Formação de Professores e Pratica de Ensino

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FORMAÇÃO DE

PRoFESSo�ES &
PRÁTiCAJ DE Ef'ISiNo:
PESQUiSAJ (ONTEMPOflÂNEAJ
#DitaduraNuncaMais
Márcia de Souza Hobold
Isabel Maria Sabino de Farias
(Organizadoras)

FORMAÇÃO DE
PROFESSORES &
PRÁTICAS DE ENSINO:
PESQUISAS CONTEMPORÂNEAS

Copyright © Editora Café com Sociologia LTDA, 2024.


1ª edição – 2024

Normatização e Edição: Fabio Monteiro de Moraes


Revisão: Letícia Santos Rodrigues
Diagramação: Fabio Monteiro de Moraes
Capa: Cristiano das Neves Bodart

FICHA CATALOGRÁFICA
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
Tuxped Serviços Editoriais (São Paulo, SP)
Ficha catalográfica elaborada pelo bibliotecário Pedro Anizio Gomes - CRB-8 8846
________________________________________________________________________
H683f Hobold, Márcia de Souza; Farias, Isabel Maria Sabino de (org.). Formação de professores
& prática de ensino: pesquisas contemporâneas / Organizadoras: Márcia de Souza Hobold
e Isabel Maria Sabino de Farias. -- 1. ed. -- Maceió, AL : Editora Café com Sociologia,
2024.
292 p.; gráfs.; tabs.; quadros; 14 x 21 cm.
E-Book; PDF; 9,2 MB.

Inclui bibliografia.
ISBN 978-65-87600-55-0

1. Docência. 2. Educação. 3. Ensino. 4. Formação de Professores. I. Título. II. Assunto.


III. Organizadoras.

CDD 370.71
24-3028238
CDU 377.8

________________________________________________________________________
ÍNDICE PARA CATÁLOGO SISTEMÁTICO
1. Formação de professores – Estágios.
2. Professor, formação.
_______________________________________________________________________

REFERÊNCIA
HOBOLD, Márcia de Souza; FARIAS, Isabel Maria Sabino de (org.). Formação de
professores & prática de ensino: pesquisas contemporâneas. 1. ed. Maceió, AL:
Editora Café com Sociologia, 2024.

Editora Café com Sociologia


CNPJ: 32.792.172/0001-31
Rua Manoel Fernandes da Silva, n. 23, Quadra E, Tabuleiro dos Martins
Maceió-Alagoas. CEP. 57081011

Todos os direitos reservados.


É proibida a reprodução deste livro para fins comerciais sem prévia auto-
rização da Editora Café com Sociologia.
CONSELHO EDITORIAL

Chefe Téc. Editorial


Cassiane da C. Ramos Marchiori Bodart - Editora Café com Sociologia

Editor gerente
Cristiano das Neves Bodart - Universidade Federal de Alagoas (UFAL)

Vice-diretor gerente
Roniel Sampaio-Silva - Instituto Federal do Piauí (IFPI)

COMITÊ EDITORIAL

César Alessandro Sangrillo Figueiredo - Universidade Federal do


Norte do Tocantins (UFNT), Brasil.
Fernanda Feijó- Universidade Federal de Alagoas (UFAL), Brasil.
Igor Martinache- University Paris VII, Diderot, França.
Joaquim Fialho - Universidade Lusíada (CLISSIS), Portugal.
Marluci Menezes - Laboratório Nacional de Engenharia Civil
(LNEC), Portugal
Ricardo Manuel Ferreira de Almeida - Escola Superior de Tecnologia e
Gestão de Lamego - Instituto Politécnico de Viseu (ESTGL), Portugal.
Thiago de Jesus Esteves - Centro Federal de Educação Tecnológica
Celso Suckow da Fonseca (CEFET-RJ), Brasil.
Thiago Ingrassia Pereira - Universidade Federal da Fronteira Sul
(UFFS), Brasil.
Sumário

Apresentação 9
Márcia de Souza Hobold
Isabel Maria Sabino de Farias

Eixo I - Formação de professores: questões


provocadoras
Hora-atividade dos professores: tempo possível para formação 27
continuada e cultural em serviço
Silvia Zimmermann Pereira Guesser
Márcia de Souza Hobold

Formação continuada de professores em discussão: o que 51


diz o sistema de ensino do Paraná
Susana Soares Tozetto
Flavia Wegrzyn Magrinelli Martinez
Thaiane de Gois Domingue

O curso de Pedagogia no Brasil e a formação de professores 75


polivalentes – trajetória em debate (1939 – 2019)
Antonio Anderson Brito do Nascimento
Emerson Augusto de Medeiros
Osmar Hélio Alves Araújo

Formação inicial e desenvolvimento profissional de professores 107


egressos do Curso de Licenciatura em Educação Física via
PARFOR em Roraima
Marnilde Silva de Farias
João Luiz da Costa Barros
Hellen Cris Almeida Rodrigues

A formação nos doutoramentos em artes na região norte do 133


Brasil:
panorama e desafios na/da Amazônia.
Leila Adriana Baptaglin
Wenderson Silva Oliveira
Eixo II - Práticas de ensino: apontamentos teóricos e
experiências
Problematizações sobre desafios do início da docência: 163
um estudo com professores cearenses
Maria Mikaele da Silva Cavalcante
Isabel Maria Sabino de Farias

Estudos e proposições sobre estágio em docência nos 187


anos iniciais do ensino fundamental
Alba Regina Battisti de Souza
Lourival José Martins Filho
Mônica Teresinha Marçal

A formação e a prática como contributos para o 207


desenvolvimento profissional docente
José Rubens Lima Jardilino
Ana Maria Mendes Sampaio

A prática pedagógica: a relação entre o aprender e o ensinar 231


Nilvânia Cardoso Almeida
Liliane Campos Machado

A profissionalidade docente de professores(as) da Rede 255


Municipal de Ouriçangas - Bahia: caminhos e escolhas no
processo de formação
Evódio Maurício Oliveira Ramos
Maria Aline Borges Dantas Cerqueira

Sobre as autoras e os autores 279


FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

m livro é um testemunho e com este, intitulado Formação de pro-


fessores e práticas de ensino: pesquisas contemporânea, não é diferente,
pois sua organização foi movida pelo propósito de contribuir para a
socialização de pesquisas recentes oriundas da pós-graduação stricto
sensu em Educação (mestrado, doutorado e estágio pós-doutoral) e de
relatórios de pesquisas, com ou sem financiamento, bem como resul-
tados de investigações de redes e grupos de pesquisas. Nesses termos,
nosso objetivo central, como ponto de partida para termos pensado
esta obra e convidado colegas pesquisadores(as), foi reunir pesquisas,
realizadas em diferentes universidades públicas das cinco regiões do
Brasil, que tenham tido como temáticas centrais as discussões con-
cernentes à formação de professores e às práticas de ensino.
Todas as pesquisas deste livro apresentam forte aderência à linha
de pesquisa “Sujeitos, Processos Educativos e Docência” (SUPED),
do Programa de Pós-Graduação em Educação (PPGE) da Universi-
dade Federal de Santa Catarina (UFSC), que financia esta obra por
meio de recursos provenientes do Programa de Apoio à Pós-Gradu-
ação (PROAP) (Edital nº 85/2022/PPGE). A linha SUPED tem
como ementa, disponível no site (https://ppge.ufsc.br/o-pro-
grama/linhas-de-pesquisa/suped/), o comprometimento com o de-
senvolvimento de “pesquisas, atividades de ensino e de extensão, em
âmbito nacional e internacional, com foco nos seguintes tópicos: pro-
cessos educativos escolares e não-escolares; infâncias; juventudes e
vida adulta; desigualdade social; violências e educação; relações ét-
nico- raciais e de gênero; questões ambientais e educação; teorias e
políticas de currículo; literatura infantil e juvenil; formação docente;
estética, linguagens e tecnologias”.
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

Para fins de organização desta obra, duas temáticas dessa


ementa foram elencadas: processos educativos e formação docente.
Destacamos que são temáticas concernentes a pesquisas a que nós,
organizadoras, temos nos dedicado há décadas, tendo em vista que
somos membros do Grupo de Trabalho 8 – Formação de Professo-
res da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Edu-
cação (ANPEd) há mais de duas décadas, além de membros da As-
sociação Nacional de Didática e Práticas de Ensino (Andipe) e da
Associação Nacional pela Formação dos Profissionais da Educação
(ANFOPE). Ou seja, nossas publicações, pesquisas e orientações de
mestrado, doutorado, trabalho de conclusão de curso, iniciação ci-
entífica e supervisão de estágio de pós-doutoramento envolvem as
temáticas referidas e que constituem este livro.
Pesquisas sobre formação de professores e práticas de ensino
são essenciais, pois nos atualizam sobre os processos e as políticas
de formação inicial e continuada dos(as) professores(as) no âmbito
dos diferentes cursos de licenciatura, bem como em relação às prá-
ticas de ensino nas diferentes modalidades e etapas da educação.
Tratam-se de pautas basilares à Didática e à Formação de Professo-
res, campos de estudo e de produção das duas organizadoras
(Hobold; Farias, 2020; Farias et al., 2014), conforme registrado antes.
Socializar as pesquisas dessas duas temáticas, oriundas da pós-
graduação stricto sensu em Educação no Brasil, em instituições públi-
cas, tem o potencial de dar visibilidade ao que se consegue fazer de
contributivo para os processos formativos e de ensino ante às inúme-
ras dificuldades impostas às instituições públicas, a exemplo da falta
de financiamento das pesquisas, da redução extrema de bolsas de es-
tudos, das condições de trabalho fatigantes dos docentes, bem como
os imensos desafios a que estudantes da pós-graduação, em sua mai-
oria, trabalhadores do magistério, estão submetidos.
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

Com relação ao campo da formação de professores, tanto no


âmbito da formação inicial quando continuada, não podemos deixar
de mencionar os grandes embates e disputas sobre as normativas
para a matriz curricular e a concepção de formação, principalmente
após o golpe jurídico-midiático-parlamentar (Saviani, 2016; Freitas,
2018; Farias, 2019) vivenciado recentemente, que têm fortalecido os
ditames e intensificado a injunção de organismos multilaterais sobre
os processos formativos e educativos no país (Maués, 2003; Freitas,
2002; Scheibe; Bazzo, 2013, 2016; Hobold, 2021). Não por acaso, a
temática da disputa sobre o campo da formação de professores me-
receu um dossiê especial, que reuniu textos inéditos de pesquisado-
res(as) que têm se dedicado ao assunto, publicados na Revista práxis
educacional, periódico vinculado ao Programa de Pós-Graduação em
Educação (PPGEd) da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia
(UESB), sob o título “Formação de professores: projetos em dis-
puta” (Hobold; Farias, 2021).
Com relação às práticas de ensino, concernentes ao campo de
conhecimento da Didática, não podemos deixar de destacar que as
práticas educativas precisam estar constantemente na pauta das inves-
tigações, para que possamos conhecer e nos atualizar sobre as neces-
sidades dos processos de ensino (prática docente) e de aprendizagem
(processo de aprender dos(as) estudantes). Nessa temática, não pode-
mos nos furtar de pesquisar e evidenciar questões relativas aos pro-
cessos de ensino, bem indicados por Candau (2020), tais como: glo-
balização, multiculturalismo, questões de gênero e de raça, novas for-
mas de comunicação, manifestações culturais de adolescentes e jo-
vens, expressões de diferentes classes, movimentos culturais e religi-
osos, diversas formas de violência e exclusão social etc. Assim, diante
do contexto social, sempre em movimento e em constante alteração,
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

não podemos deixar de contribuir com um espaço para a discussão


de recentes pesquisas sobre as práticas de ensino.
Também contribuímos com o debate da Didática, com textos
sobre as práticas de ensino, quando organizamos um dossiê intitulado
“A Didática em debate: questões contemporâneas” (Hobold; Farias,
2022), que reuniu um conjunto de oito artigos nacionais e internacio-
nais, abordando temas centrais à Didática sob o prisma do que, na
atualidade, atravessa esse campo de conhecimento e da investigação
dos fenômenos pedagógicos. O referido dossiê foi publicado pela re-
vista Perspectiva, que é vinculada ao PPGE/UFSC.
Compõem esta coletânea 10 textos, um grupo de 24 pesquisa-
dores(as) ligados(as) a 12 instituições de Educação Superior, distri-
buídas pelas cinco regiões brasileiras: no Norte, a Universidade Fe-
deral de Roraima (UFRR) e a Universidade Federal do Amazonas
(UFAM); no Nordeste, a Universidade Estadual do Ceará (UECE),
a Universidade Estadual de Feira de Santana (UEFS), a Universi-
dade Federal da Paraíba (UFPB) e a Universidade Federal Rural do
Semi-Árido (UFERSA); no Centro-Oeste, a Universidade de Brasí-
lia (UnB) e a Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS);
no Sul, a Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG), a Uni-
versidade do Estado de Santa Catarina (UDESC) e a Universidade
Federal de Santa Catarina (UFSC); e, no Sudeste, a Universidade Fe-
deral de Ouro Preto (UFOP). Todos(as) os(as) autores(as) apresen-
tam escrito inédito, ou seja, ainda não publicado em periódico cien-
tífico da área da Educação, resultante de pesquisas recentes oriundas
de programas stricto sensu Educação, em instituições públicas, com
ou sem a participação de estudantes desses PPGEs.
Esperamos que o conjunto dos textos reunidos neste livro con-
tribua para fazer avançar a crítica, qualificar o debate e fortalecer os
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

processos formativos de professores(as) e de estudantes nas institui-


ções públicas brasileiras, aportando dados e análises que sirvam de
subsídio para os estudos nos diferentes cursos de formação inicial e
continuada dos(as) docentes. Possibilitar a publicação de uma coletâ-
nea de textos inéditos, com as características descritas anteriormente,
evidencia o esforço dos(as) pesquisadores(as) da área da Educação no
sentido de dar robustez ao processo de ensino e de aprendizagem.
O livro, composto por 10 capítulos, é organizado em torno de
dois eixos teoricamente imbricados: formação de professores e prá-
ticas de ensino, temas capitais à pesquisa nos campos da Didática e
da Formação de Professores, pois ambos se articulam e se comple-
mentam mutua e dialeticamente. Nessa perspectiva, as análises ano-
tadas neste livro pressupõem que as práticas de ensino são funda-
mentais para os estudos sobre os processos formativos de profes-
sores (inicial ou continuada), assim como estes nutrem as práticas
de ensino, compondo um ciclo virtuoso.
O “Eixo I – Formação de professores: questões provocadoras”
aporta cinco pesquisas provenientes de diferentes regiões do Brasil,
abordando pautas já conhecidas e que permanecem tensionando esse
campo de estudo, bem como preocupações emergentes e que têm
alçado expressiva visibilidade na cena nacional recente, ora recolo-
cando, ora provocando o debate.
O escrito “Hora-atividade dos(as) professores(as): tempo possível
para formação continuada e cultural em serviço”, de Silvia Zimmer-
mann Pereira Guesser (Rede Municipal de Ensino de Antonio Car-
los/SC) e de Márcia de Souza Hobold (UFSC), resulta de investigação
de mestrado que teve como objetivo geral compreender como ocorre
a formação continuada e cultural dos(as) docentes dos anos iniciais do
ensino fundamental na hora-atividade. A investigação se desenhou
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

acerca da seguinte questão: de que maneira a hora-atividade, como di-


reito adquirido nacionalmente a partir de 2008, pode potencializar a
formação continuada dos(as) professores(as) e contribuir com os pro-
cessos de ensino-aprendizagem? As autoras defendem que a hora-ati-
vidade, como um possível momento para a formação continuada e cul-
tural em serviço, não é suficiente para o(a) professor(a). É necessário
um novo modelo de organização na hora-atividade, assim como a
emergência de políticas culturais que contemplem o acesso, por parte
dos(as) docentes, aos espaços e eventos culturais, de modo que possam
sentir, pensar e experenciar, de maneiras diferentes, o cotidiano da vida
e, assim, possibilitar formação integral aos(às) alunos(as).
O texto “Formação continuada de professores em discussão: o
que diz o sistema de ensino do Paraná”, de Susana Soares Tozetto
(UEPG), Flavia Wegrzyn Magrinelli Martinez (UFMS) e Thaiane de
Gois Domingues (UEPG), discute como a formação continuada, sob
responsabilidade das redes de educação, expressa um sentido e uma
escolha teórico-metodológica e torna-se relevante, no contexto da
prática educacional das escolas, pois contém uma orientação teórica
e metodológica para o desenvolvimento das práticas educativas.
Mesmo com sua importância, há debilidade de conhecimento e pos-
sibilidade de análise coletiva, pois o planejamento dessas ações não é
amplamente conhecido e a formação nas redes municipais de educa-
ção ocorre de diferentes maneiras, a critério das Secretarias, não exis-
tindo, portanto, um formato consagrado. Nesta pesquisa, indagou-se
como e com que perspectiva a formação continuada tem ocorrido nas
redes municipais do Paraná. Tem-se os seguintes objetivos: caracteri-
zar a formação continuada dos professores das redes municipais do
Paraná e analisar seus principais objetivos e sua relação com a Base
Nacional Comum Curricular (BNCC). Como campo empírico, bus-
caram informações nas 399 redes municipais de educação do Paraná.
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

O capítulo “O curso de Pedagogia no Brasil e a formação de


professores polivalentes – trajetória em debate (1939-2019)”, de An-
tonio Anderson Brito do Nascimento, Emerson Augusto de Medei-
ros (ambos da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte, da
Ufersa e do Instituto Federal do Rio Grande do Norte) e Osmar
Hélio Alves Araújo (UFPB). Os pesquisadores trazem à tona movi-
mentos correntes na história, tomando como objetivo central do es-
crito analisar a trajetória do curso de Pedagogia no Brasil (1930 a
2019) e a formação de professores polivalentes. Utilizam-se da revi-
são bibliográfica. Nesse sentido, para desenvolver a contextualiza-
ção histórica sobre o curso de Pedagogia no Brasil e sobre a histori-
cidade e o conceito de formação de professores polivalentes e de
polivalência, fizeram uso de documentos normativos que versam
sobre o curso de Pedagogia e a formação de professores na perspec-
tiva da polivalência, dentre eles, a Resolução CNE/CP nº 1, de 15
de maio de 2006, que auferiu Diretrizes Curriculares Nacionais para
o Curso de Pedagogia; e a Resolução CNE/CP nº 2, de 20 de de-
zembro de 2019, que definiu Diretrizes Curriculares Nacionais para
a Formação de Professores da Educação Básica e homologou a Base
Nacional de Formação Inicial de Professores da Educação Básica
(BNC-Formação). Desse modo, esse estudo também se tipifica
como uma pesquisa documental, haja vista que analisa documentos
cernes na história do referido curso.
Em “Formação inicial e desenvolvimento profissional de pro-
fessores egressos do curso de licenciatura em Educação Física via
Parfor em Roraima”, Marnilde Silva de Farias (UFRR), João Luiz da
Costa Barros (UFAM) e Hellen Cris Almeida Rodrigues (também
da UFRR) trazem uma análise resultante de pesquisa de doutorado,
que teve como objeto a formação inicial de professores em Educa-
ção Física via Plano Nacional de Formação de Professores para
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

Educação Básica (Parfor). Buscaram saber qual percepção os egres-


sos da primeira licenciatura em Educação Física têm sobre sua for-
mação inicial, em particular, sobre as reverberações dessa experiên-
cia em sua prática pedagógica/atuação profissional. Para tanto, ele-
geram como objetivo geral analisar a contribuição da formação ini-
cial no desenvolvimento profissional de professores de Educação
Física, egressos de primeira licenciatura de Física do IFRR/Parfor
de Rorainópolis. Os autores partiram dos princípios metodológicos
de uma pesquisa qualitativa e os dados empíricos foram produzidos
utilizando diferentes instrumentos, como um questionário semies-
truturado, entrevistas com os egressos, observação, diário de campo
e registros fotográficos. Os sujeitos participantes foram professores
egressos da turma de primeira licenciatura que foi ofertada no mu-
nicípio de Rorainópolis/RR, no período de 2011 a 2015.
O escrito “A formação nos doutoramentos em Artes na região
Norte do brasil: panorama e desafios na/da Amazônia”, assinado por
Leila Adriana Baptaglin e Wenderson Silva Oliveira, ambos da UFRR,
tem como pano de fundo o questionamento: quais são os principais
desafios e abordagens no doutoramento em Artes na região Norte do
Brasil? Destacam que a pós-graduação stricto sensu na região Norte,
comparativamente com as demais regiões do Brasil, apresenta dados
menores em termos de quantidade de pessoal disponível e qualifica-
ção docente – principalmente no que tange aos níveis de mestrado,
doutorado e pós-doutorado. Conforme o Centro de Gestão e Estu-
dos Estratégicos do Ministério da Ciência Tecnologia, Inovação e Co-
municações (2019), os sete estados brasileiros da região Norte (Pará,
Amazonas, Tocantins, Roraima, Rondônia, Acre e Amapá) concede-
ram, no período de 1996 a 2017, apenas 1,5% dos títulos de douto-
rado e 3,3% dos títulos de mestrado emitidos no país. Esse é um in-
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

dicativo importante da carência de possibilidades de formação em ní-


vel de pós-graduação na região, já registrada nos estudos que emba-
saram o Plano Nacional de Pós-Graduação (2011-2020). Essa situa-
ção desencadeia enormes desafios para o processo de consolidação
da pós-graduação stricto sensu e, principalmente, o doutoramento no
Norte do país, o que impacta diretamente na formação docente e no
desenvolvimento profissional.
O “Eixo II – Práticas de ensino: apontamentos teóricos e ex-
periências” agrega também cinco estudos que olham para o que
acontece nos processos de formação e de atuação dos professores,
realçando o debate sobre o estágio na formação inicial, o aprender
a ensinar durante a inserção profissional na docência e a profissio-
nalidade pela via do desenvolvimento dos professores.
Abre essa segunda parte do livro a pesquisa “Problematizações
sobre desafios do início da docência: um estudo com professores
cearenses”, de Maria Mikaele da Silva Cavalcante (Rede Municipal
de Ensino de São Gonçalo do Amarante/CE) e Isabel Maria Sabino
de Farias (UECE). As autoras discutem sobre os desafios de profes-
sores iniciantes na carreira na Educação Básica. A análise, que de-
corre de resultados de investigação empírica do tipo pesquisa-for-
mação envolvendo universidades de três diferentes regiões brasilei-
ras (Sudeste, Sul e Nordeste), contempla dados e constatações refe-
rentes ao Ceará, advindos do exame das narrativas orais de 22 pro-
fessores desse Estado, produzidas no ano de 2021. Em vista da cen-
tralidade desse debate na seara educacional contemporânea, as au-
toras tecem uma problematização sobre os desafios enfrentados por
professores iniciantes cearenses nos primeiros anos de docência, as
dificuldades que encaram em sua prática profissional e como, na
perspectiva desses profissionais, os primeiros anos de docência são
experienciados nesse contexto.
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

Na sequência, temos o texto “Estudos e proposições sobre estágio


em docência nos anos iniciais do ensino fundamental”, de autoria de Alba
Regina Battisti de Souza, Lourival José Martins Filho e Mônica Teresinha
Marçal, todos vinculados à UDESC. Os autores, que abordam um tema
central ao debate sobre a formação inicial de professores, discutem resul-
tados de um estudo sobre o estágio curricular em docência, desenvolvido
pelo Grupo de Pesquisa Didática e Formação Docente (NAPE), vincu-
lado ao Departamento de Pedagogia e ao PPGE da UDESC. A partir de
uma abordagem qualitativa, reunem dados de estudos bibliográficos, ma-
teriais documentais e depoimentos oriundos de profissionais que atuam
na educação básica. Retomam alguns estudos sobre o estágio, em especial
a partir da reconfiguração do campo da Didática e da Prática de Ensino
no Brasil. Na sequência, apresentam aspectos teóricos e metodológicos da
proposta de estágio em docência do curso de Pedagogia em análise, finali-
zando com um diálogo com as contribuições de gestores e profissionais
da equipe pedagógica da rede municipal de ensino de Florianópolis/SC.
O texto “A formação e a prática como contributos para o de-
senvolvimento profissional docente”, de José Rubens Lima Jardilino
e Ana Maria Mendes Sampaio, ambos da UFOP, tece considerações
sobre a prática profissional como elemento formativo necessário ao
fortalecimento da profissionalidade docente, apresentando-se, por
conseguinte, como “fundamento para a elaboração de políticas que
favoreçam a melhoria da qualidade do professor”. Os autores discu-
tem a formação e a prática docente sob uma perspectiva do Desen-
volvimento Profissional Docente (DPD), levando em consideração a
prática profissional do(a) professor(a) como elemento formativo ne-
cessário à socialização com outras áreas produtoras de conhecimento,
com fins a validar sua produção. A aliança entre a formação e a prática
docente aponta para um antigo impasse não vencido no campo edu-
cacional, que envolve a qualidade da formação dos professores e se
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

apresenta como fundamento para a elaboração de políticas mais con-


sistentes de DPD. No entorno dessas questões, a intensificação do
debate atual sobre o DPD vem se construindo como forte aliada nas
proposições acerca das necessidades de transformações, tanto no que
se refere aos elementos de valorização da carreira docente, que forte-
mente influenciam no exercício pedagógico dos professores, quanto
às demandas formativas desses profissionais.
O capítulo “A prática pedagógica: a relação entre o aprender e
o ensinar”, de Nilvânia Cardoso Almeida e Liliane Campos Ma-
chado, ambas da UnB, considera que ato de aprender e de ensinar
perpassa a vida do ser humano. Para as autoras, é por meio da edu-
cação que ocorre, no ambiente escolar, o entrecruzamento de inte-
resses e o enfrentamento em condições distintas que tencionam e
especificam o ato de ensinar. Funciona como um universo plural
representativo da sociedade, de efervescências de ideias, contradi-
ções e singularidades históricas. Um meio partilhado por professo-
res, estudantes e outras realidades que, em constante processo dia-
lético, expandem os aspectos relacionados à instrução, ao pensa-
mento, à ciência e ao saber. Nesse sentido, o texto tem como ques-
tão balizadora: “de que forma o aprender e o ensinar envolvem a
profissão docente e podem impulsionar o processo de ensino-
aprendizagem e a práxis pedagógica?”.
A segunda parte do livro encerra com o texto “A profissionalidade
docente de professores(as) da rede municipal de Ouriçangas/BA: ca-
minhos e escolhas no processo de formação”, de Evódio Mauricio
Oliveira Ramos (UEFS) e de Maria Aline Borges Dantas Cerqueira
(Rede Estadual de Educação Básica da Bahia). Nele, os dois autores
baianos abordam como as histórias vividas e narradas por professores
participantes da pesquisa, precisamente da rede pública de ensino de
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

Ouriçangas/ BA, representam escolhas que levaram à profissão do-


cente e influenciaram na constituição de sua profissionalidade. São
histórias que revelam saberes experienciais, afetividades, transgres-
sões e rupturas que possibilitaram/possibilitam fazer da profissão do-
cente um lugar de plena profissionalidade. As narrativas examinadas
advêm de pesquisa desenvolvida no PPGE da UEFS, cuja produção
ocorreu por meio de entrevistas em profundidade e produção de me-
morial, com exame realizado com suporte na Análise Textual Discur-
siva, cujo achados são fartamente detalhados no texto.
O conjunto dos dez escritos que compõem o livro Formação de
professores e práticas de ensino, ao visibilizar múltiplos e diversos focos
de atenção que têm mobilizado pesquisadores(as) brasileiros(as) nas
cinco regiões do Brasil, evidencia a riqueza, a relevância e a perti-
nência das questões que vêm provocando a reflexão, o estudo e o
desenvolvimento do pensamento educacional nesses dois eixos te-
máticos. Revela também a atualidade do debate e o vigor da produ-
ção científica nessas searas, o que justifica esta publicação que viva-
mente recomendamos à leitura, desde já desejando que ela possa
continuar nos provocando e convocando a pensar as questões que
atravessam a docência na atualidade.
Pelo direito à vida!

Márcia de Souza Hobold (UFSC)


Isabel Maria Sabino de Farias (UECE)
(organizadoras)

CANDAU, Vera. Didática: revisitando uma trajetória. In: CAN-


DAUm Vera Maria; CRUZ, Giseli Barreto; FERNANDES, Claudia
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

(Org.). Didática e fazeres-saberes pedagógicos: diálogos, insur-


gências e políticas. Petrópolis, RJ: Vozes, 2020.
FARIAS, Isabel Maria Sabino de. O discurso curricular da proposta
para BNC da formação de professores da Educação Básica. Revista
Retratos da Escola, Brasília, v. 13, n. 25, p. 155-168, jan./maio 2019.
Disponível em: https://bit.ly/2KlTJ2A. Acesso em: 24 ago. 2020.
FARIAS, Isabel Maria Sabino de; SALES, Josete de Oliveira Castelo
Branco; BRAGA, Maria Margarete Sampaio de Carvalho;
FRANÇA, Maria do Socorro Lima Marques. Didática e Docência:
aprendendo a profissão. 4ª Ed. Brasília-DF: Liber Livro, 2014.
HOBOLD, M. de S.; DE FARIAS, I. M. S. Didática e formação de pro-
fessores: contributos para o desenvolvimento profissional docente no
contexto das DCNs. Revista Cocar, [S. l.], n. 8, p. 102–125, 2020. Dispo-
nível em: http://177.70.35.171/index.php/cocar/article/view/3050.
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FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

Silvia Zimmermann Pereira Guesser


Márcia de Souza Hobold
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

reflexão que apresentamos no capítulo deste livro constitui-se


como um recorte dos dados da pesquisa de mestrado intitulada
“Hora-atividade dos/a professores/as dos Anos Iniciais: contribu-
tos para a formação continuada”, defendida em dezembro de 2020
pela MestraSilvia Zimmermann Pereira Guesser, orientada pela Pro-
fessora Dra. Márcia de Souza Hobold.A pesquisa esteve vinculada
ao Programa de Pós-Graduação em Educação – PPGE, da Univer-
sidade Federal de Santa Catarina – UFSC e ao Grupo de Estudos e
Pesquisas: Formaçãode Professores e Prática de Ensino – FOPPE
(https://foppe.ufsc.br/), bem como ao projeto de pesquisa Forma-
ção de Professores e Práticas de Ensino – FORPE.
Como ponto de partida, considerando a hora-atividade como um
direito nacionalmente adquirido por meio da Lei do Piso Salarial Pro-
fissional Nacional nº 11.738, de 16 de junho de 2008, o capítulo aqui
apresentado, propõe-se a dialogar acerca da formação continuada e cul-
tural dos/as professores/as durante o tempo de não interação com o/a
educando/a, que para todos os fins é hora de trabalho.
A regulamentação da hora-atividade, explicita a necessidade de
remuneração e organização do tempo, compatível com a jornada de
trabalho do/da professor/a. Visto que por muito tempo, os/as do-
centes dispendiam de suas horas domiciliares para a realização do
trabalho escolar, ocorrendo de intensificação do trabalho, com o es-
gotamento emocional e físico. Não mais aceitável, a situação de des-
valorização docente e sobrecarga de trabalho, mobilizações e greves
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

de profissionais da educação ocorreram em todo o território nacio-


nal, com o objetivo de pressionar os estados e municípios a estrutu-
rarem a carreira docente na Educação Básica, conforme implemen-
tados pela Constituição Federal/1988, a Lei de Diretrizese Bases da
Educação Nacional/1996 e a Lei do Piso nº 11.738/2008.
Nessa perspectiva, é a partir da Lei do Piso nº 11.738/2008, de
abrangência nacional, que ocorre um movimento de estruturação da
carreira dos profissionais do magistério público da Educação Básica,
que se organiza em três pilares: salário, formação e jornada de trabalho
(BRASIL, 2012). Desse modo, a pesquisa de mestrado se desenhou
acerca da pergunta de investigação: de que maneira a hora-atividade,
como direito adquirido nacionalmente a partir de 2008, pode potenci-
alizar a formação continuada dos/as professores/as e contribuir com
os processos de ensino-aprendizagem? Assim, para o desenvolvimento
da investigação teve-se como objetivo geral, compreender como ocorre
a formação continuada e cultural dos/as docentes dos anos iniciais do
Ensino Fundamental na hora-atividade.
Para desenvolver o trabalho, a pesquisa fundamenta-se a partir
das discussões de autores como Lüdke e André (2018), no que diz
respeito ao embasamento da abordagem qualitativa. Para a interpre-
tação dos dados coletados, adotou-se a técnica de análise de conteúdo
de Bardin (1977) e Franco (2018). Para a compreensão da formação
continuada e cultural dos/as professores/as durante a hora-ativi-
dade, utilizou-se Bourdieu (2016), Diniz-Pereira (2019), Freire
(1994, 1996, 2021) e Marin (1995).
Assim, a síntese deste estudo aqui apresentado está organizada
da seguinte maneira: inicialmente as considerações iniciais da pes-
quisa; o percurso metodológico; na sequência, trata-se da hora-ati-
vidade, um campo de disputa, cujo estados e municípios buscam por
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

vias judiciais a não aplicabilidade desse tempo na jornada de traba-


lho dos/as professores/as.Também, apresenta-se a discussão sobre
a interconexão entre os conceitos formação continuada e cultural
em serviço do/as professores/as, durante a hora-atividade; após,
discute-se a hora-atividade como possibilidade de formação conti-
nuada e cultural em serviço dos/as professores/as; e, por fim, apre-
senta-se algumas considerações finais acerca das discussões apresen-
tadas neste capítulo

A presente pesquisa se desenhou a partir da abordagem quali-


tativa, na perspectiva que “[...] para se realizar uma pesquisa é pre-
ciso promover o confronto entre os dados, asevidências, as infor-
mações coletadas sobre determinado assunto e o conhecimento teó-
rico construído a respeito dele” (LÜDKE E ANDRÉ, 2018, p. 1-2).
Segundo Bardin (1977, p. 115), a pesquisa qualitativa emana de um
campo “[...] intuitivo, mas também mais maleável e mais adaptável
a índices não previstos, ou à evolução das hipóteses”. Desse modo,
a fim de interpretar os dados coletados, para além, do conteúdo ex-
plicito, fez-se necessário lançar mão da técnica de análise de conte-
údo (BARDIN, 1977).
Dessa maneira, foram utilizados três procedimentos: a análise do-
cumental, a pesquisa bibliográfica e a aplicação de questionário aos/às
professores/as dos Anos Iniciais do Ensino Fundamental da Rede Mu-
nicipal de Ensino de Antônio Carlos, em Santa Catarina - SC.
Inicialmente, coletou-se uma série de documentos oficiais, como
a legislação federal, os pareceres e as resoluções do Conselho Nacional
de Educação, além da legislação do município de Antônio Carlos.
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No que se refere a pesquisa bibliográfica foi realizada con-


sulta a livros e artigos científicos especializados na temática pes-
quisada, como o site da ANPEd nacional, especificamente o GT
8, que trata da formação de professores, e, o GT 9, que se pro-
põe a discutir trabalho e educação. Também foram consultados
a Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações - BDTD
e o Catálogo de Teses e Dissertações da Capes, além de disser-
tações e teses nos repositórios institucionais de programas de
pós-graduação brasileiros.
Os questionários1, foram entregues presencialmente aos/às
professores/as que atendessem os seguintes critérios: ser profes-
sor/a com estabilidade (efetivo/a) na Rede Municipal de Educação
e Cultura de Antônio Carlos e atuar nos Anos Iniciais do Ensino
Fundamental. Dos/as 19 professores/as contatados, 15 aderiram à
proposta de pesquisa, 3 optaram por não participar e 1 docente afas-
tou-se do exercício de sua função por motivos de saúde. Em posse
dos dados coletados, foi necessário preservar a identidade dos/as
docentes, para assim evitar qualquer risco de identificação ou vincu-
lação à escola. Desse modo, os/as professores/as foram identifica-
dos/as pelos acrônimos P1, P2, P3 até P15.

_______________
1 Antes de ir a campo, preliminarmente, contatou-se a Secretaria Municipal de
Educação e Cultura de Antônio Carlos, a fim de solicitar autorização para a
pesquisa, requisito necessário para a aprovação doestudo no Comitê de Ética de
Pesquisas da UFSC, posteriormente registrado o projeto na Plataforma Brasil. A
aprovação ocorreu em 2 de maio de 2019, com o Parecer de nº 3.299.793 e CAAE:
08501119.0.0000.0121.
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“Ninguém começa a ser educador numa certa terça-feira às 22 quatro horas da


tarde, ninguém nasce educador ou marcado para ser educador.
A gente se faz educador, a gente se forma, como educador, permanentemente,
na prática e na reflexão sobre a prática.”
(FREIRE, 1991, p. 58)

Ao longo da história do magistério, os/as professores/as, seja


no Brasil ou em qualquer outra parte do mundo, possuem uma histó-
ria e fazem parte de uma construção social e cultural que tem muito
a ver com a história do trabalho, dos/as trabalhadores/as, de seus
saberes e ofícios. “Com a história do fazer-se da cultura operária [...]”
(ARROYO, 2013, p. 25), é no autorreconhecimento como classe tra-
balhadora que os/as) professores/as passam a lutar economicamente
e politicamente pela revalorização profissional que nunca tiveram. Ar-
royo (2013) descreve as dificuldades que os/as professores/as têm de
afirmar seu próprio ofício e seus saberes específicos, pois, ao longo
do processo histórico-profissional, sua imagem social foi vinculada a
um ofício pobre, utilitarista, acatado e adestrado. Basta lembrar que,
no alvorecer da profissão em nosso país, bastava saber ensinar as pri-
meiras letras para ser professor/a.
Nesse viés, os dados da pesquisa, mostram que todos/as os/as
professores/as pesquisados/as acompanharam o processo histórico
de formação de professores/a, a ponto que possuem formação em
nível superior e também por se tratar de uma exigência da Rede. Este
capítulo não tratará das questões da formação inicial, mas sim sobre
a formação continuada, a partir do recorte temporal da Lei do Piso
Salarial Profissional Nacional, Lei nº 11.738/2008, que institui que,
em uma carga semanal de trabalho de 40 horas, 2/3 são destinados à
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interação com os educandos, e, 1/3, deve ser destinado à hora-ativi-


dade2. Assim, considerando a hora-atividade como um aporte para a
formação continuada e cultural dos/as professores/as, faz-se neces-
sário uma breve contextualização acerca da temática.
Desde a aprovação, a Lei do Piso nº 11.738/2008, vem sofrendo
ataques por parte dos estados e municípios que se posicionavam con-
tra a sua aplicabilidade, argumentando que os custos gerados pela
mencionada Lei representavam fator de risco às contas públicas. Os
governadores dos estados do Mato Grosso do Sul, do Rio Grande do
Sul, do Paraná, do Ceará e de Santa Catarina, ainda no ano de 2008,
com apoio de outros cinco governadores, dos estados de Roraima, de
São Paulo, do Tocantins, de Minas Gerais e do Distrito Federal, re-
correram ao Supremo Tribunal Federal (STF), por meio de Ação Di-
reta de Inconstitucionalidade (Adin) nº 4.167/DF, a fim de obstar a
aplicação da referida Lei. Na data de 17 de dezembro de 2008, a Adin
dos governadores foi parcialmente atendida pelo Supremo Tribunal
Federal - STF, que proferiu medida cautelar suspendendo provisori-
amente dois pontos da Lei nº 11.735/2008, a saber: a composição da
jornada de trabalho e a vinculação do piso salarial aos vencimentos
iniciais da carreira docente.
Em 7 de abril de 2011, a Lei 11.735/2008 foi definitiva e inte-
gralmente declarada constitucional, devendo ser aplicada por todos
os entes federados. Contudo, no ano de 2015 o estado de Santa Ca-
tarina, que, novamente não satisfeito com a decisão de constitucionali-

_______________
2Esta temática foi tratada na dissertação de mestrado intitulada “Hora-atividade
dos(as) professores(as) dos Anos Iniciais: contributos para a formação
continuada”, defendida em dezembro de 2020, sob autoria de Silvia Zimmermann
Pereira Guesser e orientação da Professora Dra. Márcia de Souza Hobold.
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

dade da hora-atividade, promulgada em 7 de abril de 2011, sorrateira-


mente movimentou o Recurso Extraordinário (RE nº 936790) na Su-
prema Corte. O estado de Santa Catarina sustentava o argumento de
inconstitucionalidade do referido dispositivo legal, por entender que,
abril de 2011, o caso não se havia resolvido de forma definitiva pela
Corte, em virtude do empate na votação da Adin (nº 4.167).
Por essa razão, o STF, em meio ao caos mundial por conta da
pandemia da Covid-193,julgou no ano de 2020, procedente o pedido
do estado de Santa Catarina. O então Ministro Marco Aurélio de
Mello, relator da Adin que requeria a inconstitucionalidade da hora-
atividade, alegava que o tema é passível de repetição em inúmeros
casos, sustentando que tal decisão ‘feria’ o princípio de autonomia
das Unidades da Federação, previsto na CF/1988, e, portanto, re-
clamava a análise por parte do STF.
Eis que, em um cenário de crise econômica mundial, o Go-
verno Federal e o CongressoBrasileiro não mediram esforços para
promover projetos de desmonte dos direitos sociais etrabalhistas
em nome da ‘salvação’ econômica. Em continuidade aos ataques aos
direitos dos/asprofissionais do magistério, o relator Ministro Marco
Aurélio, acionou, em caráter excepcional,o sistema virtual para vota-
ção do Recurso Extraordinário de Santa Catarina (RE 936790) sobre

_______________
3 Deacordo com o Ministério da Saúde do Brasil, a Covid-19 é uma doença causada
pelo coronavírus (SARS-CoV-2), cujo quadro clínico varia de infecções
assintomáticas a quadros respiratórios graves. O novo agente do coronavírus foi
descoberto em 31 de dezembro de 2019, após casos registrados na China. A doença
rapidamente alastrou-se pelo mundo, forçando a adoção de medidas sanitárias de
isolamento social. Disponível em: https://coronavirus.saude.gov.br/sobre-a-
doenca. Acesso em: 22 jun. 2020.
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

a constitucionalidade definitiva do 1/3 de hora-atividade para o ma-


gistério da Educação Básica.O processo virtual iniciou-se no dia 22
de maio de 2020 e encerrou-se na noite do dia
28 de maio de 2020. Registra-se que, na ocasião, foram sete
votos favoráveis à constitucionalidade da hora-atividade contra três.
Vale mencionar os nomes dos ministros que votaram a favor da
constitucionalidade da hora-atividade: Edson Fachin, Alexandre de
Moraes,Carmen Lúcia, Rosa Weber, Roberto Barroso, Ricardo Le-
wandowski e Celso de Melo. Os ministros Marco Aurélio, Luiz Fux
e Gilmar Mendes votaram contra.
Desse modo, o STF assegurou o direito a 1/3 de hora-atividade,
conforme estabelece a redação do artigo 2º, §4º, da Lei 11.738/2008:
“Na composição da jornada de trabalho, observar-se-á o limite máximo
de 2/3 (dois terços) da carga horária para o desempenho das atividades
de interação com os educandos” (BRASIL, 2020).
Vale ressaltar, que em meio ao processo de inconstitucionalidade
da hora-atividade apresentado ao STF, o Sindicato dos Professores
do Ensino Oficial do Estado de São Paulo (Apeoesp), o Sindicato
Único dos Trabalhadores em Educação de Minas Gerais (Sindute), o
Centro dos Professores do Estado do Rio Grande do Sul (CPERS),
o Sindicato dos Trabalhadores em Educação Pública do Rio Grande
do Norte (Sinte), a Confederação Nacional dos Trabalhadores em
Educação (CNTE) e a União também requereram o ingresso no pro-
cesso como terceiros interessados, em defesa do direito dos profissi-
onais do magistério à fração de um terço da jornada de trabalho para
atividades extraclasse.
Destaca-se que as entidades representativas da classe trabalha-
dora (sindicatos), não mediram esforços para mobilizar os profissio-
nais da educação por meio das redes sociais, a fimde pressionar os
ministros do STF, haja visto que estávamos em isolamento social. É
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

fato que,mediante a uma situação de crise humanitária e econômica


por conta da Covid-19, a sobrevivência capitalista depende da ex-
ploração da classe trabalhadora, a começar pela racionalização dos
custos, seguida pelo desmonte do Estado de direito e a destruição da
carreira docente, logo pela perda da hora-atividade, que considera-
mos um tempo de trabalho, potencializador para a formação conti-
nuada e cultural dos/as professores/as.

A partir das realidades investigadas, evidenciou-se a necessidade


de discutir nesse capítulo a formação continuada e cultural em ser-
viço dos/as professores/as durante o tempo da hora-atividade. Sem
pretensão de empreender uma revisão exaustiva sobre o tema, faz-se
necessário compreender as terminologias utilizadas para referenciar a
educação continuada e cultural dos/as professores/as como interco-
nexão entre esses dois conceitos. A respeito da formação continu-
ada, Marin (1995), em um artigo clássico, intitulado Educação continu-
ada: introdução a uma análise de termos e concepções, propôs-se a fazer uma
análise sobre a temática. A autora defende que os conceitos subjacen-
tes às terminologias utilizadas norteiam as decisões e justificam as
ações propostas para a formação de professores/as, a exemplo de re-
ciclagem, treinamento, aperfeiçoamento, capacitação, educação per-
manente, formação contínua e educação continuada.
Marin (1995, p. 19) afirma que a atividade profissional dos/as
professores/as é algo contínuo, que “[...] se refaz mediante proces-
sos educacionais formais e informais variados, amalgamados sem
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

dicotomia entre vida e trabalho, entre trabalho e lazer”. Essa con-


cepção comunga com a de Freire, que define como formação perma-
nente, conceito esse, resultado da“condição de inacabamento do ser
humano e a consciência desse inacabamento”, algo que não se es-
gota, que se prolonga por toda a vida (FREIRE, 1996, p. 40).
Contudo, para Diniz-Pereira (2019), existem dicotomias a se-
rem superadas a respeito da formação docente, principalmente
acerca das terminologias formação inicial/pré-serviço e formação continu-
ada/em serviço, utilizadas no Brasil em decorrência da tradução da li-
teratura inglesa. Ainda de acordo com Diniz-Pereira (2019), por
muito tempo (atualmente) a formaçãodos/as professores/as brasi-
leiros/as, ocorre em degraus, desconsiderando a realidade formativa
das diferentes regiões do Brasil.
Apesar das diferenças entre as nomenclaturas, é certo afirmar que
Marin (1995), Freire (1996) e Diniz-Pereira (2019), dialogam em defesa por
uma formação continuada em serviço, a fim de “[...] auxiliar profissionais
a participar ativamente do mundo que os cerca, incorporando tal vivência
no conjunto dos saberes de sua profissão” (MARIN, 1995, p. 19).
Diante do exposto, é propósito, desse texto, associar a forma-
ção continuada, a formação cultural dos/as professores/as dos
anos iniciais do Ensino Fundamental, durante a hora-atividade, que
é hora de trabalho4. Conforme explanado, sobre as concepções
acerca da formação continuada, traz-se também para a reflexão o
que seria a formação continuada cultural. A esse respeito, entende-se que
_______________
4 A respeito das condições e intensificação do trabalho docente durante a hora-
atividade, publicamos um artigo intitulado “Constitucionalidade da hora-atividade
e suas contribuições para a formação continuada dos professores” na revista
Profissão Docente, Uberaba-MG, v.22, n.47, p.01-25, 2022. ISSN 1519-
0919DOI: http://dx.doi.org/10.31496/rpd.v22i47.1484
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

a formação é um processo continuado, que não se limita apenas as


questões teóricas e práticas, mas sim, ao desenvolvimento de uma
formação que também é cultural, com vistas a resgatar a humani-
dade, um direito social, como parte integrante do currículo de for-
mação inicial e continuada de professores/as. Conforme explana
Freire (2021, p. 74), “Não sou apenas objeto da história, mas seu su-
jeito igualmente. No mundoda história, da cultura, da política, cons-
tato não para me adaptar, mas para mudar”.
A essa questão, Passiani e Arruda (2017, p. 135), a luz de Bour-
5
dieu , conceitua a culturacomo “[...] elementos simbólicos da vida
social, ou seja, um conjunto de representações, valores morais e ide-
ais que institui e organiza a sociedade”. Desse modo, o objetivo
desta escrita não é o aprofundamento teórico da questão e seus res-
pectivos embasamentos, mas sim,partir do pressuposto de que a cul-
tura é parte do processo de humanização. Nesse movimento, sa-
bendo-se que a escola tem um papel fundamental na formação
do sujeito, não há como discutir a formação cultural dos/as pro-
fessores/as e estudantes sem antes compreender que a palavra cul-
tura implica, portanto, o conjunto de práticas por meio das quais

_______________
5Revisitando a pesquisa de mestrado “Hora-atividade dos(as) professores(as) dos
Anos Iniciais: contributos para a formação continuada”, defendida em 2020, sob
autoria de Silvia Zimmermann Pereira Guesser e orientação da Professora Dra.
Márcia de Souza Hobold, julgamos pertinente refletir a luz do sociólogo francês
Pierre Félix Bourdieu, acerca da formação cultural dos/as professores/as, após
cursar na condição de aluna especial, no primeiro semestre de 2022, a disciplina,
Dominação e Reprodução Social: a Sociologia de Pierre Bourdieu, na Linha de
Pesquisa: Sociologia e História da Educação – SHE, , ministrada pela Professora
Dra. Ione Ribeiro Valle.
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

significados são produzidos e compartilhados em um grupo. É im-


portante demarcar que a cultura também diz respeito às estruturas
econômicas, políticas e sociais.
Nesse contexto, faz-se necessário pensar de que maneira se deu
a formação dos/as professores/as que hoje educam a futura gera-
ção. De acordo com Bourdieu (2016), o ensino nas instituições de
ensino não ocorre da mesma maneira, como a escola faz parecer, ou
seja, háuma constante exclusão no interior das instituições. Apregoa-
se que na escola o conhecimentoé partilhado de maneira democra-
ticamente igual, desconsiderando que a maior parte dos/as alu-
nos/as das escolas públicas pertencem às classes menos favorecidas
e que não trazem de berço uma herança denominada por Bourdieu
de capital cultural ou capital de culturas, reconhecida e afirmada pelas
classes dominantes.
O Capital Cultural é um conceito elaborado por Bourdieu (2016)
para explicar como a cultura em uma sociedade dividida em classes se
transforma em uma espécie de moeda, cujo as classes dominantes uti-
lizam para acentuar as diferenças sociais. A cultura se transforma em
instrumento de dominação, bem como as classes dominantes elencam
e impõem sobre as classes dominadas sua própria cultura, atribuindo a
essa cultura um valor incontestável, a tal ponto de legitimá-la como a
cultura boa de ser ensinada no espaço escolar, negando outras formas
de manifestação culturais, que muitas vezes são manifestações de luta,
contra o arbitrário cultural dominante “[...] que consagram à sua ma-
neira de ser e seu estado” (BOURDIEU, 2016, p. 218).
Para Freire (2021, p. 42), é lamentável que no “[...] caráter sociali-
zante da escola, o que há de informal na experiência que se vive nela,
de formação ou deformação, seja negligenciado”, de modo a privilegiar
o ensino de conteúdos, como uma transferência de saber, impedindo
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

professores/as e alunos/as de se conhecerem e partilharem culturas


próprias e/ou aquelas acumuladas pelo ser humano.
Diante disso, defende-se a escola como um dos espaços opor-
tunos para a formação humana, social, política e cultural, mas tão
relegado, conforme descreve Freire:
[...] mulheres e homens, historicamente descobriram que é
possível ensinar. Se estivesse claro para nós que foi apren-
dendo que percebemos ser possível ensinar, teríamos en-
tendido com facilidade a importância das experiencias in-
formais nas ruas, nas praças, no trabalho, nas salas de aula
das escolas, nos pátios dos recreios, em variados gestos de
alunos, de pessoal administrativo, de pessoal docente se
cruzam cheios de significação. Há uma natureza testemu-
nhal nos espaços tão lamentavelmente relegados das esco-
las (FREIRE, 2021, p. 43).
O importante, não resta dúvida, é a necessidade de políticas
públicas que possibilitem aos/às professores/as uma formação
continuada e cultural em serviço, de maneira a fazer com que dis-
ponham de mecanismos legais de incentivo ao acesso às diferentes
áreas culturais, sejam as consideradas elitistas, como as galerias, os
museus e os espetáculos, sejam as ditas popularizadas, como o ci-
nema, as feiras, a arte de rua, enfim, toda a forma de expressão
cultural acumulada pela sociedade.
Defende-se, que não é possível pensar em formação continu-
ada dos/das professores/as apartado da formação cultural, pois am-
bas, tem o mesmo objetivo: o desenvolvimento do pensamento crí-
tico e mais humano. Contudo, propiciar formação continuada e cul-
tural não deve se limitar somente no espaço físico escolar, ou aqueles
promovidos pelas Redes estaduais e municipais de educação, com
vistas apenas a responder uma necessidade formativa advindas das
instituições de ensino, mas sim, que:
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

[...] docentes se distanciem, de tempos em tempos, da realidade


em que vivem, encontrem profissionais de outras escolas e vi-
venciem momentos intensos de estudos para fundamentação
teórica de suas práticas, de trocas de saberes experenciais, de
conhecimento de outras realidades, bem como de reflexão in-
dividual e coletiva sobre suas ações. Aliás, tais afastamentos
periódicos e temporários, com remuneração integral dos salá-
rios, visando a uma maior qualificação profissional, passam a
ser reivindicados como direito dos profissionais da educação
(DINIZ-PEREIRA, 2019, p. 72)”.
Contrariamente ao que sugere Diniz-Pereira (2019), no ex-
certo acima, evidenciou-se que na Rede pesquisada, utiliza-se dos
dispositivos legais, para impossibilitar os/as docentes, a realiza-
rem a hora-atividade fora da escola, mesmo que seja para fre-
quentar outros espaços que venham a contribuir com as suas ne-
cessidades formativas. Por fim, compreende-se que não é possí-
vel desassociar a formação continuada da formação cultural,
tendo em vista, que são conceitos capazes de corroborar para o
desenvolvimento profissional docente e conseguinte nos proces-
sos de ensino e aprendizagem dos/as alunos/as.

A Lei nº 1.356/2011, que trata do Plano de Carreira e Remune-


ração dos servidores/profissionais do magistério do Município de
Antônio Carlos, cujo art. 27 determina que “[...] as horas-atividade,
destinadas a atividades extraclasse deverá ser cumpridas na unidade
escolar” (ANTÔNIO CARLOS, 2011), é possível constatar que a
hora-atividade não acontece em outros espaços que não sejam a es-
cola. Vê-se que os/as professores/as são proibidos de realizarem a
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

hora-atividade fora da escola, mesmo que seja para frequentar outros


espaços formativos, que venham atender as necessidades formativas.
Durante a pesquisa, constatou-se que a formação continuada
dos/as professores/as pesquisados/as ocorre de maneira aligeirada,
por meio de palestras e cursos de curta duração. Ainda, aqueles/as que
tentam realizar a formação continuada em serviço, são obrigados a de-
sistir, pois alegam a sobrecarga de trabalho, conforme se expõem:
[...] já tentei fazer um curso online durante a hora-atividade.
No entanto, não conclui, porque não conseguia realizar as
demais atividades na escola (P9).
Da mesma forma, outro/a professor/a, compreende que o
tempo da hora-atividade poderia ser utilizado para o seu/a desen-
volvimento profissional, mas a disparidade na organização do
tempo e dos/as professores/as os/as coloca em conflito e causa
descontentamento:
No meu caso, como uma boa parte da hora-atividade é con-
centrada em um único dia, a participação em formações
continuadas se torna possível ou pelo menos as chances são
maiores. Essa, no entanto, não é uma realidade que con-
templa a maioria dos professores, pois sua hora-atividade é
quebrada (P3).
Se for para sair, não seria possível. Só se for a distância ou
na própria escola (P15).
Nesse contexto, de formação continuada e cultural em serviço,
verificou-se que são poucos os/as professores/as que têm acesso à
cultura acumulada historicamente pela humanidade. Para Bourdieu
(2016), a cultura vai se materializando de acordo com a condição
socioeconômica, que por sua vez, será desenvolvida por instituições
sociais como a família e aescola. Assim, a cultura vai se configurando
a partir das trajetórias vividas por cada sujeito, sem deixar de consi-
derar as diferentes condições de vida nas diferentes classes sociais.
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

Importadestacar, que a escola não é uma instituição neutra, ela con-


tribui para produzir e reproduzir asestruturas sociais. Nesse sentido,
também é importante diferenciar os tipos de escola e educação que
estão sendo ofertados; escola para o pobre e escola para a burguesia
(LIBÂNEO, 2012), pois a depender do público atendido na escola,
distinguir-se-á a oferta do conteúdo.
Nesse sentido, mediante o impedimento dos/as professores/as fre-
quentarem outros espaços formativos durante a hora-atividade, pergun-
tou-se aos/às professores/as o que costumam fazer fora do espaço es-
colar, durante o tempo livre, como tempo liberado do trabalho ocupaci-
onal, de influência na formação do ser humano. Constatou-se que o
'acesso à internet e redes sociais’ é unânime entre os/as docentes da Rede
pesquisada, ou seja, 100% (n=15) e apenas 13% (n=2) participam de pa-
lestras/cursos voltados à ampliação cultural6.
A partir desses dados, a presente pesquisa não pretende mani-
festar qualquer repúdio àstecnologias, mas sim ao modo e à finali-
dade a que estão submetidas no âmbito da vida das pessoas. Faz-se
a defesa, da valorização do ser humano histórico-cultural, de uma
escola que sabe o seu papel na formação humana, que reconheça
que os/as estudantes são portadores de cultura e, por sua vez, tam-
bém têm o direito de conhecer outras culturas construídas histori-
camente pela humanidade, conforme descreve o excerto:

_______________
6 Esta temática foi tratada em apresentação de trabalho em março de 2022, no
evento; Ciclo de debates: formação e arte nos processos políticos
contemporâneos. Posteriormente, em dezembro do mesmo ano, foi publicado o
artigo nos anais do evento referenciado, intitulado “A hora-atividade como ação
transformadora”, de autoria da Mestra Silvia Zimmermann Pereira Guesser e
Professora Dra. Márcia de Souza Hobold.
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

Todos os povos têm cultura, porque trabalham, porque


transformam o mundo e, ao transformá-lo, se transfor-
mam. A dança do Povo é cultura. A música do Povo é cul-
tura, como cultura é também a forma como o Povo cultiva
a terra. Cultura é também a maneira que o Povo tem de
andar, de sorrir, de falar, de cantar, enquanto trabalha. O
calulu7 é cultura como a maneira de fazer o calulu é cultura,
como cultura é o gosto das comidas. Cultura são os instru-
mentos que o Povo usa para produzir. Cultura é a forma
como o Povo entende e expressa o seu mundo e como o
Povo se compreende nas suas relações com o seu mundo.
Cultura é o tambor que soa pela noite adentro. Cultura é o
ritmo do tambor. Cultura é o gingar dos corpos do Povo
ao ritmo dos tambores (FREIRE, 1994, p. 75).
Nesse sentido, conhecer e compreender as diferentes mani-
festações culturais de um povo é primordial nas relações com o
mundo. Pela própria existência humana, tanto o/a professor/a
quanto os/as estudantes são sujeitos produzidos e reprodutores
de cultura, submissos a um Estado centralizado, burocratizado e
excludente. Compreender, o mundo em que se vive, não é tarefa
fácil, exige conhecimento, interpretação da realidade em que se
vive. A formação continuada e cultural, apresenta-se como um
caminho para que a escola venha a ser um espaço de igualdade de
oportunidade. Contudo, é necessário dispor de condições para o
acesso de professores/as e estudantes a frequentarem os diversos
espaços culturais, artísticos e de fruição, pois ninguém consegue
ensinar aquilo que não aprendeu ou experienciou.
Por fim, não se tem a pretensão de ‘receitar’ um modelo de
formação continuada e cultural em serviço, mas sim, de promover a
reflexão dos modos operantes, de maneira a modificar as condições
_______________
7Segundo Freire, trata-se de um prato à base de azeite de dendê. Pode ser feito
com galinha, peixe ou pata de vaca.
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

que são impostas por uma cultura escolar dominante, cujos saberes
sãoconsiderados únicos e verdadeiros, instituindo escolas e práticas
pedagógicas padronizadas.

Ao longo do processo histórico de burocratização do ensino e


de valorização dos/as professores/as brasileiros, a hora-atividade,
como direito adquirido nacionalmente a partir da Lei do Piso nº
11.738/2008, parecia ser algo consolidado, embora carente de me-
lhorias. Contudo, sob os duros revés que a humanidade vem so-
frendo por conta da Covid-19, os/as professores/as foram surpre-
endidos com o julgamento de inconstitucionalidade da hora-ativi-
dade. Comprova-se, mais uma vez, que o Estado não tem autono-
mia política, e a classe trabalhadora não é hegemônica, pois ambos
estão submetidos ao capitalismo, que é quem ditaas regras.
A sobrevivência capitalista depende da exploração da classe tra-
balhadora, a começar pela racionalização dos custos, seguida pelo
desmonte do Estado de direito e a destruição da carreira docente,
logo pela perda da hora-atividade. Compreendendo-se a hora-ativi-
dade comoum possível momento formador de sujeitos de mudança,
coloca-se em risco a ordem social. Na ordem capitalista, professo-
res/as precisam ser controlados/as, a começar pela retirada do di-
reitoà hora-atividade. Assim, sobrecarregados/as de atividades ine-
rentes à sua profissão, os/as professores/as tendem a incorrer em
conformismo e a aceitar a ordem vigente.
A permanência obrigatória do/a professor/as durante a hora-
atividade na unidadeescolar, condicionando-o/a a realizar incessan-
temente atividades rotineiras de planejamento, elaboração e corre-
ção de avaliações, atendimento às famílias, entre outras atividades
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

burocráticas, impossibilita a ressignificação da profissão docente.


Dentre tantas tarefas atribuídas ao/à professor/a, investir e garantir
a formação continuada é um dos direitosprescritos à constituição do
trabalho docente.
Com o propósito de alcançar o objetivo principal da pesquisa;
compreender como ocorre a formação continuada e cultural dos/as
docentes dos anos iniciais do Ensino Fundamental na hora-ativi-
dade, evidenciou-se que a formação humana, social, política e cultu-
ral, proposta por Bourdieu (2016), Diniz-Pereira (2019) Freire
(1991, 1994, 1996, 2001) e Marin (1995), estão longe de acontecer
na Rede pesquisa. A “formação continuada” nessa Rede ocorre me-
diante a organização e a oferta de palestras e cursos de curta dura-
ção, mais voltados para uma diplomação e progressão anual na car-
reira. Assim como à obrigatoriedade de cumprimento da hora-ativi-
dade na unidade escolar, a disparidade na organização do tempo e a
sobrecarga de trabalho impedem que os/as professores/as busquem
espontaneamente uma formação continuada e cultural que atenda
às suas necessidades formativas.
É certo que somente a hora-atividade, como um possível mo-
mento para a formação continuada e cultural em serviço, não é su-
ficiente para o/a professor/a, é necessário um novo modelo de or-
ganização na hora-atividade, assim como, a emergência de políticas
culturais quecontemplem o acesso, por parte dos/as docentes, aos
espaços e eventos culturais, de modo que possam sentir, pensar e
experenciar, de maneiras diferentes, o cotidiano da vida e, assim,
possibilitar a formação integral aos/às alunos/as.
Por fim, como orientação à continuidade do debate, considera-
se fundamental que o trabalho formativo do/a professor/a não
aconteça somente dentro da sala de aula, nem se limiteà escola, mas,
por meio da hora-atividade – para todos os fins, hora de trabalho –
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

, que seja possível ao/à docente buscar formação cultural em serviço


em outros espaços que não na escola.

ANTÔNIO CARLOS. Lei n° 1.356 de 1º de novembro de 2011.


Institui o Plano de Carreira eRemuneração dos servidores/profissi-
onais do magistério da Secretaria de Educação do município de An-
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BRASIL. Lei nº 11.738, de 16 de julho de 2008. Regulamenta a alí-
nea “e” do inciso III do caput do art. 60 do Ato das Disposições
Constitucionais Transitórias, para instituir o piso salarial profissi-
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ção básica. Diário Oficial da União, Brasília, DF, Seção 1, p. 1,
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17 jul. 2008. Disponível em: encurtador.com.br/prR07. Acesso em:


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Implantação da Lei nº 11.738/2008, que institui opiso salarial pro-
fissional nacional para os profissionais do magistério público da
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FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

Susana Soares Tozetto


Flavia Wegrzyn Magrinelli Martinez
Thaiane de Gois Domingues
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FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

relevância em se pesquisar sobre a formação continuada re-


força a importância de expandir a área e subárea de educação
permanente, bem como o espaço de sistematização e socialização
do conhecimento que envolve a escola, o professor, a docência,
o ensino e a prática pedagógica. A pesquisa teve como intuito
caracterizar a formação continuada dos professores das redes
municipais do Paraná e analisar seus principais objetivos e sua
relação com a BNCC. Ademais, também pode mobilizar pesqui-
sas futuras, de modo que a produção científica e acadêmica possa
alcançar e contribuir para a reflexão dos problemas cotidianos da
Educação Básica no estado.
A motivação da presente pesquisa deu-se a partir da análise dos
resultados da investigação8 realizada nos planos de curso de 13 cursos
de Pedagogia de 8 universidades públicas do estado do Paraná, pelo
Grupo de Estudos e Pesquisas sobre o Trabalho Docente (GEP-
TRADO), vinculado ao Programa de Pós-Graduação da Universidade
Estadual de Ponta Grossa (PPGE/UEPG), que apontou que, no es-
tado do Paraná, há uma formação predominantemente pautada para a
docência na Educação Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental,

_______________
8Para a pesquisa, acesse: TOZETTO, S. S.; SILVA, M. R.; DOMINGUES, T. G. Os
cursos de licenciatura em pedagogia das universidades públicas do estado do Paraná.
Formação Docente, Belo Horizonte, v. 11, n. 21, p. 41-56, mai./ago. 2019. Disponível
em: www.revformacaodocente.com.br. Acesso em: 04 abr. 2023.
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

bem como para a Gestão Escolar. Dessa forma, percebemos a neces-


sidade de dar continuidade ao estudo sobre formação de professores,
problematizando como acontece a formação continuada dos professo-
res que ingressam nas redes municipais. Sendo assim, com essas pes-
quisas, propomo-nos a estudar o desenvolvimento profissional do-
cente nas etapas da formação inicial e continuada, integrando as duas
pesquisas, caracterizando a experiência e o domínio do grupo acerca
do tema. As trajetórias individuais das pesquisadoras são ancoradas em
referenciais teóricos, estudos e pesquisas associados à formação do-
cente. O histórico profissional das envolvidas é arraigado na docência,
coordenação pedagógica e conhecimento do espaço escolar, possibili-
tando a discussão e reflexão dialética sobre os dados da pesquisa.

A concepção de formação continuada desta pesquisa é ancorada


nos pressupostos da Associação Nacional de Formação de Professores
(ANFOPE), que compreende que a formação continuada está imbri-
cada no desenvolvimento profissional docente, associada a ações de
valorização do profissional da educação, tais como carreira, remunera-
ção e condições de trabalho. Para tal, deve promover o processo de
reflexão do professor acerca da realidade na qual está inserido:
[...] a formação continuada não pode ser considerada um
adendo da formação inicial, mas sim um processo de refle-
xão que possibilita a análise de questões daquela formação,
abastecendo-se do diálogo entre as organizações, movi-
mentos e sujeitos educativos. Assim, tomamos a formação
continuada como parte integrante da práxis docente, con-
tendo e estando contida em uma relação dialética. Desse
modo, não é possível desconectar a formação do trabalho
e da vida do professor (ANFOPE, 2021, p. 35).
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

Com base nisso, percebe-se que o discurso oficial das propostas


de formação de professores vai ao encontro da reflexão e análise crítica
da realidade escolar, mas o discurso real, muitas vezes, vai de encontro
com os objetivos propostos. Isto posto, embora haja a defesa do pro-
cesso reflexivo concomitante à formação docente, compreende-se que,
no espaço escolar e com base na dinâmica das políticas educacionais
vigentes, isso não ocorre. O que temos é uma necessidade urgente de
uma atitude voltada para a formação de qualidade daquele que vai atuar
no contexto da escola. Ou seja, formar um docente crítico, reflexivo e
preocupado com a aprendizagem de seu aluno.
De forma a estabelecer a relação entre o proposto e o realizado
acerca da formação continuada docente, esta pesquisa possui abor-
dagem quali-quantitativa, de caráter exploratório. De acordo com
Minayo e Sanches (1993), a relação entre quantitativo e qualitativo
não pode ser pensada como oposição contraditória e pode “gerar
questões para serem aprofundadas qualitativamente, e vice-versa”
(MINAYO; SANCHES, 1993, p. 247).
As atividades desenvolvidas2 se deram a partir do levantamento dos
contatos das 399 Secretarias Municipais de Educação (SME) do Paraná,
em 2020, por meios digitais, nos sites das prefeituras ou em suas páginas
oficiais em redes sociais. De forma a garantir a capilaridade da pesquisa,
houve a atenção em relação a informações e endereços desatualizados,
então, realizamos uma busca ativa de contatos, de maneira que todos os
questionários chegassem aos seus destinatários. Dessa forma, contata-
mos os 32 Núcleos Regionais de Educação (NRE)3 do Paraná e solicita-
mos os contatos de e-mails das respectivas SME, que estão sob sua ju-
risdição. Como instrumento de pesquisa, utilizamos questionário com
perguntas abertas e fechadas. A fim de validar o instrumento de pesquisa,
realizamos uma pesquisa piloto, a qual foi realizada junto a uma SME de
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um dos municípios. O que possibilitou o aprimoramento do instru-


mento, com vistas a atender aos objetivos da pesquisa.
Na sequência, via e-mail, enviou-se um ofício à SME e o ques-
tionário, o qual foi disponibilizado via plataforma Google Forms.
O período de produção de dados foi de um ano e, ao final, foram
obtidas as respostas de 43 questionários, perfazendo 66% dos NRE
aos quais as SME pertencem, pois muitos municípios são de pequeno
porte e não possuem Sistema Municipal de Educação. Para a codifica-
ção e organização dos dados, foi utilizada a orientação do processo da
Análise de Conteúdo (BARDIN, 2011), definido como um conjunto
de instrumentos metodológicos que se aprimoram constantemente e
se adaptam a discursos diversificados. Os dados produzidos foram ta-
bulados e analisados, sendo os achados descritos na sequência.
Com base nas respostas angariadas, todos os NRE tiveram re-
presentatividade por meio de ao menos um município respondente
na pesquisa. As 43 SME do estado do Paraná pesquisadas atendem,
no total, 572 escolas municipais, sendo a maioria delas (93%) apon-
tadas como de médio porte pelos respondentes. Tais escolas contam
com 17.795 professores em seu quadro próprio, ou seja, professores
concursados. Há 1.337 professores temporários, que atuam por
meio de contratação via processo seletivo. Dessa maneira, a pes-
quisa se dá acerca da formação continuada de 19.132 professores
atuantes nas redes de ensino municipais do estado do Paraná, pre-
dominantemente concursados.
Considerando a objetivação de caracterizar a formação con-
tinuada ofertada pelas 43 SME paranaenses, o documento enca-
minhado aos respondentes questionou quais profissionais parti-
cipavam das formações. O público é identificado por meio do
Gráfico 01, a seguir:
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

Gráfico 01 – Participação das formações continuadas nas 43 SME/PR

Fonte: as autoras (2023).

Das SME pesquisadas, em 98% há a participação de docen-


tes na formação continuada. Os coordenadores pedagógicos são
envolvidos na formação docente em 88% das SME, o que gera
estranhamento o número não abranger a totalidade das secreta-
rias consultadas, tendo em vista o papel do pedagogo no processo
formativo dos professores. Os gestores, remetendo à figura do
diretor escolar, são apontados como integrante de formações por
83% das 43 SME do estado do Paraná. Por sua vez, há também
formação continuada em que auxiliares e estagiários participam,
bem como outros profissionais escolares.
O processo de organização das formações foi questionado
junto aos integrantes da pesquisa e apresentado no Gráfico 02:
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

Gráfico 02 – Responsáveis pela realização da formação continuada


ministrada nas escolas das 43 SME/PR

Fonte: as autoras (2023).

A questão envolvia múltiplas assinalações, tendo em vista a


possibilidade de organização de formações por mais de uma equipe.
Em 60% das 43 SME paranaenses pesquisadas, as equipes das pró-
prias secretarias têm organizado e realizado a formação continuada.
O processo é feito também por equipes escolares, junto a universi-
dades, mas também por fundações, organizações ou instituições
parceiras, em 40% das secretarias consultadas. O indicador de que
30% das SME utilizam contratação de empresas ou pessoas para a
realização da formação continuada é preocupante, no sentido de se
compreender que um projeto formativo versa, igualmente, sobre um
projeto educativo, que pode estar sendo designado e atendendo a
interesses privados no espaço público de ensino, bem como na
transferência de recursos públicos à esfera privada.
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

Sobre esta questão, a Anfope, atenta ao movimento de tais


recursos, tem defendido a “garantia de investimento público ex-
clusivamente para o ensino público – contra o processo de mer-
cantilização/privatização da educação” (ANFOPE, 2018, p. 44).
A privatização da educação e da formação de professores tem
sido uma tendência global, não somente pelo repasse de verba
pública para a iniciativa privada, como também pela “transferên-
cia das práticas do mundo corporativo como lógica principal da
gestão educacional [...] e uma preparação técnica que treina pro-
fessores para seguirem roteiros ‘eficazes’ de ensino para um cur-
rículo padronizado” (DINIZ-PEREIRA; ZEICHNER, 2019, p,
12). Isto posto, ao apontar a contratação de empresas para a ges-
tão da formação docente de suas próprias equipes pedagógicas,
as SME pesquisadas denotam a adesão a um modelo corporativo
com ênfase em resultados, em um processo de privatização da
formação docente e de aderência ao modelo neoliberal vigente.
Considerando a formação continuada como um processo de
contínuo desenvolvimento docente, a periodicidade das forma-
ções foi levantada, apontando que ocorre em caráter mensal em
39% das 43 SME pesquisadas e, semestralmente, em 35% delas.
Somente 18% das SME denotam uma formação com maior fre-
quência em caráter semanal, quinzenal ou de acordo com a de-
manda, tanto de professores quanto de pedagogos. A baixa peri-
odicidade da formação continuada, na compreensão de integrar
o processo de desenvolvimento profissional docente, está relaci-
onada ao direito do professor de realizar suas atividades ex-
traclasse junto a sua carga horária de trabalho.
[...] à garantia na jornada de trabalho, de uma proporção
mínima de um terço para atividades extraclasse, utilizado
para preparação de aulas, correção de provas e trabalhos,
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

reuniões pedagógicas e com os pais, e formação continuada


no local de trabalho ou em instituições credenciadas, dentre
outras atividades (entendendo assim que o trabalho docente
ultrapassa o tempo de contato com os alunos). Esse é um
outro elemento essencial, do qual depende a qualidade do
trabalho, não devendo e não podendo ser, assim, a sua im-
plantação substituída por remuneração compensatória
(ANFOPE, 2018, p. 71).
Ao identificar-se que a maioria das 43 SME pesquisadas de-
dicam somente um encontro mensal para a formação continuada
e que apenas uma parte das SME dedicam encontros semanais ou
quinzenais à formação docente, deflagramos que o processo for-
mativo dos professores não tem se dado no espaço escolar com
a periodicidade necessária para um processo de estudo e reflexão
sobre sua prática pedagógica. A formação continuada deve for-
necer bases para a construção do conhecimento crítico, criativo
e pedagógico do dia a dia escolar, com os quais os professores
enfrentam todo tipo de tarefas e problemas. Tudo isso implica
dizer que há uma grande parte das SME no estado do Paraná que
não possibilita momentos reflexivos na escola para a aquisição do
conhecimento necessário para o trabalho docente.
Dentre as metodologias utilizadas nos encontros, dado o pe-
ríodo de realização da produção de dados, questionou-se os mo-
delos adotados antes e durante a pandemia de Covid-19. As res-
postas foram organizadas no Gráfico 03:
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

Gráfico 03 – Modelos de formação continuada nas 43 SME/PR pesquisada

Fonte: as autoras (2023).

Identifica-se que antes do período pandêmico, de forma


majoritária, as formaçõescontinuadas se davam por encontros pre-
senciais, envolvendo oficinas e palestras em 98% das secretarias,
contando com reuniões (86%) e minicursos (61%). Entretanto,
no ano letivo de2021, a utilização de reuniões, palestras e mini-
cursos online de forma síncrona elevaram-se significativamente,
chegando a 72% das secretarias pesquisadas, ainda que as escolas ti-
vessemretornado às atividades presencias. De acordo com a An-
fope (2021, p. 17), esse movimentoreverbera o discurso tanto da
formação discente quanto da docente de forma híbrida, como
“solução educacional para o pós-pandemia, aprofundando o pro-
cesso de desqualificação dotrabalho docente agora substituído por
programas autoinstrutivos em grandes plataformas”. Talsituação se
acirra, ao se identificar que formações continuadas endereçadas às
equipes docentesde maneira gravada, ou seja, sem a interação e
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

participação dos professores, que passam àcondição de meros es-


pectadores se acentuam, sendo adotadas por 40% das SME respon-
dentes.A flexibilização, tanto quanto a gestão e o modelo de
realização de formação continuada das SME, denota os padrões
que têm sido denunciados por pesquisadores eeducadores, correla-
tos à lógica de produtividade, formação e avalição em larga escala,
sem a devida atenção à efetividade dos processos formativos quanto
à prática pedagógica docente.
Na perspectiva neoliberal, o alinhamento com políticas e
projetos educacionaisinternacionais aponta que são as de-
mandas sociais que, nesta conjuntura, tornam-se uma espé-
cie de necessidade capitalista voltada a formar competên-
cias operacionais para atender às demandas do mercado,
criando, em contrapartida, incompetentes para o exercício
da reflexão crítica e da liberdade, portanto, para o exercício
da ética (CURADO SILVA, 2020, p. 108).
Considerando a lógica reprodutora que tem estabelecido abei-
rar-se da formação de professores, questionou-se as SME acerca da
relação da BNCC e da formação continuada ofertada às equipes do-
centes e pedagógica. Com base nas respostas obtidas, pretendeu-se
analisar a conformação das práticas dessas secretarias quanto às re-
centes diretrizes oriundas do Conselho Nacional de Educação
(CNE), cujos achados são abordados a seguir.

Das 43 SME do estado do Paraná que obtivemos retorno,


100% informaram que a formação continuada que desenvolvem
para os professores da Educação Básica se fundamenta nos princí-
pios da Base Nacional Comum Curricular (BNCC) (BRASIL, 2017).
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

Vale lembrar que a BNCC foi instituída por meio da Resolução


CNE/CP nº 2, como um “documento de caráter normativo que de-
fine o conjunto orgânico e progressivo de aprendizagens essenciais
como direito das crianças [...] e orientam sua implementação pelos
sistemas de ensino das diferentes instâncias federativas, bem como
pelas instituições ou redes escolares” (BRASIL, 2017, p. 1). Trata-se
de uma política de educação neoliberal que está alicerçada nos dita-
mes domercado e apresenta uma concepção curricular restritiva, ar-
ticulada à produção de materiais didáticos e à regulação pelas avalia-
ções externas. Traz em seu bojo ações políticas e curricularesque vi-
sam “formar professores para ensinar a BNCC” (CURADO SILVA,
2020, p. 104), o que traz implicações graves ao trabalho docente,
como o seu esvaziamento, controle, precarização, desvalorização e
desintelectualização.
A formação continuada, ao fundamentar-se em um documento
normatizador e regulador, que se apresenta como mecanismo de
controle, naturaliza as relações de reproduçãosocial. E, ao compre-
ender o professor como um tarefeiro, os considera
[...] como obedientes servidores civis, desempenhando or-
dens ditadas por outros, e menos como pessoas criativas e do-
tadas de imaginação, que podem transcender a ideologia dos
métodos e meios a fim de avaliar criticamente o propósito do
discurso e da prática em educação (GIROUX, 1992, p. 14).
Assumir a BNCC como eixo de proposta formativa dos profes-
sores em sua formaçãocontinuada evidencia a tentativa de consoli-
dar a padronização e o controle do trabalho docente que, por sua
vez, reduz a prática pedagógica dos professores a ensinar os conte-
údos prescritos no documento.
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

Tal opção revela uma perspectiva de formação que visa ao


domínio de competências e habilidades, em termos da atu-
ação docente, por meio das quais o docente é capacitado
para realizar de forma eficaz o processo de ensino, num
processo de formação diretamente na prática, isto é, na área
de atuação profissional. O professor torna-se um instru-
mento de transmissão do conteúdo e o aluno tem sua for-
mação voltada para o mundo do trabalho, centrada pelas
aprendizagens essenciais (CURADO SILVA, 2020, p. 108).
Centralizar a formação a partir da BNCC objetiva “apren-
der e ensinar com vistas ao domínio de competências capazes
de relacionar a transposição da matéria a novas habilidades com-
petitivas” (CURADO SILVA, 2020, p. 109), ou seja, uma visão
esvaziada e distorcida do trabalho docente, pois não há separa-
ção entre o pensar e o executar.
Compreendemos que os professores são intelectuais, por
isso a autonomia deve perpassar o trabalho docente. A prática
de professores como intelectuais, de acordo com Giroux (1997,
p. 87), necessita “fornecer aos estudantes os instrumentos críti-
cos para compreender e desmantelar a racionalização crônica de
práticas sociais prejudiciais e, ao mesmo tempo, apropriar-se do
conhecimento e habilidades que precisam para repensar o pro-
jeto de emancipação humana”. A docência é uma via de possi-
bilidade de transformação social (GIROUX, 1992; 1997), não
existe neutralidade ao ensinar. Por isso, é necessário realizar o
enfrentamento à padronização imposta e ao esvaziamento pro-
posto no processo formativo via BNCC.
Destaca-se que, além das formações ocorrerem a partir da BNCC,
23% das 43 SME paranaenses utilizam documentos elaborados sob sua
luz, como podemos visualizar no gráfico a seguir:
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

Gráfico 04 – Documentos que fundamentam a formação continuada


ofertada pelas 43 SME/PR

Fonte: as autoras (2023).

A utilização de documentos estaduais/regionais/municipais


merece atenção, pois configura-se como uma possibilidade de
alargamento da concepção do trabalho docente para além da vi-
são simplista, padronizada e esvaziada, presente na BNCC. Visto
que no processo de elaboração curricular não existe neutralidade,
mas envolve relações de poder e produção de identidade. Assim,
no momento de elaboração de uma proposta curricular, é possí-
vel que cada estado/região/município considere as suas especifi-
cidades e afirme a sua concepção de educação, avaliação e orga-
nização do trabalho pedagógico.
Dentre os tais documentos citados pelas 43 SME paranaenses,
nota-se a predominânciado Referencial Curricular do Estado do Pa-
raná e da Proposta Pedagógica Curricular, elaboradapela Associação
dos Municípios do Oeste do Paraná (AMOP).
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

Gráfico 05 - Documentos elaborados à luz da BNCC, utilizados pelas 43


SME/PR na formação continuada

Fonte: as autoras (2023).

Ao considerarmos que 77% das 43 SME paranaenses desen-


volvem a formaçãocontinuada com base nas premissas presentes na
BNCC, compreendemos que as propostas da formação continuada
têm como fio condutor as competências e as aprendizagens essen-
ciais. Segundo o documento, as aprendizagens essenciais “devem
concorrer para assegurar aos estudantes o desenvolvimento de dez
competências gerais, que consubstanciam, no âmbito pedagógico,
os direitos de aprendizagem e desenvolvimento” (BRASIL, 2017, p.
8). O conceitode Aprendizagens Essenciais (AE), expresso no docu-
mento, faz parte da lógica neoliberal e temcomo pressuposto a reali-
zação e avaliação do ensino e da aprendizagem. “As AE são a base
comum de referência para a aprendizagem de todos os alunos, isto
é, o denominador curricularcomum. Desta forma, constituem-se, a
par do perfil dos alunos, como o referencial para a avaliação ex-
terna” (CURADO SILVA, 2020, p. 106). É preciso proporcionar
espaço de escuta e fala para os professores, para que professores,
por meio de um coletivo, façam ecoar suas vozes nesses debates, a
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

partir dos embates à proposta da BNCC. É imperativo, que ospro-


fessores abordem “questões sérias sobre o que ensinam, como de-
vem ensinar e quais objetivos mais amplos por que lutam”, como
bem pontua Giroux (1992, p. 22).
A formação continuada visa possibilitar uma sólida formação teó-
rica que considere os professores como sujeitos produtores do saber,
pois, como é um processo de desenvolvimento pessoal e profissional,
requer a superação de práticas formativas prescritivas e desconexas do
ato pedagógico. A formação que defendemos deve possibilitar, ao pro-
fessor, condições para que este possa refletir e teorizar sobre a sua prá-
tica docente. E que ao compreender e se apropriar da realidade, a qual
se efetiva a partir da unidade teórico-prática, propicie ao professor co-
nhecimentos e elementos que o ajudarão a intervir e transformar o seu
trabalho com vistas à construção de novas possibilidades nos processos
de ensino e aprendizagem, o que vai muito além das ditas aprendiza-
gens essenciais expressa no documento.
Ao indagarmos às 43 SME paranaenses de que maneira a pro-
posta de formação continuada está relacionada à BNCC, 14% não
indicaram a forma; das que responderam, 36%teceram respostas va-
gas ou citaram trechos dos documentos, o que não nos permitiu
identificarcomo se dá a relação.
Das demais SME respondentes, identificamos três (3) propos-
tas de eixos formativas, conforme a seguir: Eixo 1 - Estudos dos docu-
mentos; Eixo 2 - Orientação na e para a prática pedagógica; e Eixo 3 - Ade-
quação curricular.
No Eixo 1 - Estudos dos documentos, percebe-se que relatam
que a formação se dá a partir do estudo do/s documento/s, como
podemos observar nas falas abaixo:
Através de estudos (SME-PRx).
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

Estudo da proposta curricular (SME-PRx).


Em forma de leitura (SME-PRx).
Estudo da BNCC e Referencial Curricular do Paraná (SME-PRx).
O Eixo 2 - Orientação na e para a prática pedagógica, por sua vez,
apresenta ênfase na orientação na/para a prática pedagógica, como
podemos visualizar:
Buscando aprimorar as habilidades de cada componente
curricular (SME-PRx). Fazendo inferência aos campos de
experiência e saberes do conhecimento, e estruturas que
precisam ser abordadas em cada série, respaldando assim o
trabalho pedagógico (SME-PRx).
Abordando conteúdos e metodologias pertinentes a esse
documento (SME-PRx).
O Eixo 3 - Adequação curricular se volta para a construção do
currículo, conforme podemos constar nas falas abaixo:
Abrangendo o currículo da BNCC e Referencial Curricular
do Paraná (SME-PRx). As Formações Continuadas de im-
plantação/implementação do currículo, abordam os objeti-
vos de aprendizagem, habilidades, competências e apren-
dizagens essenciais propostos pela Base Nacional Comum
Curricular e as especificidades locais contextualizadas ao
meio de convivência do estudante (SME-PRx).
O que vemos a partir dos eixos encontrados é que a proposta
formativa presente na BNCC tem se materializado no âmbito edu-
cacional, a partir de formações em ações descontínuas, sem relação
entre si, ao evidenciar a desarticulação entre a teoria e a prática, o
que remete ao modelo de prática instrumental.
Conforme apontado por Magalhães (2019, p. 1999), tomar a
BNCC como base de formação equivale a “treinamentos dirigidos
por especialistas, asseados na epistemologia da prática, distanciando
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

os professores do desenvolvimento profissional ou da aprendiza-


gem/crescimento emancipador”. Há pouco ou nenhum espaço para
que os professores se façam ouvir, ou encontrem espaço para dialo-
gar sobre os desafios escolares cotidianos. Ou seja, para que partici-
pem como protagonistas e intelectuais no seu processo de forma-
ção. Esse fundamento e cerceamento do trabalho do professor é
expresso de maneira muita clara no documento, conforme segue:
A BNCC deve fundamentar a concepção, formulação, imple-
mentação, avaliação e revisão dos currículos, e consequente-
mente, das propostas pedagógicas das instituições escolares,
contribuindo, desse modo, para a articulação e coordenação de
políticas e ações educacionais desenvolvidas em âmbito fede-
ral, estadual, distrital e municipal, especialmente em relação à
formação de professores, à avaliação da aprendizagem, à defi-
nição de recursos didáticos e aos critérios definidores de infra-
estrutura adequada para o pleno desenvolvimento da oferta de
educação de qualidade (BRASIL, 2017, p. 5).
A formação continuada, à luz da premissa presente na BNCC,
conforme apontamos no decorrer deste texto, não valoriza o professor,
nem contempla a formação de um sujeito consciente do seu papel po-
lítico-social; e designar a esse momento formativo a função apenas de
formação de competências necessárias à atuação dos professores é con-
dicionar a prática pedagógica aos ditames do mercado, tornando-se via
de padronização de dinâmicas curriculares e do trabalho docente.
Importante reiterar que a formação continuada é parte consti-
tuinte do exercícioprofissional docente, porque emerge como uma
necessidade para a realização do exercício do seu trabalho. Trabalho
este compreendido como atividade material humana, transforma-
dora domundo e do próprio homem (VAZQUEZ, 2011). Compre-
ender o processo formativo, a partir da unidade teórico-prática, é
defender que a formação continuada faz parte do desenvolvimento
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

pessoal, intelectual e técnico do professor e está intimamente relaci-


onada à qualidade do ensino escolar. Portanto, a formação, o traba-
lho docente e os processos de ensino e aprendizagem devem ser
compreendidos como eixos que se entrelaçam e se constituem como
fios condutoresdo processo formativo dos professores.
Desta feita, a formação continuada deve ser compreendida como
um espaço fértil de possibilidades ao enfrentamento da proposta pela
BNCC, com vistas aos novos caminhos para a pratica pedagógica. Uma
formação centrada nas necessidades e preocupações dos docentes,
com ações formativas fundamentadas a partir da unidade teórico-prá-
tica e distante de um enfoque em técnicas, conteúdos e estratégias que
limitam o ensino critico, criativo e colaborativo na escola.

A formação continuada é compreendida como um processo de


formação intelectuale técnico, que objetiva responder às demandas
e aos desafios presentes na realidade social na qual o professor
exerce o seu trabalho. É um processo contínuo, intencional, que
ocorre durante toda a trajetória profissional. Deve possibilitar ao
professor estabelecer relações com a formação inicial, de modo a
fortalecer os processos de ensino e aprendizagem, circunscritos em
contextos escolares específicos. Como se trata de um elemento for-
mativo que visa a qualificação do trabalho pedagógico no espaço
escolar, a consolidação da profissão e da identidade docente deve
pautar-se na unidade teórico-prática, e ter o professor no centro
desseprocesso. Nessa perspectiva, a formação continuada é condi-
ção para o seu exercício daprofissão docente.
Entretanto, o que vemos aponta para outra compreensão e di-
reção da formação continuada. Em um cenário de avanço da agenda
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

neoliberal, as escolas têm sido pensadas comoempresas. Presencia-


mos o retrocesso de políticas educacionais e perdas importantes no
campoda formação de professores. O que se apresenta é um terreno
fértil para que processosprescritivos sejam impostos aos professo-
res, de modo a atender à BNCC, trazendo graves implicações para
o desenvolvimento profissional docente.
Esta pesquisa revela que a BNCC tem impactado no processo
formativo dos professores de maneira significativa, e tem ocupado
posição articuladora e centralizadora na formação continuada dos
professores das redes municipais de educação no Paraná. As pro-
postas de formação têm contemplado palestras, cursos, estudo de
documentos, ações descontínuas,desconexas da realidade da qual o
professor faz parte, ou seja, ações que são pensadas fora da escola e
reguladas por um documento. Atrelar a formação à BNCC aponta
contrariamente ao que esperamos para a formação continuada, pois
não permite que o professor participe ativamente e criticamente
deste processo. E tomá-la como eixo impossibilita que unidade teó-
rico-prática fundamente a formação, de modo a possibilitar a eman-
cipação humana.
Apontamos, nesta pesquisa, para a necessidade de se considerar
as instituições escolares como espaços plenamente capazes, com
condições de refletirem para as problemáticas por elasmesmas iden-
tificadas, implementando permanente reflexão e proposição dos
profissionais da educação envolvidos. E que estes sejam espaços
formativos, para estudo e análise crítica da BNCC, oferecendo con-
dições para a construção de uma pratica pedagógica voltada para a
reflexão, para a crítica e analise do contexto real da escola.
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

ANFOPE. XIX Encontro Nacional da Anfope - Políticas de for-


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-
Antonio Anderson Brito do Nascimento
Emerson Augusto de Medeiros
Osmar Hélio Alves Araújo
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s configurações que o curso de Pedagogia foi tomando ao


longo da história, fizeram com que muitas modificações se
incorporassem à formação de professores e professoras para o
exercício da docência, seja ela na Educação Infantil, nos anos ini-
ciais do Ensino Fundamental e nas diferentes modalidades educa-
tivas que requerem a atuação de pedagogos, como a Educação de
Jovens e Adultos, a Educação Profissional, a Educação Especial e
a Educação do Campo, por exemplo.
Algumas dessas mudanças que estiveram presentes no itinerá-
rio do curso de Pedagogiaforam instituídas por leis que impactaram,
diretamente, na formação de professores de forma geral, no currí-
culo do curso, entre outras. Dentre elas, algumas serão situadas na
discussão que estamos construindo ao longo deste texto. Desse
modo, acreditamos que pesquisas que propiciem pensar/refle-
tir/analisar a “Formação de Professores” não se esgotam e devem
ser dointeresse, principalmente, de toda comunidade docente, com
realce para os estudiosos da área de Educação que investigam a for-
mação docente para atuação na Educação Básica.
As diretrizes, resoluções e leis aprovadas e instituídas estão
continuamente trazendo movimentos benéficos e outros que se
_______________
9 O presente estudo é parte integrante de uma pesquisa desenvolvida no Mestrado
em Ensino (POSENSINO/UERN/UFERSA/IFRN) e também vinculada a
um estudo em desenvolvimento via Chamada CNPq/MCTI/FNDCT Nº
18/2021 - Faixa A -Grupos Emergentes, processo nº 404720/2021-8.
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contrapõem a real finalidade para o campo da formação docente.


Estarmos atentos é um aspecto necessário para, de fato, vivenci-
armos uma formação docente fundamentada em uma Pedagogia
Crítica. Assim, politicamente situados no contexto social pode-
mos nos posicionar e perceber as questões que estão diretamente
ligadas à docência e à educação como consequência, especial-
mente a educação pública.
Acreditando na importância de trazermos à tona os movimentos
correntes na história, temos como objetivo central, neste trabalho, ana-
lisar a trajetória do curso de Pedagogia no Brasil (1930 a 2019) e a for-
mação de professores polivalentes. A pesquisa assume a abordagem
qualitativa, a qual “[...] exige que o mundo seja examinado com a ideia
de que nada é trivial, que tudo tem potencial para constituir uma pista
que nos permita estabelecer uma compreensão mais esclarecedora do
nosso objecto de estudo” (BOGDAN; BIKLEN, 1994, p. 49).
Utilizamos também da revisão bibliográfica. Nesse sentido,
para desenvolver a contextualização histórica sobre o curso de Pe-
dagogia no Brasil, utilizamos de Medeiros, Araújo e Santos (2021),
Sokolowski (2013), Fiorin e Ferreira (2013) e Scheibe (2007). Já para
historicidade e o conceito de formação de professores polivalentes
e de polivalência, nos respaldamos em Cruz e Neto (2012), Cruz,
Ramos e Silva (2017), e Pimenta et al. (2019).
Além desses aspectos, pontuamos que fizemos uso de documen-
tos normativos que versam sobre o curso de Pedagogia e a formação
de professores na perspectiva da polivalência, dentre eles, citamos a
Resolução CNE/CP nº 1, de 15 de maio de 2006, que auferiu Diretri-
zes Curriculares Nacionais para o Curso de Pedagogia; e a Resolução
CNE/CP nº 2, de 20 de dezembro de 2019, que definiu Diretrizes Cur-
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riculares Nacionais para a Formação de Professores da Educação Bá-


sica e homologou a Base Nacional de Formação Inicial de Professores
da Educação Básica (BNC-Formação). Desse modo, esse estudo tam-
bém se tipifica como uma pesquisa documental, haja vista que analisa
documentos cernes na história do referido curso.
Pontificamos que ao debatermos sobre a trajetória do curso de
Pedagogia no Brasil tendo como recorte temporal o período de 1939
a 2019, o fizemos fundamentados na justificativa do ano de criação
do referido curso na Faculdade Nacional de Filosofia até a publicação
da Resolução CNE/CP nº 2, de 20 de dezembro de 2019, último do-
cumento que evidencia implicações curriculares à licenciatura.
O restante do texto, após esta breve introdução, está organi-
zado em mais três seções: nasegunda seção, abordaremos a história
do curso de Pedagogia no Brasil (1939-2019), delineando os acon-
tecimentos marcantes para sua institucionalização e construção da
identidade profissional dos seus discentes. Na seção, analisaremos
documentos legais que estiveram/estão redimensionando a forma-
ção de professores/pedagogos no curso. Na terceira seção, contem-
plamos a historicidade da polivalência e a formação de professores
polivalentes.Buscamos entender as modificações que aconteceram
na nomenclatura até esta deixar de ser usual. Para além, na última
seção, apresentamos as considerações finais.

O itinerário do curso de Pedagogia no Brasil é repleto de des-


dobramentos. Nesse sentido, seu debate no campo educacional não
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

é somente uma realidade dos dias atuais, questõeshistóricas permea-


ram as concepções do currículo e da formação ofertada pelo curso.
Desse modo, pretendemos nesta seção, situá-los a respeito da his-
toricidade do curso de Pedagogia noBrasil.
Contextualizando historicamente, pelo que se faz compreen-
dido, o curso de Pedagogiainiciou suas atividades, em território bra-
sileiro, no ano de 1939, não de forma passiva, mas decorrente de
reivindicações da população trabalhadora, como nos conta Soko-
lowski (2013). No entanto, antes de chegar a esse marco, vamos re-
gressar um pouco ao passado.
Foi na década de 1930, em decorrência da crise econômica, que
o mercado de trabalhoexigiu do povo brasileiro maior escolarização,
em contrapartida lhes permitindo acesso à educação. Com essa exi-
gência, surgem muitas manifestações e mobilizações por parte da
população. É nesse período também, mais precisamente em 1932,
que temos o Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova (Escola
Nova). Criado por intelectuais educadores, o manifesto além de pro-
por o que estava em foco nas discussões da época, por mais escolas,
também pretendia alcançar a universalização do ensino.
Esse grupo “[...] entendia que o emergente processo de indus-
trialização necessitava de políticas educacionais que modernizassem
a educação. Defendiam eles uma nova pedagogia que fosse eficaz na
formação de cidadãos adequados a esse processo” [a industrializa-
ção] (SOKOLOWSKI, 2013, p. 83). Destacamos também, nesse pe-
ríodo, a criação da “Universidade de São Paulo, em 1934, e a Uni-
versidade do Distrito Federal, em 1935”, situada no Rio de Janeiro,
capital, à época, do Brasil (SOKOLOWSKI, 2013, p. 84), conquista
obtida também por intermédio das reivindicações.
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

Com essas instituições, em 1939, inicia a implementação do


curso de Pedagogia. Diferentemente do modelo que temos até o ano
desta pesquisa (2023), este era direcionado a uma vertente bachare-
lesca. Entretanto, os discentes poderiam ao término da sua graduação
optarpor enveredar a sua formação pela licenciatura. Na literatura
educacional, esse modelo de formação docente é denominado de
3+1. Mas como isso acontecia?
Segundo Sokolowski (2013, p. 84), “este esquema consistia em três
anos de estudo dos conteúdos cognitivos ou das disciplinas específicas,
o curso de bacharelado, e um ano de conteúdos didáticos, o curso de
didática”. Essa formação em Educação, no curso de Didática, concedia
a qualificação “para atuação no antigo Ensino Secundário, equivalente,
em termos atuais, aos anos finais do Ensino Fundamental e ao Ensino
Médio” (MEDEIROS; ARAÚJO; SANTOS, 2021, p. 04). Vale pontifi-
car que “a criação do Curso de Pedagogia no Brasil está associada a outro
acontecimento importante na história da educação brasileira: o nasci-
mento da Faculdade Nacional de Filosofia” (MEDEIROS; ARAÚJO;
SANTOS, 2021, p. 02).
Entendendo isso, ao analisarmos o decreto Lei nº 1.190, de 4 de
abril de 1939, em que neste está distribuída a matriz curricular do
curso de Pedagogia, podemos observar, na secção XI, que segundo o
art. 19, a primeira série (primeiro ano) seria organizada a partir dos:

Complementos de matemática.
História da filosofia.
Sociologia.
Fundamentos biológicos da educação.
Psicologia educacional (BRASIL, 1939).

Já a segunda série (segundo ano de formação) abordava:


FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

Estatística educacional.
História da educação.
Fundamentos sociológicos da educação.
Psicologia educacional.
Administração escolar (BRASIL, 1939).

E, para finalizar, na terceira série (terceiro ano) ter-se-ia:

História da educação.
Psicologia educacional.
Administração escolar.
Educação comparada.
Filosofia da educação (BRASIL, 1939).

Com essas cinco últimas disciplinas, findavam-se os três anos


do curso na perspectivabacharelesca que a graduação propunha. En-
tretanto, como já ressaltado anteriormente, aos quepretendessem a
licenciatura precisariam vivenciar o curso de Didática, que era cons-
tituído pelas disciplinas, de acordo com a seção XII, do art. 20, do
decreto em discussão:

Didática geral.
Didática especial.
Psicologia educacional.
Administração escolar.
Fundamentos biológicos da educação.
Fundamentos sociológicos da educação (BRASIL, 1939).

Como demonstrado, eram 6 disciplinas que correspondiam


a um ano de estudos. No entanto, Medeiros, Araújo e Santos
(2021) nos chamam atenção para um aspecto importante. Se-
gundo os autores, como as disciplinas de número 3, 4, 5, e 6 da
matriz curricular do curso de Didática, mostrada anteriormente,
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

eram cursadas entre a segunda e terceira séries, “dessa forma, as


disciplinas de Didática Geral e Didática Especial são as únicas
que, em verdade, seriam necessárias para a obtenção do título de
licenciado” (MEDEIROS; ARAÚJO; SANTOS, 2021, p. 06).
Com o passar do tempo foram acontecendo transformações no
curso. Uma delas ocorreuno ano de 1941, em que foi publicado o
decreto de Lei nº 3.454, de 24 de julho, que restringia o alunado de
cursar ao mesmo tempo as duas modalidades, bacharelado e licen-
ciatura. O textonormativo pontua:
Artigo único. A partir do ano escolar de 1942, os alunos das
faculdades de filosofia, ciências e Letras não poderão reali-
zar o curso de didática simultaneamente com qualquer dos
cursos de bacharelado.
Parágrafo único. Ficam ressalvados os direitos dos que até o
ano de 1941 iniciaram os seus estudos de maneira diferente
(BRASIL, 1941, grifos do documento normativo).
Visto isto, nos anos de 1943, 1946 e 1948 foram homologadas
algumas leis, foi promulgada uma nova constituição e surgiram ca-
lorosos debates, porém, nada que se distanciasse da perspectiva do
curso de Pedagogia com uma formação bacharelesca e de licencia-
tura. No entanto, destacamos o período de 1948, que por aconteci-
mento neste, a Lei deDiretrizes e Bases da Educação só pode ser vi-
gorada 12 anos depois, em 1961, que também nãomodificou o que
se tinha por modelo (SOKOLOWSKI, 2013).
No ano subsequente, 1962, há outra publicação de parecer,
este de nº 292, de 14 de novembro, do Conselho Federal de Edu-
cação. Dessa vez, teceram-se considerações que redimensiona-
ram o currículo do curso, retirando o modelo de 3+1 e fixando
as disciplinas pedagógicas da licenciatura. Com isso, os alunos se
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

formariam tanto bacharéis como licenciados em Pedagogia ao


mesmo tempo (MEDEIROS; ARAÚJO; SANTOS, 2021).
Medeiros, Araújo e Santos (2021), nos lembram que o ano de
1968 teve forte influênciano ano posterior, pois foi neste que acon-
teceu a Reforma Universitária, imposta pela Lei 5.540, de 28 de no-
vembro, redefinindo a formação de professores e estrutura organi-
zacional do ensinosuperior. No ano de 1969, foi publicado o parecer
do Conselho Federal de Educação (CFE) nº 252, de 11 de abril, que
segundo Fiorin e Ferreira (2013, p. 50), se pretendia “distanciar-se
do Parecer de 1962, recuperando a história do curso e as Leis vigen-
tes no período, objetivando mudanças na estrutura curricular”.
Nessa perspectiva, foram criadas as “[...] habilitações em Adminis-
tração Escolar, Orientação Educacional, Supervisão Escolar, Inspe-
ção Escolar e Magistério para o Ensino Normal [...]” (MEDEIROS;
ARAÚJO; SANTOS, 2021, p. 09).
Nessa nova construção, ainda vamos perceber o início e o fim
de dualidades no que dizrespeito à formação e atuação dos profes-
sores e profissionais da Educação licenciados em Pedagogia. As ha-
bilitações eram destinadas para os especialistas em Educação e não
para atuação na docência no Ensino Primário (atualmente anos ini-
ciais do Ensino Fundamental10). Entretanto, alguns teóricos teceram

_______________
10 Nesse período da história, o curso de Pedagogia formava professores para atuar
nas escolas normais, espaços de formação do professor do Ensino Primário. O
que se destaca nesse período é que, mesmo não sendo licenciado para atuar no
Ensino Primário, muitos pedagogos lecionavam em tal nível de ensino,
deixando a questão: por que não é possível lecionar no Ensino Primário, uma
vez que era o curso de Pedagogia que formava os professores formadores dos
docentes do Ensino Primário?
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

considerações a respeito de que essa especificidade tornavaos profis-


sionais muito confusos sobre o seu trabalho e assim deixando ainda
muitas questões aserem resolvidas. Vale salientar que foi justamente
nesse período que o curso começou a ser concebido apenas como
licenciatura, deixando o perfil do bacharelado.
Passado este período, chegamos ao momento de formação, na
década de 1980, da Comissão Nacional pela Reformulação dos Cur-
sos de Formação de Educadores (CONARCFE) e que em 1990 foi
modificada e começou a ser chamada de Associação Nacional pela
Formação dos Profissionais da Educação (ANFOPE), considerada
por alguns autores, junto à AssociaçãoNacional de Pós-Graduação
e Pesquisa em Educação (ANPED), “[...] a principal instância de
defesa no que diz respeito à formação dos professores (para atuação
docente nos anos iniciais do Ensino Fundamental e na Educação
Infantil) no Ensino Superior, na Licenciatura em Pedagogia”
(MEDEIROS; ARAÚJO; SANTOS, 2021, p. 11).
Nesse período da história (décadas de 1980 e 1990), a forma-
ção de professores também continuou passando por mudanças.
Como em períodos anteriores e, podemos notar em posteriores
também, as instituições educacionais acabaram se rendendo ao
modelo sócio-político da época, no caso o neoliberalismo, assim,
atendendo à demanda do mercado. Nesse interim, “A educação
passou a ser defendida como aspecto central do desenvolvimento
econômico” (SOKOLOWSKI, 2013, p. 88).
Já no ano de 1996, temos outro marco educacional, a Lei de
Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), de 20 de dezem-
bro, que em sua perspectiva de “Composição dos Níveis Escolares,
art. 21, demarca que a educação escolar compõe-se de: I – educação
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básica, formada pela Educação Infantil, Ensino Fundamental e En-


sino Médio; II – Educação Superior”(BRASIL, 1996, p. 14). Assim,
com a Lei, estariam sendo determinadas novas alterações para a for-
mação de professores. Entretanto, em seu texto, o curso de gradua-
ção em Pedagogia não era o único habilitado à formação dos licen-
ciados para atuarem no âmbito educacional dos pedagogos, como
destacado no artigo 63. Observemos:
Art. 63. Os institutos superiores de educação manterão:
I – cursos formadores de profissionais para a educação bá-
sica, inclusive o curso normal superior, destinado à forma-
ção de docentes para a educação infantil e para as primeiras
séries do ensino fundamental;
II – programas de formação pedagógica para portadores de
diplomas de educação superior que queiram se dedicar à
educação básica;
III – programas de educação continuada para os profissio-
nais de educação dosdiversos níveis.
Art. 64. A formação de profissionais de educação para admi-
nistração, planejamento, inspeção, supervisão e orientação
educacional para a educação básica, será feita em cursos de gra-
duação em pedagogia ou em nível de pós-graduação, a critério
da instituição de ensino, garantida, nesta formação, a base co-
mum nacional (BRASIL, 1996, p. 26-27).
Nesses diferentes loci possíveis de formação, textualizados na
LDB, davam ao alunado as mesmas possibilidades de atuação do pe-
dagogo, porém, nos institutos superiores a formação era considerada
com caráter aligeirado. Felizmente, a Lei não foi bem aceita por parte
do campo educacional e, com isso, a Comissão de Especialistas de En-
sino de Pedagogia, em maio de 1999, após concordar com grandes ins-
tâncias como a ANFOPE e a ANPED, dentre outras, fomentou a cri-
ação de uma proposta com diretrizes para a formação de professores,
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

que encaminhadas ao Conselho Nacional de Educação (CNE), por vá-


rias vezes, vivenciou resistências para serem analisadas.
Interessante compreender que existiam pontos confrontantes
com a LDB, causando mais motivos para isentar a apreciação. En-
tretanto, Scheibe (2007, p. 50) nos conta que,
Diferentemente do descaso com que foi então recebida no
CNE, a proposta foi bem acolhida pela comunidade acadê-
mica. Silva (2003) apresenta dois motivos para esse acolhi-
mento: o primeiro, por ter adotado os princípios construí-
dos ao longo do movimento dos educadores no que se re-
fere ao Curso de Pedagogia; o segundo, por contemplar
tendências em conflito no que diz respeito às funções do
Curso de Pedagogia e ao papel do pedagogo.
Mas com o CNE a insistência continuou, com o envio de do-
cumentos, um deles até o ano de 2001. Só no ano de 2005, houve
movimentação mais exitosa na Resolução das DiretrizesCurriculares
Nacionais para os cursos de graduação em Pedagogia. Vale ressaltar
que a publicação do documento aconteceu por duas vezes, sendo
que a primeira se deu no dia 17 de março e a segunda dia 13 de
dezembro, ambas no mesmo ano, mas sem efetividade e validade.
Isso se efetuou devido ao descontentamento da comunidade acadê-
mica, pois era destacado que na resolução estavam sendo apresen-
tadas diretrizes que não se distanciaram do antigo cursonormal11
(SCHEIBE, 2007).
Scheibe (2007, p. 54-55), conta-nos que a resolução que apre-
sentava as diretrizes era:
_______________
11 Vale lembrar que paralela à construção das Diretrizes Curriculares Nacionais
para o Curso de Pedagogia, houve a publicação das primeiras Diretrizes Curri-
culares Nacionais para a Formação Inicial de Professores, Resoluções CNE/CP
nº 1, de 18 de fevereiro de 2002, e nº 2, de 19 de fevereiro de 2002.
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

Contrária as aspirações históricas dos educadores em relação


às diretrizes curriculares nacionais para o Curso de Pedagogia.
Reduz o Curso de Pedagogia ao que se pretendeu estabelecer
para os Cursos Normais Superiores. O projeto do CNE não
leva em consideração o fato de que é o Curso de Pedagogia o
espaço acadêmico de que a universidade brasileira dispõe para
os estudos sistemáticos e avançados da área da educação. As
competências indicadas no artigo 3º explicitam a concepção
instrumental da formação de professores para a educação in-
fantil e séries iniciais do ensino fundamental, desconsiderando
as contribuições presentes nos documentos de diretrizes ela-
borados pelas entidades.
A proposição de um bacharelado pós-licenciatura, com a
duração de 800 horas, apostilado ao diploma, ‘visando ao
adensamento em formação científica’, representa clara des-
valorização da formação para a docência, cuja capacitação,
alijada ‘do adensamento teórico’, da pesquisa e da produção
de conhecimento, que deveria ser sua base, reduz-se, então,
ao pragmatismo da docência para as séries iniciais da edu-
cação fundamental ou para a educação infantil, aprofun-
dando a dicotomia entre teoria e prática.
Tal formulação desconsiderou a particularidade da Pedagogia
como uma das ‘ciências práticas’ mais ricas em tradição (Sch-
mied-Kowarzik), o que lhe daria a condição de formar o ba-
charel e o licenciado ao mesmo tempo, sem dicotomias, como
preveem as propostas de diretrizes curriculares elaboradas pe-
las duas últimas Comissões de Especialistas do Curso de Pe-
dagogia da Sesu/MEC e referendadas pelas entidades repre-
sentativas dos educadores.
Existe grande dissonância entre a concepção de organização
curricular do Curso de Pedagogia expressa no projeto de re-
solução e o desenho do projeto pedagógico e curricular con-
tido na proposta de diretrizes curriculares elaborada pela Co-
missão de Especialistas da Educação da Sesu.
Ao definir a formação de especialistas nas áreas previstas no
artigo 64 da LDB, a proposta de resolução o faz de maneira
imprecisa, invocando as exigências do artigo 67 da mesma lei
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

para estabelecer que essa formação será feita exclusivamente


para licenciados, podendo levar à compreensão de que a
mesma se dê apenas na pós-graduação, o que fragmentaria a
formação e contribuiria com a abertura de um novo e atra-
ente nicho de mercado para os cursos de especialização,
quase todos, hoje, nas mãos das IES privadas, o que signifi-
caria a privatização e a elitização da formação desses profis-
sionais, em cursos de duvidosa qualidade, acessíveis apenas
aos formandos em condições econômicas de dar continui-
dade à sua profissionalização.
A partir dessas considerações, foram organizadas novas
mobilizações em que se reivindicavam apontamentos que “fo-
ram sintetizados em documento assinado pela ANFOPE,
ANPED e CEDES e enviado ao Conselho Nacional de Educa-
ção com solicitação de uma audiência pública antes da aprova-
ção definitiva das diretrizes” (SCHEIBE, 2007, p. 54). No que
se pode observar, as reivindicações foram atendidas, não por
completo, mas o suficiente para que fossem pensadas as ques-
tões que envolvem a licenciatura e o bacharelado, além da am-
pliação da formação do pedagogo.
Com o novo perfil conquistado para o profissional formado
pelo curso de Pedagogia, há avanços:
As habilitações foram extintas. O Curso de Pedagogia – licen-
ciatura – deverá formar integradamente para o conjunto das
funções a ele atribuídas. O Parecer CNE/CP 5/2005 sugere
que cada instituição, no projeto pedagógico do curso, circuns-
creva áreas ou modalidades de ensino que proporcionem apro-
fundamento dos estudos (SCHEIBE, 2007, p. 58).
A partir disso, ações formativas foram mais direcionadas no que
diz respeito à formaçãodo licenciado em Pedagogia, bem como ao
currículo do curso, tornando-se mais abrangente e duradouro, com
o mínimo de horas que correspondia a 3.200, dentre outras questões
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de caráter organizacional (como a prática como componente curri-


cular, os estágios supervisionados, a pesquisa como eixo fundante
da formação, dentre outros).
Em 2006, temos a publicação da Resolução CNE/CP nº 1, de
15 de maio. Seu primeiroartigo, explica:
[...] A presente Resolução institui Diretrizes Curriculares
Nacionais para o Curso de Graduação em Pedagogia, licen-
ciatura, definindo princípios, condições de ensino e de
aprendizagem, procedimentos a serem observados em seu
planejamento e avaliação, pelos órgãos dos sistemas de en-
sino e pelasinstituições de educação superior do país, nos
termos explicitados nos Pareceres CNE/CP 5/2005 e
3/2006 (BRASIL, 2006, p. 01).
Nessa resolução, podemos apreciar as considerações sobre a
formação e exercício dos licenciados em Pedagogia, entendendo que
o curso formaria para desenvolver o “[...] magistériona Educação In-
fantil e nos anos iniciais do Ensino Fundamental, nos cursos de En-
sino Médio,na modalidade Normal, de Educação Profissional na área
de serviços e apoio escolar e em outrasáreas nas quais sejam previstos
conhecimentos pedagógicos” (BRASIL, 2006, p. 02).
No que cabe à organização curricular, o curso precisava resta-
belecer a sua carga horáriapara se adequar às modificações. Como já
citado anteriormente, foram atribuídas 3.200 horas, elas seriam con-
densadas da seguinte forma:
I - 2.800 horas dedicadas às atividades formativas como as-
sistência a aulas, realização de seminários, participação na
realização de pesquisas, consultas abibliotecas e centros de
documentação, visitas a instituições educacionais e cultu-
rais, atividades práticas de diferente natureza, participação
em grupos cooperativos de estudos;
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

II - 300 horas dedicadas ao Estágio Supervisionado prioritaria-


mente em Educação Infantil e nos anos iniciais do Ensino Fun-
damental, contemplando também outras áreas específicas, se for
o caso, conforme o projeto pedagógico da instituição;
III - 100 horas de atividades teórico-práticas de aprofunda-
mento em áreas específicas de interesse dos alunos, por
meio da iniciação científica, da extensão e da monitoria
(BRASIL, 2006, p. 04).
Com isso, frente à perspectiva de formação:
Art. 3º O estudante de Pedagogia trabalhará com um reper-
tório de informações e habilidades composto por pluralidade
de conhecimentos teóricos e práticos, cuja consolidação será
proporcionada no exercício da profissão, fundamentando-se
em princípios de interdisciplinaridade, contextualização, de-
mocratização, pertinência e relevância social, ética e sensibi-
lidade afetiva e estética (BRASIL, 2006, p. 01).
Medeiros, Araújo e Santos (2021), nos alertam que o processo para
adaptação dessas diretrizes, pelos cursos de Pedagogia nas instituições
do país, foi acelerado, e as mudanças não pararam por aí. Surgiram novas
resoluções como a Resolução CNE/CP nº 2, de 01 de julho de 2015, e
a Resolução CNE/CP nº 2, de 20 de dezembro de 2019.
A Resolução CNE/CP nº 2, de 01 de julho de 2015, não se
afastou do que estava sendo apresentado na resolução específica de
2006 (dos cursos de Pedagogia). Ela demarcou a docência como o
pilar central da identidade dos cursos de licenciatura, respigando, di-
retamente, no curso de Pedagogia. Entretanto, a Resolução
CNE/CP nº 2, de 20 de dezembro de 2019, traznovas diretrizes e,
“[...] o que se almejou como a base comum nacional se consolidou
na Base Nacional Comum de Formação” (MEDEIROS; ARAÚJO;
SANTOS, 2021, p. 18).
Assim, prescreveram-se modificações ao currículo do curso de
Pedagogia, sua carga horária passou de 3.200 horas para 3.600 horas,
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

para contemplar aspectos da “[...] gestão educacional (envolvendo co-


nhecimentos e conteúdos curriculares sobre a administração, o pla-
nejamento, a inspeção e a orientação educacional)” (MEDEIROS;
ARAÚJO; SANTOS, 2021, p. 18).
Salientamos que na Resolução CNE/CP nº 2, de 20 de dezem-
bro de 2019, encontramos os objetivos, as questões dos fundamen-
tos, da política e a organização curricular dos cursos de licenciatura,
bem como aspectos norteando a formação docente. Além disso, há
apontamentos para a primeira licenciatura e para a segunda licencia-
tura, para a formação pedagógica para professores bacharéis, para ati-
vidades de gestão e o processo avaliativo interno e externo dos cursos.
No entanto, a mobilização no campo educacional sobre a resolução
discutida anteriormente tem sido tônica. As entidades representativas da
área educacional (ANFOPE e ANPED, principalmente) têm sinalizado
para o caráter neoliberal que tal resolução se alinha. A ênfase nas com-
petências a serem construídas pelos licenciandos é um dos aspectos pon-
tificados. No documento de 2019, por exemplo, podemos ver mencio-
nado o termo “Competência” (no singular) aproximadamente 51 vezes
e “Competências” (no plural) 50 vezes.
Refletindo sobre esses aspectos em relação às competências en-
fatizadas na resolução e norteadas a partir da BNC-Formação, Me-
deiros, Araújo e Santos, (2021, p. 583) corroboram que:
Ainda sobre a BNC, identificamos uma ênfase no desen-
volvimento de competências como o principal objetivo a
ser alcançado nos processos formativos na licenciatura.
Essa característica já foi constatada em outros dispositivos
legais, a exemplo das primeiras Diretrizes Curriculares Naci-
onaispara a Formação Inicial de Professores da Educação
Básica, publicadas em 2002 [...]. Com isso, outro dilema se
atesta: superar na organização e desenvolvimento do currí-
culo do Curso (em cada instituição) a formação centrada na
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

racionalidade técnica, associada à lógica do sistema social


capitalista e atentar para a formação crítica, visando proces-
sos formativos quevalidem dimensões contextuais.
Em relação ao curso de Pedagogia, o documento normativo faz
retomar, no interior das faculdades, centros e departamentos de Edu-
cação de todo o país, a discussão sobre o perfil pensado para o egresso
do curso. A resolução inferioriza a concepção de docência como pilar
central projetada ao longo dos anos para ser materializada na forma-
ção no curso de Pedagogia. Além disso, volta-se à questão da atuação
do pedagogo em espaços da gestão educacional e escolar, como se no
curso de Pedagogia não fosse possível refletir sobre a formação do
profissional da educação. A própria discussão sobre a Pedagogia,
como ciência da educação, é totalmente silenciada – considerando as
prescrições do texto normativo.
Além do mencionado, podemos notar que a Resolução
CNE/CP nº 2, de 20 de 2019, conjectura um curso de Pedagogia
dividido em dois. Podemos verificar enfaticamente quando no art.
13 está mencionada a seguinte orientação:
[...] Para o Grupo II, que compreende o aprofundamento
de estudos na etapa e/ou no componente curricular ou área
de conhecimento, a carga horária de 1.600 horas deve efe-
tivar-se do 2º ao 4º ano, segundo os três tipos de cursos,
respectivamente destinados à:
formação de professores multidisciplinares da Educação Infantil;
formação de professores multidisciplinares dos anos ini-
ciais do EnsinoFundamental; e
formação de professores dos anos finais do Ensino Fun-
damental e doEnsino Médio (BRASIL, 2019, p. 07).
Não poderíamos deixar passar despercebida em nossa análise,
quando o texto utiliza a expressão “Três tipos de cursos” englobando
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

nesse quantitativo a Educação Infantil (primeiro curso de Pedagogia)


e o Ensino fundamental, anos iniciais (segundo curso de Pedagogia)
como dois deles (cursos de Pedagogia). No entanto, apesar de estar-
mos conscientes que são duas etapas diferentes da Educação Básica,
estes não se configuram como dois cursos, já que ambos estão insti-
tuídos como partes da formação para atuação dos docentes formados
pelo curso de licenciatura em Pedagogia, até então.
Assim, o que o texto traz como professor multidisciplinar da
Educação Infantil, em outras palavras, é o pedagogo. Da mesma
forma acontece quando o manuscrito utiliza a mesmaexpressão para
se referir ao docente dos anos iniciais do Ensino Fundamental, que
também é o pedagogo. Esse profissional que é formado por um
único curso, atuando nas duas instâncias citadas e em outras mais
da Educação, mas que nas configurações políticas e ideológicas que
estão tomando espaços nos âmbitos constituintes das leis para for-
mação, acabam reconfigurando ou tentando, com novas e velhas
características, uma licenciatura, até o momento, ameaçada a possí-
vel apartamento em termos de atuação docente.
Lembramos que há outras frentes organizadas, além da ANFOPE
e da ANPED que também defendem o curso de Pedagogia no Brasil,
por exemplo a Rede Nacional de Pesquisador@s em Pedagogia - ReP-
Ped. Essa instância também compreende que a divisão proposta ao
curso de Pedagogia em dois cursos, um para formar os professores da
Educação Infantil e outro para formar os professores dos anos iniciais
do Ensino Fundamental carece de um debate e reflexão ampla.
Em linhas finais, percebemos que foram muitos os desdobra-
mentos para o curso de Pedagogia se tornar uma licenciatura. Um
itinerário repleto de lutas (que não se findaram) pordireitos que, por
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

insistência de educadores e organizações representativas da Educa-


ção, tornoupossível alcançar o que se constituiu por sua identidade,
até então. Assim, contada a história (trajetória) do curso, na próxima
seção nos dedicaremos a dialogar sobre a formação de professores
polivalentes, bem como a polivalência na perspectiva da docência.

Quando pensamos no termo polivalência, logo vem ao consci-


ente a possibilidade multifuncional por parte de um sujeito. Algo
que propicia, também, ao mercado de trabalho um profissional que
ofereça a garantia de remanejamento de funções ou atribuições em
diversas atividades. Nesse sentido, Cruz e Neto (2012, p. 386), re-
forçam que o termo “[...] tem sido comumente usado no contexto
do mundo do trabalho, requisitado pelo discurso neoliberal no pe-
ríodo pós-crise do capitalismo”. Além disso, complementam que
“designa a capacidade de o trabalhador poder atuar em diversas
áreas, podendo caracterizar ainda um profissional pautado pela fle-
xibilização funcional” no sistema social.
Nesse processo do entendimento da flexibilização e transição
caracterizada como polivalência, temos a formação dos licenciados
em Pedagogia, os pedagogos. Na perspectiva sobre a polivalência
e o olhar para a atuação do professor, Cruz, Ramos e Silva (2017,
p. 1191), declaram:
[...] que a noção de polivalência estaria associada a um sentido
generalista e superficial de trato com os conteúdos curricula-
res denotando uma relação economicista de relação ‘custo‐
benefício’ sob a justificativa de se suprir o déficit de profes-
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

sores para atuarem na crescente população escolar com en-


sino obrigatório estendido no período para oito anos. Já a
noção de professor polivalente seria associada à visão de que
este seria um profissional que transita por diferentes áreas de
conhecimentos articulando saberes e procedimentos.
Diante da proposta curricular do curso de Pedagogia, a transi-
ção do professor polivalente dá liberdade ao desempenho da atuação
desses profissionais em diferentes espaços,podendo ser escolares e
não escolares. Nas escolas, podem ocupar todas as funções e fora
do âmbito escolar, podem atuar em instituições como presídios, su-
permercados, hospitais, dentre outros que utilizam da esfera peda-
gógica (PIMENTA et al. 2017). Pimenta et al. (2017, p. 18)conside-
ram que a amplitude que é destinada à atuação do pedagogo “[...]
excede significativamente o exercício da docência, em especial,
quando se propõe a preparar esse professor para a área da gestão
educacional e atuação em espaços não escolares”.
Vale ainda ressaltar que nem todos os docentes são apresentados
como polivalentes. Segundo Pimenta et al. (2017, p. 17) “a denomina-
ção de polivalente se refere ao professor dos anos iniciais do ensino
fundamental, que marca a atuação desse profissional desde as origens
da então escola normal de ensino médio [...]”.
Essas escolas advindas de um modelo europeu, aqui no Brasil,
respaldam a cultura vivida no período de 1835. As escolas normais
eram, inicialmente, vinculadas à nobreza e em seu público predomi-
nava o gênero masculino. Essas instituições não tinham permanên-
cia em suas atividades. Iniciavam e fechavam com frequência. No
nosso país, a primeira foi fundada no Rio de Janeiro.
Hahner (2011, p. 470), nos conta que:
A primeira escola normal para treinamento de professoras
primárias, uma ideia europeia, tinha surgido em Niterói, em
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

1835, numa tentativa de melhorar o padrão de ensino. Nas


décadas seguintes, foi seguida por outras em várias provín-
cias e na Corte, embora as primeiras escolas normais fossem
destinadas só para homens.
Só com o passar dos anos, entre algumas modificações de go-
vernantes durante o período, foi que as mulheres encontraram es-
paços nessas escolas. Assim, dada essa contextualização breve sobre
as escolas normais, Pimenta et al. (2017, p. 17) contam que no século
XIX, os docentes eram formados “[...] para ensinar as disciplinas
(matérias) básicas: língua portuguesa (alfabetização), história, geo-
grafia, ciências e matemática”.
Na busca de compreender ainda mais sobre a polivalência, Cruz,
Ramos e Silva (2017, p. 1190), levando em consideração os documen-
tos de 1970, relatam que “o termo polivalência ou polivalente no pe-
ríodo que compreende o governo militar foi apresentado pelo Con-
selho Federal de Educação, a partir das indicações do Conselheiro
Valnir Chagas”. Nesse contexto, Valnir ainda havia apresentado “[...]
indicações que tinham como foco a regulamentação da formação de
professores [...]. Uma boa parte de suas indicações não foi aprovada,
mas, figuraram como elementos polêmicos para esse campo de for-
mação profissional” (CRUZ; RAMOS; SILVA, 2017, p. 1190).
Nesta indicação, a qual segundo Cruz, Ramos e Silva (2017, p.
1189) não foi promulgada,
[...] foi proposta a ideia de polivalência para afirmar um nú-
cleo comum nos currículos a partir da compreensão de que
o professor não é um ‘tarefeiro’ e precisa vivenciar uma for-
mação que lhe garanta compor junto ao processo educa-
tivo, a dimensão da preparação integral do aluno, dos con-
teúdos das matérias a serem ensinadas e dos métodos apro-
priados para atender a tais especificidades. Assim, aquela
indicação fomentou a implementação daslicenciaturas cur-
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

tas que além de refletirem um cerceamento ideológico, ca-


racterístico do governo militar, reduzindo o tempo de pre-
paração intelectuale crítica num curso em nível superior,
apresentou‐se como uma solução aligeirada para se suprir a
falta de professores habilitados para atuarem na docência
no nível médio de ensino.
Ainda nos anos de 1980 se estendeu a teoria do capital humano.
Entretanto, a polivalência “deu lugar” ao “[...] conceito atrelado à
noção de politecnia” (CRUZ; RAMOS; SILVA, 2017, p. 1190). Se-
ria um trabalhador que compreendia “[...] os fundamentos científicos
das diferentes técnicas que caracterizam o processo de trabalho pro-
dutivo atual de modo a nãoseparar trabalho manual do trabalho in-
telectual” (CRUZ; RAMOS; SILVA, 2017, p. 1191). Junto a essas,
surgiram mais nomenclaturas que expressavam esse professor poli-
valente, comoé o caso do Professor unidocente que aparece unido
ao professor multifuncional. Outracuriosidade que aponta nesse pe-
ríodo é o gênero desses docentes, atuação que deveria ser exercida
quase que exclusivamente por mulheres.
Nos anos 2000, há a necessidade da formação superior para a
atuação dos pedagogos, desconsiderando apenas a formação de ní-
vel médio para o exercício profissional, comocontamos na seção so-
bre a trajetória do curso de Pedagogia no Brasil. Nesse ano (2000),
percebemos que existe uma diferenciação de caráter documental e,
consequentemente, usual dos termos polivalente e multidisciplinar.
O professor “polivalente indicaria a presença de um único pro-
fessor por turma, conforme já mencionamos a partir do Parecer
CNE nº 5/1997. Já multidisciplinar se referiria ao número de disci-
plinas com as quais deveria atuar” (CRUZ; RAMOS; SILVA, 2017, p.
1194).Vale salientar que essa diferenciação apreciada nos documen-
tos durou por um longo período. A mesma situação acontece, como
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

relatam Cruz, Ramos e Silva (2017, p. 1198), “parece, então,que a no-


ção de polivalência está endossada por uma perspectiva interdisci-
plinar de formação eatuação”.
Dado esse contexto, a atuação e formação do professor poliva-
lente sempre foi amparada na ideia do que se tem não é suficiente.
Acreditamos que o assunto também é meio confuso, pois, ou não
entendiam do que se tratava ou queriam renomear por alguma razão
que desconhecemos. Até mesmo quando não se encontrava a termi-
nologia “polivalente”, tinha-se aatuação com outra nomenclatura ao
longo do tempo.
Neste texto, assumimos o entendimento, com base em Pimenta
et al. (2017), de que o professor polivalente é aquele que exerce a do-
cência na Educação Básica em mais de uma disciplina, em uma mesma
sala de aula (ou com uma mesma turma), atividade que recai ao licen-
ciado pelo curso de Pedagogia, conforme salienta a base normativa do
referido curso no Brasil. Do mesmo modo, entendemos como profis-
sional polivalente da Educação aquele que exerce a docência e também
atividades de natureza pedagógica, no âmbito da gestão educacional,
por exemplo, nas instituições de ensino ou em outras áreas do âmbito
da Educação em espaços escolares e não escolares.
Dada essa função tão abrangente, reconhecemos que desde a fun-
dação do curso de Pedagogia no Brasil muitas modificações foram acon-
tecendo, algumas como as modificações citadas na seção anterior. Ao
longo dos anos, o perfil de atuação profissional do pedagogo foi defi-
nido, redefinido e, nesse momento da história, abrange um leque de pos-
sibilidades que pretendemos apresentar, brevemente, neste texto.
No quadro a seguir destacamos os principais espaços que os discen-
tes formados nos cursos de licenciatura em Pedagogia podem atuar.
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

Quadro 1 – Campos de atuação do pedagogo


Espaços escolares Espaços não escolares
Educação Infantil Espaços de Educação Comunitária
Ensino Fundamental – anos Espaços de Educação Prisional
iniciais
Educação de Jovens e Adultos Educação com Adolescentes e
Jovens Privados de Liberdade
Educação Especial Espaços de Educação Empresarial
Educação Profissional Espaços de Educação Popular
Gestão Educacional (sistema Espaços de Educação Hospitalar
educacional)
Direção Escolar Centros de Pesquisa Educacional
Supervisão Escolar Educação Social com pessoas em
situação de rua
Coordenação Pedagógica
Continua... Gestão e Conselho Editorial
Orientação Educacional Educação no Trânsito Continua...
Apoio/Reforço escolar Espaços de Pedagogia Jurídica
Profissional Técnico em Espaços Especializados em
Assuntos Educacionais questões de neuro e/ou
psicopedagogia
Fonte: Elaborado pelos autores (2022).

Vale ressaltar que este quadro toma como referência os profissio-


nais que possuem a formação inicial no curso de licenciatura em Peda-
gogia. Consequentemente, havendo ingresso e conclusão da formação
continuada, em termos de pós-graduação stricto sensu e/ou lato sensu, esse
campo é ampliado, mas também existindo especificidades.
Os espaços escolares acabam sendo de mais conhecimento e
principal campo de atuaçãodos docentes licenciados em Pedagogia.
Já os espaços não escolares ofertam menor quantidade de vagas e,
além disso, muitos dos profissionais formados ou em processo de
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

formação desconhecem ou não possuem interesse no ingresso em


áreas de atuação de espaços não escolares. Assim, é necessário de-
monstrar que existem (para identificação e ciência) e que dentro
desse âmbito atuam ou devem atuar nas demandas e atividades que
envolvem as questõespedagógicas.
Esses apontamentos sobre a atuação do pedagogo aparecem
já mencionadas no Art. 4º da Resolução CNE/CP nº 1, de 15 de
maio de 2006,
[...] O curso de Licenciatura em Pedagogia destina-se à for-
mação de professores para exercer funções de magistério na
Educação Infantil e nos anos iniciais do Ensino Fundamen-
tal, nos cursos de Ensino Médio, na modalidade Normal, de
Educação Profissional na área de serviços e apoio escolar e
em outras áreas nas quais sejam previstos conhecimentos pe-
dagógicos (BRASIL, 2006, p. 02).
Podemos observar que é vasta a possibilidade de atuação dos
pedagogos, instituída por lei. Com base no texto anterior, o licenciado
em Pedagogia pode ser concebido como um profissional da Educa-
ção, quer na dimensão da Educação Formal (escolar), quer na dimen-
são da Educação Não Formal (não escolar).
Entendemos que a luta em manter o curso de Pedagogia como o
espaço de formação inicial do profissional da Educação é fundamental
neste momento da história, haja vista que as diretrizes curriculares na-
cionais publicadas em 2019 demarcam o fim desse aspecto.
Sabemos que a literatura educacional demostra insatisfação com
a perspectiva de formação do curso, por entender que ela é generalista
e não consegue qualificar o profissional (professor) polivalente. No
entanto, compreendemos que dividir o curso de Pedagogia em duas
modalidades de graduação não resolverá esse problema. É preciso
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

ampliar o debate nacional, especialmente convidar as frentes progres-


sistas da Educação para pensarem um caminho que favoreça a for-
mação no referido curso e a Educação no sentido amplo.

Buscando analisar o itinerário do curso de Pedagogia no Brasil


(1930 a 2019) e a formação de professores polivalentes, consegui-
mos nos aproximar da historicidade, das modificações curriculares,
das lutas, resoluções e demais documentos que nortearam as ques-
tões associadas ao objetivo deste trabalho.
A partir das leituras e discussões tecidas para este texto, chega-
mos ao entendimento de que o curso de Pedagogia permanece em
uma dimensão de constante embates, novos e antigos, que acabam
sendo trazidos novamente a realidade formativa dos currículos das
instituições deensino superior e, consequentemente, aos discentes e
profissionais formados por essa licenciatura.
Além do que vimos referente ao itinerário do curso, constata-
mos as questões que percorrem a polivalência em termos de termi-
nologia (conceitos) e de atuação, no caso do professor polivalente.
Notamos que o termo polivalente foi entrando em desuso, apesar de
suasações aparecerem com novas nomenclaturas, como menciona-
das no capítulo em diálogo. Em linhas conclusivas, buscamos alertar
para as modificações que vão de encontro à formação inicial de pro-
fessores, em especial, dos pedagogos, que põem em questão a sua
atuação, as realidades diversas dos espaços de exercício da docência.
De modo algum, acreditamos que curso de Pedagogia não precisa
ou não deva passar por mudanças e reflexões, porém, o que vem
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

sendo instituído, como o mencionado sobre a Resolução CNE/CP


nº 2 de dezembro de 2019, desvirtua o proposito da licenciatura.

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FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas
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Marnilde Silva de Farias


João Luiz da Costa Barros
Hellen Cris Almeida Rodrigues
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FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

óvoa (1992) destaca a centralidade conferida à formação de


professores e como esta reverbera na qualidade do ensino e
nas reformas educativas, quando destaca que não há ensino de qua-
lidade, nem reforma, nem inovação pedagógica, sem uma ade-
quada formação de professores. Este estudo teve como objeto, a
formação inicial de professores em Educação Física via Plano Na-
cional de Formação de Professores para Educação Básica (Parfor),
com foco na experiência do curso de licenciatura em Educação
Física ofertado pelo Instituto Federal de Educação, Ciência e Tec-
nologia de Roraima (IFRR) no município de Rorainópolis.
As propostas de formação de professores têm incorporado, tal
como apontam Pimenta (2012), Imbernón (2011) e Nóvoa (1992, 1999,
2009), discursos e apropriações de conceitos que não transcendem a re-
tórica. As políticas de formação têm se importado menos com a demo-
cratização e o acesso ao conhecimento, e mais em expandir quantitativa-
mente a escolaridade, mesmo em condições de qualidades empobreci-
das, desenvolvendo políticas e reformas de formação que estão cada vez
mais fragmentadas, aligeiradas, e ainda faltam incentivos para pesquisas
sobre a formação dos professores e suas práticas nas escolas públicas,
principalmente em contextos amazônicos.
A inquietação central delineou-se em saber: que percepção os
egressos da primeira licenciatura em Educação Física do Parfor do
IFRR de Rorainópolis têm sobre sua formação inicial, em particular,
sobre as reverberações dessa experiência em sua prática pedagó-
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

gica/atuação profissional? No propósito de responder a essa ques-


tão e partindo do princípio da abordagem de pesquisa qualitativa,
foi pretensão desta investigação, que focaliza um programa de for-
mação de professores, analisar a contribuição da formação inicial no
desenvolvimento profissional de professores egressos do curso de
primeira licenciatura em Educação Física do Parfor do IFRR, ofer-
tado no município de Rorainópolis.

A formação de professores em Educação Física no Brasil é uma


temática com inúmeras reflexões e discussões decorrentes de sua
trajetória histórica, carregada de avanços e retrocessos, além de ter
aproximação em duas grandes áreas distintas: Saúde e Educação.
Por ter sua trajetória entrelaçada aos períodos histórico e socioeco-
nômico do Brasil, a função social dessa área passou por muitas tran-
sições, com o objetivo de responder aos anseios e às necessidades
impostas pelo poder governante.
Em 1939, por meio do Decreto-Lei nº 1212, que determinou a
obrigatoriedade da formação em Educação Física como requisito
mínimo para atuar com tal disciplina/conteúdo na escola, essa área
de formação tomou um novo rumo. Sabe-se que, por mais que a
orientação fosse a formação específica na área para exercer tal fun-
ção, esta é orientada por concepções sócio-históricas.
Entende-se que a formação é um processo complexo que se
relaciona a uma construção identitária docente. Ressalta-se que, por
identidade, compreende-se um fenômeno dinâmico que acontece
durante toda a vida e que é construída e (re)construída em um ciclo
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

permanente. Assim, “[...] falar da carreira docente não é mais do que


reconhecer que os professores, do ponto de vista do ‘aprender a
ensinar’, passam por diferentes etapas, as quais representam exigên-
cias pessoais, profissionais, organizacionais, contextuais, psicológi-
cas, etc., específicas e diferenciadas” (Garcia, 1999, p. 112).
Dessa maneira, é necessário (re)encontrar campos de interação
entre as dimensões pessoais e profissionais, possibilitando aos do-
centes assumir seus processos de formação e empregar-lhes um sen-
tido de acordo com suas histórias de vida, pois “[...] enquanto ao
professor, em sua formação, for possibilitado, apenas ser fruto do
mero aprender, é quase certo que sua ação como professor será mar-
cada como mero ensinar” (Palma, 2001, p. 14).
Partiu-se do paradigma sobre o pensamento epistemológico
histórico da Educação Física em sua constituição como área educa-
cional profundamente enraizada com influências do positivismo e
do tecnicismo, demarcando um modelo de formação e profissiona-
lização docente, a mercantilização do esporte e a ausência de uma
proposta, de fato, educativa para o pressuposto da transformação
desse pensamento, por conceber que a educação, como um impor-
tante instrumento de transformação social, que tem como dever as-
sumir o compromisso com a sociedade, não necessariamente a que
se tem, mas a que é desejada.
Nesse contexto, acredita-se que a Educação Física escolar tem
um papel crucial e promover uma formação humanizadora, liberta-
dora na perspectiva de Paulo Freire, torna-se, de certo modo, utó-
pico quando reflete-se sobre como a concepção de uma formação
crítica e superadora vai na contramão dos projetos defendidos por
uma ótica neoliberal e neoconservadora.
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

Observa-se que as políticas e os cursos de formação apresen-


tam um discurso de rompimento do modelo de racionalidade téc-
nica para um que contemple a subjetividade reflexiva dos sujeitos ao
mesmo tempo que permita a autonomia desse sujeito no seu pro-
cesso formativo, para poder assumir capacidades e habilidades que
atendam à demanda.
As mudanças e as reformas nos modelos de formação são de-
correntes das necessidades do mercado de trabalho. Desse modo, o
professor enquanto trabalhador e, consequentemente, o seu modelo
de formação, é resultado de imposições e exigências de cunho eco-
nômico, ditados pelos organismos internacionais, pelas políticas so-
ciais e pelo mercado de trabalho.
A centralidade colocada nos professores volta-se para uma re-
estruturação produtiva, decorrente da precarização e do esvazia-
mento da profissão após os anos 1980. A referida reforma tinha
como objetivo, segundo Novóa (1992); Tardif (2012), conferir cará-
ter profissional para a atividade desenvolvida pelos professores,
apoiando-se na premissa da necessidade de uma base de conheci-
mento para o ensino e superando concepções e paradigmas.
Muitos foram os programas que surgiram pós- Lei de Diretri-
zes e Bases da Educação Nacional (LDBEN) nº 9394/96, dentre os
quais pé possível citar alguns: Pró-Letramento; ProInfantil; Profor-
mação; Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência
(Pibid); e Parfor. O que observou-se em todos esses programas foi
que a estratégia discursiva disposta nos planos carregam a concep-
ção do professor como responsável pelas deficiências do sistema
público de ensino, ao mesmo tempo que lhe atribui a responsabili-
dade de extirpá-las.
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

Diante das constantes mudanças no modo de ensino-aprendi-


zagem e das imposições da sociedade, Pimenta (2012) conclui que
por melhor que seja a formação do professor, ela não dá condições
para que ele, por meio somente de seu trabalho, responda e dê conta
da necessidade exigida para melhorar a qualidade e extirpar as defi-
ciências históricas de um sistema. Nesse espaço particular, enfatiza-
se a formação como solução paliativa. Desse modo, compreende-se
como uma redução da complexidade da docência a uma mecaniza-
ção do trabalho docente, levando-nos a considerar que somente o
trabalho do professor é suficiente; basta ensinar a “técnica” certa e
todos os problemas serão solucionados a partir da prática, o que, se
sabe é que não é assim.
Para atender aos objetivos propostos pelo Plano Nacional de
Educação (PNE) de 2001, surgiram políticas de formação de pro-
fessores que não deram conta de atender toda a demanda até 2006.
Decorrente dessas políticas, surgiu o Parfor em caráter emergencial,
depois de 13 anos da promulgação da LDBEN nº 9394/96. Diante
do não cumprimento da meta prevista e da necessidade de investi-
mento na formação de professores da rede básica de ensino, o Par-
for, mediante parcerias com os estados, municípios e Instituições de
Ensino Superior de todo o país, desenvolveu/desenvolve cursos su-
periores gratuitos para professores(as) em exercício nas escolas da
rede pública de ensino do país.

Compreende-se a metodologia, na perspectiva de Minayo


(1996), como mais que uma técnica pronta para execução; entende-
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

se que ela é um entrelaçamento de teorias e concepções que se co-


nectam com a realidade. Empenhou-se em explicitar o caminhar
desse percurso fazendo uma análise da tríade vida-formação-profis-
são, a partir da compreensão de um processo formativo, por conce-
ber que o desenvolvimento docente e as intervenções são resultados
de situações vivenciadas nas três dimensões e, portanto, há uma in-
dissociabilidade (Nóvoa, 1992).
Discutir a formação docente também significa discutir os sig-
nificados, a prática e o contexto real, revelando um modo de ser/sa-
ber/fazer. Ao realizar um estudo com egressos, acredita-se que eles
são uma representação dos seus cursos, das propostas e da imple-
mentação de reformas educativas e ainda se constituem como uma
fonte de avaliação importante para uma investigação que trata sobre
condições, motivações, expectativas, percepções e ações, conside-
rando o desenvolvimento profissional como sendo a combinação
entre o percurso formativo e atuação profissional.
Desse modo, os fundamentos teórico-metodológicos que nor-
tearam este estudo foram construídos e moldados no próprio per-
curso, tomando como base os princípios da abordagem qualitativa
de caráter descritivo analítico por considerar que a problemática não
pode ser compreendida a partir de leitura e de dados estatísticos.
Nesse caso, fez-se necessário estabelecer relações de diálogo entre
o universo subjetivo e o objetivo dos envolvidos.
Este texto faz parte do projeto de pesquisa desenvolvido no
período de 2018 a 2020, aprovado no Comitê de Ética e Pesquisa
(CEP) sob o Parecer nº 3.243.432. Após a aprovação, buscou- se
estabelecer aproximações com a instituição que forneceu os conta-
tos dos egressos da turma de primeira licenciatura que foi ofertada
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

no município de Rorainópolis/RR no período de 2011 a 2015, cons-


tante na ficha de matrícula. Dos 51 professores que fizeram matrí-
cula em 2011.1, 39 professores formaram, um faleceu durante o
curso e 11 desistiram. Foram encontrados apenas 27 e-mails cadas-
trados nas fichas de matrícula e em todas as fichas constavam nú-
meros telefônicos para contato. Buscou-se contato com os números
cadastrados e nove apareceram como inexistentes, enquanto quatro
não pertenciam mais à pessoa procurada. Estabeleceu-se o contato
inicial com 26 egressos, por mensagem de texto, ligações, mensa-
gens via WhatsApp e e-mail, visto que nem todos os professores
moravam na zona urbana.
Considerando a dificuldade em encontrar pessoalmente os
egressos, optou-se pelo questionário on-line do Google Forms, com
questões abertas e fechadas, de múltipla escolha, discursivas, para
conhecer os egressos e saber se estavam em situação ativa no exer-
cício da docência na educação básica e na área de formação pelo
Parfor. Após a aplicação do questionário, identificou-se que 12 par-
ticipantes estavam atuando na área e foi realizado o convite para
participarem da segunda fase da pesquisa, que consistiu em uma ob-
servação in loco das práticas e entrevista e apenas seis participantes
concederam o aceite, os mesmos estão identificados no texto por
numeração numérica de PE1 a PE6.

O processo de formação não se dá somente a partir do acesso


aos cursos de formação inicial; perpassa toda a dimensão pessoal e
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

acadêmica desde a infância. Acredita-se que o professor se constrói


à medida que vai tomando consciência de suas fragilidades e poten-
cialidades. A formação propicia ou deveria ser a mola propulsora do
conhecimento para que o professor possa refletir sobre a prática e
os conhecimentos experienciais, a ponto de questioná-los, explicá-
los e modificá-los, se assim for necessário.
Para Sales (2009), a formação em exercício tem, ou pelo menos
deveria ter, a práxis pedagógica como um espaço de reflexão e ação,
que dá sentido à cotidianidade e assume suas singularidades e dife-
renças. Nesse sentido, buscou-se saber como se deu a formação em
serviço pelo Parfor e quais as concepções dos professores sobre as
reverberações dessa no desenvolvimento docente.
Ao perguntar para os professores egressos se a formação em
Educação Física pelo Parfor propiciou a apropriação de conheci-
mentos necessários para melhorar a prática docente, todos os parti-
cipantes relataram que sim. PE1 destaca que “[...] me trouxe um leque
de informação muito grande, onde aprendi o quanto é importante o conhecimento
teórico e a prática da Educação Física”, enquanto PE5 relata que “[...] a
experiência foi satisfatória, mas poderia ter sido melhor, o tempo foi pouco para
explanar nossa aprendizagem e nosso conhecimento. O curso abriu a minha
visão na prática, pois me deu liberdade para associar a disciplina com as demais
disciplinas escolares, o que antes eu não via”.
Observa-se nos relatos que os participantes acreditam que o
curso propiciou os conhecimentos necessários, porém, apontam que
o tempo não foi suficiente no sentido de apropriação. Citam como
mudanças, em sua atuação, uma melhora em relação à metodologia
das aulas, permitindo a compreensão dos elementos técnicos e práti-
cos a que se referem. A PE1 foi a única que citou a teoria e a impor-
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

tância desta para prática, os demais não fazem menção ao conheci-


mento teórico, apenas a atividades concretas e novas metodologias
como conhecimentos indispensáveis para o fazer docente. Logo, “[...]
a ideologia opera muito bem esse ocultamento da teoria na prática, à
medida que ignora que em cada ação traduz-se o modo de pensar e
este, por sua vez, explicita se no modo como aquele ensina” (Leite;
Ghedin; Almeida, 2008, p. 14-15).
Separar a prática da teoria é o que constitui o maior descami-
nho da ação profissional do professor. Segundo os autores, esse
ocultamento é resultado da falta de pesquisa ao longo da formação;
a pesquisa é o elemento que faz o imbricamento entre a teoria e a
prática. Cada vez mais, a formação tem se resumido a uma prepara-
ção metodológica e tem se preocupado menos em ser um campo de
investigação e construção do conhecimento.
Imbernón (2011) também corrobora com os autores, desta-
cando que o conhecimento pedagógico especializado está interli-
gado à ação, não existindo, portanto, conhecimento prático sem co-
nhecimento teórico e é essa relação de unidade que caracteriza a
prática docente. Os autores destacam que não há formação com-
pleta quando se extingue dos cursos os processos investigativos
constitutivos do saber docente. Leite, Ghedin e Almeida (2008) tam-
bém afirmam que são visíveis as dificuldades em instituir e desen-
volver processos de pesquisa na formação e ainda há a reprodução
de uma formação tradicional que não se prepara para lidar com os
processos de mudança, ao mesmo tempo que não ensina esse sujeito
a transformar informação em conhecimento.
Sobre a metodologia a qual os professores se referem, destacam-
se duas categorias que são apresentadas/citadas por todos os partici-
pantes: o planejamento e o conhecimento prévio. Os participantes
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

relacionam que foi durante a formação pelo Parfor que aprenderam a


planejar considerando o conhecimento prévio do aluno. Evidencia-se
que à medida que os professores organizam suas atividades para se-
rem desenvolvidas em suas turmas, consideram o contexto em que
atuam e a valorização dos conhecimentos dos alunos. Depreende-se
que, ao apontar o planejamento como elemento indispensável para a
apreensão dos conhecimentos mediados, o professor apresenta-se
como um sujeito pesquisador-reflexivo.
De acordo com Pérez Gómez (1992, p. 103), a prática implica
em refletir que a:
Imersão consciente do homem no mundo da sua experiência,
um mundo carregado de conotações, valores, intercâmbios
simbólicos, correspondências afetivas, interesses sociais e ce-
nários políticos. O conhecimento acadêmico, teórico, cientí-
fico ou técnico, só pode ser considerado instrumento dos pro-
cessos de reflexão se for integrado significativamente, em es-
quemas de pensamento mais genérico ativados pelo indivíduo
quando interpreta a realidade concreta em que vive e quando
organiza a sua própria experiência.
Nos relatórios de observação, foram identificados registros so-
bre como os participantes referem-se às atividades práticas vivenci-
adas durante o curso e, ao repeti-las, sempre mencionava os mo-
mentos da formação.
Ao relacionar o conhecimento teórico com a prática, a partici-
pante PE1 evidencia uma questão relevante, histórica, que marcou
profundamente a Educação Física, principalmente a escolar. A Edu-
cação Física, dividida entre corpo e mente. Nesse caso, compreende-
se que o ensino de Educação Física na escola deve “educar numa
perspectiva da corporeidade”, promovendo as “relações ho-
mem/mundo/sociedade/cultura” (Sobreira; Nista- Piccolo; Mo-
reira, 2016, p. 68). Para os autores, a educação pode ser um caminho
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

de mais sentido à vida, e os profissionais de Educação Física devem


colaborar para o entendimento da corporeidade no contexto da
complexidade humana.
Essa visão de distanciamento da teoria com a prática surge da
ideia equivocada do senso comum, evidenciada em diálogos infor-
mais que apresentam uma concepção de que teóricos fazem teoria e
práticos se ocupam da prática. Desse modo, os participantes com-
preendem a escola como o lugar da prática. Tal afirmativa baseia-se
no revelar da concepção pessoal dos participantes de não se verem
teóricos de sua profissão, relatando que não compreendem como
fazer pesquisa na/da/sobre suas práticas em seus contextos. Dessa
forma, pode-se destacar que os participantes não consideram a prá-
tica como resultado de um conhecimento teórico, revelando, por-
tanto, que não fazem pesquisa, indicando uma lacuna e evidenci-
ando um modelo de formação prática.
Contudo, o perfil previsto pelo Projeto Pedagógico do Curso de
licenciatura em Educação Física do IFRR (2008) sinaliza que o pro-
fessor, formado por esse curso, deve ser um profissional com a pre-
dominância da formação humanística sobre a técnica, com capaci-
dade reflexiva na articulação dos saberes. Destaca-se que, dentre as
competências prescritas pelo plano, o “desenvolvimento da consci-
ência crítica” como forma de valorização, defesa da democracia e
combate às formas de discriminação é a primeira a ser evidenciada. O
plano do curso ainda prevê a incorporação do princípio da aprendi-
zagem contínua, a valorização da investigação científica e a busca de
informações/conhecimentos, pela pesquisa e pela extensão, além do
desenvolvimento do senso crítico, como uma forma de subsidiar o
desenvolvimento profissional no contexto escolar.
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

A partir das ideias de Freire (1996), a guerra contra o conheci-


mento evidencia faces de um fenômeno biologicamente fundamen-
tado em uma perspectiva de alienação e domesticação. Dessa forma,
posicionou-se contrariamente ao modelo de formação desenvolvido.
É necessário superar esse modelo de formação, que considera o pro-
fessor apenas como um transmissor de conhecimentos.
Nesse sentido, com base em Pimenta (2012), compreende-se a
formação como um instrumento propulsor de novas formas de pen-
sar e, consequentemente, de desenvolver novas práticas. A forma-
ção também se configura como espaço de constituição profissional
que, conforme entende Imbernón (2011, p. 45), é “[...] qualquer in-
tenção sistemática de melhorar a prática profissional, crenças e co-
nhecimentos profissionais, com o objetivo de aumentar a qualidade
docente, de pesquisa e de gestão”; portanto, contempla, mas não se
resume à formação.
Nóvoa (2009) defende a formação como necessária para pro-
mover a autonomia, mas alerta para a complexidade que envolve
esse processo, enfatizando como condição de mudanças a imbrica-
ção dos professores no planejamento e desenvolvimento de progra-
mas formativos, o que constatou-se que não é o caso da proposta
que foi executada pelo Parfor.
Dadas as características da turma, a formação aconteceu no
município, locus de atuação dos professores e, por esse diferencial,
foi objetivo saber quais as principais dificuldades enfrentadas du-
rante o processo formativo na primeira licenciatura em Educação
Física que foi ofertada pelo Parfor. “Eu tive muitas dificuldades nas aulas
teóricas, pois os conhecimentos prévios que eu tinha eram muito pobres. Porque
meu ensino médio e magistério que cursei, não foi presencial, e sim modular”
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

(PE1); “Foi o tempo curto para algumas aulas ministradas no curso, era tão
bom a metodologia, o conteúdo, que poderia ser mais extenso” (PE5).
Os participantes revelam dificuldades de cunho pessoal em
suas falas. PE1 destaca novamente a questão teórica como o maior
desafio enfrentado, citando a dificuldade que teve e justificando que
o percurso formativo anterior não foi suficiente. Avalia que a for-
mação anterior foi superficial e fragmentada.
Diante do exposto, identificou-se lacunas na formação básica
dos professores; uma formação precária, que é reproduzida e reflete
no fazer docente. Essas lacunas estão atreladas a fatores sociais, po-
líticos, econômicos e culturais, que sabe-se que a formação inicial
não tem como corrigir. Contudo, acredita-se que para haver uma
construção do conhecimento no sentido de promover a práxis, a
formação deve criar condições de superação, ao considerar quem
são, onde estão e quais conhecimentos prévios têm os sujeitos que
são formadores de outros sujeitos para a construção de uma pro-
posta emancipadora.
Nesse sentido, buscou-se saber se as ações que foram desenvolvi-
das na formação ofertada para a turma foram suficientes ao tempo que
tecem críticas, no sentido de dar condições de mudar ou de refletir so-
bre a prática docente. Cinco participantes responderam que sim, as
ações foram suficientes, e ainda consideram que “[...] a formação foi uma
das melhores, pena que o tempo e a distância foi um empecilho (PE5)”.
Foi possivel identificar que quatro participantes atuavam na
zona rural, um participante atuava na zona rural e urbana e uma atu-
ava somente na zona urbana. Sobre como os professores avaliaram
a formação, eles atribuíram em suas falas notas que vão de 9 a 10 e
expressam que:
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

[...] foi muito gratificante, pois nosso curso foi presencial,


porém muito corrido e isso deixa algumas coisas a desejar.
Mas o conhecimento pedagógico que obtive foi de muita
importância na minha vida profissional, ampliou meus co-
nhecimentos e metodologias, fazendo assim, tornar minha
prática pedagógica mais eficiente [...] (PE1).
Observou-se nas falas dos participantes como eles compreen-
dem a formação como um espaço de aquisição de conhecimentos.
Novamente destacaram questões metodológicas como sendo o di-
ferencial da aprendizagem. Nas observações, os participantes relata-
ram que antes da formação pelo Parfor só ministravam aulas práti-
cas e não viam possibilidades de trabalharem com a teoria na disci-
plina de Educação Física. Atribuem essa mudança de concepção à
formação e revelam que somente depois de conhecerem que é pos-
sível, contemplam em seus planejamentos aulas teóricas e práticas.
É possível perceber no discurso dos sujeitos palavras de ordem
capitalista, como “mercado educacional”, revelando uma concepção
de educação como mercadoria e que a formação foi compreendida
assim. Talvez seja uma visão distorcida por conta da forma como
aconteceu o curso: aligeirado e, segundo os participantes, com
“muita teoria e poucas práticas”. Os participantes consideram a for-
mação, ainda, como aquisição de repertório prático e não como con-
dição de melhorar o pensar para um agir melhor.
Para Demo (2006), a qualidade da educação sob a égide do sis-
tema capitalista é tipicamente funcional. Há uma apreciação ao tra-
balhador que “sabe pensar”, mas não àquele que “pense” a ponto
de questionar o sistema. Dessa forma, o autor ainda enfatiza que
não se trata de aumentar as aulas de formação, mas de preocupar-se
em aumentar a aprendizagem.
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

A partir da fala dos participantes, percebe-se que a perspectiva


técnica e racional que controlou a formação durante as últimas dé-
cadas ainda é e esteve presente na formação dos participantes, os
sujeitos evidenciaram em suas respostas sobre a perspectiva técnico-
racionalista como necessidade formativa. Observou-se um modelo
de formação não superado e com base em Morin (2000) para afirmar
que pensar a complexidade da formação e suas influências exige ur-
gente uma reforma do pensamento. Nesse sentido, Imbérnon (2011,
p. 16) alerta que a “[...] mudança nas pessoas, assim como na educa-
ção, é muito lenta e nunca linear”. Assim, “Sabe-se que não há como
começar uma profunda reforma na educação ou na sociedade se
esse processo não tiver seu início, de algum modo, pelos professo-
res. Qualquer reforma no pensamento só se desencadeia se come-
çar, antes, por uma ‘reforma’ dos professores” (Pimenta, 2008, p. 9).
Quando relatam que a formação propiciou “abrir a mente”, en-
tende-se que ela ampliou a visão sobre as possibilidades de atuação
e, ao mesmo tempo, permitiu uma valorização, no sentido de im-
portância da profissão e de sua contribuição social.O programa de
formação foi avaliado positivamente pelos professores à medida que
declararam que o curso possibilitou conhecimentos mais sólidos
para o desenvolvimento da prática docente, mas não no sentido de
promover a “reforma”, reforçando a concepção de Freire (2007) so-
bre a desvalorização cultural e contextual de professores e alunos,
como meio de dominação escancarada, demarcando um projeto ne-
oliberal de Educação,
Portanto, é preciso repensar a formação de professores a par-
tir do contexto de seu trabalho, não se podendo considerar
essa formação descolada ou distanciada da reflexão crítica
acerca da realidade. É preciso refletir sobre esta dimensão
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

por meio de propostas curriculares, de atividades que permi-


tam a compreensão da dinâmica e das relações que ali se es-
tabelecem (Leite; Ghedin; Almeida, 2008, p. 32).
Nóvoa (1992) já inferia que os processos formativos de profes-
sores têm ignorado o desenvolvimento pessoal e a articulação entre
a formação e a atuação destes. Também salienta que para que esse
processo assuma, de fato, uma condição de desenvolvimento pro-
fissional, deve contemplar também o desenvolvimento organizacio-
nal, ou seja, a escola. Os dados analisados revelam mudanças for-
mativas que implicaram nas propostas desenvolvidas no chão da sala
de aula, principalmente em relação ao planejamento, ao saber fazer
e a um maior conhecimento sobre a área de atuação.
Segundo Nóvoa (1992), a formação não pode se dissociar do
saber nem pode ser alheia aos contextos de atuação. Não se trata de
uma formação somente pedagógica, mas de uma formação social.
PE5 cita que os professores formadores, diante das lacunas e das
dificuldades que apresentavam – inclusive cita dificuldades nos as-
pectos básicos, primordiais, como as habilidades de leitura e escrita
–, buscaram superar obstáculos durante a mediação dos conheci-
mentos. Apesar disso, dois dos participantes apontam para a carga
horária baixa das disciplinas.
As narrativas revelam uma concepção de formação contraditó-
ria ao discurso de formação presente na proposta do programa e do
curso de formação. Foi possível identificar que os participantes ana-
lisam o curso com a ideia de capacitação se colocando na posição
de executores do ensino, fortalecendo o modo de produção atual.
Os dados obtidos sinalizam lacunas, algumas percebidas e ou-
tras não, principalmente sobre os conhecimentos pedagógicos. Nos
diálogos e na observação, identificou-se que os conteúdos específi-
cos que fazem parte do planejamento e foram observados na prática
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

contemplam o desporto, especificamente as modalidades de futebol,


futsal, voleibol e a recreação.
Os diálogos revelam dificuldades em planejar e inserir conteú-
dos mais específicos e teóricos e, por isso, relatam muita dificuldade
em atender ao que recomenda a Base Nacional Comum Curricular
(BNCC). Acreditam que “[...] é necessário estudar uma especialização para
que a gente possa aprender essas novas mudanças” (PE1) e “[...] comprar novos
livros que seja na base na BNCC... Os livros que tenho são antigos e não estão
me ajudando...” (PE2).
Os dados sugerem, por exemplo, que em muitos momentos o
planejamento não é seguido e as atividades são guiadas pelas situa-
ções de ensino que já vivenciaram em seu processo de formação.
Dessa forma, percebeu-se que a formação não foi implementada na
perspectiva dos sujeitos e não considerou suas necessidades e seus
contextos, não representando, portanto, mudanças e transforma-
ções significativas, pois atendem a um ideário político que é incor-
porado, interpretado e recriado socialmente no contexto da prática,
o que nos leva a compreender as relações de poder, intencionais,
que estão prescritas.
Imbernón (2011) defende que o ponto de vista do docente (em
formação) deve ser considerado no planejamento dos programas de
formação. O autor assevera, ainda, a necessidade de uma formação
que instigue a reflexão, a fim de que os sujeitos em formação sejam
“[...] melhores planejadores e gestores do ensino‐aprendizagem e
por que não, agentes sociais, capazes de intervir também nos com-
plexos sistemas éticos e políticos que compõem a estrutura social e
de trabalho” (Imbernón, 2011, p. 27).
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

Sobre as ações de formação empreendidas, identificaram-se


fragilidades apontadas nos diálogos com os sujeitos, que se diri-
gem, por exemplo, ao aligeiramento da formação e à intensifica-
ção das atividades de formação concomitantes com o trabalho,
porém de modo diferente do encontrado em outras pesquisas. Os
egressos criticam o caráter teórico assumido na formação e enal-
tecem a formação técnico-prática como ideal. É oportuno tam-
bém destacar o caráter de certificação em detrimento da qualifi-
cação, pois muitos professores que se formaram na turma não
exercem a profissão na área.
Gatti, Barreto e André (2011) constataram grandes potenciali-
dades do Parfor no que concerne ao incentivo à formação de pro-
fessores que já atuam nas redes públicas de ensino e precisam de
nivelamento, para atender ao disposto pela legislação, o que não
aconteceria sem o apoio de um programa desse porte.
De outro lado, considera-se como potencialidade a formação
em serviço no lugar de atuação, pois diferente de outras instituições
que optaram por oferecer a formação presencial nos períodos de
férias e nos centros, exigindo o deslocamento e o dispêndio finan-
ceiro dos professores, a formação em Educação Física pelo Parfor
do IFRR aconteceu presencialmente, concomitante com o período
letivo dos participantes e no lugar de atuação, sendo a primeira
turma e a única ofertada em Educação Física na região.
Dentre as especificidades dos participantes, observou-se que
são professores e professoras que já atuavam nas redes públicas de
ensino, efetivos e/ou temporários, que exercem suas funções em
localidades historicamente negadas e desassistidas de oportunida-
des. As falas evidenciam que são sujeitos que estavam à margem de
qualquer possibilidade de acesso e qualificação profissional, pois
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

muitos residem e atuam em zonas rurais, às margens de estradas


vicinais, dos rios e que lidam com realidades de escolas multisseria-
das, em espaços e condições precárias e remotas, tampouco teriam
a oportunidade de cursar uma licenciatura em Educação Física em
instituição pública, pela ausência de condições e de assistência das
Secretarias de Educação.
O Parfor significou a única oportunidade de acesso à formação
superior, um direito à melhoria nas condições de vida quando se
referem aos sentimentos, aos sentidos e aos significados atribuídos
à formação. Porém, não é possível acitar como contribuição à me-
lhoria da qualidade da educação básica, por considerar os limites e
os múltiplos determinantes que envolvem essa questão, não sendo
a formação a única condicionante de melhoria.
Compreende-se a formação como um elemento essencial do
desenvolvimento docente, mas como pontua Imbernón (2011), não
é o único. Não se pode afirmar que o desenvolvimento profissional
deve ser imbricado ao desenvolvimento pedagógico, pois segundo
o autor, são as situações profissionais que permitem ou impedem o
desenvolvimento da carreira docente.
Considerações finais
Embora a formação pelo Parfor seja uma forma de assegurar
direitos e garantias aos professores da educação básica, compreen-
didos como sujeitos sociais, que lutam pela educação pública de qua-
lidade para todos e, portanto, estão do lado oposto das reais inten-
ções das políticas governamentais. O que ainda se perpetua por
meio de políticas de formação de caráter paliativo é a formação pre-
cária, fragmentada e, ao mesmo tempo, uma exigência de compe-
tências para quem desenvolve um trabalho em forma de exploração
desumana e desigual.
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

Dialogar com os egressos sobre seus percursos formativos pos-


sibilitou percepções sobre os sentidos e significados da formação
em Educação Física e a dimensão desta em suas vidas. Revelou
quem são os sujeitos que vivenciaram a formação, suas condições
de vida e de trabalho, bem como os determinantes que limitam, ora
impossibilitam, o fazer docente. Os participantes revelaram dificul-
dades no modo de ser professor, destacando um distanciamento da
pesquisa como elemento articulador da teoria-prática, inclusive ci-
tando como dificuldade fazer a conexão teórico-prática e transfor-
mar prática em teoria.
A formação pelo Parfor atendeu às expectativas profissionais
no quesito valorização, quanto à questão salarial, à realização profis-
sional, ao valor pessoal e também pelo curso ter sido o primeiro e
único da região. Os participantes destacaram que o curso possibili-
tou conhecimentos que promoveram maior desempenho e respon-
sabilidade quanto à atuação profissional. Por outro lado, enfatiza-se
a necessidade de melhoria das condições de trabalho para que, de
fato, promova o desenvolvimento profissional.
A realização deste estudo oportunizou apreender que a Educação
Física, na percepção dos sujeitos, é considerada uma atividade escolar
e que ainda é preciso superar as concepções técnico racionais que ca-
racterizam a docência na área. Compreender como o processo de for-
mação reverberou na atuação profissional dos docentes, indicando que
ainda se faz necessária uma formação que ofereça condições para os
professores superarem o modelo de racionalidade técnica e que pro-
mova uma formação sólida com base na reflexividade crítica, que ve-
nha a influenciar na atuação, de modo a dar condições de luta pela va-
lorização profissional e por melhores situações de trabalho.
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

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Leila Adriana Baptaglin


Wenderson Silva Oliveira
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas
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uais são os principais desafios e abordagens no doutora-


mento em Artes na região Norte do Brasil? É uma questão
orientadora desta escrita, que surge por inquietações pessoais e
profissionais das pesquisadoras. Por uma delas atuar em nível de
pós-graduação, passamos a sentir a necessidade de compreender
os processos de construção, desenvolvimento e permanência dos
programas na região Norte do Brasil.
Sabemos que, na pós-graduação, em relação ao restante do
Brasil, a região Norte apresenta dados menores em termos de
quantidade de pessoal disponível e qualificação docente – prin-
cipalmente no que tange aos níveis de mestrado, doutorado e pós-
doutorado. Conforme o Centro de Gestão e Estudos Estratégicos
do Ministério da Ciência Tecnologia, Inovação e Comunicações
(2019) 12, os sete estados brasileiros da região Norte (Pará,
Amazonas, Tocantins, Roraima, Rondônia, Acre e Amapá)
concederam, no período de 1996 a 2017, apenas, 1,5% dos tí-
tulos de doutorado e 3,3% dos títulos de mestrado emitidos no
país. Esse é um indicativo importante da carência de possibili-
dades de formação em nível de pós-graduação na região, já re-
gistrada nos estudos que embasaram o Plano Nacional de Pós-
Graduação (2011-2020).

_______________
12
Disponível em: https://mestresdoutores2019.cgee.org.br/web/guest/inicio.
Acesso em: 21 fev. 2022.
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

Essa situação desencadeia enormes desafios para o processo


de consolidação da pós-graduação strictu sensu e, principalmente, o
doutoramento no Norte do país, que impacta diretamente a for-
mação docente e o desenvolvimento profissional. Destarte, ainda
é percetível que muitos dos profissionais que têm atuado e despen-
dido tempo para a pós-graduação na região são oriundos de movi-
mentos migratórios entre os diversos estados brasileiros. É nessa
conjuntura que buscaremos apresentar um pouco do contexto e
dos desafios de doutoras e doutores que atuam no extremo norte
do Brasil, na busca de uma reflexão em torno do binômio forma-
ção/atuação e da necessidade de uma ação transformadora no âm-
bito da educação nesses contextos.
No Brasil, o mestrado e o doutorado são processos formativos de
profissionais das diferentes áreas de conhecimento, nas quais o próprio
profissional busca atender suas ânsias e suprir possíveis carências em sua
trajetória formativa. Assim, conforme Contreras (2002, p. 195), a auto-
nomia formativa e das formas de ensino do docente são tanto “[...] um
direito trabalhista como uma necessidade educativa”. Paulo Freire (2016,
p. 123) já nos colocava na eminência de uma discussão sobre a autono-
mia docente, que a “[...] educação como prática de liberdade, ao contrário
daquela que é prática da dominação, implica a negação do homem
abstrato, isolado, solto, desligado do mundo, assim como também a
negação do mundo como uma realidade ausente nos homens”. É
nessa esteira que a interlocução formativa entre ensino/aprendiza-
gem vem ocorrendo na América Latina.
De forma significativa, no que tange ao ambiente educacio-
nal brasileiro, é nessa interlocução com o latino continente que
os profissionais docentes do país têm realizado suas formações,
tomando consciência de suas necessidades formativas a partir da
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

interlocução com essas sociedades. Isso pode ser compreendido


a partir de Leontiev (1984, p. 25), que nos coloca que “[...] a cons-
ciência individual surge como resultado da influência que, sobre
o homem, exerce a consciência da sociedade, por efeito da qual
sua psique se socializa e se intelectualiza 13”. Em nosso caso,
como profissionais docentes da pós-graduação atuando na região
Norte do Brasil em um contexto fronteiriço, é eminente pensar-
mos nas especificidades contextuais e nos desafios que passam ao
percorrer esses territórios.

A referida investigação pautou-se nos dados contidos na Pla-


taforma Sucupira (para encontrar os programas stricto sensu da re-
gião Norte); no Catálogo de Teses e Dissertações da Fundação
Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior
(Capes) (a fim de fazermos o levantamento de todas as disserta-
ções e teses); e no site dos programas (para conferência e comple-
mentação dos dados investigados). Assim, nos debruçamos para
a área das Artes e buscamos apresentar dados da investigação que
problematizem os desafios e as abordagens que vêm sendo evi-
denciadas e trabalhadas no âmbito do doutoramento em Artes
da/na região Norte do Brasil.
A região Norte do Brasil apresenta três cursos stricto sensu no
campo das Artes, sendo eles: o Programa de Pós-Graduação em Artes

_______________
13
Tradução nossa.
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

Cênicas da Universidade Federal do Acre (UFAC), em nível de mes-


trado; o Programa de Pós-Graduação em Artes da Universidade Fe-
deral do Pará (UFPA), em nível de mestrado; e o Programa de Pós-
Graduação em Artes da UFPA, em nível de doutorado. Acreditamos
ser importante também destacar mais dois programas: o Programa de
Pós-Graduação em Letras e Artes da Universidade do Estado do
Amazonas (UEA), em nível de mestrado, que está vinculado à área
básica das Letras, mas tem uma interlocução com a área das Artes em
sua área de concentração e nas linhas de pesquisa; e o Programa de
Pós-Graduação em Letras da Universidade Federal de Roraima
(UFRR), em nível de mestrado, que também está vinculado à área
básica das Letras, mas tem uma das linhas de pesquisa com interlocu-
ção das Artes. Contabilizando, assim, apenas três cursos vinculados à
área básica das Artes e acrescentamos, para conhecimento, mais dois
cursos vinculados à área básica das Letras, mas que têm direta relação
com o campo das Artes.
O Programa de Pós-Graduação em Artes Cênicas da UFAC está
vinculado à área básica das Artes tendo seu início no ano de 2019. Até a
escrita deste capítulo, apresenta sete dissertações defendidas e consta em
processo de reconhecimento. O programa conta com a área de concen-
tração nas “Artes Cênicas”, tendo como linhas de pesquisa: Linha 1: Te-
oria e prática das Artes Cênicas; e Linha 2: Artes Cênicas e Educação.
Foram ofertadas, nos anos de 2019 e 2020, o total de 10 vagas por ano.
Esses alunos estão vinculados ao grupo de 10 professores.
O Programa de Pós-Graduação em Artes da UFPA conta com
mestrado e doutorado. O curso de mestrado foi o primeiro pro-
grama na área de Artes criado/implementado na região Norte, no
ano de 2008/2009, e está avaliado pela Capes com conceito 4. Por
isso, a viabilidade da criação/implementação do doutorado em
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

2015/2016. Os programas contam com a área de concentração “Ar-


tes”, tendo como linhas de pesquisa: Linha 1: Poética e processos
de atuação em Artes; Linha 2: Teorias e interfaces epistêmicas em
Artes e; Linha 3: Memórias, história e educação em Artes. O pro-
grama conta com 12 professores permanentes e nove professores
colaboradores que dão conta das atividades do mestrado e douto-
rado. Com essa estruturação, entre os anos de 2011 a 2021 foram
defendidas 253 dissertações de mestrado. O curso de doutorado em
Artes é o primeiro e único dessa área de conhecimento na região
Norte até o ano de 2023. Até o momento, foram defendidas apro-
ximadamente 40 teses.
Cabe destacar também outros dois programas que apresentam
uma interlocução explícita com as Artes. O mestrado em Letras e
Artes da UEA, como sinalizado anteriormente, apesar de estar vin-
culado à área básica de Letras, apresenta como área de concentração
“Representação e interpretação artística, literária e linguística” e
como linhas de pesquisa: Linha 1: Arquivo, memória e interpreta-
ção; Linha 2: Linguagem, discurso e práticas sociais e, Linha 3: Te-
oria, crítica e processos de criação. Atualmente, o programa conta
com 14 professores permanentes e três professores colaboradores.
Apresenta nota 3 na avaliação da Capes. O Programa de Pós-Gra-
duação em Letras e Artes da UEA teve sua criação no ano de 2011
como mestrado profissional, permanecendo nessa categoria até
2015, quando passa a mestrado acadêmico. Assim, entre os anos de
2013 a 2016, foram defendidas 53 dissertações como mestrado pro-
fissional e, entre os anos de 2017 a 2021, a defesa de 79 dissertações
como mestrado acadêmico, totalizando 132 dissertações.
O mestrado em Letras da UFRR também se apresenta vinculado
à área básica de Letras. Foi criado no ano de 2012 e hoje apresenta a
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

área de concentração “Estudos de linguagem e cultura regional” e as


seguintes linhas de pesquisa: Linha 1: Língua e cultura regionais; e Li-
nha 2: Literatura, Artes e cultura regional. O programa conta com 18
professores permanentes e um professor-colaborador. Apresenta nota
3 na avaliação da Capes. No período de 2012 a 2021, temos o registro,
no site do programa, de 129 dissertações defendidas.

Neste estudo, optamos por trabalhar com as 15 primeiras teses


de doutoramento em Artes defendidas em 2019 e 2021 no Programa
de Pós-Graduação em Artes da UFPA. Desse modo, esse é o nosso
corpus de investigação. Assim, as teses passaram por um processo de
análise qualitativo a fim de adentrarmos em algumas especificidades
do que vem sendo problematizado. Destas, seis são vinculadas à Li-
nha 1: Poéticas e processos de atuação em Artes; quatro vinculadas
à Linha 2: Teorias e interfaces epistêmicas em Artes; e cinco vincu-
ladas à Linha 3: Memórias, histórias e educação em Artes. Para a
análise qualitativa desse material, elaboramos as seguintes categorias,
quais sejam: “Sujeito/objeto de investigação”; “Metodologia”;
“Conceitos/autores”.

Quadro 1 – Categorias de análise


Sujeito/objeto Música (cinco trabalhos)
de investigação Teatro (quatro trabalhos)
Artes Visuais (três trabalhos)
Dança (um trabalho)
Interdisciplinar (dois trabalhos)
Metodologia Pesquisa (nove trabalhos)
Memorial (dois trabalhos)
Continua...
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

Continua...
Poética/criação artística (quatro trabalhos)
Conceitos/ Autores conceituais e metodológicos
autores
Fonte: Elaboração das autoras.

No que tange à categoria “Sujeito/objeto de investigação”,


pautamos nosso olhar para o que está sendo investigado no campo
das Artes adentrando nas especificidades das linguagens artísticas
(artes visuais, música, teatro, dança e outras), bem como nas inter-
locuções com campos interdisciplinares. Na categoria “Metodolo-
gia”, buscamos evidenciar os caminhos percorridos na consolidação
das investigações propostas especificando as teses que abordam
uma construção investigativa da pesquisa acadêmica, do memorial e
da poética/criação artística; na categoria “Conceitos/autores”, apoi-
amo-nos em uma perspectiva de trabalho que buscasse evidenciar
os autores que estão sendo mobilizado nas investigações.
Assim, ao tratarmos da categoria “Sujeito/objeto de investiga-
ção” no campo da Música, foram encontradas cinco teses. Nestas,
podemos observar a utilização de instrumentos, músicos ou apenas
o som como experimento sensorial. A primeira tese, Sons, textos e
visualidades, de Silva (2019), propõe um estudo voltado à produção
musical envolvendo o gênero do rock paraense a partir de três artis-
tas escolhidos pelo autor. A segunda tese, Minha viola é de buriti, de
Bonilla (2019), investiga o instrumento musical da viola de buriti
produzida no quilombo do Mumbuca, como patrimônio imaterial e
considerando seu papel histórico na comunidade. A terceira tese,
Como estrela és David, de Puget (2020), analisa o processo criativo e
os sambas-enredo do compositor David Miguel dos Santos, por
uma perspectiva da etnomusicologia da música popular paraense.
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

A quarta tese, Move, de Rodrigues (2020), realizou uma inter-


venção com os estudantes de licenciatura em Música com privações
sensoriais, intelectuais e motoras da UFPA, por meio de um protó-
tipo como ferramenta de visualização, dando acessibilidade a esses
estudantes. A quinta e última tese no campo da Música, Arte-educação
em psicologia, de Sousa (2020), utiliza a Educação Musical para ajudar
pessoas com transtornos de ansiedade na prática psicoterapêutica.
As teses buscam, com a música, investigar a história de uma socie-
dade a partir de um instrumento patrimonial, estudar compositores
e seus processos para alavancar a cultura por meio do seu estilo mu-
sical ou fazer experimentos sensoriais para facilitar aprendizagem e
tratar transtornos clínicos.
No campo do Teatro, encontramos quatro teses que sensibili-
zam o espectador e contam histórias por meio da representação de
aspectos sociais, tendo como finalidade representar e repassar co-
nhecimentos perdidos no tempo, os quais são estudados e aprofun-
dados nessas teses. A tese O camelo, o leão e a criança que brinca, de
Miranda (2019), performa a partir do memorial poético Árvore de
mim, com aprofundamento da sua árvore genealógica. A segunda
tese, Poéticas nômades, de Fonseca (2020), investiga a problematização
do termo “nômade” e sua relação de arte e territorialidade, a partir
de dispositivos tecnológicos que possam transmitir ao espectador
uma experiência espacial.
Na terceira tese, Puta, pistoleira, dona de cabaré, Carvalho (2021)
realiza uma pesquisa sobre o “corpo-cavalo” de Dona Rosinha (en-
tidade umbandista) e Rosa Luvara (mãe de santo trans-travesti), com
uma proposta epistemológica de um corpo em processo de criação
identitária de gênero e empoderamento epistêmico-artístico. A
quarta tese, Entes marujas e marujos, de Baena (2020), aprofunda-se na
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

pesquisa sobre o vestir no culto à São Benedito em Bragança/PA,


além de sua importância no aspecto vestimenta do santo homena-
geado, ensaios, missas etc. A autora confecciona junto à comuni-
dade sua própria vestimenta e experimenta a vivência do trabalho
dos adereços das marujas e dos marujos, feitos pelas artesãs devotas.
Assim, os trabalhos no campo do Teatro contextualizam histórias e
heranças de identidades marcadas pelos processos culturais das co-
munidades, seja por conflitos religiosos, seja por preconceitos mo-
tivados por desigualdade de gênero. É notável que essas pesquisas
se aprofundam no legado deixado pela sociedade.
No campo das Artes Visuais, temos três teses em que encon-
tramos registros de história familiar ou evento por meio da produ-
ção de quadrinho e, principalmente, com o uso de fotografia. A pri-
meira tese, O Auto do Santo Preto e a benção das três fomes, de Chagas
(2020), analisa fotografias das festividades jurunenses de São Bene-
dito buscando um olhar sensível pelo enredo da escola de samba no
Carnaval. A segunda tese, Saburo, de Ono (2020), narra o período de
vida do avô do autor, contando o processo de imigração japonesa
no Brasil e realizando, a partir da técnica de desenho em quadrinho,
um memorial. A terceira e última tese no campo das Artes Visuais,
Território móvel, de Rabello (2021), utiliza o álbum de fotografia antigo
de família e fotografias autorais para registrar seu processo criativo
e poético. Essas teses têm semelhança quanto à utilização de ima-
gem para narrar tradições e contar histórias de vida. Com fotografias
ou técnicas de desenho, seus trabalhos epistemológicos enaltecem
culturalmente suas trajetórias de vida em memoriais.
No que tange ao campo da Dança, encontramos apenas uma tese
que aborda a percepção feminina familiar da autora e seus conceitos a
partir da sua memória, por meio de signos de movimentos expressivos
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

para a autorrecriação de si. Lavand (2021) desenvolve na sua tese, inti-


tulada Ânima Trama, o processo de criação de uma obra de dança, por
uma visão feminina sensível e por suas relações familiares, utilizando o
trabalho manual predominantemente feminino da costura para fazer
esse memorial poético, uma autocriação de si.
Ainda, encontramos duas teses que discutem uma construção
interdisciplinar: uma abordando a produção do conhecimento em
mestrado em Artes e a outra a relação da Arte com a Comunicação,
sendo as duas teses de teor analítico e com aprofundamento na valo-
rização do campo da Arte como estudo. A primeira, O lugar da arte na
TV, de Andrade (2020), utiliza como objeto de estudo programas de
TV especializados em Arte para elaborar sua pesquisa associada à co-
municação para fortalecer a valorização da temática de Artes como
estudo. A segunda, Mestres que criam, de Menezes (2020), analisa as
produções do conhecimento no mestrado em Artes no estado do
Pará, com a intensão de destacar os impactos que podem atingir a
educação e consolidar um referencial teórico. Ambas as teses inter-
disciplinares norteiam a pesquisa teórica em Artes para fortalecer o
conhecimento na área, possibilitando maior compreensão da necessi-
dade do estudo em Artes na educação brasileira e sua valorização.
Na categoria “Metodologia”, adentramos na especificidade da
construção investigativa. Nesta categoria encontramos nove teses
que se vinculam a uma construção acadêmica de pesquisa. A pri-
meira tese, Sons, textos e visualidades, de Silva (2019), constrói-se a par-
tir de relatos orais, fanzines, panfletos, escrita de poemas e vídeo-
performance, servindo de base para reflexões históricas representa-
das nesta tese. A segunda tese, Minha viola é de buriti, de Bonilla
(2019), utiliza a metodologia do Instituto do Património Histórico e
Artístico Nacional (IPHAN) (2016) e o documentário audiovisual,
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

além da criação de um caderno de partituras e da produção de textos


acadêmicos de escrita coletiva sobre os quilombos. Já a terceira tese,
O lugar da arte na TV, de Andrade (2020), realiza um levantamento
sobre a produção dedicada ao campo da arte na TV brasileira.
Na quarta tese, Como estrela és David, de Puget (2020), foi reali-
zada uma investigação bibliográfica, discográfica, imagética e audio-
visual, fornecendo informações contextualizadas sobre o composi-
tor (David Miguel dos Santos) e seu processo criativo no samba-
enredo. Em sequência, a quinta tese O Auto do Santo Preto e a benção
das três fomes, de Chagas (2020), tem uma perspectiva realizada de
forma epistemológica e etnocenológica da vivência do sujeito, ana-
lisando práticas e comportamentos humanos. Em continuidade, a
sexta tese, Move, de Rodrigues (2020), aborda uma metodologia ba-
seada na prática de exercício com estudantes de música com priva-
ções sensoriais, intelectuais, usando a interdisciplinaridade como
base. Por outro lado, a sétima tese, Mestres que criam, de Menezes
(2020), aprofunda-se no estudo realizado com a análise do acervo
de 25 produções textuais dos discentes de mestrado em Artes do
estado do Pará (2014-2016), construindo, assim, o referencial teó-
rico da sua pesquisa.
Em suma, a oitava tese, Arte-educação psicologia, de Sousa (2020),
fez uma pesquisa teórico-aplicada sobre arte-educação em Psicolo-
gia, com ênfase na linguagem musical para tratar transtornos de an-
siedade utilizando a prática psicoterapêutica. Por sua vez, a nona
tese, Entes marujas e marujos, de Baena (2020), referenciou-se biblio-
graficamente dos estudos acadêmicos acerca do tema sobre marujas
e marujos. Em seguida, pesquisou sobre os vestuários do evento ao
culto do santo e, por último, a autora vivencia a prática das confec-
ções das mulheres trabalhadoras e devotas de São Benedito.
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

Ainda encontramos quatro teses que abordam o processo de


poética/criação artística. Nessas quatro teses, a primeira é O camelo,
o leão e a criança que brinca, de Miranda (2019), poética realizada em
cima de uma árvore genealógica em busca da construção de uma
dramaturgia de si mesma utilizando o tarot, a consciência e a conexão
do sujeito. Já a segunda tese, Poéticas nômades, de Fonseca (2020),
aplicou uma metodologia baseada na pesquisa prática por meio de
uma materialidade tecnopoética acompanhada de posterior análise.
Em síntese, a terceira tese, Puta, pistoleira, dona de cabaré, de Carvalho
(2020), desenvolveu um dinamismo etno-método-afetivo para aden-
trar a metodologia de um corpo em processo de criação e transfor-
mação por uma entidade umbandista e mãe de santo trans-travesti.
Por fim, a quarta tese, Ânima trama, de Lavand (2021), é entendida
pela metáfora da autora em sua pesquisa de teia labirinto, pois ad-
vém do corpo da pesquisadora e de suas múltiplas possibilidades de
percurso e processo de autocriação com a obra de dança contempo-
rânea Ânima trama.
Com uma proposta investigativa estruturada a partir do memo-
rial, encontramos duas teses. Essas teses são distintas, já que a pri-
meira, Saburo, de Ono (2020), utiliza duas formas metodológicas:
produção e técnica de quadrinhos e a tese em si como memorial e
desempenho criativo sobre as especificações da linha de poéticas e
processos de atuação em Artes. Em contraste, a segunda, Território
móvel, de Rabello (2021), faz uso de três instâncias de projeto poé-
tico: retorno, rizoma e ressonância. Nela, produziu duas séries foto-
gráficas buscando memórias, desejos e multiplicidade das imagens,
direcionando a autora ao que denomina “território móvel”.
Na categoria “Conceitos/autores”, trabalhamos com a pers-
pectiva de identificar autores apresentados na estruturação teórica
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

da investigação. Para isso, encontramos na tese Sons, textos e visuali-


dades, de Silva (2019), o conceito dos autores que entendem que a
arte na contemporaneidade rompeu fronteiras (Ego, 2016) e que a
história da arte não se detém apenas nos trabalhos de artistas ligados
exclusivamente aos famosos e elitistas centros do sistema da arte
(Fabris, 1989; Medeiros, 2012; Kern, 2007). Também a tese Minha
viola é de Buriti, de Bonilla (2019), considera a indissociabilidade
(Maffesoli, 1998) entre o intelecto e a sensibilidade da poética sobre
o tema “quilombo” e utilizou conceitos de autoetnografia (Fortin,
2009; Aschieri, 2018) para tentar descrever suas impressões sobre a
experiência de campo e a seleção de filtros pessoais para algumas
abordagens específicas que marcaram o autor da tese durante todo
o processo, procurando equilibrar a abordagem antropológica com
uma aproximação mais artística e sensível.
Entretanto, na tese O lugar da arte na TV, de Andrade (2020),
para alcançar uma profundidade de informações sobre o objeto
estudado, a autora compreende, a partir de Gerhardt (2009), a
naturalidade com que em alguns pontos da pesquisa se realizem
correlações em contextos mais gerais em que o objeto está inse-
rido, além de levantamentos históricos que podem vir por meio
de levantamento bibliográfico. Vale salientar que esse acervo bi-
bliográfico também foi ampliado pela observação do referencial
teórico que passa pela compreensão do conceito de “Eduteni-
mento” ou “Edutretenimento”, a partir de autores como Américo
(2010), Okan (2003), Moraes (2014), Singhal (1999) e Walldén
(2014). No trabalho Como estrela és David, de Puget (2020), o ob-
jetivo era conhecer a trajetória de vida do compositor David Mi-
guel dos Santos. Sua pesquisa bibliográfica se aprofundou no
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

termo criado por Gilbert Durand (1989), conhecido como “tra-


jeto antropológico”, que representa “[...] a incessante troca que
existe ao nível do imaginário entre as pulsões subjetivas e assimi-
ladoras e as intimas objetivações que emanam do meio cósmico
e social” (Puget, 2020, p. 41). Já que a obra desse compositor está
inserida no contexto sociocultural do estado do Pará, seu traba-
lho aprofundou-se nas ideias de Merriam (1964, p. 6), em que
“[...] a música é o resultado do processo comportamental de seres
humanos que são moldados pelos valores, atitudes e crenças das
pessoas que a compõe uma cultura particular [...]” e “[...] textos,
naturalmente são comportamentos linguísticos mais do que sons
musicais, mas eles são uma parte integrante da música e há claro
indício de que a linguagem usada em conexão com a música difere
do discurso usual” (Merriam, 1964, p. 187).
No conceito da tese O Auto do Santo Preto e a benção das três
fomes, de Chagas (2020), o trabalho é construído sobre o vislum-
bre do mundo como texto, pela visão de Paul Ricouer (1988); da
Antropologia Interpretativa, de Clifford Geertz (2013); das Soci-
ologias Compreensiva e Orgiástica, de Michel Maffesoli (1998); e
da Antropologia das emoções, de Davi Le Breton (2009). A pro-
posta almejada foi a de apresentar a dimensão imaterial das festi-
vidades a partir do entendimento de patrimônio cultural e memó-
ria (Nora, 1993; Halbwachs, 2006) como meio de elaboração de
identidades (Hall, 1999, 2013). Para o alcance dos objetivos pro-
postos, a tese Move, de Rodrigues (2020), justifica a literatura re-
lacionada às pesquisas no ensino superior e vem destacando a
necessidade intrínseca de estabelecer ou reestabelecer o diálogo
entre ensinar a pesquisar e o ato de pesquisar para ensinar, visto
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

que a pesquisa ultrapassa o viés da universidade para a profissio-


nalização, formando profissionais que questionam o seu próprio
fazer, a fim de avaliar e ressignificar o seu próprio saber (Rojas
Betancur; Méndez Villamizar, 2013; Barros; Silva; Barros, 2016;
Nascimento; Aragão; Gomes; Nova, 2013).
A tese Mestres que criam, de Menezes (2020), concentra-se prin-
cipalmente em um referencial teórico focado em políticas educacio-
nais e parte da reflexão sobre as redefinições necessárias em um
contexto do que Schwartzman (2005), baseado em Gibbons (et al.,
1994 apud Schwartzman, 2005), chamou de “novo modo de produ-
ção do conhecimento”, ou seja, “[...] na verdade, são dois modelos
ideais, entre o que seria uma ciência mais tradicional e uma ciência
mais contemporânea” (Schwartzman, 2005, p. 11). Sousa (2020)
fundamenta sua pesquisa metodológica ligando Arte-Educação na
Psicologia, explicando que, nesse contexto, a Arte-Educação, por
meio da Educação Musical, constitui-se num elo importante para o
sujeito efetivar sua vivência subjetiva e, ainda, pode ser aliada da
Psicologia no fortalecimento da capacidade de o indivíduo se modi-
ficar pela apropriação de novos conhecimentos (Vigotsky, 1997).
Esses conhecimentos, se construídos de forma autônoma, por eta-
pas biopsíquicas (Piaget, 1990) e dentro de um plano cognitivo, afe-
tivo e psicossocial (Beck, 2013), além de especificamente centrado
nas necessidades individuais desse sujeito (Rogers, 2009), poderão
produzir mais qualidade e saúde nas suas funções psicológicas supe-
riores (percepção, atenção, linguagem e pensamento, por exemplo)
que estejam desarmonizadas, causando transtornos, como os trans-
tornos de depressão e/ou ansiedade.
Por fim, a tese Entes marujas e marujos, de Baena (2020), relaciona a
ideia entre o termo “etno” e “metodologia” apontado por Garfinkel,
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

citando “[...] de uma forma ou de outra que um membro dispõe de


saber do senso comum de sua sociedade enquanto saber o que quer
que seja” (Garfinkel apud Coulon, 1995, p. 50). Continuando seu raci-
ocínio, as pessoas compreendem juntas, valendo-se de regras (práticas)
constitutivas, que o autor citado denominou de “etnométodos”.
Aponta que para a democracia existir, essa cooperação baseada em prá-
ticas é essencialmente igualitária e deve substituir a forma “tribal” de
consenso que cria fronteiras entre as pessoas (Garfinkel, 2018).

Compreender os desafios e as abordagens do/no contexto do


doutoramento em Artes no Norte do Brasil é de suma importância
para alavancar mais pesquisas em torno da Arte-Educação em nossa
região. Assim, nesta investigação realizamos um detalhamento de 15
teses, em que foi possível investigar os trabalhos no campo da Mú-
sica, Teatro, Artes Visuais, Dança e Interdisciplinarmente. Nas te-
ses, foram discutidas questões sociais, de histórias de vida ou ele-
mentos históricos para adentrar na cultura do Norte, de forma a
trazer novas possibilidades de entendimento e valorização cultural.
No que tange às categorias de investigação elencadas, verificamos
que na categoria “Sujeito/objeto de investigação” os autores buscaram
de forma poética ou educacional compreender suas inspirações de vida
ou inquietações pelas quais desenvolveram sua pesquisa. Fruíram, a
partir de objeto ou sujeito inspirador, para embasar estudos na área de
Artes e, de forma educacional, usaram a investigação das teses para
pesquisas de campo, por exemplo, de maneira interdisciplinar, como a
utilização da música na área da Psicologia (Sousa, 2020).
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

Na categoria referente à “Metodologia”, os autores investigam


o processo em pesquisas práticas com sujeitos no ambiente educa-
cional, como no desenvolvimento artístico, poético e memorial de
objetos ou narrativas de vida de pessoas inspiradoras, tratando, as-
sim, de momentos históricos que marcaram de alguma forma a cul-
tura local. Houve teses que recorreram a um mapeamento de dados
no campo da Arte no Brasil para dissertar o que possui de caracte-
rísticas do Norte ou a um levantamento da produção da arte na TV
brasileira para utilizar essa relação teórico-prática em teste de um
programa de TV no Pará. Essas investigações buscaram a combina-
ção do artista/pesquisador que aproxima o que tem de mais rico em
sua cultura para o restante do país.
Para articularem suas pesquisas, pudemos evidenciar na cate-
goria “Conceitos/autoras(es)” que nas teses há referências a auto-
res/pensadores que trabalham de forma conceitual ou metodoló-
gica, intensificando suas propostas e narrativas. Foi possível identi-
ficar conceitos/autoras(es) sob uma diversidade bastante ampla, o
que mostra a complexidade de abordagens que passam a ser estabe-
lecidas nas pesquisas do campo artístico.
As investigações analisadas mostram uma variedade imensa de
sujeitos/objetos/metodologias e autorias. Contudo, colocam em
discussão e nos apresentam na consolidação da investigação a difi-
culdade que esses futuros profissionais enfrentarão para realizarem
sua pesquisa em Arte na região Norte do Brasil. Isso, pois há uma
carência de modelos e programas que foquem seu olhar para o
campo das Artes e da Educação. Nesse sentido, este capítulo intenta
mostrar a construção de um corpus epistemológico que parta também
das problemáticas amazônicas em toda a sua diversidade e diferença.
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Com isso, buscamos evidenciar a necessidade de programas de


formação continuada de nível stricto sensu para a região Norte do Bra-
sil, tendo em vista a escassez de produção de pesquisas em nível de
doutoramento, em função do reduzido número de programas de
pós-graduação e também do acesso a eles. É necessário ressaltar que
o acesso à universidade ainda é um dos grandes obstáculos, princi-
palmente ao que se refere a logística para quem mora no interior ou
mesmo em comunidades rurais. Permeada por especificidades terri-
toriais, fronteiriças, históricas e étnicas, a região Norte do Brasil ca-
rece ainda de investimentos na formação de recursos humanos e
ocupa a lanterna nos indicadores de desenvolvimento educacional.
Ademais, outros desafios, como acesso à internet, a carestia de in-
vestimento em bens artísticos e culturais por parte do poder público
e o contínuo esvaziamento científico que vivemos nos últimos anos
são complexas particularidades, de árdua transposição.
Assim, com nosso estudo foi possível perceber a diversidade ine-
rente às perspectivas artísticas e epistemológicas na/da Amazônia, o
que abre campo para que novos cursos possam surgir e para que o
estabelecimento de redes de saberes e conexões interestaduais possam
acontecer. Queremos advogar por uma pesquisa em Artes que não so-
mente compreenda as problemáticas amazônicas, mas também abra
campo para outras tantas perspectivas ao se tecer entre os diversos es-
paços e tempos, tanto artísticos quanto pedagógicos, produzindo ciên-
cia descolonizada e preocupada com o campo amazônico, que dialogue
com as comunidades que a cerca e com as multiplicidades da região.
Dessa forma, cremos que a possibilidade de efetivação de uma pesquisa
capaz de colaborar com um olhar contínuo para essas especificidades
e de apontar os desafios desse contexto – suas potencialidades, fragili-
dades e provocações – é algo ímpar e indispensável de ser executado a
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

fim de que possamos, diante das intempéries, ampliar os horizontes


formativos na região Norte do Brasil.

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Maria Mikaele da Silva Cavalcante


Isabel Maria Sabino de Farias
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas
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sta produção versa sobre os desafios de professores cearenses


iniciantes na carreira. Trata-se de análise decorrente de resulta-
dos de investigação empírica do tipo pesquisa-formação, de caráter
multicêntrico e que envolveu três universidades de três diferentes
regiões brasileiras (Rio de Janeiro, Santa Catarina e Ceará). As cons-
tatações apresentadas neste escrito, contudo, referem-se ao Núcleo
Ceará e advêm do exame das narrativas orais de 22 professores, par-
ticipantes da pesquisa-formação no ano de 2021.
O início da profissão configura tema emblemático e que en-
volve um conjunto dedesafios, de um sujeito – o professor iniciante
– que vive um momento delicado e complexo de sua vida profissi-
onal, sendo atravessado por inseguranças, medos e entusiasmo. É
uma fase, portanto, difícil, pois “[...] independentemente da quali-
dade do programa de formação inicial que tenham cursado, há algu-
mas coisas que só se aprendemna prática, e isso implica que esse pri-
meiro ano seja um ano de sobrevivência, descobrimento, adaptação,
aprendizagem e transição” (Garcia, 2010, p. 28).
Durante os primeiros anos na docência se consolida a consti-
tuição profissional de cada professor, que aprende durante as primei-
ras interações e experiências, de forma mais intensa, caracterizando
esse período como uma fase em que sentimentos, desafios e apren-
dizagens iniciais do contato com profissão são mais árduos e decisi-
vos quanto à continuidade na profissão. É nesse sentido que inúme-
ros autores nacionais (André, 2018; Cunha; Zanchet, 2010; Cruz; Fa-
rias; Hobold, 2020) e internacionais (Garcia, 2010; Huberman,
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

2007; Imbernón, 2004; Veenman, 1984) têm contribuído para o


debate sobre o assunto, inclusive visando compreender esse pro-
cesso com maior aprofundamento.
Em vista da centralidade desse debate na seara educacional
contemporânea, trazemos com este texto nossa contribuição ao
problematizarmos, no intuito de compreendermos melhor os desa-
fios enfrentados por professores iniciantes cearenses, as dificuldades
que estes possuem no âmbito da sua prática profissional e como, na
perspectiva dos professores iniciantes cearenses, os primeiros anos
de docência são experienciados nesse contexto. Essas preocupações
expressam os elementos abordados ao longo deste escrito.

Para o estudo da temática ora anunciada, realizou-se um es-


tudo de natureza qualitativa, do tipo pesquisa-formação. Partici-
param do estudo professores iniciantes da rede pública de ensino
cearense, por meio de edital de seleção, que teve como intuito a
organização de Grupos de Formação (GF). No caso do Ceará,
formaram-se três grupos com 22 professores que atuavam na
educação infantil, anos iniciais do ensino fundamental e anos fi-
nais do ensino fundamental e ensino médio, ou seja, grupos dis-
tribuídos a depender da etapa da educação básica, por entender
que os desafios nessa fase da carreira podem variar.
Durante os encontros, os professores iniciantes participantes,
de forma coletiva e processual, construíram narrativas sobre suas
primeiras experiências como professores iniciantes. Nesses encon-
tros, a intenção era que os professores pudessem (re)pensar suas
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

próprias histórias, aprender com as experiências dos outros profes-


sores e, com isso, criar uma dinâmica formativa entre os integrantes
do encontro. Todos os encontros foram gravados, filmados e, pos-
teriormente, todo o material foi transcrito e os cuidados ético devi-
damente observados.

De antemão, é preciso que se “[...] reconheça que a docência


é uma profissão complexa, que exige um aprendizado constante
e que para enfrentar as questões e os desafios da prática cotidiana
é preciso continuar estudando, recorrer a colegas mais experien-
tes, buscar apoio, dispor-se a aprender” (André, 2018, p. 6).
Nesse sentido, cabe questionar: quais os principais desafios en-
frentados pelos professores nos seus primeiros anos de docência?
De que natureza são esses desafios? Quais desafios têm maior
tônica no exercício do trabalho docente?
Os desafios que são postos aos professores em seu primeiro
contato com sua atividade profissional não são exclusivos do seu
trabalho. Todo profissional sente o peso de estar num ambiente
novo pela primeira vez, o medo por aquilo que não conhece e o
entusiasmo de conseguir alcançar o que se espera dele. O fato é que
os desafios que enfrentam os iniciantes são variados, às vezes so-
frendo influência da realidade escolar em que está inserido. Por mais
que não se possa apontar para um único elemento desafiador, alguns
autores da área da formação de professores já arriscam pontuar de-
terminados aspectos, a exemplo das professoras Alarcão e Roldão
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

(2014, p. 112, grifos nossos) que, após análise de pesquisas realiza-


das sobre a temática, dizem:
As dificuldades sentidas pelos professores em início de car-
reira são de várias ordens: científico-pedagógica (gestão do en-
sino, problemas de indisciplina e desmotivação, diferencia-
ção de ritmos de aprendizagem, gestão do currículo, relaci-
onamento com os alunos, avaliação), burocrática (conheci-
mento da legislação, dos regulamentos, do funcionamento
da escola, diversidade de tarefas e tempo para as gerir, as-
sunção de cargos sem preparação), emocional (autoconheci-
mento, autoestima e autoconfiança, isolamento, angústias,
gestão das dimensões pessoal e profissional), social (identi-
dade e identificação profissional, relacionamento com os
colegas, desconhecimento das regras de conduta, relaciona-
mento com os encarregados de educação). É habitual falar-
se em resolução das dificuldades por tentativa e erro neste
período em que aossaberes aprendidos na formação inicial
é preciso dar uma orientação prática e contextualizada.
Os desafios experienciados pelos professores no início de suas
atuações profissionais, conforme destacado pelas autoras no frag-
mento anterior, são diversos, não se limitando a um fator único. Es-
tes, em geral, extrapolam os muros da escola (Cavalcante, 2018), o
que caracteriza toda a complexidade do trabalho docente. Com re-
lação ao início na educação básica, “[...] os primeiros anos na carreira
são os maisdesafiantes, predominando o sentimento de sobrevivên-
cia na profissão e uma sensação de estar lutando continuamente para
se manter nela” (Costa, 2021, p. 78).
Com relação aos desafios de ordem científico-pedagógica, estes
envolvem a ação do professor, seu trabalho e modo de agir. Por esse
motivo, tais desafios geram conflitos e inseguranças ao professor,
uma vez que, ao não saber “o que fazer” e “como agir”, passam a
questionar a solidez da sua formação inicial (Romanowski; Martins,
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

2010), mas também ter insegurança quanto às suas ações na quali-


dade de profissional. Esse dilema inicial acerca da prática professo-
ral, inclusive, transporta o docente ao desestímulo e, em último caso,
à desistência do seu mister (Alves, 2017).
Sobre os desafios de natureza burocrática, estes costumam apa-
recer e ser mais penosos nos primeiros momentos da atuação,
quando o professor se depara com o preenchimento de relatórios,
documentos orientadores e afins. Por mais que esse desafio seja re-
lativamente fácil de ser sanado, ele tem de entender que “[...]
precisa atender as expectativas que vão além do ato de ensinar, mas
são especificidades da função de ser professor” (Alves, 2017, p. 35)
e, com isso, depara-se mais com uma série de atividades que lhe de-
mandará tempo, aprendizagem e empenho para realizar. Esse é um
dos elementos que não estão no script, quando muitos idealizam ser
“professor”, mas que faz parte da função e precisa ser aprendido.
Os desafios de cunho emocional, a seu turno, relacionam-se ao
modo particular de cada sujeito, como ele sente e vive a docência, mas
também à natureza do trabalho professoral, que se caracteriza como
uma atividade, muitas vezes, solitária, demandando diálogo e vínculos
entre aqueles que compõem a comunidade escolar. Em adição, con-
forme ensina Farias (2006), as práticas não mudam antes das crenças,
exceto quando essas mudanças ocorrem de modo impositivo. É pre-
ciso que os professores queiram e tenham motivações próprias para
mudar, o que é muito mais difícil de conseguir, pois é providência que
abrange a esfera individual do sujeito.
Ensinar, por mais que seja uma prática de cariz coletivo, é também
uma ação realizada de modo isolado, ou, pelo menos, é assim que mui-
tos docentes sentem e vivem na profissão. Para Garcia (2010, p. 16), os
professores, “[...] geralmente, enfrentam sozinhos a tarefa de ensinar.
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

Somente os alunos são testemunhas da atuação profissional dos docen-


tes. Poucas profissões se caracterizam por uma maior solidão e isola-
mento”. Solidão, desamparo e falta de apoio são característicos na vida
docente. No caso dos professores iniciantes, eles são tratados como se
já devessem saber como fazer o seu trabalho, quando deveriam ter uma
atenção diferenciada dos demais profissionais.
Ante ao exposto, apresentamos a seguir as narrativas dos pro-
fessores iniciantes participantes do estudo.

Os professores iniciantes participantes da pesquisa indicaram a


prática profissional como um dos seus maiores desafios. Grosso modo,
as suas narrativas evidenciaram os seguintes aspectos em relação à
prática profissional: planejamento, conteúdos e resistência dos alu-
nos. Um primeiro aspecto destacado pelos professores iniciantes foi
quanto à dificuldade no planejamento de seus trabalhos. Vejamos a
seguir o que eles pontuam sobre o assunto:
Em relação aos meus primeiros dias, o planejamento para
mim era muito angustiante, porque assim, eu sabia planejar,
mas aí, como é que ia ser na verdade? Ia dar certo? Tempo
ia dá certo? Como é que eu ia saber que aquilo ali que eu
estava fazendo estava dando certo? (Professor iniciante 9,
anos iniciais do ensino fundamental).
[...] eu tive muita dificuldade no início, em questão de pre-
encher o diário, preencher o plano, porque eu vinha de uma
realidade de estágio e quando eu cheguei pra docência eu
tive uma outra realidade. [...] eu andava muito perdida no
início, eu não sabia fazer um plano, eu fiquei com vergonha
quando uma professora que eu fiz amizade pegou meu
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plano e disse: ‘meu Deus, não é assim!’ (Professor iniciante


4, educação infantil).
Aqui na Prefeitura da nossa cidade, nós ainda temos um dia
que é chamado ‘dia livre’, que é para planejarmos e temos
algumas horas na escola, mas, muitas vezes, infelizmente,
acontece de ter reunião, acontece de ter questão de avisos,
tem que acompanhar aluno. [...] . O tanto de coisa que eu
preciso fazer dentro daquele pouco tempo, sendo que são
muitos dias para planejar. Então, planejamento não é uma
questão fácil [...] No fim de semana, às vezes, eu pego o fim
de semana todinho para planejar, porque na semana não dá
tempo. Aí você tem que mandar para coordenação, a coor-
denação tem que avaliar (Professor iniciante 17, ensino fun-
damental e ensino médio).
As narrativas despontam novamente para o sentimento de soli-
dão que acompanha os professores em início de carreira, de estar
sozinho, ser cobrado e ter que aprender por conta própria. Os rela-
tos anteriores demonstram que esses professores não recebem o de-
vido acompanhamento pedagógico que é esperado. Assim, preci-
sam, por meio dos erros e acertos, aprender as inúmeras exigências
que se faz daqueles que atuam nessa profissão.
Alves (2017) compreende que as especificidades da função de ser
professor vão além do ato de ensinar, o que por si só já seria muito,
mas também contempla: a) interação com os pais e/ou responsáveis;
b) desenvolvimento de um planejamento que atenda às necessidades
de aprendizagem; c) preenchimento de diários; d) atendimento às ativi-
dades burocráticas solicitadas pelas Secretarias de Educação; e) desen-
volvimento de atividades diferenciadas que atendam às crianças com
dificuldades de aprendizagem ou um aluno desmotivado/indiscipli-
nado; f) mediação de conflito dentro e fora da sala de aula etc. (Alves,
2017). Algumas dessas atividades, como é o caso do planejamento, são
fundamentais para que se tenha um processo de ensino e aprendizagem
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

adequado, afinal, quando se refere à ação que vai antecipar, orientar e


mediar o ensinar. Fazer um bom planejamento é um fator indispensá-
vel para uma boa aula e, consequentemente, ensino. Portanto, causa
estranheza que os professores participantes, conforme suas narrativas
denotam, sejam tão negligenciados em seu trabalho.
Os professores dos anos iniciais do ensino fundamental e os
professores dos anos finais e médio também destacam, entre os seus
principais desafios da docência, a dificuldade com os próprios con-
teúdos a serem ministrados ou mesmo a fragilidade de suas forma-
ções com relação a estes.
[...] eu consegui montar um conteúdo do zero, que a Edu-
cação Física não tem um livro didático, consegui montar
um currículo do zero, porque nenhuma escola tem um cur-
rículo, como é que eu digo, universal da Educação Física,
igual o Português e Matemática (Professor iniciante 19, en-
sino fundamental e ensino médio).
O outro desafio para mim foi selecionar os conteúdos. Ti-
nha um livro, fiquei muito feliz de um ter um livro para
poder exercer a profissão, mas o livro é mais para nortear,
né? As realidades são bem distintas, e os alunos têm todo o
carinho de elaborar suas ideias lá, mas o material está ali
planejado para ser executado lá na zona rural do interior do
Ceará. Eu acho que eu fui me sentido muito perdida neste
aspecto por conta que me senti sozinha e, também, não me
foi avisado que estavam acontecendo formações da Educa-
ção Física (Professor iniciante 16, ensino fundamental e en-
sino médio).
[...] contei com a ajuda de um colega também meu que se
dispôs muito a ajudar e nós estamos essa construção, cons-
truindo o nosso currículo, construindo o nosso material. A
gente está sentando uma vez por semana e discutindo real-
mente questões que a gente acha pertinentes para se traba-
lhar na EducaçãoFísica (Professor iniciante 20, ensino fun-
damental e ensino médio).
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

[...] eu chegava a tirar foto do quadro da professora da outra


sala para ver o que que ela realmente estava dando para po-
der acompanhar o ritmo dela. E isso foi um desafio muito
grande e os meninos não sabiam ler, eu fiquei angustiado
porque ninguém no quarto ano sabia ler e eu dizia: ‘Eu não
sou alfabetizador’. Porque na faculdade todinha minha in-
tenção era ensinar nível superior, nunca pensei em ensinar
fundamental, séries iniciais (Professor iniciante 11, anos ini-
ciais e ensino fundamental).
A insegurança é um ponto bem demarcado nesses relatos, nos
quais, muitas vezes, os professores parecem realmente estar perdidos
ou mesmo tentando se encontrar em suas profissões. Chama a atenção,
principalmente, sobre o quesito da relação com os conteúdos, o fato
de os professores não atentarem ou pontuarem para a formação, inicial
ou continuada, por ser essa um meio para amenizar tais desafios.
Os professores dos anos finais do ensino fundamental e do en-
sino médio – em específico, os que atuam na área de Educação Física
– destacam um desafio particular que enfrentam com o público com
o qual eles trabalham: a resistência dos alunos quanto a alguns conte-
údos. Segundo os docentes, é preciso, muitas vezes, realizar uma ne-
gociação para que se consiga desenvolver o seu trabalho:
Outro desafio que eu vi foi em relação à própria resistência
dos alunos, porque é uma cultura muito forte presente na
Educação Física, essa questão de eles quererem uma aula
da forma que eles querem, e se não for o que eles querem,
eles não permitem o professor dar aula. [...] eu esperava
chegar naquela escola e ministrar os conteúdos que eu acre-
dito que sejam relevantes para a formação deles, acredito
que esses conteúdos fazem parte do dia a dia deles, da cul-
tura deles, da realidade deles lá, mas só que eles foram
muito resistentes em aceitar o novo conteúdo, e isso para
mim também foi muito desafiador (Professor iniciante 21,
ensino fundamental e ensino médio).
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

[...] eu tive que me submeter aos acordos, foi uma idealização


que eu tive de realmente poder concretizar alguma coisa em
parte do que eu planejava, eu tinha que fazer esses acordos
com eles. Às vezes não dava tempo da bola na aula, eu tive
que fazer a promessa que, na aula seguinte, garantisse que
aconteça a bola, para que realmente eles participassem. E aí,
há muito a cobrança disso, a da prática, porém no momento
da prática tem que ser o que eles querem, a gente tem que
dançar conforme a música deles, e aí a gente tem que ir con-
versando e dialogando (Professor iniciante 20, ensino funda-
mental e ensino médio).
Sobre os relatos, é preciso considerar que a Educação Física
acaba sendo relativizada em detrimento de outras disciplinas, tanto
pelos alunos como também pelos demais participantes da comuni-
dade escolar. Talvez por isso, perceba nessa relação um aspecto di-
ferente dos demais, uma vez que existe uma proximidade cultural
do que os alunos vivem e gostam. O que chama a atenção também
são os professores iniciantes estarem dispostos a “negociar” e dia-
logar com o corpo discente, um aspecto positivo.
As constatações supraexplicitadas firmam o planejamento como um
dos aspectos que, no início da docência, apresenta-se como um desafio
que mobiliza fortemente os professores, visto seu reconhecimento como
estruturante da prática profissional. No que concerne às relações interpes-
soais no âmbito escolar, aprofundamos o assunto no próximo tópico.

Os professores iniciantes participantes da pesquisa sinalizam as


relações interpessoais ocorridas na escola como um desafio dos seus
contextos de trabalho, destacando em particular as relações estabe-
lecidas com a gestão escolar, demais professores e familiares. Os
vínculos com a comunidade escolar é fundamental, no entanto, as
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

narrativas dos participantes indicam que essa caminhada inicial se


deu de forma muito solitária, sem apoio ou com pouca ajuda. Os
professores registram que falta acolhimento, apontaram uma dinâ-
mica de competição e destacaram o distanciamento da família.
Os professores de todas as etapas da educação básica partici-
pantes da pesquisa informaram que não tiveram apoio nem dos co-
ordenadores nem dos diretores. Para eles, o sentimento é solidão.
Vejamos a seguir alguns desses relatos.
[...] eu realmente fui me construindo, eu fui me construindo,
porque realmente no meu início eu não tive apoio nenhum
de gestão, pelo contrário, era o que pudesse dificultar, seria
mais interessante ainda, para que eu pudesse sair. Então as-
sim, eu vi que eu estava em uma batalha, uma batalha invi-
sível, mas que era real (Professor iniciante 9, anos iniciais e
ensino fundamental).
A gente entende que realmente os gestores são atribulados e
atarefados com outras demandas e realmente não tenha essa
transição, essa entrada na escola, esse apoio ao professor ini-
ciante, não tem! Isso aí não existe de forma nenhuma, em
nenhuma escola! A gente conta, como um colega falou aí, a
solidariedade, a boa ação e a empatia dos nossos pares (Pro-
fessor iniciante 20, ensino fundamental e ensino médio).
[...] as relações foram as piores possíveis, de perseguição, de
julgamento, me subestimavam porque eu era recém-for-
mada e achava que eu não tinha nada para oferecer para os
alunos. Então assim, foi muito terrível (Professor iniciante
9, anos iniciais e ensino fundamental).
As narrativas dos professores iniciantes demostram que não
houve um acompanhamentoadequado e satisfatório durante os seus
primeiros anos de atuação. Na verdade, segundo os seus relatos, não
há nenhum tipo de acompanhamento nem apoio pedagógico da ges-
tão ou da secretaria escolar. Para André (2018, p. 6), “[...] o princi-
piante precisa receber apoio e orientação no ambiente de trabalho,
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

de modo que reconheça que a docência é uma profissão complexa,


que exige um aprendizado”. No entanto, para que isso aconteça, a
escola precisa reconhecer a importância desse processo e caminhar
de forma alinhada na mesma direção.
Ao que parece, encontrar acolhimento durante os primeiros
anos na docência é mais uma realidade pouco experienciada pelos
professores iniciantes. Calil e André (2015, p. 13295) dizem que “[...]
o concurso público é a forma de entrada e depois, o professor con-
tará com a sorte de encontrar profissionais tais como: coordenador
ou o próprio diretor e professores experientes que lhe apóiem”.
É difícil e contraditório esperar que professores que estão ensi-
nando pela primeira vez consigam ter um bom desempenho ou sintam-
se melhor com a sua profissão se não lhes é oferecido nem sequer um
acolhimento enquanto profissional. Infelizmente, as narrativas indicam
que não há um processo de apoio nem entre os próprios professores,
inclusive, muitas vezes, sendo desencadeado um clima de competição.
É sempre assim ‘Ah, isso não dá certo’, ‘Você não consegue’
que sempre me colocava para baixo como se eu não tivesse
capacidade. [...] tem outros querem tudo para si, que se pu-
der lhe rebaixar, colocar lá para baixo, é a melhor coisa que
ele faz (Professor iniciante 4, educação infantil).
Eu entrei numa escola em que a maioria dos professores
eram todos concursados, eu acho que só tinha eu e outra
professora como temporário e infelizmente tem essa dife-
rença. Então, de alguns professores você sente uma repulsa-
zinha, você sente a indiferença no olhar, de não querer per-
guntar nem qual é o seu nome, qual disciplina que você vai
lecionar. Infelizmente ainda tem disso e você está ali como
professora temporária, em um ambiente dominado pelos
concursados. Acaba sendo ainda mais difícil, infelizmente
(Professor iniciante 17, ensino fundamental e ensino médio).
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

[...] o preconceito ele vinha por parte, infelizmente, de cole-


gas de trabalho, os colegas professores, e às vezes eu sentia
que vez ou outra por parte até mesmo da própria gestão,
sabe, quando chega naquela situação: ‘- Ah, a gente precisa
tirar uma aula de alguém!’ A primeira cogitada logo é a Edu-
cação Física para ceder para o Português ou Matemática, en-
fim, as a disciplinas que tem, assim, teoricamente um valor a
mais que a Educação Física, Arte, Religião, e é isso! (Profes-
sor iniciante 22, ensino fundamental e ensino médio).
As narrativas informam que os professores iniciantes, além de
não encontrarem o apoio adequado, também possuem dificuldade em
se inserir no grupo escolar e se apoiar em professores considerados
mais experientes. Para André (2018, p. 6), é necessário que o iniciante
“[...] reconheça que a docência é uma profissão complexa, que exige
um aprendizado constante e que para enfrentar as questões e os de-
safios da prática cotidiana é preciso continuar estudando, recorrer a
colegas – mais experientes, buscar apoio, dispor-se a aprender”.
Além do mais, as relações interpessoais não são complexas so-
mente no ambiente intraescolar, mas também fora dele, na relação com
as famílias, por exemplo. Esse desafio aparece, preponderantemente,
entre os professores da educação infantil, os quais sinalizam apresentar
dificuldade no acompanhamento com a família, em estabelecer essa re-
lação. Para eles, esse é um desafio importante, tendo em vista a neces-
sidade da presença familiar nessa faixa etária da vida estudantil.
[...] a existência de forte cobrança da gestão e das famílias
nesse processo, para que priorizasse a alfabetização das cri-
anças. Considera o seu vínculo empregatício temporário
como uma desvantagem, pois a deixa insegura, dificultando
o seu enfrentamento com a gestão da escola em relação às
cobranças que recebe e às divergências de concepções so-
bre o processo de ensino e aprendizagem infantil (Profes-
sor iniciante 6, educação infantil).
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

Eu passei um ano nessa escola e eu conheci uns quatro,


cinco pais. Eu não conhecia o restante de jeito nenhum,
porque assim, eram crianças de 5 anos, era uma série muito
seriada, e eram crianças de 3, 4 e 5 anos. Então, as crianças
vinham no ônibus ‘sozinhas’, entre aspas porque vinha uma
monitora, então os pais não acompanhavam de jeito ne-
nhum e também tinha aquela questão de ir trabalhar, cui-
dando da casa, também na agricultura, então eu conhecia
de maneira alguma e era muito, se tornou muito desafiador
(Professor iniciante 4, educação infantil).
O distanciamento da família é outro desafio que os professores
iniciantes enfrentam e que dificulta o seu trabalho. Ter uma relação
tranquila e constante com o núcleo familiar é fundamental para garantir
o bom desenvolvimento do trabalho docente e, consequentemente, o
processo de ensino e aprendizagem. A escola e a família, juntamente
com os seus atores, precisam, necessariamente, andar lado a lado, pois
“[...] o caminhar junto dessas duas instâncias – família e escola – é im-
portante, pois são estes, em geral, os principais responsáveis pelo de-
senvolvimento de uma pessoa, e as duas assumem um caráter de soma,
complementação, em seus distintos papéis” (Cavalcante, 2018, p. 100).
Diante do exposto, cabe ponderar a importância das relações
interpessoais no contexto escolar para que os professores, sobre-
tudo os que estão ingressando na carreira, sintam-se acolhidos, se-
guros e apoiados. Portanto, entendemos que esse é um cenário que
ainda precisa mudar nas escolas, assim como as condições de traba-
lho docente, um assunto que é discutido no próximo tópico.

Sobre as condições de trabalho, as narrativas indicam que os


docentes sentem dificuldades tanto no que abrange aspectos inter-
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

nos como externos da escola. Os achados informam que há insufi-


ciência de materiais para trabalhar e dificuldades estruturais, assim
como um excessivo quantitativo de aluno por turmas, o que seria
um fator consideravelmente desafiador para os participantes. Com
relação ao número de alunos, os professores informam:
São muitos desafios, mas a questão da sala numerosa, eu
passei um ano sem ter dia de estudo, a situação da creche
ser bem precária. Mulher, foram tantas coisas, mas assim, o
que mais mexeu comigo foi a situação da creche em si, por-
que assim, sempre a creche muito [pausa], assim, acabada
mesmo. Então assim, a sala numerosa e quando chovia, ti-
nha que colocar, tirar todos os alunos, colocar em outra
parte da sala que simplesmente era o lugar que não ia molhar
as crianças (Professor iniciante 7, educação infantil).
[...] a gente fala muito da postura, da dignidade na infância, a
gente fala muito dos cuidados com a infância, mas a gente não
tá atentando para as nossas realidades, de fato, porque não é
possível que a gente tenha realidades em que turmas têm ex-
cessivos números de alunos e a gente não garanta a eles um
mínimo de dignidade (Professor iniciante 8, educação infantil).
A gente tem aquele conceito de que a escola pública é ruim,
então eu tinha muito medo quando eu vi aquela turma nume-
rosa, aí eu pensava: ‘Meu Deus, como eu vou é, conquistar essa
turma? Como eu vou conseguir que esses alunos aprendam?’
(Professor iniciante 12, anos iniciais do ensino fundamental).
O quantitativo de alunos por turma é um desafio, pois os pro-
fessores precisam acompanhar aluno a aluno no seu desenvolvi-
mento e, na realidade concreta de trabalho, na maioria das vezes,
os alunos apresentam diferenças quanto ao seu nível de desenvol-
vimento, na forma de aprendizagem e afins. Somos todos diferentes,
em todos os sentidos, e o processo de ensino e aprendizagem é
único e particular a cada sujeito. Evidentemente que segue-se um
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

planejamento em sala de aula, mas que este precisa ser revisto e ade-
quado a depender das necessidades de cada aluno. Assim, quanto
mais numerosa for a sala de aula, mais difícil será para manter uma
rotina, atender de modo individualizado cada aluno, promover a
aprendizagem considerando as diferentes formas de aprender, con-
seguir avaliar os alunos de modo processual. Além disso, não se
pode esquecer que nas salas regulares ainda há os alunos com defi-
ciências, os quais precisam de um olhar particular. Realizar tais ati-
vidades sem condições adequadas certamente é um desafio, princi-
palmente, para quem ainda está iniciando na profissão.
Não se pode perder de vista que para o exercício de um traba-
lho com qualidade é necessário oferecer suporte. Assim, “[...] de face
com dificuldades dessa natureza – salas superlotadas, ter que ‘impro-
visar’ denota a desvalorização para com a profissão, além de repre-
sentar algo a mais para o docente preocupar-se” (Cavalcante, 2018,
p. 71). Ainda sobre as condições de trabalho, os professores também
destacaram a falta de materiais, sendo um aspecto em comum entre
todos os níveis de atuação na educação básica, apresentando como
solução a compra por conta própria.

Tudo era a gente que comprava, brinquedo, eu lembro que


eu saía de uma sala para ir pra outra, eu levava todos os meus
brinquedos. Então, era um negócio que era do professor, que
não era pra ser do professor, era pra ser da escola, então esse
tipo de material não tinha. E já na creche que eu estou agora,
em relação a isso, tá um pouco melhor, agora a infraestrutura
em relação ao ambiente macro, foi que mudou um pouco
(Professor iniciante 1, educação infantil).
[...] comprei material com meu dinheiro porque eu sabia que a
escola não ia me dar condições, e quando eu comprei os pri-
meiros materiais, eu comprei cinco bambolês, e eu disse assim
‘- No próximo mês, eu compro mais tal coisa, no outro mês,
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

eu compro mais tal coisa!’ Então eu fui pensando a longo


prazo, não me vinha mais na mente de dizer assim ‘- Não, vou
desistir!’ Sempre quando eu ia comprar algum material, eu dizia
que próximo mês é tal coisa (Professor iniciante 21, ensino
fundamental e ensino médio).
Infelizmente, a forma que os professores iniciantes têm encon-
trado para sanar o desafio da falta de materiais desvaloriza ainda
mais a profissão, assim como indica uma visão equivocada sob a
responsabilidade do docente frente à sua função. Mas “[...] criou-se
uma imagem do professor como o responsável pelo funcionamento
da instituição, insucesso escolar, alguém que pode, caso se empenhe,
transformar o atual quadro da Educação, independente de apoio,
condições sociais e materiais de trabalho” (Cavalcante, 2018, p. 72).
Certamente, ao assumir a responsabilidade de comprar os pró-
prios materiais de trabalho, mesmo atuando num serviço público,
os professores o fazem por não terem outra alternativa e, em meio
a tanto abandono e solidão, essa pode ser a maneira mais rápida e
simples de solucionar essa situação. Mas não se pode esquecer do
papel do Estado, das instituições que devem obrigatoriamente ga-
rantir condições para que o trabalho se efetive. Como pontua Jesus
(2004, p. 8), “[...] para além da formação dos professores é também
necessáriodar-lhes condições de trabalho que possam permitir con-
cretizar a sua motivação ecompetência profissional e realizar um tra-
balho de qualidade”. Sobre o assunto, os professores iniciantes in-
formam como se caracteriza a sua realidade quanto à infraestrutura:
[...] na escola da zona rural, onde eu trabalho, lá não tem sim-
plesmente nenhum espaço para eu ministrar a aula. Existem
algumas árvores fora da escola, e o calçamento de zona rural
mesmo, é algumas pedras levantadas, outra parte é o barro
batido. [...] a maioria das escolas do município, elas não têm
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

quadra ou qualquer outro espaço para realizar as aulas, diga-


mos, práticas da Educação Física, que a gente denomina ‘prá-
tica’. Existe uma quadra universal, uma quadra única e que
cada escola tem um dia para ir para essa quadra para ter as
aulas de Educação Física, e aí fica mais complicado quando
é para as escolas da zona rural! Essa quadra se encontra na
cidade, no meio urbano e fica muito complicado de você
pensar na possibilidade de levar esses alunos do sítio para a
zona urbana porque também não tem ônibus (Professor ini-
ciante 21, ensino fundamental e ensino médio).
[...] grande quantidade de crianças por turma, o exercício da
docência sem o apoio de uma assistente, a existência de ba-
nheiros não apropriados e a falta de parque e de infraestru-
tura adequada dos espaços para as crianças (Professor ini-
ciante 8, educação infantil).
[...] quando chovia as salas inundavam, então a gente, as
professoras, principalmente as efetivas, faziam fotos e ví-
deos e mandava para os jornais. E saía nos jornais, porque
as nossas turmas ficavam inundadas, aí não podia ter aula,
então basicamente, eu penso que isso assim, em uma visão
mais macro, de infraestrutura a esse ponto de chover e
inundar (Professor iniciante 2, educação infantil).
Com relação à infraestrutura, percebemos o quanto ela é pre-
judicial ao desenvolvimento do trabalho docente e, na maioria
das vezes, a solução simplesmente não passa por pelos professo-
res, mas atinge diretamente o desenvolvimento do seu trabalho e
a aprendizagem dos alunos. As constatações evidenciadas situam
as condições de trabalho como um desafio permanente no coti-
diano da vida e do trabalho do professor iniciante.
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

Nesta produção apresentamos os principais desafios dos pro-


fessores iniciantes cearenses participantes de um estudo interinsti-
tucional, do tipo pesquisa-formação. Em geral, os desafios foram
com relação à prática profissional, às relações interpessoais e às con-
dições de trabalho.
Os achados da pesquisa, por meio das narrativas dos professo-
res iniciantes, apresentam o quanto tais profissionais vivem sozi-
nhos essa trajetória de suas vidas na docência. É preocupante iden-
tificar o descaso e a falta de atenção com esse público. Este estudo
nos provoca a pensar a formação, a atuação e a atenção que é dada
a essa fase da carreira professoral, um período tão particular e deci-
sivo daqueles que estão iniciando como professores.

ALVES, R. R. Professores iniciantes egressos do Pibid em ação: aproxi-


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GARCIA, M. O professor iniciante, a prática pedagógica e o
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JESUS, S. N. Desmotivação e crise de identidade na profissão docente.
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ROMANOWSKI, J. P.; MARTINS, P. L. O. M. Formação conti-
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fessores. Rev. Diálogo Educ., Curitiba, v. 10, n. 30, p. 285-300,
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EENMAN, S. Perceived Problems of Beginning Teachers. Review
of EducationalResearch, 1984.
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

Alba Regina Battisti de Souza


Lourival José Martins Filho
Mônica Teresinha Marçal
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas
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este texto nos propomos a discutir os resultados de um estudo


sobre o estágio curricular em docência, desenvolvido pelo
Grupo de Pesquisa Didática e Formação Docente (NAPE), vincu-
lado ao Departamento de Pedagogia e ao Programa de Pós-Gradu-
ação em Educação (PPGE) do Centro de Ciências Humanas e da
Educação (FAED) da Universidade do Estado de Santa Catarina
(UDESC). Por meio de uma abordagem qualitativa, reúne dados de
estudos bibliográficos, materiais documentais e depoimentos oriun-
dos de profissionais que atuam na educação básica.
Inicialmente, retomamos alguns estudos sobre o estágio, em
especial a partir da reconfiguração do campo da Didática e da Prática
de Ensino no Brasil. Na sequência, apresentamos aspectos teóricos
e metodológicos da proposta de estágio em docência do curso de
Pedagogia em análise, finalizando com um diálogo com as contri-
buições de gestores e profissionais da equipe pedagógica da rede
municipal de ensino de Florianópolis/SC.

Desde o final da década de 1970 e adentrando nos anos 1980,


são reconhecidas as contribuições dos estudos críticos da área da
Educação no Brasil, dentre eles, no campo da docência. Importante
a menção de Pimenta (1996), ao rememorar que os cursos de pós-
graduação nos anos 1970 impulsionaram as pesquisas em Educação,
em conjunto com a criação de associações e outras entidades, bem
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

como a disposição de algumas editoras na publicação dos trabalhos,


mesmo ainda sob os auspícios do regime autoritário. E, como um
dos feitos desse movimento intelectual crítico, com base no materi-
alismo dialético, na busca de romper com a concepção da racionali-
dade técnica da didática, foi criado o Encontro Nacional de Didática
e Práticas de Ensino (Endipe)14 (Pimenta, 2022).
Dentre esses movimentos intelectuais, a reconfiguração da Di-
dática – de uma perspectiva instrumental para uma compreensão com
base nas multidimensões humana, técnica e política – constituiu-se
em uma referência para a formação docente (Candau, 2000). Segundo
a autora, tais dimensões deveriam ser compreendidas, não de forma
justaposta, mas sim de maneira dinâmica e articulada. Assim,
Contexto e processo são vistos em articulação onde a prática
educativa quotidiana, traduzida em comportamentos e atitu-
des concretos relativos aos objetivos propostos, disciplina,
avaliação, relação professor-aluno, etc., assume uma perspec-
tiva político-social [...] trabalhar nesta perspectiva e traduzi-
la em termos de currículos e dinâmica de formação eis, para
nós, o grande desafio do momento (Candau, 2000, p. 55).
Tal desafio, lançado por Candau, implicou em novas perspec-
tivas para a organização do trabalho docente, do processo de en-
sino-aprendizagem e de seus componentes, como planejamento,
conteúdos, metodologias e avaliação. Tal ressignificação, num viés
crítico, histórico e social, também denotou no desenvolvimento de
estudos e propostas para os estágios curriculares.
_______________
14O Endipe foi criado a partir da fusão (1985) do Encontro Nacional de Prática
de Ensino, iniciado em 1979 na Universidade Federal de Santa Maria, com o
Seminário Nacional Didática em Questão, iniciado em 1982 na Pontifícia
Universidade Católica do Rio de Janeiro. O primeiro encontro unificado foi
denominado “IV Encontro de Didática e Prática de Ensino” (1987).
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

O estudo de Pimenta (1995) retrata muito bem o esforço


em delinear o estágio como práxis e sua relação com a didática:
A didática não se reduz, no entanto, à atividade de
estágio, nem reduz este a ela. Da mesma forma, o es-
tágio pode servir à demais disciplinas, e, nesse sen-
tido, ser uma atividade articuladora do curso. [...] Uma
atividade instrumentalizadora da práxis (atividade teó-
rica e prática) educacional, da transformação da reali-
dade existente (Pimenta, 1995, p. 63).
Pimenta e Lima (2005/2006, p. 14) continuam a discussão
e reiteram o estágio como uma apropriação crítica da realidade:
Nesse sentido, o estágio atividade curricular é ativi-
dade teórica de conhecimento, fundamentação, diá-
logo e intervenção na realidade, este sim objeto da
práxis. Ou seja, é no trabalho docente do contexto da
sala de aula, da escola, do sistema de ensino e da so-
ciedade que a práxis se dá.
Autores como Candau, Cunha, Freire, Pimenta, Oliveira,
Gatti, André, Lüdke, Passos e Veiga, Saviani, Libâneo 15, dentre
tantos outros, impulsionaram novas perspectivas para uma for-
mação docente de qualidade, séria e comprometida com os desa-
fios da educação básica e da valorização da profissão no país. Suas
contribuições, de alguma forma, incidiram na reconfiguração dos
estudos e propostas dos estágios curriculares em docência.

_______________
15Esses autores possuem vasta produção científica e, dada a notoriedade no
âmbito acadêmico, não vamos aqui citar as datas das tantas obras publicadas.
Algumas compõem a fundamentação teórica do presente texto.
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

Tomamos aqui as experiências das autoras e do autor deste ca-


pítulo e os materiais disponíveis sobre o estágio curricular em do-
cência nos anos iniciais do ensino fundamental no curso de Pedago-
gia da FAED/UDESC, como fonte para a discussão. Tal estágio em
docência, como uma atividade vinculada ao ensino, tem-se configu-
rado numa perspectiva articuladora com a educação básica por meio
da pesquisa e da extensão. Com base nos princípios da pesquisa-
ação crítica e colaborativa, são construídas parcerias com as institui-
ções escolares, um “[...] mergulho na práxis do grupo social em es-
tudo” (Franco, 2005, p.486).
Para tanto, definimos algumas etapas articuladas: da observação
participante ao processo de organização, a realização da docência e os
processos de registro e avaliação. O período de observação participante
– referência para os projetos de docência e ações docentes – é iniciado
por uma leitura crítica de contexto que consiste na compreensão da
escola dentro de um bairro, de uma comunidade, e no que isso implica
em termos de caracterização e relações construídas, histórica e social-
mente. Essa leitura se expande para o espaço escolar, desde o estudo
do Projeto Político-Pedagógico ao âmbito da sala de aula, a fim de co-
nhecer as crianças e a professora, criar vínculos e compreender os mo-
vimentos de aprendizagem e de interação.
Nesse período ocorre: a) a integração institucional, a inserção
e a ambientação do estagiário no ambiente escolar, bem como o
acesso aos documentos orientadores; b) a participação e o acompa-
nhamento de atividades e reuniões de conselhos, planejamentos co-
letivos e formações; c) a inclusão dos estagiários na rotina docente:
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

momentos de planejamento, de contato com as famílias, no trânsito


pelos diversos espaços da escola, ou seja, desde as ações mais elabo-
radas e complexas até as mais corriqueiras, como orientar a reservar
algum material didático ou espaço, como laboratórios, salas especí-
ficas, brinquedoteca e outros.
Afunilando esse processo, ocorre a integração dos estagiários
nas rotinas diárias que envolvem o trabalho docente como, por
exemplo, a condução e a organização das aulas, orientação quantos
às atividades dos estudantes, formas de abordar e retomar os temas
estudados, de apresentar, ilustrar conceitos, maneiras de ensinar,
mediar e lidar com conflitos e situações inesperadas. Enfim, uma
gama de minuciosas ações que compõem a prática e exigem tomadas
de decisões e encaminhamentos contínuos.
Tais dimensões – observação-participante, elaboração dos pro-
jetos e planos de aula, registros – são movimentadas com base na
interlocução contínua entre escola e universidade, nas relações cons-
truídas entre professoras orientadoras, professoras supervisoras e
estagiários. Importante mencionar que os constructos teóricos e me-
todológicos desenvolvidos junto às áreas e respectivas disciplinas no
curso de licenciatura são fundamentais e insubstituíveis. Quando de-
fendemos a articulação contínua com o cotidiano escolar, o fortale-
cimento de parcerias e a valorização dos conhecimentos advindos
desse contexto, não nos aliamos a alguns discursos que defendem o
“enxugamento” curricular dos cursos de graduação, em especial de
áreas dos fundamentos da Educação, nem reforçamos as ideias
“praticistas” advindas das perspectivas neoliberais.
Nesse sentido, entendemos que a inserção do licenciando já nas
primeiras fases do curso, de forma contínua no ambiente educacio-
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

nal, tendo o professor experiente como um coformador, pode con-


tribuir para dinamizar a articulação entre teoria e prática, promover
um processo de paulatina inserção profissional e a compreensão do
trabalho docente de forma mais abrangente e contextual. Segundo
Bazzo, Souto-Maior e Souza (2020, p. 584):
[...] o papel do co-formador como uma referência profissi-
onal, um mediador dos conhecimentos da prática, de suma
importância para o processo de transição da condição de
estudantes para professores/as, pois a guisa de exemplo, a
relação entre as estagiárias no momento de assumirem uma
turma, planejarem as aulas, ou seja, definirem os conteúdos,
os objetivos, as estratégias de ensino e aprendizagem, os
critérios e os instrumentos de avaliação etc., e a professora
experiente proporciona de forma inigualável o desenvolvi-
mento de capacidades cognitivas, afetivas e modos de lidar
únicos no contexto da docência.
Vale a menção de Carminati, Demaria e Pazin (2020, p. 62):
[...] se a universidade estabelece uma relação de respeito e
alteridade com a escola, entendendo as dificuldades e os
problemas que certamente surgirão no dia a dia como uma
responsabilidade coletiva e mais uma oportunidade de
aprendizagem para todos, as possibilidades de a escola pú-
blica se constituir em um espaço de coformação docente
com certeza serão muito melhores.
Dessa forma, no período de observação-participante, os esta-
giários são orientados a estabelecer um vínculo com o docente e, de
forma dialogada, acessar seu planejamento, perguntar sobre os en-
caminhamentos em sala de aula e definir o tema do projeto de do-
cência que é produzido sob orientação do professor universitário,
mas com uma significativa colaboração do professor supervisor.
Conforme Socorro (2008, p. 203): “Formadores e formandos aten-
tos aos nexos e relações que se estabelecem entre a universidade e a
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

escola, e destas com a profissão magistério e seus profissionais, terão


a oportunidade de descobrir formas de se reconhecerem como es-
tagiários da vida e aprendizes da prática docente”.
É nesse ponto de fusão que o estagiário e o professor da escola,
e incluímos o professor orientador, integram-se e interagem na dis-
cussão do projeto de docência e dos planos de aula; e, na sequência,
é na realização, no acompanhamento e na avaliação da prática do-
cente que a formação colaborativa se efetiva. Além disso, o estágio
representa, segundo Carminati, Demaria e Pazin (2020, p. 44):
A capacidade da escola de criar uma cultura de colaboração
que permita aos profissionais e, mais especialmente, aos
professores, saírem desta situação de isolamento e vivenciar
momentos de troca e aprendizagem coletiva é vital para o
desenvolvimento de processos de formação e mudança.
As autoras salientam ainda que há a necessidade de se criar en-
tre os professores uma cultura de formação permanente, “[...] trans-
formando os espaços coletivos de trabalho, cada vez mais raros, em
instrumentos de formação [...]”, afinal o que está em jogo “[...] não
é apenas a qualificação ou a progressão na carreira docente”[...], mas
a “possibilidade de uma mudança coerente e inovadora de escola”
(Carminati, Demaria; Pazin, 2020, p. 61).
O estágio como um elo, com base colaborativa, provoca e pro-
move uma articulação entre teoria e prática, considerando as dimen-
sões que essa relação contém, desde suas contradições e conflitos
até os desafios e as conquistas. Assim, corroboramos com Pimenta
e Lima (2004, p. 61):
Acreditamos no Estágio como lócus de formação do pro-
fessor reflexivo pesquisador, de aprendizagens significati-
vas da profissão, de cultura do magistério, de aproximação
investigativa da realidade e do seu contexto social. Reafir-
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

mamos o nosso conceito de Estágio, como campo de co-


nhecimento, que envolve estudos, análise, problematiza-
ção, reflexão e proposição de soluções sobre o ensinar e o
aprender, tendo como eixo a pesquisa sobre as ações peda-
gógicas, o trabalho docente e as práticas institucionais, situ-
adas em contextos sociais, históricos e culturais.
Como uma segunda etapa, mas iniciada no decorrer da obser-
vação participante, os estagiários elaboram os “projetos de docên-
cia” e os “planos de aula”. A partir de temas oriundos do contexto
da escola e da sala de aula, definem questões orientadoras, referência
para os processos e as atividades propostas. Essas questões repre-
sentam indagações mobilizadoras, de caráter crítico, reflexivo e so-
cial, extrapolando, assim, a perspectiva transmissiva e fragmentada
dos conteúdos, denominadas no projeto de “problematizações”. A
esse respeito, tomamos como referência Gasparin (2002, p. 37):
A problematização tem como finalidade selecionar as prin-
cipais interrogações levantadas na prática social a respeito
de determinado conteúdo. [...] questionamento do conte-
údo escolar confrontado com a prática social, em função de
problemas que precisam ser resolvidos no cotidiano das
pessoas ou da sociedade.
As problematizações permeiam os objetivos e os conteúdos de
aprendizagem e, por sua vez, as atividades a serem desenvolvidas com
os estudantes. O planejamento é compreendido como um processo de
sistematização e organização das ações do professor, tal como afirma
Libâneo (1991), um instrumento da racionalização do trabalho peda-
gógico que articula a atividade escolar com os conteúdos do contexto
social. Na elaboração do planejamento há uma especial atenção quanto
as possíveis integrações entre as componentes curriculares como forma
de articular, ampliar e contextualizar os conhecimentos.
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

Outra dimensão organizativa do estágio diz respeito aos regis-


tros em “diários de campo” utilizados pelos(as) estagiários(as) como
instrumentos para o registro e a análise de situações vivenciadas nas
observações participantes e práticas docentes. Um dos intuitos é que
os tomem como objetos de reflexão, tal como preconiza Zabalza
(2004), constituindo, assim, em documentos de memória, com rela-
tos, descrições - neles estão inscritos, muitas vezes de forma subje-
tiva, percepções, conceitos e compreensões que podem e devem ser
alvos de reflexão, análise e, por conseguinte, aprendizagem, pois
como nos ensina Freire (1996, p. 43-44):
É pensando criticamente a prática de hoje ou de ontem que
se pode melhorar a próxima prática. O próprio discurso
teórico, necessário à reflexão crítica, tem de ser tal modo
concreto que quase se confunda com a prática. O seu ‘dis-
tanciamento’ epistemológico da prática enquanto objeto de
sua análise, deve dela ‘aproximá-lo’ ao máximo.
Dessa forma, entre diálogos, vivências e orientações, os regis-
tros em diários instigam a problematização e a reflexão como refe-
rência para dinamizar a relação entre teoria e prática no processo
formativo dos futuros docentes. Nesse aspecto, os momentos de
orientação e de partilha coletiva são fundamentais, pois trazem à
tona as vivências, os aprendizados, os conflitos e as contradições.
Um momento especial do estágio diz respeito à socialização fi-
nal das atividades realizadas, que é organizada em forma de seminá-
rio aberto para a comunidade acadêmica e a escola e representa a
síntese de uma caminhada construída com muitos desafios e apren-
dizados. No nosso entendimento, o processo de organização da sín-
tese de apresentação, com base em todas as etapas, antes descritas,
também representa um exercício reflexivo sobre as ações previstas
e realizadas (ou não), as interações e as perspectivas futuras.
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

Integrando a proposta de estágio, entendemos que a extensão uni-


versitária, vinculada aos cursos de licenciatura, pode ser pensada com
vistas às parcerias com as escolas campo, por meio de formações, se-
minários e mostras, além de outras possibilidades. Um exemplo mais
recente de uma proposta de extensão colaborativa, intitulada “Forma-
ção docente e práticas pedagógicas: diálogos e registros”, ocorreu entre
abril de 2022 e março de 2023, por meio de encontros dialogados sobre
as práticas realizadas nas escolas parceiras (em propostas de estágio,
pesquisa e extensão). Tais práticas foram, paulatinamente, sendo objeto
de problematizações, registros e culminaram na escrita e publicação de
uma coletânea em forma de livro.
Temos percebido que ações dessa natureza podem contribuir
para o processo formativo continuado, fortalecer a coletividade e a
parceria docente, e reconhecer a escola como lugar de elaboração de
conhecimento e de formação, ou seja, “[...] não somente um lugar
de aplicação de saberes produzidos por outros, mas também um es-
paço de produção, de transformação e de mobilização de saberes
que lhe são próprios” (Tardif, 2002, p. 237).
Ainda em relação aos trabalhos de extensão, mas também de
pesquisa e, em especial, aos estágios e parcerias com as escolas
campo, foram publicadas as obras bibliográficas: Formação docente e
práticas pedagógicas: cenários e trajetórias (2010); De mãos dadas: discussões e
vivências sobre a relação escola e universidade (2012); e, em 2020, o livro
Anos iniciais do ensino fundamental: estágio curricular supervisionado e forma-
ção docente. Todos os textos discorrem sobre os estágios em docência
sob a ótica de especialistas em Educação, professores da educação
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

básica, professores universitários e contam com a participação de


estudantes de graduação e pós-graduação.
Nesse sentido, temos aprendido que as escolas se constituem,
para além de um espaço ou de um campo de exercício da docência,
como um complexo lócus de inserção e formação profissional. Tar-
dif (2002, p. 286), ao explicitar uma concepção de formação profis-
sional de professores voltada para a escola enquanto lugar de traba-
lho, afirma que os conhecimentos oriundos das instituições de for-
mação devem ter “[...] estreita relação com a prática profissional dos
professores nas escolas”, e:
Concretamente, esse modelo comporta a implantação de no-
vos dispositivos de formação profissional que proporcionam
um vaivém constante entre a prática profissional e a formação
teórica, entre a experiência concreta nas salas de aula e a pes-
quisa, entre os professores e os formadores universitários.
Entendemos que as escolas têm muito a nos dizer sobre a for-
mação inicial. São elas que recebem os estágios, admitem em seus
quadros os professores iniciantes, enfim, podem ser grandes cola-
boradoras no repensar de nossas propostas. Ao realizarmos a pes-
quisa (Souza; Martins Filho, 2018), buscamos compreender como
as escolas, por meio dos gestores e integrantes da equipe pedagógica,
lidam com várias questões, dentre elas os estágios.
Os participantes do estudo, quando indagados sobre o papel
do estágio, destacaram a relação com o contexto de futura atuação
dos licenciandos. Apresentamos alguns excertos dos depoimentos:
“Uma imersão na prática, na forma como ela se apresenta, lhe dando uma base
muito concreta da atividade que posteriormente será por eles desenvolvida”; “Co-
nhecer e compreender melhor o contexto atual da educação brasileira e os desafios
a serem enfrentados na prática docente”.
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

As menções “imersão”, “desafios”, “prática” e “contexto”, de-


monstram, dentro das expressões analisadas, uma compreensão mais
abrangente sobre os estágios em docência. Não identificamos nessas
e em outras manifestações indícios de uma perspectiva aplicacionista
ou praticista de formação, ou seja, de que o estágio seria um espaço
apenas para “aplicar a teoria” ou “aprender a prática”, propiciando
assim, o desenvolvimento de propostas mais articuladas com a edu-
cação básica, num viés participativo e colaborativo. Porém, para via-
bilizar tal caminho, é necessário pensar nas condições necessárias, o
que envolveria um conjunto de ações coordenadas por políticas edu-
cacionais com base em premissas discutidas coletivamente.
Sobre os possíveis aprimoramentos dos estágios em docência,
os participantes pontuaram: “Possibilitam contato com a realidade
escolar, porém a curto prazo, não possibilitando a prática do exer-
cício da função”; “O tempo é insuficiente para conhecer a realidade
escolar”; “Ainda há pouco conhecimento e espaço/tempo para os
estagiários conhecerem melhor todas as instâncias escolares. Ainda
se limita muito na atuação em sala de aula propriamente dito”; “Pro-
piciam apenas um recorte da rotina da escola, alguns se limitam a
apenas em poucas horas de observação e regência”.
Tais colocações acompanham várias análises que temos reali-
zado ao longo dos estágios, frente às exigências postas para os licen-
ciados em Pedagogia na atualidade. Tratando-se dos anos iniciais,
observamos que o tempo disponível para o estágio curricular repre-
senta um recorte muito ínfimo em relação ao que terão como res-
ponsabilidade quando docentes formados. Reiteramos que nossa
observação se alinha ao compromisso sócio-histórico das institui-
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

ções educacionais frente ao direito das crianças ao acesso ao conhe-


cimento sistematizado e ao direito de os jovens professores terem
uma formação com uma sólida base teórica e prática.
E, sobre alguns possíveis caminhos para ações mais integradas
entre universidades e escolas, os participantes da pesquisa mencio-
naram: “Estabelecer parcerias; compartilhar experiências”; “Parceria univer-
sidade-escola”; “Diálogo e aprendizagem mútua”; “Diálogo para que, em con-
junto, sejam identificados possíveis campos de atuação, parcerias e trocas”.
Freire (2016) alerta que a educação é um ato de fazer junto.
Nesse sentido, os depoimentos revelam a necessidade de integração
permanente entre universidade e escola. Estamos numa era com-
plexa histórica e politicamente falando, e a educação do país não
foge a essa situação. Além disso, mais que ouvir os professores, a
universidade pode fazer coro com as escolas, pois quando esta se
coloca na situação de “ouvinte”, dá a impressão de que ela tem, em
suas mãos, as decisões e os rumos das políticas que resolverão as
mazelas da educação.
Os depoimentos obtidos na pesquisa revelaram a necessidade
de a universidade criar outras formas de relação com as escolas, para
além da ideia de um local para apenas receber os estagiários, ampliar
a participação da educação básica em estudos e pesquisas, incluindo,
no nosso entendimento, discussões sobre reformulações curricula-
res dos cursos de licenciatura, elaborando alternativas para a inser-
ção mais precoce e contínua dos licenciandos nas instituições, mas
sem diminuir os estudos teóricos.
O estudo nos demonstrou, tal como preconiza Freire (2012),
que o diálogo é fundamental quando se pensa uma formação do-
cente que reconhece as pessoas envolvidas como seres da aprendi-
zagem e da mudança e: “[...] não é falando aos outros, de cima para
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

baixo, sobretudo, como se fôssemos os portadores da verdade a ser


transmitida aos demais, que aprendemos a escutar, mas é escutando que
aprendemos a falar com eles” (Freire, 1996, p. 127).
Pimenta (2019, p. 37) contribui com nossas reflexões proble-
matizando: “E por que valorizamos essa concepção do professor
como um profissional intelectual crítico-reflexivo e pesquisador de
sua práxis e da práxis educativa que se realiza na escola e demais
contextos nos quais se insere profissionalmente?”. Voltando-se a
essa questão tão pertinente e atual, a autora discorre:
Com vistas a empoderar os alunos, seus professores, suas
escolas públicas, suas famílias para defenderem e fazerem
nelas acontecer a educação pública emancipadora, partindo
da consideração das desigualdades e elevando todos os alu-
nos a uma condição de igualdade, para se manterem e atu-
arem na construção da sociedade democrática, justa, fra-
terna, superando as profundas desigualdades que o capita-
lismo constrói, determina e aprofunda desde sempre. E,
portanto, se oponha à transformação do direito à educação
em mercadoria, em bem individual de consumo, pratica da
com agressividade, cada mais voraz e mais refinada em seus
métodos pelas corporações financistas que cada vez mais
estão se enraizando no estado brasileiro, em todos os níveis
(Pimenta, 2019, p. 37-38).
Assim, entendemos ser necessário que as políticas públicas se
voltem com mais vigor para a valorização da carreira docente no
país e que a escola seja reconhecida como um espaço formativo.
Para isso, é preciso que os professores tenham condições concretas
para refletir criticamente, problematizar, registrar e compartilhar co-
nhecimentos produzidos no âmbito do seu trabalho.
Também é preciso criar estratégias para elevar o acesso, a per-
manência dos futuros docentes por meio de ações e programas mais
atrativos e fomentar as relações entre as agências formadoras e os
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

sistemas de ensino, tal como afirma Nóvoa (2017, p. 18): “O espaço


universitário é decisivo e insubstituível, mas tem de se completar
com o trabalho no seio de comunidades profissionais docentes”.
Saviani (2009), discorrendo sobre a formação docente no Bra-
sil, já mencionava que se a docência fosse transformada numa pro-
fissão atraente socialmente, por meio de melhoria salarial e das con-
dições de trabalho, muitos jovens seriam atraídos, dispostos a inves-
tir em alta qualificação e em formações mais alongadas. Isso se re-
verteria em professores qualificados e trabalhando em um único lo-
cal e, como consequência, cidadãos conscientes.
Ainda há muitas questões em aberto em nosso cenário educa-
cional quanto à formação docente e aos estágios curriculares. Com-
partilhamos algumas que nos inquietam: quem e como estão for-
mando os professores no nosso país? Quais pressupostos e meto-
dologias sustentam as propostas de estágios em docência dos cursos
de licenciatura? E como estão sendo conduzidas, acompanhadas e
avaliadas? São preocupações que deveriam constar na agenda da ges-
tão da educação e das políticas educacionais do país.

Quando Candau (1986) nos instigou a questionar sobre a pre-


tensa neutralidade pedagógica e a compreender que a docência é
multidimensional e marcada por intencionalidades pedagógicas, so-
ciais e políticas, o caminho da formação docente tomou outros ru-
mos, não sem conflitos e contradições, mas na continuidade das
produções e experiências sobre os estágios em docência é possível
identificar os avanços, bem como os necessários enfrentamentos.
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

Considerar o legado construído com resistência e muito com-


promisso torna-se uma responsabilidade coletiva atual, pois os de-
safios continuam: lutar por uma formação docente pública e gratuita
e pela construção de um projeto nacional de educação, fruto de dis-
cussões ampliadas e democráticas. Por fim, compreendemos que o
estágio em docência pode representar um importante elo articulador
teórico-prático quanto ao currículo. Mas um currículo dinâmico e
que inclua ações participativas e emancipatórias junto às instituições
da educação básica, mantendo em seu âmago a história de resistên-
cia que os tempos atuais continuam a exigir.

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FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

José Rubens Lima Jardilino


Ana Maria Mendes Sampaio
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

presente capítulo discute a formação e a prática docente em


uma perspectiva do Desenvolvimento Profissional Docente
(DPD), levando em consideração a prática profissional do(a) profes-
sor(a) como elemento formativo necessário à socialização com outras
áreas produtoras de conhecimento, com a finalidade de validar sua
produção. A aliança entre a formação e a prática docente aponta para
um antigo impasse não vencido no campo educacional, que envolve
a qualidade da formação dos professores e se apresenta como funda-
mento para a elaboração de políticas mais consistentes do DPD.
No entorno dessas questões, a intensificação do debate atual
sobre o DPD vem se construindo como forte aliada nas proposições
acerca das necessidades de transformações, tantono que se refere aos
elementos de valorização da carreira docente, que fortemente influ-
enciamno exercício pedagógico dos professores, quanto nas deman-
das formativas desses profissionais. A compreensão dessas deman-
das requer ouvir os professores sobre o seu processo formativo,
seus percalços e os esforços para que, mesmo diante dos obstáculos,
sigam aprendendo. Alémdisso, é preciso analisar o processo forma-
tivo docente, considerando a realidade vivenciada pelos professores
em suas práticas nas redes de ensino.
Assim, o conhecimento em torno do DPD requer uma reflexão
mais ampla dos professores sobre a relação entre a sua formação e
a sua prática, compreendendo que é no exercício da sua profissão
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

que desenvolvem sua profissionalidade16. Para Sacristán (1999), pro-


fissionalidade refere-se à:
[...] afirmação do que é específico na ação docente, isto é, o
conjunto de comportamentos, conhecimentos, destrezas,
atitudes e valores que constituem a especificidade de ser
professor [...] o conceito de profissionalidade docente está
em permanente reelaboração, devendo ser analisado em
função do momento histórico concreto e da realidade social
que o conhecimento escolar pretende legitimar; em suma,
tem de ser contextualizado (Sacristán, 1999, p. 65).
Considerando o excerto, tratar do DPD neste estudo envolve as
questões da profissionalidade docente na medida em que o exercício
profissional se mostra como condição primordial para a consolidação
do ser professor. Para Sampaio (2018, p. 24), isso ocorre:
Porque, no momento em que se consolida a prática, prestigia-
se os elementos alcançados nos momentos de formação, seja
inicial ou continuada. É no momento do exercício da profissão
que o docente mobiliza os conhecimentos advindos da forma-
ção, conhece melhor os problemas da esfera educativa na qual

_______________
16 Para Pimenta (2005), o termo “profissionalidade” não deve ser compreendido
isolado da relação estabelecida pela tríade profissionalização-profissionalidade-
profissionalismo. A autora considera a profissionalização como um rol de ações
historicamente situadas que definirão certos parâmetros para o exercício
profissional docente, envolvendo-se, inclusive, com o reconhecimento social da
profissão. Já o profissionalismo remete aos aspectos que são referendados ou
aderidos pelos sujeitos que exercem a profissão, vindo a definir um status social e
dando, portanto, legitimidade para a função social que exercem. Assim, a
profissionalidade revela os saberes e as competências definidos para o exercício
e, também, as formas subjetivas que os professores vão constituindo na relação
com os processos mais externos instituintes da profissionalização. Esses
processos são construídos a partir do diálogo, nem sempre consensual, com as
formas de adesão aos princípios de ação da prática profissional expressos pelo
profissionalismo.
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

ele intervém, cria estratégias que se adequem melhor à reali-


dade heterogênea que vivencia e se capacita para construir uma
gama de argumentos contundentes, no que se refere à reali-
dade do ensino, aos problemas educacionais e ao seu pleno
desenvolvimento profissional.
Assim, é na prática profissional, influenciada pelos elementos
advindos da formação, que os docentes constroem os saberes e as
experiências essenciais para se posicionarem diante das diversas situ-
ações impostas, tanto pela sociedade quanto pelo sistema educacio-
nal. Nesse contexto, a escola ganha papel fundamental por se revelar
como espaço de grandes desafios, mas também de grandes avanços,
tendo em vista que sendo o locus de atuação, o professor a vê como
um “[...] espaço autônomo, um espaço que é seu, onde ele possa
transitar com certa liberdade” (Ramalho; Nunez; Gauthier, 2003, p.
54). Dito isso, a formação docente, aqui tratada, implica diretamente
na prática desses profissionais que, por sua vez, não pode ser com-
preendida como a ação pela ação, mas integra o processo do DPD e
se encontra impregnada de valores, conhecimentos e capacidades
cognitivas, relacionais e políticas.
Compreendendo que o DPD vê na prática docente um alicerce
contínuo de formação, é preciso atentar para o que alerta Tardif
(2002) quanto à imposição do discurso acadêmico sobre os saberes
da experiência dos docentes em suas práticas cotidianas. Para o au-
tor, esse fato resulta da escassez de “[...] parceria entre professores,
corpus universitários de formadores e responsáveis pelo sistema edu-
cacional” (Tardif, 2002 p. 55). Trata-se, assim, de um quadro de des-
perdício de oportunidades de aprendizagem profissional e de con-
tato com as diversas situações de atuação (prática docente). Neces-
sário se faz destacar que a referida parceria possui um alto valor de
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

contribuição para o enriquecimento e a (re)organização dos cursos


de licenciaturas do país.
Sobre as licenciaturas, Gatti (2013) infere que a formação de
professores para a educação básica, há um século, tem resistido na
preservação de uma estrutura curricular e institucional arcaica, mos-
trando-se descontextualizada e esvaziada de sentido. Uma realidade
que ocorre frente aos movimentos socioculturais e históricos da con-
temporaneidade e evidencia uma relação anacrônica diante das de-
masiadas mudanças da sociedade contemporânea.
Com base nessas considerações, este trabalho analisou a forma-
ção e a prática docente como contributos para o DPD. Para tanto,
empenharam-se esforços analíticos a partir de relatos de professores
da educação básica da rede pública municipal de ensino de Mari-
ana/MG, participantes de algumas pesquisas. Dessa forma, este es-
crito integra o acervo de pesquisas (Jardilino; Oliveri, Sampaio, 2020)
desenvolvidas no Grupo de Pesquisa Formação e Profissão Docente
(Foprofi)17 do Programa de Pós-Graduação em Educação da Univer-

_______________
17 O Grupo de Pesquisa Formação e Profissão docente – (FOPROFI) cadastrado
no Diretório dos Grupos de Pesquisa do CNPq desde 2021 e atua em parceria com
o Grupo internacional - História de la Universidad LatinoAmericana (HISULA).
Atualmente, o Foprofi reúne diversos pesquisadores: estudantes de graduação/ini-
ciação científica e pós-graduação (mestrado e doutorado) da UFOP e de outras Ins-
tituições; profissionais da educação básica, além de parcerias com redes de pesquisa
nacional e internacional e projetos da Fundação Coordenação de Aperfeiçoamento
de Pessoal de Nível Superior (Observatório da Educação); assim com projetos par-
ceiros de outras universidades - Pensar a Educação Pensar o Brasil, da UFMG -
Universidade Federal de Minas Gerais; Rede Universidades Públicas Colombianas
(Rudecolombia). Como parceria mais recente, destaca-se a realizada com o Colégio
das Américas da Universidade Pablo de Olavide, em Sevilha/Espanha.
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

sidade Federal de Ouro Preto (UFOP), grupo consolidado e certifi-


cado no diretório de grupos do Conselho Nacional de Desenvolvi-
mento Científico e Tecnológico (CNPq). Os dados referenciados
neste escrito contaram com a participação de 27 professores das eta-
pas da educação infantil e do ensino fundamental I da referida rede
de ensino. Foram dois os critérios de escolha dos sujeitos das pesqui-
sas já desenvolvidas: a) o interesse na formação ofertada pelos cursos
de Pedagogia; b) o interesse na formação continuada que valorize a
prática dos professores como contributo para o alcance do DPD.
Para a construção desses dados, foram utilizados questionários
de caracterização, documentação de grupos focais realizados em al-
gumas pesquisas do referido grupo. Frente ao contexto e à realidade
investigada na perspectiva espaço-temporal, constituídos por diversos
sentidos e significados, articulados a partir das relações conflitivas, as-
simétricas e ambivalentes entre a formação e a prática docente no locus
da pesquisa (Região dos Inconfidentes), temos optado, na parte ana-
lítica, pelo uso da técnica de análise de conteúdo de Bardin (2011).
Assim, a discussão aqui apresentada se dá em torno da forma-
ção e da prática docente sob a perspectiva do DPD, abordagem teó-
rica atual que vem, no campo das pesquisas sobre a formação e a
prática docente, oferecendo pertinentes resultados relacionados à
carreira dos professores.

A abordagem sobre o DPD se apresenta como uma discussão


atual, tendo em vista que,segundo Nóvoa (1995), o que temos pre-
senciado, a partir dos anos de 1960, refere-se a uma ríspida (des)pro-
fissionalização docente. Para o autor:
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

Os anos 60 foram um período onde os professores foram


ignorados, parecendo não terem existência própria, enquanto
aspecto determinante da dinâmica educativa; nos anos 70, os
professores foram esmagados, sob o peso da acusação de
contribuírem para a reprodução das desigualdades sociais; já
nos anos 80 multiplicaram as instâncias de controle dos pro-
fessores, em paralelo com o desenvolvimento de práticas ins-
titucionais de avaliação (Nóvoa, 1995, p. 15).

Esse contexto hostil que cerca a profissão docente ganhou um


novo quadro apenas em meados da década de 1980, quando estudos
e pesquisas do campo educacional nacional passama dar visibilidade
às temáticas relacionadas à carreira, aos saberes docentes, à trajetória
profissional,à proletarização da carreira, bem como ao desenvolvi-
mento profissional dos professores.
O avanço dessas pesquisas tem evidenciado as dificuldades em for-
mar-se professor, já que essa carreira vem suscitando diversas exigências
ligadas a novos conhecimentos, habilidades, capacidades e avanços na
base teórica e metodológica, vistas como requisitos necessários para o
exercício da profissão. Essas exigências pautam a necessidade de uma
formação que ocorra na perspectiva do DPD e de uma transformação
da práxis, compreendida como “[...] atividade teórica e prática que trans-
forma a natureza e a sociedade; prática, na medida em que a teoria, como
guia da ação, orienta a atividade humana; teórica, na medida em que esta
ação é consciente” (Vázquez, 1968, p. 6).
Para este estudo, a práxis é o próprio trabalho docente, “[...]
pois é uma atividade humana carregada de intencionalidade e que
tem na unidade teoria e prática a sua ação, em que ambas orientam
a atividade” (Curado; Silva, 2022, p. 35). Já o DPD se instaura nesta
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

pesquisa como objeto de estudo da formação e da prática docente


que é definido por Oliveira-Formosinho (2009, p. 226) como:

[...] um processo contínuo de melhorias das práticas docen-


tes, centrado no professor, ou num grupo de professores
em interação, incluindo momentos formais e não formais,
com a preocupação de promover mudanças educativas em
benefício dos alunos, das famílias e das comunidades. Esta
definição pressupõe que a grande finalidade dos processos
de desenvolvimento profissional não é só o enriquecimento
pessoal, mas também o benefício dos alunos. Pressupõe a
procura de conhecimento prático sobre a questão central
da relação entre aprendizagem profissional do professor e
aprendizagem dos seus alunos.
Além de apontar o DPD como processo permanente da carreira
docente, que segundo a autora deve ter na valorização da prática o
seu eixo central, apresenta, ainda, uma visão ampla e democrática do
DPD, na medida em que vê o seu alcance para além do crescimento
pessoal e profissional dos professores, atingindo alunos, famílias e co-
munidades. Trata-se de uma visão que, de forma alguma, desmerece
a formação inicial e seu papel fundamental de oferecer uma sólida
base teórico-metodológica, imprescindível para que os docentes en-
frentem os desafios vivenciados nas redes de ensino do país.
Para Farias e Rocha (2016, p. 135):
Ao contrário disso, a priorização da escola como lócus for-
mativo dos docentes e da práxis como elemento formativo
de integração e troca entre os pares está diretamenteligada
às concepções e aportes formativos advindos da formação,
além de favorecer aaproximação dos professores daquelas
categorias profissionais que exercem papel fundamental no
desenvolvimento sociocultural do País. Romper também
com oisolamento público dos professores implica o seu re-
conhecimento profissional como sujeito capaz de dizer de
si e do seu trabalho.
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

Assim, a prática docente, enquanto ação transformadora e de


reconhecimento profissional, requer dos professores um pensa-
mento crítico sobre as suas requisições de ordem formativa e pro-
fissional. Ao abordarem sobre a qualidade e os percalços da sua for-
mação inicial, os professores investigados assumem certo descon-
tentamento relacionado a uma formação deficitária quanto à abor-
dagem de temas e conteúdos necessários para a atuação nas redes
de ensino, conforme revelam os professores18 P2, P25 e P12: “Eu
acho que ela foi voltada simplesmente para dar aos profissionais um diploma,
não para formar mesmo um bom profissional” (P2); “Eu acho incompleta, por-
que pelo menos quando eu estudei muitos temas não eram abordados” (P25);
“A minha formação, a minha graduação, eu acho que ela foi falha. Ela não me
atendeu no nível que eu gostaria. Hoje, o que a gente vê, é que muita coisa ficou
para trás, que ela poderia ter sido melhor” (P12).
Os excertos acima da fala dos professores na pesquisa apontam
para as mudanças educacionais, advindas no século XXI, que têm
demandado desses profissionais a aquisição de novos conhecimen-
tos, habilidades e procedimentos, ou seja, uma nova compreensão
pedagógica que requer estender e ressignificar os caminhos teóricos
e metodológicos, consolidados nos cursos de formação docente.
Percebe-se ainda que, se por um lado, houve um significativo au-
mento das exigências formativas e de atuação profissional sobre os
docentes, bem como o aumento da importância dos professores para
a melhoria da qualidade da educação do país, por outro lado, go-
verno, sociedade e mídia apontam que o problema da educação se

_______________
18Os colaboradores foram categorizados utilizando-se a letra “P” de professor e
um número correspondente sequencial (1-27), conforme se vem utilizando no
acervo de dados de pesquisas do Foprofi.
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

encontra, justamente, no déficit formativo desses profissionais. Esse


cenário indica uma realidade perversa e contraditória, marcada por
processos de responsabilização injustos e incoerentes aos docentes
que, em contrapartida, lutam, por meio de associações, sindicatos e
coletivos, para ressignificar sua formação e sua prática pedagógica
no âmbito dos direitos já conquistados.
O agravamento desse contexto ocorre na medida em que a so-
ciedade e o próprio sistemaeducacional têm apontado os professores
como profissionais malformados, despreparados e, muitas vezes,
desprovidos de compromisso para com os discentes. Por outro lado,
o que temospresenciado são condições de formação inconsistentes,
inclusive no que se refere ao enfrentamento da relação entre a teoria
e a prática e aos desafios inerentes à docência, que se envolvem com
o desenvolvimento de melhores procedimentos de ensino, frente às
atuais mudanças e demandas do cotidiano escolar. Para o enfrenta-
mento dessas questões, as políticas de formação docente precisam
reconhecer o professor como (re)construtor de conhecimentos ad-
vindos do seu percurso profissional.
Ainda sobre a conflituosa relação entre teoria e prática, os pro-
fessores inferem sobre um claro distanciamento entre o que se
aprende nas Instituições de Ensino Superior (IES) e a realidade es-
colar, que se mostra bastante heterogênea. Um contexto que vem
obrigando os cursos de licenciatura, entrada obrigatória para a pro-
fissão, a (re)pensarem sobre a sua base teórica-metodológica, ou seja,
sobre “o que ensinar” e “como ensinar” Para o professor P26:
[...] Nem se falava que todo mundo aprendia de maneira
diferente. A ideia que se passava é que você entrava na sala
de aula e ia encontrar meninos com a mesma capacidade,
cheios de vontade de aprender, que você ia planejar sua
aula, chegar lá e dá uma aula bacana. Só que, depois que você
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

chega à sala de aula, percebe ‘puxa vida, não é isso que eu


pensava’. É difícil! (P26).
O excerto aponta para uma realidade que impõe novas requisi-
ções para as políticas públicas de formação docente, sobretudo no
que se refere à capacidade para lidar com um cenário social contem-
porâneo plural, conflituoso, com agravantes disparidades econômi-
cas e culturais, e em constantes mudanças.
O ideário relacionado às classes homogêneas e com alunos
“cheios de vontade para aprender” (P26) indica equívocos, de ordem peda-
gógica e comunitária, na compreensão sobre o contexto escolar. Es-
ses equívocos surpreendem os professores e se interligam às suas
“passagens” pelas escolas, realizadas em períodos de estágio e, em al-
guns casos, por meio de programas de formação (Lima-Jardilino,
2014)19, a exemplo do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação
à Docência (Pibid), do Programa de Consolidação das Licenciaturas
(Prodocência) e, atualmente, do Residência Pedagógica (RP). Apesar
_______________
19 Cf. o autor os aspectos das misturas inadequadas e indevidas que se têm feito
entre Estágio Curricular Supervisionado e os programas de formação inicial
(como o Pibid e o RP), o campo tem exercido certa vigilância porque ambos têm
abrangências e papéis diferentes na formação inicial de professores.
5 O que vem ocorrendo é que programas como o Pibid e o RP têm ofuscado, em

muitas licenciaturas e instituições, o Estágio Curricular Supervisionado. Essa


discussão foi amplamente debatida em um dossiê da Revista Brasileira de Pesquisa sobre
Formação de Professores (v. 14, n. 30, 2022), sobre o tema “Estágio Supervisionado e
Políticas Públicas de Formação Prática: implicações e repercussões para a formação
de professores”, coordenado pelos colegas do GT 8/ANPED: professora doutora
Andréia Nunes Militão (Universidade Federal da Grande Dourados/Universidade
Estadual de Mato Grosso do Sul) e professor doutor Samuel de Souza Neto
(Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”). Dossiê composto por
12 artigos que teve como intuito provocar grande debate sobre um componente
curricular muito importante para a formação. Disponível em: https://revformaca-
odocente.com.br/index.php/rbpfp/issue/view/3
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

da importância desses momentos de contato direto com a realidade


escolar, é imperioso que os cursos de licenciaturas fortaleçam maior
debate e contextualização da realidade escolar, no intuito de melhor
preparar os quadros docentes que atuarão nas redes de ensino do país.
O exposto acima também indica a importância dos estágios do-
centes, tratado na Estratégia 15.8 do Plano Nacional de Educação
(PNE), Lei nº 13.005, de 25 de junho de 2014. Para o PNE (2024),
esses estágios deverão ocorrer dentro de uma perspectiva do DPD
que valorize as práticas de ensino e retrate uma visão sistemática do
trabalho do professor: articulada entre a formação acadêmica, a prá-
tica conduzida em sala de aula e as demandas da educação básica.
Trata-se de uma perspectiva audaciosa por requerer uma parceria
estratégica de propostas e acordos entre os professores, as Secreta-
rias de Educação e as IES.
Vale destacar que a deliberação de propostas e acordos relaci-
onados à formação docente do país estão sujeitos à Resolução do
Conselho Nacional de Educação nº 2, de 20 de dezembro de 2019
(CNE/CP 2/2019), que define as Diretrizes Curriculares Nacionais
para a Formação Inicial de Professores da Educação Básica e institui
a Base Nacional Comum para a Formação Inicial de Professores da
Educação Básica (BNC-Formação). Como efeito de sua estreita vin-
culação ao avanço de projetos neoliberais, que preveem alterações
no processo de produção e acumulação capitalista, comandados pe-
las fundações ligadas ao capital privado, influenciam sobrmaneira os
lugares de produção e implementação de políticas educacionais
(Conselhos Nacional, Estadual e Municipal de Educação) em
todo o país. É desolador percebermos que, mesmo no atual
governo de redemocratização e reconstrução da res publica, esses
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

“entes privados” constituem um corpus considerável como influencia-


dores políticos, verdadeiros stakholders no Ministério da Educação e
em outras agências de construção de políticas, como o Conselho Na-
cional de Educação (CNE) e Conselhos Estaduais de Educação
(CEEs) e Conselhos Municipais de Educação (CMEs).
Advém desse contexto a ênfase dada pela referida Resolução
CNE/CP 2/2019 ao “[...] conceito de competência20, não como
uma noção nova, mas reatualizada em seu sentido e em seu signifi-
cado” (Curado; Silva, 2022, p. 29). Entretanto, a referida reatualiza-
ção não parece clara, demonstrando “confusões” naquilo que, ora
apresenta como competência, ora apresenta como habilidades.
A formação continuada também foi abordada pelos docentes
como elemento distanciado da promoção do DPD. Um dos motivos
apontados para esse distanciamento se refere à falta de professores
substitutos nas escolas. Para os professores P3 e P1: “A dificuldade
está aí, em liberar. Não porque a escola não quer liberar, e sim porque não tem
pessoas para ficar substituindo” (P3); “O professor busca formação e aí tem
esse problema: que não tem ninguém que o substitua” (P1).
As dificuldades de liberação apresentadas pelos professores
para continuarem seformando ao longo da carreira foram abordadas
nos estudos de Gatti, Barreto e André (2011), que apontaram a falta

_______________
20 De acordo com Curado e Silva (2022), o termo “competência”, ligado à
formação, é influenciado por Perrenoud (2000), sociólogo suíço que realizou
trabalhos sobre as competências e se tornou escritor de referência no país. Oautor
é reiteradamente citado no Parecer CNE/CP 22/2019, como embasamento do
termo “competências” na formação docente. Para o sociólogo, competência se
refere à “[...] faculdade de mobilizar um conjunto de recursos cognitivos (saberes,
capacidades, informações etc.) para solucionar com pertinência e eficácia uma
série de situações” (Perrenoud, 2000, p. 19).
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

de professores substitutos como a principal objeção das Secretarias


de Educação para liberarem seus discentes. Essa análise também foi
escrutinada por Davis, Nunes e Almeida (2011, p. 95): “[...] faltam
professores substitutos, quando os docentes se afastam da sala de
aula para participar de ações de formação continuada e muitas se-
cretarias de educação reclamam de que não dispõem de um centro
de formação próprio [...]”.
Assim, os problemas da formação docente parecem se amon-
toar a outras questões de ordem política e administrativa. Percebe-
se, nesse contexto, novas contradições, já que ao mesmo tempo em
que se travam embates e cobranças em torno da necessidade cons-
tante de os professores prosseguirem na sua formação, ocorrem di-
ficuldades em torno de um elemento básico para que a referida for-
mação ocorra: a presença desses profissionais.
Ressalta-se, ainda, a necessidade de planejamento, implemen-
tação, acompanhamento e avaliação pelas Secretarias de Educação
dos Programas de Formação Continuada Docente, voltados para o
planejamento e a organização de cursos formativos, bem como para
a liberação dos professores. Para Gatti, Barreto e André (2011),
um número expressivo dessas Secretarias sequer possui um depar-
tamento responsável pela formação continuada desses profissionais.
Além disso, estudos realizados por Azevedo, Vieira, Assunção
(2021) indicam que a falta de professores substitutos nas escolas está
diretamente relacionada às seguintes questões: a) déficit na regularidade
de realização de concurso público, que deve ocorrer por cumpri-
mento constitucional, observando as situações de remoções e substi-
tuições dos quadros docentes das redes de ensino do país; b) efeitos
negativos sobre a proficiência dos alunos. Quanto a essa última ques-
tão, Fernandes e Rocha (2005) advertem que a ausência do professor
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

da educação básica pode causar prejuízos ao aprendizado do aluno,


tendo em vista que o trabalho realizado, sobretudo na fase da infância,
envolve o desenvolvimento de hábitos, atitudes e pensamento crítico,
o que requer acompanhamento contínuo e sistematizado.
Outro motivo que, segundo os professores investigados, tem
desfavorecido o DPD, é a diminuição da oferta de cursos. Segundo
os professores P22 e P27: “Pelo que eu tenho de entendimento a prefeitura
não oferece. No momento, não! Eu não sei de nenhum curso de formação em
andamento” (P22); “Nos últimos dois anos está raríssimo, raríssimo. Até o
ano atrasado eles tentavam fazer algumas palestras” (P27).
Destacam-se, aqui, dois graves problemas que se aliam a essa re-
alidade. O primeiro se relaciona à drástica diminuição, por parte da
última gestão do Governo Federal (2018-2022), de ações e programas
voltados para a formação docente, um retrocesso advindo do descaso
com a educação nacional, sobretudo no que se refere ao corte de ver-
bas envolvendo os seus dois níveis: básico e superior. O segundo pro-
blema diz respeito ao desmerecimento, por parte das Secretarias de
Educação, às demandas formativas dos docentes, de acordo com seu
grau de interesse e necessidade. Para os professores P26 e P17:
[...] era preciso uma formação continuada que realmente
atendesse às necessidades do profissional. Porque buscar
cursos de formação continuada, no qual o que vai ser visto
é o que a gente já sabe, ou algo que não está dentro das
expectativas enquanto educador, não vai adiantar muito. E
aí, fica enchendo a gente de coisa que a gente não precisa.
É igual a você dar comida para quem não tem fome e deixar
com sede quem precisa de água (P26).
A maioria desses cursos que nós fazemos é uma repetição
do curso anterior. Não muda o assunto [...]. Você não tem
um retorno dos seus anseios (P17).
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

Percebe-se que, em nenhum momento, os professores apresen-


tam a escola como locus formativo, o que sugere momentos de troca
de vivências, experiências e saberes construídos aolongo da carreira,
entre seus pares.
Os excertos expressam uma via comum da formação continu-
ada de professores: a prerrogativa da transmissão de teorias susten-
tadas nas considerações ideologicamente prevalecentes. Refere-se,
assim, a uma formação continuada que ocorre dentro de uma pers-
pectiva mercadológica, que percebe e considera o professor como
mero executor de uma “nova pedagogia da hegemonia” (Neves,
2005), em que “[...] o aparelho escolar também (assim como os
meios de comunicação) tem tido um papel pedagógico fundamental
naconformação do novo homem coletivo, requerido pelo neolibe-
ralismo da Terceira Via”21 (Neves, 2005, p. 104).
Os efeitos de uma formação realizada nesses moldes, tende a ser
o esvaziamento do trabalho docente, a falta de reconhecimento da in-
telectualidade do professor e o desprestígio da complexidade dos seus
conhecimentos, advindos da prática e das experiências (individuais e
coletivas) que, por sua vez, constroem-se no percurso de suas carreiras.
Além disso, Magalhães e Azevedo (2015) ressaltam que a for-
mação docente não é alcançada por meio do amplo acervo de cur-
sos, conhecimentos, teorias e técnicas – ainda que se apresentem
como elementos importantes –, mas se dá por meio da “[...] reflexão

_______________
21 Segundo Neves (2005), a “Terceira Via” se refere a um programa político
específico, teorizado pelo sociólogo britânico Anthony Giddens, o qual
fundamenta, no caso da sociedade brasileira, uma ideologia neoliberal voltada para
a descentralização, a privatização e a desresponsabilização do Estado, com ênfase
nos ideais do voluntariado.
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

do trabalho educativo e sua identidade pessoal e profissional, le-


vando em conta as dificuldades na busca dosignificado no interior
de suas aprendizagens ou do que aprende com suaspráticas” (Maga-
lhães; Azevedo, 2015, p. 31). Segundo De Rossi (2001, p. 95):
[...] tais práticas contribuem para organizar algo que hoje
tem encontrado pouco espaço: as bases do procedimento
político e a essência da política, entendida como a organi-
zação da esfera pública na qual as pessoas ampliam sua co-
municação, articulamsuas opiniões e se unem para alcançar
objetivos coletivos e interesses comuns.
Na contramão de uma formação mercadológica, marcada por
questões quantitativas (número de cursos e capacitações), faz-se neces-
sário que os processos formativos dos professores ocorram dentro de
uma perspectiva do DPD, em que a articulação e a troca coletiva entre
os pares, bem como a prática profissional, sejam validadas com áreas
produtoras de conhecimento. Assim, a formação docente deve se ins-
taurar como base pedagógica e política da profissão, tendo em vista a
possibilidade que se abre para compreender as trajetórias; as concep-
ções de vida, de homem, de sociedade, de educação, de ensino, de
aprendizagem, de carreira; bem como dificuldades, anseios, temores,
desafios, perspectivas e limitações sofridas pelos docentes. Isso jamais
poderá ocorrer se o professor não for considerado um protagonista de
sua própria trajetória formativa, sentindo-se, assim, valorizado.
Uma importante saída para que a formação continuada docente
se distancie de moldes meramente mercadológicos e considere a tra-
jetória da prática docente foi apontada pelo Plano Nacional de Edu-
cação (2014-2024), que demonstrou interesse de que a formação
continuada dos professores das redes públicas de ensino do país seja
de responsabilidade das IES públicas.Essa previsão legal, por diver-
sas razões, não vem ocorrendo, com destaque para a inexistência de
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

um Sistema Nacional de Educação, capaz de intervir com maior res-


ponsabilidade na formação docente por meio de políticas que en-
volvam, de modo equânime, os entes federados. Infelizmente, até o
momento, o que se tem visto são iniciativas inconsistentes, pauta-
das, sobretudo, nos aspectos técnicos da formação, não alcançando,
necessariamente, o DPD.
Diante do exposto, percebe-se que os elementos da formação e
da prática docente se revelam como importantes contributos para o
DPD, na medida em que a relação entre esses elementos permitem aos
professores acionarem conhecimentos alcançados no exercício da pro-
fissão frente àqueles advindos do seu histórico formativo.

A formação e a profissão docente, por diferentes ângulos, vêm


sendo foco de estudos e produções científicas do Foprofi que, ao
longo de sua existência, tem realizado pesquisas macro que subdivi-
dem e subsidiam projetos menores. Desta feita, podemos indicar
que os dados e os resultados de pesquisas relacionadas à formação
e à prática docente, analisados na perspectiva do DPD e aqui apre-
sentados, são de feitura coletiva no âmbito do Forprofi.
No contexto ambientado pelos dados apresentados, crescem as
cobranças para que os professores se assumam “como produtores da
sua profissão” (Nóvoa, 1992). Trata-se de uma reinvindicação que
não pode ocorrer de forma isolada, tendo em vista que a escola não
muda sem que os sentidos aferidos à formação docente estejam cen-
trados na escola como locus formativo permanente, vindo, assim, aten-
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

der às demandas do exercício profissional dos professores. Esse con-


texto requer interferências na formação inicial e continuada dos pro-
fessores, por meio de políticas formativas que prestigiem o DPD.
Entretanto, para que os docentes se engajem no debate mais
amplo sobre o seudesenvolvimento profissional, é necessário rever
questões de ordem teórica e metodológica que contemplem, de
forma mais direta, crítica e analítica, o contexto educacional viven-
ciado por esses profissionais nas redes de ensino do país.
Para Giroux (1997), o aporte teórico é necessário para que os
professores possam se organizar e alcançar uma voz forte e coletiva
no debate da educação contemporânea. Percebe-se, com isso, que
este estudo acarreta em desdobramentos de outros acessos, ligados
diretamente às políticas educacionais, sobretudo àquelas direciona-
das para a formação e a prática docente, como contributos para o
processo do DPD. Tal processo se alinha ao desenvolvimento da
autonomia e da intelectualidade dos professores, elementos funda-
mentais para uma educação voltada para a construção de uma soci-
edade mais justa, solidária, diversa e humanamente emancipada.
Por fim, este estudo ressalta a imprescindibilidade da prática do-
cente ser considerada como elemento formativo que necessita ser so-
cializado com áreas produtoras de conhecimento, com vistas a validar
sua produção. Para tanto, é indicativo ampliar os processos de intera-
ção entre professores, comunidade escolar, IES e redes de ensino, a
fim de melhor conhecer a realidade objetiva do contexto escolar, além
dos conceitos e pré-conceitos em torno da tradução da prática do-
cente como conhecimento a ser reconhecido e socializado.
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

AZEVEDO, V. R. A.; VIEIRA, R. S. F.; ASSUNÇÃO, A. A. Efei-


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FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

Nilvânia Cardoso Almeida


Liliane Campos Machado
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

ato de aprender e de ensinar perpassa a vida do ser humano.


Desde a mais tenra idade, os processos que envolvem a socia-
lização e a aprendizagem constituem práticas diárias inclusivas de
conhecimentos sociais imprescindíveis à vida. O aprender éinerente
ao homem, à mulher e funciona como um mecanismo fundamental
de: sobrevivência, comunicação, trocas de experiências, aprendiza-
gens e conhecimentos queao longo da sua existência vão se conso-
lidando, se transformando, significando e ressignificando o modo
de pensar, agir, aprender e ensinar.
A contar das comunidades primitivas, segundo Antunes (2013),
o conhecimento, os saberes necessários à sobrevivência são trans-
mitidos aos membros dos grupos sociais em coletividade. O pro-
gresso da raça humana efetivamente desencadeou processos dife-
renciados que reorganizaram os territórios ocupados, as atividades
de sobrevivência grupal e os aspectos relacionados ao trabalho em
todo o seu percurso de constituição histórico. O trabalho sofreu
com a fixação do homem à terra variadas transformações ao longo
dos milênios. Desde os pequenos arranjos para aquisição do ali-
mento à utilização da força de trabalho como mercadoria, o trabalho
é considerado a força motriz que potencializou a ampliação da lin-
guagem, da comunicação e da evoluçãohumana.
Para Saviani (2013, p. 11), “[...] o que diferencia o homem dos
outros animaisé o trabalho. E o trabalho instaura-se a partir do mo-
mento em que seu agente antecipa mentalmente a finalidade da
ação”. Em compensação, por meio do trabalho, gerou-se a divisão
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

de classes, criou-se o lucro, fomentou-se as dominações, promoveu-


se o deslocamento contraditório e dialético da organização social.
Na explicação de Cury (1985, p. 27), “[...] a contradição é o próprio
motor interno do desenvolvimento”. Ele assegura que a contradição
é o elemento transformador da sociedade, promove a discussão e o
discernimento do real. Pontua (p. 26), “[...] a reflexão só adquire
sentido quando ela é um momento da práxis social humana”, foi na
peleja em vencer e sobreviverà realidade posta que a humanidade
gradativamente refletiu e teve condições de aos poucos transformá-
la, ensinando e aprendendo.
Nesse processamento, a institucionalização221 do conheci-
mento, tem na escolao espaço formal assegurado à transmissão dos
saberes essenciais ao desenvolvimento social, cultural e científico
das pessoas. Para o autor, nela acontece a produção do saber,o tra-
balho não material.
Trata-se aqui da produção de ideias, conceitos, valores, sím-
bolos, hábitos, atitudes, habilidades. Numa palavra, trata-se
da produção do saber, seja do saber sobre a natureza, seja
do saber sobre a cultura, isto é, o conjunto da produção
humana. Obviamente, a educação situa-se nessa categoria
do trabalho não material (SAVIANI, 2013, p. 12).
No espaço escolar é que se cumpre, geralmente, o papel insti-
tucional de proporcionar aos indivíduos a obtenção dos conheci-
mentos científicos produzidos ao longo dos séculos. Saviani (2013),
alega que a transmissão às gerações de tais conhecimentos, possibi-

_______________
22As instituições são organizações culturais (no sentido amplo) a serviço das ideologias

que as veiculam através de instrumentos de difusão entre os quais os agentes


pedagógicos, o material pedagógico e o ritual pedagógico. (CURY, 1985, p. 87).
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

litaram ao homem apreender o conhecimento histórico e cultural-


mente produzido pela humanidade e avançar em busca de novos
saberes para o desenvolvimento social e cognoscível.
Por meio da educação, ocorre no ambiente escolar o entrecru-
zamento de interesses, o enfrentamento em condições distintas que
tencionam e especificam o ato deensinar. Funciona como um uni-
verso plural representativo da sociedade, efervescências de ideias,
contradições e singularidades históricas. Um meio partilhado pelos
professores, estudantes e outras realidades que, em constante pro-
cesso dialético expandem os aspectos relacionados a instrução, ao
pensamento, à ciência e ao saber.
Nesse capítulo tem-se como questão norteadora: “De que
forma o aprender e o ensinar envolve a profissão docente e pode
impulsionar o processo de ensino aprendizagem e a práxis pedagó-
gica?”. Com essa indagação objetiva-se contextualizar de que forma
o aprender e o ensinar que envolve a profissão docente e os saberes
da formação inicial e continuada podem impulsionar o processo de
ensino aprendizagem e apráxis pedagógica.
Para um melhor alinhamento vale evidenciar que nesta produ-
ção para definir de que lugar compreendemos a práxis recorremos a
Vázquez (2011), e com ele o sentido da práxis como atividade da
prática social que em seus processamentos transformam os indiví-
duos e a realidade que os cercam.
[...] a práxis é uma atividade conscientemente orientada, o
que implica não apenas as dimensões objetivas, mas também
subjetivas da atividade. Dizendo de outro modo, a práxis não
é apenas atividade social transformadora, no sentido da
transformação da natureza, da criação de objetos, de instru-
mentos, de tecnologias; é atividade transformadora também
com relação ao próprio homem que, na mesma medida em
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

que atua sob a natureza, transformando-a, produz e trans-


forma a si mesmo (VÁZQUEZ 2011, p. 185).
Para Vázquez, a relação existente entre a teoria e práxis é intensa
e difícil de separar sem comprometer a sistematização do ato de ensi-
nar e aprender, elas são interdependentes. Ambas, são relevantes para
evidência da práxis. Diante de tais percepções e intenções enxerga-
mos nesta, a promessa de alcançar o conhecimento em torno dessa
temática que busca compreender a práxis como princípio fundante da
prática pedagógica, condição transformadora da realidade social.
A metodologia utilizada foi de natureza qualitativa, desenvol-
vida na perspectiva histórico-crítica relativa às análises provenientes
da realidade escolar pesquisada a partirda prática pedagógica de dez
professores, em duas escolas classes232 da Coordenação Regional de
Ensino de Sobradinho – DF. Foi utilizada a análise de conteúdo em
Bardin (2016), por acreditar na sua relevância para o tratamento dos
dados qualitativos. Para preservar a identidade dos participantes, ao
serem registrados seus depoimentos, os nomes foram trocados por
letras do alfabeto.
Este capítulo resulta da pesquisa “Os caminhos e os desafios da
práxis pedagógica: análise da profissão docente de professores dos
anos iniciais” desenvolvida no programade Pós Graduação em Edu-
cação na Modalidade Profissional na Faculdade de Educação da

_______________
23 Na Secretaria de Estado de Educação do Distrito Federal, as escolas de Ensino
Fundamental, Anos Iniciais, recebem a denominação de Escolas Classes. Elas
atendem os estudantes do 1º ao 5º ano de escolarização; podendo oferecer a
Educação Infantil: creche e pré-escola; os 6.º e 7.º anos do Ensino Fundamental e
o 1.º e o 2.º segmento de Educação de Jovens e Adultos, de acordo com as
necessidades da Rede Pública de Ensino do Distrito Federal.
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Universidade de Brasília no ano 2020, por Nilvânia Cardoso Al-


meida, sob a orientação de Liliane Campos Machado24.
A seguir, discorreremos sobre os saberes que envolvem a ação
educativa eampliam a competência docente frente às singularidades
que experimentam e promovema aprendizagem no dia a dia da sala
de aula. Aprofundamos, assim, nossos entendimentossobre o ato de
aprender e ensinar, os saberes e a ação educativa

O professor é considerado como um dos componentes fundamen-


tais da ação educativa para a aprendizagem em diferentes tempos. Seus
conhecimentos tendem a extrapolar os saberes específicos das áreas do
conhecimento. Agregam em seus percursos formativos, cultura, enten-
dimentos, instruções, sabedorias e técnicas que podem gravitar em vari-
áveis dimensões teóricas. Em busca de aprimorarem seus estudos, incor-
poram às suas vivências e experiências desde a infância, saberes múltiplos
que fundamentam e direcionam o seu fazer pedagógico: “[...] o saber dos
professores é plural, compósito, heterogêneo, porque envolve, no pró-
prio exercício do trabalho, conhecimentos e um saber-fazer bastante di-
versos, provenientes de fontes variadas e, provavelmente, de natureza
diferente” (TARDIF, 2012, p. 18).
Como esses saberes são desenvolvidos? E o que interfere na
aquisição e construção deles? São na maioria das vezes paulatina-
mente construídos a partir da necessidade de aprender, de ensinar
numa relação dialética com os outros, com a prática social, com a
_______________
24Disponível em: https://repositorio.unb.br/handle/10482/39703. Acesso em:
18/04/2023.
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profissão, com as imposições e inovações que adentram a área edu-


cacionalconstantemente.
Para compreender melhor as questões relacionadas aos saberes
dos professores e suas especificações, apoiamos nosso entendi-
mento nas conceituações de Tardif, resumidas no Quadro 7.

Quadro 7 – Classificação dos Saberes Docentes.

Saberes Classificação
Saberes Docentes Saber plural, formado pelo amálgama,
mais ou menos coerente, de saberes
oriundos da formação profissional e de
saberes disciplinares, curriculares e
experenciais. (p.36).
Saberes da Formação Pro- Conjunto de saberes transmitidos pelas
fissional (das ciências da instituições de formação de professores
educação e da ideologia (escolas normais ou faculdades de ciências
pedagógica) da educação). (p. 36).
Saberes Disciplinares São saberes que correspondem aos diversos
campos do conhecimento, aos saberes de
que dispõe a nossa sociedade, tais como se
encontram hoje integrados nas
universidades, sob a forma de disciplinas,
no interior de faculdades e de cursos
distintos. [...] Os saberes disciplinares
emergem da tradição cultural e dos grupos
sociais produtores de saberes. (p. 38).
Saberes Curriculares Esses saberes correspondem aos
discursos, objetivos, conteúdos e
métodos a partir dos quais a instituição
escolar categoriza e apresenta os saberes
sociais por ela definidos e selecionados
como modelos da cultura erudita e de
formação para a cultura erudita. (p. 38).
Continua...
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

Continua...
Saberes Experienciais Esses saberes brotam da experiência e são por
ela validados. Eles incorporam-se à
experiência individual e coletiva sob a forma
de habitus e de habilidades de saber-fazer e de
saber-ser. (p. 39).
Fonte – Tardif, 2012 (adaptado).

Logo, o conjunto de saberes que compõem a essência formativa


do professor,representam a totalidade de conhecimentos apreendi-
dos em suas vivências e experiências de aprendizagens que podem
constituir na carreira docente a base para eleger os saberes pedagó-
gicos pensados e articulados na ação educativa, fundamentais para a
prática pedagógica.
Os saberes se desenvolvem vinculados às relações entre os pa-
res, na complexidade de tensões que: abarcam a realidade, fragmen-
tam o trabalho educativo, abalam as certezas pedagógicas conheci-
das, por vezes provocam o novo, transformam asconcepções e po-
dem permitir um olhar diferenciado para a dinâmica que rege o pla-
nejamento e a organização do trabalho escolar.
Os dilemas que envolvem a sociedade se entranham nos espa-
ços escolares e demandam alterações nucleares impactantes para os
processos de aprendizagens. Como nos apresenta Leite e Fernandes
(2013, p. 57), a formação dos professores respondem ao conjunto de
fatores pensados e organizados que sinalizam, “[...] no que às políti-
cas educacionais diz respeito, as situações atuais caracterizam-se por
uma ambiguidade geradora de tensões”. Um movimento tencionado
nas relações personificadas na prática pedagógica e que exigem res-
postas positivas continuamente.
Em nossas indagações aos sujeitos participantes da pesquisa,
sobre as contradições, dilemas e dificuldades vividas na profissão
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

docente, eles relataram seus contratempos demonstrando os percal-


ços das relações de ensino aprendizagem experimentadas no exercí-
cio da sala de aula.
“Na universidade eu não aprendi sobre a realidade da
sala de aula, apesar de ter realizado projetos como PIBIC
não ficou evidente para mim o quão difícil é a realidade
de sala de aula. Dentro de uma sala temos alunos subje-
tivos que aprendem de formas diferentes, temos alunos
com dificuldades de aprendizagem, temos famílias que
não conseguem dar o apoio necessário, e é nesse cenário
que o professor precisa atuar, e precisa atuar de forma
efetiva. A prática pedagógica é algo que poderia ser con-
templado de forma mais efetiva na formação do educa-
dor. Teoria é fundamental, mas não basta sabê-la, é pre-
ciso aplicá-la”. (C, 2020).
Para este professor, exercer o ofício de ensinar, enfrentando a
realidade, a desafiante novidade da prática pedagógica foi penoso.
Se deparou com situações sociais as quais não cogitava fazer parte
do cotidiano da sala de aula. Os conhecimentos e os saberes que
acreditava possuir inicialmente não foram suficientes para lhe asse-
gurar de imediato a eficiência no processo de desenvolvimento em
atividades docentes. Esbarrou em questões sociais, elementos no-
vos, que não faziam parte das discussões teóricas das formações
acadêmicas, mas comuns nas instituições educativas. O distancia-
mento entre o aprendido e o enfretamento com a conjuntura escolar
causa choque aos professores no enfretamento da realidade da prá-
tica pedagógica. Eles, normalmente são forçados pelas vivências dos
conflitos apreciados na ação educativa a aprenderem a pensar e agir
sobre e com eles continuadamente.
Embora as questões práticas sejam consideradas pela maioria
dos professoresinvestigados como de suma importância para o pro-
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

cesso ensino aprendizagem, sem o amparo da teoria, é difícil pro-


mover o aperfeiçoamento das concepções acerca doconhecimento
científico. É necessária a articulação entre elas.
Partindo dos conceitos e das relações entre teoria e prá-
tica, pode-se perceber que a primeira depende da segunda,
na medida em que a prática é o fundamento da teoria, visto
que determina o horizonte de desenvolvimento e pro-
gresso do conhecimento. O progresso do conhecimento
teórico aparece vinculado às necessidades práticas do ho-
mem (CURADO SILVA, 2018, p. 41).
Na linha de discussão da autora, a correlação existente entre a
teoria e a prática é fundamental para que não haja a fragmentação e
nem adaptações aligeiradas doconhecimento. Uma prática esvaziada
de teoria, dificulta a interpretação crítica do real e reduz o trabalho
do professor a técnicas destituídas do pensar. Esse fato pode im-
pedi-lo de construir sentido para o seu fazer pedagógico. Na
visão de Freire (1996), essadissociação dificulta a leitura de mundo
o entendimento, a analogia e a avaliação da conjuntura e da prática
social frente ao que está sendo ensinado.
Nessa perspectiva, Tardif (2012), chama a atenção para as refor-
mas que processualmente ocorreram com o intuito de pensar e orga-
nizar a formação docente, idealizada para cada momento histórico,
que interferem e normatizam os processos educativos como um todo.

A formação continuada é considerada por muitos professores


como o elemento essencial que ressignifica e amplia o entendimento
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

da prática pedagógica. Para além dos aspectos relativos as atuali-


zações teóricas, das apreensões sobre asdeterminações curricula-
res, ela se constitui como um recurso a apropriações de saberes no-
vos e diversos. Essas ações transcendem as peculiaridades que en-
volvem o trabalho docente e expressam na característica da ação
educativa, da produção do saber científico e das especificidades da
formação docente os modos de ser e agir da profissão discutidasnas
relações com os pares.
Na apreciação dos julgamentos colhidos em relação à formação
inicial e a ação, os participantes defenderam que as divergências encon-
tradas no desempenho de suas funções estão relacionadas aos distanci-
amentos entre a teoria e a prática, nas dificuldades ocasionadas por essa
desarticulação que afetam o trabalho docente. Sinalizaram a importân-
cia da formação continuada para darem conta de responder com qua-
lidade, aos assuntos inerentes a educação.
“As maiores contradições, dificuldades quando comecei, é
que realmente você aprende na prática, e que os conheci-
mentos vão sendo adquiridos aos poucos com as forma-
ções continuadas, com as vivências dos mais experientes e
com os próprios erros”. (E. 2020).
“Os processos formativos iniciais em sua maioria, estão dis-
tantes da realidade da prática da sala de aula. O antigo curso
magistério ainda trazia em sua composição as matérias de al-
gumas práticas úteis em nosso dia a dia. Mas, mesmo assim, a
aprendizagem maior se dá na prática”. (H, 2020).
Concordamos com Korthagen, Loughran e Rssussell
(2013) quando falam sobre o choque de realidade para os
professores iniciantes. Argumentam que durante a carreira
profissional, na interlocução com os pares e ajustamentos
inerentes ao ato de ensinar vãose apropriando, se moldando
às necessidades da prática. É um deslocamento contínuo de
interesses formativos, de aperfeiçoamentos de instruções e
conhecimentos que perfazemtoda a trajetória do docente.
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

A dicotomia entre o aprendido e a atividade laboral, é ex-


plicada em parte por estudiosas do assunto ao descreverem
sobre a formação dos professores.
Ao entender o Curso de Pedagogia como um local de for-
mação docente e como um espaço de luta pela melhoria
da qualidade do ensino, foi possível analisar as políticas pú-
blicas de educação e a forma utilitarista e neoliberal adotada
na atualidade. Nesta discussão, compreendemos que as po-
líticas de Formação de Professores têm sido marcadas pelo
caráter tecnicista e conteudista, pelo aligeiramento, fragili-
zação e degradação da formação de professores (SILVA,
DE SORDI, 2006, p. 06, Grifos dos autores).
A formação de professores na visão das estudiosas é marcada
por situações externas à ação educativa, mas incidem diretamente
nos aspectos formativos e definem aqualidade da formação recebida
nos Cursos de Pedagogia. Oimpacto desses procedimentos fragili-
zados, é a descontextualização entre o que se aprende e se ensina.
Para elas, a desarmonia com a prática social responde aos interesses
neoliberais de cada momento histórico, definindo percursos de
aprendizagens, assinalando avanços e retrocessos. Constatamos em
nossas averiguações, que a questão apresentada pelasautoras é uma
verdade particularizada nas descrições dos sujeitos indagados.
Impelidas a ampliar a compreensão sobre as implicações das
políticas públicas que deliberam sobre a educação, intentamos breve-
mente destacar a trajetória da formação de professores para melhor
analisar os achados da pesquisa. Apuramos que a formação inicial e
continuada dos professores apresenta no decorrer da constituição
histórica do Brasil, percalços e dissensões.
Formação de professores e oferta de escolarização básica são
fatos relacionados, mas essa relação tem dissonâncias e desen-
contros constatáveis. A trajetória histórica da educação inicial
escolar nos mostra que essa educação demorou a se expandir
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

no Brasil podendo-se observar que por muito tempo ela aten-


deu parcela mínima da população brasileira que crescia e se espa-
lhava pelo interior do país. [...] O processo formativo mais es-
truturado de professores acompanhou a lentidão com que a
educação básica se desenvolveu no Brasil, um país que revelou,
ao longo de seus governos, pouco interesse pela educação bá-
sica de sua população (GATTI, 2019, p. 21).
A trajetória da educação básica, particularizada pelas marcas
que definiram os rumos do surgimento da nação, seu desenvolvi-
mento e contradições, delinearam as metodologias pedagógicas na-
cionais através dos anos. Com elas, a ação educativa se desenvol-
veu precariamente pelo país, aos poucos alfabetizou, formou a po-
pulação brasileira. Uma tarefa que exigiu árduos esforços, dificul-
dades e determinação de muitos. É possível estimar o importante
papel desempenhado pela educação, apesar dos contratempos ex-
perimentados que promoveram a compreensão dos desdobramentos
e percepções das tendências pedagógicas observadas no movimento
dialético de constituição, organização da nação e da educação básica
brasileira, como nos aponta Saviani (2013).
Falar da formação de professores, das políticas, dos seus impac-
tos na sala de aula, tendências e implicações desses assuntos para o
campo educativo é também trazer à tonaas questões referentes aos
aspectos relacionados às condições de trabalho, de salários queinten-
sificaram os debates pelo Brasil.
No Brasil, esse processo de modernização do setor produtivo
ocorreu de forma mais intensa a partir do fim da década de 1980.
Além das modificações no cenário econômico nacional às exigên-
cias da globalização e adoção da ideologia neoliberal trouxeram
mudanças profundas na área social, cultural e educacional, exi-
gindo a readequação dos currículos escolares. [...] Para tanto, a es-
tratégia adotada pelas forças políticas alinhadas ao projeto neoli-
beral foi a de aprovar uma lei que deixasse o caminho aberto para
medidas políticas pontuais que fossem adequando gradativamente
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

a educação escolar às estratégias contemporâneas do capital nas


lutas de classe (MALANCHEN, 2016, p. 9-10).
A reformas produzidas pelas vertentes econômicas apontadas,
foram ganhando expressão no cenário das políticas públicas nacio-
nais, que a exemplo de um projeto internacional253 amplo, marcaram
no final do século XX, início do século XXI alterações significativas
na elaboração dos documentos e normativos que regem o país, am-
pliando e determinando a área de atuação do poder público. No
atual momento político, O Conselho Pleno e a Câmara de Educação
Básica do Conselho Nacional de Educação - CNE aprova a Base
Nacional Comum de Formação inicial de professores da Educação
Básica - BNC, considerada uma ameaça e retrocesso para o modelo
de formação que vivenciamos por ser uma resolução muito mais
prescritiva que a anterior a DCN 02/2015, situação apontada por
Freitas (2019, n.p.) em seu blog264.
Em destaque, os documentos formulados a partir das pre-
missas econômicas epolíticas os quais deram origem à restruturação
e reorganização do Brasil no que tangem as normas definidoras das
leis e políticas públicas, foram: a Constituição Federal de 1988,a Lei
de Diretrizes e Base da Educação a LDBEN (lei n.9.394/96) (BRA-
SIL, 1997), OsParâmetros Curriculares Nacionais - PCN (BRASIL,
_______________
25 O panorama das reformas realizadas na maioria dos países a partir dos anos 1990
teve como marco inicial a Conferência Mundial de Educação para Todos, em
Jomtien, em 1990, que resultou na assinatura da Declaração Mundial sobre
Educação para todos e o Marco de Ação para a Satisfação das Necessidades
Básicas de Aprendizagem (1993). Também deve ser considerado o documento da
UNESCO, O Relatórioda comissão internacional sobre Educação para o século XXI.
Eles, apontam as diretrizes dos organismos internacionais, principalmente
UNESCO e Banco Mundial (MALANCHEN, 2016, p. 17).
26 Para maiores informações ver blog do Freitas (FREITAS, 2019).
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

1997), Planos Nacionais de Educação, 2001 e 2014 – PNE


(BRASIL,2014), Diretrizes curriculares Nacionais - DCN(BRASIL,
2015), a Base Nacional Curricular Comum – BNCC (BRASIL,
2018) e porúltimo a BNC (BRASIL 2019). Esses documentos pro-
pagam alterações que alcançam ocampo curricular e intrometem na
dinâmica e no papel da escola, interferem nas questões formativas e
avaliativas que indiretamente sugerem variações na formação de
professores, nos métodos de ensino e aprendizagem, como nos
aponta Malanchem (2016).Aliado ao contingente de transformações
que abrangem as políticas públicas nacionais, fez-se necessário
planejar formações para darem conta de abarcar todo oprocesso
de mudança e ampliar o capital de saberes dos docentes, visando
aperfeiçoar aprática pedagógica na direção dos interesses aponta-
dos. Nesse propósito, a LDBEN (lein.9.394/96) (BRASIL, 1996),
provocou o governo a pensar e articular as formações deprofesso-
res pelo país. Na esfera federal foram criados condições e me-
canismos paracustear o magistério e as formações. O Fundo de
Manutenção e Desenvolvimento doEnsino Fundamental e de Va-
lorização do Magistério-FUNDEF, um incremento forte em pro-
cessos chamados de educação continuada, de acordo com Gatti
(2008), foi pensado para cumprir além de outras, a determinação
sobre o financiamento da educação e a formação dos professores.
Essas medidas primam desde então, pela formação do trabalha-
dor, interferem na dinâmica organizativa das instituições escolares e
provocam os saberes dos professores em diversas paragens e dire-
ções. Charlot (2012), argumenta de não ser tão fácil formar professo-
res, pelo simples fato do desconhecimento de suas necessidades e do
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

alcance das formações para ofício em questão. Averiguamos esta si-


tuação ao perguntarmos os integrantes da investigação em curso, so-
bre a relevância das políticas públicas para a formação continuada.
“As políticas públicas são de extrema relevância para a for-
mação dos professores, pois as políticas públicas normal-
mente estão associadas ao momento histórico que o país
vive, portanto quando se tem momentos em quese oferece
tempo/espaço para a formação propicia um incentivo
maior para formação”. (F. 2020).
“Considero de extrema relevância, uma vez que assegurar a
formação continuada é propiciar a mudança da realidade esco-
lar, buscando melhorias na qualidade do trabalho”. (B. 2020).
“Eu considero extremamente importante, afinal, temos
dois grupos, o de professores que realmente querem se
aperfeiçoar e os que apesar das políticas públicas, irão man-
ter práticas ultrapassadas”. (C. 2020).
“O investimento na educação deveria ser prioridade para o
país. Portanto ampliadas as ofertas de formação continuada
para os professores considero que nosso trabalho pode ser
mais relevante”. (H. 2020).
“As políticas públicas impactam diretamente no cotidiano
escolar, seja para fortalecer e oferecer qualidade na forma-
ção continuada, seja para sucatear e fraturar a formação. O
PNAIC, por exemplo, ofereceu qualidade para muitos pro-
fessores País a fora, mas foi desmontado”. (D. 2020).
A análise oferece diferenças no entendimento e alcance dessas
políticas públicas para a prática docente. Esperam que elas, alinha-
das a historicidade e interesses de cada momento, tenham força para
mudar a realidade e o contexto de inserção escolar. Dentre os inda-
gados, apontam que nem todos estão dispostos às mudanças, resis-
tem ao novo e desafiam as propostas aventadas. Encontram nos
cursos a possibilidade de transformar a prática, de alçar novos planos
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

para o fazer pedagógico. Percebem como a descontinuidade das políti-


cas públicas interferem na educação. Porém, acreditamos que talvez
estejam esquecendo da contrapartida pessoal, que exige a criticidade e
implicação dos envolvidos no processo, para pensar, implementar e
transformar a realidade em que trabalham e vivem.
Por outro lado, tem quem acredite na distorção de aplicação das
políticas, frente aos interesses dos professores. Para J (2020), “[...] nem
sempre as políticas públicas atendem à demanda de interesse dos pro-
fessores, muitas vezes são impostas sem levar em consideração a ne-
cessidade de cada escola ou contexto”. Evidencia em outras respostas
a relevância da prática sobre a teoria, considerando importante o pro-
cesso de formação em contato diário de aprendizagem com o aluno.
Encontramos ainda quem ache desnecessária disponibilidade das
políticas públicas para a implementação da formação continuada. Alega
que, “[...] não considero relevante pois acredito ser mais eficaz uma
mudança na formação acadêmica,” (A.2020). Rejeita a hipótese de que,
quem determina a formação acadêmica, sejam as políticas públicas. Po-
siciona de forma contraditória ao que se espera das formações, pois
não consegue associar os recursos favoráveis a disponibilização delas
frente às determinações e direcionamentos das políticas públicas.
As regulamentações que expressam as tendências do século
XXI, tencionam as determinações sobre a formação docente e têm
o poder de impingir na ação e prática docentes implicações na orga-
nização do trabalho pedagógico.
As políticas educacionais envolvem aspectos que explicam
e legitimam decisões que estão imbricadas em uma política
maior, que busca produzir e atingir objetivos articulados às
questões materiais. O fato de as políticas estarem vincula-
das a uma lógica de mercado situa as reformas educacionais
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

como panaceia para resolver os problemas educacionais


(ALMEIDA; LEITE; SANTIAGO, 2013, p. 123).
As políticas educacionais apontadas pelas autoras, demonstram
o quanto osdiscursos educacionais se afinam no sentido de polarizar
a formação de professores na expectativa de atender cada vez mais
aos impositivos mercadológicos. Ressaltam a importância de se con-
siderar nesse processo as variantes que transitam no universo edu-
cativo, considerando as peculiaridades da rotina profissional as quais
definem os rumos para prática educativa sem ocorrer um engessa-
mento de suas práticas postuladas por políticas públicas de forma-
ção e definições curriculares rígidas cujo contexto educacional e as
singularidades da profissão docente não são considerados.
Acreditamos, os avanços e retrocessos que sedimentam os ca-
minhos da educaçãoencontram na prática educativa os fundamentos
justificadores dos interesses de mudanças. Contudo, compreende-
mos as dificuldades enfrentadas pelos professores nesse processo
frente à oficialização e implementação das políticas educacionais.
A importância da formação continuada para os partícipes da pes-
quisa, relacionadas a aquisição dos saberes docentes e a formação da
identidade profissional, é esperada como o fator principal para transfor-
mar os modos de agir pedagogicamente na sociedade por meio da escola.
“De vital importância desde que se vise a evolução da es-
cola num contexto socialmente mais humano e igualitário
em valores, direitos e deveres despertando o professor para
os quatro pilares da educação baseados no relatório da
Unesco para a educação do século XXI trabalhando-os em
si mesmo primeiramente, reaprendendo também a fazer, a
conhecer, a conviver para sermos os educadores de novos
tempos, renascendo de outras práticas de vida para o desen-
volvimento do ser”. (G. 2020).
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

“É fundamental, isso porque, muitas vezes misturamos


nossas subjetividades com assuntos pedagógicos e por ve-
zes eles estão desalinhados com o currículo. Exemplo: o
currículo da SEEDF se baseia no modelo de pedagogia
histórico crítica pautado nos princípios da psicologia
histórico-cultural e ainda vemos professores que não le-
vam em consideração a historicidade dos sujeitos, que
não mudam as carteiras de posição, que mantêm uma
postura autoritária baseada na pedagogia tradicional. É
fundamental alinhar o que o professor acredita na indi-
vidualidade dele, com o que os documentos e a prática
exigem de fato”. (C.2020).
Nesses trechos observamos o papel da formação continuada
caracterizado na intencionalidade das professoras. Apesar de exter-
narem de maneira diferente o que esperam das formações, manifes-
tam em suas descrições o desejo de garantir melhores práticas peda-
gógicas e oportunizarem boas aprendizagens aos discentes, a partir
de uma estreita relação formativa entre o ensinar e o aprender para
um melhor desenvolvimento da ação educativa.
A seguir apresentamos alguns apontamentos finais sem a preten-
são de conclusão da temática tem em vista a necessidade de continuar-
mos esse diálogo em outras produções e/ou com outros parceiros.

A pesquisa realizada nessas duas escolas classes da Coordena-


ção Regional de Ensino de Sobradinho - DF, analisou a prática
pedagógica dos professores e as questões que cercam o ensinar e
o aprender em condições singulares dos contextos sociais onde es-
tão situadas essas comunidades escolares. São realidades sociais
que exigem dos docentes o traquejo pedagógico para promover o
ensinar e o aprender, encadeando ideias que conjuguem a teoria e
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

a prática no exercício diário da profissão. Neste contexto, eles per-


cebem as discrepâncias entre a formação teórica e a realidade da
prática, a qual exige deles ações educativas capazes de responder
situações específicas na brevidade com que se apresentam as ne-
cessidades pedagógicas da sala de aula e dos estudantes.
Ao analisarmos a prática docente, a processualidade que en-
volve os percursos formativos da ação educativa entrelaçados
continuamente entre o aprender e o ensinar na rotina da prática
pedagógica, percebemos que, ao longo da vida profissional, os
professores gradativamente constroem suas relações pedagógi-
cas, quer sejam com seus alunos, com seus pares, com o fazer
pedagógico ou com o processo formativo, que no conjunto da
obra, em concomitância com a vida, constroem seus saberes do-
centes. Suas ações pedagógicas são afiançadas pelas escolhas fei-
tas, pelas definições das determinações das políticas públicas edu-
cacionais, pelos processos formativos desenvolvidos durante a
carreira profissional docente.

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FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

Evódio Mauricio Oliveira Ramos


Maria Aline Borges Dantas Cerqueira
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

prática docente, em sua essência, é uma ação cotidiana, contí-


nua e que se renova ou se amplia no decorrer da sua trajetória.
Esse movimento, quando conscientemente praticado, torna-se uma
ação que não se restringe à transmissão de conteúdo, na aprendiza-
gem de métodos e meios de ensino, mas na ação-reflexão-ação que
permite aprendizagens, mudanças, criticidade e percepção sobre a
ação pedagógica como um espaço propício à interação e à mudança,
que se compõe de sujeitos diversificados e igualmente importantes.
Para que a profissão docente se inicie, é preciso garantir uma
formação inicial que conceda ao docente as habilidades, os saberes,
as práticas e os espaços onde vai atuar. Trata-se de um momento
propício ao tornar-se profissional do magistério. Concordando com
Morgado (2011, p. 796-797),
A profissionalização deve promover a apropriação de uma
dada cultura profissional por parte dos formandos e favorecer
a construção da sua identidade profissional. Construção
essa que irá prolongar-se ao longo da sua profissão. Trata-
se de um processo que visa o desenvolvimento de competên-
cias profissionais.
Constituir-se um profissional docente demanda formação es-
pecífica, estabelecer uma identidade profissional. Trata-se de perce-
ber-se como agente que atua com habilidades próprias na prática
docente, ao tempo em que dela reflete e age a partir desses saberes.
Para Nóvoa (1992, p. 23), a profissionalização é “[...] um processo
através do qual os trabalhadores melhoram o seu estatuto, elevam
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

os seus rendimentos e aumentam o seu poder/autonomia. Ao invés,


a proletarização provoca uma degradação do estatuto, dos rendi-
mentos e do poder/autonomia”.
Mesmo tendo como modelo as profissões liberais que formalizam
o fazer profissional em suas ações e institucionalizações, a profissão
docente precisa romper com a informalização para erigir espaços de
constituição da profissão docente que se dá em sua totalidade. Se, nesse
sentido, a profissionalização representa a aprendizagem inicial da pro-
fissão, então, considera- se que uma formação inicial frágil vai propiciar
uma atuação docente também fragilizada. A crescente investigação so-
bre a profissionalização docente representa “[...] a necessidade da revi-
são de modelos formativos, das políticas de aperfeiçoamento e fortale-
cimento da profissão e o próprio contexto do exercício das atividades
docentes” (Ribeiro; Moraes; Martins, 2011, p. 282).
Nesse movimento, surge a profissionalidade docente que se faz
de processos formativos contínuos, de engajamento social, de prá-
ticas docentes reflexivas e de multiplicidades de saberes que alimen-
tam a trajetória do ensino e da aprendizagem. É o que Contreras
(2002, p. 73) define “[...] como modo de resgatar o que de positivo
tem a ideia de profissional no contexto das funções inerentes ao tra-
balho da docência”. Se, por um lado, a competência profissional é
parte fundante da profissão docente, o compromisso social aliado
às questões éticas e também morais precisam estar no cerne da luta
pela autonomia docente.
Destarte, a discussão sobre profissionalidade é algo um tanto
recente. Isso envolve, para sua definição, um complexo conjunto
de ideias e opiniões que fazem desse conceito algo de polissêmicos
sentidos e de muitas discussões sobre a sua constituição. Roldão
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

(2005, p. 106) aponta em suas pesquisas evidências de que a pro-


fissionalidade docente está sendo alvo de investigações no “forum
das políticas educativas internacionais”, fato que remete a se pen-
sar na relevância desse tema no cenário da pesquisa e os seus des-
dobramentos no campo das políticas educacionais. Concordando
com a autora, o termo “profissionalidade”, como o “[...] conjunto
de atributos, socialmente construídos, que permitem distinguir
uma profissão de outros muitos tipos de actividades, igualmente
relevantes e valiosas” (p. 105), não deve abrir mão de perceber as
maneiras subliminares de subordinação nem de possuir o poder
sobre sua prática estabelecida numa coletividade que permite uma
identidade compartilhada.
A profissão docente, nesse sentido, é plena de poder, coletivi-
dades, saberes específicos, experiências vividas e problematizadas.
Não se trata de puramente adquirir um “lugar nas profissões”, po-
rém, mais do que isso, agir de modo consciente, abalizando suas
perspectivas sociais, discutindo seus desafios para traçar políticas
públicas que promovam uma educação de qualidade.
Sacristán (1995, p. 65), a seu tempo, define a profissionalidade
como um “[...] conjunto de comportamentos, conhecimentos, des-
trezas, atitudes e valores que constitui a especificidade de ser pro-
fessor”. O que forma a profissão docente é, em especial, a multipli-
cidade de saberes, atitudes, reflexões e tomadas de decisões, cons-
tantemente refletidas e ressignificadas. Avigorando tal discussão,
Ambrosetti e Almeida (2009) reforçam a importância da centrali-
dade do professor como protagonista da sua profissionalidade. A
práxis pedagógica só é assim definida se exercida com uma autono-
mia professoral gradualmente tecida de experiências formativas que
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

afloram saberes, histórias e lutas sociais. Na dita direção, as autoras


argumentam que
[...] a ideia de profissionalidade repõe a centralidade dos
professores como atores da prática educativa, trazendo
para a discussão aspectos como a dimensão pessoal e sub-
jetiva no trabalho docente e o significado dos processos bi-
ográficos e relacionais na construção da docência. Aponta
também para a importância dos contextos e situações de
trabalho e para o reconhecimento da organização escolar
como espaço fundamental na constituição da profissionali-
dade docente (Ambrosetti e Almeida, 2009, p. 595).
Na profissionalidade, a autoformação e as aprendizagens cons-
tantes ocorrem de maneira marcante no contexto da profissão, en-
volvendo a apreensão de conhecimentos e atitudes que farão parte
da prática docente. Um fazer que é vivo, interativo, dialético, histó-
rico, ou seja, um fazer que não é um ato de transmissão de conheci-
mentos e saberes, mas que se dá na amplitude da interação ineren-
temente humana (Freire, 1996).
As histórias tecidas e vividas que são narradas e refletidas neste
escrito representam escolhas que levaram à profissão docente e in-
fluenciaram na constituição da profissionalidade dos professores da
rede pública de ensino de Ouriçangas/BA. São histórias que mos-
tram saberes experienciais, afetividades, transgressões e rupturas
que possibilitaram/possibilitam fazer da profissão docente um lugar
de plena profissionalidade. Essas narrativas fazem parte do recorte
de uma pesquisa desenvolvida no Programa de Pós-Graduação em
Educação da Universidade Estadual de Feira de Santana (UEFS),
cuja produção de informações se deu a partir de entrevistas em pro-
fundidade e da produção de memorial. A análise foi realizada por
meio da Análise Textual Discursiva (Moraes; Galliazzi, 2006), cujo
achados são apresentados a seguir.
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

Ao ouvir as narrativas sobre os motivos pela opção em seguir


o magistério, as razões que se destacaram fazem referência, especi-
almente, tanto a questões financeiras quanto a incentivo familiar. No
depoimento a seguir, nota-se que o professor considerava que o cur-
rículo do curso do magistério era muito restrito ao “fazer docente”
e não o preparava para o exame vestibular, visto que este era um dos
seus objetivos, mas acaba sendo uma opção pela restrição de cursos
de formação profissional no município:
A vontade era assim, fazer faculdade, mas a vontade não
era, inicialmente de ser professor já com o magistério. O
exercer o magistério a partir do magistério dado pelo ensino
médio. A vontade inicial era fazer formação geral por acre-
ditar que ali a gente teria um suporte maior de conteúdo
para ir para o vestibular para enfim seguir uma carreira do-
cente a partir de fato da faculdade (Professor 1).
O mesmo professor, todavia, exprime que, por pretextos
econômicos e de influência familiar, ele inicia a profissão, não por
haver optado, mas por necessidade.
Por isso que falo que essa questão do magistério tem sido
antecipado em função dessa questão econômica, de traba-
lho, de ajudar os pais. É uma questão que volta à tona de-
pois no primeiro ano, quando faço a opção do ensino mé-
dio com magistério, mas era uma questão que já se insinu-
ava nas séries anteriores, porque [...] na sétima e a oitava
série, eu fiz a noite justamente por conta dessa questão de
estar ajudando meus pais durante o dia, então, eu fui aluno
de EJA (Professor 1).
Ao discutir sobre a escolha da profissão docente, é relevante
que se perceba o contexto que perpassa essa escolha: econômico,
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social, cultural ou histórico. O que mobilizou esse grupo para tão


importante opção profissional? A questão econômica e familiar no
cerne desta pesquisa se mostrou balizadora. Os professores partici-
pantes também apontaram:
A minha vida do magistério surgiu incentivada pelos meus
pais e vendo na minha família seis irmãs que já eram profes-
soras; algumas já lecionavam, outras estavam cursando o
curso de professora e diante da carência que tinha naquela
época de professor, os meus pais diziam que pobre tinha que
fazer magistério, que emprego era garantido (Professor 2).
Aí no ano seguinte, por coincidência, minha cunhada estava
se aposentando e aí foi que eu comecei então a lecionar, não
por vontade, mas por necessidade também de trabalhar...
Que eu tinha necessidade de trabalhar, tinha concluído o en-
sino médio e não queria voltar para roça (Professor 4).
Quando eu comecei como professora, primeiro, por conta
de que no momento, quando eu estudava, só existia magis-
tério e contabilidade. Então eu optei por fazer magistério.
Sempre a nossa mãe falava que magistério que era a profis-
são da mulher. E segundo, porque eu me dediquei e gostei
da área (Professor 5).
A questão econômica e a influência familiar para a escolha do
ofício são preponderantes, pois conferem segurança, estabilidade e
empregabilidade; todavia, em um dos depoimentos, a motivação
também partiu pelo exemplo da sua mãe, que foi professora leiga,
apontando que, ultrapassando os aspectos econômicos, o exemplo
de outros professores e familiares que tiveram a mesma profissão
também influenciaram na escolha da profissão:
E isso assim, como eu falei que eu fui professora das mi-
nhas irmãs, eu pensando na minha mãe, que ela já tinha fa-
lado que foi professora de algumas pessoas; ela morava na
zona rural e foi professora leiga antes de casar. E aí, quando
eu vi muitos alunos que foram alunos dela, que passavam
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

por mim e falavam assim: ‘Sua mãe foi minha pró’, ‘Sua mãe
foi minha pró’. Eu achava aquilo tão interessante que eu
falei ‘Eu também quero ser professora’ (Professor 5).
Sobre esse aspecto da influência familiar, Tardif (2002) aponta
que a trajetória docente é relevantemente marcada por questões pré-
profissionais, as quais a história familiar, o tempo de aluno, o exem-
plo de professores e outras pessoas pertencentes ao grupo social de
que faz parte constituem os saberes da docência e com eles a carreira
se forma. Essa narrativa, então, faz com que se note a escolha pela
profissão sucedendo de maneira diversificada, sendo que as experi-
ências, antes ou durante a prática do ofício docente, são balizadoras
para a constituição da profissionalidade.
Já a narrativa de um professor aponta para uma ruptura histórica,
determinando que a continuação dos estudos não era para todos,
sendo necessário abrir mão da escola para ajudar no sustento familiar.
E aí a minha mãe, mesmo sendo também leiga, tinha uma
visão de que era o estudo que dava essa condição de você
mudar, transformar sua realidade. Então a minha avó vivia
uma situação cultural, de não prosseguir estudando, e isso
ela fez com as filhas dela e queria passar essa mesma con-
dição pra os netos e daí por diante (Professor 3).
Entende-se, então, que a escolha do magistério ainda no ensino
médio é recheada de perspectivas familiares. O ato de querer lecio-
nar situa a história familiar como elemento mobilizador, seja para
sair da baixa condição financeira vivida, seja como elemento de par-
ticipação social, visto que a educação era percebida como ponte de
emancipação e de inserção na sociedade local.
Contemporaneamente, essa escolha profissional é factível de
reunir outros elementos mobilizadores, haja vista que o desprestígio
advindo das condições de trabalho envolvendo salários, valorização
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

social e carga horária excessiva carreia para a profissão docente um


desafio, tanto na formação dos seus profissionais como na garantia
da qualidade da educação. Sobre esse ponto, Iza et al. (2014) expri-
mem que a identidade pessoal e profissional, não sendo algo dado
nem facilmente descrito, reserva a amplitude de um processo histó-
rico, social, cultural e econômico com significações e contradições
para a constituição da profissionalização docente.
Embora aparecendo a influência econômica e familiar como
principal ponto para a escolha da profissão, havendo até mesmo a
resistência inicial ao magistério, as narrativas apontam que, desde
esse tempo de formação no ensino médio, inicia-se o reconheci-
mento da importância de ser professor e de seu papel na sociedade:
Aí foi uma coisa assim que não veio muito de mim, veio mais
do meio e comecei talvez não com tanta vontade própria,
mas só que me deparei com professores, com pessoas que
incentivavam, que vinham mostrando para gente a importân-
cia de ser professor, do magistério, e aí fui me identificando
aos poucos e criei vínculo com a profissão (Professor 2).
Depois que eu consegui fazer o magistério, eu fui desco-
brindo como se dava essa vida profissional e eu percebi que
não era algo difícil de ser professor. Então eu fui desco-
brindo aos poucos a me encontrar nesta área e aí eu fui se-
guindo com colegas que também me incentivaram muito
nesta lida (Professor 3).
Os excertos acima evidenciam que o curso do magistério e a
coletividade do espaço formativo configuraram um despertar para a
criação de uma identidade docente, sendo majoritariamente iniciada
a carreira docente após todos os entrevistados terminarem o ensino
médio e logo após serem aprovados em concurso público. Nesse
percurso, a profissionalidade docente começou a emergir do contato
inicial com a sala de aula, como mostram as narrativas a seguir:
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

Dentro desse processo surgiu realmente o amor pela pro-


fissão, o qual não tinha na hora que eu comecei o curso,
mas tocando o curso e tocando a prática eu sentir prazer
pelo que eu estava fazendo (Professor 2).
E aí foi que eu tive minhas primeiras experiências no ensino
de alfabetização, com alunos do primeiro ano e foi aí que me
despertou esse desejo, essa vontade de trabalhar. No ano se-
guinte eu ainda trabalhei com outra turma também, aí foi que
eu tive uma maior aproximação com o contato com esses alu-
nos, com a realidade dos alunos em si; aí que me despertou
essa vontade de continuar nessa carreira (Professor 4).
Quando eu comecei a estudar o magistério, algumas pro-
fessoras que me conheciam me chamavam pra dar aula no
lugar delas, aí eu comecei a me especializar e a adquirir amor
pela profissão (Professor 5).
As narrativas dos participantes evidenciam um movimento
processual de imbricação e aproximação com o ato docente, ao
adentrarem a carreira e na formulação da sua profissionalidade. Essa
constituição implica uma formação contínua e um sujeito que se ex-
prima como ativo no desenvolvimento da sua profissão (Ambro-
setti; Almeida, 2009). A especificidade de ter feito o “antigo magis-
tério”, no contexto desta pesquisa, aponta para uma escolha da pro-
fissão norteada por influências sociais, familiares e econômicas, su-
gerindo-se, também, o despertar para uma identidade profissional
que não se edifica isoladamente do locus de trabalho, mas que é es-
sencial para a ampliação dos saberes da prática pedagógica.
A análise das narrativas, assim, assinalam que a escolha da pro-
fissão é influenciada por um contexto social, histórico e cultural.
Todavia, a identidade docente se faz das experiências que se crista-
lizam com/no percurso. Nesse aspecto, tanto a formação inicial
quanto a de ordem continuada são espaços para a profissionalização
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

e, consequentemente, para suas trajetórias de profissionalidades.


Nessa perspectiva, é perceptível que o início da profissão com o
magistério em nível médio foi instigador e desafiante. Contudo, a
formação inicial em nível superior, de maneira específica o curso de
Pedagogia, representou outras perspectivas para a profissão.
No contexto das falas dos professores pesquisados, essa for-
mação mostrou-se como balizadora na qualificação da prática peda-
gógica. Impulsionados pelas exigências da Lei de Diretrizes e Bases
da Educação Nacional (LDB) nº 9394/96 (Brasil, 1996), que regu-
lamenta a obrigatoriedade da formação em nível superior para a atu-
ação em qualquer etapa da educação básica, os cursos de licenciatura
ganharam grande aderência. Por essa via, os professores da rede mu-
nicipal de ensino de Ouriçangas, que adentraram na profissão ainda
com o “antigo magistério”, foram motivados a fazer o exame vesti-
bular em Pedagogia, ação que representou uma parceria entre a Pre-
feitura Municipal e a UEFS.
Sobre os saberes advindos dessa formação, a experiência da
prática refletida à luz das teorias estudadas conduziu a aprendiza-
gens diversificadas, como conhecimentos da didática, das metodo-
logias, dos saberes específicos, entre outros – em especial, a possi-
bilidade de ressignificar sua prática com amparo na autorreflexão.
Consoante expressa Kramer (2002, p. 127), a formação do professor
pressupõe que, constantemente, “[...] a teoria, os estudos, as discus-
sões se misturam, costuram conhecimentos vivenciais, aos saberes
que vêm da prática”, para que assim a profissionalidade se constitua
em toda a sua amplitude.
Dessa maneira, as narrativas reforçam a noção de que, enquanto
o magistério motiva para o ingresso na profissão, possibilitando
aprendizagens referentes à prática pedagógica, o curso de Pedagogia
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amplia essas aprendizagens, expandindo o repertório de saberes rela-


tivos à profissão. Sobre tais contribuições, um professor relata:
[…] Então, o curso de Pedagogia ele contribui muito com
relação a isso: a você entender os aspectos ali envolvidos,
todos, da configuração do espaço da sala de aula, de quem
é o aluno, de quem é esse sujeito, essa trajetória histórica,
essa trajetória cultural, essa trajetória social, a antropologia
desse sujeito, enfim, vai contribuindo para a gente ter os
pés no chão, pra ter um entendimento melhor acerca do
ensinar e de a quem você está ensinando, dos objetos ali
intrínsecos ou específicos do que é ensinar e das variáveis
que isso implica e quem é esse sujeito que eu estou ensi-
nando (Professor 1).
Desse modo, os conhecimentos advindos da formação permi-
tem que se ampliem os saberes que tecem a prática pedagógica. Para
o professor, a oportunidade de formação teórico-reflexiva na gradu-
ação expressou um aprofundamento da prática pedagógica e a ela-
boração de saberes docentes adequados ao cotidiano da escola.
É imprescindível que o percurso formativo favoreça ao profes-
sor o intento de pesquisar, refletir sobre sua prática e, para ela, vis-
lumbrar transformação. Essa é a indissociável relação entre a teoria
e a prática: que uma esteja em função da outra, numa atitude de
procura, inquietação e recomeço. O reconhecimento da intrínseca
relação entre a teoria e a prática fundamenta a fala dos professores,
legitimada pelas narrativas aqui reproduzidas:
[...] o curso de Pedagogia abriu novos horizontes. Já dentro
da participação de quase 50 colegas na turma e a gente fazia
o curso e alí se ministrava teoria e prática, nós trabalháva-
mos com os nossos professores aquilo que a gente já estava
trabalhando em sala de aula (Professor 2).
Eu percebia que a área [Licenciatura em Pedagogia] me dava
uma condição de melhor conhecer o que é ser professor, como
se dava essa prática, porque eu já tinha um pouco da prática e
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a teoria veio pra conciliar essa condição. Então, isso também


foi algo muito valioso, porque professores que me deram essa
orientação de conciliar a teoria à prática (Professor 3).
Os fragmentos evidenciam que a formação em licenciatura em
Pedagogia promoveu melhoria no conhecimento teórico e prático
dos professores, reforçando a ideia de que tal formação inicial foi
significativa para a formação profissional e para suas profissionali-
dades, visto que esta se amplia em momentos formativos, com rup-
turas de modelos estagnados para uma ação viva e de reflexão.
As narrativas ainda apontaram que essa formação inicial auxi-
liou para que a sala de aula fosse refletida, aproximando esse tempo
formativo da prática docente:
Coisas que a gente achava que estava fazendo certo e aí se
trabalhando a cada dia e inovando a nossa prática ia que-
brando paradigmas, que a gente tinha aquela tradição que
era daquela forma e aí o curso foi despertando na gente a
reflexão e terminamos o curso com uma outra visão, com
um outro olhar e mais apaixonada ainda pela profissão. Daí
eu senti que o curso foi bastante significativo a ponto da
gente ter um novo olhar para o aluno, um novo jeito de
ensinar (Professor 2).
Outro ponto relevante na fala dos professores foi que essa for-
mação enseja o reconhecimento da subjetividade do outro e seus
desdobramentos na coletividade, quanto às aprendizagens referen-
tes às relações entre professor/aluno, aos saberes da profissão do-
cente e seus objetivos sociais. “Então o curso em si, tanto do magistério
como de Pedagogia, favoreceram isso: a entender melhor como se dava a questão
da aprendizagem do outro e de como a gente deveria interagir para que o outro
fosse tendo avanço naquela aprendizagem” (Professor 4).
A análise desses discursos remete a um dos saberes necessários à
prática educativa, preconizado por Paulo Freire (1996) – que não há
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docência sem discência. A relação dialética que se dá em sala de aula


não nega as subjetividades de todos os sujeitos que dela fazem parte.
As contribuições do curso de Pedagogia assentes nas narrativas apon-
tam que a dialogicidade que aflorou da formação inicial deu azo à re-
flexão sobre a ação pedagógica, na qual o ato de ensinar foi problema-
tizado em vista dos sujeitos partícipes desse processo.
Tal ação pedagógica advinda da formação inicial ou continuada
remete à ideia da formação de um professor como um ato que não o
submete a uma ação meramente técnica e que, conscientemente, in-
tenta ser agente de transformação do seu espaço. Sacristán (1995, p.
74), quanto à conduta profissional, relata: “A sua conduta profissional
pode ser uma simples adaptação às condições e requisitos impostos
pelos contextos preestabelecidos, mas pode também assumir uma
perspectiva crítica, estimulando o seu pensamento e a sua capacidade
para adotar decisões inteligentes para intervir nos contextos”.
Seguindo nessa vertente, tanto a formação inicial quanto a
formação continuada precisam ser espaços de reflexão. São am-
bientes de formação receptíveis a uma profissionalidade consci-
ente, repleta de saberes e destrezas, mas pode ser também lugar
de subordinação. De tal sorte, o grupo de professores participan-
tes evidenciou a formação em Pedagogia como lugar de pesquisa
e, especialmente, de fazer a teoria e a prática serem retroalimen-
tadas pela reflexão constante.
A formação, nessa perspectiva, encerra rupturas, aprendizagens
e motivação. Aliada a um processo contínuo, a profissão docente é
constituída sob o viés da multiplicidade das identidades que circun-
dam os espaços educativos e da elaboração profissional (Nóvoa,
2002). Para Sacristán (1995, p. 76), “[...] a formação contínua de pro-
fessores deve pôr em causa as bases da profissionalidade docente,
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não se limitando a uma reciclagem ao nível dos conteúdos ou das


destrezas”, ensejando um currículo predeterminado para a formação
docente, a valorização das individualidades e das experiências cons-
titutivas da carreira.
As narrativas dos professores pesquisados sinalizam importantes
indícios de que os espaços de formação continuada dos quais partici-
pam ou já participaram auxiliaram na constituição da profissionali-
dade docente na rede municipal de Ouriçangas. Todavia, reforçam
que os ambientes formativos que realizam inter-relações com a prá-
tica pedagógica é que possibilitam importantes contribuições para a
ação docente. Os cursos citados como relevantes para o grupo de
professores foram, em especial, o Projeto Transformando a Educa-
ção do Ensino Fundamental (Transe)27, desenvolvido pela UEFS, e a
formação oferecida pelo Instituto Chapada de Educação e Pesquisa
(ICEP)28, por considerarem a prática como dispositivo de formação.
Também a pós-graduação lato sensu foi citada como um espaço para o
desenvolvimento profissional docente, ao passo que se apreende das
narrativas a ideia de que a profissionalidade docente é formulada, tam-
bém, na participação de recintos formativos que têm a escola como
referencial de análise. Os relatos sobre a participação em cursos de
formação continuada reforçam essa constatação:

_______________
27 Projeto criado no ano de 1986, coordenado pela Pró-Reitoria de Extensão, com
vistas a desenvolver projetos e organizar trabalhos de capacitação e
acompanhamento em serviço de professores do ensino fundamental.
28 O Projeto Chapada atua na formação continuada de educadores desde 1997. O

seu principal objetivo é garantir que os estudantes, até os 8 anos, consigam ler e
produzir textos.
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

E diante de tudo isso a gente vê o quanto é necessária a


formação continuada, porque a partir do curso de Pedago-
gia, que ficou bem claro que temos que estudar, temos que
melhorar nossa prática e aí a mente muda. Temos que ser
mais flexível e estar constantemente fazendo formação
continuada para estar se adaptando às mudanças que ocor-
rem constantemente na área (Professor 2).
Eu não me vejo como um ser completo, mas me vejo como um ser
em formação... Eu aprendi muito na pós-graduação (Professor 3).
Dá uma certa confiança daquilo que a gente tá fazendo... O
medo que a gente tem, a insegurança, ele dá aquele suporte
para a gente. Às vezes a gente fica pensando que está per-
dido, mas começa a conversar e socializar e trocar as expe-
riências com outros professores, você vê e percebe que não,
você percebe que aquela trajetória que você está fazendo ali
está igual à dos outros, todo mundo remando ali naquele
mesmo barco (Professor 4).
A certeza do “inacabamento”, tão bem defendido por Paulo
Freire, permeia a constatação da importância da formação continu-
ada. Como argumenta o autor, “[...] a consciência do mundo e a
consciência de si como ser inacabado necessariamente inscrevem o
ser consciente de sua inconclusão num permanente movimento de
busca” (1996, p. 64); isto é, formar-se num ato de (trans)formação.
Não cabe mais o inconformismo ante o mundo, impende um pro-
fissionalismo para uma autonomia que faz da ação de educar um ato
de problematização.
Outro ponto das narrativas acerca da importância da formação
continuada para a constituição da profissionalidade é o fato de a
própria escola ser o lugar para emergir seus objetivos, discussões e
desdobramentos. Quando a formação se isola do locus educacional,
a contribuição se torna pouco relevante, pois não retorna para a prá-
tica como elemento reflexivo e mobilizador de novos saberes:
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

Os cursos de formação que são mais esporádicos podem


contribuir em alguns insights, mas geralmente eles são con-
tribuições menores, porque geralmente são cursos que são
muito pontuais, você não retorna aquela discussão, você
não está ali na prática pensando nela, às vezes há um dis-
tanciamento desses cursos do fazer de fato do chão da sala
de aula (Professor 1).
As narrativas também apontaram para uma formação continuada
que enseja o reconhecimento subjetivo de cada professor e os desdo-
bramentos das suas singularidades na coletividade. Nóvoa (2002), ao
fazer proposições sobre a formação continuada, reforça a noção de que
esta deve ter o professor como sujeito e o locus educacional em sua or-
ganização e objetivos educacionais como centro da formação. Com
efeito, como explicitado nas narrativas dos participantes, a formação
que apreende a prática como sua base de análise, assim como situa os
professores como ativos, possibilita uma formação que valoriza a indi-
vidualidade formativa, enquanto faz com que essas singularidades se
ampliem ou se ressignifiquem em um espaço coletivo para concretizar
uma ação escolar com maior qualidade.
Na roda da profissionalidade ou da constituição da profis-
sionalidade docente, os cursos que podem contribuir mais,
claro, são aqueles, enfim, que emergem do próprio fazer ali
e que eles são tomados para análise a partir do próprio su-
jeito que produz a prática e no ambiente em que essa prática
ela é produzida, ou seja, na coletividade (Professor 1).
A ação docente que se retroalimenta nesse modelo de for-
mação continuada como elemento constituinte de sua identidade
demanda uma ação investigativa, na qual sua prática aceita a pes-
quisa e seus desdobramentos no cotidiano, como observado nas
narrativas dos professores,
É um fazer que é pautado no pensamento, na pesquisa, na
ação o tempo todo. Pensar no que vai dando certo, por que
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

que não está dando certo [...] o trabalho do professor é de


um eterno pesquisador. Tudo isso é avanço e avanço se faz
com pesquisa, com conhecimento e o espaço da sala de aula
não pode ser um espaço em que o seu conhecimento ali
naquele dado momento ele se cristalizou e é aquilo; as no-
vas didáticas, as novas teorias, a pesquisa ela não para o
tempo todo e o professor ele precisa avançar (Professor 1).
[...] todo esse meu jeito de ensinar hoje e me relacionar com as
turmas é graças a essa formação que venho ao longo dos anos
tentando sempre está inovando a minha prática (Professor 2).
O fato de reconhecer-se pesquisador é algo essencial para a
prática docente. A autoformação e a valorização da individualidade
concedem oportunidade à constituição de uma identidade docente
que tem autonomia para atuar. Não se há, todavia, de abrir mão da
garantia de uma profissionalização institucionalizada. É necessário
que a profissionalização docente seja
constituída por uma relação de rede. Não basta o professor se
dizer profissional, pois é indispensável que as políticas educacionais
garantam tempos e espaços formativos para a profissão docente
acontecer em sua integridade.
Quando isso se dá dentro de uma relação de rede de ensino
aí pronto, aí a gente tem um perfil de professor instituciona-
lizado, não é a formação em si, é uma relação e um movi-
mento em cadeia; não é o professor sozinho, enfim, ou a par-
tir de sua experiência da sua formação que percebe que tem
que ser assim. Há toda uma estrutura e conjuntura montada
e propiciando que isso seja assim, da importância disso ser
assim, porque vai ter uma reverberação no aluno, vai ter uma
reverberação social maior (Professor 1).
O fragmento citado reforça o argumento de que, mesmo que a
profissão docente procure a autonomia necessária para criar sua
identidade, as políticas públicas de direito à educação hão de existir
sempre, para que se garanta uma educação de qualidade. A eficácia
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

da formação continuada, assim, conserva três possibilidades: a valo-


rização dos docentes, de suas histórias de vida e identidade profissi-
onal, tudo adicionado à efetivação de redes de ensino que planejam
sua educação com base em políticas públicas que têm as devidas
condições para que se realize um fazer pedagógico com vistas à
transformação. Pretende-se que o professor seja um profissional
consciente e que reflita o espaço da docência, este como objeto de
investigação que a ele interessa e que faz parte de uma coletividade
e que, não sendo dado, precisa ser constituído cotidianamente.
Dessa maneira, a importância dos cursos de aperfeiçoamento
para a prática docente é variada. Cada curso deixa sua soma, uma
possibilidade de ampliação para a prática e de apropriação de saberes
que formam o perfil profissional. Isso produz experiências formati-
vas que refletem em práticas de reflexão-ação-reflexão, como rela-
tam os professores:
Analisando o meu perfil educativo durante essa trajetória
de mais de 30 anos, eu tenho consciência de que ser pro-
fessor no século XXI precisa estar constantemente ino-
vado, estar inovando suas práticas, estar atento às mudan-
ças que surgem e estar, assim, por dentro da realidade e na
formação continuada isso é fundamental, pois o professor
tem que ter um perfil mais articulador, no qual o conheci-
mento é construído num processo participativo e crítico e
num relacionamento com o outro (Professor 2).
Porque a formação, ela é um processo; por ser um processo
a gente vai lidando inicialmente com a teoria – teoria essa
que já tínhamos lá atrás, de outros estudos formativos – e
a gente vai também fazendo essa formação se juntar à prá-
tica (Professor 3).
A formação continuada e sua importância para a qualificação
da trajetória docente demarca o reconhecimento da necessidade de
um movimento que impulsione a pesquisa, que tenha a prática do
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

cotidiano como fundamento do seu planejamento, para, assim, aten-


der às necessidades formativas de cada professor, dentro do seu es-
paço de trabalho e para o seu desenvolvimento profissional e sua
profissionalidade.

Os achados da pesquisa apontaram claramente o fato de que


situações e experiências vivenciadas na trajetória profissional dos
professores constituíram/constituem seus saberes e identidades. A
profissionalidade dos docentes participantes é marcada pela convi-
vência familiar e social, pela memória do tempo de estudante, desde
o magistério até a formação inicial em Pedagogia, estendendo-se nos
cursos de aperfeiçoamento e qualificação. A práxis pedagógica é
composta por histórias de vida, de formação, de atuação em grupos
sociais, do fazer diário que dá a oportunidade de desenvolver sabe-
res e conhecer o outro com seus limites e capacidades de atuar, de
modo a “tornar-se” um profissional com a capacidade de, também,
mobilizar saberes e refletir sobre sua prática.
A contribuição de processos de formação que valorizem a in-
dividualidade e a práxis docentes no fortalecimento da profissiona-
lidade dos professores, de acordo a análise feita, também reforça a
noção de que a concretização do fazer docente se veste de um con-
junto constituído por teoria e prática. Nesse sentido, o estudo e a
pesquisa são essenciais para o profissional docente. Negar os conhe-
cimentos científicos e históricos não é salutar para o fortalecimento
de uma ação pedagógica eficaz, pois, ao contrário, contrapor/pro-
blematizar essas duas vertentes é fundamental nessa constituição.
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

Na diversidade que compõe a profissionalidade dos professores,


estar inserido em um espaço formativo que preza pelo desenvolvi-
mento intelectual, pela aprendizagem de saberes críticos, reflexivos e
específicos – pedagógicos, didáticos ou curriculares – dá ensejo à cons-
tituição de uma identidade docente fundamentada no processo de en-
sino-aprendizagem crítico, no comprometido com o social e nos pres-
supostos da equidade, da dialogicidade e da emancipação de seus sujei-
tos, fator fundante nessa trajetória de profissionalidade.
O início da profissão ainda no magistério, tendo o incentivo
econômico e familiar como principal balizador, foi o começo de
uma formulação identitária que, primeiramente, exibiu medos, ten-
sões e resistências, mas, com o fazer cotidiano e, em especial, com
o contato com os estudantes, efetivaram-se aprendizagens e o desejo
de continuar no ofício.
A formação inicial em Pedagogia foi citada como um “desper-
tar” para a reflexão, para a importância de perceber a relação intrín-
seca entre prática e teoria. Os cursos de aperfeiçoamento e a pós-
graduação se constituíram como espaços que permitiram o diálogo,
a interação, a troca de práticas exitosas e, especialmente, momentos
de olhar para o próprio percurso, pensando em erros, acertos, desa-
fios e possibilidades para uma significativa atuação.
Portanto, os resultados aqui expressos retratam que a profissi-
onalidade docente se constitui de um conjunto de elementos que
compõem a práxis docente, sejam estes os exemplos e incentivos
familiares, os momentos formativos, as experiências e vivências das
atividades diárias, dentre tantos outros meios, como processos que
mobilizam saberes, rompem tradicionalismos e contribuem para o
pensar e agir na profissão docente.
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

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ROLDÃO, Maria do Céu. Profissionalidade docente em análise: espe-
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FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

Professora Associada do Centro de Ciências Humanas da Educação


da Universidade do Estado de Santa Catarina - UDESC. Leciona nos
Cursos de Pedagogia, Mestrado e Doutorado no Departamento de
Pedagogia e no Programa de Pós-Graduação em Educação. Possui
Graduação em Pedagogia e Especialização em Fundamentos do Ma-
gistério pela UDESC. É Mestre em Educação pela Pontifícia Univer-
sidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC/RS), Doutora em Enge-
nharia de Produção pelo Programa de Pós-graduação em Engenharia
de Produção da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Re-
alizou estágio Pós Doutoral no Programa de Pós-Graduação em Edu-
cação na Universidade do Vale do Rio dos Sinos - UNISINOS sob
orientação da Profa. Dra. Maria Isabel da Cunha.

Doutoranda e Mestre em Educação pela Universidade Federal de Ouro


Preto - PPGE/UFOP; Especialista em Política do Planejamento Peda-
gógico: Currículo, Didática e Avaliação pela UNEB- Universidade do
Estado da Bahia; Graduada em Pedagogia pela UEFS - Universidade
Estadual de Feira de Santana - BA. Integrante do Grupo de Pesquisa
FOPROFI - Formação e Profissão Docente/Departamento de Educa-
ção da Universidade Federal de Ouro Preto UFOP/ CNPq.

Mestre em Ensino, no POSENSINO, associação ampla entre


UERN/UFERSA/IFRN. Especialista em Educação e Contempora-
neidade pelo IFRN. Graduado em Pedagogia pela UERN.
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Doutor em Educação pelo PPGE/UECE. Professor Adjunto da


Universidade Federal Rural do Semi-Árido (UFERSA). Docente Per-
manente do Programa de Pós-Graduação em Ensino (POSEN-
SINO/UERN/UFERSA/IFRN).

Licenciado e Bacharelado em Educação Física pela Universidade Federal


de Viçosa-MG (1992), Especialista em Metodologia do Ensino Superior
pela Universidade do Estado da Bahia-BA (2002), Mestre em Educação
pela Universidade Estadual de Feira de Santana- BA (2014), Doutor em
Educação pela Universidade Estadual do Ceará (2018). Membro Pesqui-
sador do Núcleo de Estudos e Pesquisas sobre Pedagogia Universitária
(NEPPU- UEFS) e do Grupo de Pesquisa Educação, Cultura Escolar e
Sociedade (EDUCAS- UECE). Professor Adjunto do Departamento de
Saúde – DSAU/UEFS. Professor Permanente do Programa de Pós-
Graduação em Educação - PPGE/UEFS.

Graduada em Pedagogia e Ciências Biológicas. Mestre e Doutora em


Educação pela UEPG. Docente Adjunta da Universidade Federal de
Mato Grosso do Sul (UFMS). Coordenadora Estadual da AN-
FOPE/MS. Líder do grupo de Pesquisa em Educação, GEPE. Pes-
quisadora membro do GEPTRADO e da RIPEFOR. Desenvolve
pesquisas naárea de formação de professores.
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Possui graduação em Pedagogia pela Universidade Federal de Roraima -


UFRR (2014), graduação em Educação Física - Claretiano - Centro Uni-
versitário (2017), Especialização em Gestão Escolar pela Universidade Fe-
deral de Roraima - UFRR (2015), Mestrado em Educação pela Universi-
dade Estadual de Roraima - UERR (2018). Doutorado em Educação pela
Universidade Federal do Amazonas - UFAM (2022). Foi pedagoga no
Instituto Federal de Roraima/IFRR/Campus Novo Paraíso, atuando
como coordenadora na Coordenação de Assistência ao Estudante - CAES
(2014-2016). Atualmente é professora efetiva nos anos iniciais - Colégio
de Aplicação - UFRR.

Professora Associada da Universidade Estadual do Ceará (UECE).


Docente permanente do PPGE da UECE. Líder do grupo de pes-
quisa Educação, Cultura Escolar e Sociedade (EDUCAS/CNPq). Pe-
dagoga, com Estágio Pós-Doutoral em Educação pela UNB, com
doutorado e mestrado em Educação Brasileira pela UFC. Membro da
ANFOPE e da ANPEd, compondo o grupo de pareceristas Ad Hoc
do GT8 – Formação de Professores.Bolsista de Produtividade em
Pesquisa do CNPq - Nível 2. Editora da Revista Educação& Forma-
ção do PPGE/UECE. Membro do conselho editorial da Revista
Educação em Questão (UFRN), Formação Docente - Revista Brasi-
leira de Pesquisa sobre Formação deProfessores (ANPEd GT8/Edi-
tora Autêntica) e Arquivos Analíticos de Políticas Educativas
(AAPE), além de outros periódicos qualificados.
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

Pós-Doutor em Educação pela Universidade Estadual do Ceará -


UECE (2019). Graduado em Educação Física pela Universidade Fede-
ral do Amazonas - UFAM (1987). Bacharelando em Direito. Atuou
como professor de Educação Física na Rede Pública Estadual, Muni-
cipal e Particular da Educação Básica por mais de 20 anos. Mestre em
Educação Física pela Universidade Metodista de Piracicaba - UNI-
MEP/SP (2005). Doutor em Educação pela Universidade Metodista
de Piracicaba - UNIMEP/SP (2012). É professor adjunto da Universi-
dade Federal do Amazonas (UFAM), atuando na Faculdade de Educa-
ção Física e Fisioterapia - FEFF/UFAM. Professor permanente nos
cursos de pós-graduação stricto sensu em Educação - PPGE/UFAM,
do Programa de Pós- Graduação Sociedade e Cultura na Amazônia -
PPGSCA/UFAM e Programa de Pós- graduação em Educação na
Amazônia - PGEDA- Doutorado em Educação na Amazônia. Líder
do Grupo de Pesquisa - GEPEFRI/CNPq: Educação Física e suas re-
lações interdisciplinares.

Pesquisador de produtividade do CNPq. Doutor em Ciências Sociais


(PUC/SP); com Pós- doutorado em História da Educação (Université
Laval, Quebéc–CA) e (UPTC-CO); Em História (UPO/ES). Docente
na Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP-PPGE- UFOP); Pro-
fessor visitante na Rede de Universidades Públicas Colombianas (RU-
DECOLOMBIA) e investigador no Instituto Interuniversitario de In-
vestigación Educativa (IESED-CHILE). Membro da Junta Directiva da
Sociedad de Historia de la Educación Latinoamericana (SHELA) e do
GT.08d/ANPED; Vice-Diretor do G.P. Historia y Prospectiva de la
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

Universidad Latinoamericana (HISULA); Coordenador do GP Forma-


ção e Profissão Docente – FOPROFI (CNPq).

Doutora e mestra em Educação, mestra em Patrimônio Cultural, es-


pecialista em Gestão Educacional e bacharela e licenciada em Dese-
nho e Plásticas, ambas pela Universidade Federal de Santa Maria. Pos-
sui estágio de pós-doutoramento em Artes Cênicas – Migração na
Universidade Federal de Brasília (Brasil, 2023-2024); pós-doutora-
mento em Filosofia e Ciências Humanas em Nuestra América pela
Universidad Nacional Experimental Simón Rodríguez (Venezuela,
2018-2019). Professora do mestrado no Programa de Pós-Graduação
em Educação (PPGEduc) da UFRR (permanente). Professora do
doutorado no Programa de Pós-Graduação em Educação na Amazô-
nia PGEDA (permanente). Coordenadora do Grupo de Estudos e
Pesquisas em Patrimônio, Arte e Cultura na Amazônia (GPAC). Tem
atuado nos temas: arte urbana, saberes amazônicos, circuito da arte,
estudos culturais, educomunicação e ensino de Artes.

Pedagoga, mestrado em Educação Tecnológica, doutorado e pós-


doutorado em Educação.Professora associada I da FE- UnB. Atua na
graduação em Pedagogia e na pós graduaçãonos cursos de mestrado
e doutorado acadêmico e profissional. Atualmente é diretora da Fa-
culdade de Educação da Universidade de Brasília (gestão 2022-2025).
Tem experiênciana área de Educação, com ênfase em Formação
de Professores, saberes e práticasdocentes, atuando principalmente
nos seguintes temas: formação docente, currículo, didática, professor
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

formador e avaliação institucional, ensino superior, prática pedagó-


gica, inovação pedagógica e competências profissionais.

Professor Titular da Faculdade de Educação da Universidade do Es-


tado de Santa Catarina. Editor-Chefe da Revista Linhas e subcoorde-
nador do Programa de Pós-Graduação em Educação. Bolsista de Pro-
dutividade em Pesquisa do CNPQ - Nível 2. Leciona nos cursos de
Pedagogia, Mestrado e Doutorado em Educação e Mestrado Profissi-
onal em Gestão de Unidades de Informação. Coordena e realiza estu-
dos com ênfase no processo de alfabetização de crianças, jovens, adul-
tos e idosos e nas relações entre a formação docente, políticas curricu-
lares e os processos de inclusão. É integrante do Conselho Municipal
de Educação de Florianópolis, Articulador do Fórum Catarinense de
Alfabetização e Presidente da Associação Brasileira de Alfabetização.

Doutora em Educação pela PUC SP. Pós-Doutoramento em Educa-


ção, com bolsa do CNPq-PDJ. Professora do Programa de Pós-Gra-
duação em Educação – PPGE e do Departamento de Metodologia
de Ensino – MEN, ambos vinculados ao Centro deCiências da Edu-
cação (CED), da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Lí-
derdo Grupo de Estudos e Pesquisas: Formação de Professores e
Práticas de Ensino – FOPPE; pesquisadora do Grupo de Trabalho
(GT 8) de Formação de Professores da ANPEd Nacional e membro
da Associação Nacional pela Formação dos Profissionais daEducação
- ANFOPE; e, membro da Rede Interinstitucional de Pesquisas sobre
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

a Formação e as Práticas Docentes – RIPEFOR. Bolsista de Produ-


tividade em Pesquisa pelo CNPq.

Licenciada em Pedagogia pela Universidade Estadual de Feira de San-


tana (2006) e graduada em Letras - Língua Portuguesa e Literaturas
de Língua Portuguesa pela Universidade do Estado da Bahia (2012).
Especialista em Coordenação Pedagógica pela Faculdade Santíssimo
Sacramento. Mestre em Educação pela Universidade Estadual de
Feira de Santana (2022). Coordenadora Pedagógica - Colégio Esta-
dual Professora Mariado Carmo Santana, Aramari – BA. Professora
do Ensino Fundamental II, Ouriçangas-Ba.

Doutora e Mestre em Educação pelo Programa de Pós-Graduação


em Educação da Universidade Estadual do Ceará. Graduada em Pe-
dagogia pela mesma instituição. Professora efetiva da rede municipal
de São Gonçalo do Amarante, Ceará, atuando nos anos iniciais do
Ensino Fundamental. Tem experiência no Ensino Superior, tanto na
Graduação como na Pós-Graduação Lato Sensu. Pesquisadora cola-
boradora no Grupo dePesquisa Educação, Cultura Escolar e Socie-
dade. Membro da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa
em Educação e da Associação Nacional de Didática e Práticade En-
sino. Integra a Red de inducción a la docencia. Desenvolve pesquisas
na área de Educação, precisamente sobre formação de professores,
iniciação à docência, permanência no magistério e desenvolvimento
profissional docente.
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

Possui graduação em Educação Física (2013) e Pedagogia (2016), es-


pecialização em Psicomotricidade (2014), Mestrado Acadêmico em
Educação pela Universidade Estadualde Roraima (2016), Doutorado
em Educação pela Universidade Federal do Amazonas (2021). Atual-
mente professora EBTT – Pedagogia no Colégio de Aplicação da
UFRR. Participa do Grupo de Pesquisa em Educação Física e suas
relações interdisciplinares - GEPEFRI/UFAM.

Possui graduação em Pedagogia pela Universidade do Estado de


Santa Catarina (1995), graduação em Habilitação em Educação Infan-
til pela Faculdade de Pinhais (2008), mestrado em Educação e Cultura
pela Universidade do Estado de Santa Catarina (2005),doutorado em
Educação pela Universidade Federal de Santa Catarina (2017) com
doutorado sanduíche na Universidade de Coimbra- Portugal no ano
de 2015. Atualmenteé professora colaboradora da Universidade do
Estado de Santa Catarina - UDESC. Tem experiência na área de Edu-
cação, com ênfase nesta área, atuando principalmente nos seguintes
temas: formação de professores, relações de gênero, literatura, repre-
sentação feminina, artes, perspectiva histórico cultural, estágio curri-
cular, educação infantil e anosiniciais.

Pedagoga-Doutoranda em Educação na linha de pesquisa: Currículo,


Avaliação e Formação Docente UnB). Mestra em Educação com ên-
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

fase em formação de professores.Especialista em Psicopedagogia Ins-


titucional. Tem experiência nas áreas de gestão, formação de profes-
sores, coordenação e docência na Educação Infantil, Anos Iniciais da
Educação Básica. Atua como docente na Secretaria de Estado
do Distrito Federal.Membro do Grupo de Estudo e Pesquisa: For-
mação, Currículo, Tecnologias e Inovação-GEPFOCTI.

Doutor em Educação pelo PPGE/UFPB. Professor Adjunto da Uni-


versidade Federal da Paraíba (UFPB). Coordenador do Laboratório
de Práticas, Estudos e Pesquisas emFormação de Professores – Uni-
versidade e Escolas de Educação Básica(LACONEX@O). E-mail:
osmarhelio@hotmail.com

Doutoranda em Educação pela Universidade Federal de Santa Cata-


rina - UFSC, integrante do Grupo de Estudos e Pesquisas: For-
mação de Professores e Práticas de Ensino - FOPPE-UFSC, vin-
culada ao Programa de Pós-Graduação em Educação da Universi-
dade Federal de Santa Catarina (PPGE/UFSC). Integrante da
pesquisainterinstitucional, vinculada ao Edital UNIVERSAL 2018 do
CNPq, intitulada “Pesquisa Com Professores Iniciantes: um estudo
sobre Indução Profissional”, realizada pela UFRJ, UFSC e UECE.
Possui graduação em Pedagogia pela Universidade do Vale do Itajaí.
Professora alfabetizadora nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental,
com estabilidade (efetiva) na Rede Municipal de Educação do Muni-
cípio de Antônio Carlos - SC.
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

Graduada em Pedagogia e mestre em Educação pela Universidade


Estadual de Ponta Grossa (UEPG). Doutora em Educação pela
UNESP, Araraquara/SP. Docente Adjunta da UEPG e Docente Sê-
nior do PPGE/UEPG, na linha de Ensino e Aprendizagem. Líder do
GEPTRADO. Vice Presidente ANFOPE/Sul. Membro Adoc do
GT8 ANPED/Nacional. Vice Coordenadora da RIPEFOR. Desen-
volve pesquisas na área de formação inicial e continuada de professo-
res desde os anos de 1990.

Graduada em Pedagogia. Mestre e Doutora em Educação pela


UEPG. Professora colaboradora do Departamento de Educação da
UEPG. Pesquisadora membro do GEPTRADO e da RIPEFOR.
Desenvolve pesquisas na área de formação de professores.

Professora adjunta do curso de licenciatura em Música do Centro de


Comunicação, Letras e Artes da Universidade Federal de Roraima
(CCM/CCLA/UFRR), na área de Educação Musical/Canto. Dou-
tora em Educação pelo Programa de Pós-Graduação em Educação
da Universidade Estadual do Ceará (PPGE/UECE). Mestre em Mú-
sica pelo Programa de Pós-Graduação em Música da Universidade
Federal de Uberlândia (PPGMU/UFU). Licenciada em Mú-
sica/Canto pela mesma instituição. Líder do grupo de pesquisa Mu-
siCuir: Educação Musical, Currículos e Interseccionalidades da
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICAS DE ENSINO: pesquisas contemporâneas

UFRR/ Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecno-


lógico. Desenvolve pesquisas com currículos, gênero, sexualidade, te-
orias queer e raça em Educação Musical, além de pesquisas em voz e
ensino de Canto.

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