STJ - Info 801 - Lido
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781-40
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Informativo comentado:
Informativo 801-STJ
Márcio André Lopes Cavalcante
ÍNDICE
DIREITO ADMINISTRATIVO
AGENTES PÚBLICOS
▪ Administração Pública não pode sobrestar o processo de promoção do militar, sob o argumento de que a promoção
não seria possível porque ultrapassaria os limites com pagamento de pessoal do Poder Executivo, segundo a Lei de
Responsabilidade Fiscal.
DIREITO AMBIENTAL
OUTROS TEMAS
▪ É indispensável a autorização federal para a utilização de água mineral obtida diretamente do solo como insumo
em processo industrial, mesmo que não destinada ao envase e consumo humano.
DIREITO CIVIL
NOME
▪ É possível a inclusão do sobrenome do padrinho para constituição de prenome composto, com amparo na regra do
art. 56 da Lei 6.015/73 (redação original), independentemente de motivação.
PROCESSO COLETIVO
▪ O MP possui legitimidade para propor ACP que trate de contrato de honorários advocatícios abusivos quando houver
litigantes hipossuficientes e repercussão social que transcenda a esfera dos interesses particulares, como nos de
beneficiários da Previdência Social.
DIREITO PENAL
LEI DE DROGAS
▪ A apreensão e perícia da substância entorpecente é imprescindível para a comprovação da materialidade do crime
de tráfico de drogas.
DIREITO ADMINISTRATIVO
Cabe à Administração verificar o preenchimento dos requisitos para promoção por ato de
bravura de oficial dos quadros da carreira militar, sendo indevida a suspensão do processo
administrativo motivada na situação econômica do Estado.
O STJ definiu, no julgamento do Tema 1.075, que a progressão funcional de servidor público
está compreendida na exceção prevista no art. 22, parágrafo único, I, da Lei Complementar
101/2000 (Lei da Responsabilidade Fiscal), considerando o art. 37, X, da Constituição Federal.
STJ. 2ª Turma. RMS 69.581-GO, Rel. Min. Afrânio Vilela, julgado em 20/2/2024 (Info 801).
Foi nesse contexto que João (nome fictício), bombeiro militar, lotado no 1º Grupamento de Incêndio de
Goiás, foi escalado para a proteção, isolamento e limpeza das áreas contaminadas pelo césio-137, bem
como a manutenção do depósito provisório do lixo radioativo. O Estado não forneceu equipamento de
proteção adequado nem mesmo treinamento específico, de forma que o trabalho nas proximidades do
material foi realizado por João com o fardamento normal do corpo de bombeiros.
Com o passar dos anos, João passou a desenvolver problemas de saúde causados pela exposição ao césio-
137. A Junta de Saúde do Corpo de Bombeiros, de fato, reconheceu que o militar foi vítima de
contaminação radioativa.
Diante desse quadro, em 2019, João requereu, junto ao Comando do Corpo de Bombeiro Militar do Estado
de Goiás, a sua promoção por ato de bravura, benesse prevista em lei estadual, dada a sua ação meritória
de exposição ao risco radioativo em proteção da sociedade.
No curso do processo administrativo, embora os pareceres tenham sido favoráveis à concessão da
promoção requerida, o Comandante Geral do Corpo de Bombeiros decidiu sobrestar o prosseguimento
do processo de promoção por bravura argumentando que a promoção não seria possível porque
Mandado de segurança
João, discordando da decisão administrativa, impetrou mandado de segurança perante o Tribunal de
Justiça do Estado de Goiás.
O impetrante afirmou ter direito líquido e certo à promoção por ato de bravura, apontando ilegal o ato do
Comandante Geral do Corpo de Bombeiro Militar de sobrestar o processo administrativo de sua
promoção, motivado na situação econômica do Estado.
O Estado de Goiás se manifestou em contraposição aos pedidos, argumentando ser “notório que o Estado
de Goiás há algum tempo experimenta crises de ordem econômica e fiscal”, razão pela qual a promoção
pleiteada seria vedada pelo art. 22 da Lei de Responsabilidade Fiscal:
Art. 22. A verificação do cumprimento dos limites estabelecidos nos arts. 19 e 20 será realizada ao
final de cada quadrimestre. Parágrafo único. Se a despesa total com pessoal exceder a 95%
(noventa e cinco por cento) do limite, são vedados ao Poder ou órgão referido no art. 20 que
houver incorrido no excesso:
I – concessão de vantagem, aumento, reajuste ou adequação de remuneração a qualquer título,
salvo os derivados de sentença judicial ou de determinação legal ou contratual, ressalvada a
revisão prevista no inciso X do art. 37 da Constituição;
II – criação de cargo, emprego ou função;
III – alteração de estrutura de carreira que implique aumento de despesa;
IV – provimento de cargo público, admissão ou contratação de pessoal a qualquer título,
ressalvada a reposição decorrente de aposentadoria ou falecimento de servidores das áreas de
educação, saúde e segurança;
V – contratação de hora extra, salvo no caso do disposto no inciso II do § 6º do art. 57 da
Constituição e as situações previstas na lei de diretrizes orçamentárias.
Além disso, a Fazenda Pública argumentou que, como o impetrante ingressou na carreira militar como
praça, não seria cabível a sua promoção na carreira do quadro de oficiais. Afirmou que se a promoção
fosse deferida neste caso haveria ofensa à Súmula Vinculante nº 43:
SV 43: É inconstitucional toda modalidade de provimento que propicie ao servidor investir-se, sem
prévia aprovação em concurso público destinado ao seu provimento, em cargo que não integra a
carreira na qual anteriormente investido.
Preliminarmente
O STJ entendeu que o TJGO inverteu a lógica do mandado de segurança. Isso porque o Tribunal local, em
vez de analisar se o sobrestamento do processo administrativo foi correto, decidir adentrar
inadequadamente na análise dos requisitos da promoção.
Conforme voto do Ministro Afrânio Vilela, “o acórdão afasta a pretensão do impetrante sem, porém,
analisar (i)legalidade do ato apontado coator, muito embora reconheça a pertinência do segundo
fundamento, quanto ao preenchimento dos requisitos”, de forma que “a análise, se devida ou não a
promoção ao Tenente, oriundo da carreira policial militar, é secundária a uma primeira análise da alegada
Assim, ainda que se argumente ser a promoção por bravura ato discricionário da administração, ou que
se defenda vincular-se ao preenchimento dos requisitos aqui demonstrados, fato é que a suspensão do
processo administrativo que caminhava favoravelmente ao impetrante não deve se dar motivada na
situação econômica local.
Em suma:
Cabe à Administração verificar o preenchimento dos requisitos para promoção por ato de bravura de
oficial dos quadros da carreira militar, sendo indevida a suspensão do processo administrativo motivada
na situação econômica do Estado.
STJ. 2ª Turma. RMS 69.581-GO, Rel. Min. Afrânio Vilela, julgado em 20/2/2024 (Info 801).
DIREITO AMBIENTAL
Caso adaptado: uma indústria fabricante de café decidiu utilizar a água mineral obtida
diretamente de um manancial a fim de empregá-la em seu processo industrial de fabricação
de café solúvel. A indústria obteve um título de concessão outorgado por uma autarquia
estadual, que cuida de questões hídricas no Estado. A empresa passou, então, a utilizar a água
mineral obtida diretamente do solo como insumo em seu processo industrial.
A indústria argumentou que, como a água não se destinava ao envase nem ao consumo
humano, ela não estaria sujeita à autorização federal imposta pelo Código de Águas Minerais
(Decreto-Lei nº 7.841/45) e pelo Código de Minas (Decreto-Lei nº 227/67).
O STJ não concordou com esse argumento.
O Código de Minas e o Código de Águas Minerais em momento algum estabelecem essa
restrição. A fiscalização e análise da água pelo DNPM, hoje realizada pela ANM, não tem como
objetivo somente a verificação de suas propriedades para fins de saúde da população que pode
vir a consumi-la. É uma atividade que visa ao resguardo dos interesses da União no bem
natural (art. 20, IX, da CF/88), respeitando imperativos de predominância do interesse
público sobre o particular e de desenvolvimento no interesse nacional.
STJ. 1ª Turma. REsp 1.490.603-PR, Rel. Min. Paulo Sérgio Domingues, julgado em 20/2/2024 (Info 801).
A indústria de café apresentou contestação alegando que, como a água não se destina ao envase nem ao
consumo humano, ela (empresa) não estaria sujeita à autorização federal imposta pelo Código de Águas
Minerais (Decreto-Lei nº 7.841/45) e pelo Código de Minas (Decreto-Lei nº 227/67).
Argumentou que seria desnecessária a outorga de licença pelo Poder Executivo Federal para a utilização
Art. 25. Só será permitida a exploração comercial de água (mineral, termal, gasosa, potável de
mesa ou destinada a fins balneários) quando previamente analisada no D.N.P.M. e após expedição
do decreto de autorização de lavra.
O STJ acolheu os argumentos dos recorrentes? É necessária autorização federal neste caso?
SIM.
No caso concreto, a indústria praticava extração de água mineral.
Inicialmente, cumpre ressaltar que o art. 20, IX, da Constituição Federal é expresso ao elencar que os
recursos minerais, inclusive os do subsolo, são bens da União.
Analisando agora a legislação infraconstitucional, verifica-se que o art. 1º do Código de Águas Minerais
(DL 7.841/1945) define o que são águas minerais:
Art. 1º Águas minerais são aquelas provenientes de fontes naturais ou de fontes artificialmente
captadas que possuam composição química ou propriedades físicas ou físico-químicas distintas
das águas comuns, com características que lhes confiram uma ação medicamentosa.
A legislação estabelece que, para que haja o aproveitamento comercial das fontes de águas minerais,
mesmo que situadas em imóveis particulares, é necessária autorização de pesquisa e autorização de lavra.
Isso está previsto no art. 4º do Código de Águas Minerais:
Art. 4º O aproveitamento comercial das fontes de águas minerais ou de mesa, quer situadas em
terrenos de domínio público, quer do domínio particular, far-se-á pelo regime de autorizações
sucessivas de pesquisa e lavra instituído pelo Código de Minas, observadas as disposições especiais
da presente lei.
Parágrafo único. O aproveitamento comercial das águas de mesa é reservado aos proprietários do
solo.
Nesse mesmo sentido, o art. 10, do Código de Águas Minerais prevê que “a lavra de uma fonte de água
mineral (...) será solicitada ao Ministro da Agricultura”.
O art. 25, por sua vez, preconiza que “só será permitida a exploração comercial de água (mineral, termal,
gasosa, potável de mesa ou destinada a fins balneários) quando previamente analisada no D.N.P.M. e após
expedição do decreto de autorização de lavra.”
Além disso, o Decreto-Lei nº 227/1967 (Código de Minas), norma geral, aplicada subsidiariamente no
silêncio do Código de Águas Minerais, afirma competir ao extinto DNPM, atualmente à ANM (art. 32 da
Lei 13.575/2017), a fiscalização da lavra e de outros aspectos da indústria mineral.
No caso concreto, o Juiz Federal e TRF entenderam que não seria necessária a expedição de alvará ou
Em suma:
É indispensável a autorização federal para a utilização de água mineral obtida diretamente do solo como
insumo em processo industrial, mesmo que não destinada ao envase e consumo humano.
STJ. 1ª Turma. REsp 1.490.603-PR, Rel. Min. Paulo Sérgio Domingues, julgado em 20/2/2024 (Info 801).
O que é envase?
O envase de água é o processo industrial pelo qual a água, seja ela potável, mineral, termal ou de qualquer
outra categoria destinada ao consumo humano, é captada, tratada (quando necessário), e posteriormente
engarrafada ou acondicionada em recipientes apropriados para a sua comercialização e consumo.
DOD PLUS
Interessante ainda que, nesse caso, como se trata de recurso mineral, a ação de ressarcimento ao erário
é imprescritível, de forma que a empresa poderá ser cobrada por toda a quantidade exorbitante de água
(da União) que utilizou:
São imprescritíveis as ações de ressarcimento ao erário, decorrentes de lavra mineral efetuada em
desacordo com a licença concedida, tendo em conta a degradação ambiental e a especial proteção
constitucional atribuída ao meio ambiente e aos recursos minerais.
STF. Plenário. RE 1.427.694/SC, Rel. Min. Rosa Weber, julgado em 01/09/2023 (Repercussão Geral – Tema
1268) (Info 1106).
DIREITO CIVIL
Caso hipotético: durante muito novo, Lucas Souza Garcia teve intensa convivência com
Francisco Bianchi, seu padrinho, a quem considera como segundo pai.
Lucas decidiu fazer uma homenagem ao padrinho e, quando completou 18 anos, com a
concordância de Francisco, tentou alterar acrescentar a expressão Bianchi ao seu prenome.
Seu nome completo ficaria Lucas Bianchi Souza Garcia.
O fundamento para esse pedido foi o art. 56 da Lei nº 6.015/73.
O STJ concordou com o pleito.
Essa pretensão não é proibida pela lei considerando que o art. 56 da LRP, seja antes ou depois
da Lei nº 14.382/2022, não exige a apresentação de justo motivo para a alteração do prenome.
Ora, se a lei permite a modificação de um prenome por um outro (ex: Lucas poderia passar a
se chamar Pedro), não há motivo plausível para se proibir a inclusão de determinada partícula
para tornar esse pronome duplo ou composto, como ocorre no caso concreto (Lucas Bianchi).
Dessa maneira, sem desprezar o princípio da imutabilidade do nome, deve-se admitir o pleito
de alteração do prenome, relegando essa matéria ao âmbito da autonomia privada, pois
ausente qualquer risco à segurança jurídica e a terceiros, já que foram juntadas inúmeras
certidões negativas em relação ao nome do autor, bem como há declaração expressa do
padrinho no sentido de não se opor ao fato de que o afilhado faça a inclusão postulada.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.951.170-DF, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 20/2/2024 (Info 801).
Art. 56. O interessado, no primeiro ano após ter Art. 56. A pessoa registrada poderá, após ter
atingido a maioridade civil, poderá, pessoalmente atingido a maioridade civil, requerer
ou por procurador bastante, alterar o nome, desde pessoalmente e imotivadamente a alteração de
que não prejudique os apelidos de família, seu prenome, independentemente de decisão
averbando-se a alteração que será publicada pela judicial, e a alteração será averbada e publicada
Desse modo, o interessado queria que seu nome completo passasse a ser Lucas Bianchi Souza Garcia.
O oficial do Registro Civil não aceitou realizar a retificação.
Ação de retificação
Diante disso, Lucas, em 2018, ingressou com ação de retificação de assento de nascimento, postulando a
inclusão do vocábulo Bianchi ao seu prenome.
Com a inicial, foram juntadas certidões negativas em nome do autor e uma declaração do padrinho,
dizendo que nada tinha a opor quanto a pretensão do afilhado.
O juiz julgou o pedido improcedente. De acordo com a sentença, a pretensão não mereceria acolhimento
porque o art. 56, da LRP, não autorizaria o acréscimo de sobrenomes estranhos ao grupo familiar.
No caso concreto, o sobrenome Bianchi não pertence à ancestralidade do requerente, circunstância que,
à luz do dispositivo legal supracitado, inviabilizaria a pretensão.
O Tribunal de Justiça manteve a sentença.
Ainda inconformado, Lucas interpôs recurso especial. Reiterou os fundamentos da inicial, destacando que
sua pretensão não prejudica os apelidos de família, que ficariam preservados e inalterados. O recorrente
argumentou que a sentença teria ignorado que o vocábulo Bianchi não seria utilizado como sobrenome,
mas sim para compor o prenome do autor, como uma forma de homenagear seu padrinho.
O STJ deu provimento ao recurso de Lucas? Ele conseguiu incluir o sobrenome do padrinho como sendo
um prenome seu?
SIM.
Lei nº 14.382/2022
A Lei nº 14.382/2022 promoveu inúmeras alterações na Lei de Registros Públicos facilitando a alteração
do nome.
Vale ressaltar, contudo, que, mesmo antes da Lei nº 14.382/2022, o STJ já vinha adotando uma postura
bem flexível no que tange à mudança de nome por entender que esse tema, apesar de não perder seu
aspecto público, está inserido mais diretamente no âmbito da autonomia privada.
no meio social e reduzir as possibilidades de homonímia, haja vista que, nos termos do art. 54 da LRP, o
Do caso concreto
No caso concreto, ao contrário do que entenderam as instâncias ordinárias, postula-se a inclusão do
vocábulo Bianchi ao prenome, tornando-o composto, com fundamento no art. 56 da LRP.
Essa pretensão não é proibida pela lei considerando que o art. 56 da LRP, seja antes ou depois da Lei nº
14.382/2022, não exige a apresentação de justo motivo para a alteração do prenome. Ora, se a lei permite
a modificação de um prenome por um outro (ex: Lucas poderia passar a se chamar Pedro), não há motivo
plausível para se proibir a inclusão de determinada partícula para tornar esse pronome duplo ou
composto, como ocorre no caso concreto (Lucas Bianchi).
Dessa maneira, sem desprezar o princípio da imutabilidade do nome, deve-se admitir o pleito de alteração
do prenome, relegando essa matéria ao âmbito da autonomia privada, pois ausente qualquer risco à
segurança jurídica e a terceiros, já que foram juntadas inúmeras certidões negativas em relação ao nome
do autor, bem como há declaração expressa do padrinho no sentido de não se opor ao fato de que o
afilhado faça a inclusão postulada.
Art. 57. A alteração posterior de nome, somente Art. 57. A alteração posterior de sobrenomes
por exceção e motivadamente, após audiência do poderá ser requerida pessoalmente perante o
Ministério Público, será permitida por sentença do oficial de registro civil, com a apresentação de
juiz a que estiver sujeito o registro, arquivando-se certidões e de documentos necessários, e será
o mandado e publicando-se a alteração pela averbada nos assentos de nascimento e
imprensa, ressalvada a hipótese do art. 110 desta casamento, independentemente de autorização
Lei. judicial, a fim de:
I - inclusão de sobrenomes familiares;
II - inclusão ou exclusão de sobrenome do cônjuge,
na constância do casamento;
III - exclusão de sobrenome do ex-cônjuge, após a
dissolução da sociedade conjugal, por qualquer de
suas causas;
IV - inclusão e exclusão de sobrenomes em razão
de alteração das relações de filiação, inclusive para
os descendentes, cônjuge ou companheiro da
pessoa que teve seu estado alterado.
A simples pretensão de homenagear parente ou pessoa próxima não constitui fundamento bastante, já
que não há previsão de que sentimentos íntimos sejam suficientes para alterar a qualidade imutável do
nome, não sendo essa a função exercida pelo sobrenome.
Vale ressaltar, portanto, que a questão aqui analisada é diferente do que foi julgado pela 3ª Turma do STJ
no REsp 2.076.693/RN, pois naquele caso a controvérsia girou em torno da inclusão ao sobrenome do
postulante de palavra ou expressão que fora incluída ao nome civil de ascendente, enquanto no caso
Em suma:
É possível a inclusão do sobrenome do padrinho para constituição de prenome composto, com amparo
na regra do art. 56 da Lei nº 6.015/1973 (redação original), independentemente de motivação.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.951.170-DF, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 20/2/2024 (Info 801).
INTIMAÇÕES
É nula a modificação ou alternância do meio de intimação eletrônica (Portal ou Diário
eletrônico) pelos Tribunais, durante a tramitação processual, sem aviso prévio, causando
prejuízo às partes
Importante!!!
ODS 16
Caso hipotético: Regina ajuizou ação contra Madalena. Durante a tramitação do processo,
todas as intimações ocorreram por meio do Portal Eletrônico. Ao final, o pedido foi julgado
procedente. Inconformada, Madalena interpôs apelação. Na peça recursal, o advogado de
Madalena requereu que o julgamento ocorresse, no Tribunal de Justiça, de forma presencial
(e não virtual), para que pudesse realizar sustentação oral. Esse pedido do advogado foi
acolhido pelo Desembargador Relator, que determinou a inclusão do feito em pauta de
julgamento presencial. O advogado de Madalena tomou conhecimento dessa decisão do
Relator por meio de intimação realizada pelo Portal Eletrônico (assim como havia ocorrido
durante todo o processo). Em seguida, o advogado ficou acompanhando o Portal Eletrônico e
Essas duas espécies de intimação estão previstas na Lei nº 11.419/2006 (Lei do Processo Judicial
Eletrônico).
Exemplo:
Exemplo:
Há regra específica segundo a qual a publicação do Há um prazo de 10 dias para acesso à informação.
Essa mudança na forma de intimação gerou nulidade? Houve vício na intimação da pauta de
julgamento, uma vez que, no curso do processo, todas as intimações se deram por meio do Portal
Eletrônico e a publicação da pauta de julgamento foi a única comunicação que se deu por meio diverso
processo por meio eletrônico, o advogado que se cadastrou e esteja apto no Portal eletrônico seja
Em suma:
É nula a modificação ou alternância do meio de intimação eletrônica (Portal ou Diário eletrônico) pelos
Tribunais, durante a tramitação processual, sem aviso prévio, causando prejuízo às partes.
STJ. 4ª Turma. REsp 2.018.319-RJ, Rel. Min. João Otávio de Noronha, julgado em 20/2/2024 (Info 801).
PROCESSO COLETIVO
O MP possui legitimidade para propor ACP que trate de contrato de honorários advocatícios
abusivos quando houver litigantes hipossuficientes e repercussão social que transcenda a esfera
dos interesses particulares, como nos de beneficiários da Previdência Social
Importante!!! ODS 16
Caso adaptado: dois advogados convencem inúmeros trabalhadores rurais idosos a propor
ações previdenciárias. O aspecto impugnado diz respeito à cláusula de honorários
advocatícios contratuais. De acordo com o contrato assinado, em caso de êxito nas demandas,
os advogados teriam direito de ficar com todo o benefício previdenciário retroativo do autor
ou com o valor correspondente a prestações vincendas durante três anos (caso não houvesse
atrasados).
Diante desse cenário, o Ministério Público ajuizou ação civil pública contra os advogados
questionando a validade dessa cláusula de honorários.
O STJ afirmou que o Ministério Público possui legitimidade.
Quando se cuida de situação recorrente e continuada, de clientes em situação de
hipossuficiência que são induzidos, em razão de sua condição de vulnerabilidade, a anuir com
cobrança abusiva de honorários advocatícios contratuais, desenha-se uma situação que
ultrapassa os limites da esfera individual.
A modalidade de advocacia predatória que obsta o propósito da Previdência Social de
mantença de seus segurados, ao atuar com desídia para aumentar a sua remuneração e ao
Mesmo com essas cláusulas muito desvantajosas, diversos trabalhadores idosos aceitaram firmar os
contratos.
Ocorre que, com o passar do tempo, as famílias desses beneficiários começam a perceber que, apesar das
ações serem bem-sucedidas, o resultado não trazia o alívio financeiro esperado. Pelo contrário, muitos se
encontravam em situação ainda mais precária, tendo que abrir mão de uma parte significativa dos seus já
limitados recursos.
As denúncias começam a chegar ao Ministério Público, que identifica um padrão preocupante: os
contratantes são, na sua maioria, pessoas em situação de vulnerabilidade, sem plena compreensão dos
termos aos quais estavam concordando.
Diante desta situação, o Promotor de Justiça ingressou com ação civil pública contra João e Francisco
visando declarar a nulidade dessas cláusulas abusivas e buscar a restituição dos valores pagos pelos
hipossuficientes.
Na ACP, o Ministério Público apontou que os autores das ações previdenciárias, na maioria das vezes,
eram pessoas idosas, deficientes, moradores de zona rural, analfabetos ou semianalfabetos, ou seja,
pessoas hipossuficientes, sem compreensão dos termos contratuais.
Contestação
Na contestação, entre outros argumentos, os advogados suscitaram a ilegitimidade ativa do Ministério
Público para ingressar com a ação civil pública considerando que o Parquet estaria defendendo interesses
individuais disponíveis, o que não se encontra dentre as competências do órgão.
Sentença e acórdão do TJ
O Juiz afastou a preliminar de ilegitimidade ativa e julgou os pedidos procedentes no sentido de:
(I) proibir a pactuação de novos contratos com valores de honorários acima do permitido;
(II) determinar a adequação das placas de propaganda no escritório de advocacia dos recorrentes, que se
localizava em frente ao prédio do INSS;
(III) anular e tornar sem efeitos a cobrança de honorários de todos os contratos firmados com clientes de
ações previdenciárias em trâmite na comarca que fossem superiores a 30% dos valores retroativos dos
benefícios dos clientes, bem como anular a cobrança que ultrapasse o equivalente a quatro parcelas
vincendas, anular as cláusulas contratuais que previam o recebimento integral dos honorários contratados
Recurso especial
Inconformados, os advogados interpuseram recurso especial argumentando que:
• o Ministério Público não possui legitimidade para propor Ação Civil Pública que visa declarar abusivas as
cláusulas de contrato de prestação de serviços advocatícios;
• a presente Ação Civil Pública não se enquadra em nenhuma das hipóteses listadas no art. 1ª da Lei nº
7.347/85, haja vista que os honorários contratuais advocatícios são direitos individuais disponíveis e que
inexiste relação de consumo entre o cliente e o advogado;
• o simples fato de se tratar de pessoa idosa não atrai, por si só, a legitimidade do Ministério Público para
propor Ação Civil Pública;
• não existe vício no contrato firmado entre as partes que justifique a sua anulação, devendo ser
preservada a autonomia da vontade;
• o Estatuto da Advocacia assegura aos inscritos na OAB o direito de receber os honorários
convencionados.
Apesar de a gama de beneficiários do sistema previdenciário ir além das pessoas idosas, o art. 74 do
Destaca-se ainda que, nos termos do art. 3º Lei nº 10.741/2003 (Estatuto da Pessoa Idosa), a proteção ao
idoso deve ser tratada como bem jurídico a ser tutelado não só pela família, como também pela
comunidade, sociedade e Poder Público:
Art. 3º É obrigação da família, da comunidade, da sociedade e do poder público assegurar à pessoa
idosa, com absoluta prioridade, a efetivação do direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação,
à cultura, ao esporte, ao lazer, ao trabalho, à cidadania, à liberdade, à dignidade, ao respeito e à
convivência familiar e comunitária. (Redação dada pela Lei nº 14.423, de 2022)
Nessa linha de raciocínio, conclui-se que a modalidade de advocacia predatória que subverte o propósito
da Previdência Social de mantença de seus segurados, ao atuar com desídia para aumentar a sua
remuneração e ao cobrar honorários que prejudicam a subsistência dos beneficiários, configura-se como
ofensa ao próprio sistema previdenciário. Logo, atinge um bem jurídico de interesse de toda coletividade.
Importante destacar que não se trata de Ação Civil Pública para veicular as contribuições previdenciárias
propriamente ditas, o que é vedado pelo art. 1º, parágrafo único, da Lei nº 7.347/85.
Cuida-se, em verdade, de coibir o abuso daqueles que se aproveitam da condição de vulnerabilidade de
pessoas que aguardavam a concessão de benefícios da Previdência Social para impor-lhes contratos
abusivos de honorários.
Com efeito, tendo em vista a competência do Parquet para zelar pelos direitos fundamentais, é de ser
reconhecida a sua legitimidade para propor Ação Civil Pública que trate de honorários contratuais abusivos
quando houver litigantes hipossuficientes e repercussão social que transcenda a esfera dos interesses
particulares.
Em suma:
O Ministério Público possui legitimidade para propor ação civil pública que trate de contrato de
honorários advocatícios abusivos quando houver litigantes hipossuficientes e repercussão social que
transcenda a esfera dos interesses particulares, como nos de beneficiários da Previdência Social.
STJ. 3ª Turma. REsp 2.079.440-RO, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 20/2/2024 (Info 801).
DIREITO PENAL
LEI DE DROGAS
A apreensão e perícia da substância entorpecente é imprescindível
para a comprovação da materialidade do crime de tráfico de drogas
Importante!!!
ODS 16
Caso hipotético: A polícia investigava há alguns meses João, Pedro e Tiago, suspeitos de
praticarem tráfico de drogas na região. Havia, inclusive, o depoimento de pessoas que
afirmaram que adquiram drogas com o grupo. Com base nesses elementos informativos, a
polícia requereu a interceptação telefônica dos suspeitos, o que foi deferido. Foram então
ao do laudo definitivo e haja sido elaborado por perito oficial, em procedimento e conclusões
Pelo que se infere dos referidos precedentes, em um ou outro caso, ou seja, com laudo toxicológico
Em suma:
A apreensão e perícia da substância entorpecente é imprescindível para a comprovação da
materialidade do crime de tráfico de drogas.
STJ. 5ª Turma. REsp 2.107.251-MG, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, julgado em 20/2/2024 (Info 801).
EXECUÇÃO PENAL
É dever do Judiciário indagar à pessoa autodeclarada parte da população transexual acerca da
preferência pela custódia em unidade feminina, masculina ou específica, se houver, e, na
unidade escolhida, preferência pela detenção no convívio geral ou em alas ou celas específicas
Importante!!!
ODS 16
Regina poderá cumprir a pena no regime fechado enquanto não há vagas no semiaberto?
NÃO. A falta de estabelecimento penal adequado não autoriza a manutenção do condenado em regime
prisional mais gravoso.
Depois de alguns meses, o próprio Juízo da Execução Penal revogou a prisão domiciliar de Regina, sob o
argumento de que o Presídio Regional de Criciúma (presídio masculino) estaria “apto a receber reclusos
em regime semiaberto”. Logo, Regina poderia cumprir pena neste local.
A defesa impetrou habeas corpus pedindo para restabelecer o direito à prisão domiciliar.
O Tribunal de origem manteve a decisão de primeiro grau que revogou a concessão da prisão domiciliar,
razão pela qual a defesa impetrou novo habeas corpus agora para o STJ.
Resolução 348/2020
A Resolução nº 348/2020, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) estabelece diretrizes e procedimentos a
serem observados pelo Poder Judiciário, no âmbito criminal, com relação ao tratamento da população
lésbica, gay, bissexual, transexual, travesti ou intersexo que seja custodiada, acusada, ré, condenada,
privada de liberdade, em cumprimento de alternativas penais ou monitorada eletronicamente.
O art. 7º da Resolução determina que o local de cumprimento da pena deve ser determinado pelo juiz
após a pessoa presa manifestar sua preferência:
Art. 7º Em caso de prisão da pessoa autodeclarada parte da população LGBTI, o local de privação
de liberdade será definido pelo magistrado em decisão fundamentada.
§ 1º A decisão que determinar o local de privação de liberdade será proferida após
questionamento da preferência da pessoa presa, nos termos do art. 8º, o qual poderá se dar em
qualquer momento do processo penal ou execução da pena, assegurada, ainda, a possibilidade de
alteração do local, em atenção aos objetivos previstos no art. 2º desta Resolução. (redação dada
pela Resolução n. 366, de 20/01/2021)
§ 1º - A. A possibilidade de manifestação da preferência quanto ao local de privação de liberdade
e de sua alteração deverá ser informada expressamente à pessoa pertencente à população LGBTI
no momento da autodeclaração. (redação dada pela Resolução n. 366, de 20/01/2021)
(...)
Desse modo, a determinação do local do cumprimento da pena da pessoa transgênero não é um exercício de
livre discricionariedade do julgador, mas sim uma análise substancial das circunstâncias que tem por objeto
resguardar a liberdade sexual e de gênero, a integridade física e a vida das pessoas transgênero presas.
O órgão estatal judicial responsável pelo acompanhamento da execução da pena deve resguardar a vida
e a integridade física das pessoas presas, respeitando a diversidade de gênero e a liberdade sexual.
ADPF 527
Importante registrar que, em 2019, o STF, na ADPF 527, havia concedido medida cautelar para que pessoas
presas transexuais e travestis com identidade de gênero feminino pudessem escolher cumprir a pena em
estabelecimentos prisionais femininos ou masculinos.
Em seguida, o CNJ editou a já mencionada Resolução CNJ n. 348/2020 que, em seu art. 8º, previu:
Art. 8º De modo a possibilitar a aplicação do artigo 7º, o magistrado deverá:
I – esclarecer em linguagem acessível acerca da estrutura dos estabelecimentos prisionais
disponíveis na respectiva localidade, da localização de unidades masculina e feminina, da
existência de alas ou celas específicas para a população LGBTI, bem como dos reflexos dessa
escolha na convivência e no exercício de direitos;
II – indagar à pessoa autodeclarada parte da população transexual acercada preferência pela
custódia em unidade feminina, masculina ou específica, se houver, e, na unidade escolhida,
preferência pela detenção no convívio geral ou em alas ou celas específicas, onde houver; e
(redação dada pela Resolução n. 366, de 20/01/2021)
III – indagar à pessoa autodeclarada parte da população gay, lésbica, bissexual, intersexo e travesti
acerca da preferência pela custódia no convívio geral ou em alas ou celas específicas. (redação
dada pela Resolução n. 366, de 20/01/2021)
§ 1º Os procedimentos previstos neste artigo devem ser observados na realização da audiência de
custódia após prisão em flagrante ou cumprimento do mandado de prisão, na prolação de
sentença condenatória, assim como em audiência na qual seja decretada a privação de liberdade
Portanto, é dever do Judiciário indagar à pessoa autodeclarada parte da população transexual acerca da
preferência pela custódia em unidade feminina, masculina ou específica, se houver, e, na unidade
escolhida, preferência pela detenção no convívio geral ou em alas ou celas específicas.
Em suma:
É dever do Judiciário indagar à pessoa autodeclarada parte da população transexual acerca da
preferência pela custódia em unidade feminina, masculina ou específica, se houver, e, na unidade
escolhida, preferência pela detenção no convívio geral ou em alas ou celas específicas.
STJ. 6ª Turma. HC 861.817-SC, Rel. Min. Jesuíno Rissato (Desembargador convocado do TJDFT), julgado
em 6/2/2024 (Info 801).
EXERCÍCIOS
Julgue os itens a seguir:
1) Cabe à Administração verificar o preenchimento dos requisitos para promoção por ato de bravura
de oficial dos quadros da carreira militar, sendo indevida a suspensão do processo administrativo
motivada na situação econômica do Estado. ( )
2) É dispensável a autorização federal para a utilização de água mineral obtida diretamente do solo
como insumo em processo industrial, mesmo que não destinada ao envase e consumo humano. ( )
3) É possível a inclusão do sobrenome do padrinho para constituição de prenome composto, com amparo
na regra do art. 56 da Lei 6.015/73 (redação original), independentemente de motivação. ( )
4) Não é nula a modificação ou alternância do meio de intimação eletrônica (Portal ou Diário eletrônico)
pelos Tribunais, durante a tramitação processual, sem aviso prévio, causando prejuízo às partes. ( )
5) O Ministério Público possui legitimidade para propor ação civil pública que trate de contrato de
honorários advocatícios abusivos quando houver litigantes hipossuficientes e repercussão social que
transcenda a esfera dos interesses particulares, como nos de beneficiários da Previdência Social. ( )
6) A apreensão e perícia da substância entorpecente é prescindível para a comprovação da
materialidade do crime de tráfico de drogas. ( )
7) É dever do Judiciário indagar à pessoa autodeclarada parte da população transexual acerca da
preferência pela custódia em unidade feminina, masculina ou específica, se houver, e, na unidade
escolhida, preferência pela detenção no convívio geral ou em alas ou celas específicas. ( )
Gabarito:
1. C 2. E 3. C 4. E 5. C 6. E 7. C