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SOCIOLOGIA DA LITERATURA: CONTRIBUIÇÕES DA IRONIA EM MACHADO

DE ASSIS PARA O DESENVOLVIMENTO INTELECTUAL, EMOCIONAL, SOCIAL


E POLÍTICO

Tatiane Silva de Albuquerque

1. INTRODUÇÃO

Segundo Bourdieu (1996) e Botelho e Hoelz (2016), a sociologia da literatura


é um campo interdisciplinar que busca compreender a relação entre a literatura e a
sociedade. Este campo analisa as obras literárias em si e, sobretudo, como elas
refletem, influenciam e são influenciadas pelo contexto social em que são
produzidas e consumidas. A sociologia da literatura examina as interações entre
autores, textos e leitores dentro de um quadro social mais amplo.
Conforme Botelho e Hoelz (2016), historicamente, a sociologia da literatura
surgiu como uma tentativa de entender como os textos literários se relacionam com
as estruturas sociais. No Brasil, figuras como Antônio Cândido desempenharam
papéis fundamentais no desenvolvimento deste campo. Em sua obra “Literatura e
Sociedade”, Cândido propôs que a literatura funciona como um sistema simbólico de
comunicação, onde o autor, o texto e o leitor estão interligados por meio de
significados coletivos.
Existem três principais tendências teóricas na sociologia da literatura: a
estética sociológica, a crítica literária e a pesquisa histórica. A estética sociológica é
uma abordagem que foca nos aspectos estéticos ou psicológicos do autor e sua
obra, muitas vezes marginalizando as condições sociais. Ela considera que os
processos criativos do autor são primordiais, enquanto os fatores sociais atuam em
segundo plano. A crítica literária analisa as obras através de uma lente crítica,
considerando tanto os elementos estéticos quanto os contextos sociais. A crítica
literária busca entender como os textos refletem questões sociais contemporâneas.
E a pesquisa histórica examina as obras literárias dentro de seu contexto histórico
específico. Ela investiga como eventos históricos influenciaram a produção literária e
vice-versa.
De acordo com Pierre Bourdieu (1996), no final do século XX, surgiram novas
teorias sociológicas que impactaram significativamente o campo da sociologia da
literatura. Estas novas abordagens enfatizam a importância das práticas culturais na
formação de significados literários. Elas promovem uma visão mais dinâmica das
relações entre literatura e sociedade, reconhecendo que essas interações são
mediadas por diversos fatores culturais e sociais. A presença crescente de estudos
literários nos cursos de sociologia tem contribuído para a autonomia deste campo de
pesquisa. Essa autonomia resulta das interseções entre diferentes áreas das
ciências humanas e sociais, permitindo uma análise mais rica e multifacetada das
relações entre literatura e sociedade.
Posto isto, a seguir, exploraremos em detalhes os principais benefícios da
literatura, bem como as contribuições da ironia em Machado de Assis (1839-1908).
Em outros termos, o objetivo deste resumo expandido é identificar as contribuições
da ironia nas principais obras de Machado de Assis, tendo em vista o
desenvolvimento intelectual, emocional, social e político. Esta pesquisa foi
conduzida por metodologia bibliográfica efetuada no Google Scholar.

2. OS BENEFÍCIOS DA LITERATURA

Segundo Bosi (2006) e Candido (2011), ler é uma das formas mais eficazes
de desenvolver o pensamento crítico. Através da leitura, somos expostos a
diferentes perspectivas, ideias e argumentos que nos fazem questionar nossas
próprias opiniões e convicções. Ao analisar textos literários, aprender a interpretar
contextos, identificar e avaliar a validade dos argumentos apresentados. Isso nos
torna leitores mais atentos e cidadãos mais conscientes. A literatura oferece uma
janela para diferentes culturas, épocas e realidades sociais. Ao ler obras de autores
de diversas partes do mundo, ampliamos nosso conhecimento sociocultural e
adquirimos uma compreensão mais profunda das complexidades humanas. Esse
enriquecimento cultural não só nos torna mais empático como também nos fornece
um repertório vasto para debates e discussões sobre temas variados.
Um dos benefícios mais evidentes da leitura é a expansão do vocabulário. Ao
entrar em contato com diferentes estilos de escrita e gêneros literários, somos
apresentadas a novas palavras e expressões que enriquecem nosso léxico pessoal.
Um vocabulário amplo facilita a comunicação eficaz, tornando nossos discursos e
textos mais expressivos e persuasivos. A prática constante da leitura melhorou
significativamente nossa capacidade de interpretação e argumentação. Ler textos
complexos exigem atenção aos detalhes e compreensão das entrelinhas,
habilidades que são transferíveis para outras áreas da vida acadêmica e
profissional. Além disso, ao absorvermos diferentes pontos de vista através da
literatura, aprimoramos nossa habilidade de construir argumentos sólidos baseados
em evidências.
De acordo com Candido (2011), a literatura é um terreno fértil para a
imaginação. Histórias fictícias ou reais estimulam nossa criatividade ao nos
transportar para mundos desconhecidos ou ao nos fazer reflexões sobre
possibilidades inexploradas na realidade cotidiana. Esse estímulo criativo é
essencial não apenas para escritores ou artistas, mas também para qualquer pessoa
que precise resolver problemas ou inovar em seu campo de atuação. Desde cedo, o
hábito da leitura contribui para uma formação intelectual completa. Crianças que
cognitivamente são incentivadas a ler desenvolvem habilidades superiores àquelas
que não têm esse hábito cultivado desde a infância. A leitura promove o
desenvolvimento linguístico, melhora a concentração e aumenta a capacidade de
retenção de informações.
Logo, segundo o sociólogo Antônio Cândido (2011), a literatura possui uma
função humanizadora essencial para proporcionar experiências estéticas que
promovam o autoconhecimento e a empatia pelo outro. Ao vivenciar as emoções
dos personagens literários, os leitores desenvolvem uma maior sensibilidade às
questões humanas universais.

3. A RIQUEZA DA IRONIA EM MACHADO DE ASSIS

Nesse contexto, destaca-se a obra de Machado de Assis, um dos maiores


escritores da literatura brasileira, é amplamente reconhecido por seu uso magistral
da ironia. Este recurso estilístico não apenas enriquece suas narrativas, mas
também oferece uma visão crítica e profunda da sociedade de sua época. A ironia
machadiana é complexa e multifacetada, revelando-se em diferentes formas ao
longo de sua obra.
A ironia, conforme definido pela gramática da Língua Portuguesa, consiste em
utilizar um termo em sentido oposto ao usual, obtendo-se um efeito crítico e
humorístico. No entanto, Machado de Assis vai além dessa definição básica. Ele
incorpora a ironia como um elemento estrutural e estilístico fundamental em suas
obras. A ironia machadiana frequentemente envolve uma dissimulação sutil que
desafia o leitor a decifrar as camadas subjacentes de significado.
Segundo Pessanha (2011), um exemplo notável pode ser encontrado no
romance “Helena”, onde Machado descreve o olhar de uma mula como
“filosoficamente”. Esta escolha inusitada do advérbio não só humaniza o animal,
mas também provoca uma reflexão irônica sobre a condição humana e a filosofia.
Em “Ressurreição”, ele caracteriza Vieira como um “parasita consumado” com uma
irreverência que expõe as hipocrisias sociais. Outro exemplo brilhante está em
“Memórias Póstumas de Brás Cubas”. Aqui, a ironia se manifesta na relação entre
Lobo Neves e Brás Cubas através do comentário sobre o vinho: “– Você janta
conosco, doutor, disse-me Lobo Neves. – Veio para isso mesmo, confirmado a
mulher; diz que você possui o melhor vinho do Rio de Janeiro”. O “melhor vinho” é
uma metáfora para Virgília, esposa de Lobo Neves e amante de Brás Cubas, criando
uma situação de humor negro e crítica social.
Conforme Pessanha (2011), a ironia em Machado não serve apenas para
entreter; ela é uma ferramenta poderosa para criticar as normas sociais e os
comportamentos humanos. Em “Esaú e Jacó”, por exemplo, a descrição do buraco
na meia da ex-bailarina Caponi simboliza a decadência contrastada com seu
passado glorioso. Este detalhe aparentemente trivial carrega um peso significativo
ao ilustrar a transitoriedade da fama e das conquistas humanas. No clássico “Dom
Casmurro”, Bentinho usa um eufemismo irônico para descrever seus amigos
falecidos: “Os amigos que me restam são de dados recentes; todos os antigos foram
estudar a geologia dos campos santos”. Esta frase não apenas suaviza a realidade
da morte, mas também adiciona uma camada cômica à narrativa sombria.
Embora seja frequentemente associado ao Realismo, Machado de Assis
herdou muitos elementos do Romantismo europeu, incluindo sua abordagem irônica.
A tese defendida por Andrea Czarnobay Perrot sugere que a ironia romântica está
presente desde os primeiros escritos do autor até suas obras mais maduras. Essa
continuidade indica que Machado utilizou a ironia não apenas como estilo literário,
mas também como visão de mundo.
A ironia em Machado de Assis é um recurso estilístico sofisticado que
transcende o mero humor ou a crítica superficial. Ela é intrínseca à sua narrativa e
serve para revelar verdades profundas sobre a condição humana e as estruturas
sociais. Cada palavra escolhida pelo mestre tem um propósito curioso, convidando o
leitor a explorar as múltiplas camadas de significado escondidas sob a superfície
aparente de suas histórias. É por isso que a ironia machadinha é capaz de trazer
contribuições à formação dos leitores.

4. CONCLUSÃO

A sociologia da literatura oferece uma perspectiva única para entender como


as obras literárias não apenas refletem, mas também moldam o mundo social ao seu
redor. Ao considerar tanto os aspectos estéticos quanto os contextos históricos e
sociais, este campo fornece conhecimentos valiosos sobre o papel da literatura na
sociedade.
Desse modo, verificou-se neste resumo expandido que os benefícios da
literatura são vastos e profundos, abrangendo desde o desenvolvimento intelectual
até o enriquecimento emocional e social dos indivíduos. Portanto, incorporar o hábito
da leitura em nossas vidas diárias não só enriquece nosso conhecimento como
também nos transforma em seres humanos mais completos. E, nesse âmbito, a
ironia em Machado de Assis é um recurso estilístico sofisticado que transcende o
mero humor ou a crítica superficial. Ela é intrínseca à sua narrativa e serve para
revelar verdades profundas sobre a condição humana e as estruturas sociais. Cada
palavra escolhida pelo mestre tem um propósito curioso, convidando o leitor a
explorar as múltiplas camadas de significado escondidas sob a superfície aparente
de suas histórias. É desse modo que avançamos enquanto sujeitos e coletividade.

5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BOTELHO, André; HOELZ, Maurício. (2016), Sociologia da literatura: da reflexão à
reflexividade. Tempo social, v. 28, n. 3, pp. 263-287. Disponível em:
<http://www.scielo.br/scielo.php?
script=sci_arttext&pid=S010320702016000300263&lng=en&nrm=iso>;. Acesso em:
05 out. 2024. http:// dx.doi.org/10.11606/0103-2070.ts.2016.106017.

BOSI, Alfredo,1936: História concisa da literatura brasileira. 43 ed. São Paulo:


Cultrix, 2006.

BOURDIEU, Pierre. (1996), As regras da arte. Gênese e estrutura do campo


literário. 1. ed. São Paulo: Companhia das Letras.

CANDIDO, Antonio. Esquema de Machado de Assis. In: Vários Escritos .5ª ed. Rio
de Janeiro: Ouro sobre Azul, 2011.
PESSANHA, Ketiley da Silva: Machado de Assis e João: do ri(s)o à ironia o conto
submerso em sala de aula. Revista Anagrama: Revista Científica Interdisciplinar da
Graduação. Ano 4. Março-Maio de 2011.

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