Assessor Ou Jornalista
Assessor Ou Jornalista
Assessor Ou Jornalista
DOI:10.34117/bjdv6n7-032
RESUMO
O presente trabalho pretende compreender a função do assessor de comunicação, que envolve a
definição do conceito, a criação da escola e o papel do profissional; as questões éticas que envolvem
o jornalista e função social; e pontos e contrapontos sobre a rotina produtiva do assessor de
comunicação, em relação, principalmente, aos procedimentos éticos. Para, assim, questionar se o
profissional graduado em Jornalismo, enquanto assessor de comunicação, ainda pode ser considerado
jornalista ou se os princípios morais e éticos se divergem nos distintos exercícios.
ABSTRACT
The present work intends to understand the role of the communication advisor, which involves the
definition of the concept, the creation of the school and the role of the professional; ethical issues
involving the journalist and social function; and points and counterpoints about the productive routine
1 INTRODUÇÃO
O aumento das assessorias de comunicação tem atraído diversos novos profissionais das mais
diversas áreas de comunicação social para empresas e instituições, entre eles, jornalistas (FENAJ,
2007b). A partir do cenário contemporâneo das organizações públicas e privadas, entende-se a
existência de um “novo perfil do profissional de comunicação” (SCHAUN; RIZZO, 2007).
No começo da história da assessoria, os jornalistas que saiam das redações ocupavam apenas
a área de assessoria de imprensa nas empresas, enquanto os profissionais de relações públicas eram
responsáveis pelas funções na área de comunicação empresarial (SCHAUN; RIZZO, 2007). De
acordo com Schaun e Rizzo (2007), os jornalistas que trabalhavam nas redações levavam suas
experiências de analistas políticos e sociais para aliarem-se aos profissionais de relações públicas e
de publicidade e propaganda, otimizando a comunicação da instituição. Entende-se as assessorias de
comunicação como espaços ocupados por diferentes profissionais da comunicação social, como os
de relações públicas, publicitários, jornalistas etc. Entretanto, a presente pesquisa investiga
especificamente o profissional formado em Jornalismo neste contexto.
Diante desse cenário, é coerente questionar se esse profissional, ao atuar como assessor de
comunicação, ainda pode ser considerado jornalista. Pretende-se questionar e pesquisar se esse
profissional - relativamente novo - ainda faz, de fato, Jornalismo. Também se faz necessário
compreender se o assessor, como profissional, se enquadra como um jornalista ou se ambas profissões
se divergem a ponto de o assessor de comunicação não ser mais considerado jornalista. Por meio de
pesquisas bibliográficas e documentais, o presente trabalho busca refletir sobre essa problematização,
por uma perspectiva analítica, à luz da ética de ambos profissionais do campo da comunicação.
No século IV a.C., os primeiros filósofos gregos já diziam que a ética é a “morada do homem”
(PEQUENO, 2016). Nesse sentido, Pequeno (2016) explica que, para tais pensadores, “nenhuma
comunidade humana pode sobreviver sem o mínimo de regras ou padrões de comportamentos, ou
seja, sem um código de condutas” (p. 42). Dessa forma, as ações de cada indivíduo perante o mundo
e o próximo são orientadas por uma espécie de “código normativo”. “A ética, com efeito, trata do
comportamento do homem, da relação entre a sua vontade e a obrigação de seguir uma norma, do
bem e do mal, do que é justo e injusto, da liberdade e da necessidade de respeitar o próximo”
(PEQUENO, 2016, p. 42).
2 O ASSESSOR DE COMUNICAÇÃO
O assessor de imprensa é o profissional que, entre suas várias funções com a empresa,
organização ou cliente que trabalha, deve funcionar como mediador entre a possível fonte (o cliente)
e os jornalistas que se encontram dentro dos jornais (CHINEM, 2003). Ou seja, o assessor é um dos
profissionais mais próximos do repórter e que deve ter contato direto com as redações e os grupos de
comunicação.
Entretanto, quando trabalhamos com o conceito de assessor de comunicação, o papel do
profissional vai além da mediação com a imprensa e se relaciona com a ideia de otimizar a imagem
do cliente, independentemente de sua natureza, tanto para o público interno quanto para o externo
(ALMANSA, 2017). Neste modelo, as empresas de assessoria adotam maiores estruturas de sistemas
integrados, o que inclui a ampliação das atividades comunicacionais e a visão do assessor como um
administrador das informações que sejam de interesses de todos os públicos da organização
empregadora.
A origem da assessoria de comunicação, como observado por Chaparro (2018), não é nova.
A sua criação se remota a 1906, quando o jornalista americano Ivy Lee aceitou o trabalho de defender
o empresário John Rockfeller frente à mídia. Rockefeller era “o homem mais impopular dos Estados
Unidos” por suas atitudes impiedosas e por incitar um “capitalismo selvagem”, que destruiu médias
e pequenas empresas. Um exemplo, e talvez o estopim da entrada da assessoria de imprensa, foi o
episódio conhecido como “greve sangrenta da ‘Colorado Fuel and Iron Co.”, em que grevistas de
empresa de foram mortos a tiros. Lee partiu do princípio que as barreiras entre o público e a família
Rockefeller deveriam ser derrubadas, então “criou fatos noticiáveis, e com eles formou valores sobre
os quais esculpiu, na opinião pública, a nova imagem de seu cliente” (CHAPARRO, 2018, p. 37).
Tal começo conflituoso não foi exatamente bem recebido, pois, logo após o movimento,
surgiram ofertas de “empregos” à jornalistas para que não atacassem tais empresas nos jornais. Tais
ofertas beneficiaram o crescimento de empresas de relações públicas nos Estados Unidos, grande
parte delas “convertidas” e voltadas para lucrar a partir da manipulação da imprensa. Entretanto,
apesar de tais controvérsias, ainda é importante reconhecer a importância de Ivy Lee como
personagem principal na criação da escola. Sobre a criação da assessoria, entende-se que a crise de
1929 foi, de certa forma, essencial para o crescimento da escola. Com a crise financeira, milhões de
O assessor pode ir mais além dentro da organização e realizar apoio em outras áreas, como
marketing, publicidade, relações públicas, eventos etc. Deve avaliar resultados, criar press kits, enviar
mailings, sugerir pautas, organizar planos para eventuais crises de imagem, entre outras diversas
funções em aberto para o profissional (DUARTE, 2018). Assim, entende-se que o assessor de
comunicação utiliza de técnicas jornalísticas - pauta, critérios de noticiabilidade, lide - para grande
parte de seus ofícios.
3 ÉTICA DO JORNALISMO
Segundo Traquina (2005), a ideologia jornalística e a própria sociedade constroem e definem
o ethos jornalístico, que se fundamenta na premissa de informar os cidadãos e proteger a sociedade
dos abusos de poder. Além disso, o jornalista deve encarar as notícias como resultado de um processo
de interação social, seguindo valores como: compromisso com o interesse público e o bem comum;
papel de árbitro das disputas (mediação); credibilidade; objetividade; independência; e verdade
(TRAQUINA, 2005).
Traquina (2005) compreende o Jornalismo como um “Quarto Poder”. Diante disso, o
Jornalismo exerce poder e influência sobre a sociedade para além dos três poderes dos regimes
democráticos (Legislativo, Executivo e Judiciário), sobretudo, defendendo o status quo e realizando
a função de contra-poder periodicamente, fiscalizando e denunciando abusos desses três poderes.
Nesse sentido, para Rossi (1985), o Jornalismo “é uma fascinante batalha pela conquista das mentes
Este não é um serviço de imprensa secreto. Todo nosso trabalho é feito às claras.
Pretendemos fazer a divulgação de notícia. Isto não é agenciamento de anúncios. Se
acharem que o nosso assunto ficaria melhor na seção comercial, não o usem. Nossa
informação é exata. Maiores pormenores sobre qualquer questão serão dados
prontamente e qualquer redator interessado será auxiliado, com o máximo prazer, na
verificação direta de qualquer declaração de fato. Em resumo, nosso plano é divulgar,
prontamente, para o bem das empresas e das instituições públicas, com absoluta
franqueza, à 3 imprensa e ao público dos Estados Unidos, informações relativas a
assuntos de valor e de interesse para o público (CHAPARRO, 2018, p. 5).
Esse questionamento não se faz somente dentro do Brasil. Em Portugal, um jornalista pode
ter a carteira da profissão confiscada pelo sindicato caso esteja exercendo profissionalmente a
assessoria de comunicação (PECIN, 2010). A indagação também é influenciada quando é analisada
a história. Durante a ditadura militar de 1964 no Brasil, com o AI-5, os assessores de comunicação
vinculados a órgãos públicos eram vistos como “incompetentes, bloqueadores do fluxo de
comunicação, criadores de cortinas de fumaça, porta-vozes do autoritarismo, de fazerem jornalismo
chapa-branca” (DUARTE, 2003, p. 84).
Na atualidade, da mesma forma que o jornalista, o assessor produz conteúdos com técnicas e
metodologias de âmbito jornalístico. Entretanto, como profissional de instituição ou personalidade, o
assessor pode mudar os princípios e divergir-se dos adotados pelo jornalista (MARCOS, MIOLA &
SIEBRA, 2014). Ou seja, por trabalhar para uma empresa, entende-se que o assessor pode não mais
pensar no interesse público, no que se enquadra no papel do jornalista e na ética do jornalismo, mas
sim trabalhar em função do seu cliente, seja ele empresa ou pessoa física. E mais, o assessor de
por sua ação de mediador, o assessor pode não apenas aumentar a presença das fontes
na imprensa, mas também democratizar o acesso da sociedade à informação de
interesse público, iluminar o contexto em que a organização está inserida para os
dirigentes e estimular o envolvimento dos empregados com as questões que lhes
afetam (DUARTE, 2018, p. 232).
Além disso, para Schaun e Rizzo (2007), o novo perfil do profissional da comunicação deve
pautar-se por uma política de comunicação global, pensando a comunicação como um todo e sendo
guiado por um princípio ideal, eticamente justo, que é o da comunicação integrada. Esse profissional
deve ter as seguintes características: informação (papel de esclarecimento); transparência nas ações;
formação cultural de diversidade, amplitude e internacionalização; análise, reflexão e crítica para
decisões; visão de mercado e concorrência; capacidade de trabalhar em equipe; pesquisa, método e
planejamento; linguagem e expressão; resolução colaborativa de problemas e inteligência emocional;
desenvolver talentos; avaliar processos e projetos; criar redes de relacionamentos e produzir
transformações e cadeias de sustentabilidade; e proximidade ética (SCHAUN; RIZZO, 2007).
Mafei (2005) defende que, apesar de alguns interesses se divergirem entre os jornalistas em
redações e os assessores de comunicação, ainda há objetivos em comum. O principal é que o trabalho
da assessoria é “intensificar o fluxo das informações entre os meios de comunicação e a sociedade”
(MAFEI, 2005, p. 28). Nesse sentido, quando o assessor facilitar o trabalho do repórter ou do editor
Um bom assessor de imprensa é aquele que reconhece os limites éticos de sua atuação
e não os ultrapassa. Não mente, não engana, não ameaça, não oferece vantagens a
jornalistas em troca de inserção de reportagem positiva sobre seu cliente. Seu
compromisso principal é sempre o de auxiliar o assessorado no contato com a
imprensa, em busca da notícia correta (MAFEI, 2005, p. 25).
[...] tantas mudanças, empresas públicas e privadas não podem mais permanecer na
penumbra, sem prestar contas de seus atos aos cidadãos brasileiros. E é nesse contexto
que o jornalista que atua em assessoria de imprensa passa a exercer um papel
essencial, pois é ele o profissional capacitado a preencher as lacunas entre os poderes
públicos, a iniciativa privada e o terceiro setor com os meios de comunicação e,
conseqüentemente com a própria sociedade (FENAJ, 2007b, p.5)
O Código de Ética dos Jornalistas Brasileiros (FENAJ, 2007a) também propõe regras de
conduta voltadas para as assessorias de imprensa. No documento, é dito que a apuração deve ser feita
antes da divulgação de qualquer fato: o assessor deve sempre ouvir o maior número de pessoas e
instituições envolvidas em uma cobertura, principalmente as que são objeto de acusações para, assim,
trabalhar a equidade e promover uma discussão justa.
Dessa forma, entende-se que os profissionais graduados em Jornalismo, enquanto assessores
de comunicação, têm o objetivo profissional de garantir a informação da forma mais correta possível,
bem como funcionar de certa forma como um “pauteiro” - pois, por meio dos “releases”, envia
sugestão de pautas e faz parte do processo da construção da notícia. O assessor entrevista seus
empregadores - o que resulta em muitas “aspas” das notícias, apura certas questões e esclarece
informações que somente ele tem acesso e as repassa ao jornalista em redação. O assessor tem a ideia
dos critérios de noticiabilidade jornalísticos, do interesse público e da construção de uma notícia, bem
como de suas características, que envolvem o lide, a pirâmide invertida etc.
A informação é um bem público, bem social. Para isso, deve-se cumprir a regra básica
de reafirmação de um jornalismo responsável, com ética. O jornalista de assessoria
não pode fugir a esta regra básica de sua profissão. Os jornalistas que trabalham em
assessoria de comunicação não podem, nem devem, se deixar usar por
assessorados/administradores antiéticos que tentam ocupar os espaços nos veículos de
comunicação com intenções que não sejam divulgar, adequadamente, um produto ou
um serviço (FENAJ, 2007b, p. 21).
Nesse sentido, ressalta-se a importância da ética jornalística como fator determinante para que
o jornalista-assessor ainda possa ser denominado, pela sua atuação, jornalista, seja ele de imprensa
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