vitimização.
À semelhança, o Brasil escolheu áreas metropolitanas de prioridade elevada como zonas-alvo
para a sua iniciativa local de financiamento, uma parte do seu programa nacional de segurança
pública, o PRONASCI.

Qualquer plano precisa de estabelecer objectivos bem claros que indiquem o que é preciso al-
cançar, como é que os objectivos podem ser alcançados e com que temporização. Nalguns casos,
os países instituiram balizas para a redução de problemas de crime; noutros, foram estabelecidos
indicadores para avaliar o progresso na realização dos objectivos. Contudo, é importante que se
equilibre a marcação de balizas com intervenções realísticas, de modo a evitar levantar as expec-
tativas e provocar a falta de confiança em abordagens de natureza preventiva.

Na maioria dos casos, os planos são montados durante um período de tempo programado, tal
como 3, 5 ou até 10 anos. Isto irá permitir a implementação e a averiguação dos seus impactos e
resultados, antes da subsequente revisão e adaptação de estratégias.

Muitas das vezes, os Governos escolheram aplicar um processo competitivo para a atribuição
dos fundos, convidando candidadtos das autoridades locais e as organizações da sociedade civil
a desenvolver programas de prevenção que satisfizessem as necessidades locais. Por exemplo, no
Canadá, o Chile e o México, foi empregue um processo competitivo para a atribuição de fundos
a prioridades alvo sob determinados programas:

•  o Canadá, a Província de Alberta tem um Programa de Concessão para a Prevenção


N
à Criminalidade ao nível da Comunidade, administrado pelo Advogado Geral e a Se-

66 UNODC e UN-Habitat, Assuntos transversais 5: Ferramenta de Avaliação de Prevenção à Criminalidade (ver a nota
de rodapé 1).
CAPÍTULO IV  PLANIFICAÇÃO, MONITORIA E AVALIAÇÃO 71

gurança Pública. Está à disposição da comunidade para ajuda nos projectos de preven-
ção à criminalidade que almejam os grupos e assuntos de prioridade: os indivíduos e as
famílias em risco, os povos e as comunidades aborígenes, medidas que reforçam o relata
das actividades criminosas, ou as intervenções que se encontrem ligadas à Estratégia lo-
cal para uma Comunidade Segura. Isto pode requerer ligação a programas especiais de
educação, escolas extensionistas, clínicas de saúde mental, centros de combate à tóxi-
codependência, agências de proteção de crianças, serviços policiais, o Programa sobre
Medidas Alternativas, o Programa sobre as Sanções Extrajudiciais, ou estratégias que
abordem vizinhanças com elevados índices de criminalidade. As abordagens mais ob-
jectivas, baseado em provas, recebem tratamento prioritário acerca das iniciativas uni-
versais de prevenção. A totalidade de Can$ 600,000 foi disponibilizada para a fase de
2009, aquando do convite para candidatura a projectos que custaram até Can$ 50,000
(www.solgps.alberta.ca).

•  oi iniciado o Programa Comuna Segura no Chile, em 2001, como uma estratégia prin-
F
cipal do Governo nacional para fortalecer a segurança comunitária. Fez parte da abord-
agem de descentralização do Governo que deu maior autonomia aos presidentes da câ-
mara e as autoridades locais, capacitando-os para desenvolver as suas próprias políticas
de segurança pública. A Divisão de Segurança Comunitária nacional escolheu municípi-
os, baseando-se num Índice de Vulnerabilidade à Criminalidade (níveis de pobreza, edu-
cação, desemprego, uso da droga e outros factores, bem como as taxas de criminalidade).
Foi dada prioridade a municípios mais vulneráveis, e alguns até chegaram a receber uma
percentagem de fundos directamente do Governo para projectos de impacto elevado,
mas o processo de concurso competitivo foi o método inicial de alocação dos fundos.
Estes foram direcionados a projectos específicos para os grupos vulneráveis, sobre temas
como a violência contra as mulheres e crianças, a violência nas escolas, e os jovens em
situação de risco. Os fundos também foram atribuídos a projectos de segurança comu-
nitária que envolveram organizações e municípios locais. Durante os primeiros quatro
anos do projecto, foi atribuída uma totalidade de US$ 23.3 milhões para o programa,
com 2,727 projectos a receberem financiamento.67

•  Secretaria Federal para o Desenvolvimento Social (SEDESOL) no México, montou o


A
seu programa de Recuperação dos Espaços Públicos em 2007. O programa providencia
financiamentos às autoridades e as comunidades locais para aumento da segurança e
o uso de espaços públicos através de princípios do desenho ecológico. As cidades e as
áreas metropolitanas com populações superiores a 50,000 são eligíveis para se can-
didatarem a estes fundos, trabalhando em parceria conjunta com as comunidades e
organizações locais.

O exemplo do Governo Federal da Alemanha apresentado na caixa 6 abaixo, delineia a


evolução da política de prevenção nacional sobre a violência contra mulheres. Indica a forma
como o Governo trabalhava com outros níveis de governo e a sociedade civil, e investia na
pesquisa e avaliação das práticas de apoio durante um período de vários anos, com planos de
ação sucessivos.

67 Alejandra Lunecke, “Política de segurança pública no Chile: o Programa de ‘Comuna Segura’”, em Estratégias e
Melhores Práticas de Prevenção à Criminalidade, em Relação Especial com o s Municípios e a Juventude em Risco, Margaret
Shaw e Kathryn Travers, eds. (Montreal, Centro Para Prevenção Internacional do Crime, 2007).
72 MANUAL DE DIRETRIZES DE PREVENÇÃO À CRIMINALIDADE: APLICAÇÃO PRÁTICA

Caixa 6. Planos de ação na Alemanha para combater a violência contra mulheres

O Governo Federal da Alemanha emitiu dois planos de ação para o combate da violência contra
mulheres em 1999 e 2007. O plano de ação de 1999 incluíu uma gama de intervenções:

(a) Prevenção;

(b) Regulamentação de legislação e administrativa;

(c) Cooperação com o Congresso Alemão de Criminalidade e as organizações não-governmentais;

(d) O trabalho com perpetradores;

(e) Actividades de conscientização de especialistas e o público;

(f) Cooperação internacional.

Estas intervenções visavam alterar as atitudes e a prática para que nenhuma mulher tivesse que ser
obrigada a abandonar o seu lar para fugir à violência doméstica. Em vez disso, os tribunais provi-
denciavam proteção às mulheres em situações como essas, trabalhando com os perpetradores
de violência para mudar o seu comportamento e atitudes, deixando claro que a violência é uma
questão pública e não uma questão privada.

Em segundo lugar, a fim de se conseguir providenciar um melhor entendimento e mais informação


sobre a dimensão do problema, foi encomendado um estudo sobre mulheres na Alemanha pelo
Ministério Federal das Famílias, os Cidadãos de Terceira Idade, mulheres e jovens, publicado em
2004. Era baseado em mais de 10 000 entrevistas com mulheres de 16 a 85 anos. Alguns dos
resultados do estudo foram utilizados em debates da sociedade civil sobre os serviços e apoio de
que as mulheres necessitam.

Em terceiro lugar, o Ministério encomendou uma avaliação de projectos de intervenção sobre a


violência doméstica.

O projecto de “cooperação, intervenção, pesquisa”, em 2004, examinou o progresso feito na mu-


dança das atitudes para com a violência contra mulheres enquanto problema social, identificando,
além disso, elementos de uma boa estratégia sustentável de prevenção.

O segundo plano de ação, em 2007, continha uma série de nove medidas, com base na experiên-
cia e lições tiradas da implementação do plano de 1999. Entre estes estavam incluídos: +

(a) A prevenção;

(b) A legislação e as regulamentações administrativas;

(c) U
 m sistema de assistência para providenciar o apoio e aconselhamento para mulheres afecta-
das pela violência;
CAPÍTULO IV  PLANIFICAÇÃO, MONITORIA E AVALIAÇÃO 73

(d) Redes nacionais para o sistema de assistência;

(e) Cooperação entre as instituições de Governo e as agências de apoio não-governamentais;

(f) Trabalho com perpetradores;

(g) Qualificação, e sensibilização acrescida;

(h) Cooperação europeia e internacional;

(i) Medidas de apoio a mulheres no estrangeiro.

O plano foi coordenado pelo Concelho de Prevenção à Criminalidade da Baixa Saxónia, como ex-
emplo da implementação do plano ao nível do Estado. O Concelho reune mais de 250 organi-
zações aderentes, o Governo, os concelhos da comunidade, as organizações não governamentais
e centros de pesquisa, e foi responsável por implementar um plano de ação do Estado sobre a
violência doméstica enquanto tarefa transversal de todos os Ministérios. O Concelho trabalhou
com os Ministérios e a polícia sobre a intervenção em situações de crise, em processos de carácter
penal e na proteção de vítimas, desenvolveu serviços de apoio, e instituiu mesas redondas para
consultoria e discussão sobre as intervenções locais.*

* Erich Marks, Apresentação no 8º Colóquio Anual sobre a Prevenção à Criminalidade, Querétaro, México, de 12 a 14
de Novembro de 2008.

D. Planificação ao nível do governo local


Como ficou claro da discussão anterior, existe agora um conjunto útil de ferramentas que foi
desenvolvido para conduzir a prevenção à criminalidade do governo local. Foi desenvolvido na
base de consideráveis experiências práticas em muitos países, e incluem:

•  Estojo de Ferramentas do Governo Local, que foi desenvolvido pelo Centro de Preven-
O
ção do Crime na África do Sul, com base na experiência do trabalho com as comuni-
dades no terreno. Fornece um guia passo a passo ao desenvolvimento e a implementação
de um plano local à prevenção (www.crimeprevention.csir.co.za).

•  ornar a África do Sul Segura, Centro de Prevenção Nacional do Crime, Departamento


T
de Segurança e Proteção (Pretória, África do Sul, 2000).

•  m Guia de Recursos para os Municípios: Prevenção à Criminalidade e a Violência Urbana


U
com Base Comunitária na América Latina (Washington, D.C., Banco Mundial, 2003).

•  m estojo de ferramentas entitulado A Chave para Municípios Mais Seguros desenvolvido


U
no Canadá (Montreal, ICPC/Fundação Phillippe Pinel, 2005).

•  ornar as Cidades Mais Seguras Frente à Criminalidade — Um Estojo de Ferramentas


T
(2007). Desenvolvido ao abrigo do Programa da UN-Habitat Cidades Mais Seguras, na
74 MANUAL DE DIRETRIZES DE PREVENÇÃO À CRIMINALIDADE: APLICAÇÃO PRÁTICA

base de dez anos de trabalho com presidentes da câmara em África e outros, e as suas
cidades, para desenvolver estratégias locais para a prevenção à criminalidade.68

•  ornar as Cidades Mais Seguras: Mandatos de Ação para Principais Interessados nos Mu-
T
nicípios (Instituto para a Prevenção do Crime, 2009), disponível em www.ipc.uOttawa.
ca). Uma série de 10 mandatos desenvolvidos para os municípios do Canadá, incluin-
do 4 sobre porquê e quantos municípios deveriam ter sido envolvidos na prevenção à
criminalidade (porquê investir; investir de forma inteligente; tomar a responsabilidade;
planificar estrategicamente; envolver o público) e uma série de mandatos sobre temas
específicos: ruas seguras; a proteção das mulheres; a proteção das mulheres aborígines;
segurança da propriedade; e policiamento e proteção.

•  anual de Seguridad Ciudadana “La clave para municipios más seguros en América
M
Latina” (Washington, D.C., Banco de Desenvolvimento Inter-Americano, 2009).

Usar as auditorias de segurança

Uma das mais ferramentas importantes que se pode usar para fazer a análise de problemas locais
é a auditoria sobre a segurança local do governo, discutida no capítulo III. Tal como acontece
com todos os tipos de planificação estratégica, o desenvolvimento de uma auditoria de seguran-
ça segue à mobilização dos sectores chave e os principais interessados, bem como à criação de
um grupo técnico local, de preferência sob o presidente da câmara enquanto chefe de autoridade
local. A Figura V sugere a composição dum grupo técnico da autoridade local para o desenvolvi-
mento de um plano local de auditoria e segurança.69

Figura V. Auditorias sobre a segurança local: grupo técnico de segurança comunitária

Presidente
Cuidados
Saúde Sociais

Administrador Polícia
da cidade

Agentes Comunidade
de Justiça
de Menores

Académicos
Educação

Correções Negócio

68 UN-Habitat, Tornar as Cidades Mais Seguras Frente à Criminalidade–Um Estojo de Ferramentas (Nairobi, 2007).

69 Guia sobre as Auditorias Locais de Segurança (ver nota de rodapé 57).


CAPÍTULO IV  PLANIFICAÇÃO, MONITORIA E AVALIAÇÃO 75

A Figura VI providencia um esquema visual para a sequência do processo de planificação, des-


de a mobilização do grupo técnico, a condução da auditoria de segurança, o desenvolvimento
duma estratégia local, a implementação da estratégia no plano de ação, e averiguação do seu
progresso e resultados, o que, por sua vez, providencia insumos para a auditoria de segurança a
seguir. Isto permite que sejam abordados os problemas encontrados durante o primeiro plano
de ação e implementação, ou as novas preocupações, em fases posteriores.

Figura VI Auditorias de segurança locais: o processo de prevenção à criminalidade*

Mobilização

Auditoria

Inclusão
Participação
Avaliação
Revisão

Ação Estratégia

* Orientação de Auditorias sobre a Segurança Local (ver nota de rodapé 57).

Em todas as fases do processo, a inclusão e a participação tanto de homens e mulheres, bem


como das populações de difícil acesso, tais como os grupos minoritários, os idosos, as crianças e
jovens, precisam de receber uma atenção especial.

A fase de auditoria de segurança normalmente envolve os passos seguintes:70

• Contextualizar através de uma síntese das características da cidade (tais como caracterís-
ticas demográficas ou económicas), comparando-as com a região e o país como um todo
• Analisar o crime, a violência, a desordem em termos da sua escala, tendências e dis-
tribuição
• Perfilar as vítimas e os ofensores (padrões de idade, género, etno-culturais e sócio-
económicos)
• Investigar padrões de factores de risco
• Avaliar a eficácia de projectos e serviços (tais como a saúde, a habitação, a assistência

70 pp. 10-11 (adaptado).


76 MANUAL DE DIRETRIZES DE PREVENÇÃO À CRIMINALIDADE: APLICAÇÃO PRÁTICA

social, a educação) em relação à prevenção


• Avaliar o ambiente político e institucional de modo a identificar oportunidades para o
desenvolvimento de uma ação preventiva
• Identificar oportunidades, pontes fortes e o potencial da área, incluindo capital social, a
sociedade civil e projectos existentes sobre os quais edificar uma estratégia para o futuro

O Guia sobre Auditorias de Segurança Locais providencia informações detalhadas sobre a con-
dução duma auditoria em termos das agências que deveriam estar envolvidas, as aptidões e con-
hecimentos necessários, a montagem da programação para conduzir o processo de auditoria, e
os tipos de informação que possam ser obtidos junto de sectores chave tais como a habitação,
o meio-ambiente, a saúde, e educação, os serviços às vítimas, a polícia e a justiça, e os serviços
sociais.

A informação a incluir numa auditoria de segurança:71

Ambiente Tamanho da cidade, uso da terra, estrutura económica, situação


política

Demografia  opulação total, equilíbrio de géneros, estrutura etária, diversi-


P
dade etno-cultural, emprego/desemprego

Crime e desordem Tipo de ofenças, ocorrências, ofensores, vítimas, alvos, distribuição

O impacto e o custo da Sobre indivíduos e as comunidades (tais como as lesões relaciona-


criminalidade das com a violência), exigências sobre os serviços de emergência
dos hospitais, o valor da propriedade roubada, o custo da segu-
rança e a justiça

Percepções De risco, vulnerabilidade, a polícia, justiça, outros serviços

Factores de risco Tais como a pobreza relativa, a violência, os lares provisórios, o


abandono escolar, a doença mental

Serviços Provedores, gama, qualidade, acesso, uso

Iniciativas Projectos e programas existentes, e práticas efectivas

Parceiros interessados Interesses, capacidades, recursos

Fonte: UN-Habitat Estojo de Ferramentas Cidades Seguras

É apresentado o exemplo de um calendário de auditoria na figura VII.

71 Ibid., p. 15.
CAPÍTULO IV  PLANIFICAÇÃO, MONITORIA E AVALIAÇÃO 77

Figura VI Auditorias de segurança locais: o processo de prevenção à criminalidade*

Mês
1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12
Montar um Grupo Técnico de
Auditoria
Planificação

Designar equipe de auditoria


e chegar a acordo acerca de
programa de trabalho

Apreciação inicial de prob-


lemas, factores de risco e
reações (etapa 1)

Pesquisa de temas que requer-


em mais investigação (etapa 2)
Implementação

Identificar prioridades de ação


e oportunidades (etapa 3)

Consultar com partes interes-


sadas e comunicar os resulta-
dos (etapa 4)

* Guia sobre as Auditorias Locais de Segurança (ver nota de rodapé 57)

Exemplos de resultados das auditorias de segurança empreendidas em cidades dos Camarões


e em Pápua Nova Guiné, como parte do Programa da UN-Habitat Cidades Mais Seguras, e no
Karoo Central sem-rural, África do Sul, são apresentados mais abaixo:72

• Auditoria de segurança em Yaoundé (Camarões)


Uma auditoria de segurança finalizada em 2001 reuniu a estatística oficial disponível,
bem como os resultados de inquéritos sob a forma de questionário, o estudo de temas
específicos (tais como as crianças da rua e a violência contra mulheres), consultas com
a sociedade civil e muitas outras fontes. Reuniu parceiros chave que antes não se co-
municavam; prioridades claramente identificadas; e foi instrumental em catalisar a ação
em torno de uma série de projectos piloto. Além disso, levou à montagem de uma polí-
cia municipal; mais análises e planificação sobre a justiça juvenil; e desenvolvimentos
contínuos de infra-estrutura (incluindo a iluminação) que alvejavam as áreas com mais
tendência à criminalidade.

• Auditoria de segurança de Port Moresby (Pápua Nova Guiné)


A Iniciativa designada Port Moresby Mais Seguro foi lançada em 2002 com o apoio do
Programa de Desenvolvimento das Nações Unidas e UN-Habitat. Este empreendimento

72 Ibid., pp. 11 e 13.


78 MANUAL DE DIRETRIZES DE PREVENÇÃO À CRIMINALIDADE: APLICAÇÃO PRÁTICA

municipal foi edificado sobre parcerias estabelecidas com instituições públicas, privadas
e “populares”.

As autoridades municipais e o Departamento do Governo central para o Desenvolvimento


Comunitário trabalhavam em estreita colaboração. A primeira tarefa foi completar um di-
agnóstico sobre a insegurança local, que averiguou as causas subjacentes do crime, bem
como as características da vítima e o ofensor. Os resultados foram usados para se identi-
ficarem prioridades e para se chegar a acordo sobre um plano estratégico. A segunda fase
incidiu no reforço das parcerias de modo a permitir a implementação de um plano de ação.

• Auditoria de segurança do Karoo Central (África do Sul)


A Estratégia de Prevenção à Criminalidade do Karoo Central na Província do Cabo Oci-
dental, assentou fortemente numa análise de dados qualitativos e quantitativos oriundos
duma variedade de fontes:
º A revisão da literatura, uma análise de relatórios e estudos de pesquisa, estatísticas da
polícia e planos estratégicos em relação aos departamentos locais
º Uma auditoria sobre investimentos actuais e futuros dirigida às causas do crime e a
vitimização
º Sessões de mobilização comunitária, onde os líderes e representantes dos diferentes
assentamentos no Karoo Central obtiveram uma perspectiva da situação local e em
relação às percepções e atitudes para com o crime e o desenvolvimento dessas áreas
º Sessões de mobilização de negócio, que visavam mobilizar o apoio e a apropriação do
processo de implementação de uma estratégia local de prevenção à criminalidade
º Entrevistas individuais e de grupo com parceiros locais

A análise forneceu as bases de uma estratégia direccionada de prevenção à criminalidade, que


assentava não só nos sintomas visíveis de actividade criminal, como também nas suas causas
adjacentes.73

Desenvolver estratégias abrangentes locais

As cidades em muitas das regiões desenvolveram estratégias locais em anos recentes que ilus-
tram bem o valor de planificação e implementação cuidadas, bem como o uso duma variedade
de intervenções para responder aos diferentes tipos de problema identificados. Num determina-
do número de casos, os Governos nacionais atribuiram certos poderes e opções fiscais de modo
a dar maior autonomia às cidades na sua formulação das estratégias de segurança pública e a
prevenção. Isto foi o caso do Chile e a Colômbia, por exemplo. Noutros casos, tais como a Ingla-
terra e o País de Gales, no Reino Unido, todas as autoridades são exortadas por lei a desenvolver
e implementar as estratégias locais numa base regular de três anos. As estratégias locais poderão
incluir mudanças institucionais para melhorar os serviços municipais, implantando a monitoria
sistemática de tendências e opiniões, melhorias na infra-estrutura, a mobilização e o apoio da
comunidade, iniciativas direcionadas para lidar com problemas específicos da criminalidade
tais como a violência juvenil, execução de regulamentações e legislação locais e programas de
educação pública.

73 A auditoria foi conduzida como parte do programa facilitado pelo Centro para Prevenção Internacional do Crime,
África do Sul.
CAPÍTULO IV  PLANIFICAÇÃO, MONITORIA E AVALIAÇÃO 79

Os exemplos do Brasil e a Colômbia, apresentados nas caixas 7 e 8, ilustram o modo como duas
cidades responderam à violência e o homicídio de uma forma sistemática e planificada, imple-
mentando uma série de iniciativas que se revelaram ser muito eficazes para reduzir a violência
e envolver os cidadãos.

Caixa 7: Diadema, São Paulo, Brasil

Em 2000, a cidade de Diadema tinha a taxa de homicídio mais elevada de todos os municípios da
área metropolitana de São Paulo, Brasil. Desde o ano 2000 a esta parte, que Diadema tem vindo
a desenvolver uma estratégia de prevenção à criminalidade, sob a liderança do Presidente da Câ-
mara, José de Filippi Junior e o seu concelho. Uma análise cuidada identificou a data, hora e local
de ocorrência dos incidentes mais violentos e outros problemas. A estratégia inclue elementos de
abordagem de saúde pública, tais como fechar bares e restaurantes à noite, a renovação urbana,
mais especialmente nos bairros degradados da cidade, alterações ao policiamento e a execução, e
intervenções sociais e comunitárias.

Também foi estabelecido um processo participatório vibrante, com reuniões regulares entre todos
os bairros municipais locais e o concelho da câmara, para se discutirem preocupações e planos de
desenvolvimento, e a atribuição de financiamento dedicado da câmara para se utilizar em projec-
tos selecionados pelos residentes através do processo de orçamentação participatória. Em 2004,
a taxa de homicídios tinha diminuído de forma substancial, e a classificação da cidade tinha caído
do número 1 para o número 18 entre as câmaras municipais da região.

As 10 intervenções foram conforme se segue:

1.  criação de um Departamento da Câmara sobre as Políticas Sociais e a Segurança Públi-


A
ca, e houve a categorização e a actividade criminal, diariamente, das 06 horas da manhã
2. A integração de todas as forças policiais da cidade (municipal, militar e regional civil)
3. Uma nova lei promulgando o encerramento de todos os estabelecimentos de venda de
bebidas alcoólicas das 11 da noite às 06 da manhã
4. Lançar o Concelho da Câmara para a Segurança e Prevenção à Criminalidade
5. Aumentar a Força da Polícia Municipal em 70 por cento e estabelecer “Os anjos da vizin-
hança”, que efectuavam a patrulha montados em bicicletas
6. Estabelecer o “Projecto do jovem aprendizado” para gente jovem em situação de risco
7. Políticas sociais e do meio-ambiente incluindo favelas e projectos escolares
8. A instalação de câmaras de vigilância
9. Inspeções e operações de execução da lei
10. Lançamento de três campanhas principais de educação pública:
• Campanha de desarmamento de armas de fogo
• Campanha de desarmamento de pistolas de brinquedo de criança
• Campanha de conscientização sobre as drogas e o alcoól.*

*Ver José de Filippi, Jr., “A experiência de Diadema, São Paulo, Brasil”, em Estratégias e Melhores Práticas na Prevenção à
Criminalidade, Principalmente em Relação às Áreas Urbanas e a Juventude em Risco, Margaret Shaw e Kathryn Travers,
eds. (Montreal, Centro para a Prevenção Internacional do Crime, 2007).
80 MANUAL DE DIRETRIZES DE PREVENÇÃO À CRIMINALIDADE: APLICAÇÃO PRÁTICA

Caixa 8: O que é que funcionou em Bogotá

Durante o período entre 1993-2002, as taxas de homicídio em Bogotá desceram, de uma forma
dramática, de 80 para 28 homicídios por cada 100,000 pessoas; os acidentes ficaram reduzidos
em metade; e a polícia aumentou a sua taxa de prisões para 400 por cento sem ter que aumentar
também o tamanho das forças policiais. O sucesso de Bogotá em reduzir a violência vem ilustrar a
importância do compromisso político, sustentado através de três administrações diferentes, e da
atribuição de recursos suficientes para combater o crime e a violência. De acordo com os dados de
avaliação disponíveis, a redução da taxa de violência era atribuível a:

• C
 ampanhas de promoção de desarmamento da cidadania e o controlo do consumo do al-
coól: Sistemas de informação eficazes que providenciaram informações detalhadas sobre
os eventos que culminavam nos resultados dolosos, originando a formulação do “Plan de-
sarme” o que passou a supervisionar a circulação de armas de fogo. Em 2001, por exemplo,
cerca de 6,500 armas de fogo foram devolvidas a título voluntário à polícia como resultado
do plano. Acresce ainda que, com a implementação da Ley Zanahoria, as vendas do alcoól
terminavam às 3 da manhã durante o fim de semana para reduzir às taxas de crimes vio-
lentos. O controlo das armas e o alcoól teve um efeito significativo (se não mesmo grande)
sobre a redução da violência.

• A
 ção de reabilitação de espaços urbanos degradados: Duas das áreas mais violentas de Bo-
gotá – a Avenida Caracas e a zona do Cartucho—sofreram uma renovação de infra-estrutura
urbana e os transportes. Como resultado disso, os níveis de crime e violência diminuiram
de uma forma substancial em ambas as áreas. Na Avenida Caracas, os níveis de homocídio
diminuiram em 60 por cento entre 1999 e 2003. Ao mesmo tempo, na zona do Cartucho,
os casos de furto decresceram em 70 por cento entre 2000 e 2003.

• F rentes de seguridad: Os comités de monitoria da criminalidade nas vizinhanças encorajam


a relações de colaboração entre os agentes policiais comunitários e os residentes locais,
promovendo níveis mais elevados de confiança entre a polícia e a comunidade. Como resul-
tado disso, tem-se verificado o aumento de esforços na prevenção à criminalidade.

• E
 squadras familiares da polícia: Os dados de avaliação indicam que as medidas de pro-
tecção disponibilizadas através destas esquadras de polícia, eregidas para controlar a vi-
olência familiar, foram mais eficazes do que as medidas de conciliação, na redução da vi-
olência física contra as mulheres na família.

• A
 profissionalização da polícia: A reforma da polícia e a modernização foram conseguidas
através dum plano que enfatizou o desempenho baseado nos resultados. Foi introduzida
uma abordagem epidemiológica para efectuar a monitoria dos dados sobre o crime e a
violência, o que permitiu o desenho de ações de prevenção ao crime. O treinamento no
policiamento preventivo tem vindo a ser largamente aceite pelos cidadãos como alternativa
eficiente para reduzir a violência e melhorar a co-existência.*

*Citado por Mayra Buvinić Erik Alda e Jorge Lamas, Enfatizando a Prevenção na Segurança Cotidiana: Contribuição do Ban-
co Inter-Americano de Desenvolvimento para a Redução da Violência na América Latina e as Caraíbas (Washington, D.C.,
Banco de Desenvolvimento Inter-Americano, 2005).
CAPÍTULO IV  PLANIFICAÇÃO, MONITORIA E AVALIAÇÃO 81

E. Implementação e avaliação
A implementação e a avaliação precisam de ser integradas nos planos de ação durante a etapa de
planificação, e não como uma reflexão posterior. A formação e o apoio que os Governos podem
providenciar a projectos e praticantes profissionais também deveriam abordar estes processos.

Conforme foi discutido no capítulo II, se os Govermos não tiverem a capacidade e os conheci-
mentos próprios para conduzir a planificação transectorial e a recolha e análise de dados, há
um número crescente de universidades e centros de pesquisa, bem como organizações não-
governamentais especializadas que podem fornecer os aconselhamentos ou a assistência técnica
que são necessários.

No caso da Inglaterra e o País de Gales, por exemplo, duas organizações nacionais não-gov-
ernamentais, Crime Concern (Lit. Preocupação com o Crime) e Nacro, com idoneidade na
planificação de projectos, a implementação e a avaliação na prevenção à criminalidade, foram
contratadas pelo Governo nacional em apoio a projectos locais que foram beneficiários de finan-
ciamentos ao abrigo do Programa de Redução à Criminalidade. Isto seguiu-se ao lançamento
do programa, quando ficou claro que existia uma necessidade premente, ao nível local, para o
apoio especializado e orientação durante a implementação e a avaliação do projecto. Os coorde-
nadores de pesquisa nacional foram nomeados, de seguida, para adiantar um apoio contínuo ao
pessoal do projecto local.

Monitoria e avaliação

A avaliação é uma ferramenta necessária para melhorar a prestação de contas, informar


a política sobre prevenção à criminalidade, e desenvolver uma base de evidência e com-
preensão sãs acerca do que funciona melhor e o que pode ser considerado boa prática na
abordagem dos problemas da criminalidade. A avaliação vai reflectir sobre o desenho e
a implementação dum programa, de modo a determinar se a estratégia escolhida con-
seguiu alcançar os seus objectivos declarados.

Tal como acontece com qualquer política de iniciativa social ou económica, os Governos pre-
cisam de fazer a monitoria e avaliação no caso da implementação dos programas e projectos,
para assegurar a responsabilização financeira, isto para que os programas possam ir de encontro
aos objectivos indicados, e para avaliar o impacto desses programas. Normalmente, contudo,
isto não é necessariamente um processo tão simples ou tão fácil quanto isso.

A monitoria geralmente refere-se ao processo contínuo para acompanhar a evolução das tendên-
cias do crime e a vitimização ou qualquer outra informação relevante, ou informação sobre as
actividades do projecto ou o programa, e os seus resultados interinos. Por exemplo, poder-se-á
determinar o número de crianças da rua abrigadas, ou o número de ruas que agora têm ilumi-
nação que aumenta o factor de proteção.

A avaliação geralmente considera a mensuração dos resultados ou os impactos dum projecto


ou um programa. Por exemplo, poder-se-ia determinar o número de crianças da rua que são
reintegradas com êxito em famílias estáveis ou no dia-à-dia das comunidades, ou medir o de-
créscimo nos assaltos ou os furtos em áreas com iluminação.
82 MANUAL DE DIRETRIZES DE PREVENÇÃO À CRIMINALIDADE: APLICAÇÃO PRÁTICA

Tal como indica a definição da avaliação abaixo, há muita disputa em torno das técnicas de
avaliação utilizadas na prevenção à criminalidade, e a medida em que as mesmas são capazes de
provar que as mudanças são mesmo imputáveis às intervenções do projecto:

Avaliação: A avaliação sistemática dos processos, produtos e resultados das iniciativas,


políticas e práticas. Os métodos usados na avaliação da prevenção à criminalidade são
muito contestados. Muitas vezes, é difícil obterem-se provas fortes sobre os efeitos dos
resultados, embora sejam pedidas com frequência.74

Foi desenvolvida uma variedade considerável de técnicas e abordagens para assistir à monito-
ria e avaliação. Inclue a aplicação de “modelos lógicos”, a gestão do desempenho (ver abaixo),
parâmetros de referência e indicadores, todos os quais ajudam a estabelecer uma estrutura
racional ou lógica em torno do que deve ser alcançado (tal como a redução nos arrombamentos
em residências e um sentido ampliado de segurança); o que deve ser feito para se alcançar esses
objectivos (tal como melhorar a segurança de portas e janelas, designar zeladores e convocar
reuniões regulares dos residentes); e quais os factores é que se podem usar para medir essas ac-
tividades e resultados (o número de portas e janelas reforçadas, o número de zeladores nos seus
cargos, o número de reuniões convocadas e o comparecimento a essas reuniões, a mudança de
atitude dos residentes, entre outros factores).

Outros termos e processos incluem a avaliação do processo, a incidir primariamente na forma


como um projecto é implementado; a pesquisa de ação, que permite efectuar mudanças ao de-
senho do projecto, enquanto o mesmo ainda está a decorrer, para facilitar o alcânce dos seus
objectivos; a auto-avaliação e as auditorias internas, empreendidas pelo pessoal do projecto, que
possam ser de valor para o melhoramento dos projectos, mas que também possam estar sujeitos
a preconceitos; uma avaliação independente conduzida por uma agência exterior, auditor ou
pesquisador, de modo a garantir que a avaliação será objectiva e clara. Os ensaios aleatórios
controlados são considerados o método mais objectivo e ciêntífico de avaliação, já que medem
os níveis de crime e outros factores antes e depois de uma intervenção, e comparado com um
grupo de controlo que não foi sujeito a qualquer intervenção anterior. Por fim, a avaliação custo-
benefício leva em conta a totalidade dos insumos para um programa e os produtos e resultados,
efectuando a estimativa das despesas e as poupanças projectadas. Todas estas abordagens po-
dem ser usadas aos diferentes níveis. No desenvolvimento e a pilotagem de um programa, por
exemplo, muitas das vezes seria útil se fossem usadas abordagens sobre a pesquisa de processos
e ações na ajuda da adaptação ao contexto local. Quando um projecto já está bem-estabelecido,
torna-se mais importante que nele seja embutida uma avaliação dos resultados.

Assim, a avaliação de um programa ou política nacional ou local de prevenção à criminalidade


normalmente toma em conta três componentes principais:

• Quão bem foram implementadas as políticas e os programas, e se estes conseguiram


alcançar os objectivos estabelecidos;

• Os resultados imediatos dos projectos, tanto os esperados e não-esperados;

• Os resultados e o impacto a longo prazo desses programas, por exemplo, em termos de

74 Tilley, Relatório Internacional sobre Prevenção da Criminalidade e Segurança Cotidiana (ver nota de rodapé 17), p. 762.
CAPÍTULO IV  PLANIFICAÇÃO, MONITORIA E AVALIAÇÃO 83

redução da violência, ou a melhoria do emprego e as aptidões para a vida, bem como


de quaisquer resultados negativos, tais como o deslocamento da criminalidade das ruas
para outra área. Isto pode incluir uma avaliação dos custos e benefícios do programa ou
a política.

O exemplo citado mais abaixo, do Chile, a forma como a implementação dum programa na-
cional foi avaliado e o programa foi redesenhado para se adequar aos problemas identificados:

No final dos primeiros quatro anos do programa nacional Comuna Segura, no Chile, cinco
avaliações independentes dos diferentes aspectos do programa foram encomendadas pelo Gov-
erno. Este trabalho foi empreendido por duas companhias de consultoria, duas universidades e
o Ministério de Finanças, para analisar os resultados, extrair as lições necessárias e identificar os
desafios. Concluiram que o programa não tinha sido muito bem-sucedido na sua atribuição do
financiamento, por não ter dado tempo para a formação, nem permitiu que se chegasse a consen-
so sobre a ação ou a realização dos resultados ao nível local, e os municípios também não tiveram
a flexibilidade suficiente para adaptar os regulamentos sobre financiamento e as expectativas do
projecto, às circunstâncias. Isto levou à re-estruturação do programa, o que culminou na substitu-
ição do processo competitivo de concurso com estratégias de prevenção a médio e a longo prazo,
promovendo a colaboração mais efectiva aos níveis nacional e local, introduzindo maior descen-
tralização e flexibilidade, redefinindo a participação comunitária e reconhecendo a necessidade
do trabalho em conjunto por parte dos municípios no que se refere às estratégias municipais
regionais, já que os problemas do crime não são definidos pelas fronteiras administrativas.75

A mensuração do desempenho foi definida como sendo “a prática de rever o desempenho do


programa, identificar os factores passíveis de terem um impacto sobre a sua efectuação actual
e futura, e a tomada de decisões informadas sobre o modo mais apropriado de agir no sentido
de se melhorar a actuação do programa.” O exemplo abaixo é extraído da avaliação de um pro-
grama sobre a Parceria de Proteção Comunitária e a Prevenção à Criminalidade (CSCP) na
Austrália Ocidental:76

Uma estrutura de mensuração do desempenho providencia a base de recolha estruturada


e sistemática, bem como o relato, de informações relacionadas com o desempenho do
programa. É normalmente usada para se referir ao conjunto dos indicadores de desem-
penho e os processos empregues para se produzirem informações sobre a actuação. A
estrutura das Parceiras e Planos do CSCP inclue um conjunto de objectivos de alto nível;
indicadores sobre como é que os mesmos se devem medir; donde é que os dados podem
advir e ao longo de que período de tempo, e a quem atribuir responsabilidade pelo pro-
grama; bem como a forma como estas medidas seriam a integrar na tomada de decisões
acerca do programa. Por exemplo:

•U
 m conjunto de objectivos a longo e a curto prazo e imediatos (resultados planifica-
dos) reflectindo o que se pretende pelas Parcerias e os Planos do CSCP, o processo
de planificação na generalidade. Por exemplo, a longo termo: reduzir os problemas
do crime e a desordem a afligirem a comunidade local; melhorar a segurança da

75 Lunecke, “Política de segurança pública no Chile” (ver nota de rodapé 67).

76 A. Morgan e P. Homel, Modelo de Estrutura de Desempenho para a Prevenção à Criminalidade com Base Comuni-
tária, Documento técnico e de enquadramento (Canberra, Instituto Australiano de Criminologia, 2010).
84 MANUAL DE DIRETRIZES DE PREVENÇÃO À CRIMINALIDADE: APLICAÇÃO PRÁTICA

comunidade; melhorar o acolhimento oferecido pelos espaços públicos. No prazo


intermediário: reduzir as condições ambientais que promovam o crime; aumentar a
participação comunitária na prevenção à criminalidade; alcançar mudanças positi-
vas entre os participantes do projecto. A curto prazo: aumentar a conscientização e
o apoio do público para a prevenção à criminalidade; melhorar o acesso a projectos
para os grupos de risco elevado; aumentar o desenvolvimento de parcerias com base
comunitária, etc

•U
 m conjunto de indicadores de desempenho para mostrar como é que as pessoas
envolvidas no programa poderão entender quando é que são atingidos os resultados
desejados. Por exemplo: o número, a taxa e as tendências das ofensas em termos
pessoais e de propriedade registados pela polícia; as chamadas à polícia; os níveis
de vitimização; as ocorrências detectadas pelos agentes de segurança; números e
tendências de pessoas a reportar uma maior satisfação com a segurança comuni-
tária; o número de projectos locais finalizados, que incluem os princípios de pre-
venção aos crimes no âmbito do meio-ambiente; números de agregados familiares
à procura de informações sobre como melhorar a sua proteção; provas positivas de
alteração de atitudes e habilidades entre os participantes do projecto; o número de
participantes abrangidos a completar os programas do projecto; o número de visitas
a sítios web sobre a prevenção à criminalidade e pedidos de informação; foi convo-
cado um número de fóruns comunitários; o número de pessoas a comparecer, etc.

•Q
 ue tipo de informação sobre o desempenho é que seria necessária e quando e a
quem é que se deve entregar a responsabilidade pela sua colheita. Por exemplo: a
recolha de informação policial da Polícia de Austrália Ocidental numa base mensal,
pelo pessoal do Escritório de Prevenção à Criminalidade; a recolha de dados de uma
pesquisa anual sobre a satisfação comunitária com a polícia, a título anual, por parte
do pessoal do Escritório de Prevenção à Criminalidade; os dados de registo admin-
istrativo do governo local, anualmente, pelo pessoal administrativo do governo lo-
cal; os dados do registo administrativo do projecto, todos os anos, pelo Comité de
Parceria Interagencial.77

A experiência no uso da mensuração de desempenho para avaliar os programas de prevenção


do governo local, sugere que o processo nunca deve ser limitado só à verificação de responsabi-
lização financeira ou a certificação de cumprimento de quaisquer dos requisitos legais. Também
deve ser usado para a análise dos resultados dessas iniciativas. A experiência de Inglaterra, o País
de Gales e a Austrália, mostra que isso é importante:

• Comunicar a importância e o valor de mensuração do desempenho aos parceiros interes-


sados chave
• Desenvolver definições nítidas e precisas sobre os conceitos chave no âmbito da estrutura
• Desenvolver estratégias para abordar os condicionalismos
• Providenciar formação e desenvolvimento para garantir que existam conhecimentos e
aptidões apropriados para sustentar a estrutura.78

77 Ibid., ver especialmente a tabela A1 pp. 78-96.

78 Ibid., p. 10.
CAPÍTULO IV  PLANIFICAÇÃO, MONITORIA E AVALIAÇÃO 85

Os diferentes tipos de indicador de desempenho são necessários para avaliar os diversos aspec-
tos dum programa: indicadores do resultado, o produto, o processo e o insumo, conforme o
resumo na tabela a seguir.79

Tabela 1 Tipos de indicador de desempenho diferentes

Tipo de Indicador Definição Questões de desempenho chave

Resultado O impacto ou as consequências re- Qual é o impacto do serviço ou o pro-


sultantes de se ter efectuado a entre- grama?
ga do programa que produziu saída.

O programa está a conseguir os seus


objectivos?

O problema que levou o programa


a determinar estes resultados, ainda
existe?

Saída Os produtos e os serviços do projec- Que nível (qualidade) de serviço é


to oferecidos ao grupo alvo. que é fornecido?

Quantas unidades de serviço é que


são providenciadas?

O programa é eficiente na sua entre-


ga deste serviço ou serviços?

Processo Todas as coisas que os indivíduos e Será que tudo o que é preciso fazer
as organizações envolvidos no de- de modo a realizar-se saída, está a
senho de e/ou a entrega de um pro- ser feito?
grama, de facto, fazem.

O programa está encaminhado para


satisfazer as suas balizas?

Insumo A gama de recursos (financeira, ma- Que recursos é que são usados para
terial e/ou humano) usada para se efectuar o serviço ou o programa?
realizar o trabalho.

Desenvolvimento e escalação do projecto a longo prazo

Um bom exemplo do uso dos resultados de um projecto cuidadosamente implementado e avali-


ado para conduzir os projectos noutras cidades, é a Operação Cessar-Fogo em Boston, nos Esta-
dos Unidos. O sucesso do projecto Boston em reduzir os homicídios por arma de fogo entre os
jovens levou a que a orientação seguida fosse aplicada em mais 10 cidades nos Estados Unidos,
com o apoio do Instituto Nacional de Justiça, ao abrigo do projecto conhecido como Aborda-
gens Estratégicas à Iniciativa de Segurança da Comunidade (ver a caixa 9). O projecto e a sua

79 Fonte: Comissão de Auditoria (2000), reimpressão em Morgan e Homel, Modelo de Estrutura de Desempenho, p. 58.
86 MANUAL DE DIRETRIZES DE PREVENÇÃO À CRIMINALIDADE: APLICAÇÃO PRÁTICA

escalação retrata muitos dos princípios e abordagens esboçados nas Diretrizes de Prevenção à
Criminalidade, e os resultados têm ajudado a informar países e projectos de assistência técnica
fora dos Estados Unidos.

Caixa 9. Abrir caminho a novos progressos para o projecto sobre as vizinhanças segu-
ras: Iniciativa de Abordagens Estratégicas à Segurança Comunitária em 10 cidades dos
Estados Unidos*

Em princípios dos anos ‘90, o Departamento da Polícia de Boston estabeleceu uma parceria com
os pesquisadores da Universidade de Harvard, para analisar os problemas do homicídio juvenil e
crimes à mão armada, e para trabalhar em conjunto na implementação de estratégias de inter-
venção apropriadas. Esta colaboração, chamada Operação Cessar-Fogo, foi considerada bem-su-
cedida – a taxa de homicídio juvenil caiu de 40 na média para entre 10 a 15 mortes anualmente.

Para ver se a abordagem de Boston poderia ser repetida noutras cidades, o Departamento de
Justiça lançou a Iniciativa Abordagens Estratégicas à Segurança Comunitária (SACSI). Este
relatório apresenta as constatações principais duma avaliação nacional de abordagens do projecto
em 10 cidades.

As estratégias da SACSI em cada uma das cidades foram desenvolvidas por grupos centrais multi-
agenciais e multidisciplinares, liderados pelos escritórios do Procurador dos Estados Unidos.

Nove dos dez sítios da SACSI alvejavam o homicídio, a violência juvenil ou a violência à mão ar-
mada. Memphis foi a excepção, onde a parceria da SACSI focou a redução do estupro e a agressão
sexual.

O que é que os pesquisadores descobriram?

O estudo descobriu que a abordagem da SACSI, onde foi implementada de uma forma eficaz, es-
tava associada às reduções atingidas de crime violento, por vezes até 50 por cento. Os elementos
bem-sucedidos de abordagem da SACSI incluíam a liderança providenciada pelos escritórios do
Procurador dos Estados Unidos, a integração da pesquisa em estratégias de planificação e inter-
venção, o planejamento e a implementação colaboradoras estratégicas duma gama de estratégias
de intervenção.

Quais foram as limitações do estudo?

Porque o programa SACSI não envolvia a atribuição aleatória ou controlos perfeitamente adequa-
dos às áreas almejadas, não é possível dizer definitivamente que a SACSI por si só era responsável
pelas reduções no crime, ou se tinha sido a SACSI em conjunto com outros esforços de combate à
criminalidade (ou se foram outros factores completamente diferentes). Cidades de tamanho pare-
cido pelos Estados Unidos registaram decréscimos no crime violento em finais dos anos ‘90, em-
bora os mesmos fossem significativamente maiores no SACSI.

*Adaptado de: Jan Roehl e outros, “Abrir caminho a novos progressos para o Projecto Vizinhanas Mais Seguras:
SACSI em 10 Cidades dos EUA”, Departamento de Justiça dos Estados Unidos, Pesquisa do NIJ em Resumo, Abril de
2008, disponível em www.ojp.usdoj.gov/nij/pubs-sum/216298.htm.
CAPÍTULO IV  PLANIFICAÇÃO, MONITORIA E AVALIAÇÃO 87

O sucesso do projecto nos seus 10 locais, levou, por sua vez, à escalação do Projecto Nacional
de Vizinhanças Seguras, o que, a partir de 2001, visou os crimes juvenis à mão armada através
da execução rigorosa do direito relativo às armas de fogo, estratégias de supervisão e prevenção.
Por exemplo, foram estabelecidas fortes ligações com líderes de comunidades locais, e a polícia
e os funcionários de reinserção social conduziram visitas nocturnas às casas de modo a asse-
gurar que as pessoas jovens em liberdade condicional estivessem a cumprir com o seu recolher
obrigatório, e que havia um projecto concertado de re-entrada para trabalhar com os libertados
condicionalmente, antes da sua libertação.80 O projecto tem sido flexível, permitindo aos par-
ceiros locais adaptarem-se às circunstâncias locais, sendo que um dos aspectos mais notáveis do
seu sucesso tem sido a liderança forte e o compromisso, equilibrado com parcerias sólidas nos
outros sectores dos serviços e a comunidade.

Este capítulo visou o planeamento, a implementação, a monitoria e a avaliação de estratégias


e projectos de prevenção, aos níveis nacional e local. Tudo isto requer o trabalho em parceria
juntamente com outros serviços e a comunidade, e o capítulo V vai analisar os desafios que isto
apresenta.

80 Ver Edmund McGarrell e outros, Projecto Vizinhança Segura: Um Programa Nacional para a Redução do Crime à
Mão Armada—Relatório Final do Projecto (Washington, D.C., 2009).
CHAPTER IV

V. Uma abordagem
multidisciplinar e o
trabalho em parceria

A. As parcerias: uma componente desafiadora mas


importante

O Parágrafo 9 das Diretrizes de Prevenção à Criminalidade afirma:

A cooperação e as parcerias devem fazer parte integrante da prevenção efectiva à crim-


inalidade, dada a natureza ampla das causas do crime e as competências e responsa-
bilidades necessárias para as abordar. Isso inclue as parcerias que atuam em todos os
ministérios, bem como as parcerias entre as autoridades, as associações comunitárias, as
organizações não-governamentais, o sector dos negócios e os cidadãos privados.

Tal como é frisado nas Diretrizes, a prevenção à criminalidade requer que os Govermos trabal-
hem em parceria com uma larga gama de sectores. Este capítulo examina alguns dos desafios
que residem no trabalho em parceria, e a forma como se podem superar, bem como alguns dos
parceiros institucionais chave, quer aos níveis nacional, estadual, provincial ou local. O Capítulo
VI irá considerar o papél da sociedade civil em mais pormenor.

A experiência ao longo de muitos anos, tem mostrado que o trabalho em parceria não é nada
simples. As parcerias podem ser morosas e frustrantes. Leva tempo para que os ministérios ou
os sectores de serviço trabalhem em conjunto uns com os outros e estejam dispostos a partil-
har áreas de trabalho sob a sua exclusiva jurisdição. Alguns dos sectores podem não apreciar a
importância do seu potencial contributo para a prevenção ao crime, cedendo autoridade a sec-
tores mais tradicionais tais como a justiça ou o policiamento. Os aspectos de confidencialidade
podem afectar a partilha de informações, e a não ser que haja uma liderança mesmo forte, os
sectores podem até estar pouco dispostos a ratear recursos a uma sociedade conjunta. A con-
tinuidade do pessoal também constitue um factor significativo, já que as mudanças constantes
na adesão dos comités de coordenação nacional ou as parcerias locais enfraquecem a determi-
nação e a energia colectiva.

Por conseguinte, as experiências variam:

89
90 MANUAL DE DIRETRIZES DE PREVENÇÃO À CRIMINALIDADE: APLICAÇÃO PRÁTICA

Na base da experiência vivida pelas 16 cidades dos Estados Unidos que tomaram parte
no Programa Comunitário Abrangente, financiado num âmbito federal, George Kelling
notou que o termo parceria é usado de muitas formas diferentes, e que as organizações e
os cidadãos poder-se-ão envolver simultaneamente em relações muito diferentes, depen-
dendo do problema em mãos. Ele desenvolveu um contínuo que descreve estas relações,
indo da: colaboração – coordenação – cooperação – consentimento – indiferença –ob-
jectivo – passivo – protesto – desafio à resistência activa.81

Tudo isto serve para sublinhar a importância de haver uma forte liderança Governamental na
montagem dum ministério ou uma agência central que possa tomar a responsabilidade pelo
desenvolvimento e a implementação de estratégias de prevenção à criminalidade. Também sub-
linha a necessidade de todas estas pessoas que trabalham em parceria terem a autoridade e a
senioridade necessárias para lhe dedicarem o tempo e os recursos adequados. Certas parcerias
terão que ser permanentes; outras poderão ser montadas de uma forma aleatória para desen-
volver uma iniciativa específica.

Um dos maiores desafios que reside nas parcerias é a vontade por parte dos sectores de serviço e
as instituições de partilharem dados e informação. Não se pode presumir que os sectores de saúde
irão estar dispostos a adiantar informação confidencial a um comité de prevenção à criminali-
dade, por exemplo. A polícia poderá não querer partilhar informação de inteligência pertinente
a problemas ou áreas de crime, com outros departamentos, e até menos com a comunidade. As
organizações comunitárias que prestam assistência a vítimas, tais como as vítimas da agressão
sexual ou violência doméstica, muitas das vezes não têm vontade de partilhar informação pes-
soal com a polícia ou os serviços sociais. Uma das formas de responder a este problema é através
de se usarem acordos ou protocolos entre os diferentes ministérios ou sectores.

Uma série de Governos tem vindo a desenvolver protocolos sobre a partilha de dados, que têm
ajudado a reunir informações para efeitos de análise dos problemas do crime e o desenvolvi-
mento de planos de prevenção. Estes são de importância especial ao nível local. A iniciativa
Leeds Mais Segura na cidade de Leeds, Reino Unido, por exemplo, estabeleceu um conjunto de
protocolos que governa a troca de informação pessoal entre os sectores de serviço e as organi-
zações da cidade e mais além. O exemplo na caixa 10 está vinculado ao protocolo desenvolvido
pela parceria cotidiana responsável por implementar a estratégia sobre as cidades mais seguras.

Caixa 10. Leeds Mais Segura: como lidar com as drogas e o crime—protocolo de par-
tilha de informação

A Parceria Leeds Mais Segura foi formada em 2005 e é responsável por assegurar a implemen-
tação, a entrega e a gestão de desempenho da estratégia Leeds Mais Segura da cidade do mesmo
nome. Trabalha em parceria conjunta com outros sectores e utiliza uma abordagem multiagencial
para a resolução de problemas em toda a cidade.

O protocolo é um acordo entre uma série de parceiros da cidade e a região do Oeste de Yorkshire,
para gerir a troca de informação. O seu propósito é facilitar e apoiar a troca de informação num am-

81 G. Kelling, “Redução da criminalidade na comunidade: activar o controlo formal e informal”, Manual de Prevenção
à Criminalidade e a Segurança Comunitária, Nick Tilley, ed. (Editora Cullompton, Devon, Willan, 2005).
CAPÍTULO V  A ABORDAGEM MULTIDISCIPLINAR E O TRABALHO EM PARCERIA 91

biente seguro e confidencial. Determina a forma como a informação deve ser usada, explica a em-
prega dos dados personalizados e despersonalizados, elucida acerca de princípios gerais de uma
forma detalhada, especifica como é que se deve lidar com dados sensíveis, fornece informações
sobre segurança e divulgação, e esclarece o procedimento de denúncia ou participação.

As partes ao protocolo incluem Education Leeds; Câmara Municipal de Leeds: Vizinhanças e Hab-
itação, Tempos Livres e Aprendizagem, Departamento de Presidentes dos Concelhos Directivos,
Desenvolvimento, Serviços Empresariais, Serviços Urbanos e Serviços Sociais; Serviços de Saúde
Mental de Leeds, Fiduciária Aprendizagem nos Hospitais, Fiduciária Cuidados Primários; Serviço
Prisional de Leeds e Serviço de Ofensores Juvenis; Serviço de Ambulância de Oeste Yorkshire;
Serviço de Bombeiros de Oeste Yorkshire; Polícia de Oeste Yorkshire; Regime de Prova de Oeste
Yorkshire; e demais interessados (www.saferleeds.org.uk).

A experiência extensa de trabalhar em parceria ao nível local na Inglaterra e o País de Gales –


onde cada uma das autoridades locais é obrigada a estabelecer uma parceria – tem ajudado a
identificação as componentes chave para as parcerias e o trabalho bem sucedidos, de uma forma
multissectorial e multidisciplinar. Entre estas estão incluídas uma liderança forte; um sentido
claro de missão para as parcerias; uma estrutura que separa a gestão geral estratégica das activi-
dades operacionais e de implementação; recursos adequados em termos de tempo, informação,
financiamento, e perícia; e a sustentabilidade que possa ser garantida através do financiamento a
longo prazo e a estabilidade do pessoal alocado à parceria. Segue-se uma lista mais detalhada:82

•  ma missão clara ou um propósito para a parceria, juntamente com um acordo sobre


U
resultados pretendidos
• Um nível de confiança sólido entre as agências parceiras
• A liderança, incluindo de recursos, a partir dos gestores seniores de modo a permitir a
funcionalidade das parcerias
• Linhas de comunicação e responsabilização claras a todos os níveis, tanto no interior das
agências como através destas
• Uma gestão cujo enfoque são os resultados, tanto estratégicos e operacionais, ou do projecto
• Estruturas de parceria relativamente pequenas, do tipo empresarial, focando a prevenção
à criminalidade
• Perícia que garanta o acesso a um bom conhecimento orientado sobre questões da pre-
venção à criminalidade
• Continuidade de representação e participação de parceiros, incluindo uma boa docu-
mentação
• Pessoal com tempo suficiente afastado do negócio principal da agência para providenciar
insumos à parceria83

O exemplo abaixo, da Austrália Ocidental, indica a gama de parceiros diferentes, tanto institucio-
nais e da sociedade civil, que se encontrem envolvidos no desenvolvimento e a implementação do
seu plano de prevenção à criminalidade. Foi feita uma tentativa clara para garantir que a parceria
fosse representativa de todos os sectores do Estado, incluindo os que muitas das vezes são excluídos:

82 D. Gilling, “Parceria e Prevenção à Criminalidade”, em de Prevenção à Criminalidade e a Segurança Comunitária,


Nick Tilley, ed. (Publicação Cullompton, Devon, Willan, 2005).

83 Instituto Australiano de Criminologia, “Parcerias para a Prevenção à Criminalidade”, AI Questões de Redução à


Criminalidade, No. 49, 5 de Setembro de 2006 (ver www.aic.gov.au).
92 MANUAL DE DIRETRIZES DE PREVENÇÃO À CRIMINALIDADE: APLICAÇÃO PRÁTICA

Na Austrália Ocidental, o Escritório de Prevenção à Criminalidade, o órgão de coorde-


nação central, é quem estabelece as Parcerias de Segurança Comunitária e Prevenção à
Criminalidade (CSCP), incluindo entre os sectores seguintes: a Polícia Estadual; os de-
partamentos de serviços prisionais, a saúde, a educação e a formação, habitação e obras
públicas, assuntos indígenes, e o desenvolvimento da comunidade; agências nacionais
do governo; as comunidades aborígines e os Ilhéus dos Estreitos de Torres; os negócios;
as gentes jovens; grupos minoritários (comunidades étnicas e pessoas a viverem com
incapacidades físicas ou mentais); os voluntários da comunidade; as escolas locais; as
organizações religiosas; e os meios de comunicação locais.84

Em El Salvador, uma parceria entre o governo e a comunidade foi iniciada originalmente pela
sociedade civil:

Em 2003, uma coligação de base alargada, a Sociedade Sem Violência, foi formada para
trabalhar sobre o aspecto da violência armada. Com o apoio do Fundo das Nações Uni-
das para Mulheres, foi efectuada uma avaliação abrangente e detalhada sobre a extensão
do problema, as suas origens e os tipos de intervenção necessários. Juntamente com o
Concelho Nacional de Segurança Pública, a coligação pressionou o Governo no sentido
de promover as mudanças.

O Ministério de Segurança respondeu através de promulgar a legislação em 2006 para o


aumento dos controlos sobre o uso das armas de fogo em relação ao registo, a proprie-
dade e a proibição do porte de munições em público, e um imposto sobre armas de fogo
cujas receitas eram destinadas à melhoria dos serviços de saúde. O Ministério também
decretou que os municípios poderiam restringir o porte de armas de fogo em público, e
um número de comunidades relatou um decréscimo de violência.

Além disso, a coligação pressionou de uma forma bem-sucedida o Governo para montar
uma Comissão Nacional sobre a Segurança Comunitária e a Paz Social representando
todos os cinco partidos políticos, as universidades, o sector privado, e os grupos religi-
osos e outros grupos comunitários. O seu relatório de 2007 continha 75 propostas para a
redução da violência armada.85

B. Um parceiro chave: a polícia


O parágrafo 12 das Diretrizes de Prevenção à Criminalidade indica:

Direitos humanos/estado de direito/cultura de legalidade


O estado de direito e os direitos humanos que são reconhecidos nos instrumentos in-
ternacionais a que são signatários os Estados-Parte, devem ser respeitados em todas as
questões de prevenção à criminalidade. Uma cultura de legalidade deve ser activamente
promovida na prevenção à criminalidade.

84 A. Morgan e P. Homel, Avaliar o Impacto dos Planos de Segurança Comunitária e Prevenção à Criminalidade
(Canberra, Instituto Australiano de Criminologia, 2009), pp. 22-23.

85 A Organização de Cooperação e de Desenvolvimento Económicos, Redução da Violência Armada: Potenciar o


Desenvolvimento, Série de Conflito e Fragilidade, (Paris, Publicação da OCDE 2009).
CAPÍTULO V  A ABORDAGEM MULTIDISCIPLINAR E O TRABALHO EM PARCERIA 93

A prevenção à criminalidade, conforme reflectido nas Diretrizes, depende de alguns parceiros


chave, incluindo a polícia. Os países variam consideravelmente em termos das características
do seu policiamento, o número e tipos de forças policiais que têm ao seu dispor, a sua história e
orientação e a distribuição das responsabilidades. Em circunstâncias de pós-conflito, até podem
ser altamente centralizados e militarísticos no seu estilo e formação, e, em muitos países, até
pode haver falta de confiança na polícia por parte do público.

Não obstante tudo isto, a polícia tem um papél importante, embora não exclusivo, a desempen-
har na prevenção estratégica aos níveis nacional e do Estado, mais especialmente ao nível do
governo local. Não é incomum a polícia ser vista como tendo a responsabilidade principal pela
prevenção à criminalidade, e enquanto instituição chave natural em todos os aspectos de segu-
rança, em vez de parceiro dos demais sectores institucionais.

O policiamento com orientação comunitária

Teria que haver uma abordagem proactiva e orientada em torno do policiamento, no desenvolvi-
mento de estratégias efectivas de prevenção à criminalidade. Têm vindo à tona muitas formas
diferentes de policiamento, que trabalham de uma forma proactiva com as comunidades locais e
outros parceiros. É-lhes dado designações diferentes, tais como o policiamento da comunidade,
o policiamento orientado em torno dos problemas ou o policiamento tranquilizador. Contudo,
os elementos chave desse tipo de policiamento foram definidos como sendo:86

• O envolvimento comunitário
• Orientação no sentido de resolver os problemas
• A descentralização

Isto significa que as estruturas policiais precisam de ser menos hierárquicas, permitindo a flexi-
bilidade para a tomada de decisões aos níveis inferiores, trabalhar com governos locais e outros
parceiros e a comunidade, e o desenvolvimento de respostas proactivas em vez de reactivas aos
problemas do crime. Tal como a lista abaixo sugere, muitos outros termos específicos foram
utilizados, mais especialmente na América do Norte e a Europa, reflectindo os acentos difer-
entes do trabalho, mas todas as três características centrais do envolvimento comunitário, uma
abordagem à resolução de problemas e a gestão descentralizada:

(a) Policiamento centrado na resolução de problemas: o policiamento que vê o seu papél


como um de redução em vez, meramente, de resposta a incidentes, com base em teorias e
evidências bem-fundamentadas;

(b) Abordagem das janelas partidas: a noção que a desordem e o medo da criminalidade
estão fortemente ligados, e que se não for prestada a atenção devida às áreas desordeiras e
negligenciadas, os controlos da comunidade podem desmoronar-se e essas vizinhanças e
bairros ficarem expostos à criminalidade. O papél da polícia neste caso reside em ajudar a
manter a ordem e reforçar os controlos informais;

86 Jean-Paul Brodeur, “Confiança e perícia no policiamento”, em O Papél da Polícia na Prevenção à Criminalidade, Os


procedimentos do sétimo Colóquio Anual do ICPC sobre a Prevenção (Montreal, Centro para a Prevenção Internacional do
Crime, 2007); Dennis Rosenbaum, “Inovação da Polícia Pós-1980: avaliar a eficácia e as preocupações sobre a igualdade na
era da tecnologia de informação”, Revisão do CPI, vol. 1, Março de 2007, pp. 11-44.
94 MANUAL DE DIRETRIZES DE PREVENÇÃO À CRIMINALIDADE: APLICAÇÃO PRÁTICA

c) Policiamento de puxar alavancas: relacionado com o policiamento orientado no sentido


da resolução de problemas, esta abordagem emergiu do projecto lançado contra as armas de
fogo em Boston, que visou reduzir a violência dos bandos juvenis armados. Envolveu reunir
(ou puxar) todas as agências de justiça criminal para o trabalho em conjunto de uma forma
concertada, para assegurar o cumprimento da legislação, e fazer articular o mesmo com o
envolvimento, as intervenções e os serviços directos de base comunitária;

(d) Policiamento por terceiros: os esforços da polícia para convencer ou coagir outros sec-
tores, tais como as agências de habitação pública, os proprietários de imóveis e os inspectores
do comércio, a saúde e a construção, e os pais, a tomarem a responsabilidade pela prevenção
à criminalidade;

(e) Policiamento de ‘pontos quentes’: uma forma de policiamento com enfoque na identifi-
cação de localidades onde possam existir uma concentração de crime, e o desenvolvimento
de mecanismos para a resolução destes problemas;

(f) Policiamento baseado em provas factuais: a aplicação de padrões e métodos da mais el-
evada qualidade ciêntífica, à avaliação de informações e intervenções;

(g) “Compstat”: um conjunto de alterações administrativas e de gestão, em conjunto com


dados informáticos avançados sobre a criminalidade, a análise e o mapeamento geográfico,
reuniões regulares sobre estratégia criminal, e uma maior descentralização de responsabili-
dades do policiamento ao nível da vizinhança local;

(h) Policiamento tranquilizador: um modelo de policiamento vicinal para melhorar a con-


fiança do público na polícia. Os agentes da polícia e auxiliares policiais muitas das vezes tra-
balham em conjunto ao nível de uma comunidade, para identificar os problemas e responder
às preocupações locais das comunidades;

(i) Policiamento alternativo de Chicago: é uma forma de policiamento que envolve mudar
os processos decisórios e criar novas culturas nos departamentos policiais (ver abaixo);

(j) Policiamento liderado pelos serviços de informação: um modelo de policiamento desen-


volvido na Inglaterra e o País de Gales, que visa fornecer uma estratégia efectiva em resposta
a todas as necessidades de aplicação da lei, tais como o crime organizado e a segurança nas
estradas, ão sómente ao crime local. Usa a resolução de problemas com base na informação
confiável e a cooperação próxima com outras agências e órgãos.87

A experiência de um modelo de policiamento com orientação comunitária, em Chicago, nos Es-


tados Unidos, demonstra o modo como uma cidade implementou um modelo que parece estar
a produzir resultados úteis tanto em termos de relações melhoradas ao nível da comunidade e
na redução de problemas da criminalidade. Isto foi a Estratégia do Policiamento Alternativo de
Chicago, iniciada em Chicago em 1993 (população em 2005, 2.8 milhões, 4.7 agentes policiais
por cada 1,000 habitantes) em cinco distritos com três objectivos: a reorganização dos poderes
de tomada de decisão e funções da polícia, a resolução dos problemas locais usando dados rela-
cionados com o crime e a participação activa da comunidade, e coordenação ampliada entre os

87 Adaptado de Brodeur, “Confiança e perícia no policiamento”.


CAPÍTULO V  A ABORDAGEM MULTIDISCIPLINAR E O TRABALHO EM PARCERIA 95

actores locais. Os 25 distritos policiais encontram-se divididos em 279 equipes de patrulha, cada
uma consistindo em 10 oficiais e responsáveis por uma média de 4 100 agregados familiares.
Alguns agentes policiais estão afectos a uma equipe de intervenção rápida para responder às
chamadas de emergência; outros fazem patrulhas para resolver problemas locais em colaboração
com os cidadãos. As unidades de patrulha convocam reuniões mensais com os representantes de
organizações comunitárias e residentes para identificarem os assuntos mais urgentes da crimi-
nalidade nas vizinhanças locais. A implementação foi cuidadosamente avaliada. Os resultados
indicam um aumento na confiança dos cidadãos na polícia e um decréscimo nas taxas do crime.
Embora a reforma policial não seja o único factor que possa explicar o decréscimo na taxa da
criminalidade, ao tudo que indica, o crime decresceu mais em sectores com a implementação do
modelo do que nas zonas de controlo.

Sistemas policiais de orientação comunitária na Colômbia, o Japão e as Filipinas são todos ex-
emplos de bons sistemas policiais acessíveis aos locais, com pequenas esquadras da polícia situ-
adas nas vizinhanças, a trabalharem de perto com a comunidade. Foram projectados para serem
acessíveis ao público e para se poderem responder às preocupações dos residentes e utentes
locais. No caso de Bogotá e as Filipinas, não havia qualquer tradição de policiamento com ori-
entação comunitária.

• 
Sistema Cia de Colômbia, Bogotá: um sistema semelhante àquele do Japão, colocando
pequenas esquadras em parques locais e vizinhanças por toda a cidade.

• J apão, sistema de caixa policial de Koban: um sistema de policiamento com base comu-
nitária através do qual pequenas esquadras de polícia são colocadas em aldeias e municí-
pios por todo o país para poderem responder aos problemas locais.

• Filipinas: a Estratégia de Policiamento com Orientação Comunitária, junta o policia-


mento de serviço completo com parcerias para a resolução de problemas e comunitárias
ao nível local de Baranguay.88

As esquadras de polícia para mulheres são agora usadas largamente na América Latina, prin-
cipalmente no Brasil, Ecuador, Nicaragua e Peru, e, fora da América Latina, na Índia, entre
outros países. Formam parte das estratégias do Governo para a prevenção da violência contra
mulheres. O seu objectivo é aumentar a vontade das mulheres de participar casos de violência
enfrentados quer nas suas próprias famílias ou no domínio público. Também ajudam a elevar a
conscientização acerca do problema.89 Empregam principalmente as mulheres polícia e o pes-
soal de apoio, que recebem treinamento especial sobre violência contra mulheres, respostas le-
gais e apoio e serviços disponíveis a vítimas, e trabalham em parceria com a polícia regular e
outros serviços locais.

88 Miguel Coronel, “Estratégia e melhores práticas para a prevenção à criminalidade nas Filipinas: sistema de policia-
mento com orientação comunitária”, em Estratégias e Melhores Práticas na Prevenção do Crime especialmente em relação às
Zonas Urbanas e a Juventude em Risco, Margaret Shaw e Kathryn Travers, eds. (Montreal, Centro para a Prevenção Internac-
ional do Crime, 2007).

89 Cecília MacDowell Santos, Esquadras da Polícia para Mulheres: Violência e Justiça de Géneros em São Paulo, Brasil
(Nova Iorque, Palgrave Macmillan, 2005); N. Jubb, “Um estudo comparativo das esquadras de polícia de mulheres na Amé-
rica Latina”, apresentação dada ao Centro de Prevenção Internacional do Crime, Colóquio do 15º Aniversário, Montreal, 8
de Dezembro de 2009.
96 MANUAL DE DIRETRIZES DE PREVENÇÃO À CRIMINALIDADE: APLICAÇÃO PRÁTICA

Desde a sua incepção em 1985 no Brasil até agora, mais de 400 esquadras da polícia de mulheres
forma criadas, 31 no Ecuador e 36 em Nicaragua.

Adjuntos auxiliares da polícia municipal e civil

Uma larga gama de forças policiais auxiliares ou municipais com autoridade limitada foi criada
numa série de países. Isto inclue países sem qualquer tradição de policiamento local, sendo que
o seu objectivo tem sido providenciar mais policiamento com base comunitária e local. Muitas
das vezes, têm menos poderes do que a polícia Estadual ou a nacional, mas isto não obsta que
desempenhem um papél de parceria significativo juntamente com os serviços e a comunidade
local. A criação de tais grupos, mais especialmente os adjuntos, também levanta um determi-
nado número de desafios acerca da sua aderência ao estado de lei e a extensão do seu conheci-
mento e a formação.

Em Dar es Salaam, foi estabelecida uma Força da Polícia Auxiliar como parte do Programa Ci-
dades Seguras nos anos ‘90, que era responsável pelo tráfico local e os problemas de ordem, e o
patrulhamento, de modo a providenciar uma maior presença policial. Na África do Sul, cidades
grandes como Joanesburgo estabeleceram agora forças da polícia municipais que geram a es-
tratégia da cidade em relação à prevenção à criminalidade, e providenciam serviços de policia-
mento da área, embora tenham poderes e responsabilidades mais limitados do que os Serviços
da Polícia Sul Africana. À semelhança, existem guardas municipais em cerca de 700 municípios
no Brasil. São polícias civis em uniforme, responsáveis perante o Presidente da Câmara, que são
treinados como oficiais de segurança pública. Constam a seguir alguns pormenores adicionais:

•  oi criada a Guarda Municipal em Guarulhos, São Paulo, Brasil, em 1998, mais para
F
providenciar segurança para os edifícios e propriedades. Desde 2001, tornou-se uma
componente central da estratégia municipal de segurança pública. A Guarda é agora
profissionalmente treinada, e descentralizada, com um aumento no número de esquad-
ras, e os agentes trabalham sobre princípios de policiamento comunitário em estreita
colaboração com as vizinhanças designadas, as suas comunidades e escolas.90

• O Departamento da Polícia Metropolitana de Joanesburgo faz a gestão e coordenação


da estratégia de prevenção à criminalidade sob a autoridade da cidade. As suas funções
incluem:
º O policiamento preventivo e o patrulhamento das áreas de alto risco
º Estabelecer um sistema de gestão de informação para a partilha de dados sobre o crime
com os Serviços da Polícia Sul Africana
º Circuito fechado de televisão em sítios públicas
º Tecnologia antifraude
º Sinais que alertam os peões e os turistas sobre zonas de risco
º Iluminação das ruas efectiva em zonas de alto risco
º Parcerias de segurança privada e parcerias de negócio em zonas de crime elevado
º Programas familiares e comunitários para as zonas de alto risco
º Parcerias comunitáris de fóruns policiais (www.joburg.org.za)

90 Luiz Fabbri, “Governo local e segurança pública no Brasil: estrutura geral e lições tiradas”, disponível em ww2.
unhabitat.org/programmes/safercities/documents/LF001.pdf.
CAPÍTULO V  A ABORDAGEM MULTIDISCIPLINAR E O TRABALHO EM PARCERIA 97

• A Polícia Auxiliar de Dar es Salaam é uma força policial de uniforme, criada em 2001. O
seu pessoal recebeu treinamento na Academia de Polícia, e inicialmente era designado para
as autoridades municipais da zona, com o objectivo de providenciar policiamento visível
e patrulhamento, e para fazer a aplicação da lei e os regulamentos municipais do distrito.
Também trabalhavam em colaboração com patrulhas locais de voluntários (SunguSungu)
a nível do bairro municipal e forneciam apoio durante as sessões de tribunal do bairro. A
avaliação numa fase inicial descobriu que o pessoal estava sob uma carga de trabalho exces-
siva, tendo havido necessidade para se introduzir um número muito maior de agentes.91

Muitos países e cidades também criaram adjuntos civis da polícia, para providenciarem mais
presença policial no terreno e apoio às comunidadse, bem como para libertar algum tempo à
polícia. Em certos casos, havia a ausência do bom policiamento do Estado.

Na Inglaterra e o País de Gales, Funcionários especializados de Apoio Comunitário são em-


pregues e treinados pelas forças locais da polícia, bem como Guardas da Vizinhança empregues
pelas autoridades locais, que desempenham uma variedade de funções de modo a promover a
segurança e a proteção das comunidades locais, e para trabalhar de perto com os demais serviços
locais. Em países tais como a Bélgica e a França, jovens ou adultos desempregados são recruta-
dos e treinados para efectuar patrulhas locais e o desempenho de funções em sítios públicos, nos
transportes e a nível das vizinhanças.

Todavia, a legitimidade de ações dos adjuntos voluntários civis, ou milícias locais não associa-
das à polícia, tem vindo a levantar algumas preocupações, já que não se pode esperar que tais
voluntários desempenhem funções de segurança pública sem haver atenção cuidada para o seu
treino e vigilância. Em países de rendimentos médios e baixos, onde as forças da polícia pública
podem ser muito limitadas, os assuntos principais têm sido a qualidade do treino, a supervisão
e a responsabilização das forças voluntárias. Nalguns países, a ausência de policiamento por
parte do Estado em zonas rurais ou remotas tem encorajado a que sejam os grupos vigilantes a
fornecer o policiamento das suas comunidades.92

• Índia: o Sistema de Policiamento de Panchayat em Mumbai foi desenvolvido para provi-


denciar um melhor acesso policial aos habitantes dos bairros degradados, onde a falta de
confiança na polícia constituía um factor de maior afectando a vontade de participar os
crimes. Os residentes dos bairros degradados tinham muito menos segurança e proteção
e sentiam riscos muito maiores de vitimização do que aqueles em vizinhanças planeadas
e estabelecidas. Residentes do sexo feminino têm sido treinadas para trabalhar nas es-
quadras de polícia em zonas degradadas. Interagem com o público e ajudam a aumentar
a confiança na polícia por parte da população nesses bairros, o que tem elevado de uma
forma correspondente a sua vontade de participar as ocorrências.

•  ilipinas: o componente “BAC-UP” do policiamento da comunidade foi inicialmente


F
desenvolvido na Cidade de Bacolod nos anos ’80, onde a esquadra de polícia única foi
susbstituída por oito delegacias da polícia, e uns 3 000 voluntários, os Tanods Juventude

91 Anna Mtani, “Inovações locais para a prevenção à criminalidade: o caso Dar es Salaam das Cidades Mais Seguras”,
em Estratégias e Melhores Práticas de Prevenção à Criminalidade, mais Especialmente em Relação às Zonas Urbanas e a Juven-
tude em Risco, Margaret Shaw e Kathryn Travers, eds. (Montreal, Centro para a Prevenção Internacional do Crime, 2007).

92 A. N. Roy, A. Jockin e A. Javed, “Esquadras da Polícia Comunitária nas favelas de Mumbai”, Ambiente e Urbani-
zação vol. 16, No. 2 (2004), pp. 135-138.
98 MANUAL DE DIRETRIZES DE PREVENÇÃO À CRIMINALIDADE: APLICAÇÃO PRÁTICA

Barangay, foram treinados na prevenção à criminalidade para assistir a polícia. Houve


um decréscimo acentuado no crime organizado e o crime em geral na cidade, durante os
anos que decorreram.93

•  epública Unida da Tanzânia: parte do Programa Cidades Mais Seguras de Dar-es--Sa-


R
laam, o SunguSungu são um grupo de prevenção à criminalidade que fornece serviços
de segurança e ambientais a comunidades desfavorecidas numa base voluntária. O grupo
recebe treinamento e trabalha de perto com a Polícia Auxiliar em Dar es Salaam. O pro-
jecto também age como gerador de rendimentos sendo gerador de empregos, para que
os seus membros possam ganhar algum dinheiro e adquirir outras aptidões profissionais
quando não se encontrarem ocupados com as patrulhas de policiamento.94

Segurança e tecnologia privadas

A segurança privada actualmente tem um papél muito importante a jogar nos países de
Norte e Sul. Em muitos dos países de rendimento elevado, bem como em certos países de
rendimento médio e baixo, os números da polícia privada, tais como os guardas de segurança
das propriedades residenciais e de negócio, são superiores aos números da polícia pública.
O policiamento em países de baixo rendimento é agora suplementado tanto por entidades
de Estado e Não-Estaduais, além da polícia formal e informal, com o imperativo de se pres-
tarem contas e atingir a efectividade e equibilidade. Assim, terão que ser levadas em conta as
necessidades de segurança privada nos planos e consultorias de parceria ao nível do governo
nacional e local, devido a uma série de motivos, principalmente para garantir a inclusividade
de estratégias e intervenções sobre a prevenção, bem como a igualdade no provisionamento
de segurança.

Em regiões tais como África, é provável que exista menos polícia pública por capita do que
noutros lugares, e o policiamento tanto do Estado e o Não-Estadual pode revelar-se necessário
para providenciar segurança nas diferentes comunidades.95 Muitas das comunidades até po-
dem depender de sistemas de policiamento informais e privados na ausência de uma polícia
do Estado, ou porque têm medo ou não confiam na polícia do Estado. O desafio em países de
rendimento alto, médio e baixo é assegurar a adequação de mecanismos de regulamentação e
supervisão tanto para o policiamento público e privado, para que sejam capazes de se tornar
equitativos e responsáveis.

Uma segunda preocupação é que a segurança privada tem sido associada à exclusão de certos
grupos de cidadãos através de práticas contidas no aumento da construção de comunidades
em recintos vedados, ou através da prática de restrições à entrada de centros comerciais ou a
expulsão de certos grupos das áreas comerciais ou de negócio. Muito disto depende dos guardas
de segurança privados, bem como as novas tecnologias que incluem o uso de cameras de circuito
fechado de televisão e técnicas de controlo de entrada, e há o movimento em grande escala para

93 Coronel, “A estratégia das Filipinas e melhores práticas para a prevenção à criminalidade” (ver nota de rodapé 88).

94 Mtani, “Inovações locais para a prevenção à criminalidade” (ver nota de rodapé 91).

95 Julie Berg e Elrena van der Spuy, “Desafios para a boa governação de segurança no contexto africano”, no Relatório
Internacional sobre a Prevenção à Criminalidade e a Segurança Comunitária: Tendências e Perspectivas, 2010 (Montreal, Cen-
tro para a Prevenção Internacional do Crime, 2010).
CAPÍTULO V  A ABORDAGEM MULTIDISCIPLINAR E O TRABALHO EM PARCERIA 99

privatizar espaços públicos.96

As intervenções com base nas abordagens situacionais podem ser muito efectivas mas neces-
sitam de ser monitorizadas cuidadosamente já que os seus resultados por vezes podem ser con-
traproducente. Pode ocorrer a deslocação do crime de uma rua para outra, de uma forma inten-
sificada. As cameras de circuito fechado de televisão levantam preocupações em determinados
países no que se relaciona com os direitos de indivíduos. Já se implementaram muitos esquemas
de circuito fechado de televisão nas cidades, em sítios públicos e privados, mas estas nem sempre
previnem ao crime se estiverem mal-localizadas ou não forem observadas. O uso selectivo do
circuito fechado de televisão parece ser uma opção mais barata.

Desse modo, ao desenvolverem-se parcerias junto do sector privado, é importante considerar-


em-se, através de negociações com todos os parceiros e a comunidade local, formas de:

• Restringir a expansão de uma segurança privada que exclue os pobres e desfavorecidos


• Integrar as competências e a perícia do pessoal de segurança privada nos planos de pre-
venção à criminalidade
• Regular as actividades da indústria, para que o estado de lei e os direitos humanos pos-
sam ser respeitados
• Assegurar a responsabilização e transparência do sector de segurança privada, por ex-
emplo, através de legislação nacional e Estadual, encorajando à formação, e trabalhando
com associações profissionais de modo a garantir uma maior sensibilização em relação
aos aspectos de prestação de contas

Fomentar a cooperação entre a polícia e outros parceiros

Foi desenvolvido um número de mecanismos para fomentar as parcerias e a cooperação en-


tre a polícia e outros parceiros e a comunidade, mais especialmente ao nível local. Estes vão
desde as parcerias estatutárias tais como as Parcerias de Crime e Desordem na Inglaterra,
e as Parcerias de Segurança Comunitária no País de Gales, os fóruns para diálogo público
desde os desenvolvidos pelo Fórum Brasileiro para a Proteção Pública, até aos Fóruns Co-
munitários locais da Polícia na África do Sul, ou as Mesas Seguridad Ciudadanas da Amé-
rica Central.

As Mesas de Seguridad Ciudadanas de Honduras são concelhos de consultoria da comunidade


local. Vieram substituir o anterior Programa nacional do Governo, Programa de Comunidad
más Segura. Trabalham regularmente com a polícia municipal local e a justiça, bem como os
outros sectores.

São encontradas mais informações sobre a promulgação de parcerias juntamente com o sector
privado e a sociedade civil no capítulo VI.

96 Ver Laura Capobianco, Afiar a Lente: O Envolvimento do Sector Privado na Prevenção à Criminalidade (Montreal,
Centro para a Prevenção Internacional do Crime, 2005); Patricia Arias, Seguridad Privada en América Latina: El Lucro y los
Dilemmas de una Regulación Deficitaria (Santiago, Facultad Latinoamericana de Ciencias Sociales, 2009).
100 MANUAL DE DIRETRIZES DE PREVENÇÃO À CRIMINALIDADE: APLICAÇÃO PRÁTICA

C. Alguns parceiros chave: os sectores de planificação


urbana e o meio-ambiente
Os serviços responsáveis pelo desenvolvimento e a regeneração urbanos também constituem
parceiros chave que precisam de se envolver no planeamento de políticas e programas aos níveis
nacional, Estadual e local. Juntamente com os departamentos de habitação, podem contribuir
para melhoramentos através de projectos habitacionais e urbanos, transportes e segurança nas
estradas, bem como no uso do espaço público, todos estes capazes de influenciar as oportuni-
dades existentes do crime e a vitimização, contribuindo igualmente com um sentido ampliado
de segurança da população. A regeneração urbana que encoraja a inclusão e o acesso à cidade,
foi um factor importante nas estratégias de elaboração de uma segurança pública efectiva nas
cidades de Medellín e Bogotá (Colômbia), São Paulo (Brasil) e Durban (África do Sul).

O exemplo de uma iniciativa nacional é o trabalho da Unidade de Renovação Vicinal na Ingla-


terra e o País de Gales, montada em 2001 em colaboração com o Gabinete do Vice Primeiro
Ministro. Foi responsável por apoiar o desenvolvimento de uma gama de programas nas 88 áreas
mais desfavorecidas.97 O programa encoraja e fornece financiamento aos serviços de autoridade
local para a sua cooperação em satisfazer uma série de metas relacionadas com preocupações
comuns, incluindo níveis de criminalidade, desemprego, habitação, condições deficientes do
meio-ambiente e a saúde. Assim, a unidade trabalha com, e através de, Departamentos do Gov-
erno central, bem como com os governos locais.

Ao nível do governo local, os projectos de regeneração urbano têm tido um papél significativo
a desempenhar em iniciativas visando a segurança geral dos habitantes da cidade de Bogotá, ao
longo da década passada. Com base na noção de que as cidades deveriam ser amigas das popu-
lações, e que a sua qualidade de vida deverá afectar o capital social e a força dos laços da comu-
nidade, a cidade tem vindo a embarcar num determinado número de projectos de regeneração
urbana. Estes recorrem a princípios de desenho situacional e meio-ambiente e de saúde pública,
de modo a evitar e reduzir a criminalidade e os acidentes. Isto incluiu os melhoramentos dos
transportes públicos, tais como:

•  m sistema dedicado de autocarros, o Transmilénio, com controlo de acesso para reduzir


U
os roubos e a fuga ao pagamento de passagens

• O desenvolvimento de calçadões, com restrições de estacionamento e bancas montadas


de modo a criarem-se zonas amigas dos peões

• A criação de uma rede de caminhos para bicicleta por toda a cidade

•  criação de parques novos e melhoramentos aos parques existentes, visando a melhoria


A
de serviços, infra-estruturas e vigilância dos edifícios residenciais vicinais

• A construção de bibliotecas públicas

• Melhoramentos nas áreas de favela residenciais

97 Agora sob a tutela do Ministério das Comunidades e o Governo Local.


CAPÍTULO V  A ABORDAGEM MULTIDISCIPLINAR E O TRABALHO EM PARCERIA 101

Outro exemplo de regeneração urbana que contribuiu para a prevenção, é o projecto do Entron-
camento de Warwick em eThekwini (Durban), África do Sul. Este teve início em 1997 graças
aos esforços empreendidos no sentido de melhorar a segurança e a qualidade de vida da área
em torno do núcleo de transportes de Durban.98 O escritório do projecto encontrava-se na viz-
inhança propriamente dita e não na Prefeitura. O projecto cobriu as actividades de renovação
urbana, abarcando assuntos atinentes à comunidade e sociais, através de extensivas consulto-
rias com os utentes da área. Nestas estavam incluídos os comerciantes informais, vendedores
de mercadorias trazidas diariamente das áreas rurais e favelas. O mercado dos comerciantes
de ervas foi criado após cerca de 18 meses de negociação e consultoria entre a cidade, o pes-
soal do projecto e os comerciantes, que montaram a sua própria associação. Os comerciantes
agora ajudam a regular e supervisionar a nova área de mercado. Guardar os bens à chave é uma
forma de se providenciar segurança nocturna, e os sanitários individuais, supervisionados por
atendentes, estão limpos e seguros. O impacto sobre a criminalidade é claro: houve a redução
acentuada de incidentes e mortes violentas, bem como benefícios económicos e de saúde. Foram
criados cerca de 14 000 empregos afins por todo o município, e a área está a tornar-se numa
atração turística. O projecto foi seguido pelo iTRUMP, uma escalação do projecto inicial para
outras partes da cidade.

D. Alguns parceiros chave: o sector de justiça e os


serviços de reintegração
As estratégias em apoio da reintegração de ofensores na comunidade, e a prevenção à rein-
cidência, estão entre as quatro abordagens principais de prevenção recomendadas nas Diretrizes
de Prevenção à Criminalidade. Formam parte integrante de uma estratégia abrangente sobre a
proteção do público, já que muitos dos ofensores processados pelo sistema de justiça e os que se
encontram incarcerados, irão voltar para a sua comunidade. Este regresso é muito difícil para os
múltiplos ex-presidiários que foram apartados da sociedade e agora se vêm em dificuldades para
encontrar emprego e alojamento devido ao seu passado de envolvimento com crime. Em grande
parte dos países, as taxas de reincidência após a libertação da prisão são muito altas, e a proba-
bilidades é elevada de que a grande maioria reincidirá após a sua libertação, e será devolvida à
prisão, a não ser que existam serviços e apoio que permitam a sua reintegração na comunidade
local. Dado os custos agravados de manter as prisões, o recidivismo fica muito mais caro do que
os programas de reintegração.99

Os parceiros chave podem incluir os serviços prisionais, de liberdade condicional ou regime de


prova, os procedimentos penais, os tribunais, os centros de justiça de ‘balcão único’, bem como
as famílias e os serviços de saúde, as organizações com base comunitária a trabalharem neste
sector e os membros da comunidade. Os programas tomam em conta a reinserção social de pes-

98 Richard Dobson, “A regeneração urbana enquanto estratégia de prevenção à criminalidade: a experiência do


Entroncamento de Warwick, eThekwini (Durban) África do Sul”, em Estratégias e Melhores Práticas na Prevenção à Crimi-
nalidade, mais Especialmente em Relação às Zonas Urbanas e Juventude em Risco, Margaret Shaw e Kathryn Travers, eds.
(Montreal, Centro para a Prevenção Internacional do Crime, 2007).

99 M. Borzicki e T. Makkai, “A reinserção de prisioneiros pós-libertação”, em Trabalhos Selecionados sobre Estraté-


giasBem-Sucedidas de Redução e Prevenção à Criminalidade no Contexto Urbano (Riyadh, Universidade de Naif Arab para
Serviços de Segurança, 2007); Curt T. Griffths, Yvon Dandurand e Danielle Murdoch, Reinserção Social de Ofensores e Pre-
venção à Criminalidade, Relatório de Pesquisa No. 2007-2 (Ottawa, Centro para a Prevenção Internacional do Crime, Segu-
rança Pública, Canadá, 2007).
102 MANUAL DE DIRETRIZES DE PREVENÇÃO À CRIMINALIDADE: APLICAÇÃO PRÁTICA

soas que saiem das prisões ou dos centros de detenção juvenil, providenciando-lhes uma gama
de serviços de apoio tais como o abrigo temporário ou a mais longo prazo, serviços de colocação
profissional, e formação de emprego e aptidões, com o intuito de fornecer alternativas à rein-
cidência. Os programas podem oferecer ajuda com problemas tais como o abuso de substâncias,
ou o trabalho junto de grupos específicos tais como membros de bandos juvenis que desejam
sair desses bandos, ou os ofensores sexuais.

Existe uma variedade de abordagens que vão desde os programas na prisão m preparação para
a libertação; programas de transição que fornecem habitações de autonomia assisitida para per-
mitir que as pessoas possam ajustar-se à vida no exterior das prisões; programas que oferecem
tanto vigilância e supervisão e apoio ao nível da comunidade; e aqueles que fornecem apoio e
treino na prisão que é sustentado na comunidade a seguir à libertação.

A seguir apresentam-se alguns exemplos destes programas:

•  a Guatemala, a organização não-governamental, o Grupo Ceiba, dirige uma série de


N
programas para manter os jovens afastados dos bandos. Trabalham nas vizinhanças mais
degradas, desenvolvendo boas relações com a comunidade através de fornecerem alter-
nativas ao recrutamento e a violência dos bandos. Usam um modelo de extensão entre
pares para iniciar o contacto com as gentes jovens, e conduzem uma série de programas
que incluem uma universidade de rua, escolas alternativas e centros de educação, creches
para mães jovens, e formação sobre negócios e tecnologia. Actualmente, trabalham em
parceria com o Governo e serviços prisionais nalgumas das prisões principais e ajudam a
preparar os presos para a sua libertação da cadeia.100

•  as Filipinas, desde 1978 que tem estado a vigorar um sistema Voluntário de Assistentes
N
do Regime de Prova. Estes assistentes são recrutados e treinados para trabalhar junto
com os funcionários de reinserção social na supervisão e apoio aos ex-presidiários, e para
ajudar a potenciar as comunidades de modo a que poossam aceitar os ex-ofensores. O
programa desde 2003que tem vindo a ser revitalizado com o apoio do Japão e o Instituto
do Extremo Oriente e a Ásia para a Prevenção do Crime e o Tratamento de Ofensores,
e existem actualmente 10 000 assistentes que trabalham em conjunto com os governos
locais e serviços de reinserção social.101

• No Uganda, os assistentes sociais trabalham com os presidiários antes da sua libertação,
ajudando-os a estabelecer elos e planos para a sua libertação. A isso segue-se o apoio
comunitário dos funcionários de reinserção social e os membros da comunidade. O con-
tacto chegado com líderes e idosos da comunidade constitue um aspecto essencial deste
programa de pós-libertação.102

100 Escritório de Washington para a América Latina, A Ousadia do Desvelo: Respostas com Base Comunitária à
Violência dos Bandos Juvenis na América Central e as Comunidades Imigrantes de América Central nos Estados Unidos
(Washington, D.C., 2008).

101 Masahiro Tauchi, “Projecto de assistência técnica para a revitalização do sistema voluntário de assistentes do re-
gime de prova nas Filipinas”, em Optimização de Eficácia da Ajuda Técnica Providenciada nos Campos de Prevenção à Crimi-
nalidade e Justiça Criminal, Margaret Shaw e Yvon Dandurand, eds., HEUNI Série de Publicações No. 49 (Instituto Europeu
de Prevenção e Controlo da Criminalidade, afiliado com as Nações Unidas, 2006).

102 N. Masamba Sita e outros, Da Prisão para Casa: Reabilitação e Reintegração Sociais Enquanto Fases do Mesmo Pro-
cesso Social (O Caso do Uganda) (Kampala, Instituto Africano para a Prevenção do Crime e o Tratamento de Ofensores, 2005).
CAPÍTULO V  A ABORDAGEM MULTIDISCIPLINAR E O TRABALHO EM PARCERIA 103

Um número de programas de reinserção inclue componentes de justiça restorativa que visam:103

• Repor a ordem e as relações e promover a paz

• Reafirmar os valores comunitários

• Apoiar as vítimas concedendo-lhes voz activa

• Encorajar as partes afectadas, mais especialmente os ofensores, a tomarem responsabili-


dade pelas suas ações

• Identificar o resultado restorativo com perspectivas de futuro

•  vitar a reincidência através de encorajar as mudanças e a reintegração dos ofensores na


E
comunidade

Os programas de justiça restorativa poderão ter lugar antes da sentença, como parte alternativa
ao sentenciamento custodial, na prisão ou na comunidade após a libertação. Incluem a medi-
ação entre as pessoas imediatamente afectadas pelo crime, o ofensor e a vítima; um grupo mais
alargado de pessoas chegadas aos ofensores e as vitimas afectadas pelo crime, que participa em
conferências de família ou grupos comunitários; e círculos de condenação e instauração da paz,
incluindo apoios tanto à vítima como o ofensor, bem como os oficiais do governo, também são
frequentemente utilizados junto das comunidades indígenes.104

Este capítulo analisou a tarefa importante, embora desafiadora, de se estabelecerem e manterem


parcerias de trabalho efectivas, capazes de implementar estratégias de prevenção ao crime. Isto
inclue trabalhar horizontalmente através do governo, e verticalmente com outros ministérios, os
sectores de serviço, níveis de governo e a sociedade civil. O papél desta última, um dos parceiros
mais importantes, é considerado em maior pormenor no capítulo VI.

103 Manual de Programas sobre a Justiça Restorativa (ver nota de rodapé 14).

104 Ibid.
CHAPTER IV

VI. Trabalhar com as


comunidades e a
sociedade civil

O Parágrafo 16 das Diretrizes de Prevenção à Criminalidade reza:

Envolvimento Comunitário
A responsabilidade principal recai sobre os Governos em algumas das áreas que se seg-
uem na lista mais abaixo. Contudo, a activa participação das comunidades e outros seg-
mentos da sociedade civil, constitue uma parte essencial na prevenção efectiva à crimi-
nalidade. As comunidades, em especial, devem desempenhar um importante papél na
identificação de prioridades de prevenção ao crime, na implementação e na avaliação,
bem como em auxiliar na identificação de uma base de recursos sustentável.

A. Melhoramentos resultantes da prevenção à


criminalidade
O termo comunidade pode fazer referência a grupos de pessoas que se conhecem umas às outras
e têm interesses parecidos, ou pode querer especificar uma vizinhança e os seus residentes ou,
alternativamente, um grupo com características e preocupações semelhantes. Muitas das vezes,
é usado para indicar a sociedade civil local e o ambiente para onde os ex-presidiários irão regres-
sar após a saída da cadeia.105

Tal como se salienta nas Diretrizes de Prevenção à Criminalidade, os Governos por si só não
conseguem prevenir ao crime e a vitimização, nem podem desenvolver sociedades seguras sem
a participação e o envolvimento dos cidadãos. Trata-se de um aspecto de boa governação. As
Diretrizes vêm salientar as contribuições que poderão ser efectuadas por cidadãos privados, as
organizações comunitárias, as organizações não-governamentais, o sector privado e a comuni-
dade de negócios. Todos eles são actores da sociedade civil que deveriam ser envolvidos a todas
as etapas de desenvolvimento, planificação e implementação das políticas. Podem oferecer con-
hecimentos e luzes criativas com base nas suas experiências, bem como respostas inovadoras aos

105 Ver Margaret Shaw, “Ação das comunidades para a prevenção à criminalidade”, Documento sobre antecedentes
preparado para o 6º Colóquio Anual sobre a Prevenção ao Crime, do Centro para a Prevenção Internacional do Crime, 14-15
de Setembro de 2006, Canberra (Montreal, Centro para a Prevenção Internacional do Crime, 2006).

105
106 MANUAL DE DIRETRIZES DE PREVENÇÃO À CRIMINALIDADE: APLICAÇÃO PRÁTICA

problemas. A Comissão Económica e Social da Ásia e o Pacífico identificou oito características


principais da boa governação:106

• É participatória

• É orientada no sentido de consenso

• É responsável

• É transparente

• É responsiva

• É efectiva e eficiente

• É equitativa e inclusiva

• Respeita as normas gerais do estado de lei

Nem todas as comunidades ou organizações comunitárias têm tempo ou dinheiro para desem-
penhar um papél activo, todavia, e muitas das mesmas irão tirar partido de programas de capaci-
tação e treino adaptados às suas necessidades. Os Governos terão que estar dispostos a colaborar
com estas como parceiros para que possam tomar parte activa em consultorias, grupos de acon-
selhamento e na tomada de decisões. Os Governos precisam de desenvolver um bom sistema de
comunicação com as comunidades e tornar a informação e os dados disponíveis sobre o crime e
assuntos afins disponíveis às mesmas.

O envolvimento da sociedade civil também é uma componente vital para o desenvolvimento ou


a manutenção de uma cultura de legalidade, um dos princípios básicos das Diretrizes de Pre-
venção à Criminalidade. É provável que surjam oportunidades maiores para alterar as atitudes
e o comportamento, e um sentido mais vasto de propriedade dos programas, se as comunidades
forem incluídas de uma forma participatória. As abordagens sobre a segurança pública por parte
de Bogotá ao longo da década passada têm incluído abordagens criativas que visam mudar as
atitudes em relação ao desgoverno.

B. A mobilização da sociedade civil


Foi desenvolvida e usada uma gama de mecanismos para mobilizar as comunidades. Estes vão
desde a inclusão de representantes da sociedade civil em concelhos consultivos nacionais, estad-
uais ou locais, ou parcerias responsáveis por desenvolver estratégias de segurança; convocar re-
uniões públicas sobre asssuntos de prevenção aos níveis nacional e local; empreender sondagens
junto da opinião pública sobre assuntos específicos; alocar orçamentos municipais para projec-
tos de prevenção a escolher através dum processo de orçamentação participatória; envolvendo-
se directamente no desenvolvimento e a implementação de projectos, ou através de participação

106 Comissão Económica e Social para a Ásia e o Pacífco, “O que é a boa governação?”, disponível em www.unescap.
org/pdd/prs/projectactivities/ongoing/gg/governance.asp.
CAPÍTULO VI  TRABALHAR COM COMUNIDADES E A SOCIEDADE CIVIL 107

directa em actividades de prevenção à criminalidade, tais como os programas de apoio a famílias


e jovens, ou iniciativas locais de mediação.

Campanhas de informação pública podem utilizar o meio tradicional de televisão, a rádio e os


jornais, os jornais comunitários locais e as redes, bem como a Internet, através de anúncios dos
serviços públicos ou vídeos, para avançar informação geral acerca dos problemas da criminali-
dade, informações sobre serviços, ou actualizações dos desenvolvimentos de novas estratégias
e projectos.

Abaixo segue-se um exemplo do uso de diálogos públicos para mobilizarem grupos específicos
e ajudar a informar a orientação das políticas nacionais:

Sob o programa brasileiro “Mulheres: diálogos sobre segurança publica”, uma série de diálogos
públicos teve lugar sobre mulheres e a sua segurança, em quatro regiões do país, antes da primei-
ra Conferência Nacional sobre a Segurança Pública, em Agosto de 2009. O objectivo foi avaliar as
percepções que as mulheres tinham acerca da violência urbana, numa gama de cidades, e desen-
volver algumas propostas construtivas para se apresentar na conferência nacional. As discussões
tiveram lugar em sete grandes cidades. Ao longo de dois dias, grupos de cerca de 30 mulheres
com idades compreendidas entre os 15 e os 69 anos, partilharam experiências e desenvolveram
recomendações. Representavam uma larga gama de antecedentes sociais, educacionais e étnicos,
e incluíam mulheres que tinham sido incarceradas, bem como outros grupos marginalizados.

O Guia de Auditorias de Segurança Local fornece mais informações sobre a mobilização


comunitária.

Mecanismos participatórios

A orçamentação participatória foi especialmente bem-sucedida na América Latina como


mecanismo para encorajar a participação cívica na planificação municipal e a tomada de de-
cisões. Atribuindo uma parcela de orçamento municipal a projectos escolhidos pelos residentes,
tem-lhes permitido contribuir para as mudanças e decisões na sua vizinhança local. Entre out-
ras, a cidade de Diadema tem vindo a usar este método de uma forma eficaz para envolver
os residentes locais (cer capítulo IV). Este método também foi usado para permitir aos jovens
elegerem representantes para cada distrito ou freguesia, e decidir como é que os fundos munici-
pais deveriam ser utilizados.107

Auditorias participatórias

O uso de averiguações participatórias ou auditorias por parte de grupos e organizações da co-


munidade local, é outro instrumento que ajuda a potenciar as comunidades e encoraja o seu
envolvimento com as autoridades locais. As auditorias de segurança de mulheres, por exemplo,
foram usadas pelas organizações de mulheres, em particular, para efectuar mudanças nas vizin-
hanças locais ou nos locais públicos. Na América Latina, em cidades como Rosário, na Argen-

107 Programa das Nações Unidas para os Assentamentos Humanos, Juventude, Crianças e a Governação Urbana, Série
Diálogo sobre Política, No. 2 (Nairobi, 2004); Yves Cabannes, “As crianças e os jovens constroem a democracia participatória
nas cidades da América Latina”, Ambiente e Urbanização, vol. 18, No. 1 (2006), pp. 195-218.
108 MANUAL DE DIRETRIZES DE PREVENÇÃO À CRIMINALIDADE: APLICAÇÃO PRÁTICA

tina, Bogotá, e Santiago, auditorias participatórias sobre a segurança de mulheres têm vindo a
ser empregues por residentes femininas locais para desenvolver recomendações às autoridades
locais no sentido de se efectuarem melhorias às áreas onde as mulheres possam sentir-se inse-
guras. Isto resultou no melhoramento de iluminação, na montagem de lugares de recreio para as
crianças e a modernização de espaços públicos que antes as mulheres tinham receio de usar.108
As auditorias sobre a segurança de mulheres têm sido usadas pelo UN-Habitat na implemen-
tação dos Programas de Cidades Mais Seguras em África e noutras regiões. Na Índia, por ex-
emplo, as organizações de mulheres usaram os resultados das suas auditorias sobre a segurança
para trabalhar com as autoridades locais em Mumbai e Delhi, para efectuar mudanças aos locais
dos transportes públicos, no treino de condutores de autocarro e táxis, e ajudar a sensibilizar em
questões de violência contras mulheres.109 Abordagens semelhantes foram usadas por grupos de
crianças e jovens.

Estes são os exemplos de uma ação desenvolvida pelas bases por organizações não-governa-
mentais. Os governos também podem facilitar o trabalho de grupos tais como estes, conforme
discutido na seção a seguir.

C. A contribuição de organizações não-governamentais


Por um certo número de razões, as organizações não-governamentais constituem um recurso
principal para os governos nacional ou local no desenvolvimento de estratégias de prevenção.
Muitas das vezes são peritos especializados numa determinada área (tal como a ética policial, as
crianças da rua ou os serviços de reabilitação); trabalham de perto como os cidadãos nas suas
próprias áreas como promulgadores e provedores de serviços (tais como os abrigos de mulheres
ou serviços de aconselhamento legal); e há tendência por parte das comunidades locais de con-
fiar neles devido à sua situação não-governamental.

As organizações não-governamentais são muitas das vezes de ordem flexível e evolutivas, e têm
a capacidade de lançar novos programas e projectos piloto com relative facilidade juntamente
com o Governo, desde que haja a disponibilidade de recursos. Também podem ajudar os Gov-
ernos a contruir a fundação para novas políticas. Normalmente, têm contacto com uma série
de grupos, incluindo os membros chave da comunidade, as vítimas e os profissionais, oficiais e
pessoal da imprensa que trabalha sobre determinados aspectos.

As organizações não-governmentais e outros sectores da sociedade civil podem contribuir nas


diferentes fases do desenvolvimento de estratégias, por exemplo:

• Através de partilharem e criarem conhecimentos, e oferecerem aconselhamentos peritos


ao Governo ou a polícia na definição e análise dos problemas da criminalidade, mais
especialmente em termos das populações vulneráveis ou sobre determinados assuntos

• Através de assistir com o desenho e a implementação dos projectos

108 Ana Falú e Olga Segovia, eds., Ciudades para convivir: sin violencias hacia las mujeres (Santiago, Ediciones
SUR, 2007).

109 Mulheres das Cidades Internacional, Auditorias de Segurança de Mulheres: O Que Funciona e Onde? (Nairobi,
Programa das Nações Unidas para os Assentamentos Humanos, Programa de Cidades Mais Seguras, 2008).
CAPÍTULO VI  TRABALHAR COM COMUNIDADES E A SOCIEDADE CIVIL 109

•  través de identificar os interessados chave numa comunidade ou cidade e desempenhar


A
um papél de destaque na edificação de coligações e a colaboração através de todas as co-
munidades, o que pode levar à cooperação multiagencial

• Através da ajuda para desenvolver, identificar e disseminar boas práticas

• Através de se desenvolver a educação pública: organizar fóruns públicos de conscienti-


zação, ou mobilizar as populações locais sobre determinados assuntos, tais como as leis
que governam as armas de fogo ou o desenvolvimento urbano

•  través da formação e a capacitação, por exemplo, desenvolver ou conduzir programas


A
de formação para o pessoas local das cidades ou a polícia municipal; a liderança da ci-
dadania, a liderança da juventude e o treinamento e o desenvolvimento de aptidões;
apoio às famílias

•  través de ajudar a desenvolver as auditorias dos cidadãos, ferramentas e programas de


A
avaliação, indicadores do crime e uma avaliação externa dos programas

• Através de fornecer ferramentas para a monitoria e a avaliação por parte da polícia

• Através da formação e a colaboração no trabalho junto dos meios de imprensa, divul-


gando as histórias de sucesso

•  través de promover a resolução de conflitos e os mecanismos de mediação, e actuar


A
como mediadores ao nível dos conflitos intercomunitários (uma função que, muitas das
vezes, o Governo não pode desempenhar).

Um número crescente de organizações não-governamentais utiliza abordagens inovadoras


para encetar o seu envolvimento com os parceiros sobre a proteção pública e os assuntos de
segurança. Estas incluem organizações tais como Viva Rio, Sou da Paz e o Fórum Brasileiro
de Proteção Pública , Jagori em Índia, CLEEN na Nigéria, e Raising Voices em Uganda, todos
os quais trabalham em parceria com os governos nacional, estadual e municipal, as universi-
dades, a polícia e a sociedade civil. Mais detalhes sobre duas destas organizações são forneci-
dos abaixo:

•  Fórum Brasileiro para a Proteção Pública é uma organização não-governamental que


O
trabalha com todos os estratos de governo. Foi fundado em 2006 inicialmente de modo
a criar um diálogo entre a polícia e a sociedade civil sobre asssuntos de segurança e pro-
teção. Serve como anfitrião de uma conferência anual, que se tornou um local de reunião
para os decisores sobre a política, a polícia, os praticantes profissionais e as organizações
não-governamentais para trocar opiniões e falar sobre desenvolvimentos e boas práticas.
Publica informações sobre a estatística anual sobre a violência nas cidades do Brasil e
organiza seminários de trabalho para reunir os municípios e trocar ideias sobre a preven-
ção (www.forumseguranca.org.br).

•  LEEN é uma organização não-governmental com a sua sede em Lagos, Nigéria, que
C
promove a segurança pública, a proteção e a justiça acessível, em parceria conjunta com
o governo e a sociedade civil. Foi estabelecida em 1998 e age como um centro de recur-
110 MANUAL DE DIRETRIZES DE PREVENÇÃO À CRIMINALIDADE: APLICAÇÃO PRÁTICA

sos, empreendendo projectos de investigação e demonstração, organizando seminários e


trocas e publicando relatórios sobre temas relevantes tais como as boas práticas e a pre-
venção ao crime juvenil, o policiamento e a ética e procedimentos da polícia, a cidadania,
a responsabilização e a governância (www.cleen.org).

Exemplos de organizações da sociedade civil que trabalham com os Governos no desenvolvi-


mento de programas para a juventude em risco, e/ou na entrega de programas de reintegração,
incluem a Coligação de América Central para a Prevenção da Violência Juvenil (CCPVJ) e o
Instituto Nacional para a Prevenção à Criminalidade e o Programa de Reintegração e Khulisa na
África do Sul. Seguem-se mais pormenores abaixo:

•  Coligação de América Central para a Prevenção da Violência Juvenil (CCPVJ) reune


A
cerca de 16 organizações não-governamentais. Estas produziram uma coleção de mel-
hores práticas sobre prevenção e reabilitação para os jovens envolvidos em violência na
região.

• Em El Salvador, foi desenvolvida uma série de projectos para a prevenção da adesão a
bandos juvenis violentos, em parceria conjunta com a sociedade civil, pelo Concelho
Nacional de Segurança Pública. Estes incluíram uma escola agrícola de reabilitação para
pessoas de idade compreendida de 12 a 25 anos, um projecto de remoção de tatuagens e
programas de reabilitação na prisão.

• O NICRO é uma organização não-governamental sul-africana a fornecer serviços de


diversão para crianças, em todas as províncias, através de cinco programas: o programa
de aptidões para a vida chamado Esquema de Potenciação de Jovens; um programa
Comunitário de Serviços de Pré-Julgamento; um programa de mediação vítima-ofen-
sor; conferenciações com os agregados familiares; e o programa de aptidões para a
vida chamado “a viagem”, para as crianças em situação de risco muito elevado. A or-
ganização foi muito bem-sucedida na reintegração de crianças, prevenindo à ofensa e
divertindo casos do sistema judiciário. Lida com mais de 10 000 casos todos os anos
(www.nicro.org.za).

• Khulisa trabalha ao nível das instituições penais e os programas de diversão, bem como
ao nível das escolas, com as vítimas e a comunidade. Conduz uma série de iniciativas tais
como o Programa de Reintegração de Jovens Ofensores, e o Programa Make It Better
(Torná-lo Melhor) (www.khulisaservices.co.za).

Uma revisão das características dos projectos efectivos relacionados com a violência dos bandos
juvenis na América Central e os Estados Unidos, salienta a importância haverem abordagens
que fossem, ao mesmo tempo, abrangentes e equilibradas, com base na comunidade e incluindo
a prevenção, a intervenção, a reabilitação e a implementação da lei. Os projectos efectivos en-
volvem a cooperação com as escolas, as organizações locais, os grupos com base na fé e as redes
comunitárias.110

110 Escritório de Washington para a América Latina, A Ousadia do Desvelo: Respostas com Base Comunitária (ver nota
de rodapé 100).
CAPÍTULO VI  TRABALHAR COM COMUNIDADES E A SOCIEDADE CIVIL 111

D. O envolvimento do sector privado


O sector privado é uma componente importante da maioria das sociedades, sendo que é tanto
uma parte interessada quanto os demais sectores da sociedade civil, incluindo as organizações
locais sem fins lucrativos. Os negócios, as fábricas e as localidades comerciais podem ser afecta-
dos de um modo significativo pelos níveis de criminalidade elevados e a violência, nas vizinhan-
ças e as cidades, de modo que está nos seus próprios interesses trabalhar no sentido de reduzir a
criminalidade. Por sua vez, o sector privado ajuda em questões de emprego, e contribue para o
progresso social e económico das comunidades locais. (Ver o sítio web do Colégio da Universi-
dade de Londres Instituto Jill Dando de Ciências de Criminologia, www.jdi.ucl.ac.uk.)

As iniciativas de prevenção podem ser projectadas de forma a reduzir os problemas da criminal-


idade associados às áreas de negócio, comerciais e industriais. Muitos dos Governos nacionais
e as cidades estão a trabalhar em colaboração cada vez mais próxima com o sector de negócios
para melhorar a segurança dessas áreas. Todavia, o importante é garantir que iniciativas deste
tipo não irão perpetuar as práticas de exclusão, tal como foi discutido no capítulo V.

O sector privado pode contribuir de uma forma substancial para a segurança pública e a política
sobre a proteção da comunidade, de uma forma positiva, como por exemplo:

• Através de contribuir para os programas sociais locais que lidam com factores causais

• Através de ajudar a reduzir as oportunidades e os incentivos para cometer actos crimino-


sos, alavancando as alterações situacionais e ambientais, incluindo o desenho de produ-
tos para reduzir as oportunidades de roubo

• Através de contribuir para a revitalização das áreas e os espaços públicos ou semi-


públicos

• Através do envolvimento em projectos de renovação urbana

•  través de ajudar a evitar ofensas e reincidências, usando programas tais como o aprendi-
A
zado e a formação, e providenciando oportunidades de emprego.111

Envolver o sector privado em estratégias de prevenção à criminalidade, por isso, é um meio vali-
oso de ajuda na montagem de programas eficazes, trazendo recursos adicionais, sensibilizando
o público para os problemas, envolvendo-os no desenvolvimento de um sentido partilhado de
edificação da comunidade e dedicação para com a mesma.

Um número de governos nacional e local criou mecanismos para assegurar a participação do


sector privado na prevenção à criminalidade. Entre estes, estavam incluídos comités específicos
para a promoção do envolvimento e as parcerias juntamente com o sector privado sobre inicia-
tivas locais:

•  o Canadá, a Rede de Negócios sobre a Prevenção à Criminalidade, constituída de rep-


N
resentantes das associações de negócio do Canadá, foi criada em 1999, para desenvolver

111 Capobianco, Afiar a Lente (ver nota de rodapé 96).


112 MANUAL DE DIRETRIZES DE PREVENÇÃO À CRIMINALIDADE: APLICAÇÃO PRÁTICA

parcerias entre as companhias (ao nível local, nacional e internacional), em apoio das
medidas de prevenção social à criminalidade.

•  a Holanda, a Plataforma Nacional para o Controlo da Criminalidade, composta por


N
representantes dos ministérios relevantes, a polícia, as autoridades locais, as companhias
de seguro, os bancos, o comércio retalhista, e as organizações de empregados e emprega-
dores, foi montada em 1992 para combater os problemas do crime afectando o sector de
negócios.

•  a Nigéria, o governo do Estado de Lagos estabeleceu o Fundo Fiduciário de Segurança


N
do Estado de Lagos, por legislação, em Setembro de 2007. Trata-se de uma parceria públi-
co-privada cujo papél é assistir com assuntos de segurança ao nível do Estado, através de
fomentar parcerias efectivas para a prevenção e o controlo da criminalidade, buscando fi-
nanciamento, e ajudando a polícia no treinamento e a mobilização de recursos. A mesma
providencia as informações actualizadas sobre a segurança e os desenvolvimentos para a
prevenção da criminalidade, através do seu sítio web, tendo empreendido uma pesquisa
sobre a vitimização do Estado de Lagos, em colaboração com a organização não-gover-
namental, CLEEN.

•  a África do Sul, o Negócios Contra o Crime foi estabelecido em 1996, a seguir a um


N
pedido do Governo para que o sector de negócios pudesse desempenhar um papél de
liderança no combate ao crime no país.

•  Escócia, Reino Unido, o Centro Escocês de Negócios Contra o Crime, foi criado em
Na
1996 ao abrigo da Estratégia de Redução do Crime nos Negócios da Escócia, e para provi-
denciar aconselhamentos práticos aos sectores de negócio e comercial sobre a forma de
desenvolver as estratégias de redução e prevenção ao crime nos negócios.

Entre os exemplos das iniciativas do sector governo-privada para reduzir tipos específicos de
crime, estão incluídos:

•  a Austrália, o Concelho Nacional de Redução ao Furto de Automóveis, é uma socie-


N
dade independente, constituída sem fins lucrativos, e uma iniciativa conjunta entre os
governos australianos e a indústria seguradora. O Concelho iniciou as suas actividades
em 1999 inicialmente por um termo de cinco anos, que foi subsequentemente estendido.
O Concelho procura baixar a taxa elevada de furto de automóveis na Austrália através
de reduzir o número de automóveis roubados para fins do crime organizado e furtos
oportunísticos. As estratégias de redução dos roubos de veículos incluem aumentar o
fluxo nacional de informações de registos, desviar os jovens ofensores das actividades de
furto de automóveis, e fechar as lacunas exploradas por ladrões profissionais. O sítio web
do Concelho contém informações valiosas sobre a prevenção do furto de automóveis e
publicações sobre como reduzir os riscos de furto dos automóveis.

Alguns exemplos de parcerias para a prevenção ao crime social envolvendo o sector privado,
incluem a habitação social, a prevenção de adesão aos bandos juvenis e projectos de combate à
violência nas escolas:
CAPÍTULO VI  TRABALHAR COM COMUNIDADES E A SOCIEDADE CIVIL 113

•  Associação de Revitalização San Romanoway, com a sua sede em Toronto no Canadá,


A
trabalha com os três níveis de governo para combater algumas causas sociais da crimi-
nalidade na área de habitação local. A comunidade de San Romanoway tem uma forte
camada de jovens, uma taxa limitada de emprego e de oportunidades recreativas para
os jovens e uma população imigrante grande. O Programa de Enriquecimento Cultural
e Social recebeu financiamento na ordem de Can$ 300,000 ao longo de três anos, do
Programa de Ação dos Negócios, da Estratégia Nacional de Prevenção ao Crime. O pro-
grama incluíu mudanças ao desenho ambiental, tais como a iluminação e o paisagismo,
e programas pós-lectivos e outros sociais. O sector privado constituiu o elemento central
do projecto, assistindo ao desenvolvimento de uma rede forte de apoio e em salientar
os desenvolvimentos positivos da comunidade. Ajudou a construir um parque infantil
(Posto Caseiro), melhorar o espaço de escritórios da Associação de Revitalização San
Romanoway, e a providenciar oportunidades de emprego para alunos que abandonaram
a escola ou que já antes se tinham encontrado em sarilhos com o sistema de justiça crimi-
nal. Um dos parceiros do sector privado ofereceu Can$ 75,000 para empregar e formar
jovens na indústria da construção. Houve a doação de computadores e o acesso à Internet
para um centro de informática, por parte de uma série de companhias do sector privado,
que também completou uma corte de ténis e providenciou instrução de ténis durante os
meses do Verão. A avaliação do programa no final de três anos revelava que tinha havido
uma redução drástica da violência e crimes contra propriedades na área, acompanhado
de um aumento no sentido de segurança entre os residentes.112

• Na África do Sul, os Negócios Contra o Crime geriram Tissa Thuto, um programa de pre-
venção à criminalidade com base escolar, envolvendo alunos, pais e comunidades. Reune
a perícia de uma série de parceiros, incluindo a polícia e os fóruns policiais, a educação,
e as organizações especializadas em desporto, mediação e a resolução dos conflitos, o
aconselhamento de pares, e assuntos de trauma e abuso e vítimas. Cada um dos parceiros
providencia o seu próprio treino de aptidões, recursos e módulos. O Centro de Estudo da
Violência e Reconciliação, por exemplo, efectua uma formação junto de pais, professores
e directores de escola, sobre a gestão do trauma, fornece o aconselhamento de pares e
ajuda a desenvolver equipes de segurança escolar. A estrutura do projecto abrange a reso-
lução de conflitos, a gestão do trauma, os comités de segurança escolar, o VIH/SIDA, a
sexualidade, a liderança, a afectação de recursos, a gestão, potenciar os professores e pro-
gramas de tutela. Alguns dos resultados do programa incluem relações melhoradas pais-
professores-alunos, mais apoio para os professores uma reação acelerada às necessidades
das crianças. Tissa Thuto tem sido implementado em 500 escolas em três províncias.

Este capítulo faz a análise de modos ricos e variados em que a sociedade civil pode trabalhar
com os governos e outros parceiros para promover sociedades mais seguras. Muitas das organi-
zações locais trazem consigo conhecimentos especializados sobre problemas locais, a conscien-
tização de preocupações das suas comunidades locais, e a confiança dos seus residentes. Isto tem
vindo a ajudar a aumentar a capacidade e a vontade dos membros da comunidade de tomarem
em mãos projectos em parceria conjunta com os Governos. À semelhança, as organizações do
sector privado começaram a agir como membros de uma comunidade local, contribuindo acti-
vamente para as iniciativas locais.

112 Laura Capobianco, Coleção de Práticas: Ação Público-Privada-Comunidade em Relação à Segurança—Enfoque sobre
a Habitação em Vizinhanças Desfavoracidas (Montreal, Centro de Prevenção Internacional do Crime, 2006).
CHAPTER IV

VII. Conclusão

O objectivo deste Manual é fornecer um relato preciso acerca de assuntos principais ou chave
conforme delineados nas Diretrizes para Cooperação e Assistência Técnica no Campo da Pre-
venção à Criminalidade Urbana e as Diretrizes de Prevenção à Criminalidade, a respeito do de-
senvolvimento e a implementação de uma política abrangente que visa prevenir à criminalidade
e promover a segurança comunitária. Os dois conjuntos de Diretrizes salientam a importância
da liderança do Governo e a contribuição de todos os sectores da sociedade. Representam uma
abordagem multissectorial, trabalhando verticalmente entre os diversos ministérios e horizon-
talmente entre os governos e a sociedade civil.

As Diretrizes reflectem o reconhecimento geral que a responsabilidade pela segurança e a pro-


teção é partilhada, e que as abordagens de combate ao crime terão que ser progressistas e pro-
activas, não sómente dissuadoras, e não reactivas. As Diretrizes reconhecem que o sistema de
justiça criminal, tanto o formal e o informal, não é suficiente para prevenir à criminalidade, e
que tanto os sistemas formais e informais são importantes para a criação de sociedades seguras
e equitativas.

As Diretrizes também ajudam a edificar sobre uma riqueza grande de conhecimentos e com-
preensão sobre a forma como as sociedades podem trabalhar juntas de uma forma mais eficaz
no sentido de prevenir à criminalidade, e um entendimento do valor de se desenvolverem políti-
cas e programas edificados numa base sólida de informação e avaliação cuidadosa.

O Manualpresente focaliza os aspectos do processo de desenvolvimento dos planos e iniciati-


vas de prevenção estratégicas, em vez de se concentrar sobre os tipos de programas passíveis
de implementação. Alguns exemplos que foram incluídos para ilustrar as formas em que os
países diferentes abordam um problema, mas existem ainda muitos outros exemplos. Após 20
anos ou mais de projectos e experiências, surgiram numerosos exemplos de políticas e práti-
cas efectivas que podem providenciar informação e lições. Os temas cobridos pelos programas
e projectos variam largamente e incluem: a prevenção da violência juvenil; a reinserção de
crianças e adultos nas comunidades; a prevenção de violência contra mulheres e a promoção
da segurança de mulheres nos espaços públicos e em casa; a prevenção aos roubos residenciais
e o furto e roubo comercial; o desenho de habitações seguras e espaços públicos; e a prevenção
do tráfico de pessoas.

115
116 MANUAL DE DIRETRIZES DE PREVENÇÃO À CRIMINALIDADE: APLICAÇÃO PRÁTICA

Países de rendimento alto, médio e baixo têm histórias, circunstâncias e capacidades extrema-
mente diferentes. É essencial haver um plano estratégico sobre a prevenção à criminalidade que
consiga responder ao contexto específico nacional e local. Qualquer plano terá que reflectir as
preocupações dos cidadãos e edificar sobre as capacidades e os recursos disponíveis.

As abordagens à prevenção vão desde se acometerem as raízes sociais e económicas do crime


e a violência, até ao fortalecimento da capacitação das comunidades locais no sentido de se
modificar o seu ambiente, com o objectivo de dissuadir os ofensores ou promover o aumento do
sentido de segurança. Não existe uma abordagem única que possa ser considerada optimal. Em
vez disso, uma estratégia cuidada deveria ser equilibrada, utilizando uma gama de abordagens
que possam responder a problemas específicos sobre a criminalidade e a vitimização, tanto a
curto e a mais longo prazo. Tal estratégia iria responder às necessidades de todos os sectores da
sociedade, de uma forma que não provocasse o aumento da exclusão social ou económica de
grupos específicos e iria promover o respeito pelo estado de direito.
Vienna International Centre, PO Box 500, 1400 Vienna, Austria
Tel: (+43-1) 26060-0, Fax: (+43-1) 26060-5866, www.unodc.org

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