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Revista Eletrônica do Curso de Direito - PUC Minas Serro – n. 12 – Agosto / Dez. 2015 – ISSN 2176-977X

CULPABILIDADE E TEORIA DA PENA: EVOLUÇÃO, CONCEITOS E


INTERRELAÇÃO

CULPABILITY AND THEORY OF PENALTY: EVOLUTION, CONCEPTS AND


INTERACTION

Helena Frade Soares

Resumo: O foco deste artigo incide na exposição da evolução dos conceitos e dogmática da
Culpabilidade e da Penal Criminal. Sua finalidade é a realização de uma interrelação entre os
institutos que justifique a afirmação de ser a Culpabilidade o fundamento e o limite da
aplicação da Pena em matéria de Direito Penal. Uma vez que a pena somente pode ser
aplicada diante da existência, entre outros, da culpabilidade do agente, diz-se ser esta o
fundamento daquela. Ademais, uma vez presentes os requisitos para a aplicação da pena, esta
deverá ser arbitrada levando-se em consideração, novamente a culpabilidade do agente. Daí
dizer-se que a culpabilidade é também sua limitadora.

Palavras-Chaves: CULPABILIDADE. PENA. FUNDAMENTO. LIMITE.

Abstract: The aim of these article is to expose about the evolution of concepts and dogmatic
of Culpability and Criminal Penalty. It´s main goal is to stipulate an interrelation between
both institutes so that we can justify the assertion that Culpability can be considered the
foundation and the limit of the application of Criminal Penalty in the scope of Criminal Law.
Since that the criminal penalty can only be applied before the existence, between others, of
the culpability, it is said that this is the foundation of that one. Moreover, once all requisites
for the application of criminal penalty can be observed, it will be applied taking into
consideration, again the culpability of the agent. Therefore it is said that the culpability is also
it´s limiter.

Keywords: CULPABILITY. PENALTY. FOUNDATION. LIMIT.


Advogada formada pela PUC Minas em 2013. Pesquisadora do CRISP - Centro de Estudos de Criminalidade e
Segurança Pública da UFMG.
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1. INTRODUÇÃO

Propõe-se com o presente artigo abordar a relação existente entre a Culpabilidade e a


Pena, verificando-se o motivo de aquela poder ser considerada como fundamento e limite
desta última. Para tanto, discorreu-se sobre o conceito analítico do delito destacando-se a
presença da Culpabilidade como juízo de reprovação ou de censura dirigido individualmente
ao agente por não ter ele agido conforme a norma, quando assim o pudesse ser exigido.

Buscou-se, também, trazer uma exposição sobre a evolução dogmática da


Culpabilidade abarcando suas principais Teorias: Psicológica ou subjetiva, Psicológico-
normativa ou normativa complexa e Normativa pura ou finalista. Discorreu-se também, sobre
seu conceito material e seus elementos.

Em um segundo momento, o presente artigo dispõe sobre a Pena Criminal, trazendo


uma análise sobre suas Teorias: Absolutas, Relativas, Ecléticas ou Unitárias e Agnóstica.

Por fim, buscou-se a elaboração de uma interrelação entre Culpabilidade e Pena com
o objetivo de explicar porque se pode considerar aquela fundamento e limite à aplicação desta
trazendo à discussão o papel dos Direitos fundamentais da individualização e da
personalização da pena em referida discussão.

2. A CULPABILIDADE

2.1 Conceito

A elaboração do conceito de culpabilidade a partir do ponto de vista jurídico tem


início com a representação grega de penalidade e se consubstancia na racionalidade do
sistema jurídico romano.

Extrato da Teoria do Delito, para Luiz Regis Prado (PRADO,2008) a culpabilidade


está ligada ao indivíduo capaz de responder pelas consequências decorrentes de seus atos
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sendo determinado em razão de leis preestabelecidas e que conta com a interposição de um


terceiro, estranho ao sujeito.

Analiticamente, o delito é a ação ou omissão típica, ilícita e culpável. Segundo Luiz


Regis Prado (PRADO,2008, p.365) “a culpabilidade é a reprovabilidade pessoal pela
realização de uma ação ou omissão típica e ilícita. Assim, não há culpabilidade sem
tipicidade e ilicitude, embora possa existir ação típica e ilícita inculpável. ”

Explica o jurista que a culpabilidade seria um juízo de reprovação ou de censura


pessoal dirigido ao agente por não ter ele agido de outro modo quando assim lhe foi exigido.
Por outro lado, a ilicitude seria um juízo de desvalor sobre um fato típico. Seria a
culpabilidade, portanto, o fundamento e o limite da pena.

Eugenio Raúl Zaffaroni apresenta um conceito geral onde a culpabilidade é a


reprovabilidade do injusto ao autor. Segundo ele,

[...] um injusto, isto é, uma conduta típica e antijurídica, é culpável quando


reprovável ao autor a realização desta conduta porque não se motivou na norma,
sendo-lhe exigível, nas circunstâncias em que agiu, que nela se motivasse. Ao não
ser motivado na norma, quando podia e lhe era exigível que o fizesse, o autor mostra
uma disposição interna contrária ao direito. (ZAFFARONI, 2011, p. 521)

Por fim, Juarez Cirino dos Santos (SANTOS, 2008) explica que esse juízo de
reprovação de culpabilidade tem por objeto a realização injustificada de um tipo de injusto e
possui como fundamento, a imputabilidade que nada mais é do que as condições pessoais
mínimas que capacitam o agente saber o que faz. Ademais, tem como objeto também, a
consciência da antijuridicidade e a exigibilidade de conduta diversa.

Importa destacar a existência de um sentido social da culpabilidade que, nos dizeres de


Luiz Regis Prado (PRADO, 2008, p. 366) “a responsabilidade jurídica não tem nenhum
sentido senão em relação à liberdade jurídica – indissociável da noção de pessoa livre, única
capaz de responder por suas ações -, e que vincula reciprocamente os indivíduos.

Significa dizer que o poder agir de outro modo pressupõe sempre a idéia de liberdade
e livre arbítrio (liberdade de escolha), uma vez que seria impensável formular-se uma censura
jurídica e moral contra um fato determinado pela lei da causalidade.
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2.2 Evolução dogmática

O atual conceito normativo de culpabilidade é resultado de um longo processo


evolutivo que acarretou, sinteticamente, em três teorias que remontam desde o século XIX até
o século XXI. Estas teorias apresentam os conceitos psicológico, psicológico-normativo e
normativo puro de culpabilidade.

2.2.1 Teoria Psicológica ou subjetiva

Para esta teoria, a culpabilidade seria tão somente o vínculo subjetivo entre a conduta
e seu autor possuindo, como ponto de partida, o fato concreto. Cabia à culpabilidade o
tratamento da relação psíquica entre ato e sujeito causador deste.

Baseado no modelo causal de Liszt, Beling e Radbruch, injusto e culpabilidade se


relacionam como dimensões objetiva e subjetiva do fato punível. A culpabilidade como
relação psíquica entre autor e fato existe sob as formas psicológicas do dolo e da imprudência
e tem por objeto o tipo de injusto. Dessa forma, a culpabilidade nada mais é do que a
descrição de uma relação psicológica órfã de um elemento normativo e valorativo. É apenas a
descrição de uma relação puramente psicológica.

Para esta corrente, portanto, seriam elementos da culpabilidade a imputabilidade e o


dolo e a culpa que, assumem aqui, o papel de modalidades de culpabilidade. Daí, vislumbra-
se que referida teoria não ordenava de forma sistemática a imputabilidade, não explicava a
culpa consciente e o estado de necessidade exculpante.

2.2.2 Teoria Psicólogo-normativa (normativa complexa)


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Objetivando suprimir o abandono da culpabilidade exposta pela Teoria Psicológica,


Reinard Von Frank afirmando que a culpabilidade não se resume ao nexo psicológico entre
resultado e agente, propõe a inclusão à imputabilidade, à culpa e ao dolo, a reprovabilidade
como juízo de valor sobre o fato em relação ao seu autor, diante das circunstâncias em que
agiu.

Na sequência, Goldschmidt afirmou que a culpabilidade não é uma mera relação


psíquica, mas sim uma valoração do próprio fato típico. A culpabilidade pode ser conceituada
como uma vinculação normativa do fato típico.

Por outro lado, Freudenthal contribuiu para aperfeiçoar esta idéia agregando que a
inexigibilidade de outra conduta exclui a reprovação, servindo de base para a exclusão de toda
a reprovabilidade. Por fim, Mezger, finaliza dispondo que a ação aparece, por isso, como
expressão juridicamente desaprovada da personalidade do agente.

Para esta corrente, a culpabilidade surge como reprovabilidade por ausência de


inexigibilidade de conduta diversa e como vínculo psicológico.

2.2.3 Teoria Normativa pura ou finalista

Por fim, fruto da doutrina finalista da ação, para esta corrente, a culpabilidade é juízo
de censura pela realização do injusto típico, ou seja, quando podia e devia o autor agir de
outro modo. Seria, portanto, a reprovabilidade de decisão da vontade.

Juarez Cirino dos Santos defende que esta corrente revolucionou a teoria do tipo e a
teoria da culpabilidade

[...] pela deslocação do dolo, como consciência e vontade do fato, e da imprudência,


como lesão do cuidado objetivo exigido, da culpabilidade para o tipo subjetivo de
injusto, excluindo os componentes psicológicos da culpabilidade, reduzida, enfim, a
mero juízo de valor, expresso pelo critério da reprovabilidade que informa a
natureza normativa da culpabilidade. (SANTOS, 2008, p. 286)
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Assim, o conceito normativo de culpabilidade possui como objetos o juízo de


reprovação que se assenta sobre a imputabilidade, a potencial consciência da ilicitude e a
exigibilidade de conduta diversa.

Aqui, o dolo e a culpa integram, respectivamente, os tipos de injusto doloso e


culposo.

2.3 Conceito material de Culpabilidade

O conceito de culpabilidade como censurabilidade pessoal da ação tem natureza


formal e não explica o problema central da culpabilidade qual seja, o seu fundamento. Ou
seja, o porque ser o sujeito culpável ou reprovável. Surge, com isso, a necessidade de uma
definição material de culpabilidade. Este conceito deve ser coerente com o conceito de ser
humano que inspira o texto constitucional e, segundo Luiz Regis Prado:

Trata-se de alicerçar, em termos substanciais, a culpabilidade no reconhecimento da


dignidade da pessoa humana, considerando-a como ser livre e responsável, valores
imanentes à sociedade democrática.
O homem é um ser dotado de capacidade conforme valores e fins. [...] sempre que se
possa provar a impossibilidade de agir de modo diverso, deve ficar, em princípio,
excluída a culpabilidade.(PRADO, 2008, p.375)

Daí percebe-se que o conteúdo deste conceito, projeta-se externamente servindo


como fundamento e limite da pena.

2.4 Elementos da Culpabilidade

Podemos listar três elementos integrantes da Culpabilidade. São eles a


Imputabilidade, a Potencial Consciência da Ilicitude e a Exigibilidade de Conduta Diversa.

2.4.1 Imputabilidade
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Segundo Luiz Regis Prado, a imputabilidade seria a plena capacidade ou a condição


de culpabilidade, entendida como “[...] capacidade de entender e de querer, e, por
conseguinte, de responsabilidade criminal (o imputável responde pelos seus atos). ”
(PRADO,2008, p. 376).

Ou seja, seria a capacidade de compreensão e de vontade de atuar conforme ela,


compreendendo-se a natureza do caráter ilícito da ação pelo sujeito que a praticou. Para
Juarez Cirino dos Santos (SANTOS,2008), essa capacidade de culpabilidade seria um atributo
jurídico de indivíduos com determinado grau de desenvolvimento biológico e normalidade
psíquica que permitem ao agente conhecer do caráter ilícito do seu ato e de determinar-se de
acordo com este entendimento.

Daí, conclui-se que essa capacidade de compreensão da culpabilidade possui dois


aspectos. O primeiro cognoscitivo refere-se à capacidade de compreensão da ilicitude do ato
e, o segundo, volitivo, referente ao atuar segundo esta compreensão.

2.4.2 Potencial Consciência da Ilicitude

No que tange à exigência legal de consciência da ilicitude, Zaffaroni (ZAFFARONI,


2011, p. 532) explica que “O CÓDIGO PENAL exige a possibilidade do entendimento da
ilicitude do fato, especialmente nos arts. 21 e 26 (BRASIL, 1940). A lei não exige o efetivo
entendimento da ilicitude, mas somente a possibilidade desse entendimento.

Esta potencial consciência da ilicitude pode ser apontada como o elemento


intelectual da reprovabilidade. Trata-se da possibilidade de o agente entender, compreender o
caráter ilícito de sua ação. É potencial porque não real, ou seja, o agente só age culpavelmente
quando conhece ou poderia conhecer a ilicitude do seu comportamento.

Para Luiz Regis Prado (PRADO,2008) este conhecimento da potencial ilicitude da


conduta não estaria adstrito à legislação penal, bastando ao agente a possibilidade de
consciência de que o seu comportamento contraria o ordenamento jurídico.

2.4.3 Exigibilidade de conduta diversa


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Sendo o elemento volitivo da culpabilidade, a exigibilidade de conduta diversa


somente pode ser pensada quando pressupõe-se que o agente possui a liberdade de se
comportar de acordo com a norma. Apenas através da idéia de livre arbítrio pode-se exigir do
agente esse comportamento.

Segundo Juarez Cirino dos Santos ( SANTOS, 2008, p. 330) “A normalidade das
circunstâncias do fato é o fundamento concreto da exigibilidade de comportamento conforme
ao direito, como terceiro estágio do juízo de reprovação de culpabilidade [...]. ”

Este juízo de reprovação segue um procedimento sequencial no qual, o momento do


exame da normalidade das circunstâncias da ação pressupõe a existência de um sujeito normal
que possui atributos pessoais capazes de permitir a atribuição de consequências penais de suas
ações. Ademais, nesse nível, demonstra-se que o sujeito é portador de capacidade de
culpabilidade, ou seja, que compreendia concretamente o injusto do fato ou tem a
possibilidade de conhecê-lo. O último estágio do juízo de reprovação da culpabilidade
consiste na análise da normalidade ou da anormalidade das circunstâncias em que a conduta
do agente foi praticada.

Para Luiz Regis Prado (PRADO, 2008, p. 380) “isso significa que o conteúdo da
reprovabilidade repousa no fato de que o autor devia e podia adotar uma resolução de
vontade de acordo com o ordenamento jurídico e não uma decisão voluntária ilícita”.

Tanto o é, que verificada a anormalidade das circunstâncias em que a conduta do


agente foi praticada, pode-se excluir ou reduzir a dirigibilidade normativa, afastando-se a
culpabilidade.

3. TEORIA DA PENA

Para se adentrar à análise da Teoria da Pena, importante se faz tecer uma breve
consideração sobre a política criminal e o Direito Penal. Na obra Curso de Criminologia, Luiz
Regis Prado conceitua que
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A política criminal objetiva, primordialmente, a análise crítica (metajurídica) do


direito posto, no sentido de bem ajustá-lo aos ideais jurídico-penais e de justiça. Está
intimamente ligada à dogmática, visto que a interpretação e aplicação da lei penal
interferem critérios de política-criminal. Baseia-se em considerações filosóficas,
sociológicas e políticas, e, de oportunidade, para propor modificações no sistema
penal vigente, abrangendo, então, ‘ o conjunto de procedimentos pelos quais o corpo
social organiza as respostas ao fenômeno criminal’. (PRADO, 2013, p. 28)

De sua sorte, o Direito Penal é uma ciência normativa, que serve de um método
jurídico para a reconstrução científica do direito vigente. Ou seja, representa ele o sistema de
normas que define crimes e prescreve penas estabelecendo os princípios de sua aplicação.

Sendo a pena uma das mais importantes consequências jurídicas do delito,


importante se faz a realização da análise sobre a sua evolução e implicações. Pode-se apontar,
como as principais Teorias que têm por escopo a justificação de seus fundamentos e fins as
Teorias Absolutas, Teorias Relativas, Teorias Unitárias ou Ecléticas e a Teoria Agnóstica.

3.1. Teorias Absolutas

As concepções absolutas são decorrentes do pensamento alemão, especialmente com


a Teoria da retribuição ética ou moral de Kant e a Teoria da Retribuição Lógico-jurídico de
Hegel.

Para Kant, a aplicação da pena decorreria da necessidade ética e da exigência de


justiça. Hegel defendia que a pena é negação do delito.

Dessa forma, as Teorias Absolutas fundamentam a existência da pena unicamente no


delito praticado. Para elas, a pena seria uma retribuição ao mal causado pelo crime. Seria
decorrente, portanto, de uma exigência de justiça.

Segundo Juarez Cirino dos Santos a pena, para esta corrente, é

[...] retribuição do crime, no sentido religioso de expiação ou no sentido jurídico de


compensação da culpabilidade, característica do Direito Penal clássico, representa a
imposição de um mal justo contra o mal injusto do crime, necessário para realizar
justiça ou restabelecer o Direito [...]. (SANTOS, 2008, p.461)
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3.2. Teorias Relativas

Seguindo uma linha de pensamento contrária às Teorias Absolutas, esta corrente


fundamenta a existência da pena na necessidade de prevenção do delito.

A idéia de prevenção geral que, tradicionalmente, é indicada como intimidação,


modernamente é vislumbrada como exemplaridade. Trata-se de uma função pedagógica ou de
formação desempenhada pelo Direito Penal quando da edição das leis penais. Esse caráter de
intimidação é atribuído à chamada Prevenção Geral Intimidatória de Feurbach que, segundo
Luiz Regis Prado (PRADO,2008, p. 490) “[...] busca sua justificação na produção de efeitos
inibitórios à realização de condutas delituosas, nos cidadãos em geral, de maneira que
deixarão de praticar atos ilícitos em razão do temor de sofrer a aplicação de uma sanção
penal. ”

Juarez Cirino dos Santos (SANTOS, 2008) ao discorrer sobre a Prevenção Geral
Especial explica que a execução desta prevenção ocorreria em duas dimensões simultâneas,
sendo elas negativa e positiva. A primeira é externada através da neutralização do criminoso,
tornando-o incapaz de cometer crimes futuros contra a sociedade durante a execução da pena.
A segunda, positiva, visa a ressocialização ou correção do criminoso durante, também, a
execução da pena.

Pode-se apontar como três efeitos da pena dentro da concepção de prevenção


geral positiva, a aprendizagem, o sentimento de confiança e de pacificação social.

Importa destacar, como o faz Juarez Cirino dos Santos que:

A crítica jurídica da prevenção especial positiva, fundada na premissa de que a pena


criminal preserva todos os direitos não atingidos pela privação de liberdade, afirma
que programas de ressocialização devem respeitar a autonomia do peso e, por isso,
deveriam ser limitados a casos individuais voluntários, de ajuda à disposição de
auto-ajuda do encarcerado: afinal, o condenado não pode ser compelido ao
tratamento penitenciário, o Estado não tem o direito de melhorar pessoas segundo
critérios morais próprios e, enfim, prender pessoas fundado na necessidade de
melhoria terapêutica é injustificável.(SANTOS, 2008, p.466).
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Ou seja, fundamentar a pena tão somente em uma visão positiva de prevenção geral,
ataca frontalmente o princípio da dignidade humana, vez que utiliza o indivíduo como meio
para a consecução de fins sociais com duvidosa eficácia.

3.3. Teorias Unitárias ou Ecléticas

Predominantemente defendidas na atualidade, as Teorias Unitárias ou Ecléticas


buscam conciliar as exposições realizadas pelas Teorias isoladas anteriormente expostas.
Objetivam, dessa forma, a superação das deficiências individuais de cada teoria, associando as
concepções de prevenção geral e especial da pena bem como, do seu caráter de retribuição.

Pode-se verificar que a idéia de retribuição da pena não desaparece, mantendo-se


importante para a fixação de uma pena justa que possui na culpabilidade seu fundamento e
limite.

De acordo com estas Teorias, a pena criminal representaria uma (a) retribuição ao
injusto realizado; (b) prevenção especial positiva, vez que possui caráter pedagógico através
da correção do autor e (c) prevenção especial negativa, vez que é dotada de caráter
intimidatório à consecução de futuros delitos.

Conclui-se que a pena tem sua justificação nas prevenções especiais negativa e
positiva, bem como na justificação da ordem jurídica. Segundo Luiz Regis Prado:

[...] O que deve ficar patente é que a pena é uma necessidade social – ultima ratio
legis -, mas também indispensável para a real proteção de bens jurídicos, missão
primordial do Direito Penal. De igual modo, deve ser a pena, sobretudo em um
Estado constitucional e democrático, sempre justa, inarredavelmente adstrita à
culpabilidade (princípio e categoria dogmática) do autor do fato punível. (PRADO,
2008, p.498).

3.4. Teoria Agnóstica

Por fim, chama-se à atenção para a Teoria Agnóstica a qual se fundamenta em


modelos ideais de estado de polícia e de estado de direito.
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De acordo com este direcionamento, a pena estaria cumprindo apenas um papel


degenerador da neutralização vez que, empiricamente comprovada a impossibilidade de
ressocialização do condenado.

Segundo seus defensores, merece destaque a função jurídico-política do direito penal


e, por consequência, do ator jurídico. A pena seria tão somente um ato de poder de explicação
simplesmente política.

A Teoria Agnóstica pode ser vista como uma crítica às funções concebidas à pena,
uma vez que todas elas não são conhecidas sendo somente atribuídas pelo Direito Penal
através de teorias positivas. Daí denominá-la como agnóstica.

Por fim, propõe a busca de um conceito de pena delimitador do universo do Direito


Penal por um caminho distinto de suas funções.

4. CONCLUSÃO. CULPABILIDADE COMO FUNDAMENTO E LIMITE DA PENA.


DO DIREITO A INDIVIDUALIZAÇÃO E A PERSONALIZAÇÃO DA PENA

Diante das considerações anteriormente traçadas é possível vislumbrar-se uma


interrelação entre Culpabilidade e Pena afirmando-se, em conclusão, ser aquela não só
fundamento da segunda, mas também sua limitadora.

Em que pese a grande discussão sobre as funções da pena, certo é que esta somente
pode ser aplicada caso exista Culpabilidade. Uma vez que até a atualidade não nos afastamos
da idéia de retribuição da pena, não se pode questionar que referida retribuição deve guardar
proporcionalidade com a medida da culpabilidade do agente infrator.

Sendo a Culpabilidade uma reprovação pessoal pela realização de um injusto, deve


ela ser o fundamento de aplicação da pena. Tanto o é que, caso afastada, prejudicada resta a
aplicação desta.

Para que um sujeito seja responsabilizado pelo ato ilícito praticado, ou seja, para que
haja retribuição e compensação pelo injusto causado, necessário se faz a verificação de todos
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os elementos integradores da Culpabilidade sem os quais, repita-se, resta-se prejudicada a


aplicação da pena.

Primeiramente, o indivíduo deve ser dotado de capacidade de compreensão do ato


praticado bem como, uma vez ciente de tal, querer a realização do mesmo. Dessa forma, não
basta saber o que faz, necessário também a vontade de fazê-lo. Ademais, ciente do ato
praticado e o querendo praticar, deve o indivíduo possuir a potencial consciência de que
aquele ato é ilícito, ou seja, contrário ao ordenamento jurídico. Por fim, deve ser verificado
também se as circunstâncias nas quais o ato foi praticado encontram-se de acordo com a
normalidade.

Caso ausentes qualquer destes elementos, resta afastada a aplicação da pena. A


ausência total da capacidade de compreensão do ato acarreta em inimputabilidade. Por sua
vez, a ausência da consciência da ilicitude do ato, acarreta em erro de proibição que, sendo
inevitável, afasta a culpabilidade. Importa destacar que o desconhecimento da lei se distingue
do desconhecimento da ilicitude do ato. Somente este, é capaz de afastar a culpabilidade. Por
fim, caso o ato seja praticado quando verificada situações anormais, ou seja, quando
impossível exigir do sujeito agir conforme a norma, também a culpabilidade resta afastada.

Verifica-se, portanto, que a Culpabilidade serve de fundamento para aplicação da


pena que, por sua vez, deve observá-la para também guardar proporcionalidade com a sua
medida.

Partindo-se da idéia não abandonada de que a pena cumpriria também a função de


compensação pelo injusto causado, referida compensação deve ser arbitrada conforme a
culpabilidade do sujeito infrator. Ou seja, a sanção imposta ao infrator deve adequar-se à
proporção da gravidade de sua ação delituosa. Exemplo é a redução da pena quando existe
erro de proibição evitável.

Assim, o que se verifica é que a Culpabilidade limita a aplicação da pena evitando


arbitrariedades, desproporcionalidades e excessos do poder punitivo.

Neste ponto, importa destacar que a Constituição Federal de 1988 em seu artigo 5º,
incisos XLV e XLVI, determina como Direitos Fundamentais a personalização e a
individualização da pena.
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O Princípio da Personalização da Pena pode ser entendido como a impossibilidade de


punir-se determinado agente por fato ilícito por ele não praticado. Ou seja, apenas aquele que
comente determinada conduta, tida como ilícita, poderá por ela responder. Dessa forma,
afirma-se, sem maiores dificuldades, que a responsabilidade penal é subjetiva e pessoal
decorrendo apenas de sua ação ou omissão, não sendo admitida nenhuma outra forma ou
espécie.

Da mesma forma, o Princípio da Individualização da Pena prescreve que o julgador


se encontra obrigado a aplicar a pena e a determinar a forma de sua execução conforme a
cominação legal. Aqui, deve-se ter sempre em destaque a proporcionalidade e adequação da
sanção em face da magnitude e gravidade da ação delitiva.

Assim, percebe-se que a própria Constituição Federal vincula a aplicação do Direito


Penal à Culpabilidade.

Ao determinar que a pena deverá ser aplicada tão somente àquele que praticou um
ato tido como ilícito e que a mesma deverá ser arbitrada na medida da extensão da lesão do
bem jurídico protegido, nada mais impõe que a pena seja fundamentada e limitada pela
própria Culpabilidade.

Ademais, impende destacar também que, dentre os critérios de dosimetria da pena, o


artigo 59 do Código Penal estabelece a verificação da Culpabilidade, entre outros, para se
chegar à exata fixação da sanção.

No que tange à fixação da pena, o Código Penal Brasileiro adotou o Sistema da


Relativa Determinação, no qual, segundo Luiz Regis Prado (PRADO,2008, p. 575) “[...] a
individualização legislativa é complementada pela judicial, ou seja, a pena se encontra
determinada no que concerne às espécies e seu quantitativo, cabendo ao juiz, observando
seus limites mínimo e máximo, fixá-la discricionariamente. ”

Em que pese possuir o julgador discricionaridade para a fixação da pena, certo é que
referida liberdade não é absoluta, devendo o mesmo sempre observar as limitações
estabelecidas pelo próprio ordenamento. E, dentre estas, encontra-se a Culpabilidade.

Dessa forma, em que pese a imposição de uma pena àquele que pratica um ato ilícito,
quando da sua aplicação, o juiz deverá, obrigatoriamente, levar em consideração a
Culpabilidade do acusado para que a sanção seja aplicada de forma proporcional, correta e na
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medida de sua culpabilidade, conforme preceitua o artigo 59 do Código Penal (BRASIL,


1940).

Pode-se verificar, portanto, que foi adotada pelo ordenamento jurídico uma postura
garantista, centralizada na concepção de ser humano e na eficácia normativa dos direitos
fundamentais.

Assim, o Princípio da Culpabilidade além de efetivar o sentimento de justiça, garante


a consciência de que nada será castigado mais severamente do que o merecido àquele que
praticou um fato ilícito, sendo justa a pena somente quando respeitada a exata medida de sua
culpabilidade.

Prevendo a legislação penal as sanções possíveis de serem aplicadas aos sujeitos que
comentem injustos, e também, estabelecendo os parâmetros para a correta aplicação da
quantidade da pena, à liberdade do julgador impõe-se a limitação de assim o fazer tomando-se
como base a proporcionalidade e a culpabilidade do sujeito. Assim, a Culpabilidade não só
limita a aplicação da pena, como também, exerce o importante papel de medida de equilíbrio
entre a necessidade de reprovação penal pelo cometimento de um injusto e o direito do ser
humano de ser individualmente considerado para este fim.

O que se verifica, portanto, é que Culpabilidade não só fundamenta a aplicação da


Pena como sanção, mas também a limita evitando-se a censura desproporcional de um injusto.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Diário


Oficial da União. Brasília. 05 de Outubro de 1.988.

BRASIL. Decreto-Lei nº 2.848, de 07 de Dezembro de 1940. Código Penal. Diário Oficial da


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