Prevenção Ao Suicídio Na Atenção Básica

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PREVENÇÃO AO SUICÍDIO

NA ATENÇÃO BÁSICA
Escuta, trabalho multiprofissional e encaminhamentos

André Crescêncio de Souza


Psicólogo, Especialista em Saúde Coletiva, Profissional do SUS.
André Crescêncio de Souza
Psicólogo pela Universidade do Vale do Itajaí -
Univali; especialista em Saúde Coletiva pelo
Programa de Residência Multiprofissional da
Universidade do Extremo Sul Catarinense -
UNESC; idealizador e coordenador do grupo de
estudos Roda Dinâmica entre os anos de 2020
e 2021 e do Grupo de Estudos em Saúde e
Território no ano de 2023; experiência na área
de psicologia escolar na rede de escolas Sesc
de Santa Catarina; atualmente, atua como
psicólogo clínico e da saúde na Unidade Básica
de Saúde do Centro de Criciúma, bem como
em clínica particular. Atua também na
pesquisa voltada às áreas da psicologia social,
saúde coletiva e dos impactos das violências
em suas diversas formas de manifestação.
Único problema filosófico realmente sério?

“Só existe um problema


filosófico realmente sério: é o
suicídio. Julgar se a vida vale ou
não vale a pena ser vivida é
Albert Camus - Filósofo responder à questão
Francês, 1913 - 1960
fundamental da filosofia”
Etimologia e definição

sui: a si mesmo; Chama-se suicídio todo caso de


morte que resulta, direta ou
cidium: assassinato,
indiretamente, de um ato, positivo
associado ao verbo
ou negativo, executado pela própria
caedere, que se
vitima e que ela saiba que deveria
refere a matar produzir esse resultado.
explicitamente. (Emile Durkheim, O Suicídio, 2000
VESCHI (2019). (1897)
Algumas definições

Suicídio Egoísta: não integração do sujeito ao grupo ou à sociedade. Para Durkheim, esse tipo é
mais comum em sociedades onde predomina o individualismo.
Suicídio Altruísta: há uma integração social excessiva. Morte como um sacrifício necessário para o
bem do coletivo.
Suicídio Anômico: “falha” ou falta de regulação social, geralmente em momentos de crise, como
mudanças econômicas, desastres naturais ou grandes mudanças sociais. A "anomalia" refere-se a
uma situação em que as normas sociais estão desorganizadas ou inexistentes, deixando os
indivíduos sem direção.
Suicídio Fatalista: regulação excessiva da vida do indivíduo, em situações onde ele sente que não
tem controle sobre seu próprio destino, como em regimes autoritários ou em situações extremas
de opressão.

Emile Durkheim, O Suicídio, 2000 (1897)


Dados Epidemiológicos

Comparação Global (2000-2019)


Aumento nas Taxas de Suicídio e
Redução global de suicídios: 36%.
Autolesão no Brasil (2011-2022)
Aumento nas Américas: 17%.
Suicídio em jovens (10 a 24 anos):
Brasil: Crescimento de 43% no
Crescimento médio de 6% ao ano.
número de suicídios.
Notificações de autolesões em
jovens: Aumento de 29% ao ano. Notificações de Autolesão por Faixa
Suicídio na população geral: Etária (2022)
Crescimento médio de 3,7% ao ano. Aumento em todas as faixas etárias
Autolesão na população geral: (10 a +60 anos).
Aumento de 21% ao ano. População indígena: Mais de 100
casos por 100 mil pessoas, mas
A pandemia não mudou a tendência de
menores taxas de hospitalização.
aumento do suicídio.
Discussão sobre saúde mental (ansiedade,
depressão) aumentou, mas o crescimento
das taxas de suicídio foi persistente.
Número e proporções de suicídios em relação ao total de óbitos, segundo o sexo e as
características demográficas das vítimas. Brasil, 2021
Mortalidade Mortalidade Mortalidade

Dados Epidemiológicos
Masculino Feminino Total
proporcional¹ proporcional¹ proporcional¹

Total 12.072 1,21 3.431 0,43 15.507 0,86

Faixa etária

05 a 14 101 2,70 123 4,35 224 3,41

15 a 19 733 6,09 342 9,65 1.075 6,90

20 a 29 2.495 5,71 667 5,07 3.162 5,56

30 a 49 4.664 3,12 1.230 1,55 5.894 2,57

50 a 69 2.995 0,85 832 0,35 3.827 0,65

70 e mais 1.061 0,25 234 0,05 1.325 0,14

Ignorado 23 3 30

Raça/cor

Branca 5.402 1,09 1.761 0,39 7.163 0,76

Negra² 6.345 1,30 1.560 0,46 7.907 0,95


Proporção por sexo: A mortalidade
proporcional por suicídio é maior entre Amarela 33 0,53 15 0,31 48 0,44

homens (1,21%) do que entre mulheres Indígena 122 3,85 39 1,62 161 2,88

(0,43%). Ignorado 170 56 228

Faixa etária: A maior incidência ocorre Escolaridade

entre jovens de 15 a 29 anos, com uma Nenhuma 523 0,43 96 0,07 619 0,24

mortalidade proporcional de até 6,90% na 1 a 7 anos 4.085 0,97 924 0,27 5.009 0,66
faixa de 15 a 19 anos. 8 a 11 anos 3.901 1,79 1.240 0,85 5.141 1,41
Raça/cor: A população indígena apresenta 12 anos e mais 1.081 1,40 556 1,01 1.637 1,24
as maiores proporções de suicídios
Ignorado 2.482 615 3.101
(2,88%), seguido pela população negra
Estado civil
(0,95%).
Solteiro 6.410 2,44 1.804 1,04 8.214 1,88
Escolaridade: As vítimas com menor nível
Casado 2.840 0,67 722 0,35 3.562 0,57
de escolaridade (1 a 7 anos) concentram a
Viúvo 320 0,28 196 0,07 516 0,13
maior parte dos suicídios (0,66%).
Estado civil: Pessoas solteiras apresentam Divorciado 810 1,07 297 0,53 1.107 0,84

uma mortalidade proporcional mais alta Outro 613 1,46 140 0,78 753 1,25

(1,88%). Ignorado 1.079 272 1.355

Esses dados refletem uma maior


vulnerabilidade de jovens, homens,
Brasil (2020)
indígenas e negros.
Escuta

A escuta do ato da tentativa de


suicídio pode ajudar o sujeito a criar
e/ou desenvolver sua
potencialidade simbólica. Portanto,
parte-se do pressuposto de que o
que é descarregado no ato de tentar
acabar com a própria vida tem íntima
relação com um excesso derivado de
vivências traumáticas às quais não foi
possível dar uma atribuição de
sentido ou obter uma captura no
mundo representacional do sujeito.

Macedo; Werlang (2007)


Escuta

Algumas ações que podem ser realizadas por todos os profissionais da Atenção Básica, nos
mais diversos dispositivos de cuidado (CHIAVERINI, 2011):
Proporcionar ao usuário um momento para pensar/refletir.
Exercer boa comunicação.
Exercitar a habilidade da empatia.
Lembrar-se de escutar o que o usuário precisa dizer.
Acolher o usuário e suas queixas emocionais como legítimas.
Oferecer suporte na medida certa; uma medida que não torne o usuário dependente e
nem gere no profissional uma sobrecarga.
Reconhecer os modelos de entendimento do usuário.

Brasil (2013)
Trabalho multiprofissional

Enquanto fenômeno
multideterminado, o suicídio e sua
prevenção demandam olhares das
diferentes áreas do conhecimento que
compõem as equipes de saúde na
Atenção Básica.
Equipe mínima ESF:
Médico generalista (ou médico de família e comunidade);
Enfermeiro;
Técnico ou auxiliar de enfermagem;
Agentes comunitários de saúde (ACS);

A equipe pode incluir outros profissionais, como:


Dentista;
Auxiliar ou técnico em saúde bucal;
Assistente social;
Psicólogo;
Fisioterapeuta;
Nutricionista.
Intervenção em Crise
Se o risco for imediato, é necessário
garantir a segurança do paciente. Em
situações de crise, é crucial envolver
serviços de emergência ou hospitalares,
se necessário;
Mais uma vez, a escuta é essencial;
Tranquilizar o paciente sobre os
sintomas, evidenciando que esse
episódio passa em poucos minutos e não
há risco de morte iminente;
Validar o desconforto e mal-estar que o
paciente está sentindo e reforçar que a
crise é passageira;
Realizar exercícios de respiração pelo
nariz para evitar a hiperventilação;
Se o paciente apresentar muitos
sintomas respiratórios, deve-se indicar a
respiração via diafragmática até que os
sintomas desapareçam.
Notificação
De acordo com as diretrizes
do Sistema de Informação
de Agravos de Notificação
(SINAN) e as normativas do
Ministério da Saúde, todas
as tentativas de suicídio
devem ser notificadas pelas
unidades de saúde. Essa
notificação é essencial para
a vigilância epidemiológica,
planejamento e execução
de políticas públicas de
saúde mental e prevenção
ao suicídio.
Encaminhamentos
Quando encaminhar ao CAPS:
Tentativa de suicídio em qualquer circunstância, com ou sem agitação psicomotora;
Episódio depressivo grave com ou sem sintomas psicóticos associado à ideação suicida, com
planejamento ou história anterior de tentativa de suicídio;
Episódio de Mania (euforia) com ou sem sintomas psicóticos associado comportamento inadequado
com risco para si e/ou terceiros;
Autonegligência (perda do autocuidado) grave com doenças clínicas associadas (comorbidades
orgânicas);
Intoxicação aguda por substâncias psicoativas (medicamentos, álcool e outras drogas);
Quadro psicótico com delírios, alucinações, alteração do comportamento, podendo estar associado a
confusão mental, ansiedade e impulsividade com risco para si e/ou terceiros;
Mais de um episódio de autoagressividade (automutilação, cutting) com risco de morte iminente;
Episódio de agitação psicomotora, agressividade auto e/ou heterodirigida, com ideação, planejamento
e/ou tentativa de homicídio ou suicídio;
Quadro de alcoolismo ou dependência química a outras drogas com sinais de agitação e/ou
agressividade auto e/ou heterodirigida, várias tentativas anteriores de tratamento extra-hospitalar sem
êxito, com risco psicossocial elevado;
Quadros refratários à abordagem ambulatorial e especializada;
Encaminhamentos
Continuidade do acompanhamento;
Trabalho intersetorial, quando necessário (situações de violação de
direitos, p.e);
Articulação de estratégias de proteção com a rede de apoio;
Quando crianças ou adolescentes, responsabilização compartilhada
com a família ou cuidadores responsáveis, bem como eventual atuação
em conjunto com a escola;
Ainda quando crianças ou adolescentes, atuação conjunta ao conselho
tutelar;
Considerar a RAPS em seus diversos dispositivos (UBS, CAPS, SAMU,
UPA, HOSPITAIS GERAIS...)
Referências

Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Saúde Mental.
Cadernos de Atenção Básica, n. 34. Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Atenção
Básica, Departamento de Ações Programáticas Estratégicas. Brasília: Ministério da Saúde, 2013. 176 p. Disponível em:
< http://189.28.128.100/dab/docs/portaldab/publicacoes/caderno_34.pdf >

CAMUS, Albert. O mito de Sísifo. Tradução: Valerie Rumjanek Chaves. Rio de Janeiro: Record, 2010. 8 ed.

DURKHEIM, E. O suicídio: estudo de sociologia. São Paulo: Martins Fontes,. 2000.

MACEDO, M. M. K.; WERLANG, B. S. G.. Trauma, dor e ato: o olhar da psicanálise sobre uma tentativa de suicídio.
Ágora: Estudos em Teoria Psicanalítica, v. 10, n. 1, p. 86–106, jan. 2007.

SEBASTIÃO, Mariana. Estudo aponta que taxas de suicídio e autolesões aumentam no Brasil. Portal Fiocruz, 20 fev.
2024. Disponível em: https://portal.fiocruz.br/noticia/2024/02/estudo-aponta-que-taxas-de-suicidio-e-autolesoes-
aumentam-no-brasil. Acesso em: 19 set. 2024.

VESCHI, Benjamin. Suicídio. 2019. Disponível em: https://etimologia.com.br/suicidio/. Acesso em: 19 set. 2024.

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