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MARÇO 2023 24ª EDIÇÃO

R E V I S T A
Foto: Lula Marques/ Agência Brasil

O que Sergio Moro fez


contra o crime organizado
para virar alvo do PCC

Plano de Boulos acatado Luciano Trigo: ‘Geração


por Lula ameaça milhões idiota’ reúne jovens de todas
de brasileiros sem esgoto as idades
Índice

Editorial: O misterioso arcabouço fiscal 03

Diogo Schelp: Se Putin vier ao Brasil, terá de ser


12
preso e extraditado. E agora, Lula?

Luciano Trigo: ‘Geração idiota’ reúne jovens de


18
todas as idades

O que Moro fez contra o crime organizado para


30
virar alvo do PCC

Plano de Boulos acatado por Lula ameaça 94


41
milhões de brasileiros sem esgoto tratado

Droga mais mortífera dos EUA chega ao Brasil


54
pela primeira vez

Minissérie narra saga de estudante que tentou


64
ganhar jato militar numa promoção

💡 USUÁRIO DE ANDROID: PARA NAVEGAR UTILIZANDO OS


LINKS DE PÁGINA VOCÊ PRECISA DO APP ACROBAT READER
3

Ministros Fernando Haddad e Simone Tebet apresentaram detalhes do novo


arcabouço fiscal a Lula.| Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

| Editorial

O misterioso arcabouço fiscal


Após fazer suspense, o ministro da Fazenda,
Fernando Haddad, entregou ao presidente da
República o projeto do chamado “arcabouço
fiscal”, com as diretrizes e medidas de gestão
das contas públicas. Segundo o ministro, as
medidas se destinam a manter as contas do
governo sob controle, para que os resultados
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fiscais sejam adequados à saúde da economia


brasileira e ao crescimento do Produto Interno
Bruto (PIB). Na reunião de sexta-feira, dia 17, o
presidente Lula pediu que Haddad negocie com
os presidentes da Câmara, Arthur Lira (PP-AL),
e do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG).
Mesmo assim, Haddad mantém a promessa de
que o texto será finalmente divulgado ainda
nesta semana, embora seus termos sigam
mantidos a sete chaves, a ponto de gerar muitas
críticas de parlamentares.

Duas questões emergem logo de saída em


relação ao documento. A primeira é a
denominação, já que a palavra “arcabouço”
significa estrutura ou conjunto do que é
necessário para a construção de algo, o que
permite deduzir que o ministro submeteu ao
presidente as definições sobre a política fiscal e

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a lista de medidas a serem tomadas no âmbito


da arrecadação tributária e dos gastos públicos.

A segunda questão diz respeito à situação criada


pelo próprio governo, mais especificamente
pelo presidente Lula, que desde a campanha
eleitoral vinha se colocando contra o teto de
gastos, contra a independência do Banco
Central e contra o equilíbrio das contas fiscais
enquanto, dizia ele, houver pobres no país. As
falas e ações de Lula quando candidato, quando
presidente eleito e já depois da posse – entre
elas, a pressão pela revogação do teto de gastos
aprovado no governo Michel Temer para
controlar os déficits fiscais – seguiram em
direção oposta ao controle do déficit e à
austeridade na gestão das contas do governo.
Por isso, a sociedade já deduziu das falas de Lula
que o governo pode acabar aumentando a dívida
pública e, também, os impostos, como já

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ocorreu com o retorno da tributação sobre


combustíveis e a instituição de um imposto
sobre exportações de petróleo.

Infelizmente, é bastante plausível o


cenário em que Lula cumpra seu
discurso e parta para o pior
caminho ao aumentar gastos e
impostos, gerar mais déficit,
expandir a dívida pública e tentar
de algum modo baixar a taxa de
juros na marra

Haddad pode até tentar emitir sinais de que


pretende gerir com responsabilidade a política
fiscal, sobretudo controlar os gastos, não
permitir a explosão da dívida pública e não
aumentar os impostos, ou aumentá-los de
forma moderada em setores específicos. O
problema está nas falas de Lula e nas primeiras

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medidas do governo, que estão levando os


agentes econômicos a não acreditar em
moderação do governo e até mesmo apostando
que o Planalto pode vir a criar o pior dos
mundos, com aumento de gastos, aumento de
impostos, elevação do déficit fiscal e aumento
da dívida pública. Se isso ocorrer, duas
consequências diretas certamente aparecerão:
crescimento da inflação e elevação da taxa de
juros, cujo cenário desaguaria, como sempre,
em queda do produto nacional, aumento do
desemprego e, por óbvio, mais pobreza e mais
miséria.

Infelizmente, é bastante plausível o cenário em


que Lula cumpra seu discurso e parta para o pior
caminho ao aumentar gastos e impostos, gerar
mais déficit, expandir a dívida pública e tentar
de algum modo baixar a taxa de juros na marra.
Quanto aos juros, o mercado vem reagindo com

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pessimismo e o próprio Banco Central, ao


manter elevada a taxa Selic, demonstra não
acreditar em gestão austera e responsável.
Sempre vale lembrar que, se o governo
promover a explosão dos gastos públicos, as
saídas para cobrir o rombo são sempre as
mesmas: mais impostos, mais dívidas e emissão
de moeda circulante, medidas que levam a mais
inflação e juros mais altos.

O mistério gira em torno inclusive dos


indicadores que seriam usados para se criar o
novo mecanismo fiscal: dívida pública,
superávit primário, arrecadação, despesas etc.
Especificamente quanto à Dívida Bruta do
Governo Geral (DBGG), seu total atingiu R$ 7,2
trilhões em dezembro do ano passado, o
equivalente a 73,5% do Produto Interno Bruto
(PIB) de 2022. Há os que julgam não ser um
problema o aumento da dívida pública como

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proporção do PIB, sob o argumento de que


muitos países têm dívida do governo em
porcentuais bem maiores que o Brasil. Ocorre
que esse dado não pode ser analisado
isoladamente, mas deve considerar o tamanho
da poupança nacional depositada no sistema
financeiro e que forma os fundos disponíveis
para empréstimos a pessoas, empresas e
governo, bem como as necessidades de crédito
do setor privado compatíveis com aumento do
PIB. Quanto mais dinheiro é tomado pelo
governo, menor é o volume disponível para
financiar o setor produtivo privado, o que
resulta sempre em elevação da taxa de juros e
redução do crescimento econômico.

Adicionalmente, há um problema que é


característico do Brasil e de economias pobres e
com alto déficit de infraestrutura. Trata-se da
necessidade urgente de aumentar gastos

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nacionais na recuperação da deteriorada


infraestrutura física existente e na ampliação
dessa mesma infraestrutura – sobretudo
energia, transportes, portos, armazenagem,
portos, aerportos etc. A isso devem ser somadas
as necessidades da infraestrutura social –
escolas, hospitais, postos de saúde, creches,
instituições assistenciais etc. – e dos
investimentos nas cidades para destravar o
congestionado sistema de circulação e de
transporte coletivo. Diante desse quadro, o
aumento de gastos provoca males mais graves
que os já citados caso tenham por base o
inchaço da máquina estatal, aumento da
burocracia e expansão dos gastos com custeio,
aumento de salários e benefícios do
funcionalismo no âmbito dos três poderes.

Em resumo, o arcabouço fiscal do ministro da


Fazenda é um enigma, tanto por ser

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desconhecido em seus detalhes como por


ninguém saber o que sairá do gabinete do
presidente da República. O melhor programa de
governo é aquele que promove estabilidade dos
preços, confiança dos investidores e condições
para a meta maior: o crescimento do PIB e, com
ele, o aumento do nível de emprego, renda e
impostos. Fora disso, a chance de a política
econômica tornar-se um desastre é enorme.

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Diogo Schelp

Putin discursa para a Assembleia Federal e anuncia medidas para militarizar


mais o país| Foto: EFE/EPA/DMITRY ASTAKHOV / SPUTNIK / GOVERNMENT

Se Putin vier ao Brasil, terá de


ser preso e extraditado. E agora,
Lula?
O Tribunal Penal Internacional (TPI), com sede
em Haia, na Holanda, expediu na última
sexta-feira (17) um mandado de prisão contra o

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ditador russo Vladimir Putin por suspeita de ser


o responsável pela deportação de crianças para
a Rússia durante a tentativa de invasão da
Ucrânia, o que configura crime de guerra. É
óbvio que o Estado russo não vai prender e
extraditar seu próprio chefe, mas se ele pisar
em qualquer país que reconhece a jurisdição do
TPI, as forças de segurança e a Justiça locais
terão de fazê-lo. Esse é o caso do Brasil.

O Brasil assinou o Estatuto de Roma, que criou o


TPI, em 2000 e o Congresso Nacional ratificou o
tratado em 2002. Se Vladimir Putin resolver
visitar o Brasil a qualquer momento a partir de
agora, o governo Lula, por meio da Polícia
Federal, será obrigado a prendê-lo e o Supremo
Tribunal Federal (STF) terá de decidir pela sua
extradição para Haia. Caso contrário, o Brasil
estará violando um tratado internacional que
assinou e ratificou e que, portanto, tem força de

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lei nacional. Ou seja, Lula pode visitar a Rússia


(o Kremlin fez o convite no dia da sua posse),
mas Putin não pode visitar o Brasil.

Lula, presidente de um país com a


obrigação de prender Putin caso
tenha a oportunidade, vai aceitar
posar ao seu lado?

Do ponto de vista prático, é simples. Putin não


vai fazer a besteira de visitar qualquer país (são
123, no total) que tenha a obrigação de
prendê-lo e extraditá-lo para ser julgado no TPI
por crimes de guerra. Visitas ao Brasil,
portanto, estão fora de cogitação.

Aliás, Putin já tem evitado as viagens


internacionais por causa da sanções que estão
sendo impostas a ele pelos Estados Unidos e por
países europeus. Desde o início da guerra na
Ucrânia, há pouco mais de um ano, o tirano

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russo só visitou um país que fica fora da esfera


direta de influência russa, ou seja, que não fez
parte da União Soviética: o Irã. E o país persa,
além de não reconhecer a autoridade do tribunal
de Haia, não tem motivo algum para extraditar
um inimigo dos Estados Unidos. Na verdade,
está ajudando a Rússia com armamentos.

Do ponto de vista diplomático, porém, cria-se


uma complicação para Lula. A Rússia é
integrante do Brics, o grupo de países
emergentes composto também por Brasil,
China, Índia e África do Sul. O Brasil já tem se
equilibrado com dificuldade numa posição de
neutralidade, condenando oficialmente a
incursão militar russa na Ucrânia, mas
opondo-se à adoção de sanções contra o país.

A diplomacia lulista, idealizada por Celso


Amorim, aposta bastante no fortalecimento do

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Brics, e um encontro de Lula com Putin em uma


cúpula do grupo é inevitável. Agora que Putin
está sendo oficialmente procurado por crimes
de guerra por um tribunal cuja autoridade é
reconhecida pelo Brasil, porém, qualquer cena
de Lula apertando sorridentemente a mão de
um acusado de sequestro de criancinhas vai ser
algo absolutamente constrangedor, para dizer o
mínimo.

Os russos já estão há algum tempo de olho no


Tribunal Penal Internacional e até já tentaram
usar o Brasil para espioná-lo. No início deste
ano, a Polícia Federal transferiu para um
presídio de segurança máxima um russo que
usou um passaporte brasileiro falso para tentar
se infiltrar no TPI como estagiário. O espião
russo chegou ao Brasil em 2010 e usou os
documentos falsos em missões na Irlanda e nos

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Estados Unidos. Detido na Holanda no ano


passado, ele foi deportado para o Brasil.

As chances de que Putin venha de fato, algum


dia, a sentar nos bancos dos réus de Haia são
próximas de zero. Mas a recente decisão do TPI
coloca um enorme letreiro em sua testa, a de
"foragido por crime de guerra". Lula,
presidente de um país com a obrigação de
prender Putin caso tenha a oportunidade, vai
aceitar posar ao seu lado?

Autor: Diogo Schelp, jornalista, foi editor executivo da revista Veja, onde
trabalhou durante 18 anos. Fez reportagens em quase duas dezenas de países e é
coautor dos livros "Correspondente de Guerra" (Editora Contexto), finalista do
Prêmio Jabuti 2017, e "No Teto do Mundo" (Editora Leya). **Os textos do
colunista não expressam, necessariamente, a opinião da Gazeta do Povo.

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Luciano Trigo

| Foto: Reprodução Instagram

‘Geração idiota’ reúne jovens de


todas as idades
Mesmo estando longe de concordar com todas
as suas teses, um dos raros canais que
acompanho no YouTube é o do conferencista
argentino Agustín Laje. Coautor de O livro negro
da nova esquerda: Ideologia de gênero ou

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subversão cultural e autor de La batalla cultural:


Reflexiones críticas para uma nueva derecha
(este ainda não traduzido no Brasil), ele é
fundador e presidente da Fundación Libre, um
think tank de ideologia conservadora.

Por suas críticas à agenda progressista,


sobretudo quando esta agenda envolve a
infância e a ideologia de gênero, Laje se envolve
periodicamente em duras controvérsias – e
sofre as consequências e acusações de sempre.
Seu crime é fazer declarações politicamente
incorretas que são percebidas como ofensivas e
discriminatórias, como: “Homofobia é uma
construção idiomática de caráter pejorativo
para desacreditar todo aquele que opina que um
homem vestido de mulher não é uma mulher”.

Naturalmente, a reação dos ofendidos não é


debater nem argumentar, mas tentar silenciar

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na base da censura moral, carimbando na testa


de Agustín Laje o rótulo de “extrema-direita”.
O carimbo funciona mais ou menos como uma
senha, um recado para as milícias do bem: eis
aqui mais um alvo a ser perseguido, cancelado,
esfolado e abatido, nas redes sociais e fora
delas.

Nenhuma novidade até aqui: esse truque está


tão manjado que já está pegando mal mesmo
entre alguns progressistas, para quem começa a
cair a ficha de que fizeram papel de bobos ao
acreditar que o amor venceu, ou que democracia
se defende com censura e outras práticas
comuns às piores ditaduras.

Pois bem, contra a narrativa hegemônica ora


em curso – que une de forma inédita bilionários
e a extrema-esquerda, o Judiciário e a grande
mídia – Agustín Laje acaba de lançar um novo

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livro: Generación idiota: Uma crítica al


adolescentrismo.

O autor não se refere a uma geração específica,


mas a um comportamento adolescente, hoje
comum a jovens, adultos e até mesmo idosos.
Porque as fronteiras, outrora claras, entre
adolescentes e pessoas maduras – Nelson
Rodrigues dizia que os jovens só devem ser
levados a sério quando ficam velhos – se
dissiparam completamente, em meio à névoa
onipresente da lacração. A idiotice se
democratizou: hoje qualquer pessoa tem o
direito de ser idiota, não importa a idade.

Não era Marx quem dizia que no


socialismo era assim que as coisas
iam funcionar: “a cada um segundo
suas necessidades”? A geração
idiota acreditou

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Todos aqueles que participam alegremente


dessa “geração idiota” parecem estar viciados
na adrenalina do cancelamento, e esta
adrenalina os impede de enxergar a armadilha
óbvia em que caíram: em nome da defesa da
diferença, lutam para destruir toda e qualquer
diferença, da diferença entre os sexos à
diferença de opinião – e, por fim, à diferença
entre as gerações, que agora se confundem em
uma única trans-geração, na qual todos se
unem e se confundem na mesma idiotice.

A consequência desse processo,


paradoxalmente, é que nunca se falou tanto em
tolerância, mas nunca se exerceu tanto a
intolerância; e, quanto mais se fala em amor,
mais ódio se pratica.

Segundo o autor, a mensagem que prevalece


hoje é que eu posso ser adolescente, mesmo

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sendo velho, da mesma maneira que eu posso


ser mulher, mesmo sendo homem, ou posso ser
homem, mesmo sendo mulher. Porque tudo que
importa é a autopercepção: eu sou o que eu
sinto que sou. É o cogito cartesiano adaptado à
era da lacração: sinto, logo sou.

Laje desmonta esse truque de forma cristalina,


com um exemplo hipotético. O fato de uma
adolescente já muito magra continuar a
emagrecer por se perceber gorda – por sofrer de
bulimia, anorexia ou algum distúrbio do tipo –
não muda o fato de que ela está cada vez mais
magra, e que isso pode ser perigoso para a sua
saúde.

Mas, pela lógica da geração idiota, os pais dessa


moça hipotética deveriam estimulá-la a fazer
uma dieta para emagrecer ainda mais, uma vez
que, se ela se sente gorda, ela é gorda – da

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mesma maneira que, se um homem de 130


quilos se sente uma delicada bailarina de 40
quilos, ele é uma bailarina de 40 quilos – e ai de
quem discordar ou ousar negar a ele uma vaga
na companhia de dança.

A esta geração também foi ensinado que desejos


são direitos. A responsabilidade por minha
infelicidade, pelas minhas derrotas e fracassos,
nunca é minha: a responsabilidade será sempre
dos meus pais – ou desse substituto imaginário
de pais ausentes, o Estado provedor.

Não era Marx quem dizia que no


socialismo era assim que as coisas
iam funcionar: “a cada um segundo
suas necessidades”? A geração
idiota acreditou. Ora, quem não
quer ter todas as suas necessidades
satisfeitas pelo Estado, sem precisar

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se esforçar nem correr atrás? A


liberdade é um preço até baixo a
pagar por esse paraíso, tá valendo.

Uma geração que cresceu soltando pipa no


ventilador e jogando bolinha de gude no carpete
não foi preparada emocionalmente para
enfrentar o mundo real

Falando em geração idiota, por coincidência


ontem um colunista do jornal O Globo publicou
um artigo intitulado “Jovens de esquerda
tendem mais à depressão, segundo estudo”
(subtítulo: “Eles seriam mais sensíveis e mais
impactados pelas mazelas do mundo”).

O estudo existe, é sério e não me surpreende em


nada. Uma geração que cresceu soltando pipa no
ventilador e jogando bolinha de gude no carpete
– isso quando chegaram a ver “pessoalmente”
uma pipa ou uma bolinha de gude, porque a

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maioria nem isso – não foi preparada


emocionalmente nem psicologicamente para
enfrentar o mundo real.

Transcrevo abaixo alguns trechos da coluna em


questão:

“O estudo, publicado na revista 'SSM Mental


Health', apontou uma correlação intrigante entre a
identidade política dos adolescentes e uma escala
que mede depressão. Estudantes do último ano do
ensino médio (17 e 18 anos) que se identificam
como 'liberais' (na tradição americana, de
esquerda) têm pontuação média
significativamente maior na escala que mede
depressão do que aqueles que se identificam como
'conservadores'. (...)

“O debate produziu dois tipos de explicação. A


primeira acredita que os jovens de esquerda

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adoecem mais porque são mais sensíveis e mais


impactados pelas mazelas do mundo. (...)

"A colunista do jornal 'The New York Times'


Michelle Goldberg logo percebeu que a hipótese
dos autores do estudo não era muito consistente
com os dados. (...) O maior índice de depressão
entre adolescentes de esquerda não pareceu ser
afetado pela mudança de governo, permanecendo
mais elevado tanto no governo progressista de
Barack Obama como no governo conservador de
Donald Trump. (...)'

“A tese dos autores também despreza que seria


igualmente razoável esperar descompasso entre
valores e percepção do mundo entre os
adolescentes conservadores, já que, no
entendimento desse grupo, eles é que estão
deslocados num mundo controlado por elites

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progressistas que destroem a família convencional


e os valores americanos tradicionais. (...)

“A segunda linha de interpretação, capitaneada


pelo psicólogo social Jonathan Haidt, tenta explicar
o adoecimento dos jovens de esquerda pela política
progressista contemporânea, que, diz ele, estimula
a sensibilidade diante de pequenas agressões e
enxerga simples ofensas como grandes e
insuportáveis violências.”

Ora, o aumento cada vez mais evidente da


depressão, ansiedade e outros distúrbios entre
adolescentes – que já ganham contornos de
pandemia – é uma consequência natural desse
experimento social cruel que transforma todos
em vítimas e cobradores de direitos, sem
desenvolver qualquer senso de dever ou
responsabilidade. E isso só vai piorar. As

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consequências a gente está deixando pra ver


depois.

Pode até dar algum prazer a curtíssimo prazo


acreditar que, para ser feliz, basta lacrar, exibir
virtude, exigir direitos e apontar o dedo. Mas,
com o tempo, esses jovens vão descobrir – já
estão descobrindo – que vitimismo não leva a
lugar nenhum – e que aqueles que os fizeram
investir no papel de vítimas vão virar as costas
quando os boletos começarem a chegar e os
problemas reais aparecerem. Vocês estão sendo
enganados, bobinhos.

Autor: Luciano Trigo é escritor, jornalista, tradutor e editor de livros. Autor de 'O
viajante imóvel', sobre Machado de Assis, 'Engenho e memória', sobre José Lins
do Rego, e meia dúzia de outros livros, entre eles infantis.**Os textos do
colunista não expressam, necessariamente, a opinião da Gazeta do Povo.

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Operação da PF descobriu que PCC planejava homicídios e extorsão mediante


sequestro contra o senador Sergio Moro e outras autoridades ligadas ao combate
ao crime| Foto: Pedro França/Agência Senado

O que Sergio Moro fez contra o


crime organizado para virar
alvo do PCC
Por Gabriel Sestrem

Um dos alvos dos atentados planejados pelo


Primeiro Comando da Capital (PCC), maior
organização criminosa do Brasil dedicada ao
narcotráfico e a uma série de outros crimes
violentos, o senador Sergio Moro (União

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Brasil-PR) é um antigo desafeto do crime


organizado. A Polícia Federal (PF) cumpriu, na
quarta-feira (22), 11 mandados de prisão e 24 de
busca e apreensão em quatro estados contra a
facção criminosa que, além de atingir Moro,
pretendia realizar ataques contra outras
autoridades.

Um dos principais episódios que provocou a ira


de facções como o PCC e o Comando Vermelho
foi a determinação de Moro em fevereiro de
2019, quando ocupava o posto de ministro da
Justiça no governo de Jair Bolsonaro, de isolar
lideranças de facções em presídios federais.

Ao longo daquele ano, diversas lideranças de


organizações criminosas, várias do PCC, foram
transferidas para presídios federais de
segurança máxima, onde a rotina é mais rígida e

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não há possibilidade de comunicação com o


exterior.

Um dos transferidos foi Marcos Willians Herbas


Camacho, o Marcola. O criminoso, condenado a
mais de 350 anos de prisão pelo cometimento de
uma série de crimes como formação de
quadrilha, roubo, tráfico de drogas e homicídio,
é a principal liderança do PCC. Antes da
transferência para a Penitenciária Federal em
Porto Velho, Marcola comandava crimes de
dentro da Penitenciária 2 de Presidente
Venceslau, administrada pelo governo de São
Paulo. Em janeiro, o criminoso foi deslocado
para o Presídio Federal de Brasília após suspeita
de um plano de fuga para libertá-lo.

Além de Marcola, ao todo foram transferidos


para presídios federais mais de 320 líderes de
facções como resultado da decisão de Moro. A

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ordem do ex-ministro foi um duro golpe no


crime organizado e causou uma confusão
generalizada nos comandos das facções.

O impacto da medida foi abordado em conversas


telefônicas entre lideranças do PCC
interceptadas pela Polícia Federal em 2019. Na
ocasião, Alexsandro Pereira, conhecido como
Elias, acusa o golpe. “Nós tiramos a liderança.
Vai dar uma balançada, porque outros vão ter
que assumir o lugar daqueles que saíram, mas
só que também tem um ponto de interrogação.
Quem vai assumir no lugar daqueles que saíram
não tem a autonomia do que os que saíram
tem”.

Em outra conversa, Elias critica a conduta do


governo anterior contra o crime organizado e
chega a citar proximidade do grupo com
membros do Partido dos Trabalhadores (PT).

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“Os caras começou o mandato agora, irmão.


Agora que eles começou o mandato já mexendo
diretamente com a cúpula, irmão. Com quem
está na linha de frente. Então se os caras já
começou mexendo com quem está na linha de
frente, já entraram falando o que? ‘Com nós já
não tem diálogo não, mano. Se vocês estavam
tendo diálogo com outros que estavam na
frente, com nós não vai ter diálogo’”, afirmou o
criminoso.

“Esse Moro aí, esse cara é um filho da puta, esse


cara é um filho da puta mesmo, mano. Ele veio
pra atrasar. Ele já começou a atrasar quando
veio para cima do PT. Para você ver que o PT
com nós tinha diálogo. O PT tinha um diálogo
com nós cabuloso, mano”.

A ordem de transferência era bastante ousada,


já que as retaliações são comuns após esse tipo

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de medida. Uma decisão do governo de São


Paulo, em 2006, de deslocar lideranças do PCC
para o presídio de segurança máxima de
Presidente Venceslau, no interior do estado,
provocou uma onda inédita de violência com
ataques orquestrados contra civis e agentes de
segurança. Os ataques resultaram em 564
pessoas mortas, incluindo dezenas de policiais.
Apesar disso, a desestruturação da comunicação
dos líderes do grupo criminoso impediu que
ataques massivos de retaliação fossem
executados.

Mudanças nas regras de visitas íntimas para


faccionados e pacote anticrime

Outra medida executada sob a gestão de Sergio


Moro como ministro da Justiça foi a edição de
portaria que tornou mais rígidas as regras para
visitas sociais em prisões federais de segurança

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máxima. As visitas, anteriormente presenciais


nos pátios de visitação, passaram a ser
permitidas apenas para presos com perfil de réu
colaborador ou delator premiado, enquanto os
demais passaram a ter contato restrito ao
parlatório e à videoconferência. Em outras
palavras, presos perigosos que se negassem a
colaborar com a Justiça perderam qualquer tipo
de contato presencial com pessoas de fora dos
presídios.

Já as visitas íntimas nos presídios federais


haviam sido proibidas durante o governo Michel
Temer. A portaria que trouxe essa determinação
é alvo de questionamentos diversos no Superior
Tribunal Federal (STF), uma delas protocolada
por uma ONG acusada de ligação com o
narcotráfico.

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Um outro golpe ao crime organizado que teve


origem a partir de atuação de Sergio Moro foi o
pacote anticrime, que entrou em vigor no início
de 2021 após aprovação do Congresso Nacional.
As mudanças, cujo objetivo foi o endurecimento
no combate à corrupção, ao crime organizado e
a crimes violentos, foram propostas por Moro
enquanto era ministro de Bolsonaro.

Algumas das medidas aprovadas que impactam


diretamente membros de facções criminosas
são o aumento do prazo máximo em que presos
considerados perigosos podem ficar isolados
em presídios federais, que passou de 360 dias
para três anos, renováveis por mais três; a
ampliação do tempo de cumprimento de prisão
para que membros de facções tenham acesso à
progressão de pena; o aumento do tempo
máximo de cumprimento de prisão no Brasil,
que passou de 30 para 40 anos para qualquer

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tipo de crime; e a vedação das saídas


temporárias dos presídios em datas festivas
para condenados por crimes hediondos.

Para Rogério Greco, especialista em segurança


pública e crime organizado, pós-doutor em
Direito e atual secretário de Justiça e Segurança
Pública de Minas Gerais, o plano de atentado
contra Moro pode representar retaliação por
uma série de medidas do ex-ministro contra o
crime organizado. Ele destaca, entretanto o
isolamento das lideranças do PCC, em especial a
de Marcola.

“O isolamento é uma medida muito importante,


porque de fato isola de qualquer comunicação.
Não tem mais contato com outros presos, fica
22 horas na cela com duas horas de banho de
sol. Acaba aquela coisa da organização
criminosa de dentro da cela. O contato com o

Gazeta do Povo Revista – Ed.24 Março/2023


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mundo exterior é muito mais limitado”, explica.


“Para o criminoso é horrível, porque ele quer
contato com todo mundo para manter a
comunicação com o lado de fora, quer acesso a
celular. Mas na penitenciária federal isso não
acontece”, prossegue Greco.

Operação da PF

Em investigações da Operação Sequaz, agentes


da PF descobriram que o PCC pretendia cometer
crimes como homicídios e extorsão mediante
sequestro no Distrito Federal e nos estados do
Paraná, São Paulo, Mato Grosso do Sul e
Rondônia. Segundo a PF, os ataques ocorreriam
de forma simultânea, e os principais
investigados estão no Paraná e em São Paulo.
Pelo menos nove pessoas foram presas.

Além do ex-ministro, outras autoridades


ligadas ao combate ao crime eram alvo da

Gazeta do Povo Revista – Ed.24 Março/2023


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facção, como o promotor de Justiça Lincoln


Gakiya, que atua há anos em investigações
sobre a atuação do PCC.

Pelo Twitter, o senador anunciou que na tarde


desta quarta-feira (22) fará um
pronunciamento na tribuna do Senado para
comentar o caso.

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O presidente Lula (PT) e o deputado federal Guilherme Boulos (PSOL-SP).| Foto:


Nelson Almeida/AFP

Plano de Boulos acatado por Lula


ameaça 94 milhões de brasileiros
sem esgoto tratado
Por Leonardo Desideri

O governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) tem


indicado que quer frear um dos principais avanços
sociais dos últimos anos no Brasil: a implemen-
tação do marco do saneamento, aprovado em julho
de 2020 com metas ambiciosas para garantir a

Gazeta do Povo Revista – Ed.24 Março/2023


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universalização do esgoto tratado e da água potável


até 2033. Declarações recentes de Rui Costa,
ministro da Casa Civil, revelam a intenção de
modificar pontos cruciais da lei, por meio de um
novo decreto cuja publicação está prevista para os
próximos dias.

As falas de Rui Costa vão ao encontro de uma


tendência que o PT já vinha sinalizando desde o fim
de 2022, quando o partido deu protagonismo ao
deputado federal Guilherme Boulos (PSOL-SP) na
discussão sobre saneamento básico do gabinete de
transição.

Boulos é avesso ao marco do saneamento em


pontos como a exigência de licitação para firmar
contratos, a atuação de uma agência federal para a
regulação do setor – como é o caso da Agência
Nacional de Águas e Saneamento Básico (Ana) – e a
ênfase na participação do setor privado para a

Gazeta do Povo Revista – Ed.24 Março/2023


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melhoria dos serviços. Antes do marco, as


prefeituras podiam fechar contratos sem licitação
com empresas estatais de saneamento, o que
favorecia a manutenção de privilégios dessas
empresas e o afrouxamento das metas de
atendimento à população.

A falta de saneamento básico é uma das principais


tragédias sociais do país. No último diagnóstico
feito pelo Sistema Nacional de Informações sobre
Saneamento (Snis), com dados de 2020, 94,1
milhões de brasileiros ainda não tinham acesso a
redes de esgoto, e 35 milhões estavam sem água
tratada. O quadro é especialmente grave nas
regiões Nordeste e Norte.

Entre as causas da persistência desse problema ao


longo das décadas estão justamente a falta de
metas para as empresas de saneamento, a
existência de contratos irregulares e a ausência de

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padronização do corpo regulatório do setor. Em


alguns municípios, a concessão é feita a
companhias sem capacidade técnica ou econômica
comprovada para a prestação dos serviços.

Marco acabou com privilégios de estatais do


saneamento e atraiu investimentos

O marco do saneamento tentou resolver os proble-


mas mencionados com uma série de medidas:
proibindo contratos sem licitação para empresas de
tratamento de água e esgoto; estabelecendo metas
de desempenho para essas empresas; atribuindo a
uma agência federal, a Agência Nacional de Águas e
Saneamento Básico (Ana), o papel de regulação do
setor; criando blocos regionais para a administra-
ção do saneamento em vez de municipalizar a
questão (em muitos casos, um mesmo rio pode
cortar diversos municípios, o que justifica a
regionalização do serviço); e estimulando a

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concorrência entre empresas do setor, sejam elas


privadas ou estatais, por meio das licitações.

"O grande mérito do marco é exatamente tentar


estabelecer um prazo para que se universalize de
fato esse serviço à população", diz o especialista
em saneamento Luiz Firmino, pesquisador do
Centro de Estudos e Regulação em Infraestrutura
(Ceri) da Fundação Getulio Vargas (FGV). "Quando
você encontra cidades que estão com um prestador
de serviço que não tem nenhuma meta, não tem um
contrato regular assinado, nenhuma obrigação…
Como é que você pode esperar que o saneamento vá
avançar nessas condições? O que o marco tenta
fazer é acabar com esses casos".

Outro trunfo do marco, para Firmino, é regionali-


zar o saneamento em vez de municipalizar a ques-
tão. "Primeiro, você tem um problema ambiental:
um rio corta um município e passa por mais dois,

Gazeta do Povo Revista – Ed.24 Março/2023


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três ou quatro até chegar ao estuário, por exemplo.


Vamos dizer que o município do estuário cumpra
sua parte, e os municípios de cima, não. Você vai ter
as águas e os rios que passam por aquele município
poluídos do mesmo jeito. O conceito de regionalizar
leva a olhar forma integrada a questão ambiental e
a questão econô- mica. Quanto mais escala você
der ao serviço, melhor. Você otimiza a
infraestrutura das estações de tratamento para ter
um resultado melhor", explica.

As medidas têm surtido efeito. O marco atraiu o


interesse das empresas em investir no saneamento
no Brasil. Em 2022, por exemplo, houve um
aumento significativo de 15% nos investimentos.
As ideias do novo governo, no entanto, podem
ameaçar algumas dessas novidades e afugentar
especialmente o setor privado.

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Costa já deixou claro algumas vezes, por exemplo,


que é contra a regulação dos contratos por uma
agência nacional. "A Ana é agência para regular o
uso da água em rios federais. Rios estaduais cabem
à agência estadual", afirmou recentemente,
segundo a Agência Infra. "Onde é que está definido
que uma agência federal de água vai fazer norma de
referência de licitação de água ou de esgoto de uma
cidade ou de um estado? Onde tem isso? O poder
concedente é o município", acrescentou.

No começo de 2023, Lula revogou dois decretos do


ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) que regulamen-
tavam a lei de 2020. Ambos seguiam o mesmo
espírito das regras estabelecidas pelo marco. Um
deles exigia a comprovação da capacidade
financeira das empresas de saneamento; o outro
regulamentava alguns requisitos para o acesso a
recursos federais nessa área.

Gazeta do Povo Revista – Ed.24 Março/2023


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Também em janeiro, o governo Lula decidiu


sobrepor o papel regulatório da Ana previsto pelo
marco, com um decreto que atribui uma função
semelhante à Secretaria Nacional de Saneamento
Ambiental (SNSA) do Ministério das Cidades. Como
explica reportagem da Gazeta do Povo, o decreto
contraria o marco do saneamento, que previa esse
papel sendo exercido somente pela Ana. No ano
passado, quando integrava o gabinete de transição,
Boulos já havia afirmado que "é muito prejudicial
você ter uma agência reguladora, como a Ana, com
superpoderes e sem controle da sociedade".

Na visão de Firmino, a agência não tem "superpo-


deres". "A Ana está fazendo um trabalho muito
bom de forma técnica. As normas de referência são
sobretudo regras de contrato e regras tarifárias. Há
audiências públicas para discutir com a sociedade e
com especialistas quais são as melhores regras para
cada escopo. A Ana tem uma equipe muito boa e

Gazeta do Povo Revista – Ed.24 Março/2023


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está estruturando um setor de saneamento muito


capaz. Ela não vai ter superpoder, porque as
agências infranacionais e estaduais permanecem
com a sua autonomia total. O que a Ana vai tentar é
estabelecer regras mínimas para que todos tenham
como se balizar no que é de fato uma boa regulação,
uma boa contratação", comenta.

Para Firmino, uma das vantagens da atuação da


Ana é resolver os casos de agências reguladoras que
não têm a estrutura adequada para prestar os ser-
viços de saneamento à população. "Há reguladores
estaduais com câmaras de saneamento e de política
tarifária bem estruturadas, com equipes estudando
o assunto. Mas também existem, hoje, reguladores
municipais que estão dentro de um pequeno setor
da prefeitura sem qualquer estrutu- ra. Então, o
objetivo da Ana é criar parâmetros mínimos do que
seria adequado. Essas agências sem nenhuma
estrutura podem, numa canetada, mudar o valor da

Gazeta do Povo Revista – Ed.24 Março/2023


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tarifa, modificar uma meta preestabelecida… E aí


você não tem nenhuma segurança".

Para justificar a sua aversão ao marco, o governo


Lula já alegou a meios de comunicação que quer
"destravar os investimentos" na área, e que o
formato de regulação por meio de uma agência
nacional está "engessando" as empresas e
usurpando competências estaduais e municipais.

Mudanças diretas na lei que instituiu o marco do


saneamento precisariam passar pelo Congresso. A
depender da regulamentação do marco que o
governo pretenda fazer via decreto, no entanto,
algumas das conquistas do documento poderiam
ser desfiguradas.

A reportagem da Gazeta do Povo questionou o


Ministério das Cidades sobre a ideia de modificar o
marco do saneamento, mas a pasta não havia
respondido até o fim da tarde desta terça-feira (21).

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Ranking revela profunda desigualdade em


tratamento de esgoto no Brasil; marco poderia
ajudar a resolvê-la

Na segunda-feira (20), o Instituto Trata Brasil


publicou o Ranking do Saneamento 2023, pesquisa
anual sobre a situação dos maiores municípios
brasileiros em relação ao saneamento básico, em
aspectos como o acesso à água potável e o
tratamento de esgoto. O ranking pode ser acessado
neste link.

A profunda desigualdade entre as regiões Norte e


Nordeste e as regiões Sul e Sudeste foi o principal
problema observado, especialmente no que se
refere ao tratamento do esgoto.

"Há uma desigualdade muito grande do ponto de


vista de acesso ao saneamento básico quando a
gente olha as diferentes regiões do país", afirma
Luana Pretto, presidente do Trata Brasil.

Gazeta do Povo Revista – Ed.24 Março/2023


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Segundo ela, a motivação principal dessa grande


diferença é a disparidade no nível de investimento.
"Quando a gente vê as 20 cidades melhor
posicionadas, elas investiram R$ 166 por ano por
habitante em saneamento, enquanto as cidades que
estão nas piores posições investiram uma média de
R$ 55 por ano por habitante. A conclusão a que a
gente pode chegar é que sem investimento não há
avanço em saneamento básico, seja esse
investimento público ou privado", diz.

Para Luana, o marco do saneamento da forma


como está hoje poderia ajudar a resolver essa
desigualdade no tratamento do esgoto e no acesso à
água potável. "O marco traz algumas métricas,
como a necessidade de comprovação de capacidade
econômico-financeira. Ele estabelece que tais
empresas têm capacidade de universalizar
financeiramente tais e tais municípios. Ele joga luz
aos dados, para podermos entender qual é o cenário

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de saneamento em cada uma das regiões. Além


disso, ele dá segurança jurídica com as normas de
regulamentação sendo editadas por uma agência
nacional. Isso traz maior segurança para o aporte
de investimentos privados", comenta.

"A universalização do saneamento não vai


acontecer apenas com a empresa pública ou apenas
com a empresa privada, mas é importante haver
uma união de esforços para que se pense qual é a
melhor solução em cada uma das regiões do
Brasil", acrescenta.

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Fronteira em Tucson, no Arizona, usada para a travessia de pessoas e de drogas, como


o fentanil vindo da China, do México para os EUA| Foto: EFE/Paula Díaz

Droga mais mortífera dos EUA


chega ao Brasil pela primeira vez
Por Bruna Komarchesqui

A droga que mais mata nos Estados Unidos foi


apreendida pela primeira vez no Brasil, levantando
temores de que a substância responsável por uma
epidemia de overdoses na América se alastre pelo
país. No mês de fevereiro, a Polícia Civil do Espírito
Santo encontrou 31 frascos de fentanil (analgésico

Gazeta do Povo Revista – Ed.24 Março/2023


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cem vezes mais potente que a morfina) com um


fornecedor do tráfico em Cariacica, na Grande
Vitória. A principal linha de investigação supõe que
o medicamento esteja sendo usado para batizar
cocaína e outras drogas sintéticas, procedimento
comum também nos EUA.

A mistura é feita pelos cartéis para potencializar e


baratear as drogas, aumentando o lucro dos trafi-
cantes. Dessa forma, a maior parte de quem usa
fentanil não sabe disso, o que contribui para o
aumento de overdoses, já que o consumo de apenas
2 miligramas pode ser fatal para um adulto médio.
O baixo preço também é um dos fatores de
popularização da droga: uma dose chega a custar
menos de dois dólares, segundo estimativas.

Atualmente, a overdose é a principal causa de


morte de americanos entre 18 e 45 anos. Os dados
mais recentes mostram que a expectativa de vida

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no país teve a maior queda dos últimos 100 anos,


sendo o uso excessivo de drogas um dos fatores que
contribuíram para isso. Em 2021, os EUA registra-
ram mais de 107 mil mortes por envenenamento
decorrente do uso de drogas, sendo que, segundo o
Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC,
em inglês), quase 70% delas foram causadas por
opioides sintéticos como o fentanil. O número é
15% maior que as mais de 93 mil pessoas mortas
por overdose em 2020. Em 2019, haviam sido 71 mil
registros, o que representa um crescimento de 30%
em um ano. Duas décadas antes, em 1999, foram
pouco mais de 8 mil mortes por overdose.

Entre 2019 e 2021 os casos de morte de adolescen-


tes (entre 10 e 18 anos) por abuso de drogas mais
que dobrou no país (a média mensal de eventos
cresceu 109% em três anos). No ano passado, o
órgão federal de combate às drogas nos Estados
Unidos apreendeu 4.500 quilos de fentanil, o dobro

Gazeta do Povo Revista – Ed.24 Março/2023


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do ano anterior, e quantidade suficiente para matar


todos os 330 milhões de habitantes do país.

Como Chefe de Toxicologia Médica na Escola de


Medicina da Universidade de Massachusetts, a
médica Kavita Babu estudou o fentanil e seus
análogos durante anos. Ela conta que a entrada do
opioide no mercado de drogas americano foi iden-
tificada quando os casos de overdose explodiram.
“Em 2016, meus colegas e eu descobrimos que os
pacientes que chegavam ao pronto-socorro
relatando uma overdose de heroína geralmente
apresentavam apenas fentanil nos resultados dos
testes de drogas”, recorda. O uso do medicamento
na adulteração de outras drogas, tornou-o
“onipresente nos Estados Unidos”, transformando
o mercado de entorpecentes e aumentando as
estatísticas de mortes.

Por sua potência analgésica, o fentanil é usado na

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medicina para alívio imediato da dor, sedação ou


como anestesia para cirurgias. “Mesmo nas
condições controladas de um hospital, existe o
risco de que o fentanil reduza as taxas de respiração
a níveis perigosamente baixos, o que é a principal
causa de mortes por overdose de opioides”, explica
Babu.

Brasil

No Brasil, o fentanil é de uso exclusivo hospitalar.


Os frascos apreendidos no Espírito Santo foram
produzidos em Minas Gerais e seriam oficialmente
entregues a um hospital capixaba. A polícia ainda
investiga se houve desvio do material durante o
transporte ou se chegou a ser entregue à instituição
hospitalar e foi vendido para o tráfico depois disso.

Especialistas em segurança pública explicam que é


difícil prever se o fentanil passará a ser uma droga
dominante por aqui, como ocorre nos EUA. “É

Gazeta do Povo Revista – Ed.24 Março/2023


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possível. O fentanil é muito potente e faz efeito


rápido. Por isso mata dezenas de milhares de
pessoas por ano nos EUA. A introdução de uma
droga nova é influenciada tanto pela repressão (que
no Brasil tem se mostrado particularmente
eficiente nos últimos anos) quanto por decisões ‘de
mercado’ tomadas pelos cartéis do narcotráfico”,
explica Roberto Motta, autor do livro A construção
da maldade: como ocorreu a destruição da
segurança pública brasileira (Avis Rara, 2022).

O envolvimento da China e de outros países não


ocidentais na produção da substância é outro fator
que quebraria uma das barreiras hoje existentes ao
comércio ilegal do fentanil em território brasileiro.
Nos Estados Unidos, o setor de Imigração e
Alfândega identificou a China como a principal
fonte de fentanil ilícito e outros analgésicos
análogos que entram no país. O tráfico ocorre tanto
pela fronteira com o México quanto por correio

Gazeta do Povo Revista – Ed.24 Março/2023


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diretamente para os EUA, inclusive por envelopes


de cartas comuns.

Sem necessidade de plantio, como a heroína e


outras drogas, o fentanil requer menos tempo e
espaço de produção, podendo ser fabricado em
pequenos laboratórios. A margem de lucro também
é alta: um investimento de US$ 3 mil (R$ 15.750)
pode gerar ganhos de US$ 1 ,5 milhão (R$ 7,87
milhões).

“A República Popular da China, maior fonte do


problema do fentanil, é o maior fabricante e expor-
tador mundial de ingredientes farmacêuticos.
Talvez 40% da produção farmacêutica global venha
da China, mas o regime comunista tem poucas leis
que regem substâncias controladas como o
fentanil. A regulamentação inadequada de
medicamentos na China abriu espaço para cerca de
160 mil empresas químicas com capacidade de

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produzir e exportar fentanil”, explica Peyton


Smith, membro do Programa de Jovens Líderes da
Heritage Foundation, um think tank conservador
norte-americano com sede em Washington, DC.

Consequência de políticas

Uma importante rota de distribuição do fentanil via


México é o estado americano do Arizona, onde os
custos econômicos da crise de opioides
quadruplicaram em uma década, segundo um
relatório publicado pelo Common Sense Institute
(Instituto Senso Comum, em tradução livre),
organização de pesquisa apartidária dedicada à
proteção e promoção da economia estadual.

De acordo com o economista Glenn Farley, autor do


levantamento, foram US$ 53 bilhões gastos pelo
Arizona em 2021 com aplicação da lei, assistência
médica e tratamento de abuso de substâncias. Ele
analisa que a popularização do fentanil foi desen-

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cadeada não intencionalmente por decisões políti-


cas, como: repressão de opioides prescritos (que
levou os viciados a buscar soluções nas ruas);
esforços de descriminalização em alguns estados (o
que tornou o uso menos dispendioso); e políticas de
fronteira mais “humanitárias” do governo Biden
(com o aumento sem precedentes de migrantes
chegando do México, o que desviou a atenção dos
agentes de fronteira em relação ao fluxo de drogas
para o país).

“Essas três coisas realmente combinaram e intera-


giram de maneiras que ninguém pensou”, disse
Farley à National Review. O abuso de opioides co-
meçou a crescer nos EUA na década de 1970, com as
alternativas à morfina sendo prescritas para o
tratamento da dor. Em 1999, foram 116 milhões de
prescrições no país, número que atingiu um pico de
255 milhões em 2012. A preocupação com o abuso
dessas substâncias levou à criação de leis estaduais

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e federais, como a Lei de Epidemia de Opioides do


Arizona em 2018. Porém, a demanda não caiu com a
dificuldade de obter as drogas legalmente.

Paralelamente, estados da Costa Oeste, como


Califórnia, Colorado e Oregon, começaram a
descriminalizar as drogas, o que levou cidades
como Denver, Portland e San Francisco a se
transformarem em mercados de entorpecentes ao
ar livre. “Ao mesmo tempo em que nos tornamos
menos tolerantes com o uso de medicamentos
prescritos, nos tornamos mais tolerantes com o
uso de drogas de rua”, pontua Farley. “Sem
surpresa, as pessoas reduziram o uso de
medicamentos prescritos e aumentaram o uso de
drogas de rua”, completa.

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Uma falha na propaganda colocou a Pepsi numa disputa jurídica com um rapaz que
queria um jato| Foto: Divulgação Netflix

Minissérie narra saga de estudante


que tentou ganhar jato militar
numa promoção
Por José Flávio Júnior

Histórias em que um dos lados representa o gigante


Golias e o oponente remete ao bravo Davi sempre
despertam interesse. Na guerra das colas nos
Estados Unidos, houve um momento em que a
desafiante Pepsi se viu no papel de Golias (mais
adequado ao seu concorrente, a Coca-Cola). Foi

Gazeta do Povo Revista – Ed.24 Março/2023


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quando a marca de refrigerantes lançou uma


campanha, em 1996, que incentivava os
consumidores a adquirirem seus produtos para
acumularem “pontos Pepsi”, a serem revertidos
em camisetas, jaquetas e outros itens com o
famoso logo vermelho, azul e branco. A
propaganda exibia um rapaz cheio de roupas e
assessórios conquistados com essa promoção,
incluindo até um jato militar.

A parte do avião era obviamente uma brincadeira,


mas motivou o jovem John Leonard, então um
universitário de 20 anos, a bolar uma estratégia
para chegar na pontuação usada pela peça
publicitária e depois exigir seu jato como prêmio.
Em quatro episódios de cerca de meia hora, Pepsi,
Cadê meu Avião? recupera essa saga, que redundou
numa batalha judicial, hoje estudada em vários
cursos de Direito. A minissérie documental poderia
ser até mais enxuta, porém a proposta não era

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somente apresentar o caso com depoimentos.


Quase todos os relatos são encenados por atores,
com músicas de sucesso dos anos 90 ao fundo,
dando uma pegada bem pop para a série, lançada
no fim de 2022 pela Netflix.

E John Leonard teve seus 15 minutos de fama no


mundo pop. Enquanto a briga nos tribunais tomava
vulto, o estudante levava sua narrativa a programas
de rádio e tv locais, chegando até a ser sondado
para uma entrevista no talk show de David
Letterman. Pepsi, Cadê meu Avião? também joga
luz em Todd Hoffman, amigo empresário que
bancou os custos de Leonard na empreitada, no
polêmico advogado Michael Avenatti, figura
importante para popularizar a contenda, e na
equipe de marketing responsável pela campanha da
marca de refrigerantes. Ao longo dos episódios,
todos os envolvidos participam do desafio Pepsi,
um teste cego para saber qual das famosas colas

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vence no paladar. O placar final é um chamariz para


manter o espectador até o fim da série.

Ainda que o resultado não seja idêntico ao do


embate bíblico, Pepsi, Cadê meu Avião? mostra que
todas as partes aprenderam e ganharam algo com o
desenrolar da história. Leonard estreitou sua
amizade com Todd Hoffman, formou família e hoje
trabalha num parque no Alasca, enquanto a Pepsi
nunca mais deu uma brecha tão grande em futuras
campanhas publicitárias.

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PARA SE APROFUNDAR

● Cultura: “O Estrangulador de Boston” é o novo


grande hit do gênero “true crime”

● Cultura: Barbie, Indiana Jones, Super Mario: os


filmes mais aguardados de 2023

● J.R. Guzzo: Para governos petistas, Estado deve


garantir “direitos” dos criminosos

● Fixação de mandatos ganha força e pode puxar


debate sobre redução de poderes do STF

● Canetada do governo seca consignado, empurra


aposentado para juro maior e ameaça consumo

● Reforma de impostos com alíquota única de IVA,


como quer governo, pode encarecer a comida

● Movimento abortista avança na América Latina,


mas Brasil ainda resiste

● No Paraná, mais de uma centena de áreas rurais


invadidas deveriam ter voltado aos proprietários

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